República da Guiné-Bissau - SRSG on Violence Against Children

Transcrição

República da Guiné-Bissau - SRSG on Violence Against Children
República da Guiné-Bissau
Ministério da Solidariedade Social e Luta contra a Pobreza
Secretariado Nacional de Luta contra o Sida
Análise da Situação das Crianças Orfãs e Vulneraveis na
Guiné-Bissau
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
Lidia Germain
Alfredo Handem
Bissau, 1 Outubro de 2008
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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« Nous realisons ce que nous voulons realiser.
Si nous ne realisons pas quelque chose,
c’est parce que nous n’y avons pas applique toutes nos facultes.»
Muhammad Yunus, Premio Nobel da Paz, 2006
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Sumario
1. INTRODUCAO
1.1. Antecedentes
1.2. O compromisso com a crianca
1.3. Quadro analitico: quem sao as criancas vulneraveis
1.4. Vulnerabilidade e politicas publicas
1.5. O que e proteccao social
1.6. Contexto geral
2. ANALISE DA SITUACAO
2.1. Vulnerabilidade estrutural
Pobreza da crianca
Ma nutricao
Trabalho infantil
Acesso aos servicos basicos
2.2. Vulnerabilidade aguda
Criancas privadas de meio familiar
Criancas expostas a violacao de sua integridade psico-fisico
3. ANALISE DA RESPOSTA
3.1. Mecanismos destinados a criar um ambiente favoravel aos grupos vulneraveis
Luta contra a pobreza
Proteccao do estatuto juridico da crianca
Campanha de sensibilizacao
3.2. Politicas sociais basicas inclusivas e mecanismos de apoio a demanda
Registo de nascimento
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Acesso a saude
A luta contra o HIV/SIDA
Acesso a educacao
3.3. Mecanismos de apoio aos rendimentos
3.4. Mecanismos de proteccao social com base contributiva
3.5. Mecanismos de assistencia de base nao contributiva
3.6. Sistemas de proteccao da crianca
Accoes transversais/tematicas
4. ESTUDOS DE CASO: SECTOR AUTONOMO BISSAU (SAB), BAFATA E CACHEU
4.1. Introducao
4.2. Constatacoes gerais
4.3. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Sector Autonomo Bissau
(SAB)
4.4. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Regiao de Bafata
4.5. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Regiao de Cacheu
4.6. Conclusoes gerais dos estudos de caso
5. CONCLUSOES E RECOMENDACOES
5.1. Objectivos do estudo
5.2. Dificuldades e limitacoes
5.3. A abordagem da problematica
5.4. Analise da situacao
5.5. Analise da resposta
6. PROPOSTA DE ESTRATEGIA NACIONAL DE PROTECCAO SOCIAL PARA
ORFAOS E CRIANCAS VULNERAVEIS
6.1. Eixos estrategicos das intervencoes
6.2. Meios
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Anexo I – Lista das pessoas encontradas
Anexo II – Bibliografia
Anexo III – Lista das actividades desenvolvidas por zona geograficas para os estudos de
caso
Anexo IV – Lista de pessoas encontradas para os estudos de caso
Anexo V – Inquiridores para os estudos de caso
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1.
INTRODUCAO
“As criancas guineense estao sendo prejudicadas pela politica dos adultos”. A afirmacao deste
juiz e confirmada pela situacao de grande vulnerabilidade das criancas guineenses, expostas a
riscos que ameaçam gravemente a sua saúde e o seu desenvolvimento: a mortalidade infantil no
pais permanece entre as mais elevadas do continente; apesar de avanços importantes na educação,
o analfabetismo e uma ameaca concreta; as crianças são ainda expostas a a trabalho precoce, a
exploração e discriminacao. O fraco desenvolvimento dos indicadores sociais da Guine Bissau é
preocupante e se medidas importantes a curto e médio prazo não forem implementadas a presente
geração de criancas risca de ser perdida e o futuro do país de estar ainda mais comprometido.
A realização dos direitos básicos das crianças guineenses a vida e ao desenvolvimento, a uma
educação de qualidade e a protecção contra toda forma de violência e uma tarefa urgente que
necessita de uma intensificação e conjugação de esforcos e uma organizacao mais rigorosa.
A pedido do Governo do Guine Bissau, e em particular do Ministério da Solidariedade, este
documento apresenta uma analise rapida da situacao das criancas mais vulneraveis e propoe
linhas estratégicas para reduzir sua vulnerabilidade. Este trabalho situa-se no contexto de
elaboraçao de uma Politica nacional de protecçao social a ser implementada em concertação entre
todos os actores e visa clarificar os desafios e os objectivos relativamente à protecçao do grupo
mais vulneravel da populaçao – as crianças.
A proteccao social é vista como um mecanismo de reforço do conjunto das politicas sociais
basicas destinadas a realizar os direitos fundamentais da crianca. Como tal, a proteccao social
não pode dar respostas globais que dependem das politicas de desenvolvimento e de reducao da
pobreza. A proteccao social e concebida como o complemento necessario com vistas a nao deixar
para tras os grupos mais vulneraveis, por definicao excluidos dos servicos basicos.
Uma atenção especial é acordada à análise do impacto do HIV/SIDA nas famílias e nas crianças,
tendo em conta as gravissimas consequencias causadas pela epidemia sobre o bem estar da
crianca em outros países: altos números de crianças órfãs de pai e mãe, incapacidade das famílias
alargadas a acolherem todos os orfaos, crianças nos cuidados dos avos, famílias a sofrer
problemas de estigmatização nas comunidades e de discriminação em relação ao acesso aos
serviços básicos.
1.1. Antecedentes
Este trabalho tem lugar num momento em a luta contra o HIV/SIDA é considerada um dos
maiores desafios da actualidade. A recente conferência de México sobre o Sida revelou dados
verdadeiramente espantosos. Só em 2007, houve 2,7 milhões de novos casos da doença no
mundo, elevando o número de infectados para cerca de 33 milhões. As Nações Unidas estimam
que 7.400 pessoas sejam infectadas diariamente pelo Sida no mundo, 45% delas têm entre 15 e 24
anos. De entre as pessoas infectadas 67% residem na região sul de África, o que equivale a cerca
de 22 milhões de infectados.
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Segundo o relatório das Nações Unidas apresentado na referida conferência, cerca de 370 mil
crianças foram afectadas pelo VIH em 2007 e, mais de 270 mil dessas crianças acabaram por
morrer. Entre 2001 e 2007, o número de crianças com Sida no mundo passou de 1,6 milhão para
2 milhões1. Esses dados são extremamente importantes na medida em que nos remete a todos
(intelectuais, camponeses, estudantes, políticos e homens de negócio) a uma auto-reflexão sobre
as nossas acções, atitudes e comportamento face a essa doença do século.
Na Guiné-Bissau, a situação em relação a evolução da taxa do HIV/SIDA é cada vez mais
preocupante. De acordo com a projecção nacional (MINSAP/DHE – estudo sentinela, 2006), a
Guiné-Bissau poderá até o fim de 2008 contar com cerca de 100.000 pessoas infectadas pelo
Sida, o que equivale dizer que 7 em cada 100 pessoas poderão provavelmente ficar infectados até
esse período.
Em todos os paises atingidos pelo HIV/SIDA , a resposta à vulnerabilidade social provocada pela
doença nas familias e nas criancas atingidas é parte integrante dos esforcos nacionais de luta
contra a epidemia. Em particular, o fenómeno inedito de aumento exponencial do numeros de
orfaos devido ao SIDA tem necessitado de respostas de grande alcance para assegurar os direitos
basicos destas criancas.
Na Guine Bissau, a crise dos orfaos que tem atingido outros paises nao esta ainda presente.
Porem, existe a preocupacao que isto possa vir a acontcer nos proximos anos. De qualquer modo,
a resposta ao impacto do HIV/SIDA nas familias e nas criancas e uma componente da luta contra
a SIDA no pais. Desde a elaboracao do primeiro Plano Nacional de luta contra a HIV/SIDA
(2003-2005), os actores da area social guineense tem se confrontado com o desafio de elaborar
uma estrategia nacional multidisciplinar nesta area.Varios passos foram dados nesta direcção, em
particular com uma missão em 2003, apoiada pelo Banco Mundial, que teve o objectivo de
desenvolver a componente Orfaos e Criancas Vulneraveis do MAP (Multisectoral AIDS Project).
Face aos desafios lancados por este estudo preliminar2, os actores – engajados em algumas
acções isoladas - optaram pela coordenação como condição de partida para a busca de soluções.
Decidiu-se assim pela criação de uma comissão multidisciplinar que coordenasse os actores da
luta contra a SIDA e os actores da area social em torno de iniciativas e solucoes articuladas entre
elas.
A Comissao OVC (Orfaos e Criancas Vulneraveis) foi criada por decisão conjunta do Ministerio
da Solidariedade Social, Familia e Luta contra a Pobreza (MSSFLP) e do Secretariado Nacional
de Luta contra a SIDA (SNLS), e com o apoio do UNICEF. Esta Comissão OVC é coordenada
pela Directora da Solidariedade e da Familia, Dr. Inacia Mendes, com o apoio do SNLS, Dr.
Magda Lopes, e do UNICEF, seccao de HIV/SIDA e de Proteccao. Ela integra as seguintes
organizacoes:
 AIDA
 Aldeia SOS
 AMIC
 Casa Emanuel
 Ceu e Terra
 IMC
1
Jornal “Última Hora”. 1 Agosto 2008,
Rapport de fin de mission - Composante appui aux orphelins et groupes vulnerables, Projet d’appui de la
Banque Mondiale a la lutte contre le SIDA en Guine Bissua, Janeiro 2004
2
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

INDE
Tribunal Regional de Bissau
O objectivo da Comissao OVC é portanto de coordenar a intervenção dos diversos actores em
torno do reforco da resposta ao impacto social ao HIV/SIDA. Face a amplitude da
vulnerabilidade no pais, os actores adoptaram a postura de abordar a problematica dos orfaos e
das criancas vulneraveis como um todo, seja qual for a fonte de vulnerabilidade. Para tal, foi
decidida a elaboração de uma estrategia para orfaos e criancas vulneraveis na Guine Bissau no
contexto mais amplo de elaboração da Politica Nacional de Proteccao Social. Apos multiplas
discussões, a Comissão decidiu que o primeiro passo deveria ser a elaboracao de um estudo que
analisasse o impacto do HIV/SIDA e de outros factores de vulnerabilidade sobre as criancas
guineenses. Um conhecimento mais apurado da realidade social das familias e das criancas
atingidas pela epidemia, das diferentes facetas do impacto da doenca e dos obitos devidos ao
HIV e das dimensoes da discriminacao ligada ao HIV/SIDA nas comunidades guineenses
poderia fornecer as orientacoes necessarias para desenhar a resposta social mais adequada as
necessidades destas familias e de suas criancas. Com base no estudo, seria elaborada uma
estrategia nacional, partilhada pelo Estado e pelas organizacoes nao governamentais, que
orientasse as respostas, fazendo convergir os esforcos de todos para os mesmos objectivos
prioritarios. O presente relatorio e a estrategia apresentada é o fruto deste trabalho.
O presente trabalho foi realizado numa perspectiva participativa, isto é o relatorio é concebido
como uma mise en forme dos conhecimentos, experiencias e solucoes perspectivadas pelos
diferentes actores atraves de suas experiencias de terreno. Ele foi tambem levado a frente como
um processo ao longo do qual, os diferentes parceiros partilham uns com os outros seus
conhecimentos e suas experiencias e melhoram as suas praticas. Foram tambem organizadas
pelos consultores duas sessoes de trabalho para partilhar a abordagem analitica do estudo em
termos de vulnerabilidade e de proteccao social.
O estudo foi elaborado com base na seguinte metodologia:
- um etat des lieux baseado na documentacao existente e em consultas intensas com os diversos
actores da area governamental e nao governamental; a lista das pessoas encontradas esta em
anexo.
- tres estudos de caso regionais (SAB, Bafata e Cacheu) para um aprofundamento dos temas do
estudo atraves da proximacao das realidades locais. A metodologia especifica utilizada para os
estudos de caso esta referida no capitulo correspondente.
A estrategia proposta resulta do conjunto das analises contidas no estudo.
1.2. O compromisso com as criancas vulneraveis
A Guine Bissau é Estado-parte de alguns dos instrumentos fundamentais da normativa
internacional destinados a proteger os direitos da crianca no geral e das mais vulneraveis em
particular. O pais ratificou a Convenção sobre os direitos da criança em 1990. Em 2001 o país
ratificou os dois protocolos facultativos da Convenção. Em 200_ ratificou a Carta Africana dos
Direitos e Bem Estar da Criança. A Guine Bissau tambem e parte das Convencoes da OIT 138
de 1973 sobre a idade mínima para o trabalho, nº 182 de sobre a erradicação das piores formas de
trabalho das crianças. A Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de discriminação e a
Carta Africana dos direitos e bem-estar da criança foi ratificada em 2007.
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O país registou varios progressos ao nivel de implementacao dos direitos da crianca no geral
porem a consenso de que « o pais deve aumentar significativamente o grau de aplicaçao dos
direitos consagrados na Convençao »3.
Outros parametros sobre os quais o Estado engajou-se e que constituem metas imprescendiveis
para o bem estar da populaçao em geral e das crianças em particular sao os Objectivos do Milenio
(ODM) e a Declaracao para o Um mundo para a Crianca.
O acompanhamento dos ODM4 mostra uma situaçao muito desafiadora nos sectores da saude e da
educaçao. No sector da saude, as metas para a mortalidade infantil e materna estao longe de
serem atingidas. Em particular a situaçao da mortalidade infantil demora extremamente
preocupante com o incremento registado entre 2000 e 2006. No sector da educaçao, o objectivo
de escolarizaçao primaria universal para 2015 e considerado de dificil realizaçao, uma vez que o
abandon escolar faz com que apenas 42% das crianças atinjam o ultimo ano do ciclo primario.
O IDH (Indice de Desenvolvimento Humano) permite estabelecer algumas comparaçoes entre
paises quanto aos indicadores basicos. Baseado em dados de 2005 que constam do relatório de
2007-2008 do PNUD sobre desenvolvimento humano, o índice de desenvolvimento humano da
Guiné-Bissau é entre os mais baixos do mundo: 0,374 (175esimo lugar entre 177 paises, só
seguindo pelo Burkina Faso e a Serra Leoa). A esperança de vida ao nascer é de 45 anos e a taxa
de analfabetismo 63%. O PIB per capita e de 827 USD. Isto significa que sem uma vontade
politica forte de reverter este quadro, “as criancas guineenses serap realmente prejudicadas pela
politica dos adultos”.
Seja qual for o parâmetro, o dado fundamental da realidade politico-institucional guineense
permanece o impacto negativo do conflito de 1998 e a instabilidade politico-institucional que dele
resultou sobre o desempenho económico do pais e a sua governação. A rotatividade incessante
dos cargos executivos, em particular nos sectores chave das políticas sociais, tem um impacto
incalculável no bem-estar da criança, comprometendo o futuro.5
As recomendações contidas neste estudo exigem para sua implementação um cenário marcado
por uma forte vontade política para priorizar a criança, bem como um bem colectivo inestimável
do pais e promessa de bem estar futuro, uma orientação forte em direcção a redução da pobreza,
um cenário de estabilização progressiva mas irreversível do pais em termos políticos e
institucionais e um desempenho económico favorável. Estes elementos constituiriam o pano de
fundo imprescindivel sobre o qual poderia assentar uma politica social do Estado capaz de
garantir a populacao seu bem estar e sua contribuicao aos processos politicos e economicos
nacionais.
1.3. Quadro analitico: quem sao as criancas vulneraveis?
O objectivo central deste estudo é identificar estratégias de acção de proteccao social das criancas
vulneraveis em particular a serem implementados de uma forma coordenada entre os actores e em
relação aos quais o Estado preencha seu papel de orientação (fixação dos objectivos), de
coordenação, de execucao (nao obrigatoriamente) e de supervisão e controlo. A primeira tarefa e
3
Republica da Guine Bissau, Relatorio sobre aplicabilidade da Convencao dos direitos da crianca, 2008
4
5
De 2000 a 2007, anos chave para o atingimento da ETP em 2015, onze ministros da educacao foram
nomeados, o que impediu a relaizacao de progressos consistentes.
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portanto aquela de esclarecer qual e o grupo alvo deste estudo, a quem nos referimos quando
falamos de criancas vulneraveis.
Uma observacao preliminar e a de que a crianca a crianca e vista prioritariamente como
integrante de um nucleo familiar, o qual sera alvo das principais intervencoes. Com efeito, toda
familia deveria estar em condicoes de promover ao bem estar de suas criancas de maneira
autonoma. Isto nao impede que haja intervencoes de proteccao social que visem directamente as
criancas, porem sem perder de vista a sua pertenca familiar e o reforco desta mesma pertenca.
Tendo em conta as diferentes situacoes de vulnerabilidade as quais as criancas se encontram
confrontadas e a realidade das estruturas familiares na Guine Bissau, optou-se por nao utilizar o
acrónimo OVC (orfaos e criancas vulneraveis)6. Em Africa, a orfandade biologica, conceito
herdado da historia da assistencia social nos paises occidentais, nao e sistematica e
necessariamente um factor de vulnerabilidade. Pode-se dizer sem muito receio de se enganar que
o nível de vulnerabilidade da criança órfã depende do nível de vulnerabilidade do agregado
familiar onde ela se encontra. Por esta razao optou-se por estudar o universo das criancas
vulneraveis como um todo, qual que seja a causa desta vulnerabilidade.
Niveis/ degraus de vulnerabilidade
A vulnerabilidade é um fenomeno social complexo que assenta na interacçao de factores
economicos, sociais e culturais, a nivel individual, comunitario e global. De uma forma geral, a
vulnerabilidade indica um degrau elevado de esposiçao a situaçoes adversas para o bem
estar conjuntamente a uma limitada capacidade de reagir e de se proteger contra os efeitos
destas adversidades.
A vulnerabilidade economica refere-se à ausencia ou precariedade subita ou cronica dos
rendimentos familiares, e às consequencias que esta acareta em termos de consumo de bens e
servicos. A vulnerabilidade social, que pode ser relacionada ou nao à vulnerabilidade economica,
refere-se à exposiçao condiçoes sociais de vida adversas e/ou à sua deterioraçao.
Para os fins de elaboraçao de politicas publicas voltadas especificamente para a criança, a
abordagem mais productiva da vulnerabilidade parece ser aquela que define os diferentes tipos de
vulnerabilidade tendo em conta os dominios de politica social a esta relacionado. Neste sentido
parece util distinguir entre varios degraus de vulnerabilidade.
As criancas sao o grupo vulnerável por excelência em qualquer sociedade, junto com os idosos e
as pessoas portadoras de deficiência, devido a sua condicao de pessoas em desenvolvimento. Esta
vulnerabilidade ontológica assenta na dependencia da crianca dos adultos para satisfacao de suas
necessidades basiicas que garantam sobreviviencia e bem estar. Quanto mais nova a crianca
maior a sua vulnerabilidade ontologica. A vulnerabilidade ontologica da crianca constitui a razao
fundamental que deveria empurrar os governos para uma priorizacao da crianca em todos os
dominios das politicas publicas. Com efeito, as crianças sao um bem colectivo inestimavel,
6
Este acronimo identifica os orfaos como um grupo particular dentro do universo das criancas vulneraveis.
Se em alguns países, em particular aqueles duramente atingidos pelas epidemia de HIV/SIDA, os orfaos
constituem efectivamente um grupo importante dentro do universo das criancas vulneraveis, em outros
países nem todas as criancas vulneraveis sao orfas nem todas aquelas que sao orfas sao vulneraveis. Isto
tem causado algumas dificuldade na identificação dos OVC e ate criado alguns equívocos e mesmo
distorções nas metodologias de identificação dos grupos alvos de certos programas e intervenções.
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representam a parte mais consistente do capital humano de um país e como tal tem um papel
fundamental em assegurar o desenvolvimento futuro, inclusive o bem estar económico.
Os indicadores sociais básicos da Guine Bissau apontam também para um alto nível de
vulnerabilidade estrutural da populacao: os indicadores como o IDH, compósito de esperança de
vida, taxa de alfabetização e de mortalidade infantil, são entre os mais baixos do mundo. Outros
indicadores da vulnerabilidade estrutural são os níveis de pobreza, o nível de acesso aos serviços
sociais básicos e o nível de participação cidadã na vida política e civica.
O conceito de vulnerabilidade aguda diz respeito especificamente à criança: encontra-se em
situação de vulnerabilidade aguda a criança privada de meio familiar e exposta à violação da sua
integridade física, psicológica e social. Para cada realidade nacional ou regional, o conceito de
vulnerabilidade aguda deve ser especificado tendo em conta os riscos específicos ao contexto.
Para terminar, utiliza-se também o conceito de vulnerabilidade legal. As crianças que se
encontram nesta situação são aquelas cuja situação (colocação familiar, protecção jurídica, devido
processo para os infractores) deveria ser resolvida pelos órgãos judiciais e que correm o risco de
um tratamento inapropriado ou inexistente por parte destes orgaos.
A vulnerabilidade devido ao HIV/SIDA é de tipo transversal e sera mais grave quanto maior for
a vulnerabilidade estrutural. Numa situacao em que a maioria da populacao infanto-juvenil se
encontra em situacao de vulnerabilidade estrutural, pode provocar a exposicao das criancas
tornadas orfas a situacoes de vulnerabilidade aguda, com perda dos pais e responsaveis e
exposicao a situacoes de violacao da integridade pessoal e ate de vulnerabilidade legal. O
esquema abaixo sintetiza os efeitos graduais do impacto do HIV/SIDA sobre o nucleo familiar e
as criancas :
Infecção pelo VIH
 Doenças na família
A criança na família afectada pelo VIH
Crianças prestadoras de cuidados
Degradação estado
psico-social
Morte dos pais
Problemas económicos
Problemas
de herança
Crianças sem os cuidados de adultos
Abandono escolar
Discriminação
Malnutrição
Trabalho infantil
Problemas sociais
Exploração sexual
 Acesso à
serviços de saúde
Vida na rua
 Vulnerabilidade
ao VIH
15
Source: Williamson March 2000
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O quadro a seguir resume os diferentes niveis/tipos de vulnerabilidade e identificar para cada um
categorias de criancas :
Nivel/tipo
Vulnerabilidade
ontologica
Vulnerabilidade
estrutural
Factores
Dependencia para satisfacao
das necessidades basicas
Pobreza
Acesso limitado aos
servicos basicos
Vulnerabilidade
aguda
Precariedade/dissolução do
núcleo familiar e de suas
funções de protecção da
criança
Vulnerabilidade
legal
Disfuncoes no
funcionamento dos orgaos
de justica
Discriminacao
Doenca e obito dos pais
Vulnerabilidade
devido ao
HIV/SIDA
Categorias
Todas as criancas
Criancas de agregados familiares em situacao de pobreza
extrema
Criancas excluidas: nao registadas, sem acesso aos servicos de
saude, fora da escola
Criancas em situacao de malnutricao
Criancas trabalhadores precoce
Crianças privadas do meio familiar: Orfaos sem possibilidade
de acomodação dentro da família alargada, criancas
institucionalizadas, crianças de rua
Criança vitima de violação de sua integridade fisica e
psiquica: criancas vitimas de trafico, vitimas de abuso e
exploração, vitimas de praticas nefastas
Adolescentes autores de infraccao penal
Crianças vivendo num contexto familiar atingido pelo
HIV/SIDA
Orfaos de sem possibilidade de acomodação dentro da família
alargada
Crianças chefes de familia
Crianças no cuidado dos avos em situação de pobreza
Crianças seropositiva e doentes de SIDA
1.4. Vulnerabilidade e politicas publicas
Esta abordagem da vulnerabilidade por degraus tem a vantagem de permitir identificar
domínios de politicas publicas diferenciados e complementares para cada nível de
vulnerabilidade. A cada nível de vulnerabilidade corresponde grosso modo um sector de
politicas públicas.
As políticas de desenvolvimento, de reducao da pobreza e as politicas sociais basicas destinamse a reduzir o degrau de vulnerabilidade estrutural da populacao como um todo, incluindo a
crianca e o seu ambito familiar e tem como alvo toda a populaçao infanto-juvenil. Uma cobertura
universal das politicas sociais basicas de registo civl, saude e educacao e o instrumento
primordial para prevenir situacoes de vulnerabilidade mais grave e mais onerosas de se aliviar.
A politica de protecçao social visa garantir o bem estar dos segmentos mais vulneraveis da
populacao e tem como alvo as crianças pertencentes a familias em situaçao de vulnerabilidade
economica e social, inclusive aquela devido ao HIV/SIDA. Tambem contribuir para prevenir
situacoes de vulnerabilidade mais grave.
A politica de protecção da criança visa assegurar os direitos basicos das crianças em situacao de
vulnerabilidade aguda: privadas de meio familiar e vitimas de violaçao dos seus direitos humanos
fundamentais à integridade psico-fisica (abuso e exploraçao).
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Uma política de garantias legais e necessaria para assegurar que as crianças que infringem a lei
penal sejam atendidas adequadamente.
A vulnerabilidade devido ao HIV/SIDA, por sua natureza transversal, deve ser atacada
conjuntamente pela politica de luta contra o HIV/SIDA e a proteccao social dos grupos atingidos.
A politica de registo civil de garantir à criança o reconhecimento oficial da sua existencia enquanto
cidadao do Estado guineense ;
A politica de saude de garantir a sobreviviencia e um estado de saude aceitavel da criança;
A politica de educaçao de garantir à criança o desenvolvimento das capacidades cognitivas e sociais que
lhe permitirao de tornar-se um adulto responsavel e produtivo ;
A politica de protecçao social de proteger as populacoes mais vulneraveis contra os riscos (malnutriçao,
doença, trabalho infantil) e sustentar seu acesso ao serviços basicos;
A politica de protecçao da criança, de intervir nas situaçoes em que a crianca e privada de meio familiar
e nos casos em que a integridade psico-fisica da criança é violada;
A politica de garantias legais de assegurar que a criança autora de infracçoes descritas na lei beneficie
da aplicaçao de uma lei especifica e de medidas adequadas de atendimento socio-educativo;
A Luta contra o HIV/SIDA de prevenir as situacoes de vulnerabilidade acarretadas pelo impacto da
epidemia nas familias e nas criancas.
1.5. O que e a proteccao social
Como mencionado, a protecçao social destina-se a proteger os cidadaos em estado de
vulnerabilidade e a assegurar seus direitos sociais basicos e um nivel de vida suficiente e digno.
Estas politicas incluem todos os mecanismos que visam proporcionais meios de subsistencia
(rendas ou bens) para os pobres, os serviços destinados a proteger os vulneraveis contra os
riscos sociais e as accoes que melhoram as condiçoes sociais e os direitos dos grupos pobres,
vulneraveis e marginalizados.
Existem muitas definiçoes de protecçao social, mas de uma forma geral todas elas fazem
referencia à necessidade de proteger os cidadaos contra os riscos economicos (insuficiencia ou
perda de rendimentos) e sociais (degradaçao do bem estar), em particular dos grupos mais
vulneraveis, os quais tem menos capacidade de reagir e se proteger contra estes riscos de uma
forma autonoma.
PROTECCAO SOCIAL
Un conjunto de mecanismos (prestacoes financeiras, materiais e
servicos) destinados a assegurar a proteccao das pessoas, em
particular dos grupos mais vulneraveis frente aos riscos economicos
et sociais
Existem por conseguinte muitas formas de abordar a proteccao social. Aqui propoe-se abordar a
proteccao social a partir dos tipos de intervencoes que podem ser consideradas como integrantes
deste sector. O esquema proposto a seguir va do mais geral ao mais particular, das intervencoes
mais abrangentes destinadas aos grupos vulneraveis aquelas mais especializadas, conforme o
grafico seguinte :
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Proteccao
Social
Mecanismos de
Criacao de um
Ambiente
Favoral
Aos grupos
vulneraveis
- Politicas
Pro-poor
(Empregos,
Salario
Minimo)
- Protecca Juridica
- Campanhas de
sensibilizacao
Politicas sociais
Basicas
Inclusivas
- Registo civil
- Saude
- Nutricao
- Atencao a
Pequena Infancia
- Educacao
- Educacao
Informal
Mecanismos de
Apoio a demanda
Para o acesso
Aos servicos
Sociais de base
- Carta de
Acesso
Gratuito a
Consultas,
medicamentos
- Restaurante,
Transporto,
Material
Escolar
Mecanismos de
Apoio aos
rendimentos
- Formacao
- Microcredito
- Empregos
Subvencionados,
- AGR, ect
Mecanismos de
Proteccao social
No sentido stricto
-Base
contributiva
formal ou
informal
-Base nao
contributiva
=Proteccao
social da
cidadania:
Subsidios
Financeiros
Servicos Sociais
Proteccao
Especial
Da crianca
Vtima de
Abuso e
exploracao
- Proteccao
Juridica
- Servicos
Sociais
1. Mecanismos que visam uma transformaçao global favoravel aos grupos vulneraveis do
ambiente socio-economico (por exemplo politicas de crescimento economico que visam
explicitamente integrar os mais pobres), das politicas sociais (priorizaçao dos grupos mais
fracos), das leis (estatutos, direitos e protecçao de certos grupos vulneraveis e
marginalizados) e dos comportamentos e atitudes da populaçao (por exemplo campanhas de
comunicaçao social para mudanças de comportamentos em relaçao a certos grupos).
2. Politicas sociais basicas inclusivas com mecanismos de apoio directo a demanda,
destinados a garantir o acesso das populacoes vulneraveis aos servicos basicos ;
3. Mecanismos de apoio aos rendimentos, incluem as accoes que visam manter ou gerar
rendimentos para os grupos vulneraveis (formacao, micro-credito, empregos subvencionados,
etc.)
A seguir, encontramos os mecanismos da proteccao social no sentido mais restrito,
tradicionalmente divididos entre mecanismos de base contributiva, formal ou informal, e
mecanismos de base nao contributiva financiado pelas financas publicas, conforme o grafico em
baixo :
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Os mecanismos da
Proteccao social
No sentido mais
restrito
Mecanismos com
Base nao
Contributiva
Financiados pelo
Orcamento
publico
Mecanismos com
Base contributiva
Financiados pelas
partes
Seguros
Publicos/privados
Mecanismos
Comunitarios/
Informais
(mutualidades=caixas
poupanca e credito)
Prestacoes
financeiras a
Categorias
Especificas da
Popu;acao
Assistencia social
Com base em
Criterios de
seleccao
Servicos
Sociais
Especializados
Às pessoas
4. Mecanismos de base contributiva, sendo os seguros obrigatorios a forma mais classica. Este
tipo abrange tambem os mecanismos informais e comunitarios, como as mututalidades e as
caixas de poupanca e credito.
5. Mecanismos de assistencia de base nao contributiva, sao financiado pelo orcamento
publico ou por outras fontes, e destinam-se a assegurar aos grupos mais vulneraveis,
particularmente aqueles com capacidade reduzida para o trabalho, um minimo de capacidade
de sobrevivencia.
6. Servicos sociais especializados as pessoas, nao implicam em transferencia de subsidios mas
visam oferecer as pessoas com necessidades especiais uma assistencia individualizada pelos
profissionais como assistente sociais, psicologos, terapeutas, etc. O sistema formal de
proteccao da crianca em situacao de risco pessoal e social constitui o conjunto de servicos
mais relevantes nesta area. Ele articula o sector judiciario, responsavel pela proteccao judicial
da crianca e, se tiver crime, pelo sancionamento de seu autor, e o sector social (autoridade
administrativa), para o atendimento social especializado da crianca, conforme o grafico
abaixo:
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Notificação
Polícia
Indivíduos, vitima
MCS
Resposta judicial
Autoridade judiciaria
Atendimento policial
de emergência
Aplicação medida
Protecção da criança
Averiguação, julgamento e
sancionamento do autor
do crime
Resposta social
Autoridade administrativa
Requisição de
Tratamento médico
Reabilitação
psicosocial
Localização dos pais
Reintegração e
Acomp. familiar
Acolhimento
provisório
Atendimento social
de emergência
Apoio social à
criança e à família
Apoio acesso serviços
básicos
Apoio colocação
família substituta
registo, educação, saúde
Em conclusao, quanto mais os serviços basicos universais de registo civil, de saude e de
educaçao serao disponiveis para todo o universo infanto- juvenil e quanto mais eles forem de boa
qualidade, tanto mais a protecçao social podera ter uma funçao complementar e supletiva, podera
ser verdadeiramente selectiva e virada para as camadas mais vulneraveis. Na ausencia de
politicas sociais basicas eficazes, a protecçao social torna-se principalmente uma tentativa de
corrigir as carencias destas politicas basicas e portanto insustentavel.
A piramide das politicas para a crianca apresenta os diversos tipos de politicas publicas:
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1. 6 Contexto geral
Demografia
A população guineense esta estimada a 1.320.595 pessoas7, com uma taxa de crescimento anual
em torno de 2.2% nos últimos anos. A taxa de fertilidade total estima-se a 7,1 .
A população é jovem. Mais de 50% da população são crianças com menos de 17 anos de idade.
A população é maioritariamente rural. A população urbana, que era 18% em 1991, esta estimada
hoje em 30 %. Bissau concentra 30% da população. A população apresenta uma densidade de 30
habitantes por km2 porem a população é distribuída de maneira não uniforme no território, sendo
que as áreas do litoral são as mais densamente povoadas.
Estes dados apresentam dois desafios fundamentais : uma pressao demografica crescente sobre os
servicos basicos e a cobertura pelos servicos nas regioes mais afastadas do pais.
Contexto politico institucional
Nos últimos dez anos o contexto político institucional tem sido marcado por uma grande
instabilidade, por mudancas incessantes nas esferas do poder executivo, marcado por divisoes
internas nos partidos e tensoes entre os militares e o Governo. O impacto do conflito armado de
1998-1999 foi reforçado pela crise politica de 2003. Espera-se que as proxima eleicoes
legislativas de novembro 2008 poderao reforcar a ordem constitucional, garantir maiores
condicoes de governabilidade do pais e reforcar a capacidade das instituicoes do Estado de
promover os servicos basicos a populacao.
Contexto económico
A economia da Guine Bissau situa-se entre as mais fracas de Africa, tendo sido afectada
severamente pelo conflito armado de 1998-1999, que ocasionou um retrocesso do PNB igual a
28%. A partir daquela data, o crescimento económico tem sido extremamente difícil e em 2001 e
2003 tem sido registadas taxa negativas. O PNB per capita é estimado a USD 180 em 2006.
Em 2007, o crescimento do PNB foi estimado a 2,7% (exportacoes da castanha de caju e
contribuicoes estrangeiras) e existe a expectativa de que o crescimento em 2008 sera de 3.3%.
Porem as receitas fiscais, apesar das medidas tomadas neste dominio, nao permitem cobrir os
gastos necessarios para que o sector publico possa funcionar adequadamente. O aumento dos
precos do bruto incide tambem negativamente sobre a balanca de pagamentos.
A economia continua marcada por uma fraca diversificação. Ela está centrada na agricultura
(60% do PNB e 90% das exportações) e é dominada pela rizicultura e a plantação de caju para
exportacao. As famílias praticam também uma agricultura de subsistência baseada no arroz,
outros cereais, frutas. A pesca artesanal, a pecuária, a silvicultura são outras fontes de
rendimentos para as famílias rurais. Os empregos formais são raros e concentram-se na
administração do Estado. As taxas de desemprego sao altas, em particular entre os jovens.
Contexto sócio-cultural
7
Relatorio nacional sobre Desenvolvimento Humano na Guine Bissau, PNUD, 2006.
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A Guine Bissau é um mosaico de diversas etnias (mais de 30), com predominancia dos Fula (1/4
da populacao) e Balanta (1/4). Os três grupos religiosos –musulmanos, animistas e cristao convivem pacificamente.
A estrutura patriarcal é prevalecente em todas as etnias, sem consideração para a religião. O
homem é o chefe da família e a nível comunitário predomina o poder regulador dos mais velhos,
sendo que as mulheres e as crianças não tem direito à palavra e ainda menos à decisão, incluindo
nos assuntos que lhes dizem respeito directamente8.
Quanto às estruturas familiares, o modelo preponderante e a familia alargada. As mulheres
chefes de familia representam …. O casamento precoce/forçado, as uniões informais, a poligamia
e a assimetria entre as idades do homem e da mulher casados ou em união são extremamente
recorrentes, em particular em certos grupos étnicos.
O relatorio sobre a Convencao dos direitos da crianca poe em realce algumas praticas socioculturais especificas da Guine Bissau que sao contrarias aos direitos da crianca. Em particular, o
casamento forcado/precoce, as mutilacoes genitais femininas, o fenomeno das criancas talibe.
8
E referida a exepcao notavel de uma etnia das Ilhas Bijagos.
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2. ANALISE DA SITUACAO
2.1. Vulnerabilidade estrutural
Pobreza da criança
A pobreza é o factor e o efeito de vulnerabilidade mais difundido no pais. Uma analise completa
da pobreza da criança nao esta ainda disponivel, porem sabemos que as crianças são mais pobres
do que os outros grupos etarios, uma vez que elas se encontram nos agregados familiares mais
numerosos que sao de regra os mais pobres. Dados do MICSIII, confirmam que as criancas de
menos de 5 anos na (quintilha) mais pobre e na (quintilha) pobre sao mais numerosas
(respectivamente 21.8% e 22.6%) do que nas outras (quintilhas) (por ex. 14,2% na (quintilha)
mais rica).
Embora a análise da pobreza monetária não seja suficiente para estabelecer o nível de
vulnerabilidade dos agregados familiares guineense, ela é sem dúvida seu indicador principal,
uma vez que a capacidade económica das famílias constitui um elemento fundamental na
prevenção e gestão dos riscos.
A grande maioria da população guineense e vulnerável devido a pobreza. A incidência da pobreza
é muito elevada: 64,7% dos agregados familiares estão na pobreza – vivem com menos de 2 USD
por dia por pessoa – e 20,8% deles estão em pobreza absoluta e vive com menos de um USD por
dia9.
Uma especificidade é de que as mulheres na faixa etária dos 31 aos 65 anos apresentam taxas de
pobreza inferiores àquelas dos homens, devido ao facto de que as mulheres são mais reactivas,
dominam o mercado de trabalho informal e recorrem simultaneamente a várias formas de geração
de rendimentos enquanto os homens são mais propensos ao trabalho formal, claramente em crise.
Nas áreas rurais, as mulheres chefes de família são mais eficazes em prover às necessidades
alimentares da família e com efeito apresentam níveis de consumo mais elevados do que aqueles
dos homens. Porém as mulheres mais jovens ou mais idosas que aquelas neste grupo etário e as
mulheres viúvas ou divorciadas são mais pobres que os homens do mesmo grupo etário.
Outra característica da pobreza na Guine Bissau é a vulnerabilidade das famílias que vivem no
meio urbano: se por um lado as populações rurais são mais pobres, elas estão menos expostas a
choques de tipo económico ou politico uma vez que elas vivem de uma agricultura de
subsistência.
Os choques de tipo económico mais frequentes sao as flutuações nos preços por ex. dos alimentos
e das matérias primas, perda da colheita devido a seca, pragas de insectos ou infiltrações de água
salgada, óbito ou doença cronica ou grave do provedor principal da família com os acréscimos de
despesas em tratamentos médicos e medicamentos, funerais, ou riscos de acidentes, como nos
casos dos incêndios.
A ausência de mecanismos privados - como poupanças, disponibilidade de bens para a venda, - e
públicos – indemnizações, subsídios, crédito - para fazer face a estas situacoes, faz com que os
9
Inquerito ligeiro para avaliacao da pobreza (ILAP), 2002
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únicos recursos em caso de dificuldades sejam os familiares e amigos e eventualmente as obras
sociais das Igrejas ou alguma forma de apoio à geração de rendimentos oferecida por ONGs.
Quando os agregados familiares enfrentam dificuldades de tipo economico, existe o risco que as
criancas carreguem o peso destas dificuldades, porque a família pode decidir ou encontrar-se
encurralada a recorrer a medidas altamente prejudiciais para as crianças: diminuicao na
alimentacao das criancas, retirada da escola, intensificacao do trabalho infantil, casamento
forçado/precoce, exploração sexual, migracao temporaria ou nao para a cidade a busca de meios
de sobrevivencia, institucionalizacao.
Entre as consequencias da pobreza, e embora numa relacao complexa e multidimensional, a
situacao nutricional das maes e das criancas e o trabalho infantil.
Malnutrição
A malnutricao e responsavel de uma serie de risco graves para a saude e o desenvolvimento da
crianca, sendo um dos factores preponderantes das taxas de mortalidade e morbilidade das
criancas.
A malnutricao nao e determinada apenas pelo nivel de rendimentos, que determina em grande
parte a insuficiência de alimentos consumidos; mas tambem pela falta de diversificao dos cultivos
e fraca diversidade da dieta, a indisponibildade de alimentos no mercado, o nivel de educacao, as
preferencias e escolhas em termos de consumo, a capacidade de utilisar os produtos disponiveis
de uma forma balanceada. Porem, a capacidade economica de adquirir alimentos resta o factor
individual mais importante da situacao nutricional.
Existem quatro perfis da população face à segurança alimentar: 34% das famílias são
consideradas muito vulneráveis à insegurança alimentar; 28% são vulneráveis; 11% são
potencialmente vulneráveis e somente 27% das famílias se encontram numa situação de
segurança alimentar10.
No que diz respeito as práticas de amamentação, somente 16% das crianças são aleitadas
exclusivamente até aos 6 meses de idade. As crianças são geralmente amamentadas até aos dois
anos. A amamentação é geralmente interrompida logo que a mãe retoma a actividade sexual ou
quando ela fica grávida.
Como consequencia, na Guine Bissau, uma em cinco criancas de menos de 5 anos de idade tem
baixo peso, enquanto 4% tem uma insuficiencia ponderal severa. As criancas que sofrem de
atrasos no crescimentos sao muito numerosas (40,9%), e 19,5% sao muito baixas pela sua idade.
Cerca de 7,2% de criancas e magra de forma moderada e 1,7% e magra demais para o seu
tamanho.
Conforme os dados do MICSIII, um dos factores a nivel do agregado que mais influenciam a
situacao nutricional da crianca na Guine Bissau e o nivel de educacao das maes. Quanto mais as
maes sao educadas, tanto menos a crianca tem hipotese de estar desnutrida. Isto nao nos
surpreende, uma vez que nos sabemos que a educacao das maes e a melhor garantia do bem estar
das criancas.
10
PNDSII 2008-2017
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Trabalho infantil
O trabalho infantil está também relacionado com a pobreza: o trabalho infantil é mais frequente
nos agregados familiares mais pobres.
Na Guiné Bissau, como em outros paises da regiao, o trabalho infantil esta estritamente
relacionado com a estrutura economica do pais, baseada na agricultura de subsistencia e na
cultura da castanha de caju. As taxas de trabalho infantil são extremamente elevadas: 39,2%
raparigas (37,0%) e atinge mais as crianças que vivem no meio rural (47,7%) do que no meio
urbano (22,0%), e no SAB (14,2 para as crianças de 5 a 14 anos de idade, é mais alta para os
rapazes (41,1%) do que para as %).
O trabalho das crianças realiza-se no ambiente familiar, uma vez que apenas 5,2% das crianças
trabalha fora da família e so 2,1% das criancas trabalhadoras executam um trabalho remunerado.
As crianças começam a ajudar muito cedo e executam tarefas conforme a sua idade. O trabalho
de colheita da castanha de caju é uma actividade que mobiliza toda a família, mais em particular
as mulheres e as crianças. O transporte de cargas pesadas de frutos por parte das criancas deve
ser considerado uma das piores formas de trabalho.
37% das crianças que vao a escola dizem que também trabalham e das crianças trabalhadoras
53.7% dizem que também vao a escola. Embora seja dificil estabelecer o nivel de interferencia
deste trabalho na frequencia escolar, nao ha duvidas de que varias horas de trabalho por dia
interferem pesadamente no sucesso escolar destas criancas. Por outro lado, e evidente que a
frequência escolar protege as crianças contra o trabalho precoce e prolongado.
Acesso aos serviços basicos

Registo de nascimento
Uma criança nao registada esta exposta a negacao de seus direitos fundamentais e a varias formas
de abuso e exploracao. Em primeiro lugar, o registo permite a fixacao dos elementos constitutivos
da identidade (nome, nacionalidade, filiação). Ele garante o acesso aos servicos sociais basicos de
saude e educacao. Nos dominios publicos definidos pela faixa etaria como o trabalho (idade
minima fixada por lei 14 anos), imputabilidade penal (16 anos), o casamento, o recrutamento – o
registo de nascimento representa uma forma de proteccao legal contra toda forma de abuso (obito
prematuro, casamento forcado, detencao ilegal).
A maioria das criancas guineenses estao exposta a este risco. Em 2006 ainda apenas 38,9% das
crianças de menos de 5 anos de idade eram registadas (MICS 2006). Os rapazes são ligeiramente
mais favorecidos que as meninas. As desigualdades manifestam-se mais no que diz respeito o
lugar de residência – sendo que as zonas rurais são menos favorecidas, e a região, sendo que a
capital goza de uma situação mais favorável (57 % de crianças 0-59 meses registadas) em relação
as regiões mais afastadas do sul do pais onde apenas 20 % das crianças são registadas.
As criancas mais velhas sao mais registadas que as mais novas, indicando o facto de que o registo
ao nascimento nao e praticado. Outros factores que influenciam o registo sao o nível de vida do
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agregado familiar, sendo que as criancas pobres sao muito menos registadas que as criancas mais
ricas (21,1% entre os agregados mais pobres e 61,2% entre os mais ricos). O nível de instrução
da mãe e tambem importante: quanto mais as maes sao instruidas tanto mais elas estao propensas
ao registo de nascimento (33,4% para as mães não instruídas e 60,0% para aquelas com nível
secundário ou superior).
A incapacidade economica da familia pode atrapalhar o registo da crianca. Com efeito os custos11
sao evocado como o motivo principal (34,2%) pelo qual as maes nao registam as suas criancas.
Por entre as razoes evocadas pelas mães para a falta de registo das suas crianças encontra-se
tambem a distancia a percorrer para fazer o registo (25,7%) e o desconhecimento do lugar onde
funciona o registo (18,9%). Os usos locais de dar o nome a crianca apos um certo periodo ou
segundo certas circunstancias e a falta de documentos de identidade dos pais podem tambem ser
factores de nao registo.

Saúde
A situação de saúde da população guineense no geral e das crianças em particular é extremamente
crítica. Conforme os dados do MICS a mortalidade infantil acusou um aumento passando de 124
a 138 mortes por mil nascidos vivos entre 2000 e 2006 e a mortalidade das crianças de menos de
cinco anos tem passado de 203 a 223 por mil nascidos vivos, situando-se entre as piores do
mundo.
A principal causa de morte para os menos de cinco anos é o paludismo. O risco de mortalidade é
mais elevado para os rapazes, sendo que não há no momento explicações para este fenómeno.
Nota-se também uma grande desigualdade entre as diferentes províncias do país. O risco de
mortalidade é mais elevado nas zonas rurais, onde a vulnerabilidade é mais intensa, e nas famílias
mais pobres.
Os riscos ligados ao período da gestação dependem em primeiro lugar as taxas de ma nutrição e
anemia das mães, determinando baixo peso das crianças ao nascer. No momento do nascimento,
as crianças guineenses estão expostas a riscos peri-natais uma vez que apenas 39 % das mulheres
dão a luz com alguma assistência ou numa estrutura sanitária, e 41% são estimadas nao estar
vacinadas contra o tétano.
Os riscos de saúde reprodutiva para as mulheres são muito elevados, tendo em conta as taxas de
mortalidade materna (entre 800 e 1100 por 100,000 partos de crianças nascidas vivas) e o impacto
de algumas doenças tais como o paludismo.
A gravidez precoce é a principal causa de morte para as raparigas no grupo etário de 15 a 19 anos,
solteiras ou casadas.
Quadro 1.
Principais problemas de Saúde por grupos-alvo
Grupos vulneráveis:

Crianças <5 anos



11
Causas de morbilidade/mortalidade:
Paludismo
Infecções respiratórias agudas
Diarreias
Má nutrição
Depois dos cinco anos de idade, o custo do registo e de 3,500 XOF.
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
Anemia
Paludismo

Complicações ligadas à gravidez e ao parto (hemorragias,
anemias, rupturas uterinas, complicações de aborto, fístulas, etc.)

Má nutrição

Problemas dos recém-nascidos (nados mortos, prematuridade,
baixo peso à nascença, etc.)

VIH

Paludismo

IST

HIV/SIDA (impacto potencial)

Paludismo

Tuberculose (aumento ligado ao VIH)

IST

HIV/SIDA (impacto actual)

Mulheres grávidas e
Recém-nascidos
Adolescentes
Adultos
Fonte: PNDSII, 2008-2017
Por entre os factores que influenciam o estado de saude da população, o acesso a agua potavel de
boa qualidade e muito baixo nas zonas rurais. Segundo o MICS, 60% da população guineense,
(82% urbano e 48% rural), utilizam fontes ditas melhoradas de água para beber, tais como água
canalizada (dentro e fora de casa), furos, poços e nascentes protegidos. No entanto, cerca de 95%
da população precisa deslocar cerca de 30 minutos para poder obter a água de beber. Isto significa
que apenas 5% têm água canalizada em suas casas (DENARP, 2006).
Acesso
O acesso económico e geográfico aos serviços de saúde é problemático para uma grande parte da
população, em particular da populaçao pobre, população das zonas rurais e dos bairros
periféricos das cidades. As populações que vivem em áreas distantes dos centros, não tem acesso
aos serviços de saúde principalmente por causa da distancia a percorrer. Em média 40% da
população vive para além dos 5 km da estrutura de prestação de cuidados primários de saúde mais
próxima, mas na Região de Oio, cerca de 65% da população vive a mais de 5km dos serviços de
saúde mais próximos. Existem áreas sanitárias com localidades populacionais a mais de 30 km.
Também, a qualidade insatisfatória dos serviços existentes faz com que a população não recorra
aos serviços de saúde. Os servicos privados, acessiveis apenas a uma parte limitada da
população, são também de fraca qualidade.
A infra-estrutura sanitária permanece pouco desenvolvida. Dos onze hospitais regionais
existentes, sete permanecem fechados. O Hospital nacional de Bissau foi totalmente rehabilitado,
mas a qualidade dos cuidados e os problemas de gestão dos recursos humanos, financeiros e
materiais estão longe de serem resolvidos.
A qualidade dos serviços de saúde e um factor que influencia a sua procura e utilização da parte
da população. Com efeito, as taxas de utilização dos serviços de saúde por parte da população
sao baixas no geral, porem mais baixas para a população pobre (9%) do que para população mais
abastada (19%). Um outro problema de grande importância é a disponibilidade de recursos
humanos de qualidade para os ector saude, sendo que o ratio geral de populacao por numero de
profissionais de saude e inferior aos standard internacionais e sua distribuicao no territorio
desigual.
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Em suma, o acesso aos serviços de saúde é muito limitado devido a infraestrutura deficiente, a
baixa operatividade dos centros de saude existentes, a dispersão da população sobretudo nas
zonas rurais e a fraca capacidade das famílias para se deslocarem. Também, a fraca qualidade do
atendimento, a não disponibilidade dos medicamentos ou a incapacidade financeira de adquirilos, as exigências de comparticipação (todos os instrumentos e medicamentos necessarios a uma
prestacao sanitaria sao a cargo das familias) têm como consequência de desincentivar a utilização
dos serviços de saúde por parte da população, em particular da população pobre. Em 2002,
apenas 37% das famílias mais pobres tinha acesso a saude.

A epidemia de HIV/SIDA
A situação epidemiológica da Guine Bissau e difícil de se avaliar, sendo que há discrepâncias
importantes entre diversas estimações e projecções da incidência da doença. Há entretanto
consenso de que a situação seria mais grave dos que os seus vizinhos (Senegal e Guine Conacry)
e existem receios de que a epidemia possa se alastrar ulteriormente nos próximos anos.
Segundo o estudo sentinela de 2005, a prevalência do HIV-1 seria 2.5/3.0%. Segundo as
estimativas da OMS, em 2005 haveria 32,000 pessoas vivendo com VIH, dos quais 10% com
menos de 15 anos.
A prevalência entre mulheres grávidas e estimada a 7.9%. Este resultado foi obtido por um
estudo levado a cabo pela ONG Ceu e Terra. O estudo testou cerca de 27,000 mulheres grávidas
entre 2001-2006.
Todos os anos cerca de 4,000 mulheres seropositivas dão a luz, sendo que a percentagem
estimada daquelas que tiveram acesso a prevenção da transmissão de mae para filho e ínfima12
(1% em 2007).
Embora estes dados deveriam ser de fácil recolha, ha dificuldades em se conhecer o numero total
de crianças de menos de 15 anos actualmente em terapia ARV.
As causas principais das infecções de HIV/SIDA sao as relacoes sexuais precoces, a alta
incidência das DST e o uso restrito do preservativo. Quanto aos conhecimentos, baixo nível de
conhecimento da população das modalidades de infecção e dos meios de prevenção. Com efeito,
as percentagens de pessoas capazes de identificar correctamente duas modalidades de transmissão
e baixa nas cidades (12.7 %) e muito baixas nas áreas rurais (3.4%).13
Quadro resumo:
Indicador
Estimação do numero de pessoas vivendo com HIV/SIDA
Estimação do numero de pessoas de menos de 15 anos
vivendo com HIV/SIDA
Prevalência estimada HIV-1 %
Prevalência em adultos %
Estimativa de óbitos de adultos
12
13
Ano
2005
2005
Fonte
OMS
OMS
Valor
32,000
3,200
2005
2005
2006
SNLS
UNAIDS
UNAIDS
2,5/3.0
2/6
2,700
Destaca-se aqui tambem a ONG Ceu e Terra, que inicou-se o CTV.
Estudo CAP, 2006
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
Impacto nas familias e nas criancas
- Estimativas criancas infectadas e afectadas pelo HIV/SIDA
Como mencionado acima, haveria um total de 3,200 crianças de menos de 15 anos vivendo com
HIV/SIDA. De facto, são conhecidas dos serviços apenas as crianças seropositivas nascidas de
mãe seropositiva, ou ainda as crianças em terapia ARV. Os orfaos seropositivos conhecidos são
apenas aqueles que se encontram na Casa Emanuel (nove crianças).
Devido às limitações das estatísticas sociais gerais no país e dos dados da seroprevalência, tornase particularmente difícil avaliar o impacto do HIV/SIDA em termos de mortalidade dos adultos
e, portanto, de orfandade das crianças. Os dados existentes são estimativas pouco fiáveis. Haveria
no pais um total de 100,00 orfaos dos quais 11,000 devidos ao SIDA.
Segundo os dados do MICSII, uma crianca em cada dez de 0 a 17 anos e vulneravel, uma em
cada dez tem um ou os dois pais falecidos e uma em cada cinco e orfa e vulneravel14.
Quanto a identificação a nivel das comunidades das crianças infectadas ou afectadas pelo
HIV/SIDA, a pesquisa de terreno confirmou aquilo que se passa em muitos países: esta
identificação e extremamente difícil. Em primeiro lugar, o estado de seropositividade pode nao
ser conhecido. Com efeito, na maioria das vezes, o teste e feito so em circunstancias particulares,
isto e quando o estado de saúde se torna muito critico e passa a exigir cuidados médicos. Nestes
casos porem, pode haver recursos a medicina tradicional, impedindo toda possibilidade de
despistagem e tratamento. Em outros casos, a pessoa vivendo com HIV/SIDA pode ja ter falecido
sem que se tivesse conhecimento da causa da morte. Finalmente, se o estado seropositivo e
conhecido, ele e escondido, por receio do estigma associado a doença.
- Estigma e discriminação
Muitas vezes considerada um castigo divino, a informação sobre um estado seropositivo fica uma
informação extremamente confidencial, que não sai do âmbito do casal. Um teste positivo da
mulher pode ocasionar ruptura da relação marital, expulsão de casa, uma estigmatização violenta
por parte dos próprios familiares e dos vizinhos.
Estas informações recolhidas durante o trabalho de campo são confirmadas pelos dados do
MICSII, que analisou as atitudes discriminatórias em relação as pessoas vivendo com HIV/SIDA.
Uma grande parte das mulheres inquiridas esta contra o acesso a sala de aula por parte de uma
professora portadora do VIH e 20% não cuidaria de um membro do agregado doente de SIDA. 15
Quanto aos arranjos familiares relativos as crianças de pais falecido de SIDA e órfãos
seropositivos, o factor não material principal e a discriminação e o ostracismo em relação a
14
Uma crianca e orfa e vulneravel se um dos seus pais faleceu, se um dos seus pais e atingido por uma
odenca cronica, ou se um adulto com idade entre 18 e 59 anos, membro do agregado que a acolhe, faleceu
devido a uma doenca cronica, ou fora atingido por uma doenca cronica no decurso do ano que precedeu o
inquerito. Como se ve esta definicao apresenta varios problema de inteligibilidade e de operacionalidade.
15
MICSIIII, 2006
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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doença. Por outro lado, as necessidades das crianças seropositivas em termos de cuidados e
tratamento médico, faz com que alguns deles são entregues as instituições.
Os orfaos duplos sao também discriminados em relação a frequência escolar, que e mais baix em
relacao as criancas que nao sao orfaos duplos. Também , as crianças orfas e vulneráveis
apresentam taxas de ma nutrição mais altas que as crianças não órfãs e vulneráveis.
- HIV/SIDA e género
Como demonstrado pelas pesquisas, as adolescentes estão mais expostas a infecção pelo
HIV/SIDA em razão de sua imaturidade fisiológica, pela prática do sexo precoce16, e pela prática
de sexo com homens mais velhos contra diversas formas de remuneração ou manutenção.
Meninas e adolescentes estão ainda expostas ao risco de contrair HIV/SIDA no caso de abuso
sexual perpetrado por adultos. Por seu lado, as praticas ligadas a tradição sociocultural guineense
demonstram que as mulheres são muito mais discriminadas no caso das heranças quando é o
marido que morre. Ela não tem direito aos bens do marido e quando não pretende ser “herdada” é
simplesmente expulsa da casa.Porem, o debate relativo ao género e HIV/SIDA está ainda pouco
desenvolvido nas estratégias de luta contra o HIV/SIDA.
- Impacto sobre a saúde e a nutrição da criança
A família atingida pelo HIV/SIDA pode ter menos disponibilidade de meios e tempo para a
prestação de cuidados de saude e para a alimentação das crianças. Com efeito, o MICSIII refere
que as criancas orfas e vulneraveis, como referido acima, apresentam taxas de ma nutrição mais
altas que as crianças não órfãs e vulneráveis. O acesso a alimentação tem sido uma das razões
porque as comunidades dependem cada vez mais das missões católicas nas zonas rurais.
- Impacto sobre o estado psicossocial
A degradação do estado psicossocial dos pais e das crianças é devida, por um lado, à vivência de
uma doença fatal e, por outro lado, ao estigma associado com a doença e as práticas
discriminatórias que dele derivam. A equipa constatou que as famílias atingidas sao levadas a
enclausuramento social, uma vez que o estado de seropositividade não sai do circulo do casal.
Desta forma, as pessoas atingidas e suas crianças passam a privar-se do apoio psicológico e social
da própria família e da vizinhança, com consequente sofrimento psicológico e moral.
- Impacto sobre a escolarização das crianças
Nas famílias atingidas pelo HIV/SIDA podem verificar-se situações de abandono prematuro do
sistema de ensino ou diminuição das possibilidades de integrar a primeira série, para as crianças
mais novas, devido à menor disponibilidade financeira e à necessidade de envolver as crianças
nas estratégias de geração de rendimento familiar e nos afazeres domésticos, no cuidado dos
doentes e dos irmãos mais novos, especialmente no caso de óbito da mãe.
Os dados do MICSIII são relativos so aos orfaos duplos. Eles revelam, como ja referido, que os
órfãos duplos apresentam taxa de frequência escolar mais baixas relativamente as outras crianças.
16
O MICSIII também refere que as raparigas orfas e vulneráveis estao mais expostas do que as outras a
relações sexuais precoces, com consequentes riscos de gravidez precoce e infecção pelo HIV/SIDA e outra
DST.
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- Impacto socio-económico
Quando os pais adoecem com SIDA, a sua capacidade de trabalho fica grandemente
comprometida. No caso de famílias vulneráveis, o impacto socio-economico é muito forte e a
perda de emprego ou a incapacidade dos pais para o trabalho pode ter consequências nefastas
para as crianças: reduções drásticas em termos de alimentação, maior pressão para as crianças
trabalharem e assumirem cargas mais pesadas de trabalho agrícola, recurso a estratégias de
geração de rendimento altamente prejudiciais, como a prostituição das meninas.
- Impacto sobre os direitos de sucessão
Um aspecto do impacto do HIV/SIDA diz respeito ao destino da viúva, a manutenção dos filhos e
a herança. Existem padrões tradicionais diferentes segundo as etnias, porem de uma forma geral a
mulher pode escolher ou e atribuída a um dos irmãos do marido. As crianças podem ser
marginalizadas por estes arranjos e serem afastadas do convívio com a mãe. Neste caso tambem,
inicia uma cadeia de infecções no âmbito familiar a termos vai privar as criancas de todos os seus
familiares proximos, a não ser os avos.
O direito positivo à herança da parte da mulher não é conhecido nem praticado pela maioria da
população. Segundo as praticas costumeiras, os bens do agregado são herdados pela família do
marido, deixando a mulher totalmente destituída de seus direitos.
Deste quadro, pode-se concluir que o HIV/SIDA representa uma ameaca muito seria para o as
criancas. Em primeiro lugar, os recem nascidos e os jovens adolescentes estao a risco de contrair
a doenca, haja vista a limitacoes em servicos de PTMF e a pratica das relacoes sexuais precoces
nao protegidas. Em segundo lugar, um aumento da mortalidade devido ao SIDA pode aumentar
consideravelmente os numeros de orfaos duplos, os mais vulneraveis de todos os orfaos. Em
terceiro lugar, as criancas de familias afectadas, com adultos doentes e falecidos, estao expostas
ao risco de estigma e de discriminacao e a degradacao de seu nivel de vida.
Educação
A educacao é um direito fundamental da crianca e uma porta para uma vida melhor. Ela dota a
crianca dos conhecimentos e competencias necessarias para o exercicio da cidadania e para a sua
participacao activa e frutuosa no mercado do trabalho.
Uma crianca fora da escola e sem educacao é uma crianca em estado de vulnerabilidade. Ela fica
exposta ao risco grave de analfabetismo, casamento precoce, trabalho precoce e nao qualificado,
todos estes sendo elementos predictores de pobreza futura.
Na Guine Bissau, estima-se que 100,000 criancas entre 6 e 11 anos estao fora da escola, sendo
que uma metade nunca foi matriculada e a outra abandonou a escola pour uma razao ou outra.17 A
maioria das criancas fora da escola sao rapazes.18 Além disso, calacula-se que 60% da populacao
guineense e analfabeta, com alta inequidade de genero: 50% dos homens sao analfabetos e 80%
são mulheres, o que e altamente prejudicial a sobrevivencia e ao desenvolvimento da crianca.
- Pre-escolar
17
EPT, draft 2, Junho 2007
Seis em cada sete, ou 80-85% das raparigas em idade escolar frequentam um estabelcimento de ensino.
EPT, draft2, Junho 2007
18
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A educacao pre-escolar é uma forma precoce de prevenir a exposicao da crianca a situacoes de
vulnerabilidade. Ela assegura a crianca um acompanhamento do crescimento psico- fisico e social
e um ambiente propicio ao deselvolvimento de capacidades cognitivas e emocionais que
facilitarao, entre outros, a integracao e o sucesso escolar. No que diz respeito as familias
vulneraveis, ela permite as maes ter tempo para as actividades produtivas.
O acesso a edução pré-escolar é extremamente limitado, sendo que a oferta limita-se a escolinhas
privadas, principalmente na capital do pais, acessiveis apenas aos grupos mais favorecidos e
algumas escolas comunitarias, com custos compartidos entre os pais e entidades comunitarias,
como organizacoes religiosas, que recebem apoios de organizacoes internacionais. Apenas 2 a 3%
do grupo alvo frequenta um jardim de infancia, sendo um total de 7,500 crianças.
Os preçoos que os pais pagam variam de 30,000 FCFA em Bissau a 1,000 FCFA no interior.
E’ de se notar tambem que a qualidade da educacao pre-escolar nao e sempre satisfatoria, sendo
que aproximadamente 40% do pessoal das escolinhas nao tem qualificacao. O sector publico que
deveria regular este sector, que esta em crescimento, deveria editar normas, parametros e
orientacoes e fiscalizar o seu cumprimento.
- Escolarização primaria
Apesar de avancos espectaculares no sector da educacao primaria, quase metade das criancas em
idade escolar permanecem fora da escola.
Acesso
Taxas de inscrição. Na ultima década, graças aos esforços de expansao da infraestrutura escolar,
de recrutamento de professores e de estimulaçao da demanda para a educaçao, o acesso à
educaçao tem registado grandes progressos, refletidos pelo aumento do numeros totais de alunos
e pelo incremento na taxa bruta de inscripçao, que passou de 53% em 1995 a 110% em 2005200619. Estas taxas porem sao influenciadas pela defasagem da idade de inscripçao ao ciclo
primario, devida a multiplas repetencias e entrada tardia na escola. As taxas liquidas de inscripçao
sao muito baixa e continuam em torno de 45%- 50%.
Escolarizacao das raparigas. Naquilo que diz respeito à equidade de acesso, é importante
sublihnhar os avanços obtidos em termos de educaçao das raparigas no ciclo basico. Em Bissau as
raparigas no ensino primario sao hoje mais numerosas (52%) do que os rapazes. Em outra regioes
balanco de genero no primario e mais dificil de se obter, como em Oio, onde elas sao ainda
apenas 40%. As raparigas apresentam taxas de evasao escolar mais altas e taxas de
completamento do primario mais altas do que os rapazes. No que diz respeito ao secundario e
terciario as taxas são mais baixas do que dos rapazes. Estas diferenças sao devidos ao casamento
precoce (27% das raparigas casam antes dos 18 anos), gravidez precoce, inadequacao das
instalacoes sanitarias escolares, grande distancia entre o domicilio e a escola, os trabalhos
domesticos, resistencia dos pais por motivos de ordem cultural.
Acesso geografico. Apesar dos esforcos de expansao da infraestrutura escolar, o acesso à escola
nas zonas rurais apresenta-se ainda problematico. As criancas mais desfavorecidas sao aquelas
19
EPT, draft 2, Junho 2007
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que vivem no Sul e nas ilhas Bijagos. 40% das escolas primarias nao oferecem o ciclo de seis
anos (escolas completas) e limitam-se a dois, tres ou quatro anos. Para poder continuar a
escolarizacao, as criancas tem que se deslocar sobre longas distancias, o que e um factor de
bandono escolar20. 1/3 da oferta de educacao primaria e de tipo comunitario (19.4%) concentrado
no interior, ou privado, concentrado em Bissau.
Os custos relativos a educação, como materiais e fardamento, podem constituir um obstáculo ao
acesso. A falta de instalações sanitarias e um obstáculo especifico para o acesso das raparigas. A
lingua do ensino, o portugues, tambem constitui uma barreira, porque via de regra as crianças
escutam o português pela primeira vez , quando ingressam ao primario se o professor o domina.
O dialecto do professor e do aluno também podem ser diferente, dificultando a comunicação.
Eficiencia
O sistema escolar apresenta altas taxas de repetencia, de evasao e baixas taxas de conclusao do
ciclo basico. Os alunos do primario repetem em media duas vezes. Em 2001 a repetencia na
primeira classe era de 20-25%. A média das taxas de evasão escolar no primário situa em torno de
7%. Porem se olharmos de mais perto vemos que o abandono escolar e mais acentuado logo no
inicio da escolarização primaria: 20% das crianças que entram para o primeiro ano abandonam no
curso deste primeiro ano. No segundo ano o abandono e de 2% e cresce ate 9% no sexto ano.
Isto resulta num efeito cumulativo que interessa os dois terços dos efectivos: a taxa completa do
ciclo escolar primário,é muito preocupante, situa-se a 42%. Menos de metade das crianças que
entram no ciclo primario o completam e apenas 30% o completam em seis anos.
Mesmo as criancas que completam o ciclo primário, correm o risco do analfabetismo . A
percepção geral e de que estas criancas apresentam serias dificuldades no uso de calculo e da
lingua portuguesa, seja na escrita, leitura e conversação.
Qualidade
A baixíssima qualidade do ensino básico na Guine Bissau e devido ao deficit de formação dos
professores, a um curriculo inadequado e a ausência de material pedagógico. inadequação do
curriculo. Existem fortes preocupações quanto a qualificação dos professores. Metade do corpo
professoral e leigo (nao detem as qualificacoes minimas estabelecidas pelo MENES). Aqueles
que detem o diploma do normal superior nao dominam o conjunto de competencias necessarias.
O curriculo tem baixa relevância, concentra-se nos conteúdos, em vez de conteúdos e
competências, e rígido. Não há material pedagogico para os professores e para os alunos. A isto
acrescenta-se que a carga horaria e mais baixa em relacao aos padroes internacionais e seu
cumprimento e compremetido por frequentes perdas de dias letivos, pela pratica de 3 turnos
diarios em muitas escolas e pelo absenteismo dos professores. 21
As escolas comunitarias
20
As criancas que estudam na escola primaria do Sector Cacine, seccao Cassaca, Tombai, uma boa
percentagem de criancas que ali estudam provem de localidades com distancia entre 10 e 20 km, razao de
inscripcao tardia.
21
Em 2006-2007 as escolas publicas perderam um terco do ano letivo, devido a greve ocasionada pelos
atrasos no pagamento dos salarios dos professores.
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Um quinto das escolas primarias no pais sao escolas comunitarias. Sao escolas criadas por ONGs,
Igrejas, associacoes comunitarias , para responder as necessidades de areas nao servidas pelo
sistema.
2.2. Vulnerabilidade aguda
Toda criança tem o direito de viver no seu meio familiar (CDC art.20) de ser protegida contra
todas as formas de violência (art 19), de exploração económica e trabalho prejudicial (art. 32),
exploração e abuso sexual (art. 34) sequestro, venda e tráfico (art. 35) e o direito à reabilitação
psico-física e social art.39). O Estado deve tomar todas as medidas legislativas, administrativas,
sociais e educacionais para proporcionar esta protecção e a assistência necessária sob forma de
programas de prevenção, notificação, transferência, investigação, tratamento, acompanhamento,
intervenção judiciária.
Crianças privadas do meio familiar
Todas as criancas tem o direito de crescer no meio familiar e de serem criadas por seus pais. A
familia tem o direito e a responsabilidade fundamental dos cuidados e a proteccao da crianca e o
Estado tem o dever de apoiar as familias para que elas possam cumprir da forma melhor possivel
as suas responsabilidades.
Na sociedade guineense, quando os pais se deparam com dificuldade, os pais morrem ou nao tem
mais condicoes de garantir os cuidados das criancas, os familiares proximos passam a se ocupar
da crianca, em particular dos orfaos. Porem, um numero reduzido de criancas, que se encontram
em situacoes extremas de pobreza e abuso, estes arranjos familiares nao sao possiveis e o direito a
viver na familia de origem e na comunidade de origem na continuidade religiosa, cultural e
linguistica e interrompido. Sao as criancas privadas de meio familiar, abandonadas ou que vivem
nas instituicoes.
Assim como acontece em vários países africanos, as percentagens de crianças que não vivem com
os seus pais biológicos são elevadas. Se no total 18,9% das crianças não vivem com os pais
biológicos, este percentagem aumenta consideravelmente para 30,2 % para os 15-17 anos e 24 %
para os 10-14 anos. Os percentagens sao mais altas para para a qmais rica (28%) para a capital
(25,4%) e para o meio urbano. Entre as hipoteses de explicacao deste fato, talvez a mobilidade
destas criancas mais abastadas para fins de frequencia escolar.
Isto parece ser relacionado com o costume de enviar as crianças para serem criadas por familiares
mais ou menos próximos ou famílias sem laços biológicos com as crianças, seguindo uma ordem
de atribuição onde os tios paternos e maternos constam nas primeiras posições. Os meninos de
criação gozam de mais ou menos boas condições de crescimento e desenvolvimento em suas
famílias substitutas. Se em grande parte dos casos a criação por uma outra pessoa que não os pais
biológicos pode se revelar favorável e proporcionar às crianças condições mais aptas do que em
seus próprios lares de origem, em outros casos os meninos de criação enfrentam riscos de
exploração, negligência, maus tratos.
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A comunidade dos pais revela-se fragil, sendo que apenas 60% das criancas vivem com pai e
mae. 15,2% das criancas vivem so com a mae, mas na grande maioria dos casos a pai vive. A
“orfandade social” de pai e mais do que o dobro do que a orfandade biologica.
Quanto aos orfaos, baseado nos dados do MICS de 2006, 11,3 % das crianças 0-17 anos são órfãs
de pai ou de mãe, sendo em termos absolutos cerca de 11,000 crianças. Esta percentagem é de
5,4% para as crianças de 0 a 4 anos de idade e aumenta com a idade da criança, sendo que 22%
das crianças de 15 a 17 anos são órfãs. 1,8% das crianças são órfãos duplos.
Baseado nos dados estatisticos disponiveis, as crianças tornadas órfãs estao muito levemente a
risco de discriminacao. A probabilidade de estar na escola é quase igual para órfãos duplos e não
órfãos (respectivamente 69,3 e 71,3), indicando que o factor de risco principal da não
escolarização não esta na orfandade, mas em outros factores como a quintilha de riqueza, o meio
de residência e a região. Este resultado é confirmado pelos dados relativos ao estado nutricional e
ao comportamento sexual das raparigas. Os diferencas entre crianças tornadas órfãs e vulneráveis
pelo HIV/SIDA e as outras são quase insignificantes, 1 ponto nos dois casos.
MICS indagou também o estado das famílias, sendo que 7,1% dos agregados familiares tem um
adulto doente crónico e 19,3% - cerca de 21,000 crianças de 0 a 17 dos dois sexos - são
considerados crianças órfãs e vulneráveis22, 26,6% no SAB e e 25,9% na mais rica.
- Crianças que vivem nas instituições
A institucionalizacção constitui uma violaçãoao do direito da crianca a ser criado na familia de
origem e de gozar da integração comunitaria, a menos que ela nao seja provisoria, de curta
duracao e de qualidade e seja constitua uma verdadeira proteccao do melhor interesse da crianca.
A criança que vive numa instituicao de maneira prolongada e privada de uma socialização
normal, fonte de bem estar e necessaria ao seu desenvolvimento.
Na Guine Bissau existem duas organizações que dirigem instituições que praticam o regime de
internato para crianças: a Casa Emanuel, dirigida por uma congregacao religiosa, com sede na
cidade de Bissau, a as Aldeia SOS crianças, instituição filantrópica internacional que acolhe
crianças órfãs, activa em Bissau desde 1996, abriu em Gabu e Canchungo em 2006.
Crianças expostas à violação de sua integridade psico-física
- Criancas vitima de violência e maus tratos
A violência doméstica nao so constitui uma infraccao a lei mas tem consequências pesadas não só
para a família mas também para a comunidade e a sociedade como um todo. A casa deveria ser o
lugar mais seguro para as crianças. A presença da violência dentro de casa representa um risco e
um perigo para as crianças, porque as crianças que crescem numa família violenta podem
desenvolver problemas emocionais e comportamentais, mesmo se eles não experimentam a
violência directamente. Eles também aprendem que a violência é uma maneira de resolver os
conflitos, e isso aumenta o nível de violência geral na sociedade.
22
A definicao do MICSIIII de crianca orfa e vulneravel e “se um dos seus pais faleceu, se um dos seus pais
e atingido por uma doenca cronica, ou se um adulto entre os 18 e 59 anos, membro do agregado familiar
que a acolhe, faleceu (devido a uma doenca cronica) ou fora atingido por uma doençca cronica no decurso
do ano que precedeu o inquerito”.
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De uma forma geral, existe a percepcao pelos profissionais da area social que a violencia contra a
crianca cometida por um familiar proximo e abafada, em particular a violencia sexual. Alguns
casos chegam a policia por via dos meios de comunicacao por parte de vizinhos. Um facto
preocupante registado pelo MICSIII e as mulheres têm um alto nível de aceitação da violência
praticada pelo cônjuge: mais do que metade (51,5%) das mulheres guineenses acham que o
marido pode bater nelas23, sobretudo no contexto do casamento.
Quando o autor da violencia contra a criança e uma pessoa mais afastada do circulo familiar ha
mais hipotese que haja denuncia na policia (ou directamente ao Tribunal). Em 2005, o
Comissariado Geral da Policia de Ordem Publica registou 34 casos de violencia e abuso sexual de
menores (33 meninas e 1 menino). Em 2006, foram registados 65 casos de violencia contra a
crianca, sendo a maioria abuso sexual (53), violencia fisica (6), rapto (2) e abandono (2)24.
- Criancas vitimas de mutilações genitais femininas
A mutilação genital constitui uma violação grave do direito da criança à integridade física e do
direito da mulher à integridade sexual. Que seja praticada por razões sociológicas, higiénicas,
sanitárias ou religiosas, a excisão não deixa de ser uma violação dos direitos fundamentais das
crianças de sexo feminino.
Na Guiné Bissau, como em outros países da sub-região, as MGF são praticadas geralmente nas
raparigas com idade entre 4 e 14 anos, mas podem ser também praticadas em crianças mais
novas, nas mulheres prestes a ser casadas, na mulher grávida do primeiro filho ou antes do parto.
A prática mais usual é a retirada da pele (?) porém quase 3 % das mulheres experimentaram a
forma extrema de MGF, a isto é a infibulação. O fanado é uma cerimónia de iniciação tradicional
durante a qual faz-se a ablação do clítoris e dos pequenos lábios do sexo das meninas. A idade
das crianças pode variar entre 6 e 14 anos. Os acampamentos de fanados apresentam condições
deshumanas.
A maior parte dos grupos étnicos do país praticam o fanado, em particular todas as comunidades
muçulmanas, isto é cerca de 46 % da população, em particular as das regiões de Gabu e Bafata.
44,5 % das mulheres com idades entre 15-49 anos são excisadas. A prevalência da excisão varia
muito em função da pertença étnica e a zona de residência, ela é mais forte entre as
Fula/Mandinga (95,2%) e no Leste (92,7%). As MGF são também mais frequentes entre as
mulheres sem instrução (54,4%) e no meio rural (48,2%). Mais recentemente, assiste-se a um
aumento das praticas de fanado nos centros urbanos (barracas de fanado).
Dentre os elementos que contribuem para a perpetuação do fanado, factores culturais e religiosos
por um lado e economicos por outro lado. Nas comunidades onde as MGF sao praticadas, ser
“cortada” representa para a menina uma condição de estar “limpa” e portanto de nao ser
discriminada, poder aceder ao casamento e a outras tarefas como preparação de pratos para os
anciãos em ocasião do Ramadan e outras festividades. A pratica constitui por outro lado uma
fonte de rendimentos para a fanatecas, as mulheres que o praticam, podendo o seu custo chegar a
30,000 XFO por cada intervencção.
23
As razões são as seguintes (em ordem de importância): quando ela discute com o marido, quando
ela recusa ter relações sexuais, quando ela negligencia as crianças, quando ela sai sem avisar, quando ela
deixa queimar a refeição.
24
INEP – Abuso e exploracao sexual de menores na Guine Bissau, 2006
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Os riscos implícitos nesta prática são numerosos. Riscos relativos à integridade psicológica, como
consequência da dor física aguda, traumatismo e estado de choque, bloqueios e incapacidade de
ter prazer sexual. São muito graves também os riscos para a saúde física: lesões e infecções do
aparato reprodutivo e urinário, esterilidade, complicações durante o parto, morte. Também
aumentam os riscos de contrair doenças contagiosas como o HIV/SIDA.
- Criancas vitimas de casamento forçado/precoce
Conforme o relatório global da OMS sobre violência (2002) o casamento precoce/forçado é uma
forma de violência sexual, uma vez que as raparigas não estão em condições de dar o seu
consentimento esclarecido, não tendo maturidade para tal, sendo em seguida obrigadas a ter
relações sexuais regulares com os maridos e expostas à gravidez precoce, com consequências
graves para o desenvolvimento das raparigas. O Fórum pan-africano contra a exploração sexual
da criança (data???) identificou ainda o casamento precoce como uma forma de exploração
sexual da criança para fins comerciais. Uma menina casada, apesar dela ser ainda uma criança,
será considerada socialmente como uma adulta, com todas as responsabilidades que decorrem
deste status.
O casamento precoce implica no abandono escolar, baixo nível de educação e formação
profissional, excesso de trabalho domestico, perpetuação da pobreza, violencia fisica e
psicologica, isolamento social e em riscos sérios para a saúde, ligados à gravidez precoce e
repetida, que por sua vez expõe a rapariga ao risco elevado de mortalidade, e à infecção pelo
HIV/SIDA.
7,3 % das raparigas guineenses casam antes dos 15 anos de idade, em particular na zona norte do
pais (10,1%) seguido por Bissau (5,8%), o leste (5,7%) e o Sul do pais (4,8%) e em particular
aquelas que pertencem aos grupos economicamente mais fracos (8,5%). A percentagem daquelas
que casam antes dos 18 anos de idade é de 27,3%.
A província, o meio de residência, o nível de instrução, o nível de vida e a pertença étnica são os
factores principais que aumentam a probabilidade para as raparigas de 15 a 19 anos de serem
casadas ou em união. Com efeito, o casamento precoce é mais frequente na zona Leste do pais,
no meio rural, entre as mulheres sem instrução, e entre as Fula/Mandinga.
Existem casos de meninas que recusaram-se a casar conforme a decisao dos pais e fogem, ou qye
abandonam o novo lar nao aguentando a sua nova condicao de esposa. Em 2005 a Missao
Catolica acolheu 40 meninas que escaparam a casamento forcado ou outras praticas nocivas.
- Crianças talibés vitimas de tráfico
Um grande número de crianças muçulmanas frequenta estudos religiosos. Uma parte destas
crianças desloca-se de seu domicílio habitual para frequentar o ensino do alcorão em escolas
corânicas dirigidas por imams. É costume que estas crianças passem uma parte do dia a trabalhar
para o seu sustento (em particular na agricultura) ou a pedir esmola para a alma dos defuntos. As
entradas sao entregues ao mestre corânico.
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Esta pratica tem aberto caminho para o estabelecimento de uma rede de trafico de criancas
enviadas para o Senegal, que tem a reputacao de ter melhores escolas coranicas do que a Guine
Bissau, a pretexto de receberem a educacao religiosa, para serem exploradas por pessoas que se
disfarcam de mestres coranicos. As regioes mais afectadas por este fenomeno sao as de Gabu e
Bafata. Um estudo realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP) tem
recenseado 22,831 criancas talibe em algumans regioes do Senegal. Uma parte destas criancas
sao guineenses. No geral, os intermediarios recutram as criancas nas tabancas mais
desfavorecidas por meio de tecnicas sofisticadas de aliciamento. O recrutamento das crianças e
facilitado pela miragem do acesso a uma educacao religiosa de qualidade, pela precariedade de
vida das famílias e pelas dificuldades em assegurar as crianças uma educação qualquer.
As crianças sao exploradas no trabalho agricola (cajueiro, algodao, ginguba) e pela mendicidade.
Muitas delas rompem com os “mestres” e os centros e passam a viver na rua, numa situacao de
vulnerabilidade extrema.
O numero de criancas identificadas como vitimas de trafico pela Policia e pelas autoridade
locais e muito baixo: apenas 5 casos em 2005.
- Criancas vitimas de discriminação
As crianças de uniões adulterinas, as criancas portadoras de deficiencias, como tambem os
gemeos, podem ser alvo de praticas discriminatorias muito nocivas, como o abandono, que
podem ate causar a morte (como no caso das criancas iras, reputadas trazer o azar sobre todo o
nucleo familiar).
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3. ANALISE DA RESPOSTA
Nesta parte do relatorio sao apresentadas as politicas, programas e accoes viradas para os grupos
vulneraveis em geral e as criancas em particular levadas a cabo pelo Estado e por seus parceiros
nao governamentais.
De uma forma geral a formulação, execução e avaliação da politica social do Estado guineense
tem sido afectada por um i) contexto politico-institucional adverso, a instabilidade das lideranças
e falta de continuidade das políticas ; ii)orcamentos insuficientes, discrepancias profundas entre
os orcamentos anunciados na Lei de OGE e os desembolsos, dependencia dos doadores iii)
capacidade de gestão reduzida, devido a quadros de pessoal reduzido e sem as competencias
sificientes em materia de planeamento, implementação, monitoria, avaliação e coordenação das
acções.
Como resultado, os esforços de redução da pobreza e as acções de expansão e melhoria da
qualidade das políticas sociais básicas, que constituem a base da politica social, tem sido
insuficientes e falham em assegurar a melhoria das condições de vida dos segmentos mais
vulneráveis da população. Isto significa que não há pelo momento avanços na redução do
contingente de cidadãos em geral e de crianças, em particular, que deveriam ser os principais
destinatários de acções de protecção social. As acções de protecção social da cidadania são
levadas a cabo em sua maioria pelos parceiros sociais, ONGs e missões. A actuação do poder
publico nesta área ainda continua fraca.
3.1. Mecanismos destinados a criar um ambiente geral favoravel aos grupos vulneraveis
Luta contra a pobreza
A Estrategia Nacional de Redução da Pobreza (2006) tem dado resultados mitigados. A
Estrategia foi elaborada com base base no Inquerito ligeiro para avaliaçao da pobreza (ILAP) de
2002, e esta coloca prioridade nos eixos de i) governaçao ii) crescimento economico iii) acesso
aos serviços basicos e iv) protecçao dos grupos vulneraveis. A implementação desta estratégia
tem acelerado o reordenamento de algumans instituiçoes e a redefiniçao dos seus mandatos,
como também o lançamento de uma importante reforma da administração publica, porém estas
medidas têm sido atropeladas pela persistente instabilidade politico-institucional e as dificuldades
de financiamento. No que diz respeito ao eixo ligado aos grupos vulneráveis, as intervenções têm
sido fragmentadas e levadas a cabo por organizacoes nao governamentais e Igrejas com fraca
coordenação por parte do Estado.
Também, apesar de varios esforços neste sentido, nao existe ainda uma Politica nacional de
Protecçao social clara e partilhada por todos os intervenientes.
Por exemplo, a luta contra o trabalho infantil ainda não está ainda organizada. Existe uma
perspectiva da parte da OIT de apoiar a elaboracao de um Plano nacional de combate ao trabalho
infantil no ambito do programa mundial IPEC (International Program for the Eradication of Child
Labor), porem ainda as negociacoes nao tem comecado.
Em relação a resposta à nutricao, as intervenções são mais de tipo curativas, levadas a cabo pelos
22 Centros de Recuperacao Nutricional (CRN) geridos pela CARITAS. Entre 2007 e 2008, os
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Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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Centros receberem um total de 3,490 criancas. Uma avaliacao destes centros conduzida em
200825 concluiu que, para alem do reforco das capacidades dos Centros e uma maior implicacao
dos centros de saude nas prestacoes relativas a nutricao, e necessario desenvolver accoes de
educacao nutricional junto das comunidades e, paralelamente, diminuir a inseguranca alimentar e
melhorar a dieta das comunidades atraves da estimulacao de hortas comunitarias.
Proteccao do estatuto juridico da crianca
O Estatuto juridico da crianca é definido pelos instrumentos da normativa internacional dos quais
o pais é parte e pela legislacao nacional. A Guine Bissau faz parte dos países que ractificaram a
Convenção sobre os Direitos da Criança (1990), dos dois protocolos facultativos da Convenção
contra a utilização de criancas nos conflitos armados e contra o trafico e a exploracao sexual
(2001), da Carta Africana dos Direitos e Bem Estar da Criança (2007). A Guine Bissau tambem
ratificou as Convencoes da OIT 138 de 1973 sobre a idade mínima para o trabalho, nº 182 de
sobre a erradicação das piores formas de trabalho das crianças e a Convenção sobre a Eliminação
de todas as formas de discriminacao.
No que diz respeito ao quadro juridico nacional de proteccao dos direitos da crianca, a
harmonizacao da Legislação Nacional com a Convenção e demais diplomas internacionais ainda
não está completao. Na legislatura de 2000 a 2003 foi criada na Assembleia Nacional Popular
uma Comissão para os assuntos da mulher e da criança. Na legislatura 2004-2008 esta Comissão
foi reestruturada e reforcada e coordenou a elaboracao de um estudo sobre a legislacao nacional
no dominio da crianca e a elaboracao de propostas de actualizacao das leis nas diferentes areas,
em particular26 :
- Estatuto da Assistência Jurisdicional do Menor (Idade de inimputabilidade 16 anos).
- Código civil e Código de processo civil
- Código penal e Código de processo penal
- Lei geral do trabalho. A idade mínima para o emprego é de 14 anos. Não há alusão ao trabalho
realizado no âmbito familiar.
- Código de registo civil
- Lei orgânica do Tribunal do sector.
Estas propostas de lei têm ainda que ser analisadas e aprovadas pela Assembleia. Tambem, uma
lei específica é exigida para tornar ilegal e sancionar as mutilações genitais femininas, para
garantir o direito da criança à integridade física e os direitos da mulher à integridade sexual, em
conformidade com o Protocolo de Maputo27 . Uma lei de repressao do trafico de seres humanos,
em particular de criancas, deveria tambem ser prevista como resposta ao problema das criancas
talibes e outros movimentos ilegais de criancas e mulheres.
No que diz respeito àproteccao das pessoas portadoras de HIV/SIDA, uma nova Lei, nº 5/2007 de
10 Septembro de 2007, aprovada gracas a mobilizacao dos actores nao governamentais (Action
Aid, FACOL-SIDA, outros) garante o acesso ao diagnostico, ao tratamento e aos cuidados
necessarios e protege as pessoas portadoras de HIV/SIDA e seus familiares contra toda forma de
discriminacao nos diversos ambitos da vida publica, e principalmente no mundo do trabalho.
25
Ministerio da Saude, Nucleo de Nutricao – Relatorio de supervisao Centro de Recuperacao Nutricional,
Agosto 2008
26
Centros de Estudos e apoio as reformas legislativas da Faculdade de direito de Bissau
27
Protocolo à Carta Africana dos direitos humanos e dos povos relativo aos direitos da mulher em Africa,
adoptado pela União Africana em 2003
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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Como todo instrumento legal novo, esta Lei precisa ser divulgada nos ambitos judiciario, do
trabalho e no geral junto a populacao.
Importa aqui sublinhar dois aspectos importantes da proteccao juridica da crianca. Por um lado, o
direito positivo sofre de uma forma geral de conhecimento, interiorizacao e aplicacao limitada
pelas instancias judiciarias, por causa das fraquezas institucionais neste dominio. Por outro lado,
o direito positivo acima analisado tem uma vigencia limitada nas mentalidades e praticas da
maioria da populacao da Guine Bissau. Apesar das diversidades culturais que distinguem as
diversas etnias do pais, todos os grupos sociais sao regidos maioritariamente pelo conjunto de
regras comportamentais que podemos reunir sob o termo de direito costumeiro. Se por um lado
esta situacao e garante de maior coesao social, as praticas conflitam em varios ambitos com a
nocao de proteccao da crianca tal como estabelecido pela normativa internacional e o direito
nacional nesta area. Exemplos desta situacao, o proprio lugar atribuido a crianca na sociedade, as
praticas de socializacao atraves do trabalho, as praticas tradicionais de iniciacao, algumas praticas
de resolucao de conflitos.
Neste sentido, parece necessario desenvolver acções de proximidade baseadas em metodologias
genuinamente participativas e sustentadas no tempo para se obter progressivamente junto das
comunidades a eradicacao das praticas nocivas e uma maior adesao aos valores universais da
proteccao da crianca tais que preconizados pela Convencao Internacional sobre os direitos da
crianca.
Campanhas de sensibilizacao para as mudancas comportamentais favoraveis aos grupos
vulneraveis e a sua proteccao
Varias organizacoes da sociedade civil sao activas na divulgacao dos direitos da crianca como
estrategia de mobilizacao das liderancas politicas e da sociedade em geral. A AMIC, criada em
1984, tem como missao central a promocao dos direitos da crianca. A RENLUV, rede de 40
Ongs e associacoes, actua na sensibilizacao e reducao da violencia contra a mulher e a crianca
atraves de campanhas de informacao e sensibilizacao, marchas e advocacia junto das autoriades.
O CIOJ (Centro de Informação e Orientação Jurídica) criada em em 1993 é uma instituição de
aconselhamento e orientação das mulheres e jovens adolescentes em matéria de violação dos seus
direitos que trabalha em parceria com a Polícica de Ordem Pública. A REJE (Rede de Jovens
Educadores) criado nos anos 2000 intervém no dominio da sensibilização contra a a violação dos
direitos da criança e favor da escolarização das raparigas. É de salientar igualmente as
contribuicoes das Rádios Comunitarias, de grande penetração e eficacia comunicativa junto as
colectividades, para a criacao de uma mentalidade e comportamentos favoraveis aos direitos da
crianca e a sua proteccao.
As campanhas de sensibilizacao relativamente ao HIV/SIDA visam contribuir para mudancas de
atitudes e comportamentos para favorecer a prevencao, a despistagem, o tratamento e corrigir os
comportamentos discriminatorios relativamente as pessoas atingidas. As abordagens mais
eficazes sao as abordagens comunitarias levadas a cabo pelas organizacoes presentes no terreno.
3.2. Políticas sociais básicas inclusivas: registo civil, saúde e educação e mecanismos de
apoio a demanda
Registo de nascimento
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O registo de nascimento destina-se a implementar o direito da criança a um nome e uma
nacionalidade (CDC, art. 7) e portanto à sua existência oficial como cidadão do Estado.
Do ponto de vista legislativo, o Codigo de Registo Civil é considerado de dificil aplicaçao em
razao de sua complexidade e obsoleto. Como referido anteriormente, foram propostas alteraçoes
profundas ao Codigo, porém estas nao foram ainda aprovadas.
A instituição responsavel pelo registo civil é o Ministério da Justiça através da Direcçao dos
Serviços de Indetificaçao Civil, Registos e do Notariado. Existem 47 postos de registo civil no
país. Sua distribuiçao geografica nao permite cobrir as tabancas mais isoladas. O quadro de
pessoal dos registos carece de qualificacoes e sua pratica deixa a desejar.
Enquanto no país nao se estabelecer uma cultura e uma pratica rotineira do registo de nascimento
assim como a rede de servicos necessarios, as estrategias chave para sustentar o acesso ao registo
de nascimento continuarão a ser a realização de campanhas incluindo a eliminação dos custos de
registo. O Ministério da Justiça, com a cooperaçao do UNICEF e de PLAN/GB, realiza
campanhas de registo de nascimento que visam abranger prioritariamente a população de 0 a 10
anos de idade. A campanha de 2005 conseguiu-se registar 53,000 criancas. Por outro lado, a
concessão de gratuidade para os actos relativos ao registo e ao bilhete de identidade tem sido
progressiva. A partir de 2002, o registo tornou-se gratuito até 30 dias depois do nascimento, a
partir de 2004 até aos três anos de idade da criança e à partir de 2006 até aos 5 anos de idade28.
As campanhas de registo apoiadas por Plan International na regiao de Bafata propuseram 50% de
desconto dos custos do registo para as criancas maiores de 12 anos, o que permitiu alcancar bons
resultados.
A realizacao de um encontro nacional visando a elaboracao uma Estrategia Nacional para o
registo de nascimento poderá constituir um passo importante para a definicao dos objectivos e dos
meios necessarios com vista ao reforco do registo civil no pais. A estrategia deveria privilegiar o
registo sistematico a nascenca e condicoes para a sua sustentabilidade, reforcado por campanhas
pontuais para o registo retroactivo. As boas praticas, como o pre-registo a nivel de tabanca
implementado pela PLAN Internacional, deveriam ser analisadas e introduzidas na estrategia com
base numa avalicao de sua eficacia.
Acesso a saúde
O desafio fundamental para o Estado guineense é garantir à criança o direito fundamental à vida e
à sobrevivencia através de uma reduçao drastica das causas da elevadissima mortalidade infantil e
o funcionamento de um sistema de saude capaz de distribuir as prestaçoes fundamentais
(assistencia ao parto, imunizacao, tratamento das doenças infantis) para o conjunto da populacao.
A Politica do Estado guineense na área de saúde foi fixada pelo primeiro Plano nacional de
desenvolvimento sanitário (1998-2002), cuja execução foi comprometida pelo conflito armado. O
conflito destruiu infra-estruturas, provocou uma progressiva carência de profissionais de saúde,
instalou no país uma instabilidade administrativa muito grande, responsavel pela falta de
28
Despacho n° 06/06.
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continuidade na implementacao do plano e ocasionou uma diminuição da ajuda externa da qual
dependia a saúde em mais de 90% do seu orçamento de funcionamento29.
No intuito de dar continuidade ao DENARP, o segundo Plano Nacional de Desenvolvimento
Sanitario (PNDSII), finalizado em 2008, fixa os objectivos e as estrategias para a decada 20082017. Os pontos principais da política nacional de Saúde são a) a saúde como “bem-estar”, b) o
acesso universal a cuidados primários de Saúde de qualidade e com equidade, c) a
descentralização progressiva das estruturas de tomada de decisões, d) a autonomização das
estruturas e a contratualização dos prestadores de cuidados com vista a garantir melhor qualidade
na prestação de cuidados de saúde, e) a participação comunitária no financiamento e gestão dos
serviços de Saúde (IB), f) o desenvolvimento de uma política de recursos humanos, g) o
desenvolvimento de parcerias e de colaboração intersectorial, h) e a valorização da medicina
tradicional30. O PNDSII esta baseado em oito eixos estrategicos reunidos em dois objectivos: o
período de 2008 - 2012, concentrado essencialmente no reforço de capacidade de intervenção do
Serviço Nacional de Saúde (eixos 1 a 4) e o período 2013 - 2017 orientado no sentido de obter
mais ganhos em saúde melhorando significativamente os indicadores do estado de saúde da
população (eixos 5 a 8).
Resultados obtidos
Os principais resultados registados dizem respeito à reduçao da incidencia da malaria continua a
ser a principal causa da mortalidade infantil e das consultas nos hospitais. O país elaborou uma
Estrategia de luta contra a malaria baseado na introduçao de ACT, treinamento de pesssoal,
distribuiçao de mosquiteiros e campanhas de impregnaçao que foi aprovado pelo Fundo Global e
deveria receber financiamentos calaculados a volta de USD 12 milhoes para o periodo de 2008 a
2012.
Os resultados obtidos sao atribuido principalmente à maior disponibilidade e uso pelas
populaçoes de mosquiteiros. Aproximadamente 60% das crianças dormem sob o mosquiteiro
impregnado e 46% das familias dispõem de pelo menos um mosquiteiro. Porem, o acesso aos
medicamentos no caso de febre mala rica demora problemático, sendo que apenas 45.7% das
crianças vitimas de malária tiveram acesso ao tratamento.
Com respeito à imunização, o Estado colabora com parceiros como a OMS e o UNICEF para a
implementação do Plano Nacional de Imunização (2005-2009) através principalmente da
realização de campanhas. Estas campanhas tem mostrado alguma eficiência porem os resultados
não são ainda satisfatórios, devido aos limites da estrutura de saúde a nível do território nacional,
da sua reduzida capacidade e eficiência, das dificuldades de financiamento para estratégias
avançadas, problema de gestão da cadeia do frio e problemas a nível dos recursos humanos.
Acesso dos grupos vulneráveis à saúde
Em termos de acesso geográfico, a infra-estrutura sanitária, particularmente afectada pelo conflito
armado de 1998-1999 e suas consequências económicas e organizacionais, tem sido alvo de
accoes de expansão e a reabilitação física por parte do Estado e de seus parceiros internacionais
como a UE, a AFD e o Banco mundial, porem ela permanece subdesenvolvida, deixando numa
situação de grande vulnerabilidade as populações rurais.
29
Nos últimos dez anos, a fracção do OGE que é atribuída à Saúde nunca chega a 10% e representa menos
de 15% das necessidades financeiras do funcionamento do sector, implicando que o orçamento ordinário do
Ministério da Saúde esteja totalmente dependente do apoio dos parceiros de desenvolvimento.
30
PNDSII, 2008-2017
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
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Page 40 sur 102
Em termos de acesso económico, a política vigente e de comparticipação. Esta politica porem não
esta baseada em orientações claras e sofre de desvios ao nível das práticas. A abordagem,
conforme a Iniciativa de Bamako, de recuperação de custos, que previa a disponibilização de uma
serie de medicamentos essenciais a custo subvencionado a nível dos centros de saúde, tem
apresentado problemas grave de gestão e tem resultado na ausência de disponibilidade de
medicamentos a preço mais baixo do que no mercado por um lado e em nenhuma acumulação de
fundos para financiamento dos serviços de saúde, pelo outro.
Neste contexto, parece promissora a experiencia das mutualidades de saúde, apoiada pelo
FNUAP e algumas ONGs no contexto de uma política de maternidade segura e resposta aos
problemas sanitários das comunidades.
A Luta contra o HIV/SIDA
O Conselho nacional de luta contra a SIDA é o orgao multisectorial presidido pelo Primeiro
Ministro responsavel por liderar a luta contra a SIDA no pais. Varios ministerios estao
envolvidos e lideram a luta contra a SIDA nos seus sectores respectivos (educacao, militares,
policias,etc).
O Conselho apoia-se operativamente no Secretariado Nacional de Luta contra a SIDA (SNLS),
criado em 2005 e responsavel pela coordenacao tecnica de todas as actividades de prevencao e
tratamento. A nivel regional existem coordenadores regionais.
Depois do Plano relativo ao periodo 2003-2005, a Guine Bissau elaborou um novo Plano
nacional de luta contra o HIV/SIDA que cobre o periodo 2007-2011. O Plano esta articulado em
torno das estrategias de i)acesso universal a prevencao das IST/HIV/SIDA ii)reducao do impacto
do HIV/SIDA iii)reforco da vigilancia da epidemia, seguimento, avaliacao e iv) reforco da
coordenacao das parceria e mobilizacao dos recursos.
Quanto aos resultados obtidos, de uma forma geral, a cobertura das campanhas de comunicacao
social e ainda baixa e irregular, persiste a dificuldade de cobertura das areas rurais e as
mensagens veiculadas nem sempre sao intelegiveis e capazes de provocar mudancas de
comportamentos e atitudes para maioria da populacao. Os anuncios radiofonicos nao sao
regulares. As accoes mais eficazes sao aquelas de proximidade conduzidas pelas ONGs e pelas
igrejas, porem limitadas as suas areas de intervencao. O impacto destas accoes parece mais forte
nas areas urbanas.
Campanhas de sensibilizacao e despistagem voluntaria sao organizadas pelos estudantes da
capital. Algumas Ongs como Caritas e a Cruz Vermelha, colaboram com o Ministerio da
Educacao para a introducao progressiva de modulos de educacao sobre o HIV/SIDA. A ONG
AGMS forma jovens para a educacao de pares (160 educadores foram ja formados).
Quanto ao impacto destas campanhas, o estudo nacional CAP de 2006 e o recente estudo de casos
sobre as Crianças Orfãs e vulneraveis revelaram que apenas 6,9% dos jovens de 15 a 24 anos
identificaram correctamente pelo menos duas formas de contaminacao pelo VIH e 8,1% ja
ouviram falar de ARV. O estudo CAP actualmente em curso vai dar uma ideia do impacto das
accoes mais recentes. Ha de se referir porem, que apesar dos esforcos, existem muitas
comunidades, como aquelas visitadas no curso da nossa pesquisa de terreno, onde nunca se ouviu
falar do HIV/SIDA.
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No que diz respeito a cobertura dos servicos de testagem, prevencao da transmissao vertical e de
tratamento ARV, metade da oferta esta concentrado no SAB. Quinara, Bolama e Tombali so tem
um servico de luta contra o HIV/SIDA, como pode se observar no seguinte quadro.
Quadro 1. Servicos de luta contra a SIDA disponiveis em Abril 2008
Regioes Atendimento
Centros de
Prevencao da Centros para o
Centros de
medico e
testagem
trasmissao
acompanhamento transfusao de
psicosocial
voluntaria
mae-filho
biologico
sangue
SAB
7
15
10
1
1
Bafata
1
4
1
0
1
Bolama
0
1
0
0
0
Cacheu
1
5
1
0
1
Gabu
1
4
1
0
1
Biombo
1
1
1
1
0
Oio
1
4
1
0
0
Quinara
0
0
0
0
0
Tombali
0
0*
0
0
1
Total
12
35
15
2
5
Fonte : CNLS/SNLS – Abril 2008
* em curso de abertura
Se por um lado, a oferta é ainda insuficiente, por outro lado, a demanda e baixa, sendo que existe
falta de informação, reticência e desconfiança das populações em utilizar os servicos. O numero
de pessoas seropositivas aumentou de 3.861 en 2006 a 11.734 en 2007. Na base dos dados de
2007, cerca de 10% das mulheres gravidas seropositivas receberam tratamento ARV para corte da
transmissao vertical. O numero de pessoas em tratamento ARV tambem aumentou de 65 em
2005, a 349 em 2006 e 890 en 2007 e , na base de projections SPECTRUM, chegaria a cobrir
28,1% das pessoas vivendo com HIV/SIDA. Os ARV e o tratamento das DST sao gratuitos,
porem pode haver falta de medicamentos e reagentes, como em 2007, quando houve uma ruptura
do stock de ARV durante tres meses, com repercussoes graves nos tratamentos em curso.
Respostas a vulnerabilidade social devido ao SIDA
Os serviços de saúde que identificam famílias atingidas pelo HIV/SIDA numa situação de
vulnerabilidade económica não dispõem de opções de encaminhamento dos pacientes para
mecanismos de apoio social. As poucas acções implementadas dizem respeito as pessoas
portadoras em terapia ARV e apoiam-se nos serviços existentes, como os Centros de Recuperação
Nutricional que acolhem mães seropositivas ou a Casa Emanuel, que tem nove crianças orfãs e
seropositivas, encaminhadas na sua maioria pela ONG Céu e Terra.
Quanto as crianças de famílias afectadas pelo HIV/SIDA, em primeiro lugar a dificuldades em
identificar as crianças que se tornaram órfãos devido ao SIDA, uma vez que a causa de morte
do(s) pai (s) não é normalmente conhecida, pois os casos não são divulgados. Por outro lado,
não existe no momento um mecanismo institucional de apoio social para assegurar que estas
crianças sejam mantidas na família alargada ou colocadas numa família de substituição.

A gestao dos orfaos
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Conforme a cultura vigente, as praticas relativas as crianças orfas seguem padroes tradicionais.
No caso de obito da mae, a crianca é no geral acolhida por uma tia materna ou paterna, ou por
outro familiar. Os principios que regem esta colocacao sao os de parentesco (primazia ao lado
materno, “a crianca é da mae”), de recursos materiais (rendimentos, espaco), de proximidade
geografica. A pratica dos filhos de criacao, pode em alguns casos abrir porta para situacoes de
exploracao e maus tratos, ainda assim tem sido um instrumento eficaz para assegurar cuidados e
proteccao a criancas orfas.

Cobertura
Devido a falta de dados quanto aos numeros de criancas afectadas pelo HIV/SIDA, é difícil
estimar a cobertura das acções em curso. O MICSIII inquiriu-se sobre os apoios recebidos pelas
crianças tornadas órfãs e vulneráveis (total de 4,051 crianças)31. A percentagem de crianças cujo
agregado recebeu apoio é muito baixa: 4,4% recebeu apoio médico, 1,3 % recebeu apoio
psicológico ou emocional, 1,2% apoio material, 3,2% apoio à escolarização, ao passo que 92,5%
não recebeu nenhum tipo de apoio.
A resposta ao impacto do HIV/SIDA necessita de uma abordagem hierarquizada e integrada, que
corresponde aos diversos níveis de vulnerabilidade e aos diversos domínios de políticas públicas.
A redução da pobreza e a garantia de acesso aos serviços de saúde, educação, água e saneamento,
são a primeira resposta à grande vulnerabilidade estrutural que determina a intensidade e
gravidade do impacto do HIV/SIDA. Quanto aos grupos mais vulneráveis responsáveis por
crianças, sejam elas órfãs ou não, e que não tenham capacidade para o trabalho (doentes, pessoas
idosas, crianças chefes de família) e necessário encontrar soluções apropriadas para, em particular
para preservar e fortalecer os sistemas de gestão das crises e integração dos órfãos.
Acesso a Educação
Apesar de vários esforços desenvolvidos em matéria de educação, o país ainda tem pela frente
enormes desafios com vista a alcançar os Objectivos de Desenvolvimento de Milénio na sua
vertente nº 2, ou seja, “garantir que todas as crianças, de ambos os sexos, terminem um ciclo
completo do ensino primário”.
Varios programas de desenvolvimento do sector da educacao tem sido desenvolvidos com apoio
de organismos internacionais, porém de uma forma geral todos eles tem sido afectados pela
instabilidade governamental e das frequentes mudanças na lideranca do Ministerio da Educacao
Nacional e do Ensino Superior (MENES).
No quadro do Programa de Apoio a Educação de Base financiado pelo Banco Mundial e apoiado
tecnicamente pelo Pólo de Dakar, o pais engajou-se em 2002 em proceder a reforma do sistema
educativo virado para o soluçao de alguns problemas estruturais da oferta de educaçao.
A partir de 2006, com o apoio da UNESCO-Polo de Dakar, foi inciada a preparaçao de um Plano
Estrategico que entre outros possibilite o acesso da Guine Bissau aos fundos da Fast Track
Initiative, indispensaveis tendo em conta a incapacidade financeira do país em assegurar os
recursos necessarios para o sector da educacao. O Plano Sectorial em prol da Educacao para
Todos nao foi ainda finalizado.
31
Definicao do MICSII de criancas orfas e vulneraveis:
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
Resultados alcancados
Graças aos esforcos destinados a ampliar a oferta escolar, o numero de salas de aula cresceu,
porém esta ampliação a todo o territorio nacional não responde as demandas do crescimento
populacional. Por outro lado, apenas 60% das salas de aula são construções definitivas, as demais
são barracas, inadequadas a função escolar. Também, em certas localidades vigoram tres turnos
diarios, factor que ameaça o cumprimento de quatro horas diarias, dada a falta generalizada de luz
eletrica.
Uma mudanca estrutural verificou-se com a unificação dos dois ciclos da educação primaria num
ciclo único, dito ensino básico, que passa a ter uma duração de seis anos. A reforma porém não
foi ainda aplicada em varias zonas do pais, em particular nas zonas rurais, onde a persistencia dos
dois ciclos, com consequentes problemas de oferta para o ciclo complementar, não permite que as
crianças completem a educação básica.
Para melhorar a eficiência dos recursos humanos e diminuir os gastos em salários, foi realizada
uma reforma importante do quadro de professores titulares do ensino publico em 2007. Uma nova
carga horária (dois turnos de quatro horas) acompanhou o aumentode 60% sobre o salário base
para os professores dos quatro primeiros anos e uma carga horaria de 30-32 horas semanais e
40% de aumento salarial para os professores da 5ª e 6ª classe. O numero total de professores
passou de 7,400 para 3,000, com importantes poupanças na folha de pagamento.
Várias acções destinam-se a melhoria da qualidade do ensino. A principal delas por abrangencia
e o Programa de Formação dos Educadores em exercício do Ensino Básico da Guiné-Bissau foi
inciado em 2006 atraves de uma parceria do Ministério da Educação e Ensino Superior, com
UNICEF, UNESCO, PAM, UNFPA, PLAN Internacional, Serviço Holandês de Cooperação
(SNV) e Banco Mundial. O programa termina no fim de 2008. Ele proporcinou formação
contínua e qualificação profissional a 2,378 Formadores e Professores não diplomados32 do
ensino básico. A formacao foi dispensada em quatro Centros de Formação Intensiva de
Professores (SAB, Bula, Buba e Gabú). A reestruturação curricular do ensino básico e outra
condição indispensavel para a melhoria de qualidade da educação na Guiné-Bissau. A conclusão
da revisão do curriculo para o ciclo unificado da 1ª a 6ª classe esta prevista para 2011. Quanto ao
material escolar, apos o fim do projecto BESP, que apoiava a grafica escolar e a publicação e
distribuição de livros, não existe um programa permanente de distribuição de material escolar nas
escolas públicas, apenas doações esporádicas.

Os desafios da EPT
Os grandes desafios da Educação na Guine Bissau são o financiamento e a gestão da educação. O
sector da educação sofre de insuficiência de financiamento: Por exemplo, a educação recebe 1215% dos recursos do Orçamento Geral do Estado que representa 2,5-3% do PNB. Estes valores
deveriam ser respectivamente de 25% e 4,5-5%. A parte do ensino básico e de 40% mas deveria
passar para 50%. Quanto ao planeamento e gestão educacional, é necessário melhorar,
paulatinamente o sistema de colheita e tratamento de dados, promover uma verdadeira
descentralização da gestão ao nível das regiões, e uma gestão financeira capaz de resolver os
problemas ligados ao pagamento dos salários.

32
As escolas comunitarias
Sendo 142 professores das escolas comunitarias apoiadas por Plan internacional na regiao de Befata.
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Na Guine Bissau, embora não existirem dados definitivos sobre as escolas comunitárias, as
previsões indicam que cerca de um quinto da oferta escolar é providenciado por escolas
comunitarias. As escolas comunitarias são escolas construídas eme special em zonas não
cobertas pelo sistema nacional do ensino, geralmente com o apoio de financiamento
internacional. A comunidade contribui na fase de construção, no pagamento do salario dos
professores (em dinheiro ou espécie, por exemplo em Quitafine, as populações pagam as
mensalidade das crianças com arroz ou ôleo de palma). Um factor importante na dinamica das
escolas comunitarias, é existencia de Associações de Pais e Encarregados de Educacao (APEE),
que asseguram a gestão da escola e supervisionam a atuação do professor e a aprendizagem dos
alunos. Não se requer uma cédula de identidade para a inscrição da criançaa.
A principal instituição de apoio as escolas comunitarias é a PLAN Internacional, que ajudou a
construir inúmeras escolas na região de Bafatá contribuindo significativamente para o aumento da
escolarização das crianças. Outras escolas comunitarias foram estimuladas pela SNVCooperacao Holandesa no Sul nos anos 90. Estas passaram a ser geridas autonomamente e
contam agora com o apoio da Estrutura para o Desenvolvimento do Ensino Comunitario (EDEC)
para o planeamento, a formação, o reforco das capacidades de gestao, etc. A organizacao
Tiniguena apoia o ensino comunitario nas ilhas. Um leque importante de professores de escolas
comunitarias (142)participam no Programa Nacional de formação de professores.
A participação efectiva dos pais e da comunidade nas escolas comunitarias tem dado resultados
positivos, revelando-se uma estratégia bem sucedida em manter as criancas na escola e em
assegurar a presença e o bom desempenho do professor.

Apoios a demanda
Da parte das famiíias (demanda), os factores que influenciam a matrícula e a frequência das
crianças são ligados ao acesso geográfico, aos custos implicados (material, uniforme) e as
necessidades dos trabalhos agricolas em certa êpocas do ano e finalmente as percepções que as
famílias têm quanto a qualidade da educação e quanto as vantagens da escolarização
comparativamente ao trabalho.
Os avanços registados nas inscrições têm sido possiveis também graças a eliminação das taxas de
inscrição, decidido pelo Ministerio de Educacao em 2001. Esta medida tem certamente reduzido
os custos da educação para as familias, possibilitando a inscrição de crianças que teriam sido
excluidas, porem outros custos permanecem. Em particular, desde 2004, os livros não são mais
distribuidos aos alunos. Existem algumas acções de apoio atraves de material escolar a
escolarização das crianças das comunidades mais vulneraveis, levadas a cabo por certas ONGs e
Igrejas, porem estas acções são pontuais e nao perenes.
A cantina escolar
Se a eliminação das taxas de inscrição constitui um mecanismo de apoio a demanda eficiente, a
merenda escolar por sua vez representa uma estrategia de atração de criancas para a escola, de
contribuição ao seu estado nutricional e por consequente de suas capacidades de aprendizagem e
de apoio indirecto aos rendimentos familiares. Em certos contexto, ela pode ser tambem uma
estrategia eficiente para motivar a criação de hortas escolares ou utilizar os produtos agricolas da
area, favorecendo o mercado local.
O Programa de Alimentacao Mundial (PAM) atende atraves do Programa de Cantinas Escolares
cerca de 86,000 crianças do primario, ou cerca de um terco do total, em 533 escolas localizadas
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nas quatro regioes mais vulneraveis do pais: Bafata, Biombo, Gabu e Oio. 70% destas escolas sao
públicas. O custo por aluno e de cerca de 20USD por ano33.
O programa de cantinas escolares IPHD/AMIC, “Estrategia de reforco a inscrição e retenção das
crianças na escola”, financiado pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, é activo
nas regioes não cobertas pelo PAM, sendo 7 regioes (Biombo, Cacheu, Oio, Quinara, Tambali,
Bolama Bijagos e SAB). O programa beneficia 58,000 crianças enquadradas em 246 escolas e 32
jardins infantis34. O programa distribui trimestralmente arroz, feijao e oleo vegetal. As refeições
sao preparadas na escola. Um comite de gestao lacal é responsavel pelo programa. Para além da
alimentação, o programa distribui tendas impregnadas, desparasitantes, apoia na construção e
reparação de cozinha e estimula a actividades das APEE. Uma avaliação do impacto constatou
uma redução da taxa de abandono nas 246 escolas em media de 20.2% no ano anterior ao inicio
do programa para 14.3%, sendo 5.22% para os rapazes e 9.08%para as raparigas. 35
Na ausencia de perspectivas que o Ministerio da Educacao possa assumir o programa e
universaliza-lo é urgente elaborar uma estrategia de sustentabilidadedo programa na perspectiva
do desengajamento do doador. As propostas ja em curso sobre a reabilitação das bolanhas e
criação de hortas escolares é promissora. 60 escolas do programa IPDH/AMIC tem propostas
concretas para criação de horta escolares.
3.3. Mecanismos de apoio aos rendimentos
Garantir as familias vulneraveis um ambiente propicio e oportunidades para geração de
rendimentos36 constitui uma das estrategias-chave de redução da pobreza e garantia que as
familias possam viver de uma forma autonoma e digna (não dependente) e garantir o bem-estar
de suas criancas. Em particular, a experiencia regional demonstra que o apoio as mulheres é o
mais eficaz, uma vez que as mães utilizam os seus rendimentos para o bem estar das crianças.
O organismo público nesta area é a Fundaçao para a Acçao Social, que tem como missão apoiar
associações que trabalham na área de geração de renda para grupos vulneraveis e prestação de
serviços sociais.
De uma forma geral, mais do que a actuação do FAS, sao as diversas intervenções levadas a cabo
pela cooperacao internacional, atraves de ONG (Divutec, Aprodel, Adim, Nadel, ADS, Adic Na
Faye, Edec, Nantinyan e outros) , que tem assegurado o acesso das populações vulneraveis a
projetos de geracao de rendimentos. Experiências interessantes a mencionar são as desenvolvidas
33
Estes dados constam do relatorio EPT, segundo draft, Julho de 2007.
IPHD/AMIC – Programa de apoio as escolas publicas – cantinas escolares – sintese analitica dos resultos
alcancados, fev.2007-fev 2008
35
As razoes levantadas por este estudo para o abandono escolar foram:
- grande distancia da escola do domicilio
- ma condicao das estruturas escolares
- baixo nivel de instrucao dos professores
- ataques frequentes de malaria e outras doencas
- fome
- analfabetismo na familia e na comunidade
- abandono por parte dos professores devido a isolamento e falta de condicoes de sobrevivencia.
36
Incluem-se aqui as accoes que visam manter ou gerar rendimentos para os grupos vulneraveis
(formacao, micro-credito, empregos subvencionados, etc.)
34
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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por algumas ONGs de desenvolvimento comunitário sobretudo no dominio da Criação de Bancos
de Cereias junto das comunidads rurais que têm se revelado importantes para a segurança
alimentar, em especial no perído de maior rutptura de stock alimentar (Junho a Setembro).
Os programas de microcrédito têm sido igualmente relevantes para a sobrevivencia familiar na
medida em que permitem as mulheres arrecadar rendimanetos para investir na alimentação dos
filhos e na sua escolarização e saúde. Por exemplo, a ONG “RENLUV” durante um período de
tempo actuava através de microcréditos na formação das mães de criancas vitimas de violencia no
dominio de pequenos negócios. Isto constitui um bom exemplo de articulação entre o apoio à
resposta judicial e apoio social.
3.4. Mecanismos de proteccao social com base contributiva
A nova lei guineense sobre a protecçao social de 2007 define como protecçao social com base
contributiva, os seguros sociais obrigatorios e complementares (protecçao social obrigatoria)
bem como os diferentes tipos de seguro privado.
No sector contributivo, o Instituto de Previdencia Social (IPS), sob a alçada do Ministério da
Reforma Administrativa, Função Publica e Trabalho, gere os tres regimes de Previdência social
em vigor (regime geral, regime facultativo, seguro obrigatorio de acidentes de trabalho e doenças
profissionais). Registam-se várias dificuldades no funcionamento e gestão do Instituto: mudanças
incessantes ao nível da direcção, ausências e atrasos nas contribuições por parte das empresas,
com consequente ausência de fundos para os pagamentos, não uniformidade e lentidão nos
pagamentos.
A cobertura do seguro obrigatório para os trabalhadores do sector privado é baixa. Estão
recenseados apenas 6,400 trabalhadores e 1,622 empresas. As empresas que efectivamente
contribuem para o seguro são muito menos numerosas (2-3%).
Os 12,500 trabalhadores publicos contribuem com cerca de 18% de seus salarios para o seguro de
saude, porem o acesso ao tratamento e aos medicamentos nao é regular para todos. Eles tem
tambem acesso a reforma, aos 60 anos e depois de 40 anos de servicos ou 15 anos em caso de
invalidade. As contribuicoes dos trabalhadores publicos para a reforma não são geridos por um
fundo autonomo, mas vão para orçamento geral. Desta forma, os pagamentos aos trabalhadores
reformados sofrem atrasos.
De qualquer modo, o sector dos seguros sociais permanece muito pouco desenvolvido, em parte
em razao das limitaçoes do sector privado, da ausencia de uma politicas de seguros para os
trabalhodores do sector informal (que sao a maioria - cerca de 80% da populaçao activa) e da
reduzida porçao da populaçao com confiança e capacidade economica para eventualmente
contribuir, e finalmente devido a ausencia de agencias para os seguros privados.
O instituto beneficia do apoio da Cooperaçao Portuguesa que tem como objectivo a modernizaçao
do sector e de suas instituiçoes como também a ampliaçao da cobertura dos seguros.
A experiencias das Caixas de Poupanca e Crédito
Devido a fraqueza do sector publico para os seguros, iniciaram no pais experiencias de caixas de
poupanca e credito. Estas experiencias sao estimuladas por ONGs e organismos de cooperacao
como a SNV, que apoiou a criacao de mais de 20 destes grupos em diferentes partes do pais.
Estes organismos de microfinancas sao integrados sobretudo por mulheres.
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O projecto PAED do PNUD, iniciado no Ano Internacional das Microfinancas (2005) tem
estimulado a criacao de organismos de microfinancas atraves da concessao de linhas de credito,
capacitacao e apoio material. Estes organismos engajaram-se para em 5 anos tornar-se
instituicoes performantes. Actualmente, algumas destas instituicoes de microfinancas apresentam
bons resultados. A DIVUTEC, a NO PEGA, a AMID e a ADIM, com uma media de 4 a 5 caixas
cada uma, tem sido bem sucedidas em garantir a sustentabilidade de suas operacoes.
O projecto PAED tem tambem contribuido para redinamizacao da CADESP (Celula de Apoio ao
Desenvolvimento da Economia Solidaria), junto ao Ministerio da Economia. A CADESP tem o
objectivo de formalizar este sector e desenvolver funções de supervisao e seguimento dos
organismos de microfinancas. As instituicoes mutualistas registadas sao isentas de impostos.
Actualmente, estao registadas cerca de 18 institutições mutualistas e de credito, das quais
algumas ja inactivas. As capacidades da CADESP de implementar suas funcoes sao limitadas.
De uma forma geral, o desenvolvimento destes mecanismos privados de proteccao social se
confronta com algumas dificuldades. A motivação para participação nas caixas está baseada
sobretudo no acesso ao credito. A mentalidade de seguro não esta ainda desenvolvida. Os creditos
obtidos podem ser desviados para gastos directos, ligados a tradição (por ex. Pagamento de uma
cerimonia), deixando o devedor numa situacao dificil. Para superar estas dificuldades, seria
necessario melhorar a gestao das caixas de maneira a estimular a confianca dos participantes
potenciais.
3.5. Mecanismos de assistencia de base nao contributiva
Quadro juridico-institucional
A Lei sobre a protecção social define a protecçao social da cidadania como todos aqueles
mecanismos com base nao contributiva que sao os subsidios financeiros e os serviços sociais para
os grupos vulneraveis. A Lei menciona explicitamente como fundamento da proteccao social da
cidadania a solidariedade nacional e a redistribuiçao. A proteccao social da cidadania deve ser
financiada pelo imposto e outros eventuais recursos procendentes de donativos e participaçoes
internacionais.
O Ministério da Solidariedade Social Familia e Luta contra a probreza (MSSFLP) foi criado em
2004, apos uma serie de mudanças na denominaçao e missão das instituições na area social e no
quadro da implementação do Programa de Reforma e Modernização da Administração Pública. O
Ministério é responsável pela “definição e execução da política que tem por missão principal,
desenvolver a solidariedade social, proteger a família, promover a integração social, reduzir a
pobreza, e assegurar a paz social através do desenvolvimento de acções multidisciplinares”. Ele
tem portanto a responsabilidade geral da protecçao social de tipo nao contributivo devendo para
tal “organizar, promover, enquadrar e coordenar com as ONGs vocacionadas, nacionais e
internacionais, todas as iniciativas sócio-economicas em beneficio das populações em geral,
privilegiando as camadas mais desfavorecidas”. O Ministério está organizado operativamente
em duas Direcções gerais, Direcção Geral da Solidariedade Social (DGSS) e Direcção Geral da
Luta Contra a Pobreza (DGLCP). Ele e o orgao de tutela do Fundo para a Acção Social (FAS) e
do Instituto da Mulher e da Criança (IMC). O sector da assistencia aos grupos vulneraveis
(orfaos, pessoas portadoras de deficiencias, idosos) é coordenado pela Direcçao Geral da
Solidariedade Social. Esta direcçao nao tem representaçoes nas regioes.
Resultados
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A missão principal da DGSSF é a coordenação das acções. Neste sentido tem havido várias
tentativas de criar um mecanismo eficaz de coordenação das ONGs. Uma Comissão Técnica
sobre OVC liderada pela DGSSF tem trabalhado e está na origem deste estudo.
A DGSSF gere directamente o fundo de solidariedade. Trata-se de um pequeno programa de
pensoes sociais para populaçoes particularmente vulneraveis, sendo as categorias eligiveis as
pessoas portadoras de deficiencias, as viuvas, os gemeos, os orfaos e os idosos37. O fundo tenta
responder também a evacuações para o exterior de urgências sanitárias (pagamento da passagem)
e acidentes como incêndios. O programa é financiado pela venda de selos.
Actualmente, estao inscritas no programa cerca de 2,500 pessoas, das quais a maioria sao pessoas
portadoras de deficiencias. Os inscritos recebem em principio uma contribuiçao trimestral de
10,000 CFA. O programa funciona baseado na demanda (pedido escrito) e a atribuiçao do
subsidio depende dos resultados do estudo social, da disponibilidade dos recursos e, em ultima
instancia, de uma decisao directa do Ministro. A irregularidade dos fundos disponiveis e sua
utilização ponctual para outros fins fazem com que o programa siga um andamento irregular.
Apoio às populações de refugiados- A Guiné-Bissau tem sido refúgio para as populações a fugir
conflitos na Libéria, Serra Leoa e Sul do Senegal (Casamança). O país dispõe de uma Comissão
nacional de refugiados e de apoios vindos das agências especializadas nas Nações unidas. Em
2006 o Ministério disponibilizou meios aos deslocados do Sector de São Miguel afectados pelo
conflito transfronteiriço de Casamança, Sul do Senegal e Norte da Guiné-Bissau.
De uma forma geral porem, o principal recurso para as familias em situacao de grande
vulnerabilidade nao tem sido o Estado mas as organizacoes privadas.
Neste sentido, o Projecto integrado de desenvolvimento de uma rede de protecçao social baseado
em acordo entre o MSSFLP e Cooperaçao portuguesa apoia financeiramente 16 entidades
publicas e privadas que actuam na area social – Rede Protecção Social - GB tem como objectivo
fundamental de assegurar a coordenaçao e a sinergizaçao das acçoes de protecçao social face a
limitaçao dos recursos financeiros e humanos disponiveis e às grandes necessidades da populaçao
em situaçao de pobreza. As entidades participantes proporcionam apoios directos às populaçoes
carenciadas, desenvolvem actividades de sensibilizaçao, conduzem acçoes educativas e de
formaçao para crianças e jovens e acçoes de apoio à criaçao de micro-empresas.
Em particular, as missoes catolicas e evangelicas, apoiadas por fundos estrangeiros e pela
CARITAS, actuam de maneira eficaz nas areas de saude preventiva e curativa, em particular das
maes, recuperacao nutricional e melhoria da dieta alimentar, jardins e escolas privadas e
comunitarias, com uma atencao especial para as familias afectadas pelo HIV/SIDA. Algumas
ONGs internacionais sao tambem presentes, como a PLAN internacional que cobre na regiao de
Bafata 16,000 criancas vulneraveis com servicos sociais e colabora tambem com ONGs nacionais
(como SOS Criancas Talibes).
No ambito ainda da Rede de Proteccao Social, o Ministério tem procurado estabelecer parcerias
com as organizações que actuam na área dos servicos a Pessoas portadoras de deficiências em
37
Em 2007, o Fundo assistiu cerca de 2206 pessoas repartidas da seguinte forma- 1,500 pensionistas- 386
órfãos e pessoas vulneráveis- 236 casos de assistência medica e medicamentosa- 58 gémeos, trigémeos e
quadrigémeos- 26 evacuações
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particular a União nacional dos deficientes menores (UNDM) e a Associação Bengala Branca,
que têm funcionado em infra-estruturas do Estado.
3.6. Sistemas de protecçao da crianca
A protecçao da crianca é um dominio especializado da protecçao social . A sua missao é de
assegurar proteccao judicial e atendimento psico-social as crianças que se encontram em uma
situaçao de vulnerabilidade aguda, a dizer as situaçoes em que:
-a criança é privada de agentes cuidados primarios (nos casos de abandono, criança traficado,
abandonada a si mesma, crianças a viver na rua, crianca institucionalizada, etc.)
-a criança é vitima de violação da sua integridade psico fisica (violencia, maus tratos, abuso,
exploraçao, etc.).
Portanto, a politica de protecçao da criança, embora seja um sector da protecçao social, merece
uma analise separada e aprofundada em termos das leis que a definem , das instituiçoes que a
implementam e do impacto das acçoes realizadas. Com efeito, esta politica é de responsabilidade
especifica do Estado e de suas instituiçoes especializadas, unicas detentora de legitimidade
governamental. Cabe ao Estado (e nao as ONGs) garantir os direitos humanos basicos das
crianças nos casos que implicam mudanças na responsabilidade parental e nos casos de violaçao.
Esta politica de proteccao da crianca implica em intervençoes especializadas e individualizadas
para a criança vitima :
 Intervenção das forças de segurança (policia d eordem publica epolicia judiciaria) nas
situaçoes de crise em que seja envolvida a criança, para apreensao do agressor e
protecçao da vitima ;

Intervenção da autoridade judiciaria do Estado, Curador de menores, Juiz para aplicaçao
de medidas de protecçao à criança por um lado, e sancionamento do autor da infracçao
contra a criança pelo outro;

Intervençao da autoridade administrativa de protecçao da criança para a implementaçao
de medidas de protecçao da criança (abrigo provisorio, atendimento psico-social,
acompanhamento etc.).
Quadro legislativo
Para a protecção da criança, a Lei vigente é o Estatuto da Assistência Jurisdicional do Menor,
herdado do período colonial. Como referido, existe uma nova proposta de lei para a protecçao da
criança a risco, que faz parte do conjunto de leis a serem reformadas para assegurar a
harmonização da legislação nacional com a normativa internacional neste dominio. O pacote
deveria ser aprovado, apos actualizacao, no curso da proxima legislatura. Convem que esta lei
diferencie paulatinamente, atraves de duas leis diferentes:
- Os procedimentos aplicaveis nos casos em que a criança é vitima (de negligência, de agressoes
fisicas e psicologicas, de exploraçao sexual ou no trabalho por parte de outrem) ;
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- Os procedimentos aplicaveis nos casos em que a propria criança infringe a lei – isto é é autor de
uma acçao descrita na lei como infraçcao, exigindo a aplicaçao de uma legislaçao especifica de
responsabilizaçao penal para jovens infractores e a aplicaçao de medidas socio-educativas
conforme a gravidade da infracçao.
Instituiçoes responsaveis pela proteção da crianca
- Comissariado Geral da Policia da Ordem Publica, Direcçao de Serviços de Direitos Humanos,
Promoçao e Protecçao da Mulher e Criança
- Ministerio do Interior, Direcção Geral da Polícia judiciária, Gabinete de Protecção do Menor e
Adolescente
- Direcção Geral da Solidariedade Social (MSSLP)
- Instituto da Mulher e da Criança (IMC) , Secretariado executivo da crianca
- Curadoria de Menor junto da Secção da Família do Tribunal Regional.
- Núcleo Nacional de Técnicos de Intervenção Social (NUNATIS) trabalha em parceria com o
MSSFLP e com a Curadoria de menores
Estes serviços colaboram com algumas organizações privadas e com algumas famílias.
Politica
No momento não existe nenhum documento oficial programático do Governo sobre a Politica de
protecção da criança. Os documentos de referência nesta matéria sao constituidos pelos acordos
de cooperação com organizações que operam nesta area, quer sejam acordos individuais
(UNICEF, ONGs) ou colectivos (Rede de Protecçao Social).
Resultados obtidos
 A notificação dos casos
Os professionais da área estimam que apenas um número limitado de casos de violação dos
direitos da criança a integridade psico-fisica chegam as autoridades. Alguns casos de violência
contra a criança são notificados ao radio, à Policia, ao IMC ou diretamente ao Tribunal (este
ultimo, e solicitado sobretudo elas ONGs). Porém, e reconhecido que existe uma grande
reticencia da parte da população em recorrer as instituições, de um lado para preservar a honra
da familia bem como relações e equilbrios familiares e de vizinhanca, en negação do interesse
superior da crianca, do outro lado tambem devido a um deficit de confiança no funcionamento
das instituições e na sua capacidade de resposta.
A ausência de um mecanismo de notificação que permita preservar o anonimato (como uma linha
telefónica SOS) faz com que não há denúncia de muitos casos que são portanto conhecidos das
comunidades. O rádio constitui o único recurso. O rádios porém, viola duplamente os direitos da
criança com o anúncio público do caso. Outra desvantagem, o rádio não tem mecanismo de
articulação com a Policia ou o Tribunal, deixando o caso ao grau das circunstâncias.

Resposta judicial
Policia da Ordem Publica e Policia Judiciaria
No Ministerio do Interior, existe um departamento especializado nos assuntos da mulher e da
crianca junto do Comissariado Central da Policia de Ordem Publica. A Policia da Ordem Publica
e encarregue da manutencao da ordem e da tranquilidade publica e da proteccao da seguranca dos
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cidadaos, em particular das mulheres e criancas. Ela desempenha uma funcao prioritariamente
preventiva e intervem nos casos de infracoes em flagrante e/ou a pedido da populacao.
Quanto a policia judiciaria, que tem a funcao de investigar os casos (constatar as infracoes a lei
penal, reunir as provas e procurar os autores). O Ministerio do Interior criou na Direcção de
Servico de Direitos Humanos, um servico especializado de promocao e proteccao da mulher e da
crianca em 2008. Este Departamento elaborou um Plano de trabalho para o periodo 2008-2009.
Um programa de formacao dos agentes policiais em policiamento comunitario preventivo e
apoiado actualmente pelo UNOGBIS. Varias outras actividades previstas ficam letra morta
devido a inexistencia de financiamentos.
Nem todos os casos de violencia contra a crianca que chegam a Policia sao investigados e
transmitidos ao Tribunal. Os profissionais do sector, admitem que a pratica deixa muito a desejar.
Da parte das famílias, há abandono dos procedimentos sobretudo devido a incapacidade
financeira de pagar os exames médicos necessários para averiguação das lesões físicas. 38 Da
parte da policia, as mas condições de trabalho, os baixos salários, a falta de supervisão, abrem
aporta para a corrupção e afectam fortemente a actuação. Nos casos de violação sexual de
crianças, se o autor do crime conhecido tem capacidade para pagar um suborno, o caso pode ser
abafado. Se as pessoas notificadas não comparecerem, a Policia não tem meios de terreno para ir
impor a lei (viaturas). Também e ressentida a necessidade de uma casa de passagem para albergar
as vitimas em condições de segurança.
De uma forma geral, é necessária uma vontade política de facto e investimentos para assegurar
que a actuação das polícias seja condizente com o Estado de Direito.
Curadoria de menores
A Curadoria de Menor existe so na Capital, junto da Secção da Família do Tribunal Regional.
Este serviço é encarregue de acompanhar os casos envolvendo crianças, quer na fase de
desenvolvimento dos actos processuais dentro do Tribunal como também nos contextos
familiares de colocação, assegurando o respeito do princípio do interesse superior da criança. A
Procuradoria geral da República tem procurado colocar nestes serviços magistrados com alguma
preparação especial, sensibilidade e interesse para os assuntos da criança.
A Curadoria de Menores de Bissau trata na maioria casos de separação de pais e de sucessão.
Trata também de casos de violência doméstica e de abandono de criança. Os profissionais da área
consideram que uma grande parte dos casos não chega ao Curador de menores, devido a fraca
capacidade de resposta da parte do poder judiciário. Com efeito, a capacidade de resposta da
Curadoria e diminuta enquanto a Curadoria i) não dispõe de assistentes sociais que possam levar
a cabo os estudos necessários a tomada de decisão do Curador e ii) carece de ligado funcional
estabelecida e regular com uma autoridade administrativa bem definida, que seria encarregues de
tratar do caso socialmente (acompanhamento a visitas medicas, estudos psico-social, analise das
possibilidades de reintegração familiar ou colocação alternativa, etc.).
Tribunal de Menores
O Tribunal de menores existe apenas na capital. O Juiz de Menores tem uma formação geral e
especializa-se no decurso da sua actuação profissional. Nas outras regiões, os casos são tratados
38
Estes exames estão a cargo da vítima e serão reembolsados pelo autor só após julgamento.
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pelos Tribunais regionais que não disporem de pessoal especializado. O Juiz de menores trata
casos cíveis.
Vara Criminal
Os casos de violência contra a criança acabam por serem tratados pela Vara criminal, no que diz
respeito as sanções aplicadas ao autor. Nos casos de violência familiar, a criança é entregue ao
Curador de menores, que decide da colocação da criança. Nos outros casos, a criança não e alvo
de nenhuma medida de protecção.

Resposta social
Não existe no momento, uma politica de protecção da criança que explicite o papel da autoridade
administrativa nesta área. No momento, a instituição que tem legitimidade administrativa na
defesa das crianças vitimas e que e portanto e responsável pelo atendimento social aos casos
tratados pelo Tribunal e o IMC.
O IMC realiza uma média de 70 atendimentos anuais. Devido a pessoal reduzido e falta de
representações nas regiões, este não vem assegurar paulatinamente uma assistencial adequada as
vitimas.
Os serviços de “retaguarda”, que deveriam colaborar com a autoridade administrativa para
proporcionar o atendimento social mais adequado a cada caso, não estão organizados em rede.
Nos casos em que ha necessidade de retirar a crianca do seu ambiente familiar ou de providenciar
um abrigo provisorio, ate se encontrar a solucao definitiva (reintegracao na familia, colocacao na
familia alargada ou em familia de acolhimento) nao existe um centro que possa desempenhar
esta funcao. Os centros de internamento de crianças existentes sao por vezes solicitados39, porem
eles nao dispoem das competencias necessarias para tratar com criancas vitimas.
A ONG RENLUV, na sua actuação contra a violência, recebe crianças a procura de um abrigo
provisório e tenta dar alguma resposta, porem de forma precária.
Por entre os serviços que fazem mais falta neste momento, uma prioridade partilhada pelos
actores, seria um centro para o acolhimento provisório de crianças na capital40.
Centros de internamento
Os orfanato funcionam portanto como meio de substituicao a familia, podendo a crianca
permanecer por periodo longos. Na sua maioria, as crianças sao entregues aos orfanatos pelos
proprios familiares, que afirmam a crianca ser orfa para responder aos criterios de admissao.
Todas as criancas tem um ato de entrega, porem os seus casos nao sao levados ao conhecimento
do Tribunal, como deveria ser. Apenas os casos inviados pelo Tribunal tem um ato de confianca
judicial.
3.6.1. Accoes transversais/tematicas
Luta contra o casamento precoce e as mutilacoes genitais femininas
39
Por exempo, pela Curadoria de Menores do Tribunal de Bissau.
Um centro de acolhimento para mulheres e criancas vitimas esta em construcao em Bula, com apoio da
RENLUV.
40
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Nao existe no momento uma Politica nacional de erradicacao do casamento precoce/forcado. A
legislacao admite diversas formas de unioes matrimoniais (civil, religioso, costumeira e de facto)
e diferentes tipos (monogamico epoligamico). Ela ainda autoriza o casamento de menores de 16
anos de idade a casarem desde que tenham consentimento dos pais, sem que seja necessario o
consentimento esclarecido do menor. Os casos esporadicos de meninas que fogem de situacoes de
casamento forcado e recorrem a instituicoes de proteccao da crianca sao resolvido de maneira
ponctual.
No que diz respeito as mutilacoes genitais femininas, antes do conflito de 1998-1999 o Comite
nacional contra praticas nefastas iniciou capanhas de sensibilizacao no pais com a colaboracao de
ONGs e com a participacao do governo. Contudo, o Comite parou de funcionar em 2000. O
aumento das cerimonias de fanado nas areas urbanas e o contexto regional de luta contra as MGF,
ajudou a retomada das actividades. Mais recentemente, a lideranca da luta legislativa foi
assumida pela Comissãoo sobre os assuntos da mulher. Um estudo regional da OMS (2006)41
provou que as MGF sao responsaveis por complicacoes de parto e aumentam a mortalidade e
morbilidade materna e neonatal. A PLAN Internacional levou a cabo um estudo nacional em
2007. No mesmo ano, o debate nacional foi redinamizado com o encontro nacional de lideres
religiosos. O resultdado e de que existe hoje no pais uma massa critica formada por alguns
lideres politicos e religiosos, profissionais da area social, activistas, membros das comunidades
capaz de levar a termo esta luta. Um dos pontos-chave demora a aprovacao de uma lei
criminalizando as MGF.
A instalação da nova ANP no fim do ano deveria colocar as condicoes para a retomada das
mobilizacoes em torno da repressao legal das MGF, conforme preconizado pelo Protocolo de
Maputo. A nivel da prevencao, as boas praticas de fanado alternativo (simbolico, preserva o ritual
mas nao pratica mutilacao fisica) da ONGs Sinimira e o inicio das actividades da ONG TOSTAN
no pais, que elaboru uma metodologia comunitaria para a eradicacao da pratica, deveria permitir a
difusao das boas praticas e ajudar na diminuicao progressiva das MGF.
Luta contra o trafico de criancas talibes
A ONG AMIC, o IMC e a OIM integram desde 2005 um programa transnacional contra o trafico
de seres humanos em sete paises da subregiao, com o apoio da Fundacao Suica do Servico Social
Internacional. O programa tem organizado o rapatriamento de um total de 176 criancas vitimas
no Senegal. As criancas sao identificadas por uma ONG senegalesa, Enda Tiers Monde, como
criancas que vivem na rua porque romperam com seus mestres por causa principalmente dos
maus tratos. O repatriamento passa pelas fases de identificao, acolhimento provisorio42,
localizacao da familia e preparacao a reintegracao da crianca e reinsercao na comunidade.
A pratica tem mostrado que as accoes de prevencao e eradicacao do trafico de crianca sob
pretexto de ensino coranico precisam de um apoio mais amplo da parte da sociedade guineense
para reforcar as accoes de prevencao por um lado, evitar a suspensao dos regressos e os
malentendidos sobre as finalidades do repatriamento junto dos pais, das comunidades e das
autoridades religiosas, por outro lado e para favorecer um efectivo seguimento das criancas
reintegradas. Uma concertação promissora dos actores tem sido iniciada sob a lideranca do
41
OMS- Mutilations Genitales Feminies et devenir obstetrical: etude prospective concertee dans six pays
africains, 2006
42
Em Gabu existe um centro de acolhimento provisorio gerido pela organizacao SOS Criancas Talibes,
onde as criancas rapatriadas podem albergar ate a identificacao das familias e em preparacao da
reintegracao.
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Ministro da Solidariedade, permitindo o dialogo das diversas partes e a busca de solucoes
conjuntas. Esta concertacao tem aberto o caminho para a elaboracao de um plano de accao
partilhado pelos varios actores. Uma Comissao tecnica e encarregada de dar seguimento as
diversas recomendacoes.
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Bomba manual de água em Caió, região de Cachéu. As dificuldades de acesso a água potável
têm sido uma das causas da alta taxa de mortalidade infantil e materna na GB.
ESTUDOS DE CASO: SECTOR AUTONOMO DE BISSAU (SAB), BAFATA E CACHEU
4.
4.1. Introdução
Estes estudos de caso pretendem analisar o contexto social em que vivem as crianças vulneráveis,
em especial as crianças órfãs e afectadas pelo HIV/SIDA na Guiné-Bissau. O estudo realizou-se
no sector autónomo de Bissau e nas regiões de Bafatá e Cachéu, regiões que apresentam uma taxa
de prevalência do HIV/SIDA um pouco superior ao resto do país.
Objectivos e problemática dos estudos de casos
O objectivo dos estudos é investigar o contexto social e económico no qual vivem as crianças
vulneráveis, em especial as crianças órfãs e afectadas pelo HIV/SIDA na Guiné-Bissau. A
questão central da investigação é compreender em que medida o processo de transformação social
que ocorre presentemente na Guiné-Bissau face ao alastramento da pobreza e as diferentes
estratégias de sobrevivência interfere com os mecanismos tradicionais comunitárias de coesão
social e protecção social às crianças em situação de vulnerabilidade, em especial as crianças órfãs
e afectadas pelo HIV/SIDA.
Importa sublinhar que as transformações (sociais, políticas e económicas) que se ocorrem
actualmente no país têm interferido com a estrutura de família tanto nas comunidades rurais como
urbanas conduzindo à uma rápida autonomização dos indivíduos face as normas tradicionais de
controle social tradicionalmente exercido pelos pais, velhos e chefes tradicionais/religiosos.
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Metodologia e abordagem da investigação de terreno
O desenvolvimento deste trabalho obedeceu aos critérios definidos nos termos de referência
elaborados pela consultora internacional Lídia Germain em concertação com o UNICEF. Ao
longo do processo, a missão foi obrigada algumas vezes a reorientar os trabalhos devido as
dificuldades de ordem infraestrutural (i.e. falta de jangada na travessia para São Domingos) ou
institucional (i.e. ausência de pessoas responsáveis/protectoras das crianças órfãs e afectadas pelo
HIV/SIDA na altura da missão), entre outros. Todo o trabalho foi suportado por uma conduta
ética e moral irrepreensível por parte dos inquiridores e coordenador (i.e. respeito pelos mais
velhos, respeito pela privacidade das pessoas, visita aos chefes tradicionais e autoridades
administrativos em primeiro lugar para explicação sobre os objectivos da missão, isenção e
neutralidade politica, etc). Os métodos e abordagens utilizados nos contactos com as instituições
sociais (públicas e privadas) assim como com os grupos focais (mulheres, jovens e homens nas
duas regiões visitadas), chefes religiosos e tradicionais, responsáveis e agentes de saúde foram
bastante participativos e inclusivos de forma a garantir a representatividade étnica, religiosa,
cultural, de género e institucional.
A metodologia foi completada pela revisão bibliográfica e documental sobre o HIV/SIDA,
histórias de vida (12 histórias em lugar de 20, porque os inquiridores não conseguiram falar com
as educadoras/responsáveis das outras 8 crianças, mesmo depois de várias tentativas), entrevistas
semi-dirigidas e/ou directas com informantes-chave, questionários abertos, fichas de identificação
de crianças nas instituições (SOS, Casa Emanuel), reuniões de djumbai43 com grupos focais
(homens, mulheres, jovens), visita de terreno, observação participante. Vários encontros e
entrevistas foram combinados (arranjados) previamente com o apoio do SNLS nacional e local,
dos governadores e os administradores locais e pelo régulo de Bafatá. Outras entrevistas foram
arranjadas no local, muitas vezes, em horas impróprias, embora a reacção dos entrevistados tenha
sido quase sempre positiva.
Encontro de com grupo de jovens na região de Cachéu
43
Método participativo de recolha de informações baseado em conversas informais com grupo-alvo
identificado a volta do tema em investigação. O encontro pode por vezes ser animado com bebida ou chá
para criar um ambiente mais flexível e menos pesado a volta dos temas em discussão.
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O trabalho de terreno foi complementado com entrevistas nas rádios comunitárias de Bafatá e
Canchungo que se revelaram de enorme utilidade visto a importância das rádios na sensibilização
e comunicação junto das comunidades rurais. As entrevistas tiveram como pano de fundo o
objectivo e finalidade da missão, os grupos-alvo, localidades incluídas, responsável pelo estudo e
pedido de colaboração e apoio por parte das instituições públicas e privadas.
A equipe que desenvolveu o trabalho foi constituída de um coordenador e seis (6) assistentes
sociais provenientes do Ministério da Solidariedade Social (4 pessoas, das quais 2 mulheres) e do
Instituto de Mulher e Criança (1 homem e 1 mulher). O grupo desenvolveu um espírito de
trabalho verdadeiramente de equipe. Depois de cada fase de trabalho a equipe reunia-se para fazer
um balanço rápido da actividade, analisar os pontos fortes e fracos, e definir novas orientações.
Assim foi em Bissau e nas regiões. Depois dos trabalhos em cada região, fez-se uma restituição
geral, no qual cada elemento emitiu o seu parecer sobre o que correu bem e o que correu menos
bem.
A representatividade e heterogeneidade dos actores e instituições sociais que lidam com as
crianças foram critérios respeitados ao longo de todo o processo de investigação.
Zonas geográficas abrangidas pela investigação
Os trabalhos desenrolaram-se nas regiões de Bafatá e Cachéu e no sector autónomo de Bissau, a
escolha das regiões baseou-se na progressão do índice de prevalência do HIV/SIDA. Em Bissau,
a missão teve encontros com os responsáveis das instituições que prestam serviços e apoios as
crianças vulneráveis e seropositivas (i.e. Casa Emanuel, Céu e Terra, Pediatria do Hospital Simão
Mendes, Sida Alternag, SOS). Vários bairros foram igualmente visitados na sequência das
histórias de vida.
Na região de Bafatá, a missão trabalhou em diversos bairros da cidade de Bafatá, no sector de
Contubuel e de Bambadinca. Na região de Cachéu, a missão visitou os sectores de Canchungo,
Caio, Bula e Cachéu. Inicialmente estava prevista a visita ao sector de São Domingos que fica
perto da fronteira com o Senegal, mas problemas relacionados com a avaria da jangada que
garante a travessia fez com a missão escolhesse um outro sector (Bula) para completar o quadro.
A escolha da cidade de Cachéu foi uma opção da missão em concertação com o responsável do
SRLS em Canchungo, por ser a sede do governador regional.
4.2. Constatacoes gerais
A análise dos dados e das informações recolhidas no terreno revela situações complexas e por
vezes ambíguas referentes a situação das crianças vulneráveis e a atitude e comportamento das
instituições e das famílias em relação a esse grupo social. Em termos genéricos, diz-nos a teoria
que as sociedades tradicionais africanas (sociedade “mecânica” na óptica de Max Weber) regemse por normas e mecanismos próprios que fazem com que a família não abandone as suas
crianças, salvo casos muito excepcionais (i.e. emigração, morte, invalidez dos pais, etc), dado o
grau de solidariedade horizontal existente entre os membros da comunidade. É importante
sublinhar que as estratégias de sobrevivência das comunidades e famílias africanas repousam,
entre outros, na reprodução social com vista a manutenção, renovação e transmissão dos
diferentes tipos de capital (económico, simbólico e social) entre as diferentes gerações.44 Ter
44
Bourdieu, 1994
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muitas crianças em casa ou morança (aldeia) significa ter mão-de-obra disponível para o difícil e
árduo trabalho de campo.
Entretanto, a investigação empírica constatou que as comunidades tradicionais africanas passam
por processos de transformação social importantes. O alastrar da pobreza e a influência da
sociedade moderna com todo o seu encanto e desencanto têm trazido muitas mudanças no modus
vivendi das comunidades influenciando o comportamento das instituições e famílias (vide o
“sistema” de herança tratado mais adiante45).
Face a esta dinâmica de recriação de novas formas de sobrevivência, na qual a dispersão familiar
(por vezes temporal) dos membros da família através da “migração circular”46 entre o campo e a
cidade e vice-versa ocupa um lugar importante, a coesão social que caracteriza a família africana
tem estado a ser afectada fazendo com que cada vez mais dependam das instituições de protecção
social (SOS, Casa Emanuel, Missão Católica) para busca de apoios, em especial alimentos (i.e.
farinha, leite, óleo, arroz), mas também roupas, medicamentos inclusive estadias prolongadas das
suas crianças.
Encontro com grupo de Mulheres em Caió, região de Cachéu.
Tanto em Bissau, como nas regiões de Bafatá e Cachéu existem muitas crianças órfãs e
vulneráveis. Entretanto, visto o Sida ser ainda considerado em muitos círculos sociais como uma
doença “terrível e carregado de simbolismos”, não é fácil saber se uma criança está ou não
infectada porque a doença não é divulgada nem no seio de familiares mais próximos. Assim
sendo, captar as formas como se expressam os comportamentos e as atitudes torna-se uma tarefa
bastante difícil. Em geral, a situação em que vivem essas crianças e as causas que as empurram
para estados de vulnerabilidade dependem do contexto sociocultural e económico de região para
região. Porém, e como foi atrás referido, dado o grau da coesão social e dos mecanismos de
protecção social comunitária é difícil encontrar uma criança fora do ambiente familiar. A prática
de apadrinhamento e de herança faz com que haja sempre algum familiar que tome conta de uma
criança órfã.
Em Bissau, as crianças que mais sofrem são as que vêm do mundo rural para a capital a procura
de emprego ou meios de subsistência. Muitas dessas crianças são órfãs (e possivelmente algumas
45
46
Cada vez mais os interesses económicos sobrepõem-se aos aspectos éticos e morais da coesão social
Ana Bénard da Costa. O Preço da Sombra. Pg, 28
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afectadas por HIV/SIDA). As crianças seropositivas identificadas e com idade compreendida
entre os 0 e 36 meses (ou mais) são, normalmente institucionalizadas a pedido dos próprios
familiares (i.e. Casa Emanuel, Céu e Terra, SOS). Porém, como a doença é tratada com muito
“secretismo”, a população tem vergonha de a revelar, por isso, raras vezes se sabe se a criança é
afectada ou não pelo HIV/SIDA.
Nesse fluxo de movimento migratório tem participado cada vez mais raparigas, o que deixa
entender que a dispersão geográfica dos membros da família e a existência de uma migração
circular entre o campo e a cidade constituem algumas características de estratégia de
sobrevivência que envolve tanto o rapaz como a menina.
Em Bissau, enquanto não sucedem com os seus objectivos, essas crianças ficam em casas de tios,
irmãos ou conhecidos até conseguirem algum emprego para depois alugarem apartamentos que
chegam a albergar até 5/7 pessoas. No seu processo de socialização com a nova realidade, muitas
dessas crianças passam por inúmeros problemas (prostituição e delinquência infantil, trabalho
forçado, assaltos pontuais, etc). É frequente assistir-se a cenas horríveis de maus tratos
perpetuadas por familiares (tias, avós) contra essas crianças (i.e. queimaduras nos pés e nas mãos,
cortes com armas brancas, castigos severos, etc).
Na região de Bafatá, onde existe uma nítida estratificação social, assiste-se a uma espécie de
mercantilização das relações, expressas em formas de tráfico de crianças (talibés) para o Senegal,
mas também na mutilação genital feminina, casamento precoce (esta pratica também acontece na
região de Cachéu e em Bissau). As razões que se prendem com a manutenção e desenvolvimento
destas práticas são tanto culturais ou religiosas como também económicas e políticas (i.e. seguir a
pratica ancestral, perpetuar a descriminação de género e os mecanismos de manutenção do poder
do homem sobre a mulher, etc).
As crianças expostas a maiores riscos nesta região são as crianças “talibés”. Sob pretexto de irem
apreender o Alcorão (no Senegal), essas crianças são envolvidas numa larga rede de tráfico que
inclui os mestres, os intermediários e por vezes os próprios pais ou encarregados de educação.
Apesar dos esforços desenvolvidos por algumas organizações (i.e. SOS Criança Talibés em
Bafatá, UNICEF, AMIC) e pelas autoridades locais para diminuir essa pratica, o fenómeno
continua bem vivo.
O nível de informação e conhecimento sobre a prevenção e formas de transmissão do HIV/SIDA
é bastante limitado. As comunidades em geral afirmam ter ouvido falar de Sida, mas não sabem
como a doença se contrai ou transmite. As crianças afectadas passam despercebidas na
comunidade, mesmo quando apresentam sintomas ligados ao HIV/SIDA, porque os familiares ou
não sabem ou não acreditam ou sabem, mas procuram não divulgar a doença.
Na região de Cachéu, é igualmente notório o aumento do número de crianças que vivem em
situação de vulnerabilidade. A pobreza e a dependência das famílias das remessas de familiares
emigrantes (do Senegal ou França) acabam por empurrar uma grande parte das crianças em idade
escolar para fora do sistema de educação. Muitas dessas crianças dedicam-se as actividades
informais (i.e. venda de alimento, transporte de produtos) ou a prostituição infantil. Segundo o
relato das missionárias católicas, algumas grávidas que visitam a Missão são adolescentes (15-17
anos), e algumas delas vêm infectadas pelo Sida. Recebem conselhos sobre como lidar com a
doença para evitar a transmissão para o filho, mas devido ao baixo nível de escolaridade e a
complexidade dos usos e costumes locais, algumas não levam a sério os conselhos dos agentes de
saúde ou das irmãs.
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O movimento migratório que é extremamente alto na região de Cachéu, facto que tem contribuído
para o aumento da prevalência do HIV/SIDA nessa região. Apesar da sociedade tradicional
Manjaca repousar numa estrutura social do tipo horizontal, onde a diferença de classes é ditada
mais por factores como idade, sexo ou ainda posse de poderes sobrenaturais e menos pela
acumulação de bens ou nível de escolaridade, facto que deixa entender uma certa homogeneidade
social, a região é uma das mais afectadas pelo HIV/SIDA no país. A promiscuidade social
alimentada pelo movimento de emigrantes que chegam com o seu dinheiro e excedem-se em
comportamentos desviantes tem sido uma das causas do aumento da transmissão do HIV/SIDA.
Nesta região, regista-se igualmente uma forte tendência para casamentos arranjados ou forçados
de adolescentes, mesmo que isso seja contra a vontade das raparigas. A força dos costumes e da
tradição obriga a mulher a aceitar ser “comercializado”, a troco de bens, terra ou dinheiro. Um
exemplo que ilustra a descriminação de género e sinais claros de perpetuação de poder do homem
nas comunidades rurais ocorreu numa pequena tabanca (UCO) do sector de Calequisse, região de
Cachéu. Eis a história:
“As comunidades locais decidiram num só dia celebrar 11 casamentos
forçados de jovens raparigas com homens daquela localidade contra a vontade
de algumas delas. Em pleno acto (cerimónia) aconteceu algo inédito. Uma das
raparigas rompendo as normas e procedimentos tradicionais declara
publicamente que estava apaixonada por uma outra pessoa que por sinal
estava presente a assistir impávido ao acto. A rapariga foi punida pelo pai
após o acto, originando depois a sua fuga para junto as Missionária do
Espírito Santo a busca de refúgio e apoio”.
Volvidas quase duas décadas desde que o HIV/SIDA foi declarado publicamente na GuinéBissau, a doença ainda continua envolta num grande tabu. As pessoas e as comunidades em geral
têm receio (ou complexo) de falar abertamente da doença mesmo quando alguém da família
padece de Sida. A doença e as suas vítimas encontram sempre um outro nome que não o Sida, “
… coitade, es doença kansal ba tchiu” (coitado, já não conseguia resistir a doença), dizem os
familiares ou amigos mais próximos, para não dizer que morreu de Sida.
A resistência em aceitar a doença tem muito a ver com argumentos culturais (tradicionais), o Sida
é considerado por muitos grupos sociais como uma maldição do espírito (ou Irã)47, por isso, os
doentes e os familiares recorrem, em primeiro lugar, aos métodos tradicionais da cura em
detrimento do hospital e cura moderna, b) a comunidade acredita que a doença é uma fatalidade
do destino, e que as pessoas já morriam antes do Sida e continuarão a morrer curando ou não a
doença, c) a proximidade física, social e psicológica das instituições tradicionais dos cidadãos faz
com que a família tenha vergonha em revelar o segredo por causa de possível perda de estatuto
social.
47
Figura com poderes sobrenaturais que pode decidir sobre o destino das pessoas
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SNLS (BULA). Informação sobre a dieta alimentar para os seropositivos
A revelação da doença muitas vezes representa um castigo duro (i.e. expulsão da casa), sobretudo
quando a infectada é uma mulher que em certas sociedades são vistas apenas como agente de
reprodução social. Em Bafatá, houve um caso que merece ser relatada:
“Uma jovem rapariga grávida faz teste de despistagem que acusa resultado
positivo. A mulher quis suicidar-se por desespero, ela não queria viver com a
sensação de que o filho nasceria com Sida e que um dia, mais cedo ou mais
tarde, viria a morrer por sua causa. Uma animadora da AGUIBEF (Associação
Guineense para o Bem Estar Familiar) colocada no local soube da história,
passou a visitar com frequência a mulher numa tentativa de persuadi-la em
não cometer o suicídio o que veio a lograr mais tarde. Hoje, a rapariga visita o
centro de saúde onde recebe o tratamento antiretroviral e conselhos sobre a
forma de evitar a transmissão da doença para o filho”.
Esta história confirma uma das descobertas da investigação empírica no que se refere ao nível de
conhecimentos e informações referentes ao Sida por parte das comunidades rurais. As campanhas
de sensibilização sobre a prevenção e transmissão do HIV/SIDA normalmente levadas a cabo
pelas associações locais ou Organizações Não-governamentais privilegiam uma abordagem
simplista de comunicação e informação acompanhada de música e oferta de preservativos que
muitas vezes não ultrapassam os círculos fechados dos bairros ou espaços circunscritos a volta
das estradas asfaltadas. As informações não penetram no fundo das aldeias ou quando lá chegam
vêm incompletas, por isso não produzem um efeito multiplicador. Isto faz com que uma grande
parte da população não tenha informações correctas sobre como e porquê prevenir-se da doença?
Como fazer para lidar com a doença? E que oportunidades de tratamento existem e onde?
O estudo concluiu que dentre as várias transformações que ocorrem nas comunidades rurais as
que se referem ao sistema de herança e casamento forçado são das que interferem de maneira
mais violenta com os direitos humanos, em especial das mulheres e crianças. Tradicionalmente,
quando uma mulher fica viúva terá que casar com o irmão do marido ainda que contra a sua
vontade. Quando é o homem (marido) que morre, os seus familiares querem herdar os seus bens,
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fazendo pressão para que a mulher (viúva) não fique com eles. E quando, essas tradições e usos
são contestados, muitas vezes a família ou os interessados directos recorrem a meios coercivos
contra a mulher (i.e. violência, ameaça de expulsão, ameaça de recurso ao Irã, etc.) para
conseguir os seus objectivos.
As histórias de vida revelaram que a responsabilidade pelo cuidado das crianças órfãs afectadas
ou não por HIV/SIDA é quase sempre decidida em comum acordo entre os pais ou então é o pai
quem decide antes de morrer ou emigrar. Em geral, é a mãe ou algum outro familiar de sexo
feminino (i.e. avó, sobrinha ou irmã do pai) que se responsabiliza pelo cuidado da criança. O
estado de saúde da criança quase nunca é revelado, por isso não é possível avaliar o alcance das
atitudes ou comportamentos de outras crianças em relação as seropositivas. Os relatos das pessoas
responsáveis pelo cuidado da criança deixaram entender que elas não levam as crianças com
regularidade as consultas (motivos da luta pela sobrevivência, negligência, entre outros), o que
deixa antever que o estado de saúde das crianças nessa situação seja bastante débil.
Por outro lado, essas histórias demonstraram que um dos maiores problemas que as famílias
sofrem não é o facto de terem que receber mais uma criança órfã em sua casa, mas sim a falta de
condições económicas para sustentar as crianças.
As reuniões com os grupos focais (mulheres, jovens, lideres comunitários) deixaram entender
que as mulheres são as que mais sofrem quanto a educação, saúde e alimentação das crianças.
Porque os homens passam grande parte do seu tempo fora de casa (por vezes em actividades
politicas, agrícolas, outras), as mulheres normalmente circulam em espaços públicos não muito
longe das suas casas e quase sempre envolvem as crianças nas suas actividades comerciais. Em
relação a situação de descriminação face às crianças portadoras de HIV/SIDA, o estudo verificou
que o nível de conhecimento e apropriação da doença pelas comunidades em geral (i.e. formas de
transmissão, poder de decisão em relação aos riscos, prevenção, etc.) não é homogéneo. Os
jovens são, em geral, mais informados porque participam das campanhas de sensibilização (mas
também são os mais expostos a riscos devido aos seus comportamentos), os velhos têm
informação, mas também acreditam menos na doença e as mulheres têm alguma informação, mas
são mais reactivas do que proactivas. Elas dependem quase totalmente das decisões e vontade dos
homens quanto ao uso de preservativo, visita médica, etc.
4.3. Principais constatações e conclusões dos estudos de casos: Sector Autónomo de
Bissau
Características demográficas, políticas e socioeconómicas
A partir dos anos 80, com a liberalização económica assistiu-se a um movimento migratório
importante do mundo rural para Bissau. Hoje, a cidade de Bissau concentra mais ou menos um
quarto (25%) da população total da Guiné-Bissau, ou seja, cerca 368.435 (200448) das quais cerca
de 135.901 têm a idade compreendida entre os 0 e os 14 anos de idade (em 2001). Esta situação
só por si deixa entender que há uma enorme pressão social sobre as já frágeis infra-estruturas
sociais existentes com consequências pesadas no bem-estar das populações. Se hoje se fala do
declínio do controle social por parte da sociedade, ou do enfraquecimento da instituição família,
em especial do controle dos pais sobre os filhos, é na cidade de Bissau onde este fenómeno é mais
evidente.
48
RNDH. PNUD.2006, tabela 10, pg 21
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Em Bissau concentra-se a máquina da administração do estado da Guiné-Bissau (Parlamento,
Governo, Supremo Tribunal, Tribunal Militar, Tribunal de Contas, Ministério Público), para além
das representações diplomáticas, o sistema das Nações Unidas, os bancos comerciais, a maioria
das empresas privadas, universidades, centros de formação, organizações não-governamentais,
centros de assistência médica, etc. Estas facilidades, por seu lado, estimulam a migração rural
para a Bissau fazendo aumentar os riscos da vulnerabilidade.
Apesar de contar com um hospital nacional (Hospital Simão Mendes), 3 centros de referência
nacional (hospital Raoul Follereau, hospital de Cumura e Centro Saúde Mental), a cidade de não
consegue dar resposta a imensa demanda do crescente aumento demográfico. Cerca de 51,6% da
população de Bissau vive debaixo do nível de pobreza, 35% das mulheres e 30,6% são
considerados pobres em termos monetários. A cobertura em água é igualmente deficitária, apenas
66,3% da população tem acesso a um ponto de água, 5.60% das pessoas com a idade entre 20-24
anos é infectada por VIH, 43,6% de população tem cobertura de água sem poço, e 43,6% de
mulheres é escolarizada.
Situação da vulnerabilidade das crianças, órfãs e afectadas por HIV/SIDA
A cidade de Bissau alberga uma enorme quantidade de crianças vulneráveis (16,3%, contra 7,8%
no meio rural e 14,5% nos outros centros urbanos), algumas delas em situação de muita
vulnerabilidade49. Nesta categoria as crianças que mais sofrem são as crianças órfãs de mãe ou de
ambos os progenitores ou as crianças que vêem do campo para Bissau. Reza a tradição que
quando uma criança fica órfã de mãe ela é herdada pela avó ou tia (são raros os casos onde o pai
fica com uma criança menor). Visto a maior parte dos agregados familiares guineenses (mais de
64,7%50) vivem em situação de pobreza absoluta, as tias ou as avós não conseguem oferecer a
devida protecção as crianças (i.e. alimento, medicamentos, escola, roupa, etc). Por isso as
crianças são muito cedo envolvidas em trabalho de subsistência económica, normalmente em
pequenos negócios da família chegando a trabalhar mais de 28 horas por semana em certos
agregados familiares51. Por passarem grande parte do seu tempo nas ruas das cidades, muitas
dessas crianças tornam-se dependentes de grupos organizados de “gangs” que controlam as
actividades ilícitas nocturnas (i.e. prostituição infantil, furtos, etc.).
Quando se trata de crianças menores que ficam órfãs, sobretudo da mãe, a investigação constatou
que os familiares têm recorrido cada vez mais aos centros ou instituições que oferecem protecção
social às crianças. Por exemplo, 74% das 102 crianças actualmente institucionalizadas na Casa
Emanuel são crianças órfãs de mãe, 7% é órfã de ambos os pais e apenas 2% de pai. A idade das
crianças varia entre as 4 semanas a 15 anos de idade. Todas as crianças chegaram ao centro a
pedido dos próprios familiares.
No centro, as crianças recebem assistência alimentar, médica, pedagógica e material, jurídica,
formação, acompanhamento no crescimento, reintegração e lazer. A partilha da visão cristã de
vida colaborando na defesa dos direitos fundamentais das crianças é a força que move o centro. O
estudo não conseguiu obter dados sobre a situação de crianças órfãs afectadas pelo HIV/SIDA,
embora no centro estejam várias crianças nessa situação. O centro tenta ensinar as crianças a
49
MICS. 2006
DENARP. 2005
51
MICS.2006
50
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viverem uma vida de harmonia, sem descriminação, segundo os valores da família. As crianças
interagem-se sem problemas, sem estigmas e procuraram ajudar-se mutuamente.
A Casa Emanuel trabalha em parceria institucional com o Secretariado Nacional de luta contra o
Sida e o Ministério da Solidariedade Social para além de associações e organizações ligadas a
igreja católica.
Na Aldeia SOS encontram-se 108 crianças com a idade entre os 0 e 18 anos, mas o número dos
beneficiários do centro chega a 257 crianças. 35% das crianças institucionalizadas neste centro
são órfãs de mãe, 41% é órfã de ambos os pais e 12% é órfã de pai. A aldeia oferece assistência
alimentar, medica, pedagógica, lazer, protecção jurídica, reintegração, acompanhamento e apoio
financeiro. Todas as crianças estão institucionalizadas a pedido de familiares e por apresentarem
critérios requeridos pelo SOS para serem institucionalizadas.
O objectivo da Aldeia é lutar contra a exclusão social, garantindo capacitação e formação das
crianças vulneráveis, entre as quais as órfãs e abandonadas. A abordagem da aldeia é desenvolver
uma cultura de paz, solidariedade e honestidade entre as crianças, preparando-as para uma vida
futura. Neste momento existem cerca de 52 jovens saídos da SOS a estudarem em diferentes
universidades nacionais e estrangeiras.
Quadro - Proporção das crianças Órfãs por instituição de atendimento
Instituição
Mãe
Órfãs
Pai
Casa
Emanuel
Aldeia
SOS
74%
2%
Ambos (Mãe
e Pai)
7%
35%
12%
41%
Urbana
Não dito
Idém
Rural
Não dito
Idém
Nível de conhecimento e apropriação da doença
O estudo concluiu que uma das causas que tem contribuído para a evolução da taxa de
prevalência do HIV/SIDA na Guiné-Bissau é a ignorância das populações sobre a doença. De um
lado, o nível de escolaridade bastante baixo (i.e. resistência em usar preservativos) aliado aos
aspectos culturais faz com que muitos guineenses recorrem preferencialmente aos poderes
espirituais para a cura do Sida em lugar de hospital. A crença no poder dos espíritos (irã,
djambacus52, etc) determina o sentido de pertença e a forma como o cidadão concebe a direcção
da sua vida na comunidade.
52
Forças sobrenaturais que determinam o sentido de vida dos seres vivos
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Um dos pressupostos mais importantes na luta para a redução da taxa de infecção do HIV/SIDA é
um conhecimento preciso sobre a maneira como o Sida é transmitido e as estratégias de
prevenção da transmissão53. Uma informação correcta é a primeira etapa em direcção a
sensibilização dos jovens sobre como se proteger da doença. Ora neste capítulo, ainda existe um
grande défice.
Por exemplo, segundo o MICS 200654, o nível de conhecimento das pessoas sobre como prevenir
a transmissão do Sida é muito baixo, ou seja, apenas 32,1% das pessoas inquiridas detêm esse
conhecimento, 53,1% sabem que é preciso ter um parceiro sexual fiel e não infectado, enquanto
apenas 49,4% sabem que é necessário utilizar preservativo no momento das relações sexuais e
58,2% das mulheres sabem que o Sida pode ser transmitido de mãe para o filho.
Um dos factores que influencia este tipo de comportamento por parte da população jovem tem a
ver com a maneira como o próprio Estado guineense encara a luta contra o HIV/SIDA. Apesar do
Parlamento Nacional ter aprovado (em 2007) a lei sobre a Protecção das pessoas portadoras do
HIV/SIDA, o governo não tem demonstrado na prática fazer da luta contra o HIV/SIDA uma das
prioridades da governação. Os diferentes programas de governação não expressam essa
prioridade (i.e. orçamento geral do estado, conteúdos pedagógicos, etc). A luta contra HIV/SIDA
na Guiné é quase que totalmente financiada pela comunidade internacional.
Ao nível da sociedade civil, várias são as organizações que intervêm no domínio de
sensibilização sobre Sida através de programas radiofónicos ou teatro. Essas actividades
enquadram-se mais numa perspectiva circunstancial (i.e. enquanto o financiamento externo
existir), e menos numa visão sustentável que implica entre outros, voluntarismo,
consciencialização e patriotismo.
Nível dos apoios e comportamento das comunidades e famílias
A complexidade do ambiente social e económico em que vivem as famílias guineenses tem
influenciado o comportamento das comunidades guineenses. A enorme mobilidade e dispersão
dos membros da família relatada nas inúmeras histórias de vida (i.e. emigração temporária ou
prolongada, mudança de residência, mudança de profissão, etc) inserida nas estratégias de
sobrevivência das comunidades provocam frequentes mudanças no cuidado e protecção da
criança, muitas vezes esta é obrigada a mudar de casa para casa e de mãos para mãos (ora de mãe
para tia, mãe para avó, mãe ou tia para a vizinha, etc). Esta acaba por interferir na criação da
personalidade (i.e. processo de socialização) da criança. Quando se trata de uma família pobre, o
sofrimento é ainda maior, a criança é obrigada a trabalhar mesmo padecendo de alguma doença
(i.e. ir ao mercado, buscar água, limpar a casa, cozinhar, fazer recados diversos, etc).
A investigação apurou que a comunidade guineense, em geral cuida e protege a criança, mesmo
quando esta é deficiente ou órfã. Porém, de uma forma geral, pode-se afirmar que quase todos os
grupos sociais e étnicos da Guiné-Bissau educam as suas crianças preparando-as para uma vida
de trabalho árduo e de sofrimento. A primazia dos direitos colectivos das comunidades sobre os
direitos dos indivíduos é regra a seguir. Garantir a sobrevivência no quotidiano e,
simultaneamente no futuro, passa assim pela utilização de toda a mão-de-obra disponível55.
53
MICS, 2006, pg 95
MICS, 2006, pg 24.
55
Mecanismo de Protecção Social e Assistência às Crianças na GB. Cristina Rodrigues, Alfredo Handem e
Ana Benard Costa. Novembro 2007
54
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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O tempo que as crianças vulneráveis despendem a executar tarefas, o nível de desgaste físico e
psicológico que essas tarefas implicam, varia enormemente. Não só em função da situação
económica e social e das características particulares de cada família, como varia de etnia para
etnia e em função do sexo e idade da criança. O que é importante reter é que tanto nas
comunidades rurais como em certos meios urbanos na Guiné-Bissau as crianças são socializadas
e educadas para e no trabalho. Desde muito novas que têm obrigações a cumprir no espaço
doméstico ou publico informal (i.e. nas ruas da cidade através de vendas de diversos produtos
agrícolas transformados, entre outros)
Em Bissau, os chamados “filhos de criação” (que residem por diversas razões, com família que
não as dos seus progenitores) trabalham mais que do que os “filhos da casa” nas tarefas
domésticas. Alguns destes são efectivamente tratados como “escravos” da casa, mas também há
casos (algumas crianças órfãs ou jovens que vêm para a cidade estudar) em que estes têm um
tratamento diferenciado das restantes crianças da família que as acolheu e em que esta funciona,
efectivamente como uma família protectora da criança56.
De uma forma geral, pode-se dizer que as famílias na Guiné-Bissau protegem as crianças no
sentido de lhes garantirem abrigo, alimentação e uma educação que lhes permite mais tarde serem
adultos úteis e capazes de, com o seu trabalho, cumprirem a sua quota-parte de responsabilidades
dentro de um contexto produtivo e cultural com características específicas.
Recomendações
- Estimular a construção de uma visão nacional partilhada sem matéria de protecção às crianças
vulneráveis, envolvendo o conjunto dos actores sociais activos no país (público, privado,
parceiros internacionais). Essa visão deve ser traduzida em acções concretas (mecanismos de
coordenação, capacidades, orçamento, etc.);
- Criar um Observatório Nacional sob a supervisão do governo, incluindo a ANP, Parlamento
Infantil, Ministério da Administração Interna, Amic, Aldeia SOS, IMC, Reje e parceiros
internacionais com antenas nas regiões (aqui devem fazer parte do ON, a polícia de ordem
pública, os chefes religiosos e as associações de jovens) para diagnosticar e tomar medidas sobre
os acontecimentos que violam ou põem em perigo os direitos das crianças;
- Melhorar as acções de sensibilização a escala nacional, incluindo curriculum escolar sobre o
HIV/SIDA;
- Estimular e criar programas de desenvolvimento rural dirigidos a garantir a soberania alimentar
e criação de rendimentos as comunidades locais de forma a poderem melhor alimentar a família e
pagar as despesas da escolarização das crianças;
- Criar programas de sensibilização e de apoio as actividades económicas das comunidades em
função das realidades socioculturais de cada região;
- Melhorar a oferta de serviços socais de base às comunidades (i.e. água potável, centro de saúde,
escolas, estradas);
56
Mecanismo de Protecção Social e Assistência às Crianças na GB. Cristina Rodrigues, Alfredo Handem e
Ana Benard Costa. Novembro 2007
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
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- Melhorar os serviços de registo das crianças;
- Reforçar o papel do Instituto de Mulher e Criança e do Ministério das Solidariedade Social no
domínio da coordenação e concertação e influência de políticas
4.4. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Região de Bafatá
Características demográficas, políticas e socioeconómicas
A região de é uma das mais afectadas pela pobreza (estima-se que cerca de 72,4% da população
vive com menos de 2 dólares por dia, o que equivale a 13,6% do total do país). A população local
dedica-se essencialmente a actividade agrícola, a criação de gado bovino (de salientar que Bafatá
detém a segunda maior reserva de gado bovino do país) e ao comércio em especial o informal. De
entre as principais actividades agrícolas desenvolvidas pelas populações encontram-se a produção
de arroz no planalto, o milho, o algodão (este produto é exportado para o Senegal, através da
Associação Guineense de Algodão), o caju, a horticultura (a região é conhecida por ser grande
produtora nacional de tomate, cebola e outros legumes) e batata-doce. A pesca artesanal e a caça
completam o quadro das actividades mais relevantes da região que se inserem na dinâmica da luta
contra a pobreza. Em termos turísticos, destacam-se a caça desportiva (procurada especialmente
pelos portugueses e franceses) e algumas infra-estruturas hoteleiras. O sector privado está em
crescimento: a comercialização do algodão, a exportação da castanha de caju, o turismo, e o
comércio informal e formal vêm ganhando cada vez mais espaço na vida da região.
A região de Bafatá é dividida administrativamente em 6 sectores. Um governador sediado na
cidade de Bafatá nomeado pelo governo no poder coordena politica e administrativamente a região,
coadjuvado por 6 administradores sectoriais, um secretário regional, um contingente da força da
polícia de ordem pública e agentes do serviço de informação do Estado.
Na região de Bafatá intervêm várias organizações da sociedade civil, incluindo grupos ligados as
igrejas, organizações não-governamentais, associações juvenis e rádios comunitárias. Entre as
organizações mais activas destacam-se a Aprodel, Plan GB, a missão católica, a SOS Criança Talibé,
ETAD, Associação Guineense de Algodão (AGA), Associação de Pequenos Comerciantes,
Associação de Mulheres para a Promoção do Desenvolvimento e Luta contra a Fome (APALCOF),
Guiarroz, Centro de Formação Administrativa (Cenfa).
A região de Bafatá é conhecida por ser uma região com tradição do movimento associativo e
dinâmicas de desenvolvimento participativo. Os projectos “Agro-Silvo-Pastoril”, projecto
algodão, Fã-Mandinga, Projecto de micro-realizações desenvolvido pela SNV, Serviço-Quaker,
entre outros, realizados nas décadas de 80 e 90 criaram uma cultura de vida associativa
importante na região. Hoje, não existe sector em toda a região onde não se assiste a um
crescimento gradual de movimento de cidadãos a volta de assuntos ligados a vida da comunidade.
As actividades desenvolvidas em prol da comunidade por Aprodel, Plan GB, Apalcof, Guiarroz,
Missão Católica, SOS Criança Talibé, etc são exemplos importantes no quadro do
desenvolvimento de uma consciência colectiva capaz de estimular um maior envolvimento das
comunidades na protecção dos seus membros e na gestão dos riscos de ruptura social e
desagregação familiar.
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
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Por exemplo, as actividades a volta do GITT (gestão integrado do território da tabanca) têm
criado na mente das comunidades o senso de pertença através de gestão participativa do espaço
social e físico. Em Contubuel, a Apalcof procura através da rádio comunitária e das actividades
geradora de rendimento criar espaços de debate sobre os aspectos sociais e comunitários, na qual
a situação das crianças vulneráveis merece um destaque especial. Em relação a Missão Católica
importa sublinhar que a sua intervenção no quadro dos Centros de Recuperação Nutricional tem
permitido salvar a vida de muitas crianças e mulheres grávidas.
Breve resumo sobre a situação das crianças vulneráveis
A região de Bafatá é das regiões mais afectadas pelo índice de pobreza (72,4% das populações
vivem com menos de 2 $ por dia57) na Guiné-Bissau. Esta situação faz com que as famílias
recorram a inúmeras e diversas estratégias de sobrevivência de modo a fazer face as crescentes
dificuldades impostas pela pobreza (i.e. envio de crianças junto de algum parente nas cidades a
procura de melhores condições de vida, envio de crianças para Senegal para irem aprender o
alcorão “crianças talibés”, trabalho nos campos da lavoura, venda nas ruas, pedir esmolas, etc).
Segundo o relato das instituições e pessoas contactadas na região, as crianças que mais sofrem
são as crianças órfãs e as crianças Talibés. As crianças Talibés são crianças mandadas para outros
países (geralmente para o Senegal) para poderem estudar o Alcorão, mas segundo alguns
estudos58, as crianças são exploradas pelos seus mestres a quem devem entregar diariamente uma
determinada soma em dinheiro (entre 500 a 1.000 xof). Muitas dessas crianças (algumas são
órfãs) passam a vida nas ruas de Dakar a pedir esmolas, ficando expostas a inúmeros abusos
físicos e psicológicos e violações.
As crianças órfãs (várias são envolvidas nesse movimento Talibés) são normalmente herdadas por
algum familiar (em geral tia, irmão do pai ou avó). Durante um encontro que a missão teve com
um grupo de mulheres vendedeiras de óleo de palma e iogurte (extraída do leite de vaca), uma das
mulheres contou-nos a seguinte história:
“Eu tenho em minha casa sob a minha responsabilidade 9 crianças órfãs filhas
da minha irmã mais nova que faleceu depois de passar quase um ano doente.
O seu marido já tinha falecido uns tempos atrás, mas ninguém sabe da razão
da morte. Quatro delas são gémeas. Trato-as como minhas filhas, mas
não tenho condições financeiras suficientes para as sustentar, nem sei o que
será delas no futuro”.
Casos como essas são muitas na região. As comunidades em geral não sabem se uma criança órfã
está afectada ou não por HIV/SIDA, porque, por um lado, não vão ao hospital fazer teste de
despistagem, alegando não terem dinheiro para pagar consultas, por outro, as famílias têm
vergonha em revelar a causa da doença, quando de Sida se trata, por motivos de estigmatização (a
doença por vezes é relacionada com espíritos/irã).
No Centro de Saúde de Bambadinca, contou-nos o enfermeiro responsável59 pelo centro, que
houve alturas em 2008 (primeiro trimestre que registavam em média cerca de 5 casos positivos de
HIV/SIDA por dia nos testes de despistagem em mulheres grávidas. Os resultados dos testes são
57
DENARP. 2005
Vide estudo INEP sobre “Escolas Corânicas, Madrassa e Crianças Talibé” 2006.
59
Sr. Kiaké Djatá, enfermeiro responsável do Centro de Bambadinca
58
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sigilosos, quando as mulheres não querem receber os resultados não o fazem assim como não
regressam ao centro para seguir o tratamento quando não quiserem.
Na região existem algumas Unidades de Saúde Base construídas com o apoio da Plan GB e pela
missão católica, apesar de muitos deles não estarem operacionais por causa de falta de cuidado e
manutenção por parte das comunidades. As matronas (i.e. agentes de saúde formados para atender
a aconselhar as comunidades).
Nos últimos anos, a comunidade tem recorrido muito a assistência oferecida pela Missão
Católica, através dos Centros de Recuperação Nutricional. As famílias procuram sobretudo a
alimentação, medicamentos, roupa e materiais escolares. As irmãs oferecem igualmente
aconselhamento sobre como as mães devem lidar com as crianças, em especial a alimentação e
medicação. Todavia, as mães nem sempre seguem com rigor os conselhos recebidos e quando as
crianças começam a ganhar peso e a sentirem-se melhor, já não voltam ao centro e deixam de
tomar os medicamentos prescritos pelos agentes de saúde. Várias crianças morrem na região de
Bafatá por causa desse tipo de comportamento.
Nível de conhecimento e apropriação da doença
A investigação constatou que o nível de conhecimento e apropriação da doença por parte da
população de Bafatá é bastante fraco. As populações em geral, dizem que ouviram falar da
doença, na rádio ou através de campanhas de sensibilização, mas não conhecem como fazer para
evitar transmissão vertical
(de mãe para filho), ou as formas como o Sida pode ser transmitido para uma outra pessoa, nem
mesmo como fazer para garantir a prevenção. O défice de conhecimento sobre o HIV/SIDA
(prevenção e transmissão) é aqui relato nesta história:
“A Associação para a Luta contra a Fome em Contubuel (APALCOF) é uma associação
de mulheres (mais de 3.000 associadas) que promove actividades de captação de
rendimento através da produção hortícola e crédito a produção e oferece serviços
sociais (alfabetização, educação, capacitação, educação cívica) as suas associadas.
Recebe apoios entre outros do VSO (Voluntary Service Oversea, uma ONG da
Grã-Bretanha). Numa tentativa de capacitar o staff da Associação sobre o HIV/SIDA
para efeitos de disseminação de informação sobre o HIV/SIDA juntos das comunidades
rurais, a VSO enviou um formador da organização por sinal um seropositivo, numa
clara demonstração de argumentos contra a estigmatização e descriminação. Porém
quando o formador chegou ao Contubuel (pequeno centro semi-urbano), o responsável
do programa da Apalcof não tinha sido antes informado que o formador era um
seropositivo. Este foi acolhido e alojado pelo responsável da Apalcof em sua casa a
quem ofereceram comida e roupa de cama. Quando mais tarde o responsável do
programa foi informado do estado de saúde do formador fez um grande escândalo
e expulsou o formador da sua casa. Mais tarde quando participou da formação e
compreendeu como o Sida pode ser transmitido ele acabou por pedir desculpas ao
formador e a partir desse momento passou igualmente a sensibilizar e
informar as comunidades sobre a prevenção e formas de transmissão”
Esta história mostra-nos a complexidade do mundo rural e as dificuldades que as comunidades
sentem para lidar com o HIV/SIDA devido a falta de informação suficiente e baixo nível de
escolaridade. As campanhas de sensibilização levadas a cabo por associações juvenis e ONGs
sobre o HIV/SIDA duram apenas o tempo que o dinheiro que recebem das instituições
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financiadoras durar, isto significa, que essas acções não são contínuas e muitas vezes não chegam
ao fundo das tabancas.
Um outro factor que pesa no processo de apropriação de informação e conhecimento sobre o
HIV/SIDA é a relevância do peso da cultura, ou seja, dos usos e costumes tradicionais. As
comunidades em geral, acreditam que o Sida é uma fatalidade dos espíritos, por isso o medo em
revelarem a doença ou então o recurso antes a cura tradicional em vez do hospital.
Igualmente importante de referir nesse quadro de insuficiência de conhecimento por parte das
comunidades rurais é o alto grau de analfabetismo da população. De acordo com o relato de um
dos funcionários de uma ONG activa na região, uma mulher cujo teste de despistagem acusara
positivo, tinha na sua receita médica um código que indicava a seropositividade, mas ninguém da
família sabia ler para compreender a anotação do agente de saúde. Ela veio mais tarde a falecer,
porque não contou a ninguém sobre a doença assim como ninguém conseguiu descortinar a
informação sobre Sida no papel na receita que recebera do centro de saúde.
Nível dos apoios e protecção da criança pelas comunidades e famílias
Os relatos sobre as formas de protecção e apoios das comunidades e famílias às crianças
vulneráveis e órfãs variam de grupos focais para grupos focais e de instituição para instituição.
Em geral, os relatos indicam que as comunidades têm feito muito pouco para ajudar e proteger as
crianças, em especial as órfãs e deficientes (poucos conhecem se a criança órfã é afectada ou não
por Sida). A razão porque isso acontece esta ligada a situação da pobreza e falta de dinheiro para
pagar consultas num centro de saúde e comprar medicamentos ou ainda pagar a matrícula e
mensalidade escolar. Por isso, as famílias recorrem com frequência a ajuda da Missão Católica
para conseguir os apoios necessários para educar e alimentar as crianças. O envio das crianças ao
Senegal (crianças Talibés) para aprender o Alcorão e todas as histórias por detrás desse “tráfico
ocultado” é uma das expressões dessa falta de zelo por parte das famílias e comunidades em geral
em relação as crianças orfãs.
Por outro lado, alguns relatos deixam entender que, em geral, a criança órfã não é abandonada, élhe sempre oferecida alguma protecção (i.e. alojamento, alguma roupa, comida) através do
sistema de herança fortemente suportado pela tradição. Quando se trata de uma criança órfã de
pai, reza a tradição que a própria mãe é herdada pelo irmão mais novo do marido. Porém, em
alguns círculos familiares, a mulher é livre de decidir se aceita ou não a herança, ou seja de ir
viver com um outro homem, em caso de não querer ela é expulsa da casa e perde todo o direito
sobre os bens do marido. São raros os casos em que a mulher recorre a protecção da justiça (via
Ministério publico ou uma ONG) para defender os seus direitos. A mulher na maioria das
estruturas dos grupos sociais da Guiné-Bissau é severamente descriminada e punida pela força da
tradição e dos costumes sem ser defendida e/ou protegida pelo estado e as suas instituições.
As organizações da sociedade civil, neste caso as organizações não-governamentais activas na
região oferecem serviços de informação e sensibilização sobre o HIV/SIDA, mas dispõem de
poucos recursos financeiros para intervir de forma mais efectiva na luta contra a doença. Entre as
ONGs, a Plan Guiné-Bissau é das poucas que estende o seu apoio as comunidades rurais à
construção de infra-estruturas sociais (unidades de saúde de base, escolas, bombas manuais de
águas, etc).
Recomendacoes
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- Definir uma estratégia nacional sobre o fenómeno Talibe que tenha em conta a realidade
sociocultural do país e as experiências dos diferentes actores sociais envolvidos nessa matéria;
- Envidar esforços para a mobilização de recursos que possam ser usados na construção de
escolas corânicas para evitar ou diminuir o tráfico de crianças para o exterior da Guiné, em
especial para o Senegal;
- Criar espaços de lazer e jardins infantis para as crianças vulneráveis;
- Criar centros de acolhimento “temporário” para as crianças órfãs e afectadas por HIV/SIDA;
- Criar bolsas para crianças órfãs (matrícula gratuita, isenção de pagamento de propinas, oferta de
materiais escolares, entre outros);
- Criar a gratuidade para as consultas de mães grávidas;
- Criar programas de micro-créditos para bancos de cereais junto das comunidades rurais;
-Apoiar as comunidades nas actividades de transformação e comercialização através de microbancos rurais geridos pelas comunidades;
- Reforçar as actividades de sensibilização através das estruturas tradicionais das comunidades;
- Apoiar os programas das ONGs que intervêm na luta contra a pobreza;
- Apoiar programas de cantina escolar que possam adquirir produtos no próprio país;
- Reforçar as campanhas de sensibilização sobre a convenção dos Direitos da Criança;
- Reforçar as actividades de captação de rendimentos das mulheres no domínio da economia
informal;
- Incentivar a escolarização das raparigas através de bolsas, programas extra-curricular, etc.;
- Reforçar as acções de sensibilização nas zonas rurais sobre o HIV/SIDA;
- Criar centros de formação socioprofissional para as crianças e jovens mais pobres;
- Estimular e organizar as comunidades no sentido de criação de mutualidades de saúde;
- Apoiar na criação de jardins infantis para as mães trabalhadoras;
- Estimular a criação de redes regionais de mulheres líderes de opinião (incluindo jovens
estudantes, comerciantes, agricultoras, vendeiras, professoras, funcionárias, deputadas, etc) que
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sirvam de activistas e animadoras junto as comunidades para a mudança de mentalidade e de
defesa de direitos de mulheres e crianças.
4.5. Principais constatacoes e conclusoes dos estudos de caso: Regiao de Cacheu
Características demográficas, políticas e socioeconómicas
A região de Cachéu conta com uma população acima de 150.000 pessoas espalhadas por mais de
500 tabancas (censo 1991). O nível de pobreza é igualmente elevado na região. Cerca de 59,1%
das mulheres e 42,1% são considerados pobres. A região é habitada maioritariamente por
Manjacos, seguidos de Balantas, Felupes, Mandingas e Brames.
As principais actividades económicas da região são a agricultura, a pesca e o comércio informal.
A região faz fronteira com a Republica do Senegal factor que tem contribuído para aumentar o
fluxo migratório entre os dois países e as transacções comerciais. Administrativamente, a região é
dividida em 6 sectores (Cachéu, Canchungo, Caió, São Domingos, Bula e Calequisse), sendo a
cidade de Cachéu o centro administrativo e a sede do governador. Porém, a cidade de Canchungo
é o centro comercial e o lugar onde se concentra a maior parte das organizações da sociedade
civil e empresas privadas.
A região é confrontada com inúmeros problemas sociais. A taxa de escolarização das raparigas é
de 64,2%, enquanto que o analfabetismo situa-se a volta de 82,3 para as mulheres e 45,4% para
os homens60. A cobertura em água sem poço é apenas de 38,2% da população o que indica a
existência de muitas doenças associadas a falta de higiene. A região possui um hospital de
referência em Canchungo, uma maternidade, 10 centros de saúde e 44 unidades de saúde de base.
A produção agrícola, em especial a produção e comercialização de caju é a actividade que
emprega o grosso da mão-de-obra activa contribuindo ao lado das remessas dos emigrantes para a
principal fonte de sobrevivência das populações locais.
Na região de Cachéu intervêm muitas das organizações não-governamentais, redes de associações
e associações juvenis activas no país. A proximidade com o Senegal faz aumentar os riscos
sociais devido ao movimento migratório estimulado não só pela guerra de Casamance, mas
também pelas transacções comerciais.
Breve resumo sobre a situação das crianças vulneráveis
Não obstante, a região de Cachéu apresentar um número considerável de organizações da
sociedade civil (SOS, ONGs, redes de associações, associação profissionais de sexo, Projecto de
Saúde Bandim, AMIC, associações de mulheres e jovens, incluindo as organizações ligadas a
igreja) que intervêm no domínio da sensibilização e informação sobre o HIV/SIDA e prestam
serviços diversos a comunidade (i.e. alimentação, assistência escolar e sanitária), a região aparece
nos lugares cimeiros em matéria da propagação do HIV/SIDA.
60
Relatório Nacional sobre o Desenvolvimento Humano na Guiné-Bissau. PNUD. 2006
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Projecto de Saúde Bandim, sector de Caió.
Entre as causas apontadas para esta alta prevalência do VIH está o movimento migratório (há
muitos emigrantes manjacos a viverem no Senegal ou em França que chegam e partem), mas
também a pobreza e o declínio das instituições tradicionais em termos do seu papel de controlo
social.
Em termos de situação de crianças vulneráveis, a região apresenta características sociais não
muito diferentes das da região de Bafatá, apesar do fenómeno criança Talibé não se verificar
nesta região, pois ela é habitada por grupos étnicos predominantemente animistas.
Na tradição manjaca (i.e. etnia maioritária), quando uma criança fica órfã de pai ela fica com a
mãe, mas quando são ambos os pais que morrem, a criança é herdada pela tio/tia ou avó. Se a
mulher não quiser ser herdada pela pessoa indigitada, ela é livre de escolher alguém da família
com quem queira ficar. Quando a mulher recusa em aceitar alguém ela core o risco de ser expulsa
e perder todo o direito e regalias sobre os bens. Quando se trata de homem (por exemplo, um tio
da criança) que não estiver interessado em aceitar receber as crianças, pode perder a vida devido a
intervenção dos espíritos. A questão da herança é quase que sagrada na tradição Manjaca.
A existência da aldeia SOS em Canchungo revela a evolução da taxa de crianças vulneráveis
cujos pais morreram (se de Sida ou não, não se sabe devido ao tabu) ou emigraram. A aldeia
abriga 60 crianças (entre elas muitas são órfãs), 37 meninas e 23 rapazes, entre 0 a 7 anos de
idade, a criança mais nova é um rapaz que tem 9 meses. As vezes as crianças são abandonadas na
porta da aldeia SOS. O sistema de funcionamento da aldeia faz com que cada criança internada
tenha uma Mãe da Aldeia que cuida ao mesmo tempo de mais 4 outras crianças. As crianças
podem igualmente ter padrinhos ou madrinhas com os quais podem passar um tempo de férias. O
pessoal da aldeia não sabe (ou não querem dizer) se as crianças órfãs são afectadas ou não por
HIV/SIDA. O comportamento das pessoas em relação as crianças é uniforme, sendo ela órfã ou
não.
O projecto de Saúde de Bandim em Caió intervém mais na área de investigação, pesquisa e
sensibilização sobre o HIV/SIDA, mas com indivíduos acima de 15 anos de idade. Neste
momento seguem um grupo de 600 indivíduos/amostras a quem deram um cartão verde que os
permitem ter acesso grátis a consulta e medicamentos. O projecto segue 18 pessoas em
tratamento antiretroviral.
Em Bula, a missão católica tem prestado assistência a um número cada vez mais crescente de
crianças órfãs. Uma vez por semana (segundas-feiras), a missão recebe crianças em consultas, e
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cada semana aparece uma nova criança órfã. Muitas mães que chegam ao centro são ainda
raparigas adolescentes (entre 14 a 17), que apresentam um estado físico bastante anémico e
desnutridas.
Centro de Nutrição de Caritas de Bula
Uma outra característica da tradição local é os homens terem entre 3 a 4 mulheres e muitos filhos,
alguns passam o tempo nas hortas e plantações e são muito mal nutridas. Os homens raras vezes
ajudam as mulheres com as tarefas domésticas e familiar, ficam sentados a espera das mulheres e
da alimentação, não cuidam das crianças que as vezes brincam nos lugares onde os porcos bebem
(!!!). Por isso, os maiores problemas dessas crianças relacionam-se com a má nutrição,
crescimento lento, perda de peso, entre outros.
Nível de conhecimento e apropriação da doença
O nível de conhecimento e informação que as comunidades têm em relação ao Sida varia de
centros urbanos para aldeias. Em geral e graças as acções de sensibilização com o apoio do
STNLS em Canchungo, através das rádios comunitárias, distribuição de preservativos e peças
teatrais em lugares públicos, as populações dos centros urbanos (Canchungo, Bula, Caió) têm
informações mínimas sobre as formas de prevenção e transmissão do HIV/SIDA. Nos encontros
com as autoridades, chefes tradicionais, representantes das organizações da sociedade civil ou
grupos de jovens e mulheres todos são peremptório em informar que ouviram falar de Sida e
conhecem minimamente como se transmite a doença.
No meio rural, a situação é mais grave. As informações e a comunicação entre os centros urbanos
e o meio rural são limitadas, muitas vezes resumem-se a missões esporádicas ou visitas de
algumas organizações, em especial da missão católica. Por outro lado, os usos e os costumes
tradicionais são muito mais enraizados na cultura das comunidades rurais, daí a resistência das
comunidades em aceitar a doença e/ou usar meios modernos para evitar a contaminação.
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Segundo as estimativas do estudo sentinela (2003), estima-se que cerca de 10.073 indivíduos
vivem com Sida na região, 1.679 nos centros urbanos e 8,394 nas zonas rurais. Calcula-se que
mais de 10% dessas pessoas tenham menos de 18 anos de idade.
Encontro com Missionárias do Espírito Santo (Caió)
O grau de escolaridade baixo das comunidades é outro factor que contribui para perpetuar
comportamentos e atitudes discriminatórios contra os direitos das crianças e mulheres (i.e.
casamento precoce e forçado das jovens raparigas, trabalho infantil pesado, falta de cuidado com
as crianças, sistema de herança, entre outros).
Um outro aspecto que a investigação apurou e que tem a ver com o nível de consciência e
apropriação da doença por parte das populações é o facto de muita gente decidir de livre vontade
fazer teste de despistagem, mas depois recusam-se (ou desinteressam-se) em ir buscar os
resultados do teste. Por exemplo em Caió, o Projecto de Saúde de Bandim colabora com cerca de
600 pessoas (possuem um cartão verde que os possibilita acesso grátis as consultas e aquisição de
medicamentos no projecto e nos centros de saúde local). Essas amostras são seguidas durante um
período de tempo para avaliar a evolução e o comportamento. Muitos fazem teste mas não
aparecem para buscar os resultados.
Nível de apoios e protecção da criança pelas comunidades e famílias
O fraco rendimento das populações rurais na sequência da queda dos preços dos produtos
agrícolas e da crise das políticas públicas para o desenvolvimento têm influenciado e muito a
maneira como as comunidades e as famílias gerem as suas crianças. Assiste-se nos últimos anos a
uma quebra gradual de valores e normas de coesão social tradicionais às famílias africanas. As
populações recorrem cada vez mais a terceiros para buscar protecção as suas crianças, não só em
termos de alimento, como em medicamentos, roupa ou formação socioprofissional. As irmãs e
missionárias da igreja católica têm praticamente substituído o Estado nas tarefas de apoio e
prestação de serviços sociais as populações e crianças em especial.
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Entretanto, o estudo deparou com certas situações que não podem ser explicadas apenas do ponto
de vista de indicadores de pobreza ou na base das transformações que ocorrem no modo de
funcionamento das instituições sociais tradicionais. Eis a história que nos foi contada pelo
responsável do Centro de Saúde de Bula:
“Um belo dia de sol, uma viatura atropela uma mulher que levava a sua filha de dois anos ao colo.
A mulher faleceu no local e a esposa do condutor do carro, ofereceu-se a ficar com a criança sob
sua responsabilidade. O pai da criança informado mais tarde do ocorrido aceita sem resistência a
proposta da mulher do condutor em ficar com sua filha. O responsável do centro de saúde (que por
sinal também tem uma filha órfã sob sua responsabilidade que lhe foi entregue para criação
quando era enfermeiro em Bigene há 13 anos atrás) soube através da sua esposa que é amiga (e
frequenta a casa) da mulher do condutor do acidente que esta tem tratado a criança da mãe
acidentada de forma diferente como trata os próprios filhos (i.e. aplica-lhe castigos mais severos,
está sempre a gritar com ela, obriga-a a trabalhos mais pesados em casa, etc).”
Ora esta história demonstra a transversalidade da abordagem criança e remete-nos a questionar
todo o sistema económico e social do país. A má distribuição de riqueza nacional e a injustiça
social que dela advém está paulatinamente a transformar a sociedade (i.e. as normas colectivas e a
solidariedade horizontal estão cada vez mais a serem substituídos pelo individualismo e interesses
materiais
Recomendacoes
- Trabalhar na conscientização sobre os problemas de herança com vista a salvaguardar os
direitos da mulher;
- Apoiar os Centros de Recuperação Nutricional com géneros alimentícios para as crianças e
mães pobres;
- Construir mais escolas comunitárias e proceder a reciclagem contínua dos professores para
facilitar o acesso e uma maior aprendizagem;
- Apoiar a escolarização de jovens raparigas órfãs e pobres através de bolsas (i.e. isenção de
pagamento de mensalidade, de propinas, programas de corte e costura, etc.);
-Reforçar as acções de sensibilização via as estruturas do poder tradicional sobre a prevenção e
transmissão;
-Estimular uma maior coordenação e concertação entre os diferentes actores que intervêm no
domínio da infância;
- Realizar estudos sociológicos sobre a real situação sociocultural e económico das crianças
vulneráveis na região;
- Sensibilizar as comunidades sobre a forma de lidar com crianças seropositivas;
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- Isentar as crianças órfãs e vulneráveis de pagamento de consultas e compra de medicamentos
essenciais;
- Reforçar o fornecimento de alimentação nas escolas comunitárias;
- Criar programas de incentivos à produção e comercialização dirigidos às mulheres;
- Apoiar as populações na vedação dos seus campos de cultivo por causa dos animais;
- Criar e desenvolver espaços de reflexão comunitária e de troca de experiências;
- Apoiar às jovens adolescentes com programas de aprendizagem, consciencialização sobre
formas de prevenção, contaminação, transmissão, etc;
- Criar projectos virados para o desenvolvimento comunitário com prioridade para a produção
alimentar e criação de receitas;
- Sensibilizar às comunidades para a criação de abotas (mutualidades de saúde e solidariedade
inter-grupo);
- Estimular à criação de redes regionais de mulheres líderes de opinião (incluindo jovens
estudantes, comerciantes, agricultoras, vendeiras, professoras, funcionárias, deputadas, etc) que
sirvam de activistas e animadoras junto as comunidades para a mudança de mentalidade e de
defesa de direitos de mulheres e crianças.
4.6. Conclusoes gerais dos estudos de caso
A luta contra o HIV/SIDA pressupõe a obtenção de informações claras sobre os factores e as
situações que levam milhares de Guineenses, mulheres e homens, a serem primeiro infectados e,
depois, a não poderem encarar a doença. A vulnerabilidade não é nenhuma condição divina que
advém do sobrenatural. Ela é, antes de mais, a consequência de factores determinantes individuais
conjugados com os factores sociais, comunitários e económicos. O conhecimento desses factores
determinantes é fundamental para melhor orientar as estratégias da Resposta Nacional que, acima
de tudo, tem de estar em condições de encontrar soluções para neutralizar ou reduzir o efeito
desses determinantes e o impacto do SIDA sobre a saúde e as condições de vida dos PVVIH e dos
seus familiares.61
A investigação empírica constatou que transformações sociais importantes têm vindo a ocorrer no
contexto das comunidades e famílias guineenses. Essas mudanças interferem com a forma como
as pessoas se relacionam no interior da família e na comunidade e com a maneira como as
normas, os símbolos e os costumes são interpretados e recriados ao longo do tempo.
61
PEN 2007 – 2011. Pg 11
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Os factores estruturais ligados a má governação e, sobretudo ao baixo nível de escolaridade e ao
elevado índice de pobreza tanto em Bissau como nas duas regiões visitadas são apontados pela
maioria dos nossos entrevistados como as causas principais da vulnerabilidade das crianças. O
declínio do preço dos produtos agrícolas no mercado internacional, a ausência de políticas de
incentivos à diversificação agrícola e o baixo salário dos funcionários públicos obrigam as
comunidades a recorrerem a inúmeras estratégias de sobrevivência, entre as quais, a reprodução
social e a utilização da mão-de-obra infantil desempenham um papel vital.
A crítica situação da pobreza faz com que muitos jovens e crianças abandonem as suas aldeias
para as cidades a procura de melhores oportunidades de vida sobretudo no sector informal da
economia. Esse movimento migratório provoca uma ruptura na mão-de-obra activa no campo (a
família produz menos), como também remete os jovens e adolescentes vindas do interior a uma
vida “quase de escravo” em Bissau, numa tentativa desesperada de obter rendimentos para ajudar
a família que ficou no campo. Muitas dessas crianças acabam por tornar-se presa fácil das redes
de criminalidade manejadas por adultos (i.e. pequenos grupos de assaltos e furtos nos mercados
de Bandim, prostituição infantil, trabalhos forçados, entre outros) aumentando o risco de
vulnerabilidade das crianças.
A ausência e a fragilidade do Estado, em especial no mundo rural é um outro factor que interfere
com o contexto social das crianças. O débil estado das infra-estruturas sociais de base (i.e.
bombas de água, escolas, centros de saúde, medicamentos, estradas, etc) deixa as comunidades
numa situação bastante vulnerável. Para além da falta de serviços sociais de base, a qualidade e a
disponibilidade dos agentes de saúde deixa muito a desejar. Muitas vezes, as comunidades (i.e.
mulheres) escusam de levar as crianças aos centros de saúde porque não têm dinheiro para pagar
a consulta e comprar medicamentos.
Em relação ao HIV/SIDA, o estudo apurou que uma das causas do aumento da taxa de
prevalência tanto em Bissau como nas regiões é o desconhecimento e ignorância das populações
em relação as medidas de prevenção e de transmissão. De acordo com o PEN (2007-2011), a
proporção da população guineense (homens e mulheres), com idade entre 15 e 49 anos, que nunca
ouviu falar do HIV/SIDA baixou em 2005 em comparação com 1998. São apenas 18% das
mulheres que afirmaram, em 2005, nunca ter ouvido falar de HIV/SIDA contra 40% em 1998.
Entre os homens, são 3,4% contra 12%. Os jovens (15 – 24 anos de idade) apontaram o sexo, em
94%, como a principal via de transmissão do HIV/SIDA. Mas as outras formas de transmissão
(transfusão sanguínea, seringa multiuso e transmissão vertical) cujo conhecimento é também de
extrema importância para a prevenção, não foram identificadas pelos jovens. Somente 7%
conseguiram citar, correctamente, duas vias de transmissão do VIH. 36% não sabe do poder
infectante de um portador assintomático do VIH (PVVIH). Isto é, não sabem que uma pessoa
aparentemente gozadora de boa saúde pode ser portador do vírus e, por isso, poder infectar
outrem.
A tabela em baixo monstra a tendencia de conhecimentos sobre HIV/SIDA (fonte: PEN 2007 –
2001)
Indicadores
1.
2.
Proporção da população com idade entre 15 e
49 anos que já ouviram falar do HIV/SIDA
(N=4285)
Proporção da população com idade entre 15 e
49 anos que já ouviram falar do preservativo
Sexo %
Mascul. Femin.
96,6
82,4
Residência %
Urbana
Rural
96,4
85,7
Total
%
89,5
94,5
94,2
83,7
72,9
78,0
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(N=4285)
3.
4.
5.
6.
7.
8.
Proporção da população (15 – 49 anos,) que
afirmaram ter acesso fácil aos preservativos
(N=3550), %
Proporção de jovens (15 e 24 anos) que já
ouviram falar do HIV/SIDA (N=2377)
Proporção de jovens (15 e 24 anos) que já
ouviram falar do preservativo (N=2378)
Proporção de jovens (15 - 24 anos) que
declaram ter conhecimentos sobre a
transmissão do HIV/SIDA (N=2160)
Proporção de jovens (15-24 anos) que
identificam correctamente duas vias de
transmissão do VIIH/SIDA (N=2160)
Proporção de jovens (15-24 anos) que negam
os preconceitos erróneos (rumores) sobre a
transmissão do HIV/SIDA (N=2160)
51,9
43,2
48,1
97,0
84,9
98,1
87,0
90,9
95,2
77,8
96,1
81,3
86,5
94,9
78,1
93,1
83,3
87,0
8,0
5,6
12,7
3,4
6,9
14,8
5,1
16,0
6,8
10,3
Fonte: PSB/06
O estudo também constatou que as campanhas de sensibilização levadas a cabo tanto pelas
associações juvenis e organizações não-governamentais com o apoio do Secretariado Nacional e
Regional de Luta contra o Sida, Action Aid e outras organizações são muitas vezes pouco
consistentes em termos do conteúdo das mensagens, da abrangência geográfica e sustentabilidade
da sensibilização, uma vez que elas não são contínuas. Muita gente nas aldeias longínquas não
têm acesso as informações sobre o HIV/SIDA.
Um outro factor que importa sublinhar e que prejudica o contexto social das crianças são os tabus
religiosos e culturais. Para muita gente, o Sida é uma doença ligada aos efeitos do irã (espírito)
daí o medo e/ou vergonha em revelar a doença, mesmo aos familiares mais directos. Por isso, as
comunidades em geral, buscam primeiro a cura tradicional e só depois (muitas vezes já tarde
demais) os hospitais. A questão da herança é um outro factor que mexe com as sensibilidades e a
estigmatização. Quase em todas as etnias da Guiné, quando uma mulher fica viúva, ela (e mais os
filhos) é herdada por familiares da vítima, normalmente pelo irmão mais novo. Quando a viúva
recusa é expulsa da casa e perde todas regalias sobre os bens do marido. O estudo constatou que
face a esta situação, algumas mulheres da região de Cachéu guardam os seus bens pessoais em
“duas malas separadas”, uma que se encontra em casa do marido e outra em casa da sua mãe.
Trata-se de estratégias de sobrevivência face aos riscos de que a mulher é exposta devido a
prática da herança que é discriminatória e violadora de direitos das mulheres e crianças. As
crianças que vivem em agregados familiares similares ficam, naturalmente expostas a maiores
riscos (i.e. castigos frequentes, trabalhos mais duros, ficam fora da escola, etc.).
O movimento migratório de campo para a cidade e vice-versa na sequência do alastramento da
pobreza é outra causa da vulnerabilidade das crianças. As crianças envolvidas nesse movimento
são muitas vezes abandonadas ou entregues ao cuidado de vizinhas ou algum outro familiar
mesmo que esse não reúna condições suficientes para cuidar da criança.
Por fim, importa igualmente referir-se ao comportamento sexual do guineense (i.e. recusa do uso
de preservativo, múltiplo parceiro, sexo comercial, inicio prematuro da actividade sexual, etc.)
surge como um dos muitos e importantes factores do aumento da prevalência do HIV/SIDA na
Guiné-Bissau.
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5. CONCLUSOES/RECOMENDACOES
5.1. Objectivos do estudo



Consolidar a informação existente de forma a estabelecer o quadro geral do impacto do
HIV/SIDA nas famílias e nas crianças, contextualizando-o no quadro mais amplo da
vulnerabilidade da criança;
Fazer um balanco rapido das intervencoes existentes viradas para as criancas e as familias
vulneraveis a nivel das diversas politicas publicas;
Propor uma estrategia de accao que resulte da analise e das trocas com diversos actores a
nivel governamental, das organizacoes da sociedade civil e das comunidades das regioes
escolhidas para o estudo.
5.2. Dificuldades e limitacoes

O processo sofreu de um deficit de leadership, sobretudo durante a segunda fase do
trabalho, da parte da Direccao Geral e da Comissao OVC com consequente insuficiencia
de debate e reflexão relativamente às conclusões e direcções possíveis para respostas
futuras. Tambem houve participacao muito limitada das liderancas do IMC, devido a
mudancas na Presidencia e Secretariados executivos.
5.3. A abordagem da problematica

A análise da situação do impacto do HIV/SIDA necessita de uma abordagem que permita
por um lado, analisar a complexidade dos efeitos da epidemia e por outro lado situar a
posição desta problemática relativamente a um contexto social fortemente caracterizado
por uma grande vulnerabilidade da população.

A vulnerabilidade estrutural (colectiva) abrange grandes segmentos da população infantojuvenil. Ela deriva em grande parte da instabilidade politico-institucional e manifesta-se
pelos altos índices de pobreza, pelo reduzido acesso a serviços básicos e pelo fraco
funcionamento de um Estado de direito capaz de proteger os direitos básicos da
cidadania.

A vulnerabilidade aguda da criança decorre principalmente de situações em que a criança
seja privada de meio familiar e/ou esteja exposta a situações de violação do direito à
integridade psíquica, física e social.

A epidemia de HIV/SIDA e uma variável adicional da vulnerabilidade estrutural, pelos
efeitos complexos de seu impacto a nível dos indivíduos, das famílias, do funcionamento
da sociedade em geral. Por outro lado, os efeitos complexos da vulnerabilidade
estrutural e do impacto do HIV/SIDA podem colocar as crianças numa situação definida
neste estudo como vulnerabilidade aguda. Isto significa que a resposta a vulnerabilidade
devido ao HIV/SIDA deve ser multidimensional e transversal a politica social,
implicando desde intervencoes de tipo transformativo ate os sistemas de proteccao da
crianca.
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5.4. Analise da situacao
Pobreza

A populacao da Guine Bissau encontra-se numa situacao de grande vulnerabilidade
estrutural.

A grande maioria da populacao guineense e vulneravel devido a pobreza: 64,7% dos
agregados familiares estão na pobreza e 20,8% deles estão em pobreza absoluta e vivem
com menos de um USD por dia. As criancas sao mais pobres do que os outros grupos
etarios.

Os choques de tipo económico mais frequentes sao as flutuações nos preços por ex. dos
alimentos e das matérias primas, perda da colheita devido a seca, pragas de insectos ou
infiltrações de água salgada, óbito ou doença cronica ou grave do provedor principal da
família com os acréscimos de despesas em tratamentos médicos e medicamentos,
funerais, ou riscos de acidentes, como no casos dos incêndios. Quando os agregados
familiares enfrentam dificuldades de tipo economico, existe o risco de que eles recorram
a estrategias prejudiciais envolvendo suas criancas: diminuicao na alimentacao das
criancas, retirada da escola, intensificacao do trabalho infantil, casamento
forçado/precoce, exploração sexual, migracao temporaria ou nao para a cidade a busca de
meios de sobrevivencia, institucionalizacao.

A pobreza influenciam o estado nutricional das criancas. Uma em cinco criancas de
menos de 5 anos de idade tem baixo peso, enquanto 4% tem uma insuficiencia ponderal
severa. As criancas que sofrem de atrasos no crescimentos sao muito numerosas (40,9%),
e 19,5% sao muito baixas pela sua idade. Cerca de 7,2% de criancas e magra de forma
moderada e 1,7% e magra demais para o seu tamanho.

A pobreza esta tambem entre os determinantes do trabalho infantil, cuja taxas são
extremamente elevadas: 39,2% raparigas (37,0%) e atinge mais as crianças que vivem no
meio rural (47,7%) do que no meio urbano (22,0%), e no SAB (14,2 para as crianças de 5
a 14 anos de idade, é mais alta para os rapazes (41,1%) do que para as %).
Acesso aos servicos basicos

As dificuldades de acesso economico e geografico aos servicos de registo de nascimento,
juntos com outros factores ligados a baixa qualidade dos servicos e a uma demanda
insuficiente, faz com que em 2006 ainda 61.1% das crianças de menos de 5 anos de
idade nao eram registadas e portanto expostas a uma serie de risco de exclusao e abuso.

O acesso aos serviços de saúde é muito limitado devido a infraestrutura deficiente, a
baixa operatividade dos centros de saude existentes, a dispersão da população sobretudo
nas zonas rurais e a fraca capacidade das famílias para se deslocarem. Também, a fraca
qualidade do atendimento, a não disponibilidade dos medicamentos ou a incapacidade
financeira de adquiri-los, as exigências de comparticipação têm como consequência de
desincentivar a utilização dos serviços de saúde por parte da população, em particular da
população pobre. Em 2002, apenas 37% das famílias mais pobres tinha acesso a saude.
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
Quanto a educacao primaria, estima-se que 100,000 criancas entre 6 e 11 anos estao fora
da escola, sendo que uma metade nunca foi matriculada e a outra abandonou a escola
pour uma razao ou outra (fraco desempenho, trabalho infantil, distancia, baixa qualidade
do ensino, entre outros). A maioria das criancas fora da escola sao rapazes.

No secundario e no terciario, notam-se taxas de inscripcao de raparigas
consideravelmente mais baixas dos rapazes devido ao casamento e gravidez precoce,
inadequacao das instalacoes sanitarias escolares, distancia entre o domicilio e a escola,
trabalhos domestico, resistencias culturais da parte dos pais.

60% da populacao guineense e analfabeta, com alta inequidade de genero: 50% dos
homens sao analfabetos e 80% das mulheres.
O impacto do HIV/SIDA

A situacao epidemiologica global da Guine Bissau e dificil de se avaliar. Existem porem
grandes receios de que a situacao esta a se agravar.

Segundo o estudo sentinela de 2005, a prevalencia do HIV-1 seria 2.5/3.0%. Segundo as
estimativas da Oms, em 2005 haveria 32,000 pessoas vivendo com VIH. A prevalencia
entre mulheres gravidas e estimada a 7.9%.

Todos os anos cerca de 4,000 mulheres seropositivas dao a luz, sendo que a porcentagem
estimada daquelas que tiveram acesso a prevencao da transmissao de mae para filho e
infima (1% em 2007).

Estima-se que um total de 3,200 criancas de menos de 15 anos vivem com HIV/SIDA.
Sao conhecidas dos servicos apenas as criancas seropositivas nascidas de mae
seropositiva, ou ainda as criancas em terapia ARV. Os orfaos seropositivos conhecidos
sao apenas aqueles que se encontram na Casa Emanuel (nove criancas).

Quanto aos orfaos devido ao HIV/SIDA estima-se que eles sejam 10% dos orfaos em
geral, isto e 11,000 orfaos devidos ao SIDA. Conforme os dados do MICSII, uma
crianca em cada dez de 0 a 17 anos e vulneravel, uma em cada dez tem um ou os dois
pais falecidos e uma em cada cinco e orfa e vulneravel.

Quanto a identificacao a nivel das comunidades das criancas infectadas ou afectadas
pelo HIV/SIDA, a pesquisa de terreno confirmou que esta identificacao e extremamente
dificil. Em primeiro lugar, o estado de seropositividade pode nao ser conhecido, sendo
que o teste e feito so quando o estado de saude se torna muito critico e passa a exigir
cuidados medicos. Nestes casos porem, pode haver recursos a medicina tradicional,
impedindo toda possibilidade de despistagem e tratamento. Em outros casos, a pessoa
vivendo com HIV/SIDA pode ja ter falecido sem que se tivesse conhecimento da causa
da morte. Finalmente, se o estado seropositivo e conhecido, ele e na maioria das vezes
ocultado, por receio do estigma associado a doenca.

Baseado nos dados do MICS de 2006, 11,3 % das crianças 0-17 anos são órfãs de pai ou
de mãe, sendo em termos absolutos cerca de 110,000 crianças. 1,8% das crianças são
órfãos duplos. Baseado nos dados estatisticos disponiveis, as crianças órfãos duplos
estao levemente a risco de discriminacao quanto a sua escolarizacao: o factor de risco
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principal da não escolarização não esta na orfandade, mas em outros factores como a
quintilha de riqueza, o meio de residência e a região.
Vulnerabilidade aguda

Quanto as criancas privadas de meio familiar, algumas centenas de criancas vivem em
instituicoes que praticam o regime de internato: a Casa Emanuel, dirigida por uma
congregacao religiosa, com sede na cidade de Bissau, a as Aldeias SOS crianças,
instituição filantrópica internacional que acolhe crianças órfãs, activa em Bissau desde
1996, e em Gabu e Canchungo desde 2006. O criterio principal para que as criancas
sejam aceites nestas instituicoes e que elas sejam orfas. Como referido, a Casa Emanuel
alberga uma dezena de criancas seropositiva em tratamento ARV.

As criancas sao vitimas de varias formas de violencia (maus trato, abuso, exploracao) no
ambito domestico e nas comunidades. A maioria dos casos nao chega as autoridades,
devido a fraco desempenho destas, arranjos/suborno para casos sobretudo de violencia
sexual e desconfianca nos orgaos de justica. Em 2005, o Comissariado Geral da Policia
de Ordem Publica registou 34 casos de violencia e abuso sexual de menores (33 meninas
e 1 menino). Em 2006, foram registados 65 casos de violencia contra a crianca, sendo a
maioria abuso sexual (53), violencia fisica (6), rapto (2) e abandono (2). Menos de
metade dos casos denunciados a Policia sao transmitidos ao Tribunal.

Uma forma de violencia sexual a qual sao exposta as meninas e raparigas guineense e a
mutilacao genital feminina (fanado). 44,5 % das mulheres com idades entre 15-49 anos
são excisadas. A prevalência da excisão varia muito em função da pertença étnica e a
zona de residência, ela é mais forte entre as Fula/Mandinga (95,2%) e no Leste (92,7%).
As MGF são também mais frequentes entre as mulheres sem instrução (54,4%) e no meio
rural (48,2%). Mais recentemente, assiste-se a um aumento das praticas de fanado nos
centros urbanos (barracas de fanado).

Outra forma de violencia sexual que afecta as raparigas e o casamento
forcado/precoce.7,3 % das raparigas guineenses casam antes dos 15 anos de idade, em
particular na zona norte do pais (10,1%) seguido por Bissau (5,8%), o leste (5,7%) e o
Sul do pais (4,8%) e em particular aquelas que pertencem aos grupos economicamente
mais fracos (8,5%). A percentagem daquelas que casam antes dos 18 anos de idade é de
27,3%.

Os rapazes das comunidades musulmanas por sua vez estao expostos ao trafico de
criancas sob pretexto de educacao religiosa, em particular para o Senegal. Uma parte das
criancas talibes sao recrutadas para fins de exploracao por intermediarios na maioria dos
casos com o consentimento dos pais, sao levadas para os centros coranicos onde passam a
ser exploradas atraves do trabalho agricola e da mendicidade. Estima-se que uma parte
das 22,831 criancas talibes recenseadas em algumas regioes do Senegal sao guineenses.
5.5. Analise da resposta
A resposta a vulnerabilidade estrutural
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
Nos últimos anos, a formulação, execução e avaliação da politica social do Estado
guineense tem sido afectada por um i) contexto politico-institucional adverso, a
instabilidade das lideranças e falta de continuidade das políticas ; ii)orcamentos
insuficientes, discrepancias profundas entre os orcamentos anunciados na Lei de OGE e
os desembolsos, dependencia dos doadores iii) capacidade de gestão reduzida, devido a
quadros de pessoal reduzido e sem as competencias necessarias em materia de
planeamento, implementação, monitoria, avaliação e coordenação das acções.

Como resultado, os esforços de redução da pobreza e as acções de expansão e melhoria
da qualidade das políticas sociais básicas, que constituem a base da politica social, tem
sido insuficientes e falham em assegurar a melhoria das condições de vida dos segmentos
mais vulneráveis da população.

Nao existem mecanismos privados - como poupanças, disponibilidade de bens para a
venda, - e públicos – indemnizações, subsídios, crédito - para fazer face as situacoes de
risco com as quais se deparam as familias. Os únicos recursos em caso de dificuldades
sao os familiares e amigos e eventualmente as obras sociais das Igrejas ou alguma forma
de apoio à geração de rendimentos oferecida por ONGs.

As acções de protecção social da cidadania (nao contributiva) são levadas a cabo em sua
maioria pelos parceiros sociais, ONGs e missões. A actuação do poder publico nesta área
ainda continua fraca. Apesar de varios esforços neste sentido, nao existe ainda uma
Politica nacional de Protecçao social clara e partilhada por todos os intervenientes.

A luta contra o trabalho das criancas nao esta ainda organizada e o pais necessita de uma
plano nesta area. Quanto a nutricao, a resposta actual e principalmente de tipo curativo.
Novos esforcos devem ser feitos para melhorar a educacao alimentar junto das
comunidades e para melhorar a seguridade alimentar atraves da diversificacao dos
cultivos.

Quanto a proteccao juridica dos direitos da crianca, e de se ressaltar que e urgente
harmonizar a legislacao nacional com os instrumentos da normativa internacional na area
da crianca, acrescentando-se as propostas ja formuladas i)duas leis bem distintas para a
proteccao da crianca vitima e a crianca que infringe a lei penal e ii) um diploma legal de
repressao do trafico de seres humanos, principalmente de criancas.

Uma accao permanente e necessaria para suscitar comportamentos e atitudes condizentes
com a proteccao dos direitos da crianca a nivel comunitario, atraves de abordagens
participativas.

Quanto ao registo civil, uma Estrategia Nacional para o registo de nascimento poderá
constituir um passo importante para a definicao dos objectivos e dos meios necessarios
com vista ao reforco do registo civil no pais. A estrategia deveria privilegiar o registo
sistematico a nascenca e criar condicoes para a sua sustentabilidade, reforcado por
campanhas pontuais para o registo retroactivo.

Para melhorar o acesso das populacoes vulneraveis a saude, para alem do necessario
desenvolvimento do sistema de saude, parece importante levar a cabo um debate claro
sobre as praticas actuais da politica de comparticipacao, como tambem uma revisao dos
comite de gestao dos centros de saude. Para melhorar a capacidade dos agregados de
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fazer face a despesas de suade, parece promissora a experiencia das mutualidades de
saúde, cuja experiencia, apos avaliacao, poderia ser reforcada e multiplicada nas diversas
areas do pais.

No sector da educacao, e importante finalizar o Plano nacionald e Educacao para Todos,
para assegurar o acesso a fundos suficientes para o sector . De fundamental importancia,
priorizar as intervencoes de expansao e melhoria da oferta escolar, de formacao de
dirigentes e professores, de revisao curricular e de apoio a demanda para educacao.

E’ tambem fundamental capitalizar a experiencia das escolas comunitarias no que diz
respeito a participacao dos pais e da comunidade na gestao e supervisao da performance
dos alunos e dos professores.

E fundamental tambem elaborar uma estrategia de universalizacao e perenizacao do
programa de merenda escolar, que tem actualmente uma cobertura de cerca de 144,000
estudantes (PAM e AMIC) e que tem contribuido para uma reducao do abandono escolar.
A resposta ao HIV/SIDA

A eficacia das campanhas de informacao e prevencao parece estar limitada a zonas
urbana. A cobertura dos serviços de despistagem e tratamento ainda nao e universal.
Algumas regioes nao tem nenhum servico. A frequencia da parte da populacao e
limitada, devido a falta de informacao no geral e ao estigma relativo a doenca. A taxa de
colecta do resultado da despistagem e baixa. Sao ainda necessarios esforcos serios para
aumentar as taxas de prevencao da transmissao vertical e para aumentar a taxa de
cobertura em tratamento ARV. Os ARV e o tratamento das DST sao gratuitos, porem
persistem problema de abastecimento que devem ser superados para evitar graves
repercussoes nos pacientes com tratamentos em curso.

Os serviços de saúde que identificam famílias atingidas pelo HIV/SIDA numa situação de
vulnerabilidade económica não dispõem de opções de encaminhamento dos pacientes
para mecanismos de apoio social. As poucas acções implementadas dizem respeito as
pessoas portadoras em terapia ARV e sao apoiadas financeiramente pelo SNLS, como os
Centros de Recuperação Nutricional que acolhem mães seropositivas ou a Casa Emanuel,
que acolhe crianças orfãs e seropositivas.

Quanto as crianças de famílias afectadas pelo HIV/SIDA, porem nao seropositivas, ha
serias dificuldades em identifica-la. Alem dos esforcos neste sentido, que devem ser
feitos pelos servicos de despistagem e tratamento, ha necessidade de se criar um
mecanismo institucional de apoio social para assegurar que estas crianças sejam mantidas
na família alargada ou colocadas numa família de substituição.

Nao havendo na grande maioria dos casos conhecimento da causa da morte dos pais, os
orfaos sao tratados conforme a cultura vigente. A crianca é no geral acolhida por uma tia
materna ou paterna, ou por outro familiar. Os principios que regem esta colocacao sao os
de parentesco (primazia ao lado materno, “a crianca é da mae”), de recursos materiais
(rendimentos, espaco), de proximidade geografica. A pratica dos filhos de criacao, pode
em alguns casos abrir porta para situacoes de exploracao e maus tratos, ainda assim tem
sido um instrumento eficaz para assegurar cuidados e proteccao a criancas orfas.
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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
Devido a falta de dados quanto aos numeros de criancas afectadas pelo HIV/SIDA, é
difícil estimar a cobertura dos apoios recebidos pelas crianças tornadas órfãs e
vulneráveis. Segundo os dados do MICSIII esta cobertura e muito baixa: 4,4% recebeu
apoio médico, 1,3 % recebeu apoio psicológico ou emocional, 1,2% apoio material, 3,2%
apoio à escolarização, ao passo que 92,5% não recebeu nenhum tipo de apoio.
A resposta a vulnerabilidade aguda

Quanto a politica de proteccao da crianca em situacao de vulnerabilidade aguda, e
fundamental a elaboracao de uma lei especifica de proteccao da crianca contra toda forma
de violencia e abuso e de documentos de politica que possam orientar a accao dos
principais intervenientes.

Apesar da responsabilidade das instituicoes governamentais neste dominio, nao ha no
momento modalidades de intervencao concertada entre as autoridades policiais,
judiciarias e aquelas da area social. Parece urgente portanto esclarecer os mandatos e as
responsabilidades de cada um dos intervenientes para que estes possam trabalhar de uma
forma integrada no tratamento dos casos particulares.

Existe tambem a necessidade de se criar alguns servicos que neste momentos estao a
faltar: programa de alternativas de colocacao familiar, para evitar a institucionalizacao
das criancas; mecanismo anonimo de notificacao dos casos, para encorajar as denuncias
de violacoes contra a crianca e seu sancionamento; abrigo provisorio, para as situacoes de
crise temporanea.

A luta contra as MGF deve se apoiar em accoes eficacez a nivel das comunidades,
utilizando metodologias promissoras utilizadas pelas ONGs nesta area. A criminalizacao
da pratica em conformidade com o protecolo de Maputo deve tambem ser introduzida.

A luta contra o trafico de criancas, para alem de um diploma legal apropriado, deve se
apoiar numa estrategia concertada entre as diversas partes, como aquela actualmente
preconizada pela Comissao ad hoc criada recentemente sob a alcada do Ministro da
Solidariedade Social.
* * *
A analise mostra que a situacao da crianca na Guine Bissua esta longe de ser satisfatoria. Em
todos os sectores das politicas sociais, notam-se dificuldades relativamente ao financiamento
e disponibilidade na administracao de recursos humanos qualificados para planejar e levar a
cabo as intervencoes. Esta situacao, derivada em grande parte das dificuldades politicoinstitucionais importantes que o pais tem sofrido desde o conflito de ha dez anos, sao os
factores principais responsaveis pelo fraco desempenho dos indicadores sociais.
Ao mesmo tempo, novos planos de accao, novas experiencias e metodologias participativas,
novas ideias sao desenvolvidas nos diferentes sectores, com resultados muitas vezes
promissores. Estas experiencias devem ser capitalizadas e na medida do possivel,
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perenizadas. Outras accoes devem ser reforcadas, para assegurar um impacto mais incisivo no
bem estar das criancas guineenses. Novas iniciativas devem ser levadas a cabo de uma forma
concertada entre os actores, para a melhor utilizacao possivel dos recursos disponiveis.
Para tal, e como resultado de toda esta analise, apresenta-se a seguir uma proposta de
estrategia de proteccao social para a crianca num contexto de HIV/SIDA, que propoe
algumas direccoes para que a politica de proteccao social contribua eficzmente com os outros
sectores em direccao de objectivos comuns. Acreditamos que as intervencoes propostas na
estrategia estao ao alcance dos actores engajados com os direitos da crianca na Guine Bissau.
Gostariamos ainda de fechar com as palavras que abriram este trabalho, palavras
inspiradoras e convite para cada um de nos a dar o maximo: “Nous realisons ce que nous
voulons realiser. Si nous ne realisons pas quelque chose, c’est parce que nous n’y avons pas
applique toutes nos facultes.»
Bissau, 1 de outubro de 2008
Lidia Germain e Alfredo Handem
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6. PROPOSTA DE ESTRATEGIA NACIONAL DE PROTECCAO SOCIAL PARA
ORFAOS E CRIANCAS VULNERAVEIS
A) EIXOS ESTRATEGICOS DAS INTERVENCOES
1. Criar um ambiente geral favoravel aos grupos vulneraveis, em particular as criancas
vulneraveis, qualquer seja a fonte de vulnerabilidade
2. Implementar politicas sociais basicas inclusivas e reforcar os mecanimos de apoio a
demanda para o acesso das populacoes vulneraveis aos servicos basicos
3. Desenvolver accoes destinadas a incrementar os rendimentos das familias vulneraveis
4. Melhorar e ampliar as accoes de proteccao social de base
5. Reforcar os sistemas formais e informais de proteccao da crianca
B) MEIOS
6.
7.
8.
9.
10.
Reforcar a coordenacao
Assegurar os financiamentos necessarios
Melhorar a gestao
Desenvolver sistemas de monitoramento
Melhorar as capacidades de planeamento, execucao e controlo de todos os intervenientes
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Eixo estrategico 1: Criar um ambiente geral favoravel aos grupos vulneraveis, em
particular as criancas vulneraveis, qualquer seja a fonte de vulnerabilidade
Objectivo geral
Objectivos especificos
Melhorar a proteccao
juridica dos direitos
da crianca, em
conformidade com os
diplomas legais
internacionais
dos quais a Guine
Bissau e parte
- Actualizar a revisao feita na passada legislatura das diferentes leis
relativas a crianca;
- Elaborar novas leis;
- Melhorar o nivel de execucao das leis atraves da capacitacao dos
diversos intervenientes do aparelho judiciario e administrativo;
- Divulgar as leis junto dos demais actores (ONGs, media, entre
outros) e da populacao em geral.
Provocar mudancas
de comportamentos e
atitudes em todos os
niveis do Estado e da
populacao em geral
no sentido de um
maior respeito dos
direitos da crianca
- Elaborar uma estrategia conjunta entre os órgãos públicos, o sector
não governamental, as Igrejas e os meios de comunicação social, bem
como os operadores a nível comunitário para um trabalho de
sensibilização em favor dos direitos das criancas em situacao de
vulnerabilidade
Envolver as
comunidades na
proteccao activa dos
direitos da crianca
- Elaboracao de uma abordagem de comunicacao e mobilizacao a
nivel comunitario e das liderancas tradicionais para suscitar
comportamentos protectivos e prevenir as principais violacoes dos
direitos da crianca (Tabanca modelo, tabancas amigas da crianca)
Promover uma
abordagem de genero
no trabalho de
promoccao dos
direitos dos grupos
vulneraveis
- Estimular a criação de redes regionais de mulheres líderes de
opinião (incluindo jovens estudantes, comerciantes, agricultoras,
vendeiras, professoras, funcionárias, deputadas, etc) que sirvam de
activistas e animadoras junto as comunidades para a mudança de
mentalidade e de defesa de direitos de mulheres e crianças (heranca,
escolarizacao das raparigas, prevencao do HIV/SIDA, luta contra as
MGF, melhoria dos rendimentos das mulheres, etc.)
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Eixo estrategico 2: Implementar politicas sociais basicas inclusivas e reforcar os
mecanimos de apoio a demanda para o acesso das populacoes vulneraveis aos servicos
basicos
Objectivo geral
Objectivos especificos
Assegurar o acesso de
todas as criancas ao
registo de nascimento
- Priorizar e reforcar o registo sistematico a nascenca
- Conduzir campanhas de registo como estrategia supletiva
(complementar) do registo sistematico
Apoios a demanda
para contribuir a
assegurar o acesso a
saude e aos
medicamentos
- Projeto de farmacia social
- Editar normas claras sobre a comparticipacao
- Revitalisar o debate em torno da Initiativa de Bamako (Comite de
gestao dos centros de saude);
- Reforcar e expandir as actividades de educacao alimentar baseado
na analise da experiencia dos Centros de Recuperacao Nutricional;
- Elaborar uma estrategia de apoio a expansao das mutualidades de
saude baseado na avalicao das praticas das mutualidades existentes
Apoiar a expansao do
sector pre-escolar
- Estimular a expansao da cobertura do sector prescolar pelas
associacoes comunitarias, ONGs, sector privado
- Editar regras, standards e realizar a supervisao
Apoios a demanda
para contribuir a
assegurar o acesso, a
permanencia e o
sucesso na educacao
primaria
- Documentar a experiencia das escolas comunitarias para extrair as
licoes aprendidas quanto a gestao comunitaria Criar associacao de
pais e encarregados de educacao em cada escola com participacao
activa na gestao e no controlo das actividades educativas
- Elaborar uma estrategia de universalizacao e perenizacao da
merenda escolar, que privilegie o abastecimento nos mercados locais
e o desenvolvimento de hortas comunitarias
- Levar a cabo um estudo sobre a viabilidade de um programa de
bolsas escolares para a escolarizacao secundaria das raparigas
Eixo estrategico 3: Desenvolver accoes destinadas a incrementar os rendimentos das
familias vulneraveis
Objectivo geral
Melhorar a cobertura
das accoes destinadas
a melhorar os
rendimentos das
familias, priorizando
os jovens e as
mulheres
Objectivos especificos
- Estimular a expansao e a melhoria da performance dos organismos
de microcredito
- Apoiar e reforcar os Bancos de Cereais
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Eixo estrategico 4: Melhorar e ampliar as accoes de proteccao social de base
Objectivo geral
Objectivos especificos
Finalizar a
formulacao da
politica de
proteccao social
com participacao
ampla dos
parceiros e dos
doadores
- Revisao e clarificacao da estrutura institucional e das instancias de
coordenacao
- Reforcar o papel do Estado para as funcoes de orientacao, coordenacao e
supervisao das intervencoes
Reformar as
intervencoes
publicas de
proteccao social
de base
- Levar a cabo uma avalicao rapida visando a reforma do Fundo de
solidariedade que contenha indicacoes sobre:
. desenvolvimento de um conjunto de indicadores de eligibilidade aos
beneficios
. desenvolvimento de estrategias de identificacao dos beneficiarios
. desenvolvimento de estrategia de distribuicao das alocacoes;
. elaboracao de uma estrategia de diversificacao das receitas do Fundo de
Solidariedade
Melhorar e apoiar
os mecanismos
comunitarios de
gestao dos riscos
- Apoiar a criacao de grupos de solidariedade a nivel comunitario para
favorecer o acesso conjunto a modalidades de microcredito
- Apoiar o desenvolvimento de mutualidades de saude
- Apoiar o desenvolvimento de caixas de poupanca e credito por
categorias de trabalhadores informais nas areas urbana e por colectividades
nas zonas rurais
Estabelecer
modalidades de
apoio publico as
familias atingidas
pelo HIV/SIDA
em parceria com
os servicos de
despistagem e
tratamento ARV
- Definir e aplicar criterios de eligibilidade coerentes/complementares com
os criterios definidos para o Fundo de Solidariedade
- Respeitar a politica de colocacao familiar alternativa (ver abaixo)
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Eixo estrategico 5: Reforcar os sistemas formais e informais de proteccao da crianca
Objectivo geral
Objectivos especificos
Reformar a lei
existente e criar
novos diplomas
legais adaptados a
situacao actual
- Distinguir claramente na lei as finalidades e os procedimentos aplicaveis
para:
i) criancas privadas de meio familiar vitimas de violacoes de direitos
ii) criancas autoras de infraccoes a lei penal
atraves de dois diplomas legais distintos
- Aprovar a Lei de repressao das MGF
- Elaborar uma lei de repressao do trafico de seres humanos, em particular
de criancas
Criacao de um
sistema nacional de
recolha e
tratamento das
informacoes para
assegurar uma base
solida a fase de
planeamento das
intervencoes
- Elaborar instrumentos de recolha de dados ao nivel de cada interveniente
da proteccao da crianca
- Estabelecer uma estrutura de recolha e analise dos diferentes bancos de
dados (Observatorio dos direitos da crianca)
Formular e
divulgar
amplamente a
Politica nacional
de proteccao da
crianca, articulacao
da protecao
judicial com a
proteccao social
Criar o sistema
formal de servicos
de proteccao da
crianca,
articulando de
maneira clara a
resposta judiciaria
com a resposta
social num sistema
integrado
Reforcar os
sistemas informais
de tipo comunitario
de proteccao da
crianca
- Explicitar os mandatos e as responsabilidade de cada um dos
intervenientes da proteccao da crianca na gestao dos casos individuais e a
cada etapa dos procedimentos;
- Estabelecer modalidades de articulacao entre os diversos intervenientes
bem como modalidades de circulacao/transmissao da informacao
- Criar redes comunitarias de proteccao da crianca com accao preventiva e
celulas de alerta precoce
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Assegurar as
criancas orfas o
direito a
convivencia
familiar e
comunitaria,
inclusive para
criancas com
dificuldades de
integracao na
familia extensa
(portadoras de
deficiencias, com
doencas cronicas,
etc.)
-Elaborar uma estrategia de colocacao familiar, incluindo toda a gama das
alternativas a institucionalizacao (desde integracao na familia extensa ate
familias tutelares)
Criar os servicos
necessarios para
completar o
sistema formal de
proteccao da
crianca
- Criar na capital um servico anonimo de notificacao de casos de violacao
dos direitos da crianca (tipo hotline ou linha verde), em colaboracao com o
sector privado das telecomunicacoes
- Criar uma casa de passagem para vitimas de violacoes
- Celebrar acordos entre as autoridades judiciairias, os servicos sociais
(autoridade administrativa) e os servicos de saude para a gratuidade dos
exames medicos de criancas vitimas
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B) MEIOS (accoes transversais)
1. Reforcar a coordenacao
1.1 Criar mecanimos de troca de informações e coordenação no dominio da proteccao social nos
seguintes niveis:
 Nivel nacional:
- Comissao interministerial de proteccao social
- Comissao mixta governo/parceiros sociais
- Redes de organismos nao governamentais com actuacao nacional
 Nivel regional
- Comissao mixta governo/parceiros sociais
5.2 Criar mecanismos de coordenacao a nivel das cidades e dos sectores no que tange a proteccao
da crianca (redes de proteccao da crianca) que reunam os intervenientes da area publica
(executivo, judiciario) e da area nao governamental e comunitaria
2. Assegurar os financiamentos necessarios
2.1 Dotar as instituicoes de proteccao social de recursos humanos, financeiros e materiais
condizentes com seus mandatos
3. Melhorar a gestao
3.1 Melhorar os instrumentos de gestao interna e externa (planos de trabalho, indicadores de
performance, prestacao de contas publica, etc.)
3.2 Melhorar a gestao financeira
3.3 Melhorar a gestao dos recursos humanos
4.
4.1
4.2
4.3
4.4
Desenvolver sistemas de monitoramento
Producao de conhecimentos quantitativos e qualitativos sobre as populacoes vulneraveis
Mapeamento actualizado periodicamente dos intervenientes
Sistema de acompanhamento das accoes/intervencoes
Desenvovimento de actividades de avaliacao
5. Melhorar as capacidades de planeamento, execucao e controlo de todos os intervenientes
5.1 Elaborar uma politica de formacao inicial e continua, de recrutamento e planos de carreira do
pessoal das diferentes instituicoes com actuacao na proteccao social
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Anexo I- Lista das pessoas encontradas
Aida Aminata Fadia, Direccao Servicos de direitos humanos, Ministerio do Interior
Ansumane Sanha, Juiz da Vara Criminal, Tribunal regional de Bissau
Celestino, Gabinete Estudos e Planeamento, MSSFLP
Domingos Simoes Pereira, Secretario geral, CARITAS
Edson Lopes, CADESP
Eliane Rodrigues, CADESP
Eugenia Castro, administradora, Casa Emanuel
Fantina, Juiz de Menores, Tribunal regional de Bissau
Fernando Ca, Administrador, AMIC
Fernando Menezes d’Alva, Seccao de saude, UNICEF
Filomena Mendes Lopes, Curadora de Menores, Tribunal regional de Bissau
Finhamba, Psicologa da CARITAS
Gabriel Ca, Secretario Geral, SNLS
Hector, AMIC
Iaia Ialo, CADESP
Inacia Mendes, Directora Geral da Solidarieda Social e da Familia, MSSFLP
Johannes, Associacao Social do Hospital Simao Mendes
Jolijn van Hagenamm, seccao HIV/SIDA, UNICEF
Jose Pedro Sambu, Juiz de Menores, Tribunal regional de Bissau
Laniela Lima, Seccao Proteccao da Crianca, UNICEF
Laudolino Medinas, Secretario Executivo, AMIC
Magda Lopes, Secretario Executivo, SNLS
Mamadou Diallo, APRODEL
Maria Victoria, Secretaria Executiva da area da crianca, IMC
May, Associacao Ceu e Terra
Mehoundo Faton, Seccao de Saude, UNICEF
Nelvina Barreto, Coordenadora Projeto CDD – Banco Mundial
Dr. Nicolau, secretario regional SNLS – regiao de Bafata
Noemia, Secretaria Executiva da area da mulher, IMC
Oscar, Associao Ceu e Terra
Urcelina Soares Gama Gomes, Presidente IMC
Simao, Seccao de Monitoria e avaliacao, UNICEF
Sonia Polonio, Seccao de Proteccao da Crianca, UNICEF
Responsaveis/membros das seguintes instituicoes:
- Casa Emanuel
- Plan international
- SOS crianças talibés
- APRODEL
- AMIC
- SOS Aldeia Crianca
- Centro regional de saude, Bafata
Victor, AIDA
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Anexo II - Bibliografia
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
9.
10.
11.
12.
13.
14.
15.
Plano Estratégico Nacional de Luta contra Sida. 2007-2011
Relatório Nacional sobre o Desenvolvimento Humano na GB. PNUD. 2006
DENARP. Outubro 2005
Mapping of resources and Gaps for Peacebuilding in Guinea Bissau. PSBO. 2008
Background paper on the situation in Guinea-Bissau for the country
specific meeting on Guinea-Bissau. 2008
Associação “Céu e Terra”. Relatório 2007
Plano Desenvolvimento Regional de Bafatá. Outubro 2007
Identificação de actividades para o programa regional norte. Alfredo Handem e Jan
Conelis. SNV. 1997
Recenseamento Geral da População e Habitação. 1991. INEC. Apoio Cooperação
portuguesa
O Preço da Sombra. Ana Benard da Costa. Abril 2007
Estudo sobre Escolas Coránicas, Madrassa e Crianças Talibés na GB. INEP/UNICEF.
2006
MICS. 2006
Analise dos Mecanismos de Protecção Social e Assistência às Crianças na GB. Cristina
Rodrigues, Alfredo Handem e Ana Benard Costa
Jornal “Ultima Hora”. 1 de Agosto de 2008
Histórias de Vida sobre crianças órfãs e afectadas por HIV/SIDA
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Anexo III - Lista de actividades desenvolvidas por zona geográfica para os estudos de caso
Actividades
Conduzida por Responsável
BISSAU
1. Perfil das crianças Casa Emanuel
Eunice, Fernando, Silvino
2.Perfil das crianças SOS
3. Histórias de vida – Crianças em tratamento ARV (20 histórias
de vida)
4. Entrevistas com organizações que desenvolvem actividades
de apoio às crianças órfãs, afectadas e vulneráveis (Céu e Terra,
Cida Alternag, Hospital Simão Mendes, SNLS, Casa Emanuel)
5. Reuniões de coordenação e concertação entre inquiridores e
coordenador de estudo
Fátima, Cremilde, Feliciano
Eunice, Fernando, Silvino,
AH, Feliciano, Cremilde, Silvino, Fátima,
Fernando, Eunice
AH, Feliciano, Cremilde, Silvino, Fátima,
Fernando, Eunice
REGIÃO DE BAFATÁ
Fernando, Silvino, Feliciano
1.Entrevista com responsável de
centro de saúde
2.Encontro com responsável
adjunto educação
3. Encontro com grupo focal
mulheres em Bambadinca
4. Encontro com grupo focal
mulheres em Bafatá
5. Encontro com grupo focal
mulheres Contubuel
6. Encontro com Aprodel
Bafatá
7.Encontro com Plan GB
Bafatá
8. Encontro com ONG Guiarroz
Contubuel
AH, Cremilde, Eunice, Feliciano
9.Encontro com Associação
Apalcof
10.Encontro com grupo focal
jovens
11. Encontro grupo focal jovens
Contubuel
AH, Feliciano, Cremilde, Eunice
Bafatá
Feliciano, Silvino, Fátima
Bambadinca
AH, Fernando, Feliciano
12.Encontro com grupo focal
velhos
13. Encontro com Régulos
Bafatá
AH, Feliciano
Bafatá
Fernando, Silvino
14. Encontro com responsável de
centro de saúde
15.Encontro com Governador,
Director da Polícia, Secretário
Regional
16.Encontro Bispo de Bafatá
17.Encontro com Administrador
18. Encontro com representante de
régulo
Bambadinca
AH, Feliciano
Bafatá
Eunice, Cremilde e Fátima
Bafatá
Bambadinca
Bambadinca
Feliciano, Fernando, Silvino
AH, Silvino, Fernando, Feliciano
Fernando e Silvino
Bafatá
AH, Cremilde, Feliciano
Bambadinca
Fátima, Eunice e Cremilde
Bafatá
Eunice e Cremilde
Contubuel
AH, Feliciano, Cremilde e Fátima
Bafatá
AH, Feliciano, Fátima, Silvino, Cremilde,
Eunice, Fernando
AH, Feliciano, Fernando, Cremilde, Silvino,
Fátima, Eunice
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Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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19.Encontro com missão católica
20.Encontro com responsável
SRLS
21.Encontro com responsável de
saúde da região
Contubuel
Bafatá
22.Encontro com director de
hospital de Bafatá
23.Entrevista na rádio Comunitária
Bafatá
1. Encontro com Governador
2.encontro com grupo de mulheres
vendedeiras de peixe
3.Encontro com Administrador
4.Encontro com a Aldeia SOS
5.Encontro com grupo focal
mulheres
6.Encontro com a associação
Profissionais de sexo
7.Encontro com régulo
8.Encontro com a associação de
produtoras de Horticultura
9.entrevista da rádio Uller u Band
10.Entrevista na rádio comunitária
11.Encontro com rede de
associações CONGAI
12.Encontro com responsável de
SNLS
13.Encontro com responsável de
saúde
14.encontro com grupo focal
mulheres
15.Encontro com grupo focal
jovens
16.Encontro com Projecto de
Saúde de Bandim
17.Encontro com a missão
Católica
18.Encontro com Régulo
19.encontro com Administrador de
Bula
20.Encontro com grupo focal
jovens
21.Encontro com responsável de
centro de saúde
22.Encontro com missão católica
Bafatá
AH, Cremilde e Eunice
AH, Silvino, Fernando, Eunice, Fátima e
Cremilde
AH, Fernando, Cremilde, Silvino, Fátima,
Eunice
Fernando e Silvino
Bafatá
AH
REGIÃO DE CACHÉU
Cachéu
Eunice, Fernando e Silvino
Cachéu
Eunice, Fernando, silvino
Canchungo
Canchungo
Fernando e Silvino
Fernando, Feliciano, Fátima
Canchungo
Eunice, Fátima, Cremilde
Canchungo
Eunice, Fátima, Silvino e Fernando
Canchungo
Canchungo
Fernando e Silvino
Eunice, Fátima e Cremilde
Canchungo
Canchungo
Silvino
AH
Fernando, Feliciano e Silvino
Canchungo
Fernando e Silvino
Caió
AH e Cremilde
Caió
Eunice e Fátima
Caio
Eunice, Feliciano, Fátima
Caió
AH, Feliciano, Eunice, Fátima e Cremilde
Caió
AH, Fátima, Eunice Cremilde e Feliciano
Caió
Bula
AH e Feliciano
Fernando e Silvino
Bula
Eunice, Fernando, Silvino, Fátima
Bula
AH e Feliciano
Bula
AH, Feliciano, Silvino, Fernando
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Anexo IV - Lista de pessoas encontradas para os estudos de caso
Nome
1. Sonia Polónio
2. Magda Quetá
3. Alberto Sanca
4. Nelson Carlos de Medina
5. Dra. Isabel Johanning
6. Mamadu Baldé
7.Carlos Adulai Djaló
8. Alficene Djaló
9. Mamadu Cissé
10. Dr. Nicolau Almeida
11. Aladge Embaló
12. Joaquin Sanhá
13. Carlos Manuel Lucas Pereira
Organização
UNICEF
SNLS
Conselheiro Regional do SRLS Cachéu
Director da Aldeia SOS GB
Casa Emanuel
CIDA Alternag
Governador da região de Bafatá
Administrador do Sector de Bafatá
Régulo de Bafatá
Conselheiro regional doo SRLS Bafatá
Coordenador Interino da Plan GB Bafatá
Coordenador para a Área Saúde Plan GB
Director Regional adjunto de Saúde de Bafatá
14. Dr. Domingos Soares
15. Amadú Keita
16.Filomeno Barbosa
17. Amadu Uri Canté
18. Saad Baldé
19.Tombom Seidi
20. António Nassalu
21. Adja Djenabu Baldé
22. Maria Jilvanda dos Santos
23. Bernardo António Sanca
24. Kiaké Djatá
Delegado Regional de Saúde
Chefe de Tabanca Bafatá
Secretário Executivo Aprodel
ONG Guiarroz. Responsavel Produção
ONG Guiarroz. Alfabetização adulto
ONG Guiarroz. Conselheiro
APALCOF. Coordenador de Programa
APALCOF. Presidente da Associação
Irmã Missionária Contubuel
Assessor do Rirector Regional de Educação
Enfermeiro Responsavel do Centro de Saúde de
Bambadinca
Administrador do Sector de Bambadinca
Representante do Régulo Badora
Animador Comunitário. Associação AFAS
Animador AGUIBEF. Bambadinca
CRJ. Presidente
Membro CRJ
Administrador do Sector de Canchungo
Associação de Mulheres Horticultoras de
Canchungo
Radio Uler Abaand. Director
Rádio Babook.Director
CONGAI. Presidente
Secretário Executivo
AMIC. Presidente
Associação Professional de Sexo. Canchungo
SOS Canchungo. Director
Técnico Laboratório Projecto de Saúde de Bandim.
Caió
Enfermeiro Responsável do Centro Saúde. Caió
Missionária do Espírito Santo. Caió
Missionária do espírito Santo. Caió
Régulo de Caió
Homem Grande de tabanca. Caió
25. Aliu Buaró
26. Caba Sanhá
27. Malam Fati
28. Djai Seidi
29. Lassana Corubus
30. Djai Seidi
31. Raimundo Vicente Gomes
32. Avelina Sanca
33.Humberto Tavares
34. Armando Gomes
35. Dulcineia Pereira
36. Augusto Mango
37. Palmira Amelia Cabral
38. Linda Cabato
39. Demba Baldé
40. Joaquim da Silva
41. Augusto Lopes
42. Irmã Margarida
43. Irmã Paula
44. Régulo Quintino
45. Luís Gomes
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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46. Roberto Honorio Tamba
47. José Vaz
48. Irmã Elda
49. Irmã Helena
50. Dom Pedro Zilli
51. Celine Marques
52. Serifo Embaló
53. Jecelino
Secretyário de Estado de Sector de Bula
Enfermeiro Responsável do Centro de Saú de Bula
Missionária da Missão Católica de Bula
Missionária da Missão Católica de Bula
Bispo de Bafaté
Voluntária da diocese de Bafatá
Coordenador Casa das Mães. Bafatá
Sida Service
Elementos para uma Estrategia Nacional de Proteccao Social
Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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Anexo V - Inquiridores para os estudos de caso
NOME
Silvino N´Dafa Braba
Eunice Moreira
Instituição
Instituto de Mulher e Criança
Instituto de Mulher e Criança
Filiciano Mendes
Fernanado M. Tchuda
Maria de Fátima Bolama
Ministério da Solidariedade Social,
Familia e Luta contra a Pobreza
MSSFLP
MSSFLP
Cremilde Correia
MSSFLP
Função
Assessor para a Área Social
Secretaria Executiva para Assuntos
da Mulher
Director de Servuços de Estudos e
planificação
Director de Serviços de Protecção
Chefe de Departamento de
Atendimento e Registo de Utentes
Chefe de Departamento de Apoio a
Familia
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Para Orfaos e Criancas Vulneraveis
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