Pensamento do Dia Pensamento do Dia

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Pensamento do Dia Pensamento do Dia
Pensamento do Dia
Economistas analisam a Economia, o Brasil
e o mundo,
mundo, na mídia diária 22 05 2009
----------------------------------------------------------------------------------------------Folha de S.Paulo 22 05 2009
Para economistas, Estado deve
reduzir custeio
Na crise, governo deve concentrar despesas em investimentos,
afirmam palestrantes do Fórum Nacional
DA SUCURSAL DO RIO
Encerrada ontem no Rio, a 21ª edição do Fórum Nacional gerou pelo menos um
consenso: o país deve conter, nestes tempos de crise, o crescimento dos gastos
de custeio da máquina pública, a fim de liberar mais recursos para
investimentos e reforçar seu caixa para poder manter as políticas anticíclicas
adotadas até agora com relativo sucesso pelo governo.
Entre os presentes aos debates, compartilharam de tal opinião os economistas
Raul Velloso, Affonso Celso Pastore e João Paulo dos Reis Velloso -que preside o
Inae (Instituto Nacional de Altos Estudos), responsável pelo fórum.
"O problema é que o investimento público está desaparecendo e ele é
indispensável neste momento para fomentar a economia", avalia Reis Velloso.
Em 1987, um ano antes de a Constituição "cidadã" de 1988 criar uma série de
vinculações orçamentárias, 16% da despesa pública total era destinada aos
investimentos. Esse percentual caiu para 3% nos primeiros anos do governo
Lula e só se recuperou para a faixa atual de 5% a 6% graças ao aumento
"excepcional" da arrecadação nos últimos dois anos, segundo Raul Velloso.
Especializado em finanças públicas, o economista diz que 85% das despesas da
União são referentes a pagamento a pessoas. Nesse bolo estão a folha de
pagamento, os programas sociais e o INSS -que responde, sozinho, por 21%
do total.
Isso, diz, "engessa" o Orçamento e impede a expansão das atuais políticas
anticíclicas levadas adiante pelo governo -como as desonerações fiscais
promovidas para estimular setores importantes da economia. "Como a receita
não vai subir por causa da crise, temos de conter gastos de custeio", concorda
Reis Velloso.
Para o economista Affonso Celso Pastore, o governo acertou ao adotar políticas
de estímulo à economia e só teve fôlego para tal graças a medidas
questionadas por muitos no passado. Citou a "desdolarização" da dívida pública
e o acúmulo de reservas cambiais.
"Muitos diziam: "Não vale a pena fazer isso porque é muito caro". Mas foram
medidas importantes e que agora permitem a adoção de políticas anticíclicas",
afirmou.
O presidente do Ipea, Marcio Pochmann, disse ainda que o ajuste promovido
possibilitou o reajuste real do salário mínimo e a expansão do número de
beneficiários do programa Bolsa Família. Ambos, diz, geraram uma massa
adicional de consumo, que também contribuiu para conter o desaquecimento da
economia provocado pela crise.
Bolsa Família
Ontem, no último dia do fórum, os programas sociais do governo foram
debatidos. O ex-secretário de Planejamento da Presidência da República
Roberto Cavalcanti de Albuquerque analisou como positiva a transferência
pública de renda por meio da Previdência Social e do Bolsa Família. No entanto,
em sua avaliação, a inserção dos mais pobres na economia só será assegurada
"através da ocupação".
Para ele, é necessário superar as desvantagens enfrentadas pelas camadas
mais populares, principalmente no que se refere à escolaridade.
Cláudio de Moura Castro, ex-chefe da área social do Banco Interamericano de
Desenvolvimento, ressaltou, em sua palestra, que, além da escolarização
maior, é necessário oferecer também uma educação de qualidade à população.
Segundo ele, os estudos sociais devem analisar esse aspecto para avaliar
melhor o motivo das desvantagens enfrentadas pelos mais pobres.
--------------------------------------------Folha de S.Paulo 22 05 2009
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Entendendo a dinâmica do real
A alta do real é difícil de ser
controlada; o BC pode apenas
modular a valorização via
compras da moeda americana
NA ÚLTIMA quarta, o Banco Central comprou mais de US$ 1 bilhão para evitar
uma valorização significativa do real. No momento seguinte à realização do
leilão, nossa moeda retomou o caminho de alta, flertando com a cotação de R$
2,00. Apenas uma piora nos mercados internacionais na parte final do dia -e
que continuou ontem- evitou que essa fronteira simbólica fosse cruzada. Mas,
se o otimismo permanecer, será uma questão de tempo para que o mercado
teste novamente o Banco Central.
Com o expressivo fortalecimento do real -quase 10% neste mês-, volta ao
debate a questão da taxa de câmbio no Brasil. Como sempre, as questões
econômicas acabam por radicalizar as posições dos analistas.
De um lado, estão os que defendem uma intervenção agressiva do BC para
anular esse movimento e culpam os juros elevados por tudo o que está
acontecendo. De outro, estão os que dizem que em um regime de metas de
inflação a taxa de câmbio deve variar livremente seguindo as forças de
mercado.
Não vou entrar no mérito dessas duas posições. Quero apenas dividir com o
leitor da Folha meu entendimento sobre as forças que estão atuando no câmbio
neste momento. Acredito que vivemos uma dinâmica nova, criada
principalmente pelo otimismo com que os mercados internacionais veem hoje a
economia brasileira. Passar pela crise em condições satisfatórias foi
fundamental para consolidar essa avaliação.
Credenciado por isso, o real mudou de qualidade e passou a fazer parte de um
seleto grupo de moedas emergentes.
Essa cesta flutua em função da força ou da fraqueza da moeda americana nos
mercados, medida principalmente em relação ao euro e ao iene japonês. Em
setembro, quando a falência do Lehman Brothers colocou o sistema financeiro
mundial à beira do precipício, houve corrida ao dólar. Naquele momento de
pânico, ele foi visto como moeda refúgio dos capitais financeiros e como
proteção de patrimônio em geral. O resultado foi uma desvalorização
generalizada da maioria das moedas, principalmente as dos emergentes. O real
foi apanhado por essa tormenta e perdeu quase 40% de seu valor. O mesmo
ocorreu com o won coreano, o peso mexicano, a lira turca e outras moedas
emergentes. Mesmo o euro e a libra inglesa perderam valor.
Em meados de março, com a volta de certa dose de confiança em relação à
recuperação da economia mundial, esse movimento começou a ser revertido.
Os dólares acumulados nos dias de pânico estão sendo reciclados, provocando
uma mudança na sua valorização dos últimos meses. A contrapartida desse
movimento é o fortalecimento das demais moedas, principalmente algumas
ligadas às economias que se portaram bem na crise, como o real.
Nossa moeda está sendo procurada de maneira intensa por investidores
ansiosos em diversificar seus investimentos. Uma nova onda de entrada de
capitais está ocorrendo e, se não acontecer uma reversão das expectativas em
relação à economia mundial, deve continuar. Esse movimento é difícil de ser
controlado sem uma coordenação entre bancos centrais, pois não é localizado
apenas no Brasil. O BC pode apenas modular a valorização via compras da
moeda americana no mercado, pela colocação dos chamados "swaps" cambiais
reversos e por uma redução mais agressiva da taxa de juros Selic. Tentar
administrar o valor do real sem levar em consideração essa nova dinâmica pode
custar muito caro.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 66, engenheiro e economista, é
economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro
das Comunicações (governo Fernando Henrique Cardoso).
------------------------------------O Estado de S.Paulo 22 05 2009
Consequências do 'paternalismo
libertário'
Dionísio Dias Carneiro*
Dadas as perspectivas de uma recessão mundial prolongada, os governos
buscam estratégias para sustentar os gastos de consumo e a oferta de crédito.
Quanto mais aumenta a capacidade ociosa, mais sentido faz o uso de medidas
de estímulo, de modo a quebrar o círculo vicioso da depressão.
Nos programas em andamento, o conteúdo dos gastos públicos e os efeitos das
renúncias fiscais têm atraído maior atenção do que o tamanho das despesas
supostamente anticíclicas. Mas os estímulos econômicos são sempre uma
mistura de incentivos genéricos e induções a ações específicas. Os estudos
experimentais que renderam ao psicólogo Daniel Kahneman, da Universidade
de Princeton, o Prêmio Nobel de Economia em 2002, mostraram a fragilidade
empírica do homo economicus dos modelos de escolha racional e permitiram
maior entendimento do papel que preconceitos, o acaso e a heurística
desempenham nas escolhas individuais. Num livro recente, Nudge, dois
professores da Universidade de Chicago, Richard Thaler e Cass Sunstein, a
partir da constatação de que as escolhas individuais, na prática, dependem de
fatores usualmente desprezados pelos economistas, argumentam que políticas
públicas devem fazer uso do que denominam "paternalismo libertário", uma
doutrina que valoriza a liberdade de escolha dos indivíduos, mas considera o
papel do que denominam "arquitetura da escolha" no comportamento dos
agentes. Exemplos dessa arquitetura: a ordem em que os objetos são exibidos
nas prateleiras, a facilidade com que os indivíduos possam escolher
"racionalmente" sua dieta e a força da inércia na escolha de planos de
aposentadoria. Importantes assessores de Obama, como Rahm Emanuel e
Peter Orszag, têm sido apontados como adeptos do paternalismo libertário.
Isso ajuda a entender a importância prática do pragmatismo de base empírica,
que ora substituiu o "conservadorismo piedoso" do grupo Bush II. O novo grupo
pretende usar o Estado para dar uma "cutucada" (minha tradução livre para
nudge) nos agentes, mas mantém o respeito pela liberdade da escolha
individual, o que tem incomodado a esquerda Democrata.
Uma implicação prática dessa postura é a preferência por cortes de impostos
direcionados, em vez de medidas para só aumentar a renda disponível das
famílias. Países latinos sempre valorizaram a discricionariedade dos estímulos,
a exemplo do aumento do subsídio para a compra da casa própria, que o
governo brasileiro instituiu em seu plano habitacional. Na China, o governo
combina medidas como a generalização do programa de apoio à velhice e à
garantia da assistência médica, que abre espaço para as famílias pouparem
menos, se tiverem confiança na sustentação do programa. Em outros, medidas
protecionistas predominam apesar do discurso pelo livre comércio. Nos EUA, o
governo reluta em receber de volta prematuramente o dinheiro do Tarp, porque
prefere manter controle sobre os bancos.
O fato é que esta crise tem feito o pêndulo tender valorizar o dirigismo, dada a
lentidão com que os gastos e as quedas de juros agem sobre as decisões de
famílias e empresários. Não se sabe até que ponto essa tendência vai gerar um
mundo pior após a recessão, mas as consequências das atuais escolhas dos
governos terão impacto diverso no bem-estar futuro das nações. Para países
que ainda têm muitas pessoas fora da economia moderna e da proteção social,
não escolher corretamente medidas de estímulos que produzam maior
crescimento no futuro significa agravar os conflitos sociais ao final do ciclo. Um
exemplo é o excesso de gastos irreversíveis, mudanças tributárias ao sabor de
lobbies ou a submissão a conflitos do calendário político. Em países ricos, a
correção de situações insustentáveis, como a falta de acesso de um contingente
da população ao atendimento médico-hospitalar adequado, diminuirá a
incerteza das famílias quanto ao futuro. Isso ajuda a sustentar o consumo
presente, mesmo que possa resultar numa arquitetura de escolha diferente
daquela utilizada no passado. Para países mais pobres, como o Brasil, o abuso
das "cutucadas" tende a piorar a qualidade dos estímulos. Como nunca fomos
"libertários", o excesso de paternalismo incentivará escolhas individuais que
podem agravar os desequilíbrios futuros. Na prática, devemos nos preparar
para um novo ciclo de endividamento público e menor crescimento no final
deste ciclo.
*Dionísio Dias Carneiro, economista, é diretor da Galanto Consultoria e
do IEPE/CdG
Correção - No artigo de 20/5, Ruy M. Altenfelder Silva é presidente da
Academia Paulista de Letras Jurídicas, e não da Academia Paulista de Letras
---------------------------------------------------Folha de S.Paulo 22 05 2009
ENTREVISTA - NOURIEL ROUBINI (“Dr. Apocalipse”)
Crise global vai continuar mesmo
depois da recessão
Para economista, movimento atual de recuperação das Bolsas não é
sustentável
DENYSE GODOY
DA REPORTAGEM LOCAL
Leia a seguir os principais trechos da entrevista de Nouriel Roubini à Folha
ontem, após participar de seminário promovido pela Serasa Experian em São
Paulo.
FOLHA - O senhor está sorrindo hoje! É difícil vê-lo assim nas fotos, nas
imagens da televisão... Isso contribui para a sua fama de "Doutor
Apocalispe"?
NOURIEL ROUBINI - [Fica sério] A crise econômica é um assunto tão grave
que, quando estou falando a respeito, simplesmente acho que sorrir não é
apropriado. As pessoas me chamam de "Doutor Apocalipse" porque fui o
primeiro a prever o atual desastre, mas prefiro ser chamado de "Doutor
Realista".
Não vejo, à nossa frente, uma depressão ou uma longa recessão, como muitos
apontam. Creio que vamos sair desta crise no ano que vem. Ainda estou
preocupado, no entanto, com determinados aspectos econômicos de curto
prazo.
FOLHA - Alguns analistas afirmam já detectar aqui e ali sinais de
recuperação da economia americana. Quais indicadores realmente
apontam o começo de um restabelecimento e quais não devem ser
interpretados assim?
ROUBINI - Os índices mais importantes a acompanhar são os relativos a
consumo, investimento das empresas, produção industrial e mercado
imobiliário. Eles continuam caindo. Só que estão recuando menos do que o
observado no ano passado -se apresentassem o mesmo ritmo de queda dos
últimos meses de 2008, não estaríamos em uma recessão, mas em uma
depressão profunda. Isso não significa uma luz verde, mas uma luz amarela, na
minha opinião. Não se pode tomá-los como indicativos de retomada.
FOLHA - Então, em que ponto da crise nos encontramos agora?
ROUBINI - Eu havia afirmado que a recessão dos EUA duraria 24 meses.
Como começou em dezembro de 2007, deve terminar em dezembro de 2009.
Transcorridos 17 meses, já passamos de dois terços do caminho, portanto, em
termos de recessão. Entretanto, não chegamos nem perto do fim da crise
bancária ou de crédito -esta deve levar mais dois ou três anos para passar.
FOLHA - O senhor quer dizer que não se deve comemorar o fato de já
ser possível avistar o final do período de contração?
ROUBINI - Sim. No caso de economias avançadas como os EUA, a Europa e o
Japão, o cenário para os próximos dois anos é de crescimento abaixo do
potencial. O potencial americano é de um avanço de 2,75% a 3% ao ano, mas
ficará abaixo de 1% em 2010, o que é medíocre. Apesar de não estar mais em
uma recessão, tecnicamente falando, o sentimento no país será o de estar
porque o desemprego seguirá subindo por ao menos um ano e meio. Assim
aconteceu nas últimas duas retrações, em 1991 e 2001, e tende a se repetir.
FOLHA - Quais são as perspectivas para o Brasil?
ROUBINI - O Brasil deve no máximo apresentar crescimento zero neste ano; o
mais provável é que tenha uma pequena retração do PIB [Produto Interno
Bruto], entre 0 e 1% negativo. Após fortes quedas no último trimestre de 2008
e no primeiro deste, o desempenho fica positivo no segundo, pelas nossas
previsões. A sorte do Brasil é possuir um mercado doméstico robusto a ser
explorado. Já as exportações dependem mais da recuperação do preço das
commodities, que dependem da retomada da China. Com uma agressiva
política de governo, a China realmente tem reagido nos últimos meses.
FOLHA - Os seus críticos argumentam que o senhor previu essa crise
diversas vezes nos últimos anos, por isso acertou.
ROUBINI - Ouvi essa história de que até mesmo um relógio parado está certo
duas vezes por dia. Mas essas críticas são tolas e injustas, pois não fiz
previsões genéricas sobre a crise, basta ler com atenção tudo o que escrevi. Fui
bastante específico, dei detalhes sobre os problemas financeiros, quando e
como seriam os seus desenvolvimentos. Por exemplo, falei, um ano e meio
atrás, que dois grandes bancos de investimento dos EUA iriam à lona em dois
anos. Adivinhe. Levou sete meses apenas para o colapso do Lehman Brothers e
do Bear Stearns. Pode-se dizer na verdade que eu fui até muito otimista
quando falei de prazos.
FOLHA - Onde o senhor tem investido o seu próprio dinheiro?
ROUBINI - Nos últimos três anos, deixei na poupança ou em títulos de
depósito interbancário, bem longe do mercado financeiro. Aí me falam: "Você
ganhou quase zero". Bem, é melhor ganhar zero do que perder 50%, não é?
Continuo fora do mercado financeiro porque ainda vejo riscos de recuos
macroeconômicos e no lucro das empresas, além de turbulências no setor
financeiro. É claro que vai chegar o tempo de recuperação do preço dos ativos
financeiros em nível global. Porém, só vejo isso ocorrendo daqui a um ano ou
até um ano e meio. Não acredito que a escalada recente das Bolsas seja
sustentável, porque o movimento está indo além do que os dados sobre a
economia permitem. Por esse motivo, pode haver uma correção.
FOLHA - Como tem sido a vida de economista-celebridade? O que
mudou na sua rotina?
ROUBINI - Não acho que eu seja uma celebridade porque não tenho vida de
celebridade. Trabalho 12 horas por dia, sete dias por semana, e gasto 80% do
meu tempo viajando pelo mundo. Se eu fosse celebridade, não estaria
passando a vida a conversar com jornalistas e outros pesquisadores -eu estaria
pegando uma praia no Rio de Janeiro [risos]. É muito trabalhoso fazer análise
porque requer que visitemos o mundo inteiro para falar com pessoas,
empresários, investidores, autoridades. Não tenho uma bola de cristal.
FOLHA - Circula uma piada segundo a qual os únicos que estão
lucrando com a atual crise são os advogados, por causa das falências
de empresas, e os economistas, que nunca deram tantas palestras.
Entendo que o seu trabalho seja desgastante; no entanto, é uma
oportunidade de ganhar dinheiro e fazer o seu nome no planeta todo.
ROUBINI - O momento é bastante complexo e interessante para os
economistas. Aconteceram mais coisas no último ano e meio do que nos 70
anteriores. Só acho que não se pode dizer que alguém está tirando vantagem
da pior crise financeira desde a Grande Depressão. Há enormes custos
humanos, sociais, fiscais. É muito sério. Eu e os outros economistas estamos
engajados em ajudar o mundo a entender o que aconteceu e a buscar uma
solução.
----------------------------------------Valor Econômico 22 05 2009
Os testes de estresse: início do fim da
crise?
Armando Castelar Pinheiro
O anúncio inicial, em fevereiro passado, foi um desastre de comunicação. Não
muito diferente do que acontecia no Brasil com os planos da segunda metade
dos anos 1980, o Plano de Estabilização Financeira (PEF), com o qual o governo
Obama quer acabar com a crise dos bancos americanos, continha um excesso
de rótulos novos e pouco detalhe. O mercado reagiu mal, suspeitando que o
plano ia fracassar como os anteriores.
Em contraste, os resultados dos testes de estresse, um dos três pilares do PEF,
foi um sucesso de comunicação, dos vazamentos que antecederam à divulgação
oficial aos números em si, que foram suficientemente punitivos para mostrar
que os testes tinham sido feitos a sério, mas não tão ruins que sugerissem a
incapacidade de algum dos grandes bancos sobreviver sem ser estatizado. Isso
fez dos testes o ponto alto de três meses de uma campanha de comunicação
por autoridades e bancos para convencer a opinião pública de que a situação do
sistema financeiro estava sob controle e que o pior na economia ficou para trás.
O quanto de substância há nessa mensagem?
Em economia, as expectativas desempenham um papel chave, de forma que o
sucesso em convencer empresas e consumidores de que as coisas estão
melhorando pode ter, por si só, um efeito positivo sobre o nível de atividade e o
emprego. O mercado financeiro, por exemplo, comprou essa ideia, como
mostra a forte alta da bolsa e, em especial, das ações dos bancos, desde que o
Citibank informou, no início de março, que voltara a apresentar lucro. A alta
nas bolsas, por sua vez, facilita o trabalho dos bancos em captar recursos e faz
com que as famílias recuperem parte da riqueza perdida no último ano e meio,
tornando-as mais dispostas a consumir. Porém, as expectativas também são
mais voláteis que os fundamentos e elas não vão continuar melhorando se os
indicadores não confirmarem a melhoria do quadro econômico. As bolsas, por
exemplo, podem não continuar subindo se as empresas não lucrarem mais e
apresentarem boas perspectivas de expansão.
Nesse sentido, as atenções devem continuar voltadas para os indicadores de
solvência dos bancos e de nível de atividade, na expectativa de que eles
confirmem a visão mais otimista sobre a situação global que começa a
prevalecer.
Os testes feitos pelo governo americano mostraram que dez dos dezenove
maiores bancos do país precisam levantar mais capital - US$ 75 bilhões ao todo
- para serem capazes de enfrentar um quadro de estresse econômico em 200910. Ao todo, essas dezenove instituições teriam perdas com empréstimos e
investimentos em títulos de US$ 535 bilhões nesse período, dos quais US$ 363
bilhões seriam cobertas pelo lucro pré-provisões. As estimativas de perdas
superam as do FMI (US$ 321 bilhões), mas as de lucro também (US$ 210
bilhões), de forma que a diferença, que teria de ser coberta com capital
próprio, não é tão grande.
Há dois riscos principais envolvidos nessas estimativas. Primeiro, o cenário de
estresse macroeconômico que as sustenta não é muito pior que as projeções
medianas de mercado, de forma que não é claro se os bancos conseguiriam
superar um quadro econômico realmente adverso. Vale notar que o FMI projeta
as perdas dos bancos utilizando um cenário mais provável, e não de estresse,
como feito pelo governo americano. Segundo, que os bancos não consigam ser
tão lucrativos como supõem os testes, mesmo em um cenário base. No
primeiro trimestre de 2009 os bancos em geral apresentaram resultados muito
bons, mas parcialmente baseados em uma combinação de eventos
extraordinários (por exemplo, venda de ativos), um volume especialmente alto
de renegociações de hipotecas e forte capacidade de formação de preços nas
atividades de intermediação no mercado de capitais. Mesmo com os juros
básicos no patamar atual, o que reduz o custo de captação dos bancos, há
dúvidas sobre sua capacidade de manter esse bom desempenho. O governo
americano não quer correr riscos e deve começar em breve a implantar o
terceiro pilar do PEF, com a compra de ativos podres das carteiras dos bancos.
Em junho, a FDIC, a seguradora de depósitos bancários nos EUA, fará um leilão
piloto de compra de US$ 1 bilhão desses papéis.
Grande parte da mudança de sentimento em relação à crise se deve à
percepção de que o nível de atividade teria parado de cair, ou pelo menos
estaria caindo mais lentamente, conforme se completa o ciclo de redução dos
estoques e as políticas fiscal e monetária expansionistas começam a dar
resultado. Em particular, há grande expectativa de que o pacote de estímulo
fiscal adotado pelo governo chinês e a forte expansão do crédito no país
coloquem o PIB da China outra vez em forte expansão, ajudando as demais
economias asiáticas e os preços das commodities a se recuperarem.
Naturalmente, ao parar de cair, o nível de atividade pode simplesmente
estagnar, de forma que a desaceleração da queda não se traduz
necessariamente em recuperação. Mais fundamentalmente, o ajuste da
economia ainda está incompleto em pelo menos um aspecto. Nas últimas
décadas o crescimento mundial se calcou numa distribuição desequilibrada da
produção e da demanda, com países como os EUA, Reino Unido e Espanha
consumindo mais do que produziam, enquanto outros, como China e Alemanha,
faziam o oposto. Os superávits gerados por estes eram reciclados pelo sistema
financeiro e emprestados a famílias e empresas no primeiro grupo de países
para permitir que gastassem mais do que ganhavam. Nos países que
consumiam além dos seus meios, as famílias precisam se ajustar à perda de
riqueza sofrida e reduzir sua alavancagem financeira, o que significa consumir
menos. As instituições financeiras também precisam reduzir seus balanços, o
que limitará a oferta de crédito. No segundo grupo, por outro lado, é preciso
estimular a demanda doméstica, mas esses não parecem ter nem o desejo nem
o conhecimento para fazer isso. Como quem sabe consumir não pode fazê-lo, e
quem pode não quer ou não sabe como, a solvência dos bancos pode não
garantir sozinha a volta do crescimento acelerado.
Armando Castelar Pinheiro, analista da Gávea Investimentos e
professor do IE - UFRJ. Escreve mensalmente às sextas- feiras.
----------------------------------------------Valor Econômico 22 05 2009
O governo permitiu que os banqueiros "negociassem" os resultados de
seus testes de estresse
O capitalismo de compadres dos EUA
Sin-ming Shaw
Nenhum dos homens da equipe de Obama viu qualquer dificuldade em
aceitar a lógica absurda dos banqueiros
Por vinte anos, os americanos têm denunciado o "capitalismo de compadres"
dos países do Terceiro Mundo, especialmente na Ásia. Exatamente no momento
em que aquelas regiões começaram a aprimorar sua governança pública e
corporativa, porém - Hong Kong testemunhou há pouco a decisão inovadora de
um tribunal contra um magnata das telecomunicações que é o filho do mais rico
e poderoso homem da província - o capitalismo de compadres está deitando
raízes nos Estados Unidos, país que o mundo há muito considerava representar
uma referência das condições iguais para todos nos negócios. Os recentemente
concluídos "testes de estresse" dos bancos dos EUA são apenas o mais recente
indício de que os compadres capitalistas tomaram a capital Washington.
Não surpreende que os mercados acionários tenham gostado dos resultados
dos testes de estresse que o secretário de Estado Timothy Geithner administrou
para os bancos dos EUA, pois o resultado geral já havia sido vazado semanas
antes. De fato, a maioria dos investidores profissionais descartou os testes,
considerando-os desonestos, mesmo enquanto seus investimentos se
beneficiavam de um mercado ascendente.
Até o "The Wall Street Journal", geralmente o mais estridente chefe de torcidas
dos mercados financeiros, desacreditou abertamente da integridade dos testes.
O governo havia permitido aos banqueiros "negociar" os resultados, como um
estudante que presta um exame final e em seguida negocia sua nota.
Os testes pretensamente revelariam as verdadeiras condições de bancos
sobrecarregados com ativos tóxicos não-auditados nos empréstimos
habitacionais e nos derivativos financeiros. O argumento para os testes parecia
incontestável. Era mesmo?
Como qualquer banqueiro experiente sabe, um banco bem administrado
deveria se submeter a "testes de estresse" regularmente, como uma questão
de boa manutenção doméstica. A crise financeira deveria ter imposto o
acionamento de um teste de estresse para manter o alto escalão executivo
atualizado diariamente. Porque, então, o governo dos EUA precisou conduzir
um exercício financeiro que os próprios banqueiros deveriam ter feito melhor e
mais rápido?
A verdade é que os testes não foram projetados para encontrar respostas. Os
caciques de Wall Street, assim como a administração Obama, já conheciam a
verdade. Eles sabiam que se as verdadeiras condições em muitos bancos de
grande porte fossem divulgadas ao público, muitos teriam sido imediatamente
declaradas falidas, necessitando de recuperação judicial com a ajuda do
governo para sustar um tsunami de corridas a bancos.
O governo Obama, porém, não quis ser rotulado de "socialista" por nacionalizar
bancos, por mais temporário que fosse o processo, apesar de especialistas
como o ex-presidente do Federal Reserve Paul Volcker terem recomendado
exatamente isto. Ademais, nacionalizar bancos teria exigido rejeitar os caciques
de Wall Street e seus conselhos de administração por terem administrado as
suas firmas de forma extremamente incompetente.
Os titãs de Wall Street, porém, convenceram Obama e sua equipe de que sua
administração continuada é essencial para tirar o mundo da sua crise. Eles
conseguiram se retratar como vítimas de um incêndio incontrolável, em vez de
cúmplices de incêndio premeditado.
Geithner e Larry Summers, principal assessor financeiro de Obama,
compartilham a cultura de Wall Street como protegidos de Robert Rubin, o exsecretário do Tesouro, que passou a atuar como diretor e consultor sênior no
Citigroup. Nenhum destes homens viu qualquer dificuldade em aceitar a lógica
absurda dos banqueiros.
Os testes de estresse pretendiam sinalizar ao público que não existia nenhuma
ameaça imediata de falência de bancos. Esta mensagem, esperava-se,
estabilizaria o mercado de forma que os preços dos ativos "tóxicos" aumentaria
até um nível em que os banqueiros se sentiriam à vontade para vendê-los.
Afinal, os banqueiros do alto escalão vinham alegando que estes ativos tiveram
seus "preços distorcidos" e que a fixação dos seus preços a níveis de mercado
penalizaria os bancos desnecessariamente.
Por enquanto, Geithner parece ter logrado êxito nos seus "testes", na medida
em que o mercado acionário realmente mais do que se estabilizou, sendo que
preços de ações de bancos como Citigroup e Bank of America quadruplicaram
em relação às suas cotações mais baixas. A temida implosão de Wall Street
parece ter sido evitada.
Ninguém jamais acreditou seriamente, porém, que os EUA permitiriam que o
Citigroup e o Bank of America, para citar apenas dois, quebrassem. Na
verdade, o mercado acionário atingiu o fundo do poço no começo do ano. Os
mercados embutiram nos preços das ações a crença de que o governo dos EUA
não permitiria que nenhum outro banco fosse à bancarrota.
O que o mundo queria era uma imagem fiel de quanto os bancos valiam e
avaliações "marcadas a mercado" para orientar os investidores sobre quanto de
capital novo necessitariam.
O mundo também queria ver os EUA retornarem à via principal, no
fortalecimento da ética e integridade empresarial - tão em falta sob a
administração anterior. Considerando que os contribuintes já haviam aplicado
enormes somas no socorro a bancos quebrados, com a perspectiva de mais por
vir, era imperativo ter um processo transparente que revelasse como o dinheiro
estava sendo usado.
Consideráveis recursos públicos de socorro teriam sido desviados para bancos
estrangeiros, Goldman Sachs e gratificações a funcionários, para finalidades
não relacionadas com a proteção do interesse público. Nada disto foi revelado
ou desmascarado pelos testes de Geithner. Pelo contrário, os servidores
públicos parecem estar em conluio com Wall Street para arquitetar uma aura
artificial de rentabilidade.
Além disso, o valor dos ativos tóxicos continua nebuloso como sempre.
Princípios contábeis outrora sacrossantos foram modificados por ordem de Wall
Street com o propósito de permitir que os bancos informem essencialmente o
que quiserem. E agora, os resultados dos testes de estresse negociados foram
divulgados para "provar" que os bancos são muito mais robustos. Chamar isso
de "esquema Ponzi" seria hostil demais. Mas poucos profissionais financeiros
foram enganados.
Enquanto isso, os caciques de Wall Street e seus conselhos diretores nada têm
a temer do governo. Pelo contrário, agora eles são os sócios do governo numa
parceria feita para administrar este programa desonesto.
Assim como a gripe suína, o capitalismo de compadres migrou dos países
corruptos do Terceiro Mundo para a América, que já foi a cidadela da sólida
governança pública e privada. Surpreende que a China seja vista como um
modelo cada vez mais mais confiável para grande parte do mundo, ao passo
que os EUA agora são vistos como um símbolo da hipocrisia e das duas
medidas?
Sin-ming Shaw foi presidente fundador de um fundo de hedge e de um
fundo de "private equity" na Ásia, foi professor convidado nas
universidades de Columbia, Harvard, Princeton e Oxford e continua
atuando como investidor ativo. Ele mantém um blog em
sinmingshaw.blogspot.com. © Project Syndicate/Europe´s World,
2009. www.project-syndicate.org
---------------------------------------------------------OUTRAS NOTÍCIAS
O Estado de S.Paulo 21 05 2009
O Fed e a retomada econômica
A ata da reunião de abril do Comitê de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em
inglês) do Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA), divulgada
anteontem, forneceu sinais ambíguos sobre o estado da economia dos Estados
Unidos e provocou uma queda nos mercados mundiais. Os economistas do Fed
notaram que as perspectivas de longo prazo melhoraram um pouco, mas a
retomada será mais lenta do que o previsto e o desemprego tende a crescer.
A estimativa sobre a marcha da economia neste ano passou do intervalo de
crescimento de 0,5% e queda de -1,3% para o de queda de -1,3% a -2%. O
desemprego, previsto em janeiro entre 8,5% e 8,8%, foi recalculado entre
9,2% e 9,6% - e um dos membros do Fomc chegou a prever uma taxa de 10%.
A economia deverá se recuperar em 2010 e 2011, conforme a avaliação do
Fomc, mas em ritmo mais lento.
Tensões no mercado de crédito, dificuldades de realocação de mão de obra,
consumo contido das famílias, menores estímulos fiscais e baixa demanda de
exportações tenderão a frear o ritmo econômico no médio prazo, segundo a Ata
do Fomc.
Houve, nas últimas semanas, inegáveis sinais positivos, sobretudo os
originários do mercado. Nos últimos 30 dias, até quarta-feira, o índice Dow
Jones se valorizou 6,79% e o Nasdaq, 4,96%. Os dois indicadores caíram
fortemente ontem.
Foi significativa a revelação do secretário do Tesouro, Timothy Geithner, de que
os bancos que há pouco foram submetidos ao teste de stress já levantaram
US$ 56 bilhões de um total de US$ 75 bilhões de que necessitam em capital
novo. Alguns já planejam devolver ao governo os recursos recebidos no ano
passado.
O programa de socorro Tarp (Programa de Alívio de Ativos Problemáticos)
previu desembolsos de US$ 700 bilhões, dos quais ainda estão disponíveis US$
123,7 bilhões, disse Geithner. Segundo o Wall Street Journal, entre os bancos
que tratam da devolução dos recursos ao governo estão Goldman Sachs, J.P.
Morgan, Capital One Financial, U.S. Bancorp e Morgan Stanley.
A Ata do Fed confirma que a fase mais aguda da crise da economia norteamericana passou, mas que o governo ainda terá de mobilizar vultosos
recursos para comprar ativos hipotecários e títulos do Tesouro em poder das
instituições em dificuldades. "Alguns membros (do Fed) notaram que um maior
aumento no montante total das compras poderá ser necessário, em algum
momento, para estimular um ritmo mais rápido de recuperação", diz a ata.
O Estado de S.Paulo - 22/05/2009
Vale refaz plano e corta investimento
em US$ 5,2 bi A Vale reduziu em US$ 5,2 bilhões sua projeção de investimentos para 2009. A
decisão, aprovada ontem pelo conselho de administração da companhia, foi
motivada por três fatores: redução de custos, desvalorização do real e
alongamento dos cronogramas de alguns projetos. A cifra supera o valor de
todos os projetos de expansão do setor de papel e celulose para os próximos
quatro anos, que soma cerca de US$ 4,5 bilhões, segundo estimativa do Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Em comunicado divulgado ontem ao mercado, a Vale informou que o novo
orçamento para 2009 é de US$ 9,035 bilhões, 36,5% inferior aos US$ 14,235
bilhões projetados inicialmente. A possibilidade de revisão dos investimentos foi
sinalizada durante a divulgação do balanço do primeiro trimestre da companhia,
em virtude das mudanças no cenário econômico desde o estouro da crise
financeira mundial.
Em outubro de 2008, quando a companhia bateu o martelo e divulgou seu
plano de investimento, o ambiente ainda não refletia uma desaceleração tão
forte da economia mundial. O cenário piorou nos meses seguintes, obrigando a
companhia a adotar uma série de medidas, como a demissão de 1,3 mil
funcionários e a suspensão de atividades em algumas minas, com a concessão
de férias coletivas aos trabalhadores. Por outro lado, naquela época, os custos
estavam inflados por conta do ritmo acelerado de investimentos dos últimos
anos.
A companhia diz que a revisão dos investimentos não significa que os projetos
deixarão de ser tocados. Em alguns casos, a redução de gastos foi obtida com a
queda no custo de insumos e matérias-primas nos últimos meses. Em outros,
há o impacto da desvalorização cambial, que reduz o valor em dólar de
encomendas de bens e serviços que são pagas em reais.
Mas há também a postergação de investimentos em projetos que não têm
mercado consumidor neste momento. Nesse caso, se enquadram
principalmente as operações em níquel, que tiveram redução de 18,2% nos
investimentos previstos em 2009, para US$ 1,381 bilhão. No texto divulgado
ontem, a empresa diz que os projetos de níquel Onça Puma, Goro, Totem e
Salobo - com investimento total de US$ 7,9 bilhões - têm sua conclusão
"sujeita às condições de mercado".
O corte mais significativo, porém, recaiu sobre os projetos do segmento de
minerais ferrosos, especialmente nas minas de Carajás e Serra Sul, ambas no
Pará. A previsão era gastar com ferrosos US$ 4,554 bilhões este ano, volume
reduzido para US$ 2,853 bilhões. Só o projeto Serra Sul teve seu orçamento
encolhido de US$ 675 milhões para US$ 233 milhões. Maior investimento
individual da companhia atualmente, com o orçamento total de US$ 11,297
bilhões, tem início de operações previsto para o primeiro semestre de 2013.
A expansão da mina de Carajás para 130 milhões de toneladas de capacidade
também sofreu corte expressivo, de US$ 798 milhões para US$ 455 milhões. A
empresa projeta uma nova usina de britagem e ampliação da estrutura logística
para 2011.
O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José
Augusto de Castro, lamentou a redução de investimentos, mas reconheceu que
a empresa tem de se ajustar ao cenário atual. "Ela está se adaptando à nova
realidade de demanda internacional", afirmou. Em abril, a companhia já havia
anunciado uma redução de US$ 600 milhões em seus investimentos em
logística programados até 2013, que caíram de US$ 12 bilhões para US$ 11,4
bilhões.
-----------------------------------------O Estado de S.Paulo 22 05 2009
''Investimentos no Brasil vão superar
US$ 10 bilhões''
Robert Wilson: presidente do Conselho do BG Group; O BG é um dos principais
parceiros da Petrobrás na exploração de petróleo na camada pré-sal, com 25%
do Campo de Tupi
Daniela Milanese, LONDRES
Não há limites para os investimentos do BG Group no Brasil, afirma o
presidente do Conselho de Administração da empresa britânica, Robert Wilson.
"Nós próximos anos, vamos investir muitos bilhões de dólares no Brasil."
Segundo ele, o valor pode superar rapidamente os US$ 10 bilhões. Desde que
chegou ao País, em 1997, a companhia já fez aportes superiores a US$ 2
bilhões. Depois de entrar no gasoduto Brasil-Bolívia, o grupo BG comprou a
Comgás, em 1999, e licenças para a exploração de petróleo, em 2000. Hoje, é
um dos principais parceiros da Petrobrás na cobiçada área do pré-sal, com 25%
do Campo de Tupi, além de participações em Guará e Iara.
As reservas se tornaram um pilar importante para a estratégia de crescimento
do BG no mundo. O grupo considera o pré-sal brasileiro como uma das
descobertas mais importantes feitas neste século.
Agora, a empresa aguarda as novas regras para o setor que estão sendo
definidas pelo governo. Wilson espera que o marco regulatório mantenha a
atratividade para novos investimentos, mas mostra dúvidas sobre a
necessidade de uma nova estatal para administrar as reservas de petróleo.
Após receber o título de "Personalidade do Ano" da Câmara de Comércio
Brasileira em Londres, na noite de quarta-feira, ele concedeu a entrevista
exclusiva à Agência Estado.
O governo brasileiro está criando um novo marco regulatório para o
setor de petróleo. Qual é a sua expectativa?
Não vou tentar adivinhar como será a nova política. Eu entendo que ela só será
aplicada para as novas licenças e não para as já existentes. Acho que isso é
muito importante. Eu ficaria muito desapontado se os termos das novas
licenças forem tão desfavoráveis de forma que fiquemos incapazes de continuar
a nos candidatar. Mas não estou pessimista.
Em que caso as novas regras podem não ser favoráveis?
Estou otimista de que os termos vão permanecer atrativos o suficiente.
Fala-se na criação de uma nova estatal para administrar as reservas do
pré-sal. O sr. acredita que esse seria um bom modelo?
Obviamente é uma decisão política. Se é necessário? Eu não sei. Acho que a
Petrobrás é uma empresa muito boa. Ficaríamos muito satisfeitos de continuar
trabalhando com a Petrobrás. Vamos ver como as novas regras virão.
Uma nova estatal não seria necessária então?
Eu não sei. Há fortes rumores de que haverá uma estatal 100% do governo.
Existe alguma possibilidade de o BG Group decidir não investir mais no
Brasil após o novo modelo para o setor de petróleo?
Não espero isso. E, certamente, tenho esperança de que não. Consideramos o
Brasil uma parte muito importante da nossa estratégia e ficaríamos muito
desapontados se os novos termos das próximas licenças forem tão
desfavoráveis a ponto de não podermos justificar os investimentos.
Quanto o BG Group está disposto a investir no Brasil?
Nós próximos anos, vamos investir muitos bilhões de dólares no Brasil. Eu não
sei quanto, mas é provável que o valor suba bem acima de US$ 10 bilhões
rapidamente. Se vejo algum limite para o montante de recursos a serem
aplicados? Não, ainda não. Já investimos mais de US$ 2 bilhões na Comgás e
na exploração de petróleo nos últimos anos.
Qual é o preço do petróleo que viabiliza os investimentos no pré-sal?
É difícil neste momento julgar quais serão os custos de capital e de operação
em águas profundas. Mas acho que estamos razoavelmente confortáveis com o
nível de preço atual.
Ao redor de US$ 60,00?
Sim.
E abaixo desse valor?
Depende dos custos, mas se tudo der certo pode ser economicamente viável a
operação com preço abaixo de US$ 50.
------------------------------------------O Estado de S.Paulo 22 05 2009
Bancos competem para devolver ajuda
primeiro
Louise Story* e Eric Dash*, THE NEW YORK TIMES
Tudo começou em 13 de outubro, em meio ao pânico, com um ultimato de
Washington. Agora, os maiores bancos do país estão vendo uma oportunidade
de encerrar a era dos planos de resgate financeiro. Depois de tantas más
notícias, isso pode parecer quase impossível. Mas, tendo reconquistado uma
base financeira, e também um pouco da velha arrogância, os grandes bancos
estão com pressa de devolver os bilhões de dólares para os contribuintes.
Muitos insistem que o farão isso até o fim do ano.
Em Washington ou em Wall Street, são poucos os que acreditam numa
recuperação tão rápida. Para muitos, os bancos dependeriam do governo por
anos e ainda precisariam de ajuda para resolver problemas com hipotecas de
alto risco e outros ativos que levaram à crise financeira. Mas, agora que as
grandes instituições bancárias parecem ter se estabilizado, as autoridades
tentam determinar como e quando elas poderão devolver a ajuda recebida - e
se essa medida poderá deixá-las vulneráveis a outra crise no caso de a
economia piorar.
De acordo com executivos dos bancos e uma autoridade do governo federal,
duas semanas depois dos resultados dos testes de estresse, vários bancos,
entre eles o Bank of New York Mellon, Goldman Sachs, JP Morgan, Chase,
Morgan Stanley, State Street e US Bancorp, iniciaram discussões formais com
os reguladores para devolver sua parte do empréstimo de US$700 bilhões.
Na terça-feira surgiram novos detalhes, como rumores de que as autoridades
não permitiriam que um grande banco fosse o primeiro a se retirar do
programa sozinho, para evitar que use o fato para se exibir. De outro lado, em
oito de junho o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) espera
identificar um grupo pronto para se retirar do programa, segundo um
funcionário. Ao Departamento do Tesouro cabe decidir sobre o momento
oportuno.
Muitos americanos, irritados com os multibilionários planos de ajuda, salários e
bônus pagos pelo setor financeiro, poderão receber bem a notícia da devolução
antes do esperado. Mas isso comporta riscos. Embora, no momento, muitos
grandes bancos conseguiram estancar as perdas astronômicas, o setor ainda
enfrenta desafios enormes.
Novos problemas estão à vista no setor imobiliário comercial e de cartões de
crédito. Ao permitir que os bancos restituam sua parte no empréstimo, o
governo renunciará a um certo poder sobre as instituições que estavam no
centro da crise financeira. Os bancos, por outro lado, estão ansiosos para se
libertar da vigilância intensificada do governo, incluindo as restrições às
bonificações pagas aos executivos.
"Se um determinado banco devolver o dinheiro e em outubro precisar
novamente, isso vai ser assustador", disse Douglas J. Elliott, membro da
Brookings Institution e ex-diretor no JP Morgan Chase.
Para alguns observadores, os bancos podem estar pressionando o governo para
autorizar os reembolsos. "Há uma tensão pública maior entre eles", disse
Andrew Goldberg, chairman da área de treinamento financeiro e corporativo da
Burson-Marsteller. "É um diálogo entre duas jurisdições diferentes que operam
com perspectivas diferentes - bancos e governo - e se cruzam na zona que
chamamos Tarp".
Essa tensão reflete também as velhas rivalidades de Wall Street. O Goldman
Sachs, por exemplo, há muito tempo é visto como o banco que, provavelmente,
será o primeiro a devolver o dinheiro. Mas os concorrentes dizem que uma
decisão nesse sentido pode ser vista como favoritismo, diante dos elos do
Goldman com importantes autoridades federais, como o chefe do Federal
Reserve Bank de Nova York, William C. Dudley, que já trabalhou no banco.
Enquanto vários bancos de menor porte devolveram sua parte, nenhum grande
banco retornou o empréstimo. Até agora, o Citigroup é o único que fez do
governo um acionista a longo prazo. Ao decidir quais bancos poderão devolver
o dinheiro, o governo vai traçar, potencialmente, uma linha entre vitoriosos e
fracassados.
Um ponto de desacordo é se os bancos que fizerem a restituição poderiam
continuar usando o programa do governo que garante suas dívidas. Alguns
talvez não consigam operar sem isso. As autoridades disseram recentemente
que, antes de as empresas terem permissão para devolver o dinheiro, precisam
provar que têm capacidade de emitir dívida sem necessidade do programa. De
acordo com uma fonte, a ideia é deixar que os bancos usem o programa de
garantia de dívidas até outubro.
Um outro problema é o investimento dos contribuintes nos bancos. O governo
tem garantias que lhe dão o direito de comprar ações dos bancos, e tem que
decidir como será feito pagamento para eles terem essas garantias de volta.
Bancos mais fortes como o Goldman defendem um preço alto, e os com menos
caixa querem cancelar as garantias pagando um preço menor.
Fortes ou fracos, muitos grandes bancos querem restituir o dinheiro antes do
fim do ano, de maneira a pagar bonificações para seus executivos tão logo
possam.
*Os autores são jornalistas
---------------------------------------------O Globo 22 05 2009
Lula dará bônus para acelerar obras do
PAC
O governo enviou à Câmara dos Deputados, em regime de urgência
constitucional, projeto de lei que cria um bônus anual e especial para
servidores do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).
A medida alcançará 2.947 servidores ativos do quadro de pessoal do Dnit e terá
um impacto financeiro de R$ 55,9 milhões no Orçamento de 2010. Para ganhar
a gratificação, o funcionário terá de cumprir as metas estabelecidas para o
órgão, especialmente as relacionadas ao andamento de obras do Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC). O PAC é o grande projeto de obras usado
pelo governo para impulsionar a pré-candidatura da ministra Dilma Rousseff
(Casa Civil) em 2010, chamada de “mãe do PAC” pelo presidente Lula.
O artigo 3º do projeto deixa clara a intenção de premiar os responsáveis por
agilizar obras, inclusive as do PAC. O texto define que o “conjunto de metas
cujo cumprimento será avaliado para fins de concessão do bônus são as fixadas
para o Dnit, para o período compreendido entre 1º de janeiro de 2009 e 30 de
abril de 2010”.
O bônus especial de desempenho institucional será pago só uma vez, em junho
de 2010. O pagamento poderá ter antecipações, condicionadas à
disponibilidade orçamentária nos exercícios de 2009 e 2010. Se houver
antecipação do pagamento de parte do bônus, o impacto este ano seria de R$
19,5 milhões.
Segundo assessores do governo, no Ministério do Planejamento se discute a
criação de bônus para todo o funcionalismo.
Nesse caso, haveria contratos de gestão. No Dnit, as metas serão estabelecidas
pelo órgão.
Pelo projeto, o bônus anual poderá ter três valores: R$ 48,9 mil para cargos de
nível superior; R$ 20,8 mil (nível intermediário); e R$ 6,4 mil (nível auxiliar).
Poderão receber o bônus servidores ativos, titulares dos cargos que integram
as carreiras de infraestrutura de transportes, suporte à infraestrutura de
transportes, analista administrativo e técnico administrativo, e o plano especial
de cargos.
Pagamento do bônus está previsto para junho de 2010
Os ministros Dilma Rousseff, Paulo Bernardo (Planejamento) e Alfredo
Nascimento (Transportes) estabelecerão as metas específicas que integrarão
compromisso de desempenho e que resultarão no pagamento do bônus.
Segundo integrantes do Palácio do Planalto, o projeto foi discutido pela área
econômica, com o Ministério dos Transportes e a Casa Civil. A proposta recebeu
o aval do presidente Lula há uma semana, antes da viagem ao exterior, e foi
enviado à Câmara dia 19. A exposição de motivos é assinada pelo ministro
Paulo Bernardo.
O projeto diz que o bônus será uma “retribuição pecuniária eventual a ser pago
exclusivamente no mês de junho de 2010”. Caso os servidores recebam valores
antecipados e as metas não forem cumpridas, o dinheiro deverá ser resolvido.
Será fixado um “índice global” a ser atingido no cumprimento das metas. As
metas serão mensuradas a cada quatro meses.
O ministro dos Transportes disse que o pagamento do bônus é fruto de um
acordo salarial com os servidores do Dnit. Apesar de frisar que estava em
viagem e que não tinha detalhes da proposta, Nascimento disse que o bônus
teria sido acertado com os servidores após uma paralisação da categoria.
----------------------------------------------Folha de S.Paulo - 22/05/2009
Petrobras faz negócios com firma que
deu carro a petista
Alvo da CPI dos Correios após a revelação de que havia presenteado o então
secretário-geral do PT, Silvio Pereira, com um carro Land Rover, a empresa
GDK, de Salvador (BA), foi contratada 19 vezes pela Petrobras após o término
daquelas investigações, num total de R$ 584 milhões.
Os contratos foram fechados entre 2007 e 2009. Para o mais alto, de R$ 199
milhões em novembro de 2007, a Petrobras dispensou a licitação. A estatal é
agora alvo de uma CPI específica, criada pela oposição na semana passada no
Senado.
O carro de Silvio Pereira, avaliado em R$ 73,5 mil, foi doado em 2004 pelo
dono da GDK, mas o fato só foi tornado público em 2005, no auge do escândalo
do mensalão.
Na época do presente, a GDK mantinha R$ 512 milhões em contratos com a
Petrobras. O maior era a reforma da plataforma de exploração de petróleo P34, no Espírito Santo.
Em seu relatório final, a comissão do Congresso considerou a doação um "caso
exemplar de tráfico de influência".
O relatório da CPI descreveu as investigações realizadas pelo TCU (Tribunal de
Contas da União) sobre obras tocadas pela GDK para a Petrobras.
Técnicos do tribunal detectaram irregularidades em contrato firmado entre a
Petrobras Netherlands, subsidiária da estatal na Holanda, e a GDK, para a
adaptação de uma planta da plataforma P-34, no campo de Jubarte (ES).
O contrato, assinado em 2004 por US$ 88 milhões (hoje, R$ 176 milhões),
poderia, segundo auditores do tribunal, ter sido firmado por um valor 35% mais
baixo, ou US$ 64,8 milhões (R$ 129,6 milhões).
Há indícios, segundo relatório do TCU, de irregularidades de US$ 23 milhões
(cerca de R$ 46 milhões). O processo ainda não foi concluído.
O relatório aponta supostos erros na formulação do orçamento, falhas na
execução do contrato, inclusão indevida de tributos, deficiências na fiscalização,
pagamentos antecipados, divergência entre valores orçados e contratados.
O relatório da CPI dos Correios também avaliou as práticas de gerenciamento e
fiscalização do contrato. O documento descreveu que, das 28 pessoas
envolvidas nessa atividade, 71% eram terceirizadas. A própria GDK fornecia
seis pessoas para esse trabalho; outros 14 vinham de outra contratada.
A CPI afirmou ter recebido a notícia com "espanto".
"A GDK está fornecendo três secretárias para os dois gerentes setoriais
(gerente e fiscal do contrato), auxiliares administrativos e arquivistas. O
elevado nível de terceirização nas atividades de acompanhamento, fiscalização
e de liberação de recursos desse contrato causa espanto, principalmente
quanto ao fornecimento de mão-de-obra pela GDK, inclusive no caso das
secretárias dos gerentes e do fiscal do contrato, por cujas mãos passa toda a
documentação do contrato."
Dos 19 contratos da GDK com a Petrobras após o mensalão, 3 foram feitos com
a dispensa ou a declaração de inexegibilidade de licitação, 11 por convites e 5
por tomadas de preços. São obras de manutenção de dutos, perfuração de
poços e construção e reparos de instalações industriais.
Ao dispensar a licitação no caso do projeto de R$ 199 milhões, a Petrobras
invocou o decreto 2.745, baixado em 1998 pelo então presidente, Fernando
Henrique Cardoso.
O decreto tem sido atacado pelo TCU, mas a Petrobras recorreu ao STF
(Supremo Tribunal Federal) e já obteve, até agora, 11 decisões favoráveis à
aplicação do decreto.
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Dólar furado - Miriam Leitão - O Globo - 22/05/2009
O dólar cai porque está entrando mais dinheiro de investidores externos, as
empresas brasileiras voltaram a captar no exterior, as commodities estão
subindo. Os motivos são muitos e mostram que os sinais se inverteram. Depois
de meses de fluxo cambial negativo, o fluxo ficou positivo. Qual o risco? Que o
movimento fique exagerado se todos acreditarem que o susto passou.
Foi por isso que o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, fez o alerta
ontem contra o excesso de euforia. Da mesma forma que o pânico, a euforia
produz movimentos de manada que podem exagerar uma tendência. Isso
aumenta muito a volatilidade e ela pode deflagrar um novo momento de crise.
Mas alguns dos motivos de queda do dólar são melhoras sólidas. E não são
apenas brasileiras. Veja o gráfico abaixo. De 17 de março até ontem, a conta já
registra que o dólar caiu 10% frente ao real, 15,6% frente ao rand sul-africano
e 4,7% diante do peso chileno. O que há de comum entre Brasil, África do Sul e
Chile é que os três países são exportadores de commodities e elas voltaram a
se valorizar.
O índice CRB, que mede o valor das commodities, subiu 12% nesse período.
O economista-chefe da Ativa Corretora, Arthur Carvalho, acha que o dólar se
desvaloriza em função da diminuição da aversão ao risco mundial, porque isso
traz os investidores, que fugiram do país desde o fim do ano passado, quando a
crise se agravou após a quebra do banco americano Lehman Brothers.
Isso significa um forte ingresso de moeda americana por meio da Conta de
Capitais (investimentos em bolsa, investimentos estrangeiros diretos e títulos
do Tesouro brasileiro), dos Adiantamentos de Contrato de Câmbio (ACC), que
estão se normalizando para as empresas exportadoras, e também pelo anúncio
de captação de recursos por parte de empresas brasileiras no exterior.
— Com essa inversão de cenário começa a acontecer, também, um forte viés
especulativo a favor do real.
Ou seja, na medida em que os investidores olham para frente e veem um
cenário de entrada de dólares, há uma tendência de venda da moeda
americana — explicou Carvalho.
Foi contra isso que o presidente do BC alertou ontem, o exagero da tendência
provocada por movimentos especulativos. Mesmo assim, diante do contexto de
crise, Carvalho não acha muito provável que o dólar caia para a casa de R$
1,80. O mais provável, segundo ele, é ficar oscilando entre R$ 2 e R$ 2,10,
mesmo que ele chegue a romper a barreira dos R$ 2. O problema é que a crise
não acabou, apenas melhorou de expectativa.
Para Sérgio Vale, da MB Associados, outro fator que influencia é o fato de que o
Brasil não fez um afrouxamento muito grande da política fiscal e, ao mesmo
tempo, ainda pode utilizar muito a política monetária para enfrentar a crise.
Isso tem dois efeitos positivos sobre os investidores: primeiro, que as contas
públicas estão menos desajustadas que em outros países e, segundo, que juros
altos significam alta rentabilidade nos investimentos em títulos públicos.
— Se as políticas são sólidas e os juros são elevados, nada mais natural do que
esse investidor vir para cá — explicou Vale.
Um cenário mais otimista na recuperação econômica mundial também sustenta
a alta das commodities. Afinal, se a recuperação acontecer mais rapidamente, o
consumo de matéria-prima será maior e os preços tendem a subir mais.
André Sacconato, da Tendências Consultoria, também acha que um dos
grandes motivos da alta do dólar é que o Brasil tem juros altíssimos, no mar de
juros baixos no mundo. Ele também explica que o país sofreu menos com a
crise na comparação com outros emergentes, como Rússia, México e Índia,
abrindo espaço para a vinda de investidores estrangeiros.
Além disso, os chineses estão tentando diminuir sua exposição a títulos
americanos e dólar. Isso ajudou o Brasil de dois modos: primeiro, porque
valorizou os produtos que o Brasil exporta e, segundo, porque aumentou a
demanda por esses produtos.
Por enquanto, o BC compra dólares e recompõe suas reservas. Os exportadores
que sofreram com o dólar baixo, e depois se encrencaram no mercado futuro
pela alta abrupta da moeda, agora olham preocupados para a queda, com o
temor de que isso reduza sua rentabilidade. O dólar pode não ter o valor que já
teve, mas ainda é a moeda para a qual todos olham.
---------------------------------------Folha de S.Paulo 22 05 2009
Fusão Perdigão-Sadia deve ser
"congelada"
Indicação foi dada pelo presidente do Cade, Arthur Badin, caso seja
preciso reverter operação no futuro
JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
O presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), Arthur
Badin, disse ontem que a preocupação atual com o processo de criação da
Brasil Foods é garantir as condições para que a operação possa ser revertida no
futuro, caso o tribunal administrativo decida pelo veto -parcial ou integral- no
julgamento do negócio.
As declarações de Badin indicam que o Cade deverá negociar com a PerdigãoSadia um acordo para "congelar" a operação, o chamado Apro (Acordo de
Preservação da Reversibilidade da Operação). A expectativa é que a fusão seja
analisada até o final do ano.
"O Cade se preocupa, no primeiro momento, com a reversibilidade da
operação, não só dos ativos, máquinas, como da mão de obra", disse Badin,
informando que a fusão ainda não foi notificada oficialmente pelas empresas ao
Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Depois do anúncio da operação,
há um prazo de 15 dias úteis para a notificação aos órgãos antitruste.
Hoje, representantes da Sadia e da Perdigão apresentarão, informalmente, aos
conselheiros do Cade o modelo da operação. De acordo com relatório da
corretora Santander, as maiores concentrações resultantes da fusão ocorrem
no mercado de massas prontas (quase 90%) e no segmento de pizzas
semiprontas (70%).
Os executivos da nova empresa ainda deverão se reunir com representantes da
SDE (Secretaria de Direito Econômico) e da Seae (Secretaria de
Acompanhamento Econômico), que realizarão a instrução conjunta do processo
de fusão.
Sintonia
Em sintonia com as afirmações de Badin, a diretora do DPDE (Departamento de
Proteção e Defesa Econômica), Ana Paula Martinez, declarou que a lei permite
aos órgãos antitruste "adotar medida cautelar ou realizar o Apro, caso em uma
análise preliminar da operação se verifique que há risco para determinado
mercado". O DPDE é um órgão da SDE.
A diferença entre uma medida cautelar e um acordo é que, no primeiro caso,
trata-se de um ato unilateral do governo. No acordo, as condições são
negociadas entre as empresas e o Cade.
O presidente do Cade disse ainda que a fusão Sadia-Perdigão é muito
complexa, não podendo ser reduzida à soma da participação de mercado das
duas empresas.
Ele rebateu, porém, a avaliação de especialistas em defesa da concorrência de
que a análise desse caso seria o maior desafio da história do Cade.
"Não vejo nenhuma especificidade que torne essa operação especial. Vamos
analisar com a mesma tranquilidade, independência e imparcialidade de outros
processos."
O secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria
e Comércio Exterior, Welber Barral, disse ontem que, do ponto de vista das
exportações brasileiras, a fusão Perdigão-Sadia traz ganhos de eficiência para a
nova empresa.
"Principalmente neste momento de abertura do mercado internacional, uma
fusão como essa cria eficiência em termos de marketing e redistribuição",
declarou o secretário.
Badin acrescentou que as empresas, provavelmente, terão de notificar a fusão
também às autoridades de defesa da concorrência internacionais, entre elas as
da União Europeia, devido ao caráter internacional da nova empresa.
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