Análise crítica de corredores de ônibus sob o ponto de vista ambiental

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Análise crítica de corredores de ônibus sob o ponto de vista ambiental
Revista dos Transportes Públicos - ANTP - Ano 30 - 2007 - 4º trimestre
QUALIDADE AMBIENTAL
Análise crítica de corredores
de ônibus sob o ponto de
vista ambiental
AN P
PROBLEMAS AMBIENTAIS DO TRANSPORTE URBANO
As emissões causadas por veículos automotores são a fonte predominante de poluentes em centros urbanos. Segundo a World Health Organization, as emissões de veículos são responsáveis por 95% de CO e 70% de
NOx. Na atmosfera, os componentes orgânicos voláteis das emissões são
combinados formando o ozônio ao nível do solo, que é conhecido como
o smog fotoquímico e é associado às doenças pulmonares e à neblina de
poluição marrom que permeia muitas cidades (Schipper, 2001).
Renata Almeida Motta
E-mail: [email protected]
Suzana Kahn Ribeiro
E-mail: [email protected]
Licínio da Silva Portugal
E-mail: [email protected]
Centro de Tecnologia
Programa de Engenharia de Transportes da Universidade
Federal do Rio de Janeiro - PET/Coppe/UFRJ
As cidades do mundo, particularmente as de maior porte, têm enfrentado problemas de crescente urbanização e motorização, congestionamentos e problemas de saúde gerados por altos índices de poluentes.
Os problemas de congestionamento não podem ser resolvidos pela
construção de novas rodovias, pois elas encorajam mais carros a
transitar, além de minar o transporte público que, diferentemente,
deveria ser fortalecido e modernizado.
Muitos países, entre os quais o Brasil, a Colômbia, o México, os Estados Unidos, o Japão e a França, implantaram sistemas baseados em
corredores exclusivos de ônibus e muitos outros estão planejando a
implantação. Cidades de médio e grande porte vêm se estruturando
através desses sistemas, buscando reduzir emissões de gases do
efeito estufa e de poluentes locais, além de proporcionar melhorias na
mobilidade urbana.
Para possibilitar uma análise crítica dos sistemas de corredores exclusivos de ônibus em diversas cidades ao redor do mundo, de modo a
identificar seus principais benefícios e restrições, principalmente de
natureza ambiental, foram coletadas informações nas principais fontes bibliográficas disponíveis.
Este artigo realiza a identificação dos impactos ambientais gerados
por corredores de ônibus como o Trasmilênio, o Metrobus e o Adelaide O-Bahn B-Lines e faz, sem pretensão de esgotar o assunto, uma
mensuração dos principais benefícios ambientais decorrentes da
implantação desses corredores. O estudo se justifica pela carência de
informações ambientais nos corredores de ônibus, necessárias para
recomendar ou não a implantação desses corredores.
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Essas emissões também causam impactos na saúde, incluindo doenças respiratórias, cardiovasculares e câncer, além de impactos econômicos como produtividade reduzida. Junto a isto, a poluição do ar causada pela combustão de combustíveis fósseis causa também a chuva
ácida através do dióxido de enxofre e dos óxidos nítricos, gerando
impactos no meio ambiente, como destruição de árvores e vegetações,
corrosão de materiais usados nas construções, destruição de represas
e turbinas hidrelétricas, entre outros prejuízos para o meio ambiente.
Com relação ao efeito estufa, nas emissões provenientes de veículos
motorizados predomina o dióxido de carbono (CO2), o principal gás do
efeito estufa, mas também incluem o metano (CH4) e o óxido nitroso
(N2O). É conveniente ressaltar que os automóveis produzem três vezes
mais CO2 por passageiro do que o transporte público (UITP, 2006).
A International Energy Agency (IEA, 2002) declara que o setor de transportes é o que tem aumentado as emissões do efeito estufa com mais
rapidez, atingindo uma taxa anual de crescimento mundial de 2,1% e
nos países em desenvolvimento de 3,5%. De acordo com o Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC, 2007) este aumento, entre
1970 e 2004 no setor de transportes, foi de 120%. Atualmente o setor
de transportes responde mundialmente por 23% das emissões de CO2.
Além disso, o setor de transportes provoca impactos de poluição
sonora devido ao tráfego que pode ser considerado a maior causa de
ruído das grandes cidades. Produz, também, impacto de poluição
visual devido à presença de veículos parados ou em movimento e pela
própria infra-estrutura física do setor que afeta a qualidade visual de
diversas áreas. Sobretudo, causa impactos sobre o valor e uso do
solo, fruto de mudanças no nível do serviço e no custo de transporte.
O transporte por ônibus gera uma grande variedade de lixos sólidos e
líquidos, como óleos lubrificantes, solventes industriais, óleos não
aproveitáveis e pneus usados que devem ser reciclados ou dispostos
de alguma maneira aprovada pelas leis municipais. Líquidos não aproveitáveis que não são adequadamente tratados podem por em perigo
o abastecimento de água, sendo perigosos para os moradores que
vivem perto de depósitos de transporte e oficinas mecânicas.
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Análise crítica de corredores de ônibus sob o ponto de vista ambiental
Quanto à poluição e energia geradas pelos diferentes tipos de veículos, segundo a ANTP, as motocicletas poluem 32 vezes mais e gastam
cinco vezes mais energia por passageiro do que os ônibus. Os automóveis poluem 17 vezes mais e gastam 13 vezes mais energia do que
os ônibus. O transporte coletivo apresenta menor consumo de combustível, energia e espaço viário por passageiro, assim como taxas
muito menores de emissão de poluentes do que as do transporte privado (NTU e Sedu, 2002).
A Confederação Nacional dos Transportes afirma que os automóveis
privados ocupam 60% das vias públicas, apesar de transportarem
apenas 20% dos passageiros nos deslocamentos motorizados,
enquanto os ônibus, que transportam 70% dos passageiros, ocupam
25% do espaço viário (Lacerda, 2006).
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Ultimamente, tem-se utilizado mundialmente para este sistema de
transporte de alta capacidade o termo bus rapid transit (BRT) que se
apresenta sob as seguintes situações típicas: faixa exclusiva para ônibus (junto à calçada, junto ao canteiro central ou no contrafluxo),
canaleta para ônibus ou via exclusiva para ônibus.
As figuras 1 e 2 respectivamente ilustram sistemas de BRT como o
Trasmilênio em Bogotá e em São Paulo.
Figura 1
Bogotá (ITDP, 2007)
Figura 2
São Paulo (Wright, 2003)
Para agravar a situação da poluição gerada pelos veículos automotores, a IEA estima que em 2050 serão 2,6 bilhões de veículos particulares no mundo, em lugar dos 982 milhões atualmente existentes (Fulton e Wright, 2005). Na China e na Índia, a taxa de crescimento de
automóveis e veículos de duas rodas tem sido maior que 10% ao ano
(Schipper, 2001).
No Brasil, as demandas por transporte coletivo vêm caindo nos últimos
anos devido à expansão da mobilidade fortemente apoiada no transporte individual, sobretudo nos automóveis e motocicletas. Estima-se
que a queda no uso do transporte público nas duas últimas décadas
situa-se, nas grandes cidades brasileiras, entre 20 e 30%, gerando
impactos ambientais e aumento no consumo de energia. Calcula-se
uma perda total no transporte público no período de 1992 a 2003 de
16,6 bilhões de passageiros, representando uma perda por dia útil de
cerca de 4,6 milhões de passageiros (ANTP e BNDES, 2006).
Diante da situação e considerando as vantagens do transporte coletivo em relação ao particular no tocante ao consumo de combustível,
taxa de emissão de poluentes e espaço viário por passageiro transportado, investimentos no transporte público são plenamente justificáveis para a melhoria ambiental, incluindo a implantação de corredores exclusivos de ônibus.
CARACTERIZAÇÃO DOS CORREDORES DE ÔNIBUS
De acordo com a ANTP, o processo de segregação do tráfego, utilizado
no Brasil sob diferentes denominações (“faixas exclusivas”, “canaletas”,
“corredores”, dentre outras), voltado à priorização do transporte coletivo, envolve ações de engenharia de tráfego que possibilitam que os
ônibus circulem com maior fluidez, livres de congestionamentos e da
disputa pelo espaço viário com o tráfego geral (Lopes et al, 2001).
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O BRT é também um condicionante do desenvolvimento urbano,
podendo promover a reconstrução das principais avenidas que
fazem parte da integração da cidade. Possui paradas e estações
atrativas aos usuários, oferece maior velocidade, embarque e desembarque rápidos, permite em alguns sistemas o pagamento antecipado das tarifas, alta freqüência do serviço, conforto, acessibilidade
para usuários com necessidades especiais e tecnologia veicular com
maior capacidade.
Faixas exclusivas para ônibus implicam em vantagens em termos de
velocidade sobre os demais modos de tráfego. De acordo com a IEA
(2002), um ônibus convencional apresenta uma velocidade média de
quinze quilômetros por hora comparados com vinte e cinco quilômetros por hora do BRT.
Já a USA General Accounting Office, citada por Hensher (2007), afirma que o BRT pode carregar o mesmo número de pessoas que um
sistema de transporte leve sobre trilhos por um custo de quatro a 20
vezes menor. Declara também que em seis cidades dos Estados Unidos o custo de investimento por milha do sistema de transporte leve
sobre trilhos comparado com o BRT foi 260% maior.
Muitas vezes, o sistema de BRT combina a tecnologia de sistemas inteligentes de transporte (ITS), veículos limpos e silenciosos e integração
com outros modais. Possibilita também, no curto prazo, benefícios para
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as cidades do mundo inteiro, sendo apontado por Leal e Bertini (2003)
como uma alternativa eficaz para países em desenvolvimento.
Por sua vez, a tecnologia global positioning system (GPS) pode ser utilizada por um sistema de BRT para rastrear a posição do ônibus e recolocar essa informação para os viajantes em tempo real. Um sistema de
sinalização semafórica avançado pode ser utilizado permitindo aos ônibus uma fase luminosa verde mais cedo ou mais longa nas interseções.
Observa-se que o BRT combina os benefícios do transporte leve
sobre trilhos com a flexibilidade e eficiência do sistema de ônibus,
sendo mais adaptável a mudanças nos padrões de viagens do que
outros modais. Por conta disso, os sistemas de BRT são flexíveis,
podendo ser construídos por etapas e modificados, enquanto que sistemas sobre trilhos são inflexíveis. No entanto, o BRT tem como desvantagem o espaço ocupado na via, diferentemente do metrô (em
túnel) que não gera impactos nas vias existentes e aumenta a capacidade de transporte da rede muito acima do que o sistema de BRT.
Busca-se, com a segregação do tráfego decorrente do BRT, fornecer
benefícios significativos aos usuários que escolhem viajar de ônibus.
De acordo com Lopes et al (2001), o principal deles é a redução do
tempo de viagem, resultante do aumento da velocidade média de percurso. Outra grande vantagem operacional do sistema é a redução da
variabilidade do tempo de viagem. Assim sendo, diminui-se o nível de
estresse e de preocupação dos passageiros com horários e com o
congestionamento gerado pelo tráfego misto de veículos.
CORREDORES DE ÔNIBUS NO BRASIL E NO MUNDO
No ano de 1974, Curitiba obteve grande sucesso com experiências de
BRT em operações de ônibus direcionadas para o transporte massivo
(Menckhoff, 2005). Posteriormente, Bogotá (Colômbia) e Quito (Equador) replicaram tal sistema de transporte copiando várias características de Curitiba e adaptando-as para suas próprias características. Os
benefícios gerados e os impactos ambientais positivos foram significativos e desde então esse sistema de transporte de alta capacidade
continua sendo implantado em muitos países.
Rabinovitch e Hoehn afirmam que o sistema de BRT ajudou Curitiba a
obter um ganho de 2,3% na taxa média anual do número de passageiros que utiliza o transporte público (Fulton e Wright, 2005). Karekezi et al (2003) declaram que em Curitiba as vias de ônibus exclusivas
permitem que os ônibus mantenham uma velocidade média de 30
quilômetros por hora. Estima-se que 70% das viagens por dia são feitas através do transporte público que utiliza, desde 1992, ônibus
biarticulados com capacidade para 270 pessoas.
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Além disso, o planejamento do sistema de transporte público de Curitiba tem como uma de suas prioridades o atendimento aos portadores de necessidades especiais. As estações-tubos, distribuídas entre
as linhas expressas do sistema, contêm rampas e/ou mini-elevadores
para portadores de necessidades especiais.
Além do Brasil, encontram-se em operação sistemas de BRT nos
seguintes países: Equador, Colômbia, México, Porto Rico, Chile, França, Alemanha, Irlanda, Grã Bretanha, Japão, Taiwan, China, Indonésia,
Nova Zelândia, Austrália, Estados Unidos. Diversos países que ainda
não possuem sistemas operantes de BRT os estão desenvolvendo:
Guatemala, Panamá, El Salvador, Índia, Tanzânia, Nigéria, Senegal,
entre outros (Embarq, 2006; UITP, 2006).
Mais de 70 sistemas de BRT estão operando ou estão sendo construídos, melhorando a mobilidade urbana em 23 países. O Banco Mundial reconheceu o BRT como a melhor prática sustentável no setor de
transportes e reservou US$ 750 milhões especificamente para esses
projetos na América Latina (Embarq, 2006).
Em 2000, o sistema de BRT Transmilênio de Bogotá iniciou seu funcionamento com 14 quilômetros de linhas construídas. Em 2002, já
eram 41 quilômetros de corredores e 800 mil passageiros por dia. Em
2006 o sistema já possuía 84 quilômetros e suportava 1,3 milhão de
passageiros por dia (NBRTI, 2006; O Globo, 2007). Atualmente o
Transmilênio transporta mais de 80 mil passageiros por hora. Os veículos desse sistema vão do início ao final da cidade em menos de
uma hora, metade do tempo que os ônibus convencionais costumavam gastar (Embarq, 2006).
Segundo o NBRTI (2006), o Transmilênio ajudou a aumentar a participação do transporte coletivo de 64% em 1999 para 70% em 2005.
Por meio de pesquisas, 9% dos passageiros declararam que antes do
Transmilênio eles faziam a mesma viagem com seus carros particulares. Obteve também um impacto positivo na qualidade do ar nas vizinhanças da avenida Caracas, reduzindo a poluição local. O sistema
propiciou em Bogotá uma redução de 43% em dióxido de enxofre,
18% em dióxido de nitrogênio e 12% em material particulado. Além
disso, as reduções nos conflitos de trânsito de veículos reduziram o
número de colisões nos corredores em 79%, reduzindo radicalmente
o número de feridos e mortos. O número de roubos pelos corredores
também foi reduzido.
No México, a qualidade de vida dos habitantes também melhorou
muito com o sistema de BRT denominado Metrobus, isso após situações críticas como os 225 dias em que os níveis aceitáveis de alguns
poluentes foram excedidos. Uma redução de 33% no tempo de via48
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gem de seus usuários foi proporcionada. Diante disso, estima-se que
17 milhões de horas foram economizadas, melhorando a qualidade de
vida dos moradores.
Já nos Estados Unidos, a difusão do BRT está vinculada ao programa
nacional para a redução de congestionamentos. Já são 12 cidades
norte-americanas que operam e outras 100 que planejam sistemas de
ônibus rápidos (O Globo, 2007).
Com relação a outros sistemas de BRT, em Pittsburgh houve uma
redução de 50% no tempo de viagem e a demanda aumentou de 80 a
100%. Em Los Angeles houve uma redução de 25% no tempo de viagem e a demanda aumentou de 27 a 41%. Em Miami a demanda
aumentou 70%. Em Honolulu houve uma redução de 25 a 45% no
tempo de viagem. Adicionalmente, em Chicago houve uma redução de
25% no tempo de viagem e a demanda aumentou 17% (UITP, 2006).
As figuras 3 e 4 mostram respectivamente corredores exclusivos de
ônibus em Brisbane na Austrália e em Seoul na Coréia da Sul.
Figura 3
Brisbane Southeast Busway (Vincent, 2007)
Figura 4
Seoul (Vincent, 2007)
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Mudança do Clima (UNFCCC) e, em dezembro de 2006, o Transmilênio foi
registrado como o primeiro projeto de transportes aprovado de mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL). Baseada na metodologia do MDL
aprovado, calcula-se uma redução de emissões num total de 3,8 milhões
de toneladas de CO2 equivalentes para o período de 2001 até 2012.
A tabela 1 mostra estimativas de redução anual de emissões de gases
do efeito estufa pelo Transmilênio dos anos de 2006 a 2012. A redução média anual prevista é de 246 mil toneladas de CO2 equivalentes.
Tabela 1
Projeções para reduções de emissões de gases do efeito estufa do
sistema Transmilênio até 2012
Anos
Estimativa anual de reduções de
emissões em toneladas de CO2 equivalentes
2006
94,567
2007
134,011
2008
230,201
2009
304,432
2010
298,718
2011
336,735
2012
327,276
Média anual
246,563
Fonte: Consultoria Grütter, 2006 (adaptação).
IMPACTOS AMBIENTAIS DOS CORREDORES DE ÔNIBUS
A agência de meio ambiente de Bogotá, conhecida como Dama (Departamento Técnico Administrativo del Medio Ambiente), mantém equipamentos de monitoração da qualidade do ar em 14 localizações diferentes
pela cidade. De acordo com a Dama, foram registradas com o Transmilênio reduções de 318 mil toneladas de CO2, 40% de SO2, 10% de material particulado, em 2001, comparado com 1997 (Karekezi et al, 2003).
Segundo Grütter (2007), em julho de 2006, uma metodologia para projetos
de BRT foi aprovada pela Convenção Quadro das Nações Unidas para
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Em 2005, a Secretaría del Medio Ambiente do México estimou uma
redução anual de 9,709 mil toneladas de monóxido de carbono, 1,18
mil toneladas de hidrocarbonetos, 206 toneladas de óxidos de nitrogênio e 1,27 toneladas de material particulado. Um dos motivos da
redução de poluentes no sistema de BRT Metrobus do México foi a
troca da frota de ônibus de gasolina para diesel. Os ônibus a diesel
emitem aproximadamente quatro vezes menos dióxido de carbono e
gastam cinco vezes menos combustível que os ônibus a gasolina
(Aguilera, 2006). Contabilizou-se também uma redução de dióxido de
carbono de 35 mil toneladas durante o primeiro ano de operação do
Metrobus. Hoje seus passageiros estão expostos a 50% menos
poluentes em comparação com o transporte anterior (Embarq, 2006).
Já em Vancouver, com a implantação do BRT Adelaide O-Bahn BLines, houve uma redução nas emissões de 1,2 mil toneladas por ano
de dióxido de carbono, 0,01 toneladas por ano de material particulado, 5 toneladas por ano de óxidos de nitrogênio, 59 toneladas por ano
de monóxido de carbono e 5 toneladas por ano de hidrocarbonetos
(BRT Policy Center, 2007).
A tabela 2 resume as reduções de toneladas de poluentes em decorrência da implantação e operação dos sistemas de BRT Transmilênio,
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Análise crítica de corredores de ônibus sob o ponto de vista ambiental
Metrobus e Adelaide O-Bahn B-Lines. Embora apresente dados de
apenas três sistemas de BRT, devido à carência de dados ambientais
de outros sistemas, observa-se que eles apresentam um enorme
potencial para reduzir poluentes. Diante dessas estimativas, percebese que o BRT gera muito menos poluição do que os ônibus no tráfego misto, mostrando-se superior no tocante ao meio ambiente.
Tabela 2
Redução de poluentes através da implantação de sistemas de BRT
Sistemas de BRT
Transmilênio
Metrobus
Adelaide O-Bahn B-Lines
CO2
(toneladas/ano)
106 mil
35 mil
1,2 mil
Material particulado
(toneladas/ano)
3,3%
1,27
0,01
A Região Metropolitana de São Paulo conta com um Plano Integrado de
Transportes Urbanos para 2020, o Pitu, que tem como objetivo estabelecer uma rede de transporte público buscando integrar diferentes modais
nos terminais e construir novos caminhos inovadores. De acordo com o
Pitu, se nada for feito, a concentração de monóxido de carbono no centro da cidade de São Paulo poderá aumentar em 32% até 2020. Os resultados projetados pelo Pitu com implantações de corredores de ônibus,
entre outras medidas, são a redução no tempo perdido pelos usuários do
transporte público nos horários de pico de 1,9 milhão de horas por ano,
melhoria na qualidade do ar, redução de 8% no consumo de combustíveis, 35% de redução nos acidentes de trânsito, redução de 40% nas
emissões de poluentes e redução da poluição sonora (STM, 2000).
Em Porto Alegre, estima-se uma redução de 70% das emissões de
dióxido de enxofre com a adoção de um diesel com 75% menos de
enxofre na frota de ônibus urbano.
Já o sistema de BRT El Trole de Quito não produz emissão de poluentes locais nem de gases do efeito estufa, pois sua energia é gerada
por hidrelétricas.
Segundo a SPTrans, citada por Motta (2000), o trólebus, apesar de possuir
custo de aquisição maior do que o do ônibus diesel, oferece vantagens em
relação a este último como a melhoria de qualidade do ar na cidade: cada
ônibus diesel lança na atmosfera, por ano, uma tonelada e meia de monóxido de carbono, uma tonelada de óxidos de nitrogênio, meia tonelada de
óxidos de enxofre e duzentos quilos de material particulado.
Cabe salientar, ainda, que um dos impactos comuns dos sistemas de
BRT é a ocorrência de densificação ao redor das estações. Diante
disso, centros comerciais são construídos junto dos corredores, especialmente perto dos terminais e das estações. Rodriguez e Targa
(2004) declaram que o valor das propriedades residenciais é valorado
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junto dos corredores do Transmilênio, sendo diretamente proporcionais à proximidade das estações. Assim sendo, a densificação do
comércio, emprego e residências junto dos corredores provoca reduções no número de viagens e na distância média de cada viagem.
Por outro lado, impactos negativos ocorrem com as desapropriações
necessárias para a construção dos corredores, sendo necessário um
programa para o reassentamento de famílias pobres, além de compensação pelos impactos causados nos serviços dos comerciantes locais.
Por fim, torna-se importante lembrar que novas tecnologias com diferentes tipos de sistemas de propulsão e de combustíveis alternativos
podem melhorar o desempenho dos ônibus. Os veículos podem
incorporar inovações, tais como: motores com baixa emissão de
poluentes (diesel com baixo teor de enxofre, híbridos diesel-elétrico,
gás natural veicular), bicombustível, biocombustíveis, entre outras.
Uma estratégia baseada em combustíveis representa uma ótima
oportunidade de benefícios ambientais.
CONCLUSÃO
Sistemas eficientes de transporte coletivo propiciam uma diminuição
do transporte individual, melhorando o tráfego nas cidades e diminuindo os congestionamentos, resultando em menores emissões de
poluentes. Quanto maior o uso do transporte coletivo em detrimento
do individual melhor o aproveitamento da energia e menor a emissão
de gases responsáveis pela poluição local e pelo efeito estufa.
Diversos casos de sucesso de BRT ao redor do mundo foram citados no
artigo, ressaltando-se o grande potencial para reduzir emissões de CO2
além de outros poluentes, gerando impactos positivos na qualidade do
ar. As experiências de sucesso dessas cidades devem ser estudadas e
replicadas para melhorar as condições de transporte de outras cidades.
Foi mostrado também que em diversas cidades as vias exclusivas passaram a constituir eixos estruturadores importantes das cidades, associadas
às políticas de uso e ocupação do solo, contribuindo para o ordenamento
do espaço urbano e para o aumento da qualidade de vida dos moradores.
O sucesso da adoção do BRT tem mostrado que com a segregação do
tráfego as pessoas são estimuladas a viajar de ônibus devido à reduzida
variabilidade do tempo de viagem, diminuindo o nível de estresse e de
preocupação dos passageiros com horários e com congestionamentos.
O presente artigo mostrou uma série de benefícios, principalmente
ambientais, gerados pela implantação dos sistemas de BRT como a
redução do consumo de combustíveis, de acidentes e a melhoria da
qualidade do ar decorrente da diminuição de emissões de poluentes
pelos veículos. Também foram mostrados alguns prejuízos ambien52
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tais, pequenos em relação aos benefícios. Assim sendo, recomendase aos tomadores de decisão e técnicos das cidades de médio e
grande porte a elaboração de estudos para a implantação de sistemas
de BRT. Esses sistemas contribuirão para a redução do aquecimento
global e para a melhoria do meio ambiente nos locais de implantação.
IPCC. Summary for policymakers, fourth assessment report. Climate change 2007: mitigation of climate change. Bangkok, Thailand, 2007. Disponível em:
http://www.ipcc.ch/SPM040507.pdf (Acessado em 16/5/07).
Não foram exploradas neste artigo políticas que vêm surtindo efeito
em alguns países como o pedágio urbano e taxação de gasolina,
medidas essas de alto “custo político”.
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http://web.pdx.edu/~bertini/brt.pdf (Acessado em 16/5/07).
Outra consideração a ser feita e que pode ser explorada em novos trabalhos é a carência de dados consistentes, organizados e detalhados
estimando as reduções de poluentes nos corredores de ônibus. Tal
carência dificulta a comparação dos impactos e a elaboração de estimativas de benefícios ambientais em novos estudos. Essa dificuldade
se deve à inexistência de uma metodologia para a obtenção de um
cenário básico (tendencial) confiável de medição dos poluentes e à difícil monitoração de índices para contabilizar a redução dos mesmos.
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