a federação russa: desenvolvimentos recentes no sector

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a federação russa: desenvolvimentos recentes no sector
As Grandes Economias
A FEDERAÇÃO RUSSA: DESENVOLVIMENTOS RECENTES NO SECTOR
ENERGÉTICO
Rui Nunes@
Putin believes that Russian ownership of Russia's resource base is critical to Russia's economic
recovery and to the country's reemergence as an important international actor (Olcott 2004).
Oil is becoming for Russia what nuclear status was to the USSR (Gorst 2004).
Gazprom is to a significant extent the foundation of our economic growth (Putin, Rosbalt, 15MAR04).
... it can be difficult to understand where the budgets of Gazprom and UES properly ends, and where
those of state organs begin (OCDE 2002).
... the disorder that has reined in the Russian oil and gas production is over. The state is retrieving the
control over natural resources (Slobodanuk 2003).
La tentative de reprise en mains par l'État du secteur pétrolier est un facteur nouveau et important de
l'évolution de l'industrie pétrolière (Locatelli 2004).
... the fiscal stance of Russia has become more vulnerable to a downward correction in oil prices that
was the case in the pre-crisis [1998] period (Kwon 2003).
Russia has indeed suffered from the Dutch disease since it began its transition to a market economy
(Bosquet 2002).
Unfortunately, there is currently a real risk of the venezuelization of Russia (Illarionov, Interfax,
14OUT04).
Some observers envisage Russia as a future main supplier of Western oil needs, displacing Saudi Arabia.
However, it is reasonable to assume that current Russian oil production is inflated by specific
circumstances that cannot last forever (Maugeri 2003).
Oil will have to be imported into Russia within the next 5-7 years (Stepashin, Rosbalt, 17FEV04).
Russia to Run Out of Oil in Six Years? (Pravda, 13ABR04).
The future lies in the hands of fields yet to be discovered (Ebel 2004a).
@
[email protected]
Departamento de Prospectiva e Planeamento
Informação Internacional, Vol. II, 2004
INTRODUÇÃO
O sector da energia na Federação Russa está em ebulição. O exemplo mais espectacular é a
recuperação na produção e exportação petrolífera pós-1998; o mais sintomático, a detenção
em 25OUT03 de Mikhail Khodorkovsky, então presidente da maior empresa petrolífera, a
Iukos, entretanto desmantelada; o mais estrutural, em termos políticos, a afirmação do
poder estatal, e em termos geológicos, a discussão sobre a dimensão das reservas,
confrontada com o segredo de Estado.
Outras demonstrações da velocidade e dinâmica das mudanças em curso são dadas pelos
anúncios, sucessivos e inconsequentes, de reforma no gás natural (GN) e na electricidade;
pela consolidação entre empresas russas e associação destas com ocidentais, com destaque
para a da BP com a TNK, no que foi o maior investimento directo estrangeiro (IDE) na
Federação Russa; pelo desenvolvimento de projectos difíceis em termos técnicos, climáticos
e geográficos; pelas intenções de investimento em infra-estruturas, como oleodutos,
gasodutos e portos; pelas perspectivas de exportação para EUA e Ásia (China, Coreia do Sul
e Japão); e pelo diálogo energético estabelecido pelos presidentes russo e norte-americano.
Se as alterações são inquestionáveis, a leitura das consequências é menos consensual. No
caso do petróleo, uns prevêem o fim [do domínio] da Organização dos Países Exportadores
de Petróleo (OPEP) (Morse e Richard 2002), mas outros apontam o que consideram as bases
insustentáveis do renascimento russo (Kwon 2003; Maugeri 2003; Odling-Smee e Thomson
2003). Das razões da insustentabilidade mencionam a dependência da economia face aos
preços elevados do petróleo, a anemia da procura interna, a degradação das infra-estruturas
de transporte, a dutch disease [perda de competitividade dos transaccionáveis pela
valorização
da
moeda
resultante
da
entrada de
quantidades
avultadas
de
divisas
proporcionadas pelas exportações de matérias-primas] e o clima hostil ao capital
estrangeiro.
O caso Iukos engrossou as perturbações em um sector já de si politizado. As consequências
em termos de IDE poderão ser insignificantes, apesar de revelarem a debilidade dos direitos
de propriedade e indiciarem a vontade do Kremlin controlar o mundo dos negócios. No fundo
seria apenas o regresso à tradicional centralização política. Representaria a correcção da
desagregação da era Ieltsin, se bem que as reformas deste simply accelerated the inevitable
collpase of a hugely inefficient system (Jack 2004: 34). A função (re)centralizadora é
desempenhada pelo FSB (ex-KGB), não pelo PCUS. Neste quadro, o pluralismo ocidental está
deslocado. A (re)centralização é geral e estende-se da economia à política, passando pelos
media. (Re)centralização é o resultado das expressões Vertical do Poder e Ditadura da Lei
empregues por Putin.
A vontade ocidental de aceder às reservas energéticas russas poderá amenizar as
consequências negativas do caso Iukos, pese a sugestão de John McCain, Richard Perle e
George Soros de expulsar a Federação Russa do G8, ou a contratação de insiders da política
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norte-americana, como Stuart Eizenstat, para fazerem lobbying por Khodorkovsky. Ao fundir
as suas operações na Federação Russa com a TNK, negócio em que pagou 6,15 mil milhões
de dólares (USD) (a fusão com Amoco custou-lhe dez vezes mais), a BP tomou uma decisão
de consequências indeterminadas na sua totalidade – para ela própria, as rivais ocidentais e
as empresas locais.
Inegável da mesma forma é a resistência, nacionalista ou interessada, à entrada dos
estrangeiros por parte de políticos, empresários ou o chamado “homem da rua”. O
adiamento da legislação sobre acordos de partilha de produção [ou Production Sharing
Agreements (PSA)] é sintomático. Os nacionalistas contestam a alienação ao estrangeiro de
um
recurso
natural,
que
entendem
dever
aproveitar
aos
Russos,
mais
a
mais
proporcionando, de forma considerada imoral, encaixes astronómicos aos oligarcas que
compraram (ou roubaram, como acusam) as empresas ao preço da chuva nas privatizações.
Os empresários resistem porque pela primeira vez vêem as empresas cheias de dinheiro, o
que lhes alimenta vontade de expansão em autonomia e uma lógica de conquista. O “homem
da rua” vê entretanto associado “oligarca” com “ladrão”, “estrangeiro” e “judeu”, o que
reforça o nacionalismo e o populismo.
Além do jogo político, está a sustentabilidade do preço do petróleo. Vale dizer que a
Federação Russa (produtores e governo) terá de equacionar a diversificação da economia
e/ou um período de preços inferiores.
Entretanto, e independentemente do preço, as empresas abrir-se-ão aos estrangeiros para
conseguir os recursos financeiros indispensáveis para investir em reservas, produção e infraestruturas? A legislação sobre PSA será aprovada nos termos desejados pelos ocidentais? As
alianças aumentarão, com a BP-TNK a ser uma première? A Lukoil, por exemplo, abrir-se-á
em troco da sua expansão nos EUA? Os siloviki [dirigentes políticos saídos da área da força:
militar, polícia, serviços secretos] tomarão conta dos activos petrolíferos, depois de Putin ter
assegurado o controlo da Gazprom? Neste caso, os estrangeiros afastar-se-ão ou negociarão
com quem estiver, seja quem for? Os siloviki rejeitarão a repetição da experiência da BP?
Entre o maior valor acrescentado (refinaria), que pretendem os estatistas, o controlo da
produção, que agradaria à OPEP, e a expansão desta e das exportações, que satisfaria os
privados e EUA, as opções esclarecerão.
Este texto pretende dar conta da dinâmica recente no sector energético russo e divide-se em
quatro partes, a saber, a centralidade da energia na Federação Russa; a recomposição
empresarial; a procura de mercados; e a relação com a OPEP, em particular a Arábia
Saudita.
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1. RECURSOS ENERGÉTICOS: BASE DA ECONOMIA, SOCIEDADE E POLÍTICA
The doubling of the GDP is a systemic and a large-scale task. But the main thing that we have to do here
and what we will need is the consolidation of political forces, of society (Putin 2003).
...the energy sector and the redistribution of the exports revenues and wealth it generates will continue
to lie at the heart of the consolidation and reform process (Barbieri e Khalioulline 2004).
Why can't we put 7,5 percent annual growth into the forecast? It's not just someone, it's the president
who called for the doubling of GDP (Fradkov, Moscow Times, 20AGO04).
Diversification is a top priority for structural reform in Russia, as it would be for any economy where one
percent of the workforce creates about 20 percent of GDP (Banco Mundial 2004b).
How raw material 'rents' are captured and reinvested in the economy and society will determine Russia's
development for the foreseeable future (Sapir 2004).
Síntese: A Federação Russa apresenta indicadores macro-económicos invejáveis – Since
1998, Russia has confounded the sceptics (OCDE 2004a: 9); with virtually no exception,
forecasters underestimated Russian economic growth in recent years (Barbieri 2004). Esta
evolução resulta do petróleo – do aumento dos preços, da produção e da exportação. A
questão é a sustentabilidade, se se der por adquirida a conveniência da diversificação da
economia. O objectivo enunciado pelo presidente Vladimir Putin de duplicar o PIB em 10
anos obriga ao sacrifício da diversificação. A necessidade de uma taxa de crescimento médio
anual do PIB de 7,25% requerida por aquele objectivo confronta-se com o facto de
historically, Russia has never grown faster than 5,5 percent without an increase in the price
of oil (Banco Mundial 2004a: 4). Apesar do risco das institutional pathologies (OCDE 2004:
16) típicas dos Estados rentistas produtores de energia, a Federação Russa prepara-se para
reforçar a fileira do gás natural, tanto em resultado do ritmo actual de exploração do
petróleo, como das perspectivas de ganho de importância daquela fonte no mercado
energético, em particular devido ao aparecimento de grandes consumidores na vizinhança
imediata.
Os números da agência oficial de estatística (Goskomstat) relativos a 2000 indicam que o
VAB do petróleo e gás natural (GN) representa 7,8% do PIB. Porém, corrigido do efeito dos
preços de transferência (1), sobe para entre 19,2% e 22,3% (Banco Mundial 2004a, 2004b;
OCDE
2004a).
O
limite
mínimo
reparte-se
por
extracção
de
petróleo
(10,6%),
processamento de petróleo (2,2%) e GN (6,4%). As estatísticas oficiais indicam ainda que
80% das exportações em 2003 foram de recursos naturais, com 55% relativas a petróleo e
GN. Os hidrocarbonetos geraram ainda 37% das receitas orçamentais e motivaram mais de
60% da FBCF.
O vice-ministro da Economia, Andrey Sharonov, afirmou, durante o Primeiro Congresso
Russo do Petróleo e Gás, em 23JUN03, que em 2002 o sector representara 14% do PIB,
26% das receitas orçamentais, 55% das exportações [35% petróleo e derivados; 20% GN] e
4% das importações. Conforme a conjuntura anual, o petróleo e o gás originam 20 a 40%
das receitas orçamentais e 30 a 40% das cambiais. As empresas da energia valem 70% da
capitalização bolsista. Em 1999 ocupavam 618 mil pessoas, das quais 416 mil na extracção
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de petróleo, 117 mil no processamento deste e 85 mil na extracção de gás. Só a Gazprom
empregava 300 mil; da sua produção, 58% foram vendidos na Comunidade dos Estados
Independentes (CEI), a maior parte para produção de electricidade, 31% exportados para
fora da CEI (UE; PECO; Turquia) e 11% consumidos pela própria empresa. Este concentrado
de números indica traços estruturais, como a dependência da Federação Russa face aos
recursos energéticos, a par de outros conjunturais, como a dimensão da perda pelo Estado
de receitas fiscais devido aos preços de transferência.
A dependência da economia face ao petróleo é mostrada por regras práticas. Christof Ruehl,
economista-chefe do Banco Mundial na Federação Russa, calcula que o aumento do preço do
barril em 1% provoca uma subida correlativa de 0,07 pontos percentuais (pp) na taxa no
PIB. Estudos do FMI, mencionados por Guglietta (2003) e Loison (2003), concluem que uma
baixa de um USD no preço do barril amputa 0,5 pp ao crescimento do PIB, mil milhões USD
às receitas orçamentais e dois mil milhões USD às exportações. Zabotkine e Pukhayev
(2001) calculavam que por cada USD de variação no preço do barril o valor da exportação
oscila em 1,85 USD e o das receitas orçamentais em 1,1 USD. Recentemente, Kwon (citado
em Banco Mundial 2004b: 8) estima que o aumento do preço do barril Ural em um USD
eleva as receitas do orçamento federal em 0,35% do PIB e do consolidado em 0,45% do PIB.
Brian de Clare, responsável da divisão de derivados sobre commodities do ABN-Amro,
garante que there is a far closer correlation between the oil price and Russian GDP than most
people realised, quantificando-a em 86% após a desvalorização de 1998, que compara com
36% antes (Financial Times, 28JUN03).
Barnard e Thomsen (2002) realçam a dependência da economia face aos recursos naturais,
em particular energia e metais., baseados em uma análise bancária à propriedade das 64
maiores empresas, cujas vendas totalizaram 109 mil milhões USD em 2000 (42% do PIB).
As controladas pelo Governo, como a Gazprom e a eléctrica UES, representaram 43% das
vendas. Da facturação dos privados, 85% corresponderam a oito conglomerados, todos
baseados nos recursos naturais. A situação leva-os a aludir à dutch disease. As exportações
de petróleo, gás e metais representaram 75% do total em 2003, após 60% em 2002. Os
preços do níquel, no máximo de 14 anos, e do ouro, no máximo dos últimos oito anos,
devem ser relativizadas, por espelharem a queda do dólar. Por outro lado, juntem-se ainda
as armas nas exportações relevantes.
A Federação Russa está entre a sustentabilidade do preço do petróleo e diversificação da
economia. Existem, porém, factores que podem ajuadr a consolidar a fileira energética. A
eventual proximidade do peak oil (2) à escala mundial conjugada com o aparecimento de
grandes consumidores, como China e Índia, que se somam aos EUA, e o ganho de
importância do GN, são alguns. Neste cenário, as reservas russas apreciar-se-iam comercial
e estrategicamente no curto prazo [outro ponto é a sua dimensão].
1.1. A Recuperação pós-1998
Em 17AGO98 a Federação Russa suspendeu o pagamento da dívida externa. Terá sido o
culminar da implosão da URSS, cujo fim fora formalizado em Minsk, em 08DEZ91. Na
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desorganização generalizada – com sociedade, política e economia entre desestruturação e
reestruturação – sobressaiu o crescimento da economia não-monetária. A ausência de
liquidez, reforçada pela contracção de crédito, e a gestão política da economia expandiram a
troca directa, as notas promissórias de baixa credibilidade e reduzida extensão geográfica, a
aceitação pelas autoridades fiscais e empresas estatais, designadamente de energia, de
pagamentos em géneros, o endividamento e o não pagamento puro e simples. Com o PIB
em queda ininterrupta – 40% de 1991 a 1997 (Dolinskaya 2002), sem discutir a qualidade
da produção subjacente –, a informalização da economia serviu para substituir a concessão
de crédito, preservar emprego e conquistar apoios políticos (3).
O sector da energia teve um dos papéis centrais nesta evolução (OCDE 2002; Commander,
Dolinskaya e Mumssen 2000). Em 1998 a Gazprom só recebeu 15% das suas vendas e as
centrais eléctricas da UES 20%. Ao receber em cash apenas uma pequena parte das vendas,
a UES fazia o mesmo a fornecedores, como Gazprom – a quem devia 1,4 mil milhões USD no
final de 2000, correspondente a 40% do total dos créditos da gasífera –, petrolíferas e
carboníferas. Por outro lado, a queda dos preços do barril, com o Benchmark Brent, replicado
quase a 100% pelo Ural (Gráfico 1) (4), a começar 1997 nos 24 USD e acabar 1998 nos 9
USD, contraiu as receitas das petrolíferas e consignou 70% das receitas de exportação dos
12 maiores exportadores ao reembolso de dívidas. Todas ficaram limitadas no cumprimento
das obrigações fiscais. O governo viu-se sem fontes internas de liquidez para suportar a rede
de segurança social e os compromissos com credores (Bosquet 2002). Para mais prescindira
de imprimir dinheiro, para cumprir objectivos de inflação, estabilidade cambial e baixas taxas
de juro – sem reduzir despesas, o que motivou alusões a orçamentos virtuais (Aitken 2001).
Défices orçamentais médios de 8,1% do PIB entre 1993 e 1997 ilustram o problema. A
dinâmica do endividamento e o câmbio revelaram-se insustentáveis.
Gráfico 1
A DINÂMICA DO PREÇO DO PETRÓLEO
Fonte: Banco Central da Federação Russa.
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A partir de 1998 a economia inverteu a tendência (Gráficos 2 a 5). O PIB começou a
apresentar taxas de crescimento elevadas: 5,4% (1999), 8,3% (2000), 5,2% (2001), 4,3%
(2002) e 7,3% (2003). Em AGO04, o ministro das Finanças, Alexei Kudrin, previu para 2004
um crescimento entre 6,9% e 7,1%, projectando para os próximos anos 6,3% (2005), 6,1%
(2006) e 6,5% (2007). O segredo esteve na conjugação da desvalorização de 1998 com a
recuperação do preço do petróleo (5). A balança corrente passou de um défice de 6 mil
milhões USD na primeira metade de 1998 para um excedente de 45 mil milhões USD em
2000; as reservas de 12 mil milhões USD no fim de 1999 para 76,9 mil milhões USD no fim
de 2003 e 100,1 mil milhões USD em 15OUT04; e a dívida externa de 96% do PIB em 1999
para 34,2% em 2003.
As empresas energéticas aproveitaram em pleno, ao pagarem em rublos e facturarem em
USD. As novas condições viabilizaram investimentos na produção (e exportação), com
recurso a conselhos de sociedades ocidentais, como Halliburton e Schlumberger, e fizeram
reentrar na zona da rentabilidade muitos poços. Por sua vez, o preço médio anual do barril
Ural mais do que duplicou até 2000 – 11,8 USD em 1998; 17,1 USD em 1999; 26,4 USD em
2000 –, mantendo-se depois acima dos 20 USD (23,0 em 2001; 23,5 em 2002; 21,5 USD
em 2003). Se o preço em 2003 fosse o de 1998, o saldo orçamental federal passaria do
excedente de 2,7% do PIB para um défice de 0,1%.
Gráfico 2
RECEITAS DO PETRÓLEO E CRESCIMENTO DO PIB NA RÚSSIA (1996/2002)
Fonte: Dobrinsky (2003).
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Gráfico 3
RECEITAS DO PETRÓLEO E DÉFICE ORÇAMENTAL NA RÚSSIA (1996/2002)
Fonte: Dobrinsky (2003).
Gráfico 4
AS EXPORTAÇÕES DE PETRÓLEO DA RÚSSIA (1996/2002)
Fonte: Dobrinsky (2003).
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Gráfico 5
DINÂMICA DA TAXA DE CÂMBIO REAL DO RUBLO (1995/2002)
Fonte: Dobrinsky (2003).
Foi assim possível reanimar a economia, em particular na actividade conexa da indústria
petrolífera, como transportes, metalurgia e construção, mobilizar capacidades industriais
desocupadas, aumentar o emprego estatal e remonetarizar as trocas. Há quem acrescente o
factor Putin (Beck e Schularick 2003; Esanu 2003; Kwon 2003), apesar de mencionar a sua
sorte por começar a governar com a economia no fundo e a o preço do petróleo a subir.
Vernet (2002) aduz ainda que Putin herdou um país em tripla crise: identitária, porque não
sabia o que era ou para onde ia; política, com o Estado minado pela corrupção e
desintegrado em proveito de mafias e/ou oligarquias; económica, com o PIB reduzido a
metade em 10 anos. Guglietta (2003) pormenoriza: L'effondrement de la Russie dans les
années 1990 – la Russie est passée d'une économie de production sans marché à une
économie de marché sans production – était la conséquence du ”régime d'accumulation"
pendant l'ère soviétique et d'un problème de présidence qui a donnée naissance à une
économie de marché dominée par des requins de l'industrie.
Mas a situação degradada herdada por Putin manteve-se, com excepção – e apesar – da
macroeconomia. A crise demográfica e sanitária e os desaires das Forças Armadas [Kursk,
Chechénia, lançamento falhado de mísseis, ameaça de mães dos soldados de criar um
partido para denunciar as condições do serviço militar,...] são exemplos. Kalugina e Najman
(2004) sublinham que um terço da população está abaixo da linha oficial de pobreza, os
rendimentos dos 10% mais ricos excedem o dos 10% mais pobres em 14 vezes, o sistema
de protecção social não funciona e que avoir un seul emploi déclaré – dans le secteur formel
– accroît la probabilité à la fois d'être et de se sentir pauvre (p. 36). Isto é explicado par la
baisse significative depuis 1994 des salaires réels dans le secteur formel, mais également par
la réduction des avantages liés aux emplois salariés (faible retraite, système de santé en
crise, disparition des avantages sociaux, etc.) (p. 42).
A imagem da Federação Russa como um país em desagregação, um Estado com dificuldades
de afirmação e uma economia em risco de mono-especialização é forte Putin (2003) admite-
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o. Oliker e Charlick-Paley (2002) entendem que as a weak state, Russia shares some
attributes with “failed” or “failing” states. Feshbach (2003) refere-se a um country on the
verge. Naím (2004) invoca o risco de evolução para um petro-Estado, como Venezuela ou
Nigéria, oil-rich countries plagued by weak institutions, poorly functioning public sector and
high concentration of power and wealth, where gulf between rich natural sources and chronic
poverty of citizens has led to political unrest and frustration. Um relatório da CIA (Global
Trends 2015) vê a Federação Russa as a terminally ill patient (Independent, 30ABR04). Além
de se admitir a desintegração do Estado, evidencia-se uma população em contracção e cada
vez menos saudável.
1.2. Reformar ou Crescer: sob a Economia, Encontrando a Política
A meta de duplicação do PIB dentro de 10 anos, enunciada por Putin (2003), a par da
eliminação da pobreza e da modernização das Forças Armadas, aparece como a segunda
fase da resposta à situação de degradação, após a centralização do poder. Se, por um lado,
Putin está ciente do risco da petro-estatização, por outro lado, aquela meta é mais do que
parece à primeira vista.
Ao discursar sobre o estado da nação, em 16MAI03, Putin (2003: 7) admitiu o perigo da
dependência do petróleo, ao afirmar que economic growth remains extremely unsustainable
e que without a favorable foreign economic situation our success stories in social and
economic development would have been much more moderate. Para que não restassem
dúvidas, acrescentou: It is essential to bear in mind that such a favourable situation cannot
and will not last forever.
O assessor presidencial Andrei Illarionov insiste: The effects of high oil prices were masking
poor economic policy over the past three years. (...) last year higher oil prices contributed
9,2 per cent to gross domestic product. But GDP increased only 7,3 per cent, so domestic
factors cut growth by 1,9 percentage points (Financial Times 07OUT04).
Os analistas dizem o mesmo. Kwon (2003) contesta que as melhorias nas receitas públicas
após a crise de 1998 are largely irreversible due to sucessful tax reforms, political stability,
and economic growth. [...] on the contrary, the fiscal stance of Russia has become more
vulnerable to a downward correction in oil prices that was the case in the pre-crisis period.
These findings highlight the need for measures to shield its budgetary stance against oil price
volatility. A Unidade de Informação Económica (EIU) do The Economist, citada em Esanu
(2003), constata que a parte dos hidrocarbonetos nas exportações subiu de 43% em 1998
para 55% em 2002. Gomart (2003) considera que le véritable enjeu du second mandat de
Poutine é la capacité de la Russie à ne pas être reliée au monde uniquement par les
questions d'approvisionement énergétique, de commerce d'armes et d'intelligence sharing.
Esanu (2003) acrescenta que la Russie ne semble pas parvenir à sortir du modèle de
croissance fondé sur la rente pétrolière et demeure dépendante des cours de matières
premières potentiellement instables.
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Putin (2003: 10-11) revela o que subjaz à duplicação do PIB: The doubling of the GDP is a
systemic and of course a large-scale task. It will call for a profound analysis and adjustment
of the existing approaches to economic policy. But the main thing that we have to do here
and what we will need is, again, the consolidation of political forces, of society (6).
Consolidation of all the branches of government; the pooling of the best intellectual forces;
support of the social and political structures; cooperation between parliament and
government; a joint search for optimum ways of solving the truly strategic, vital, historic
task for Russia.
A duplicação do PIB aparece assim como resultado da consolidação, da centralização,
política, factor sine qua non da recuperação, afirmação e viabilização da Federação Russa.
Por outras palavras, a gestão da economia decorre da centralização do poder no Kremlin,
vista como condição de sobrevivência e afirmação.
O conceito de consolidação corresponde à actualização de outro, também formulado por
Putin quando ascendeu à Presidência, o da vertical do poder (propagação da autoridade
presidencial ao conjunto da Administração e à totalidade do território) complementado por
um terceiro, o da ditadura da lei. Depois de substituir Sergei Stepashin como primeiroministro, em 09AGO99 [a que se seguiu a presidência interina em 31DEZ99, após a
resignação de Ieltsin], Putin escreveu um artigo, traduzido pelo Jornal de Negócios em
16DEZ99, em que comentava a derrota da URSS na Guerra Fria. Considerava que era só
comparável à sofrida pela Alemanha e pelo Japão na II Guerra Mundial. Sobre o pós-URSS,
afirmava que o resultado da tentativa de integrar a economia mundial a qualquer preço foi a
destruição do 'complexo económico' russo e a sua transformação em apêndice fornecedor de
matérias-primas aos países mais desenvolvidos. [Já em 2004 considerou o colapso da URSS
uma tragédia nacional de uma enorme dimensão (Interfax 12FEV04)]. Chegara o momento,
adiantava, de a Rússia definir prioridades por si própria. A primeira, aproveitar o complexo
militar-industrial, onde estão os quadros mais qualificados. Também na altura, Putin
estipulava um prazo de 10 anos para resolver os problemas da economia, falhada a terapia
de choque preconizada pelo Ocidente, até porque Alemanha e Japão precisaram de 20 anos
para se reerguer no pós-guerra.
Conjugar vertical do poder, ditadura da lei e consolidação pode colocar, por outras palavras,
a energia a financiar o complexo militar-industrial. Wallander (2003: 308) sublinha que a
política externa está em função da redução da debilidade económica: Russia's foreign policy
concepts and national security doctrine were reformulated to identify Russian weakness as
the greatest threat the country face, and to support development of a vibrant and successful
economy as the main foreign policy task. Isto mesmo é apontado como o real objectivo da
acção judicial contra a Iukos. Belton (2003) cita declarações do ministro da Defesa, Sergei
Ivanov, ao Kommersant, segundo as quais o Estado deve controlar os sectores estratégicos
da economia, em particular a exploração e o nível de produção do petróleo. Belton atribuiu
ainda a Sergei Markov, um analista identificado com o Kremlin, a frase Se a Iukos não for
vendida aos EUA, e o Estado conseguir assumir o seu controlo e formar um sindicato das
principais empresas petrolíferas, aumentará os seus recursos e a sua influência internacional.
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O ministro da Economia, German Gref, já disse que quer financiar a high-tech, leia-se o
complexo militar-industrial, com os recursos obtidos com as receitas petrolíferas. Marshall
Goldman, director do Centro Davis de Estudos Russos e Euro-Asiáticos, na Universidade de
Harvard, ainda no artigo de Belton, afirma que the siloviki seem to want to take back control
of oil revenues so that they can build up the military industrial complex as they did in Soviet
times. A possibilidade de a renda da energia financiar o (re)armamento já fora mencionada
por Adler (2001): Espérons que, comme dans la dernière comédie douce-amère (mais qui
finit bien) de Pavel Lounguine, la Noce, magnifique tableau impressionniste du moment russe
actuel, nos héros poutiniens, tout pétersbourgeois qu'ils soient, n'allaient pas boire 'bystro!'
en vodka ou en industries d'armement, c'est la même chose, les quelques milliards de dollars
de rente qui leur permettent peut-être d'envisager un peu de bonheur quotidien.
A duplicação do PIB como prioridade – a par da eliminação da pobreza e modernização das
Forças Armadas – tem de ser lida, por outro lado, no contexto em que foi formulada. Na
altura, o governo era chefiado por Mikhail Kasyanov, ligado à Família, palavra que
designa(va) o grupo do ex-presidente Boris Ieltsin. Quando o governo Kasyanov divulgou em
25AGO03 o programa de desenvolvimento económico até 2005, deu prioridade às reformas,
não ao crescimento. Para mais, contrastava a fiscalidade com a legalidade. Da primeira, que
dependia de si, entendia que comparava bem com os países considerados atraentes pelos
investidores; da segunda, dependente do presidente, alinhavam-se queixas sintetizadas na
ausência de um sistema efectivo de aplicação da lei.
Ao demitir Kasyanov, em 24FEV04, e nomear Mikhail Fradkov, em 01MAR04, Putin removeu
a principal fonte institucional de divergência política e contestação técnica à sua actuação em
geral e a este objectivo em particular. Em consequência, the Russian government has set a
task to ensure a GDP growth of 7 to 9 percent per year in the near future, Russian Prime
Minister Mikhail Fradkov declared at today's meeting of the Cabinet (RBCNews, 17JUN04).
O estabelecimento burocrático-administrativo do objectivo político de duplicar o PIB em
10 anos suscitou manifestações de cepticismo. Na altura (2003), os cépticos perguntavam
pelas fontes de crescimento, quando se discutia se a economia cresceria 3,5% ou 4%.
Mas entretanto o preço do petróleo disparou.
O que saiu pela porta, porém, parece ter entrado pela janela, com o governo dividido quanto
à concretização do objectivo. Em causa está o sacrifício das reformas resultante da aposta no
petróleo, uma vez que o tempo requerido para aquelas darem resultado inviabiliza a
duplicação do PIB em 10 anos. É a vontade política versus a capacidade da infraestrutura
física, tecnológica, administrativa e humana, a que se pode somar a volatilidade dos
mercados, designadamente o petrolífero. Cabinet Screwed Up, Says Kudrin, titulava o
Moscow Times, em 20AGO04, um artigo sobre uma reunião do Executivo. Nesta, Fradkov
teria criticado os ministros das Finanças, Alexei Kudrin, e do Comércio e Desenvolvimento
Económico, German Gref, e ameaçado remodelá-los. Ao comentar as metas para o PIB
aprovadas na reunião [6,9%-7,1% para 2004; 6,3% para 2005; 6,1% para 2006; e 6,5%
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A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
para 2007], Fradkov exclamou: Why can't we put 7,5 percent annual growth into the
forecast? It's not just someone, it's the president who called for the doubling of GDP.
De resto, o próprio Gref – oriundo do governo Kasyanov, como Kudrin – já em DEZ03 punha
a duplicação do PIB em função de sorte, situação favorável nos mercados estrangeiros e
reformas ambiciosas. Para enfatizar o aleatório, Gref sublinhava que o objectivo de duplicar
o PIB não será atingido se algum destes elementos faltar. E já propôs o adiamento da meta
para 2015, com referência ao PIB de 2004 (Interfax, 14DEZ04). Ao contrário, Illarionov
defendeu a antecipação da duplicação do PIB de 2002 para 2010 (Moscow Times, 13AGO04),
a atingir com a melhoria da política económica e do ambiente empresarial, via liberalização,
combate à corrupção e tranquilização da comunidade empresarial. Enquanto estes ministros
e o assessor preferem a liberalização, o primeiro-ministro opta pela estatização. Fradkov
realçou (Financial Times, 28SET04) que a Rússia should not be ashamed of the term ”active
industrial policy”.
Entre adiar, cumprir ou antecipar a meta temporal da duplicação do PIB, o está em causa é a
lógica rentista. A perspectiva da reforma, da diversificação, da procura de fontes de
crescimento, decorre da inconveniência da mono-especialização. Passando por cima da
discussão
das
reformas
estruturais,
a
alternativa
tem
associado
o
problema
da
sustentabilidade do petróleo enquanto fonte de crescimento, desde logo pela volatilidade do
preço, mas também pelo nível da produção e pela (in)capacidade de exportação e a própria
disponibilidade do produto, além dos efeitos perversos da especialização.
Fradkov já anunciou que o governo vai trabalhar na diversificação das fontes do crescimento,
focando-se nas tecnologias de informação e na inovação, bem como na infra-estrutura
industrial e dos serviços financeiros (RBC, 27SET04). Também já admitiu (Interfax,
14ABR04) que a Rússia tem de evoluir de uma economia de renda para uma desenvolvida.
Mas parece render-se ao petróleo, quando reconhece que sem acabar com a dependência
das exportações de matérias-primas, o crescimento anual do PIB será inferior a 3-4%. O FMI
(2004: 15) menciona um potencial de crescimento da economia em torno dos 5%. A solução
avançada por Fradkov é sintomática do seu dilema – em declarações à Interfax (10MAR04)
prometeu aproveitar o preço elevado do petróleo para diversificar a economia, garantindo ao
mesmo tempo que aumentará a produção deste, a exploração geológica, a construção de
oleodutos e o investimento no sector da energia. Entretanto, lamentou que unfortunately,
the fuel sector dominates in the structure of investments in the country (RBC, 27SET04).
Como corolário, aceitou que to ensure that many sectors of the Russian economy make great
strides, there is nothing to do but to attract foreign business (Interfax, 12NOV04). O que
coloca a questão das condições de atracção e operação deste.
O cenário da duplicação do PIB em 10 anos, além da petro-estatização, tem riscos como a
estabilização do Iraque, o arrefecimento da economia chinesa e norte-americana e o recurso
pelos EUA à sua reserva estratégica. Barbieri (2004) alerta aidan que the idea that high oil
prices could exert decreased effects on economic growth is begining to gain credence. Até
pelo efeito estatístico de base, que provoca a contracção das elasticidades – as oil prices get
very high, their marginal impact on the economy may decrease.
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
A dependência orçamental do preço do petróleo evidencia-se ainda quando o projecto do OE
para 2005 contempla despesas de 3,05 biliões [milhão de milhões] de rublos (104 mil
milhões USD), que equivalem a 16% do PIB. O nível dos preços permite uma previsão de
receitas de 3,327 biliões de rublos (114 mil milhões USD). Qualquer variação negativa no
pilar principal das receitas ameaça o equilíbrio orçamental.
1.2.1. A atracção da renda
Neste contexto começaram a ouvir-se teorizações relativas à cobrança de uma renda natural
sobre a exploração económica dos recursos naturais, que deveria contribuir mais para a
sociedade, via orçamento.
Serguei Stepashin, presidente do Tribunal de Contas, ex-primeiro-ministro e ex-chefe do
FSB, foi um apoiante do conceito. Uma justificação foi a compra de 50,09% do clube de
futebol inglês Chelsea, por 29,6 milhões de libras (42,58 milhões de euros), por Roman
Abramovitch, accionista da Sibneft. Stepashin acusou-o de usar o regime fiscal da Chukotka,
de que era governador, para reduzir os impostos da petrolífera. Considerando isto uma
afronta política ao país, prometeu medidas económicas muito severas contra a Sibneft, entre
as quais um controle fiscal excepcional. When this young man took USD 10 billion out of the
country in 2001 at the expense of pensioners, I asked myself what is the government here
for? (Rosbalt, 17FEV04). O iate de Abramovitch, avaliado em 122 milhões USD, e um
planeado investimento na hotelaria suíça reforçaram a polémica.
Nesta linha, Kudrin declarava (Financial Times, 03DEZ03) que oil is the main resource of the
country. (...) The absence of tax payments was a serious problem. De forma esclarecedora,
acrescentava: Yukos is the number one for avoiding taxes [O jornal contrapôs a Sibneft].
They were very agressive. They tried to find legal schemes. I can't criticise legal tax
avoidance but morally it's another question. The court will judge.
O partido de Putin, Rússia Unida, dirigido pelo ex-ministro do Interior, Boris Gryzlov,
defendeu, na campanha eleitoral para as legislativas, de 07DEZ03, que the unearned superprofits obtained by raw materials oligarchs that fell in their lap during the Boris Yeltsin years,
must be contributed to the state budget, and from there channelled into social programmes,
regional development, and making national industry more modern and competitive. This is
what is called 'natural rent' (Fillippov 2004). Um economista, Dmitry Lvov, citado por este
jornalista do Pravda, esticava o raciocínio ao afirmar que by using natural rent, Russia might
in general do without any labour and capital taxation, abolish value added tax, abolish or at
least drastically cut profit tax, free company from paying into the pension fund, and the bulk
of the population from income tax. Como sintetizava Gryzlov, ainda no artigo: The country's
natural resources must belong to the entire nation.
Putin propôs, durante uma intervenção televisiva em 18DEZ03, o agravamento da carga
fiscal sobre o lucro acima de determinado patamar das petrolíferas, para aumentar a receita
fiscal e desagravar outras indústrias. Afirmou que a repartição dos lucros, que disse ser 80%
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A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
para as petrolíferas e 20% para o Estado, era o contrário do que se passa nos países
desenvolvidos, e contrapôs 50:50. Criticou então votações na Duma anterior às eleições de
07DEZ03 em que comunistas, SPS e Iabloko votaram contra o agravamento fiscal das
petrolíferas, o que foi atribuído ao lobby destas. As eleições resolveram o problema, ao
redundarem na eleição de 300 deputados em 450 do Rússia Unida, na eliminação de SPS e
Iabloko e na laminação do PCUS pelo Rodina.
Porém, foi no próprio Kremlin que se ouviram as primeiras críticas à ideia, com Illarionov a
considerá-la a anti-ideia do ano. O então vice-primeiro-ministro, Viktor Khristenko, reduziu-a
a slogan eleitoral e admitiu antes a introdução de uma renda administrativa em vez de
económica (Prime-Tass, 20JAN04). O chief strategist da Renaissance Capital integrou-a na
pretty explicit campaign to drag back the resource economy under state influence (Nash
2004). Salientou ainda a forma errática da concretização da ideia: Kasyanov mencionava o
lucro obtido com preços do barril superiores a 25 USD; Putin particularizava uma taxa sobre
a extracção de recursos naturais; Primakov, ex-primeiro-ministro, ex-chefe do KGB e
presidente da Câmara de Comércio e Indústria, sugeria a taxação da exportação; e
Stepashin aludia a um aumento da taxa sobre a produção.
Anatoly Yanovsky, vice-ministro da Energia, admitia que a renda, fosse qual fosse a forma,
começasse a ser cobrada em 2006, com os analistas da Troika Dialogue a antecipá-la para
2005. Gref definiu como razoável um encaixe de três mil milhões USD. Os economistas da
Aton entendem que the main result of the elections [legislativas de 2003] is likely to be a
rise in taxes for big business and a review of property rights in a context of a general
worsening of the country's business climate (Pinchuk 2003).
Em ABR04 o Executivo mexeu na fiscalidade sobre as petrolíferas. A lógica foi a de uma
imposição progressiva sobre a produção e exportação, variável em função do preço do barril.
Baseado no valor de 18 USD, o novo esquema permitiria receitas extras de dois mil milhões
USD na exportação e 600 milhões USD na produção se o barril alcançasse os 27 USD. Em
MAI04, com o Ural nos 30 USD, Kudrin previu uma receita orçamental suplementar de 3,3
mil milhões USD. Em OUT04, o Brent ultrapassou pela primeira vez os 50 USD nominais... A
divergência entre os ministros da Economia, Gref, e Energia, Igor Iusufov, conhecida em
FEV04, com o primeiro a prever uma receita extra de 3 mil milhões USD e o segundo a
querer o dobro, dissipou-se com a superação das previsões mais optimistas ou ambiciosas.
Em 2002, a facturação das petrolíferas foi de 55-60 mil milhões USD, com que pagaram
17-21 mil milhões USD de impostos, nove mil milhões USD de transportes e 15 mil milhões
USD de extracção. Os lucros situaram-se nos 11-13 mil milhões USD, de que 10% foram
para dividendos, o que deixa 10 mil milhões USD. O problema está assim na determinação
da dimensão da renda. Os analistas da Aton consideram que a taxa de lucro, estimada entre
25% e 30%, pode ser reduzida a metade [4 a 6 mil milhões USD]. Se for mais, haverá fuga
de capitais, prevêem. O líder do Rodina mencionou estimativas da Academia Russa das
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Ciências que quantificam a renda anual dos recursos naturais em 50 mil milhões USD
(Glazyev 2003) e defendeu a redução da taxa de lucro dos oligarcas de 50% para 10-15%.
O Ministério da Indústria e Energia estimou, pela primeira vez, os grandes números do
sector, com referência a 2003. Apurou vendas de 70 mil milhões USD (38,8 mil milhões USD
das exportações de crude e 30,3 mil milhões USD de refinados) e custos operacionais de
20,1 mil milhões USD, repartidos entre 12,75 mil milhões USD de manutenção e 6,1 mil
milhões USD em transportes. O resultado operacional de 50 mil milhões USD divide-se em
25 mil milhões USD de impostos e outro tanto em lucro. O Instituto para a Modernização e o
Alfa Bank adiantam números similares. O banco divide o resultado operacional em 23,1 mil
milhões USD para Lukoil, 15,5 mil milhões para a Iukos, 7,5 mil milhões para a
Surgutneftgaz, 7 mil milhões para a Sibneft e 5 mil milhões para a Tatneft. Esta informação
financeira é relativa à produção de 421,3 milhões de toneladas (mt), de que foram
exportadas 207. Já cálculos da Iukos estimam vendas sectoriais de 81 mil milhões USD,
contrabalançadas por custos de 70,5 mil milhões USD [18 na extracção; 12,5 em
transportes; 12 em investimentos na extracção; e 28 em impostos], o que deixa 10,5 mil
milhões USD para lucro.
Entretanto, Sapir (2004) considerou que just advocating taxation of natural resources is not
enough. It is a first step, but needs to be followed by a comprehensive economic and social
strategy for Russia. Tem de esclarecer se se quer aumentar a receita fiscal ou melhorar a
exploração dos recursos naturais; taxar mais a extracção ou a exportação; lidar com a
sobrevalorização do rublo; e onde aplicar o dilúvio de petrodólares.
Outra forma de cobrar uma renda às empresas, sem ser por via fiscal, é pô-las a financiar
despesas sociais. Putin afirmou que business cannot and should not be disengaged from
resolving social problems (Interfax, 23DEZ03). Acrescentou inclusive que businesses will find
it profitable to participate in projects aimed at improving the worker's living conditions. [Na
Federação Russa há muitas cidades que, na realidade, correspondem a cidades-empresa,
nascidas da necessidade logística de exploração de recursos de uma região, com a empresa
a pagar habitação, escola, hospital e transporte. Company town, factory-town, algumas
mesmo closed town (Jack 2004: 21); mere physical collection points, repositories and supply
centers – utilitarian in the extreme (Gaddy e Hill 2004: 10). Com o fim da URSS, a
desestruturação subsequente e as privatizações, muitas empresas desresponsabilizaram-se
da sorte destes centros populacionais e seus habitantes].
Ideias para aplicar o dinheiro não têm faltado. Além da constituição de um fundo de reserva,
alinham-se aumento de pensões, bolsas para estudantes e salários para militares e função
pública, bem como investimentos na educação e saúde e nos transportes (portos,
aeroportos, pipelines). Ao perigo da falta de estratégia junta-se o da corrupção. Aliás,
Fradkov fez do combate à corrupção uma prioridade, o que é a admissão que a Vertical do
Poder continua com dificuldades de afirmação ao fim de quatro anos. Em outro registo,
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A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
Bosquet (2002) alerta que grande parte da renda perde-se, via desperdícios e subsidiação,
com os decisores focados apenas nos lucros e impostos.
1.2.1.1. O fundo de estabilização
Para prevenir a baixa do preço do Ural, e os efeitos da quebra de receitas, a Federação
Russa constituiu um fundo de estabilização, a partir de 01JAN04, com 257,9 mil milhões de
rublos (8,8 mil milhões USD). [A Noruega tem um similar que ascende a 130 mil milhões
USD, grosso modo o PIB português em 2003]. A dotação inicial proveio de uma reserva
financeira, criada em DEZ01 para preparar um pico na amortização de dívida externa em
2003. A sua utilização só será possível para cobrir défices orçamentais resultantes da queda
do preço abaixo do valor de referência (20 USD), mas apenas depois de ter atingido os 500
mil milhões de rublos (17 mil milhões USD).
Em SET03, Kudrin declarou que o objectivo era permitir que a Federação Russa sobrevivesse
a uma queda do preço do barril para 15 USD, que se previa no horizonte de 3 anos. Na
memória está a crise da dívida externa de 1998. Estimava-se uma dimensão do fundo no
final de 2006 entre 311,3 mil milhões de rublos (10,16 mil milhões USD) e 668,1 mil milhões
de rublos (21,8 mil milhões USD). O fundo seria alimentado ainda com os excedentes
orçamentais, além das receitas fiscais obtidas quando o preço do Ural excedesse 20 USD,
valor médio dos 10 anos anteriores.
Em 01OUT04 as reservas acumuladas atingiam 349,7 mil milhões de rublos (11,9 mil
milhões USD), com Kudrin a admitir que cheguem a 574,4 mil milhões de rublos (19,6 mil
milhões USD) até ao fim de 2004. Em 04JUN04, Kudrin ainda previa 380 mil milhões de
rublos para o final do ano. Ou seja, a subida do preço do petróleo permitiu que quase se
atingisse em um ano o valor esperado para três. Enquanto o orçamento para 2004 se baseou
no preço do barril de 22 USD, a média nos nove primeiros meses foi de 31,30 USD, com o
Ural acima dos 40 USD depois. As contas dos dirigentes russos incluem ainda um preço
médio de 21,6 USD entre 1998 e 2007, graças a uma previsão de 28 USD entre 2005 e
2007; para 2004 a média prevista é de 32 USD.
Esta disponibilidade financeira divide o governo quanto à sua aplicação. Barbieri e
Khalioulline (2003) previam que there is no absolute guarantee that the rules will be
observed if a political consensus emerges to the contrary. Sobre a parte reservada do fundo,
o governo decidiu investi-la em títulos de dívida pública norte-americana, britânica e da Zona
Euro, e limitar as aplicações monetárias a dólar, libra e euro. Mas Kudrin já declarou à Duma
que só começaria a gastar depois de atingidos 600 mil milhões de rublos, e não os
estipulados 500 mil milhões. E garantiu que só utilizará o excedente na amortização da
dívida externa e na anulação do défice do fundo de pensões, que resultará da redução do
imposto sobre salários previsto para 2005.
As sugestões não param. O ministro da Indústria e Energia, Viktor Khristenko, quer financiar
a expansão da UES na Ásia Central, Irão, Turquia e China (1,3 a 1,4 mil milhões USD
durante 5 a 7 anos), a rede de distribuição de electricidade e o oleoduto para o Pacífico. A
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
melhoria das infra-estruturas foi outra ideia: reconstrução de aeroportos e portos fluviais,
manutenção de estradas e construção de metropolitanos em São Petersburgo e Kazan, a
capital tártara. O vice-primeiro-ministro, Alexander Zhukov, discorda e rejeita financiar
projectos em grande escala, por serem arriscados e o eventual retorno demorar 5 a 10 anos.
Prefere aplicações de efeito mais rápido, como redução da inflação. O ministro da Economia,
Gref, recusa aplicações em current needs e sugere que at first we should allocate the money,
select projects and finance them (Mosnews, 11OUT04). Yevgeny Yasin, ex-ministro da
Economia (1994-97), corrobora-o ao considerar que it's a stupid idea to pile up money
without having any idea of how to spend it. Critica ainda a intenção de tapar um défice que
nem existe e defende investimentos na ciência, educação e alta tecnologia (Moscow Times,
01SET04). Sergei Suverov, economista principal do banco Zenit, sugere o desenvolvimento
das indústrias aeronáutica e naval. O FMI e a OCDE aconselham amortizar a dívida externa,
antes de qualquer investimento social, redução de impostos incluída, ou industrial. Já no final
do ano, Kudrin afirmou que a partir de 2006 serão afectados anualmente 2 mil milhões USD
do fundo para projectos de infra-estruturas (RBC, 22DEZ04), além de a dívida externa ser
amortizada entre 7 a 10 mil milhões USD a sair do acumulado em 01JAN06. A previsão,
acrescentou, é que o fundo atinja os 719 mil milhões de rublos (25,4 mil milhões USD) no
final de 2005.
Esterilizar liquidez, para o que também conta a saída de capitais (8 a 12 mil milhões USD em
2004), ou investir; reduzir impostos, consolidar a fileira energética e modernizar o sector
militar ou estimular a diversificação; focar no curto ou médio prazo; liberalizar ou estatizar –
é isto que subjaz à discussão sobre o destino do excedente do fundo de estabilização
petrolífero e da execução orçamental. Certo é que while the revenue base of the Russian
government increased, however, neither this policy, nor other legislation, set an actual
economic development strategy in place (Olcott 2004: 25).
Entretanto, Yermakov (2004) prevê que a fiscalidade regresse ao centro da agenda política à
medida que o custo da produção aumentar. A recuperação desta, assente nos campos
tradicionais da Sibéria Ocidental, encarecerá à medida que estes produzam menos e
obriguem a investimentos nas novas províncias na Sibéria Oriental e no offshore árctico. Está
por saber se o aumento da fiscalidade servirá de argumento às petrolíferas para reduzirem
investimentos, ou se será um obstáculo real, mais a mais dado o tratamento do investimento
directo estrangeiro (IDE), entre hostilização e menorização.
1.2.2. A sustentabilidade em discussão
Com o crescimento em função de sorte, centralização política, mercados estrangeiros e
reformas, a economia tem mais certezas quanto aos problemas. Entre os principais está a
sustentação do sector energético (reservas bastantes e disponíveis) e a lógica económica na
exploração. Identificam-se ainda o investimento baixo fora dos recursos naturais, um
enviezamento em favor das grandes empresas, a dificuldade de obter empréstimos sem
ligações pessoais e a degradação de infra-estruturas e equipamentos industriais.
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Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
A divergência governamental mencionada estende-se às agências de notação. A S&P acusou
a Moody's de enviesamento pró-russo, pelo upgrade da notação da dívida em 08OUT03,
reafirmado em OUT04. Esta revisão colocou pela primeira vez a dívida em grau de
investimento, o que permitiu empréstimos a taxas mais reduzidas. A S&P sublinha que se a
Moody's pode estar contente com o retrato estático da Federação Russa, sabe – tem de
saber – que a dinâmica é tudo menos optimista. Helena Hessel, analista principal da S&P,
garantiu, em seminário realizado em Moscovo, em 16DEZ03, que a sua agência nunca
mexeria na notação antes de a Federação Russa passar pelo teste de enfrentar preços baixos
do petróleo. Hessel disse ainda que as perspectivas da economia são boas apenas a curto
prazo, enquanto que os ratings da S&P reflectem o longo prazo. A S&P e a Fitch mantêm a
notação da dívida russa ao nível de junk.
A lógica de pôr a energia a financiar o complexo militar-industrial só será comprometida no
contexto actual pelo esboroar da base da oferta: as reservas energéticas. Isto porque o
choque representado pela China no lado da procura garante por si preços relativamente
elevados. É ainda de esperar o fim da anormalidade de um grande produtor e um grande
consumidor de energia estarem de costas voltadas, apesar da fronteira comum.
Assim, por a energia proporcionar mais cash em menos tempo, a diversificação deverá
passar a objectivo secundário. As perspectivas, razoáveis no curto prazo, apresentam-se
problemáticas no médio prazo, perante a dutch disease, um quadro institucional instável –
com a propriedade e exploração dos recursos naturais, em especial energéticos, no centro –
um problema demográfico sério e um sistema financeiro frágil. Diversification of the Russian
economy will take longer than widely held (...) Russia creditworthiness will continue to
depend on volatile oil and gas exports (Beck e Schularick 2003).
1.2.2.1. As reservas petrolíferas: 70 ou 400 mil milhões de barris?
A informação das reservas petrolíferas tem sido relativizada. À dificuldade normal de uma
estimativa, que não corresponde a uma ciência exacta, acresce a política oficial de não
divulgação de números. Durante a URSS os recursos em hidrocarbonetos eram considerados
estratégicos e a sua informação sujeita a segredo. Curiosamente, o local onde estão
guardados documentos secretos sobre as reservas, o Centro Fedynsky de Pesquisas em
Ambiente e Geofísica Regional, foi assaltado em meados de OUT04. Em todo o caso, há
desenvolvimentos recentes que as colocam em níveis insuspeitos.
As estatísticas anuais da BP (2004) indicam reservas provadas de 69,1 mil milhões de barris
(mb), ou 9,5 mil mt, no final de 2003. O Departamento de Energia do governo norteamericano, em MAI04, calcula 60 mil mb. Reservas provadas são as que a informação
geológica e tecnológica disponível indica que podem ser recuperadas, com uma certeza
razoável, dadas as condições económicas e tecnológicas existentes. Relativas à produção de
2003 [421,2 mt ou 8,534 milhões de barris diários (mb/d)], aquelas reservas dão para
22,2 anos (BP 2004). Em termos relativos, a Rússia tem 6,0% das reservas mundiais. Só a
superam Arábia (22,9%%), Irão (11,4%), Iraque (10,0%), Emiratos Árabes Unidos (8,5%),
Kuwait (8,4%) e Venezuela (6,8%).
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Àqueles 69 mil mb, o vice-presidente da Iukos para a exploração, o geólogo norte-americano
Ray Leonard, contrapôs intervalos de 90 – 105 mil mb e 97 – 119 mil mb nas conferências
da ASPO, em MAI02 e MAI03, respectivamente. Pelo meio, o presidente da Lukoil, Vagit
Alekperov, disse, durante uma conferência do Baker Institute, em 01OUT02, que as
auditorias internacionais às 10 maiores empresas russas indicavam reservas de 76 mil mb
em 2001 e admitiu a duplicação para 150 mil mb entre 2010 e 2015, com o desenvolvimento
de Timan-Pechora, Cáspio, Sibéria Oriental, plataforma continental do Árctico e Sacalina. Da
mesma forma, o director do Departamento de Combustíveis e Energia do Ministério dos
Recursos Naturais (MRN), Rinat Murzin, durante uma conferência sobre o potencial siberiano,
realizada em 16-17DEZ03, afirmou que a Sibéria Oriental é capaz de produzir 80 mt de
petróleo e 60 mil milhões de metros cúbicos (mmmc) de GN por ano durante 35 a 50 anos.
O problema, relativizou, era obter 51 mil milhões USD. Consegui-los dependeria do
orçamento federal e dos regionais e, mais importante, das empresas que exploram os
recursos minerais.
Em ABR04, o presidente da BP, John Browne, admitiu que as reservas da joint-venture com
a TNK podiam passar de 6 mil mb para o quíntuplo, ombreando com as dos EUA. Em
17SET04 foi a Iukos a rever em alta as reservas provadas, pelos padrões da Society of
Petroleum Engineers (SPE), da Iuganskneftegaz, então a sua principal unidade, para 93,7 mil
mb (12,8 mil mt), o que quintuplica a soma das reservas provadas, prováveis e possíveis
consideradas até então (19,4 mil mb; 2,7 mil mt) e excede as provadas russas.
Em 28SET04, a firma DeGolyer & MacNaughton, sedeada em Dallas, elevou a sua estimativa
de reservas provadas na Sibéria Ocidental de 56 mil mb em 2001 para 66 mil mb. Esta
revisão foi feita também segundo as regras da SPE, que considera provadas as reservas
recuperáveis comercialmente e não-provadas (prováveis ou possíveis) as que sofrem de
incerteza técnica, contratual, económica ou regulatória. Pelas regras russas, que privilegiam
a geologia mais que a viabilidade comercial, a estimativa de recuperáveis sobe para 106 mil
mb, que duplicam (200 mil mb) quando se acrescentam as prováveis. O vice-presidente da
empresa, Martin Wiewiorowski, calcula que a dimensão das reservas suporta uma produção
de 10 mbd durante os próximos 50 anos. Nos oito primeiros meses de 2004, a Sibéria
Ocidental produziu 6 dos 9,1 mbd extraídos na Federação Russa.
O entusiasmo pela revisão em alta das reservas levou um broker da Brunswick UBS a
declarar ao Financial Times (30ABR04) que by the end of decade Russia will be proven to
have 50 per cent more hydrocarbon reserves than what Saudi Arabia has today (262,7 mil
mb, só em petróleo, pelas estimativas da BP, mas o ministro saudita do Petróleo admitiu, em
26DEZ04, a probabilidade de as reservas aumentarem quase outro tanto: 200 mil mb).
Significaria isto a passagem de 70 para 400 mil mb.
Wiewiorowski adianta, neste mesmo artigo (Ostrovky e Hoyos 2004), que as companhias
russas contabilizavam no final de 2002 cerca de 18% do petróleo, pelas regras da Securities
and Exchange Comission (SEC) [exclusão das reservas fora do alcance de um poço em
actividade e das que podem ser produzidas após expirar a licença da produção] e 24% pelas
28
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
do SPE. Percentagens que são metade das consideradas pelas empresas ocidentais. Ao
contrário, a Shell reviu as suas reservas em baixa por 4 vezes em 2004.
A importação de know-how ocidental explica as reavaliações e o aumento da produção.
White (2004) menciona sessions of pizza and long hours in a special room, em Moscovo, no
qual two veterans of Oklahoma and Colorado set up a training center, onde young engineers
from the Siberian production units with the help of 3-D glasses and high-powered computers,
could see how to improve the flow of oil at their wells.
Porém, constata-se um hiato entre recuperação da produção (gráfico 6) e revisão em alta
das reservas: aquela sobe por maior eficiência; estas sobem por reavaliação, não por
descobertas, mas permanecem indisponíveis, falhas de investimento. A dream backed by
potencial substituído por a dream blurred by reality (Ebel 2004a).
Gráfico 6
EVOLUÇÃO DA EXTRACÇÃO DE PETRÓLEO NA RÚSSIA
Fonte: Bosquet (2002) até 2002; imprensa para 2003 e 2004.
A explicação está na estratégia das empresas, que maximiza produção e exportação. Ces
comportements de cash stripping s'accompagnent de stratégies de prédation d'actifs (asset
stripping) qui permettent d'aumenter rapidement la base exportable sans se lancer dans de
vastes programmes d'exploration beaucoup plus coûteux en investissements et surtout
beaucoup plus incertains. (...) A l'inverse, les investissements de long terme notamment
dans l'exploration et le renouvellement des réserves ont été largement sacrifiés, alors qu'ils
sont déterminants de l'évolution de long terme de la production (Locatelli 2004: 5-6). A
precariedade dos direitos de propriedade, decorrente do processo de privatizações,
incentivou esta lógica de transformação tão rápida de petróleo em cash.
Departamento de Prospectiva e Planeamento
29
Informação Internacional, Vol. II, 2004
Ebel
(2004b)
menciona
um
levantamento
do
MRN
que
aponta
a
ineficiência
no
desenvolvimento dos campos, com perdas significativas para o Estado. Como pormenoriza:
The issue is this. In Russian terms it is called 'selective production'. (…) a company
developing an oil field selects the largest and most accessible oil-bearing formations and
produces only them. Moreover, associated natural gas is flared off and low yields wells are
simply shut down. [Em] 2003, more than 34% of oil wells under Yukos control stood
inactive; some 51% of Sibneft wells were inactive (p. 4). Stepashin já afirmara que virtually
no Russian companies, with the possible exception of Lukoil, are carrying out any geological
research or drilling any new oil wells but are simply operating those oil wells and oil fields
that were discovered in Soviet times (Rosbalt, 17FEV04).
A produção tem-se concentrado na Sibéria Ocidental. Em desenvolvimento estão a Sibéria
Oriental e o offshore dos mares de Barents e Cáspio e da ilha Sacalina; as novas fronteiras
estão no offshore dos oceanos Árctico e Pacífico e Mar Negro (Mapa 1).
Mapa 1
A BASE ENERGÉTICA DA RÚSSIA – REGIÕES, CAMPOS E ESTÁDIOS DE MATURIDADE
Fonte: Leonard (2003).
A maior eficiência na extracção de reservas confronta-se assim com a renovação destas. Os
alertas sucedem-se. Em 2000 o Ministério da Energia afirmou que as reservas não estão a
ser renovadas e que a produção em campos marginais (inferior a 10 toneladas diárias) já era
55-60% do total. A Agência Internacional de Energia (AIE) (2002) previu que sem
investimento de longo prazo – quantificado por aquele Ministério entre 550 e 700 mil milhões
USD entre 2001 e 2020; pelo do Comércio e Desenvolvimento Económico (MCDE) entre
128 e 140 mil milhões USD entre 2005 e 2015; estimado pela AIE em 900 mil milhões USD
entre 2005 e 2030 – o sector petrolífero fique em situação crítica. Cerca de 100 mt por ano
30
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
(mt/a) dos campos maduros da Sibéria Ocidental têm de ser substituídas até 2012. O MRN
avança que no pior cenário as reservas só chegam até 2010 (Rosbalt, 15JUN03; Pravda,
13ABR04). Um relatório do MCDE, de ABR03, alertava que exploração geológica insuficiente
e redução do investimento na renovação de reservas e em tecnologias de produção
ameaçavam o aumento da produção. Realçava ainda a deterioração da estrutura das
reservas pela exaustão de grandes e produtivos campos. A Clearing House assegurava, em
JUN03, que o sector da energia estava em declínio, a qualidade da produção a deteriorar-se,
os investimentos na prospecção e exploração do GN e petróleo aquém do necessário, que as
privatizações privaram o Estado de receitas e as empresas praticavam preços de
transferência ruinosos para as regiões produtoras. O presidente da ConocoPhilips admitiu, na
conferência
do
Baker
Institute, que incremental
investment
will
sustain near-term
production, but it isn't enough to create a sustainable future. Russia will experience a decline
in production by the end of the decade if new large reserves are not brought on line. Já Kjell
Aleklett, presidente da ASPO, questiona as próprias reservas e prevê que a sua falta leva à
baixa da produção, após um pico no início da próxima década (gráfico 7). Aleklett prevê que
a Federação Russa só produza mais 60 mil mb, além dos 125 mil mb já extraidos (gráfico 8).
Gráfico 7
EVOLUÇÃO DAS DESCOBERTAS E DA PRODUÇÃO PETROLÍFERA NA RÚSSIA
Fonte: Kjell Aleklett, www.peakoil.net.
Departamento de Prospectiva e Planeamento
31
Informação Internacional, Vol. II, 2004
Gráfico 8
NIVEL ACUMULADO DE DESCOBERTA E PRODUÇÃO DE PETRÓLEO NA RÚSSIA
Fonte: Kjell Aleklett, www.peakoil.net.
Um pico em 2010 é previsto também por um estudo da Iukos, com o horizonte de 2020.
Após exceder um pouco os 10 mbd, onde deverá ficar até 2015, começará um declínio lento
(gráfico 9). Ebel (2004a, 2004b) destaca o pico nas duas principais regiões – Sibéria
Ocidental e Urais-Volga – e em Timan-Pechora e contrasta o que se espera das novas zonas
produtoras com o que se sabe. A Sibéria Oriental produz 40 mil bd em 2001 e prevê-se que
aumente para 1,34 mbd em 2020. Mas a produção posterior a 2010 deve vir de campos
ainda por descobrir. Da mesma forma, o offshore, que também produziu 40 mil bd em 2001
deverá produzir 1,3 mbd em 2020, oriundos de reservas ainda desconhecidas. Como diz
(2004a): The future lies in the hands of fields yet to be discovered. Neste sentido, também o
vice-director do instituto de pesquisa VNIGRI, Oleg Prischepa, afirmou em ABR04 durante
um seminário em São Petersburgo, que a produção petrolífera e de GN em Timan-Pechora
teria o seu pico entre 2013 e 2020.
32
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
Gráfico 9
PREVISÃO DA PRODUÇÃO PETROLÍFERA DA RÚSSIA 2001/2020
(A VISÃO DA YUKOS)
Fonte: Leonard (2003).
Uma quebra na produção a partir de 2010 é ainda admitida por Rinat Murzin por renovação
insuficiente das reservas. Mais pessimista, o vice-presidente da Lukoil, Leonid Fedun, prevê
que a produção de petróleo e GN interromperá o crescimento em 2007 (RBC, 13JAN04).
Stepashin já mencionou previsões segundo as quais oil will have to be imported into Russia
within the next 5-7 years (Rosbalt, 17FEV04). Igor Mashmako, director do Centro para um
Uso Efectivo da Energia, foi o último em série a admitir que as exportações poderão ser
interrompidas em 2010, devido à falta de eficiência no consumo energético russo (RBC,
08DEZ04).
Nas novas áreas de produção, a complexidade, o custo e o risco são maiores. Ou seja, a
Federação Russa está a ser um case study da muito anunciada tendência de a procura e
extracção de petróleo passar a ocorrer em áreas mais longínquas, perigosas e difíceis – e
ainda sem pipelines –, uma vez que o petróleo na proximidade, de extracção fácil e em
segurança está a acabar. No offshore árctico e na Sacalina os lugares estão meses sob gelo,
as empresas têm de construir todas as instalações e infra-estruturas e lidar com pressões de
ecologistas, como os defensores da baleia na Sacalina ou os Noruegueses, e comunidades
locais. A Federação Russa carece ainda de petroleiros de mar profundo e quebra-gelos em
quantidade suficiente. Já se discutiu o uso de submarinos nucleares para transportar
petróleo e GN sob os gelos do Árctico.
Recorde-se, entretanto, que a primeira expedição científica russa em 20 anos ao Árctico,
realizada em 2000, concluiu que a plataforma continental é maior que a estimada, o que
permitiria, se os resultados forem validados, alargar a actual em 1,2 milhões de quilómetros
quadrados e reclamar recursos além da zona offshore de 320 quilómetros. No final de 2004,
Departamento de Prospectiva e Planeamento
33
Informação Internacional, Vol. II, 2004
a Noruega promoveu uma iniciativa semelhante para procurar provar que o solo do Norte da
Groenlândia
ao
Pólo
Norte
é
geologicamente
uma
extensão
natural
do
território
dinarmarquês. Esta prova dar-lhe-ia acesso a novos recursos em petróleo e GN, reconheceu
o governo, que financiou a expedição em 25 milhões USD.
Kasyanov admitia que desenvolver a Sibéria Oriental apenas com meios russos exigiria
7 anos, talvez mais. Em reunião com responsáveis japoneses avançou que algumas medidas
seriam tomadas para encorajar as empresas japonesas a iniciar a prospecção de campos
petrolíferos na Sibéria Oriental e Extremo Oriente russo (Rosbalt, 16DEZ03).
Assim, o aumento da produção só ocorrerá if Russian oil companies, against the background
of high oil prices, continue to maximize current yields, but at the expense of the future; if
Russia improves its investment climate, and that means 'the rule of law' must be firmly in
place; if foreign oil investors responds, and that means the world oil market must be of
sufficient attraction to offset the risks of doing business in Russia (Ebel 2004a).
1.2.2.2. Lógica económica versus subsidiação: o gás natural (GN)
Putin foi claríssimo sobre o papel do GN, e da Gazprom, na Federação Russa: Gazprom is to
a significant extent the foundation of our economic growth. Its gas is sold in Russia, for both
ordinary and industrial uses, at less than cost. The growth of all the other economic spheres
rests on Gazprom (Rosbalt, 15MAR04). E acrescenta: We know very well that gas is sold for
households and industrial consumers at prices lower than its production costs. That is why if
we introduce free market gas prices, gas will cost $110 per 1,000 cubic meters for domestic
consumers and this is impossible (Neftegaz, 15MAR04). A OCDE (2004a: 130) reforça: It is
difficult to exaggerate the significance of Russia's natural gas industry, both nationally and
internationally.
A Gazprom tem 68% das reservas e responde por 93% da produção; os independentes
valem 30% das reservas e 7% da produção, dos quais 5,9% é feita pelas petrolíferas. A
geração de energia é a actividade que mais consome GN (40%), seguida pela metalurgia
(8%), agro-química e petroquímica (7%), serviços de interesse público (public utilities)
(14%), com o consumo da população entre 10 e 11%.
Recursos energéticos, em particular GN, em abundância e as receitas da sua exportação
evitam o colapso da Federação Russa, permitindo uma exploração sem lógica económica e
um consumo desregrado pelos padrões ocidentais. A intensidade energética do PIB russo é
15 a 20 vezes superior à de economias como a alemã ou japonesa. Em 2003 o consumo de
energia por USD do PIB foi mais do dobro (2,3) da média mundial.
A importância do GN é patenteada tanto nas reservas como no consumo, além do contributo
orçamental. A Federação Russa possui as maiores reservas mundiais de GN, as segundas no
carvão e as sétimas no petróleo (BP 2004). No GN tem 26,7% do total, quantificados em
47,0 biliões [milhão de milhões] de metros cúbicos – o segundo é o Irão com 15,2% –, que
lhe permitiriam repetir a produção de 2003 durante mais 81,2 anos, e é o maior produtor
34
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
mundial (578,6 mmmc; 22,1%), à frente dos EUA (21,0%). Tem ainda as segundas reservas
de carvão (15,9%) a seguir aos EUA (25,4%).
Mais de metade do consumo – 640,2 mt equivalentes de petróleo [o terceiro mundial
(6,8%), após EUA (24,4%) e China (10,6%)] – foi de GN (54,6%), seguido por petróleo
(19,2%), carvão (15,4%) e electricidade de origem hídrica (5,8%) e nuclear (5%). Por outro
lado, é o quinto consumidor de energia nuclear (5,3%), após EUA (30,5%), França (16,2%),
Japão (11,7%) e Alemanha (6,1%) e de electricidade de origem hídrica (6,3%), a seguir a
Canadá (13,3%), Brasil (10,9%), EUA (9,8%) e China (9,4%).
Esta fartura de energia provocou, paradoxalmente, que a Federação Russa se tornasse o país
mais frio do mundo by nearly any conventional measure of temperature (Gaddy e Hill 2004).
Na história russa, dimensão e frio têm sido vistos como activos estratégicos, de defesa. Com
energia à discrição e uma mão-de-obra escrava fornecida pelo Gulag (15% a 18% do
produto e emprego industrial no pós-II Guerra Mundial), os planeadores soviéticos
industrializaram e povoaram a Sibéria. Isto teve um impulso forte durante a II Guerra
Mundial com a deslocação de fábricas da Rússia europeia para leste dos Urais para as afastar
das tropas alemãs. Mas continuou. Criaram-se cidades para fornecer trabalhadores a
fábricas, minas e campos de GN e petróleo. Em resultado, um terço da população vive em
particularly inhospitable climatic conditions e cerca de 10% live and work in almost cold and
large cities in Siberia (p. 104). A Federação Russa esticou e arrefeceu. Estas cidadesempresa constituem pontos no mapa, mais do que uma rede urbana, com poucos contactos
entre si, dependentes dos subsídios para combustível e alimentação – autárcicas, inviáveis,
subsidiadas. Esta realidade começou a motivar críticas. Quando a URSS acabou, the
industrialization of Siberia was begining to seem a monumental mistake (p. 111). O chefe da
Gazprom, Aleksei Miller, já afirmou que the mistakes of the 1970s, when the North was
developed on a massive scale and entire towns were constructed, had to be admitted. And
what do we do with them now? (Rosbalt, 29ABR04). Como que em resposta, na mesma
ocasião, Putin afirmou que the government's main task had to be the creation of adequate
conditions for life in the North. Gaddy e Hill estimam que a Sibéria e o Extremo Oriente têm
16 milhões de pessoas a mais e a Federação Russa uma temperatura média inferior em 1,5
graus ao que deveria. Como calculam que cada grau de temperatura per capita a menos
reduz o PIB entre 1,5 a 2 pp, o frio está a contrair o PIB entre 2,25 a 3 pp anuais. Sugerem
que a Federação Russa encolha o espaço útil para indústria e população, cingido a zonas
mais quentes. Para a Sibéria iriam trabalhadores na base da deslocação temporária.
Esta subsidiação mantém-se generalizada. Há widespread expectations that energy should
be provided at little or no cost (Linn 2003). A OCDE (2002: 115) classifica a Gazprom e a
UES como instituições quase-fiscais [fenómeno extensivo à ex-URSS (Petri, Taube e
Tsyvinski 2002)], por concederem substantial subsidies to firms, households and regions in
various forms. Admite (2002: 106) que in a complicated web of arrears, debt restructuring,
money surrogates, and implicit subsidies, it can be difficult to understand where the budgets
of Gazprom and UES properly ends, and where those of state organs begin. Por certo dá que
subsidies channelled trough the electricity and gas industries remain enormous (2002: 20),
perto de 5% do PIB em 2000 (cerca de 13 mil milhões USD).
Departamento de Prospectiva e Planeamento
35
Informação Internacional, Vol. II, 2004
Linn especifica três componentes da subsidiação: consumo não pago; custo da energia
fornecida não coberto pela estrutura tarifária; ineficiências operacionais e roubos. Cobrir
custos significa no curto prazo aquisições, manutenção e operação; no médio e longo prazo,
financiar o investimento necessário à sustentação da actividade.
O subsídio à economia [definido como a diferença entre receitas e custo marginal de longo
prazo, o que permite a permanência da actividade] atingiu 95% na electricidade em 1998 e
92% no GN em 1999. Com a intensificação das cobranças em numerário (83,6% nos oito
primeiros meses de 2004), o principal subsídio passou a ser a diferença entre os preços
correntes de electricidade e gás e o seu custo económico. A subsidiação permite consumo
ineficiente – agravado por ausência de contadores, estado degradado da rede de transporte
e distribuição e roubos –, mantém métodos de produção obsoletos, afasta o investimento e
reduz a preocupação com o desperdício.
As receitas de exportação da Gazprom são a principal fonte de financiamento desta
subsidiação, extensível à UES na forma de GN barato para produzir electricidade. Em 2003,
por cada mil metros cúbicos (mmc), as famílias pagaram 15,9 USD e os consumidores
industriais 23,8 USD, mas as exportações para a Europa não-CEI foram facturadas a 128,1
USD. A exportação de 25% da produção rende 75% da facturação. Estilizando: o orçamento
e o modo de vida russo são sustentados pelos consumidores europeus – alemães à cabeça.
A AIE (2002: 133) admite que a reforma dos preços do GN é a medida política mais
importante para o sector da energia na primeira década do século XXI. Perante os problemas
sociais, políticos e económicos decorrentes do aumento de preços, torna-se necessário um
programa de assistência social. A racionalização de preços confronta-se com o facto de the
domestic market is not really a market at all. It is rather a rationing mechanism with marketbased activity at the fringes (OCDE 2004a: 132). A AIE reconhece que the economic and
commercial basis of gas sales within Russia is extremely complicated (2002: 124). Na
negociação
da
adesão
à
Organização
Mundial
do
Comércio,
a
Federação
Russa
comprometeu-se a subir os preços domésticos, de uma média de 23,4 USD no final de 2003,
para 37-42 USD por mmc até 2006 e 49-57 até 2010.
Outro problema é a renovação de infra-estruturas e reservas. Como no petróleo, aqui
convivem visões optimistas e pessimistas, com a opacidade informativa em fundo. O governo
prevê uma produção de 635-665 mil milhões de metros cúbicos (mmmc) em 2010 e
680-730 mmmc em 2020, ano em que espera que a Gazprom produza 580-590 mmmc. Ao
contrário, a Gazprom quer estabilizar a produção de 530 mmmc até 2020, mas o seu
presidente já mencionou os objectivos de 580-590 mmmc em 2020 e 610-630 mmmc em
2030. Entretanto, a própria capacidade de estabilização é questionada. O problema com as
previsões do aumento da produção, que já a colocaram em 700 mmmc em 2010 e 800-1000
mmmc em 2020 é o de while possible purely in terms of resource availability, have been
recognised as economically unrealistic. É que future supply management must be a function
of the ability and willingness of customers – domestic and foreigners – to pay prices high
enough to support the required investments (AIE 2002: 113). Em todo o caso, a previsão de
36
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
exportações aponta para o aumento dos 140 mmmc em 2003 para 180-200 mmmc em 2008
e 220 mmmc em 2020.
As reservas concentram-se na Sibéria Ocidental (75%); na Rússia Europeia (16%), incluindo
o Mar de Barents, e na Sibéria Oriental e no Extremo Oriente (9%). Na Sibéria Ocidental, a
produção concentra-se na região Nadym-Puz-Tazovsky, nos campos super-gigantes de
Yamburg, Urengoy e Medvezh'ye, que equivalem a 75% da produção da Gazprom e 65% da
produção russa. Porém, as reservas do primeiro estão consumidas em 45%, do segundo em
65% e do terceiro em mais de 75%. Dada a necessidade de 5 a 7 anos para um campo
entrar em funcionamento, nenhum funcionará antes de 2010. Os 5 super-campos conhecidos
estão em áreas remotas, no Norte árctico, o que encarece o desenvolvimento e exige
investimento em gasodutos. O declínio siberiano será compensado pela entrada em
funcionamento de Shtokmanovskoye, no Mar de Barents, e, depois de 2015, pela península
de Yamal. O desenvolvimento do primeiro requererá entre 10 a 20 mil milhões USD, além do
gasoduto, para produzir 20 mt/a de gás natural liquefeito (GNL) e o do segundo 65 mil
milhões USD.
A AIE (2002) classifica como unduly pessimistic (p. 113) as projecções oficiais sobre a
produção daqueles campos, de 457 mmmc em 1999 para 142 mmmc em 2020. It is not
quite clear why Gazprom and the Russian government expect such steep declines in the
super-giant Siberian fields (2002: 113). A OCDE (2004a: 138) admite that it [Gazprom] has
an economic interest in exaggerating the expected declines in order to increase the pressure
on the authorities for higher prices. Porém, um responsável da AIE, Ralf Dickel, admite o
pior: Russian gas giant Gazprom will not be able to ensure additional supplies to European
countries. O cumprimento dos contratos assinados não está em causa, mas os posteriores
sim. Fields that are already being operated by Gazprom are almost depleted and the
development of new fields will require enormous investment (Interfax, 13SET04).
A redução da produção naqueles campos super-gigantes na dimensão esperada pelo governo
implica uma nova capacidade de produção de 300 mmmc até 2020. A AIE (2002) cita
documentação russa que identifica como alternativas outros campos na Sibéria Ocidental,
com custos de produção superiores, como o de Zapolyarnoe, que começou a funcionar, após
10 anos de desenvolvimento, no final de 2001, com a expectativa de produzir mais de 100
mmmc a partir de 2005. Dado o custo do investimento em gasodutos, espera-se que a
prioridade vá para o desenvolvimento de campos menores na Sibéria Ocidental para
aproveitar a proximidade à rede existente. Fora da Sibéria, a prioridade é para
Shtokmanovskoye, o único dos campos nos mares de Barents e Kara com desenvolvimento
previsto antes de 2020, por ser mais barato que o da península de Yamal. Mais a Sul existe
ainda a área de Astrakhan, ribeirinha do Mar Cáspio, onde a Gazprom tem uma joint-venture
com a ENI. São ainda referidos 500 campos mais pequenos (menos de 20 mmmc),
atractivos para os independentes se os preços internos subirem. Desde a saída desta
publicação da AIE, a exploração de GN, e petróleo, na Sacalina ganhou relevância, o que a
faz merecedora de referência.
Departamento de Prospectiva e Planeamento
37
Informação Internacional, Vol. II, 2004
Neste contexto ganham importância as reservas não-Gazprom, como a dos produtores
independentes, das petrolíferas e dos países da Ásia Central. A Federação Russa tem acordos
com Casaquistão, Turquemenistão e Uzbequistão. O último foi com o Turquemenistão, em
ABR03, a quem expressou a vontade de lhe comprar todo o GN. Ficaram acordadas
transacções de 5-6 mmmc em 2004, de 6-7 mmmc em 2005 e 10 mmmc em 2006, após o
que pulará para 60-70 mmmc em 2007 e 70-80 mmmc a partir de 2009. Este acordo, e os
outros, permite adiar o desenvolvimento da península de Yamal, atrasar o fomento da
produção não-Gazprom, eliminar/reduzir concorrência de forma directa e indirecta, ao
libertar GN para vender aos europeus, o que quase empurra o Irão para o mercado
paquistanês e indiano, comprometendo de passagem o projecto de gasoduto afegão. O
Turquemenistão vende o GN a 50 USD por mmmc (44 USD pelo GN e 6 USD por direitos de
trânsito). A Federação Russa pagará metade (22 USD) com bens, enquanto o venderá à
Europa a mais de 100 USD, que paga na totalidade em cash.
Citando o documento Estratégia para a Energia da Federação Russa até 2020, divulgado pelo
Ministério da Energia em 2001, a AIE (2002: 120) diz que se prevê um investimento no GN
de 164-171 mil milhões USD até 2020. A maior parte destina-se ao transporte (76-80),
seguido pela produção (71-73) e armazenagem (17-19). Durante uma conferência conjunta
AIE-Soyuzgas, realizada em Paris em 25NOV03, foi estimada em 11 mil milhões USD a
média do investimento anual necessário para o sector do GN até 2030, no total de 330 mil
milhões USD, o que é o dobro do investimento anual da Gazprom.
Por outro lado, a OCDE (2004a: 138) entende que the transport and distribution networks
are arguably in more urgent need of investment than Gazprom's upstream business. Isto é
apenas um indicador de que one of the biggest problems of entire Russian energy sector is
the age and condition of its infrastructure (AIE 2002: 118). Cerca de 70% dos 150 mil
quilómetros de tubos dos gasodutos de alta pressão funcionam desde 1985; mais de 19 mil
quilómetros destes tubos já passaram o prazo de validade; a idade média da rede é de 22
anos; e são precisos mais 28 mil quilómetros de gasodutos devido aos novos campos.
No caso da infra-estrutura de distribuição eléctrica a degradação é tal que se admitem
severos cortes de abastecimento nos próximos 5 anos. It is assessed that the sector requires
$5 billion to $10 billion in annual investment until 2010, and the sector is unlikely to be able
to generate this level of fund internally (Zsiga 2002).
Tal como no petróleo, também no GN o potencial precisa de justificação económica para se
concretizar – e capital para investir. A vantagem da Federação Russa é ter poder de mercado
no GN. A desvantagem é a subsidiação, que descapitaliza a Gazprom. A descapitalização
traduz-se em mais dívida (16 mil milhões USD no fim de 2003) e menos investimento.
Conseguirá pôr os estrangeiros a pagar o desenvolvimento do negócio? Em 2002
representou 8% do PIB e 20% das exportações, valendo 20% do consumo na UE-15 e 66%
nos PECO. Apesar de ter 157 campos licenciados, apenas extrai em 80. We are facing
limitations. And the word 'limit' has become a norm for the gas segment. The prices of gas
do neither reflect the demand-supply, nor reduce demand, that is why the demand is
growing rapidly (Kravchenko 2003).
38
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
Na discussão da sustentabilidade da aposta na energia realçam-se, mais do que a
degradação/insuficiência da rede de distribuição, as consequências da aposta (maior
vulnerabilidade a choques externos; risco de patologias institucionais; dutch disease) e as
suas bases (dimensão e localização das novas reservas e investimento para as desenvolver e
comercializar). A situação da Gazprom remete a discussão para o tema dos agentes. QuasiMinistério, é usada e comporta-se com um departamento estatal para e na política interna e
externa. Os adiamentos dos cinco projectos que visavam reformá-la, i.é, desmantelá-la,
reduzir-lhe a influência, liberalizar o mercado, são esclarecedores.
Em síntese: a introdução de uma lógica de mercado no consumo do GN e na gestão do
sector (Gazprom) está comprometida, uma vez que é da sustentação – via subsidiação
assente na receita da exportação – da economia, da sociedade e do Estado que se trata.
2. OS AGENTES: A CENTRALIZAÇÃO ESTATAL EM CURSO
Something extraordinary is happening in Russia. Yukos, its biggest oil company, is about to go bankrupt
in the midst of an oil boom, even though it is one of Russia's most efficient, transparent and
international companies and produces 2 per cent of world oil output, the same as Kuwait or Lybia. The
Yukos affair has helped drive up the world oil price. How could things have gone so awry? (Aslund
2004a).
“Managed business” was joining the new Russian lexicon, alongside 'managed democracy' (Jack 2004:
215).
A crescente influência do Estado tem sido o traço dominante (também) no sector da energia.
O dossier Iukos, a expansão da Gazprom e a abertura limitada aos estrangeiros serão os
fenómenos mais perceptíveis. A lógica da reapropriação do controlo da energia por parte do
Estado é a recuperação da imagem e estatuto internacional da URSS, via ciência e
tecnologia, puxada pelo complexo militar-industrial, financiado pelas rendas proporcionadas
pelo petróleo e gás natural. Esta lógica resulta de mudanças na orientação do Kremlin, com a
ascensão dos siloviki em detrimento dos oligarcas e da Família. A aplicação da ditadura da lei
e da vertical do poder sucede à implosão da URSS, à convulsão da perestroika, concebida
por Andropov e concretizada por Gorbachov, e à deliquescência político-institucional da
Presidência Ieltsin.
Para o anunciado objectivo do renascimento russo, justificação da consolidação, Putin apoiase no seu grupo de origem: o KGB, actual FSB, e na sua cidade, São Petersburgo, e afastase dos que aparentemente o propulsionaram: os oligarcas e a Família. Como se os serviços
secretos fossem o guardião nacionalista da alma russa, contra os liberais, acusados de
destruição da economia e do Estado, e os oligarcas, definidos em grande parte como judeus
saqueadores da riqueza nacional, mas também os comunistas, vistos como incompetentes
na preservação da URSS e do Império, e a burocracia político-administrativa, que deixou
degradar as Forças Armadas, diluiu a autoridade do Estado e foi incapaz de defender a
fronteira da própria Federação Russa [Cáucaso].
Departamento de Prospectiva e Planeamento
39
Informação Internacional, Vol. II, 2004
A domesticação dos oligarcas insere-se em um conjunto de práticas, coerentes em si,
resultantes daquela verticalização. Os efeitos têm-se sentido no combate ao separatismo,
desde logo checheno, nos media, na política (partidos, Duma, governo, governadores), nas
organizações não governamentais e na própria possibilidade de organizar acções públicas de
protesto, restringidas de forma significativa. A criação por Putin do Conselho para o
Desenvolvimento das Instituições da Sociedade Civil (Moscow Times, 11NOV04) foi a última
manifestação, à data, da verticalização. Trata-se de estabilizar o fim, dramático, do Império
e procurar viabilizar a Federação Russa no novo contexto internacional, o que implicará
reponderar a distribuição de propriedade.
2.1. O “Dossier” Yukos
A Iukos acabou. Pelo menos, como era conhecida. Em 19DEZ04 foram vendidos 76,79% do
capital da sua principal unidade, Iuganskneftgaz, que produz 1,1 milhões b/d, equivalente a
62% da produção da Iukos, foi vendida em leilão que durou 10 minutos. Esta operação foi
justificada com a recuperação de impostos devidos desde 2000 no total de 28 mil milhões
USD. Algumas verbas reclamadas superam a facturação dos anos a que respeitam. A
compradora, por 9,352 mil milhões USD, foi a desconhecida Baikal Finance Group, apesar de
contar com a concorrência da Gazprom. Quatro dias depois, na noite de 23DEZ04, a Rosneft
revelou que adquirira a Baikal, ficando assim de posse da Iuganskneftgaz. Apesar de se
desconhecer a identidade dos accionistas da Baikal, mesmo com Putin a assegurar que são
pessoas com ligações antigas à indústria petrolífera, correram rumores de que estariam
ligados à Surgutneftgaz, empresa que tem boas relações com o Kremlin e a que estariam
ligados alguns dos representantes da Baikal no leilão. O presidente russo admitiu ainda que
a China National Petroleum Corporation possa vir a ter alguma palavra na gestão da
Iuganskneftgaz. Esta petrolífera chinesa já assinou um acordo de cooperação com a
Gazprom. A China é um dos principais compradores do petróleo Iukos.
A Rosneft, holding estatal para o petróleo, tem a fusão prevista com a Gazprom para JAN05.
Esta fusão visa criar uma empresa com uma posição accionista estatal superior a 50% e com
uma presença significativa (a referência é 20%) no petróleo. Para evitar processos judiciais
nos EUA, a Gazprom vendeu em 16DEZ04 a holding Gazpromneft que criara para acolher a
Rosneft e, ao que tudo indicava, comprar a Iuganskneftgaz. A Iukos recorreu à lei norteamericana de protecção de falências, no seguimento do que um tribunal de Houston ordenou
que a Gazprom não participasse no leilão e foi congelado um empréstimo de 10 mil milhões
de euros, que estava a ser negociado por um consórcio bancário internacional. A gasífera
pretende contudo manter a operação de fusão, agora atrravés de uma subsidiária já
existente, que deverá mudar o nome para… Gazpromneft.
Uma consequência da incorporação da Iuganskneftgaz na Rosneft – que quase triplica a
produção para 1,4 mb/d e passa a n.º 2 a seguir à Lukoil – é a mudança nas proporções dos
parceiros. Se já houvera desentendimentos quanto aos termos da fusão prevista entre os
responsáveis da Gazprom e da Rosneft, é possível que as tensões se acentuem. Para mais, a
Rosneft é presidida desde JUL04 por Igor Sechin, que já foi considerado o n.º 2 do regime.
Oriundo de São Petersburgo, onde trabalhou com Putin, com uma eventual pertença ao KGB,
40
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
é licenciado pela Universidade de Leninegrado em Filologia, em 1984, e especializado em
PALOP, onde esteve ligado a vendas de armas (Moscow Times 28DEZ04). O CEO, Sergei
Bogdanchikov, é outro homem de confiança de Putin.
Por outro lado, perante a desproporção da receita obtida em relação à reclamada, são de
esperar mais incorporações do património da Iukos na esfera estatal. Realce-se que a
Iuganskneftgaz fora avaliada pelo J.P. Morgan, a pedido da Iukos, entre 16 e 19 mil milhões
USD, enquanto o Dresdner Kleiwort Wasserstein, contratado pelo governo, enquadrou o
valor entre 14,7 e 17,3 mil milhões USD.
Sinal de que nem tudo é pacífico no próprio Kermlin, Illarionov descreveu o caso, em
conferência de imprensa, dada em 28DEZ04, como l’arnaque de l’année, considerou que se
tinha destruído a empresa petrolífera mais eficaz da Rússia e que se estava perante uma
expropriação. Realçou ainda o mistério da origem do dinheiro, para especular que a operação
tenha sido financiada com dinheiro do orçamento do Estado. É que a Rosneft foi avaliada
entre 7,0 e 8,5 mil milhões USD pela Morgan Stanley, antes de comprar a Iuganskneftgaz, e
entre 5,5 e 6,0 mil milhões USD pelo Dresdner depois da compra. Não só vale menos do que
o valor da compra da Iuganskneftgaz, como ainda tem uma dívida de 2 mil milhões USD. No
primeiro semestre de 2004, a facturação cresceu 37% para 2,3 mil milhões USD e os lucros
duplicaram para 340 milhões USD.
No imediato, o caso Iukos, explica-se como retaliação pelo comportamento de Mikhail
Khodorkovski, antigo dirigente da Juventude Comunista. Apoiante da oposição liberal e
comunista, com dinheiro e candidatos eleitorais; presumível candidato presidencial em 2008;
defensor da divisão da Gazprom e da entrada dos privados na construção e gestão de
pipelines, com um projecto de oleoduto dedicado para a China; promotor de lobbying
parlamentar contra o agravamento fiscal das petrolíferas; maximizador da exportação de
petróleo; com o controlo petrolífero da Sibéria Oriental na agenda; vontade de alienar o
controlo da recém-fundida IukosSibneft aos americanos – os motivos de desagrado
presidencial acumulavam-se: Khodorkovsky's methods were a fundamental challenge to their
[siloviki] control of the country – or, as one noted, 'a danger and threat to the Russian state '
(Goldman 2004: 38).
Em termos mais ponderados, alinham-se a intenção de Putin dar uma lição aos oligarcas e
uma estratégia dos siloviki para passarem a controlar activos empresariais e/ou as rendas
associadas, que poderá incluir a revisão das privatizações dos anos 90 e uma redistribuição
de propriedade favorável ao Estado, que controlam (7).
Da terapia de choque de Igor Gaidar, com Anatoly Chubais como ministro das Finanças, no
início da década de 90, resultou uma classe de novos proprietários. No fim emergiram três
tipos de accionistas: antigos directores das fábricas, membros da nomenklatura e outros
(Goldman 2003). Da nomenklatura sobressaíram Vagit Alekperov, ministro do Petróleo,
Viktor Chernomyrdin e Rem Vyakirev, respectivamente, ministro e vice-ministro do Gás, e
Vladimir Potanine, dirigente da Organização do Comércio Externo (OCE). O primeiro juntou
três dos principais campos – Langepaz, Urengoi e Kogalym – e constituiu a Lukoil;
Departamento de Prospectiva e Planeamento
41
Informação Internacional, Vol. II, 2004
Chernomyrdin, que chegou a primeiro-ministro, e Vyakirev transformaram o Ministério na
Gazprom, deixando ao Estado 38% do capital; Potanine apropriou-se da OCE, transformou-a
em trading, com um banco e uma holding financeira, e chegou a controlar a Norilsk Nikel, o
maior produtor russo de níquel e metais preciosos, como platina e paládio. Na categoria
‘outros’ estão os menos integrados ou excluídos do sistema, designadamente judeus.
É este conjunto que protagoniza a nova fase de privatizações através do esquema dos loans
for shares. Inventado em 1995 por Potanine, à altura dono do Uneximbank, consistia em
conceder crédito à Administração Ieltsin garantido com acções de empresas públicas. Se
dentro de um ano o empréstimo não fosse reembolsado, as acções seriam vendidas em
leilão. Na altura, o comunista Ziuganov liderava as sondagens para as presidenciais de 1996.
Se ganhasse, as privatizações poderiam ser canceladas e a vida de alguns envolvidos
ameaçada. A aliança entre Ieltsin, sem dinheiro, e os empresários, sob ameaça vital, foi fácil.
O que se seguiu foi de tal ordem que oligarca passou a ser sinónimo de ladrão, com os
credores a ficarem com as acções, com substanciais descontos. O facto de muitos dos
poucos oligarcas serem judeus – Boris Berezovski, Vladimir Gusinsky, Khodorkovky, Roman
Abramovitch, Leonid Nevzlin – levou alguns dirigentes políticos a insinuar que Não deixam os
russos ocupar a indústria petrolífera. Deveríamos ter por todo o lado Rosneft (Petróleo
Russo) e só temos Petróleo Judeu (Courrier International, 24JUL03).
Sapir (2003) propôs uma lei de amnistia complementada por pesadas multas ou
renacionalizações
provisórias
para
permitir
privatizações
correctas.
Aslund
(2004b)
relativiza: Property rights in the West were not formed in a more ethical fashion, only slightly
earlier. (...) The essence of successful capitalism is to accept existing property rights and
declare them sacrosanct – no matter how they arose in the first place. There is nothing
moral about historical property rights. Admite ainda que few would contend that a new round
of confiscations in Russia will lead to a more equitable distribution of property.
Certo é que este pecado original colocou todos os oligarcas sob a ameaça permanente de
intervenção judicial. O espectro de acusações é tão amplo que vai do roubo do património,
público e privado [no rescaldo da crise de 1998 muitos bancos, detidos pelos oligarcas,
fecharam, fazendo desaparecer as economias dos depositantes], ao assassínio, passando
pela fraude fiscal ou desrespeito dos accionistas minoritários. Platon Lebedev, braço direito
de Khodorkovsky, foi encarcerado em 03JUL03, acusado de desviar – em 1994 – acções no
valor de 283 milhões USD da sociedade pública Apatit.
Passou a ser o (des)alinhamento com o Kremlin a determinar a avaliação judicial. Por
exemplo, a eleição de Abramovitch para governador da Chukotka propiciou à Sibneft a
exploração de petróleo da zona e benefícios e isenções fiscais. The result was that Sibneft
paid the lowest profit taxes in the industry, at less than half the official nominal rate of 24
per cent (Jack 2004: 196). Mas não usou a Chukotka para se opor a Putin. Preferiu investir
no futebol inglês. Até agora (DEZ04) não foi importunado, apesar das ameaças de
Stepashin, tendo até colaborado com o Kremlin na anulação da fusão com a Iukos.
42
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
Potanine terá exemplificado o futuro quando discursou num comício da Russia Unida, em
05JUL03, em que se confessou arrependido dos erros cometidos durante a acumulação
primária de capital – e se colocou ao dispor de Putin. Esta voluntarização para colaborar com
o Estado fora objecto de aviso por parte do próprio Putin. Em 29JUL00 reuniu-se com os
principais empresários, após o início dos ataques aos oligarcas, e transmitiu esta mensagem:
“Do your business and you will get support if your money is working for the country”. The
president is restoring order and don't make this difficult or I will not forgive you, because
you are partly responsible (Jack 2004: 193).
Quando foi detido acusado de fraude e evasão fiscal no montante de mil milhões USD,
Khodorkovsky presidia à Iukos, avaliada em 25 mil milhões USD, que comprara em 1995 por
350 milhões USD. Só esta comparação – valorização superior a 7.000% – explica que 80%
dos russos queiram anular as privatizações. O anúncio, no início desse mês, de contactos
com a Exxon para comprar 40% da IukosSibneft por 25 mil milhões USD, compra que
poderia ir além dos 50%, terá sido a gota de água. Khodorkovsky foi preso, a fusão desfeita
e a Iukos desmantelaad. (Em 22ABR03 fora anunciada a fusão da Iukos com a Sibneft,
negócio avaliado em 35 mil milhões USD. Seria a maior petrolífera russa e a quarta mundial.
A operação terminou com especulações sobre a entrada da Shell e Total na Iukos, e foi vista
como uma resposta à associação da BP com a TNK).
Com o dossier Iukos em vias de resolução, um assessor de Putin, Igor Shuvalov, garantiu
que este era apenas o primeiro: The Yukos affair is connected primarely with taxes, and this
is just the start of a process during which we will demonstrate to all – corporations and
selected individuals alike – that taxes must be paid in their entirety (Interfax, 28OUT04).
À questão – discutível mas óbvia – da fiscalidade parece somar-se a prevenção de um
takeover norte-americano, como pormenoriza Helmer (2004): If anyone in Washington
needs further reminding that the fight over Yukos has been to stop US takeover of Russian
resource assets, the next steps Putin will take in the corral strategy should suffice. The
roundup of the cash cows will continue. Putin is now on track to apply the corral approach to
all of the Russian resources extraction industries that were prematurely rustled, a decade
ago, by the so called oligarchs. A lista tem minerais, incluindo preciosos (Potanine), alumínio
e bauxite (Oleg Deripaska e Viktor Vekselberg) e petróleo (Abramovitch e Mikhail Fridman,
sócio de Vekselberg, vg, na TNK).
A Iukos seria o primeiro exemplo da vontade de Putin fazer regressar ao curral [Estado] as
vacas leiteiras, antes que os actuais proprietários, que acederam à sua posse por meios
considerados ilícitos, as vendam ao estrangeiro por quantias fabulosas, que o seriam sempre
por comparação com o que lhes custou, ou se sirvam delas para entrar em posições
dominantes em empresas estrangeiras, ficando ao abrigo da lei russa. Neste cenário, o crime
compensaria, com os criminosos a escapar com o dinheiro e a Federação Russa a perder o
controlo das suas riquezas naturais, alienadas ao estrangeiro, ao adversário da Guerra Fria,
que, para mais e apesar do fim desta, prossegue a estratégia de cerco, com a NATO na
fronteira e os EUA na ex-URSS.
Departamento de Prospectiva e Planeamento
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Pior do que o alegado criminoso escapar com o produto do crime, na perspectiva do Kremlin,
seria a perda de controlo de um sector que gera capital e poder – e sustenta a vida na
Federação Russa – para os “estrangeiros”, em particular norte-americanos.
2.2. O Pilar Gazprom
O governo decidiu fundir a petrolífera estatal Rosneft na Gazprom, juntando os respectivos
activos petrolíferos na Gazpromneft. Conhecida em 14SET04, esta decisão consolida posições
e unifica o controlo de uma plataforma, baseada na energia, para a gestão da política interna
e projecção de vontade no exterior. The Ministry of Oil and Gas Is Back, considera o banco
privado MDM (Moscow Times, 15SET04), aludindo ao tempo soviético. O primeiro passo para
a expansão do Estado no sector petrolífero, consideravam outros jornais, antecipando a
incorporação da Iugansk, a caminho de uma quota estatal de 20% na produção petrolífera,
como defendeu o chefe da Agência Federal de Energia, Sergei Oganesyan. Gazpromização e
iukosização como cara e coroa da mesma moeda. O objectivo é dotar o Estado russo, à
semelhança dos principais países exportadores, de uma empresa pública capaz de ombrear
com as majors.
A operação foi concebida para permitir que o Estado elevasse a participação accionista na
gasífera para 50% mais uma acção, da actual participação directa de 38,37%, a que soma
0,9% via Rosgazifikatsiya. As subsidiárias da Gazprom possuem 16,6% da holding. Porém, o
valor da Rosneft, avaliada em 10,7% da Gazprom, foi revisto em baixa, o que justificou a
necessidade de integrar outras empresas. A da Zarubezhneft, que controla os investimentos
petrolíferos no estrangeiro, foi mencionada em OUT04. O seu director, Nikolai Tokarev, já
previu que, se a Gazprom adquirir a Rosneft, a Zarubezhneft e a Iugansk, além de
multiplicar a produção de petróleo por 8 para 2 mbd, aparecerá uma estrutura that will be a
legislator for the sector in terms of setting standards and implementing the interest of the
state (Moscow Times, 22OUT04).
A consolidação na Gazprom de outros activos deve continuar. Miller já anunciou a expansão
na produção de electricidade, onde possui 10% da UES, dirigida pelo liberal Chubais, e
15,7% na moscovita Mosenergo, detida em 51% pela UES. A UES é o maior cliente
doméstico da Gazprom, a quem compra 75% do gás. Em 2003 queimou 135,6 mmmc, cerca
de 25% da produção da Gazprom, pelos quais pagou 4,6 mil milhões USD. O plano de
reestruturação da UES prevê a sua separação em produção, transporte e distribuição.
Concebido por Chubais, pretende introduzir a concorrência e atrair investimento para as
infraestruturas. Khristenko quantificou (RBC 24DEZ04) os investimentos necessários nas
unidades geradoras de energia até 2015 entre 48 e 60 mil milhões USD. Ainda em OUT04 foi
divulgada a compra de mais de 50% do capital da Atomstroiexport, a empresa exportadora
de tecnologia nuclear, que está a operar no Irão, China e Índia. A este crescimento da
Gazprom por fusões, aquisições e incorporações, o Kremlin estimula a constelação em torno
da gasífera de empresas mais colaborantes, como as petrolíferas Surgut e Lukoil.
A transformação da Gazprom em cluster energético sob controlo de Putin justifica a sua
designação como The Kremlin Oil and Gas Corporation (Mosnews, 16SET04). Em termos de
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Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
protagonistas, esta consolidação evidencia o controlo deste activo pelo círculo próximo de
Putin, curto-circuitando o governo. Miller permanece como CEO da Gazprom, presidida pelo
chefe da administração presidencial, Dmitry Medvedev (ver nota 7).
A afirmação de personlidades dos serviços secretos como os novos dirigentes da Federação
Russa foi prevista. Ao comentar o caso Iukos, Cohen (2003) considerava que Putin is now
facing the hardest choice of his career: support asset-hungry cronies from the former
Leningrad KGB, or stay the course of integration with the West, foreign investors, and
economic growth. Um estudo da socióloga Olga Kryshtanovskaya, mencionado por Ostrovsky
(2004), concluiu que a proporção de siloviki nos escalões superiores do Kremlin passou de
4,8% sob Gorbachov para 58,3% sob Putin. Mais de metade dos 24 membros da comissão
política informal de Putin são siloviki. No Kremlin um em cada três dirigentes passou pelos
serviços secretos ou pela esfera militar. Quatro dos 7 representantes presidenciais nas
regiões têm este registo. Origens estas que replicam nos respectivos staffs. Defendem que
seja o Estado a definir a exploração de petróleo, opõem-se ao desmantelamento da Gazprom
e ao domínio pelos estrangeiros das empresas que exploram recursos naturais. Motivados
por um misto de zelo patriótico-corporativo e vingança, pesarão na situação na Chechénia.
Putin convidou o chefe do KGB envolvido no golpe de 1991 contra Gorbachev, Vladimir
Kriuchkov, para a tomada de posse.
Este contexto dá sentido à afirmação do antigo chefe da polícia secreta polaca, Zbigniew
Siemiatkowski, ouvido no quadro de um inquérito parlamentar sobre a tentativa de controlo
de activos energéticos polacos pela Federação Russa: I agree that we are facing a
restoration of the Russian Empire through economic means and with the principle of
“yesterday tanks, today oil” (Jasser 2004). As pressões sobre a Ucrânia, os cortes de
fornecimento à Bielorrúsia e Geórgia, as tentativas de aquisições de activos nos Estados do
ex-Comecon, o controlo, por vezes até ao veto, das exportações de gás da Ásia Central, são
exemplos avulso da energia como arma nas relações internacionais.
2.3. Visitando uma Tese de Putin: O Estado como Racionalizador Social
Com um sector energético que é sustentáculo da sociedade, galinha dos ovos de ouro (ou
cash cow) do Estado e vector de projecção internacional, é de forma relutante, hostil, que o
Kremlin vê a penetração dos estrangeiros na energia – a não ser que seja conforme as suas
regras e conveniências. Do outro lado, estão as companhias internacionais sequiosas de
reservas, que vêem na Federação Russa a última fronteira do negócio.
A tomada de uma posição dominante da ExxonMobil ou ChevronTexaco na IukosSibneft seria
impensável neste quadro. A mesma lógica já presidira à exclusão da China National
Petroleum Corporation do leilão de privatização de 75% da Slavneft, que acabou adquirida
em partes iguais pela Sibneft e TNK, vindo a ser repartida em MAR03. Aquelas pagaram 1,86
mil milhões USD, uando o preço-base era de 1,7 mil milhões USD, apesar de a empresa
estar avaliada em 3 mil milhões USD.
Departamento de Prospectiva e Planeamento
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
A associação da BP com a TNK deve ter sido a primeira e última nos termos em que ocorreu
(50:50), because the government while wanting Western expertise and capital, is no longer
willing to cede half of Russia's valuable resources to foreign enterprises (Arvedlund e
Timmons 2004).
Ao contrário, a ConocoPhilips terá sido o exemplo para os eventuais casos futuros de
tomadas de participação em empresas estratégicas de energia por estrangeiros. Em
29SET04 adquiriu 7,6% da Lukoil por 1,988 mil milhões USD, já elevados para 10%. Esta
compra foi antecedida de conversações com Putin, de quem obteve autorização para o acto e
subir a sua participação até 20% dentro de 2 ou 3 anos. Em 30JAN01, a BP vendera 7% da
Lukoil, por 650 milhões USD, por ser muito pequena e não dar qualquer influência. Antes do
negócio da ConocoPhilips, fora a Total a adquirir 25% da Novatek, o maior produtor privado
de GN, mas incomparável com a Gazprom, por mil milhões USD.
Os episódios Khodorkovsky/Iukos, Gazprom, estatização e hostilidade ao IDE apresentam a
mesma lógica quando lidos à luz de uma tese atribuída a Putin, elaborada nos anos 90. Com
efeito, na última década, apesar dos seus afazeres, o presidente russo apresentou uma tese
sobre Os Produtos Minerais na Estratégia de Desenvolvimento da Economia Russa, no
Instituto Estatal de Minas de São Petersburgo. Olcott (2004: 16ss) divulgou a essência do
documento em OUT04, durante uma conferência do Baker Institute.
Em substância, Putin defende que os recursos naturais devem basear o desenvolvimento
económico da Federação Russa e garantir a sua posição internacional. O Estado está no
centro da gestão destes recursos, mas rejeita o cenário de a Federação Russa se reduzir a
um exportador de matérias-primas; pelo contrário, quer que o desenvolvimento da indústria
transformadora faça da Federação Russa um poder económico dirigente com um padrão de
vida elevado para a maioria da população em relativamente pouco tempo. Este objectivo
requer o apoio do Estado e o desenvolvimento de complexos empresariais financeiroindustriais, integrados verticalmente, capazes de competir com as multinacionais ocidentais.
A tese aponta para o reforço e aumento do número destes complexos, controlados pelo
Estado, no sector energético. Previa-se a partir desta perspectiva que a Gazprom dominaria
o sector do petróleo e gás natural, servindo ainda de parceiro às empresas estrangeiras nos
projectos mais importantes.
O IDE, por seu lado, é aceite, desde que apoiado pelo Estado. A perda de controlo por parte
do Estado nestes investimentos não é opção: The Russian mineral raw material complex
plays an important role in all aspects of the state's vital functions (...). The development of
the raw material sector helps form a strong industrial base which is capable of satisfying the
needs of both industry and agriculture; it makes an important contribution to the income of
the country as its products remain the basic source of foreign currency. (Putin, citado por
Olcott, 2004: 18). Como especulava o The Economist (23SET00) sobre os PSA: Sorting out
PSAS to western companies' satisfaction would bring tens of billions of dollars of investment
in oil and gas. But the simbolic value is even greater: a big chunk of the Russian economy
becomes governed by western-style commercial law. Disputes would be settled not in
46
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
Russian courts, but by arbitrators in Stockholm. Whether Russia is ready for what amounts
to foreign colonisation of large parts of its most attractive industries is another matter.
Baseado nos recursos naturais, sob a direcção do Estado, com o IDE a desempenhar uma
função supletiva, Putin pretende a reconfiguração da economia. Este objectivo de
transformação confronta-se com o obstáculo de os sectores soviéticos do petróleo e gás
natural, que formam a base da indústria energética russa, terem sido desenvolvidos sem
ligação às forças de mercado. O problema resolver-se-ia com a fusion of the state and
private sectors, assistida pelo Estado para criar grupos financeiro-industriais internacionais.
Em troca, estas multinacionais forneceriam produtos e recursos minerais, aumentariam a
eficiência da sua utilização e desenvolveriam a indústria extractiva e o potencial exportador
aumentando o peso dos produtos industriais e o valor das exportações minerais. These
financial groups will operate within the framework provided by the state, and if they serve
the state in this way, they can expect to hold onto their assets. De forma clara, Putin
entende que the state has the right to regulate the process of the acquisition and the use of
natural resources, and particularly mineral resources, independent of on whose property they
are located; in this regard the state acts in the interest of society as a whole, as well as in
the interests of private owners whose interests conflict and who need the help of the state
organs of power to achieve a compromise.
A cedência do controlo dos recursos naturais ao sector privado após a implosão da URSS é
vista como um erro. This led to a stagnation of the potencial of the nation's natural
resources, to a breakdown in the geological sector that had been formed over the course of
many decades, as well as having a number of other negative consequences. Aliás, os
privados são mesmo responsabilizados pelo colapso do sector.
2.3.1. IDE: Se e quando interessar (o caso BP)
No seguimento da afirmação do Estado como o centro de racionalização da indústria
energética, os estrangeiros notaram a diferença. O caso mais paradigmático – também pelas
atribulações – é o da BP.
Em 26JUN03, em Londres, os responsáveis da BP e das holdings privadas russas Alfa e
Access Renova (AAR) assinam, perante Tony Blair e Vladimir Putin, um acordo que cria uma
joint-venture, em partes iguais. Nascia a TNK-BP, 3º grupo russo e 10º mundial. No valor de
15,4 mil milhões USD, it's a project that could catapult Lord Browne [CEO da BP] to
legendary status, or reveal him as a reckless risk-taker (Hoyos e Ostrovsky 2003), clearly a
bargain struck between Russia and Britain, America's closest ally (Reed e Starobin 2003). A
BP pagou 3,95 mil milhões USD cash e entregará 3,75 mil milhões em acções em três
prestações anuais no aniversário do acordo: 29AGO04, 2005 e 2006. Este IDE é o maior
feito na Federação Russa, o dobro da média dos fluxos de 2000-2002 e superior em 33% ao
pico de 1997.
A joint-venture junta os activos russos da BP – Sidanko, Rusia Petroleum, rede de estações
de serviço em Moscovo – com os da Alfa e AAR: 100% do grupo TNK (Tyumen Oil), Rusia
Departamento de Prospectiva e Planeamento
47
Informação Internacional, Vol. II, 2004
Petroleum, projecto Sacalina 6 e refinadora Roslan. A licença de exploração das reservas
gasíferas em Kovytka, na Sibéria Oriental, detida pela Rusia Petroleum, é um dos principais
activos. A TNK-BP, que começou a operar em 12SET03, tem reservas provadas de 5,2 mil
mb (710 mt), uma produção de 1,2 mb/d (60 mt/a), 5 refinarias na Federação Russa e
Ucrânia, que produzem 500 mil b/d, mais de 2.100 estações de serviço na Federação Russa
e Ucrânia, mais de 20% do mercado retalhista de Moscovo e 113 mil empregados – e
permite à BP ascender ao 2.º lugar mundial e aumentar as reservas em 30% e a produção
em 12%.
A associação da BP à TNK só admirou pela dimensão. Era vista como inevitável depois de se
saber, em FEV03, que a TNK ia absorver a Sidanko, onde a BP tinha 25%. O sal da decisão
está em que a BP esteve para ser expulsa da Federação Russa pelos actuais associados. Em
1997 a BP comprou 10% da Sidanko a Potanine por 484 milhões USD. Mas a falência
fraudulenta da Sidanko, devido a disputas entre Potanine e Grupo Alfa, resulta na perda do
principal campo petrolífero da Sidanko [Chernogorneft] para a TNK, que o compra, em
NOV99, por 175 milhões USD. A BP teve de fazer o write-off [redução de activos por
assunção de perdas] de 200 milhões USD. Em 2000, a BP aliou-se ao Grupo Alfa, o qual vem
a ficar com a posição de Potanine e a controlar 56% da Sidanko. A disputa judicial terminou
em 2001 com a devolução do campo. A BP aumentou, em ABR02, a participação na Sidanko
para 25%, ficando com o controlo da gestão, após investir mais 375 milhões USD. Na altura,
BP e Grupo Alfa, que tinha 50%, não faziam segredo da vontade de fundir TNK e Sidanko.
A alternativa ao investimento era a saída, perante a diluição da posição accionista. Neste
sentido, a aposta da BP é vista mais como uma decisão de Browne, do que resultante de
uma melhoria do ambiente para as empresas ocidentais ou da redução de riscos na
Federação Russa. Sem o Estado russo conceder a legislação pretendida nos PSA, algumas
petrolíferas ocidentais arriscam entrar segundos as condições locais.
Para esta decisão terá contribuibuída a pressão colocada pela renovação das reservas. Em
12FEV03, Browne revela que a BP investirá 20 mil milhões USD nos próximos 5 anos no deep
offshore do Golfo do México, em Trindade, Angola, Azerbaijão e no GNL da Ásia/Pacífico,
para compensar o declínio do Mar do Norte e Alaska. A Federação Russa aparece como 6º
destino. Ou seja, novas reservas em sítios mais difíceis tecnicamente e instáveis
politicamente, em contraste com o Mar do Norte e Alaska.
2.3.1.1. Kovytka
O campo de GN em Kovytka, com reservas estimadas em 1,9 biliões [milhão de milhões] de
metros cúbicos, é um dos principais activos da Rusia Petroleum, joint-venture que une TNKBP (63%), com Potanine (26%) e a administração regional de Irkutsk (11%). O início da
venda de 900 mmmc/a à China e Coreia do Sul durante 30 anos estava previsto para 2008,
com a empresa a projectar um gasoduto de 4.900 quilómetros para o efeito.
Em 2003 o domínio da Sibéria Oriental parecia adquirido pela BP e Iukos, com esta a
comprar campos de petróleo para alimentar o seu projecto de oleoduto para Daqing. Mas a
48
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
Administração Putin expressou a sua oposição ao oleoduto, com Rosneft e Gazprom a
preferirem Nakhodka e o vice-ministro dos Recursos Naturais, Aleksandr Povolotsky, a
admitir a revogação de 24 licenças da Iukos, por danos ambientais e não cumprimento de
metas de produção em Tomsk e Yakutia, onde estão as fontes do petróleo que queria
exportar para a China. Em DEZ03, o Ministério dos Recursos Naturais atribuiu mesmo à
Surgutneftegaz o campo petrolífero de Talakan, retirado à Iukos.
Depois, a Gazprom foi nomeada para coordenar em nome do Estado o desenvolvimento dos
recursos energéticos na Sibéria Oriental, o que, com a Rosneft, sugerira a Putin. Em
24DEZ03 estabelecem com a Surgutneftegaz um consórcio para desenvolver reservas de GN
e petróleo na Sibéria Oriental. O texto estabelece que qualquer projecto de exportação deve
integrar uma estratégia energética regional unificada – e controlada pelo Estado. A source
close to the Natural Resources Ministry explains that implementation of the idea that 'right'
companies should increase their reserves and 'wrong' companies should lose them has
started (Vedomosti, in Russian Institute of Directors, 25DEZ03).
A BP muda de estratégia. Em 04JUN04 acorda com a Gazprom a utilização de um único canal
de exportação para os países da Ásia-Pacífico, com os termos da entrega – volume, duração
e preço – negociados pela Gazexport, filial da Gazprom. Mas em 15SET04, responsáveis da
Gazprom declaram que o GN de Kovykta será vendido na Federação Russa e que China e
Coreia do Sul serão abastecidas a partir de Sacalina; adiantam que a exportação de GN para
a Coreia só será possível com um acordo intergovernamental e através dos gasodutos da
Gazprom. Nesta altura, em 18SET04, Sergei Kuprianov, porta-voz da Gazprom, declara que
o desenvolvimento de Kovytka perdeu interesse após a fusão com a Rosneft. E fonte da TNKBP admitiu que a situação era incerta, uma vez que a Rosneft tinha projectos na Sacalina,
um dos quais com a própria BP, na Sacalina-5.
À desvalorização aparente de Kovytka, a BP soma a ameaça do ministro dos Recursos
Naturais, Iuri Trutnev, de retirar a licença de exploração do próprio campo, com o argumento
de não ter construido um gasoduto para distribuir GN aos arredores de Irkutsk, as pressões
dos serviços secretos sobre os estrangeiros da TNK-BP, uma vez que não devem ter acesso a
informação sobre reservas de petróleo, e as reclamações do Fisco de impostos em atraso à
semelhança da Iukos (87 milhões USD relativos a 2001, montante que 45 deputados
elevaram para 786 milhões USD devidos por 2000 e 2001).
Em 28SET04 a TNK-BP aceita passar a ter uma posição minoritária no consórcio de Kovytka.
Um mês depois há um encontro Miller-Browne. Abordam (Neftegaz, 26OUT04) cooperação
no GNL e gasodutos; o swap de GNL da BP vendido nos EUA por conta da Gazprom por GN
da Gazprom entregue aos clientes europeus da BP; a construção de terminais de
regasificação e vendas de GN nos EUA e Reino Unido; a cooperação na construção do
Gasoduto do Norte Europeu (3.000 quilómetros; custo 5,7 mil milhões USD), que visa unir a
Federação Russa ao Reino Unido, passando pelo Mar Báltico, Alemanha, Países Baixos e Mar
do Norte, com ramificações para Finlândia e Suécia. Ou seja, mercados e financiamento para
a Gazprom. Sobre Kovytka nada transpira.
Departamento de Prospectiva e Planeamento
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Já no final de Novembro, a Prime-Tass, citada pelo Moscow Times (29NOV04), fazia-se eco
da possibilidade de a Gazprom entrar como accionista no consórcio, em troca do que a BP
entraria no consórcio do Gasoduto do Norte Europeu. Uma semana antes, Khristenko
reunira-se com o vice-presidente da BP para a Rússia e Casaquistão, em que acordaram a
cooperação na produção de GNL e exploração de um campo siberiano – e a entrada da
Gazprom no projecto da BP em Sacalina (Moscow Times, 23NOV04).
3. NOVAS ROTAS, NOVOS DESTINOS
The go ahead for the 1.6 million b/d Nakhodka project could jeopardize the chances of an additional
western route ever being built (Gorst 2004).
... a pipeline outlet to the Asia/Pacific market from eastern Siberia is a very long-term and uncertain
prospect (Gordon 2004).
A new global energy business (natural gas) is emerging (…) U.S. has emerged as a key – indeed the key
– future growth market for LNG (Yergin e Stoppard 2003).
The government should decide to allow private investment in pipeline (Gref, Interfax 17JUN04).
We do not need private investments (presidente Transneft, Russia Journal 22JUN04).
A Federação Russa tem de investir nos pipelines. Herdou da URSS 46 mil quilómetros (km)
de oleodutos, 15 mil km de pipelines para produtos petrolíferos e 152 mil km de gasodutos,
quase tudo controlado pelo Estado. By contrast, the United States, with only 55 percent of
Russia's land mass, has over four times more oil pipelines and two times more natural gas
pipelines, almost none of which are owned ou controlled by the government (Chow 2004:
28). A rede de oleodutos é gerida pela Transneft. A capacidade ronda 55 mt/a (11 mb/d);
dois terços têm mais de 30 anos. Conservação, renovação e expansão requerem
investimentos. A produção aumentou desde 1999, mas a capacidade de exportação não. As
empresas tiveram de recorrer a modos caros e lentos como o ferroviário e o fluvial para
exportar perante um mercado interno flat. Há ainda um desajuste entre os mercados
tradicionais (Europa) e os novos (América e Ásia).
Têm sido apontados três pontos de estrangulamento: a Noroeste, no Mar de Barents; a
Oeste, nos Estreitos turcos; e a Oriente, na Sibéria Oriental/Extremo Oriente. Putin
mencionou, no discurso anual à nação, em 26MAI04, cinco prioridades: a expansão do
Sistema de Oleodutos do Báltico, para Primorsk, no golfo da Finlândia; uma nova linha da
Sibéria Ocidental para o Mar de Barents; uma saída pela Sibéria Oriental; o bypass dos
Estreitos Turcos; e a reversão do oleoduto Adria, para que o oleoduto Druzhba (Amizade)
alcance o terminal croata de Omisalj no Mar Adriático. Tem-se dado por assente que para as
exportações crescerem de forma significativa basta anular dois estrangulamentos. No início
do segundo mandato, Putin excluiu a entrada dos privados nos pipelines. Um resumo das
propostas de oleodutos está na Tabela 1, visualizáveis no Mapa 2.
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Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
Tabela 1
Fonte: Gordon (2004).
Departamento de Prospectiva e Planeamento
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Mapa 2
RECORDANDO A DIVISÃO ADMINISTRATIVA DA RÚSSIA
Fonte: Gordon (2004).
O problema está na conjugação da vontade de controlo estatal dos recursos energéticos e
dos pipelines com a captação dos investimentos necessários ao desenvolvimento daqueles e
à construção destes. Por outro lado, há a possibilidade de o travão colocado aos projectos
privados de pipelines, acrescida da aparente hesitação na rota oriental, se ligar à ideia de
reduzir o ritmo de crescimento da produção. Gorst (2004: 9) pormenoriza que the notion
that the extraordinary sucessful newcomers may be no more than fast buck merchants and
reservoir wreckers is never far from the surface in discussion about the sustainability of
Russia's oil boom. O vice-presidente da Transneft, Sergei Grigoryev, já defendeu a
introdução de quotas de produção e exportação (Mosnews 23MAR04).
A necessidade de pipelines para escoar uma produção em crescendo é menor do que parece,
quando o enfoque é a sustentabilidade da produção. Surge assim uma oposição estilizada
entre uma lógica financeiro-comercial, de curto prazo, e uma outra, mais industrial,
geológica, de médio e longo prazo. Regressa-se ao problema de fundo: quais são as reservas
da Federação Russa? As aparentes hesitações quanto aos pipelines têm a ver só com falta de
financiamento? Com a volátil cena internacional (dado que a orientação de um pipeline
materializa opções e tem consequências na política externa)? Resultam de uma perspectiva
pós-bolha produtivista dos últimos anos, evitando elefantes brancos? Decorrem da
informação sobre as reservas, que são segredo de Estado?
52
Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
3.1. O bypass dos Estreitos Turcos
Os Estreitos Turcos referem-se ao canal que separa o Mar Negro do Mar Mediterrâneo ou,
para ser mais exacto, do Mar Egeu. Em cada extremo há um estreito, intermediados pelo
Mar de Marmara. O Bósforo está do lado do Mar Negro, o dos Dardanelos na outra
extremidade. O Bósforo tem cerca de 30 quilómetros de comprimento e chega a ter uma
largura de apenas 698 metros, além de 12 pontos de viragem muito acentuada. Espera-se
que em 2004 seja atravessado por 52 mil navios, dos quais 9.500 petroleiros, a que acresce
um tráfego diário de 2,5 milhões de pessoas entre as margens, resultante de separar/juntar
as áreas europeia e asiática de Istambul.
Por força do tráfego crescente e de medidas restritivas aplicadas pelas autoridades turcas –
que alguns classificam como incentivos negativos ao seu oleoduto Baku-Ceyhan –, um
petroleiro pode esperar 35 horas para poder atravessar os Estreitos. Por vezes, o mau tempo
cancela mesmo a travessia dos Estreitos durante dias. A Transneft estima em 600 milhões
USD as perdas anuais com os atrasos. Primorsk já destronou Novorossiysk como principal
porto exportador de petróleo da Federação Russa por esta razão.
O tráfego petrolífero dirigido ao Bósforo aumentou 30% para 140 mt (2,8 milhões b/d) nos
dois últimos anos. Em 1998 eram apenas 60 mt (1,2 milhões b/d). As exportações por
Novorossiysk deram o principal contributo. Mas já se esperam mais aumentos oriundos do
Consórcio do Oleoduto do Cáspio (COC), que traz o petróleo casaque, e da reversão do
projecto inicial do oleoduto Odessa-Brody. O COC anunciou em OUT04 que tenciona
aumentar a capacidade do oleoduto de 510 mil b/d para 1,4 mb/d (67 mt/a) até 2008, uma
antecipação de seis anos em relação à data inicial. Esta necessidade decorre do aumento da
produção casaque e do início do transporte de petróleo russo da Sibéria e Chechénia.
A reversão do Odessa-Brody permitirá escoar, antes do fim de 2004, para o Mar Negro
40 mil b/d da produção russa, entre as quais a da TNK-BP, em vez de exportar para a
Europa o petróleo cáspio, como era a ideia inicial. Neste contexto, o bypass dos Estreitos
Turcos é imperativo. Há várias hipóteses (Mapa 3).
Departamento de Prospectiva e Planeamento
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Mapa 3
PROPOSTAS DE PIPELINES PARA REALIZAR O BYPASS DO BÓSFORO
Fonte: Lee (2004).
3.1.1. Burgas – Alexandropolis
Este projecto já tem uma década. Reúne Bulgária, Federação Russa e Grécia. A versão inicial
mencionava um custo de 700 milhões USD, para um oleoduto com 320 quilómetros de
extensão e uma capacidade de 40 mt/a (800 mil b/d). Reganhou importância após a
inauguração do oleoduto do COC, em NOV01, mas disputas económicas e técnicas e dúvidas
sobre a sua eficiência têm dominado as discussões.
Em 06AGO04, Khristenko e o vice-ministro grego do Desenvolvimento, George Salagoudis,
agreed it is necessary to restart and intensify the activity of a working committee on the
project (Interfax).
Em 18OUT04 uma fonte do governo russo, na véspera da deslocação de Fradkov à Bulgária,
declarou à Interfax que seria mais caro construir um oleoduto através da Bulgária do que um
similar através da Turquia, e reclamava mais benefícios fiscais e alfandegários ao governo
búlgaro.
Reunidos no Kremlin, em 09DEZ04, Putin e o primeiro-ministro grego, Kostas Karamanlis,
incluíram o oleoduto na declaração final, anunciando que os ministros das três partes iriam
assinar os documentos necessários para começar a construção.
Em 03FEV05, o Russia Journal dava conta de declarações do vice-ministro grego do
Desenvolvimento, Giorgos Salagoudis, segundo as quais o memorando para a construção do
oleoduto seria assinado até 15MAR05, o que não era confirmado por fontes de empresas
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Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
ligadas ao projecto, como Transneft, TNK-BP ou Lukoil. Em contrapartida, dava conta da
preferência da Transneft por um trajecto alternativo, via Turquia (ver 3.1.2).
A Lukoil já disse não garantir petróleo suficiente para encher a conduta, alegando que tem
várias refinarias no Mar Negro, além de dar prioridade a rotas a Norte.
3.1.2. Kiyikoy – Ibrikbaba (Turquia)
Em JUN03, a Companhia turca de Desenvolvimento da Trácia sugeriu ao Ministério da
Energia um oleoduto, no território europeu da Turquia, entre Kiyikoy, no Mar Negro, e
Ibrikbaba, no Golfo de Saros, no Mar Egeu.
O grupo petrolífero Anadolu assumiu o projecto e contactou o ministério da Energia da
Federação Russa e a Transneft. Esta aprovou em MAI04 a participação no projecto.
Com 193 quilómetros, estima-se que custe 913 milhões USD, leve 2 anos a construir e
permita a exportação de 60 mt/a (1,2 milhões b/d), via super-petroleiros [Very Large Crude
Carriers (VLCC)] capazes de alcançar os EUA mais depressa (10-11 dias) e mais barato
(7 USD/tonelada) em relação à situação actual. Para mais a capacidade do oleoduto
corresponde grosso modo à exportação de petróleo russo que passa pelos Estreitos Turcos
(62 mt em 2003, cerca de 30% do total).
A TNK-BP e a Tatneft, que ganhou a privatização de uma refinaria na Turquia Ocidental,
operação entretanto anulada judicialmente, estão envolvidas, tal como a Lukoil.
3.1.3. Reversão do Adria
A reversão do oleoduto Adria, que transporta petróleo do porto de Omisalj para a refinaria
croata de Sisak, foi acordada, em 16DEZ02, por Federação Russa, Bielorússia, Ucrânia,
Eslováquia, Hungria e Croácia. A inversão permitirá que o petróleo transportado pelo
oleoduto Druzhba durante 3.000 quilómetros chegue a um porto de águas profundas, capaz
de acolher petroleiros com 350 mil toneladas (2,5 mb), por onde se poderiam exportar
15 mt/a (300 mil b/d). O custo está estimado em 300 milhões USD. Em OUT04 parecia num
impasse devido à avaliação do impacto ambiental na Croácia.
Há ainda outras iniciativas promovidas sem o envolvimento da Federação Russa.
3.1.4. Samsu – Ceyhan (Turquia)
O governo turco prefere ver os VLCC longe do Egeu. Já propôs um oleoduto entre Samsun,
no Mar Negro, e o terminal petrolífero de Yurmutalik (Ceyhan).
3.1.5. Constanta - Oleoduto Transalpino
Áustria, Itália, Roménia, Croácia, Sérvia e Eslovénia assinaram um acordo em 05NOV04 para
ligarem via oleoduto Constanta, no litoral romeno, e Trieste (Itália), no Mar Adriático. O
Departamento de Prospectiva e Planeamento
55
Informação Internacional, Vol. II, 2004
objectivo é transportar petróleo do Mar Cáspio para a Europa Ocidental. Divulgada em
conferência de imprensa, em Bucareste, pelo vice-ministro romeno da Economia, Andrei
Grigorescu, a iniciativa visa abastecer reservatórios e refinarias na Alemanha, Áustria e
República Checa servidos pelo Oleoduto Transalpino, a partir de Trieste.
Este acordo desenvolve um de 2001. Admite-se que a construção comece no final de 2005. A
capacidade prevista é de 60 mt/a (1,2 mb/d). A proposta actual retoma uma da ENI, de
1998, a Linha do Sudeste Europeu. Durante 1999 foram divulgados estudos feitos por firmas
romenas e norte-americanas que concluíam pela viabilidade de um oleoduto entre Constanta
e Trieste.
A raíz da hipótese Constanta-Trieste radica na Organização para a Cooperação Económica no
Mar Negro, organização proposta no fim dos anos 80, ainda existia a URSS, pelo presidente
turco Turgut Ozal. Durante a presidência romena, o avanço institucional esbarrou na sede do
banco central. A Roménia queria-o, mas foi para Tessalónica, na Grécia, com um governador
turco. Em compensação, a Roménia ganhou a modernização do seu litoral, que incluiu a
modernização do porto de Constanta.
3.1.6. Burgas – Vlore
Esta rota balcânica, entre a Bulgária e a Albânia, via Macedónia, concebida desde 1994 e
apresentada como alternativa a Burgas-Alexandropolis e Constanta-Trieste, ganhou novo
fôlego no final de 2004, com os primeiro-ministros destes países a assinarem um acordo
para a sua realização.
Com uma extensão de 900 quilómetros, terá uma capacidade de 750 mil b/de está orçado
em 1,2 mil milhões USD. A construção está a cargo da Albanian Macedonian Bulgarian Oil
Corporation, deverá começar em 2005 e terminar em 2008 ou 2009. Os norte-americanos do
CPC – ChevronTexaco e ExxonMobil –, além da BP, são apontados como potenciais
interessados.
SÍNTESE
Lee (2004) constata que for all of the proposed Bosphorus bypasses, the real stumbling
block is continued uncertainty over the economic viability of such pipelines. A novidade é a
chegada progressiva do petróleo do COC e a anunciada do da TNK-BP.
A inversão do projecto inicial de Odessa-Brody, mesmo que temporário, indicia a imposição
dos interesses da Federação Russa sobre as pretensões autonomistas da Ucrânia – cuja
eleição presidencial demonstrou a clivagem entre aqueles e estas –, o agravamento da
pressão sobre o Bósforo e a eliminação de uma auto-estrada energética do Mar Cáspio até à
Europa, via Cáucaso (Azerbaijão e Geórgia), Mar Negro e Ucrânia, com prolongamento até
Gdansk, na Polónia. Falta ver a consequência da eleição de Viktor Yuschenko nas relações
entre a Federação Russa e a Ucrânia, por onde a passa a maior parte das exportações russas
de GN para a Europa.
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Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
O afluxo crescente de petróleo ao Mar Negro poderá levar as empresas a comprometer-se
com alguma das rotas. Para já está a empurrar a Federação Russa parra Norte.
Por outro lado, o oleoduto Baku-Tbilisi-Ceyhan, o primeiro fora do território da Federação
Russa, deverá começar a funcionar no segundo semestre de 2005. A este desenvolvimento
acrescem os avanços no projecto de oleoduto acordado em 1997 entre o Casaquistão e a
China National Petroleum Company. A começar em 2006, partirá do sul da bacia petrolífera
de Turgai, no centro casaque, 2.000 quilómetros a leste do Mar Cáspio, e terá uma
capacidade de 20 milhões t/a (400 mil b/d).
3.2. Sistema de Oleodutos do Báltico
Os esforços da Transneft, após a implosão da URSS, centraram-se na resolução do
problema, inédito, do trânsito do petróleo pelos novos países, e custos associados. A
prioridade foi a construção de segmentos dos oleodutos, para que a exportação se fizesse,
tanto quanto possível, apenas pelo território federal. Ucrânia e países bálticos foram vítimas
da nova política. O SOB origina uma receita anual de 100 milhões USD e permite poupanças
em direitos de trânsito no montante de 1,5 mil milhões USD.
O Sistema de Oleodutos do Báltico (SOB) foi lançado em 1997 para fazer o bypass dos novos
Estados, não para aumentar exportações. Inaugurado em DEZ01, o terminal de Primorsk,
perto de São Petersburgo, no golfo da Finlândia, tornou dispensável o terminal letão de
Ventspils e
reduziu
a
dependência
da ucraniana Odessa, no Mar Negro. A capacidade
inicial de 240 mil b/d foi entretanto elevada para 850 mil b/d. A Transneft quer oferecer
1,2 milhões b/d no fim de 2006, o que Frakhov já reafirmou (RBC, 27DEZ04).
Mas Primorsk sofre dos mesmos males estruturais de Ventspils. Falta profundidade para
acolher VLCC, o gelo prejudica o trânsito 4 a 5 meses por ano e os que acolhe têm de passar
pelos Estreitos Dinamarqueses, também cada vez mais congestionados. Os exportadores
deverão sofrer aqui os mesmos atrasos dos Estreitos Turcos, por onde sai um milhão b/d.
Este congestionamento implica a procura de soluções, na qual se incluem as saídas pelo
Norte e Noroeste.
Na vizinhança, no seu terminal em Vysotsk, a Lukoil inaugurou em FEV04 a recepção
ferroviária de petróleo das suas explorações de Nizhny Novgorod, Perm e Ukhta. Este
terminal
tem uma capacidade de 10 mt. O fundo norte-americano HBK emprestou
225 milhões USD a 12 anos, de que a Overseas Private Investment Company garantiu
130 milhões e o Crédit Suisse First Boston 75 milhões USD. Em 24DEZ04 foi anunciada a
intenção de melhorar o porto para passar a receber petroleiros com 100 mil toneladas para
elevar as exportações, dirigidas aos EUA, para 12,5 mt/a até 2007 e 17 mt/a depois.
Também em FEV04, a administração regional de Leninegrado autorizou a TNK-BP a construir
um terminal para petróleo e derivados no Golfo da Finlândia, perto de Vyborg.
Departamento de Prospectiva e Planeamento
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Acrescente-se que devido ao desvio da exportação para Primorsk, após a Letónia rejeitar a
intenção da Transneft comprar 50% da sociedade gestora, o porto de Ventspils, existente
desde 1961 e que chegou a exportar 15% da produção russa, passou a depender da via
férrea. Em 2004 (até Outubro) só exportou 7,3 mt, o que compara em termos homólogos
com 9,6 mt em 2003 e 12,5 mt em 2002.
3.3. Mar de Barents
A Transeft anunciou, em 14OUT04, a intenção de construir um oleoduto da cidade siberiana
de Surgut para o Árctico. Com um custo estimado de 5,6 mil milhões USD passará por Usa e
terminará no porto de Indeika/Indiga. Por mais 600 milhões USD poderá passar pelos
campos de Kharyaga, na província petrolífera de Timan-Pechora, desenvolvidos por Lukoil e
Total. Os franceses queixaram-se, em 27OUT04, que a falta de oleodutos impedia mais
subidas da produção, após a terem aumentado de 20 para 50 mil b/d com investimentos de
800 milhões USD.
Fica assim sem efeito o acordo assinado em 27NOV02 por quatro dos maiores produtores –
Iukos, Lukoil, Sibneft e Tyumen – para financiar um oleoduto para Murmansk, na costa da
Península de Kola, no Mar de Barents (Mapa 4). Este projecto, que marcaria a entrada dos
privados nos pipelines, foi aprovado pelo governo Kasyanov em ABR03 e considerado pelos
EUA o símbolo do diálogo energético entre os dois países. O então ministro da Energia, Igor
Yusufov, afirmou que the government has for the first time made public its position that the
state is not trying to fully own new pipelines, but it reserves the right to monitor and
regulate the transport infrastructure (Financial Times, 21ABR03).
Mapa 4
PROJECTOS DE PIPELINES QUE ABRIRIAM NOVOS MERCADOS PARA O PETRÓLEO DA
RÚSSIA, EM PARTICULAR OS EUA
Fonte: Alekperov (2002).
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A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
As águas árcticas de Murmansk não gelam no Inverno e são profundas o suficiente para
acolher VLCC. Com início em Yaroslavl, hub de pipelines na Sibéria Ocidental, o oleoduto
teria uma capacidade de 1,6 milhões b/d (80 mt/a), uma extensão de 1.500 quilómetros e
um custo entre 3,4 e 4,5 mil milhões USD. A Transnfet contrapôs um intervalo de custos
entre 9 e 15 mil milhões USD. Alekperov (2002) defendia que era alternativa a BakuCeyhan. Com Murmansk mais próximo dos EUA do que o Golfo Pérsico (1.800 milhas versus
5.800 milhas), os seus promotores previam que a quota russa no mercado norte-americano
subisse de 1% para 13% até 2010. Acabava o inconveniente do transbordo que a Iukos era
forçada a fazer no Mediterrâneo, de petroleiros necessariamente pequenos para passarem
pelos Estreitos Turcos para VLCC capazes de alcançarem os EUA com petróleo em
quantidade que compensasse os custos da viagem.
Sem oleoduto para Murmansk, as empresas começaram, em MAR04, a utilizar uma
plataforma de armazenagem offshore, a Belokamenka, para fazer o transbordo para os
VLCC. Com uma capacidade de 360 mil toneladas, o tanker recebe petróleo de Arkhangelsk e
Vitino, no Mar Branco, e ainda de Murmansk, transportado por cargueiros com uma
capacidade de 15 a 50 mil toneladas.
Já em 27OUT04, o vice-CEO da Lukoil, Leonid Fedun, acomodando-se à nova solução,
sublinhava que a pipeline to an Arctic port would definitely be a good solution ao problema
de conseguir vender fora da Europa, em particular nos EUA. Mas em 24JAN05 voltou a
insistir na opção Murmansk, esperando que a entrada da ConocoPhilips no seu capital
reforçasse as hipóteses desta alternativa. Sem Indeika/Indiga, considerava-se que a Lukoil
teria de multiplicar por oito a capacidade do seu terminal em Varandey, no Mar de Barents,
para exportar para os EUA, onde comprou a rede de distribuição da Getty Oil, na costa
ocidental, que conta com duas mil estações de serviço. No fim de 2004 anunciou planos para
expandir a capacidade deste terminal para 12 mt em 2007.
Note-se que a solução que parece vir a ser adoptada premeia a Surgut, que não esteve entre
os promotores de Murmansk.
3.4. Ásia – pela Sibéria ou por... Israel?
Em 31DEZ04, o governo decidiu avançar com o Oleoduto Sibéria Oriental – Oceano Pacífico,
ou Grande Oleoduto Oriental, entre Taishet e Nakhodka, no Mar do Japão. Até 01MAI05, os
ministérios da Energia, Finanças e Comércio e Desenvolvimento reportarão a sua viabilidade
económica e o dos Recursos Naturais um plano de extracção.
O projecto divulgado aponta para uma capacidade de transporte de 80 mt/a (1,6 mb/d) e
uma extensão de 4.130 quilómetros, com uma primeira fase até Skovorodino. Aqui será
construído um terminal ferroviário, de onde o petróleo seguirá por comboio para o mar e,
possivelmente, para a China, uma vez que estará a 60 quilómetros da fronteira. O tempo de
construção está estimado entre 3 a 6 anos, o que faz de 2010 o ano de referência.
Há muito esperada, esta decisão culminou os duelos travados durante anos – entre rotas,
entre russos, entre China e Japão – perante a assistência interessada da Coreia do Sul e
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Índia. A história recente começa com a Iukos a querer Angarsk-Daqing e a Transneft a
defender o seu monopólio com Taishet-Nakhodka (Mapa 5). Tratava-se de saber se o
oleoduto a partir de Angarsk, na zona do Lago Baikal, seria exclusivo para a China,
terminando em Daqing, no hinterland chinês, ou acabaria em Nakhodka, em mar aberto,
disponível para quaisquer clientes. Taishet substituiu entretanto Angarsk por pressões várias,
como ecologistas.
Mapa 5
OS PIPELINES PARA O ORIENTE – CHINA VS. JAPÃO
Fonte: McGregor, Piling e Ostrovsky (2004).
Para trás ficaram, derrotados, o governo Kasyanov, a Iukos e a China. A ascenção de Putin e
a agressividade do Japão – ao prometer 13,5 mil milhões USD em investimento e
empréstimos para prospecção, construção do oleoduto e desenvolvimento do Extremo
Oriente – mudaram os dados.
O traçado para Daqing seria mais rápido e barato, por ser mais curto. Com 2.400
quilómetros, teria uma capacidade de 600 mil b/d e custaria 1,9 mil milhões USD; já
Nakhodka orçaria em 5,2 mil milhões USD – estimativa já elevada para 10,75 e até 18 mil
milhões USD, consonante se faça ou não a ligação à China – e transportaria 1 mb/d.
A incógnita, porém, reside na existência de petróleo suficiente para abastecer dois oleodutos
– para Nakhodka, com derivação para Daqing –, um ou nem isso. Trata-se de saber se basta
a Sibéria Oriental ou se será preciso recorrer à Sibéria Ocidental e se tal necessidade
reduzirá a oferta disponível para o mercado ocidental.
Citando Gorst (2004) looming over the whole eastern pipeline debate, is the key question of
how much oil will be found in East Siberia and how expensive it will be to tap. Investing in
such a large export system will be risky until more is know about the potential and cost of
developing East Siberian reserves, and if West Siberian deposits are initially tapped to feed
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A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
Nakhodka, then this eastern line would drain line fill away from proposed expansions on
western routes.
Putin foi claro, em declarações a jornalistas chineses, aquando da sua visita à China: We
think that the People's Republic of China is interested not only in projects to develop this
transport infrastructure (including pipelines) in the east of the Russian Federation, but also in
helping this transport infrastructure give a strong impetus to additional prospecting efforts.
This is needed to ensure that Russian energy resources are assessed properly so that
Chinese consumers, taking into account plans for Chinese economic growth, can have
information on when, how much and what kind of energy resources Chinese enterprises can
received from Russia (Interfax 13OUT04).
Pela incerteza associada, a última proposta conhecida prevê o recurso ao petróleo da Sibéria
Ocidental. Em 04NOV04, a Interfax divulgou uma carta do presidente da Transneft a
Fradkov, em que propunha um oleoduto de Taishet para Skovorodino. Daqui sairia um
oleoduto para a China, com capacidade de 30 mt/a (600 mil b/d). À medida que a Sibéria
Oriental fosse desenvolvida avançaria o oleoduto para o Oceano Pacífico. Mas the raw
material base for the project includes 24 million tonnes of oil from Western Siberia and 56
million tonnes from fields in Eastern Siberia and Sakha Republic (Yakutia), most of which are
not yet producing (Interfax 04NOV04).
O ministro dos Recursos Naturais quantificou em 20 mil milhões USD o investimento na
Sibéria Oriental para conseguir o petróleo necessário, tendo já apresentado uma lista de
38 campos para serem leiloados para exploração e desenvolvimento.
3.4.1. Israel
Os mercados asiáticos podem ser alcançados através do Trans-Israel Pipeline (TIPline),
um oleoduto entre Ashkelon, no Mar Mediterâneo, e Eilat, no Mar Vermelho, com
254 quilómetros e uma capacidade de 60 mt/a (1,2 mb/d). Esta linha resultou de uma jointventure israelo-iraniana, completada em 1968. Raramente foi utilizada em pleno. Acresce
que o Xá foi deposto em 1979 e os campos no Sinai, explorados por Israel, devolvidos ao
Egipto. Israel passou a importar quase todos os cerca de 300 mil b/d que consome. Até ao
reinício da Intifada, em 2000, o TIPline era utilizado para transportar petróleo egípcio para o
Mediterrâneo. A racionalidade da proposta de chegar à Ásia pelo Ocidente, via Israel, decorre
de o contorno de África exigir 30 a 35 dias, enquanto que pelo Mar Vermelho bastam
10 dias. O Canal de Suez não é opção porque o Egipto não permite a sua travessia por VLCC.
Este hipotético entendimento israelo-russo teria racionalidade política (radicais de base
islâmica como inimigo comum; enfraquecer Arábia Saudita), cultural (1 em cada 5 israelitas
é imigrado russo) e económica, ao integrar um canal de abastecimento energético russoturco a Israel.
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Um ministro israelita mencionou, em ABR04, um projecto de corredor de infra-estruturas de
energia sob o Mar Mediterrâneo, com linhas eléctricas, gasodutos e oleodutos de crude e
refinados entre Israel e Turquia. Em JUN04 Israel e Rússia decidiram estudar a viabilidade de
contratos de fornecimento de longa duração de GN e em SET04 a Botas turca e a Gazprom
acordaram na venda de GN ao Médio Oriente, incluindo Israel e Síria. Já em FEV05, tornouse pública a pretensão da Gazprom instalar uma unidade de liquefacção de GN na costa
israelita, com uma capacidade de 4 mmmc/a, de onde poderia ser exportado para os EUA.
3.4.2. Sacalina
No mar de Okhotsk está a mais recente zona produtora da Federação Russa, no offshore da
ilha Sacalina, a Norte do Japão. Apesar de a produção ter começado a ser discutida em
meados da década de 70, só agora se está a tornar realidade. Ainda com muita incerteza
associada, as estimativas apontam para reservas equiparáveis às do Mar do Norte. A sua
exploração está dividida por seis blocos (Mapa 6). Mais avançada nos blocos 1 e 2, com
problemas jurídico-políticos no 3, apresenta ainda um duelo entre formas de transporte de
GN: gasoduto e transporte marítimo do GNL. As condições ambientais são muito agrestes
(acolheu a maior colónia penal russa), as águas gelam durante vários meses, a localização é
remota (a ilha com 930 quilómetros conta apenas com 600 mil habitantes), a infraestrutura
limitada, a sensibilidade ecológica forte e há diversas questões no relacionamento com as
comunidades locais.
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Mapa 6
OS CAMPOS DE PETRÓLEO E GÁS NA SACALINA
Fonte: World Investment News (http://www.winne.com/sakhalin/eng/cr-oilandgas.htm), 2003.
Nos últimos tempos têm-se sucedido acontecimentos estruturais. Assim, o primeiro contrato
para a venda de GN russo para a América do Norte foi assinado em 14OUT04, depois de a
partida do primeiro petroleiro para a costa oeste dos EUA, com 700 mil barris, ter ocorrido
no início de JUL03. Um mês antes fora assinado o contrato para a construção da maior
fábrica mundial de GNL, que permitirá que em 2007 a Federação Russa venda GN pela
primeira vez à Ásia. Em outro plano, a Gazprom estava a acentuar a pressão para entrar nos
consórcios, apesar de a presença do Estado ser assegurada pela Rosneft. Esta pressão, que
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
poderia ser aliviada com a sua absorção da Rosneft, poderá voltar a estar na ordem do dia
após esta integração ter voltado à estaca zero no seguimento dos últimos desenvolvimento
do caso Iukos, com a Gazprom a alienar a recém-constituída holding petrolífera
Gazpromneft.
3.4.2.1. Sacalina-1
O bloco Sacalina-1 é explorado por um consórcio constituído por Exxon e Sodeco – uma
holding japonesa constituída pela terceira (Itochu) e quinta (Marubeni) maior tradings e a
maior petrolífera por capitalização bolsista, Japan Petroleum Exploration – com 30% cada,
Rosneft e a indiana ONGC-Videsh, com 20% cada.
O projecto tem quatro fases (Fields 2002). A primeira assenta no petróleo e concretiza-se na
entrada em funcionamento dos campos de Chayvo, em 2005, e Odoptu, em 2007, além de
um oleoduto para DeKastri, na região de Khabarovsk, e da exportação por petroleiros. Em
11NOV04 começou a ser construído o oleoduto, com 225 quilómetros e um custo estimado
de 300 milhões USD. A infraestrutura deverá estar pronta em 2005 para transportar o
petróleo de Chayvo, de onde se prevê uma produção de 250 mil b/d a partir de meados do
próximo ano. Em 2005 esta região também deverá começar a receber GN, que deverá
alcançar 3 mmmc enm 2009. A segunda fase contempla exportação de GN para o Japão (ou
China) em 2008. A intenção é exportar 100% para o Japão, via gasoduto. Uma terceira fase
coresponde ao desenvolvimento da exploração de GN no terceiro campo, Arkutun Dagi, onde
se espera que (quarta fase) a produção, como a de Odoptu, dure até 2050.
O consórcio já investiu 2,6 mil milhões USD, de um total de 12 mil milhões USD, com quatro
milhões destinados à primeira fase. Em 24NOV04, a ONGC-Videsh anunciou ir investir mais
1,07 mil milhões USD. Prevê-se que a Federação Russa receba 35 a 40 mil milhões USD em
royalties, impostos e lucros durante a vida do projecto, além de outros benefícios como
milhares de empregos, um fundo para o desenvolvimento da Sacalina com 100 milhões USD
e GN para o seu Extremo Oriente.
As reservas recuperáveis estão estimadas em 2,23 mil mb (307 mt) e 485 mmmc. Com uma
área de 1.146 quilómetros quadrados, centrada nos pólos de Odoptu, Arkutun Dagi e
Chayvo, a exploração decorre a uma profundidade entre 10 e 60 metros, com o mar gelado
durante metade do ano e ventos fortes e ondas altas na outra metade, em zona sísmica e
sensível ambientalmente. Já foram feitos testes, bem sucedidos, de transporte por
petroleiros durante o Inverno com recurso a navios quebra-gelos.
Em FEV05, os accionistas sofreram um revés quando o tribunal de Khabarovsk cancelou a
aprovação ambiental do projecto e impediu a construção de um porto petrolífero em
DeKastri, no Mar de Okhotsk, perto de um outro de onde a Rsneft exporta 20 mil b/d desde
1998. No mês anterior, os autóctones bloquearam o acesso às instalações, sob a acusação
de os projectos energéticos na ilha estarem a poluir os lençóis freáticos, a matar a vida
marinha e a afectar os percursos dos salmões, considerados vitais para o modo de vida
tradicional das populações locais.
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A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
3.4.2.2. Sacalina-2
O consórcio que explora o mais avançado dos blocos, Sacalina-2, é o único sem empresas
russas. Designado Sakhalin Energy, criado em ABR94, é integrado pela Royal Dutch/Shell
(55%) e as japonesas Mitsui (25%) e Mitsubishi (20%). As reservas estão estimadas em mil
mb, centrados no campo de Piltun-Astokhskoye, e 400 a 800 mmmc de GN, em Lunskoye, a
17 quilómetros da ilha. A produzir petróleo desde 1999 – 70 mil b/d actualmente; previsão
de 175 mil b/d no próximo futuro –, só o pode fazer nos meses em que o mar não está
gelado.
Contratos de venda de GN e petróleo para EUA e Japão e investimentos avultados
anunciados são os destaques actuais. A primeira venda de GNL russo para a América do
Norte foi assinada em 14OUT04. O negócio, avaliado em 6 mil milhões USD, consiste na
venda de 37 mt, ao longo de 20 anos, a partir do início de 2008, à Shell Eastern Trading.
Este GNL, transportado em navios do consórcio, abastecerá a unidade de regasificação
(Energia Costa Azul) a construir na Baja California, México, para abastecer o mercado local.
O excedente será reexportado para a Califórnia norte-americana. Em 2003 foram assinados
os primeiros acordos para vender GNL a longo prazo a empresas japonesas (Maio), para
construir a fábrica de liquefacção de GN, feita a 162 graus negativos (Junho), e anunciada a
partida do primeiro petroleiro para a costa oeste dos EUA, com 700 mil barris (Julho), bem
como feita a primeira venda de petróleo para Taiwan (Setembro).
A fábrica de GNL é o ex-libris do projecto. Localizada no extremo sul da ilha, onde o mar não
gela, a 2,5 dias de viagem marítima da bacia de Tóquio, deve produzir 9,6 mt/a, metade das
quais destinadas ao Japão e o resto dividido por China, Coreia do Sul, Taiwan e América do
Norte. Os principais compradores japoneses são a Tokyo Gas (1,1 mt/a no período 20072031) e Tokyo Electric (1,2 mt/a entre 2007 e 2029), a que se juntam a Kyushu Electric
(500 mil t/a entre 2007 e 2029) e Toho Gas, esta com compras anuais de 300 mil t/a.
Assim, no segundo semestre de 2007, a Federação Russa venderá pela primeira vez GN à
Ásia. O investimento associado – plataformas offshore, pipelines, entre os quais um oleoduto
submarino com 800 quilómetros, um terminal para exportação, além da unidade de
liquefacção – ascende a 10 mil milhões USD, que eleva o total aplicado para 12 mil milhões
USD.
As pressões ecologistas, relacionadas por exemplo com a protecção das baleias, já levaram o
consórcio a investir 5 milhões USD desde 1990 e a dedicar 2 milhões USD em 2004 ao
estudo do impacto da exploração das reservas de energia sobre estes animais.
A composição accionista do consórcio está sob pressão. Os accionistas propuseram à Korea
Gas que entrasse no capital quando negociaram o eventual fornecimento da Coreia com GN.
Por outro lado, a Gazprom já manifestou vontade de ser accionista. O controlo deste
consórcio, junto com o da BP em Kovytka, aumentar-lhe-ia o poder negocial com os
importadores asiáticos. A Royal Dutch/Shell já admitiu trocar parte da sua quota pela
participação em projectos russos. Em 29NOV04, o Moscow Times citava a imprensa japonesa
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
para noticiar a entrada da Gazprom no consórcio, com um investimento de 975 milhões USD
e a entrega de direitos de exploração de um campo petrolífero na Sibéria.
3.4.2.3. Sacalina-3
O governo russo anulou em JAN04 a licença de exploração do bloco Sacalina-3, atribuída à
ExxonMobil e ChevronTexaco, sob o argumento de que não o desenvolveram desde que a
obtiveram em 1993. O Ministério dos Recursos Naturais anunciou que em 2005 fará um
concurso para atribuir esta licença, com o que espera receber entre entre 800 e mil milhões
USD. O presidente da Câmara de Comércio Americana, Andrew Somers, considerou que what
it gets close is expropriation (Moscow Times 05FEV04). A demora na concretização do
projecto resultou da decisão das empresas de não investirem enquanto não fosse garantido
um estatuto de PSA ao investimento.
As reservas deste bloco estão estimadas em 4,1 mil mb de petróleo e 1,5 biliões (milhão de
milhões) de metros cúbicos.
ExxonMobil e ChevronTexaco estiveram em negociações para comprar 40% da Iukos, à
revelia da vontade do governo e presidente russos.
3.4.2.4. Sacalina-4
O consórcio que explora este bloco – BP (49%) e Rosneft (51%) – decidiu no início de 2004
abandonar a prospecção devido a resultados decepcionantes.
3.4.2.5. Sacalina-5
O consórcio, estabelecido em 28MAI98, que explora este bloco é o mesmo do anterior.
Estima-se a existência de reservas de 783 mt de petróleo e entre 400 e 600 mmmc de GN. A
produção, que não deverá começar antes de 2010, poderá atingir um máximo anual de
700 mil b/d (tanto quanto o Qatar) e 22 mmmc.
No início de 2004, state-owned partner Rosneft has asked BP to finance the entire
development of their Sakhalin-5 venture (...) BP, which spends over $10 billion on capital
investment worldwide annulally, is likely to pay up, as otherwise Rosneft may turn back its
back on BP and go to a keen rival like France's Total for backing in one of the world's most
coveted new energy extraction schemes (Neftegaz.RU 09JAN04).
A BP deve assim suportar a totalidade dos custos de desenvolvimento, estimados entre 3 e 5
mil milhões USD.
3.4.2.6. Sacalina-6
Este é o bloco cuja exploração está mais atrasada. O grupo Alfa, parceiro da BP na TNK-BP,
tem uma licença.
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3.4.3. Estabilizar a península coreana
Em teoria, a Coreia do Sul pode ser abastecida de GN a partir da Rússia Continental, a partir
de Sacalina ou Kovytka, via Coreia do Norte. O primeiro disponibilizaria GN a regiões
remotas russas, o segundo à China. Ambos apresentam a vantagem de reduzir tensões na
península coreana, fornecendo energia à Coreia do Norte.
Até ao fim da Guerra Fria, a Coreia do Norte era abastecida com petróleo russo e chinês a
preços subsidiados. A partir de 1990, Federação Russa e China começaram a cobrar preços
internacionais e Pyongyang deixou de pagar e receber. Sem esta fonte energética, a débil
economia colapsou. As carências alimentares – um quarto da população depende da ajuda
internacional – são um dos exemplos mais óbvios. O investimento no nuclear foi uma aposta.
Em 1994, a Coreia do Norte e os EUA concordaram na paragem do programa nuclear nortecoreano, destinado tanto à produção de energia como de armas, em troca da construção
pelos EUA de duas centrais nucleares até 2003 e do fornecimento de 500 mt/a de petróleo
até ao fim da construção. Perante o arrastar dos trabalhos, Pyongyang ameaçou terminar o
acordo, o que fez no final de 2002, na sequência do que reactivou o reactor de Yongbyon.
O acesso da Coreia do Norte a fontes de energia surge assim no topo da agenda política
peninsular. A decisão norte-coreana conduziu ao actual processo de negociações com seis
partes: China, Coreia do Sul, EUA, Federação Russa e Japão, além da Coreia do Norte. A
Administração Bush opõe-se à passagem de qualquer pipeline pela Coreia do Norte e centrase nas armas nucleares. O Japão admitiu, durante uma reunião das partes em JUN04,
participar em um programa de ajuda internacional em energia aos norte-coreanos, em troca
de três condições: congelamento dos programas nucleares norte-coreanos, revelação por
Pyongyang do estado destes programas e inspecção rigorosa do congelamento. No mês
seguinte, o ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, visitou a península. Um
dos membros da delegação, o presidente do comité da Duma para a Energia, Valery Yazev,
afirmou que the decision to freeze North Korea's nuclear programmes directly depends on
the methods and delivery time of energy resources to that country; therefore the Russian
gas supply project may become a priority (Novosti, citada no Gasandoil, 21JUL04). Esta
lógica de pacote – congelamento do programa nuclear em troca de compensações –
significaria, em particular, o fornecimento de energia, petróleo garantido pelos EUA em uma
primeira fase, gás natural russo em uma segunda. O futuro depende do mecanismo de
compensação, uma vez que a Coreia do Norte pagaria um preço reduzido, enquanto a do Sul
pagaria preços internacionais.
A hipótese russa de GN desdobra-se em duas alternativas: Kovytka e Sacalina. A primeira
insere-se na criação de uma rede de fornecimento de GN à Sibéria Oriental e ao Extremo
Oriente, mas tem o problema de passar pela China que, a prazo, pode querer todo o GN para
si. A segunda confronta-se com a importância do GNL no mercado sul-coreano, o que reduz
as hipóteses de um abastecimento por gasoduto, desde logo pela Coreia do Norte, mas
também pelo Japão.
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Se everyone wants a nonnuclear solution to North Korea's energy problem (Brooke 2004), há
menos candidatos a dividir os custos associados a esta vontade, apresentada como unânime.
Harrison (2003) defende uma combinação do fornecimento de GN por gasoduto com um
programa, reduzido, de energia nuclear (só uma central) em troca de um regime de
inspecções adequado para verificar o fim efectivo do esforço norte-coreano de produção de
armas nucleares.
3.5. GÁS NATURAL
Os EUA e o Reino Unido são os principais novos mercados que a Federação Russa, via
Gazprom, pretende para o seu GN. O primeiro através do GNL; o segundo via gasoduto.
Pressionar a entrada em Sacalina-2 e procurar acordos de swap são os métodos actuais.
Yergin e Stoppard (2003) classificam o GN como The Next Prize, em referência à obra do
primeiro, The Prize – The Epic Quest for Oil, Money & Power [Nova Iorque: Touchstone,
1991], que ganhou o Prémio Pulitzer, para significarem a crescente importância desta fonte
energética. Como dizem: A new global energy business – natural gas – is emerging (p. 103).
Atribuem esta novidade à electricidade – if there is a single thing responsible for the
emergence of natural gas as a global commodity, it is the rising demand for electricity (p.
108). Produto que viaja mal, o GN tem sido distribuído por gasoduto terrestre, perante o
custo da alternativa. Esta infraestrutura, pelo investimento que requer, normalmente está
associada a contratos de longa duração, que amarram mutuamente vendedor, comprador e
países de trânsito. A contrução do gasoduto entre a Sibéria e a Europa Ocidental, que dividiu
a
Europa
e
os
EUA na década
de 80, foi um
dos
grandes
acontecimentos
na
internacionalização do GN. Another was the emergence of LNG (p. 106). O LNG (liquefied
natural gas) is natural gas, primarly methane, which has been cooled to its liquid state at –
260º Fahrenheit (-162,2º Celsius). Liquefying natural gas reduces the volume it occupies by
more than 600 times, making it a pratical size for storage and transportation (Gaul 2004).
A queda dos custos é a explicação para esta atracção crescente do GNL, o que permite
responder à necessidade cada vez maior demonstrada pelos EUA: In the last two years, the
United States has emerged as a key – indeed the key – future growth market for LNG (p.
109). O interessante para os EUA é que a contracção do volume feita pela liquefacção
permite que um barco transporte o equivalente a 5% do seu consumo diário médio. Os EUA
esperam um crescimento anual médio de 16% das importações de GNL entre 2002 e 2025
(Gaul 204), o que se reflecte nas propostas de novos terminais de GNL (Mapa 8).
Neste contexto, o antigo secretário do Comércio dos EUA, Donald Evans, realçou o papel da
Federação Russa, durante a conferência organizada pelo Baker Institute em OUT02:
heretofore, natural gas has been confined to continents, because that was the only way you
could transport it effectively or economically. We're rapidly moving into a world where
natural gas will be moved around the world, which is why Russia will play such an important
role in providing energies supllies in the years ahead.
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A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
As vantagens do GNL face ao gasoduto incluem menores riscos tecnológicos, geológicos e
ambientais e o favorecimento do comércio multilateral de curto prazo, spot inclusive, em
comparação com contratos exclusivos, bilaterais e de longo prazo (Hartley e Brito 2001)
3.5.1. EUA
O GNL representou 2% do consumo de GN em 2003 e deve passar para 8% em 2010 e 20%
em 2020. Miller já disse que quer a Gazprom a expandir-se para os EUA. Esta expansão
basear-se-ia no GNL a produzir em Murmansk, com base no campo de Shtokmanovskoye, no
Mar de Barents. A dificuldade da operação – a única instalação de liquefacção na Federação
Russa está em construção na Sacalina-2 – levou a gasífera a desenvolver contactos com BP,
Shell, ConocoPhilips, ExxonMobil, ChevronTexaco e Statoil. Antes, em 03MAR04, a Gazprom
anunciara a criação de uma empresa para exportar GNL para EUA. Já assinou mesmo um
contrato, em 13OUT04, com a Petro-Canada para vender GNL ao Canadá a partir de 2909 e
estudar a construção de um terminal de GNL perto de São Petersburgo.
Estes projectos exigirão sempre algum tempo e muito dinheiro. Gref já admitiu que as
exportações só serão significativas a partir de 2007, no caso do petróleo, e 2010 na mellhor
das hipóteses no GNL. Quotas nas importações dos EUA de 10% no petróleo e de 23% no
GNL são metas que já foram formuladas por responsáveis russos.
Em caso de sucesso, as consequências serão positivas para a Federação Russa: In addition
to a 'nuclear bludgeon', Russia will get energy leverage on the US, notava um analista
(Russia Journal, 24OUT03). Por outro lado, as vendas aos norte-americanos reforçariam a
Gazprom nas negociações com os europeus.
Entretanto, a Gazprom acordou com a ConocoPhilips (Moscow Times 23DEZ04) a elaboração
de um estudo de viabilidade de produção de GNL a partir de Shtokmanovskoye e a detecção
de oportunidades de participação da Gazprom em unidades de regasificação do GNL nos
EUA. Por outro lado, foi proposto à BP um swap, em que a britânica venderia GNL nos EUA
pela Gazprom e receberia GN na
Europa.
3.5.2. Reino Unido
Com o mercado europeu continental saturado, a Gazprom pretende alcançar o mercado
britânico, em especial consumidores industriais e produtores de electricidade. Este mercado
está a perder a autosuficiência, devido à redução da produção no Mar do Norte. O projecto
do Gasoduto do Norte Europeu responde a este desejo. A iniciar em Griazovets, 350
quilómetros a nordeste de Moscovo, seguiria até Vyborg, de onde, sob o Mar Báltico, pelas
águas territoriais finlandesas, prosseguiria em direcção a Alemanha, Países Baixos e Reino
Unido. Com uma extensão de 2.980 quilómetros, teria ramais para Finlândia e Suécia. De
caminho fazia o bypass da Bielorrúsia, Ucrânia e Polónia.
Apesar de prometidas, em 11FEV04, pela Gazprom para o final de 2004, desconhecem-se
decisões sobre o investimento. Discute-se o projecto desde os anos 90, mas a decisão de
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
avançar só foi tomada em NOV02. Com um custo estimado em 5,7 mil milhões USD, teria
uma capacidade entre 19 e 30 mmmc em 2009 e estaria concluído em 2007. A finlandesa
Fortum, a holandesa Gazuni, BP, Shell, as alemãs E.ON, Ruhrgas, VNG e Wintershall e a
TotalFinaElf foram algumas das contactadas ou que já manifestaram interesse em participar.
A Comissão Europeia ajudou o projecto ao conceder-lhe o estatuto de rede transeuropeia em
2000.
Têm-se levantado obstáculos. Um consórcio internacional está a construir o maior gasoduto
submarino, o Langeledd, com 1.200 quilómetros, a partir da Noruega, que fornecerá 20 a
25 mmmc/a ao Reino Unido. O CEO de um dos grupos mais falados para parceiro do
projecto, a Ruhrgas, Burckhard Bergmann, declarou à Itar-TASS (11MAI04) que the project
was caused by political reasons to a large extent, and it was necessary to thoroughly analyze
its economic expediency – whether West and North Europe, primarly the United Kingdom,
are capable of consuming additional amounts of natural gas from Russia in the future. Os
analistas do United Financial Group acreditam mesmo que o gasoduto, a avançar, não será
encomendado antes de 2010.
As boas notícias para a Gazprom são o convite do porto de Roterdão, de OUT04, para
participar na construção de um terminal de importação de GNL, com capacidade de
6 mmmc/a, e a possibilidade de chegar ao mercado britânico, em partilha, através do
gasoduto que, a partir da Bélgica, o une ao continente europeu.
A AIE tem expressado a sua preocupação com a crescente dependência europeia do petróleo
e GN da Federação Russa. O seu economista-chefe, Fatih Birol, aconselha mesmo o recurso à
energia nuclear como forma de atalhar esta dependência (Neftegaz.RU 17JUN04). O domínio
da Iukos pelo Kremlin só agrava a tendência uma vez que estenderá ao petróleo a influência
existente no GN. A parceria estratégica com a UE, assinada em OUT00, prevê o aumento das
exportações de GN de 136 mmmc para 200 mmmc em 2008.
4. FEDERAÇÃO RUSSA, ARÁBIA SAUDITA, OPEP – E EUA
A visita do príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Abdallah Ben Abdel Aziz, a Moscovo, entre 02
e 04SET03, provocou alguma surpresa. Era a primeira visita de um tão alto responsável
saudita desde o estabelecimento de relações diplomáticas em 1926. Desde então, os dois
Estados têm oscilado entre a ignorância e a hostilidade (os sauditas financiaram a resistência
afegã à invasão soviética e fomentaram uma guerra de preços no petróleo que terá
contribuído para a implosão da URSS, além de serem acusados de apoio ideológico e
financeiro à guerrilha chechena; os russos comportam-se no mercado do petróleo de forma
independente, ignorando as mais das vezes os pedidos de concertação feitos pelos membros
da OPEP). As relações económicas bilaterais situaram-se em média nos 130 milhões USD
anuais na década anterior à visita. Para mais, os produtores russos, designadamente Lukoil e
Iukos, não faziam segredo do seu desejo de disputar o mercado norte-americano e
conquistar uma quota de 10%.
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Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
Os resultados da visita foram lidos à luz do potencial de entendimento dos dois maiores
produtores e exportadores de petróleo, até então de costas voltadas ou em conflito. Os
principais foram, além da inclusão no texto final da intenção de estabilizar o preço do
petróleo, a entrada da Lukoil na prospecção e exploração de GN na Arábia, a produção de
helicópteros russos no reino, o reconhecimento da autoridade russa sobre a Chechénia, com
o presidente desta, Akhmad Kadirov, que seria morto pelos independentistas, a deslocar-se a
Riade em JAN04, e a defesa de um papel maior da ONU no Iraque. Dada a ignorância e
hostilidade tradicionais, a visita terá a ver com as mudanças subsequentes aos atentados de
11SET01, em que a maioria dos piratas-do-ar era saudita, que arrefeceram as relações
saudito-norte-americanas.
Os sauditas foram os principais interessados na iniciativa, receosos de entrar na lista norteamericana de regimes a substituir e, eventualmente, países com fronteiras a redefinir. Um
dos pontos da declaração conjunta foi a defesa da manutenção da independência, soberania
e integridade territorial do Iraque. Na altura especulou-se com a possibilidade de Riade
investir no complexo industrial-militar russo parte dos fundos aplicados no estrangeiro,
estimados entre 600 e 800 mil milhões USD, em especial uma tranche dos 200 mil milhões
USD investidos nos EUA, de onde pretenderia desinvestir. A Federação Russa teve, por sua
vez, a oportunidade de se aproximar do mundo muçulmano (1/7 da sua população de
145 milhões é muçulmana), recolhendo apoios para entrar na Organização da Conferência
Islâmica, e legitimar-se na Chechénia. A visita fora precedida por uma deslocação de Yuri
Shafranik, a Riade, em DEZ02, que levou à criação de um Clube de Negócios Russo-Saudita,
e uma outra do príncipe Turki al-Faisal, a Moscovo, que quase coincidiu com o raide
checheno ao teatro moscovita em OUT02.
Mais de um ano depois, os sauditas ouviram Putin declarar, em 19NOV04, no Chile, durante
o Fórum da Cooperação Económica Ásia-Pacífico (APEC), que a Rússia definiria os seus níveis
de exportação sem qualquer influência da OPEP. Não somos membros da OPEP. A nossa
política energética é independente, sublinhou o presidente russo. Esta reafirmação de
divergências de políticas petrolíferas, apesar da cimeira de SET03, é atribuida a uma política
voluntária de aumentar a produção, independentemente dos preços: They sold whatever
they had at whatever the price was because they needed the money, sintetiza Ebel (Ebel e
outros 2004).
Porém, ao contrário dos tempos soviéticos, um conjunto de factores ameniza o que seria o
efeito negativo do excesso de oferta, em particular a baixa de preços. No conjunto destacase um choque do lado da procura – aparecimento da China como grande importador;
dependência crescente do maior consumidor (EUA) das importações – e a instabilidade
geopolítica, com esta a representar um prémio estimado em 25% do preço do barril. De
resto, o contexto de mercado é favorável. Para comparação, registe-se que o break-even do
Ural está nos 15-16 USD, que Iukos e Sibneft convivem bem com o barril nos 9, Lukoil,
Rosneft e TNK nos 12, Surgutneftgaz nos 13,5 e Tatneft nos 16. A maioria das pequenas
companhias começam a perder dinheiro com o barril abaixo dos 20 USD. O custo de
extracção do barril na Arábia Saudita ronda os 2 USD... (Frolov 2003).
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Com o aumento de importância da fileira energia, em especial petróleo, no PIB – e no
orçamento estatal – a Federação Russa não tem interesse em guerras de preços. Por outro
lado, esta guerra reproduziria o dilema dos membros da OPEP cujas reservas têm um fim à
vista (Argélia 16,7 anos; Omão 18,5) – produzir o máximo com os preços elevados, mesmo
ultrapassando a quota determinada. A Federação Russa pode repetir a produção de 2003
mais 22,2 anos (BP 2004). Isto significa que, em relação a 2003, as reservas provadas
suportam uma produção durante aquele período, o que compara com 73,3 anos da Arábia.
Abreviando: a importância da OPEP só pode aumentar, o que será particularmente evidente,
mantendo-se as actuais condições, dentro de duas décadas.
Mais generalista, Maugeri (2003) alerta para os efeitos negativos – para o Ocidente – de
uma guerra de preços relacionada com o Iraque que Morse e Richard (2002) estudaram para
a Federação Russa. Enquanto estes previam que a Arábia só conseguiria bloquear o
desenvolvimento petrolífero da ex-URSS com o barril a 10 USD durante um mínimo de dois
anos, aquele avisa que blind western policies podem ter o mesmo efeito que um radical
fundamentalist regime. Se na reconstrução do Iraque se jogar a carta anti-OPEP, uma guerra
de produção e preços devastaria a Arábia – mas também reduziria a produção russa e norteamericana, degradaria as perspectivas da Bacia do Cáspio, suspenderia desenvolvimentos na
exploração e tecnologia e ameaçaria investimentos realizados pelas companhias petrolíferas.
In short, within five to seven years, the world would be far more dependent on the Persian
Gulf than it is today with no immediate way out – an outcome that would seem like a real
victory for a radical regime. But today the very same outcome could also be caused by blind
Western policies designed to undermine OPEC and introduce competition among its
members.
O problema subjacente à preferência dos EUA por um ou outro fornecedor, é que, ainda
segundo Maugeri, many Western observers speak about oil security when that what they
have in mind is stable and cheap oil supplies. Acontece que cheap oil has always been and
remains a curse for industrializes countries and is the most elusive enemy of oil security. It
constricts the development of expensive energy alternatives and new oil regions. It
discourages conservation and perpetuates lax Western consumption habits. Finally, it
increases dependence on the Persian Gulf countries with the lowest production costs. Cheap
oil is harmful to the production countries as well (p. 171). Assim, os governos ocidentais
deveriam explicar aos eleitores que oil is prone to price volatility e desiludi-los quanto a
'bonanza' oil expectations and promote more careful consumption habits and investment in
new energy technology (p. 173). Deveriam ainda vencer a sua misguided obsession with oil
security so that they can begin to cope more impartially with the Middle East's problems
(p. 174).
Noel (2003) relativiza, por outro lado, a origem geográfica do petróleo e eventuais ameaças
derivadas. A lógica é a de que on peut dire que le marché pétrolier n'est plus, aujourd'hui
qu'un immense marché spot (...) (p. 1) one great pool (p. 2). Significa isto que as crises
petrolíferas manifestam-se pela alta dos preços. Se há pouco petróleo os preços sobem, os
consumidores retraem-se, os produtores expandem-se e um novo reequilíbrio se processa. O
embargo não é ameaça credível. Desta forma, la véritable 'dépendance' est donc celle de
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Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
l'economie à l'égard du pétrole, plus exactament du marché pétrolier mondial (p. 3). Mas
avisa que en revanche, le degré de concentration de l'offre pétrolière mondiale est une
variable important de la sécurité énergétique. Por exemplo, o aumento da produção russa é
bom para a segurança petrolífera, mas os EUA não têm de a comprar. Pode é esta ligação
comercial ser do interesse russo, o que é diferente. No mesmo sentido, Victor e Victor
(2003) defendem que most public discussion of oil policy is based on the fiction that the
identity of particular barrels is relevant.
Quando o que sobressai é a dependência da economia face ao petróleo, mais do que a
origem deste, é outra discussão que se abre. Wirth (ex-senador), Gray (ex-conselheiro do
ex-presidente Bush-pai) e Podesta (ex-chefe do staff do ex-presidente Clinton) (2003),
entendem que U.S. dependence on oil leaves the country's economic, security, and
environmental destiny to forces beyond America's control e que reducing this exposure –
especially in the transportation sector, which is 95 percent dependent on petroleum – must
be a primary goal of national energy policy (pp: 133-134). Entendem assim que a
diversification of U.S. oil imports is not an adequate answer. Propõem o que consideram a
truly visionary new course: a redução do consumo de petróleo e das emissões de dióxido de
carbono em um terço nos próximos 25 anos e aposta na bioenergia para que o etanol
represente 30% do combustível consumido, o que até favoreceria o desenvolvimento da
agricultura do Terceiro Mundo.
5. CONCLUSÃO
O Estado da Federação Russa, sob a direcção dos siloviki, está a recuperar o controlo das
principais alavancas da vida política e económica, após uma transição para a economia de
mercado que se traduziu no que, por exemplo, Roche (1999) designou como Le Hold-Up du
Siècle. Os anti-corpos criados no processo explicam em muito o que se passa em quase
todas as esferas da vida colectiva russa. Estilizando, e correndo os riscos associados às
simplificações, pode dizer-se que a democratização é responsabilizada pela desagregação do
Estado, a economia de mercado por desemprego e miséria, a ocidentalização pela
desestruturação, os judeus pelo saque do Estado, os EUA acusados pela debilitação da
Federação Russa, a quem querem cercar, roubar-lhe as riquezas e aniquilar. A salvação é
vista como estando no conjunto Estado, Pátria, Tradição, Centralização, Defesa. Para usar as
referências de Putin: Consolidação, Vertical do Poder, Ditadura da Lei – tudo baseado no
complexo militar-industrial.
Com este background, aquela recuperação decorre em termos pouco consentâneos com
legalidades formais, como direitos de propriedade. O essencial é reafirmar a vontade, a
autoridade, do Estado. Isto tanto afecta os oligarcas, como as empresas estrangeiras que
marginalizem o Estado nos seus negócios. A Administração Putin parece estar mais
preocupada com a sua agenda interna, dominada por uma lógica de recuperação,
restauração, reformulação, relegitimação, que com os efeitos externos das suas acções.
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Se o choque da procura energética, por um lado, e os novos mercados asiáticos, por outro,
lhe garantirão receitas substanciais no próximo futuro, surgem em contrapartida outras
interrogações. Quando e se conseguir aumentar os seus fornecimentos aos EUA, à UE, à
China, ao Japão e à Coreia do Sul, qual será o uso dado pela Federação Russa à posição
vantajosa que resulta de alimentar energeticamente estes clientes? No cenário benigno,
conseguirá melhorar o seu estatuto internacional? Ou, como qualquer Estado mono-produtor
rentista, debater-se-á com uma situação interna em descalabro, sacrificada a prioridades de
segurança? A provável transição do petróleo para o GN reforçar-lhe-á a força negocial no
médio prazo, a manterem-se as condições técnicas e económicas actuais? Em que se
traduzirá a substituição do grupo dirigente na Federação Russa, com os novos titulares a
sucederem a czares, PCUS e oligarcas?
NOTAS
(1) Um preço de transferência é um preço estabelecido entre entidades com relações especiais entre si,
em que uma influencia a gestão da outra, por força de domínio accionista ou dependência económica.
Esta inflência pode determinar a existência de preços diferentes dos que existiriam se estas entidades se
relacionassem de forma independente, em que seriam preços de mercado. A transferência de lucros,
para reduzir o imposto a pagar, a designada optimização fiscal, é um dos principais objectivos do grupo
económico ou multinacional e um dos principais focos de conflito com as autoridades fiscais. Em causa
estão operações comerciais – produção e vendas; serviços, como informática ou gestão; transferência
de intangíveis, como patentes e marcas, e tangíveis – e financeiras, como empréstimos. A transferência
a preços do produtor (basic prices) de produtos de uma unidade industrial para uma unidade comercial,
que os vende ao cliente final com lucro, resulta na concentração do lucro nesta. O segredo está na
localização da sede desta em uma unidade geográfico-administrativa, no caso da Federação Russa, com
um nível fiscal inferior, ou benefícios fiscais superiores, no contexto legal existente. Privação da região
produtora de receitas devidas pela exploração dos seus recursos, redução das receitas fiscais [estimada
em 2% do PIB, no caso da Federação Russa] e transferência do VAB do sector industrial para o
comercial são algumas consequências.
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Departamento de Prospectiva e Planeamento
A Federação Russa: Desenvolvimentos Recentes no Sector Energético
(2) O peak oil designa o momento em que se atinge uma extracção histórica equivalente a metade das
reservas e a partir do qual a produção começa a baixar. Para uma introdução ao tema ver site da
Association for the Study of Peak Oil (ASPO): www.peakoil.net, ou o blog Peak Oil News, em
http:\\peakoil.blogspot.com
(3) O Ministério do Interior da Federação Russa estima em cerca de 50% do PIB a economia informal,
subterrânea ou negra (Kossals e Ryvkina 2003). Convirá notar que a queda e recuperação é difícil de
determinar na sua exacta medida. Krueger (2004) cita o antigo presidente do banco central polaco,
Leszek Balcerowicz, que sobre os PECO e a Rússia considera que that are good reasons to suppose pretransition output had been overstated, em resultado do que output decline in the early years of
transition was overstated.
(4) Já houve sugestões de o Ural substituir o Brent, do Mar do Norte, como benchmark, dado
representar 9,5% da produção mundial, com 7,7 milhões b/d, enquanto o Brent vale apenas 0,5%, com
400 mil b/d.
(5) Enquanto Weafer (2004) quantifica – Today, and every day this year, Russia will earn approximately
$300 million from the export of oil and gas. Six years ago that daily average was only about $70 million
–, Yuri Shafranik (Vários 2003: 46), presidente da Soiuzneftegaz e da União dos Industriais Russos do
Gás e Petróleo, reconhece: It seems that for the last three years God's hand has been on us. These
three years have seen the highest oil prices since 1980. (...) We have never seen high oil prices hold for
so long. (...) The Soviet Union could never even dream of such high prices.
(6) No início do seu discurso Putin remetera para o conceito consolidação a base da resposta às ameaças
à Federação Russa – We are faced with serious threats. Our economic foundation, although it has
become appreciably stronger, is still shaky and very weak. The political system is not developed enough.
The state apparatus is inefficient and most sectors of the economy are uncompetitive. Meanwhile, the
population continues to shrink. Poverty is receding very slowly. The international situation remains
complicated. Competition in the world economy is not decreasing.
We see around us countries with highly developed economies. Let us face it: They are crowding Russia
out of promising world markets wherever they can while their apparent economic advantages give cause
for growth of geopolitical ambitions.
Nuclear weapons continue to spread in the world. Terrorism is threatening peace and the security of out
citizens. Strong and well-armed national militaries are sometimes used not to fight this evil but to
expand certain countries' zones of strategic influence.
Is Russia in a position to seriously counter these threats if our society is divided into small groups, if we
are concerned only about our own narrow-minded group interests, if parasitic sentiments grow, not
recede, while these sentiments are sustainded by bureaucracy's complacent attitude toward the fact that
the national wealth is not husbanded and accumulated but often mismanaged and wasted away?
I am convinced that without consolidation, at least around basic national values and objectives,
(destaque nosso) it will impossible to counter these threats (Putin 2003: 2).
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Informação Internacional, Vol. II, 2004
Derivaria daqui o que alguns observadores da situação russa designam por democracia gerida a partir do
Kremlin, que teve no processo eleitoral e no resultado das eleições legislativas para a Duma, de
07DEZ93, uma expressão privilegiada, com vários partidos da oposição a requerem, em 27SET04, ao
Supremo Tribunal a sua anulação. A Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE)
considerou o escrutínio profundamente falseado, uma farsa vergonhosa e uma regressão no processo de
democratização. Outros acusaram o Kremlin de fabricar partidos, além do próprio [o Russia Unida,
dirigido por Boris Gryzlov, actual presidente da Duma, ex-ministro do Interior], como o Rodina para
laminar o Comunista, e de ter ajudado à exclusão da Duma dos liberais do Iabloko e do SPS. Já em
2002, Vernet descrevera o regime de Putin como uma democratically legitimised autocracy.
Mais recentemente (SET04) no rescaldo de uma série de acções de terror ligadas ao conflito da
Chechénia dirigidas contra interesses russos (explosões no metropolitano moscovita, derrube de dois
aviões comerciais, ocupação de uma escola em Beslan, na Ossétia do Norte, que se saldou por centenas
de mortos, além do assassinato do próprio presidente checheno), Putin decidiu reforçar a centralização
política. As principais medidas foram a mudança do sistema eleitoral, com o fim das eleições directas e a
consagração do escrutínio proporcional como única forma de eleição, a substituição da eleição dos
governadores regionais pela nomeação presidencial e um maior controlo sobre os juízes, além do
estímulo à criação de grupos de cidadãos voluntários no quadro de "comités contra o terror".
Esta centralização política motivou alusões a um golpe de Estado constitucional e a uma variante russa
de fascismo por parte de ONG como Memorial ou Grupo Helsínquia e personalidades como Elena Bonner.
No Ocidente, King (2004) fala em putsch e o Courrier International titula a manchete da sua edição de
23SET04 com Poutine – aprés Beslan, le temps de la dictature.
Esta gestão da democracia pelo Kremlin conheceu um novo episódio em OUT04, quando foi atribuída à
Administração Presidencial o projecto de criar (mais) um partido pró-Kremlin. De cariz liberal, arumado
à direita, contrabalançaria o esquerdista Rodina e o centrista Rússia Unida. Entre as principais figuras
estariam os ministros Gref e Kudrin, além de Stepashin.
(7) Le chef de l’administration présidentielle, Dmitri Medvedev, siège ainsi au sein de la direction du
groupe gazier Gazprom (..). Tout en conservant lui aussi sa position de numéro deux dans
l’administration présidentielle, Vladislav Sourkov, a pris la tête, début septembre, de la société
Transneftprodukt, qui contrôle un tiers des transports de produits pétroliers dans le pays. Un autre
membre de l’administration du Kremlin, Viktor Ivanov, dirige le groupe militaro-industriel lmaz-Antei,
ainsi que la compagnie aérienne nationale, Aeroflot. Le conselleir de M. Poutine pour les relations
internationales, Serguei Prikhodko, a été chargé de superviser un fabricant de missiles. Igor Chouvalov,
nommé au Kermlin par le président, siège désormais au conseil d’administration du monopole des
chemins de fer, qui est par ailleurs présidé par le vice-premier ministre, Alexandre Joukov, autre homme
de confiance du président (Nougayrède 2004).
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O texto incorpora ainda informação obtida junto da imprensa internacional, designadamente
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