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ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA REFUGIADOS O conflito sírio e a dissipação do fluxo de refugiados: envolvimento da comunidade internacional, apoios estratégicos e ajuda econômica no acolhimento aos grupos refugiados NOVEMBRO DE 2015 COLÉGIO MILITAR DE BELO HORIZONTE – XV CM MUNDI 1 SUMÁRIO 1. Apresentação da Equipe ................................................................................................3 2. Introdução ......................................................................................................................5 3. Breve histórico do conflito sírio ....................................................................................6 4. O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados...........................................7 5. Exposição da problemática ..........................................................................................10 6. Conclusão ....................................................................................................................23 7. Questões a serem respondidas .....................................................................................24 8. Referências bibliográficas ...........................................................................................24 2 1. APRESENTAÇÃO DA EQUIPE Sejam muito bem-vindos a mais essa edição da CM Mundi, senhores delegados! Meu nome é Danilo Narciso, estou no 2º ano do CMBH e é com muito contentamento que eu recepciono os senhores nesse comitê tão especial. Vindo de uma família com raízes sírias, transmitir para os senhores empatia por um povo tão diferente, em condições tão extraordinárias, será o meu maior objetivo dentro desse evento. Eu espero que esse tema seja para os senhores tão construtivo quanto ele já está sendo para mim, que estou extremamente gratificado em transformá-lo em um comitê simulado das Nações Unidas. Simular sempre foi, e ainda é, um meio de transformar-me em um indivíduo cada vez melhor, e ter a oportunidade de ser diretor dos senhores será um meio de eu transmitir um pouco de minha carga àqueles que se envolverem nesse intercâmbio mútuo de conhecimento e valores. Venham preparados, e até o dia do evento! Prezados delegados, é com grande alegria que eu me dirijo aos senhores. Meu nome é Marcella Carvalho e eu sou aluna do 2º ano do Colégio Militar de Belo Horizonte. Em 2014 participei pela primeira vez da CM Mundi como delegada e poder este ano construir com pessoas tão queridas um comitê que foi tão idealizado é um prazer muito grande! Espero que os senhores gostem tanto quanto eu do que já é o melhor comitê da XV CM Mundi. Aguardo ansiosamente pelas nossas sessões. Até logo, e venham preparados para os debates. Olá, delegados do ACNUR! É um prazer imenso ter todos vocês no nosso comitê, o melhor, sem dúvidas. Meu nome é Rafaela Paranhos, e eu estou no 2º ano do Ensino Médio. Comecei a simular ano passado em uma simulação interna do CMBH (por causa da Marcella, que me convenceu) e eu logo me encantei com esse mundo, não parando mais de simular a partir de então. E quando o Danilo e ela me chamaram pra fazer parte disso eu fiquei muito feliz, pois fazer um comitê era uma coisa que eu sempre quis, ainda mais com pessoas tão especiais e esse tema sensacional! Espero que vocês superem todas as minhas expectativas e que gostem muito. Nós nos veremos em breve. Estudem bastante! Sejam bem-vindos, senhores delegados! É com enorme prazer que integro a equipe da XV CM Mundi, pela segunda vez. Meu nome é Amanda Ramalho Guimarães 3 e formei-me no 3º ano do Ensino Médio do CMBH, no ano passado. As saudades deixadas pela instituição e pelas simulações que desenvolvemos sempre me estimulam a retornar. Atualmente curso o 1º período de Relações Internacionais na Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, fato que atribuo fortemente à minha paixão irrefreável pelos modelos das Nações Unidas. Espero que vocês, assim com eu, estejam animados para o começo das discussões! Vejo vocês em breve! 4 2. INTRODUÇÃO A questão dos refugiados se legitima enquanto conflito internacional através de bases distintas, podendo ser considerada o grande foco de estudo das Relações Internacionais no momento. Halford J. Mackinder (1904), geógrafo e geopolítico inglês do século XX, por vez afirmou que “as forças sociais não mais se dissipam [no contexto do povoado mundo moderno]; eclodem culminando em ruínas de Estados colapsados”. O contexto geopolítico de um mundo sistêmico, conectado por sinapses visíveis ou não, cujas relações causais não podem ser contidas ou traçadas em suas consequências de forma precisa, é o locus de nossos estudos. Não podendo afirmar categoricamente, teorizamos acerca dos efeitos imediatos da diáspora síria através do globo. Mesmo muito antes de se falar em Primavera Árabe, previamente à elaboração dos Direitos Humanos e historicamente distante da criação das Nações Unidas (quiçá deste comissariado), já se pensava idealisticamente no resguardo às populações advindas de migrações forçadas. Immanuel Kant, em seu livro “Para a Paz Perpétua”, defendia a criação de um Direito Cosmopolita, que garantisse ao refugiado abrigo internacional. “Terceiro artigo definitivo para a paz perpétua: O Direito Cosmopolita deve limitar-se às condições de hospitalidade universal. (...) hospitalidade significa aqui o direito que tem um estrangeiro de não ser tratado hostilmente pelo fato de estar em território alheio.” (KANT, 2006, p.41) O diálogo para além da paz entre os povos pode ser considerado uma necessidade histórica da humanidade. Propomos, neste estudo, que vejam tal situação pela ótica do novo. O refugiado sírio seria, como bem definiu Duroselle (1981), o estrangeiro, que instintivamente causa uma sensação de ameaça ao outro. O seu surgimento cria novas relações sociais, e o modo de explicá-las e de lidar com elas advém de uma concepção de intensa complexidade social, por vezes tendendo à dicotomia. Toda e quaisquer análises concernentes a fenômenos, que tais como o deste 5 estudo, perpassam as fronteiras dos Estados, são de extrema cautela e importância para a manutenção da paz entre os povos. 3. BREVE HISTÓRICO DO CONFLITO SÍRIO Há um grande questionamento dentro das Relações Internacionais quanto ao Conflito Sírio ser, ou não, parte do conjunto componente da onda de protestos revolucionários no Oriente Médio ditos por “Primavera Árabe”. Isso porque se percebeu no conflito sírio particularidades que o tornam desalinhado das demais regiões onde tal fenômeno se manifestou, não apenas tangenciando a disparidade proporcional dos eventos, mas também a questão do número bem superior de atores internacionais e de forças autônomas de poder atuantes não advindas do Oriente Médio. Em suma, a comunidade internacional tem se envolvido direta e ativamente no futuro do Estado Sírio. O começo do conflito armado data de março de 2011, quando foi declarada situação de emergência por organizações internacionais e, concomitantemente, a guerra civil, em contrapartida à suspensão de um Estado de emergência sírio que havia sido decretado 38 anos antes. Uma série de fatores é atribuída ao estopim da guerra; em âmbito político, segundo as manifestações da Primavera Árabe, houve a destituição de muitos governos dados como tiranos no Oriente Médio. Na Síria, a presença de uma oposição armada e focada na instalação de uma democracia efetiva, contra o que havia sendo seguido por Bashar Al-Assad, culminou num cenário de intensa instabilidade política, cujas consequências se deram materialmente no conflito. Os opositores, ou chamados de ‘rebeldes’ pelo governo sírio, são tidos por este como uma dissidência terrorista de um grupo religioso. Nessa esfera, o conflito rompe com o caráter exclusivamente político e começa a agir no sentido de fomentar rivalidades históricas entre grupos islâmicos cujos retrospectos refletem em cenários caóticos em outras partes do Oriente Médio. No fim de 2011, um grande número de soldados e demais patentes do exército sírio considerados desertores, alinharam-se a uma frente guerrilheira em formação, posteriormente chamada de Exército Livre Sírio. A existência de uma frente armada propiciou uma unificação entre diferentes grupos opositores, originando o Conselho 6 Nacional Sírio. A forte repressão por parte do governo ocasionou inúmeras baixas. Em organizações internacionais, tais como a Cruz Vermelha, declararam a existência de um “conflito armado não-internacional”, abrindo precedentes às aplicações diretas do Direito Internacional Humanitário na região. No primeiro ano de luta armada, foram registrados oficialmente 10.000 mortos. A onda de instabilidades atraiu olhares do grupo radical conhecido por Estado Islâmico. Emergindo como uma intensa força autônoma de poder, a organização começa, em 2013, a conclamar territórios sírios em ação conjunta à oposição, num primeiro momento. É inegável a intensa participação e interesse de outros elementos estatais do sistema internacional, que financiam bélica e estruturalmente as bases do conflito. A vitória de qualquer um dos lados, num prospecto futuro, terá enormes impactos sociais e econômicos para os Estados não só do Oriente Médio, mas de várias partes do globo. Os avanços do Estado Islâmico representam uma intensa ameaça às potências ocidentais, que desde o atentado das torres gêmeas (2001), utilizam de ingerências no trato aos países de regimes islâmicos. Este ano, o conflito completou quatro anos do seu começo, contabilizando baixas humanitárias históricas que abrem precedentes para que se considere um possível fracasso das organizações internacionais destinadas à manutenção da paz e da harmonia no escopo internacional. 4. O ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA REFUGIADOS 4.1. Histórico e Missão do ACNUR Diante a emergência da criação de um órgão das Nações Unidas incumbido de proteger e assistir às vítimas de perseguição, violência e intolerância no contexto pósSegunda Guerra Mundial, a Assembleia Geral das Nações Unidas votou e aprovou, em 14 de dezembro de 1950, a criação do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados. Com o mandato de conduzir e coordenar ações internacionais para proteção dos refugiados, além de buscar por soluções duradouras para seus problemas, a agência empenha-se em garantir que qualquer pessoa possa exercer o direito de buscar e gozar 7 de refúgio seguro em outro país e, caso assim deseje, regressar ao seu país de origem (ACNUR, 2015). Com sua sede em Genebra, Suíça, hoje é uma das principais agências humanitárias do mundo, tendo ganhado o Prêmio Nobel da Paz duas vezes (1954 e 1981). Antecedido por outros órgãos também de cunho humanitário e apolítico, o ACNUR seria, a princípio, de caráter temporário, sendo essa situação revertida após atestada sua efetividade. Atualmente, consta com mais de 7.200 funcionários em 250 escritórios, distribuídos pelas mais diversas nações do globo, e é responsável pela assistência dada a mais de 50 milhões de pessoas. Em um mundo extremamente globalizado e de acentuada interdependência entre as nações, a exteriorização de problemas domésticos é inevitável. É imprescindível, portanto, a atuação da agência em prestar auxílio às mais de 43 milhões de pessoas que se enquadram em seu perfil de assistência. Como organização humanitária, apolítica e social, o ACNUR tem como objetivos básicos a proteção de homens, mulheres e crianças refugiadas e buscar soluções duradouras para que possam reconstruir suas vidas em um ambiente normal. Atua, assim, principalmente a partir de três programas para refugiados: o da integração local, que busca facilitar a inserção do refugiado na comunidade, o de repatriação voluntária, que visa o retorno do refugiado a seu país de origem, e o de reassentamento, que é focado em receber refugiados que continuam sofrendo ameaças e problemas de adaptação no primeiro país de refúgio. Um refugiado é definido como “pessoa que está fora do seu país natal devido a fundados temores de perseguição relacionados à raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política” (ESTATUTO DOS REFUGIADOS, 1951). São pessoas comuns que tiveram de deixar para trás seus bens, empregos, familiares e amigos para preservar sua liberdade, sua segurança e sua vida. Posteriormente, definições mais amplas passaram a considerar como refugiados também aquelas pessoas obrigadas a deixar seu país devido a conflitos armados, violência generalizada e violação massiva dos direitos humanos. 8 4.2.Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados A partir de uma resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas, convocou-se uma conferência para redigir uma Convenção regulatória do status legal dos refugiados. Como resultado, a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados foi adotada em 28 de julho de 1951, entrando em vigor em 22 de abril de 1954. A Convenção consolida prévios instrumentos legais internacionais relativos aos refugiados e fornece a mais compreensiva codificação dos direitos dos refugiados a nível internacional. Ela estabelece padrões básicos para o tratamento de refugiados – sem, no entanto, impor limites para que os Estados possam desenvolver esse tratamento (ACNUR, 2015). Com o tempo e a emergência de novas situações geradoras de conflitos e perseguições, tornou-se crescente a necessidade de providências que colocasse os novos fluxos de refugiados sob a proteção das provisões da Convenção. Assim, um Protocolo relativo ao Estatuto dos Refugiados foi preparado e submetido à Assembleia Geral das Nações Unidas em 1966. O Protocolo foi assinado pelo Presidente da Assembleia Geral e o Secretário-Geral e transmitido aos governos. Entrou em vigor em quatro de outubro de 1967. A Convenção e o Protocolo são os principais instrumentos internacionais estabelecidos para a proteção dos refugiados, e o seu conteúdo é reconhecido a nível global. A Assembleia Geral tem frequentemente chamado os Estados a ratificar esses instrumentos e incorporá-los à sua legislação interna. A ratificação também tem sido recomendada por várias organizações, tal como o Conselho da União Europeia, a União Africana e a Organização dos Estados Americanos. Ao ratificar a Convenção e/ou o Protocolo, os Estados signatários aceitam cooperar com o ACNUR no desenvolvimento de suas funções e, em particular, a facilitar a função específica de supervisionar a aplicação das provisões desses instrumentos. 4.3. O Comitê Executivo (EXCOM) Em 1958, por meio de uma resolução do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (ECOSOC), o Comitê Executivo do ACNUR foi criado após uma 9 solicitação da Assembleia Geral. Consta com 85 membros, e elabora relatórios anuais acerca de sua atividade para análise por parte das Nações Unidas. De acordo com o seu mandato, o ExCom têm como funções principais: i) Assessorar o Alto Comissariado no exercício de suas funções de acordo com o Estatuto da agência; ii) Revisar anualmente o uso dos fundos à disposição do Alto Comissariado e dos programas propostos ou que já estão em execução. O Comitê Executivo reúne-se uma vez por ano, durante uma semana, em Genebra (Suíça). Seu órgão subsidiário, o Comitê Permanente, porém, reúne-se várias vezes ao ano de acordo com o programa de trabalho fixado pelo ExCom. A adoção dos textos é realizada por consenso, refletindo o caráter apolítico e humanitário do trabalho do ACNUR. 5. EXPOSIÇÃO DA PROBLEMÁTICA A questão da guerra civil síria, que na verdade possui seu limiar intrinsecamente vinculado a questões econômicas em nível internacional, é reconfigurada e tida como consequência de reivindicações políticas. O conflito, que já se arrasta por anos, tem forçado o deslocamento de mais de quatro milhões de pessoas, além dos fluxos migratórios terem cada vez mais se intensificado e, com eles, as tensões em fronteiras que se vedam diante àqueles que necessitam de abrigo. O Alto Comissariado da ONU, principal organismo internacional responsável pela gestão e efetivação dos direitos dos refugiados, tem trabalhado incessantemente na logística de reassentamento dessas pessoas de forma pacífica, coesa e efetiva. No entanto, numerosos são os empecilhos para a atuação do órgão, colocando em cheque a segurança dos milhões que buscam asilo e assistência junto à comunidade internacional. 5.1. O direito internacional dos refugiados A Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos Humanos¹ (1948) representam o primeiro passo do recente processo de internacionalização desses direitos básicos fundamentais, a partir dos quais tais preceitos passaram a ser assegurados não somente em âmbito nacional, mas também em esfera global. Uma vez signatários da 10 referida Declaração, os Estados tornaram-se responsáveis por garantir e respeitar os direitos nela propostos. No entanto, a abordagem dos documentos elaborados aprimoravam os direitos da pessoa humana em situação de paz. Fazia-se necessário complementar essa proteção abrangendo situações especiais de vulnerabilidade, como os casos de conflito, em que insurgem a figura dos refugiados e apátridas. Redigida pela Conferência de Plenipotenciários das Nações Unidas, a qual foi convocada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1950, a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951 estabelece importante proteção a todos aqueles que se enquadram na definição do seu artigo 1º. Todavia, esse mesmo artigo abrange apenas eventos ocorridos anteriormente a 1º de janeiro de 1951, restringindo-se contextualmente à Europa (por ter sido cenário da Segunda Guerra Mundial) ou demais localidades de adoção relativa a cada Estado no comprometimento com a Conferência. No corpo da mesma estão presentes cláusulas que determinam o tratamento mínimo a que os refugiados têm direito. A fim de preservar a validade da Convenção de 1951, o Protocolo de 1967 removeu a limitação geográfica referente à Europa e passou a considerar eventos futuros como legítimos, tornando a Convenção de abrangência universal. Além disso, reiterou o princípio da não devolução², o qual tem sido reafirmado nos mais diversos tratados, convenções e documentos referentes ao Direito Internacional dos Refugiados. Ainda que o Protocolo de 1967 esteja ligado a Convenção de 1951, ele conserva um caráter próprio, pois é um instrumento jurídico independente, pelo fato de que sua adesão pura e simples é suficiente para que a maior parte das disposições da Convenção de 1951 se torne aplicável aos Estados que a ele aderirem. Contudo, muitos foram os Estados que optaram por ratificar a Convenção e o Protocolo, reforçando a autoridade desses dois instrumentos do Direito Internacional relativos aos refugiados e os únicos de caráter universal (BARICHELLO e BONESSO DE ARAÚJO, 2014). _________________________________________________________________ ¹ O artigo 14, amparado pelo artigo 2 e cláusulas preambulares da DUDH, já abordava a questão do deslocamento forçado, assegurando a todo ser humano o direito de buscar e de gozar asilo em outros países. 11 As pessoas que deixam suas pátrias em função das diversas violações dos direitos humanos, uma vez reconhecidas como refugiados, possuem assegurados os direitos estabelecidos nos documentos supramencionados³. Entretanto, após deixarem seus países de origem, os requerentes de asilo se deparam com as mais diversas violações de seus direitos. A violação que mais tem se destacado no cenário dos fluxos de refugiados sírios é o fechamento de fronteiras, em especial por países europeus, o que tem sido expressamente rechaçado pelo Alto Comissário do ACNUR. Outra questão que preocupa a comunidade internacional é a infração dos direitos básicos dos refugiados durante o processo de solicitação de asilo, bem como quando este é concedido. No primeiro caso, os processos de determinação de status de refugiado são burocráticos, demorados e acabam por submeter os indivíduos a situações de maus tratos. Durante esses processos, são incontáveis os casos de refoulement (repulsão) por parte dos países que deveriam proporcionar asilo. No entanto, forçam o regresso (predominantemente de forma hostil) desses indivíduos aos seus países de origem. Já no segundo caso, muitas vezes os refugiados deixam os países de acolhimento devido às condições de vida degradantes, que concerne nomeadamente à xenofobia e à falta de suporte prestado pela nação receptora _________________________________________________________________ ² Comitê Executivo do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados. Conclusion n. 22 (XXXII). Protection of asylum-seekers in situations of a large-scale influx: “II. Measures of protection A. Admission and non-refoulement 1. In situations of large-scale influx, asylum seekers should be admitted to the State in which they first seek refuge and if that State is unable to admit them on a durable basis, it should always admit them at least on a temporary basis and provide them with protection according to the principles set out below. They should be admitted without any discrimination as to race, religion, political opinion, nationality, country of origin or physical incapacity”. Disponível em <http://www.unhcr.org/print/3ae68c6e10.html> Acesso em: 28/09/2015 ³ A Convenção e o Protocolo são os principais instrumentos internacionais estabelecidos para a proteção dos refugiados e seu conteúdo é altamente reconhecido internacionalmente (ACNUR, 2015). . 12 Conforme sobredito, ao longo da história e edificação do regime de proteção aos refugiados criou-se três programas de solução ditos permanentes cuja finalidade era a proteção do indivíduo solicitante. São elas: a repatriação ao país de origem do refugiado, o reassentamento do refugiado em um terceiro país e, finalmente, a integração local do refugiado em uma comunidade do primeiro país de asilo (BARROSO e AGUIAR, 2013). 5.2. Fluxos de deslocamento e principais focos de aderência dos grupos de refugiados Para compreender os fluxo de deslocamento e os focos de aderência é substancial termos delineado, preliminarmente, o conceito de refugiado. Sendo assim, ficou estabelecido pela Convenção de 1951 e atualizado pelo Protocolo de 1967, a definição do termo: §1. Para os fins da presente Convenção, o termo "refugiado" se aplicará a qualquer pessoa: c) Que temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência habitual em consequência de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele. Contudo, os padrões de migração se tornaram cada vez mais complexos na atualidade, num contexto em que não apenas os refugiados tomam parte, mas também milhões de migrantes econômicos. Nesse último caso, são classificados aqueles que decidem deslocar-se em busca de melhores condições de vida de modo totalmente voluntário e, infortunadamente, inúmeros são os que se valem do uso de mecanismos e benefícios de refúgio de forma ilegal. Não há um risco real a sua vida que os obrigue a deixar seu lar, bem como possuem capacidade de remanescer em seu país de origem se assim desejarem, contrastando com os refugiados legítimos, que necessitam deslocar-se 13 para salvar suas vidas ou preservar sua liberdade. A transmigração desempenha um papel crucial para os refugiados em sua sobrevivência, sendo esta garantida custosamente a partir de uma existência edificada à margem dos direitos humanos. Ao se deslocarem e adentrarem em uma nação sob a alegação de refúgio, a esses é designado a solicitante da condição de refugiado. Isto é, alguém que afirma ser um refugiado, mas que ainda não teve seu pedido avaliado definitivamente. Dessa forma, os sistemas nacionais de asilo existem para determinar quais solicitantes realmente se qualificam para tal. “Um dos objetivos do ACNUR é trabalhar com os governos para identificar quem é migrante e quem é requerente de asilo dentro dos complexos fluxos migratórios. As medidas contra a fraude e o abuso são necessárias para assegurar a proteção e são indispensáveis para estabelecer a credibilidade do sistema de asilo” (ACNUR, 2015). Ao se verem obrigados a sair da Síria em meio à guerra civil ocorrente, dos mais de 4,2 milhões de sírios que já saíram do país, mais de 2,1 milhões se encontram na Turquia. O segundo principal foco de aderência destes refugiados é o Líbano, com por volta de 1,1 milhão, cerca de 25% da população do país, seguido pela Jordânia, que também faz fronteira com a Síria, e de acordo com o ACNUR já recebeu mais de 630 mil refugiados. Países que também merecem ser citados são o Iraque, que mesmo em meio a conflitos internos recebeu 245 mil, e o Egito, com 128 mil. Em primeira instância, os refugiados recorrem a esses destinos devido à proximidade com a zona de conflito e a esperança de logo retornarem para casa. Apesar de cerca de quatro milhões de sírios viverem atualmente em países vizinhos, houve um aumento acentuado no número de pessoas que procuram refúgio ainda mais longe. “Os refugiados enfrentam condições horríveis de vida, e restrições nos regimes legais de refugiados nos países onde vivem. Quando as pessoas não têm abrigo adequado e estão vivendo com 45 centavos por dia, é óbvio que elas vão querer se mover. Os sírios estão saindo dos países vizinhos” afirma o diretor do ACNUR para o Oriente Médio e Norte da África, Amin Awad. O ACNUR identificou, em suas pesquisas, sete principais fatores que motivam estas pessoas a buscar refúgio fora da região fronteiriça ao território sírio (ONU, 2015): 14 a) Perda da Esperança: é comum muitos abandonarem a perspectiva de uma futura estabilização do país, para que possam voltar a viver nesse. b) Altos custos de vida e pobreza extrema: incapazes de sustentar suas famílias, com as economias pessoais esgotadas e objetos de valor vendidos, eles vivem em condições miseráveis, lutando para pagar o aluguel e cobrir suas necessidades básicas. c) Oportunidades limitadas para subsistência: em uma desesperada busca pelo próprio sustento e sem acesso ao mercado de trabalho, os refugiados submetem-se a exploração e a trabalhos ilegais. d) Ajuda insuficiente: programas de ajuda a refugiados e comunidades de acolhida na região têm sido afetados pela escassez de financiamento. O atual plano interagencial de resposta à crise de refugiados sírios para 2015 (3RP) tem apenas 41% do seu custo total financiado, o que significa cortes na ajuda alimentar para milhares de necessitados. e) Obstáculos para renovar a residência legal: no Líbano, novos regulamentos para refugiados sírios tornaram mais difícil conseguir refúgio e transitar em direção à Turquia. Refugiados que já estão no país têm que pagar 200 dólares por ano para renovar sua permanência. Na Jordânia, as autoridades estão adotando fiscalizações mais duras para garantir que todos os sírios que residem fora dos campos de refugiados tenham um novo documento de identidade para acessar serviços. Tais medidas causam um sentimento de insegurança e vulnerabilidade. f) Escassas oportunidades de educação: principalmente na Jordânia, Egito, Líbano e Iraque. Os sírios, que antes da guerra possuíam ensino gratuito e obrigatório, agora sofrem um impacto devastador sobre sua educação. Cerca de 90 mil sírios em idade escolar não têm educação formal: 30 mil destes tem acesso apenas à educação informal e os demais não têm acesso a quaisquer formas de educação. g) Sentimento de insegurança: a maioria dos deslocados sírios relatou um sentimento de insegurança em relação à região e veem a migração como solução para a sua segurança física. 15 Por esses fatores os refugiados buscam novos focos de aderência, sendo um dos mais requisitados a Europa. No entanto, são controversos e muito inseguros os fluxos de deslocamento adotados para alçar essa destinação. A principal porta de entrada para o continente é via mar Mediterrâneo, que somente no ano de 2015 foi usado para atravessar para a Espanha: 2,7 mil pessoas; para a Itália: mais de 140 mil; e para a Grécia mais de 608 mil. Usam-se, primordialmente, as rotas do Mediterrâneo ocidental, central e oriental, respectivamente. O número de pessoas que se arriscam por esses fluxos em botes superlotados e sem segurança alguma é alarmante. Foram mais de 752 mil no período de janeiro a outubro deste ano, sendo 52% refugiados sírios. Igualmente alarmante é o número de mortes ou desaparecimentos no intervalo citado por consequência destas travessias: foram 3440 pessoas, incluindo mulheres e crianças. A rota mais usada pelos refugiados sírios, que é saindo da Síria pela Turquia para atravessar o Mediterrâneo a fim de adentrar território grego, não termina quando o continente europeu é alcançado. A maioria dos refugiados visa atingir países mais estáveis economicamente e com políticas mais liberais de imigração, como a Suécia e a Alemanha. As duas nações possuem os maiores números de pedidos de asilo, com 64,7 e 98,7 mil respectivamente. Para alcançar tais destinos, os refugiados se deslocam pela Macedônia e Sérvia a fim da chegar à Hungria, país pertencente ao Espaço Schengen, de onde se tornaria, teoricamente, mais fácil prosseguir. Outra rota também usada para se alcançar o país é por meio da Bulgária e da Romênia, partindo da Turquia. Contudo, há ainda várias nações europeias que entravam a entrada dos refugiados, dificultando a travessia a fim de conter o fluxo de refugiados. Mesmo após o perigoso trajeto marítimo, alçar terra firme não significa que a viagem torna-se menos incerta. Todas as rotas de deslocamento mencionadas são estradas ou vias marítimas concebidas em meio ao desespero de pessoas fugindo da guerra em busca de um lugar seguro para viver. Os exemplos da ausência de segurança destes trajetos que atestam as condições precárias em que eles são conduzidos são inúmeros, havendo pontuais casos que alcançaram visibilidade em esfera global. A fim de ilustrar a comoção internacional, podemos citar a foto do menino sírio de três anos 16 afogado em território turco e a morte de 71 refugiados em um caminhão de refrigeração abandonado em uma estrada da Áustria, exemplos que viralizaram nos mais diversos veículos midiáticos por todo o mundo. A Europa não é o único destino distante que os refugiados sírios buscam. Outro foco de aderência importante é a América Latina, em destaque o Brasil. Segundo dados do CONARE (Comitê Nacional para os Refugiados), 2.077 sírios receberam status de refugiados do governo brasileiro de 2011 até agosto deste ano. O número é superior ao dos Estados Unidos (1.243) – que prometem receber até 10.000 refugiados no próximo ano, apesar de possuírem condições para muito mais – e ao de países no sul da Europa, como Grécia (1.275), Espanha (1.335), Itália (1.005) e Portugal (15). Os dados supracitados, provenientes da Eurostat – agência de estatísticas da União Europeia – referem-se ao total de sírios que receberam asilo, e não aos que solicitaram refúgio. Caso fosse essa a situação, os números seriam absurdamente maiores. E, apesar dos dez mil quilômetros que separam o território das duas nações, o Brasil lidera o acolhimento de sírios na América Latina, seguido pela Argentina. 5.3. O enfrentamento do estigma e xenofobia no contexto da integração local do refugiado Vítimas da frequente errônea abordagem do termo “refugiado”, aqueles que são condicionados pela situação de refúgio padecem carregar um significado históricocultural aquém de sua própria situação. No limite de enquadrar-se em uma denominação pejorativa, os refugiados são comumente perseguidos pelo estigma e pelo preconceito, seja pelo desconhecimento da realidade que vivenciam por parte de comunidades locais, seja pela repercussão de crises econômicas na segregação das classes. Nessa conjuntura de extremos, o "diferente" é o objeto frequente de exclusão. Na Alemanha, um dos principais focos de aderência de refugiados, cresceu o número de manifestações contrárias a “islamização” da população. As críticas se referem nomeadamente à abertura das fronteiras alemãs para os fluxos migratórios que buscam asilo no país. Muitas são as mobilizações por parte de cidadãos alemães para a oposição à política adotada pela nação, e recentemente foi registrado um incêndio criminoso contra três abrigos (ainda inabitados) que seriam utilizados para a recepção de refugiados na região central do país. 17 Muitas dessas medidas conservadoras partem muitas vezes também dos próprios governos. As eleições gerais na Suíça tiveram como vencedora uma legenda antiimigração cujo líder justificou a vitória a partir do discurso xenófobo de que os países da União Europeia teriam que “tornar a Europa menos atrativa e enviar um sinal de que não podemos oferecer asilo, nem mesmo aos refugiados de guerra" (BRUNNER, 2015). O primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, alertou os dirigentes europeus de que o fluxo de migrantes é “inesgotável” e representa um sério risco para as “raízes cristãs” do continente. A Hungria terminou, em 2015, a construção de uma barreira de 175 quilômetros de arame farpado na fronteira com a Sérvia, simbolizando a política conservadora do país no que tange à recepção de refugiados. As dificuldades advindas do estigma e preconceito se alastram também para o campo socioeconômico. Refugiados sírios enfrentam diversas dificuldades para conseguir emprego no Brasil, principal foco de aderência na América Latina, mesmo muitos contando com qualificação profissional. A integração local é difícil, fazendo com que mais de 400 sírios tenham que recorrer a programas sociais do governo brasileiro, como o “Bolsa Família”. O Ministério da Justiça do país lançou uma campanha pró-refugiados e contra a xenofobia, visando uma maior aceitabilidade da diáspora síria por parte dos brasileiros. O ACNUR também organizou, junto a diversas outras organizações, uma campanha em larga escala pelo dia do refugiado com o objetivo de aproximar o público do tema, mostrando os refugiados como pessoas comuns vivendo sob circunstâncias extraordinárias. Vítimas de violência moral, psicológica, física e não raramente sexual, é evidente o processo de invisibilidade pelo qual os refugiados são frequentemente submetidos. Entre políticas protecionistas inadequadas e populações locais contrárias à construção de abrigos e fornecimento de ajuda externa, o trabalho do ACNUR e das demais organizações atuantes na problemática é cada vez mais dificultado, bem como o bem-estar daqueles que solicitam asilo por parte da comunidade internacional. 5.4. A União Europeia enquanto organismo gestor de fluxo de pessoas Mais uma questão assombra a crise humanitária que se consolidou em território europeu. O acordo que prevê a livre circulação de pessoas entre os 25 países integrantes da União Europeia - conhecido como Schengen - estipula que se um cidadão recebe um 18 visto para um dos países do bloco, tem o direito de circular por qualquer um dos demais membros do acordo. No entanto, em função do atual contexto europeu, o tratado tem sido alvo de polêmica. O ministro austríaco dos Negócios Estrangeiros (Sebastian Kurz) defendeu a necessidade de resguardar as fronteiras exteriores da União Europeia, ou de outra forma colocar-se-á em perigo o livre-trânsito em seu interior. Da mesma forma, Itália e França propõe uma revisão do tratado, motivadas pela grande demanda de refugiados e imigrantes que solicitam a entrada no continente. Uma política acolhedora seria, portanto, condenável do ponto de vista estrutural nas sociedades europeias. Focos de aderência no continente têm sido objeto de atenção para que haja controle de refugiados em solo europeu, e países da Europa Oriental têm estudado e ameaçado um fechamento massivo de fronteiras como forma de contenção do fluxo de pessoas. Esse tipo de política tem se pautado nomeadamente na alegação de que se fazem necessárias uma maior fiscalização e identificação dos beneficiários dos programas para reassentamento de refugiados. Autoridades da Alemanha, por exemplo, estimam que quase um terço dos imigrantes que solicitam asilo no país e dizem ser sírios na verdade estão mentindo. Além disso, a recepção de refugiados pode significar um perigo para o continente; o jornal britânico Sunday Express, citando um agente do Estado Islâmico, escreveu que mais de 4.000 combatentes da organização terrorista penetraram na Europa sob a capa de refugiados. Tais argumentações não poderiam, no entanto, servir de pretexto para uma nação fazer uma recusa à recepção de refugiados. Deparamo-nos, assim, com um impasse acerca da segurança e soberania nacionais em consonância com possíveis violações à Convenção de 1951, que repudia esse tipo de regime a ser adotado pelas nações signatárias do documento. 5.5. Países e populações diretamente afetados pelo intenso fluxo de refugiados Os países mais afetados pelos fluxos migratórios de refugiados são, indubitavelmente, os vizinhos das áreas em conflito. As condições precárias para a travessia fazem com que essas pessoas tenham dificuldades para alcançar países muito distantes e, assim, os países que mais recebem refugiados são os fronteiriços. Estas 19 nações, com isso, sofrem grande abalo em âmbito econômico, político e social, passando por verdadeiras reestruturações em suas dinâmicas estruturais. Alguns países europeus, muito almejados e alvo frequente dos fluxos de refugiados, também sofrem abalos socioeconômicos em sua organização interna, bem como as demais diversas nações que se mostraram abertas à entrada de imigrantes refugiados em seus territórios, como é o caso de alguns países latino-americanos. No geral, mesmo havendo parcelas populacionais que se mostrem solícitas e sensibilizadas com a situação dos refugiados, isso não faz com que elas se sintam menos saturadas. No Oriente Médio, países como Turquia, Líbano, Jordânia, Iraque e Egito, respectivamente, são os que mais acolhem refugiados sírios. Esses países têm recebido apoio quase que insignificante das demais nações, podendo contar somente com a ajuda de organismos internacionais e ONGs. Ademais, os governos têm arcado com enormes custos ao proporcionarem asilo aos fluxos de refugiados sírios que só fazem crescer. Inevitavelmente, setores sociais e econômicos são atingidos pelo abrupto aumento das populações de cidades já sobrecarregadas nos países supracitados, o que acaba gerando desconforto e deterioração da qualidade de vida dos habitantes. Na Turquia, por exemplo, aproximadamente 90% dos refugiados asilados no país utilizam serviços de saúde locais. Em Reyhanli, cidade localizada na fronteira entre Turquia e Síria, a população dobrou devido aos asilados sírios. A falta de infraestrutura e planejamento da cidade — bem como a grande maioria das cidades do Oriente Médio que são mais próximas da Síria, e, por isso, recebem grande fluxo de refugiados — para acolher tal volume populacional, faz com que os habitantes sejam diretamente afetados. A situação é exemplificada no depoimento de três habitantes de Reyhanli, para o jornal Euronews: “— Por exemplo, quando sou chamado para uma obra, um muro, levo o equivalente a €17. Mas os sírios fazem o mesmo por menos dinheiro. Isto causa tensão entre a população local.” “— A partir do momento em que os sírios chegaram, o Estado ofereceu-se para ajudar, mas não faz o mesmo pelos cidadãos turcos.” Comparando a Europa com o Oriente Médio, pode-se dizer que a primeira encontra-se em situação bem mais confortável. Isso se deve não só à quantidade de 20 refugiados em território europeu, mas também à capacidade estrutural, principalmente econômica, para lidar com tais fluxos migratórios. O número de sírios que chegam à Europa em busca de asilo tende a aumentar, mas em relação ao todo ainda representam baixa parcela: pouco mais de 10%. Do total de, aproximadamente, 680 mil pedidos de asilo sírios, mais da metade estão concentrados na Sérvia e Alemanha e cerca de 34% na Suécia, Hungria, Áustria, Holanda e Bulgária. É importante ressaltar novamente que esses dados, disponibilizados pelo ACNUR, são referentes às solicitações e não à efetivação de asilo por parte dos referidos países. Apesar de o bloco contar com uma condição que tende a ser mais estável, principalmente no campo econômico, os países devem ser analisados em sua individualidade. No caso da Grécia, não é possível afirmar que a situação seja confortável, visto que o país enfrenta grave crise econômica; apesar disso, foi apelidado de “porta de entrada” para as nações europeias em melhores condições, estando submetido à entrada de milhares de refugiados em seu território diariamente, mesmo que em estado temporário. Proporcionar asilo a essas pessoas, salvar refugiados que estão em perigo por causa de travessias arriscadas e demais auxílios necessários têm sido extremamente dispendioso para o governo grego. Devido a esses gastos extras, o governo reduz ainda mais o seu suporte à própria população. Na ilha de Kos, dificuldades do governo para lidar com o fluxo de refugiados têm gerado tensões sociais e revoltas de refugiados de outras nacionalidades. Em situação oposta à Grécia, a Alemanha, como um país de sólida economia, tem condições de receber milhares de imigrantes. Entretanto, o que preocupa não é apenas a questão da logística, mas também a opinião pública. Muitos cidadãos alemães têm se esforçado para proporcionar uma integração harmoniosa aos asilados, mas outros continuam receosos no que concerne aos gastos, perturbações e, em ultimo caso, reconfiguração cultural da população alemã. Vale ressaltar o interesse do país em receber esses refugiados, os quais podem trazer mudanças positivas para a economia do país, uma vez que representam mais força de trabalho e manutenção da população que está cada vez mais velha e escassa. Já em outro contexto, diferentemente da Europa, a América Latina é composta exclusivamente por países em desenvolvimento. A maioria dos países latino-americanos está disposta a aceitar a entrada de refugiados sírios. Entretanto, as condições 21 disponíveis em cada país divergem bastante. Apesar de não terem uma infraestrutura econômica e social sólidas como os países europeus, tais nações têm recebido grandes quantidades de refugiados se comparados ao bloco da União Europeia; porém, quando comparados aos vizinhos sírios do Oriente Médio, essas quantidades se tornam ínfimas. Um dos principais atrativos dos países da América Latina se deve ao fato de concederem o status de refugiados com menor burocracia, e integra-se outro fator positivo que é a laicidade da maioria do bloco. Segundo o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), já foram concedidos mais de 2.000 vistos para refugiados sírios no Brasil. O alto Comissário da ONU para refugiados, António Guterres, elogiou o país pela atenção dada aos imigrantes. Apesar de estar passando por um período de conturbação política e crise econômica, o governo e a população brasileira não têm sofrido grandes impactos com entrada dessas pessoas no país, o que pode ser encarado como algo benéfico para a imagem da nação junto ao cenário mundial. 5.6. A escassez de recursos frente à necessidade global de assistência a refugiados Deparamo-nos atualmente com o que foi apontada pela ONU como a maior crise humanitária do século. A definição refere-se ao drama vivenciado pelos refugiados em África, Oriente Médio, e nomeadamente no contexto da guerra civil síria, que perdura há mais de quatro anos. Totalizando 60 milhões de pessoas, o deslocamento forçado no mundo atualmente é o maior desde a Segunda Guerra Mundial. O ACNUR, os governos e seus parceiros têm trabalhado laboriosamente nos últimos dias para substituir barracas danificadas, fornecer kits de reparo, entregar suprimentos de emergência e oferecer abrigos alternativos para aqueles que foram forçados a abandonar suas casas, principalmente devido ao fator climático associado às consequências do inverno. No entanto, apesar destes esforços, a situação em toda a região continua precária para a maioria dos refugiados, que sobrevivem em condições extremamente críticas. É imprescindível ressaltar que o Alto Comissariado, diferentemente das demais agências da ONU, se mantém por meio de contribuições voluntárias de nações 22 doadoras. Sendo assim, a agência precisa desenvolver grandes iniciativas para captação de recursos junto à comunidade internacional, ao setor privado e a doadores particulares em todo o mundo. No entanto, a agência conta com menos de 42% dos fundos necessários para financiar mais de 33 apelos de emergência destinados a ajudar 82 milhões de pessoas em diferentes regiões do mundo (GUTERRES, 2015). Em razão desse quadro, teme-se que mais de 1,7 milhão de refugiados sírios possam vir a passar fome devido a uma crise de recursos financeiros. O ACNUR prevê que até ao fim do ano o número total de migrantes seja de 700.000 e sublinha que serão necessários mais 77 milhões de dólares além do inicialmente previsto. O orçamento total eleva-se por enquanto a 128 milhões, valor considerado insuficiente para poder prestar a assistência devida e possibilitar uma melhor resposta às necessidades humanitárias de proteção nos pontos de trânsito e de destino dos refugiados. Faz-se extremamente necessário, portanto, que se tenha sempre em mente os limites de atuação do órgão, condicionados por sua escassez de recursos. 6. CONCLUSÃO Alocar refugiados e proporcionar-lhes condições dignas de vida são, antes de tudo, deveres da comunidade internacional para com todos aqueles que forçosamente deixaram suas pátrias a fim de acondicionarem-se mais um dia em sua sobrevivência. No entanto, é necessário o entendimento de que tal ação deve ser primordialmente efetuada em consonância ao caráter temporário lhe conferido e, portanto, concomitante à busca do reestabelecimento da paz em território sírio. Dessa forma, o Alto Comissariado também atua como agente pressionador no conflito, para que este se encerre o mais brevemente possível em prol da estabilidade da região. Fez-se pertinente trazer à tona a problemática de forma imparcial, ou seja, primando pelos direitos dos refugiados e tendo em mente os impactos que os fluxos em massa trazem a um país e sua população. Compreender as rotas desses fluxos é fundamental, visto que refletem os anseios desses refugiados e proporcionam embasamento para solucionar as questões que devem ser solucionadas ao final dos debates. Da mesma forma, mostrou-se imprescindível atentarmo-nos às alterações das 23 dinâmicas sociais ocasionadas em esfera mundial, principalmente tratando-se de uma crise humanitária que segue as tendências do contexto globalizado em que se insere. 7. QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS ● Como melhorar as condições de vida dos refugiados nos países em que se encontram asilados em consonância com o bem estar da população local? ● Como otimizar o processo de concessão do status de refugiados e dos vistos para os deslocados sírios? ● O que deve ser feito pelos Estados para que esses cumpram efetivamente os direitos assegurados pela Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967 a essas pessoas? ● Quais ações precisam ser tomadas pela comunidade internacional para amparar os países superlotados de refugiados sírios? ● Como proporcionar deslocamentos seguros a fim de evitar mais mortes por travessias arriscadas? ● Quais diretrizes devem ser estabelecidas a fim de se obter uma resposta mais efetiva da União Europeia para a crise humanitária? ● Qual a melhor maneira de dissipar os fluxos de refugiados? O que deve ser levado em conta para que tal iniciativa torne-se efetiva? ● Como os países e blocos econômicos podem auxiliar o ACNUR de forma a garantir sua eficiência? ● Onde buscar recursos para a crise orçamentária em que se insere a agência? Como lidar com a falta dos mesmos diante o inverso rigoroso que se segue? 8. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA (CARR, E. Vinte Anos de Crise 1919-1939: uma introdução ao estudo das Relações Internacionais. Brasília: Editora UnB, 2008). (MORGENTHAU, H. A Política Entre as Nações. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2003). (ANGELL, Norman. A Grande Ilusão. Brasília: Editora UnB, 1987). 24 CARR, Edward Hallet. 20 Anos de Crise 1919-1939. Universidade de Brasília, 2001. MORGENTHAU, HANS. A política entre as nações: aluta pelo poder e pela paz. Universidade de Brasília, 2003. KANT, Immanuel. Para a Paz Perpétua. In: GUINSBURG, J. (ORG.). A paz perpétua: Um projeto para hoje. São Paulo: Perspectiva, 2004. ANGELL, Norman. A Grande Ilusão. 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