cabo verde - África 21 Online

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cabo verde - África 21 Online
BRASIL
E agora Dilma?
Angola no Conselho
de Segurança das Nações Unidas
Nº 91 - novembro 2014 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15
O topo é a ambição
CABO VERDE
Cabo Verde
enfrenta
longos desafios
económicos,
o que não impediu
de ser considerado
o segundo país
africano mais bem
governado
África21– novembro 2014
1
2
novembro 2014 –
África21
PARABÉNS.
ESTES PRÉMIOS
TAMBÉM SÃO SEUS.
Melhor Banco em Angola
EMEA FINANCE
Melhor Banco
Comercial
Global Banking and
Finance Review
Melhor Gestão
Corporativa
World Finance
Melhor Programa
de Cartão de Débito
Card and Epayment
Africa Awards
Prémio
de Excelência STP
Deutsche Bank
Marca
de Excelência
Superbrands
O BFA é um Banco de referência em Angola e o seu desempenho tem
sido reconhecido com os diversos Prémios Nacionais e Internacionais.
O elevado grau de solidez, organização e sustentabilidade do BFA é
confirmado pelos prémios de gestão, de inovação e de excelência que tem
vindo a receber. Uma consagração que só é possível porque tudo o que
fazemos é pelos nossos Clientes, pelos nossos Colaboradores e pelo
desenvolvimento do nosso País. Por isso, estes prémios também são seus.
África21– novembro 2014
3
sumário
Angola no Conselho
de Segurança
As ambições de Cabo Verde
Com190 votos favoráveis dos 193 possíveis,
a Assembleia Geral das Nações Unidas elegeu Angola para integrar o Conselho de
Segurança como membro não permanente
durante dois anos.
Carlos Severino
20
Cabo Verde vislumbra um futuro promissor. Tem a possibilidade de se
transformar num país mais desenvolvido e aspira tornar-se o mais bem
governado em África. Mas até lá é preciso investimento e empenho para
reforma e desenvolvimento de diversas áreas.
37
Gláucia Nogueira, Corsino Tolentino, Natacha Mosso e Miguel Correia
Plebiscito a Dilma Rousseff
A batalha pelo controlo
de Kobani
62
Sitiada desde agosto pelos jiadistas do Estado
Islâmico, a batalha pelo controlo da cidade síria
de Kobani parece não ter fim. E a questão curda
revela as fragilidades e incoerências da coligação
liderada pelos Estados Unidos.
Nicole Guardiola
África21 Revista de Política, Economia e Cultura
Propriedade Nova Movimento, Lda
Sociedade de Marketing, Comunicação e Cultura
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Bairro do Maculusso – Luanda, Angola
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Editada por Movipress
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Diretor Carlos Pinto Santos
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Técnica Comercial Yuma Traça
Assistente Direcção Comercial Patrícia Filipe
Representação em Portugal Triangulação, Lda
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Apartado em Lisboa: 19059
1990-999 LISBOA
Diretora administrativa Marina Melo
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4
novembro 2014 –
A vitória de Dilma na segunda volta das presidenciais foi à tangente. Para os próximos quatro anos, a Presidente reeleita promete
reformas inevitáveis: reforma política, combate contra a corrupção
e à inflação.
Representação no Brasil
Belisan Editora, Comércio e Serviços Ltda [email protected]
Redação de Angola
Adriano de Sousa, Alberto Sampaio, Carlos Severino,
Luís Ramiro, António Dombele, Pedro Kamaka,
Ruben Kamaxilu e Teixeira Cândido
Redação de Portugal João Carlos, João Escadinha,
Miguel Correia, Nicole Guardiola, Nuno Macedo
e Teresa Souto
Redação do Brasil Carlos Castilho e João Belisario
Colaboradores permanentes Almami Júlio Cuiaté
(Bissau), Augusta Conchiglia (Paris), Charles Shorungbe
(Lagos), Emanuel Novais Pereira (Maputo), Fernando
Lopes Pereira (Bissau), Gláucia Nogueira (Praia), Itamar
Souza (Nova Iorque), João Vaz de Almada (Maputo),
Juvenal Rodrigues (São Tomé), Luís Costa (Washington),
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(Praia), Paul Cooper (Houston) e Rodrigues Vaz (Lisboa)
Colunistas Alves da Rocha, Conceição Lima, Corsino
Tolentino, Fernando Pacheco, Germano Almeida, João
Melo, José Carlos de Vasconcelos, Luís Cardoso, Odete
Costa Semedo e Pepetela Fotografia Agência Angop,
Agência Lusa, Agência France Presse, Arquivo
África21
45
Carlos Castilho
África21, Arquivo Digiscript, Fernanda Osório, Jornal
de Angola e Ruth Matchabe
Projeto gráfico, paginação e pré-impressão Digiscript
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aos leitores
Os desafios de Cabo Verde
6 Entrevista
Mohamed Yioussouf Adamgy
Crime e violência não vêm no Alcorão
Nicole Guardiola
42OPINIÃO
Alves da Rocha
48MOÇAMBIQUE
Filipe Nyusi e Frelimo comemoram vitória
Emanuel Novais Pereira
50Ébola
O mundo em alerta
Nicole Guardiola
54São tomé e príncipe
Patrice Trovoada vence as eleições
Juvenal Rodrigues
58GUINÉ-BISSAU
Democracia discutida em Bissau
Almami Júlio Cuiaté
60ÁFRICA DO SUL
Economia em crise
Gaye Davis
69AMÉRICA LATINA
Lutar contra os abutres financeiros
Manrique S. Gaudin
83LÍNGUA PORTUGUESA
Nova diretora do IILP
João Carlos
Rubricas
11 Antena21
18 Gente
74 Insumos
88 Cults
92 Livro do Mês
94 Ver, Ouvir Ler
Crónicas
57 Conceição Lima
67 José Carlos de Vasconcelos
85 Luís Cardoso
96 João Melo
Dizer que Cabo Verde é um caso
de sucesso soa a muito pouco.
Quem o visitou há trinta anos
ficava suspenso ao olhar as ilhas
feitas de serras áridas e rochas, que
o vento as varria com violência.
Tempos a tempos, chovia mas a
água teimava em cair no mar a
escassos metros da praia. Mas
[email protected]
quando a sorte sorria e a água
molhava as populações acontecia o carnaval, festejado por
crianças e adultos que se rebolavam pelas ruas.
Chegada a independência em 1975 muitos cabo-verdianos e estrangeiros interrogavam-se se o país era viável.
O vocábulo pontuava na boca de muita gente e também
de dirigentes. Mas o «viabilizar» caiu em desuso muito
rapidamente, substituído pelo «gota a gota, árvore a
árvore».
Os anos foram-se esgotando e Cabo Verde foi-se
construindo.
Criou-se muita coisa, desafios foram vencidos, e
muitas transformações aconteceram na fragilidade da
economia, da agricultura (num território que apenas
dispõe de dez por cento de terra arável), e de escassos
recursos naturais. A vida dos quinhentos mil habitantes,
número semelhante aos que foram forçados a emigrar, foi
melhorando pouco a pouco, passo a passo.
Em 2007, Cabo Verde começou a caminhar do grupo
dos Países Menos Avançados para os de Rendimento
Médio, uma mudança sustentada pelos indicadores de
rendimento per capita, educação e saúde. Uma transição
complexa porque a outra face da moeda levava à
supressão de vários apoios de países doadores.
Ao entrar na quarta década de país independente,
tem provas dadas no sistema político. Em Cabo Verde,
os mandatos dos governos cumprem os prazos legais em
paz, e a coabitação entre o primeiro-ministro, do PAICV,
e o presidente da República, do MpD, verifica-se sem
sobressaltos, como aliás é a situação atual, o que causará,
seguramente, inveja aos santomenses.
E há agradáveis ironias. A pouca água que cai no
arquipélago não impediu a construção de barragens, e o
vento arrasador dá para alimentar os parques eólicos.
Mas ressalve-se que nem tudo está bem no segundo
país africano mais bem governado. Há falhas para resolver
com urgência. Disto tratam os nossos colaboradores cabo-verdianos nesta edição.
Carlos Pinto Santos
África21– novembro 2014
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Entrevista Mohamed Yioussouf Adamgy, diretor da revista islâmica Al-Furqán
“Quem conhece o Islão
não parte para fazer a jiade”
O Islão é mal conhecido em muitos países e geralmente está
associado na opinião pública às noções de guerra, radicalismo
e terrorismo. Os cerca de 50.000 muçulmanos que vivem em
Portugal, oriundos maioritariamente da Guiné- Bissau e de
Moçambique, repudiam esta violência e também a manipulação
caluniosa do Alcorão.
Nicole Guardiola
ÁFRICA21. Nunca se falou tanto do
Islão na imprensa lusófona. Como muçulmano e como intelectual, como avalia esta mediatização?
MAHOMED YIOSSUF ADAMGY. Se
se fala tanto na imprensa lusófona é porque se fala, também, na imprensa internacional que, por sua vez, transmite, duma
forma ou de outra, o que a CNN noticia.
E quando se fala do Islão, fala-se só e
sempre ligado à guerra, ao radicalismo e ao
terrorismo.
Assistimos a uma monumental maquinaria mediática que caracterizou o
sempre impreciso e mal definido «fundamentalismo islâmico» como uma nova
praga bíblica. A comunicação social internacional preocupou-se em difundir (com
pouco material de apoio) que as ações do
dito Estado Islâmico são bárbaras, que assassinam pessoas, que raptam mulheres e
que, sobretudo, impõem a lei islâmica às
populações que conquistam. Mas apesar
da muito real violência que existe em algumas zonas do mundo islâmico, há que recordar que a história do Islão não foi mais
violenta que a de outras religiões e que se
os media fossem objetivos veriam que estes
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novembro 2014 –
África21
crimes não são muito piores do que as
ações dos «civilizados» israelitas em Gaza,
ou que os «civilizados» ataques com drones que ordena o Presidente dos Estados
Unidos no Paquistão e que deixam um
trágico saldo de mortes de civis, crianças,
mulheres e idosos, sem distinção.
A violência não é religiosa; é criminosa. O ódio cego não é islâmico, é um pecado mortal. Está escrito no Alcorão «Quem
matar uma pessoa, sem que esta tenha cometido homicídio ou semeado a corrupção na terra, será considerado como se tivesse assassinado toda a humanidade;
quem a salvar, será reputado como se tivesse salvado toda a humanidade.» (Alcorão, 5:32.)
Como reage a comunidade islâmica,
em Portugal e no seu país de origem,
Moçambique?
A maioria da comunidade islâmica (e
mesmo os não-muçulmanos) em Portugal, Moçambique e em todo mundo condena estas atrocidades e este Estado islâmico que nada tem a ver com o Islão. Por
outro lado, essa maioria pressente que há
uma manipulação caluniosa dos Estados
Unidos e, por inércia, do Ocidente contra
o Médio Oriente e o Islão, porque em
nome de uma «democracia totalitarista» se
invade e se bombardeia nações soberanas
como Síria, Líbia, Iraque que foram arrasadas e as suas economias devastadas.
A radicalização de jovens, de origem
muçulmana ou recém-convertidos, que
partem para fazer a jiade na Síria ou no
Iraque, suscita alguma inquietação.
Quer comentar?
Quem conhece bem o Islão, certamente
não parte para fazer a jiade na Síria ou no
Iraque. Apesar de ser este o discurso de
inúmeros ocidentais que aderiram ao Estado Islâmico (e são, pelos vistos, os seus dirigentes no terreno) penso que são indivíduos que por um motivo ou outro se
sentiram marginalizados pela sua sociedade, e que em vez de assumirem os seus insucessos, defeitos ou incapacidades, optaram por culpar toda a cultura ocidental, e
que esse facto é aproveitado pelos angariadores de mercenários. Sem desculpabilizar
estes indivíduos, posso vislumbrar quem
está por detrás de tudo isto e sei que não é
a religião. Nenhuma religião manda massacrar inocentes. O que acontece é que a
sociedade humana sofre as consequências
da desinformação e mentiras, a verdade
tem sido deformada por interesses económicos, os centros de poder no mundo…
Os muçulmanos em Portugal são pouco
numerosos e pertencem aos vários ramos
do Islão. Como se relacionam entre eles?
Segundo a Comunidade Islâmica de Lisboa, os muçulmanos são cerca de 50.000
em Portugal, originários sobretudo da
Guiné-Bissau e Moçambique. A maioria é
sunita. Há uma minoria chiita: a Comuni-
África21
A maioria muçulmana
em Portugal pressente
que há uma manipulação
caluniosa dos Estados
Unidos e, por inércia,
do Ocidente contra
o Médio Oriente e o Islão
dade Ismaelita com o seu templo em Lisboa e a Comunidade Içna Achari com o
seu lugar de culto em Almada. Todos relacionam-se entre eles.
E com os portugueses que professam
outras religiões, nomeadamente os
católicos?
Os muçulmanos de Portugal convivem e
têm relações de amizade, fraternidade e
solidariedade, vivendo em paz com os seus
irmãos de fé cristã e outras, pois os ensinamentos do Alcorão assim os orientam.
Quando Deus diz: «Ó humanidade!
Nós vos criamos de macho e fêmea e vos
dividimos em tribos e nações, para que se
conheçam uns aos outros.» (Alcorão,
49:13) não se está a referir apenas a conhecer um determinado nome ou tribo; a expressão implica, numa interpretação mais
lata e dirigida a toda a humanidade, a troca de saberes e de conhecimentos e toda
uma série de interações positivas.
Quero lembrar, por exemplo, o encontro com o Dalai Lama na Mesquita de Lisboa, que reuniu budistas, muçulmanos, judeus, cristãos, hindus e bahha’is, e cuja
notícia (na época) foi registada, na sua íntegra, na revista islâmica portuguesa Al Furqán. Recebemos na Mesquita de Lisboa as
visitas dos Presidentes da República Portuguesa, nomeadamente, o Dr. Mário Soares,
o Dr. Jorge Sampaio e o Dr. Cavaco Silva,
e os primeiros-ministros Sócrates e Passos
Coelho. E tem havido eventos culturais
com participação de várias religiões.
Tem sentido recentemente mais intolerância, hostilidade?
Em Portugal, felizmente temos poucos indícios de radicalização e de maior intolerância. A maioria dos muçulmanos são portuÁfrica21– novembro 2014
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África21
MAHOMED YIOSSUF ADAMGY
Mahomed Yiossuf Mohamed Adamgy
nasceu na Ilha de Moçambique em
1951, fez os estudos secundários em
Nampula e reside em Portugal desde
1977. É um dos fundadores e diretor da
Al Furqán (O critério do bem e do mal),
uma Organização Islâmica Portuguesa,
fundada em 1981, para a defesa, divulgação e edição de estudos islâmicos em
Portugal. A revista bimensal Al-Furqán é
uma das poucas publicações portuguesas que se dedica à exegese e reflexão
sobre o Alcorão mas também à refutação de muitas interpretações erradas e
preconceitos existentes entre muçulmanos e não muçulmanos.
Foi secretário (1985-87) da Direção
da Comunidade Islâmica de Lisboa
(CIL), fundada em 1968 por um familiar,
Suleiman Valy Mamede (falecido em
1995 e conhecido entre os muçulmanos
lusos como o «pai da grande mesquita»
inaugurada em 1985) e empenhou-se no
desenvolvimento das atividades culturais da CIL e na abertura do diálogo inter-religioso mediante a organização de
colóquios e a criação da Feira do Livro
Islâmico que se realiza anualmente durante o Ramadão.
Muçulmano sunita, considera-se independente quer do ponto de vista teológico quer em relação à CIL, atualmente
presidida pelo Sheik David Munir. Como
intelectual de nacionalidade portuguesa
(como 70% dos muçulmanos residentes
em Portugal) defende o reconhecimento
do Islão como um dos pilares do chamado universalismo cultural lusófono.
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novembro 2014 –
África21
A violência não é religiosa;
é criminosa. O ódio cego
não é islâmico,
é um pecado mortal
gueses, originários das ex-colónias e a nova
geração já nasceu cá; por conseguinte, estão
integrados. Mas não esqueçamos que o
mundo se tornou uma aldeia global. Na
Europa crescem os partidos extremistas e
xenófobos. A televisão que entra quotidianamente em casa das pessoas fala do Islão só
e sempre ligado à guerra, ao radicalismo e
ao terrorismo. Já há sinais de islamofobia,
sobretudo na internet.
Diz que em matéria de direitos humanos um dos valores fundamentais do
Islão é a justiça. Acha que uma ordem
política e social injusta contribui para a
emergência do chamado islão político e
à sua radicalização?
No clima de desespero em que vivem
grandes massas de muçulmanos – e mais
ainda da sua juventude – a saída violenta
pode aparecer como uma tentação. Mas
pergunta-se: é realmente esse um caminho
de libertação para as empobrecidas e prostradas massas muçulmanas?
O escritor, psicólogo e politólogo de
origem argentina Marcelo Colussi escreveu
que num ambiente de pobreza, desemprego e miséria «as populações dos países muçulmanos encontram-se num beco sem
saída» e que «a arrogância e desprezo dos
monarcas e ditadores no mundo islâmico e
árabe adicionam mais combustível ao ódio
e cólera das massas». De um ponto de vista
sociopolítico, as razões principais deste fenómeno são o enorme vazio criado pela
falta de propostas alternativas que acontece
nestas sociedades, e a manipulação das populações apelando a um fanatismo fácil de
No clima de desespero em
que vivem grandes massas
de muçulmanos e sobretudo
a juventude, a saída violenta
pode parecer uma tentação
exacerbar. É ai onde começa a vislumbrar-se outra pergunta: a quem beneficia este
fundamentalismo? Segundo o economista
egípcio Samir Amin «imperialismo e fundamentalismo cultural caminham juntos.
O fundamentalismo de mercado diz: subvertam o Estado e deixem que os mercados
à escala internacional manejem o sistema.
Isto se conseguirá quando os Estados forem
completamente desmantelados».
Por outro lado, todas as religiões podem comportar rasgos fundamentalistas.
Proibir o uso do preservativo alegando
que representa um «atentado à vida»
como faz o Vaticano, no meio de uma
pandemia de VIH como a que atualmente temos, não é por acaso um fundamentalismo irresponsável? E o fundamentalismo não é só religioso.
Bombardear a população civil não combatente com o pretexto de defender a «liberdade» e a «democracia» não é uma forma
extrema de sangrento fundamentalismo?
Nunca houve em Portugal grande interesse pela cultura islâmica. Agora mais
pessoas estudam a língua árabe. Acha
que pode contribuir para o reconhecimento do Islão como parte da identidade histórica portuguesa?
A curiosidade pelo Islão cresceu após a
Guerra do Golfo (1990) e os atentados de
11 de Setembro de 2001. A criação pela Al
Furqán, em 1997, da Feira do Livro Islâmico nas instalações da Mesquita de Lisboa (que se repete todos os anos durante a
última semana do mês do Ramadão) foi,
para muitos, a primeira oportunidade de
entrar na Mesquita de Lisboa. As pessoas
pensavam que se tratava de um lugar
proibido e a feira veio quebrar este tabu.
A Mesquita de Lisboa recebe, anualmente,
muitas visitas de escolas de todo o país. Há
aulas de árabe, gratuitas, ministradas pelo
Imame da Mesquita, Cheik David Munir.
Muitos não-muçulmanos frequentam essas aulas. Por outro lado, há já historiadores e arqueólogos portugueses que se dedicam a investigar e divulgar os vestígios
árabes e islâmicos em Portugal.
Ler entrevista na íntegra
em www.africa21online.com
Obrigado Angola.
Juntos transformamos
sonhos em realidade.
AH Cambambe
AH Gove
A Odebrecht é uma Organização Global presente em cinco continentes, com estrutura
descentralizada e negócios diversificados em Engenharia & Construção, Indústria e
desenvolvimento de projectos em Infraestrutura. Presente em Angola há 30 anos, a
Organização tem foco em transportes, água, saneamento, habitação, energia e
mineração, através de projectos prioritários e sustentáveis, com forte contribuição para o
desenvolvimento das pessoas e comunidades. A Organização também participa de um
portfólio seleccionado de investimentos estratégicos no retalho, agronegócios, shopping
center, mineração e óleo & gás, reforçando o compromisso de longo prazo da Odebrecht
com Angola e também com o continente.
AH Laúca
Para realizar, basta acreditar
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Na SONANGOL trabalhamos todos os dias para ajudar
Angola a transformar energia em desenvolvimento
sustentado para todos os angolanos.
www.sonangol.co.ao
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África21
anos era a esperança de vida
dos angolanos em 2013,
que em 2000 não ia além dos 45
“
Exortamos todos os países a seguir
Cuba e Venezuela, que deram um exemplo
louvável com a sua rápida resposta de apoio
aos esforços para travar o ébola
BAN KI-MOON, secretário-geral da ONU
José Eduardo dos Santos defende estabilidade,
pragmatismo e realismo, para continuar a progredir
«Sem pressas, para não tropeçarmos». A expressão sintetiza o apelo do Presidente José
Eduardo dos Santos à classe política do país para que esta assente a sua ação no pragmatismo e realismo, evitando a «retórica político-partidária», a fim de manter a estabilidade
e possibilitar a continuidade dos progressos alcançados depois do fim da guerra, em 2002.
O Presidente falava sobre o Estado da Nação na sessão de abertura de mais uma legislatura, a 15 de outubro, perante os 220 deputados da Assembleia Nacional.
José Eduardo dos Santos valorizou os progressos políticos, económicos e sociais
verificados nos últimos doze anos, como a pacificação e reconciliação, a democratização, a estabilidade macroeconómica, a reconstrução de infraestruturas e as melhorias sociais, mas reconheceu que ainda resta muito por fazer. Como a principal crítica
à atual governação tem a ver com os desequilíbrios sociais, o Presidente enumerou
aquilo que considera serem os avanços registados nesse domínio. Entre eles, destacou a diminuição da pobreza em mais de 50%, a «revolução quantitativa» na educação, a diminuição da taxa de mortalidade infantil e o aumento da esperança de vida.
Desconstruindo a leitura dominante relativamente ao posicionamento do país
no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano, ainda muito baixo, Eduardo dos
Santos preferiu sublinhar que, desde 2009, Angola foi o terceiro pais africano que
mais progrediu nesse domínio, atrás apenas do Rwanda e da Etiópia. Ele mostrou-se convencido de que, em duas décadas, o país estará situado entre as nações de
índice de desenvolvimento humano elevado.
Na sua mensagem aos deputados, o Presidente alertou, entretanto, para a
«urgente e inadiável» necessidade de diversificar a economia e ultrapassar a dependência em relação ao petróleo. Depois de mencionar as flutuações da produção
petrolífera do país e a diminuição do preço do crude no mercado internacional como
fatores que tornam imperiosa a diversificação económica, José Eduardo dos Santos reiterou que o Governo vai continuar a apostar fortemente nas infraestruturas, a
fim de atrair investimento privado, nacional e internacional. Isso, compreensivelmente, leva tempo. Por isso, ele acrescentou que, «mesmo nas atuais condições»,
o país vai desenvolver programas dirigidos às áreas do cimento, têxteis, bebidas,
açúcar, silos, produção de ovos e carne e pescas, para acelerar a redução da dependência em relação ao petróleo e diminuir as importações.
Forças Armadas Angolanas
estão prontas a participar
em missões de paz da ONU
As Forças Armadas Angolanas (FAA) estão
preparadas para participar em missões de paz
definidas pela ONU e outras instâncias internacionais. A garantia foi dada pelo Chefe do
Estado Maior General das FAA, Geraldo Nunda. Assim, e depois de terem participado em
missões de paz na República do Congo e na
República Democrática do Congo, bem como
na Guiné-Bissau, a próxima missão dos militares angolanos deverá ser a República Centro-Africana (RCA). Segundo o semanário Agora,
publicado em Luanda, 1800 efetivos das FAA
deverão partir para aquele país em data ainda
a definir. A oposição exige que o Presidente
José Eduardo dos Santos solicite autorização
para o efeito à Assembleia Nacional, mas ainda não se sabe se isso vai ser feito ou não.
As Forças Armadas Angolanas – uma das
mais organizadas e capacitadas de África –
estão a iniciar presentemente um processo de
modernização e reequipamento. Novos meios,
como helicópteros e navios-patrulha, estão a
ser adquiridos em diferentes países, como
Rússia e Brasil, enquanto militares angolanos,
de diversos ramos, estão a terminar a sua formação em vários países estrangeiros, entre os
quais a Rússia, Cuba, Portugal e Brasil, mas
também no interior. O Instituto Superior Técnico Militar, por exemplo, inaugurado em 2008,
já formou os primeiros 120 engenheiros militares, nas especialidades de informática, construção e fortificações, engenharia mecânica e
eletrotecnia.
EDUARDO PEDRO/JORNAL DE ANGOLA
FRANCISCO BERNARDO/JORNAL DE ANGOLA
Antena21
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Postos de Venda
da Revista África21
LUANDA
Lojas Africana
“
Angola tornou-se um dos grandes casos
de sucesso em África
RUSSELL FEINGOLD, enviado especial dos EUA
para os Grandes Lagos e a RDC
Mutamba – Rua Rainha Ginga (junto à sede da Sonangol)
Hotel Skyna (hall do hotel)
Av. dos Combatentes (junto ao restaurante Ritz)
Shopping do Belas (junto à zona da restauração)
Maianga – (junto à rotunda da Martal) - irá reabrir brevemente
Outros revendedores
Bombas Aeroporto Internacional 4 de Fevereiro
Bombas da Corimba
Bombas Embarcadouro do Mussulo
Casa dos Frescos Atrium - Junto ao Nova Vida
Casa dos Frescos Baixa Mutamba
Casa dos Frescos Brisas Talatona - Junto à Universidade Oscar Ribas
Casa dos Frescos Conchas Talatona - Junto à sede do Banco BIC
Casa dos Frescos Vila Alice - Junto ao Cine Atlântico
Cita Café dentro da Hyundai - Rua Rainha Ginga
Pastelaria Vouzelense
Gestoffice - Junto à Universidade Lusíada (Ex-Papelaria Fernandes)
Greenspot - Dentro do supermercado Max (Morro Bento)
Galeria Hotel Alvalade
Hotel Epic Sana Mutamba
Quiosque Las Palmas - dentro do Aeroporto Inter. 4 de Fevereiro
Supermercado Valoeste
Shopping Carmo – B. Marianga, perto da antiga Embaixada da África do Sul
Galeria Hotel Trópico
Livraria Mensagem Rua do 1º Congresso do MPLA Mutamba
Livraria Nguvulu - Vila de Viana – Junto à Igreja Católica
Star Angola (Viana) Rua Comandante Valódia, prédio da Conservatória
Livraria Sá da Bandeira – Maculusso
Pastelaria Snack das Quatro - Talatona
Livraria Papelaria Mestria – Kinaxixi, junto à farmácia do Kina Xixi
Supermercado Jofrabo – Maculusso, junto à Liga Africana
Universidade Metropolitana Bairro
Livraria Lello Mutamba - Perto da Sonangol
Distribuidora News Praia do Bispo - Perto do Mausoléu
LUBANGO
Livraria Lello
Centro Comercial Millennium
Livraria Texto Editores
HUAMBO
Ludim Centro Comercial – Cidade Alta - Rua Imaculada Conceição
Mercado Central da Baixa
BIÉ
Praça da Pouca Vergonha
BENGUELA
Supermercados Martins e Neves
Restaurante Tudo na Brasa
Pastelaria Flamingo
CAB (Café da Cidade)
LOBITO
Livraria Independência - Bairro 28, junto ao mercado
NAMIBE
Futuro sem limites FASHION, Lda.
Livraria Texto Editores
H30/cita na Rua 14 de Abril
12
novembro 2014 –
África21
Morreu Michael Sata,
Presidente da Zâmbia
O Presidente da Zâmbia Michael Sata, de 77 anos, faleceu a 28 de
outubro em Londres, para onde tinha sido transportado uma semana antes para tratamento médico. Segundo a Constituição, é o vice-presidente Guy Scott, um branco filho de emigrantes britânicos,
que assume a presidência interina. Guy Scott é o primeiro presidente branco no continente africano em vinte anos. Mas o ministro da
Defesa, Edgar Lungu, é tido como o provável candidato da Frente
Patriótica, o partido presidencial, às próximas eleições.
Católico, pai de oito filhos, Sata era chamado na Zâmbia de «o
Rei Cobra» pela sua língua afiada e a paciência ao serviço das
suas ambições políticas. Próximo do «pai da independência»,
Kenneth Kaunda, eleito presidente da câmara de Lusaka em
1985, juntou-se à oposição antes das primeiras eleições pluripartidárias de 1991 e ocupou vários cargos ministeriais após a vitória
do MMD de Frederick Chiluba. Fundou o seu próprio partido da
Frente Patriótica para concorrer à presidência em 2001, mas só
conseguiu ser eleito à terceira tentativa. Venceu o presidente cessante Ruppiah Banda por 42% dos votos contra 35%.
Nas suas campanhas eleitorais Sata notabilizou-se pelos
ataques contra a alegada hegemonia chinesa sobre a economia
zambiana, centrada nas exportações de cobre. Populista, próximo do zimbabueano Robert Mugabe, prometia acabar com a
corrupção e «mudar a Zâmbia em 90 dias» com uma lei obrigando as companhias estrangeiras a passar 25% das suas sociedades para as mãos de empresários zambianos. Uma vez eleito
mostrou-se menos radical, reconciliou-se com Pequim e intensificou a cooperação económica e política com Angola. Acusado
de autoritarismo e de querer restaurar o regime de partido único
deixa um país em forte crescimento económico, devido ao elevado preço do cobre, mas com finanças públicas em mau estado e
cerca de 60% da população na pobreza.
“
73%
A paz e a estabilidade política são
bens preciosos, mas devemos garantir
também a estabilidade económica sem a
qual muito se pode perder
é a cifra de alfabetização dos adultos
angolanos em 2014
JOSÉ EDUARDO DOS SANTOS, Presidente da República de Angola
MOHAMED MESSARA/LUSA
O atleta Oscar Pistorius está na prisão desde 21 de outubro, dia em que a juíza Thokozile
Masipa o condenou a cinco anos de prisão efetiva pela morte da sua companheira Reeva
Steenkamp e a três anos de pena suspensa pelo uso de arma de fogo. Esperava recuperar
a liberdade dentro de 18 meses, depois de cumprir a sexta parte da pena, de acordo com a
lei penal sul-africana. Mas o Ministério Público decidiu recorrer da sentença que considerou
«não provada» a intenção de matar e reteve apenas o crime de homicídio por negligência.
Pistorius deverá ser julgado de novo por outro tribunal por homicídio premeditado.
As associações de defesa dos direitos das mulheres tinham pedido a revisão da
sentença, estimando que a rápida libertação de Pistorius enviaria uma mensagem errada
aos autores de violência contra as mulheres, crime de que a África do Sul é recordista
mundial. A Federação Internacional de Atletismo informou que o homem mais rápido do
mundo nos 400 m, apesar de ter sido amputado às duas pernas na infância, não poderá
voltar às competições antes de cumprir a totalidade da pena a que fosse condenado.
Enquanto Pistorius aguarda na prisão a marcação do seu novo julgamento, a opinião pública sul-africana foi abalada por outro crime que enlutou o desporto nacional. O guarda-redes
Senzo Meyiwa recentemente nomeado «capitão» dos Bafana Bafana, a seleção nacional de
futebol, morreu a 26 de outubro após ter sido baleado durante o assalto a uma residência em
Vosloorus, pequena cidade a 20 quilómetros a sul de Joanesburgo. Segundo a polícia, Meyiwa, de 27 anos, tentou impedir os ladrões de fugir com os telemóveis das pessoas presentes
e foi alvejado com vários tiros; faleceu durante o transporte para o hospital.
Béji Caïd Essebssi
HERMAN VERWEY/POOL/LUSA
Fim de carreira para Oscar Pistorius
Vitória laica nas eleições na Tunísia
Sem esperar pelos resultados oficiais, o partido islamista Ennahda reconheceu
a derrota nas eleições legislativas de 26 de outubro na Tunísia, e felicitou Béji
Caïd Essebssi pela vitória da sua formação Nidaa Tounès.
Criado há pouco mais de dois anos e incluindo desde sindicalistas de esquerda até políticos que serviram os anteriores regimes, o Nidaa Tounès
apelou ao voto útil contra o regresso dos islamistas ao poder e a sua estratégia
resultou além das expectativas. Com 38% dos votos e 15 mandatos de vantagem sobre o Ennahda, que perdeu um terço dos mandatos que ocupava na
Assembleia Constituinte, Nida Tounés falhou contudo a maioria absoluta e
deverá negociar a formação de uma coligação para governar. A tarefa não
será fácil dada a bipolarização do novo Parlamento e a não existência de uma
terceira força.
Mais de cinco milhões de eleitores, dos quais cerca de um milhão de novos
eleitores, 15.000 candidatos (dos quais 52% de mulheres) para os 217 lugares
no Parlamento, 20 partidos em competição e uma participação próxima dos
60% confirmaram a vitalidade da democracia tunisina. Preocupados com a situação económica e social e com o recrudescimento da violência terrorista, os
tunisinos esperam do próximo Governo que relance a economia e restaure a
segurança.
Começou a campanha para as eleições presidenciais de 23 de novembro.
Dado que o Ennahda não apresentou candidato e que vários postulantes retiraram as suas candidaturas, o líder de Nidaa Tounès, Béji Caïd Essebssi, de
88 anos, é desde já considerado como o futuro Presidente.
África21– novembro 2014
13
“
2,8 mil milhões
O radicalismo islâmico não deveria ser
criminalizado mas tratado como o alcoolismo
ou a toxicodependência
Angolanos são quase 24 milhões e meio
A população angolana é de 24.383.301 pessoas, segundo os resultados preliminares do censo realizado este ano, de 16 a 31 de
maio. Como desde 1970 que não era realizado qualquer censo no
país, a estimativa andava em torno de 20 milhões de pessoas,
mas o número foi largamente ultrapassado. Desse modo, Angola
torna-se o 12.º país mais populoso de África. Mesmo assim, a
densidade populacional continua baixa: apenas 19 pessoas por
quilómetro quadrado.
De acordo com as informações avançadas, há mais mulheres
do que homens, sendo estes apenas 96 para 100 mulheres. Por
outro lado, 62,3% da população vive em áreas urbanas e 37,3%
nas áreas rurais. A província mais populosa é Luanda, concentrando 27% do total da população, enquanto a menos populosa é
o Bengo (vizinha de Luanda), com apenas 1%. Huíla, Benguela,
Huambo, Cuanza Sul, Bié e Uíge seguem-se a Luanda. Essas
sete províncias representam em conjunto 72% da população
angolana.
A cidade de Luanda é o município com mais habitantes:
2.107.646 pessoas. Mas se juntarmos a esse o número de habitantes dos municípios satélites (Viana, Belas, Cacuaco e Cazenga), a «grande Luanda» totaliza exatamente 6.443.213 pessoas,
ou seja, quase um quarto da população do país.
Estes números foram adiantados em primeira mão pelo Presidente José Eduardo dos Santos, na sua mensagem sobre o Estado da Nação, proferida na Assembleia Nacional a 15 de outubro.
Ele considerou que os resultados constituem uma base fundamental para a elaboração de políticas públicas mais adequadas.
De notar que o primeiro efeito deste resultados é a diminuição
do rendimento per capita dos angolanos. Assim, ao invés de
637.350,00 kwanzas por pessoa (cerca de 6400 dólares), esse
rendimento é, na realidade, de 529.765,00 kwanzas (aproximadamente 5300 dólares). Ou seja, e como escreveu em título o semanário económico Expansão, a 24 de outubro, «afinal estamos mais
pobres com o censo».
Segundo alguns observadores, outra conclusão confirma a
necessidade, defendida há muito tempo por várias vozes, de elaboração de uma política de imigração seletiva, para colmatar a
carência de recursos humanos, em quantidade e qualidade.
Por seu turno, o demógrafo João Lukombo criticou a ausência
de dados etnolinguísticos entre os resultados preliminares avançados, ao contrário, segundo ele, do censo-piloto, realizado em
2013. Além da composição étnica da população, este último informava, por exemplo, que a língua mais falada em Angola é o português, apontado por 40% das pessoas como a sua primeira língua. Os resultados completos do primeiro censo realizado após a
independência de Angola deverão ser divulgados até novembro
de 2015.
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novembro 2014 –
África21
KAMALDEEP BHUI, professor de psiquiatria
e epidemiologia da Universidade Queen Mary de Londres.
IAN LANGSDON/LUSA
eram os utilizadores da net no final de 2013; 801
milhões faziam-no em inglês, 649 em chinês, 222
em espanhol, 136 em árabe e 122 em português
Blaise Compaoré, fora!
«Demasiado é demasiado!» Foi com este grito que centenas de
milhares de manifestantes saíram as ruas para impedir o Presidente do Burkina Faso, Blaise Compaoré, de aprovar a revisão
da Constituição que lhe permitiria candidatar-se de novo em novembro de 2015 e permanecer no cargo por mais três mandatos
de cinco anos.
Depois de uma jornada insurrecional, as Forças Armadas
anunciaram a 30 de outubro que tomavam o poder até à realização das eleições de 2015. Depois de ter dito que permaneceria
na Presidência até a eleição do seu sucessor, Compaoré acabou por anunciar a sua renúncia ao cargo, no dia 31.
A situação era confusa à hora de fecho desta edição, com os
governos ocidentais e os vizinhos do Burkina Faso a fazerem
pressão a favor de uma transição sem alteração da ordem institucional. Os burquinabês dizem querer que a queda de Compaoré sirva de exemplo para o Benim, Burundi, Ruanda e RDC,
cujos Presidentes são acusados de quererem também manipular as respetivas Constituições para se manterem no poder.
Chegado ao poder em 1987 por um golpe de Estado que
custou a vida ao líder carismático da revolução burquinabê
Thomas Sankara, Blaise Compaoré tinha sido eleito pela primeira vez em 1992. Cumpridos os dois mandatos de sete anos autorizados pela Constituição, modificara a lei fundamental para se
fazer eleger de novo em 2005 e 2010. Preparava-se para repetir
a manobra, mas os burquinabês disseram «basta!».
“
85
Ébola é um espantalho que veicula
todos os fantasmas das nossas sociedades
dos mais ricos do mundo (entre os quais nove
mulheres) têm a mesma riqueza que os 3500
milhões mais pobres (50% da humanidade),
segundo a revista Forbes
JÉRÔME MOUTON, chefe da missão
de Médicos sem Fronteiras na Guiné-Conacri
Frágil vitória do partido presidencial nas legislativas ucranianas
O presidente ucraniano Petro Porochenko não obteve nas eleições legislativas ucranianas de 26 de outubro a «maioria clara»
que tinha pedido para levar a cabo o seu plano de paz com os insurretos do leste. A elevada abstenção (47%) mostrou que os
ucranianos têm uma confiança relativa nos seus atuais
dirigentes.
Segundo os resultados provisórios, a coligação liderada por
Porochenko foi a força política mais votada (23%), seguida de
perto pela Frente Popular do atual primeiro-ministro Arseni Iatseniuk (21%). Porochenko apressou-se a proclamar que «os partidários da solução militar são claramente minoritários». Mas se é
verdade que os extremistas de Svoboda (6%) perderam cerca de
metade dos votos obtidos nas eleições presidenciais, este recuo é
compensado pelos 6% alcançados pelo Partido Radical do sulfuroso Oleg Liatchko (acusado de crimes de guerra pela Amnistia
Internacional) e sobretudo pelos 13% de Samopovich, um partido
recém-criado e maioritariamente constituído por voluntários que
combateram na frente do Leste.
Os grandes derrotados são os comunistas, que ficarão fora do
Parlamento por terem recolhido menos de 5% dos votos, e Iulia
Timochenko, ex-rival de Porochenko nas eleições presidenciais,
cujo partido obteve pouco mais de 5%, ficando atrás do Bloco da
Oposição (ex-Partido das Regiões do presidente deposto Ianokovich) que obteve 8%.
Por outro lado, os apoiantes de Iatseniuk pretendem que este
conserve o cargo de primeiro-ministro, que Porochenko tinha
previsto atribuir ao cabeça de lista da sua coligação, Vitali Klitchko, o popular presidente da câmara de Kiev. Vinte e cinco lugares de deputados ficam por atribuir em representação das populações do Donbass, que não puderam votar, mas os separatistas
anunciaram que realizarão as suas próprias eleições em
novembro.
O A, B, C das hepatites...
O termo Hepatite significa inflamação do fígado e são
muitas as causas que podem provocar esta situação. Entre as mais frequentes encontram-se: os vírus (vírus da
hepatite A, B, C e D); o excesso de peso, a diabetes, o colesterol e os triglicéridos elevados no sangue responsáveis
por uma situação designada por esteatohepatite não alcoólica; o consumo crónico e excessivo de álcool e as doenças auto-imunes.
O vírus da hepatite C (VHC) provoca na maioria dos casos (cerca de 80%) uma infecção crónica que pode evoluir
silenciosamente para a cirrose hepática, podendo essa progressão fazer-se mais rapidamente quando existe também
consumo de álcool, obesidade, diabetes ou outras infecções
simultâneas como pelo vírus da hepatite B (VHB) ou vírus
da imunodeficiência humana (VIH). Um fígado com cirrose
provocada pelo VHC tem um grande risco de aparecimento
de cancro do fígado.
São fatores de risco para a infecção pelo VHC o consumo de drogas ilícitas por via endovenosa ou intranasal (cocaína) ainda que uma única vez; as transfusões de sangue
efectuadas antes de 1992 (quando se descobriu o anticorpo para o VHC que permite testar o sangue), os tratamentos/procedimentos parentéricos (injectáveis) realizados
no passado quando não se usava material descartável
(por exemplo, material usado em abortos clandestinos, antibióticos ou vacinas injectáveis com agulhas infectadas)
as tatuagens e piercings realizados em sítios sem respeito
pelas normas de segurança; relações sexuais desprotegidas, entre outros.
O VHB pode provocar também hepatite crónica, cirrose e cancro do fígado. Adquire-se por contacto sexual com
alguém infectado, através de partilha de seringas ou uso
de agulhas infectadas utilizadas em tatuagens, piercings,
acupunctura; transmite-se também da mãe para o bebé
durante o parto ou pouco depois e ainda por contactos
casuais (sempre que há contacto com sangue ou outros
fluidos corporais e por exemplo feridas).
A esteatohepatite não alcoólica é uma situação também muito prevalente entre nós associada à obesidade,
à diabetes e à dislipidémia. A maioria dos doentes são assintomáticos ainda que alguns se queixem de fadiga, mal-estar e desconforto abdominal nos quadrantes superiores direitos. Habitualmente os doentes são referenciados
à consulta de Hepatologia por apresentarem alterações
analíticas como elevação de um parâmetro designado por
ALT ou numa ecografia abdominal descrever-se esteatose
hepática ou seja gordura no fígado. Estes doentes também podem evoluir para cirrose hepática.
África21– novembro 2014
15
620 milhões
de africanos não têm acesso a eletricidade,
segundo a Agência Internacional da Energia
Os islamistas mais perto
do poder na Líbia
O Parlamento e o Governo de Abdallah al-Theni, reconhecidos internacionalmente
mas refugiados em Tobruk, no oeste do
país, desde a tomada de Trípoli em agosto
pelas milícias islamistas de Misrata, deram
o seu aval à operação «dignidade» lançada
pelo general Khalifa Haftar para reconquistar a cidade de Bengazi e anunciaram a
integração no exército nacional líbio de todas as forças anti-islamistas. Mas apesar
dos violentos combates em curso, a coligação Fajr Libya, que agrupa as principais
milícias antigovernamentais, continua a
avançar em todas as direções. A Fajr Libyia, que integra além das milícias de Misrata (próximas dos Irmãos Muçulmanos)
as de Ansar al Charia, o grupo terrorista
que controla Bengazi recentemente realiado ao Estado Islâmico, não reconhece a
legitimidade do governo de Al-Theni e criou
o seu próprio governo chefiado por Omar
al-Hassi. A Líbia parece encaminhar-se
para uma guerra convencional entre islamistas e anti-islamistas e os respetivos
aliados internacionais.
ONU, União Europeia e Estados Unidos pedem um cessar-fogo imediato em
Bengazi; União Africana e Liga Árabe
apelam ao diálogo, lembrando aos líbios e
aos seus vizinhos que não há solução
militar para a crise; mas Egito e Turquia
continuam a apoiar os respetivos aliados.
O Egito fornece armas ao governo «legítimo» e um enviado do Presidente turco
Recep Erdogan visitou as cidades controladas pela Fajr Libya e teve conversações
com Omar al-Hassi. Depois da visita, a
transportadora aérea turca Turkish Airlines anunciou o estabelecimento de uma
ligação diária entre Istambul e Misrata.
Todos os voos para a Líbia estavam suspensos desde a tomada do aeroporto de
Trípoli em agosto.
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novembro 2014 –
África21
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A geração internet é o alvo privilegiado
dos proselitistas do Estado Islâmico
ASIEM EL DIFRAOUI, politólogo alemão de origem egípcia
The New York Times defende
fim do embargo americano a Cuba
O restabelecimento de relações diplomáticas entre os EUA e Cuba e o fim do embargo americano contra a ilha mais populosa do Caribe foi defendido pelo influente diário
The New York Times, em editorial publicado a 11 de outubro. A primeira medida pode
ser tomada pelo Presidente norte-americano sem precisar do apoio do Congresso,
mas a segunda exige mudanças legislativas nesse sentido.
O The New York Times assinala que a geração de cubanos exilados que defendia
a manutenção do embargo está a desaparecer. Segundo uma pesquisa citada pelo
jornal, 52% dos cubanos de Miami pensam que é tempo de terminar o bloqueio. O fim
do embargo, acrescenta o The New York Times, permitiria aos EUA apoiar mais eficazmente reformas democráticas na ilha, além de diminuir o sofrimento da população
cubana, devido à grave crise económica e social que enfrenta, em especial depois da
queda do Muro de Berlim. Isso ajudaria também a conter uma nova onda migratória
de cubanos ilegais que tentam chegar aos Estados Unidos por mar.
O jornal recordou algumas medidas tomadas por Barack Obama em 2009 a fim de
flexibilizar o embargo, tais como a autorização para o envio de remessas financeiras
para Cuba e a diminuição dos obstáculos tecnológicos para permitir o acesso a telefonia
celular e a Internet em Cuba. Mas disse que os EUA podem fazer mais. Para o The New
York Times, o primeiro passo deve ser a retirada de Cuba da lista de países que
«apoiam o terrorismo». Cuba foi incluída nessa lista em 1982 por causa do seu apoio
aos movimentos rebeldes que lutavam contra as ditaduras latino-americanas, mas esses movimentos já não existem (alguns deles estão atualmente no poder).
O reatamento das relações diplomáticas bilaterais entre os EUA e Cuba foi vigorosamente defendido pelo jornal. O mesmo lembrou que, para o efeito, a administração não precisa do respaldo do Congresso. Note-se que, apesar do embargo, os dois
países possuem sedes diplomáticas nas duas capitais, as quais funcionam como
secções de interesse.
«Pela primeira vez em mais de meio século, mudanças na opinião pública norte-americana, bem como uma série de reformas em Cuba, tornam politicamente viável restabelecer as relações diplomáticas entre os dois países e acabar com um embargo insensato», escreveu o The New York Times, no seu editorial. O jornal vai mais longe. Para o
articulista, a reaproximação com Cuba pode representar um importante legado da presidência de Obama no domínio das relações diplomáticas, terreno no qual o primeiro Chefe
de Estado afro-americano enfrenta uma série de problemas e dificuldades.
“
Outorga-se a amnistia total a todos os cidadãos
condenados pelos tribunais da Guiné Equatorial por
delitos políticos no exercício das suas atividades
TEODORO OBIANG, Decreto de 21 de agosto
assinado pelo Presidente da Guiné Equatorial
Movimento internacional
a favor do povo sarauí
É um chamamento em defesa do povo do Sara Ocidental e da sua cultura, tão esquecidos pelo mundo mediático. Personalidades da cultura, das artes e letras de
diversos países, incluindo os de língua portuguesa, associaram-se à causa, «com a força e o sentimento de
contribuir para a realização de uma verdadeira paz para
os sarauís e os povos da região» no norte de África.
Numa carta de apelo, o grupo de promotores da iniciativa refere que quer apenas fazer ouvir a voz do povo
sarauí, entender as suas preocupações e fazer cumprir
o direito internacional. Basta recordar que a 14 de novembro de 1975 começou para os sarauís uma triste
história de guerra, exílio, êxodo e abuso dos direitos
humanos mais básicos, como a vida, a liberdade e a
autodeterminação.
Intelectuais, escritores, poetas, professores, jornalistas e artistas estão entre os que apoiam este movimento de solidariedade. Exortam a Espanha (ex-país
colonizador) e Marrocos (país ocupante) a assumirem o
seu compromisso, de modo a não sepultar da sua
agenda bilateral a questão sarauí. O chamamento
aberto a novas adesões conta, entre outros, com a assinatura dos escritores Eugénia Neto, viúva de Agostinho Neto, e Luís Kandjimbo (Angola), Corsino Fortes e
José Luís Hopffer (Cabo Verde), do historiador Julião
Soares de Sousa (Guiné-Bissau), dos professores universitários Pires Laranjeira e Salvato Trigo (Portugal),
de Armindo do Espírito Santo (São Tomé e Príncipe),
Edna Maria dos Santos (Brasil), e de Sheila Khan
(Moçambique).
África21– novembroPALOP
2014 Business
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52
jornalistas foram mortos no mundo nos nove
primeiros meses de 2014, dos quais 12 na
Síria, segundo os Jornalistas Sem Fronteiras
Boas e más notícias
para Goodluck Jonathan
O Presidente nigeriano anunciou oficialmente a
sua candidatura a um segundo mandato nas
eleições presidenciais de fevereiro e a presidência antecipou o anúncio com a divulgação de
boas notícias.
A primeira foi a conclusão de um acordo de
cessar-fogo com o grupo terrorista Boko Haram
que iria permitir a libertação das duzentas raparigas raptadas em abril em Chibock. Infelizmente,
duas semanas mais tarde, as raparigas não foram devolvidas às respetivas famílias e novos
ataques atribuídos aos rebeldes islâmicos mostram que o cessar-fogo é ainda uma miragem.
Segundo fontes locais, depois do anúncio do
cessar-fogo os terroristas perpetraram novos
atentados e continuam a raptar dezenas de mulheres no estado de Borno. O Chade e os Estados Unidos confirmaram, no entanto, a existência de negociações.
A segunda boa noticia, confirmada pela Organização Mundial de Saúde é o fim do surto de
ébola que foi declarado extinto no país mais populoso de África. Importado por um diplomata
com dupla nacionalidade americana e nigeriana,
que chegou a Lagos a 20 de julho procedente de
Monróvia, o vírus contaminou 20 pessoas das
quais oito faleceram. Um grupo de 150 «rastreadores de contactos» levou a cabo «um trabalho
de detetive epidemiológico de categoria mundial», segundo a OMS, e conseguiu localizar 898
pessoas suscetíveis de terem contraído a doença. Estas foram acompanhadas diariamente durante 42 dias, o dobro do tempo máximo de incubação. Passado este período sem o
aparecimento de novos casos as autoridades
sanitárias declararam a Nigéria «livre de ébola»,
embora se mantenha o estado de alerta.
18
novembro 2014 –
África21
Gente
CARLOS LOPES O guineense Carlos Lopes, secretário
executivo da Comissão Económica das Nações Unidas
(UNECA) para África, recebeu, a 10 de outubro, o Lifetime Africa Achievement Prize, na categoria Ação para
África, atribuído pela Millennium Excellence Foundation.
Este prémio reconhece personalidades com ideais politicamente visionários, que tenham contribuído para a transformação de África na transição de ditaduras para um sistema
de governação democrática, promotor de ganhos impulsionadores do crescimento
e desenvolvimento do continente. A UNECA considera que desde que Carlos Lopes
assumiu funções «trouxe para a comissão uma visão cuja premissa é ‘Africa First’,
no sentido de cinzelar o modelo de desenvolvimento de África». Um dos seus objetivos é «trazer para o sistema global a visão do desenvolvimento de África» e a «a
voz do continente nas negociações internacionais de impacto sobre o seu futuro,
das alterações climáticas à posição comum africana pós-2015».
MALALA YOUSUFZAI O mundo conheceu-a pela defesa
do direito à educação das raparigas no Paquistão. O ativismo e o ganho da popularidade da jovem de 14 anos, na
época, que começou por relatar num blogue anónimo a
sua vida no nordeste do país, tornou-a alvo de um ataque
dos talibãs. Ficou entre a vida e a morte obrigando-a a
meses de recuperação num hospital do Reino Unido. Aos 17
anos, Malala torna-se na pessoa mais jovem de sempre a receber o Prémio Nobel da Paz. «Este prémio é mais que um
pedaço de metal. É um encorajamento para continuar,
para acreditar em mim, e saber que há mais pessoas que
me apoiam nesta campanha». A jovem ativista dedicou o
prémio a «todas as crianças sem voz, de forma a dar-lhes
coragem». KAILASH SATYARTHI O indiano (60 anos)
partilhou o Nobel da Paz deste ano com Malala, devido ao
seu empenho na educação das crianças do seu país, livrando-as do trabalho infantil, através da BBA, fundação criada por si. «Estou esperançado
e acredito que o prémio ajude a dar mais visibilidade e atenção à causa das crianças
mais negligenciadas e mais necessitadas». Kailash diz ser necessário que o mundo
perceba que a escravatura infantil ainda existe, «um mal que é um crime contra a
humanidade», e que todos temos a «responsabilidade de salvar e proteger as crianças do planeta». Com as suas iniciativas, estima-se que já tenha salvo 80.000
crianças das agruras do trabalho infantil.
DENIS MUKUNGERE MUKWEGE É no hospital de Panzi,
em Bukavu, na República Democrática do Congo (RDC)
que trabalha o mais recente galardoado com o Prémio
Sakharov, com que o Parlamento Europeu distingue
pessoas e organizações que lutam pela «liberdade de
espírito» e pelos direitos humanos. O ginecologista (59
anos) operou, desde 1999, mais de 45 mil mulheres vítimas
de violação, num país onde a violação é usada como arma.
Nas suas intervenções internacionais, Denis Mukwege prefere não falar em números, mas relatar a sua experiência: «Vi vaginas onde espetaram pedaços de madeira, de vidro, de aço. Vaginas laceradas por lâminas de barbear, por facas, por
baionetas. Vaginas queimadas com borracha em brasa, com soda cáustica. Vaginas em que deitaram gasolina e depois pegaram fogo».
Super Ordenado BAI
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de kwanzas e 60 meses para pagar. Super Ordenado BAI. O dinheiro que precisa, agora.
Angola • Cabo Verde • Portugal • África do Sul
África21– novembro 2014
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cabo verde e a governação
APESAR DA FRAGILIDADE ECONÓMICA E dos NOVOS DESAFIOS
Cabo Verde chega aos 40
em fase ascendente
Os dados recentemente divulgados do Relatório
Mundial da Competitividade, elaborado anualmente pelo Fórum Económico Mundial, e do
Ibrahim Index of African Governance (IIAG),
da Fundação Mo Ibrahim, revelam Cabo Verde
em rota ascendente em vários aspetos ligados à
governação e ao desenvolvimento.
Refira-se, a propósito, que em agosto, no
encerramento da cimeira EUA-África, que
reuniu Chefes de Estado e de Governo de 50
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novembro 2014 –
África21
países, o Presidente norte-americano Barack
Obama considerou Cabo Verde como um
exemplo de democracia, liberdade e estabilidade para os países da África Ocidental, da
África como um todo e, ainda, do mundo.
Nessa maré positiva, até no desporto o
país soma pontos: em outubro a seleção nacional de futebol passou para o 33.º lugar no
ranking da FIFA, subindo oito posições, e
ocupa o 4.º lugar no contexto africano, atrás
ARQUIVO ÁFRICA21
da Argélia, Costa do Marfim e Tunísia, sendo o primeiro entre os PALOP.
Ao mesmo tempo, a vida nesta sociedade
insular traz toda a complexidade da época contemporânea: questões sociais como o desemprego e as migrações, novos desafios da segurança
interna e externa, a preservação do ambiente e
as habituais disputas políticas, sobre um pano de
fundo económico com muitas fragilidades ainda
não resolvidas. As dificuldades do financiamen-
to das empresas, questões laborais e burocracia
pesam negativamente nesta economia, para além
da reduzida dimensão do seu mercado.
Numa balança que meça a sua performance ao completar a quarta década de existência
como Estado independente, Cabo Verde equilibra-se entre ser país de desenvolvimento médio
e uma série de desafios e urgências por resolver.
Gláucia Nogueira, Corsino Tolentino,
Natacha Mosso e Miguel Correia
África21– novembro 2014
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cabo verde e a governação
Ambição de José Maria Neves
Governo de Cabo Verde pode ser
O primeiro-ministro cabo-verdiano afirmou,
ao conhecer o ranking de 2014 da Fundação
Mo Ibrahim sobre a governação em África,
que a sua «grande ambição» é fazer com que
Cabo Verde seja o país mais bem governado
do continente.
ARQUIVO ÁFRICA21
‘o melhor de África’
Gláucia Nogueira
C
abo Verde, que no ano passado aparecia no Ibrahim Index
of African Governance (IIAG)
em terceiro lugar, depois das ilhas Maurício e do Botswana, ultrapassou este
último, ocupando agora o segundo lugar, que aliás, já fora seu em 2012. De
resto, o país está no grupo dos que sistematicamente são os cinco primeiros –
que inclui ainda as Seychelles e a África
do Sul. Esses países são os que apresentam as melhores performances em cada
22
novembro 2014 –
África21
uma das quatro categorias analisadas
para constituir o ranking: desenvolvimento económico; desenvolvimento
humano; segurança e estado de direito;
participação e direitos humanos.
José Maria Neves disse pretender atingir o seu objetivo ainda nesta legislatura,
que, aliás, encaminha-se já para o fim. Em
declarações a África21, salientou: «Cabo
Verde está muito próximo dos indicadores
das Ilhas Maurício, o que permite a Cabo
Verde aspirar a ser o primeiro.»
O primeiro-ministro manifestara essa
ambição nas declarações que fez durante
a apresentação de um outro ranking em
que Cabo Verde aparece a melhorar a sua
posição: o Relatório Mundial da Competitividade, divulgado pelo Fórum Económico Mundial. Neste índice, que avalia
144 países, o país melhorou oito posições, passando do 122.º lugar no ranking
2013-14 para 114.º na lista de 2014-15
(as ilhas Maurício passaram do 45.º para
o 39.º lugar).
Num máximo de sete pontos, o país
tem 3,68 no Índice de Competitividade
Global 2014-2015, que é liderado pela
Suíça com 5,7 pontos, seguida de Singapura, EUA, Finlândia e Alemanha, nos
cinco primeiros lugares. No fim da lista,
está a Guiné Conacri, enquanto Angola
ocupa a 140.ª posição.
São 12 os pilares analisados, e em
praticamente todos Cabo Verde melhorou a sua posição, com exceção do que
diz respeito à dimensão do mercado. Os
12 pilares dividem-se por três grandes
áreas, a primeira relativa a «requisitos
básicos» (instituições; infraestruturas;
ambiente macroeconómico; saúde e
educação fundamental); a segunda refere-se a «potenciadores de eficiência»
(educação superior e formação; mercado
de bens; mercado laboral; desenvolvimento do mercado financeiro; desenvolvimento tecnológico; dimensão do
mercado); e «fatores de inovação e sofisticação» (sofisticação dos negócios e
inovação).
Cabo Verde ocupa o 91.º lugar no
pilar de requisitos básicos; a 106.ª posição quanto ao ambiente macroeconómico; e, na área da saúde e educação fundamental, a 57.ª posição. Entre os
aspetos mais problemáticos para o desenvolvimento de negócios em Cabo
Verde estão a burocracia, o acesso ao financiamento e a eficiência do mercado
de trabalho.
País seguro
No índice da Fundação Mo Ibrahim, o
arquipélago teve muito boa avaliação
nos quesitos de segurança e funcionamento da lei e da justiça, áreas em que,
internamente, a perceção não é assim
tão positiva. Por exemplo, a criminalidade tem aumentado nos últimos anos
– desde meados de outubro, as Forças
Armadas estão na rua a apoiar a polícia
para garantir a segurança da capital do
país –, ao mesmo tempo que a morosidade da justiça é um aspecto sob constantes críticas.
José Maria Neves afirma que Cabo
Verde continua a ser um país seguro, re-
Apesar dos investimentos
em infraestruturas,
persistem problemas
no que diz respeito
à água, à energia
e ao saneamento
lacionando a segurança e a estabilidade
ao funcionamento das instituições, o respeito pelas regras do jogo democrático, a
independência dos tribunais, a liberdade
de imprensa. Ou seja, «o funcionamento
normal do Estado de Direito Democrático. E em Cabo Verde tudo isso funciona», afirma, admitindo, contudo, quanto
à morosidade da justiça: «Temos um
longo caminho a percorrer».
O governante relativiza a questão da
criminalidade, referindo que apesar da
percepção que se tem, os dados apontam
para uma redução, considerando-se um
certo horizonte temporal, embora, «se
tomados os picos de criminalidade, tenha-se a impressão de que é elevada».
«As instituições policiais funcionam e há
políticas públicas de combate seja à pequena como à grande criminalidade»,
sustenta. «Os indicadores não nos autorizam a falar em índices elevados de insegurança em Cabo Verde», afirma
Neves.
Por outro lado, uma das áreas em
que tem havido grandes investimentos
recebeu nota menos boa na avaliação.
É o caso das infraestruturas, há cerca de
uma década a receber forte apoio dos
EUA através do programa Millenium
Challenger Account (MCA), além de
outros parceiros.
«Já investimos muito e Cabo Verde
já avançou muito na área das infraestruturas», refere o chefe do Executivo,
apontando que, de facto, persistem
problemas no acesso à água, à energia e
ao saneamento (ultimamente, cortes de
luz e água são frequentes e atormentam
a população de várias cidades). «Temos
que melhorar o nosso desempenho nesses domínios», diz José Maria Neves,
Posições dos PALOP
no índice Mo Ibrahim
No ranking de 2013 da Fundação Mo
Ibrahim, Cabo Verde aparecia em terceiro lugar (76,7 pontos), tendo à frente
as ilhas Maurício, com 82,9, e o Botswana, com 77,6. Entre os PALOP, São
Tomé e Príncipe vinha a seguir, com
59,9, na 12.ª posição. Moçambique
ocupava a 20.ª posição e Angola a 39.ª,
enquanto a Guiné-Bissau estava no
46.ª lugar, portanto entre os dez com
pior pontuação. Este ano, ao mesmo
tempo em que Cabo Verde sobe para o
segundo lugar na tabela, Moçambique,
devido à insegurança resultante dos
conflitos entre a Renamo e a Frelimo,
passou para o 22.º (52,2). Angola piorou também a sua pontuação, estando
agora no 44.º lugar (40,9), assim como
a Guiné-Bissau (48.º posição, com 33,2
pontos). São Tomé e Príncipe mantém-se, com 59,7 na 12.ª posição.
salientando que, ao elaborar o segundo
pacote de apoio do MCA, em vigor até
2017, Cabo Verde teve como prioridade
o setor da água e saneamento.
Nessa linha, esclarece, está a procurar-se melhorar o acesso à propriedade,
no sentido de resolver determinadas
questões fundiárias que por vezes
opõem municípios, o poder central e
também privados. «Eliminar determinados entraves nessa área facilitará a modernização de infraestruturas e realiza-
No índice Mo Ibrahim,
Cabo Verde teve boa
avaliação em segurança,
funcionamento
da lei e da justiça,
áreas em que
a perceção interna
não é assim tão positiva
África21– novembro 2014
23
ARQUIVO ÁFRICA21
cabo verde e a governação
Muita água, pouca terra
Aferir e influenciar
A cada ano, desde 1979, o Fórum Económico Mundial analisa
dados de várias organizações internacionais, como o Banco
Mundial ou o Fundo Monetário
Internacional, e organiza uma
sondagem com mais de 1400
empresários em todo o mundo,
para apontar as virtudes e fraquezas dos países nos quais
operam. Por sua vez, a Fundação Mo Ibrahim, homónima do
milionário sudanês que a criou
em 2006, apoia a boa governação e a liderança em África.
Desde 2007, elabora anualmente
o Índice Ibrahim, que visa contribuir para que se possa medir o
progresso. Em 2011, o ex-Presidente Pedro Pires foi galardoado
por essa organização pelo seu
papel no percurso político de
Cabo Verde.
24
novembro 2014 –
África21
ção de investimentos», afirma. Refira-se
que foi criado há alguns anos um sistema de informação geográfica com o objetivo de modernizar toda a gestão dos
solos em Cabo Verde, o que segundo o
primeiro-ministro irá favorecer os investimentos e permitir que o país tenha
ganhos em termos de competitividade.
Ampliar o mercado
Entre os itens que definem a posição dos
países nos rankings de desenvolvimento,
a dimensão do mercado é um dado que
joga contra Cabo Verde. País pequeno e
com as contingências da insularidade,
um alargamento dessa dimensão passa
pela internacionalização das empresas
O mercado só pode
aumentar pela
internacionalização das
empresas cabo-verdianas
e pelo aumento
das exportações
cabo-verdianas e pelo aumento das
exportações.
«Aqui, temos um longo trabalho, para
reforçar o setor privado nacional, aumentar
os níveis de produtividade, para poderem
competir no mercado internacional. O setor privado cabo-verdiano é frágil, com
uma reduzida capacidade de autofinanciamento e com níveis de gestão que precisam
de ser qualificados. É um dos principais
desafios que temos nos próximos tempos»,
disse, acrescentando que a inserção competitiva de Cabo Verde na economia global
passa por um esforço comum das autarquias, do Governo e das empresas.
A questão do acesso ao financiamento é «um dos maiores problemas», pois as
empresas não têm capitais próprios e o
custo do financiamento é muito elevado.
Por outro lado, diz, só há condições para
o financiamento de pequenas e microempresas. Assim, defende o primeiro-ministro, as empresas privadas devem abrir-se à
constituição de parcerias e alianças com
outras empresas, a nível internacional,
para poderem mobilizar recursos financeiros, know-how e tecnologias.
Jorge Carlos Fonseca avalia a justiça
O
ARQUIVO ÁFRICA21
Presidente da República de
Cabo Verde, Jorge Carlos Fonseca, não comentou para a comunicação social cabo-verdiana, nem
para África21, os resultados obtidos
pelo país nos dois rankings em que este
aparece a melhorar posições e que levaram o chefe do Governo a exprimir a sua
ambição de Cabo Verde ser o mais bem
governado em África.
Porém, ao presidir à abertura do ano judicial, a 17 de outubro, no Tribunal da
Praia, Jorge Carlos Fonseca tocou num
ponto que é uma das fragilidades apontadas
na avaliação que se faz de Cabo Verde: a
questão da justiça. «Apesar de todos os esforços, investimentos e medidas, Cabo Verde
não tem logrado obter melhorias significativas no que tange ao estado da justiça», declarou, citado pelo jornal A Semana.
Contudo, na visão do Presidente, ele
próprio jurista e professor universitário
nesta área, o percurso no seu conjunto é
positivo, dado que aumentou o número
de tribunais, procuradorias, magistrados, advogados e oficiais de justiça, entre outros aspetos.
Outra nota negativa do discurso do
Presidente, na abertura do ano judicial,
surge quando refere ter «a consciência clara
de que a sociedade cabo-verdiana não está
satisfeita com o desempenho do sistema de
administração, que ela espera muito mais»,
como cita o jornal: «Os cidadãos, ao criticarem a Justiça, também estão amiúde a manifestar o seu descontentamento para com a
Administração Pública».
Refira-se que a morosidade é um
grande entrave ao funcionamento da
justiça em Cabo Verde. Um relatório
recente do Conselho Superior do Ministério Público mostra o aumento do número de pendências de cerca de 87 mil
para mais de 95 mil processos-crime;
mais de 12 mil processos por decidir nos
Tribunais de Comarca; e 735 processos
pendentes no Supremo Tribunal de
Justiça.
Gláucia Nogueira
Coabitação
Vive-se atualmente em Cabo Verde, pela primeira vez, a situação de coabitação nas mais altas
instâncias do Estado e Governo, de forças políticas diferentes. O atual Presidente da República,
eleito em 2011, é conotado com o Movimento
para a Democracia (MPD) – em cuja gestão foi
ministro dos Negócios Estrangeiros, na década
de 90 – enquanto o Governo está, pela terceira
vez consecutiva, nas mãos do Partido Africano
para a Independência de Cabo Verde (PAICV).
Embora o Chefe de Estado não governe, é
facto que por vezes determinadas questões trazem à tona o antagonismo entre as duas forças
políticas; noutros momentos, reconhecer os louros
à outra parte pode encontrar resistências.
Para José Maria Neves, este facto não é
perturbador, e o primeiro-ministro até considera
que este elemento joga a favor de Cabo Verde,
«por mostrar a maturidade das instituições e o
funcionamento do Estado de direito democrático». Refere que eventuais vetos ou pedidos de
fiscalização da constitucionalidade são normais,
e também aconteceram durante os mandatos
dos Presidentes Pedro Pires e Mascarenhas
Monteiro, sem que houvesse a situação de
coabitação. GN
África21– novembro 2014
25
cabo verde e a governação
De 2014
vê-se Cabo Verde
numa encruzilhada
O título é para receber com carinho o romance
De Monte Cara Vê-se o Mundo, que o Germano
Almeida escreveu na sua casa do Mindelo, ilha de
São Vicente, de onde contempla aquele promontório
de rosto humano e o mundo. Mas, o que quero dizer
mesmo, é que o desenvolvimento de Cabo Verde
chegou ao cruzamento de várias opções, todas elas
complexas e com caráter de urgência. Os resultados
nos setores da economia, diplomacia, educação,
saúde, cultura, desporto, migrações e governação são
notáveis, mas sabemos que as necessidades crescem
mais depressa do que os meios de as satisfazer.
Corsino Tolentino
E
conomia: Os desafios vencidos e
as ameaças presentes. Com cerca
de 500 mil residentes e outros
tantos emigrantes, Cabo Verde, que não é
cabo nem é verde, bem podia ser um país
mágico se não recebesse grandes doses de
realismo da distância de todos os continentes, da dispersão do território, dos somente 10% de terra arável, da escassez de
outros recursos naturais e também das
duras condições climáticas. Nascido e
criado em terra adversa, o cabo-verdiano
que sobreviveu fê-lo na integração de escravos e senhores, brancos e negros, cristãos e judeus, animistas e muçulmanos,
ateus e crentes, optou pela independência
na paz, consolidou instituições, criou um
Estado de direito democrático para ser
cumprido nas ilhas ou no estrangeiro,
porque, com conhecimento de causa, recusou o destino da indignidade.
26
novembro 2014 –
África21
Com pouca terra e muito Atlântico, os
governantes investiram numa relação de
honestidade com os recursos materiais e
imateriais da nação. Desde 1975, mobilizaram tudo e, como tudo não era muito,
recorreram à solidariedade internacional
em forma de ajuda pública e do investimento privado, mais daquela do que deste. Em 2007, Cabo Verde iniciou a difícil
transição do grupo dos Países Menos
Avançados para o de Rendimento Médio. Os indicadores determinantes desta
mudança foram o rendimento por pessoa, o nível de instrução e a saúde. Outro indicador que deveria ter contado,
mas não contou, é a vulnerabilidade económica. Seja como for e apesar da economia vulnerável, o país tenta ser de rendimento médio e está na linha do
cumprimento da maior parte dos Objetivos de Desenvolvimento do Milénio.
Entretanto, nos últimos cinco anos a
economia europeia engripou, o número
de turistas diminuiu, os emigrantes enviaram menos remessas, deixou de haver dinheiro para investir na construção de hotéis e segundas residências do setor
imobiliário-turístico, e a economia de
Cabo Verde estagnou, com uma taxa média de crescimento anual a rondar os 2,5%
entre 2007 e 2012, e mesmo um período
de recessão (-1,3%) em 2009. O desem-
O país tenta ser de
rendimento médio e está
na linha do cumprimento
dos Objetivos de
Desenvolvimento do Milénio
Philippe Turpin/afp
Cabo Verde iniciou transição do grupo dos Países Menos Avançados para o de Rendimento Médio
prego principalmente de jovens e de mulheres disparou. Contra a reiterada promessa de um dígito, anda à volta de
16,5%, com até 35% na faixa etária de
15-24 anos. Para evitar o pior, o governo
investiu recursos públicos alheios na construção de estradas, barragens, aeroportos,
portos e um programa para reduzir o défice de habitação a que chamou Casa para
Todos. Não tendo recursos próprios e
sendo a conjuntura internacional desfavorável, o único caminho que restou foi o
endividamento interno e externo. Em
2014, apesar de os principais índices mostrarem tendência ascendente, Cabo Verde
ainda é um país subdesenvolvido, do défice e da dívida. A produtividade da atividade privada, o uso eficiente das infraestruturas recém-construídas, a venda das
Casas para Todos, o fornecimento regular
da energia e a privatização das empresas do
transporte aéreo, dos portos e da produção
de eletricidade e água são tarefas complexas e urgentes.
Neste contexto e dado o papel central
que a banca terá de desempenhar no financiamento das famílias e na mudança de paradigma de gestão dos recursos e das expectativas, a escolha displicente do governador
do Banco Central é interpretada como sinal
de inconsistência da governação. Por outro
lado, o abandono de postos-chave por dirigentes tem afetado a confiança no futuro.
Diplomacia: uma rica tradição à espera
de mais profissionalismo. Bastará ver
quem são os principais doadores bilaterais
e os parceiros multilaterais para se ter uma
ideia da natureza e dos princípios subjacentes à estratégia da política externa e das
suas exigências em relação ao aparelho diplomático. Os doadores bilaterais ainda
Nas relações externas,
ação eficiente
e especialização
profissional são ambições
necessárias ao alargamento
da rede de parceiros
e doadores
são significativos e a lista tem de ser aumentada: China, Luxemburgo, Portugal,
Espanha e Estados Unidos são os principais. Os parceiros multilaterais de maior
peso são a União Europeia, o Banco Africano de Desenvolvimento, as Nações
Unidas, o Banco Mundial e o Fundo
Monetário Internacional.
No entanto, é assinalável o facto de haver protagonistas menores, cujo contributo
é bem-vindo e depende, entre outros fatores, da capacidade criativa e da coerência
operacional do corpo diplomático. Estou a
falar de Japão, Kuwait, Arábia Saudita,
Angola e Brasil. Nas relações externas, a
ação eficiente e a especialização profissional
são ambições necessárias ao alargamento da
rede de parceiros e doadores.
Contudo, a maior dificuldade existente
neste fim de 2014 é a ausência de uma estratégia com objetivos, valores, princípios e
meios partilhados entre o Estado, o governo e os diplomatas. Contudo, parece razoável esperar do novo ministro dos Negócios
Estrangeiros os ajustamentos imprescindíveis e o aumento da produtividade da casa.
Educação, Saúde, Cultura, Desporto:
marcas de prosperidade e exigência. A história da educação em Cabo Verde começou
com a igreja Católica a instruir escravos e a
promover a escola primária e secundária.
Depois de tentativas falhadas na Brava e em
Santiago, foi ela que criou o primeiro seminário-liceu do país, na ilha de São Nicolau,
que durou 125 anos (1892-1917) e formou
a primeira elite cabo-verdiana. Em 1917,
sucedeu-lhe o liceu nacional na ilha de São
Vicente e só em 1960 foi construído mais
um, dessa vez na Praia, ilha de Santiago.
Em 1975, Cabo Verde independente
herdou pelo menos uma escola primária e
um número variável de postos escolares em
África21– novembro 2014
27
Arquivo áfrica21
cabo verde e a governação
O desemprego de jovens e mulheres continua a aumentar em Cabo Verde
cada município. Em todo o país havia dois
liceus, um em Mindelo, ilha de São Vicente, e outro na Praia, ilha de Santiago, e a
Escola Técnica do Mindelo. Desde então,
os governos consideraram a educação escolar, tecnológica e científica como uma
prioridade na execução da estratégia de valorização dos recursos humanos e das pessoas para o desenvolvimento nacional e
sustentável. Depois da independência nacional, durante 25 anos, a alfabetização de
adultos, a expansão da educação básica elementar e a melhoria da oferta do ensino
secundário foram as escolhas para as ilhas.
Nesse quarto de século optou-se pela formação superior no estrangeiro.
Foi só no início do século XXI que
emergiram as figuras do ensino superior e
da universidade. Da educação pré-escolar à
pós-universitária, três objetivos problemáticos estão em jogo: a qualidade do sistema
Foi só no início do século
XXI que emergiram as
figuras do ensino superior
e da universidade
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outubro 2014 –
África21
de ensino-aprendizagem, a equidade no
acesso face à dispersão da população e, por
fim, o custo da educação.
Por outro lado, resistindo a enormes
pressões internas e externas, o Serviço Nacional de Saúde contribui visivelmente para
a melhoria do bem-estar da população e os
resultados extraordinários em matéria de
formação e valorização do capital humano.
Novidades na cultura. Até diz-se que
ela atingiu a maioridade, deixando de ser
vista como uma despesa de todos para o
prazer de alguns para ser percecionada nas
suas dimensões de produção e usufruto da
riqueza nacional. A literatura perdeu o exclusivismo da representação da cultura cabo-verdiana e expande o universo dos escritores e poetas.
A tecelagem e a cerâmica puseram o artesanato no primeiro plano da produção artística enquanto a pintura, a escultura e o cinema conquistam espaço justo e,
naturalmente, a língua ganha protagonismo.
Não será por acaso que a emancipação cultural coloca a questão da criação e comunicação de sentidos.
O diálogo sobre os usos e o estatuto do
crioulo – língua nacional – e do português
– língua oficial – tem hoje melhores condições de progredir nos planos técnico e político do que há uma década. O teatro, a
dança e a música ajudam a ver o Cabo
Verde que vem aí e selecionar algumas perguntas filosóficas sobre a educação, o civismo e o financiamento da criação artística.
Mindelact, para o teatro, e Raiz di Polon,
para a dança, são casos de estudo em universidades. Sobre a música, a parte mais visível da cultura cabo-verdiana, assinalo o
papel que tem como cimento da nação.
Desporto: três belos exemplos. Somos
poucos e as probabilidades de vencer são
influenciáveis pela demografia. Isto quer
dizer que quanto menos somos mais se
exige de nós em termos de seleção de talentos, organização, criatividade e esforço.
Vem isto a propósito da importância do
comportamento no sucesso das estratégias
pessoais ou coletivas.
Os treinadores Lúcio Antunes, primeiro, e Rui Águas, a seguir, ousaram e conseguiram convencer os melhores futebolistas
A literatura perdeu
o exclusivismo
da representação
da cultura cabo-verdiana
e expande o universo
dos escritores e poetas
cabo-verdianos a formarem os Tubarões
Azuis, a seleção de todos nós para os embates internacionais. A segunda lição diz respeito ao aproveitamento, sem ressentimento, da experiência da Federação. E o terceiro
elemento desse jeito de suar para ir mais
longe consiste em construir uma visão comum e ter a companhia de todos os desportistas nacionais.
Migrações e Boa Governação: progressos e falhas. Cabo Verde formou-se no bojo
das migrações dos continentes europeu e
africano, assumiu a natureza de nação migrante e, na última década, evoluiu de país
de emigrantes para a condição de terra de
emigrantes e de imigrantes. O facto de as
instituições nacionais lidarem bem com
esta situação é um sinal de progresso.
Segundo os índices regionais e internacionais, a boa governação vai bem. Contudo, o que parece uma falha grave é o apa-
rente pouco interesse do Governo em
relação às tentativas do Instituto Nacional
de Estatísticas e da Comissão de Estatística
das Nações Unidas e do PNUD (Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento) para criar um sistema fiável de recolha e
tratamento de informação sobre a boa governação. Se este processo for recuperado e
o trabalho de casa for feito, 2015 poderá ver
nascer em Cabo Verde um centro mundial
de estatísticas sobre GPS (Governação, Paz
e Segurança).
Descodificar os conceitos de boa governação, paz e segurança significará agir
mais consciente, solidária e eficazmente
para vencer os grandes desafios locais e
globais do desenvolvimento. É que a criminalidade e a insegurança estão a pôr em
causa a principal riqueza do país: a liberdade e a justiça.
alterações profundas no modo de pensar a
economia e de resolver tensões emergentes.
José Maria Neves já anunciou que deixará o cargo de presidente do PAICV (Partido Africano da Independência de Cabo
Verde) no fim de 2014, devendo manter-se
como primeiro-ministro até 2016, o ano
das eleições. Por outro lado, a qualidade do
diálogo entre o MpD (Movimento para a
Democracia), principal partido da oposição, e o PAICV, no poder, mostra pouca
confiança existente entre ambos.
E no entanto, o país espera muito mais
do que a mera alternância no poder. Para
sair da encruzilhada, Cabo Verde precisaria
de duas coisas: diálogo genuíno e pacto de
regime abrangendo, por exemplo, a resposta à emergência económica, educação, diplomacia e GPS.
Sem driblar a verdade, os cabo-verdianos e os seus partidos políticos são chamados para provarem o que realmente valem
através das melhores respostas possíveis a
estas perguntas: Como aumentar a produtividade individual e a produção nacional?
Como conciliar mais segurança pública e
mais liberdade? Como atrair conhecimento, habilidade e atitude inovadora de residentes e emigrantes para um projeto de
crescimento e bem-estar? Mas, haverá capacidade de liderança para tanto?
Conclusão: ao longo dos 39 anos que nos
separam de 1975, o ano da independência
nacional, Cabo Verde manteve a paz, construiu o Estado de direito, lançou a economia, melhorou as condições de vida dos cidadãos, instituiu o multipartidarismo, fez
eleições regulares e criou um regime político estável. A evolução interna e a conjuntura internacional desfavorável revelam dificuldades estruturais e novas, que exigem
REPÚBLICA DE CABO VERDE
Santo Antão
São Vicente
Santa Luzia
Sal
São Nicolau
Boa Vista
Santiago
Brava
Fogo
Maio
Praia
Dakar
África21– novembro 2014
África
Território: dez ilhas, 4033 km2;
Santo Antão, Sal, São Vicente,
Santa Luzia (desabitada), São Nicolau,
Boa Vista, Santiago, Maio, Fogo, Brava
Capital: Praia, ilha de Santiago
Línguas oficiais: português e crioulo
População: 499.000 habitantes
e outros tantos emigrantes
Densidade populacional: 81 habitantes por km2
Presidente da República: Jorge Carlos Fonseca
Governo: primeiro-ministro, José Maria Neves
PIB: 1,9 mil milhões de dólares
PIB per capita: 3630 dólares
Moeda: escudo cabo-verdiano, indexado ao euro
Independência: 5 de julho de 1975
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Arquivo áfrica21
cabo verde e a governação
Classe empresarial
à procura da afirmação
Cidade de Mindelo, Ilha de São Vicente
Apesar da sua evolução, o setor empresarial cabo-verdiano,
dominado maioritariamente por pequenas e médias empresas,
enfrenta, ainda, algumas fragilidades. O cenário exige mudanças
legais, institucionais e até comportamentais
Natacha Mosso
A
baixa densidade do tecido
empresarial formal cabo-verdiano, aliada a um elevado índice de informalidade, a dimensão das
empresas, a qualidade da gestão e as
perspetivas de atuação, sobretudo locais
ou, em alguns casos, regionais, assim
como a concorrência desleal são apontadas como as principais debilidades do
setor no arquipélago.
«São problemas sérios que têm afetado e, de que maneira, o funcionamento
das micro e pequenas empresas. A solução passa por reformas estruturais, a co-
30
novembro 2014 –
África21
meçar pela gestão do risco do país», advoga o presidente da Associação dos
Jovens Empresários de Cabo Verde
(AJEC).
Embora reconheça alguns avanços,
Paulino Dias assevera, porém, que essas
fraquezas, a par de outras, têm tido impacto na produtividade, na competitividade, na mobilização de recursos financeiros, humanos e organizacionais e no
ritmo de crescimento das empresas cabo-verdianas, e, consequentemente, na
criação de empregos pelo setor privado.
Para o presidente da AJEC o caso das
Pequenas e Médias Empresas (PME),
que em Cabo Verde representam 93%
das empresas formais, é mais preocupante uma vez que elas enfrentam grandes dificuldades.
«A primeira é, disparadamente, o
acesso a financiamento. Os instrumentos de políticas públicas surgidas para
minimizar o problema não se têm revelado eficazes, e a banca tradicional tem
dificuldades em entender as especificidades deste segmento e de formular soluções para atender as PME. Praticamente não existem soluções alternativas
para financiamento de PME, como por
exemplo, fundos de seed-capital, fundos
de capital de risco, etc.», descreve o
gestor.
Paulino Dias aponta igualmente o
relacionamento com a máquina administrativa do Estado e os elevados custos
de produção e de mão de obra e a pequenez e fragmentação do mercado in-
terno como fatores que dificultam o
crescimento do setor empresarial.
«Determinadas áreas, como o pagamento de impostos, a importação e exportação de mercadorias, licenças de construção, entre outras, padecem ainda de muitas
ineficiências, o que impõe custos extraordinários às PME que não têm uma estrutura
administrativa para arcar com tais responsabilidades. A par disso, há os elevados custos
de contexto, custos de se produzir em Cabo
Verde. A eletricidade e água são das mais
caras do mundo. As telecomunicações
idem, embora aqui a tendência tenha vindo
a ser de melhoria. O custo da mão de obra
é bastante elevado, por conta de uma legislação laboral demasiadamente rígida e restritiva, tornando o mercado de trabalho em
Cabo Verde um dos 25 mais ineficientes do
Para Paulino Dias, o caso
das PME, que representam
93% das empresas,
é o mais preocupante
porque enfrentam
grandes dificuldades
mundo, conforme o ranking Doing Business», enumera Paulino Dias.
Por sua vez, no início deste ano, o
presidente da Câmara de Comércio, Indústria e Serviços de Sotavento (CCISS),
acusou o Governo de usar o nome do setor
privado para «camuflar financiamento indireto ao seu programa de investimento».
Spencer Lima declarou, na altura, que a
nível do setor privado existem vários programas, mas que nunca são canalizados
para o setor. O presidente da CCISS denunciou a existência de concorrência desleal por parte de empresas estrangeiras que
«financiadas e apoiadas pelos seus governos vêm cá concorrer com empresas cabo-verdianas que estão abandonadas e sem
quem os apoie». Spencer Lima exigiu que
o setor privado passe a ser protegido e que
o Governo apoie as empresas que queiram
internacionalizar-se.
Em resposta, o primeiro-ministro
José Maria Neves aconselhou as empre-
sas «a fazerem o seu trabalho de casa»,
começando por conquistar o mercado
nacional e só depois ambicionarem a
internacionalização. «Quando estiverem
em condições de o fazer, o Governo estará disposto a prestar todo o apoio na
internacionalização», garantiu o PM,
lembrando que o seu Executivo criou o
Fundo de Apoio à Internacionalização
das Empresas cabo-verdianas (FAIE),
em fevereiro de 2011. A par das medidas
institucionais e legais, José Maria Neves
pediu aos trabalhadores cabo-verdianos
uma mudança no seu comportamento
perante o trabalho, para que haja maior
produtividade e, consequentemente,
um tecido empresarial forte e competitivo, capaz de gerar riqueza e travar o
desemprego.
Soluções
Com vista a criar condições para o crescimento do tecido empresarial, o Governo
tem vindo a implementar algumas medidas como a criação do Novo Banco,
Banco da Cultura, Fundo de Emprego e
Formação Profissional, Regime Especial
para as micro e pequenas empresas, a
CVGarante, que é o Fundo de Garantia
Mútua para empréstimos, sobretudo das
micro e pequenas empresas e o Fundo de
Competitividade.
A entrada em funcionamento do
balcão único do investimento e do centro internacional de negócios bem como
investimentos nos domínios da energia,
da água e do saneamento, no valor de 25
milhões de contos (cerca de 286 milhões
de dólares) foram também medidas
anunciadas pelo primeiro-ministro para
alavancar o setor empresarial e torná-lo
mais competitivo. Porém, a aprovação
José Maria Neves
aconselhou as empresas
a fazer o trabalho de casa,
começando por conquistar
o mercado nacional
e só depois ambicionarem
a internacionalização
do Regime Jurídico Especial para as
Micro e Pequenas Empresas foi das medidas que mais agradaram aos empresários cabo-verdianos. Trata-se de um
instrumento que facilita o relacionamento das PME com a administração
pública, através da simplificação de
procedimentos. Ainda assim, a medida
não deixou de ser criticada pela classe
empresarial, já que o seu âmbito, limitado às empresas com até cinco funcionários ou que facturam até 10 mil contos
por ano (cerca de 115 mil dólares), deixa
de fora um número significativo de
PME. Outra medida é o licenciamento
nas autarquias, para determinadas atividades direcionadas para as PME.
Para Spencer Lima, a internacionalização é o caminho, o único capaz de fazer emergir no país empresas fortes, capazes de exportar. Opinião corroborada
pelo presidente da AJEC que pede ao
Governo a definição de uma política
clara nesta matéria, que mostre qual a
visão a longo prazo, as prioridades e
correspondentes responsabilidades de
implementação, os recursos legais, institucionais, organizacionais, financeiros,
humanos e tecnológicos que serão alocados para a internacionalização das empresas nacionais.
Em julho, a AJEC deu a conhecer ao
Governo uma nova proposta que visa
simplificar os processos de acesso ao
fundo de apoio à internacionalização,
para que as micro e as pequenas empresas possam também tirar proveito do
mesmo. A par disso, a AJEC pede que
sejam harmonizados os procedimentos
que são adotados nos países parceiros de
Cabo Verde.
O presidente da AJEC defende ainda outras medidas, nomeadamente, a
promoção da concorrência entre os
operadores do setor financeiro, estímulo
à atração de novos operadores, por via
de novos produtos e novas abordagens
de financiamento ao setor privado, através de políticas públicas mais eficazes.
Paulino Dias pede também maior qualificação dos recursos humanos e que, sobretudo, haja um alinhamento entre a
oferta formativa e as necessidades do
mercado.
África21– novembro 2014
31
cabo verde e a governação
Cabo Verde é um dos países do mundo que mais
cresceu nos últimos anos na utilização da energia
eólica e é atualmente o segundo na penetração
deste tipo de energia, logo a seguir à Dinamarca.
Tem quase 50 áreas protegidas e tem desencadeado
inúmeros programas de proteção ambiental. No
entanto, como muitos outros arquipélagos, está
demasiado vulnerável às consequências das alterações
climáticas, para as quais aliás pouco contribui.
Miguel Correia
Na vanguarda
das boas práticas ambientais
A
pequena tartaruga percorre rapidamente o areal, num percurso nem sempre linear. Numa carapaça de poucos
centímetros, as esguias e desconcertantes pernas
do animal que acabou de sair do ovo destacam-se. São elas que lhe dão vida, naqueles primeiros
minutos de existência, e que lhe permitem escapar aos predadores. Já dentro de água, ganha
uma aparente segurança. E desaparece.
Nos últimos anos, Cabo Verde tem-se destacado no panorama internacional como um dos países
que mais tem apostado nas boas práticas ambientais. A proteção às tartarugas caretta caretta são um
exemplo. Mas as medidas têm abrangido múltiplas
áreas, tornando o país numa referência mundial na
área do ambiente.
Um exemplo que reflete a estratégia governamental é o recente prémio Green Projet Awards
Cabo Verde, criado pelo Governo para estimular as
boas práticas ambientais e que abrange cidadãos,
empresas e associações. Na cerimónia de entrega
dos prémios, em maio, o ministro cabo-verdiano do
Ambiente, Habitação e Ordenamento do Território, Antero Veiga, deixou na sua intervenção a frase-chave em relação à posição do Governo face ao
ambiente: «Um eixo transversal de governação».
32
novembro 2014 –
África21
E os premiados dão corpo aos passos seguidos no
pequeno arquipélago.
A Fundação Tartaruga de Cabo Verde foi precisamente o vencedor na categoria Recursos Naturais e Conservação com o projeto de proteção da
espécie caretta carreta na ilha da Boa Vista. Iniciado
em meados de 2008, o projeto tem contribuído
para a redução da mortalidade das tartarugas, devido a trabalhos de conservação e de sensibilização das
populações. Aos poucos, e de forma gradual, apesar
de algumas resistências, estas têm sido envolvidas na
sua proteção.
Na categoria Energias Renováveis, o vencedor
foi a Empresa Cabeólica, com o Projeto de Eólica, o
primeiro em larga escala no continente africano, e
que já permitiu a Cabo Verde passar de 2% de capacidade eólica instalada para 20%. Com estes resultados, Cabo Verde tornou-se num dos principais
países na utilização da energia eólica, e mesmo o líder mundial, se a avaliação assentar na sua relação
com o PIB gerado pelo país. A revolução energética
chegou ao arquipélago, que desta forma explora e
potencia aquele que é tido como um dos melhores
ventos do mundo (é considerado forte dez meses
por ano, de setembro a junho). O objetivo passa por
atingir os 100% de utilização de energias renová-
A revolução
energética
chegou
ao arquipélago
que explora
e potencia um
dos melhores
ventos
do mundo
veis, meta que deverá ser materializada com a ajuda
da União Europeia até 2020.
Também nas novas tecnologias quem levou o
prémio foi o projeto de uma central elétrica, térmica, eólica e solar, que apresenta um novo conceito
da central elétrica, onde as energias eólica e solar são
armazenadas a montante, estabilizando a produção
de energia e garantindo também a potência da
central. Mais uma aposta num ambiente sustentável, num país que até há pouco tempo estava totalmente dependente do exterior.
A aposta nas energias renováveis como fator de
desenvolvimento de Cabo Verde foi realçada recentemente numa declaração de José Maria Neves à
imprensa: «Até 2015, temos que lançar as bases para
cumprirmos os objetivos do milénio; em 2020 teremos 100% de penetração de energias renováveis e
em 2030 seremos um país desenvolvido».
Tartaruga comum,
um dos patrimónios de Cabo Verde
Cabo Verde é hoje um dos principais locais de nidificação das tartarugas
caretta caretta, ou tartaruga comum, embora não lhe faltem outras denominações, como tartaruga-amarela, tartaruga-cabeçuda ou tartaruga-mestiça. As praias do arquipélago são visitadas entre junho e novembro
pelos animais, praias estas que se apresentam como as terceiras mais
visitadas do mundo por esta tartaruga para a desova.
No entanto, nos últimos meses tem havido registo de diversas tartarugas mortas na ilha da Boa Vista, o que alertou as autoridades. A criminalização de quem abate tartarugas está em cima da mesa, para ser
legislada em breve. Em causa estão alguns hábitos das populações locais, que teimam em não abandonar certas práticas, como o consumo
da sua carne e ovos. Isto, apesar da vigilância dos militares e do esforço
de algumas instituições, como a Fundação Tartaruga. Também a venda
da sua carne se revela tentadora, já que um quilo pode rondar os 800
escudos (9,2 dólares).
Mas a verdade é que o perigo para as tartarugas não está apenas
em terra, onde apesar de tudo o trabalho de sensibilização já dá os seus
frutos. Está no mar. São os barcos e a pesca que muitas vezes acabam
por as ferir ou matar e hoje a tartaruga caretta caretta é uma espécie
considerada em vias de extinção.
Líder moral e na prática
Cabo Verde é um dos dez destinos mais éticos do
mundo para os turistas, segundo a organização
Ethical Traveler. Uma das três categorias apreciadas
é precisamente a proteção ambiental. E, nesta área,
são diversos os passos dados, alguns aparentemente
simples. Segundo as Nações Unidas, o plástico nos
oceanos provoca danos em todo o mundo avaliados
em 13 mil milhões de dólares, com a agravante de
um saco demorar cerca de 500 anos a decompor-se.
Também neste campo Cabo Verde deu já os seus
passos e estabeleceu 2015 como meta para eliminar
o plástico do país. Um dos primeiros do mundo a
lançar essa meta.
No entanto, apesar de serem os países que menos contribuem para as alterações climáticas, são as
pequenas nações insulares as mais prejudicadas com
as suas consequências. Mas, curiosamente, são
também alguns destes países, como Cabo Verde,
que atualmente se estão a colocar na vanguarda da
luta contra as suas influências na terra, questão internacionalmente reconhecida. Os Barbados, uma
pequena ilha das Caraíbas, foi este ano eleita pela
ONU para as comemorações do Dia Mundial do
Ambiente, celebrado a 5 de junho, precisamente
pelo seu esforço na sua preservação.
Na altura, Christiana Figueres, Secretária Executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas
para as Alterações Climáticas, realçou bem este facto na sua mensagem a propósito das comemorações
do dia, destacando o esforço de pequenos países
como «Cabo Verde, República Dominicana e Jamaica» nos projetos de energia eólica e o facto de
serem os líderes «morais e práticos» no combate às
alterações climáticas.
África21– novembro 2014
33
cabo verde e a governação
As especificidades da economia
Direitos de autor lá fora
As especificidades da realidade cabo-verdiana determinaram algumas alterações
na metodologia, pois os parâmetros utilizados – de acordo com o Quadro de
Estatísticas Culturais da Unesco, delineado para produzir estatísticas comparáveis
internacionalmente – não se adaptavam ao caso concreto. Algumas categorias de
atividades tiveram de ser alargadas, outras reduzidas. Por exemplo, foram incluídas determinadas atividades ligadas ao património cultural imaterial que ocorrem
fora dos domínios habitualmente considerados para este tipo de estudo – caso da
gastronomia e métodos tradicionais de transformação alimentar.
Relativamente às atividades culturais em sentido estrito, o seu peso é estimado, a partir de dados fornecidos pelo Ministério da Cultura, em 10,3% da força
de trabalho nacional, embora a análise faça a ressalva de que este valor é muito
elevado se comparado com outros países – à volta de 2% na Europa, de modo
geral. Neste conjunto, a componente «Atuação e celebração» destaca-se como o
mais importante domínio cultural, com quatro ocupações entre as seis maiores
ocupações no setor da cultura (músicos; outros artistas e intérpretes criativos;
dançarinos; cantores).
Quanto à produção musical, «um elemento fundamental de subestimação do
papel económico da cultura em Cabo Verde resulta do facto de os músicos cabo-verdianos que gravam discos no estrangeiro optarem pela residência fiscal no país
de acolhimento», indica o relatório. Ou seja, os seus direitos de autor não contribuem para o Produto Nacional de Cabo Verde, ainda que uma parte dos seus
rendimentos possa entrar no país sob a forma de remessa. Contudo, não é possível saber quais remessas que estão relacionadas especificamente com a cultura.
Gláucia Nogueira
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novembro 2014 –
África21
GLÁUCIA NOGUEIRA
O
nde se situa a cultura no contexto de desenvolvimento de Cabo
Verde foi um dos objetivos de um estudo sobre o papel da cultura na
economia do país, recentemente apresentado. Financiado pelo programa dos países ACP para a área cultural e financiado pela União Europeia, o estudo teve como objetivo número um saber qual o peso deste setor no PIB. O relatório final, que não conseguiu indicar esse valor, conclui com a recomendação de
se criar uma base de dados para mapear o setor.
Uma série de limitações na disponibilidade dos dados impediram o projeto
de atingir o seu principal objetivo. Como comentou o ministro da Cultura,
Mário Lúcio Sousa, durante a sessão de socialização do trabalho, há uma grande
fragilidade relativamente aos dados neste domínio. Por exemplo, nem o Instituto
Nacional de Estatística nem o Ministério das Finanças dispunham de informações específicas sobre o funcionamento das empresas e agentes culturais que pudessem contribuir para o estudo.
Para estimar o contributo da cultura para o PIB seriam necessários dados
pormenorizados sobre o Valor Acrescentado Bruto e salários por ramo de atividade económica, pelo que tal intenção revelou-se «impraticável», como se lê no
documento. Apesar disso, e recorrendo a fontes que atuam no terreno, como
produtores e empresários, chegou-se a obter dados que contrariaram as expectativas: por exemplo, se a informalidade atinge 88% do emprego em termos gerais
em Cabo Verde, detetou-se que na cultura ela corresponde a 66%.
Corsino Fortes
Poeta a trabalhar
Corsino Fortes, poeta, é um dos grandes
nomes da literatura de Cabo Verde e
apontado por estudiosos como um autor
que quebrou paradigmas da criação poética. Conduziu o processo de criação da
Academia Cabo-Verdiana de Letras, fundada no ano passado, da qual é presidente. Como político, exerceu vários cargos
no governo e na diplomacia, a seguir à independência. Antes disso, formara-se em
Direito em Lisboa, em 1966, e fora delegado
do Ministério Público e juiz em Angola. Esteve entre os criadores da Fundação Amílcar
Cabral, que presidiu durante algum tempo,
tal como a Associação dos Escritores
Cabo-Verdianos.
Completou 80 anos no ano passado e,
em entrevista a Á frica 21, disse pensar
que já era um «poeta desempregado»,
mas que a poesia vinha-se impondo. «Tenho estado a trabalhar», garantiu o autor
da trilogia que inclui Pão & Fonema
(1974), Árvore & Tambor (1986) e Pedras
de Sol & Substância (2001), reunida sob o
título A cabeça calva de Deus, publicado
em 2001.
ARQUIVO ÁFRICA21
ARQUIVO ÁFRICA21
ARQUIVO ÁFRICA21
da cultura
Arménio Vieira
Germano Almeida
Pedro Pires
Camões para Cabo Verde
Insatisfeito com a política cultural
Nunca em repouso
Arménio Vieira levou para Cabo Verde, em
2009, o primeiro Prémio Camões atribuído
à literatura do país. É autor de uma obra
multifacetada. Poemas e Mitografias são
os seus primeiros livros de poemas.
Os mais recentes, numa trilogia, são Brumário, Derivações do Brumário e Sequelas
do Brumário. Publicou ainda dois romances, O eleito do sol e No inferno, além de
textos dispersos que aparecem em revistas literárias como Fragmentos, Boletim
Imbondeiro, Vértice e Ponto & Vírgula,
entre outras.
O escritor nasceu na cidade da Praia,
em 1941. Foi integrante da geração dos
anos 1960 da poesia cabo-verdiana,
usualmente denominada «geração Seló»,
título de um efémero suplemento literário
criado em 1962. Foi uma geração marcada
por uma poesia de revolta e combate ao
colonialismo português e ao regime salazarista. Pelo seu envolvimento com a luta
de libertação, foi apanhado pela polícia
política portuguesa, permanecendo dois
anos na prisão.
Germano Almeida, escritor, advogado e proprietário da Ilhéu Editora, com sede em São
Vicente, onde reside, é o autor cabo-verdiano
mais divulgado internacionalmente. Natural
da ilha da Boa Vista, retrata-a nas obras
A Ilha Fantástica e A Família Trago, publicadas na década de 1990. O Testamento do
Sr. Napumoceno da Silva Araújo, adaptado
para o cinema, é das suas obras mais conhecidas, e marca a rutura com os tradicionais
temas da fome e da emigração, introduzindo
ao mesmo tempo na literatura cabo-verdiana
um traço de humor e descontração que irá
marcar toda a sua obra.
Germano Almeida escreve em língua
portuguesa, e, do ponto de vista literário,
vê a vantagem de, com isso, chegar-se
aos leitores de Portugal, Brasil, Angola.
Recentemente, ao lançar o seu mais recente romance, Do Monte Cara Vê-se o
Mundo, voltou a defender essa posição,
afirmando em entrevista ao jornal português Diário de Notícias: «Com o crioulo
não vamos longe, não saímos das ilhas».
Por outro lado, afirma-se «defensor do
ensino do crioulo rigoroso, mas o português tem de ser ensinado como uma língua estrangeira, porque não é a nossa
língua nacional».
Na mesma altura, declarou não estar
satisfeito, «de forma alguma», com a política cultural de Cabo Verde, onde os políticos
continuam a encarar as artes como «uma
despesa» e não «um investimento».
Pedro Pires, antigo primeiro-ministro e antigo Presidente da República continua com
uma agenda cheia mesmo depois de encerrar a sua vida política. Como convidado em
eventos internacionais ou como observador
em eleições, entre outras atividades, a sua
rotina, aos 80 anos, confirma o que comentou durante as celebrações do seu aniversário, no final de abril, quando um jornalista
perguntou qual o segredo para a sua vitalidade: «Estar sempre em atividade. Sabe,
eu nunca estive desempregado...».
Nascido na ilha do Fogo em 1934, Pedro Pires estava na universidade, em Lisboa, quando foi incorporado na Força Aérea
Portuguesa, em finais dos anos 50. Deserta
em 1961 e integra-se no Partido Africano
para a Independência da Guiné e Cabo
Verde. Após quase uma década e meia de
guerra, foi o representante do partido nas
negociações que estabeleceram os termos
da independência de Cabo Verde. O resto é
a história do país nos últimos 40 anos. Ao
concluir o seu segundo mandato como presidente, foi galardoado pela Fundação Mo
Ibrahim, em novembro de 2011, pela sua
atuação como liderança em África. Passou
então a presidir à Fundação Amílcar Cabral
(FAC) e criou o Instituto Pedro Pires para a
Liderança, voltado para qualificar jovens
quadros.
As atividades culturais
têm um peso estimado
de 10,3% na força
de trabalho de Cabo Verde
África21– novembro 2014
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PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
36
Um plano grandioso para um
país que pensa em grande.
novembro 2014 –
África21
Aumentar a disponibilidade, nos pontos de venda, de bens
essenciais produzidos no país é uma das estratégias do Plano
Nacional de Desenvolvimento. Até 2017, Angola pretende
desenvolver e manter um conjunto de infra-estruturas
logísticas e de distribuição que possibilite o abastecimento
de produtos nacionais em todas as províncias. Para além de
aumentar o número de estabelecimentos comerciais, o PND
vai assegurar a existência de reservas alimentares estratégicas,
bem como incentivar o comércio rural e a criação de novos
empregos.
angola
EDUARDO PEDRO/JORNAL DE ANGOLA
A eleição de Angola
para membro não
permanente do
Conselho de Segurança
das Nações Unidas
é o corolário do
processo de construção
de uma imagem
positiva do país
no exterior em curso
nos últimos anos.
Mas, internamente,
os críticos e opositores
mantêm as suas
reticências em relação
à governação.
«Uma vitória, mas também responsabilidade», comentou o ministro das Relações Exteriores, George Chikoti
Carlos Severino
Prestígio externo, reticências internas
A
disputa para a escolha dos
membros não permanentes, nos
próximos dois anos, do Conselho de Segurança da ONU aconteceu
em 16 de outubro. Angola foi o país
mais votado, com 190 votos favoráveis
dos 193 possíveis. Os outros países escolhidos foram a Malásia, Venezuela,
Nova Zelândia e Espanha. A Espanha,
note-se, precisou de três votações para
conseguir suplantar a Turquia por 132
votos contra 60. A unânime avaliação
dos observadores internacionais é que
Ancara foi vítima da sua hesitação em
combater o Estado Islâmico.
A eleição para o Conselho de Segurança é feita por voto secreto, pelo que nunca
se sabe quem vota a favor ou contra. Entretanto, segundo apurou a África21
junto de jornalistas em Washington, al-
guns diplomatas africanos desconfiam que
o único voto expressamente contra a escolha de Angola foi do Rwanda, por causa
das rivalidades entre os dois países relativamente ao Congo Democrático. Como se
sabe, o Rwanda apoia os rebeldes que
atuam no leste do Congo.
Houve ainda dois votos em países
que não eram candidatos: o Congo e a
Nigéria. Aquelas fontes disseram a esta
revista que «os votos contra camuflados
são comuns neste tipo de eleições».
Prestígio
«Os Estados Unidos estão orgulhosos
por terem apoiado a entrada do país no
Conselho de Segurança. Também estamos entusiasmados porque, acreditamos, [Angola] será um membro muito
eficaz. Pensamos que podemos trabalhar
juntos em prol não apenas de África,
mas de todo o mundo». Esta declaração
de Russell Feingold, enviado dos EUA
para os Grandes Lagos e a RDC, em
entrevista publicada pelo Novo Jornal
em 24 de outubro, confirma que a imagem externa de Angola está em alta.
O facto foi reconhecido pelo ministro angolano das Relações Exteriores,
George Chikoti, que, surpreso pelo expressivo número de votos favoráveis à
entrada do país no Conselho de Segurança, comentou: «Isto significa que há
Angola foi o país mais votado
com 190 favoráveis dos 193
possíveis
África21– novembro 2014
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Eleição para Conselho de
Segurança atesta prestígio
internacional de Angola
muita gente que olha para nós com
muita responsabilidade. Mas também
isso é o resultado da ação política de
Angola».
Na sua entrevista ao Novo Jornal, o
enviado especial dos EUA para os Grandes Lagos e a RDC corroborou essa avaliação. «Posso adiantar que estamos profundamente impressionados com o vosso
Presidente da República e com o ministro das Relações Exteriores, pelo tempo
tremendo que investiram na promoção
da paz nesta região», afirmou Russell
Feingold, sem poupar as palavras.
De notar que nas semanas que antecederam a escolha dos novos membros
do Conselho de Segurança das Nações
Unidas, o papel de Angola nos esforços
de pacificação na África Central e nos
Grandes Lagos já tinha sido elogiado,
em outras ocasiões, por diferentes entidades, o que fazia prever que a sua eleição seria mais ou menos certa.
Entre tais entidades, destaca-se a embaixadora norte-americana em Angola,
Helena La Lime, que, após um encontro
com o ministro angolano da Defesa, João
Lourenço, declarou: «O meu país reconhece a liderança que Angola tem demonstrado para alcançar a paz e a segurança no continente africano e, através do
diálogo com as autoridades angolanas,
vamos avançar e apoiar as iniciativas do
Presidente José Eduardo dos Santos e do
seu Executivo para as questões em
África».
De igual modo, o embaixador da
União Europeia, Gordon Kricke, elogiou publicamente, durante uma visita à
província do Kuando Kubango (sudeste
do pais) em setembro, o papel de Angola
na resolução dos conflitos regionais, em
especial na região dos Grandes Lagos.
Também o enviado especial das
Nações Unidas para os Grandes Lagos,
o argelino Said Djinnit, que esteve em
Luanda antes da votação para o Conselho de Segurança, manifestou a satisfa-
38
novembro 2014 –
África21
ção daquela organização pelo «dinamismo demonstrado pela liderança
angolana em relação à resolução da situação de instabilidade político-militar
ainda reinante nos Grandes Lagos».
Eis o modo como o ministro das
Relações Exteriores, George Chikoti,
sintetizou a eleição de Angola para o
Conselho de Segurança da ONU, como
membro não permanente: «Uma vitória, mas também responsabilidade».
Óbvio e verdadeiro.
Reticências
Os opositores e os críticos do Governo
receberam com pouco à-vontade a eleição de Angola para aquele órgão das
Nações Unidas. Não sendo «politicamente correto» manifestarem-se contra
ela, alguns apressaram-se a considerar
que a mesma expõe o país a um maior
escrutínio por parte da comunidade internacional, em especial no domínio da
boa governação e do respeito pelos direitos humanos.
Oposição espera maior
escrutínio da comunidade
internacional em relação
à boa governação
Para essas vozes, a política de paz
defendida pelo Governo angolano é
«ambivalente» e apenas «para inglês
ver». Segundo elas, por exemplo, as autoridades não têm promovido, internamente, uma reconciliação «autêntica».
Por outro lado, acrescentam, «há ainda
muitas questões em aberto a nível da
governação interna, segurança e direitos
humanos dentro de Angola». As mencionadas reticências talvez sejam exageradas e reflitam uma expectativa demasiado idealista em relação à atitude da
chamada «comunidade internacional».
Mas, no mínimo, servem para sinalizar
o descontentamento de setores importantes da sociedade angolana relativamente aos rumos do país.
Nem sequer o discurso sobre o Estado da Nação, proferido pelo Presidente
José Eduardo dos Santos na Assembleia
Nacional um dia antes da eleição de Angola para o Conselho de Segurança da
ONU, convenceu os opositores e os críticos. Nesse discurso, José Eduardo dos
Santos, apesar de reconhecer que o crescimento do país este ano será menor do
que o inicialmente previsto, manteve o
otimismo em relação à continuidade dos
progressos registados sobretudo depois
do fim da guerra, em 2002. Ele considerou ter havido avanços não apenas no
campo económico, mas também no domínio do combate à pobreza. Enfim,
alertou para a necessidade de aprofundar
a diversificação da economia, como forma de diminuir a dependência do país
em relação ao petróleo, cujo preço, note-se, tem vindo a cair significativamente
no mercado internacional.
A resposta da oposição não se fez esperar. Poucas horas depois do discurso
do Presidente na Assembleia Nacional, o
líder da UNITA, Isaías Samakuva, convocou a imprensa para, praticamente,
atacar todo o documento, de alto a baixo.
A conclusão do presidente do maior partido da oposição foi dramática: «Se no
campo dos direitos e liberdades fundamentais o regime regrediu, no campo da
gestão das finanças públicas e de concretização do Estado de direito democrático
a regressão enraizou-se e cresceu de tal
forma que constitui já uma séria ameaça
aos fundamentos da República de Angola», afirmou Samakuva.
É difícil saber até que ponto declarações deste tipo podem anular o efeito
positivo, pelo menos em termos de
imagem, do reconhecido prestígio internacional do país e da sua recente escolha
para membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas.
Provavelmente, será diminuto, para não
dizer mesmo inexistente. Não é, pois,
mero acaso, que o líder da UNITA tenha decidido realizar uma viagem ao
exterior, para transmitir a mensagem da
referida organização às chancelarias
internacionais.
Como se diria na linguagem popular, ele foi atrás do prejuízo. Resta saber
se colherá alguma coisa, no fim dessa
excursão.
África21– novembro 2014
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40
novembro 2014 –
África21
África21– novembro 2014
41
a opinião de alves da rocha
Os efeitos da redução
dos subsídios orçamentais
aos preços dos combustíveis
[email protected]
Periodicamente, o tema dos subsídios aos preços dos combustíveis em
Angola é trazido para o centro dos debates económicos, haja em vista as
implicações que eventuais reduções no seu montante acarretam.
E
Professor Associado da Universidade
Católica de Angola
Alves da Rocha escreve de acordo
com a antiga ortografia
42
novembro 2014 –
mbora não existam indagações estatísticas
sobre a percepção da maioria da população
quanto aos subsídios aos combustíveis, acredito,
no entanto, que desconhece que os preços dos
derivados do petróleo não são os reais. Mas mesmo assim, a população mais humilde e de rendimentos baixos queixa-se dos elevados preços
desses combustíveis.
Será que os subsídios são uma situação normal
do funcionamento das economias de mercado?
Existem circunstâncias especiais em que os preços
de determinados bens e serviços devam ser subsidiados? Quem na verdade acaba por pagar estes subsídios (nunca se deve esquecer que em Economia não
há almoços grátis)? Serão, na verdade, úteis à economia e mesmo aos sectores e pessoas beneficiadas?
Que tipo de distorções as políticas de subsidiação de
preços introduzem no funcionamento dos mercados e na repartição do excedente económico? Serão
os subsídios a preços uma forma de melhorar a distribuição do rendimento ou, pelo contrário e em
determinadas circunstâncias, como é o caso dos
combustíveis, pioram o acesso ao rendimento nacional da parte dos mais pobres? Serão as franjas
mais pobres da sociedade a beneficiarem dos subsídios aos preços dos combustíveis? Qual o custo de
oportunidade dos subsídios aos preços dos combustíveis, já que sempre nos confrontamos com uma
restrição económica fundamental que é a escassez
de recursos? Como se constata, uma quase infinidade de problemas, atestando a natureza complexa
deste fenómeno dos subsídios e do contrário, ou
seja, da des-subsidiarização.
África21
A energia no seu sentido lato (electricidade,
combustíveis) tem uma posição central no funcionamento dos sistemas económicos, pelos efeitos a montante e jusante que exerce sobre o crescimento. Um dos vectores da competitividade
estrutural das economias é a energia, disponibilizada em quantidades suficientes e a preços de
eficiência. E é através da electricidade, regularmente assegurada, que se possibilita às empresas
funcionarem com estabilidade, deslocando para
outras áreas de gestão e organização recursos financeiros e capacidade de inovação. Manter as
fábricas a funcionar na base de geradores é não só
custoso, como representa alguma ameaça ao
equilíbrio ambiental.
Os cálculos dos montantes dos subsídios
Anualmente o Estado aloca, no seu orçamento
geral, cerca de 5 mil milhões de dólares a título
de subsídios aos combustíveis e com a finalidade
de manter os respectivos preços de venda à economia (empresas, famílias e o próprio Estado)
inalterados, independentemente do preço do petróleo no mercado internacional. De resto é pelo
diferencial entre este preço e o preço final do refinado que se calculam os montantes dos subsídios. Sempre que os preços internacionais baixarem, o valor dos subsídios reduz-se, o que pode
ser uma vantagem para as finanças do Estado. Só
que para a economia não é nada bom, pois reduzem-se as receitas em divisas e também as receitas
fiscais, fundamentais para financiar o investimento público. E seguramente que esta redução
Jornal de angola
O Estado angolano atribui, no seu orçamento geral, 5 mil milhões de dólares para subsídios aos combustíveis
Um dos
vectores da
competitividade
estrutural
das economias
é a energia,
disponibilizada
em quantidades
suficientes
e a preços
de eficiência
é inferior aos ganhos com a diminuição do
montante de subsídios. Num ambiente internacional de subida sistemática dos preços do petróleo, os subsídios tenderão a aumentar cada vez
mais. Este processo tem de terminar. O desperdício económico e o desaproveitamento social associados a 5 mil milhões de dólares anuais são
muito elevados, ainda que a maior parte da população não tenha disto noção clara.
Mas a redução ou eliminação dos subsídios
aos preços dos combustíveis passa por: uma substancial melhoria da eficiência da refinaria de petróleo (a construção da nova refinaria é a solução
ideal), um funcionamento regular do sistema de
produção e distribuição de electricidade (o aumento da produção de electricidade de Cambambe, a construção da nova barragem de Laúca,
no Kwanza Norte (um investimento público de
mais de 3 mil milhões de dólares) e a melhoria da
capacidade de outras barragens hidroeléctricas
são sinais duma alteração estrutural na capacidade de fornecimento de electricidade no futuro),
uma aplicação socialmente rentável dos montantes dos subsídios a cortar (o mais fundamental é
encontrarem-se aplicações alternativas com um
valor social de retorno superior à perda social associada a preços baixos dos combustíveis), um
gradualismo do processo de diminuição (abordagem discutível face a quem prefere um choque de
oferta único, ainda que de proporções elevadas,
para se reduzir espaço ao aparecimento de comportamentos especulativos e prejudiciais ao processo de absorção dos impactos sobre a inflação)
e uma compensação imediata do rendimento das
franjas sociais mais desprotegidas da população.
Uma forma de se estimarem os custos de oportunidade destes subsídios é confrontar o seu valor
com os gastos em educação e saúde, duas áreas importantíssimas do Índice de Desenvolvimento Humano, no qual Angola tem tido um péssimo desempenho ao longo dos anos. A despeito de as despesas
sociais representarem, grosso modo, 32% das despesas públicas totais – e de se ter notado um incremento desde 2002 – a realidade quotidiana mostra
uma qualidade destes serviços que sempre deixou a
desejar, reclamando a população de parcos rendimentos por atendimentos mais de acordo com a sua
condição de seres humanos iguais a quaisquer outros. As despesas orçamentais com a educação ascenderam, em 2013, a 4,5 mil milhões de dólares e
com a saúde a 3,2 mil milhões, ou seja, bem abaixo
dos 5 mil milhões de subsídios. O reforço orçamental destes dois sectores tem de ser feito à custa da
redução dos subsídios.
África21– novembro 2014
43
PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
Um plano grandioso para um
país que pensa em grande.
44
novembro 2014 –
África21
Promover o acesso dos cidadãos aos benefícios da
cultura faz parte dos objectivos do Plano Nacional
de Desenvolvimento. É também objectivo do PND
valorizar as diferentes manifestações culturais,
incluindo as línguas nacionais e a produção de
artesanato, para consolidar uma identidade nacional
assente na diversidade cultural. A meta do PND é
aumentar o número de Casas de Cultura em diversas
províncias e estimular a formação e a qualificação de
recursos humanos, ampliando o número de alunos
matriculados nas escolas técnicas de artes.
EVARISTO SÁ/AFP
brasil
No discurso da vitória, Dilma Rousseff definiu três objetivos imediatos: reforma política, combate à corrupção e à inflação
Vitória de Dilma Rousseff mantém
o petismo no poder por 16 anos
A Presidente Dilma Rousseff permanecerá no poder por mais
quatro anos depois de duas votações nacionais qualificadas pelos
analistas políticos como plebiscitos em vez de eleições
O
desenvolvimento da campanha eleitoral acabou dando
mais ênfase à escolha entre a
continuidade ou não do «petismo» no
poder, do que ao debate sobre propostas
de governo.
O petismo é um eufemismo surgido
após 12 anos de permanência do Partido
dos Trabalhadores na Presidência da República. O temor de que esta hegemonia
se prolongasse por mais quatro anos levou os partidos conservadores e a alta
classe média a apostar na candidatura
Carlos Castilho
FLORIANÓPOLIS
presidencial do senador e ex-governador
do estado de Minas Gerais, Aécio Neves.
A polarização da campanha eleitoral
na segunda volta das eleições brasileiras
foi uma consequência do objetivo oposicionista de impedir a continuidade do
modelo econômico baseado na redistribuição de renda e redução das desigualdades sociais no país.
Na reta final da campanha, as emoções
superaram as ideias e o resultado foi a intensificação das acusações mútuas, fruto de
denúncias de corrupção e do passionalismo
dos eleitores. Isto tudo acabou se refletindo
no resultado final mais apertado desde que
o ex-líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva
foi eleito Presidente em 2002, levando o
Partido dos Trabalhadores ao poder.
Dilma ganhou por uma diferença de
3,28% dos votos válidos, cuja distribuição nacional mostrou duas tendências
claras: uma de natureza geográfica e outra
de cunho nitidamente socioeconômico.
A Presidente reeleita ganhou facilmente em quase todos os estados da região norte/nordeste do Brasil enquanto
Aécio Neves venceu também com folga
na região sul e no centro oeste do país.
As grandes exceções foram os estados de
Minas Gerais e Rio de Janeiro, cujos resultados foram decisivos para a vitória
do petismo a nível nacional.
No plano socioeconômico ficou também nítida a divisão entre ricos e pobres
África21– novembro 2014
45
No plano socioeconômico
ficou nítida a divisão
entre ricos e pobres
nas preferências eleitorais
dos brasileiros
nas preferências eleitorais dos brasileiros.
Dilma ganhou nas regiões mais pobres, as
mais beneficiadas pela política de redistribuição de renda, mundialmente famosa
pelo projeto Bolsa Família, um suplemento em dinheiro fornecido a 14 milhões de
famílias brasileiras com renda inferior a 70
reais (29 dólares).
Já o candidato oposicionista contou
com o apoio dos segmentos sociais de renda mais alta, concentrados especialmente
nos estados industrializados do sul e na
próspera região agrícola do centro-oeste
brasileiro. Aécio Neves contou também
com as simpatias dos grandes conglomerados jornalísticos e do sistema bancário do
país, interessado no fim do controle estatal
sobre o Banco Central do Brasil.
A vitória apertada da ex-guerrilheira
Dilma Rousseff, mais a clara divisão dos
eleitores por região e classe social, somados
à polarização emocional, aumentou a
preocupação com o futuro do país nos
próximos quatro anos, quando a Presidente enfrentará uma conjuntura econômica
difícil fruto da queda do Produto Interno
Bruto (PIB) e da alta da inflação.
Analistas políticos como Alberto Dines, do Observatório da Imprensa, afirmam que agora começa o «terceiro turno»
(terceira volta) das eleições, numa previsão
de que a batalha política entre governo e
oposição vai continuar intensa. A preocupação com o futuro esteve muito nítida no
primeiro pronunciamento da Presidente
46
novembro 2014 –
África21
Dilma após a vitória nas urnas, quando ela
prometeu dialogar com a oposição e definiu três objetivos imediatos de sua nova
administração: reforma política, combate à
corrupção e à inflação.
A proposta da reforma política já circula no parlamento nacional há mais de dez
anos, mas não avançou por desavenças entre os partidos. Dilma pretende agora superar este impasse promovendo um plebiscito nacional que procura incluir o cidadão
comum no debate da crise de identidade e
proliferação dos partidos políticos. No
momento há 28 partidos com representação na Câmara de Deputados e 18 presentes no Senado federal. Em sua maioria são
legendas marcadas por interesses imediatistas com escassa densidade ideológica.
O combate à corrupção está relacionado à reforma política porque a maioria dos
escândalos manipulados eleitoralmente
pelos partidos está ligada a esquemas de
captação ilegal de recursos financeiros resultantes do superfaturamento de obras
públicas. O mais famoso de todos estes escândalos é o chamado «mensalão», denunciado em 2005, e que culminou com a
prisão de importantes líderes do petismo.
O partido da Presidente Dilma não é o
primeiro e provavelmente não será o último a usar este recurso, mas foi o preço
pago pelo PT por sua longa permanência
no poder.
Já a questão econômica é o grande
«calcanhar de Aquiles» da nova gestão Dil-
A recuperação da economia
brasileira está ligada à situação
econômica da Argentina
e China, os dois maiores
parceiros comerciais do Brasil
ma, porque combina fatores internos e externos ao país. Entre os fatores internos, o
mais importante é a realização de um
diagnóstico real da situação do país.
Ao longo dos quase oito meses de
campanha eleitoral, o otimismo e o pessimismo dos eleitores variaram de forma
aguda em relação ao futuro do Brasil devido a indicadores econômicos contraditórios. Em abril, a avalancha de dados negativos sobre a inflação e o crescimento
econômico provocou índices de pessimismo da ordem de 64% conforme levantamento do jornal Folha de São Paulo. Em
setembro, o índice baixou para 50% e, nas
vésperas da segunda volta, caiu para surpreendentes 31%.
A Folha de São Paulo levantou a hipótese de que a queda do pessimismo e
consequente aumento do otimismo teria
sido gerada pela expectativa dos eleitores,
tanto de Dilma como de Aécio, de que
seu candidato venceria as eleições e recuperaria a economia. Mas a justificativa
não encontrou consenso entre os economistas e nem entre os especialistas em
pesquisas eleitorais.
Os fatores externos estão ligados principalmente à situação econômica na Argentina e na China, os dois maiores parceiros comerciais brasileiros para produtos
e serviços pouco, ou medianamente, industrializados. No momento tanto argentinos como chineses estão reduzindo as
importações por problemas domésticos.
Isto pode dificultar a recuperação econômica brasileira e comprometer o programa
de redistribuição de renda que ajudou a
reeleger Dilma Rousseff e reativar o mercado interno e a produção nacional, responsáveis pelo fato do Brasil ter passado
incólume, até agora, pela crise financeira
internacional.
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África21– novembro 2014
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moçambique
Frelimo vence com danos
no seu esmagador
poder parlamentar
O candidato presidencial da Frelimo, Filipe Nyusi, é o vencedor das
eleições gerais moçambicanas, que garantiram uma continuidade
governativa ao seu partido, embora com um domínio parlamentar
menos «retumbante». A Renamo, de Afonso Dhlakama, reforça
o estatuto de líder da oposição, enquanto o emergente MDM
cresce, mas menos do que o esperado.
Emanuel Novais Pereira MAPUTO
Q
uase a conta-gotas, os resultados das eleições presidenciais,
legislativas e das assembleias
provinciais de 15 de outubro foram sendo
divulgados até 15 dias depois da votação,
deixando Moçambique sob um manto de
tensão e ansiedade, muitas vezes transformado num profundo clima de suspeição.
48
novembro 2014 –
África21
Se nos primeiros dois dias após o
sufrágio o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral (STAE) foi convocando a imprensa para divulgar os apuramentos preliminares, tal deixaria de
acontecer quando eram conhecidos cerca de um terço dos resultados, passando
as comissões distritais do órgão a fazer
localmente a apresentação dos dados
nos 150 distritos do país.
Com a obrigatoriedade de apresentar
os editais até 48 horas após o encerramento das urnas, muitas destas comissões
acabariam por falhar este objetivo, atrasando, por arrasto, o apuramento das
comissões provinciais, que também não
conseguiram honrar o seu compromisso
legal de divulgação dos resultados até
cinco dias após a votação. Embora exíguos, os primeiros resultados apresentados pelo STAE, que apontavam para
uma vitória de Filipe Nyusi, com uma
margem de mais de 60% da votação, assim como da Frelimo, provocaram a primeira reação do principal partido da
oposição moçambicano, a Renamo, recentemente saído de um braço-de-ferro
com o atual Governo moçambicano,
consubstanciado numa crise político-militar de 17 meses, de que resultou um
GIANLUIGI GUERCIA/AFP
moçambique
número indeterminado de feridos e de
mortos, incluindo civis.
«Não aceitamos os resultados destas
eleições» assegurava no dia seguinte à
votação António Muchanga, porta-voz
da Renamo, declarando «uma vitória
categórica» do seu partido. Estas afirmações seriam mais tarde amenizadas pelo
próprio Afonso Dhlakama que, embora
tenha classificado as eleições como «uma
fantochada», sugeriu a criação de um
Governo de Unidade Nacional com o
atual Executivo. O histórico líder da
Renamo garantiu também que não iria
reacender o conflito armado na sequência de uma derrota eleitoral, mantendo a
promessa que fez antes da votação.
Os resultados provinciais
Quando já eram conhecidos os resultados provinciais, interpunha-se à faixa
vermelha da Frelimo, conquistada no
extremo norte e a sul, a cor verde da Renamo na região centro-norte de Moçambique, mas, no somatório nacional, Filipe
Nyusi surgia com 57% do total de votos
face a Afonso Dhlakama, com 36%, e a
Daviz Simango, líder do MDM, que não
ia além de 7% da votação.
Nyusi vencia assim nas províncias de
Niassa e Cabo Delgado (norte) e com
margens expressivas em Gaza, Maputo
Cidade e Maputo Província, além de
Inhambane (sul), enquanto Afonso
Dhlakama liderava a contagem em Tete,
Sofala, Zambézia e Manica (centro) e
ainda em Nampula (norte).
A contagem das legislativas não alterava de forma significativa o cenário das
presidenciais, à exceção de Tete, Nampula e Manica, que a Renamo perdia
para a Frelimo. Atribuía-se à Frelimo uma margem de 56% sobre a Renamo (33,8%) e o MDM (9,1%).
Afonso Dhlakama garantiu que
não irá reacender o conflito
armado na sequência de uma
derrota eleitoral
A Frelimo que governa
Moçambique desde 1975,
mantém maioria absoluta,
possibilitando-lhe o domínio
do Parlamento
A confirmarem-se estes resultados
no apuramento central da Comissão
Nacional de Eleições (CNE), obrigada a
divulgar os dados finais até 15 dias sobre
a votação, a Frelimo poderá perder até quase 50 deputados dos 191 que
mantém atualmente, abandonando a
maioria qualificada que, até aqui, lhe
permitia alterar a Constituição moçambicana. O partido, que governa Moçambique desde 1975, mantém no entanto
uma maioria absoluta, que lhe possibilitará o domínio do Parlamento.
Projeções avançadas pela imprensa
moçambicana apontam para que, de um
total de 250 deputados, seja expectável
que a Frelimo fique com 142, a Renamo
conquiste 89 lugares (contra 51 nas eleições anteriores) e o MDM 19 assentos.
Nas mesmas previsões, embora mais do
que duplique o número de lugares – tinha até agora oito – o MDM vê gorada a
sua expectativa de eleger 30 deputados.
Oposição reclama fraude generalizada Partindo para o sufrágio com uma alteração à Lei Eleitoral, que logrou no decorrer da crise político-militar, e que acabou
por aumentar a partidarização da CNE e
do STAE, a Renamo aponta críticas severas ao processo, que diz ter sido marcado
por vários ilícitos e fraudes eleitorais, tais
como atrasos na abertura de mesas de
votação, enchimento de urnas e falsificação de editais, além de intervenções «intimidatórias» da polícia.
Se a revisão eleitoral permitia à Renamo, assim como à Frelimo e ao
MDM, introduzir um membro partidário em cada mesa de votação – 17.010
no total –, tal acabaria por não se verificar em grande parte do território, o que
gerou trocas de acusações entre a oposição, que falava em atrasos deliberados
na emissão de credenciais, e o STAE,
que acusava os partidos de incúria, por
não terem respeitado os prazos legais
para a inscrição dos seus membros.
Dois dias após a votação, as missões de observação eleitoral estrangeiras,
que, no seu todo, levaram cerca de 500
observadores para Moçambique, apresentavam as primeiras conclusões sobre o
processo eleitoral em comunicados bastante próximos no seu teor: admitindo algumas irregularidades e a fraca
presença de membros dos partidos da
oposição nas mesas de votação, considerava-se que os incidentes registados eram
insuficientes para retirar credibilidade ao
processo.
Em oposição, os relatórios das missões de observação nacionais, que reuniam o grosso do número de observado-
A possibilidade de se virem
a repetir-se as eleições é um
cenário afastado por analistas
políticos e pela própria CNE
res, cerca de 6000, apontavam exatamente
para o contrário, afirmando que os resultados das eleições não são credíveis.
Perante uma Frelimo silenciosa, somente através da imprensa moçambicana têm surgido posições que apontam
para uma rejeição da sugestão de Afonso
Dhlakama no sentido da formação de
um Governo de Unidade Nacional, entre a Renamo e o partido atualmente no
poder.
Entretanto, e como sugeriram algumas missões internacionais, as reclamações dos partidos da oposição já começaram a dar entrada nos tribunais e
órgãos eleitorais, mas a possibilidade de
virem a repetir-se as eleições é um cenário afastado por analistas políticos do
país, assim como pela própria CNE, que
garante que os ilícitos denunciados não
têm dimensão para «impedir sequer a
eleição de um deputado ou membro da
assembleia provincial».
África21– novembro 2014
49
epidemia
Urgência mundial para travar
Foram precisos oito meses e
mil mortos em África para
que a OMS decretasse o
estado de emergência pública
face à epidemia do ébola.
Mas o aparecimento dos
primeiros casos de contágio
nos Estados Unidos e na
Europa em outubro lançou o
pânico no chamado «mundo
ocidental».
Nicole Guardiola
Ilustração de Cristina Sampaio
50
novembro 2014 –
África21
O
ébola já fez mais vítimas mortais na Guiné Conacri, Serra
Leoa e sobretudo na Libéria que
os 15 surtos epidémicos registados em
África desde a identificação do vírus, em
1976 no ex-Zaire, e as perspetivas não são
animadoras. A ONU fala de 4000 a 5000
novos casos por semana já no próximo
mês. Impedir a propagação do vírus virou
paranoia com a consequente estigmatização de regiões e países inteiros.
Sob a pressão da opinião pública,
caldeadas por uma imprensa que difunde
as informações mais pavorosas, os governos tomam medidas de «legítima defesa»
(fecho de fronteiras, suspensão de voos e
vistos, controlos sanitários nos aeroportos) que sujeitam os países mais afetados
a um embargo de facto. E como as medi-
das coercivas aplicadas até agora (como o
recolher obrigatório imposto a toda a
população da Serra Leoa de 19 a 21 de
setembro) não surtiram o efeito esperado,
a chamada comunidade internacional
decidiu intervir militarmente. Barack
Obama anunciou o envio de 4000 militares americanos para a Libéria, os britânicos fizeram o mesmo para a Serra Leoa
e os franceses para a Guiné.
Guerra ao vírus ou caça aos doentes?
O recurso à força para isolar os doentes e
proteger as equipas sanitárias corre o risco
de agravar o que o socioantropólogo senegalês Cheikh Ibrahima Niang descreve
como o «défice de confiança entre os dirigentes (dos países afetados) e os seus administrados, e entre o Ocidente e os povos
o ébola
africanos». Segundo Niang, a abordagem
ocidental focaliza-se demasiado no vírus e
nas formas de o combater. «A doença é
efetivamente causada por um vírus mas a
epidemia surge quando existe um contexto social, político, cultural e histórico favorável à sua expansão», disse.
O biólogo belga Peter Piot, que
identificou o vírus ébola em 1976, destaca também as circunstâncias que contribuíram para fazer da epidemia em
curso na África Ocidental a mais mortífera de sempre: «várias décadas de guerra
civil, governos instáveis e/ou corruptos
que geraram uma perda de confiança
nas autoridades nacionais e nos seus colaboradores estrangeiros, serviços públicos fragilizados, crenças populares fortemente enraizadas acerca da origem da
doença e lentidão das respostas nacionais e internacionais à epidemia».
A Organização Mundial de Saúde
(OMS) e as ONG como Médicos sem
Fronteiras denunciaram desde o início das
suas intervenções a negação da doença e a
resistência às intervenções exteriores como
a causa principal da explosão da epidemia.
Esta resistência, que levava as populações a
esconder os doentes e os mortos, ou a fugir
quando apareciam veículos marcados com
aumentam e que a situação geral se degrada nos países afetados.
Com efeito, a epidemia tem efeitos
devastadores na Guiné Conacri, Libéria e
Serra Leoa, que eram já os países mais pobres da região e dos mais atrasados do
mundo em termos de desenvolvimento
humano (179.º, 175.º e 183.º, respetivamente, entre 187 países, segundo o relatório do PNUD de 2014), com sistemas de
saúde fraquíssimos (um médico por cada
a Cruz Vermelha, tende a tomar formas
violentas, como o ataque contra um centro de internamento em Monróvia, no
mês de agosto, para «libertar» os doentes
hospitalizados compulsivamente, ou o
massacre, a 16 de setembro, na Guiné, de
oito membros de uma equipa de «sensibilização». Os confrontos violentos podem
multiplicar-se à medida que os mortos
10.000 habitantes na Guiné, um por cada
100.000 na Libéria).
A gravíssima crise humanitária provocada pelo ébola exacerba as tensões sociais
preexistentes e compromete a estabilidade
política. O Presidente da Serra Leoa, Ernest Bai Koroma, disse nas Nações Unidas
que o seu país está em risco de desaparecer,
e o ministro liberiano da Informação,
Lewis Brown, não descarta a eventualidade do regresso à guerra civil que acabou
em 2003.
Em Monróvia, capital do país mais
afetado, a crise é mais aguda e atinge todos os níveis do Estado e da sociedade.
Escolas fechadas sine die, economia paralisada pelo êxodo dos quadros das grandes empresas e pelo embargo de facto
sobre o comércio externo, o desemprego
A crise humanitária
provocada pelo ébola
exacerba as tensões sociais
preexistentes e compromete
a estabilidade política dos
países mais afetados
África21– novembro 2014
51
África mobiliza-se
contra o ébola
A presidente da Comissão da União Africana, Nkosazana Dlamini-Zuma, visitou
os três países da África Ocidental no
epicentro da epidemia de ébola na última
semana de outubro, quando o número de
casos registados se aproximava dos
10.000 e o dos mortos de 5000. Prometeu o envio para a Guiné Conacri, Libéria
e Serra Leoa de mil profissionais de
saúde, dos quais 600 oferecidos pela
África Oriental. Segundo a Organização
Mundial de Saúde é preciso isolar pelo
menos 70% das pessoas contaminadas
para travar a propagação do vírus, mas
até agora apenas 25% dos 50 centros de
isolamento necessários estão a funcionar devido à falta de pessoal. Cuba, que
já enviou 165 médicos e enfermeiros
para a Libéria, o país mais afetado, vai
enviar mais 65 para Serra Leoa e Guiné
Conacri.
Na frente médica e científica, investigadores franceses apresentaram um
teste de deteção simples, barato e sobretudo rápido (parecido com um teste
de gravidez) que permite detetar a presença do vírus em 15 minutos com
apenas uma gota de sangue. A vacina
foi elaborada por um laboratório canadiano e será testada em África e Europa
em novembro. Se os resultados forem
positivos o laboratório compromete-se a
fornecer milhões de doses no primeiro
semestre de 2015.
explode e a fome instala-se. Os nervos
estão à flor da pele e as forças de segurança, esqueléticas, não podem ou não querem intervir: polícias e soldados abandonam em massa esquadras e quartéis
depois de assistirem à morte de vários
colegas. Os profissionais de saúde queixam-se de não beneficiarem da mesma
proteção que os voluntários estrangeiros,
que operam nos centros de luta contra o
ébola, e recusam-se a continuar a trabalhar em maternidades e postos de saúde,
onde tudo falta, até luvas e água potável.
Em Freetown, os coveiros entraram em
greve para exigir o pagamento de dois
52
novembro 2014 –
África21
Polícias e soldados liberianos
abandonam esquadras
e quartéis após assistirem
à morte de vários colegas
meses de salários atrasados, cansados de
se expor ao contágio, sem equipamentos
adequados, por 100 dólares por semana e
sem seguro de vida para as suas famílias.
O diagnóstico feito pela ONU em
meados de outubro é dramático. Milhares, talvez dezenas de milhares, de liberianos, serra-leoneses e guineenses vão
morrer nas próximas semanas, vítimas do
ébola e não só: paludismo, cólera, ou
simplesmente de fome.
Que fazer?
A medicina não oferece nenhuma resposta
imediata. Os grandes laboratórios científicos estão a trabalhar a todo o vapor para
testar fármacos e vacinas, tendo em vista o
«mercado» dos países mais desenvolvidos,
os únicos capazes de gastar dezenas de
milhões em troca de uma segurança por
vezes ilusória, como se viu com o vírus
HN1 (da gripe aviária).
Se um remédio eficaz for descoberto
em breve não chegará a tempo para salvar
milhares de pobres africanos porque não
há indústria capaz de o produzir em grande escala e a preços acessíveis. De momento, a OMS estuda todas as opções possíveis
(transfusões de plasma sanguíneo, testes
de deteção rápidos e baratos) para baixar a
mortalidade, dos 50% atualmente registados em África para os 20% observados
entre os ocidentais contaminados e tratados nos países de origem.
Entretanto, os especialistas insistem
sobre a necessidade de adaptar a luta contra a epidemia às condições específicas dos
países afetados porque nada poderá ser
Os confrontos violentos
podem multiplicar-se
à medida que os mortos
aumentam e a situação geral
se degrada nos países
mais afetados
feito sem a cooperação das populações e
muito menos contra elas.
O epidemiologista britânico David
Heymann recorda que as epidemias anteriores de ébola ou de outros vírus da mesma estirpe foram extintas quando estavam
circunscritas a comunidades relativamente
isoladas, mais organizadas e coesas, onde
as autoridades locais dispõem de um verdadeiro poder. Foi o que aconteceu em
Angola em 2004 e está a acontecer agora
na República Democrática do Congo,
onde o surto epidémico ocorrido em
agosto está em vias de ser controlado depois de causar quatro dezenas de mortos.
As condições são radicalmente diferentes nas grandes metrópoles africanas
como Freetown e Monróvia, onde além
da promiscuidade e da situação sanitária
catastrófica, todo o tipo de obstáculos –
culturais, linguísticos, religiosos ou políticos – tornam a comunicação mais difícil.
É, no entanto, possível atenuar os sentimentos de injustiça e de revolta e melhorar
as relações entre a população e as equipas
sanitárias com bom senso, respeito e compaixão pelas vítimas.
Para isso é preciso implicar mais as
personalidades com autoridade moral no
seio das comunidades e as mulheres (que
representam mais de 60% das vítimas); insistir sobre o facto de que o ébola não é um
«castigo» ou uma fatalidade, mas uma
doença, nem sempre mortal, e que uma
boa alimentação e a limpeza individual e
coletiva são as melhores armas para travar a
epidemia. Os centros de isolamento devem
deixar de ser vistos como prisões onde os
reclusos «desaparecem» sem deixar rasto,
dando lugar às mais loucas especulações.
A entrega dos corpos às famílias, devidamente desinfetados e amortalhados, para
reduzir o risco de contágio é uma medida
que está a ser aplicada com sucesso em Conacri pela Cruz Vermelha guineense.
É urgente, sobretudo, uma mobilização geral para fazer chegar comida, água
potável e assistência básica às populações
«em risco». E África deve dar provas de
solidariedade efetiva, em vez de sucumbir
à paranoia de segurança que prevalece
atualmente no Ocidente e que, como adverte agora a OMS, poderá ser mais mortífera do que o próprio vírus.
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– novembro 2014
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53
são tomé e príncipe
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Fragmentação do MLSTP e arroz
facilitaram vitória expressiva do ADI
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A expressiva vitória do Ação Democrática Independente nas
eleições legislativas e autárquicas está ainda a ser objeto de análise
por forças políticas, observadores e analistas. Entretanto, houve
denúncias de alguns fenómenos anormais, como o levantamento
dias antes de cerca de dois milhões de dólares e a compra massiva
de cartões de eleitores. Os observadores internacionais deram,
contudo, visto bom ao complexo processo eleitoral.
Juvenal Rodrigues SÃO TOMÉ
A
dimensão da maioria absoluta
do ADI para a renovação do
Parlamento nacional surpreendeu. De acordo ainda com os resultados
provisórios anunciados pelo presidente
da Comissão Eleitoral Nacional, Victor
Correia, a Assembleia é renovada com 33
assentos do ADI; 16 do MLSTP/PSD; 5
do PCD e, pela primeira vez; 1 da UDD.
54
novembro 2014 –
África21
A abstenção rondou os 28%. Os partidos
e os analistas estão ainda a tentar perceber
as causas profundas para tirar lições.
Para alguns analistas, o golpe fatal foi a
fragmentação do MLSTP/PSD. Da cisão
surgiram duas formações: o Partido da Estabilidade e Progresso Social (PEPS) e a Plataforma Nacional para o Desenvolvimento de
São Tomé e Príncipe (PND/STP).
Segundo os dados disponíveis, os votos somados das três forças permitiria ao
MLSTP chegar a pelo menos 20 deputados. Com a agravante de que nenhuma
das duas novas forças conseguiu assento na
próxima assembleia. Surgiram há poucos
meses, no período pré-eleitoral. Não tiveram tempo de se afirmar.
O erro estratégico dos mentores desta
divisão foi acreditar que a dispersão de
votos evitaria maiorias absolutas e obrigaria à formação de um governo de coligação, em nome da estabilidade política,
tema central do escrutínio. Esqueceram-se, contudo, que a contagem pelo método d’Hondt favorece os que concentram
maior número de votos.
Por outro lado, a penalização dos três
partidos que suportaram o XV Governo
Constitucional já se desenhava há algum
tempo, porque individualmente trabalharam pouco ao longo dos cerca de dois anos.
Argumento: falta de dinheiro. Observadores atentos faziam outra leitura: falta de
imaginação, porque esperavam capitalizar,
sobretudo, o desempenho do Governo.
Na atual conjuntura, o Executivo liderado pelo primeiro-ministro Gabriel Costa
teve várias dificuldades. O primeiro obstáculo foi não tomar contacto rapidamente
com os dossiês. O XIV Governo liderado
por Patrice Trovoada, após a queda por
moção de censura e ter inviabilizado a formação de outro governo do ADI com outra
figura como primeiro-ministro, não fez a
transferência de pastas. Até discos rígidos de
computadores das instituições ficaram
completamente limpos.
Foi através de terceiros que o novo
governo se inteirou de alguns projetos
importantes. Tudo isso passou-se e, até
agora, sem qualquer consequência ou responsabilização judicial, apesar das denúncias feitas pelo chefe do Governo cessante
no Parlamento e as resoluções adotadas
pelo poder legislativo.
O golpe fatal do MLSTP/
PSD foi a cisão do partido do
poder, de onde surgiram duas
novas formações partidárias
Tomando-se em consideração que as
referências feitas na campanha ao comportamento da bancada do ADI em abandonar o Parlamento e protagonizar cenas de
pugilato e insultos no hemiciclo pelos partidos que garantiam a sustentabilidade parlamentar ao Governo não tiveram qualquer
efeito no eleitorado, pode ser uma indicação de que a maioria dos votantes identificou-se com esses comportamentos, reafirmando que o país vive uma profunda crise
de valores.
O terceiro fator, a impossibilidade do
Executivo em cumprir atempadamente
as promessas feitas a alguns setores sociais
desfavorecidos, como a concessão de créditos a pequenos empreendedores, palaiês (vendedoras de peixe) e pequenos
agricultores; e a renovação da frota para
os taxistas. Este assunto foi objeto de alguma tensão entre o Executivo e os partidos da coligação.
A promessa da redução do preço do
arroz para 13 mil dobras (cerca de um dólar) o quilo, um produto que o país não
produz, também exerceu a sua influência.
Foi tema musical da campanha do ADI.
A franja da população mais pobre entende
que este preço favorece-a mais do que
comprar produtos locais como banana e
fruta-pão para a sua dieta alimentar.
O alerta feito pelos candidatos a primeiro-ministro no último debate organizado pela
televisão local, segundo o qual este preço só
seria possível com a doação feita pelo Japão,
caiu em saco roto.
Devia-se, por outro lado, ter em conta a
situação dos privados que comercializam
este produto. A propósito, o partido vencedor explorou também a polémica que estalou sobre a qualidade deste cereal importado feito por um privado e dirigente do
PCD. O arroz japonês só permanece no
mercado durante três meses. Este já é um
desafio para o novo Governo: cumprir a
promessa de manter o preço do arroz naquele nível durante todo o ano.
Seja como for, quem vencesse as legislativas conquistaria por arrastamento as autárquicas. Foi a primeira vez que se realizaram eleições simultâneas no país.
Nas autárquicas, o ADI venceu bem
em quatro câmaras. Em Lobata registou-se
um empate técnico entre o MLSTP e o
ADI, mas o primeiro poderá liderar o distrito com o apoio do PCD. A exceção foi
Caué em que o MLSTP/PSD venceu.
Na Região Autónoma, os principenses
sabiam o que queriam. A União para a
Mudança e o Progresso do Príncipe mantém a hegemonia, embora com uma pequena oposição, devido à aplicação do método d’Hondt. Dos sete mandatos, dois
foram para o MLSTP/PSD.
Reações
Os responsáveis das principais formações
derrotadas felicitaram o ADI e o seu líder
pela vitória eleitoral. Para Patrice Trovoada,
«assistimos a uma clarificação da situação
política através do voto determinante da
maioria dos santomenses a favor do ADI.
Gostaria neste momento de chamar a atenção de todos, do ADI e da classe política
santomense sobre essa grande responsabilidade que recai sobre os nossos ombros».
«Numa campanha em que foram apresentados candidatos a primeiro-ministro,
eu percebo que recai sobre os meus ombros
uma grande expectativa, por parte de todos
os santomenses que depositaram a sua
confiança em mim. Volto a afirmar que
serei o primeiro-ministro de todos os santomenses», acrescentou.
A promessa da redução
do preço do arroz para um
dólar o quilo, um produto
que o país não produz, foi
tema de campanha do ADI
O presidente do MLSTP/PSD prometeu, por sua vez, que o seu partido «estará
sempre na vanguarda na defesa dos interesses do povo de São Tomé e Príncipe», apesar de ter perdido as eleições. Jorge Amado
anunciou que irá convocar um congresso
extraordinário, após a avaliação dos resultados eleitorais.
O MDFM/PL, que lamenta o resultado obtido, fez o seu congresso a 26 de outubro para «eleger o novo presidente e, consequentemente, em função dos estatutos do
partido, os demais membros da sua direção
central». É quase certo que haverá limpeza
nos órgãos diretivos. Alguns nomes sonantes dos liberais teriam saltado para o ADI.
Segundo o presidente do PCD, os resultados ficaram aquém das expectativas.
Xavier Mendes denunciou «a compra de
cartões dos eleitores», um «fenómeno» que
na opinião do seu partido «deve ter concorrido para que os resultados fossem esses».
Patrice Trovoada tinha, por sua vez,
acusado os partidos do arco da governação
de terem levantado dias antes cerca de dois
milhões de dólares.
Porém, para a CEN, há muito que
não se assistia a «essa afluência, essa teimosia das pessoas em quererem votar. Se
houve banho, ele foi muito disfarçado.
Aos poucos vamos tirar esse fardo que
mancha as nossas eleições», comentou
Victor Correia.
Estabilidade e governação inclusiva
são algumas das expressões mais ouvidas
nos últimos dias. A sua materialização?
Esperar para ver!
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novembro
outubro
2014
2014
–Á
–Á
frica
frica
21
21
A crónica de Conceição Lima
O que fazer desta vitória?
O
promessa de que o arroz doado pelo Japão seria
partido Ação Democrática Independente
vendido à população por 13.000 dobras (menos de
venceu com maioria absoluta as legislativas de
um dólar), caso vencesse as eleições.
12 de outubro em São Tomé e Príncipe, conquisSimultaneamente, foi dando indicações de que
tando 33 dos 55 assentos na Assembleia Nacional.
o ADI governaria de forma inclusiva, mobilizando
A robustez da vitória estendeu-se às autárquicas,
competências e respeitando a esfera de atuação de
tendo o partido de Patrice Trovoada juntado às câcada órgão de soberania.
maras de Água Grande e de Mé-Zóxi
O ADI venceu as eleições e vai
as de Cantagalo e Lembá.
reassumir as rédeas da governação em
São Tomé e Príncipe ficou, liteSão Tomé e Príncipe. Pediu e obteve
ralmente, colorido de azul e amarelo,
a maioria absoluta com um conforto
antecipando um novo ciclo cujos eialém, quiçá, das suas próprias expectaxos e contornos são aguardados com
tivas. À sua espera está um país ainda
expectativa. Numa primeira leitura,
crispado por divisões partidárias e
os resultados do escrutínio de 12 de
querelas personalistas agravadas pelo
outubro favorecem a estabilidade goclima de campanha.
vernativa, tão reclamada por todos os
Um país que quase não produz e
atores políticos como pressuposto
cujos orçamentos dependem, em mais
para o continuamente adiado [email protected]
de 80%, da assistência estrangeira. Um
volvimento do arquipélago.
país em que 50% da população vive abaixo da linha
Pela sua envergadura, o triunfo do ADI aponta para
de pobreza e 15% em pobreza extrema, com uma
o cumprimento da legislatura, interrompendo o padrão
taxa de desemprego juvenil a rondar os 29%.
da II República que não viu um só dos seus sucessivos
Que farão Patrice Trovoada e o ADI com esta
governos encerrar o mandato de quatro anos.
vitória?
O desfecho destas eleições representa um triunfo
pessoal de Patrice Trovoada, regressado a São Tomé
em período legal de campanha, pondo fim a um
autoimposto exílio iniciado logo após o derrube, no
parlamento, do XIV governo constitucional por ele
liderado. O fervoroso acolhimento popular de que
foi alvo à chegada não tem precedentes próximos e
sugeriu que os que o condenaram como general cobarde fugitivo do campo de batalha não estavam em
sintonia com o eleitor comum.
Tendo pairado, como um espectro sobre a vida
política do país, Patrice Trovoada explorou incessantemente, a partir de Lisboa, a queda do seu minoritário e intransigente governo como um assalto
ao poder por forças não legitimadas pelo voto popular. Num tabuleiro fragmentado e algo cacofónico,
definiu os termos da contenda: ADI contra todos.
Diabolizou preferencialmente o Presidente da
República, Manuel Pinto da Costa, a quem acusou
de apadrinhar as forças políticas adversárias, agindo
não como árbitro, mas sim como jogador.
Pediu oito anos para transformar São Tomé e
Príncipe no Dubai de África. E fez reverberar a
Aqueles que condenaram Patrice
Trovoada como um general
cobarde fugitivo do campo
de batalha não estavam em sintonia
com o eleitor comum
África21– novembro 2014
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guiné - bissau
A construção da democracia é incompatível com violência política,
instabilidade institucional e atraso socioeconómico, que marcaram os
últimos vinte anos do país. Esta é uma das conclusões que se podem extrair
de três dias de intervenções e debates em outubro.
Almami Júlio Cuiaté Bissau
Os desafios da democracia
S
inal dos novos tempos, da normalização
institucional após as eleições gerais de abril/
maio, que puseram termo ao regime de transição, o centro de gravidade da política deslocou-se
para o Parlamento, que numa iniciativa muito rara
nestas paragens, abriu as portas a líderes partidários,
académicos, autoridades religiosas, especialistas de
questões jurídicas, militares, agentes económicos,
promotores sociais e culturais, para um exercício de
reflexão sobre uma dúzia de temas, agrupados em
três painéis: «O Estado, a prática política e as ideias»,
«Nação, sociedade e democracia», e finalmente «Que
Constituição para a Guiné-Bissau?».
O ponto de partida foi o ano das primeiras eleições gerais multipartidárias, em 1994, embora a liberalização política de facto tenha começado nos finais
dos anos 80, em consequência das mudanças que se
seguiram à queda do Muro de Berlim. É certo que
ninguém tem saudades do monolitismo, da ausência
de liberdade e da penúria material da era do partido
único. Porém, os guineenses também não estão satisfeitos com a fragilidade das instituições, a falta de
autoridade do Estado e a péssima qualidade de vida
da larga maioria da sociedade, que se seguiram ao
advento do liberalismo económico e do pluralismo
político. O que está mal? De quem é a culpa? Será de
certas lacunas e ambiguidades da Constituição de
1984, apesar das suas sucessivas alterações, ou o problema reside na sua interpretação e aplicação? Ou a
democracia simplesmente não é viável num território
onde medra a pobreza quase absoluta, como disse
um deputado e conhecido empresário?
A reforma destinada a acabar com a agitação
nos quartéis e a submeter os militares ao poder político é suficiente para apaziguar duravelmente o
país, libertar as energias para a modernização e desenvolvimento da economia? O que mais tem de
mudar, e como? Nenhuma destas questões é uma
58
novembro 2014 –
África21
novidade, mas pela primeira vez muitas cabeças-pensantes juntaram-se em simultâneo num lugar
tão solene como o salão da plenária da Assembleia
Nacional Popular, para um diagnóstico, que embora não sendo definitivo, teve o mérito de recolocar
estes assuntos no centro das preocupações nacionais, para que sejam encontradas em tempo útil as
soluções que merecem, o que permitiria ajustar a
democracia guineense às exigências, cada vez mais
urgentes, da sociedade atual e futura.
Para o efeito, uma série de medidas estão na forja
e suscitam muita esperança. Grande parte delas são
iniciativas do Parlamento ou passarão pelo crivo dos
deputados. Há consenso de que a prioridade das
prioridades, se assim se pode dizer, é a reforma do
setor de Defesa e Segurança. Tem enormes custos financeiros, porque implica garantir o fundo de pensões e a reinserção social dos desmobilizados, e também mexe com a estabilidade geral, uma vez que
requer a aposentação de toda uma geração de militares e ex-combatentes, cujas vidas se confundiam com
a própria história e existência da Guiné-Bissau. Aqui,
tal como na reforma da justiça, outra obra que não
pode esperar e que condiciona tudo o resto, é fundamental um corte com o passado.
A nomeação, em setembro, de um novo chefe de
Estado-Maior General das Forças Armadas, com um
perfil mais republicano e tecnicamente mais preparado, é um primeiro passo neste sentido, mas não basta.
E o mesmo se pode dizer do recém-indigitado Procurador-Geral da República, Hermenegildo Pereira,
um magistrado de reputação imaculada, que vai ter
de navegar num mar de dificuldades e carências, de
toda a administração pública. Isto levanta a questão
da vulnerabilidade do Estado, da sua capacidade para
gerar os recursos indispensáveis ao seu próprio funcionamento, um problema que continuará ainda por
resolver em todos as esferas de atividade, enquanto
ARQUIVO ÁFRICA21
A reforma da Defesa
é uma das prioridades
do novo Governo
não for levada até às últimas consequências a tão
propalada reforma da administração do Estado.
Presidencialismo ou semipresidencialismo?
Outra tarefa identificada pela maioria dos analistas
locais como sendo não menos crucial para impulsionar o sistema democrático e estabilizar de vez o país,
e que foi aflorada por diversos intervenientes no colóquio, é a revisão da atual Constituição. Desde a V
Legislatura (1994/99, a primeira multipartidária e
que foi prolongada por causa da guerra civil) que estão em curso tentativas para tal, sem sucesso. A comissão criada para o efeito concluiu o trabalho em
1999 e enviou o decreto para promulgação ao então
Presidente interino, Malam Bacai Sanhá, que não o
rubricou, e passou a batata quente ao seu sucessor
eleito, Kumba Yalá, já noutra legislatura, e com outra
comissão, que introduziu algumas emendas no decreto de 1999, que de um modo geral limitavam alguns dos poderes presidenciais. Kumba colocou o
decreto na gaveta e não o assinou, até à sua queda em
setembro de 2003.
A situação não mudou com os Chefes de Estado
que se seguiram, o general Nino Vieira e novamente
Bacai Sanhá, que morreram ambos antes do fim dos
respetivos mandatos. Nova comissão de revisão foi
criada, na VIII Legislatura, mas as suas recomendações não passaram disso mesmo, porque o golpe de
força de abril de 2012 veio interromper o seu mandato. Resta saber o que se passará daqui em diante.
Tanto mais que a revisão do início dos anos 90, que
abriu caminho ao multipartidarismo, consagrou, no
aspeto relativo à organização do sistema de poder,
um semipresidencialismo de pendor presidencial (o
Chefe de Estado pode presidir ao Conselho de Ministros quando achar conveniente), que para alguns
estudiosos é fonte das tensões que sempre se verificaram nas relações entre a Presidência e o Executivo.
Alguns especialistas consideram que este bicefalismo, num contexto de disputa pelo poder, e a diferente leitura que os atores políticos fazem da lei
magna guineense, é a causa número um dos conflitos
e da crónica instabilidade do país, cuja expressão
máxima foi a guerra civil de junho de 1998/maio de
99. Depois deste colóquio dos Vinte Anos da Democracia, parecem estar criadas as condições para se
aprofundar a questão e colocar sobre a mesa a escolha
entre o regime presidencialista, dominante na África
Ocidental (só a Guiné-Bissau e Cabo Verde são exceção) e o semipresidencialismo.
Para outros observadores, o problema não reside
aqui, e entendem que a origem do «mal» da democracia guineense está na governação, como defendeu
o atual primeiro-ministro, Simões Pereira, não basta
ser eleito e possuir maioria. O exercício do poder
deve ser dialogante, partilhado e inclusivo, com responsabilização e prestação de contas, o oposto do que
tem sucedido até aqui. Outros, finalmente, acham
que a verdade e a reconciliação nacional, que vai ser
objeto de uma conferência em 2015, são o caminho
mais indicado para a redenção da democracia na
Guiné-Bissau.
Os guineenses
não estão
satisfeitos com
a fragilidade
das instituições
e a falta
de autoridade
do Estado
África21– novembro 2014
59
áfrica do sul
DR
Ao baixar as previsões
de crescimento de 2,7%,
estabelecidas em fevereiro,
para uns meros 1,4% do PIB,
o novo ministro das Finanças
da África do Sul, Nhlanhla
Nene, traçou um quadro
austero quando em outubro
fez o seu discurso intercalar
sobre o orçamento
Gaye Davis JOANESBURGO
Alerta
vermelho
à economia
J
á destronada pela Nigéria como
maior economia de África, o crescimento anémico da África do Sul
coloca o país muito atrás dos mercados
dos seus parceiros emergentes. A situação deve-se, em grande parte, a desequilíbrios estruturais, políticas globais hesitantes, mas resulta também de agressões
internas autoinfligidas, de que são
exemplo a incoerência política e os tumultos laborais no setor mineiro.
Ao fazer o seu discurso intercalar sobre
o orçamento, Nhlanhla Nene, que substituiu Pravin Gordhan na pasta das Finanças na remodelação governamental após as
eleições de maio, disse que a África do Sul
se encontra «num ponto de viragem» e
que «a consolidação não pode ser adiada».
60
novembro 2014 –
África21
Nhlanhla Nene, ministro sul-africano das finanças
O Plano de Desenvolvimento Nacional indica que é necessário um crescimento de 5% do PIB se o país quer dar
resposta convenientemente aos problemas de pobreza, desemprego e desigualdade. Mas um crescimento mais baixo
significa que o Governo sul-africano
tem gasto mais do que pode obter em
receitas. O défice do orçamento é atualmente de 153 mil milhões de rands
(cerca de 14 mil milhões de dólares).
O Tesouro estima que este possa aumentar para 2,4 biliões de rands (220
mil milhões de dólares) em 2017/2018,
ou seja, 45,9% do PIB.
Os passos anunciados pelo ministro
das Finanças para emagrecer o orçamento incluem a manutenção das despesas
públicas nos níveis atuais e possíveis aumentos de impostos, quando apresentar
o próximo orçamento em fevereiro.
Nene reiterou que o apoio do Governo aos pobres – incluindo os quase
17 milhões de pessoas que dependem de
subsídios sociais – não ficará comprometido. «Não iremos equilibrar o orçamento à custa dos pobres», afirmou.
Aos sindicatos da função pública,
cujas exigências de aumento de ordenados forçaram o Governo a pedir emprestado para assegurar as despesas salariais,
o ministro disse que os constrangi­
mentos do orçamento irão apenas permitir os aumentos necessários a contrabalançar o custo de vida. «Nas presentes
circunstâncias económicas, é especial-
mente importante manter um equilíbrio cuidadoso entre as despesas com o
pessoal e outros recursos exigidos pelo
funcionamento da administração pública». Isto pode levar a um desentendimento com os sindicatos, que estão a
pedir um aumento de 15% mesmo antes das negociações previstas para março próximo.
Nhlanhla Nene anunciou também
uma injeção de capital de 20 mil milhões de rands (1,8 mil milhões de dólares) na Eskom, a empresa paraestatal
que produz e distribui toda a energia
elétrica do país, dizendo que esse montante será angariado através da venda de
bens públicos não-estratégicos, que ele
se recusou a identificar.
O aliado político do ANC, a federação de sindicatos COSATU, mostra-se
ideologicamente oposta à privatização e
isto pode constituir outro ponto de
conflito.
A Eskom está a tentar financiar um
programa massivo para construir novas
centrais de produção com o objetivo de
ajudar a resolver a crise da energia e
apoiar a economia. Mas os custos necessários excedem em muito as suas receitas. O Governo pretende que a empresa
consiga cobrir o seu défice orçamental
Nhlanla Nene garante
que o apoio governamental
aos pobres, incluindo
os 17 milhões de pessoas
que dependem
de subsídios sociais, não
ficará comprometido
sem aumentar demasiado as tarifas da
eletricidade.
O ministro deixou bem claro que
não haverá novas garantias de dívida
para empresas paraestatais descapitalizadas, incluindo a companhia aérea
nacional, a SA Airways, que está igual-
mente em dificuldades financeiras e
cuja administração enfrenta períodos
conturbados.
Em março, a rede elétrica do país
estava sob uma tensão tão grande, que a
Eskom teve de agendar quebras de funcionamento do serviço (apagões), pela
primeira vez desde 2008, para prevenir
que a rede colapsasse, o que evidenciou
um equilíbrio fraco entre fornecimento
e procura de energia.
Apesar das greves laborais e de uma
fraca força de trabalho terem atrasado a
construção de novas centrais, as primeiras seis unidades de Medupi deverão começar a produzir energia em
dezembro.
O discurso do ministro das finanças
não fez referência à intenção do Governo de construir um conjunto de centrais nucleares, ou ao recente acordo
assinado com a Rosatom, agência nuclear pública da Rússia. Especialistas
do setor industrial indicam que o investimento seria de cerca de um bilião
de rands (cerca de 91 mil milhões de
dólares), o que os críticos dizem ser
demasiado dispendioso.
Crise na economia e na política
Partidos políticos e analistas receberam
com agrado o diagnóstico austero de
Nene, mas de imediato surgiram perguntas sobre se os burocratas do Governo irão de facto aplicar os cortes pedidos
pelo ministro. Pergunta-se igualmente
se o Executivo terá vontade política para
enfrentar a COSATU, quando tiverem
lugar as discussões salariais no próximo
ano.
A degradação económica da África
do Sul ocorre numa altura em que o
ANC está sob pressão política. As eleições locais previstas para 2016 podem
resultar numa perda de algumas das
maiores cidades do país, incluindo Joanesburgo e Tshwane (Pretória) na província de Gauteng, onde o apoio ao
ANC registou uma queda nas eleições
nacionais de maio.
Em setembro, os ladrões de cabos de
cobre desencadearam uma crise que
Jacob Zuma está sob
pressão devido aos 22,5
milhões de dólares
em fundos públicos
gastos na sua casa pessoal
deixou largas faixas de Gauteng – centro
económico do país – sem água durante
quase três semanas. A situação foi agravada por falhas de gestão em assegurar
planos de emergência para manter os
reservatórios cheios, e enfatizou a ligação entre a eletricidade e o fornecimento
de água.
Entretanto, o Presidente Jacob Zuma
está igualmente sob pressão devido aos
246 milhões de rands (cerca de 22,5
milhões de dólares) em fundos públicos
gastos na sua casa pessoal em Nkaldla no
KwaZulu Natal. A transformação de
uma moradia rural relativamente modesta numa luxuosa mansão com piscina, clínica, heliporto e um bunker ligado
por elevadores e passagens às habitações
superiores, não passou despercebida aos
eleitores.
O provedor de justiça independente,
Thuli Madonsela, indicou que Zuma
deve pagar uma parte do dinheiro pago
em serviços que não estejam diretamente relacionados com a sua segurança,
mas o Presidente tem afirmado veementemente que não conhecia os detalhes
do que estava a ser feito e não entende
por que razão deve pagar. O seu arquiteto pessoal, Minenhle Makhanya, pode
ser multado em 155 milhões de rands
(cerca de 15 milhões de dólares).
O Presidente sul-africano enfrenta
ainda um recurso judicial da decisão,
tomada antes das eleições de 2009 que o
levaram ao poder, de retirar mais de 700
acusações de extorsão, fraude e corrupção contra si. As acusações foram retiradas por se ter considerado que Zuma
teria sido prejudicado no processo devido a interesses políticos que teriam manipulado a situação contra si.
Tradução de Teresa Souto
África21– novembro 2014
61
médio oriente
A batalha de Kobani e o orgulho
Desde agosto, a batalha pela cidade síria de Kobani,
sitiada pelos jiadistas do Estado Islâmico, desvia as
atenções da imprensa internacional do que acontece
no resto da Síria, do Iraque e do Próximo Oriente.
A questão curda incomoda o Ocidente e revela as
fragilidades e incoerências da coligação liderada pelos
Estados Unidos.
Nicole Guardiola
V
«
oava para o Oriente complicado com
ideias simples», confessou o ex-Presidente
francês Charles de Gaulle nas suas Memórias. O mesmo poderiam dizer, se fossem sinceros,
muitos enviados especiais e comentadores políticos.
O mosaico de povos, etnias, religiões, tribos e ideologias que constituem o Próximo Oriente, o Levante dos românticos e berço das três religiões monoteístas, modelado por milénios de história e
remodelado pelas potências colonizadoras ao longo
do século XX é definitivamente irredutível a um
punhado de «ideias simples».
A mais comum destas simplificações consiste
em considerar o «povo curdo» de 40 milhões de
membros como uma entidade única, animada do
desejo comum de construir o seu próprio Estado,
solidária apesar das circunstâncias históricas que
repartiram os curdos entre quatro dos Estados
criados pelas potências colonizadoras do Próximo Oriente após a I Guerra Mundial e o desmembramento do império otomano – a Turquia,
onde representam cerca de 20% da população,
Iraque (17%); Síria (10%) e Irão (7%).
Se há efetivamente uma identidade curda forte, esta não se construiu no vazio mas em interação
com os outros povos da região. Não árabes – como
turcos e persas – os curdos foram como eles islamizados no século VIII e integrados nos sucessivos
califados até à criação do império otomano; são
maioritariamente sunitas (80%) mas incluem minorias fiéis a todas as religiões pré-islâmicas (maniqueístas, zoroastristas, yazedis, judeus e cristãos).
A sua língua, e maior traço de união, pertence ao
mesmo grupo indo-europeu que as línguas persas;
com variações regionais, escreve-se em três alfabetos: latino, cirílico e árabe.
A sua relação com os regimes dos países onde
foram integrados foi sempre determinada pelo
seu estatuto de minoria e pelo maior ou menor
grau de reconhecimento da sua identidade cultural, alternando períodos de relativa bonança com
perseguições e massacres. Estas opções políticas
criaram diferenças entre curdos turcos, iranianos,
iraquianos ou sírios e, por vezes, divisões e conflitos no interior de cada comunidade (o Curdistão
iraquiano, sob proteção internacional desde a
A relação dos curdos com
os regimes dos países onde foram
integrados foi sempre determinada
pelo estatuto de minoria
62
novembro 2014 –
África21
curdo
Mas o Ocidente não achou oportuno intervir
para salvar Kobani quando os mesmos jiadistas
cercaram a terceira maior cidade curda síria,
fronteiriça com a Turquia.
Desde 16 de setembro, algumas centenas de
combatentes do PYD (Partido da União Democrática) de Salih Muslim, dos quais um terço de mulheres,
defendem pé a pé e casa por casa a cidade contra os
islamistas do EI, poderosamente armados com material capturado ao exército iraquiano após a tomada de
Mossul. A menos de um quilómetro, os blindados
turcos observam o desenrolar da batalha, filtrando os
civis sírios que fogem dos combates e tratando de
impedir os voluntários, curdos e não só, que se infiltram através da fronteira para ir lutar ao lado dos seus
«irmãos» de Kobani. Para o Presidente turco Recep
Tayyip Erdogan, que recusou participar na coligação
anti-Estado Islâmico, este e o PYD são farinha do
mesmo saco, duas organizações terroristas.
A queda de Kobani era tida como inevitável e
talvez desejável (o secretário de Estado norte-americano John Kerry disse que a cidade não tinha importância estratégica, e a França considerou
que intervir na Síria contra os jiadistas fortaleceria
o regime de Damasco) mas a heroica resistência
dos defensores de Kobani acabou por vencer.
O presidente do Curdistão iraquiano, Massud
Barzani, apelou à intervenção internacional e os EUA
começaram a envolver-se na batalha arrastando consigo os «aliados» árabes, primeiro com bombardea-
O Ocidente
não achou
oportuno intervir
para salvar
Kobani quando
os jiadistas
cercaram
a terceira
maior cidade
curda síria
AHMET OKATALI/ANADOLU AGENCY/AFP
primeira guerra do Iraque, foi palco entre 1994 e
1998 de uma guerra civil entre seguidores do
Partido Democrático do Curdistão (PDK), de
Mustafa Barzani, e da União Democrática do
Curdistão UPK de Jalal Talabani).
Estas divergências políticas, que os vários regimes da região e os respetivos aliados procuraram sempre manipular para dividir os curdos e
impedir a concretização do seu sonho de «Grande Curdistão» independente, foram agravadas
pelas guerras do Iraque, a queda de Saddam
Hussein e a guerra civil síria.
A segunda ilusão consiste em pensar que os
ódios e alianças variáveis, forjados ao longo de um
século à volta da «questão curda», desapareceriam
de um dia para o outro face ao surgimento do
chamado Estado Islâmico (EI) e à organização,
pelos Estados Unidos, de uma «grande coligação»
contra a «barbárie jiadista». O formidável (e escandaloso) imbróglio suscitado pela «batalha de Kobani» provou precisamente o contrário.
Quando depois de conquistar parte da Síria,
e de lançar em agosto uma grande ofensiva no
Iraque, o EI avançou contra Erbil, a capital do
Curdistão Iraquiano, os seus campos petrolíferos
e os oleodutos que levam o crude até à Turquia,
os Estados Unidos e os europeus, encabeçados
pela França, reagiram de imediato. Era preciso,
disseram, evitar um «genocídio» iminente dos
cristãos e dos yazedis pelos jiadistas.
África21– novembro 2014
63
SAFIN HAMED/AFP
O Presidente francês François Hollande e o Presidente do Curdistão Iraquiano, Massud Barzani, numa conferência de
imprensa conjunta
mentos (23 de setembro) e, um mês mais tarde, fornecendo armamento e material médico aos
defensores de Kobani.
Só a Turquia se mantém de pedra e cal, criticando as iniciativas americanas e negando a utilização da
base da NATO de Incirlik pelos aviões da coligação.
Para Erdogan, o PYD é um braço do PKK (Partido
dos Trabalhadores Curdos) com o qual esteve em
guerra durante 30 anos, e apesar do frágil processo de
reconciliação iniciado em 2013 devido ao apelo de
Abdullha Oçalan – líder histórico do PKK, o «Nelson Mandela dos Curdos» preso desde 1999 –, ajudar o PYD equivale a reforçar os «terroristas» do PKK
e desestabilizar a Turquia.
A Turquia diz alto e bom som o que muitos
aliados dos EUA na região também pensam: que há
curdos «bons» e «maus» e que não devem ser tratados
todos da mesma forma. O protótipo do curdo «simpático» é Massud Barzani, atual presidente do Curdistão Iraquiano, amigo do Ocidente, de Erdogan e
de Israel, e inimigo jurado do Irão e dos xiitas iraquianos no poder em Bagdade, que se faz chamar «pai dos
curdos» e não esconde a ambição de vir a ser o primeiro presidente de um Estado curdo totalmente
independente.
O PYD, que aproveitou a guerra civil na Síria
para criar um embrião de Estado no norte do país,
chamado Rojava, e se declara politicamente independente de Damasco e da oposição síria apoiada pela
Turquia e o Ocidente, tem muitos adversários, mes-
64
novembro 2014 –
África21
mo entre os curdos e na Síria. Mas o pior é que o seu
modelo de «autonomia democrática» aliando socialismo, laicidade, ecologia, feminismo e autogestão
pode constituir, se tiver sucesso, um mau exemplo,
para todos os curdos e os outros povos da região.
Por isso, Ankara quer acabar com o Rojava, deixando o Estado Islâmico fazer a «limpeza»; se não for
possível exige em troca do seu apoio militar que o
PYD rompa as relações com o PKK, reconheça a liderança do PDK de Massud Barzani e coloque os seus
combatentes sob o comando do Exercito Sírio Livre.
Demasiado tarde? Apesar dos entraves turcos,
Kobani resiste e o Pentágono afirma que os curdos
controlam de novo a cidade; cada dia que passa aumenta o prestígio do PYD; o parlamento de Erbil
reconheceu o Curdistão ocidental (Rojava) e deu luz
verde ao envio de peshmargas (tropas curdas iraquianas) para Kobani através da Turquia; os Estados
Unidos já falam diretamente com o PYD, considerando-o um ator incontornável da guerra contra o
Estado Islâmico.
Na Turquia e na diáspora, a juventude curda
ferve de admiração pelos heróis de Kobani; a atitude
de Erdogan provocou manifestações de protesto que
degeneraram em confrontos com a polícia e um saldo
de dezenas de mortos. Só Oçalan, na sua prisão,
acredita que a crise pode acelerar a solução definitiva
da questão curda. É difícil prever como acabará a
história, mas uma coisa é certa: o nome de Kobani
ficará na história do povo curdo.
Recep Erdogan
recusou
participar
na coligação
anti-Estado
Islâmico porque
considera que
EI e PYD
são duas
organizações
terroristas
FEIRAS NOV 2014
4
4
Transformar a Sociedade Angolana com uma
06 ‐ 09 NOVEMBRO
INSTALAÇÕES DA FILDA
LUANDA
Educação e Formação a Crescer com ela
13 ‐ 16 NOVEMBRO
Lunda - Norte, Terra de Esperança,
a Semente que Germina para o Desenvolvimento do País
DUNDO – FAZENDA CACANDA
LUNDA ‐ NORTE
20 ‐ 23 NOVEMBRO
4ª
INSTALAÇÕES DA FILDA
LUANDA
26 ‐ 29 NOVEMBRO
2º SALÃO INTERNACIONAL DE AGRICULTURA, PECUÁRIA
ALIMENTAÇÃO E FLORESTAS DE ANGOLA
Pela diversificação da Economia, Intensifiquemos
a Produção Agro-pecuária
INSTALAÇÕES DA FILDA
LUANDA
27 ‐ 30 NOVEMBRO
INSTALAÇÕES DA FILDA
LUANDA
FIL - Feira Internacional de Luanda | Estrada de Catete | Km 12 | CP. 6127 Luanda - Angola
INSCRIÇÕES E INFORMAÇÕES: Tel:. +244 926 405 978 / 70 / 923 676 731
(*) Agradecemos recon�rmação - As Feiras e as datas poderão sofrer alteração
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novembro 2014 65
PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
Um plano grandioso para um
país que pensa em grande.
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novembro 2014 –
África21
O Plano Nacional de Desenvolvimento, PND, abrange um
conjunto de acções para incentivar o desenvolvimento
sustentável do sector hoteleiro e turístico no nosso país. São
investimentos que vão garantir uma nova política para o sector,
permitindo o surgimento de uma oferta turística diversificada
que integre praias, património cultural, desporto, ambientes
naturais e lazer. Como resultado, Angola vai aumentar o
número de unidades hoteleiras, incrementando a criação
de empregos no sector e o número de visitantes.
A crónica de José Carlos de Vasconcelos
L
A estupidez como atenuante
de fumo dissolvendo-se no ar parecia não estar a ouvir
embro-me de uma noite, durante a ditadura salanada e se tinha mantido sempre silenciosa, suspendeu
zarista, em que conversando com uns colegas,
o gesto de levar o cigarro à boca e disse, ou disparou:
todos advogados num processo no Plenário – um tri«Inteligentes são os cães».
bunal especial para ‘julgar’, quer dizer: condenar, os
Onde quero chegar, então, é a um dos piores maque combatiam a tirania, e no qual os ‘juízes’ faziam o
les das nossas sociedades, um dos que – se não o que
que a tenebrosa polícia política mandava... –, veio à
– mais afeta a política e certos políticos, assim constifala uma das figuras gradas do regime, cujas malfeitotuindo um verdadeiro «cancro» da democracia; ou,
rias íamos passando em revista. E um dos circunstansob outro ângulo, pela forma como se
tes, ao rol delas acrescentou: «E ainda
propaga e como contamina, um «ébola»
por cima é burro»... Então, de imediato,
da democracia. Refiro-me à corrupção.
notei ou respondi com uma frase que
E também quanto a ela, quanto à ânsia
haveria de repetir muito, e talvez por isso
incontida de um cada vez maior enrime lembre dessa primeira vez em que a
quecimento, sem olhar a meios, nem
disse: «Num fascista, a estupidez não é
olhar à pobreza ou miséria circundanum defeito, é uma atenuante».
tes, creio poder-se dizer o que antes
Claro que, assim sendo, manda a
deixei dito. Também quanto aos corlógica concluir que a inversa também é
ruptos, os que só pensam em aumentar
verdadeira. Ou seja: «Num fascista, a
[email protected]
as suas fortunas fabulosas, explorando
inteligência não é uma qualidade, mas
[email protected]
e enganando os outros, ou pelo menos
uma agravante». O que se aplica ao
ignorando-os, tendo como único objeautor de qualquer crime. E com isto
tivo a satisfação das suas ambições e o próprio jogo
não estou a afirmar, ou sequer insinuar, que os simconstante em que enriquecer cada vez mais se torna,
ples defensores de ideologias ou regimes desse tipo,
também quanto a esses insisto, a estupidez só pode ser
ou de qualquer outro, só por isso devam ser consideuma atenuante e a inteligência uma agravante.
rados criminosos, pelo menos em sentido jurídicoSó que, em matéria de corrupção e fortunas fabulo-penal, mesmo quando essas ideologias e esses regisas, é difícil alguém ir longe sendo burro; e para ir longe
mes de facto o são.
não é preciso ser inteligente mas esperto, ter jeito para
Bom, mas essa é outra conversa e entrar por aí leos negócios & similares – e não ter escrúpulos. Por
var-nos-ia longe. Ora, não estou aqui a escrever um
outro lado, a gravidade dos seus atos e a severa condeensaio curto, antes apenas uma crónica, na qual os leinação que a todos os títulos merecem, cresce quando se
tores já saberão onde quero chegar. Embora uma crótrata de pessoas cujo passado, até cujas lutas travadas a
nica não tenha que chegar a sítio nenhum e algumas
favor de causas justas, criaram a expectativa de que sedas melhores crónicas dos grandes cronistas tenham
riam dignos dele, passado, e delas, lutas, não se transcomo assunto exatamente a falta de assunto... E já
formando em exemplos do pior de sociedades desumaagora que falei em burrice, inteligência e avaliação de
nas, com terríveis desigualdades e injustiças, na selva de
pessoas, recordo uma história que acho excelente e dá
uma economia de casino e de usura.
bem o retrato, num certo aspeto, da personalidade de
um dos maiores poetas de sempre da nossa língua: Sophia (de Mello Breyner Andresen).
A autora do Livro Sexto parecia (quase) sempre
ausente, distante, pouco atenta ao que se passava à sua
volta, pairando. E era de facto muito distraída; apenas, no entanto, no dia a dia e para o acessório. Uma
vez, numa roda de amigos, referindo-se um conhecido político, um deles sublinhou a sua falta de caráter.
A que outro contrapôs – «mas é muito inteligente».
Sophia, que fumando o seu cigarro e vendo as bolas
A corrupção é um verdadeiro
«cancro» da democracia; ou,
pela forma como se propaga
e como contamina,
um «ébola» da democracia
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PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
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Um plano grandioso para um
país que pensa em grande.
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África21
Consolidar a reforma do sector judicial, tornando-o mais ágil e moderno para
garantir o acesso dos cidadãos ao direito e à justiça, é um dos propósitos do
Plano Nacional de Desenvolvimento, PND. Entre os objectivos está o de
assegurar a cidadania plena através da universalização do registo civil
de nascimento e do acesso a documentos básicos como o
bilhete de identidade. Com as acções do PND para esse
sector, mais um milhão e meio de cidadãos e cidadãs
passarão também a ter bilhete de identidade. Para
além de modernizar e informatizar os serviços
notariais, está previsto o aumento do número de
conservadores e notários, bem como o de oficiais de
registo.
AFP
argentina
Um passo em frente
contra os abutres
Pela primeira vez em muito tempo, ou na história da ONU,
os países fracos atuaram em uníssono e perceberam que
a agressão dos grandes especuladores globais – os fundos
abutre – à Argentina era uma agressão a todos. Com a
oposição dos Estados Unidos e dos seus amigos do Norte,
irão agora tentar «domesticar» os «usurários internacionais».
Manrique S. Gaudin BUENOS AIRES
C
om apenas onze votos contra,
a Assembleia-geral da ONU
pôs-se a favor dos mais fracos e
apoiou uma proposta argentina que
promove a criação de um marco jurídico multilateral para regular os processos
de reestruturação de dívida soberana.
Isso aconteceu a 9 de setembro, e teve a
sua origem numa disputa entre o país
sul-americano e um grupo dos chamados «fundos abutre», em que a Justiça
dos Estados Unidos decidiu a favor destes últimos. Mas não é tudo. A 26 de
setembro, outro órgão da ONU, o
Conselho de Direitos Humanos, decidiu «investigar as atividades destes usurários internacionais e as consequências
das suas ações sobre os povos do mundo». Nesta instância, houve cinco votos
contra e, como na primeira, os donos do
derrotado NÃO foram comandados pelos EUA. Nos dois casos, o SIM foi impulsionado pelos países sul-americanos.
Como chegou o tema à ONU? Depois de ter permanecido quatro anos em
estado de cessação de pagamentos (em
default), a Argentina começou, a partir de
2004, a pagar pontualmente aos seus
credores externos. Para tal, tinha chegado
a uma bem-sucedida reestruturação da
sua dívida. Agora, no entanto, e naquele
que poderá ser caso único na história do
capitalismo, um juiz de Nova Iorque
impede o país de continuar a honrar os
seus compromissos. Como tem feito
desde há quase dez anos, a Argentina depositou 539 milhões de dólares no Bank
of New York. Isso correspondia a um dos
pagamentos semestrais acordados com
92% dos credores, e o banco devia enviá-los a cidadãos de todo o mundo que
compraram títulos da dívida argentina e
África21– novembro 2014
69
participaram na sua reestruturação. Mas
o juiz ordenou ao banco que retivesse o
dinheiro. Como quer e precisa de continuar a pagar, a Argentina decidiu recorrer à ONU.
De qualquer forma, é preciso ir ainda
um pouco mais atrás. Este processo que
terminou com semelhante «aberração jurídica», como a qualificou o governo argentino, começara em 2001, quando o
país rebentou após uma década de ortodoxia neoliberal, com endividamento,
privatização de bens do Estado, desregulação da economia e flexibilização do
mercado laboral. Depois de três dias em
que a desobediência civil acabou por ser
acalmada a custo de uma trintena de
Um juiz de Nova Iorque
impede um país de continuar
a honrar os compromisos,
o que poderá ser caso único
na história do capitalismo
mortos, em apenas de uma semana a crise
«comeu» cinco presidentes e o último
dessa série patética decretou o default.
Ao fim de dois anos de um governo
interino, assumiu a Presidência Nestor
Kirchner, que em 2004 convidou os credores a participar num processo de reestruturação da dívida. Desse mesmo processo estiveram ausentes os fundos abutre
à espera de poder reclamar montantes
exorbitantes pelos seus títulos da dívida.
No entanto, a Justiça estado-unidense entendeu que o pedido deles era justo.
O cumprimento da sentença obrigaria a
pagar 1300 milhões de dólares a 1% dos
abutres. Automaticamente, esse montante passaria a ser de 15 mil milhões de
dólares, porque o pagamento deve estender-se a 7,6% dos titulares não reestruturados. Esse valor equivale a 52% das reservas do país. Mas isso não é tudo,
porque o efeito cascata continuaria. Ao
pagar-se os 1300 milhões, dispararia uma
cláusula do acordo assinado com os credores reestruturados, que estabelece que
70
novembro 2014 –
África21
têm direito a que o seu título seja equiparado a qualquer outra oferta melhor que
se faça aos 7,6% que não participaram no
acordo, ou seja, aos fundos abutre. Nesse
caso, a dívida passaria a ser de 500 mil
milhões de dólares, quase 17 vezes as reservas internacionais.
Um país que paga as suas dívidas, que
tem crescido a ritmo sustentável e que
acumulou reservas como nunca, não poderia pagar e entraria em bancarrota.
A proposta de criação de um quadro
jurídico multilateral chegou à ONU
através do G77+China e estabelece que,
à falta de mecanismos apropriados, o
mundo deve intensificar os seus esforços
para prevenir as crises de dívida. No debate ocorrido na Assembleia-geral das
Nações Unidas, pairou um pensamento
expressado dias antes pelo norte-americano Mark Weisbrot, diretor do Centre
for Economic and Policy Research.
O politólogo recordou que «na maioria
dos países existem leis de falência concebidas para permitir que as empresas que
têm dívidas que não podem pagar, possam passar uma borracha e começar de
novo, mas não existe um mecanismo
assim para os países, pelo que os acordos
de reestruturação, como o argentino,
são uma boa forma de resolver problemas de dívida impagáveis». Segundo
Weisbrot, prosseguindo-se o caminho
traçado pela Justiça dos EUA, a sua
sentença teria «um efeito devastador».
Enquanto as resoluções da ONU
recebem apoios inesperados como o do
Fundo Monetário Internacional e do
Banco Mundial, os abutres valeram-se
dos seus bons amigos argentinos para
dar início ao que o Governo chamou «o
plano abutre da destabilização».
A campanha começou a 18 de setembro no diário La Nación e continuou nos
dias seguintes com o seu colega Clarín.
O Governo argentino
estava prevenido sobre
a investida dos abutres
e dos seus amigos locais
As resoluções da ONU
receberam apoios
inesperados vindos
do Fundo Monetário
Internacional
e do Banco Mundial
O primeiro apresentou a impactante manchete «Travão à compra de dólares limita
venda de passagens aéreas». Explicava que
a medida tinha sido tomada pela American Airlines, que «limitou a 90 dias a
compra antecipada de voos a partir de ou
para Buenos Aires» e que «podia seguir-se-lhe empresas de turismo que não querem
ficar com pesos, porque não sabem quando nem a que tipo de câmbio conseguirão
transformá-los em dólares». O discurso
manteve-se apesar da American Airlines
ter continuado a vender bilhetes como
sempre e do Governo ter esclarecido que
não havia restrições para o pagamento de
passagens aéreas nem de pacotes turísticos
e que para esse efeito «vão-se entre 24 a 26
milhões de dólares por dia».
O Governo estava prevenido sobre a
investida dos abutres e dos seus amigos
locais. A Presidente Cristina Fernández
de Kirchner fora avisada pelo ex-secretário do Comércio dos EUA, Carlos Gutiérrez, hoje lobista dos fundos especulativos. Em agosto, antes de se dar a
conhecer no seu novo papel, e para cair
nas boas graças do Governo, Gutiérrez
dissera que os fundos abutre lançariam
um plano que visava desgastar a figura da
Chefe de Estado, difundir uma onda de
rumores para gerar instabilidade económica e contratar jornalistas, políticos e
sindicalistas para que atuassem contra o
Governo. Tudo foi acontecendo como
indicara Gutiérrez, e à tarefa dos media,
somaram-se o dirigente sindical Luis
Barrionuevo e o senador da oposição Ernesto Sanz, que auguraram que «antes do
fim do ano haverá uma explosão social»
(Barrionuveo) e «haverá que ver como
termina o Governo» (Sanz).
Tradução de Teresa Souto
C
M
Y
CM
MY
CY
CMY
K
O SAPO DEU O SALTO.
Quando o SAPO dá o salto a internet dá o salto. Quando o SAPO dá o salto
a tecnologia dá o salto. A informação dá o salto, o país dá o salto, o mundo
dá o salto. O SAPO deu o salto para uma imagem mais moderna, mais
simples de navegar e com novos conteúdos. Vamos todos dar o salto?
DÁ O SALTO EM SAPO.AO
África21– novembro 2014
71
publirreportagem
Chama-se Crystal Solutions, foi fundada há quatro anos e assenta o seu trabalho em três pilares
essenciais: consultoria, serviços e investimentos.
Adriano de Sousa
Fernanda Osório
Há quatro anos a cuidar
da saúde das empresas
Para Pedro da Silva, diretor-geral da Crystal Solutions, uma consultoria corporativa ajuda a potenciar os gestores e as empresas
A
linhar a sensibilidade e o
humanismo que se requerem na medicina, o rigor no
cumprimento das leis, próprio das
ciências jurídicas, e as valências da
economia na prestação de serviços de consultoria não é tarefa fácil. Mas é precisamente esse o desafio da Crystal Solutions. Aliás, é
o que tem desenvolvido desde que
foi fundada há quatro anos. «Pegamos nesses três conceitos para criar uma empresa que apresente soluções inovadoras para a sociedade, e que se rege por uma
conduta de transparência, onde os
72
novembro 2014 –
África21
valores éticos e morais são a base
da nossa personalidade. Achámos
pertinente criar algo que se identifica com aquilo que somos. Criar
ideias claras, ideias que não deixem nenhuma dúvida, mas sempre
olhando para aquilo que é a nossa
realidade», explica Pedro da Silva,
diretor-geral da Crystal Solutions,
quando questionado sobre o surgimento da empresa.
Criada para ser uma empresa
que responde às necessidades das
organizações e dos gestores angolanos, com as suas especificidades próprias, a Crystal Solutions
está assente em três pilares essenciais: consultoria, serviços e
investimentos.
No que diz respeito à consultoria, a empresa fundada por Pedro
da Silva (MBA) e Augusto Maquengo (PhD) prepara projetos para bancabilidade, estudos e análise de viabilidade de investimentos, estratégias corporativas e análise económica e financeira de projetos. Presta
ainda serviços nas áreas de tecnologia e inovação, formação e capacitação corporativa, comercialização
e promoção. A Crystal Solutions dedica-se igualmente à intermediação
financeira em projetos de investimento e em participações.
Tal como um médico que escuta atentamente o paciente, desenvolvem-se trabalhos adicionais sobre os sintomas, e os consultores, dentro do que é legalmente exigido e aceitável, apresentam soluções economicamente viáveis às empresas. Como diz
o próprio diretor-geral, «não há um
formato standard de trabalho, não
há modelos prontos; as soluções
apresentadas ajustam-se à realidade de cada caso».
Na sua opinião, «hoje o empresariado angolano tem concorrentes já com uma capacidade de investimento e de conhecimento
muito elevada. Estamos a falar de
países com anos de tradição. Há
empresas com mais de 100 anos
de existência e com estruturas
muito superiores às nossas. Neste
cenário, pensamos que uma consultoria corporativa ajudaria a potenciar os gestores e as empresas
no sentido de poderem equiparar-se aos concorrentes ou igualá-los. É bem verdade que muitos
empresários vão para fora à procura de parceiros, mas por desconhecimento de algumas práticas e
técnicas inerentes ao próprio negócio entram logo em desvantagem nessas parcerias», defendeu.
Principais serviços
Além de prestar consultoria a inúmeras empresas que atuam no
mercado nacional e internacional, a
Crystal Solutions desenvolveu dois
produtos tecnológicos e inovadores que são um conjunto de três
soluções integradas e interligadas:
a Solução Oscarweb, a Solução
PcCont e Serviços Tecnoconta, direcionadas para as instituições financeiras não-bancárias.
Estas soluções têm contribuído para o melhoramento da eficácia e da eficiência das empresas,
sobretudo das que atuam nesse
ramo.
Apercebendo-se da emissão
por parte do Banco Nacional de
Angola de um instrutivo que obriga
as casas de câmbio a adotar o novo plano de contas das Instituições
Financeiras (CONTIF) e a apresentar as informações operacionais e
contabilísticas em ficheiros eletrónicos em formato XML, a Crystal
Solutions criou uma solução que
atende a essas exigências. É o I’m
Back Office, para o registo dos movimentos diários. Um módulo de
processamento contabilístico que
já se encontra apto para responder
às solicitações do BNA fornecendo, mensalmente, os novos Mapas
de Posição Cambial e, trimestralmente, os Balanços Contabilísticos, segundo as regras do CONTIF,
e envolvendo serviços de contabilidade prestados por técnicos altamente especializados e conhecedores do novo normativo.
Como avançado acima, a solução Oscarweb é, na verdade, um
conjunto de três soluções, que interligadas tornam a vida dos gestores bem mais fácil. Para simplificar: a solução OSCAR é uma solução ERP (Sistemas Integrados de
Gestão Empresarial, do inglês Enterprise Resource Planning) composta
por três componentes integrados
que fazem dela uma solução única no mercado. A OscarWeb (front
office) é uma solução de balcões
que funciona em ambiente web,
com um interface amigo do utilizador e extremamente funcional. Para além das operações de compra
e venda de moeda, a solução de
balcões contempla as várias operações da atividade de uma agência, como sejam os fluxos com outras agências ou ainda a gestão de
fundos de maneio de pagamento
de despesas. Já o PcCont (Back
office) é um software de contabilidade completamente integrado
com a solução OscarWeb que
elimina a duplicação de lançamentos e permite o integral cumprimento dos requisitos do normativo CONTIF.
A interligação do OscarWeb
com o PcCont possibilita que os
movimentos realizados sejam automaticamente integrados na contraparte. Assim é possível uma
gestão efetiva dos valores disponíveis e informação just in time.
No PcCont são ainda realizadas as restantes operações da
empresa de uma forma simples
e intuitiva. Antes da solução da
Crystal Solutions, a maior parte
dos softwares utilizados nas casas de câmbio eram importados,
só que, de tão sofisticados que
eram, às vezes surgiam constrangimentos ao se aplicarem à realidade angolana. Havia excessiva dependência desse software e
muitos tinham até servidores noutros países. «O nosso software está totalmente integrado quanto à
nossa realidade, porque antes da
sua conceção fez-se um estudo
abrangente e complexo. Criámos
algo completamente diferente, e
para tal olhámos para fatores como o nível educacional da população, a dimensão das empresas,
as insuficiências tecnológicas do
país ou os problemas de comunicação. Com esses dados criámos
esta solução tecnológica à medida», conclui Pedro da Silva.
África21– novembro 2014
73
insumos
MOTA AMBRÓSIO/JORNAL DE ANGOLA
O Conselho de Ministros angolano apreciou no final de outubro a
proposta de Lei do Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2015,
que prevê receitas de quatro biliões de kwanzas (cerca de 40 mil milhões de dólares) e despesas em torno dos cinco biliões de kwanzas
(cerca de 50 mil milhões de dólares). Relativamente ao setor petrolífero, espera-se um crescimento de 9,2%, enquanto para o setor não
petrolífero se projeta um aumento de 10,7%; daqui resulta uma estimativa da taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de
9,7%. O défice público está estimado em 7,6% do PIB.
Segundo o ministro das Finanças, Armando Manuel, apesar de a
economia global continuar a ser caracterizada por alguma incerteza,
Angola prevê um crescimento satisfatório para 2015. «Na perspetiva
do curto do prazo, o Executivo tem acauteladas as medidas que permitem assegurar a estabilidade da economia», disse o ministro, em
conferência de imprensa. A baixa do preço do petróleo, registado no
mercado internacional, que obriga a «contenção» e «racionalidade»
nas contas do próximo ano, levou o Executivo a ajustar a composição
da despesa. Nesse sentido, prevê-se assegurar os programas de continuidade, mas limitar a entrada de novos projetos, tendo em conta que
a receita não petrolífera ainda não é suficiente para fazer face a uma
perda significativa na receita petrolífera. No que respeita às despesas,
o ministro indicou que o OGE de 2015 se concentrará na área social,
que deverá corresponder a 34% da despesa total.
Armando Manuel, ministro das Finanças
74
novembro 2014 –
África21
DR
OGE de Angola prevê receitas superiores
a 40 mil milhões de dólares
Emirates à conquista de África
A transportadora aérea do Dubai, que assumiu por dez
anos a gestão da angolana TAAG, mediante um acordo
de parceria estratégica, revelou a intenção de aumentar
a sua presença nos países africanos com a abertura de
novas linhas, o aumento da frequência dos voos e da
capacidade das aeronaves utilizadas para responder à
procura crescente. Presente em África desde 1986, com
a ligação Cairo-Dubai, a Emirates serve atualmente 24
destinos no continente, mas pretende aumentar a sua
quota no mercado de maior crescimento do mundo,
como afirmou o presidente da companhia Sheik Ahmed bin Saeed al-Maktum.
Desde 1 de outubro, a capacidade da linha Dubai-Abuja (Nigéria) foi aumentada com a afetação de
maiores aparelhos. A 26 de outubro, a Emirates duplicou a sua oferta sobre a linha Dubai-Casablanca, criada
a 1 de setembro, com dois voos diários, elevou para 49
voos semanais a frequência dos seus voos para a África
do Sul, com quatro ligações diárias entre Dubai e Joanesburgo. Na mesma data, a entrada em serviço de um
segundo A340 (com 14 lugares de primeira classe e 76
de Business Class) nos seus voos para as Maurícias permite à Emirates proporcionar a maior oferta para os
clientes mais afortunados que procuram este destino
considerado «de luxo», o mesmo acontecendo com as
Seychelles, onde a frequência semanal foi aumentada de
12 para 14. Finalmente, os voos diários para Dar es
Salam foram reforçados em quatro voos suplementares
por semana.
A Emirates espera aproveitar as sinergias com a
TAAG para desenvolver as interconexões regionais e
conquistar partes do mercado africano atualmente detidas pelas grandes companhias europeias e algumas
africanas como a sul-africana SA Airways, a marroquina
RAM e a Ethiopian Airlines. Todas estas companhias
têm já Luanda nos seus roteiros, mas a Emirates, primeira companhia a operar em África com o A340, poderá ganhar vantagem sobre a concorrência quando o
novo aeroporto de Luanda estiver concluído e apto para
receber o super-jumbo.
A cada vez menos discreta Bolsa Internacional do Turismo de Angola - Okavango tem-se agigantado a cada edição. Na edição de
2014, realizada entre 9 e 12 de outubro, ficou clara a tendência de
crescimento e o espaço que o certame vem conquistando no cenário
económico e social do país. Os números e factos falam por si.
Em 2014, houve 80 empresas expositoras (mais dez que na
edição anterior). Em termos de área, foram este ano disponibilizados perto de 6000 m2, enquanto em 2013 os expositores dispunham de um espaço bem mais reduzido. Outro facto digno de nota
é a autonomia da Okavango em relação a outras feiras. Na primeira
edição do evento, que na época se chamava “Bitur”, decorreu em
simultâneo com a Feira Internacional de Minas de Angola (FIMA),
e no ano seguinte acompanhou a primeira edição da Feira dos
Municípios e Cidades. Nesta terceira edição foram dois pavilhões
só para o turismo, sem holofotes nem protagonismo a partilhar.
«Uma realidade, um desafio, uma oportunidade, uma fonte de
receitas e empregabilidade» foi o tema central do evento que tem
como principal objetivo promover o desenvolvimento da indústria
hoteleira. O fomento do turismo local, visando um maior conhecimento do potencial paisagístico e de riqueza de cada uma das 18
províncias, sobretudo os monumentos históricos, e a promoção da
gastronomia também esteve na lista dos objetivos delineados pelo
Ministério da Hotelaria e Turismo.
NUNO FLASH/JORNAL DE ANGOLA
Bolsa do Turismo de Angola ganha maior notoriedade
A Okavango contou com a participação de empresas ligadas ao
setor do turismo, entre prestadoras de serviços, companhias aéreas,
agências de viagens e turismo, empreendimentos turísticos e hoteleiros, entre outros setores vindos de Cabo Verde, Portugal, África
do Sul, Moçambique e Espanha, além dos nacionais. Os debates
não faltaram, com palestras sobre «O papel do associativismo nas
dinâmicas sectoriais e locais», «Organização de destinos turísticos»,
entre outros temas.
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África21– novembro 2014
75
PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO
Um plano grandioso para um
país que pensa em grande.
76
novembro 2014 –
África21
Elevar os níveis de segurança alimentar e combater a
pobreza é uma das prioridades do Plano Nacional de
Desenvolvimento. Até 2017, o PND vai, entre outras
acções, promover o desenvolvimento comunitário das
aldeias rurais para assegurar a sua integração no resto
do país. Serão 91 as aldeias rurais construídas ou
requalificadas, totalizando mais de 15 mil habitações.
Para além disso, o PND vai valorizar o papel da mulher
rural, estimular o associativismo e o cooperativismo e
garantir o acesso dos camponeses ao microcrédito.
insumos
Grindod apresenta comboios de baixo consumo
As carências existentes em matéria de transportes ferroviários em África e o desenvolvimento de novos projetos mineiros de grandes dimensões no continente abrem ótimas perspetivas para as empresas especializadas na produção de material ferroviário,
como estimam os dirigentes do grupo metalúrgico sul-africano Grindrod. O grupo,
cotado na Bolsa de Joanesburgo, apresentou ao público a 21 de outubro em Pretória
o seu novo modelo de locomotiva económica, a GS7, que permitirá economizar entre
30 e 40% de combustível em relação aos modelos já existentes. A questão dos custos
de exploração é particularmente importante para a concretização e a rentabilização dos
planos de desenvolvimento do transporte ferroviário aprovados por vários países africanos, dada a importância dos investimentos necessários, a forte concorrência do
transporte rodoviário e a existência de margens diminutas.
FMI otimista em relação a Angola
SANTOS PEDRO/JORNAL DE ANGOLA
A economia angolana deverá registar um
crescimento de 7% ao ano até ao final de
2015, afirmou o diretor-adjunto da instituição, Naoyuki Shinohara, no termo de uma
visita a Luanda em outubro. O responsável do
FMI disse que «o setor não-petrolífero de
Angola desenvolveu-se de forma notável e esperamos que a tendência se mantenha de forma a reduzir a dependência do setor petrolífeNaoyuki Shinohara
ro e a continuar a investir nas atividades não
petrolíferas». Considerando que a redução das receitas petrolíferas não deve afetar
seriamente o desempenho da economia angolana baseada no planeamento a médio
e longo prazo, Naoyuki Shinohara salientou que Angola deve permanecer firme na
continuação deste processo porque está confrontada com inúmeros desafios, sendo
os mais importantes a redução das desigualdades, da pobreza e do desemprego.
Utilização do gás no transporte marítimo
A Argélia estuda a possibilidade de se lançar na comercialização e distribuição de
GNL (gás natural liquefeito) como carburante para o transporte marítimo, anunciou o secretário-geral do Ministério da Energia durante um seminário internacional organizado em outubro pela Naftal, filial da empresa pública de petróleo argelina SONATRACH. «Trata-se de uma tecnologia emergente que começa a ser
utilizada em alguns países e que oferece perspetivas promissoras aos países que dispõem ao mesmo tempo de importantes reservas de gás e de portos equipados para
abastecer os navios de passagem», precisou Ahmed Messali.
Segundo os dirigentes da Naftal, as recentes conferências mundiais sobre o
ambiente e o aquecimento global levaram a um consenso acerca da necessidade de
aumentar a utilização de energias limpas no transporte marítimo. Segundo o COE
da Naftal, Saïd Akretche, a empresa, que dispõe de seis postos de abastecimento de
combustível para navios nos seus portos, já foi consultada por vários armadores interessados na utilização do GNL pelas suas frotas comerciais. Pela sua posição geográfica na proximidade do Estreito de Gibraltar, por onde passaram em 2012 mais
de 220.000 navios, e a extensão do seu espaço marítimo, a Argélia tem condições
para se tornar num ator maior na utilização deste novo carburante no transporte
marítimo, segundo previsões dos especialistas.
Pressões sobre a OPEP
para reduzir a produção
A Organização dos Países Exportadores de Petróleo, que se reunirá em
Viena de Áustria a 23 de novembro,
está sob pressão para reduzir a produção de forma a suster a queda dos
preços do crude que recuaram 27%
desde junho. Responsável por cerca
de um terço da produção mundial e
em particular a Arábia Saudita, primeiro exportador, a OPEP tem até
agora recusado fechar a torneira,
considerando que a atual sobreprodução, estimada em 600.000 barris/dia,
e provocada pelo abrandamento da
economia mundial e a redução das
importações dos Estados Unidos, não
justifica uma redução das quotas de
produção dos países membros do
cartel, que implicaria uma perda de
partes de mercado em benefício de
produtores não-membros.
Segundo os especialistas, assiste-se
a um braço de ferro entre produtores
convencionais, com custos de produção relativamente baixos (entre 20 e
30 dólares/barril) e não convencionais,
à cabeça dos quais se encontram os
Estados Unidos, que lideram a produção de gás e crude de xisto (shale) com
custos marginais elevados (da ordem
dos 80 dólares/barril). O preço atual é
prejudicial aos países fortemente dependentes das exportações de petróleo
entre os quais Angola, Nigéria e Argélia, que elaboraram os seus orçamentos
para 2014 na base de preços superiores
aos atualmente praticados nos mercados internacionais.
África21– novembro 2014
77
insumos
Aumenta participação estrangeira
na Projekta Angola
Kuwait e Paquistão foram as duas novas presenças estrangeiras a registar
na última edição da Projekta Angola, feira sobre construção civil, obras
públicas, urbanismo e arquitetura, realizada de 23 a 26 de outubro.
Em termos absolutos, a participação estrangeira aumentou cerca de
30%, sendo Portugal o país que continua a constituir a maior representação externa no evento.
Sob o tema «Projetar o futuro, construindo o presente», a Projekta
contou com a participação de 502 empresas nacionais e internacionais dos
setores da construção, imobiliário, decoração e mobiliário. Entre as novidades apresentadas pelos expositores consta o Enerbiz Pré-pago, um produto desenvolvido para o mercado angolano, destinado à gestão e medição
inteligente de eletricidade, água ou gás. Entre os dois pavilhões, com uma
área de 16.000 m2 de exposição, destacou-se também a Load, uma empresa que atua de forma especializada no planeamento, produção, transporte
e montagem de hotéis modulares.
No âmbito da Projekta foi também realizada uma conferência sobre
«A Construção e o Imobiliário em Angola», que teve como principal objetivo identificar os pontos comuns no contributo para o desenvolvimento
da economia nacional, assim como as sinergias existentes e oportunidades
que ambos os setores aportam entre si.
MAIORES BANCOS Sete bancos de Angola e um de
Moçambique estão entre os 100 maiores de África, em
capital social, de acordo com a revista African Business. No ranking liderado pelo sul-africano Standard
Bank, constam os angolanos BESA (na 26.ª posição e
que anunciou a alteração do seu nome para Banco
Económico, na sequência da reestruturação do português Banco Espírito Santo); Banco Angolano de Investimentos (29.º), Banco de Poupança e Crédito (32.º),
Banco BIC (41.º), Banco de Fomento Angola (42.º),
Banco Millennium Angola (74.º) e Banco Privado
Atlântico (77.º). O Millenium bim, único de Moçambique
na lista, encontra-se na 57.ª posição.
FALSIFICAÇÕES Mais de 50% dos medicamentos
para o gado disponíveis em África são falsos ou de
qualidade inferior, revelou a Aliança Mundial das Medicinas Veterinárias, à margem da 6.ª conferência pan-africana sobre a agricultura animal, que se realizou na
última semana de outubro. Mais de 500 participantes
debruçaram-se sobre os meios necessários para melhorar a criação de gado, setor essencial para impulsionar a segurança alimentar e os rendimentos dos pequenos agricultores. Recomendaram a adoção de
programas para baixar os preços dos medicamentos
veterinários e controlar e reprimir o comércio de
falsificações.
GÁS NATURAL Moçambique lançou a 23 de outubro um concurso público para a adjudicação de cinco
novas concessões para a exploração do gás natural.
As concessões incluem 15 blocos e cobrem uma superfície de 76.000 km2. Dois dos blocos oferecidos
estão situados na bacia offshore do rio Rovuma, perto
da fronteira com a Tanzânia, onde a companhia italiana ENI e a americana Anadarko descobriram enormes jazidas de gás. Os outros são localizados em
áreas ainda inexploradas.
TURISMO EM ÁFRICA Com 56 milhões de visitantes em 2013, a indústria turística continua a crescer a
bom ritmo. As previsões apontam para um aumento
das receitas de 4% a 6% em 2014. Moçambique foi o
quinto país mais visitado em 2013, atrás de Marrocos
que recebeu 10 milhões de turistas, África do Sul (9,5
milhões), Tunísia (6 milhões) e Argélia (2,7 milhões).
Zimbabwe, Quénia, Uganda e Tanzânia completam o
ranking dos 10 países mais visitados. África representa atualmente 3% do mercado mundial em termos
de receitas mas deverá aumentar até 2030 a sua
participação até 7%, devido sobretudo à captação de
mais turistas asiáticos.
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novembro 2014 –
África21
press release
5ª EDIÇÃO CONGRESSO & EXPO
A reunião anual do mercado das TELECOMUNICAÇÕES
Sociser
empresa 100% Angolana, partner do iiR
Modelos de Negócio, Implementação de Estratégias e a realidade da evolução do Mercado
LUANDA
28-29
OUTUBRO
2 0 1 4
2014
SKYNA HOTEL
n 5.ª EDIÇÃO DO CONGRESSO
& EXPO GLOBALCOM ANGOLA
O iiR Angola realizou a 5.ª Edição do Globalcom Angola, o congresso anual para o
mercado de telecomunicações em Angola,
realizado no Skyna Hotel em Luanda a 28 e
29 de outubro, que abordou os temas mais
atuais do setor assim como casos práticos
internacionais. Angola encontra-se num
ponto de transição muito importante para o
www.globalcomangola.com
desenvolvimento
das infraestruturas de telecomunicações, existindo uma demanda
crescente para melhorar a cobertura do nível de qualidade, dos serviços de valor
acrescentado e respetivos preços. O Globalcom Angola visa sobretudo que os participantes possam trocar opiniões com os
decisores do mercado, identificar as linhas
mestras de crescimento e adquirir as melhores práticas internacionais.
Com a INTERVENÇÃO ESPECIAL de
Aldred Dreyer
CTO - Chief Technology Officer
NBC - NAMIBIAN BROADCAST CORPORATION
Com a participação de
> O caso da Migração da TDT da NBC na Namíbia
Eng. Dimonekene Ditutala
IT Business Relationship Manager
Dr. Eng. Amílcar Safeca
Administrador e Director Geral Adjunto
Eng. Helder Figueiredo
Assessor Técnico
SONANGOL
UNITEL
TPA - TELEVISÃO PÚBLICA DE ANGOLA
Eng. Jaime Ferreira
Director Geral
NET ONE
Eng. Mário Oliveira
Dtor. Gabinete de Engenharia
MS TELCOM
Dr. Francisco Ferreira
Director Geral
Eng. Arlindo Alves
Director de Transmissão e Core
MOVICEL
Dr. Arlindo Lopes
Dtor. Geral Interino
MULTICHOICE ANGOLA
Dr. Francisco Armando
Director Comercial
ANGOLA TELECOM
Eng. António Cardoso
Administrador Executivo
STARTEL
Dr. Adilson Santos
Director Fábrica de Redes
TVCABO
Eng. Paulo Cuanza
Director de Engenharia e Manutenção
Eng. Pedro Marques
IT Manager
CFL - CAMINHO DE FERRO
DE LUANDA
Eng. Marcos António Chaves
Líder da Área de Engenharia
Dra. Naiole Santos
Administradora
Dr. Arménio Pereira Ferreira
Director Comercial
TVCABO
Eng. José Mata
CTO - Chief Technology Officer
MOVICEL
Silver Sponsors
ANGOLA TELECOM
ANGOLA TELECOM
ANGLOBAL
ANGLOBAL
Gold Sponsors
Expositores
n CIÊNCIA E INOVAÇÃO
NOS CUANZAS
O projeto «Uma Viagem ao Mundo da Ciência, Tecnologia e Inovação» chegou às escolas das províncias de Cuanza Sul e Cuanza
Norte em Outubro. Esta é uma iniciativa do
Ministério da Ciência e Tecnologia (MINCT),
com a parceria do Ministério da Educação,
que pretende sensibilizar os jovens para o
estudo das áreas científicas. Trata-se de um
programa sociocultural, que integra a apresentação de peças de teatro nas escolas,
para demonstrar aos jovens que as áreas
das ciências e tecnologias são opções de
carreira muito válidas e devem ser consideradas para a escolha das suas profissões, no
futuro. O programa está ser implementado
no país desde abril. Já passou por onze províncias de Angola e chegou agora a vez de
mais de 11 mil alunos, de doze escolas, das
províncias do Cuanza Sul e Cuanza Norte,
fazerem “Uma Viagem ao Mundo da Ciência,
Tecnologia e Inovação”.
n III CONGRESSO INTERNACIONAL
DE SALSA E KIZOMBA
O Péd´Salsa organiza em Luanda, pelo terceiro ano consecutivo, o Congresso Internacional de Salsa e Kizomba, com o objetivo de juntar professores, alunos e amantes
das danças afro-latinas, nacionais e internacionais, proporcionando assim a interação
pela troca de experiências e a divulgação
da cultura angolana. Serão quatro noites de
festas afro-latinas e quatro dias de
workshops de dança e visitas à cidade de
Luanda. A exemplo do que acontece a nível
mundial, os encontros de Salsa e Kizomba,
atraem aficionados de diferentes culturas,
que têm optado pela aprendizagem destes
estilos de dança. Participam no congresso
professores profissionais vindos de Gana,
Quénia, África do Sul, Estados Unidos,
Venezuela, Cuba, Portugal e Espanha, com
uma larga experiência em danças de
salão.
n SEMANA EMPRESARIAL
PORTUGAL ANGOLA
No âmbito da sua estratégia de internacionalização, a Fundação AIP, através da AIP
– Feiras Congressos e Eventos, organizou
de 20 a 27 de outubro a Semana Empresa-
rial Angola Portugal, na qual participam
mais de 40 empresas portuguesas dos
setores da construção imobiliário, energia,
ambiente, segurança, decoração e mobiliário. No início da semana, as empresas portuguesas visitaram a província de Benguela
para encontros com as autoridades e empresários locais, trocando opiniões e experiências sobre as oportunidades de negócios e investimentos. A 22 de outubro
decorreu o Encontro Empresarial Angola
Portugal, promovido pela AICEP, Embaixada de Portugal em Angola e Fundação
AIP, que juntou empresários convidados
dos dois países. No resto da semana, o
programa dirigiu-se para a 12.ª edição da
PROJEKTA by Constroi Angola.
n NIDO APOIA
CONTOS TRADICIONAIS
A marca NIDO® patrocinou um áudio-livro
com histórias infantis angolanas, da autora
Cremilda de Lima, dirigido a crianças com
mais de quatro anos.
Durante os meses de
outubro e novembro, os
consumidores encontram este CD de oferta
debaixo da tampa das
latas de leite NIDO®.
Para a empresa, trata-se de uma possibilidade de reforçar a ligação com a cultura local e apresentar às crianças sete histórias
tipicamente angolanas, escritas e contadas
com palavras da nossa terra, que envolvem
gatinhos e gaivotas, imbondeiros e balões
e até o Pai Natal. Para a autora Cremilda
de Lima, «o CD é um presente para as
crianças e para os pais e um veículo cultural
para transportar as raízes angolanas até às
gerações mais novas». O leite NIDO®
é comercializado em Angola desde 1955,
e, em 2012, a Nestlé Angola inaugurou a
primeira fábrica de processamento de leite
em pó NIDO no país.
África21– novembro 2014
79
Congresso da Clínica Girassol, em Luanda
«Girassol 2014» aliou tecnologia
e humanização na saúde
Realizou-se entre os dias 21 e 24
de Outubro, no Centro de Convenções
de Talatona (Luanda), a 2.ª edição do
Congresso da Clínica Girassol, o “Girassol
2014”. O evento apresentou como intenção
primordial demonstrar que o avanço das
tecnologias da saúde não pode e não deve
afastar a necessidade premente
de garantir uma prestação de cuidados de
saúde humanizada. Daí o lema escolhido
para o evento: “Cuidados de Saúde Rumo
à Excelência: Tecnologia e Humanização”.
A iniciativa foi um enorme sucesso,
reunindo mais de 2000 participantes,
um número que mais do que duplica
a participação registada no 1.º Congresso
da Clínica Girassol, há dois anos.
80
novembro 2014 –
África21
S
ob o lema “Cuidados de Saúde Rumo à Excelência: Tecnologia e Humanização”, o 2.º Congresso
da Clínica Girassol reuniu este ano no Centro de
Convenções de Talatona mais de 2 mil participantes, procurando reflectir a filosofia da instituição de saúde que o
suporta, que procura diariamente aliar as melhores tecnologias da saúde aos valores da humanização e da proximidade com o doente.
Na abertura do «Girassol 2014», o Secretário de Estado da Saúde de Angola, Dr. Carlos Alberto Masseca,
garantiu que os princípios adoptados para a organização desta iniciativa não poderiam estar mais em linha
com as estratégias e as ideias do Ministério de Saúde
de Angola: “este congresso enquadra-se em todo um
esforço que tem vindo a ser feito pelo executivo, no
sentido de melhorar a qualidade de vida dos angolanos
e a qualidade dos serviços de saúde prestados à população. Os conteúdos e os objectivos deste congresso
encaixam-se naquilo que está contido hoje no Plano
Nacional de Desenvolvimento 2013-2017, no Plano Nacional de Desenvolvimento Sanitário 2012-2025, bem
como na política seguida para a formação de quadros
elaborada pelo executivo até 2030”.
O governante sublinhou que a circunstância do «Girassol 2014» estar centrado em assuntos como a excelência de cuidados, a tecnologia e a humanização poderá
ajudar a promover um debate aprofundado que conduza
à solução “daquele que é, provavelmente, o maior dilema
do sistema nacional de saúde; o grau de satisfação dos
nossos concidadãos”. Para o Dr. Carlos Alberto Masseca, é também de elogiar e agradecer a energia que a Sonangol E.P. colocou no apoio a este congresso, enquanto
maior empresa nacional, “com responsabilidades acrescidas na sociedade”.
Na ocasião solene, o Presidente da Comissão Organizadora do evento, Dr. António Pedro Filipe Júnior, expressou o seu agrado pelo facto de a iniciativa ter atingido
uma magnitude considerável, sendo já uma indiscutível
referência no panorama angolano dos congressos multidisciplinares e um acontecimento bianual que figura entre
os mais importantes fóruns de transmissão de conhecimento na área da Saúde: “o lema do nosso congresso
sumariza os desafios colocados à prestação de cuidados
de saúde neste século. Se, por um lado, a evolução tecnológica gigantesca que se observa nos últimos anos tem
acrescentado valor à melhoria no tratamento e diagnóstico, por outro, este desenvolvimento não pode descurar o
paciente enquanto ser humano, com todas as suas especificidades”. O Dr. António Pedro Filipe Júnior sublinhou
também, perante o Secretário de Estado da Saúde, “a
disponibilidade da Clínica Girassol em participar no processo de alerta e preparação para eventuais casos de
Ébola e outras epidemias e, acima de tudo, para partilhar
do ponto de vista do Ministério da Saúde no que tange à
relevância de aspectos ligados à sustentabilidade do financiamento do Serviço Nacional de Saúde, à necessidade de formação contínua dos técnicos de saúde e à municipalização dos cuidados de saúde em curso no país”.
Grande participação internacional
e uma área de exposição ímpar
Segundo uma das porta-vozes do Congresso, este evento ambicionou desde o início ser “um fórum de transmissão de conhecimentos, onde os profissionais pudessem
discutir e abordar questões ligadas ao saber em Saúde
e às novas tecnologias. Por outro lado, tivemos sempre
a preocupação de aliar as questões das novas tecnologias à humanização, à forma como tratamos os nossos
pacientes e lhes oferecemos um atendimento humanizado”. A porta-voz recorda que o 2.º Congresso da Clínica
Girassol trouxe várias novidades, inclusive encontros com
especialistas e uma enorme participação de conferencistas internacionais: “tivemos um total de 170 prelectores,
63 dos quais oriundos de 11 países do estrangeiros”.
A mesma realçou ainda a alargada área de exposição que
esteve ao dispôr dos congressistas: “connosco tivemos
uma mega-exposição, com mais de 1500 m2 de área e
por onde se distribuíram 32 expositores, disponíveis para apresentar serviços, equipamentos, medicamentos ou
softwares diversos. Ou seja, uma amostra topo de gama
do que de melhor se faz hoje pelo mundo fora, no campo
das tecnologias da saúde”.
Já o Vice-presidente do «Girassol 2014», Prof. Joaquim Van-Dúnem, destacou a pertinência e a actualidade
dos tópicos que a organização escolheu para moldar este congresso: “o lema do «Girassol 2014» mesclou dois
componentes relevantes das práticas na Clínica Girassol.
Tecnologia sem considerar como foco principal o doente
pode, no limite, ser uma fonte de violência e exposição
anti-ética. Humanização tem sido o pilar que norteia toda
a estratégia de desenvolvimento da Clínica Girassol e a
tecnologia não faz sentido se não estiver ao serviço da
Humanização”.
Para o Director Executivo do Congresso, Dr. Vasco
da Silva, o evento conseguiu superar tudo aquilo que fora
conquistado na primeira edição da iniciativa, realizada em
2012, não só devido ao maior número de congressistas
que marcaram presença em Luanda, mas sobretudo por
se ter focado numa matéria que é crítica para os sistemas
de saúde de todo o mundo: “o grande avanço do Congresso da Clínica Girassol, em 2014, passou por trazer o
conhecimento sobre a evolução das tecnologias da saúde e a sua aplicabilidade, no sentido de facilitar o diagnóstico. O desafio hoje, em todo o mundo, é conseguir gerar
bons hospitais. E o que é que as pessoas consideram
como um bom hospital? É aquele hospital que consegue
diagnosticar rápido, para tratar bem”.
África21– novembro 2014
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África21
língua portuguesa
Expansão pelo potencial económico
A
dr
O Instituto Internacional de Língua Portuguesa, sedeado em Cabo Verde, quer conquistar crédito a nível mundial. A moçambicana
Marisa Mendonça, que agora assume o cargo
deixado pelo brasileiro Gilvan de Oliveira, vai
prosseguir a missão pela expansão da língua
comum.
João Carlos
nova diretora executiva do Instituto Internacional de
Língua Portuguesa (IILP) assumiu funções em outubro e
promete prosseguir os objetivos de defesa e promoção da
língua falada por mais de 250 milhões de pessoas no mundo. Depois de estudar os dossiês lançados pelo seu antecessor, Marisa
Guião de Mendonça debruça-se agora sobre as linhas de ação do
seu mandato de dois anos (2014-2016) e a gestão de um magro
orçamento de cerca de 315 mil dólares, que resulta das contribuições dos Estados-membros.
Este será um dos dilemas para esta professora formada na área
do ensino do português, uma vez que alguns dos países não cumprem atempadamente o pagamento das quotas anuais, perfazendo
uma dívida que, no mandato anterior, ultrapassava 600 mil dólares.
O exercício será envidar esforços de captação de recursos financeiros
adicionais para dar resposta aos desafios do IILP.
Este é um dos alvos da sua deslocação ao Brasil, marco do início
de um périplo que a levará a visitar os demais países do grupo, alguns dos quais – reconhece –, atravessam «grandes dificuldades»
económicas. Com os meios que conseguir mobilizar, Marisa Mendonça procurará executar os planos anuais, com enfoque nos projetos lançados pelo seu antecessor, o brasileiro Gilvan Müller de
Oliveira. Entre estes destaca o projeto VOC (Vocabulário Ortográfico Comum), um dos suportes de vantagens múltiplas para a implementação do acordo de uniformização da grafia.
O portal do Professor de Português – Língua Estrangeira/Língua Não Materna também faz parte dos programas a prosseguir,
para o qual já foram realizadas várias ações de formação. O que se
pretende com esta plataforma, como explica, «é a produção de
unidades didáticas, que promovam o ensino-aprendizagem da língua portuguesa numa perspetiva muito mais integradora e muito
mais intercultural».
Internacionalização
Depois de iniciar funções, Maria Mendonça fez a sua estreia em
Braga (norte de Portugal), numa conferência que avaliou as perspe-
Marisa Guião de Mendonça, nova diretora do IILP
tivas da língua portuguesa no plano nacional e mundial. A iniciativa
partiu de uma Comissão Temática de Promoção e Difusão do
Português da CPLP, em parceria com a Universidade do Minho,
visando contribuir para alavancar a participação da sociedade civil
em prol da língua comum.
A diretora executiva considera que, além do seu valor económico, «a língua portuguesa está a crescer a nível internacional», não só
em número de falantes. A quantidade de países interessados em
aderir à CPLP pode ser igualmente um fator de crescimento, que,
na sua opinião, será notório em África, em países como a Namíbia,
o Zimbabwe, Botswana e África do Sul, onde funciona uma rede de
ensino do português apoiada pelo Camões – Instituto da Cooperação e da Língua.
A internacionalização da língua faz parte das linhas de ação do
IILP, que vai continuar a trabalhar para o seu uso em fóruns e organizações internacionais, de acordo com as orientações do colóquio
realizado há dois anos em Luanda.
Na conferência de Braga também participou Lucas Nguema
Bang, vice-primeiro-ministro encarregado do setor social e ministro
da Educação e Ciência da Guiné Equatorial, com quem Marisa
Mendonça abordou o compromisso de adoção e ensino do português, por ser esta uma das condições para a admissão do país, em
julho deste ano, como o nono Estado membro da CPLP.
A executiva está a desenvolver contactos a vários níveis para
preparar uma primeira missão de «bons ofícios» a Malabo, provavelmente em 2015, com o objetivo de avaliar a implementação do
extenso protocolo estabelecido com o Governo de Teodoro
Obiang Nguema. Mendonça considera que a adesão à CPLP
criou condições para que «o português venha a ter um nível de
aceitação elevada e possa ser uma língua de comunicação na
Guiné Equatorial».
África21– novembro 2014
83
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84 novembro 2014 – África21
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A crónica de Luís Cardoso
E
Cristo Redentor
numa sessão promovida pela inesquecível Solange
Parvaux, quando se comemorou o ano do Brasil em
disse a Carolina, a representante da editora que
França. Nessa altura a questão de Timor já estava reme foi receber ao aeroporto Carlos Drumond, na essolvida. Falei com ele sobre o episódio do Rio. Sorriu.
perança de que me levasse lá ao cimo. Já tinha ido
Sorri também, com graça. Como quando leio o que
várias vezes ao Rio, em missão diplomática, e nunca
escreve nas suas crónicas sobre o temhavia tido essa possibilidade.
po e o modo brasileiro.
A última vez que tinha estado nesta
Cardoso, agora não vai dar para ir,
cidade tinha sido por causa de uma sessão
disse-me Carolina, por causa das obras
promovida pelo grupo Tortura Nunca
de restauração, dado que nos próximos
Mais, em que a Resistência Timorense
tempos haveriam de ter lugar na cidade
também foi agraciada com um prémio
maravilhosa a Copa e os Jogos Olímpisimbólico pela determinação da sua luta
cos. Expressei o meu desalento dizencontra o invasor indonésio. Fiquei hospedo que era mesmo uma grande maldadado no Leblon, na casa de um diplomade o que os brasileiros estavam a fazer
ta, cujo porteiro, de todas as vezes que me
ao Cristo Redentor.
via entrar pela porta principal, mandavaA segunda. A primeira foi a mu-me subir pelas traseiras. Soube depois
[email protected]
dança da capital para o interior. Se alque era por onde entrava o pessoal do
guém presenciou e é testemunha de uma boa parte da
serviço doméstico que, na sua maioria, era negro. Aperhistória recente do Brasil, como a brutalidade da ditacebi-me então que o luso-tropicalismo é mais folclore que
dura militar e a luta pela restauração da democracia,
outra coisa. Nesta sessão também participou o escritor e
foi mesmo o Cristo Redentor.
cronista Luís Fernando, filho do Veríssimo, o grande
Quanta alegria e quanta tristeza guardou nos seus
autor brasileiro que escreveu Olhai os lírios do campo,
olhos. Se lhe estavam a fazer uma lavagem ao rosto só
uma obra-prima da literatura universal.
se fosse para se esquecerem do desastre do Maracanã,
O diplomata brasileiro recomendou-me que falasno ano de 1950, quando o Brasil perdeu a Copa para
se com o cronista do Estado de São Paulo, para que
o Uruguai.
escrevesse uma coluna sobre Timor, na sua página
Não tive nada a ver com isto!, uma frase que ouvi,
semanal que era lida pela maioria dos leitores. A mecitada por uma cidadã do Brasil, sobre o Maracanazo.
lhor forma de quebrar o bloqueio imposto pelo ItaCreio que a autoria pertence ao Cristo Redentor.
marati, que pendia no seu histórico pragmatismo
para o lado da Indonésia, um dos dragões asiáticos.
Coisa que nem todos os funcionários respeitavam,
como era o seu caso. Assim também o fizeram senadores, deputados, ex-presidentes, religiosos, académicos, estudantes, jornalistas e intelectuais.
Falou com Luís Fernando? perguntou-me, terminada a sessão, no caminho para Leblon. Disse-lhe que
não, dado que após a minha alocução, fiquei sem fala
por causa da emoção. Estava de tal forma surpreendido, com a atenção e o silêncio dos presentes, que me
esqueci de falar com o escritor. Aprendi que um diplomata deve ser frio e calculista. Desde então decidi
que não seria essa a minha carreira. Não tinha nenhum sentido de Estado. Demasiado emocional.
Tive a possibilidade de me redimir, quando me
encontrei com Luís Fernando Veríssimo, em Paris,
u nunca estive no cristo redentor !, foi isso que
Expressei o meu desalento dizendo
que era mesmo uma grande
maldade o que os brasileiros
estavam a fazer ao Cristo Redentor
África21– novembro 2014
85
BRASIL
E agora Dilma?
Seja assinante
Angola no Conselho
de Segurança das Nações Unidas
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Como os custos de envio também são variáveis, conforme as re­giões,
o preço das assinaturas é igualmente regionalizado.
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das assinaturas e com os detalhes acerca dos centros onde os pagamentos
deverão ser feitos, conforme os endereços dos assinantes.
Nº 91 - NOVEMBRO 2014 – 500 Kz / 4 USD / 3 € / R$ 15
O topo é a ambição
CABO VERDE
Cabo Verde
enfrenta
longos desafios
económicos,
o que não impediu
de ser considerado
o segundo país
africano mais bem
governado
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África21
África21– novembro 2014
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cults
Anunciados os vencedores
do Prémio Nacional de Cultura
grupo de teatro Enigma foi um dos vencedores da edição
deste ano do Prémio Nacional de Cultura de Angola,
iniciativa que visa distinguir a arte e a criatividade dos angolanos, nas suas múltiplas formas de expressão, atendendo às diversidades linguísticas e culturais do povo angolano. De acordo com o júri do concurso, «com objetividade e liberdade de
imaginação e fantasia, o grupo tem sabido recriar o mundo
circundante, o homem, a vida social e os valores estéticos e
morais, o que constitui o resultado de uma ideia criadora
concreta realizada e plasmada, conforme as leis da linguagem
artística específica, de forma integral e irrepetível».
Foram igualmente contemplados com o prémio Gabriel
Tchiema (Música), João Mabuaka (Artes Plásticas), Grupo de
Dança Tradicional Katyavala do Bailundo (Dança) e o Centro
de Estudos do Deserto (CEDO), em Investigação em Ciências
Humanas e Sociais. Na área de Cinema e Audiovisual, o prémio coube ao realizador Asdrúbel Rebelo da Silva, pelo conjunto da sua obra, que contra entre outros, os filmes Levanta,
Voa e Vamos e Escrever a Vida, e o documentário Valeu.
PAULINO DAMIÃO/JORNAL DE ANGOLA
O
Gabriel Tchiema, vencedor na categoria de Música
O jornalista e escritor Albino Carlos venceu na categoria de
Literatura, pelo seu livro Issunje, publicado este ano.
«Esta distinção exige dos contemplados maior aposta na
produção de obras com elevado grau de qualidade, bem como
na excelência, tendo sempre em conta os traços identitários da
cultura angolana», disse a ministra da Cultura, Rosa Cruz
e Silva, durante o anúncio dos vencedores.
lusa
Casa dos Estudantes
Pepetela
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P
do Império
epetela manifestou a sua satisfação com a homenagem prestada aos ex-alunos da Casa
dos Estudantes do Império (CEI), realizada pela União das Cidades Capitais de Língua
Portuguesa (UCCLA) em Coimbra, que assinalou o 70.º daquela que foi, entre 1944 e
1965, a residência de estudantes das então colónias portuguesas. Pepetela, também ex-estudante da CEI, mostrou-se «feliz» com o ato, que «apenas peca por tardio». Segundo o autor
do romance Geração da Utopia, «já era tempo de a CEI ter tido o reconhecimento, para que
as gerações futuras soubessem quanto representou para as independências dos nossos povos». Sobre o legado dos ex-alunos, adiantou que o sonho de independência para os países
africanos de língua portuguesa «foi alcançado». No entanto, afirmou que «queremos mais
do que as independências, porque os povos têm de sentir os seus benefícios de uma vida
melhor, em sociedades mais justas».
Por sua vez, Irene Neto, filha do primeiro Presidente de Angola, António Agostinho
Neto (um dos homenageados), destacou «a convicção e a determinação invejável» dos ex-estudantes na luta pelas independências das então colónias. «Hoje, os tempos são outros,
mas, no geral, todos os antigos associados da CEI cumpriram com os objetivos de luta pela
liberdade e independências», salientou.
Durante o ato, foi realizado o colóquio «A importância da CEI na formação cultural dos
seus associados», com a intervenção dos escritores Manuel Alegre, Pepetela, Manuel Rui
Monteiro, Eugénia Neto, viúva de Agostinho Neto, Jorge Querido e Pires Laranjeira.
dr
Afonso Reis Cabral
vence Prémio Leya 2014
A
fonso Reis Cabral ganhou, por unanimidade, o Prémio
Leya. Aos 24 anos, é o mais jovem escritor a receber o galardão. Foram a concurso 360 originais de autores de língua portuguesa enviados de 14 países. O romance de Afonso, O Meu Irmão, centra-se na relação de amor entre dois irmãos, um deles
com a síndrome de Down.
Foi Manuel Alegre, presidente do júri, que fez o telefonema a
anunciar a ótima notícia e a convidá-lo a ir à sede do grupo editorial para se encontrar com outros membros do júri. Quando
chegou, uma hora mais tarde, estava o presidente do júri a informar o vencedor da edição de 2014. Para Manuel Alegre, O Meu
Irmão, é «um dos livros mais maduros e dos mais conseguidos do
ponto de vista literário» de todas as edições do Prémio Leya.
Nas primeiras declarações sobre a razão da temática do seu
romance, Afonso disse que «todos devem escrever sobre o que
sabem e conhecem». Escreve desde os nove anos poesia, conto, e
agora romance. Trabalhou como revisor em algumas editoras e
atualmente é editor. Em 2005 editou o seu livro de poemas Condensação. Sobre O Meu Irmão, revelou que «Já estava a escrever há
três anos e como a data limite de entrega do manuscrito terminava
no fim de maio fiquei obrigado a finalizar».
O Prémio Leya, agora arrecadado por Afonso, tem o valor
mais elevado dos prémios literários em língua portuguesa, cem
mil euros (cerca de 128 mil dólares). Para os mais distraídos, informa-se que os manuscritos são lidos pelo júri em prova cega, ou
seja, sem qualquer referência ao nome do autor.
Mas o que poucos sabiam era a ascendência de Afonso Reis
Cabral. Nada mais, nada menos, Eça de Queirós, o seu trisavô.
Disse Afonso: «Tento não pensar em qualquer tipo de herança
porque isso angustia-me um bocado. Não quero atribuir qualquer
responsabilidade à genética». E concluiu: «Felizmente, não tenho
Eça de Queirós no nome».
Série sobre Bijagós
«O
na rota dos festivais internacionais
DR
s Escultores dos Espíritos», episódio da série No Reino Secreto dos Bijagós, filmado na Guiné-Bissau, tem despertado
o interesse de várias entidades, depois da estreia mundial em setembro na Fundação Calouste Gulbenkian, em Portugal. De acordo
com a produtora Lx Filmes, o documentário tem sido solicitado
para apresentação em várias universidades, por exemplo no Brasil, e
foi selecionado para o Docs for Sale, um importante mercado internacional que decorre durante o festival de Amsterdão, IDFA.
Além da Gulbenkian, a obra conta até agora com o apoio de
várias instituições portuguesas, entre as quais a Fundação Portugal-África, mas também da Organização das Nações Unidas para a
Educação, Ciência e Cultura (Unesco). A equipa busca novos parceiros e financiamento para continuar a filmar por mais um ano os
outros três episódios. A aposta é concorrer em festivais internacionais, revelam os realizadores, expectantes em relação às novidades
para 2015.
Se as condições logísticas o permitirem, a equipa dirigida por
Noémie Mendelle e Luís Correia espera retomar as filmagens em
janeiro para a produção de um novo episódio, cuja temática resulta
do fascínio dos autores pelo sagrado e pela natureza que carateriza
as ilhas dos Bijagós, reserva da biosfera. A originalidade do seu património torna Bijagós uma das sociedades mais singulares e únicas,
como refere o preâmbulo de apresentação do projeto. «Entre os
Bijagós permanece uma visão do mundo em que homens, natureza
e espíritos formam um sistema cooperativo onde tudo está interligado», lê-se no referido texto.
África21– novembro 2014
89
cults
Festival de cinema de Santa Maria
Festival Internacional de Cinema de Cabo Verde terminou em19 de outubro, com a exibição do filme Cabo, do
realizador cabo-verdiano, Ivan Barbosa, residente na Holanda.
Neste certame internacional de Santa Maria, no Sal, foram
exibidos 81 filmes, dos quais foram selecionadas 34 películas,
concorrendo para os diferentes prémios.
A curta metragem Terra Terra, da italiana Pala Zermar, foi
o único filme produzido em Cabo Verde, mostrando vários
aspetos da cultura cabo-verdiana. Presentes igualmente neste
Festival de Cinema de Cabo Verde, a longa-metragem Pecado
Fatal, do português Luís Diogo, ou ainda a longa-metragem
documentário, I Love Kuduro, do realizador português Mário
Patrocínio. Este Festival de Cinema de Cabo Verde, que chega à sua
quinta edição com a exibição de 81 filmes, teve a sua primeira
edição em 2010, com apenas cinco filmes, e tem como promotora a Viva Imagem.
DR
O
em Cabo Verde
Imagem do filme I love kuduro
O ministro cabo-verdiano da Cultura, Mário Lúcio Sousa,
também músico, compositor e escritor, admitiu que os recursos financeiros para o setor não são muitos, mas garantiu que
apoiará e estimulará iniciativas bem planeadas e executadas,
sobretudo na área da formação.
Festival de Jazz
DR
Itália-Moçambique
A cantora moçambicana Tanselle
90
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África21
A
10.ª edição do Festival de Jazz Itália-Moçambique, que começou no final
de outubro com uma ronda de três espetáculos em Maputo, procurou
fomentar intercâmbios artísticos entre músicos dos dois países e assinalar o
Acordo Geral de Paz de 1992, assinado em Roma.
Piero Borri & Valentina Bartoli e Puglia Jazz Factory foram os grupos italianos convidados para a edição de 2014 do festival, que contará com atuações dos
moçambicanos Makazani Muthimiu, Tanselle e Elcides CarlosX, além de duas
formações com músicos e estudantes da Escola de Comunicação e Artes (ECA),
da Universidade Eduardo Mondlane e da Escola Italiana G. Falcone, de
Maputo.
«O festival já se tornou um evento tradicional na agenda cultural de Maputo
e é uma iniciativa que se carateriza pelo encontro das culturas dos dois países
através da cultura universal que é a música Jazz», assinalou o embaixador de Itália
em Moçambique, Roberto Vellano, durante uma conferência de imprensa.
Com um concerto no Hotel Cardoso, o festival abriu ao grande público em
31 de outubro, com atuações das bandas no África Bar e no Gil Vicente, respetivamente, estando prevista, além de espetáculos individuais, uma jam session com todos os músicos.
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Nós da Camargo Corrêa acreditamos que devemos ir além
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Valor para nós só é legítimo quando compartilhado, aquele
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África21– novembro 2014
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livro do mês
A Virgem, de Tempestade Celestino
Um romance
angolano,
um romance
necessário
Apresentado como o mais divertido
romance angolano dos últimos tempos,
o livro A Virgem do escritor angolano
Tempestade Celestino destina-se
irrevogavelmente a um sucesso de vendas
tão apetecido como merecido
Rodrigues Vaz
D
e várias formas trata-se efetivamente de um livro que
chega na hora certa: o começo do desopilar depois da
«tempestade» que foram os anos de guerra e das suas
naturais ressacas. Como diz o editor, «Uma coisa é certa, os angolanos vivem o dia a dia com muito sentido de humor, com muito
desenrascanço, e como se já não houvesse amanhã.» Ora, de vários modos, está tudo neste romance sobre a vida em Angola
como ela é hoje. Fácil de ler, com uma escrita fluida e agradável,
A Virgem olha com ternura para as personagens e para a cidade do
Lobito, retratando o quotidiano angolano com verdade e muita
frescura. Um romance divertido e animado que arranca boas e
sonoras gargalhadas, porque se percebe à evidência que foi inspirado em factos reais e porque o autor sabe usar o picaresco de uma
forma tão ousada como ingénua, diríamos mesmo naif no sentido
literal do termo que é ingenuidade quase a virar para o que se
chama kitsch, embora se saiba manter longe disso.
De alguma forma, este novo romance angolano prossegue
nas linhas mestras da literatura angolana, continuando a evolução que ela tem sabido manter especialmente depois da in-
92
novembro 2014 –
África21
dependência, que é, como tem sido evidente, em cada época ir
de encontro às necessidades próprias, isto é, é sempre uma literatura necessária, correspondendo ao que a sociedade lhe exige
e precisa.
Ao mesmo tempo crítica e compreensiva, a escrita de Tempestade Celestino reflete várias matrizes da sociedade angolana
atual, pondo a nu as complicações familiares por causa da intervenção da família, mas reconhecendo as vantagens da solidariedade familiar, e denunciando a inveja como um mal que
corrói o convívio mas aceitando-a como inevitável, aqui e agora,
por causa das notórias clivagens sociais. Percebe-se, entretanto,
que quereria condenar a atual propensão do angolano médio
para dirimir litígios legais por tudo e por nada, mas não ousa
ir muito além.
De uma forma geral, uma das grandes qualidades deste romance está na qualidade dos diálogos a ressumarem autenticidade, a saberem a genuínos, ajudados ainda pelo uso de termos
em umbundu e outros do calão local, onde são notórios os sinais
do inglês, como bisno para designar negócios, de business, e bradar
para significar irmão, de brother, entre muitos mais que felizmente
não pedem licença aos fundamentalistas do Acordo Ortográfico
que campeiam em Portugal.
Embora, como afirma o autor, a trama do livro seja baseada
em factos reais, a verdade é que este livro foi nitidamente feito
para defender uma tese simplista: a falta de prática de sexo provoca males irreversíveis que só a sua satisfação pode curar. E, pelo
caminho, e aqui é a outra vertente principal da tese: o caminho
para a felicidade é a paz e a concórdia, a reconciliação, que é uma
mensagem irrevogavelmente positiva e também não deixa de ser
uma mensagem necessária para a sociedade angolana atual.
A trama anda à volta da figura de Catarina, uma moça tão
casta quanto bela, que aos trinta anos começa a sofrer de muitos
males. O médico assistente aconselha-a a casar porque a virgindade pode estar na origem das suas doenças. Aconselhada por uma
amiga a aceitar o namoro do maestro Caquarta, quarentão suspeito e padecendo de impotência, os males continuam levando o
próprio marido a propor-lhe a intervenção de um amigo. Está
claro, surgem as consequências, mas depois o amor faz ultrapassar
todos os ciúmes e discórdias e, no final, como nos contos de fadas,
vivem felizes para sempre.
Recorrendo a todo o momento aos provérbios mais inimagináveis e a ditados e sentenças populares que, no fundo, são comuns a todos os povos, embora se nos apresentem aqui como sabedoria africana, o autor socorre-se também de máximas e
citações da Bíblia que mostra conhecer vastamente.
Além do aspeto sociológico, que neste livro é de capital importância porque as famílias e os seus elementos principais estão
Um romance divertido e animado que arranca
boas e sonoras gargalhadas
delineados com grande acutilância, haverá outros aspetos, entre
os quais o linguístico, em que há que reparar, além do que referi
a propósito da influência do inglês. O caso da palavra Kupapata
é exemplar. Designação das motos que concorrem com os táxis
no transporte de pessoas e bens, os seus motoristas são, antes, de
mais sinónimo de desenrascanço. Por sinal, tudo começou no
Lobito, nas páginas do jornal Kilamba, onde a personagem
principal de uma banda desenhada de Pio Mariano dos Santos,
se chamava Kupapata.
A descrição da Praça do Kalumba – uma espécie de Roque
Santeiro do Lobito – como microcosmos da sociedade angolana
nas suas grandezas e misérias, é igualmente exemplar como caracterização, e a história dos patronímicos da região tem um
sabor muito especial e merece uma análise detalhada. Trata-se,
no fundo, de ver as palavras como conceitos adaptáveis a tudo,
Tempestade Celestino
Nome de guerra, pseudónimo literário de Celestino Jerónimo.
O autor é natural do Lobito, licenciado em Relações Internacionais pela Universidade Lusíada, Pólo de Benguela. Fez os
estudos primários na Igreja Evangélica da Canata e aprimorou o gosto pelas letras, na década de 80, ao cumprir o serviço militar obrigatório. Foi repórter do semanário Kilamba (ex-jornal O Lobito), onde publicou artigos, poemas, crónicas e
contos. Foi membro da UJA – União dos Jornalistas Angolanos e da Brigada Jovem de Literatura de Benguela. Foi professor de Biologia na Escola Saydi Vieira Mingas, a mesma
escola, então D. Afonso Henriques, onde foi aluno, nos anos
1974/1975, dos conceituados Dr. Grabulho, Dr. Cola e Dr.
Cruz. É funcionário público na Empresa de Águas e Saneamento do Lobito.
desde que sejam coisas práticas e que façam avançar. E, no fundo, as famílias, por mais desavindas, acabam por se reconciliar e
tudo acaba em abraços. Assim se praticasse também na política
e as coisas teriam outro final. Não é por acaso que uma das figuras centrais do romance, a tia Nonjamba, vai para a política no
final do enredo. Na verdade, a sua feição interventora em todas
as quezílias familiares e com os estranhos só lhe aponta esse
caminho.
A talhe de foice, o autor fala dos verdadeiros problemas, como
a droga, mas aos jovens que por ela tinham sido levados também
lhes aponta o caminho, aflora sem lhe dar muita importância o
racismo que muitos emigrantes portugueses continuam a ter em
Angola, e não deixa de falar no tema recorrente de todos os mais
velhos de todas as épocas: no nosso tempo é que era bom, é que
havia respeito, é que havia valores. Todos sabemos, porém, que
isso só é verdade até certo ponto. A verdade é que os tempos são
outros e outros os valores. Que podem até nem ser melhores.
A literatura angolana continua, portanto, no seu papel de literatura necessária. O romance A Virgem é, de vários modos, um
livro necessário e de algum modo fundamental para compreender
os angolanos e a sua situação hoje.
A Virgem
Tempestade Celestino
Guerra e Paz, 2014, Lisboa
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93
vl o
er
uvir
er
Vagas e Lumes
Mia Couto
Editorial Caminho, Lisboa, 2014
«Vagas e Lumes tem duas componentes. Uma sobre aquilo que
chamo de vagas, que são os assuntos do mundo, a volta, a vida.
E a parte dos Lumes é a parte mais íntima, os amores, as
paixões, etc.». As palavras são de Mia Couto, que assim nos
apresenta o seu mais recente livro, uma obra poética com mais
de 200 páginas e que se divide em duas partes: a primeira, em
que o autor escreve sobre o mundo, e uma segunda, em que
disserta sobre aspetos do seu íntimo, mais precisamente os
amores e as paixões. Em relação aos versos de Raiz de Orvalho,
Mia Couto afirma tratar-se de uma imagem poética. «Isso quer
dizer que o mais importante não é o veículo, mas sim aquilo
que eu quero transmitir como mensagem. A minha mensagem
seria o pólen, aquilo que vai fecundar alguma coisa. Pode ser
por via da música, versos, escrita ou intervenção cívica.
Portanto, o mais importante não é o veículo que quero trazer
ali, mas é o próprio pólen».
Mia Couto nasceu na Beira,
Moçambique, em 1955. Foi
jornalista e professor e é atualmente
biólogo e escritor. Está traduzido
em diversas línguas. Em 2013,
recebeu o Prémio Camões.
Entre outros prémios e distinções
destaca-se a nomeação de Terra
Sonâmbula como um dos doze
melhores livros africanos do século
XX, na Feira Internacional
do Livro do Zimbabwe.
94
novembro 2014 –
África21
Um drama que envolve várias
personagens e que decorre
em 88 a.C., quando o mundo
está à beira de uma guerra
desastrosa e de grandes
dimensões, que se estende
de Roma à Grécia, e ainda
ao Egito, onde vive Gordiano,
um cidadão romano. Quando
não está embrenhado nos
seus passatempos lúdicos,
como os seus jogos, o jovem
desfruta o seu tempo com
a escrava Bethesda. No dia
do seu aniversário, quando
cumpre vinte e dois anos,
Bethesda é confundida com
a amante de alguém rico
e é raptada. Para a salvar,
Gordiano tem de encontrar
os raptores antes que eles
se apercebam do engano.
Entretanto, é confrontado
com algo que o envolve e
absorve: o saque do sarcófago
de ouro de Alexandre, o
Grande. Não abundam os
romances históricos sobre
este período em África, onde
Os salteadores do Nilo vêm
agora ocupar um espaço
interessante.
Os historiadores e diversos
investigadores sempre se
espantaram com a facilidade e
precisão com que a Alemanha
nazi conseguia identificar
os judeus europeus. Ainda
hoje há peças de um enorme
puzzle por encaixar. Mas há
algumas certezas: Já existia a
tecnologia Hollerith de cartões
perfurados da IBM e com a
ajuda dos sistemas Hollerith
desta empresa, adaptados
às necessidades dos clientes
e sob constante atualização,
Hitler foi capaz de automatizar
a perseguição aos judeus.
A IBM e o Holocausto é a
narrativa surpreendente da
aliança estratégica da IBM
com a Alemanha nazista,
que teve início em 1933,
nas primeiras semanas da
ascensão de Hitler ao poder,
e que se prolongou ao longo
da Segunda Guerra Mundial.
À medida que o Terceiro
Reich levava à prática o
seu plano de conquista e
genocídio, a IBM contribuía
com soluções tecnológicas
para a estratégia de Hitler.
Os Salteadores do Nilo
Steven Saylor
Bertrand Editora, 2014, Lisboa
A IBM e o Holocausto
Edwin Black
2001
Com Saxophonias, Adriano
Santos lança-se em duetos
com Grace Évora, Kino
Cabral, Mirri Lobo, Dudu
Araújo, Dany Mariano,
Rui Pina, Pepe Bana e
Belinda Lima, para além
de um desafio com o
irmão trompetista, Nhela.
Paralelamente, utiliza ainda
samples dos DJs Brazão
e MarkG na melodia Thing
Medley. Após os álbuns
Reencontro I, II e III, com o
terceiro dedicado ao mestre e
fonte inspiradora de Santos,
Luis Morais, chega-nos
agora um trabalho a solo
do saxofonista, que afirma
ter querido fazer um disco
diferente, com sax e voz.
«Este CD é reflexo do amor
à minha terra, em especial
à nossa cultura. Nasci no
meio da música, ela faz parte
da minha alma. Espero que
todos gostem», afirma Adriano
Santos.
Saxophonias
Adriano Santos
Cresceu a ouvir música
tradicional, música urbana
local e ritmos de todo o
mundo na Guiné-Bissau, de
onde é natural. Fez parte,
entre outros, do histórico e
revolucionário grupo Super
Mama Djombo e já partilhou
o palco com artistas como
Tito Paris, Bonga e Boss
AC, por exemplo. Afirma
que a sua raiz musical são
os «convívios de quintal», e
que as suas composições
sofrem influência da sua
vivência em três continentes:
África, América e Europa.
Mindjer, que significa mulher,
é o título do seu primeiro
álbum, que aparece como
uma homenagem a todas
as guineenses e de todo
o mundo, pela sua força,
determinação e coragem.
Nas suas faixas, a cantora
quase que viaja pela música
do seu país, relembrando os
clássicos de compositores
como José Carlos Schwarz
e Armando Salvaterra,
passando pela música
tradicional guineense com
Mandjuandadi e pelo que
carinhosamente intitula de
«minha música da Guiné», no
fundo as diversas sonoridades
que a inspiram e dão corpo à
sua própria música.
Mindjer
Karina Gomes
«O mais interessante foi dar
ao meu pai um espaço de
escuta sem chegar a julgá-lo,
porque isso é muito difícil.
Tive que compreender a
sua história como a de um
homem, e não como a de
um pai». As palavras são da
realizadora, que se serviu
do arquivo fotográfico e dos
diários do pai sobre a sua
experiência durante o serviço
militar na colónia espanhola
do Sara, em 1964, como base
para o seu trabalho. Monsell
passou os últimos três
anos a trabalhar em África
815, um documentário que
vagueia sobre os anos que
o seu pai passou em África,
«um paraíso perdido ao que
sempre quis regressar», como
dizia, após o fracasso da sua
relação familiar e a aceitação
da sua orientação sexual.
«Eu sempre soube que o
meu pai era homossexual,
nunca foi um tema tabu», diz
Monsell, que reconhece que
partiu para este filme após
muitos anos a resistir à leitura
dos diários.
África 815
Realização Pilar Monsell
Género Documentário
Chegou finalmente a DVD
O Último Voo do Flamingo,
a história de Mia Couto
que nos leva ao interior de
Moçambique. Nele, há um
ponto de partida: Tizangara,
uma pequena vila no interior
do país, pouco tempo depois
do fim da Guerra Civil. Cinco
misteriosas explosões matam
outros tantos soldados da
Missão de Paz das Nações
Unidas. Como provas
do crime apenas pénis
decepados e os emblemáticos
capacetes azuis. Dá-se
então início à investigação,
orientada pelo oficial de
serviço designado pelas
Nações Unidas, o Tenente‑Coronel italiano Massimo
Risi. Nos passos que vai dar,
Risi mergulha num mundo
diferente, que vai necessitar
das explicações do tradutor
Joaquim (Elliote Alex), que
rapidamente lhe vai ensinar
que na vida não se pode
compreender propriamente
tudo. Um excelente livro,
traduzido num ótimo filme.
Está lá Moçambique, mas não
o das multidões. É o interior
do país que o filme nos traz,
com quase tudo o que contém
e representa.
O Último Voo do Flamingo
Realização: João Ribeiro
Género: Ficção
África21– novembro 2014
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Última página
Acerca da estabilidade – III
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João Melo
E
ste é o meu último texto, pelo menos por ora, sobre o
tema da estabilidade. Começarei com um ponto prévio:
a estabilidade, mais do que uma finalidade em si mesma,
deve ser entendida como uma condição e, ao mesmo tempo, um
instrumento para o crescimento económico, o desenvolvimento
humano e o contínuo aprofundamento da democracia no nosso
país. Não deve, por isso, ser utilizada para frenar esses objetivos
maiores, perseguidos, em geral, por todos os cidadãos.
O que acabo de dizer significa que, em determinados momentos, é imperioso proceder a mudanças que sejam necessárias
para renovar as condições de estabilização do sistema, permitindo que este último continue a ser capaz, perante as novas condições existentes, de promover aqueles objetivos maiores.
Essas mudanças não implicam necessariamente a mudança
do sistema, a não ser em momentos revolucionários. A rigor,
«sistema» – ou, se quiserem, «regime» – não é, inclusive, sinónimo de «partido» ou de «governo». Em Angola, contudo, estamos
ainda bastante longe dessa visão, devido à excessiva partidarização da vida política e social.
Uma coisa é certa: qualquer que seja a visão dos diferentes
atores, a manutenção da estabilidade em Angola, a médio e
longo prazo, implica mudanças em termos de prioridades,
procedimentos e protagonismos que, na minha opinião, são
imprescindíveis para a renovação do sistema e para a sua efetiva
capacidade de continuar a promover o crescimento, o desenvolvimento e a democracia.
A pergunta é inevitável: quem deve proceder a tais
mudanças?
No atual momento histórico angolano, não reconheço na
oposição capacidade e sobretudo interesse em proceder a mudanças positivas na nossa sociedade, regenerando a capacidade
do sistema de construir um país bom para todos vivermos, o que
implica renová-lo sem destruí-lo e sem, portanto, voltar a lançar
Angola no caos e na instabilidade.
Isto não é histeria, mas, sim, leitura objetiva dos factos. Na
verdade, não é simples acaso que o maior partido da oposição
angolana se mantenha fiel ao Programa de Muangai ou que esteja por trás do «Movimento Revolucionário» (o nome diz tudo)
de jovens manifestantes antigovernamentais. De igual modo,
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África21
é sintomático que políticos oriundos da extrema-esquerda e
convertidos presentemente em líderes de partidos «democráticos» defendam, em privado, a perseguição a dirigentes do
MPLA, caso o mesmo deixe de ser Governo, ou então que hostilizem figuras credíveis e reputadas da sociedade civil, apenas
por estas terem pertencido ao partido no poder.
Em suma, as mudanças que o sistema exige, neste momento,
para que a estabilidade se mantenha a médio e longo prazo e,
assim, o país possa continuar as profundas transformações internas desencadeadas, sobretudo, após o fim da guerra, em 2002,
devem e podem ser dinamizadas pelo MPLA.
A primeira mudança, quanto a mim, é demonstrar mais urgência e determinação em resolver os problemas da maioria da
população, como emprego, habitação, água, luz, saúde e educação. Alguns desses problemas podem ser minimizados sem
necessidade de projetos grandiosos, que levam demasiado tempo, exigem muitos recursos e, por vezes, são de eficácia duvidosa.
A segunda é ampliar drasticamente as condições de acesso
à riqueza e aos negócios, a começar pela própria «família do
MPLA», mas alargando-o a todos os angolanos interessados em
tornar-se empreendedores. Como defendi anos atrás, o cruzamento de interesses entre empresários do campo político do
MPLA e da oposição é um poderoso garante da estabilidade.
Mas a existência de oportunidades iguais para todos – fundamental para a criação de uma visão comum de «sistema» e de
«regime» – deve ser um processo geral.
Finalmente, a terceira mudança que o MPLA deve realizar
é resolver a questão da sucessão. Na minha opinião, o partido no
poder precisa de apresentar ao eleitorado, em 2017, uma solução
capaz de assegurar a estabilidade do sistema, mas que sinalize ao
mesmo tempo o início da sua renovação. No quadro político-constitucional do país isso é perfeitamente possível. Adiá-lo
é pôr em risco a estabilidade, a médio e longo prazo.
MPLA deve fazer mudanças
para manter estabilidade