Abordagem do Doente com Tinnitus em Cuidados
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Abordagem do Doente com Tinnitus em Cuidados
Ana Moreira Ana Moreira UCSP Vila do Bispo Pólo Sagres Introdução Motivo frequente de recurso aos Cuidados de Saúde Primários. Tinnitus = Acufeno = Zumbido Definição • Perceção indesejada de um som de origem interna na ausência de um estímulo acústico externo. Prevalência mais elevada nos indivíduos do sexo masculino 16.2% [40 - 69 anos] - Reino Unido McCormack A, Edmondson-Jones M, Fortnum H, Dawes P, Middleton H, Munro K, et al. The prevalence of tinnitus and the relationship with neuroticism in a middle-aged UK population. J Psychosom Res. 2014 25.3% [20 - 69 anos] - EUA Pico de incidência entre os 60 e os 69 anos de idade (14,3%) Shargorodsky J., Curhan GC, Farwell WR. Prevalence and characteristics of tinnitus among US adults. Am J Med. 2010 Classificação Descrição Campainha Gradual Sino Abrupto Tinnitus Subjetivo Zumbido Grilo - O mais frequente - Audível apenas pelo doente - Geralmente contínuo Unilateral Assobio Bilateral Apito - Raro (<1%) Rugido Chilreio Contínuo Clique Intermitente Outros Pulsátil Tinnitus Objetivo - Audível pelo doente e examinador - Geralmente vibratório ou pulsátil Etiologia Diminuição da tolerância Multifactorial / Idiopático Resposta do SNC à entrada insuficiente/anormal da informação no ouvido. Comparável ao “phantom limb syndrome“ Fatores individuais Exacerbação do tinnitus da personalidade Não existe evidência que os transtornos do humor provocam tinnitus. Ansiedade Depressão A crença de que o tinnitus é apenas psicossomático é uma ideia atualmente considerada obsoleta. A apreciação da resposta subjetiva ao tinnitus pode ajudar a estabelecer uma aliança terapêutica, reforçar a relação médicodoente e servir de suporte na educação e no tratamento. YEW KS, Diagnostic Approach to Patients with Tinnitus. Am Fam Physician. 2014 Etiologia Tinnitus Subjetivo Otológica Hipoacusia de Perceção: Presbiacusia, exposição ocupacional ao ruído, síndrome de Menière, neurinoma do acústico Hipoacusia de Transmissão: Otosclerose, colesteatoma, tampão de cerúmen, otite média ( aguda/ serosa / crónica) Toxicológica Medicação ou abuso de substâncias Somática Disfunção da articulação temporomandibular (ATM), traumatismos cervical ou cranioencefálico Neurológica Esclerose múltipla, hipotensão intracraniana espontânea (cefaleia posicional diária ou cluster), hipertensão intracraniana idiopática, enxaqueca vestibular Infecciosa Virais, bacterianas, fúngicas (otite media, doença de Lyme, meningite ou sifilis) Traumática Remoção de cerúmen Metabólica Dislipidemia, diabetes mellitus, défice de vitamina B12, hipotiroidismo, hipertiroidismo Tinnitus Objetivo Vascular Malformações arteriovenosas, aterosclerose, estenose ou dissecção carotídea Otológica Disfunção da trompa de Eustáquio Débito cardíaco elevado Anemia, hipertiroidismo Hipertensão arterial, bulbo jugular proeminente, hipertensão intracraniana benigna Tumores vasculares (Paragangliomas - Glomus timpânico, jugular ou carotídeo) Doença de Paget Neurológica Mioclonias palatinas ou do músculo do estribo (Esclerose M. ou neuropatia) Espasmos idiopáticos do musculo tensor do tímpano e do músculo estapédio Etiologia Ototoxidade Minimizar o risco iatrogénico • > 130 fármacos identificados Evitar utilizar mais de um fármaco potencialmente ototóxico concomitantemente. • Doses elevadas Limitar a dose e duração do tratamento sobretudo na presença de outros fatores de risco. • Insuficiência Renal ou Hepática Fármacos ototóxicos Anti-inflamatórios Aspirina, AINES, Sulfassalazina Diuréticos de ansa Todos (furosemida) Antineoplásicos Alcalóides Vinca, etoposido, inibidores da proteína quinase , derivados de platina Anestésicos locais Lidocaína, bupivacaína Anti maláricos Sais de quinina e cloroquina Agentes tópicos Preparações tópicas com fármacos ototóxicos Antibióticos Aminoglucosídeos: gentamicina* Macrólidos: eritromicina e claritromicina Tetraciclinas: doxiciclina, minociclina Vancomicina Outros: imipenem/cilastatina, linezolid , sulfonamidas, quinolonas, voriconazol, anfotericina B, ganciclovir , ribavirina Miscelânea Antiarrítmicos, anticonvulsivantes, anti-hipertensivos, fármacos antiulcerosos, hormonas, drogas psicotrópicas, atorvastatina, bupropiom, risedronato, vareniclina, metais pesados (mercúrio, chumbo) * Tinnitus e hipoacusia permanente associada a lesão vestibular Abordagem diagnóstica Anamnese História clínica + Exame objetivo • Início, localização , padrão , descrição qualitativa • Sintomas associados • • Cefaleia, hipoacusia, intolerância ao ruído, otalgia, vertigem, dor na ATM, cervicalgia Fatores desencadeantes • Exposição crónica ao ruído, otite média, traumatismo acústico , cervical ou TCE , tratamento odontológico ou exposição a fármacos ototóxicos • Fatores de alívio • Comorbilidades • História familiar • Impacto na vida diária • Interferência com as atividades, sono, trabalho, lazer, estado de humor. Abordagem diagnóstica Exame objetivo Controlo da tensão arterial Fundoscopia Palpação e mobilização passiva do pescoço Auscultação do pescoço, área periauricular, temporal, orbital e as mastóides Após compressão da veia jugular interna (tinnitus pulsátil) Exame da orofaringe e cavidade oral Otoscopia Acuometria instrumental (Teste de Weber e Rinne) Exame neurológico Abordagem diagnóstica ECD Hemograma completo TSH, T4 e/ou T3 Glicemia Serologia para Sífilis e doença de Lyme (hipoacusia de perceção unilateral ) Vitamina B12 Audiometria tonal liminar – avaliar a capacidade auditiva Timpanometria – avaliar a integridade do sistema de transmissão no ouvido médio (disfunção da trompa de Eustáquio) Referenciação a Cuidados Secundários Tinnitus objetivo Tinnitus subjetivo Unilateral associado a hipoacusia de perceção (Neurinoma do acústico ou Doença de Menière) Bilateral associado a hipoacusia de perceção (Hipoacusia induzida por exposição ocupacional ao ruido) Associado a hipoacusia de transmissão, se uma causa tratável não pode ser identificada e abordada em Cuidados Primários. Otosclerose unil ou bilateral, Colesteatoma, Otite média serosa ou Otite média crónica. Secundário a traumatismo cervical ou TCE. Suspeita de doença NRL ou aumento da pressão intracraniana. De causa desconhecida, não associado a hipoacusia ou associado a hipoacusia de perceção e de transmissão Quando causa desconforto ou interfere significativamente na vida diária apesar da abordagem em Cuidados Primários. NICE Clinical Knowledge Summaries - Tinnitus, 2010 Abordagem em Cuidados Primários Devem ser geridos em Cuidados Primários os casos de tinnitus subjectivo após realização de audiograma associado a: Hipoacusia de transmissão quando existe uma causa que pode ser identificada e tratada em Cuidados Primários Presença de cerúmen ou Otite média Hipoacusia de perceção quando podem ser diagnosticadas com confiança: Hipoacusia induzida pelo ruído sem relação ocupacional Presbiacusia NICE Clinical Knowledge Summaries - Tinnitus, 2010 Abordagem Terapêutica Não existe nenhum tratamento curativo específico. O objectivo é reduzir a intensidade, a percepção e o impacto desfavorável que tem na QoL. Prevenção Tratamento das causas identificadas e problemas associados Terapêutica farmacológica Terapias comportamentais Terapias complementares Prevenção Deve se evitar-se a exposição significativa ao ruído para prevenir as lesões auditivas e a exacerbação do tinnitus. Folmer RL, Martin WH, Shi Y. Tinnitus: questions to reveal the cause, answers to provide relief. J Fam Pract. 2004 Abordagem farmacológica Nenhum dos vários fármacos estudados demonstrou eficácia. Hoekstra CE, Rynja SP, van Zanten GA, Rovers MM. Anticonvulsants for tinnitus. Cochrane Database Syst Rev 2011; :CD007960. Abordagem Terapêutica Terapias complementares Terapia do som - “Sound Therapy” • Enriquecer o ambiente sonoro do paciente para facilitar o processo de habituação e reduzir o desconforto do tinnitus em ambientes silenciosos. • Experimentar com diferentes sons para encontrar o som que reduz a perceção do tinnitus. • • Abrir uma janela para permitir a entrada de sons do ambiente exterior Ouvir sons gravados associados com relaxamento / sons da natureza • Atualmente as evidências são insuficientes para apoiar ou refutar o uso de opções de terapia de som de forma individual. • No entanto, é provável que a terapia do som combinada com a educação e o aconselhamento sejam de grande utilidade. Abordagem Terapêutica Terapias complementares Acupuntura Os últimos ensaios clínicos randomizados (ECR) e revisões sistemáticas publicados têm demonstrado a eficácia da acupuntura no tratamento do tinnitus. O número, tamanho e qualidade dos ECR não são suficientes para obter conclusões definitivas. São necessários mais ECR rigorosos que comprovem a sua eficácia no tratamento do tinnitus. Abordagem Terapêutica Terapias comportamentais Evidência de eficácia estabelecida Terapia cognitivo-comportamental Reduzir a resposta psicológica negativa ao sintoma • Moderate effect size • Level of Evidence: 1a Eficácia não demonstrada / Evidência insuficiente Técnicas de redução do stress e biofeedback Podem reduzir a intensidade do tinnitus “Tinnitus retraining therapy” - Aconselhamento (perceção subconsciente no córtex auditivo) + Reprodutores de som Pode oferecer um tratamento com boa relação custo-eficácia. Fukuda S, Miyashita T, Inamoto R, Mori N. "Tinnitus retraining therapy using portable music players". Auris Nasus Larynx, Volume 38, Issue 6, 692-696. 2011. Abordagem Terapêutica em Cuidados Primários Tratar a patologia subjacente e gerir os fatores associados. Tranquilizar o utente e explicar: O tinnitus é comum e tende a melhorar progressivamente na maioria das pessoas. O objetivo do tratamento é reduzir o impacto do tinnitus. Evitar aconselhamento negativo: "Não há nada que possa ser feito para o ajudar" ou “Terá que aprender a viver com…" Agrava os sentimentos do paciente em relação ao tinnitus e aumenta o impacto negativo no estado de humor. Recomendar a evicção da exposição e a protecção contra o ruido Aconselhar o uso da terapia do som para atingir a habituação neurofisiológica. Fornecer informação escrita sobre o tinnitus e sobre a disponibilidade dos recursos de apoio locais. Planificar o seguimento/acompanhamento para avaliar a resposta ao tratamento. NICE Clinical Knowledge Summaries - Tinnitus, 2010 Conclusão O primeiro passo na avaliação do zumbido é distinguir o tinnitus subjetivo do objetivo, e realizar a investigação etiológica, através da história clínica e exame físico para uma orientação diagnóstica adequada. A educação e o acompanhamento do utente em Cuidados Primários são fundamentais. As diversas medidas terapêuticas farmacológicas estudadas carecem de evidência robusta e consistente de benefício que justifique a sua utilização. Dada a escassez de evidencia para guiar a abordagem do tinnitus em cuidados primários, as recomendações baseiam-se quase totalmente na opinião de expertos e em consensos. As limitações nas possibilidades de referenciação dos doentes e de articulação com profissionais habilitados ao exercício das diversas terapias comportamentais condicionam o acesso a algumas das hipóteses terapêuticas com eficácia comprovada. Impõe-se a necessidade de mais ensaios clínicos randomizados rigorosos que avaliem a eficácia das possibilidades terapêuticas e que permitam aferir conclusões que possam ter um impacto positivo na qualidade de vida dos utentes. Bibliografia Crummer R W, Hassan GA. American Academy of Family Phisicians. Diagnostic Approach to Tinnitus. Am Fam Physician. 2004 Jan 1;69(1):120-126. Jan 2014. http://www.aafp.org/afp/2004/0101/p120.pdf British Tinnitus Association. Anual Review 2013. Disponível em: http://www.tinnitus.org.uk/facts-and-figures Costa RC, Dorado AJC, Perez CC, Fisterra - “Guía clínica de acúfenos”. http://www.fisterra.com/guias-clinicas/acufenos/ McCormack A, Edmondson-Jones M, Fortnum H, Dawes P, Middleton H, Munro KJ, et al. The prevalence of tinnitus and the relationship with neuroticism in a middle-aged UK population. J Psychosom Res. 2014 Jan;76(1):56-60. http://eprints.nottingham.ac.uk/2556/2/1-s2.0-S0022399913003358-main.pdf Shargorodsky J, Curhan GC, Farwell WR. Prevalence and characteristics of tinnitus among US adults. 2Am J Med. 2010 Aug;123(8):711-8. http://www.neurological.org.nz/sites/default/files/Prevalence%20and%20Characteristics%20of%20Tinnitus%20among%20US%20Adults,%20Shargorodsky%20et%20al%20(2010).pdf Fioretti A, Eibenstein A, Fusetti M. New trends in tinnitus management. Open Neurol J. 2011;5:12-7. Hoare DJ, Kowalkowski VL, Kang S, Hall DA. Systematic review and meta-analyses of randomized controlled trials examining tinnitus management. Laryngoscope 2011; 121:1555. Dinces E. Deschler D, Lin F. Etiology and diagnosis of tinnitus. Uptodate. 2013. NICE Clinical Knowledge Summaries - Tinnitus, 2010. Savage J, Waddell A. Tinnitus. Clin Evid (Online), 2012. Folmer RL, Martin WH, Shi Y. Tinnitus: questions to reveal the cause, answers to provide relief. J Fam Pract. 2004 Yew S. American Academy of Family Phisicians. Diagnostic Approach to Patients with Tinnitus. 2014 Chan Y. 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