Boletim Novembro Sabores e Saberes

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Boletim Novembro Sabores e Saberes
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região | Ano VI . N° LXII. Novembro de 2012
EDITORIAL
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COMPORTAMENTO E PERCEPÇÕES
Dizer, como muitos apregoam, que há duas forças universais antagônicas,
visceralmente contrárias entre si e em permanente luta existencial, é um
maniqueísmo. Senão um mesclado histerismo ou uma apostasia.. O que há é a
luta entre conhecimento e ignorância, entre o aparente, temporário caos e a Ordem
Universal, a Criação Una, Divina, múltipla, imarcescível, referencial absoluto e base
sustentável de todas as dualidades e universalidades.
Na Criação, na Ordem, nada é ou está isolado. Cada situação tem a sua causa
e sua consequência. Cada objeto ou ser ocupa um lugar, exerce uma função. Cada
situação tem assim o seu papel, sua adequação, um sentido preciso dentro da
Ordem Infinita. Nada é fortuito.
Cada indivíduo detém a responsabilidade quanto ao seu autoconhecimento e aos
seus atos, que podem ser harmônicos ou desarmônicos. Precisa ele ter e exercer
a maturidade da mente, e que gere o seu conhecimento pessoal e de suas ações
e que, por sua vez, contribuam para o comportamento e o acervo coletivos. Levar
uma existência de exemplificação, de equilíbrio, de harmonia.
A Humanidade convive assim com ciclos bipolares e períodos oscilantes de
ordem e desarmonia, sem que isto jamais signifique estagnação ou involução.
Todo ser busca, em síntese, a liberação e superação do estado dual conflitivo (dito
“sofrimento”), o choque entre tendências puras e impuras, a divisão aparente
ou circunstancial entre a sapiência e a ignorância. Não nos esquecendo que todo
homem é portador da imortalidade, da universalidade e por conseguinte um
potencial e real detentor do conhecimento.
Pessoas há que, insaciáveis, insanas, desejam conquistar e acumular mais e
mais objetos, poder, glórias. Sempre temem o diferente, o que se lhes significa
“ameaça” e passam (a buscar) a destruição do que lhes possa(m) ocasionar ou
criar obstáculos – ainda que imaginários – às suas desmedidas ambições. Tornamse predadores, devoradores de valores e de homens. Atropelam, como um boi
selvagem ou um elefante enlouquecido, quem lhes estiver à frente. Se não o
conseguem, tornam-se frustrados, enraivecidos, de uma mente perniciosamente
destrutiva, maligna.
Eis a luta interna entre a ignorância e a sabedoria. Somente o ser equilibrado,
dotado de mente fortalecida, efetivando a Divindade em si, consegue vencer os
princípios e os guerreiros milenares da ignorância, do desconhecimento, da
instintividade e da impulsividade.
AO PÉ DA FOGUEIRA
Fatos pitorescos, históricos, lendários, folclóricos etc...de São Tiago e região
UM MAU NEGÓCIO
Adquirira uns garrotes para recriar. Na certa, na verdade, seis cabeças. Serviriam
para completar uma partida arrematada em outra cidade, em um leilão de queima
de plantel. A meia dúzia de novilhos negociada, de fato, era um brinco. Animais
vistosos, pelo sadio, azebuados.
O negócio, porém, fora apertado. Muita relagem, muita conversa, um pinguepongue de horas. O dono querendo mais, enaltecendo e elogiando desbragadamente
o lote. Comprador jogando pra baixo, escorregadio, erradio no falar. Até que se
entenderam quanto a preço e prazo – tudo selado num café coado de fresco,
servido na cozinha do vendedor e um cálido aperto de mão bem à mineira, à saída
da porteira.
Partida de reses, enfim, chega à fazenda de destino. Vermifugadas, vacinadas,
marcadas e conduzidas à pastagem. Invernada saudável, pastagem verdinha, viçosa,
bem formada. Água limpa, sal mineral à vontade nos cochos. Um mês passado,
o vaqueiro traz a grave notícia: um dos garrotes recém-chegados, daqueles seis,
aparecera morto. Inexplicável. No limpo, quem sabe erva venenosa ou bote maligno
de cascavel, que andavam assanhadas pelas grotas, depois que um benzedor as
retirara do terreno vizinho e as “encostara” e as “esparramara” pelas adjacências,
em terras do patrão. Enfim, azares, riscos de qualquer negócio.
Mais umas semanas se passaram. Urubu primeiro esvoaçante, depois rastejante
pelos lados da invernada. Um calafrio sacudiu todo o proprietário ao receber a
informação. Um dos garrotes, o segundo do lote, despencara do barranco. Uma
barranceira miúda, curta, que qualquer filhote de lontra ou lobo-guará pulava de um
salto, sem risco algum.
– Briga destas de marreio, de sabujice... Morte de bobeira, deduzira e
assim reduzira o capataz em poucas palavras, ao comunicar o patrão. Consolo,
desconsolo...
O fazendeiro passou a cismar. Duas reses em menos de noventa dias. Da mesma
procedência, da mesma mão. Bem que lhe disseram, alertaram-no que o vendedor
daquele lote tinha o hábito de “segurar o negócio pelo rabo”, que “não tinha olho
bom”. Lembrava-se agora que, nesse período, virava e mexia, ao encontrarse eventualmente com o antigo dono das reses, este perguntava sempre pelas
mesmas, tecendo-lhes loas, rasgando-lhes seda...
Algum tempo estirado, já entrada das águas. Pé d'água subitamente se formando,
despejando-se sobre a fazenda e redondezas. Relâmpagos e coriscos riscando
por sobre as serras, faiscando os céus, em meio ao súbito breu circundante. Do
barracão, o administrador ainda viu o fogaréu lambendo as cercas de arame farpado,
árvores lesionadas pelo fogo celeste, galhos de árvores decepados, arrastados pela
ventania, espatifando-se além. Teve um estremecimento dos pés aos cabelos da
cabeça, que se ouriçaram de todo.
– Cáspite! Murmurou entre os dentes abalados, mais e
adquirida do mesmo dono. “Mau olho dos bravos. Só
pode ser coisa do tinhoso”, assim monologou o capataz.
– Cáspite! Murmurou entre os dentes abalados, mais e
maus pressentimentos.
Passada a tormenta, arriou o cavalo baião e foi dar
uma verificada. Ainda quentes, chão fumegante, dois
garrotes fulminados pelo raio, bem ao lado da cerca
de arame farpado. E eram justamente os da partida
adquirida do mesmo dono. “Mau olho dos bravos. Só
pode ser coisa do tinhoso”, assim monologou o capataz.
Duro dizer ao patrão que, ao ouvir o abominável relato, engoliu a seco.
Quatro cabeças tinham já rolado. Estranhamente macabro...
As irmãs de caridade, abnegadas administradoras da Santa Casa da cidade
vizinha, apareceram – como faziam todos os anos – solicitando um adjutório. Uma
rês para o leilão beneficente anualmente realizado em benefício da nobre instituição
hospitalar. Evento tradicional todo ele realizado com prendas dos fazendeiros de
toda a região – gado, cereais, café, polvilho – e que ninguém negava. Assombrado,
atarantado, quem sabe não estaria rezando o devido, algum “olho gordo” decerto
em seus negócios, o proprietário doou um de seus melhores bois, justo, por
coincidência, um dos remanescentes dos antigos “seis”, agora reduzidos a dois.
O caminhão da Prefeitura, véspera do leilão, viera buscar a dádiva, embarcada
junto aos demais garrotes concedidos pelos sitiantes daquelas paragens. Soube,
posteriormente, que o arrematante de alguns bois, um atravessador de gado,
inclusive o que ele doara, ressabiara no pagamento à Santa Casa, alegando que fora
vítima de roubo. Sua carga de bois, quando em direção ao matadouro, fora roubada
no caminho. - Coisas de fora da lei, assim alegara. E parece que a honorável
instituição hospitalar ficara a ficar navios.
Final da estação de chuva, o fazendeiro decidiu por vender uma partida de bois,
todos erados, gordos, no ponto de abate. O marchante é chamado à fazenda e é-lhe
apresentado o lote de umas trinta cabeças. Em meio ao grupo, ali estava o último
novilho da ”turma dos seis”. Agora um boi airoso, robusto, coisa de umas 19, 20
arrobas, que a pesagem era no “olho”.
Enquanto vendedor e boiadeiro proseavam, assuntos corriqueiros, negócio se
fechando nos finalmente, abrupto rebuliço estremeceu o curral. Briga entre as
reses. Praça de guerra. Arena de gladiadores munidos de chifres, patas, berros.
Poeira ensurdecedora. Num átimo, um dos bois litigantes, para pasmo dos
circunstantes, é arremessado para o alto, estatelando-se e estrebuchando-se
sobre o largo cocho de pedras. A custo, peões conseguem separar os animais
beligerantes. Aproximam-se do animal abatido, que agonizava, pois tivera partidas
as costelas, pescoço...
Era o moribundo o último espécime da turma dos seis...
MAIS UMA AVE OBSERVADA - TIÉ SANGUE
1 - Qual é o bicho que anda com as patas?
2 - Qual a cor mais barulhenta?
3 - O que a minhoca falou pro minhoco?
4 - O que o tijolo falou pro outro?
5- O que é que fazem todos ao mesmo tempo:
velhos, novos e crianças?
Respostas: 1- O pato; 2- A CORNETA; 3- Você minhoquece; 4Há um ciumento entre nós; 5- Envelhecem
Provérbios e Adágios
Pai rico, filho nobre, neto pobre.
O pai rouba, o filho come, o neto passa fome.
Lenha verde pouco acende; quem muito dorme, pouco
aprende.
Avistada nos locais “Córrego Fundo” e
“Jacaré”, nos últimos dias, espécimes de Tiésangue (também conhecida como sangue-de-boi,
tié fogo, tapiranga, xau baeta, tié berne).
Uma ave belíssima, das mais belas que
se conhece. Comum nas costas do Brasil,
chegando, após transpor as montanhas do litoral, até Minas Gerais.
Habita as baixadas, margens ensombradas dos rios, as moitas espessas e
numerosas ou os macios de verdura do litoral ou das primeiras cadeias de
montanhas, Plumagem brilhante, senão deslumbrante. O macho é matizado,
contrastando as cores vermelha e negra: a fêmea, verde olivácea. Vive em
sociedade pouco numerosa, geralmente o casal adulto e os filhos jovens.
Canto rouco e, por vezes, desagradável. Voa de galho em galho, sempre
inquieto e desenvolto, petulante até, numa movimentação contínua que lhe
denuncia a presença e o torna vítima de caçadores. Alimenta-se de pequenas
bagas, em especial os grãos vermelhos da aroeira e pitanga.
Quem morre por gosto, enterra no brejo.
O que é de gosto, regala a vida.
EXPEDIENTE
QUEM SOMOS:
EXPEDIENTE
O boletim é uma iniciativa independente,
necessitando de apoio de todos os SãoTiaguenses, amigos de São Tiago e
pessoas comprometidas com o processo e
desenvolvimento de nossa região. Contribua
conosco, pois somos a soma de todos os
esforços e estamos contando com o seu.
Redação: João Pinto de Oliveira, Heloisa Helena
V. Reis Oliveira e Marcus Antonio Santiago
Apoio: Ana Clara de Paula e Angela Carolina
Ribeiro Costa
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Falar com Angela Carolina Ribeiro Costa
Realização:
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ORIGEM DAS EXPRESSÕES:
Pra inglês ver: A expressão surgiu por volta de 1830,
quando a Inglaterra exigiu que o Brasil aprovasse leis
que impedissem o tráfico de escravos. No entanto, todos
sabiam que essas leis não seriam cumpridas, assim, elas teriam sido criadas
apenas “pra inglês ver”.
Onde Judas perdeu as botas: A expressão é usada para designar um lugar
distante, desconhecido e incessível. Existe uma história não comprovada
que relata que, após trair Jesus, Judas enforcou-se em uma árvore sem
nada nos pés, já que havia posto o dinheiro que ganhara por entregar Jesus
dentro de suas botas. Quando os soldados viram que
Judas estava sem seus sapatos, saíram em busca dos
mesmos e do dinheiro da traição. Nunca ninguém,
ficou sabendo se tais botas foram achadas. Acreditase que foi assim que surgiu tal expressão.
Patrocínio:
Apoio Cultural:
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
A ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL E O FORTALECIMENTO
DA CULTURA EM NOSSA TERRA
Nosso singular periódico tem como preocupação básica registrar
e apoiar, dentro das habituais limitações, as manifestações culturais,
memorialísticas e históricas de nossa terra e região circunvizinha. É de
competência institucional da administração municipal a coordenação
e o incentivo, por todos os meios, da cultura local, inclusive
fortalecendo-a e transmutando-a em grande vetor da economia
municipal. Aí está o exemplo vitorioso da tradição do “Café com
Biscoito”, que hoje rende inegáveis frutos à coletividade, em termos
de empreendedorismo, investimentos financeiros, turismo e por que
não, a expansão da autoestima coletiva.
O proeminente Senador Cristovam Buarque (PDT/DF), em recente
pronunciamento no Senado Federal, alertou quanto á importância dos
Governos, em todos os níveis, estimularem a chamada “economia
criativa” ou “economia cultural”, que é aquela provinda das raízes
populares, ou seja do artesanato, gastronomia, agroindústria de
pequeno e médio portes, das tradições (aí estão o carnaval, os festivais
folclóricos-juninos do Nordeste, o bumba meu boi em Parintins no
Amazonas, etc.) que, hoje, envolvem o giro de milhões de reais, em
termos de infraestrutura de hotéis, áreas de lazer, restaurantes, custos
de figurinos, cenários, cachês de artistas, etc.).
Grande expectativa cerca a nova administração municipal,
recém eleita, na pessoa do sr. IRIMAR JOSÉ MENDES, a quem
cumprimentamos e parabenizamos, ao qual caberá a missão de
incrementar a extensão e expansão de nossas tradições e valores
culturais. Algo substancial já se fêz nos últimos anos e muito há ainda
a se fazer, quer no âmbito de nossa culinária de forno, mais ainda na
gastronomia de fogão: no resgate de nossas danças e coreografias
(catira, congado, moçambique, quadrilha ,cavalhadas, cantigas de
roda e demais folguedos infantis, etc.). A revitalização, urbanização
de nossas fontes e chafarizes; o projeto do parque municipal urbano
(a grande aspiração do Dr. Messias Natalino Santiago) e da antiga
Usina do Rio Sujo, aglutinado à Reserva do histórico Morro da Vigia, o
tombamento de imóveis urbanos e rurais de valor histórico, o projeto
do memorial dos ex-combatentes, etc. E tantos outros projetos, para
os quais não faltarão o aplauso e o apoio de toda a comunidade.
Descartada qualquer nuance político-pessoal, há que se reconhecer
o inegável avanço cultural de São Tiago ultimamente, em particular na
gestão do Sr. DENILSON REIS, e que hoje nos identifica e nos projeta
como uma referência regional quanto ao resgate da cultura e da memória
comunitária. A implantação efetiva do Memorial Santiaguense, o Forno
na Praça, o apoio consistente ao Festival do Café com Biscoito (hoje
de repercussão nacional) e a entidades como Assabiscoito, ACIST,
convênios com o FOCEST, dentre tantos, configuram pontos valiosos
para que São Tiago, progressivamente, se fortaleça e faça sobressair
suas tradições e valores sociais, econômicos e culturais. Enfim,
uma comunidade a gozar de sustentabilidade, em todos os níveis,
engendrando em cada um de nós a autoestima, o dever e o prazer de
ser sãotiaguense. E que temos certeza se robustecerá, cada vez mais!
Outro aspecto a ser enfatizado é que o administrador municipal
necessita manter uma postura institucional, simultaneamente litúrgica
e publicitária, assim diríamos, participando de eventos (reuniões,
seminários, workshops, etc.) e ainda de intercâmbio e interrelação com
a mídia, (jornais, TV, internet, etc.), sempre no intuito de divulgar o
Município e obviamente sua gestão. Não se esquecendo da elaboração
de bons projetos, da captação de recursos – que sabemos, serem até
fartos - junto a órgãos públicos estaduais e federais. Eis a função do
administrador estrategista, atualizado e assertivo.
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
UM COMENTÁRIO...
Durante os entreveros ocorridos nas redes sociais, ao ensejo do
último pleito municipal, um usuário do Facebook, ao se referir ao
nosso boletim, afirmou que: “é fácil falar sobre mortos”.
Esclarecemos, sem nenhum intuito de polemizar e apenas a título
de esclarecimento:
1. As edições de nosso boletim são mantidas por doações
espontâneas de pessoas e empresas amigas, sensíveis à causa
cultural, a quem muito agradecemos. Um exemplo que deveria ser
seguido por tantos outros... E lembrando que toda e qualquer ajuda é
sempre bem vinda!
2. É uma honra, sem dúvida, falarmos em nossas páginas sobre os
nossos antepassados (“mortos”, no dizer do usuário), o muito que
fizeram e realizaram por nossa coletividade, nos legando o exemplo e
os valores maiores do trabalho, da probidade, da honradez, do respeito
e da tolerância. Como reza o ditado latino: “De mortuis nihil nisi bene”
(Dos mortos falar sempre o bem) Ou o conhecido dito de Auguste
Comte: “os mortos governam os vivos”. E não nos esquecendo de
que, um dia, nós os chamados “vivos” estaremos na categoria de
“mortos” - e o que dirão de nós?!
Aqui temos abordado, igualmente, dezenas de assuntos diversos
pertinentes à nossa memória, história, tradições, folclore, folguedos,
oralidade, artes manuais e cênicas, gastronomia, geotopologia,
turismo, além da história e saga de nossas instituições sociais,
assistenciais, educacionais, etc.
Nosso trabalho, apesar de limitado, é deveras bem avaliado e
reconhecido pela população, por nossas autoridades e ainda por
educadores, artistas, pesquisadores de cidades da região.
O acesso à cultura é um direito constitucional e que deve ser
exercido por todos, cabendo ao Poder Público incentivar e difundir as
manifestações culturais e afins da coletividade.
A Lei Orgânica Municipal reza em seu art. 163, IV, a competência
do Poder Público na “adoção de medidas adequadas à identificação,
proteção, conservação, valorização e recuperação do patrimônio
cultural, histórico, natural e científico do município”. O patrimônio
cultural municipal é constituído por bens de natureza material e
imaterial, que contenham referências à identidade, à ação e à memória
dos diferentes grupos formadores da sociedade local, aí inclusos:
formas de expressão; modos de criar, fazer e viver; criações científicas,
tecnológicas, artísticas; obras, objetos, documentos, edificações,
sítios e demais espaços destinados às manifestações artísticas e
culturais (art. 164, LOMST).
Entendemos ser inadiável, entre nós, a instalação do Arquivo
Público Municipal, que em parceria e com o apoio de toda a sociedade,
reunirá todo o acervo documental, de valor histórico, legal e cultural
do Município: livros, textos, jornais, papéis, partituras, etc. Estaríamos
assim aplicando o que reza o art. 165 da LOMST).
“O Município, com a colaboração da comunidade, protegerá o
patrimônio cultural por meio de inventários, registros, vigilância,
tombamento, desapropriação e outras formas de acautelamento e
preservação e, ainda, de repressão aos danos e às ameaças a esse
patrimônio”.
(Num próximo nº, abordaremos a área ambiental e a defesa dos
recursos naturais do Município, a quem cabe uma austera e lúcida
posição da Administração Municipal e de toda a comunidade).
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ROTARY CLUB
O Rotary Club é uma organização formada por líderes de negócios,
empreendedores e profissionais, objetivando a prestação de serviços
humanitários e altruístas. Definido como um clube ou célula de serviços
prestados à comunidade local e mundial, sempre sem fins lucrativos,
não sendo, todavia, uma instituição filantrópica ou “secreta”.
Seu lema é: “Dar de si antes de pensar em si”.
Os rotarianos são sócios de seus respectivos clubes, os quais, por
sua vez, são membros do Rotary International. Fomentam um elevado
padrão de ética em todas as profissões e atividades, através da prática
da denominada “Prova Quádrupla”, assim expressa: “Do que nós
pensamos, dizemos ou fazemos: 1 – é a Verdade? 2 – é justo para
todos os interessados? 3 – Criará boa vontade e melhores amizades?
4 – Será benéfico para todos os interessados?”
OBJETIVOS – O objetivo do Rotary é estimular e fomentar o ideal
de servir como base de todo empreendimento digno, promovendo e
apoiando:
I – O desenvolvimento do companheirismo como elemento capaz de
proporcionar oportunidades de servir;
II – O reconhecimento do mérito de toda ocupação útil e a difusão de
normas de ética profissional;
III – A melhoria da comunidade pela conduta exemplar de cada um
na sua vida pública e privada;
IV – A aproximação dos profissionais de todo o mundo, visando
a consolidação das boas relações, da cooperação e da paz entre as
nações.
Uma sublime e elevada missão, no sentido de que os rotarianos e os
Rotary Clubes atinjam os estágios e princípios apurados da Instituição,
ou seja, apoiar as atividades do indivíduo e dos grupos prestadores
de serviços, melhorando-se a qualidade de vida, mantendo-se e
fortalecendo-se a dignidade humana, promovendo-se a compreensão
entre os povos e consolidando-se a paz mundial.
ORIGENS - O Rotary Club foi fundado na cidade de Chicago,
Estados Unidos, em 1905 (sua primeira reunião foi realizada no dia
23/02/1905) pelo advogado Paul Percy Harris , seu primeiro presidente.
Paul Harris teve como primeiros membros e companheiros de ideal:
Gustavus Loehr (engenheiro de minas), Hiram Shorey (alfaiate) e
Silvester Schiele (empresário e comerciante de carvão). O movimento
rapidamente se espalhou pelo território americano. Já em 1910 era
fundada a Associação Nacional de Rotary Clubs, nome que foi alterado
para Associação Internacional de Rotary Clubs em 1912 em função
da admissão do 1º Rotary Club fora dos Estados Unidos, localizado
em Winnipeg, Canadá. A partir de 1922, passou a denominar-se
simplesmente Rotary International.
Atualmente existem mais de 1,2 milhões de rotarianos associados e
cerca de 32.500 Rotary Clubs espalhados por quase todos os países
do mundo. Sua séde mundial é na cidade de Evanston, nos Estados
Unidos.
PAUL PERCY HARRIS
Paul Percy Harris, o fundador do Rotary Club, nasceu em 19 de Abril
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de 1868 em Racine, Wisconsin, EUA e passou praticamente toda a sua
infância na cidade de Wallingford, Vermont.
Realizou os seus estudos nas Universidades de Vermont, Princeton
e Iowa. Nesta última, formou-se em Direito em 1891. Trabalhou
como repórter para vários jornais e ainda como vendedor para uma
companhia de mármore e granito, viajando por inúmeros países. Foi
também ator numa companhia de teatro e professor na Faculdade de
Ciências e Letras de Los Angeles.
Em 1896, estabeleceu-se como advogado em Chicago. Suas
viagens e negócios pelo mundo, suas experiências comerciais e
sociais e amizades contraídas alargaram sua visão de como fortalecer
tais vínculos e estruturá-los em termos de companheirismo e de
fraternidade universal. Dizia e pregava que a humanidade era uma só
e as pessoas, independentemente de raças, credos, países, deveriam
criar inexpugnáveis pontes de amizade e solidariedade entre si.
Assim, em 1905, após reflexões e impressões coligidas ao longo
de sua ativa existência, formulou sua filosofia altruísta, a partir das
relações comerciais e profissionais, organizando com o apoio inicial
de mais três companheiros e idealistas (Gustavus Loehr, Silvester
Schiele e Hiram Shorey), o primeiro clube.
Paul Harris batizou o núcleo de “Rotary”, porque os seus sócios
se reuniam em rodizio, nos seus lugares de negócios. A iniciativa
granjeou imediato apoio e receptividade e seu quadro social cresceu
rapidamente, de inicio nos Estados Unidos e a seguir, por vários outros
países.
0 2º clube foi fundado em San Francisco em 1908 e já, em 1910,
havia 16 clubes funcionando. Neste ano (1910) foi organizada a
Associação Nacional dos Rotary Clubes e com a formação de clubes
no Canadá e Inglaterra (1912), o nome foi trocado para Associação
Internacional dos Rotary Clubes, nome simplificado para Rotary
International em 1922.
Ao falecer em Janeiro de 1947, Paul Harris ocupava o cargo de
Presidente emérito do Rotary International. Além de conceituado
advogado, Paul Harris foi um excepcional humanista e benfeitor social.
Foi o 1º presidente do Conselho da Sociedade Nacional para crianças
e adultos aleijados dos Estados Unidos e da Sociedade Internacional
para crianças aleijadas. Representante do Conselho de Advogados de
Chicago no Congresso Internacional de Direito em Haia. Recebeu, ao
longo de sua laboriosa vida, inúmeras homenagens de universidades
americanas; premiado com a medalha “Búfalo de Prata” dos Escoteiros
da América. Condecorado por governos de vários países, dentre estes
o Brasil, Chile, Equador, República Dominicana, Peru, França, etc.
O ROTARY CLUB EM SÃO TIAGO
O Rotary Club de nossa cidade foi instalado em 1982, com o apoio, o
patrocínio e o apadrinhamento do Rotary Club de Oliveira. Iniciou suas
atividades em setembro de 1982, funcionando à época – realização
de suas reuniões – nas dependências da Séde Social Santiaguense.
Posteriormente, edificou sua imponente séde própria na Rua Estados
Unidos, nº 80, bairro Nações Unidas.
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
Presidentes do ROTARY CLUB de São Tiago:
Iraci Vieira da Costa - 1982/83
Mozar Resende – 1983/84 e 2005/06
Rubens de Oliveira Matta – l984/85 e l999/2000
Raul Wilson da Mata – l985/86 e 2006/07
Antonio Marques da Silva – l986/87
André Wilson Teixeira da Mata – l987/88
Adeildo Lopes de Resende – l988/89
Antonio Machado Neto – 1989/90
Laércio de Paiva Neves – 1990/91
Sebastião Patrício Siva –1991/92
Waldomiro Madaleno – l992/93
Luis Carlos da Mata – l993/94
Rogério Ladeira Franco – 1994/95
Célia Dulce Silva – l995/96
Francisco Manoel Barcelos – 1996/97 e 2000/2001
Márcio Dias Rafael – 1997/98
Robson Nelson Carvalho – l998/99 e 2004/05
Onofre Ricardo da Silveira – 2001/02
Nilson Pacheco Santos – 2002/03 e 2003/04
Paulo Ananias Campos – 2007/08
Eder Paulo Resende – 2008/09
Fernando Caputo – 2009/10
Geraldo Tadeu Oliveira – 2010/11
Vicente Teixeira – 2011/2012
José Alves Filho – 2012/13
DR. JULIO FERREIRA DE CARVALHO - MEIO SÉCULO DE SEU FALECIMENTO
No dia 22 de outubro último, nossa
comunidade rememorou e se irmanou na
imperecível lembrança do cinquentenário de
morte de um de seus mais ilustres filhos, o Dr.
JÚLIO FERREIRA DE CARVALHO.(1)
Nascido na histórica Fazenda “Vargem Alegre”, em nosso município,
em 28/01/1893, filho de Laudares Antonio de Carvalho e Maria José de
Carvalho, Júlio Ferreira exerceu, ao longo de sua laboriosa e modelar
existência, as mais altas funções públicas e ainda privadas do Estado
de Minas Gerais, como advogado, promotor de justiça, jurista,
estadista, professor universitário, jornalista, deputado, magistrado,
dentre tantas.
Estudou humanidades em São João del Rei, para onde se transferira,
ainda muito jovem. Formado pela Faculdade de Direito de Minas, em
Belo Horizonte, iniciando sua vida jurídica como Promotor de Justiça
em Estrela do Sul, no Triângulo Mineiro (1919). Advogou ainda em São
João del Rei, no inicio da década de 1920. Em 1925, radicou-se em
Belo Horizonte, onde instalou escritório de advocacia, tornando-se um
dos mais acatados causídicos e homens do direito de Belo Horizonte
e do Estado, tendo como clientes grandes bancos, mineradores, etc.
Algumas de suas inúmeras funções profissionais e públicas e que
engrandecem seu notável currículo:
• Interventor (cargo correspondente ao de governador) do Estado de
Minas Gerais, nomeado pelo então Presidente da República, Marechal
Eurico Gaspar Dutra (1946);
• Deputado Estadual, no período de 1947 a l951, sendo ele o Presidente
da Comissão Constitucional Especial e de leis complementares que
elaborou a Constituição Mineira, após o Estado Novo;
• Advogado Geral do Estado de Minas Gerais, no Governo de
Juscelino Kubitschek (195l-1955);
• Juiz do Tribunal Regional Eleitoral – TRE/MG;
• Procurador da Justiça Eleitoral (1932-1937);
• Membro do Conselho Consultivo do Estado, no governo de
Olegário Maciel (1931) e da Comissão Técnico-Jurídica e Consultiva
de Belo Horizonte (1933-1935);
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
• Presidente do Conselho Constitutivo do Estado (1946);
• Presidente da Usiminas (1961);
• Professor de Direito Civil da Faculdade de Direito da Universidade
Católica de Minas Gerais-UCMG;
• Diretor da revista “Forense”;
• Presidente do Instituto da Ordem dos Advogados de Minas GeraisOAB/MG (1951)
• Membro do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais.
Sugerimos, infrutiferamente e, ao longo dos últimos anos, por
consideráveis vezes, às autoridades locais e à comunidade fossem
promovidas, neste ano de 2012, as devidas homenagens – dentre
elas, a título de sugestão, a confecção e instalação de seu busto em
praça pública e a realização de palestras sobre a vida e a obra deste
notável são-tiaguense e concursos de redação. Outra sugestão seria
o levantamento e até mesmo a edição de sua obra, conhecendose que foi ele orador privilegiado, além de diretor da revista jurídica
“Forense”, o que exigiriam maiores e aprofundadas pesquisas.
Seria uma excepcional oportunidade e ensejo para bem fixarmos e
enaltecermos, em especial junto aos nossos jovens e crianças, tão
memorável personalidade, que honra os cânones de história local e
de todo o Estado.
As homenagens propostas envolveriam, conforme nossa sugestão,
autoridades do Executivo, do Legislativo, do Judiciário e Ministério
Público Mineiro, além de órgãos como a Advocacia Geral do Estado, a
OAB-MG, do IHGMG, nos quais o Dr. Júlio Ferreira de Carvalho atuou
e honrou com a sua sabedoria, a sua honradez, ética, da probidade
administrativa e despojamento em prol do engrandecimento e do bem
estar públicos, valores por ele intransigentemente prezados.
Há que se lamentar, sob todos os aspectos, tão inexplicável
desinteresse por nossa história e pela figura das grandes personalidades
públicas, como o Dr. Júlio Ferreira de Carvalho!
NOTAS
(1) Sobre a marcante figura do Dr. Júlio Ferreira de Carvalho, ver
matérias neste boletim, publicadas na edição XVI, Janeiro/2009, pág.
6 e edição XXXVII, Outubro/2010, pág.7
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“MAU OLHADO”
“Mau olhado” ou “olho ruim” é a capacidade maléfica de
que algumas pessoas são portadoras, projetando fluidos
nocivos, de natureza primária e penetrante, sobre plantas,
animais e até crianças. Condensação mórbida, enfermiça,
tóxica que se acumula a nível mental de certos indivíduos,
descarregada, através do olhar, sobre algo que lhes atraiam
a atenção, despertem-lhes uma impressão violenta ou ainda
gerado por desejos veementes, sentimentos incontroláveis
de ciúme, inveja, raiva, cólera, ambição, despeito, cobiça,
frustração, vingança. Um energismo primário, pernicioso, de
ordem mental e etéreo astral, gerado e manipulado por mente
nefasta ou moral e espiritualmente invigilante. A
carga projetada corresponde ao potencial
e densidade psíquica de seu autor.
Como os olhos são os canais que
projetam as descargas fluídicas
próprias de cada pessoa - no caso
de pessoas de “mau olhado”,
más – a própria literatura atribui
aos portadores, inúmeras e
pitorescas classificações: “olhos
ferinos, argutos, cobiçosos,
frios, astuciosos, ofídicos,
reptilianos, viperinos”, etc.
As pessoas de boa índole,
fraternas, pias, por sua vez, trazem
no olhar a energia vitalizadora,
balsâmica, curativa, confortadora. Dai
a expressão poética dos olhos doces,
suaves...
Havia e ainda há o hábito de se
usar fitinha ou figa de cor vermelha, em
especial crianças ou junto a vasos e canteiros
de flores, em aves e animais, com o objetivo de absorver a
força nociva oriunda das pessoas de “mau olhado”. Sendo
o vermelho uma cor forte, excitante, ostensiva, ligada aos
instintos primários, ela acaba por atrair a energia nefasta
do mau olhado, condensando-a, absorvendo-a, antes que
ela atinja o campo etérico da planta, animal ou ser humano.
Uma espécie de para raios.
A tradição popular, a literatura e a história registram
casos, às centenas, de pessoas que, pelo olhar, fazem secar
plantas, inclusive árvores de considerável tamanho; fazem
adoecer e até matar animais de pequeno porte e produzem
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“quebranto” e prostração (anorexia) em crianças. Dai a ação
benéfica de “benzedores” que, com suas orações, rituais e
intercessões, ajudam no restabelecimento e fortalecimento
magnético (etérico astral) de nossos petizes.
Diz-se, a titulo de exemplo, que o famoso Rasputin (1), um
dos mais terríveis magos da história, chegava a intoxicar e
adoecer pessoas pela simples projeção de seu olhar diabólico.
Entre a população interiorana, outros objetos de aspecto
excêntrico, muitos toscos, espalhafatosos e assustadores
são utilizados como receptores de cargas fluídicas nocivas,
eventualmente lançadas contra plantações, residências,
animais e pessoas. Daí o largo uso, ainda hoje, de
ferraduras, chifres e caveiras de animais, amuletos,
espantalhos, carantonhas, carrancas, imagens ou
outros objetos burlescos e mesmo repulsivos
colocados no meio das lavouras, nas portas
das casas, locais de trabalho, como
condensadores de energias maléficas.
(1) Grigoriy Yefimovich Novykhn, mais
conhecido e apelidado como Rasputin
(Rasputinik ou Rasputin em russo
significa “pervertido”, “depravado”),
foi um legendário e abominável monge
russo nascido em Prokovskie, na Sibéria,
em 22/01/1869 e assassinado em São
Petersburgo em 16/12/1916. Conseguiu enorme
influência na Corte e na Igreja Nacional Russa,
à época do Czar Nicolau II, exercendo ainda
um poder desmedido e enceguecedor
junto à Czarina Alexandra Feodorovna
que o considerava um “mensageiro de
Deus”. Hábil em seus argumentos e
palavras, ao lado de seu avantajado físico,
conseguia seduzir a quase todos à sua volta.
De comportamento orgíaco, dissoluto, devasso, corruptor
de mulheres (desde simples camponesas às mais elegantes
damas da sociedade e da alta aristocracia russa), atraiu o ódio
de alguns nobres e políticos que, após inúmeras tentativas –
Rasputim resistira, incrivelmente, a envenenamento, tiros,
golpes, emasculação – conseguiram, finalmente, assassinálo por afogamento no Rio Neva.
Considerado um dos mais temíveis magos e bruxos de
todos os tempos. De cabelos negros e desgrenhados, barba
emaranhada, ferozes olhos – olhos de lobos cinzentos, dos
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quais poucos conseguiam se desvencilhar, assim dizia-se.
Camponês rude, semianalfabeto, adquirira fama de milagreiro
e curandeiro ao longo de suas peregrinações pelas aldeias
e regiões inóspitas do interior da Rússia e segundo alguns
biógrafos, teria ainda visitado santuários cristãos ortodoxos
na Grécia e Jerusalém. Era ligado a uma seita denominada
“Khlysty” (Flagelantes, em russo) e provavelmente membro
da seita “Thelema” do famoso mago inglês Aleister Cromley.
Até que chegou à Corte.
Homem sujo, asqueroso, beberrão, dotado, todavia, de
estranhos e hipnóticos poderes, extremamente lascivo,
depravado, impudico, insaciável, seduzira centenas de
mulheres da alta nobreza russa. Pregava a tese de que para
salvar-se, tinha-se que pecar. Uma figura sombria e ainda
hoje, um enigma humano e histórico!
MEDICINA POPULAR
As manifestações e ritos da natureza (ou sobrenatureza)
estão intrínseca e inelutavelmente ligados à vida humana,
desde a mais remota antiguidade. Assim, atos como benzeções,
conjuros, exorcismos, defumações, simpatias, magias
cerimoniais, evocações cabalísticas, etc., embora tachados,
preconceituosamente, como superstição, excentricidade,
empirismo, crendice, não importa a denominação, merecem
respeito e tolerância, porquanto, via de regra, são benéficos,
praticados por pessoas simples, de profunda religiosidade,
algumas até incultas (benzedores, raizeiros, magnetizadores,
herbanários, sensitivos), com objetivos de aliviar a dor
humana, resolver aflitivos problemas existenciais.
Em locais e épocas em que careciam médicos, remédios
industrializados, os chamados benzedores, parteiras e
raizeiros – herdeiros do milenar conhecimento de xamãs
e pajés – sempre prestaram inestimáveis serviços às
populações rurais e ainda o fazem nos dias atuais, em
plena era da informática e das viagens espaciais, retirando
quebrantos, maus olhados e outras enfermidades
geralmente de origem psíquico-emocional que afetam,
sobretudo, crianças; benzendo pastagens, safras, rebanhos;
receitando chás, tisanas, unguentos; manipulando xaropes
fitoterápicos, etc. São pessoas humildes, dotadas de nobre
espírito caritativo, de boa fé, seres de boa vontade, eivados
de singeleza própria dos puros de coração e de espírito, de
que nos fala o Evangelho.
Países de larga e riquíssima memória e ancestrais tradições
(ex: China, Índia, Japão, Tibete) desdobram-se em estudos,
apoio e pesquisas de resgate de sua antiga medicina popular,
incluindo a fitoterapia, quirapsia, iatralíptica, acupuntura,
ayurvédica, etc. bem como a valorização de seus agentes,
geralmente terapeutas e fitoterapeutas populares, incluindo
os chamados “médicos de pés descalços” (espécie de
trabalhadores da saúde que tratam a população com técnicas
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e terapias alternativas e caseiras).
No caso brasileiro, há a indeclinável e urgente necessidade
de se valorizar e se redescobrir a medicina popular, ainda
que seja para fins de complementação científica e de registro
memorialístico. Dispomos de rico acervo em termos de
produtos fitoterápicos: unguentos, balsamos, elixires,
tisanas, xaropes, pomadas, emplastros, florais, sinapisos,
chás... Com a ganância dos laboratórios multinacionais,
empanturrando o mercado de farmoquímicos; com o
comodismo do consumidor e agora até com a “ajuda” de
alguns religiosos - “donos da verdade” e da Palavra – que,
em suas pregações, condenam o uso de benzeções, tisanas,
terapias alternativas e para quem um simples torcicolo, um
edema, é obra do “diabo”. Cabe-nos revalorizar e respeitar
tão valioso patrimônio, herança de várias civilizações
que compõem a nacionalidade brasileiras, merecendo
inventariamento, pesquisas. Nossos raizeiros, benzedores,
os conhecedores das plantas medicinais vão falecendo,
levando consigo milenares segredos.
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Memórias de um amigo...
Atendendo ao convite
de nossa Assistente
Social, a jovem senhora
Ana Cristina, para que
eu
participasse
do
encerramento da VI
Semana do Idoso que
anualmente acontece em
nossa cidade e sempre
com grande brilhantismo, me propus e me atrevi a contar um
pouco da história deste homem de cor, cuja foto aparece no vídeo
e, que eu, desde criança passei a admirá-lo!
Este senhor que atendia em vida pelo nome de Teófilo Antônio
dos Santos, mais conhecido como Sr. Teófilo do Céu, nasceu sob a
égide da Lei do Ventre Livre em 1.884 na Fazenda “O Mato dentro”,
município de Ritápolis-MG, cuja construção conta hoje com quase
três séculos de existência e se encontra em perfeito estado de
conservação.
Como se pode notar, pelo que foi dito aqui, o Sr. Teófilo era filho
de escravos e seus pais, mesmo após terem alcançado a liberdade,
continuaram morando na mencionada Fazenda, como empregados
remunerados – daí foi só uma questão de tempo para que o filho
passasse a fazer parte do grupo de operários, juntando-se a eles.
Com o vigor de sua juventude e com sua extraordinária capacidade
e zelo pelo trabalho que fazia, não demorou muito a conquistar o
respeito e a admiração do patrão que, ao ensejo de seu casamento,
presenteou-o com uma generosa gleba de terras de ótima cultura
a qual lhe propiciou, com seu árduo e bem planejado esforço,
construir um bela e aconchegante morada, onde pôde criar sua
família unida, feliz e com muita fartura.
Pai de seis filhos, sendo dois homens e quatro mulheres: José
dos Santos (Deco), Sinésio Pedro dos Santos, Nedina dos Santos,
Alzira dos Santos e Maria Angelina de Jesus, única filha viva,
nascida à 26/12/1910, já conta com expressiva idade de 102 anos,
mora no município de Nova Iguaçu, estado do Rio de Janeiro, em
companhia de filhos e netos.
Mas, como todas as criaturas passam por momentos dolorosos
nesta vida, com o Sr. Teófilo não foi diferente, pois, ainda muito
jovem, ficou sem a companheira amada que foi tirada do seu
convívio pelos desígnios de Deus, deixando-o com seis filhos
menores e com a sagrada e difícil missão de ajuda-los a superar a
ausência da mãe. Este excepcional ser humano com sua inabalável
fé em Deus e obediente à sua grandiosa formação moral, conseguiu
criar sua família sempre unida, à sua volta, mesmo depois de
adultos, dando-lhe, por isso, tamanha felicidade até os últimos dias
de sua vida.
Permitam-me fazer uma rápida observação:
As terra a ele doadas fazem divisas com a Fazenda de meu pai,
razão essa que facilitou o nosso convívio e também porque ainda
criança, eu e meus irmãos, tínhamos grande curiosidade em saber
dele um pouco da história do seu ex-patrão que era filho do lendário
Antônio Ribeiro da Silva, o Guarda-mor, o mesmo que construiu a
Fazenda “O Mato Dentro” e que era o bisavô de meu pai.
fotos e confirmando datas, que muito me ajudaram a prestar esta
singela homenagem à memória deste exemplar ser humano que foi
Teófilo Antônio dos Santos.
Antonio Ribeiro Jackson
São Tiago - MG, 28 de setembro de 2012
Esta casa, que aparece na foto, foi construída pelo Sr. Teófilo,
na década de 40, para sua filha Carmosina, a qual não se casou.
Ela está situada a Rua Teófila Navarro, centro de São Tiago. Sendo
residida hoje, por sua netas.
Muitas histórias eu ainda poderia contar, a respeito desse senhor
que foi em vida, um grande homem, porém, a exiguidade do tempo
não me permite mais delongas, e ao encerrar, devo dizer da bela
lembrança que tenho dele quando volto, em reminiscências, a
minha saudosa infância.
Aos seus descendentes, que aqui se encontram, o meu
agradecimento pela presença e por terem colaborado, trazendo
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