Resumo Expandido - LEVANTAMENTO DE MASTOFAUNA

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Resumo Expandido - LEVANTAMENTO DE MASTOFAUNA
LEVANTAMENTO DE MASTOFAUNA OCORRENTE NA FAZENDA
CANABRANA, MUNICÍPIO DE AUGUSTO DE LIMA, MINAS GERAIS.
Guedes, E.A.; Sousa, V.M.; Siqueira, R.C.; Melo, R.S.; Teixeira, T.M.
RESUMO
Durante dois períodos compreendidos entre 24 a 28 de setembro de 2008 e 17 a 24 de
janeiro de 2009, num total de 13 dias, foram realizados levantamentos de mamíferos na
Fazenda Canabrava, localizada no município de Augusto de Lima, Estado de Minas Gerais,
com quatro metodologias: transectos diurnos, transectos noturnos, entrevistas e pesquisas em
abrigos, além de outros indícios indiretos (pegadas e fezes) e avistamentos. Foram
identificadas 38 espécies. A área estudada apresenta-se altamente fragmentada e impactada,
sendo que a maior parte da vegetação nativa foi convertida em pastagens. Os resultados
mostram que espécies típicas do cerrado são permanentes no local, porém, com a supressão da
vegetação nativa, as populações encontram-se reduzidas.
PALAVRAS-CHAVE: mamíferos; Cerrado; período seco; período chuvoso.
INTRODUÇÃO
Os mamíferos são considerados, entre os grupos animais, os seres mais evoluídos.
Possuindo, como características principais, os mecanismos para regulação de sua temperatura
corporal (sangue quente), o corpo geralmente recoberto por pêlos, além das fêmeas serem
providas de glândulas mamárias desenvolvidas, sendo essa a característica que deu origem ao
nome do grupo (STORER, 2002).
O bioma Cerrado equivale a 25% do território brasileiro e abriga alta diversidade de
solos, relevos, climas, fauna e flora. Esse mosaico de habitats abriga comunidades variadas de
animais que se destacam pela diversidade de espécies e abundância de indivíduos (BRASIL,
1999).
A área estudada está situada entre as cidades de Augusto de Lima e Diamantina,
região norte do Estado de Minas Gerais, onde a atividade predominante é a pecuária
extensiva. Nesta região são encontrados variados tipos vegetacionais, como cerrado sensu
stricto, mata ciliar, mata seca, campo limpo e campo rupestre.
Para uma conservação adequada da biodiversidade de mamíferos do Cerrado, é
necessária a obtenção das comunidades, densidade das espécies, e variação desses parâmetros
associadas às diferentes formações de Cerrado e também a diferentes regiões deste extenso
bioma.
O objetivo do presente estudo é inventariar a mastofauna na área da Fazenda
Canabrava.
METODOLOGIA
A coleta de dados foi realizada nos períodos seco (setembro/2008) e chuvoso
(janeiro/2009).
O levantamento mastofaunístico consistiu numa busca qualitativa de mamíferos não
voadores. Inicialmente, foram realizadas consultas científicas à bibliografia técnico-científica
existente, em busca de dados secundários disponíveis para a região. As informações obtidas
foram, principalmente, utilizadas para a elaboração do levantamento da área da Fazenda.
Todos os métodos de inventário são parciais, na medida em que cada um é adequado
para o estudo de apenas uma fração da rica fauna de mamíferos neotropicais, que exibe
grande diversidade morfológica e comportamental. Para o censo adequado da comunidade
como um todo, diferentes métodos foram combinados (FLEMING, 1975; VOSS &
EMMONS, 1996).
Neste estudo foram combinados quatro métodos: transectos diurnos, transectos
noturnos, entrevistas e pesquisas em abrigo, conforme sugeridos por VOSS & EMMONS
(1996), para amostragem de roedores, marsupiais e outros mamíferos de médio e grande
porte, além de indícios indiretos (pegadas e fezes) e avistamento.
Os transectos diurnos e noturnos foram feitos no mais absoluto silêncio, sem o uso de
qualquer produto que tenha odor, assim, eram inspecionados os rastros, fezes e todos os
estratos da vegetação em busca de mamíferos, além da audição de vocalizações de primatas,
os quais foram observados com o auxílio de binóculos, tanto durante o dia como à noite, em
geral a pé. Os transectos foram percorridos com uma velocidade constante e de,
aproximadamente, 1 Km/h, com paradas a cada 50-100 metros para observação do local,
conforme sugerido por CULLEN JÚNIOR et al. (2001). Alguns poucos registros foram feitos
durante deslocamentos curtos até os pontos de amostragem definitivos (em carro).
A identificação de pegadas foi utilizada para determinar as espécies, sobretudo as que
são de difícil visualização ou captura (BECKER & DALPONTE, 1999; BORGES &
TOMÁS, 2005; DOTTA, 2005).
Foram realizadas entrevistas com a população local sobre a ocorrência de mamíferos,
mas apenas os relatos confiáveis das espécies mais óbvias foram empregados no resultado
final, além do fato de que o técnico deve ter conhecimento prévio da fauna local, verificando
sempre as espécies mencionadas.
O status de conservação das espécies foi avaliado por meio da “Lista das Espécies da
fauna Silvestre Ameaçada de Extinção no Estado de Minas Gerais” e da “Lista da Fauna
Silvestre Brasileira Ameaçada de Extinção, 2008”.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As atividades de levantamento da mastofauna foram realizadas nos dias 24 a 28 de
setembro de 2008, durante o período seco, e nos dias 17 a 24 de janeiro de 2009, durante o
período chuvoso.
Foram amostradas trinta e duas espécies de mamíferos distribuídas em dezoito
famílias e sete gêneros, durante o período seco. As famílias mais abundantes foram a Cavidae
e Dasypodidae, ambas com 15% do total de espécies levantadas.
No período chuvoso, foram amostradas sete ordens, vinte famílias e trinta e seis
espécies de mamíferos. As famílias mais abundantes foram a Dasypodidae, com 14%, e
Felidae, com 11% do total de espécies levantadas.
Na tabela 01 pode-se verificar a lista de espécies amostradas no período seco e
chuvoso.
Tabela 1. Lista geral de espécies de mamíferos registrados na Fazenda Canabrava. Ordem, família,
espécie, nome popular da espécie, período em que a espécie foi encontrada (S: seco, C: chuvoso),
registro que permitiu identificá-la (RT: rastro, AV: avistamento, VC: vocalização, FZ: fezes, AT:
atropelado, OS: ossada, ENT: entrevista) e status de conservação.
MASTOFAUNA DA FAZENDA CANABRAVA, AUGUSTO DE LIMA, MG
Ordem / Família
ARTIODACTYLA
Cervidae
Tayassuidae
Nome científico
Nome popular
Mazama gouazoubira
Ozotoceros bezoarticus
Veado-catingueiro
Veado-campeiro
Pecari tacaju
Cateto
Período
Registro
Status
S/C
S/C
OS/RT/ENT
ENT
Não ameaçado
Em perigo
C
ENT
Não ameaçado
CARNIVORA
Canidae
Cerdocyon thous
Chrysocyon brachyurus
Pseudalopex vetulus
Cachorro-do-mato
Lobo-guará
Raposinha
S/C
S/C
C
RT/OS/AV
AV/ENT/OS
AV/ENT/RT
Leopardus pardalis
Leopardus tigrinus
Panthera onca
Puma concolor
Jaguatirica
Gato-do-mato-pequeno
Onça-pintada
Onça-parda
S/C
S/C
S/C
S/C
ENT/RT
ENT/RT
ENT
ENT
Vulnerável
Vulnerável
Vulnerável
Vulnerável
Mephitidae
Conepatus semistriatus
Jaritataca
S/C
ENT/RT
Não ameaçado
Mustelidae
Lontra longicaudis
Eira Barbara
Galictis sp.
Lontra
Irara
Furão
S/C
S/C
C
ENT/RT/FZ
ENT/RT
ENT/RT
Vulnerável MG
Não ameaçado
Não ameaçado
Procyonidae
Nasua nasua
Procyon cancrivorus
Quati
Mão-pelada
S/C
S/C
ENT/RT
ENT/RT
Não ameaçado
Não ameaçado
Didelphis albiventris
Marmosops incanus
Gambá-de-orelhabranca
Catita
S/C
S/C
AV/ENT/RT
AV
Não ameaçado
Não ameaçado
Silvilagus brasiliensis
Tapeti
S/C
FZ/RT/ENT
Não ameaçado
Callitrix penicillata
Sagui-do-cerrado
S/C
AV/VC
Não ameaçado
Alouatta sp.
Guariba
S/C
ENT
Cavia aprea
Dasyprocta sp.
Hydrochoerus hydrochaeres
Kerodon rupestris
Preá
Cotia
Capivara
Mocó
S/C
S
S/C
S/C
AV/RT
ENT
ENT/AV
OS/AV/RT
Não ameaçado
Não ameaçado
Não ameaçado
Não ameaçado
Nectomys squamipes
Oryzomys subflavus
Rato-d’água
Rato-vermelho
S/C
S/C
AV
AV
Não ameaçado
Não ameaçado
Cuniculidae
Cuniculus paca
Paca
S/C
ENT
Não ameaçado
Dasyproctidae
Dasyprocta sp.
Cutia
C
ENT
Vulnerável
Thrichomys apereoides
Rato-marinheiro
S/C
AV
Não ameaçado
Coendou prehensilis
Ouriço-cacheiro
S/C
ENT/RT
Não ameaçado
Guerlinguetus aestuans
Caxinguelê
S/C
AV
Não ameaçado
Cabassous unicinctus
Euphractus sexcintus
Dasypus novemcinctus
Dasypus septemcinctus
Prioodontes maximus
Tatu-rabo-mole
Tatu-peba
Tatu-galinha
Tatuí
Tatu-canastra
S/C
S/C
S/C
S/C
S/C
AV
AV/ENT/RT
ENT
ENT
OS/ENT
Vulnerável
Não ameaçado
Não ameaçado
Não ameaçado
Vulnerável
Myrmecophaga tridactyla
Tamanduá tetradactyla
Tamanduá-bandeira
Tamanduá-mirim
S/C
S/C
ENT
ENT/AV/RT
Vulnerável
Não ameaçado
Felidae
DIDELPHIMORPHIA
Didelphidae
LAGOMORPHA
Leporidae
PRIMATES
Cebidae
Atelidae
RODENTIA
Caviidae
Cricetidae
Echimyidae
Erethizontidae
Sciuridae
XENARTHRA
Dasypodidae
Myrmecophagidae
Não ameaçado
Vulnerável
Não ameaçado
Deficiente de dados
O Estado de Minas Gerais se destaca por estar localizado em um local privilegiado, na
confluência de três grandes biomas brasileiros: Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica.
Consequentemente, sua fauna se enriquece pela presença de espécies típicas destas três
formações vegetacionais. Entretanto, grande parte da vegetação original do Estado, assim
como de outros Estados da região Sudeste, já se encontra modificada pela ação antrópica,
resultando em uma diminuição de habitats disponíveis para um grande número de espécies e,
por conseqüência, na redução de populações e, até mesmo, extinção local, em alguns casos.
A família Cervidae, durante o levantamento, foi representada por duas espécies,
Ozotoceros bezoarticus (Veado-campeiro) e Mazama gouazoupira (Veado-catingueiro).
Ambas as espécies não se encontram ameaçadas.
Os porcos do mato da espécie Pecari tacaju (Cateto) foram inventariados através de
entrevistas com moradores da região.
A maioria dos animais pertencentes à família Canidae é carnívora, alimentam-se de
todos os tipos de vertebrados, assim como moluscos, crustáceos e insetos (REIS et al., 2006).
Alguns comem também vegetais e frutos e, por sua versatilidade, se distribuem por vários
tipos de ambientes.
Espécies onívoras e generalistas, como o cachorro-do-mato (Cerdocyon thous), o quati
(Nasua nasua) e o mão-pelada (Procyon cacrivorous) são capazes de se adaptar à presença
humana, e até mesmo tirar proveito dela, graças a sua plasticidade alimentar e ambiental.
Os grandes felinos foram levantados através de entrevistas com a população. Puma
Concolor é uma espécie mais tolerante às atividades antrópicas, se comparada a Panthera
onca. Sua dieta é bastante variada, constituída quase que exclusivamente de mamíferos, desde
pequenos roedores até gado doméstico (OLIVEIRA & CASSARO, 1999).
Foram encontrados fezes e rastros de felídeos de pequeno porte e nas entrevistas eles
foram relatados também. As espécies de Felídeos levantadas encontram-se vulneráveis,
segundo as listas Federal e Estadual de Conservação.
A maioria das espécies de roedores que ocorrem em qualquer área são de pequeno
porte e, só podem ser incluídas após um levantamento utilizando-se armadilhas. Neste estudo,
foram contabilizadas apenas aquelas de maior porte e/ou mais características. O rato-d’água
(Nectomys squamipes), por exemplo, deixa pegadas altamente diferenciadas, o que permite
sua identificação, sendo relativamente comum em corpos d’água.
CONCLUSÃO
A área estudada apresenta-se altamente fragmentada e impactada, sendo que a maior
parte da vegetação nativa foi convertida em pastagens, motivos que levam à fauna de
mamíferos ser composta, principalmente, de espécies generalistas, capazes de sobreviver em
áreas alteradas.
Algumas espécies típicas de Cerrado permanecem, mas suas populações não foram
encontradas em abundância. Muitas das espécies maiores e mais dependentes de grandes
extensões de vegetação nativa só foram levantadas através de entrevistas, podendo não mais
habitar esta área.
AGRADECIMENTOS
Á Deus pela oportunidade de aprendizado e aos amigos da Vert Ambiental Consultoria
e Projetos pelo apoio.
REFERÊNCIAS
BECKER, M. & DALPONTE, J.C. Rastros de mamíferos silvestres brasileiros: um guia
de campo. Brasília: Editora UnB e Edições IBAMA. 180 p. 1999.
BORGES, P.A.L., TOMÁS, W.M. Guia de rastros e outros vestigios de mamíferos do
Pantanal. Corumbá: Embrapa Pantanal, 148p. 2005.
BRASIL. Ações prioritárias para a conservação da biodiversidade do Cerrado e
Pantanal. Ministério do Meio Ambiente, Funatura, Conservation International, Fundação
Biodiversitas, Universidade de Brasília. Brasília, DF. 22p. 1999
CULLEN JUNIOR, L; BODMER, R. E; VALLADARES-PÁDUA, C. Ecological
cosenquences of hunting in Atlantic forest patches. São Paulo, Brazil. Oryx, v. 35, n. 2 p.
137-144. 2001.
DOTTA, G. Diversidade de mamíferos de médio e grande porte em relação à paisagem
da bacia do rio Passa-cinco. Dissertação (Mestrado em Ecologia de Agroecossistemas)
Piracicaba. 116p. 2005.
FLEMING, T.H. The role of small mammals in tropical ecosystems – Small mammals their
productivity and population dynamics, Cambridge University Press. 1975.
OLIVEIRA, T. G. & CASSARO, K. Guia de identificação dos felinos brasileiros. São
Paulo: Sociedade de Zoológicos do Brasil, 2º ed. 60p. 1999.
REIS, N.R., PERACCHI, A.L., PEDRO, W.A., LIMA, I.P. Mamíferos do Brasil. Londrina.
437p. 2006.
STORER, T.I. Zoologia Geral. São Paulo: companhia Editora Nacional. 816p. 2002.
VOSS, R.S. & EMMONS L.H. Mammalian diversity in Neotropical lowland rainforests: a
preliminary assessment. Bulletin of the American Museum of Natural History, 230: 115
pp. 1996.