a criminologia crítica como alternativa à ideologia da

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a criminologia crítica como alternativa à ideologia da
A NECESSIDADE DE SUPERAÇÃO DO PARADIGMA
CRIMINOLÓGICO TRADICIONAL: A CRIMINOLOGIA CRÍTICA
COMO ALTERNATIVA À IDEOLOGIA DA “LEI E ORDEM”
THE NECESSITY OF OVERCOMING OF THE TRADITIONAL
CRIMINOLOGICAL PARADIGM: THE CRITICAL CRIMINOLOGY
AS ALTERNATIVE TO THE IDEOLOGY OF THE “LAW AND
ORDER”
Homero Bezerra Ribeiro
RESUMO
Esta pesquisa tem como objetivo precípuo analisar a importância das teorias criminológicas
críticas para a ruptura com o paradigma tradicional do crime, o qual tem como base a
investigação do fenômeno criminal a partir dos fatores determinantes que levam um indivíduo
a cometer um delito. Para isto, faz-se uma breve análise do contexto que levou ao
aparecimento do pensamento criminológico positivista, principal vertente do paradigma
tradicional, bem como de suas principais idéias. Após, aponta a ruptura do pensamento
tradicional e o aparecimento de um novo paradigma para a criminologia, onde confluem,
dentre outras, as teorias criminológicas críticas. Por fim, destaca a importância dessas teorias
críticas na mudança do pensamento criminológico e na construção de um novo modelo de
sistema penal, mais engajado com as questões sociais e a transformação das instituições
punitivas, ainda fortemente caracterizadas pela ideologia da “lei e ordem”, adepta do
positivismo.
PALAVRAS-CHAVE: CRIMINOLOGIA CRÍTICA. CRIMINALIZACÃO. SISTEMA
PENAL. POLÍTICA CRIMINAL.
ABSTRACT
This research aims to analyze the importance of the critical criminological theories to the
rupture with the traditional paradigm of crime, which has as base the investigation of the
criminal phenomenon from determinant factors that manage a person to commit a fault.
Before this, it makes a brief analysis of the context that takes the appearance of the positivist
criminological thought, main theory of the traditional paradigm, as well as its main ideas.
After, it points towards the rupture of traditional thought and the emergence of a new
paradigm to the criminology, where converge, among others, the critical criminological
theories. At least, detach the importance of these critical theories on changing of the
criminological thought and on the transformation of the punitive institutions, which are still
strongly characterized to the “law and order” ideology, follower of the positivism.
KEYWORDS: CRITICAL CRIMINOLOGY. CRIMINALIZATION. PENAL SYSTEM.
CRIMINAL POLITIC.
1 INTRODUÇÃO
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
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Este artigo inicialmente passa a compreender as teorias tradicionais da criminologia,
suas análises sobre o fenômeno criminal e seus fundamentos. Dentre essas teorias, destaca-se
a escola positivista por seu alto grau de influência com o atual contexto do pensamento
criminológico brasileiro e com as estruturas das instituições penais.
As teorias tradicionais da criminologia, em especial a positivista, têm como objeto
principal a análise do fenômeno criminal a partir da perspectiva etiológica, ou seja, com base
nos fatores determinantes para que tal indivíduo cometesse uma infração penal. Essas escolas
também têm como ponto de confluência a característica ontológica do fenômeno criminal,
isto é, não dependente de outros fatores histórico-sociais.
Após, estuda-se a transformação do paradigma etiológico do crime para o paradigma
da reação social, que resultou na ruptura com o modelo básico da criminologia tradicional, e o
surgimento das novas teorias criminológicas. A partir dessas premissas, inicia-se a análise dos
principais fundamentos das teorias criminológicas críticas, situando-as dentro desse contexto
de ruptura gnosiológica.
As teorias críticas, apesar de possuírem premissas básicas em comum, não
representam um pensamento homogêneo. Assim, analisam-se somente os principais
fundamentos que abarcam as diversas teorias, suas diferenciações com as outras ciências
criminológicas quanto ao objeto e método de estudo, além da relação de compromisso dos
seus autores com a transformação social. Não serão abarcadas, pela limitação temática, as
principais divergências entre as teorias críticas de forma interna.
Por fim, faz-se uma confrontação entre a doutrina positivista, relacionada à
manutenção de um aparato punitivo para controle das classes sociais hegemonicamente
inferiores e as escolas críticas da criminologia, identificadas com a transformação social e
com a mudança das instâncias penais.
Considera-se, neste trabalho, como sistema penal não somente as instituições
competentes para produzir a legislação penal, perseguir e condenar o criminoso e executar a
penalidade, mas também as práticas e instituições sociais responsáveis pelo controle social do
crime, como a família, a escola, o trabalho etc.1
2 A ESCOLA POSITIVISTA
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No final do século XIX, com o fortalecimento da classe burguesa no poder, os ideais
libertários e humanistas do século das luzes se tornaram um empecilho à consolidação do
poder político, à conquista e à dominação de outros mercados econômicos. A segurança nas
relações jurídicas era mais importante neste momento para objetivos econômicos burgueses
do que as idéias de liberdade, igualdade e fraternidade estabelecidas pela revolução francesa.
Agora era necessário pôr ordem no caos da revolução burguesa, seguido da instalação
de um forte poder unificado 2. A metafísica revolucionária de cunho igualitário do iluminismo,
onde todos os homens eram iguais por natureza, não tinha mais fundamento.
Surgiu então uma filosofia de cunho naturalista e determinista, baseada no método
experimental, no cientificismo e na neutralidade do pesquisador, denominada de positivismo.
Essa corrente filosófica, intimamente ligada aos ideais burgueses do séc. XIX, conformava as
ciências sociais ao desenvolvimento das forças produtivas do capitalismo através do método
experimental utilizado nas ciências naturais, como a matemática, física e biologia.
De acordo com os principais representantes das idéias positivistas, a sociedade era
uma entidade autônoma e orgânica, assim como um sistema biológico. Desta maneira, seria
necessária a manutenção da ordem orgânica para regular o organismo social e gerar
progresso, retirando os elementos sociais “anormais” que causasse qualquer tipo de distúrbio.
O pacto consensual entre os cidadãos não era mais baseado na ética utilitarista dos
iluministas, mas sim num verdadeiro “instinto social” para manter a ordem e garantir o
progresso3.
Para a escola positivista, o indivíduo não deveria ser isolado da totalidade natural e
social que determina os seus comportamentos. O criminoso não é o indivíduo que, por sua
livre vontade, viola o pacto social, mas sim porque foi determinado, através de um conjunto
de fatores “anormais”, a violar a ordem.
Para os defensores do positivismo, a criminologia deveria se preocupar com as
determinantes que influenciaram o comportamento do transgressor. Ou seja, era importante,
para a análise criminológica, auferir as causas do comportamento anormal do criminoso.
Ocorre, aqui, uma ruptura com o princípio da livre vontade defendido pela escola penal
clássica, no período iluminista. Para esta, todos os indivíduos poderiam ter a mesma
capacidade de delinqüir, isto é, de violar o pacto social previamente ordenado. Já os
positivistas acreditavam que existiam fatores que levavam a construção de um indivíduo
“potencialmente” criminoso.
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Por esta razão, a criminologia positivista negava a escola clássica iluminista como
uma vertente criminológica, já que o importante, para a ciência do crime, era o estudo das
causas e do comportamento do delinqüente através de um método experimental, e não a
análise do ato criminoso em si, assim como aduziam os pensadores clássicos.
O positivismo criminológico, influenciados por Comte e Darwin, não acreditava no
homem visto sob um ponto de vista metafísico, como um ser plenamente vinculado ao mundo
natural. Ainda mais, isso contribuiria para a desordem social de maneira progressiva 4.
Para este pensamento, o consenso social não deveria ser encarado como resultado da
livre associação dos indivíduos, como pensado pelos iluministas. Aqui o consenso está
vinculado graças à ação de leis sociais que se “operam além das possibilidades conscientes
dos sujeitos”5. Assim, havia uma ordem de valores morais inconscientes que garantiam a
coesão de toda sociedade.
O criminoso era justamente aquele que conseguia violar essa ordem natural de valores
de cada organização social. Cabia à tarefa criminológica, para os positivistas, analisar
justamente os elementos que determinaram a este criminoso o fim de violar o pacto.
O determinismo marcou profundamente o pensamento da escola penal positivista. Era
necessário explicar as causas do comportamento criminoso através de determinantes que
podiam ser de ordem social, psicológica ou biológica. As de ordem social estavam ligadas ao
contexto social em que o autor do delito estava inserido, como a pobreza, a “vadiagem”, a
“marginalidade” etc6; as psicológicas se referiam a algum distúrbio psiquiátrico do criminoso;
e as determinantes biológicas indicavam algum defeito psicossomático no corpo do indivíduo,
ou em alguma característica comum a outros delinqüentes.
A “normalidade” social seria constatada através da observação empírica, sendo que os
comportamentos desviantes seriam determinados por fatores defeituosos em relação à
normalidade social, independentes do indivíduo. Os defeitos poderiam apresentar-se através
da hereditariedade, de algum trauma na infância ou mesmo nas relações sociais que o
indivíduo estivesse inserido antes de transgredir a norma.
Nessa seara, observam-se hoje inúmeras notícias de crimes como roubos, furtos ou até
mesmo grandes chacinas onde se constata, de forma indireta, que os formadores da opinião
pública procuram encontrar os elementos que ocasionaram o crime através de
comportamentos “fora” dos padrões “normais” de uma classe economicamente dominante,
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por exemplo: a situação de miséria do indivíduo, o desajustamento familiar, o fato de
pertencer a um movimento reivindicatório 7, dentre outros.
Nessa perspectiva, um exemplo desse tipo de pensamento positivista:
Quem e como é, afinal, o assaltante de rua? Hoje o cidadão tem de aprimorar mais
uma triste habilidade – a de identificar assaltantes, transformando-se em verdadeira
cobaia. Ele se difere dos outros tipos de assaltantes, por agir via de regra nas ruas
urbanas. Vestem-se geralmente de modo a melhor disfarçar a estranha atividade que
exercem. Para melhor chegar a descrevê-los, seria necessário recorrer à orientação
de policiais. O marginal não se parece com nenhum de nós8.
Para Lyra Filho 9, o positivismo reduziu o comportamento humano a fenômenos
patológicos e psicológicos, enrijecendo o elenco de visões parciais sobre as causas do
comportamento criminoso. Ademais, poderia ainda adicionar o fenômeno social, sendo
colocado como um fator determinante da “anormalidade” de um indivíduo para o positivismo.
Delinqüência? É a tradução dum sentimento de culpa ou de complexo de
inferioridade, conforme a escola psicanalítica preferida (atrás disso, está a redução
do homem a mecanismos psicológicos, numa estrutura social não questionada, que
funciona como uma espécie de super-ego, extrapolando e imobilizando em
parâmetro); é, conforme a direção biológica adotada, o resultado de uma disfunção
endócrina, duma diencefalose criminógena, de aberrações de cromossomos (atrás
disso, está a redução mecanicista do homem aos dados de sua biologia, mais uma
vez tomado o crime como algo estável, para fazê-lo “corresponder” a um elemento
de estrutura e processo somáticos); é o produto de associação diferencial ou
inadaptação psico-social, manifestando uma espécie de anomia, conforme o gosto
dos formalismos sociológicos (atrás disso, está um relativismo, que, pelo avesso, é
conservador, pois esvazia o conceito de crime e não vê suas relações com os
conteúdos concretos de superação dialética das estruturas consideradas).10
De fato, os criminólogos positivistas buscavam na diversidade ou na anomalia dos
comportamentos delinqüentes a explicação do fenômeno criminal. Tudo aquilo que fosse
contrário à ordem social orgânica, ou seja, o fato delituoso, era explicado através de
determinismos causais.
A pena, de acordo com os positivistas, tinha como objetivo inicial a prevenção da
sociedade contra o individuo “anormal” responsável pela violação dos valores sociais. Assim,
o caráter preventista, ainda presente no direito penal hodierno, era uma característica básica
do positivismo. Não bastava que o direito penal servisse como um instrumento retribuição do
mal que o indivíduo fez à sociedade, mas que contribuísse para a não ocorrência de um delito
futuro. A prevenção dos atos criminosos consistia justamente na análise dos fatores realmente
determinantes para que o criminoso delinqüisse. O sistema penal deveria atua com eficiência
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justamente na repressão destes fatores e conter previamente os impulsos dos indivíduos
potencialmente criminosos para que a ordem orgânica não fosse abalada.
Outro objetivo precípuo para a pena residiria no tratamento do delinqüente, no intuito
de curá-lo da situação de anormalidade psico-social ou biológica que o afligia. Esta finalidade
terapêutica não necessariamente se reduz ao apelo médico, mas também na tentativa de incutir
determinados valores moralmente aceitos pela sociedade para “normalizar” o indivíduo
infrator.
A criminologia positivista não estava preocupada com a investigação das prescrições
trazidas pelo direito penal. Para os estudiosos dessa teoria, não se podia formular críticas à lei
penal, dado que esta estava pré-constituída à ciência criminológica. Além disso, o método
positivista deveria ser baseado apenas na investigação e análise dos dados empíricos, ou seja,
das causas do comportamento criminoso. O que viria além do empiricamente comprovado
não poderia ser interrogado, conforme afirma Aniyar de Castro:
Como o positivismo é o império do fato, da indução, das técnicas de pesquisa, do
mensurável, do que pode ser convalidado empiricamente, ele não se interroga além
da correlação causal; não se pergunta o porquê. Pois o porquê, para o positivismo,
não é válido interpretativamente, não é científico, a menos que se recorra ao fato, à
validação empírica, coisa que em ciências sociais não é viável de fazer.11
Ao defender a neutralidade do pesquisador e a necessidade de uma ciência
racionalmente objetiva, a criminologia positivista aposta na manutenção de uma ordem de
valores consagrados como imutáveis e responsáveis pela ordenação da sociedade. A essa
ordem natural do organismo social não se podia tecer qualquer tipo de crítica, pois não era
tarefa da criminologia, responsável apenas pela constatação de rupturas da ordem social.
Para o positivismo, o importante para a tarefa criminológica era observar qualquer
mudança que violasse essa ordem de coesão social e, conseqüentemente, os valores
essenciais. A realidade constatada, assim como a atuação da justiça criminal sobre tal conduta
não podia ser criticada, pois não era considerada científica a atuação valorativa do
pesquisador sobre o objeto cognoscível.
Nesta esteira, há uma confluência ideológica, tanto na escola clássica como na
positivista, quanto à atuação do sistema penal sobre a questão criminal. Como o crime
representa a violação de valores essências de uma determinada sociedade para as duas
correntes, o sistema penal seria o responsável pela defesa da sociedade diante do fato
criminal.
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Sem dúvidas, a escola clássica iniciou o estudo do crime, identificado através da
ruptura valorativa consensual da sociedade, mas foi na vertente positivista que tal ideologia
atingiu uma complexidade bem maior e influenciou consideravelmente a doutrina penal.
Costuma-se chamar estas soma de fatores presentes nas duas escolas de “ideologia da defesa
social”. Com isto, alguns princípios sobre o pensamento criminal estão estruturados
dogmaticamente nas duas escolas, sendo responsáveis pelas características mais essenciais e
influenciadoras destas vertentes criminológicas sobre a ideologia criminal e o sistema penal
como um todo.
O estudo da ideologia da defesa social permite entender a evolução do pensamento
tradicional e sua influência no aparato jurídico-penal hodierno. Além disso, representa o
ponto crucial para a proposta das escolas críticas, que rompem definitivamente com a
ideologia da defesa social e aderem a uma nova corrente paradigmática: a da reação social ao
crime.
No entanto, antes de adentrar no pensamento crítico, faz-se necessário uma análise
sobre os principais fundamentos da ideologia da defesa social e o momento ruptura deste
pensamento no meio criminológico.
2.1 A Ideologia da Defesa Social
Inicialmente, fará referência a estes princípios seguindo a classificação apontada por
Alessandro Baratta12, o qual afirma os seguintes fundamentos como norteadores da ideologia
da defesa social: a legitimidade, o “bem e o mal”, a culpabilidade, a finalidade, a igualdade e
o interesse social.
De acordo com o princípio da legitimidade, o Estado é legítimo para reprimir e
penalizar, por meio do sistema penal, as condutas que violassem os bens consensualmente
consagrados pelo pacto social. Desta maneira, os cidadãos conferiam ao Estado o direito de
punir somente quando alguém violasse a esfera individual de outro ser humano.
Não somente o Estado seria legítimo como também representaria o único meio a ser
responsável por este tipo de punição. Assim, não poderia haver, dentro do pacto social, outro
instrumento que pudesse se utilizar do poder coercitivo para punir um infrator nas normas
penais.
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A sociedade estabelecida representa o bem, o consenso, a ordem. Qualquer indivíduo
que ouse quebrar esta ordem está causando um mal a toda sociedade. O crime, portanto,
representa um elemento negativo ao sistema social estabelecido, o mal. Desta forma está
representado o princípio do bem e do mal. A grande maioria dos indivíduos age dentro do
consenso, restando apenas a uma pequena minoria a ser desviante do comportamento geral 13.
Este princípio está bem representado no sistema penal contemporâneo. Os crimes que
são selecionados na mídia diariamente representam sempre um aspecto negativo à ordem
social, à coletividade. Esta representação midiática conduz a sociedade à criação de uma
imagem do criminoso “tradicional”, diferente da maioria da população, que age conforme os
valores consensuais.
Já o princípio da culpabilidade estabelece que o delito é uma ação interior reprovável
por toda a sociedade, contaminando valores e normas estabelecidos consensualmente para o
convívio comum dos cidadãos. A culpabilidade representaria, então, o grau de
reprovabilidade social que a conduta representa para o agressor, “um juízo de reprovação
contra o autor de um ato, porque a todos compete agir de acordo com a norma, segundo o
dever jurídico, que tutela os interesses sociais”14.
O princípio da finalidade ou prevenção determina que a pena deve ter como intuito a
contramotivação criminal, tal seja, a prevenção contra acontecimentos futuros. De um lado, a
criminologia clássica propõe que a pena tenha como finalidade a mudança do comportamento
do autor do delito, enquanto a escola positivista acredita que a pena deve ter como escopo a
prevenção social e o tratamento do criminoso. As duas teorias acreditam, portanto, que a pena
deve estimular o indivíduo a não cometer futuros delitos.
Zaffaroni afirma que a defesa social não pode ser a defesa dos bens que já foram
afetados pelo ato criminoso, mas sim a “defesa dos bens que podem ser afetados no futuro”15.
Desta maneira, a defesa não é senão a prevenção tutelar dos bens essenciais ao convívio
social.
Assim, nota-se a preocupação da criminologia tradicional com a manutenção de uma
ordenação do convívio social através da punição do infrator. Isto representa o caráter
conservador desta ideologia no tratamento dado ao crime como fenômeno culpável por toda
sociedade. Isso demonstra intenção destas escolas de preservar um status social anterior ao
momento de realização do ato criminoso, de forma a manter a sociedade ordenada.
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Quanto ao princípio da igualdade, a lei penal seria igual para todos. Ou seja, os
indivíduos podem estar sujeitos à sua aplicação de modo eqüitativo, desde que violem os bens
juridicamente tutelados pelo direito penal. O sistema penal deverá agir contra todos que
cometam delitos, ou seja, que violem o consenso geral, ou a ordem orgânica da sociedade. O
aparelho punitivo estatal, portanto, não seleciona quais crimes deverão ser punidos, porquanto
age de maneira universal.
Por fim, o princípio do interesse social ou do delito natural afirma que os tipos penais
tutelam majoritariamente os valores considerados essenciais de uma sociedade. Desta forma,
o delito representa uma ofensa a estes valores e, conseqüentemente, ao bem-estar de todo
convívio social. A privação de bens jurídicos do criminoso deve ter como finalidade precípua
a garantia dos bens jurídicos da coletividade 16.
Assim, ao afirmar que a compreensão destes princípios legitimadores do poder de
punir estatal é de essencial importância para construir a crítica sobre o sistema penal. A
influência simbólica da ideologia da defesa social ainda permanece implicitamente nos
responsáveis pela persecução, julgamento e execução do crime e do criminoso. Sua aceitação
acrítica revela-se como uma importante característica legitimadora do poder de punir estatal,
mistificando o papel dos aparelhos de coerção e persecução penal 17.
Essa mística igualitária e universal do direito penal será detalhadamente analisada nos
tópicos posteriores. Por ora, basta detectar que tal denominação define uma característica
importante do sistema criminal: a sua função real; em contraponto à sua função virtual, ou
aparente. Assim, a mística compreenderia justamente o encobrimento da finalidade real do
sistema penal pela sua finalidade aparente, que se dissolveria por todo meio social e pelos
órgãos oficiais do controle social.
Como exemplo, boa parte dos doutrinadores hoje considera o crime como uma
violação dos bens essenciais à vida em comunidade, sendo o direito penal o instrumento
tutelador destes bens, agindo de modo igualitário contra todos os indivíduos que ameacem a
sobrevivência destes bens. Bittencourt acredita que o Direito Penal apresenta caráter finalista
e preventista: A última característica seria relacionada à punição do infrator, que teria o
escopo de prevenir o autor de não realizar o ato antijurídico novamente, assim como toda
sociedade; já a primeira estaria ligada à proteção dos bens jurídicos fundamentais como
garantia de sobrevivência à ordem jurídica comum18.
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3 A MUDANÇA DE PARADIGMA DA CRIMINOLOGIA – DO PARADIGMA
ETIOLÓGICO AO PARADIGMA DO CONTROLE SOCIAL
O estudo deste tema é importante para compreender o momento de ruptura do
paradigma tradicional do estudo criminológico e as inovações trazidas pelo paradigma do
controle social nas ciências do crime. A evolução do pensamento criminológico com base na
reação social representará um marco importante para a fundamentação das teorias críticas da
criminologia.
Este paradigma começou a ser construído após a segunda guerra mundial, a partir do
afloramento da guerra fria, onde as potências dos EUA e da URSS disputavam econômica e
ideologicamente, da guerra do Vietnã e do movimento contracultural encabeçado na Europa
no final da década de 60.
Antes, a ideologia da defesa social estava intimamente ligada ao paradigma etiológico,
ou do estudo do crime a partir das causas da criminalidade, contaminada pelo pensamento
positivista. O pensamento liberal da burguesia dependia da segurança nas relações jurídicas
para o desenvolvimento econômico. O progresso econômico burguês dependia de uma ordem
social voltada para a manutenção dos privilégios econômicos de uma pequena classe, em
detrimento da maioria miserável.
As mudanças sociais após a metade do século XX trouxeram consigo o aparecimento
de uma nova forma de analisar o fenômeno criminal. No entanto, tal postura não foi
completamente seguida pelas instituições do sistema penal, bem como para o pensamento
hodierno criminal, que ainda continua majoritariamente a cultuar idéias advindas da ideologia
da defesa social.
Isso é demonstrado, por exemplo, quando o Estado, representado pela convenção
social, ainda é encarado como o único meio legítimo para punição do indivíduo, não
escolhendo, dentre os criminosos, quais serão punidos ou não. Desta forma, não é objeto de
estudo da criminologia moderna (ainda ligada à forma tradicional) a formulação legislativa
das condutas delituosas, já que o código penal seria pré-constituído à realidade de
investigação do comportamento criminal.
A ruptura gnosiológica da criminologia passou a questionar a postura universal do
crime. Ou seja, os estudiosos da criminologia começaram a descobrir que boa parte dos
crimes cometidos na sociedade não se tornava objeto de persecução penal pelo Estado. Eles
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passaram, desde então, a analisar a seleção dos comportamentos definidos como crime e dos
sujeitos criminosos pelo sistema penal.
O novo paradigma, chamado de reação social acaba definindo que o crime não é
formulado no consenso social, ou seja, pré-constituído, mas que as relações sociais históricas
são responsáveis pela construção do conceito de delito.
Desta maneira, os criminólogos deste novo paradigma passaram conceber a reação
social ao crime como constituinte do fenômeno criminal. O crime perde o seu caráter estático
e convencional e passa a tomar fundamentos histórico-sociais. A partir deste momento, surge
o paradigma usualmente conhecido como da criminologia da “reação social”, ou do estudo
das instâncias “selecionadoras” do comportamento criminal.
Baratta assim analisa a ruptura do pensamento tradicional:
[...] quando não o consideramos (o direito penal) como um simples ponto de partida,
uma entidade natural para explicar, mas como uma realidade social que não se
coloca como pré-constituída à experiência cognoscitiva e prática, mas é construída
dentro da experiência, mediante os processos de interação que a caracterizam.
Portanto, esta realidade deve, antes de tudo, ser compreendida criticamente em sua
construção.19
A criminologia da reação social, na contramão da ideologia da defesa social, passa a
apreciar os processos de definição e execução das normas penais, relacionando-os com as
diferenças de força e de poder existentes na sociedade. Em outras palavras, o direito penal não
é constituído no consenso geral de cidadãos em igual posição na sociedade, mas fruto de uma
disputa de poder para o controle social dos comportamentos danosos.
Definem então, os defensores do novo paradigma, a existência de uma parcela da
população que detém o poder de definição dos comportamentos delituosos e,
conseqüentemente, de etiquetação dos indivíduos potencialmente causadores do delito.
O direito penal apresenta-se agora fragmentário, e não universal como defendiam os
tradicionalistas, pois as instâncias de apuração e execução do crime apenas selecionam uma
parte dos delitos cometidos pela sociedade, deixando de fora aqueles que não interessavam ser
investigados ou condenados.
Surge então um intenso estudo baseado nas chamadas “cifras negras”, ou seja,
comportamentos criminais não investigados pelo aparelho Estatal. Elas apontavam para uma
realidade diferente da pensada pelos positivistas: a seletividade é mais importante para o
direito penal do que a universalidade. Assevera-se que a quantidade de crimes cometidos pela
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sociedade é bem maior do que a registrada, ou até mesmo a estimada, pelos órgãos oficiais de
persecução criminal.
O estudo das “cifras negras” se tornou importante para a crítica do princípio da
igualdade e do “bem e do mal”, defendidos pelas ideologias tradicionais. O delito não era
apenas cometido por uma pequena minoria, mas pela maioria da sociedade, sendo que o
sistema penal apenas selecionava a parte que lhe interessava do fenômeno criminal.
Os criminólogos tradicionais costumam abordar o fenômeno criminal através de
perguntas do tipo: “quem é o criminoso?”; “como se torna desviante?”; “em quais condições
um condenado se torna reincidente?”. Ao contrário, os criminólogos da reação social
costumam se perguntar: “Quais são os sujeitos definidos como delinqüentes?”; “Quais
sujeitos podem definir outros como criminosos?”; “Quem define quem?” 20.
As várias vertentes que usam o paradigma da reação social compreendem alguns
pontos de partida em comum, como se observou acima, entretanto apresentam diversas
sínteses conclusivas sobre o fenômeno criminal. Dentre as principais correntes do paradigma
da reação social destaca-se a escola do labelling aproach, a conflituísta e as vertentes críticas.
Quanto as primeiras, analisará somente algumas de suas premissas básicas, centrando-se nos
principais temas que as diferenciam da criminologia crítica.
Para os representantes do labelling aproach, ou interacionalismo, o crime é uma
qualidade atribuída a um comportamento mediante um processo de interação entre o sujeito
autor de uma conduta e a sociedade. O Labelling Aproach também é chamado de teoria da
etiquetação, ou sociologia do desajuste, por acreditar que as instâncias de poder definem, ou
rotulam, quais os comportamentos devem ter uma qualidade de criminosa.
Os interacionalistas, no entanto, com uma marcada tendência psicossocial,
contemplaram mais os efeitos do etiquetamento sobre os indivíduos do que nas características
de quem formulou a etiqueta. Assim, com base na afirmação de Anyiar de Castro: “o
principal efeito da rotulação seria o de induzir a novos atos desviantes e/ou delitivos, apesar
da sua grande referência à reação social, esta teoria continua fortemente vinculada à
criminologia do Passar à Ação”21.
Assim, apesar de compreender a criminalidade como um fenômeno obtido através de
um processo de seleção dos comportamentos delituosos por parte de quem detém o poder, o
labelling
aproach
não
consegue apresentar respostas fundamentadas de porque,
historicamente, tal fenômeno acontece na sociedade. A seletividade de determinados
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comportamentos pelo direito penal seria determinada simplesmente pelo fato de alguns
segmentos sociais deterem tal poder, e não por características estruturais objetivas. Assim,
para as escolas críticas, a sociologia do desajuste seria uma teoria limitada, pois não
compreende que as relações histórico-materiais, de certa forma, influenciam a produção social
do crime.
Desta forma aduz Cirino dos Santos:
A teoria da sociologia do desajuste é politicamente limitada e historicamente
confusa: não compreende a estrutura das classes e da sociedade, não identifica as
relações de poder político e de exploração econômica (e sua interdependência) do
modo de produção capitalista e, definitivamente, não toma posição nas lutas
fundamentais da sociedade moderna.22
Enquanto isso, o Conflituísmo, também chamado de sociologia do conflito, define que
o conflito é absolutamente normal na sociedade. Ou seja, devido à diversidade de grupos
existentes na sociedade, sempre haveria conflitos intergrupais. Desta forma, a coesão social
somente é conseguida mediante utilização de mecanismos de coerção. A sociologia do
conflito tem como momento histórico o florescimento de movimentos de resistência nos
Estados Unidos, como o movimento negro e o movimento de contestação à guerra do Vietnã;
e na União Soviética, como os movimentos separatistas da cidade de Praga, na extinta
Thecolosváquia.
A negação de uma ordem consensual foi importante para retirar o caráter legítimo do
direito penal de punir os comportamentos socialmente danosos. Os interesses protegidos não
são aqueles comuns a toda sociedade, mas sim daqueles que detêm o poder de influir na
formulação da legislação punitiva. O crime não seria a violação aos bens essenciais à
coletividade, mas sim a seleção daqueles comportamentos em conflito que seriam contrários
ao interesse de uma classe hegemonicamente influente.
Para Baratta:
As teorias conflituistas negam o princípio do interesse social e do delito natural,
afirmando que: a) Os interesses que estão na base de formação e aplicação do direito
penal são os interesses daqueles grupos que têm o poder de influir sobre os
processos de criminalização – os interesses protegidos através do direito penal não
são, pois, interesses comuns a todos os cidadãos; b) a criminalidade, no seu
conjunto, é uma realidade social criada através do processo de criminalização.
Portanto, a criminalidade e todo o direito penal têm sempre, natureza política.23
A teoria conflituísta, por sua vez, acaba não considerando a questão econômica como
fator importante na definição da luta entre os grupos sociais. Os teóricos do conflito acreditam
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que haja disputa de interesses entre grupos dominantes e entre grupos dominados, mas de
forma independente dos fatores de produção da vida material.
No entanto, a partir de análise materialista do crime, comum das escolas críticas, fica
demonstrado que esta situação conflitante parte apenas de uma análise superficial da
sociedade, pois, mesmo que haja disputa entre grupos originários das mesmas classes
econômicas, há uma disputa de interesses maior entre classes socialmente antagônicas, ligada
à manutenção/alteração das estruturas econômico-sociais de produção. Esta disputa realmente
afeta as estruturas político-ideológicas dominantes de um determinado momento histórico e,
conseqüentemente, repercutem nas instâncias de controle social. 24
Os conflituistas, ao definirem que existam diversos grupos conflitantes na classe
superior, ignoram o fato de que a classe dominante apresenta interesses comuns na
formulação do poder e das políticas relacionadas ao sistema de justiça criminal. Assim,
somente de forma superficial, grupos dentro das classes dominantes divergem em algumas
matérias, contudo, partilham interesses comuns e podem excluir dos processos políticos
membros de outras classes sociais. 25
As duas vertentes acima consideradas, apesar de apresentarem algumas contradições,
como foi demonstrado acima, trazem importantes contribuições para o pensamento
criminológico crítico, principalmente no que se refere à mudança do paradigma etiológico e à
negação básica dos princípios da ideologia da defesa social. Essa ruptura com o modelo
tradicionalista permitiu, para a escola crítica, uma abertura epistemológica para a colocação
de importantes elementos críticos. Quais sejam, históricos, sociais e políticos.
4 AS TEORIAS CRIMINOLÓGICA CRÍTICAS
A criminologia crítica começa a se desenvolver na Europa e na América nos primeiros
anos da década de 70 do século passado. O imperialismo das duas potências mundiais da
época (EUA e URSS) sobre países asiáticos, africanos e americanos, a questão ambiental, os
casos envolvendo corrupção de políticos famosos e as ditaduras militares que assolaram o
cenário mundial tornaram-se importantes elementos influenciadores das obras criminológicas
criticas na época.
Nesta seara, a observação empírica dos crimes de colarinho branco (white collar), das
fraudes contra a previdência, dos crimes ambientais, dentre outros, demonstravam que a
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atuação do sistema penal não se mostrava tão eficiente quanto em relação a outros tipos
delituosos, como furto e tráfico de drogas, por exemplo.
O marco inicial foi representado pela obra intitulada “The New Criminology: For a
Social Theory of Deviance”, dos autores Ian Taylor, Jock Young e Paul Walton” 26. Na
América Latina, as teorias críticas se desvelaram como um forte contraponto aos regimes
ditatoriais, como se pode ver nas obras de Anyiar de Castro27, Juarez Cirino dos Santos28 e
Roberto Lyra Filho 29.
As escolas críticas da criminologia não apresentam uma forma unificada de
pensamento. Várias são as tendências de pensamento que proporcionaram a ruptura
epistemológica da criminologia tradicional. No entanto, pode-se unificar a orientação dessas
formulações críticas da criminológica pelo seu método de estudo, o materialista-dialético,
pelo seu objeto, a reação social ao crime, e pelo seu compromisso com a transformação das
desigualdades econômico-sociais existentes30.
O emprego de algumas hipóteses e instrumentos da teoria do marxismo foi importante
para a evolução do pensamento criminológico das teorias tradicionais do crime e para as
teorias críticas, permitindo, dessa forma, uma interpretação mais profunda do paradigma da
reação social. Passou assim a analisar o controle social dos fatos definidos como criminosos
ligado às relações hegemônicas de produção material.
Os fatos criminais, para as teorias críticas, não são explicados pelos determinismos de
ordem biológica, psicológica ou social, mas são predominantemente condicionados pela
realidade material, como defendem Taylor, Walton e Young:
Agora, nossa posição é que, não somente esses processos são de natureza totalmente
social, mas, também, que eles são predominantemente condicionados pela realidade
material. Rompendo com explicações individuais (isto é, com explicações genéticas,
psicológicas ou similares) dentro de uma das explicações sociais projetou-se,
perante nós, a economia política como determinante primário do modelo social 31.
Com a análise das diversas vertentes críticas da criminologia, pode-se inferir que o
método
materialista-histórico
não
se
apresenta
como
um
conceito
hermeneuticamente fechado no tempo, mas sim como um “edifício aberto”
32
acabado,
onde se pode
reinterpretá-lo e criticá-lo, buscando novos significados, além de relacioná-lo a outras teorias
sociais. O método materialista relativiza as verdades, situando-as dentro de contexto social
específico. Desta forma, o materialismo acaba por romper com os conceitos absolutos dos
métodos positivistas33, que, ao mesmo tempo, tornam-se verdadeiramente parciais.
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O método materialista recusa-se em separar o pensamento da sociedade, já que não é a
consciência que determina as relações humanas, mas sim as relações sociais que condicionam
a consciência do homem. Ser radical, para o pensamento marxista, é compreender as relações
sociais pela raiz. “Para o homem, a raiz é o próprio homem”34.
Desta forma, as relações legais e criminais não podem estar fundadas no “espírito
geral humano”, ou no “consenso social”. Elas, ao contrário, são originárias de transformações
materiais na sociedade dentro da história, ou seja, originam-se das condições objetivoestruturais da vida35.
A aceitação da sociedade e das instâncias sociais, como a do controle criminal, como
um processo histórico-dialético é de fundamental importância para a análise crítica sobre o
fenômeno criminal, em particular, sobre o sistema de justiça criminal.
O materialismo-histórico, através da influência filosófica crítica, prega pela a
construção de uma práxis libertadora que rompa com as barreiras místicas das verdades
absolutas das ideologias tradicionais, desmascarando as reais opressões existentes na
sociedade36. Seguindo este pensamento, os teóricos críticos da criminologia defendem a
construção de uma ciência do crime que se mova para além da mera coleção de dados
empíricos, elaborando conceitos que apontem para a mudança das estruturas hegemônicas de
controle social.
Assim, a análise de qualquer fenômeno criminal e sua relação com o sistema penal não
pode ser encarado apenas a partir da observação acrítica e sem contextualização histórica.
Este tipo de interpretação da realidade apenas encobre as reais finalidades do sistema penal,
falseado as relações humanas.
A importância deste tipo de método material para uma análise criminológica reside
justamente na retirada do espírito humano do plano das idéias e dos valores metafísicos para
um plano real, onde as relações humanas, bem como as instituições penais, são influenciadas
por fatores político-econômicos, a depender de cada momento histórico.
Analisará, agora, como a criminologia crítica, através da teoria materialista, analisa o
sistema de justiça criminal, ou seja, as instâncias oficiais de produção, persecução e execução
do delito. Bem como de que forma essa análise aponta para uma mudança desse sistema
penal.
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4.1 O Sistema de Justiça Criminal
O controle social, como analisado anteriormente, tornou-se o objeto das novas ciências
criminológicas. É através dele que são definidas quais pessoas receberão o status de
criminosas e quais comportamentos serão apontados como desviantes.
A instância do controle social apresenta-se de vários modos nas relações sociais, seja
de maneira informal (através da escola, da família, da mídia etc.), ou institucionalizada
(através da polícia, do ministério público, dos asilos etc.), sendo que esta última, quando
relacionada aos mecanismos de produção, aplicação e execução das normas do direito penal, é
chamada de justiça criminal (ou penal).
As formas institucionalizadas do controle social, de acordo com Zaffaroni, podem ser
de caráter não punitivo, como as instâncias do direito privado; formalmente não punitivo;
como o caso dos asilos e abrigos para portadores de deficiência mental; e realmente punitivo,
onde se encaixa o sistema penal37. O sistema penal baseado no consenso defende que somente
as ações conflitivas de gravidade social são resolvidas pela via punitiva institucionalizada. No
entanto, verá a seguir que apenas alguns comportamentos selecionados receberão este tipo de
sanção.
O sistema criminal não aparece como um sistema estático, parado no tempo, assim
como defendem os criminólogos tradicionais, mas sim influenciado pelas relações sociais
hegemônicas e contra-hegemônicas, que vão construindo seus conceitos ao longo do tempo.
Um exemplo bastante elucidativo na história está relacionado à questão do escravismo no
Brasil entre os séculos XV e XIX: devido às relações hegemônicas de produção, o escravo era
considerado uma mercadoria valiosa para os escravagistas, desta forma, o escravo que ousasse
fugir dos domínios do seu senhor cometia um crime grave. Com o passar do tempo, devido às
fortes pressões contra-hegemônicas do movimento abolicionista e a mudança do mercado
econômico mundial, o poder político dominante foi forçado a, gradualmente, abolir a
escravatura e, conseqüentemente, descriminalizar os delitos relacionados ao comportamento
“rebelde” do escravo.
Nota-se aqui que não há como analisar a questão escravista no período colonial
brasileiro sob o ponto de vista da criminologia positivista. Esta se guiaria com base nos
valores sociais escravistas como absolutamente normais para a proteção da comunidade
“branca” e que o crime de rebelião do escravo aprisionado estaria determinado por fatores
sociais (desagregação da antiga família africana), psiquiátricos ou mesmo biológicos. O tipo
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penal e a atuação da justiça penal teriam o caráter ontológico, relacionados à defesa da
sociedade, sendo, portanto, prescindíveis à análise criminológica.
A análise materialista do delito apontaria que os crimes cometidos pelo escravo
fugitivo não estavam relacionados ao seu grau baixo de intelecção mental, ou por fatores
biológicos do tipo: “os escravos, pelas condições de miséria em que vivem nas senzalas, são
mais propícios a praticarem crimes”. Muito pelo contrário, são as relações materiais de
produção que influenciaram a criação de um tipo penal que selecionasse um determinado tipo
de indivíduo pertencente a uma classe hegemonicamente inferior a outra dotada de
privilégios.
Com base nestas explanações, nota-se que processo de controle social informal, ou
difuso, assim como o sistema penal oficial, condicionado pelas relações sócio-econômicas,
constrói de forma parcial a criminalidade e seleciona parcialmente os criminosos. Assim
define Aniyar de Castro:
Há um controle social que é formal, como dissemos: direito e instituições de
repressão e tratamento – polícia, tribunais, prisões, instituições para menores. E
outro, não formal ou extra-penal: religião, família, escola, meios de comunicação,
partidos, opinião pública, etc.. Todos esses elementos, sem exceção, estão
implicados na definição ou indicação do que é o delito, de quem é o delinqüente,
qual é a delinqüência e, portanto, nos chamados de “processo de criminalização”38.
Seguindo a orientação das outras teorias do controle social, a criminologia crítica nega
o caráter consensual e universal do crime, posto que o sistema penal não defende todos os
bens essenciais ao convívio social. Apesar disso, as escolas críticas conseguem ligar o
fenômeno da “criminalização” ou “etiquetação” do sistema penal às condições estruturais
objetivas da sociedade, fato este que não acontecia com as escolas anteriores.
Desta forma, o sistema de justiça criminal não é fruto universal do consenso, mas sim
hegemonicamente produto de apenas uma forma de ver o mundo 39. Aparentemente, o sistema
penal tutela a igualdade e liberdade entre os homens, através da linguagem da ordem,
contudo, ele representa mais a manutenção de uma ordem social desigual do que a defesa da
igualdade entre os homens.
O “bem”, na visão clássica do positivista, não passa, para os criminólogos críticos, da
organização dos valores morais pertencentes ao ideário de uma classe hegemonicamente
dominante. O ato diverso, ou maléfico, como apontado pelos positivistas, estaria contrário à
ordem mantida pelo sistema de produção dominante. Nesta seara aponta Cristiane Reis:
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Rotula-se o excluído, o diferente, como perigoso e, portanto, criminoso, sendo,
importante reprimi-los em nome da segurança pública. Identificam os conflitos
agrários como decorrentes da violência individual dos ditos invasores, saqueadores e
suas lideranças, buscando-se assim declarar guerra contra o violento comportamento
dos “invasores” levando à justificação do combate repressivo em defesa da
sociedade e da propriedade. Reproduz-se o discurso ideológico dominante que
polariza entre o bem (latifundiários vitimados) e o mal (cruéis “invasores”)40.
A prática organizada da classe politicamente hegemônica consegue, através desse
sistema, utilizar-se do discurso de igualdade formal41 para aplicação seletiva do desvio dentre
os despossuídos, mantendo a ordem real de reprodução das desigualdades sociais. A eficácia
invertida do sistema penal consiste na dicotomia entre a sua função real e a sua função
aparente: ao mesmo tempo em que o sistema penal, aparentemente, combate o crime de forma
universal, ele constrói e seleciona os delitos ligados em grande parte aos comportamentos das
classes mais desfavorecidas (como furtos e danos materiais). Assim define Andrade:
A eficácia invertida do sistema penal é consistente no fato de que a função latente e
real deste é construção seletiva da criminalidade e, neste processo, a reprodução
material e ideológica, das desigualdades e diferenças sociais (de classe, gênero, raça)
e não o combate da criminalidade, com a proteção de bens jurídicos universais e
geração de segurança pública e jurídica42.
O discurso hegemônico do sistema de justiça criminal também consegue influenciar
boa parte da opinião pública, através do discurso da igualdade formal e da “lei e ordem”,
principalmente pela atuação dos meios de comunicação de massa comprometidos com os
grupos economicamente influentes. Assim, a mídia consegue, através da supervalorização do
criminoso convencional, neutralizar os comportamentos socialmente danosos das elites
econômicas e esconder os reais problemas que afligem boa parte da sociedade 43.
Exemplos não faltam no nosso cotidiano para demonstrar as premissas acima
apontadas: vários são os casos no nosso cotidiano onde a mídia hipervaloriza o julgamento de
algum crime de repercussão nacional sendo que, ao mesmo tempo, invisibiliza outros tipos de
práticas criminosas socialmente prejudiciais, em grande parte cometida pelas elites
econômicas44.
Passará agora a compreender a crítica criminológica materialista às instâncias oficiais
de produção, persecução e execução do crime e como as vertentes críticas propõem a solução
para uma política alternativa da justiça criminal.
4.2 A Criminalização Primária e Secundária
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O estágio de elaboração das normas penais, ou seja, de definição das condutas que
serão ou não consideradas criminosas é chamado de criminalização primária. Este processo se
inicia na seleção dos bens que serão tutelados pelo direito penal, e conseqüentemente, dos
comportamentos ofensivos a esses bens.
A criminologia tradicional, como já foi dito, acredita que os bens penalmente
protegidos representam somente aqueles valores essenciais ao convívio social ordenado, os
quais, quando violados, causariam um grande distúrbio à paz consensual. Essa visão ainda é
defendida por boa parte da doutrina penalista, como já foi visto anteriormente.
Contudo, o que se tem notado atualmente, principalmente nos países da América
latina, é a “inflação” da legislação penal, com a prescrição inúmeros tipos de conduta
criminosa e a pouca capacidade operativa dos aparelhos de persecução penal45, o que,
inicialmente, já contradiria o princípio do interesse social. Depois, os bens tutelados pelo
direito penal não representam o interesse geral da sociedade, mas, em grande parte, os
interesses fundamentais das classes dominantes, como defende Lyra Filho:
Sem dúvida, como nota Roberto Lyra, até numa sociedade dividida em classes e
com o domínio de minorias privilegiadas, há crimes de perigo e dano comuns. Mas
essa distinção válida tornou-se necessária, justamente porque a invocação, em
abstrato, da defesa social dissimula a existência de crimes que resguardam
privilégios, bem como o aperfeiçoamento de todo o sistema normativo aos interesses
fundamentais dos melhor aquinhoados46.
Desta forma, os valores tutelados pelos tipos penais não representam o consenso geral
da sociedade, posto que uma breve análise sobre as prescrições contidas nos códigos penais
para entender que: os tipos penais referentes aos comportamentos usualmente cometidos por
classes subalternas (como furtos e roubos) e, portanto, contrários aos interesses hegemônicos
de acumulação do capital, prescrevem muito mais comportamentos de maneira mais clara e
objetiva; já em consideração aos tipos penais mais identificados com os comportamentos das
classes mais abastadas, como os crimes de colarinho branco e os relacionados à exploração
trabalhista, são prescritos de maneira obscura, vaga, imprecisa, e com muito mais
possibilidades “escapatórias” do criminoso 47.
Um belo exemplo disto está relacionado ao crime de redução análoga ao trabalho
escravo, disposto no art. 149, do Código Penal brasileiro. As estatísticas apontam que entre
1995 e 2008, 32.405 trabalhadores foram encontrados reduzidos a condição análoga a de
escravos. No entanto, até 2003, somente um criminoso tinha sido condenado pela pratica de
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tal crime48. Isto se deve, sobretudo, ao tipo penal, vago e aberto, com possibilidades diversas
de interpretação doutrinária e jurisprudencial49.
Há também aqueles comportamentos que a criminologia crítica chama de socialmente
danosos (exploração econômica e financeira, imperialismo) que não se configuram como
tipos penais por serem relacionados favoravelmente ao processo de acumulação e exploração
capitalista, em especial, nos países “subdesenvolvidos”. Deste modo, a lei penal aparece, em
boa parte, como uma “fachada ideológica” de justiça universal, posta para tutelar os interesses
particulares dos maiores “violadores de regras”, isto é, daqueles detentores do poder políticoeconômico50.
O fato de boa parte dos comportamentos tipificados se referirem à proteção de bens e
valores típicos de um sistema desigual não significa, contudo, que o direito penal é totalmente
determinado pela infra-estrutura econômica. Assim, há também fórmulas alternativas para a
tipificação de condutas socialmente danosas que correspondem num contraponto à política
criminal oficial, que serão analisadas posteriormente.
Quanto à criminalização secundária, ela pode ser definida como a concretização, ou
aplicação, das normas penais pelas instâncias de persecução penal do Estado (Ministério
Público, Judiciário, órgãos de Segurança Pública etc.).
Já foi visto, através do paradigma tradicional, que o Estado age de maneira uniforme
em toda sociedade, aplicando de maneira igual a lei penal a todos aqueles que violarem ou
ameaçarem violar os bens essenciais à vida social. Contudo, se isto fosse verdade, dado a
grande quantidade de tipos penais existentes e as inúmeras violações que acontecem por dia
não registradas nos órgãos oficiais, chegaría ao absurdo de punir a quase totalidade da
população de uma determinada sociedade, como aduz Zaffaroni51. É certo que, como já foi
dito anteriormente, grande parte dos conflitos penais somente existe por que há uma seleção
de quais serão os comportamentos considerados danosos ao processo hegemônico de
concentração de renda na mão de uma minoria privilegiada. Desta forma, conclui-se que a
regra de funcionamento do sistema penal é a imunidade, e não a criminalização 52, sobretudo
das elites econômicas.
Nesse contexto, verifica-se outro problema, relacionado à capacidade operacional
reduzida dos aparelhos de persecução penal, que somente conseguem responder por uma
parcela ínfima dos comportamentos delituosos cometidos na sociedade. Existe, assim, uma
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imensa quantidade de comportamentos criminosos que não serão apurados pelo aparelho
punitivo do Estado, a chamada cifra negra.
Importante também considerar que estes comportamentos delituosos não registrados
nos órgãos de segurança pública poderão ser resolvidos por outras formas que não a punitiva
institucionalizada. São os chamados meios “privados” de resolução conflitual, dentre os quais
se destaca: a mediação comunitária; a retribuição do dano; o tratamento clínico; e até mesmo
a punição privada. Aqui, nota-se que o Estado não consegue ser o único meio do agir punitivo
social, ao contrário, ele apenas age sobre uma parcela muito ínfima dos casos em que envolve
crimes, selecionando determinadas condutas e invisibilizando as demais.
A cifra negra traz importantes contribuições para compreender de que forma ocorre a
seletividade do sistema penal. Em geral, a estigmatização penal ocorre para os indivíduos
pertencentes aos grupos sociais não só economicamente, mas também sexual, étnica e
culturalmente oprimidos, dentre outros. Em contrapartida, delitos de maior danosidade social,
como os crimes relacionados à violação de direitos humanos são infimamente investigados.
Considera-se, ainda, que a rotulação do indivíduo como potencialmente criminoso não
está somente relacionado aos seres excluídos economicamente, mas também ligados a grupos
culturalmente oprimidos pelas relações sociais hegemônicas, como homossexuais, índios,
negros, mulheres, dentre outros.
Andrade, ao comentar sobre a atuação do sistema penal sobre as relações de gênero,
aduz que:
Num sentido forte, o sistema penal duplica a vitimação feminina porque as mulheres
são submetidas a julgamento e são divididas. O sistema penal não julga
igualitariamente pessoas, ele seleciona diferentemente autores e vítimas, de acordo
com sua reputação pessoal. No caso das mulheres, de acordo com sua reputação
sexual, estabelecendo uma grande linha divisória entre as mulheres consideradas
“honestas” (do ponto de vista sexual dominante), que podem ser consideras vítimas
do sistema, e as mulheres “desonestas” (das quais a prostituta é o modelo
radicalizado), que o sistema abandona na medida em que não se adequam aos
padrões de moralidade sexual impostas pelo patriarcalismo à mulher 53.
Zaffaroni indica que o processo seletivo de apuração dos comportamentos delituosos
na América latina adquire uma característica ainda mais violenta, haja vista o grau acentuado
de controle, ou até mesmo de extermínio, das classes marginalizadas pelos organismos
repressores do Estado. Isto se dá por causa dos processos colonização e exploração econômica
que os países latinos vêm sofrendo ao longo do tempo, abrindo margem para a criação de um
sistema penal deveras arbitrário 54.
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O sistema criminal, por fim, também age de maneira diferenciada quando prescreve as
penalidades que cada criminoso vai receber pelo dano social que cometeu. Em geral,
comportamentos que violam a ordem socioeconômica estabilizada são punidos com maior
veemência. Já em relação aos comportamentos típicos das classes mais abastadas, há uma
flexibilização maior das penas, com a aplicação dos substitutos penais e das penas
alternativas.
É bastante elucidativo o exemplo do artigo escrito por Taylor, Walton e Young:
Em um recente caso judicial, na Inglaterra, um procurador, de cinqüenta anos de
idade, foi condenado a pagar débitos de mais de um milhão de libras, em uma
audiência de falência. Foram-lhe dados 4.704 anos para saldar o débito, à taxa de
reposição de cinco libras por semana. Sendo um cavalheiro de classe média, “ele
prometeu aumentar sua taxa de reposição quando suas circunstâncias mudassem”
(Guardian, 18 de outubro de 1973). Um caso desse tipo deve ser lido e
compreendido contra o pano-de-fundo de uma sociedade que, constantemente,
prenderá infratores da classe trabalhadora por débitos no montante de 50 libras, ou
menos55.
O sistema carcerário, nessa esteira, representa a instância mais visível do sistema de
controle social do Estado, responsável por identificar quem são os indivíduos “maus” para a
sociedade. Alguns criminólogos críticos, como Cirino do Santos56, aprofundam seus estudos
sobre o aparelho carcerário. Contudo, em razão da delimitação temática, não será analisada
tais premissas nessa pesquisa.
O próximo tópico tratará sobre quais estratégias a criminologia crítica propõe para a
construção de um conceito alternativo de crime e, conseqüentemente, de uma política criminal
contra-hegemônica.
4.3 A Política Criminal Alternativa
A política criminal alternativa representa, para os criminólogos críticos, a formulação
de projetos e premissas no intuito de buscar reduzir as desigualdades materiais entre os grupos
sociais nos processos de criminalização primária e secundária, além da criação de políticas
públicas globais que possam transformar a realidade socialmente excludente. Desta forma,
constitui-se numa política de disputa ideológica do sistema de justiça criminal, consistente em
desmascarar os processos hegemônicos seletivos e estigmatizantes, criando novas alternativas
democráticas que possibilitem a mudança das condições socialmente desumanas.
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Em relação ao processo de criminalização, os teóricos críticos propõem a
despenalização dos comportamentos relacionados às classes subalternas, substituindo as
sanções institucionais por outras formas de controle social privado não estigmatizantes, como
a mediação comunitária. Em contrapartida, deve ser oposta a atuação do sistema de justiça
criminal em relação aos comportamentos “socialmente danosos”, ou melhor, às condutas
violadoras de direitos humanos, como a criminalidade econômica e política, ampliando a
tutela penal. O aumento da tutela estatal em relação a estes tipos de comportamentos deve
acontecer de maneira global, criando sanções que possam reverter a situação de desrespeito
anteriormente identificada. Ou, no dizer de Baratta: “Trata-se, dessa forma, de assegurar uma
maior representação processual em favor dos menos favorecidos” 57.
O sistema penal também deve ter uma maior preocupação com as vítimas do
comportamento socialmente danoso, não somente no sentido de assegurar uma integridade
psíquico-social, mas também formulando estratégias capazes de garantir a efetivação dos
direitos fundamentais do envolvidos negativamente nesses conflitos.
Baratta alerta para a necessidade de se evitar a supervalorização do direito penal, pois
a política criminal alternativa deve ser, antes de tudo, uma política de efetivação máxima dos
direitos humanos. O sistema punitivo deve, assim, contrair-se gradualmente ao máximo,
privilegiando-se as sanções administrativas ou civis58.
Os teóricos críticos também definem claramente que a supressão gradual do direito
penal não abrange a supressão das suas garantias processuais individuais, posto que
representam importantes instrumentos de defesa social contra as arbitrariedades do Poder
Público.
Os aparelhos de justiça criminal também devem ser reformulados para garantir um
maior controle da sociedade sobre os instrumentos de persecução e julgamento do crime,
como também sobre as políticas públicas para redução das desigualdades socais.
A instituição carcerária também deve ser gradativamente suprimida. No entanto, a
abertura penintenciária deve vir acompanhada de uma maior participação política da
população carcerária, através da fomentação de associações dentro dos presídios, além de
criar condições de que outros movimentos comunitários possam se relacionar com os presos.
Antes de tudo, uma política criminal alternativa deve estar em permanente construção
coletiva, portanto, aberta às contribuições das mais diversas práticas dos movimentos sociais
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que buscam a transformação da realidade excludente e, conseqüentemente, a emancipação do
homem enquanto sujeito coletivo de direitos59.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A criminologia tradicional traz consigo uma ideologia de cunho conservador, ao
projetar que os valores consensuais são ontológicos e, portanto, não seriam fruto de
investigação do pensamento criminológico e repressivo, ao invocar o Estado como único
meio legítimo do agir punitivo quando fosse violados esses valores essenciais à convivência
humana.
No entanto, a partir da quebra do paradigma da defesa social, a criminologia passa
agora a contestar esse modelo tradicional do crime, projetando o estudo do fenômeno criminal
não mais para o estudo das causas determinantes para o cometimento do delito, mas sim para
a análise das instâncias de controle social, responsáveis pela seleção de quais sujeitos serão
criminalizados pelo sistema penal.
Assim, o sistema criminal passa a ter duas funções: uma aparente, onde impera o
discurso do direito penal igualitário e universal, responsável pela proteção de todos os valores
imprescritíveis para a sobrevivência humana; e outra real, onde predomina o caráter
fragmentário e seletivo da lei criminal.
As teorias criminológicas críticas aprofundam a análise sobre o paradigma da reação
social através da utilização do método materialista-histórico. Assim, o fenômeno criminal e a
atuação das instituições penais são influenciados pelas relações sócio-econômicas ao longo da
história.
O crime, para as vertentes críticas, não pode ser encarado sob o ponto de vista
metafísico, mas sim da perspectiva material das relações sociais, abrangendo os fatores reais
de produção da vida material.
Chama-se de criminalização primária a etapa de produção do tipo penal, onde são
escolhidos tantos os comportamentos ditos como danosos como os criminosos em potencial.
Nesta etapa, observa-se que a escolha das condutas criminosas desprivilegia uma classe social
em detrimento de outra, hegemonicamente poderosa.
Já a criminalização secundária estaria presente tanto na persecução penal como na
aplicação da pena. Aqui, o fenômeno observado pelos criminólogos críticos é o da
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
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seletividade das instituições penais, com a imunização de determinadas condutas,
principalmente relacionadas ao modo de acumulação de capital (como crimes ambientais, por
exemplo) e a estigmatização de condutas ligadas a comportamentos de classes
hegemonicamente inferiores (como crime de dano ou esbulho possessório, por exemplo)
Por fim, as escolas criminológicas críticas apontam para uma política criminal
alternativa, onde ocorreria a inversão de seleção do sistema penal, que passaria a criminalizar
comportamentos socialmente danosos, como crimes de colarinho branco, e descriminalizar
condutas relacionadas às classes mais desfavorecidas da população.
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2004.
1
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Manual de Direito Penal Brasileiro. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004, p. 69.
2
CASTRO, Lola Aniyar de. Criminologia da Libertação. Rio de Janeiro: Revan, 2005, p. 72
3
Ibid. p. 72.
4
MARTEAU, Juan Félix. A Condição Estratégica das Normas: sobre as possibilidades teóricoepistemológicas da crítica criminológica radical às práticas penais. São Paulo: IBCCrim, 1997, p. 73
5
Ibid. p. 73
6
Sobre o assunto ler: PINHEIRO, Ângela. Criança e Adolescente no Brasil: Porque o Abismo entre a Lei e a
Realidade. Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2006, p. 78.
7
Sobre o assunto ler: REIS, Cristiane De Souza. Por trás dos bastidores da mídia. Revista âmbito Jurídico.
Disponível em <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=81
9>. Acesso em: 30 mar. 2010.
8
FERREIRA, Zoroastro de Paiva. Criminalidade. São Paulo: Universitária de Direito, 1986, p. 191.
9
FILHO, Roberto Lyra. Criminologia Dialética. Brasil: Ministério da Justiça, 1997, p. 18-19.
10
Ibid. p. 48.
11
CASTRO, Lola Aniyar de. Op. cit. p. 73.
12
BARATTA, Alessandro. Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal: Introdução à Sociologia do
Direito Penal. Trad. Juarez Cirino do Santos. 3. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002, p. 42.
13
YOUNG, Jock. Criminologia da Classe Trabalhadora. In: TAYLOR, Ian; WALTON, Paul; YOUNG, Jock
(Org.). Criminologia Crítica. Trad. Juarez Cirino dos Santos. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1980, p. 75.
14
NORONHA, Edgard Magalhães. Direito Penal: Parte Geral. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 103.
15
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Op. cit. p. 95.
16
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Op. cit. p. 92-93.
17
NÓBREGA, Lídia Ribeiro. A Criminologia Crítica no Contexto dos Conflitos Agrários no Brasil.
Monografia (Graduação em Direito). Fortaleza: Universidade Federal do Ceará, 2008, p. 18.
18
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte especial. vol. 2. 5. ed. São Paulo: Saraiva,
2006, p. 4-5.
19
BARATTA, Alessandro. Op. cit. p. 86.
20
Ibid. p. 88.
21
CASTRO, Lola Aniyar de. Criminologia da Reação Social. Rio de Janeiro: Forense, 1983. p. 101.
22
SANTOS, Juarez Cirino dos. A Criminologia Radical. 3. ed. Curitiba: ICPC: Lúmen Júris, 2006, p. 24.
23
BARATTA, Alessandro. Op. cit. p. 119.
24
QUINNEY, Richard. O Controle do Crime na Sociedade Capitalista: uma Filosofia Crítica da Ordem
Legal. In: TAYLOR, Ian; WALTON, Paul; YOUNG, Jock (Org.). Criminologia Crítica. Trad. Juarez Cirino
dos Santos. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1980, p. 239.
25
Ibid. p. 238-239.
26
Sobre o assunto ler: NÓBREGA, Lídia Ribeiro. Op. cit. p.54.
27
CASTRO, Lola Aniyar de. Criminologia da Libertação. Rio de Janeiro: Editora Revan, 2005.
28
SANTOS, Juarez Cirino dos. Op. cit.
29
FILHO, Roberto Lyra. Op. cit.
30
SANTOS, Juarez Cirino dos. Op. cit. p. 125
31
TAYLOR, Ian; WALTON, Paul; YOUNG, Jock. Criminologia Crítica na Inglaterra Retrospecto e
Perspectiva. In: TAYLOR, Ian; WALTON, Paul; YOUNG, Jock (Org.). Criminologia Crítica. Trad. Juarez
Cirino dos Santos. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1980, p. 20.
32
BARATTA, Alessandro. Op. cit. p. 200.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
978
33
PIRES, Sérgio Luiz Fernades. Os Crimes Contra o Patrimônio e a Luta de Classes no Brasil. Dissertação
(Mestrado em Direito). Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 1998. p. 20-21.
34
TAYLOR, Ian; WALTON, Paul; YOUNG, Jock. Criminologia Crítica na Inglaterra Retrospecto e
Perspectiva. In: Op. cit. p. 56.
35
Ibid. p. 60.
36
SANTOS, Juarez Cirino dos; TANCREDO, Sérgio. Apresentação. In: TAYLOR, Ian; WALTON, Paul;
YOUNG, Jock (Org.). Op. cit. p. IX.
37
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Op cit. p. 69.
38
CASTRO, Lola Aniyar de. Criminologia da Libertação. Rio de Janeiro: Editora Revan, 2005. p. 237.
39
ANDRADE, Vera Regina Pereira de. A construção social dos conflitos agrários como criminalidade. In:
Introdução Crítica ao Sistema Penal: Elementos para a compreensão da Atividade Repressiva do Estado. Rogério
Dutra dos Santos (Org). Florianópolis: Diploma Legal, 1999. p. 30. apud MACHADO, Leonardo Linhares
Drumond. De Criminosos a Criminalizados: o Processo de Criminalização no Trânsito em Montes Claros MG. Dissertação (Mestrado em Direito). Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 2001. p 30.
40
REIS, Cristiane De Souza. Op. cit.
41
A igualdade formal é aquela exprimida como a igualdade de todos perante a lei penal, sem observar, contudo a
situação de desigualdade material entre as classes sociais. Sobre o tema ler: SILVA, José Afonso da. Curso de
Direito Constitucional Positivo. 25. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 214.
42
ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Op. cit. p. 31-32.
43
SANTOS, Juarez Cirino dos. Op. cit. p. 17.
44
Sobre o tema ler: SPOSATI, Ruy Marques. Por que não queremos entender os Nardoni? Brasil de Fato, São
Paulo, 30 de abr. 2010. Disponível em: <http://ow.ly/1sHWZ>. Acesso em: 30 de abr. 2010.
45
Sobre o tema ler: FONSÊCA. Mariana Guedes Duarte da. A Seletividade do Sistema Penal: Uma Análise da
Atuação da Central de Inquéritos da Capital do Ministério Público de Pernambuco. Monografia (Graduação em
Direito). Recife: Universidade Federal de Pernambuco, 2008. p. 17.
46
FILHO, Roberto Lyra. Op cit. p. 22-23.
47
Baratta define como uma rede fina a seleção dos comportamentos criminosos das classes subalternas, capaz de
capturar muito mais condutas, e de rede larga a seleção dos tipos penais usualmente cometidos pelas classes mais
ricas. Sobre o assunto ler: BARATTA, Alessandro. Op. cit. p. 165.
48
Antonio Barbosa de Melo foi condenado em 1999 pelo art. 149 do CP. Sobre o assunto ler: SAKAMOTO,
Leonardo (org.). Trabalho Escravo no Brasil do Século XXI. Brasília: Organização Internacional do Trabalho,
2007. p. 105.
49
Sobre o assunto ler: ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Possibilidades Jurídicas de
Combate à Escravidão Contemporânea. Brasília: OIT, 2007.
50
TAYLOR, Ian; WALTON, Paul; YOUNG, Jock. Op. cit. p. 35.
51
ZAFFARONI, Eugênio Raul. Em Busca das Penas Perdidas: a Perda de Legitimidade do Sistema Penal.
Trad. Vânia Romano Pedrosa e Amir Lopes da Conceição. 2. ed. Rio de Janeiro: Revam, 1996. p. 26.
52
HULSMAN, Louk. La Criminologia Critica y el concepto del delito. Poder e Control. Barcelona: 1986. p.
127 apud ANDRADE. Vera Regina Pereira de. A ilusão de Segurança Pública: do Controle da Violência à
Violência do Controle Penal. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997, p. 266.
53
ANDRADE. Vera Regina de. Criminologia e Feminismo: da Mulher como Vítima à Mulher como Sujeito de
Construção de Cidadania. Palestra Proferida no: Seminário Internacional Criminologia e Feminismo. Porto
Alegre – RS, 1996.
54
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. Em Busca das Penas Perdidas: a Perda de Legitimidade do Sistema Penal.
Trad. Vânia Romano Pedrosa e Amir Lopes da Conceição. 2. ed. Rio de Janeiro: Revam, 1996. p. 125.
55
TAYLOR, Ian; WALTON, Paul; YOUNG, Jock. Op. cit. p. 36.
56
SANTOS, Juarez Cirino dos. Op. cit. p. 61-109.
57
BARATTA, Alessandro. Op. cit. p. 202.
58
Ibid. p. 202.
59
“A discussão e a articulação de um projeto alternativo que conduza a um “novo Direito” passa, hoje,
necessariamente, pela definição de uma racionalidade emancipatória, pelo questionamento dos valores e pela
fundamentação de uma ética política da “práxis comunitária”, pela redescoberta de um “novo sujeito histórico”
e, finalmente, pelo reconhecimento dos movimentos e práticas sociais como fontes geradoras do pluralismo
jurídico”. Sobre o assunto ler: WOLKMER, Antonio Carlos. Contribuição Para o Projeto da Juridicidade
Alternativa. In: JUNIOR, Edmundo. Lima de Arruda (org). Lições de Direito Alternativo. v. 1. São Paulo:
Acadêmica, 1991. p. 31.
* Trabalho publicado nos Anais do XIX Encontro Nacional do CONPEDI realizado em Fortaleza - CE nos dias 09, 10, 11 e 12 de Junho de 2010
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