Contestação em Ação de Indenização por Danos

Transcrição

Contestação em Ação de Indenização por Danos
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA ....ª VARA CÍVEL DO FORO
CENTAL DA COMARCA DE .................
Processo nº .....................
............., associação civil de fins não lucrativos, com
sede na Rua ..............., Jardim ......., CEP ..........., São Paulo-SP, inscrito no
CNPJ/MF sob o nº .............., por seu advogado que esta subscreve (doc. 01),
nos autos da Ação Ordinária de Indenização, promovida por ...........,
processo em referência, vem, respeitosamente, perante V. Exa., apresentar
sua CONTESTAÇÃO, o que faz nos termos das seguintes razões de fato e
de direito que passa a expor.
I - DOS FATOS
Alega a Autora que, no dia ..., ao participar de
evento, patrocinado e organizado pelo Sr. ........., em salão de festas, locado
pelo Réu, foi agredida pelo Sr. .............
Bem por isso, ingressa com a presente demanda
contra todos, pleiteando, além da justiça gratuita, danos materiais e morais.
Ab initio, frize-se, os prazos devem ser computados
em dobro, a teor do art. 191 do CPC, porquanto os réus têm procuradores
diferentes, ficando desde já requerido.
1
Deu à causa a quantia de R$ ......... (
), muito
embora, seu pedido, consiste de quantia bem superior, o que será objeto de
Impugnação ao Valor da Causa.
Contudo, sem razão a Autora, pelo menos em
relação ao Réu - ............., conforme restará demonstrado.
Clarividente que a Autora falta para com a verdade
integral dos fatos, razão pela qual, em relação ao .............., a ação é
improcedente.
II - DA CONCESSÃO DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA
Inconcebível o deferimento da justiça gratuita para
a Autora.
Está claro que pretende, no caso de condenação, se
ver livre de arcar com as custas e despesas processuais, notadamente,
honorários advocatícios.
Da própria narração da Autora, deduz-se, tratar-se
de pessoa de classe média alta, portanto, economicamente privilegiada,
senão por si só, mas, sobretudo, em razão da família a qual pertence.
Trata-se, a rigor, da banalização do benefício da
“justiça gratuita”, data venia.
Por primeiro, é de se ver que a Autora reside na
Vila Nova Conceição, bairro residencial de classe média alta, da cidade de
São Paulo.
Dificilmente encontrar-se-ão, moradores naquela
rua e bairro, necessitados da gratuidade do judiciário.
Por segundo, conforme afirmado pela própria
Autora (fls. 04), “tratava-se de um evento caro e grandioso, num dos
locais mais requintados de nossa cidade”. (g. n.)
Forçoso concluir que, para ir a evento caro e
grandioso, a Autora possui recursos, mas para se socorrer do Poder
Judiciário e arcar com as custas e despesas processuais, não.(?)
Por terceiro, até profissional especializado (fls. 06)
foi contratado pela família para localizar o agressor, Sr. ...........
Por quarto, segundo relato da própria Autora,
esteve internada no Hospital Albert Einstein.
Ora, cediço que dada à especialidade, natureza e
características de referido nosocômio, é o hospital que qualquer pessoa
gostaria de ser atendida e tratada.
Em outras palavras, segundo é do conhecimento
geral, apenas as pessoas de posse têm tal privilégio.
Por quinto, embora o pleito beira as raias do
absurdo, trata da perda da jóia no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) (fls.
29).
Ora, quem se dispõe a ir a uma festa com um
“brinco” neste valor, pode-se concluir: ou se trata de pessoa realmente de
posse, ou o enfeite não passa de mera bijuteria ou a detentora efetivamente
não dá o valor que possui, arriscando-se em comparecer em evento público,
onde poderia estar sujeita a toda sorte de acidentes ou incidentes.
Enfim, some-se a tudo isso, o fato de, conforme
relatado pela própria Autora, em se tratando de moça jovem “com padrão
de vida desejável” (fls. 31), “acostumada a freqüentar a noite de nossa
cidade, indo a bares e boates” (fls. 32), “não freqüentou festas, reuniões,
comemorações, tampouco eventos de grande porte, como foi o caso da
festa “Saint Tropez”” (fls. 33).
Disso resulta claro que a Autora não faz jus ao
benefício da Justiça gratuita.
Pretende, pois, única e exclusivamente se ver livre
ao pagamento de custas e despesas processuais, honorários advocatícios,
enfim, de todas as verbas sucumbenciais.
Neste aspecto, inquestionavelmente, litiga de má-fé
a Autora.
A declaração de pobreza (fls. 53), salvo melhor
juízo, não corresponde à verdade.
De qualquer modo, tal benefício é objeto de
impugnação em apartado.
III - DAS PRELIMINARES
III-A) DA DENUNCIAÇÃO À LIDE
Causa espécie o fato de na sua narrativa a Autora
não mencionar, em uma única linha, a Sra. .............
Aliás, também causa espécie o fato da Autora não
tê-la incluído no pólo passivo desta ação.
A razão é singela.
A Autora omite fatos relevantes.
Pois bem, está provado nos autos do Inquérito
Policial, por testemunhas de ambas as partes, que toda a confusão teve
origem em entrevero iniciado pela Sra. ............. com a Autora.
Às fls. 89 e 112 uma testemunha também depôs
sobre a agressão mútua, entre a Autora e a Sra. .............
Consta, também, do relato feito pelo Sr. Delegado
da 96ª Delegacia de Polícia, transcrito às fls. 7 a 9.
O ilustre representante do Ministério Público, na
transcrição de fls. 9/10, inclusive, faz menção de ter sido instaurado,
também, Inquérito Policial contra a Sra. ............. (fls. 114 e 115).
Em seu depoimento no Inquérito Policial, cuja
cópia o Cube ............. ora junta (doc. 02), a Sra............. narra outros fatos
de extrema e capital importância, para o deslinde da questão.
Também, contra a Sra. ............ foi instaurada ação
penal, processo nº ............ , perante a ..ª Vara Criminal do Foro Regional de
..............
A propósito, curiosamente, tudo o que se relaciona
com a Sra. ................ a Autora deliberadamente omite ou oculta. Nem o seu
depoimento na Delegacia de Polícia juntou.
Porquê?
Enfim, a par das vias de fato existentes entre a
Autora e a Sra. .................... e que deram origem a toda a confusão,
documentos indicam que ambas se agrediram.
Ainda que a agressão tenha partido, inicialmente,
só da Sra. ................., ela também deve ser responsabilizada por todos os
incidentes e, conseqüentemente, pelos danos causados à Autora.
Portanto, imperativo que seja a Sra. ................
denunciada à lide para integrar o feito.
Segundo preconiza o inciso III, do art. 70 do CPC,
a denunciação à lide é obrigatória quando “àquele que estiver obrigado, pela
lei ou pelo contrato, a indenizar em ação regressiva, o prejuízo do que perder
a demanda”.
Com evidência, apesar de remotíssima, numa
eventual condenação, o Réu - Cube ............, tem todo o direito de buscar, em
ação regressiva, o ressarcimento daqueles que efetivamente são responsáveis
ou deram causa ao evento.
No caso, está comprovada a participação da Sra.
................... nos fatos que desaguaram na agressão sofrida pela Autora.
Certa e seguramente, não tivessem Autora e Sra.
...................... chegado às vias de fato, nada teria ocorrido e, por
conseguinte, a Autora não teria sofrido a agressão da qual alega ter sido
vítima.
Isto posto, requer o Réu - Cube ....., a denunciação
à lide da Sra. ..............., brasileira, solteira, portadora do RG nº ...............,
residente na Rua .................., nesta Cidade e Capital do Estado de São Paulo.
III-B) DA ILEGITIMIDADE DE PARTE DO CLUBE ......
Claro está, tanto quanto a luz solar, que o Clube
.............. é parte manifestamente ilegítima para responder a esta ação, a teor
dos artigos 3º e 4º 1 do CPC.
Ora, a Autora adquiriu convite para comparecer a
festa, da pessoa ou empresa organizadora do evento.
Nunca manteve qualquer contato com o Clube
.............., com relação ao indigitado evento.
Acrescente-se o fato de que o Clube ....... é uma
associação civil sem fins lucrativos. Se é que possui relação de consumo, a
tem com seus associados. Não com terceiros.
Toda a organização, conforme documentos
juntados pela própria Autora, além daqueles acostados pelo Réu - Clube
......., comprovam que referido clube não teve nenhuma participação no
evento.
O
Clube
.......
não
assumiu
responsabilidade pela organização e realização do evento.
nenhuma
Não concorreu, com culpa ou dolo, para com o
ocorrido com a Autora.
Importante ressaltar, a propósito, que no curso do
Inquérito Policial e da Ação Penal intentada pela Autora contra o réu, Sr.
..............., nenhuma referência sequer foi feita com relação à participação do
Clube ......., quer a respeito da organização, como da fiscalização do evento e
tampouco das agressões sofridas pela Autora.
Não só por tais razões, é o Clube ....... parte
ilegítima nesta ação, mas, sobretudo, porque não ficou demonstrado e
provado pela Autora, a culpa ou dolo do clube, e tampouco o nexo de
causalidade, entre o clube e as agressões que deram origem às lesões
sofridas.
1 Art. 3º Para propor ou contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade.
Art. 4º O interesse do autor pode limitar-se à declaração:
I - da existência ou da inexistência de relação jurídica;
II - da autenticidade ou falsidade de documento.
Parágrafo único. É admissível a ação declaratória, ainda que tenha ocorrido a violação do direito.
Inaplicáveis, pois, os artigos 186, 927 e 942 do
Código Civil, em relação ao Clube ......., sobre os quais a Autora
fundamentou todos os seus pedidos.
Por conseguinte, o Clube ....... é parte
manifestamente ilegítima para integrar o pólo passivo desta ação, devendo o
feito ser extinto, sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, inciso
VI, 2 do CPC.
IV - QUANTO AO MÉRITO
Quanto ao mérito, em relação ao Clube ......., sem
dúvida, totalmente improcedente a ação.
Fundamenta sua pretensão nos artigos 186 3 e 927 4
do Código Civil.
“Um dos pressupostos da responsabilidade civil é a
existência de um nexo causal entre o fato ilícito e o dano por ele produzido.
Sem essa relação de causalidade não se admite a obrigação de indenizar”.
“O art. 186 do Código Civil a exige expressamente,
ao atribuir a obrigação de reparar o dano àquele que, por ação ou omissão
voluntária, negligência ou imprudência, causar prejuízo a outrem” 5 .
Todavia, pela própria narração dos fatos, conclui-se
que o Clube ....... não teve nenhuma participação nas agressões que deram
origem aos danos experimentados pela Autora.
2 Art. 267. Extingue-se o processo, sem julgamento do mérito:
Vl - quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade
das partes e o interesse processual;
3 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
4 Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados
em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para os direitos de outrem.
5
Carlos Roberto Gonçalves, Saraiva, 7ª edição, 2002, pág. 520.
Com efeito, segundo doutrina, para haver ato ilícito
“stricto sensu” é preciso que o agente tenha agido culposamente, praticando
um dano injusto para a vítima.
Esses elementos – conduta culposa e dano injusto –
não podem se apresentar isoladamente, devem estar interligados por um
vínculo de causa e efeito, pois só assim o dano será imputável ao autor do
ato culposo.
Se o prejuízo da vítima não foi efeito
(conseqüência) da conduta do agente, ainda que esta tenha sido injurídica,
não lhe terá acarretado a obrigação de indenizar.
Segundo Humberto Theodoro Júnior 6 , comentando
o art. 186 em apreço, a respeito do nexo de causalidade leciona que “Dentre
as várias teorias já aventadas na doutrina, principalmente com raízes no
direito penal, duas são as que maior repercussão tiveram: a da equivalência
dos antecedentes e a da causalidade adequada”.
Para a teoria da equivalência dos antecedentes
(também denominada teoria da conditio sine qua non) tudo o que concorre
para que um resultado se dê, deve ser tratado como causa.
Pela teoria da causalidade adequada, segundo o
ilustre jurista, é a que tem sido mais aceita pelo direito civil contemporâneo.
Causa em sua ótica é o antecedente não apenas
necessário, mas também adequado à produção do resultado.
“Não se pode, segundo essa teoria,
atribuir a responsabilidade a quem se inseriu, simplesmente,
no processo de desencadeamento do fato danoso, mas apenas
àqueles que atuaram com ações adequadas ao resultado; de
maneira que cada um dos diversos partícipes reparará apenas
nas conseqüências naturais e prováveis de sua ação. Nem
todos, portanto, responderão pela reparação do resultado
danoso final, mas apenas os que praticaram fato naturalmente
adequado ao produzi-lo. (...) A análise da causalidade adequada não
deve ser feita no momento do ato ilícito, mas deve retroagir ao instante em
6
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume III, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 95.
que o fato indigitado ocorreu. Ali é que se apreciará, isoladamente, sua
idoneidade para produzir o ato danoso que mais tarde veio a acontecer”.
(g.n.)
Dessas lições, levando em conta a participação da
Autora, ao entrar em vias de fato com a Sra ......., bem assim a suposta
contribuição (nenhuma) do Clube ......., para com as agressões sofridas,
conclui-se que este último nenhuma responsabilidade ou culpa teve para
com os danos suportados por aquela, pois, não existe nexo de causalidade
ligando o Clube aos fatos e à Autora.
Afinal, as agressões ocorreram no ambiente restrito
do evento, locado aos organizadores da festa. Não aconteceram nas demais
dependências do Clube ........
Inaplicável, também, o art. 927 do Código Civil.
Primeiramente, há de se convir, é um tremendo
exagero falar em ato ilícito praticado pelo Clube ......., considerando sua
suposta participação (nenhuma) nas agressões sofridas e, mormente, na
realização do evento.
Reiterando, toda a organização do evento ficou ao
encargo de empresas contratadas para tanto, incluindo a segurança dos
convivas, conforme provado pelos documentos acostados.
Ademais, igualmente, não há falar em atividade de
risco, em relação à participação do Clube ....... na realização do evento.
De acordo com Enunciado 38, da Segunda Jornada
de Direito Civil, promovida pelo Centro de Estudos do Conselho de Justiça
Federal (Brasília, set/02), interpretando o art. 927 do Código Civil, aduz que
“a responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda
parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se
quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano
causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais
membros da coletividade”. (g.n.)
Bem explica Humberto Theodoro Júnior 7 , ao
comentar referido dispositivo que “A posição do novo Código corresponde a
7
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume III, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 29
um compromisso com a responsabilidade delitual subjetiva, ou seja, com o
dever de indenizar fundado na culpa, como base do sistema normativo. Ao
adotar, todavia, uma abertura maior para a introdução da teoria da
responsabilidade objetiva o fez em termos vagos e genéricos, deixando para
a jurisprudência a tarefa de conceituar o que seja atividade de risco, caso a
caso, o que pode representar o perigo de um alargamento desmesurado da
responsabilidade sem culpa, contrariando a própria orientação de prestigiar
como principal a responsabilidade derivada da culpa. (...). Por isso, cabe ao
juiz avaliar, no caso concreto, “a atividade costumeira do ofensor e não uma
atividade esporádica eventual, qual seja, aquela que, por um momento ou
por uma circunstância possa ser um ato de risco”. (g.n.)
Igualmente, bem a propósito, preleciona o insigne
Ministro do Colendo Superior Tribunal de Justiça, Carlos Alberto Menezes
Direito 8 , comentando, juntamente com Sérgio Cavalieri Filho, a
responsabilidade civil no novo Código Civil, que “Deverá o julgador,
retrocedendo ao momento da conduta, colocar-se no lugar do agente e, com
base no conhecimento das leis da natureza, bem como na situação particular
em que se encontrava o agente, emitir o seu juízo sobre a idoneidade da
causa para a ocorrência do dano”. (g.n.)
O Clube ....... tem por finalidade disponibilizar aos
seus associados, a prática do hipismo. Não se trata de empresa ou entidade
especializada em promover festas. Apenas cede seu local, esporadicamente,
para aqueles que lá pretendem realizar eventos, transferindo-lhes toda a
responsabilidade pela sua realização, como foi o caso da presente ação.
E na trilha dos ensinamentos de Carlos Alberto
Menezes Direito , “Logo, o bom senso está a indicar que a obrigação de
indenizar não decorrerá da simples natureza da atividade, ainda que tenha
uma periculosidade inerente. Para não chegarmos a uma inteligência
absurda, devemos entender que a expressão “por sua natureza” não diz
respeito à natureza do serviço, tampouco ao risco que ele produz, mas à
natureza da obrigação assumida por aquele que presta o serviços”.
9
Depois de traçar a distinção entre obrigações de
resultado e de meio, conclui que “Em nosso entender, a responsabilidade
8
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume XIII, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 81
9
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume XIII, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 152.
objetiva prevista no dispositivo em exame só se configura quando a natureza
do serviços (atividade desenvolvida) gerar para o fornecedor uma obrigação
de resultado, e não apenas de meio”.
Desta feita, inaplicáveis ao Réu - Clube ......., os
artigos em questão, sob os quais fundamentou a Autora sua ação:
- não praticou ato ilícito, na acepção do termo;
- não exerce atividade de risco, nos termos propostos pelo legislador;
- não há nexo de causalidade entre sua participação e no evento danoso.
De mais a mais, impende ressaltar, que se houve
culpa de alguém, fora de dúvida que a própria Autora concorreu para os
atritos que geraram a agressão sofrida.
Está demonstrado e comprovado nos autos que a
Autora respondeu a uma agressão perpetrada por Sra ......., namorada do
agressor, Sr. ................
É o velho brocardo: “violência gera violência”!!!!!
Ainda que injustificável, sob todos os aspectos, a
agressão movida pelo Sr. ..............., mas, certa e seguramente nada teria
ocorrido ou não teria provocado as conseqüências posteriores, se a Autora,
ao invés de responder a provocação da Sra ......., simplesmente tivesse se
retirado do local.
A bem da verdade, uma das suas testemunhas ...................... - assim agiu (fls 95).
Sobre o tema - culpa concorrente - , sempre
oportunas as lições de Humberto Theodoro Júnior 10 ao asseverar que
“Verifica-se a culpa concorrente quando, ao lado da culpa do agente, se faz
presente também a culpa da vítima pelo resultado danoso. O prejuízo do
ofendido, liga-se, por nexo causal, tanto à omissão de cautela do
agente como da própria vítima. Não se pode, portanto, atribuir o
resultado danoso, com exclusividade a nenhum dos sujeitos
envolvidos no evento.
10
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume III, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 108
(...)
Tudo se resolve a partir do pressuposto de que “se a vítima concorreu
por fato seu, para o evento danoso, terá também de suportar os
efeitos. Se não chegar a elidir totalmente a responsabilidade do agente, a
indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em
confronto com a do autor do dano”.
Se a culpa do ofendido for de tal proporção que se apresente como
a única e determinante causa do evento danoso, o nexo causal com
a conduta do agente estará totalmente rompido. Nada terá este que
indenizar, porquanto a culpa exclusiva da vítima se equipara em
efeitos ao caso fortuito ou de força maior”. (g.n.)
Semelhantemente, Carlos Alberto Menezes Direito,
trata do fato da vítima, aduzindo o insigne Ministro do STJ que “Embora o
Código de 1916 não tivesse regra específica sobre o fato da vítima, a
doutrina e a jurisprudência a erigiram em causa excludente da
responsabilidade, nos casos em que a conduta desta exsurge como fato
gerador do dano, absorvendo a integralidade da causalidade. O Código atual
também não tratou expressamente do tema, mas é possível extrair alguma
conclusão a este respeito do artigo 945. Se o juiz pode reduzir a indenização
no caso de culpa concorrente da vítima, pela mesma razão será possível
excluir a responsabilidade do aparente responsável no caso de culpa
exclusiva da vítima, isto é, quando o resultado decorrer exclusivamente da
conduta desta”.
Neste mesmo diapasão, Silvio Rodrigues
(Responsabilidade Civil, Saraiva, 12ª ed., p. 179) e Washington de Barros
Monteiro (Curso de Direito Civil, 25ª ed. Vol. 1º/279, Saraiva).
Vale ressaltar, a respeito, que o Código de Defesa
do Consumidor, também, em seus artigos 12, § 3º, III e 14, § 3º, II inclui
expressamente a culpa exclusiva do consumidor entre as causas exoneráveis
da responsabilidade do fornecedor.
Alardeia a Autora, em várias
inverdades, dando destaque a falta de seguranças no evento.
passagens,
Não é verdade.
Repisando, toda a organização do evento estava
sob inteira responsabilidade de outras empresas e pessoas.
Mas, segundo consta, compareceram ao local cerca
de 1.000 (mil) pessoas, se tanto.
Também, de acordo com informações obtidas de
empresa responsável, havia no local 45 (quarenta e cinco) seguranças (fls.
87).
De acordo com empresas do setor, a necessidade
destes profissionais, para total segurança, dos presentes, é de um (1)
segurança para grupo de 50 (cinqüenta) pessoas.
Assim, seguranças havia e em número mais do que
suficiente, pois se a média é de 1 (um) segurança para cada grupo de 50
(cinqüenta) pessoas, contando o evento com 45 (quarenta e cinco)
seguranças, estes eram suficientes para até 2.250 (duas mil, duzentos e
cinqüenta) pessoas. E, na verdade, não compareceram a tal festa mais do que
1.000 (mil) pessoas.
De rigor, deve ser dito, não há seguranças
suficientes quando está envolvida a falta de educação, a falta de civilidade e
a ignorância das pessoas.
Violência gera violência; ignorância gera
ignorância. E a Autora, ao que tudo indica, tem cultura e discernimento para
tal realidade.
Desta feita, se simplesmente tivesse se afastado do
local, ignorando a Sra ......., não é descabido presumir que nada teria
ocorrido, e, conseqüentemente, nada teria sofrido.
Contudo, aliando-se esses fatores relevantes, quais
sejam, (i) conduta da Autora (culpa concorrente ou fato da vítima), (ii)
ignorância, (iii) consumo de bebida alcoólica e (iv) número mais do que
suficientes de seguranças, conclui-se que, em relação ao Clube .......,
ocorreu, na verdade, caso fortuito, uma das causas excludentes do nexo
causal e de responsabilidade.
E nesta senda, caem como uma luva as lições
proferidas por Carlos Aberto Menezes Direito 11 , ao asseverar que “Se
ninguém pode responder por um resultado a que não tenha dado causa,
11
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume XIII, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 85.
ganham especial relevo as causas de exclusão do nexo causal, também
chamadas de excludentes de responsabilidade. É que, não raro, pessoas que
estavam jungidas a determinados deveres jurídicos são chamadas a
responder por eventos a que apenas aparentemente deram causa, pois,
quando examinada tecnicamente a relação de causalidade, constata-se que o
dano decorreu efetivamente de outra causa, ou de circunstância que as
impedia de cumprir a obrigação a que estavam vinculadas. E, como diziam
os antigos, ad impossibilia nemo tenetur. Se o comportamento devido, no
caso concreto, não foi possível, não se pode dizer que o dever foi violado.
Causas de exclusão do nexo causal são, pois, casos de impossibilidade
superveniente do cumprimento da obrigação não imputáveis ao devedor ou
agente. Essa impossibilidade, de acordo com a doutrina tradicional, ocorre
nas hipóteses de caso fortuito, força maior, fato exclusivo da vítima ou de
terceiro”.
E prossegue o ilustre Ministro do STJ, tratando das
diferenças entre caso fortuito e força maior: “Entendemos, todavia, que
diferença existe e é a seguinte: estaremos em face do caso fortuito,
quando se tratar de evento imprevisível e, por isso, inevitável. Se o
evento for inevitável, ainda que previsível, por se tratar de fato superior às
forças do agente, como normalmente são os fatos da natureza, como as
tempestades, enchentes etc., estaremos em face da força maior, como o
próprio nome diz. É o act of God, no dizer dos ingleses, em relação ao qual o
agente nada pode fazer para evitá-lo, ainda que previsível. A
imprevisibilidade, portanto, é elemento indispensável para a caracterização
do caso fortuito, enquanto a inevitabilidade o é da força maior. (...) O caso
fortuito e a força maior excluem o nexo causal por constituírem
também causa estranha à conduta do aparente agente, ensejadora
direta do evento”.
A excludente do caso fortuito ou força maior, não
foi inserida no rol das excludentes da responsabilidade do fornecedor,
segundo o ilustre jurista Carlos Roberto Gonçalves 12 .
Porém, no entender desse insigne Professor,
constam do rol de excludentes de responsabilidade, que rompem o liame de
causalidade são: o estado de necessidade; a legítima defesa, a culpa da
vítima, o fato de terceiro, a cláusula de não indenizar e o caso fortuito ou
força maior.
12
Responsabilidade Civil, Saraiva, 7ª edição, 2002, pág. 398.
E sobre o caso fortuito e força maior acrescenta
que “Mesmo assim, a argüição da aludida excludente é admitida pela
jurisprudência, pois o fato inevitável rompe o nexo de causalidade,
especialmente quando não guarda nenhuma relação com a atividade de
fornecedor, não se podendo, destarte, falar em defeito do produto ou do
serviço. O Superior Tribunal de Justiça assim vem decidindo: “O fato de o
art. 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor não se referir ao caso
fortuito e à força maior, ao arrolar as causas de isenção de responsabilidade
do fornecedor de serviços, não significa que, no sistema por ele instituído,
não possam ser invocadas. A inevitabilidade, e não a imprevisibilidade, é
que efetivamente mais importa para caracterizar o fortuito. E aquela há de
entender-se dentro de certa relatividade, tendo-se o acontecimento como
inevitável em função do que seria razoável exigir-se (Resp 120.647-SP, 3ª
T., Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJU, 15 maio 2000, p. 156)”” 13 .
E deve ser dito. Para o Réu - Clube ......., apesar de
o evento contar com o dobro de seguranças, eram absolutamente
imprevisíveis, não só entrevero entre duas jovens, mas, sobretudo as
agressões daí decorrentes.
Afinal, não se promove festa esperando que seus
participantes partirão para agressões mútuas.
E não se pode alegar sequer ter havido omissão por
parte do Réu - Clube ......., pois quando contratou com o organizador exigiu
seguranças suficientes para dar tranqüilidade aos participantes.
E no dizer de Sérgio Cavalieri Filho 14 , “a omissão
pura e simples não pode ser havida como ato jurídico ilícito. Só
adquire relevância jurídica e enseja a configuração do ato ilícito
quando quem se omite tem o dever jurídico de agir, isto é, de
praticar um ato que impediria o resultado danoso. O dever pode advir
da lei, de negócio jurídico ou de uma conduta anterior do próprio omitente,
criando o risco da ocorrência do resultado, devendo, por isso, agir para
impedi-lo. Nessas circunstâncias, “não impedir o resultado significa permitir
que a causa opere. O omitente coopera na realização do evento com uma
condição negativa, ou deixando de movimentar-se, ou não impedindo que o
resultado se concretize”. (g.n.)
13
Carlos Roberto Gonçalves, Saraiva, 7ª edição, 2002, pág. 526.
14
Programa de Responsabilidade Civil, 3ª edição, Malheiros, 2002, pág. 38.
Disso tudo resulta clarividente, sob todos os
ângulos, a irresponsabilidade do Clube ....... para com as agressões sofridas
ela Autora e, por conseguinte, do dever de indenizá-la dos danos por ela
suportados.
A respeito das citações feitas pela Autora,
importante ressaltar, nenhuma delas tem inteira aplicação ao caso, no
concernente ao Réu - Clube ........
Vale frisar que uma das citações de fls. 27 é
favorável ao Clube ......., ou seja, o exime de responsabilidade pelo evento
danoso.
Outra é contrária ao pedido da Autora indeferindo
o pedido de cumulação de danos morais e estéticos.
Praticamente todas as demais dizem respeito à
reparações por danos, envolvendo o agressor direto (pessoa física), o que
não é o caso do Clube ........
Finalmente, dos documentos juntados pela Autora,
as fotos não acompanharam os negativos, consoante exige o § 1º, do art.
385 15 do CPC.
Devem ser, pois, desentranhadas dos autos.
IV-A) DA PRESCRIÇÃO
“dormientibus non sucurrit jus
O evento ocorreu em 16/08/2002 e a ação foi
proposta em 15/03/2006, ou seja, 3 anos 7 meses depois.
Sendo assim, qualquer pedido de ressarcimento de
danos, pelo menos em relação ao Clube ......., está coberto pelo manto da
prescrição, ex vi do inciso V, do § 3º 16 , do art. 206 do Código Civil, cujo
prazo prescricional está fixado em 3 (três) anos.
15 Art. 385. A cópia de documento particular tem o mesmo valor probante que o original, cabendo ao
escrivão, intimadas as partes, proceder à conferência e certificar a conformidade entre a cópia e o original.
§ 1º - Quando se tratar de fotografia, esta terá de ser acompanhada do respectivo negativo.
16 Art. 206. Prescreve:
Trata-se, pois, de questão que dispensa quaisquer
divagações doutrinárias, prescindindo de um maior esforço intelectual para
se aferir que, entre a data do evento, e a data da propositura da ação,
transcorreram mais de 3 (três) anos, prazo este que detinha a Autora para
exercer o seu direito de ingressar em juízo para pleitear reparação frente ao
Clube ........
A prescrição configura sanção processual imposta àqueles que, ante o direito
violado, quedam-se inertes, não se socorrendo da via judicial para obter o
cumprimento específico da obrigação ou a reparação devida. O transcurso do tempo,
aliado à inação do titular do direito ofendido levam à consumação da prescrição.
Nos termos do Código Civil Brasileiro, a prescrição interrompe-se por qualquer ato
judicial que constitua em mora o devedor, e, igualmente, por ato inequívoco que
importe o reconhecimento do direito pelo devedor (art. 202, V e VI).
3. Recurso Especial desprovido. (REsp 526461 / RS ; RECURSO ESPECIAL
2003/0041227-7; Relator(a) Ministro LUIZ FUX (1122); Data do Julgamento
04/11/2003; Data da Publicação/Fonte DJ 24.11.2003 p. 226 RNDJ vol. 51 p. 127)
Neste aspecto, vale transcrever as lições de
Humberto Theodoro Júnior, ao comentar a prescrição no atual Código
Civil 17 : “O Código atual, na preocupação de encurtar as prescrições, incluiu
a das reparações civis do ato ilícito no rol das que se dão em três anos. Não
importa que o dano seja doloso ou culposo, nem que seja material ou
mora. A prescrição civil é uma só”. (g. n.)
E não há falar em interrupção da prescrição por
força do art. 200 do Código Civil, pois, o Clube ....... não foi parte na ação
penal instaurada contra o Sr. ................
E voltando às lições de Humberto Theodoro Júnior,
“A responsabilidade civil é independente da criminal (art. 935), de sorte que
para a vítima do crime, ou seus dependentes, demandarem a competente
indenização, não há necessidade de aguardar o desfecho da ação penal.”
Conseqüentemente, em relação ao Clube ......., ad
argumentandum, ainda que admitido seu dever de indenizar, porém, em
relação ao pleito da Autora, aplica-se o brocardo: dormientibus non sucurrit
jus.
§ 3o Em três anos:
V - a pretensão de reparação civil;
17
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume III, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 332.
E nem a prescrição qüinqüenária, prevista no art.
27 do Código de Defesa do Consumidor, se aplica ao Clube ........
18
A uma, porque se existiu, de fato, relação de
consumo, esta foi entre Autora e a empresa e/ou organizador do evento, até
porque foi deste que a Autora adquiriu o convite, estabelecendo a relação
contratual protegida pelo código consumerista.
A duas, porquanto, a prescrição qüinqüenária
prevista no art. 27 do CDC, só subsiste para ações de responsabilidade civil
oriundas de danos causados por fato do produto ou do serviço, o que não é o
caso, eis que, repetindo, não houve qualquer prestação de serviços por parte
do Clube ......., para a Autora.
A três, em se tratando de associação civil sem fins
lucrativos, frente a Autora, não manteve relação de consumo, na acepção do
termo.
IV-B) DA INEXISTÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO CLUBE .......
A despeito das citações colacionadas pela Autora é
reconhecido que, para que se configure o dever de indenizar é necessário
restar provados determinados elementos, ou seja, a efetiva existência de um
dano; a culpa do agente; o nexo de causalidade entre o dano e a culpa.
Reza o art. 333 19 do Código de Processo Civil que
o ônus da prova incumbe ao autor.
Coadunando-se com as disposições legais e
doutrinárias, arremata José Rafaelli Santini 20 :
"O direito ao ressarcimento do dano gerado por ato ilícito, funda-se no
tríplice requisito do prejuízo, do ato culposo do agente e do nexo causal entre
o referido ato e o resultado lesivo (CC, art. 159).
18
Art. 27. Prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do
produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a
partir do conhecimento do dano e de sua autoria.
19 "Art. 333 - O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
20 Dano Moral", Ed. de Direito, 1997, p. 27.
Portanto, em princípio, o autor para obter ganho de causa no pleito
indenizatório tem o ônus de provar a ocorrência dos três requisitos supra
(CPC, art 333, I)."
Portanto, a Autora, ao contrário do que estabelece o
Código de Processo Civil e a melhor doutrina, não provou que o dano
sofrido decorreu por culpa do Réu - Clube ......., razão pela qual improcede o
pleito.
Sempre recorrendo as lições de Humberto
Theodoro Júnior , tratando do elemento culpa, preleciona o insigne jurista
que “O importante, nesse tema, é definir qual o padrão para aferir a culpa no
comportamento lesivo. A recomendação doutrinária tradicional é que
21
não se deve exigir de ninguém um cuidado extremo, mas apenas
aquele que usualmente observa o homem comum (homo medius ou
o bonus pater famílias). É culpado aquele que causa dano por não ter
observado a cautela que uma pessoa mediana teria adotado nas
circunstâncias do evento. Não se tem como culpado, por isso, aquele
que provocou dano que só uma diligência extrema e incomum no
meio social conseguiria evitar. Ainda dentro da mesma preocupação,
deve-se ter em conta a falta possivelmente cometida não de forma abstrata,
mas em razão das peculiaridades do caso concreto. Assim, não se exige do
agente que evite o fato perigoso apenas remotamente previsível, mas o que,
in concreto, pudesse ser desde logo previsto e, conseqüentemente, evitado; e
que, entretanto, veio a acontecer justamente por não ter cuidado o agente de
evitá-lo, como era de seu dever”. (g.n.)
"RESPONSABILIDADE CIVIL - A decisão que, considerando a ausência de
dolo ou culpa da ré e mesmo a não ocorrência de comprovação de dano,
mantém a sentença que desacolhera pedido de indenização, não maltrata o
art. 159 do Código Civil Recurso Especial não conhecido. Unânime." (Resp
nº 27.601 - STJ - Rel. Min. Fontes de Alencar - 4' Turma - DJ 27.06.94)
E tal ausência de responsabilidade por parte do
Clube ....... está patente nos autos, quer pela narração dos fatos pela Autora,
quanto pelos depoimentos prestados em sede de Inquérito Policial e na ação
penal intentada contra o agressor, Sr. ................
Reiterando, pelo contrato (doc. 03) firmado entre o
Clube ....... e o Sr. ...................., está claro e explícito, neste instrumento, que
21
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume III, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 103
o contratado assumiria todos os riscos e responsabilidades pela organização
do evento.
Bem por isso, o organizador tratou de contratar
todos os profissionais e empresas especializadas (segurança, assistência
médica, bombeiros etc) para a realização do evento (doc. 04).
O Clube ....... apenas cedeu, isto é, colocou a
disposição dos organizadores, o local, qual seja o salão de festas, localizado
em suas dependências.
Não foi o Clube ....... que contratou seguranças.
Os ingressos não foram vendidos pelo Clube ........
O evento foi administrado, realizado e fiscalizado
pelos profissionais contratados pelos organizadores.
O Clube ....... não forneceu nem disponibilizou
nenhum equipamento; não forneceu bebidas ou alimentação de qualquer
espécie; não se incumbiu de proceder a revistas dos participantes; não
NÃO
TEVE
disponibilizou
empregados;
enfim,
ABSOLUTAMENTE NENHUMA PARTICIPAÇÃO DIRETA
no evento.
Todos os documentos comprovam tal situação.
Repisando as lições dos doutos, a caracterização do
dano moral e conseqüentemente do direito à reparação, segundo o
ensinamento do saudoso Professor Carlos Alberto Bittar 22 "depende, no
plano fático, de ocorrência dos seguintes elementos: o impulso do agente, do
resultado lesivo e o nexo causal entre ambos, que são, aliás, os pressupostos
da responsabilidade civil."
No caso "sub judice", esses elementos não se fazem
presentes.
Não restou evidenciado que os danos materiais e
morais suportados e alegados pela Autora decorreram de impulso ou de
qualquer ato lesivo praticado pelo Clube ........
22 Reparação Civil por Danos Morais, Ed. RT, pág. 127
IV-C) DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS
Pleiteia a Autora a quantia de R$ 13.830,00 (treze
mil, oitocentos e trinta reais) a título de danos materiais, sendo R$ 3.830,00
(três mil oitocentos e trinta reais) por despesas médicas desembolsadas com
tratamento médico.
E, por incrível que possa parecer, R$ 10.000,00
(dez mil reais) por um “brinco”, supostamente, tenha perdido durante o
evento, quando foi agredida.
Não há uma só prova ou indício sequer da
existência de tal jóia, muito mais de que tenha sumida ou perdida em razão
das agressões sofridas.
Dada a sua absurdez e despropósito, tal pedido não
pode ser admitido.
Tal pedido, tem relação com alguns dados e
elementos constantes dos autos, quais sejam:
- as fotos realmente impressionam;
- a narrativa da Autora, em que pese recheada de fantasias, à primeira vista,
também, impressionam, mas não se coadunam com os fatos e com os
depoimentos prestados no Inquérito Policial;
- os gastos despendidos com tratamento de sua saúde (R$ 3.830,00) não são
coerentes com a narrativa e com as fotos e os fatos, ainda mais,
considerando o hospital onde foi atendida (Albert Einstein);
- a omissão, deliberada, de qualquer referência a Sra ......., com quem chegou
às vias de fato, antes da agressão perpetrada pelo Sr. ...............;
- o pedido de Justiça gratuita, em que pese tratar-se de jovem de classe “A”,
ou na melhor das hipóteses, de classe média alta, nem poderia ser deferido;
- o valor dado à causa, incoerente com os pedidos de danos materiais, morais
e estéticos;
- o pedido de indenização pela perda de uma jóia, nem provada sua
existência, avaliada unilateralmente por ela em R$ 10.000,00, dadas às
circunstâncias, senão absurdo, uma ‘brincadeira”, data venia.
Diante disso, não é descabido presumir ou deduzir
que a ação proposta pela Autora nada mais se resume numa aventura
jurídica.
IV-D) DA INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES
O pedido de indenização por lucros cessantes,
ainda mais por arbitramento do MM. Juiz, é totalmente descabido.
A indenização dos lucros cessantes e danos
emergentes pressupõe a comprovação cabal desses prejuízos e o nexo de
causalidade entre a situação de incapacidade para o trabalho, decorrente da
culpa do réu.
Nada disso está provado nos autos a permitir o
pleito a este título.
Sequer provou a Autora que trabalhava.
“Os lucros cessantes devem ser calculados até a
cura com base nos ganhos efetivos da vítima. Enquanto a vítima estiver sem
condições físicas, estiver em recuperação, enquanto ainda não estiver
curada, tudo o que ela deixou de ganhar deve ser computado, considerando
sempre a natureza do trabalho que exercia”. 23
Nem dos possíveis e eventuais empregos que
deixou de obter, fez qualquer prova.
“Não se pode levar o ressarcimento a cobrir
expectativas remotas de lucros e vantagens que poderiam ou não acontecer,
no futuro. Para evitar pretensões quiméricas, o art. 403 do novo Código, na
tradição do art. 1.059 do Código anterior, determina que a reparação dos
lucros cessantes só compreenda o que a vítima “razoavelmente deixou de
lucrar”. Com isto se impede a vítima do ato ilícito de afastar-se dos critérios
23
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume XIII, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 419.
objetivos e navegar nas águas do meramente hipotético ou imaginário. Em
suma, nem o dano material, nem os lucros cessantes, podem ser deferidos
sob condição de apuração futura em liquidação.” 24 .
Não há que se falar, portanto, em lucros cessantes,
ainda mais deixando ao arbítrio do d. magistrado.
Não pode haver condenação de indenização por
perdas e danos sem prova insofismável do prejuízo ocorrido, segundo
entende a Jurisprudência pátria. Confira-se:
Os lucros cessantes, para serem indenizados, devem ser fundados em bases
seguras, de modo a não compreender lucros imaginários ou fantásticos.
Nesse sentido é que se deve entender a expressão legal: 'Razoavelmente
deixou de lucrar', ensina Carvalho Santos, em seu Código Civil Brasileiro
Interpretado, 5a Ed., Vol. XIV, p. 256" (1º TACSP, Ap. 307.155, 8ª C. J.
15.03.83, Rel. Negreiros Penteado).
Como a culpa, o lucro cessante não se presume, deve ser demonstrado, e isso
o autor deixou de fazer." (1º TACSP, Ap. 292.285, 1ª C. J. 22.06.82, Rel.
Orlando Gandolfo).
A exclusão, pelo aresto recorrido, de lucros cessantes e danos morais por
ausência de comprovação do nexo de causalidade e de danos sofridos pela
autora recorrente deu-se com base no quadro fático dos autos. Destarte, no
âmbito do recurso especial, a reapreciação do acervo probatório que lastreou
o acórdão vergastado encontra óbice no enunciado 7 da Súmula do Superior
Tribunal de Justiça. (REsp 726294 / RJ ; RECURSO ESPECIAL
2005/0023222-7)
A indenização dos lucros cessantes e danos emergentes pressupõe a
comprovação cabal dos empréstimos bancários realizados e o nexo de
causalidade entre a captação dos recursos e a execução das alterações
incluídas nos projetos da obra, sendo insuficiente a mera alegação de
inadimplemento da União. (REsp 585113 / PE ; RECURSO ESPECIAL
2003/0156756-7)
Indenização. Dano material e dano moral. Acidente do trabalho. DORT
(Distúrbio Osteomuscular Relacionado ao Trabalho). Artigo 1.539 do Código
Civil de 1916 (950 do vigente). Prova do dano. Lucros cessantes. Juros
moratórios. Precedentes da Corte. O art. 1.539 do Código Civil de 1916 (art.
950 do vigente), na parte final, estabelece que a pensão será correspondente à
“importância do trabalho, para que se inabilitou, ou da depreciação que ele
sofreu”. Com isso, o que vale para a fixação do percentual, em princípio, é a
incapacidade para o trabalho que exercia no momento do ato lesivo, pouco
relevando que haja incapacidade apenas parcial para outras atividades, salvo
a comprovação de que o ofendido efetivamente exerce outro emprego
remunerado. A mera possibilidade de fazê-lo está fora da presunção legal. A
questão dos lucros cessantes fica ao desabrigo, no caso, porque não provado
24
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume III, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 36
pela instituição financeira que não poderia ter ocorrido. (REsp 569351 / MG ;
RECURSO ESPECIAL 2003/0128884-0)
Responsabilidade civil – Lucros cessantes não se presumem – Necessidade
de demonstração plena de sua existência – Verba indevida – Recurso não
provido (RJTJSP, 99:140).
IV-E) DA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS
DA EXCESSIVA PRETENSÃO DA AUTORA
Inicialmente, sempre deve ser repisado, conforme
já demonstrado, por fatos e documentos, o Clube ....... não teve nenhuma
responsabilidade ou culpa pela agressão sofrida pela Autora.
Todavia, a Autora requer o pagamento de
indenização por danos morais no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) e
estéticos no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).
Segundo Maria Helena Diniz25, "o dano moral
vem a ser a lesão de interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica,
provocada pelo fato lesivo".
O dano estético, por sua vez, é conceituado como
"toda alteração morfológica do indivíduo que, além do aleijão, abrange as
deformidades ou deformações, marcas e defeitos, ainda que mínimos, e que
impliquem sob qualquer aspecto um afeiamento da vítima, consistindo numa
simples lesão desgostante ou num permanente motivo de exposição ao
ridículo ou de complexo de inferioridade, exercendo ou não influência sobre
sua capacidade laborativa".
Para a ilustre professora civilista, a lesão estética,
em regra, constitui, indubitavelmente, um dano moral que poderá ou não
constituir um prejuízo patrimonial.
Seguindo-se esta linha de raciocínio, o dano moral
sempre abrangerá o estético ou morfológico, quando o prejuízo for
extrapatrimonial, pois este último, na doutrina de Maria Helena Diniz, é
espécie do primeiro.
25 Curso de Direito Civil Brasileiro, 7º Vol., Saraiva, 14ª ed., São Paulo, 2000, p. 73.
Corroborando com este pensamento, temos o
seguinte julgado, transcrito em parte:
Se em ação de indenização houve pedido de reparação pecuniária por danos
morais e estéticos decorrentes de defeitos da cirurgia e outro para pagamento
de despesas com futura cirurgia corretiva, atendido este, inadmissível será o
deferimento do primeiro (TAMG, 4ª Câmara, Ap. Cível, Rel. Juiz Mercêdo
Moreira, j. 21.8.1991, RT 692/149, in Rui Stoco, ob. cit., p. 301).
Tal foi a conclusão, transformada na resolução nº
09, tomada pelos participantes do IX ENTA (Encontro Nacional dos
Tribunais de Alçada) , realizado em agosto de 1997, em São Paulo.
"Res. 09 - O dano moral e o dano estético não se cumulam, porque ou o dano
estético importa em dano material ou está compreendido no dano moral (por
unanimidade)".
Mas o que diferencia o dano moral do estético, para
efeito de pleito de indenização, é que o segundo depende de prova.
Doutrina e jurisprudência, por maioria, entendem
que o dano moral independe de prova, bastando, para tanto a comprovação
do nexo de causalidade entre o evento danoso e os aborrecimentos, angústias
e dissabores enfrentados pela vítima, o que não foi demonstrado nesse caso,
em relação ao Clube ........
Porém, o mesmo já não ocorre com o dano estético.
Com efeito, em se tratando de um problema físico,
com evidência, há necessidade de prova insofismável do seu sofrimento.
Só teria cabimento, para o Superior Tribunal de
Justiça, a dupla indenização, de forma cumulativa, se se tornar possível “que
um dano e outro sejam reconhecidos autonomamente 26 ”. Tal acontecerá
quando o dano estético e o moral, “ainda que decorrentes de um mesmo
sinistro”, permitam “a identificação das condições justificadoras de cada
espécie” 27 .
Obviamente, não se pode falar em dano estético se
não está presente (fisicamente) na pessoa, ainda mais se não utiliza a própria
imagem para fins econômicos, como é o caso.
26
Resp., 193.880-DF, Rel. Min. Ari Pargendler, ac. 07/08/2001, DJU 17/09/2001.
27
Resp. 249.728-RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho, ac. 06-12-2001, DJU 25/03/2002.
Os documentos juntados pela Autora, todos do ano
de 2002, isto é, de 4 (quatro) anos atrás, não provam o suposto dano estético
sofrido.
Indevida, pois, a indenização pleiteada pela Autora,
a este titulo, porquanto não arrolou nenhuma prova cabal e insofismável da
sua existência.
Ademais, a par da falta de provas dos supostos
danos estéticos sofridos, não restou demonstrado se decorreram da agressão
propriamente dita ou se de tratamentos posteriores. Nessa hipótese, com
evidência, nenhuma responsabilidade tem o Réu - Clube ........
Contudo, ainda que se considere a ocorrência de
dano, e conseqüente obrigação à reparação, o que se admite apenas por amor
ao argumento, as quantias pleiteadas são absolutamente improcedentes.
Para que se conserve a credibilidade que deve ter
um possível ressarcimento econômico do dano moral, necessário agir com a
indispensável prudência, não se podendo desprezar, ao estabelecer a
indenização, o comedimento que se recomenda.
Não é possível transformar o resultado de uma
briga de jovens, provocada, tanto pela ofendida quanto pelo agressor, numa
fonte de enriquecimento sem causa,
Na reparação do dano moral o magistrado deverá apelar para o que lhe
parecer eqüitativo ou justo, agindo sempre com um prudente arbítrio,
ouvindo as razões das partes, verificando os elementos probatórios, fixando
moderadamente uma indenização. O valor do dano moral deve ser
estabelecido com base em parâmetros razoáveis, não podendo ensejar uma
fonte de enriquecimento - "Indenização por Dano Moral", de Maria Helena
Diniz, in Revista Jurídica Consulex nº 03 1997.
(RT 939/155) - Dano moral - Cabimento - Irrelevância de inexistir dolo ou
intenção de causar prejuízo no ato praticado Prova inexpressiva nos autos
sobre a repercussão da ofensa do ofendido - Verba a ser fixada
arbitrariamente e, portanto, com moderação e prudência - Fixação em
salários mínimos.
Dano moral - Indenização - Inexistência de repercussões justificadoras de
quantia elevada - Arbitramento moderado e eqüitativo mantido - Recurso
adesivo improvido. A indenização por dano moral deve ser arbitrada
moderada e eqüitativamente para que se não converta o sofrimento em
motivo de captação de lucro. (2º TACivil - Ap. nº 507.576 - 2ª Câm. - Rel.
Juiz Vianna Cotrim - J. 16.02.1998) - in Bol. AASP nº 2063 - p. 5 - nº 32.
O pedido é excessivo e não conta com respaldo
jurídico para tanto, mormente quando se verifica a amplitude e repercussão
do suposto dano ora em tela. Nossos Tribunais, ainda que se trate de morte,
não fixam a indenização em valores como o perseguido pela Autora.
Dano Moral - Responsabilidade Civil do Estado - Morte de menor com nove
meses de idade - Disparo de arma de fogo por Policial Militar Em Serviço Reparação do dano fixada em vinte salários mínimos - Súmula 49]ISTF.
(Tribunal de Justiça de São Paulo - Ap. Cív. 4.435-1 - Capital - Rel. Des.
Novaes de Andrade - in Jurisprudência Brasileira - vol. 157 - pág. 222).
Desse modo, ainda que fosse devido algum valor a
título de indenização - o que, novamente, se admite tão somente para
argumentar - não poderia ser o pleiteado, porque excessivo e desprovido de
qualquer fundamento que o justifique.
Aliás, eventual indenização por dano moral deve
levar em conta que o ofendido não pode ficar em situação melhor do que
aquela que se encontrava antes de ter sofrido o pretenso dano.
É sabido, à saciedade, que a indenização, deve situar se, o mais que possível,
dentro da razoabilidade e da realidade, evitando-se, ainda, que a vítima de
dano moral venha a enriquecer-se por conta do mesmo; não é esta, à toda
evidência, a intenção da lei; o dano moral não pode e não deve ser causa de
enriquecimento do ofendido; a indenização, em que pese ao arbítrio do
Magistrado, deve ser fixada em montante compatível - in Lex JTJ 177/89 Apelação Cível nº 218.449-1 - São José do Rio Preto - Rel. Des. Antonio
Manssur.
Também, deve ser considerada a culpa concorrente
da ofendida, nos termos do art. 945 28 do Código Civil.
Sempre reiterando, ser lamentável e injustificável a
agressão sofrida pela Autora, por parte do Sr. ..............., entretanto, não deve
ser desprezada a sua participação na geração de todo o ocorrido ao chegar às
vias de fato com a Sra ......., namorada daquele.
Sem dúvida, tivesse ela outra atitude ou
comportamento, mais dignos, não teria se envolvido em tamanha confusão.
Porquê, ao invés de retrucar a agressão da Sra .......,
não comunicou o fato ao responsável pelo evento ou para qualquer
segurança ali presente?
28 Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada
tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.
Possivelmente, ambos, Sra ....... e Sr. ...............
teriam sido retirados da festa e nada aconteceria.
IV-F) CONCLUSÃO
De tudo quanto foi posto na inicial e argumentado,
conclui-se que:
- indevida a concessão de justiça gratuita para a Autora;
- o pedido formulado pela Autora está prescrito;
- o Réu - Clube ....... não tem nenhuma responsabilidade ou culpa para com o
ocorrido com a Autora;
- a Autora concorreu diretamente para com o evento danoso;
- os danos materiais não restaram devidamente comprovados;
- o pleito de indenização por lucros cessantes é descabido, também, devido à
falta de provas e demonstração do que a Autora “deixou de lucrar”;
- igualmente, a indenização por danos estéticos é indevida, em razão da
inexistência de provas de sua ocorrência;
- por todas estas razões, em relação ao Clube ......., a ação é improcedente.
Mas não é só.
A ação proposta pela Autora se constitui numa
aventura jurídica. Bem por isso, deve ser rejeitada.
Tal como escreve José Afonso da Silva 29 :
A vida humana não é apenas um conjunto de elementos materiais. Integramna, outrossim, valores imateriais, como os morais. A Constituição empresta
muita importância à moral com valor ético-social da pessoa da família, que
se impõe ao respeito dos meios de comunicação social (artigo 221, inciso
IV). Ela, mais que as outras, realçou o valor da moral individual, tornando-a
mesmo num bem indenizável (artigo 5º, incisos V e X). A moral individual
29 Curso de Direito Constitucional Positivo. 7ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, pág. 179
sintetiza a honra da pessoa, o bom nome, a boa fama, a reputação que
integram vida humana como dimensão imaterial. Ela e seus componentes são
atributos, em os quais a pessoa fica reduzida a uma condição animal de
pequena significação. Daí por que o respeito à integridade moral do
indivíduo assume feição de direito fundamental.
O que se põe a discussão, frente a lição,
parcialmente transcrita, do ilustre jurista acima citado, consiste na
banalização dos pleitos de indenização por dano moral.
A “indústria” do dano moral segundo alguns
operadores do direito.
Com isso, as pessoas estão ávidas pela procura de
buscar qualquer indenização por danos morais.
Algumas
cometem
atos
desavisados,
inconseqüentes, atitudes irresponsáveis, beirando à falta de educação e
civilidade, para ao depois, pleitear indenização por danos morais.
Não raro, instam a brandir uma arrogância sem par,
principalmente perante os menos favorecidos, de modo a ostentar uma
sobrepujança, pseudo moral ou econômica, frente aos mais fracos, não mais
das vezes, perante os da mesma condição social.
E via de regra, sobre o pálio da impunidade, porque
praticam a máxima de que “rico não vai para a cadeia”.
Em suma, por pouco ou quase nada, muitas vezes
por questões de somenos importância ou ridículas se metem em confusões,
dando causa à agressões mútuas.
E quando se dão mal, ou seja, saem em
desvantagem dessas desventuras, tendem a “processar” os desafetos e quem
mais possam, como se uma ação judicial fosse o remédio para todas as suas
ignorâncias. Muitos não são vítimas; são co-autores.
E o palco desses acontecimentos está na vida
noturna de uma mega-metrópole como São Paulo, onde proliferam bares,
danceterias, restaurantes e boates de todo o tipo, onde os jovens buscam,
nem sempre um divertimento saudável, mas uma pseudo afirmação para seus
complexos e desvios de personalidade.
E neste seio de violência desenfreada em que
vivemos, destacam-se os casos policiais que se acumulam pelas Delegacias
de Polícia, e, por conseguinte, com as ações cíveis e penais daí decorrentes.
Mas, o que não se pode admitir é a
responsabilização imoderada e inconseqüente de pessoas, entidades,
empresas, órgãos públicos, pelos desatinos praticados por pessoas dessa
estirpe.
Revela-se, pois, descomunal absurdo, a pessoa que
provoca ou causa uma briga na portaria da boate, sofre conseqüências físicas
do desatino, e, depois processa a empresa por não lhe proporcionar
segurança adequada.
Da mesma forma, provoca rixas, pratica abusos, é
preso, depois processa o Estado por abuso de autoridade dos policiais ou por
danos morais.
E como, via de regra, os danos materiais são
irrisórios, apelam pelos danos morais.
Enfim, falta moral, mas a moral protegida pela
Constituição, na lição do ilustre mestre acima anotado.
Daí, a banalização das ações por danos morais.
Voltando aos comentários do ilustre Ministro
Carlos Alberto Menezes Direito 30 , aduz que “A vida moderna é cada vez
mais arriscada, vivemos perigosamente, de sorte que, quanto mais o homem
fica exposto a perigo, mais experimenta a necessidade de segurança. Logo, o
dever jurídico que se contrapõe ao risco é o dever de segurança. (...) A noção
de segurança tem também uma certa relatividade; depende do casamento de
dois elementos: a desconformidade com a expectativa legítima e a
intensidade do risco criado pela atividade, isto é, a probabilidade que ela tem
de causar dano. Caberá ao julgador, ao intérprete, aferir, em cada caso
concreto, o grau dessa periculosidade e a exigência de segurança
legitimamente esperada. O que se quer é uma segurança dentro dos padrões
da legítima expectativa da coletividade. Os serviços que geram obrigação de
resultado, por exemplo, terão que ser prestados com tal segurança que o
resultado alvejado seja efetivamente alcançado; o passageiro terá que ser
levado são e salvo ao seu destino. Nos serviços que geram obrigação de
30
Comentários ao Novo Código Civil, 2ª edição, Volume XIII, Coordenador Sálvio de Figueiredo Teixeira,
pág. 153 / 155.
meio, não haverá falar em defeito do serviços, ainda que o resultado não
tenha sido alcançado, se a atividade foi desenvolvida com segurança
esperada”.
Tais ponderações se coadunam ao presente caso.
Até pode ser que não se apliquem à Autora.
Mas, que culpa tem o Clube ....... pela agressão
sofrida pela Autora, cujo tumulto, pressupõe-se, teve origem em
comportamento seu?
Porquê não agiu adequadamente, comunicando a
conduta reprovável da Sra ....... aos organizadores?
E ainda que assim não seja, qual a responsabilidade
do Clube ....... para com a ignorância e truculência do agressor?
Alegar que o Clube ....... concorreu para com a
agressão, por não ter propiciado a devida segurança é por demais
inverossímil. Os fatos e as provam contradizem tal argumento.
E ainda que lá existisse um segurança para cada
pessoa, certamente as agressões não seriam e nem poderiam ser evitadas,
porque decorreram da incivilidade, da ignorância.
Contra a ignorância, não há segurança que possa
evitar qualquer desfecho desastroso, salvo se contornado por força policial, a
exemplo do ocorrido recentemente.
Por tal razão, não há que se falar em
responsabilidade e culpa quando as causas decorrem da ignorância das
pessoas.
Devem, isto sim, tanto
agressor(es) responderem pelos seus próprios atos.
vítima(s)
quanto
É legítimo o direito da Autora em buscar o
ressarcimento dos danos materiais e morais suportados, principalmente,
contra o agressor (Sr. ...............), se é que são devidos, a serem provados no
curso desta ação.
Mas, em face do Clube ......., data venia, não tem
cabimento.
Da interpretação exaustiva dos artigos nos quais
fundou sua ação, conclui-se que induvidosamente o Clube ....... não tem
nenhuma responsabilidade e muito menos culpa (objetiva ou subjetiva).
E Autora tem pleno conhecimento disso.
A única explicação plausível, para direcionar a
presente ação contra o Clube ....... é a busca por um locupletamento
indevido.
Ora, sabendo que os danos materiais suportados
são irrisórios (R$ 3.830,00), pretende uma gigantesca indenização por
supostos danos materiais e estéticos, de modo a obter uma “vantagem
indevida”, em compensação à agressão sofrida.
Por isso, intentou a ação também contra o Clube
......., imaginando tratar-se de clube rico.
Ledo engano. O Clube ....... é uma associação sem
fins lucrativos. Tem por receitas apenas as mensalidade dos seus associados,
as quais, na verdade, nada mais representam do que o reembolso das
despesas incorridas por seus associados. Nem possui aplicações financeiras.
Contudo, finalizando, convém citar artigo da lavra
de Ives Gandra da Silva Martins, publicado no jornal "Folha de São Paulo",
sob o título "A imprensa e os danos morais", transcrevendo alguns trechos
que se encaixam à situação presente:
E hoje qualquer assunto é objeto de ações por dano moral, como se a honra
tivesse preço e devesse ser restabelecida não por um gesto de dignidade, mas
por um punhado de reais.
O estratagema demonstra a irresponsabilidade com que a matéria vem sendo
levada aos tribunais, sempre colocando o ofendido em posição de absoluta
vantagem processual e sem riscos e o ofensor em total desvantagem,
correndo todos os riscos nas ações por danos morais. Para mim, a honra não
tem preço. Quem tem verdadeiramente honra sabe que não há dinheiro que a
pague.
Neste diapasão, mister reproduzir trabalho
doutrinário do MM Juiz de Direito, Dr. Antonio Jeová Santos 31 , que
preleciona:
Diante da possibilidade de um ganho fácil, pessoas se colocam como vítimas
de danos morais e tudo fazem para lograr o intento principal, que é a
indenização. Há quem torça para ser ofendido. Há quem paga conta em
agência bancária diversa daquela em que o título de crédito se encontra, para
contar com a dificuldade na comunicação interna das agências bancárias
para, depois, auferir lucro. Existe até quem provoque seguranças em
supermercado para ver se é acusado de furto de algum objeto de pequeno
valor para pleitear vultosas indenizações por danos morais.
Famoso jurista, conhecido pela verve ferida, já chegou a afirmar que alguém,
diante de uma notícia infamante, em vez de permanecer entristecido e
pesaroso com a nota indigna, chegará em casa, beija a esposa e os filhos para
arrematar em seguida: "Querida, agora ficaremos ricos.
Sofri uma
caluniazinha pela imprensa. Isso custará um bom dinheiro para jornal e
embolsaremos parte desse dinheiro. "
Pessoas que posam de vítima ou que provocam o fato para se tornarem
ofendidos, criando, assim, condições para o pleito ressarcitório, por certo,
merecerão todo o repúdio do órgão jurisdicional Enquanto que o Direito
brasileiro está vivendo nova fase quanto à efetiva proteção aos direitos da
personalidade, é necessário que os cuidados sejam redobrados para evitar
condenações de pessoas que foram vítimas de supostos ofendidos por danos
morais.
Existem aqueles que, de maneira proposital, deixam o título ser protestado,
apesar de poder ter evitado o protesto se exibisse ao banco, na primeira
oportunidade em que cobrado, o recibo de quitação. Porém, o que significa o
protesto, diante da possibilidade de arrancar algum dinheiro de
estabelecimento bancário vigoroso financeiramente? A pessoa se predispõe a
ser vítima. Aproveita-se de eventual erro para que seja criada a possibilidade
da indenização. Esse verdadeiro catálogo, trepidante no cotidiano forense,
será diminuído. Enquanto isso não ocorre, há de se pôr cobro a qualquer
tentativa de lucro fácil.
Isso vem ser dito, não por entender que exista uma indústria de danos morais,
apenas. O que há é a volúpia por ganhar algum dinheiro. Não que esteja
sendo defendida a vulneração da dignidade da pessoa humana. O que é
verificado com a pletora de pedidos que buscam esse tipo de indenização, em
sua maioria, é não deixar passar em branco atos que violem direitos
fundamentais. Se, de um lado, o Brasil ainda continua dando pouco valor à
dignidade humana, por outro lado há quem se aproveite dessa fraqueza, para
angariar alguma vantagem. Para extremar essa dificuldade é que os militantes
do Poder Judiciário afastam pretensões que nada têm de dano moral.
Enfim, ad argumentandum, se se levar em conta, o
grau de participação do Clube ......., aliada à culpa concorrente da Autora,
31 Dano Moral Indenizável", de Antonio Jeová Santos - 2ª edição revista, atualizada e ampliada - Ed.
Lejus 1999 - p. 125, 126 e 127.
pelo disposto no art. 944 32 do Código Civil, rigorosamente, o Réu - Clube
......., nada deve indenizar a Autora.
V - DO PEDIDO
Ante todo o exposto, requer, primeiramente, seja
denunciada à lide Sra ......., na forma pleiteada.
De outra banda, caso não seja acolhida a preliminar
argüida, no mérito, não merece guarida a pretensão deduzida no libelo,
devendo, pois, ser decretada a improcedência total da ação, condenando-se a
Autora nos ônus da sucumbência.
Pretende o Réu provar o alegado por todos os
meios em direito admitidos, inclusive depoimento pessoal da Autora, oitiva
de testemunhas, juntada de outros documentos e perícia, se necessários.
N. Termos.
P. e E. Deferimento.
São Paulo, 17 de abril de 2006.
JOÃO BATISTA CHIACHIO
OAB/SP 35.082
32 Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.
Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz
reduzir, eqüitativamente, a indenização.

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