Anais 2008

Transcrição

Anais 2008
Anais do
Congresso
INES:
150 anos no Cenário da Educação Brasileira
De 26 a 28 de Setembro de 2007
VI CONGRESSO INTERNACIONAL
E XII SEMINÁRIO NACIONAL DO INES
De 26 a 28 de Setembro de 2007
Rio de Janeiro/RJ
INES: 150 ANOS NO CENÁRIO DA
EDUCAÇÃO BRASILEIRA
Ministério da Educação
Secretaria de Educação Especial
Instituto Nacional de Educação de Surdos
PRESIDENTE DA REPÚBLICA
Luiz Inácio Lula da Silva
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
Fernando Haddad
SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL
Cláudia Pereira Dutra
INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS
Marcelo Ferreira de Vasconcelos Cavalcanti
DEPARTAMENTO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO,
CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO
Leila de Campos Dantas Maciel
COORDENAÇÃO DE PROJETOS EDUCACIONAIS
E TECNOLÓGICOS
Alvanei dos Santos Viana
DIVISÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS
Maria Inês Batista Barbosa Ramos
CIP - BRASIL. Catalogação na fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.
S474s
Congresso INES: 150 Anos no Cenário da Educação Brasileira (2007, Rio de Janeiro,RJ)
Congresso INES: 150 Anos no Cenário da Educação Brasileira. De 26 a 28 de setembro
de 2007/ (organização) INES. Divisão de Estudos e Pesquisas - Rio de Janeiro
Inclui bibliografia
I.INES 150 anos - Educação - Congresso: I. Instituto Nacional de Educação de Surdos
(Brasil). Divisão de Estudos e Pesquisas. II. Título
II. Título
96-2048
CDD - 371.912
CDU - 373.33
131296 161296 002373
ANAIS DO CONGRESSO
INES: 150 ANOS NO CENÁRIO DA
EDUCAÇÃO BRASILEIRA
EDIÇÃO
Instituto Nacional de Educação de Surdos
COMISSÃO EXECUTIVA
Drª Monique Mendes Franco (INES/UERJ) Profª Ms. Janete Mandelblatt (INES/ISBE)
REVISÃO
Comissão Executiva de Publicação
DIAGRAMAÇÃO
Gibbor Brasil
IMPRESSÃO
Santa Clara Editora
TIRAGEM
4.000 exemplares
Instituto Nacional de Educação de Surdos
Rua das Laranjeiras, 232
CEP 22 240 - 001
Rio de Janeiro - RJ - Brasil
Telefax: (21) 2285-7284 e 2205-0224
e-mail: [email protected]
Sumário
CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS
Formação do intérprete
Karen Petronio............................................................16
Bera - diferentes leituras e interpretações
Ulf Rosenhall...............................................................24
Bilingüismo e educação
Kristina Svartholm........................................................26
CONFERÊNCIAS NACIONAIS
Inclusão escolar e desigualdades sociais
José Geraldo Silveira Bueno.........................................29
Terapia fonoaudiológica na área da surdez
Cilmara Levy...............................................................39
Adaptações curriculares no contexto da
educação inclusiva
Rosana Glat................................................................42
Possibilidades de escrita pelos surdos
Marianne Stumpf.........................................................48
PAINÉIS INTERNACIONAIS
Ines 150 anos
Solange Rocha............................................................57
Jean François Dutheil...................................................60
Surdocegueira e deficiência múltipla: panorama
educacional da América Latina
Helena Burgés Olmos..................................................73
Sara Nolla..................................................................77
Marcia Regina Gomes.................................................86
MESA-REDONDA INTERNACIONAL
Educação de surdos: desafios para as
próximas décadas
Ulf Rosenhall.............................................................................. 96
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
Corporeidade e surdez
Marise Pedalino....................................................................... 100
Ana Regina Griner.................................................................... 105
José Leopoldo Vieira................................................................. 109
Políticas públicas educacionais
Cláudia Pereira Dutra............................................................... 114
Roseni Cardoso........................................................................ 120
A língua escrita como segunda língua: uma
experiência de letramento
Elaine da Rocha Baptista Plaisant.............................................. 127
Maria Cristina da Cunha Pereira............................................... 138
Panorama internacional da educação de surdos
nos últimos 150 anos
Leila Couto Mattos................................................................... 146
O ensino superior bilíngüe
Maria Marta Costa Ciccone...................................................... 150
Vilmar Silva.............................................................................. 154
Aquisição da língua de sinais por surdos adultos:
Condição para a escolaridade
Vera Regina Loureiro................................................................ 162
Gladys S. Carvalho.................................................................. 166
A influência do diagnóstico no desenvolvimento da
criança surda
Ana Lúcia do Nascimento......................................................... 170
A família em discussão
Rosária de Fátima Corrêa Maia................................................. 177
Fátima Gonçalves Cavalcante................................................... 187
Sujeitos surdos no contexto das novas tecnologias
Rita Maria de Souza Couto....................................................... 192
Maria Cristina da Cunha Pereira............................................... 201
Surdez e transtornos invasivos do desenvolvimento
Paulo Mattos............................................................................ 206
Roberta Pinheiro Lima............................................................... 207
Descrição da língua de sinais: desafios teóricos
e práticos
Tanya Amara Felipe (FENEIS)..................................................... 215
Karen Petronio......................................................................... 229
COMUNICAÇÕES
Atuação dos profissionais da saúde no
atendimento ao paciente surdo
Neuma Chaveiro
Maria Alves Barbosa
Celmo Celeno Porto................................................................. 237
Pindorama: uma plataforma computadorizada
como ferramenta na produção textual de
crianças escritoras surdas entre 7 e 12 anos de
idade
Lívia Monnerat Castro
Carlo Emmanoel Tolla de Oliveira
Carla Verônica Machado Marques............................................ 239
A construção de conceitos científicos por
estudantes surdos
Gisele Morisson Feltrini
Paulo Salles............................................................................. 241
O filosofar expresso pelo corpo
Péterson R. Costa..................................................................... 242
A aquisição de classificadores na Língua de
Sinais Brasileira
Elidéa Lúcia Almeida Bernardino............................................... 244
Entre línguas e caminhos: uma proposta de
atuação do intérprete de Libras-LP no contexto
educacional
Carlos Henrique Rodrigues
Fernando Eustáquio Guedes..................................................... 246
Problematizando o ensino de matemática
para surdos na escola inclusiva: o professor
de matemática e intérprete de língua de sinais
Luiz Cláudio Nóbrega Ayres
Lucyenne Matos da Costa......................................................... 248
Aquisição da teoria da mente pela criança surda
Laura Cristina Stobäus
Sylvia Beatriz Joffily................................................................... 249
Uma educação e escolas líquidas? Uma forma
de se trabalhar com os alunos com necessidades
educativas especiais no ensino regular a partir
da educação inclusiva.
Leny Magalhães Mrech............................................................. 251
Língua de sinais e implante coclear no processo de
construção da escrita
Esmeralda Figueira Queiroz
Celeste Azulay Kelman.............................................................. 253
Utilização do conceito de reabilitação orofacial e
corporal Castilho Morales na Síndrome de
Waaedenburg
Leny Meirelles.......................................................................... 255
As políticas públicas e a implatação do atendimento
fonoaudiológico à surdocegueira em Pernambuco
Wanilda Maria Alves Cavalcanti
Luiz Carlos Souza Bezerra......................................................... 257
Textos não-disponibilizados. ............................................. 258
Conferências Internacionais
CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS
THE INTERPRETER EDUCATION PROGRAM
KAREN PETRONIO1
The fields of interpreting and interpreter education are in different stages
in different countries, or even in different parts of the same country. While
there are differences, the overall goal of any interpreter education program is
the same: to train more qualified individuals who can successfully interpret
between a spoken language and a signed language.This paper starts with a
look at factors affecting interpreter education in the United States and then
gives a detailed description of one 4-year program.
The fields of interpreting and interpreter education are in different stages
in different countries, or even in different parts of the same country. While
there are differences, the overall goal of any interpreter education program
is the same: to train more qualified individuals who can successfully
interpret between a spoken language and a signed language. This paper
starts with a look at factors affecting interpreter education in the United
States and then gives a detailed description of one 4-year program.
Looking at our past helps us understand how things have come to be and
provides guidance for where we want to go in the future. Currently, in the
United States, as in many places throughout the world, there is a great need
for qualified sign language interpreters. One response to this has been the
development of more than 170 interpreter education programs throughout
the United States. This seems like a large number of programs; however,
there is great variation in the design of the programs, the qualification
of the faculty, and the success rate of the students. For instance, while
some programs graduate a high percentage of students who become skilled
interpreters and remain in the field, there are other programs where only a
small number of graduates actually become working interpreters
In this paper, I start by taking a historical view of different factors that
have influenced the field of interpreter education in the United States.
After looking at these factors, I will describe in detail the structure, design
and philosophy of an interpreter education program where I have worked
for the past 12 years. At this program, which is under the Department
of American Sign Language (ASL) and Interpreter Education at Eastern
Kentucky University, our goal is to provide an education that will prepare
1
16
Eastern Kentucky University -EUA
students to enter and remain in the field, and to leave with the tools that will
allow them to continue developing their skills so they can pass the national
interpreter certification test.
Before looking at the details of our interpreter education program, it
is important to look at the many factors that have shaped our field and
influenced programs such as ours. These factors included the growth of
organizations relating to the field of interpreting, changes in who becomes
an interpreter, changes in the models of what interpreters should be doing,
and changes in the length of interpreter training programs.
Growth in Organizations Related to the Field of
Interpreting:
In the United States, the first workshop for sign language interpreters was
held in 1964. At this workshop, a group of people formed an organization,
which was later called the Registry of Interpreters for the Deaf (RID).
Through the years, RID has offered three different types of certifications
tests. The most recent test, developed by working collaboratively with the
National Association of the Deaf (NAD), is called the National Interpreter
Certification (NIC). To become NIC certified, an interpreter must first pass
a written test and then take a performance test, which includes questions
about ethics. RID currently has chapters in 48 states, has numerous local
and regional conferences, and hosts a national conference every two years.
A newsletter and journal keep its 12,000 members updated and informed of
various issues that impact the field of interpreting.
In the 1970’s, the federal government funded several interpreter training
programs throughout the United States. The early teachers for these
programs were usually RID- certified interpreters who had no experience in
teaching. In the late 1970’s, many of these teachers formed an organization
called the Conference of Interpreter Trainers (CIT). CIT has a newsletter,
a journal and a national conference every two years to promote effective
teaching practices and research in the field of interpreter education.
The teaching of interpreting skills is a crucial part of all interpreter
education programs. However, skills can only be taught if students have a
strong foundation in English and ASL. The concern and need for qualified
ASL teachers lead to the formation of the American Sign Language Teachers
Association (ASLTA) in 2002. This organization certifies ASL teachers,
has state chapters and offers local, regional and national workshops focusing
on best practices for teaching ASL.
As the number of interpreter education programs were increasing,
organizations, such as CIT, RID, NAD and ASLTA, became concerned
17
Anais do Congresso
with the quality of these programs. CIT took the lead and, with input from
many other organizations, developed National Interpreting Standards for
interpreter training programs and dreamed of having a body to accredit
interpreter training programs. Their dream came true in 2006, with the
establishment of the Commission of Collegiate Interpreter Education
(CCIE). Now, one year after it was formed, CCIE has accredited one
interpreter training program (the University of New Hampshire) and has
several programs in various stages of the accreditation process.
All of the above organizations (RID, NAD, CIT, and ASLTA) have shaped
and continue to influence the growing field of interpreter education.
Changes in characteristics of people becoming
interpreters
Before interpreter training programs started, the largest number of
people who functioned as interpreters were usually from families with
deaf members, often hearing children of deaf adults (CODAs). The
second largest group of the early interpreters were people who learned sign
language through their churches.
After RID was established in 1964, workshops were offered, articles
written and interpreters started appearing in public venues. People slowly
started realizing that interpreting could be a career option. In addition to
interpreters who had deaf family members and those who came from the
churches, in the late 1970’s, many hearing people who had deaf friends
and were involved in the deaf community started becoming interpreters.
Continuing through the 1980’s, it appears that the majority of interpreters
started learning their signing skills through, and been nurtured by, the deaf
community.
Starting in the 1990’s, we saw an increase in two new groups of students
who are becoming interpreters. The first group includes young students
who arrive at college with the desire to become an interpreter, even though
they have never met a deaf person or taken a sign language class. The
second group consists of students who enter interpreter training programs
after taking ASL classes during high school or have learned ASL from a
deaf peer who was mainstreamed in their public school. In contrast with
people who previously had become interpreters, these new students are
arriving without any prior experience or with only having met one or two
deaf people (their teachers or their deaf peers). This has implications for
interpreter training programs because now, in addition to the students we
18
were use to - those having prior experience in the deaf communities, we
are now also getting an increasing number of students who arrive without
this background.
Changes in the model of what interpreters should
do
Along with changes in the characteristics of people who are becoming
interpreters, the expectations of what interpreters should do has also
changed. Before the establishment of RID, sign language interpreting
was not viewed as a profession. The earliest interpreters were family
members and people associated with the church who interpreted to help
with communication. At times, helping with communication extended to
helping with other matters, which could include ‘helping’ with or making
decisions for the deaf person. This type of role became known as the
‘helper model’.
Over time, as deaf people obtained better education and jobs, and as
NAD and RID worked on a Code of Ethics for interpreters, the helper model
was rejected and replaced with the extremely opposite ‘machine model’.
Under the machine model, the role of the interpreter was to strictly sign
everything that was said and say everything that was signed. If a person
started talking, the interpreter immediately started signing; if a person
started signing, the interpreter immediately started talking. The machine
model did not account for the modality differences of the languages (visual/
gestural vs. auditory/spoken), nor did it allow any time for the interpreter to
understand the message or consider how to convey the message in the other
language. Interpreting was a very fast-paced activity of replacing words
with signs, and signs with words. Eventually many interpreters started
developing carpel tunnel syndrome from overuse, and both deaf and
hearing people realized they were having trouble understanding the intent
and meaning of the interpretations produced using the machine model.
The 1990’s saw the introduction of the ‘Interpreting Process Model’
by Betty Colomonous. This Process Model respected ASL and English
as two separate languages and recognized that interpreters need time to
process and understand a message before they can accurately convey the
message in another language. Although there are other models, the basic
concepts of the Process Model are still in use today by many interpreters
and interpreter training programs in the United States.
19
Anais do Congresso
Changes in the length of interpreter education
programs
When interpreter training first started, it was common to hear of threemonth, six-month or nine-month programs. By the 1980’s, the majority of
programs were longer, and two-year programs became the norm. However,
unless a student entered a two-year program with adequate signing skills,
it was difficult, if not impossible, to teach enough sign language and
interpreting skills in two years to prepare students to enter the field. In the
1990’s, many programs started changing to four-year programs. In 2007,
information on RID’s webpage lists 72 two-year programs and 37 four-year
programs. Of the two-year programs, an increasing number require that
students have proven signing skills before they start the program.
A Description of a Four-Year Interpreter Education
Program
Below I will describe the design of the 4-year Interpreter Training
Program at Eastern Kentucky Program where I have worked for the past 12
years. Our program is an example of a program that started as a two-year
program in the 1980’s and then changed to a 4-year program in the 1990’s.
In describing our program, I will start with a description of the faculty
and then give an overview of our program, including the application and
selection process.
Our program currently has six teachers. Two of the teachers are deaf;
two are hearing with deaf parents; and two are hearing. All of the teachers
are RID certified and/or ASLTA certified. The hearing teachers were all
interpreters before they became teachers, and all continue to do community
interpreting. In terms of academic degrees, two teachers have their Doctoral
Degree, three have a Masters Degree, and one has a Bachelor’s degree.
In addition to going to the regular classes, we also have a sign language
lab that students must attend as part of their ASL classes. The lab staff
consists of four deaf people: a sign lab manager, an assistant manager and
two part-time people (usually one or both are students).
The graphics below show an overview of our four-year program:
Year 1 and 2
Prerequisites/Preparatory and General Education Classes
Applyinf, Interviews & Selection Process
Years 3 and 4
Advanced ASL, Interpreting Knowledge & Skill Classes
20
As shown in the above, in the first two years, the students take
prerequisite and general education classes. In the spring of their second
year, they apply for admission to the program. The arrow coming from the
left shows that students from other schools, if they meet the prerequisites,
can also apply to our program. After our interview and screening process,
the selected students then continue on to the third and fourth year, which
are almost all ASL and Interpreting classes
In the first two years, in addition to general education classes
required to get a four-year bachelors degree, students take the following
preparatory/prerequisite courses:
•
•
•
•
•
Four ASL classes: ASL 1, 2, 3, and 4
Fingerspelling and Numbers
Deaf Culture
Professional Ethics and Issues in Interpreting
Processing Skills for Interpreters
Each of these 3-credit classes meets three hours a week during 16-week
semesters. Students taking ASL classes are also required to attend the sign
lab at least one hour a week. For the ASL and Fingerspelling and Numbers
classes, we try to limit the number of students to 20; lecture classes, such as
Deaf Culture and Professional Ethics and Issues in Interpreting, are larger.
In the spring of their second year, students apply for admission
into our program. In order to meet the prerequisite requirements, students
must have already taken or be enrolled in the classes listed above, except for
the Fingerspelling and Numbers class. In addition, students must submit a
letter of intent, two letters of recommendation, take an English test offered
in our department, and have a grade point average of at least 2.5. Students
completing these requirements can then schedule an interview. The interview
is conducted in ASL and, ideally, involves all the faculty members. After
the interview, each faculty member scores applicants for signing skills,
knowledge, and disposition. These scores, along with the applicant’s grade
point average and English test scores, are used to rank all applicants. The
size of our faculty and our resources determine the number of students
that we can accept; we typically select the top 20 – 22 students every two
years. This careful selection process has allowed us to successfully teach
students who are very motivated, who are remaining in the field after they
graduate, and who are becoming nationally certified within a few years of
graduation.
After students are accepted into the program, they continue taking
intense classes to prepare them with the knowledge and skills necessary to
become a successful interpreter. In the third year, and the first semester of
the fourth year, students take the following classes:
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Anais do Congresso
•
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•
•
•
•
•
2 ASL classes (ASL 5 and 6)
2 Sign to Voice classes
2 Voice to Sign classes
2 Specialized Topics classes
2 Linguistics classes
1 Deaf History class
1 Business Practice class
1 Pre-Practicum class
With the exception of the Business Practice class, each of these classes
is three-credits and meets three hours per week for 16 weeks. Students also
take five supporting classes offered by other departments; these include:
Anthropology, Public Speaking, Introduction to Special Education, and
Education of the Deaf and Hard-of-Hearing. In the Pre-Practicum class,
which they take in the first semester of their fourth year, students prepare
portfolios that include video samples of their interpreting work. This is
the semester the students decide where they want to do their internships
and send letters, with their portfolios, to the different places. In the second
semester of their final year, students are out in the community doing a fulltime internship under the guidance of professional interpreters. Intern
sites can be within our state and at other locations throughout the United
States. Sites have included interpreter referral agencies, residential schools
for the deaf, community services for the deaf, vocational rehabilitation, and
even theatrical interpreting at Disney World.
For the past several years, we have had a graduation rate of over
95% and also a very high percentage of students who continue in the field
and later become nationally certified. I will end with the comment that
although we think our program is good, we are continually discussing
and modifying classes, materials and technology to try to best prepare
our students to become successful interpreters with the right attitudes and
skills.
22
References
Most of the agencies I have mentioned in this paper have websites where
you can obtain further information. This includes:
National Association of the Deaf, www.nad.org
Registry of Interpreters for the Deaf, www.rid.org
Conference of Interpreter Trainers, www.cit-asl.org
American Sign Language Teachers Association, www.aslt.org
Commission on Collegiate Interpreter Education, www.ccie-accreditation.org
You can find more information about the our interpreter education program
at www.interpreting.eku.edu . At this website you can see an further
descriptions for each of four years including a suggested list of classes for
each semester and descriptions for each class.
During the presentation, a video was shown that a student made about the
interpreting program at EKU. We hope to soon have this on our web page.
For now, you can view it by going to www.youtube.com and then entering
‘EKU Promo’ in the search box.
23
CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS
BRAINSTEM EVOKED RESPONSES –
READINGS AND INTERPRETATIONS
Ulf Rosenhall1
Brainstem evoked responses (BERA or ABR, auditory brainstem
responses) was described for the first time in 1967, 40 years ago. Ten years
later it was introduced as a clinical method in audiological practice, and it has
changed audiological diagnostic procedures profoundly. However, during
the last decade its diagnostic capacity has been challenged. ABR is an evoked
response test in which short acoustic stimuli generate electrical potentials
in the cochlear nerve and the brainstem. These potentials are recorded with
far-field technique, and processed with computerised technique. An ABR
consists of five reproducible waves. Auditory physiological research has
shown that waves I and II are generated in the cochlear nerve, wave III
in the cochlear nuclei, and wave V in the superior olivary complex. One
great advantage with ABR is that the responses are robust, reproducible,
uninfluenced by sleep, and not overly sensitive to anaesthetics.
The following abnormalities can be defined in an ABR-recording:
1) prolongation of absolute latencies of the waves, 2) prolongation of
interpeak latencies (IPLs), 3) prolongation of interaural time difference
(ITD), 4) loss of later ABR-waves, 5) loss of all ABR-waves, 6) reduced
amplitude of wave V and 7) abnormal configuration and increased
variability.
Applications/indications of ABR:
1) Diagnosis of sensorineural hearing loss. ABR is the best
audiological method to differentiate between cochlear and retrocochlear
hearing loss. In a retrocochlear lesion there is a pattern of latency
prolongations of wave V, the I-V IPL, and the I-III IPL. The interaural
time difference is generally abnormal. Loss of ABR-waves is another
common abnormal pattern. For large vestibular schwannomas (acoustic
tumours) the sensitivity of ABR is 100%. However, for small vestibular
schwannomas (< 1 cm) the sensitivity is unacceptably low, between 58%
and 92% according to a review of recent literature.
2) Assessment of hearing thresholds. ABR is an objective
audiometric method for patients that are difficult to test. It is most often
used in pediatric audiology. ABR gives an estimate of the hearing capacity
in the high frequency range. Methods to test discrete frequencies have been
1
24
Karolinska University Hospital/Karolinska Institutet, Stockholm, Sweeden
developed. The method is of the utmost importance for assessing hearing
in infants who have failed in neonatal hearing screening.
3) Diagnosis of auditory neuropathy. ABR is of decisive
importance to diagnose this audiological entity, preferably at an early time.
The diagnosis can be suspected when speech perception is poor, and is
established by abnormal ABR in combination with normal OAEs.
4) Peroperative monitoring. ABR can be used to monitor the
hearing capacity and brainstem function during surgery for vestibular
schwannomas and posterior fossa surgery.
5) Other indications. ABR can be used to detect neurological
lesions in the upper brainstem (pons and mesencephalon). Modern imaging
techniques, above all MRI, have almost totally replaced ABR for this
indication.
Conclusions and prospects:
ABR has for many decades been one of the most important tools in
audiological diagnostic practice. There is a clear trend that pediatric hearing
assessment in is becoming its most important indication. The capacity of
ABR to diagnose small vestibular schwannomas has been questioned. One
way to deal with this problem is to define scrupulous indications aiming
to screen for low risk cases. Another way is technique development, and
there is promising research in progress to improve the diagnostic capacity
of ABR, e.g. by the so called stacked ABR technique.
25
CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS
BILINGUALISM AND EDUCATION
Kristina Svartholm1
Tbeen in the forefront within the area bilingual education for the deaf
for long. Swedish Sign Language was recognized as a language in its own
right by the Swedish Parliament as early as in 1981 and need of bilingualism
among the deaf was officially acknowledged (1). Since then many efforts
have been made in order to develop an educational situation within the
special schools for the deaf and hard of hearing in Sweden that enhances
this special kind of bilingualism.
In my lecture I will present some of the developmental work that has
been carried through within the Swedish special schools as well as the
research basis for this work (2). One important source is linguistic research
about the two languages: what are the most important similarities and
differences between them, how can they best be described so that efficient
teaching is promoted, how can this linguistic information be applied in
the educational situation? Another source is research about bilingualism
among the hearing: what methods known from teaching hearing children
two languages can be used with the deaf and what adaptations must be
made in order to gain successful results? And what is there to learn from
research about literacy in general as well as about literacy for the hearing
in a bilingual context?
I will also present some of the main results from our last 25 years of
experience from bilingual education. In the Swedish National Curriculum,
valid since 1994, it is stated that the special schools are responsible for
ensuring that “… all pupils, who are deaf or have impaired hearing, on
completing school are bilingual”(3). How can this goal be defined – and
how is it fulfilled today? Other important questions concern the growing
number of children with cochlear implants that attend the special schools
for the deaf in Sweden (4). Their parents claim for bilingualism for them
and they are offered spoken language as an alternative to Swedish Sign
Language as the language of instruction in these schools – but what is their
actual need of bilingualism? And what is the difference, if any, between
their bilingualism and the bilingualism for the deaf?
1
26
Stockholm University, [email protected]
References
Svartholm, Kristina 1993. Bilingual Education for the Deaf in
Sweden. Sign Language Studies 81, 291–332.
Svartholm, Kristina 2005. Teaching Literacy to Deaf Learners. In
Cortese, Giuseppina / Duszak, Anna (eds) Identity, Community, Discourse.
English in Intercultural Settings. Bern: Peter Lang, 345-358.
LPO 94 1994. Information on the 1994 Curriculum for the Compulsory
School System LPo94. Stockholm: Swedish Ministry of Education and
Science.
Svartholm, Kristina 2007. Cochlear-Implanted Children in
Sweden’s Bilingual Schools. In Komesaroff, Linda (ed.) Surgical Consent.
Bioethics and Cochlear Implantation. Washington, D.C.: Gallaudet
University Press, 137-150.
27
Conferências Nacionais
CONFERÊNCIAS NACIONAIS
EDUCAÇÃO ESPECIAL, INCLUSÃO
ESCOLAR E DESIGUALDADES SOCIAIS
José Geraldo Silveira Bueno1
RESUMO
Este trabalho tem por finalidade analisar a educação especial como uma
das expressões dos processos de inclusão/exclusão escolar e a sua relação
com a origem social dos alunos, particularmente aqueles do ensino básico,
na medida em que parte do princípio de que a escola no Brasil, pelo menos
desde o advento da República, possui um duplo caráter: de um lado, de
seleção e classificação social, e de outro, de promotora do acesso aos bens
culturais necessários à inserção social. Nesse sentido, embora não restrinja
as causas desse fracasso exclusivamente às condições sociais de origem,
especialmente as econômicas, por considerar que esta perspectiva reduz
fenômenos altamente complexos a uma única causa, considera que, no caso
da sociedade brasileira, que possui um dos piores indicadores de distribuição
de renda do mundo, com uma vasta população abaixo da linha da miséria,
as condições econômicas da população não podem ser ignoradas, sob o
risco de produzirmos investigações sobre processos e sujeitos abstratos.
Com base nessa perspectiva, procura analisar o fenômeno da escolarização
de alunos com surdez, em nosso País, a partir de três eixos de análise: os
processos de escolarização e a seletividade escolar no Brasil; as políticas de
inclusão escolar; e a surdez como patologia ou condição.
Introdução
Quero deixar público os meus mais sinceros agradecimentos pelo
honroso convite do Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES, do
Ministério de Educação, para participar do VI Congresso Internacional
do INES e XII Seminário Nacional, INES: 150 anos, evento da mais
alta importância e que reúne um conjunto de especialistas nacionais e
estrangeiros voltados para os mais diversos temas envolvendo a surdez.
Vou procurar, neste trabalho, polemizar algumas questões teórico-
1
Professor Titular do PEPG em Educação: História, Política, Sociedade - PUC/SP
E-mail: [email protected]
29
Anais do Congresso
políticas sobre a surdez, sem a pretensão de que meus argumentos sejam
aceitos, mesmo porque mesmo que eu a tivesse, nada garantiria a priori que
ela se concretizasse de fato. Mas, exatamente em respeito ao caráter plural
do conhecimento que deve existir numa sociedade democrática, a minha
única pretensão é a de que eu seja ouvido (e interpretado em LIBRAS),
nada mais.
Assim, vou desenvolver as minhas reflexões sobre três eixos:
-
os processos de escolarização e a seletividade escolar no Brasil;
-
as políticas de inclusão escolar; e
-
a surdez como patologia ou condição.
Processos
escolar
de
escolarização
e
seletividade
Os processos de escolarização em nosso país, especialmente os voltados
para o período de escolarização obrigatória e da atual educação básica,
têm se caracterizado, via de regra, por seu caráter de seletividade que
dificulta aos membros das camadas populares atingir níveis mais elevados
de escolarização.
Se, no passado, os processos de seletividade se davam pelo não
acesso ou pelas retenções e evasões provocadas pela repetência escolar,
no momento atual, com a ampliação das possibilidades de acesso para a
quase totalidade de crianças com idade de ingresso no ensino fundamental,
e pelos mecanismos de redução da repetência (sistema de ciclos, regime
de progressão continuada, programas paralelos de recuperação, etc.),
esta seletividade se expressa fundamentalmente pelos baixos índices de
aprendizagem que continuam afetando, de forma contundente, os alunos
provenientes dos estratos sociais mais empobrecidos.
Considerando que o fracasso escolar, expresso por formas diferenciadas
de seleção e classificação dos alunos, em diferentes momentos históricos, é
marca constitutiva do sistema escolar brasileiro desde a Independência, os
processos de seletividade escolar têm sido uma das grandes preocupações
que acompanham a produção intelectual sobre a educação escolar desde,
pelos menos, o período republicano, especialmente a partir das primeiras
décadas do século XX.
Dessa forma, a organização do sistema escolar e o desenvolvimento
de processos pedagógicos que respondessem aos interesses da maioria da
população brasileira têm sido as “pedras de toque” para a implementação
de reformas e das análises de proposições políticas desde, pelo menos, o
advento da República.
Sob a mesma justificativa, se disseminaram propostas educacional-
30
pedagógicas, neste largo período, abrangendo desde a defesa da escola
nova em contraposição ao ensino tradicional, até os atuais Parâmetros e
Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental, Médio e Educação
Infantil, passando por proposições nacionais e/ou locais regionais, como
os antigos Programas de Ensino para a Escola Primária, os trabalhos
produzidos no âmbito do convênio PABAEE2 , pelos Guias e Propostas
Curriculares de diferentes Estados brasileiros.
Por fim, no âmbito das unidades de ensino, foram desenvolvidas práticas
escolares que tiveram, e ainda têm, como núcleo central, a finalidade de
reduzir os índices de fracasso, como a organização de suas atividades
em torno de centros de interesse, de junção de disciplinas, de trabalho
interdisciplinar, de reorganização e remanejamento de turmas e de adoção
de diferentes metodologias de ensino para as distintas disciplinas escolares,
como a adoção da “matemática moderna” ou os processos de alfabetização
baseados em novas correntes teóricas, que vão desde a adoção do “método
global”, até aqueles com base em Ferreiro & Teberosky (1986) ou Vygotsky
(1989 e 1996).
Políticas de inclusão escolar
Se é verdade que a seletividade escolar se abate fundamentalmente
sobre os alunos oriundos das camadas populares, não se pode negar que
o acesso à escola brasileira, da educação infantil ao ensino superior, foi
sendo ampliado de forma significativa, desde o início do século XX, com
a educação básica, em especial o ensino obrigatório, chegando, ao final do
século, a se constituir efetivamente como “escola de massa”, e que hoje
as oportunidades desse acesso são muito maiores do que foram em épocas
passadas.
No momento atual, as políticas educacionais brasileiras, assim como
em praticamente todo o planeta, têm como uma de suas bandeiras mais
significativas a da inclusão escolar de todas as crianças, entre elas as
crianças com deficiência.
Tanto é assim, que parte de literatura acadêmica nacional, que se volta
para análises conceituais e políticas, se refere ao “paradigma da inclusão”,
tecendo críticas sobre as formas de implementação que não se baseiam nos
princípios fundamentais desse paradigma. (Cf. Mrech, 1999). Da mesma
forma, boa parte dessa produção afirma que a inclusão nasceu nos países
escandinavos, passou para os Estados Unidos, se disseminou pelo mundo e
2
Programa de Assistência Brasileiro-Americana ao Ensino Elementar
desenvolvido pelo Centro Regional de Pesquisas Educacionais, de Minas
Gerais, a partir da década de 1950.
31
Anais do Congresso
culminou com a Declaração de Salamanca, em 1994, quando foi instaurado
o novo paradigma, que deveria substituir o da integração, ultrapassado e
conservador.
Se, no entanto, nos reportarmos ao texto original da Declaração,
constataremos que a população que ela denomina como “com necessidades
educacionais especiais” não se confina às pessoas com deficiência, bem
como não há uma referência sequer aos termo “inclusão” e “educação
especial”.
Ao contrário, por considerar que a escola atual, tal como foi sendo
construída historicamente, não conseguiu incorporar com qualidade
uma gama imensa de crianças e jovens com características orgânicas,
psicológicas, sociais e culturais, a Declaração recomenda que seja adotadas
políticas educacionais que efetivem a incorporação de toda e qualquer
criança, desde aquelas que possuem deficiência, até as que apresentam
alguma necessidade temporária, passando pelas minorias étnicas, pelos
meninos de rua, pelas comunidades nômades, etc.
Em nosso país, parece ocorrer uma inversão dessa perspectiva,
quando as próprias orientações oficiais confinam as políticas de inclusão
escolar à educação especial, como se pode verificar na Resolução do
CNE que estabelece as diretrizes nacionais da educação especial, definida
como modalidade que visa garantir a educação escolar e a promover o
desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam
necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da
educação básica. (Brasil. CNE. Resolução n. 02/01, Art. 3º).
Isto é, a resolução emanada do órgão oficial competente amplia o
âmbito da educação especial a todos alunos com necessidades educacionais
especiais. Poder-se-ia, entretanto, argumentar que o Conselho estaria
considerando o termo necessidades educativas especiais como sinônimo
de deficiência, mas não é o caso, quando se verifica que, no inciso I, do
artigo 5º, considera como tal os educandos que apresentam dificuldades
acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento
que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares, de um lado,
ligadas a condições relacionadas a condições, disfunções, limitações ou
deficiências (item “b”) e, de outro, aquelas não vinculadas a uma causa
orgânica específica (item “a”).
Ora, quem são os alunos que apresentam dificuldades acentuadas de
aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento por causas não
vinculadas a um fator orgânico específico? Pelo teor da própria Resolução,
seriam todos aqueles indicados na Declaração de Salamanca, com exceção
das crianças deficientes (crianças bem dotadas; crianças que vivem nas
ruas e que trabalham; crianças de populações distantes ou nômades;
crianças de minorias lingüísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros
32
grupos ou zonas desfavorecidos ou marginalizados), e que não deveriam
ser incluídas no âmbito restrito da educação especial, mas de uma política
global de qualificação da educação nacional que abrangesse, inclusive,
os alunos deficientes, estes sim, atendidos por políticas educacionais que
respondessem às suas características peculiares.
Ao criar uma proposição política ambígua e imprecisa, o CNE
contribui, para a criação ou, no mínimo para a manutenção, de uma
situação de indefinição em relação à instauração de políticas educacionais
que se contraponham àquelas que têm historicamente privilegiado o caráter
seletivo e excludente da educação escolar brasileira.
Mas, além de diminuir a amplitude das recomendações de Salamanca, o
fato de não incluir a inclusão escolar de alunos com deficiência no âmbito
de uma política global de incorporação, pela escola básica, de todas as
crianças e jovens, esta perspectiva contribui, também, para que se continue
a tratar os primeiros como se a única marca que implica na sua exclusão
escolar fosse a da limitação causada pela deficiência, reiterando uma visão
abstrata e a-histórica dessa população, pois que não leva em conta as outras
marcas sociais que constituem a identidade dos sujeitos, em especial as de
classe, raça e gênero.
A surdez: patologia ou condição?
Em contraposição a essa perspectiva, que reduz a problemática da inclusão
escolar à educação especial, o grupo de pesquisa que coordeno na PUC/
SP tem procurado desenvolver investigações, exatamente na inter-relação
entre as marcas advindas da deficiência e a construção da identidade social
desses sujeitos, com privilegiamento daquelas originárias de suas condições
econômico-sociais, de gênero e de raça na expectativa de oferecermos
nossa contribuição para a compreensão mais aprofundada dos processos de
inclusão/exclusão escolar das crianças e jovens com deficiência.
É a partir dessa perspectiva, de procurar analisar a relação entre os
processos de escolarização e a deficiência, não restrito somente às suas
marcas, que apresento algumas reflexões críticas sobre determinados
postulados, hoje hegemônicos, no campo da educação de surdos.
Uma das bases de sustentação da corrente sócio-antropológica
da surdez e do bilingüismo, pelo menos no Brasil, tem sido a crítica ao
conceito da surdez como patologia, porque o conceito de deficiência advém
exclusivamente da medicina.
Vale a pena refletirmos sobre esta afirmativa, pois a crítica ao conceito
3
Publicado originalmente em francês em 1865.
33
Anais do Congresso
de patologia construído pela medicina moderna, tal como encarado por parte
dos defensores do bilingüismo, não leva em consideração que, mesmo nesse
campo, ele foi objeto de polêmicas e de disputas, desde pelo menos o estudo
clássico de Claude Bernard (1978), Introdução à Medicina Experimental3
, até os nossos dias, passando por pensadores como Canguilhem (1982),
Basaglia (1986) e tantos outros. Isto é, dependendo da ótica do teórico,
a patologia, como conceito advindo do saber médico, adquire conotação
muito diversa e até mesmo antagônica.
Porém, do ponto de vista biológico, quem pode fazer avançar o
conhecimento? Segundo as mais avançadas correntes da epistemologia,
Habermas (1989), por exemplo, não cabe nem mais à filosofia fazer a
crítica epistemológica ao conhecimento científico, mas exatamente à
própria disciplina científica, na medida em que o conhecimento de cada
uma delas é hoje tão vasto, complexo e diversificado, que fica praticamente
impossível que uma crítica consistente possa ser feita por pensadores de
fora dela.
De qualquer forma, o que a medicina, no mínimo, pode nos oferecer (e
ela fez precisamente isto) é o conhecimento cada vez mais consistente dos
efeitos sobre o organismo de qualquer tipo de afecção.
Se ela ultrapassou este limite, cabe, sim, fazer a crítica, mas não a todo
e qualquer conhecimento que a ”visão médica” conseguiu produzir nestes
cerca de 400 anos de estudos, investigações e intervenções.
É verdade, entretanto, que a perspectiva médica que se tornou
hegemônica, desde, pelo menos a obra de Bernard, foi a do positivismo,
mas isto não faz com que todo e qualquer saber médico deva ser encarado
como tal.
Da mesma forma que a corrente do bilingüismo, a perspectiva sócioantropológica da surdez nasce da crítica da visão reducionista sobre os
sujeitos surdos, originária da concepção médica e, nesse sentido, contesta
a surdez como patologia, afirmando que ela é uma condição produzida por
uma apropriação viso-manual do mundo que se diferencia do ouvinte.
Apesar de se denominar sócio-antropológica, esta abordagem teórica se
prende exclusivamente ao caráter patológico da surdez: a marca distintiva
entre surdos e ouvintes é de que os primeiros não ouvem e os segundos,
sim, com os últimos sendo encarados como opressores dos primeiros por
imporem uma língua que não corresponde às características destes, o que
Skliar (1997) cunhou de “ouvintismo”.
Ao não levar em consideração as mais diferentes marcas de vida que
levam à construção da identidade social dos indivíduos, entre elas o fato de
que os surdos não ouvem, esta corrente não consegue se desvencilhar de
uma visão reduzida, pois procura produzir conhecimento sobre um sujeito
com base somente em uma única marca: a da surdez. Isto é, fala-se de um
34
sujeito abstrato, que não tem sexo, idade, naturalidade ou nacionalidade,
cujas condições sociais de origem não fazem diferença: são todos membros
de uma mesma comunidade, cujo ponto em comum é somente uma marca,
a da surdez.
Para finalizar, não poderia deixar de me referir a um radicalismo
exacerbado dos defensores do bilingüismo e da corrente sócioantropológica de recusa a qualquer espécie de debate com opositores de
suas perspectivas.
Embora eu não aceite esta atitude sectária e intransigente por parte dos
surdos, ela é compreensível, na medida em que parece que aqueles que não
comungam com essa perspectiva estejam reiterando uma visão estreita e
preconceituosa sobre ele, mesmo que, em nenhum momento, esta tivesse
sido a intenção, mas que pode ser assim interpretada por quem sofre na
carne as discriminações e preconceitos por ser surdo.
O que mais me espanta são profissionais e acadêmicos se recusarem
a ouvir quem não se coaduna com suas idéias, não porque elas fossem
obrigatoriamente melhores, mas porque expressam um sectarismo e uma
intransigência naqueles que, por dever de ofício, deveriam ser os baluartes
da pluralidade de idéias porque, é no embate entre diferentes concepções,
que poderão ser construídas novas perspectivas de análise e de práticas
sociais.
À guisa de fechamento
Para terminar estas breves reflexões, gostaria de apresentar neste
encontro, em que, com certeza, minha posição é minoritária, alguns princípios
básicos que têm norteado as investigações do grupo de pesquisa pelo qual
sou responsável na PUC/SP, em especial aquelas investigações, com base
especialmente nas contribuições de Bourdieu (1998), sobre os processos de
escolarização de alunos surdos. (Cukierkorn, 1996 e 2005; Illiano, 2001;
Santos, 2002; Oliveira, 2005; Souza, 2005; Dantas, 2006; Viana, 2006;
Mendonça, 2007)
Reitero que uma das perspectivas teóricas possíveis, não ultrapassada e
com consistência, é aquela que considera que uma lesão orgânica nos órgãos
dos sentidos (entre eles, o da audição) gera uma limitação, uma deficiência,
enfim, um quadro organicamente patológico.
Segundo, que as comunidades de surdos, na medida em que estabelecem
práticas sociais e relações significativas entre os seus membros são, sim,
produtoras de culturas, aqui entendidas como as sínteses dessas práticas
individuais e coletivas. Entretanto, estas práticas individuais e coletivas não
parecem ser tão distantes, nem completamente distintas, em sua essência,
das manifestações culturais praticadas pelos ouvintes de comunidades
próximas.
35
Anais do Congresso
Terceiro, que o fato de que muitas comunidades de surdos utilizarem
a língua de sinais como padrão lingüístico comum, não pode ser
encarado como uma escolha ético-política, mas como uma decorrência de
determinadas formas de organização social, historicamente construídas,
assim como foram criadas todas as línguas utilizadas pelo homem.
Quarto, que a deficiência auditiva severa ou surdez não é razão suficiente
para que todos aqueles afetados por ela sejam incapazes de se apropriar da
língua majoritária, desde que lhes sejam oferecidas condições e recursos
que favoreçam o acesso a ela.
Quinto, que sujeitos surdos cujas trajetórias pessoais singulares resultaram
na apropriação da língua oral como forma básica de comunicação não podem
ser considerados nem como inimigos da surdez, nem como indivíduos que
não possuem uma identidade adequada. Se considerarmos que a identidade
social é construída nas relações sociais concretas, esses sujeitos têm, sim,
uma identidade, nem melhor nem pior do que aqueles que convivem em
comunidades de surdos, mas simplesmente identidades distintas.
Sexto, que a história dos sujeitos com esse tipo de deficiência não
comprova, de forma nenhuma, que, embora discriminados e vítimas de
preconceitos, eles tivessem sido “oprimidos” pelos ouvintes, como se todos
esses últimos fossem algozes dos primeiros. Na verdade, a história mostra
que os processos de opressão estavam e estão intimamente relacionados a
outros fatores, em especial, aqueles relacionados à origem social.
Oprimidos e quase dizimados foram os índios brasileiros; processos
de opressão se abateram sobre os negros escravos; ambos, pelo caráter
predatório da América colonizada, cuja dívida social está sendo paga de
forma muito distinta, em razão da extrema diferença entre as formas como
essas etnias foram tratadas pelo colonizador branco:
- aos índios, ao lado de uma possível integração na sociedade, deve-se
dar a garantia de preservação de espaço geográfico onde possa preservar
a sua cultura, por se reconhecer que os verdadeiros ocupantes da América
brasileira foram eles, dizimados pela invasão européia;
- aos negros, entretanto, a solução não poderia ser a mesma, porque
eles, de alguma forma, mesmo que à força, também foram invasores, na
condição de escravos; isto faz com que a dívida social deva ser paga na
sua efetiva integração na sociedade brasileira que foi sendo construída,
com suor e sacrifício dos negros colocados sob abjeta condição pelo branco
colonizador.
E aos surdos, qual é a dívida que a “sociedade ouvinte” tem, se
não são, segundo os defensores do bilingüismo, nem índios ou negros, mas
produtores de uma cultura própria que, nas palavras do nosso poetinha
Vinicius de Morais, não é branca, negra, mulata, verde ou amarela, mas uma
cultura à parte de todos esses ouvintes?
36
A resposta?
Não gostaria de terminar estas reflexões pontificando sobre tema tão
controverso, mas não posso deixar de expressar, pelo menos, um princípio
básico que entendo deva ser norteador de toda e qualquer busca de maior
justiça social: não é pelo isolamento e pela preservação de traços culturais
apartados daqueles produzidos pelos ouvintes que estaremos contribuindo
para a construção de uma sociedade crescentemente democrática para todos,
sejam eles surdos ou ouvintes.
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Fontes.
38
CONFERÊNCIAS NACIONAIS
TERAPIA FONOAUDIOLÓGICA NA ÁREA DA
SURDEZ
Cilmara Levy1
O processo fonoaudiológico na área da surdez parece estar em
evidência atualmente. A comunidade surda tem logrado o reconhecimento
da língua brasileira de sinais (LIBRAS) em vários estados e diversas
pesquisas legitimam seu uso, inclusive em propagandas políticas, e, mais
recentemente, ela vem sendo incorporada à grade curricular de faculdades
de fonoaudiologia. De fato, são conquistas importantes. Por outro lado,
as triagens auditivas neonatais (TAN), os sistemas de inclusão escolar
e as concessões de próteses auditivas relevam uma situação diferente.
Ao mesmo tempo em que a surdez passa a ser considerada e sua língua,
reconhecida, parece que não há uma conduta inclusiva em relação ao surdo
por seus iguais, seus familiares e a sociedade, mesmo com o uso de aparelho
e identificando-se a surdez precocemente.
Pensando a historia da surdez através do tempo, a partir de uma
perspectiva mais ampla, que inclua fundamentações teóricas, filosóficas e
políticas, nos deparam com situações que ora favorecem a oralidade, ora
as peculiaridades do surdo e da surdez. Hoje, ela pode ser vista como
resultado o de um esforço coletivo de conhecimento integrado do indivíduo
e de suas conquistas.
No passado, havia vários indicadores de que, de fato, havia ainda muito
a conhecer sobre a surdez, pois não era raro que, surpreendentemente, os
surdos conseguissem aprender – por mérito de preceptores, da familia; e
de seu próprio empenho. Eles representavam uma façanha intelectual de
extraordinária magnitude, não só por seu esforço, mostrando que não eram
incapazes, mas sobretudo pela profundidade incalculável que levou estes
indivíduos a formularem e suscitarem idéias, pensamentos e diretrizes que
imprimiram a toda a filosofia dedicada à diversidade entre as pessoas.
Muitos séculos se passaram, e ainda nos dedicamos a descobrir como
se explica “tamanho esforço intelectual” para se entender a surdez como
singularidade, sobretudo para se partilharem com ela as diferenças entre
ouvir e não ouvir.
Conhecer através da ciência consiste em, por meio da dialética e das
discussões, incluir a capacidade audiológica no sistema maior de saúde
1
PFCMSCSP - Brasil
39
Anais do Congresso
e – aí, sim - situarem-se as triagens auditivas conscientes (grifo meu)
neonatais e as justiças sociais como formas de liberdade – a liberdade de
se expressar através da língua de sinais.
Parafraseando Platão, em linhas gerais, as idéias são a unidade ontológica
da significação, ou seja, o que é o real para alguns não representa uma
essência homogênea para toda a sociedade. Assim, a identificação do ser com
o pensar e as condições do pensar com a determinação do ser é que geram
os paradigmas da interpretação da surdez no individuo e na sociedade, uma
vez que, segundo Berger e Luckmann (1998), a socialização do indivíduo
está intimamente ligada aos modelos que recebe dos familiares e que são
aprovados pela sociedade, numa incessante determinação das identidades
coletivas (Ciampa, 1996). As diferenças – e, entre elas, a surdez - estão
à mercê das oportunidades políticas e sociais, assim como do trabalho
incessante dos pesquisadores dessa área tão polêmica.
E qual é o lugar do terapeuta da surdez nesse imenso complexo de
significações? Acredito que se deva voltar para o trabalho com a linguagem
e se propor interlocutor da família, situando-a e orientando-a no processo
terapêutico, por ser ela a base e a unidade de socialização primária do
indivíduo.
Como fazer o atendimento com a família? Periodicamente e sempre
em função da necessidade da criança; os atendimentos podem ocorrer em
sessões individuais, em grupo ou mesmo em conjunto com a criança. As
prioridades são a teorização da relação, a pontencialização da criança como
um ser capaz e também da mãe, como capaz de ser mãe de uma criança
surda. O aspecto mais importante dessa visão é o resgate do papel de mãe
e/ou pai eventualmente perdido na incerteza de um diagnóstico de surdez.
Parece, a princípio, que os pais são acometidos de “ uma surdez súbita”
da fala dos profissionais sobre a surdez do filho, e é nesse sentido que se
recomenda atendimento e acompanhamento especializado.
Quando se pensa em terapia fonoaudiólogica para a criança surda,
há certos princípios que se devem levar em conta no planejamento dos
atendimentos e que, para muitos autores, são mesmo a chave do êxito
terapêutico :
• Visão: visão clínica do caso - conhecimento geral da criança e de suas
características pessoais, familiares, cognitivas, auditivas, comunicativas e
intelectuais;
• Habilidades: habilidades terapêuticas incluem intuição, agilidade e
criatividade, além de um bom conhecimento do desenvolvimento infantil e
dos interesses da criança;
• Motivação: o entusiasmo em cada sessão e o compromisso com as
seguintes exigem harmonia e um bom relacionamento entre as partes;
• Suporte técnico: é preciso entender a configuração audiológica da
40
criança, à qual se devem adequar as características eletroacústicas do
aparelho indicado e seu benefício. Assim como o monitoramento audiológico
e, se necessário, também um acompanhamento multidisciplinar;
• Planejamento: O planejamento terapêutico se baseia em estratégias
previamente elaboradas baseada a partir da visão clinica.
Se houver falha em algum desses tópicos, rompe-se uma cadeia de
integração, acarretando possivelmente expectativas irreais e prejudicando a
terapêutica. Podem-se evitar confusões, incertezas e frustrações repensandose cada uma dessas etapas, favorecendo-se a conquista do êxito.
Assim, apesar do momento histórico conturbado que envolve as
diversas conquistas dos surdos, não têm sido em vão as angústias de muitos
profissionais que buscam o melhor desempenho terapêutico para essa
população. Que primem a qualidade, o respeito e a merecida consideração
para com esse grupo minoritário.
41
CONFERÊNCIAS NACIONAIS
ADAPTAÇÕES CURRICULARES NO
CONTEXTO DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Rosana Glat1
Este trabalho objetiva refletir, de forma sucinta, sobre as transformações
ou adaptações curriculares subjacentes à proposta de inclusão de alunos
com necessidades educacionais especiais no ensino regular. Em sua
essência a Educação Inclusiva diz respeito à responsabilidade dos sistemas
escolares de oferecer para todas as crianças e jovens, processos de ensinoaprendizagem significativos, tendo como pressuposto o reconhecimento
das diferenças individuais de qualquer origem (GLAT & BLANCO, 2007).
De acordo com a Declaração de Salamanca, Educação Inclusiva significa
que todos os alunos, independente de suas condições sócio-econômicas,
raciais, culturais ou de desenvolvimento, sejam acolhidos nas escolas
regulares, as quais devem se adaptar para atender às suas necessidades.
(UNESCO, 1994).
Nesta direção, a escola não pode mais ser seletiva, mas sim, promover
o acesso e a permanência de todos os alunos, inclusive os que apresentam
deficiências. Para tal, precisa possibilitar aos seus professore e gestores uma
formação continuada; rever sua estrutura, organização, e projeto políticopedagógico; atualizar seus recursos didáticos, metodologias, estratégias
de ensino e práticas avaliativas; e, sobretudo, repensar as suas escolhas
curriculares.
Estas ações são essenciais porque Educação Inclusiva não se resume à
matrícula do aluno com deficiência na turma comum ou à sua presença na
escola. Uma escola ou turma considerada inclusiva precisa ser mais do que
um espaço para a convivência, um ambiente onde ele aprenda os conteúdos
socialmente valorizados para todos os alunos da mesma faixa etária.
Assim, cabe ao professor da classe comum onde este aluno está inserido,
desenvolver ações que garantam sua participação plena nas atividades
cotidianas. Pois o objetivo desta proposta é a possibilidade de ingresso e
permanência do aluno na escola com sucesso acadêmico, e isso só poderá
se dar a partir da atenção às suas peculiaridades de aprendizagem e
desenvolvimento (GLAT e BLANCO, 2007).
Em outras palavras, a inclusão em classes regulares de alunos com
deficiências ou outras condições que afetam a aprendizagem não pode ser
1
42
Porfª Drº Programa de Pós-Graduação em Educação - Universidade do
Estado do Rio de Janeiro
um processo “espontâneo”. Ao contrário, exige reflexão e planejamento
para que sejam identificadas as necessidades de aprendizagem específicas
que ele apresenta em sua interação com o contexto educacional, que as
formas tradicionais de ensino não podem contemplar. Ou seja, não é o
aluno que tem que se adaptar ao contexto educacional (como no modelo
de Integração) mas sim, o ensino deverá ser adequado ao aluno. Este
é o sentido dos conceitos interelacionados de necessidades educacionais
especiais e de adaptações curriculares. E sua compreensão é fundamental
para atender às demandas postas pela escola contemporânea referentes à
diversidade presente em sala de aula.
Necessidades Educacionais Especiais são as demandas especificas de
sujeitos que, para aprender o que é esperado para o seu grupo referência,
precisam de diferentes formas de interação pedagógica e/ou suportes
adicionais: recursos, metodologias e currículos adaptados, bem como
tempos diferenciados, durante todo ou parte do seu percurso escolar
(CORREIA, 1999; BLANCO, 2001). Para Glat e Blanco (2007, p. 26):
O conceito de necessidade educacional especial engloba tanto a especificidade
do aluno em sua subjetividade, como o contexto histórico-cultural em que ele
vive e se constitui. Costumam desenvolver necessidades educacionais especiais,
por exemplo, alunos que migram para comunidades com língua, costumes
e valores diferentes daqueles que já vinham sendo constituídos por eles no
convívio familiar e social. Também são freqüentes, nos alunos das escolas
e sistemas de ensino que oferecem currículos fechados e pouco flexíveis,
sobretudo se estes forem pautados em valores e expectativas das camadas
hegemônicas da população e desvinculados de suas vivências cotidianas.
Necessidades educacionais especiais são, finalmente, apresentadas pelos alunos
com diferenças qualitativas no desenvolvimento com origem nas deficiências
físicas, motoras, sensoriais e/ou cognitivas, distúrbios psicológicos e /ou de
comportamento (condutas típicas) e com altas habilidades.
Embora esses termos sejam muitas vezes utilizados como sinônimos é
importante frisar que necessidades educacionais especiais não é o mesmo
que deficiência. O conceito de deficiência se reporta às condições orgânicas
do indivíduo, que podem resultar em uma necessidade educacional especial,
porém não obrigatoriamente. O conceito de necessidade educacional especial,
por sua vez, está intimamente relacionado à interação do aluno à proposta
ou realidade educativa com a qual ele se depara. Igualmente, necessidade
educacional especial não é uma característica homogênea fixa de um grupo
etiológico também supostamente homogêneo, e sim uma condição individual
e específica; em outras palavras, é a demanda de um determinado aluno em
relação a uma aprendizagem no contexto em que é vivida. Dois alunos com
o mesmo tipo e grau de deficiência podem requisitar diferentes adaptações
de recursos didáticos e metodológicos. Da mesma forma, um aluno que
43
Anais do Congresso
não tenha qualquer deficiência, pode, sob determinadas circunstâncias,
apresentar dificuldades para aprendizagem escolar formal que demandem
apoio especializado (GLAT e BLANCO, 2007).
Assim, para garantir o atendimento às necessidades educacionais
especiais dos alunos, sobretudo aqueles que vêm de um contexto
educacional especializado, a escola regular precisa urgentemente repensar
e redimensionar sua dimensão curricular. Este talvez seja o maior desafio,
e ao mesmo tempo o pré-requisito para a implementação da proposta de
Educação Inclusiva. Pois, independente da causa, se a escola organizar
e desenvolver adaptações curriculares adequadas, as necessidades
educacionais especiais do aluno podem ser transitórias e ele obter sucesso
escolar. Isso não significa que a deficiência esteja “curada”, ou que as
condições emocionais, sócio-familiares ou culturais do aluno tenham se
modificado. Porém, a transformação na prática pedagógica possibilitará
que ele tenha um bom desempenho e integração escolar.
Não cabe no escopo deste texto entrar em uma discussão aprofundada
sobre o conceito de currículo, que é, é variado e múltiplo, e depende da
concepção ou modelo de ensino e escola a ele adjacente. O currículo
corresponde “a um conjunto de intenções, situadas no continuum que vai da
máxima generalidade à máxima concretização, traduzidas por uma relação
de comunicação que veicula significados social e historicamente válidos”
(PACHECO, 1996 apud OLIVEIRA & MACHADO, 2007, p. 37). Uma
outra definição de currículo que dá conta da diversidade e necessidades
educacionais presentes no contexto escolar é a de Mc Laren (1997):
O currículo representa muito mais do que um programa de estudos, um texto
em sala de aula ou o vocabulário de um curso. Mais do que isso, ele representa
a introdução de uma forma particular de vida; ele serve, em parte, para preparar
os estudantes para posições dominantes ou subordinadas na sociedade existente.
O currículo favorece certas formas de conhecimento sobre outras e afirma os
sonhos, desejos e valores de grupos seletos de estudantes sobre outros grupos,
com freqüência discriminando certos grupos, de classe, ou gênero [acrescentase aqui as pessoas com necessidades educacionais especiais] (p. 216).
Com base no exposto, serão a seguir discutidos alguns mais
proeminentes relativos a um currículo inclusivo e as possíveis adaptações
para atender aos alunos com necessidades educacionais especiais incluídos
no ensino regular. Em termos simples, adaptações curriculares são os
ajustes realizados no currículo, para que ele se torne apropriado ao aluno
que apresente necessidades educacionais especiais. Segundo Oliveira e
Machado (2007, p. 36):
As adaptações curriculares, de modo geral, envolvem modificações
44
organizativas, nos objetivos e conteúdos, nas metodologias e na organização
didática, na organização do tempo e na filosofia e estratégias de avaliação,
permitindo o atendimento às necessidades educacionais de todos os alunos, em
relação à construção do conhecimento.
Conforme sistematizado nos Parâmetros Curriculares Nacionais, da
Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação, o currículo
deve ser construído a partir do projeto-político-pedagógico da escola,
envolvendo a identidade da instituição, sua organização e funcionamento,
e o papel que exerce, a partir das aspirações e expectativas da sociedade
e da cultura. O currículo inclui as experiências postas à disposição dos
alunos, planificadas no âmbito da escola, com o objetivo de propiciar o
desenvolvimento pleno dos educandos. Não se deve se fixar no que há de
especial na educação dos alunos, mas flexibiliza a prática educacional,
para atender a todos (BRASIL, 1998). Já as adaptações curriculares são
definidas como:
(…) estratégias e critérios de atuação docente, admitindo decisões que
oportunizam adequar a ação educativa escolar às maneiras peculiares de
aprendizagem dos alunos, considerando que o processo de ensino-aprendizagem
pressupõe atender à diversificação de necessidades dos alunos na escola
(BRASIL, 1998, p. 15).
Para o referido documento as adaptações curriculares, realizam-se em
três níveis:
•
Adaptações no nível do projeto pedagógico (currículo escolar)
que devem focalizar, principalmente, a organização escolar e os serviços
de apoio, propiciando condições estruturais que possam ocorrer no nível de
sala de aula e no nível individual.
•
Adaptações relativas ao currículo da classe, que se referem,
principalmente, à programação das atividades elaboradas para sala de
aula.
•
Adaptações individualizadas do currículo, que focalizam a atuação
do professor na avaliação e no atendimento a cada aluno.
As adaptações curriculares também são classificadas em pequeno
e grande porte. As primeiras, também chamadas de “não-significativas”, são
aquelas realizadas facilmente pelos próprios professores no planejamento
das atividades cotidianas de sala de aula. Servem para ampliar a participação
no processo ensino-aprendizagem de alunos com necessidades educacionais
especiais. As segundas, “significativas”, são as que exigem envolvimento
da gestão e da instituição como um todo. Ou seja, são aquelas que exigem
ações de natureza política, administrativa, financeira.
Convém também diferenciar as adaptações de acessibilidade curricular
45
Anais do Congresso
e as adaptações pedagógicas. As primeiras se referem a acessibilidade de
todos os alunos aos espaços e processos pedagógicos, eliminando barreiras
arquitetônicas, de sinalização e de utilização dos recursos didáticos nas
escolas. Ou seja, incluem as condições físicas, materiais e de comunicação
que a escola proporciona para receber alunos com diferentes tipos de
necessidades especiais e propiciando sua participação em atividades e
desenvolvimento acadêmico (GLAT & OLIVEIRA, 2003; FERNANDES,
ANTUNES & GLAT, 2007). As segundas estão diretamente ligadas às
adaptações pedagógicas realizadas na apresentação dos conteúdos e das
atividades propostas para os alunos. No entanto, é importante enfatizar que
adaptar um currículo não significa empobrecê-lo, mas em rever as estratégias
e recursos usados para que o aluno com necessidades educacionais especiais
possa participar de todas as atividades da escola.
Dias, Silva e Braun (2007, p 108-112), apresentam alguns
exemplos de adaptações curriculares que podem favorecer a aprendizagem
de alunos surdos em situação de ensino regular:
(...) utilizar vocabulário e comandos simples e claros nos exercícios; modificar
o vocabulário, os comandos, as instruções, as questões, principalmente na
hora das avaliações; dar-lhe oportunidades para ler, escrever no quadro, levar
recado para outros professores e colegas; certificar-se de que ele participa das
atividades extra classe; etc. (...) embora sabendo “ler” (ver o significante, a
letra), os alunos surdos muitas vezes não entendem o significado daquilo que
leram, sendo necessário “traduzir”, trocar ou simplificar a forma da mensagem.
Igualmente, na organização de conceitos lógicos matemáticos. (...) Na fase da
alfabetização, é fundamental a representação dos conceitos de forma concreta
e vivenciada, pois o aluno surdo precisa “ver” inicialmente o conceito para
poder compreender seu significado. (..) propor situações a partir do cotidiano
que abordem em suas relações esses conceitos. Em atividades que enfocam
a interpretação de texto, considerando os objetivos para cada ciclo ou série,
também é fundamental o uso de recursos que possibilitem a significação e
contextualização do que se está lendo.
Em síntese, a Educação Inclusiva, demanda que a escola transforme
concepções e práticas tradicionais de educação pautadas no déficit do aluno
para uma concepção curricular flexível e adaptada às suas necessidades
específicas e que propicie a aprendizagem e construção de conhecimentos.
Certamente, a constituição de ambientes de aprendizagem inclusivos
demanda não apenas condições de trabalho adequadas para os educadores,
como também programas de formação inicial e continuada voltados para as
especificidades do desenvolvimento humano.
46
Bibliografia BRASIL. Parâmetros Curriculares: adaptações curriculares – estratégias
para a educação de alunos com necessidades educacionais especiais.
Brasília: MEC/SEESP, 1998.
BLANCO, L. Falando sobre necessidades educacionais especiais. Secretaria
Municipal de Educação do Rio de Janeiro - Instituto Helena Antipoff, Rio
de Janeiro, 2001.
CORREIA, L. de M. Alunos com necessidades educativas especiais nas
classes regulares. Porto – Portugal: Editora Porto, 1999.
DIAS, V. L.; SILVA, V. de A. & BRAUN, P. A inclusão do aluno com
deficiência auditiva na classe regular: reflexões sobre a prática pedagógica.
In: GLAT, R. (Org.). Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio
de Janeiro: Editora Sette Letras, 97-115, 2007.
FERNANDES, E. M.; ANTUNES, K. C. V. & GLAT, R. Acessibilidade
ao currículo: pré-requisito para o processo ensino-aprendizagem de alunos
com necessidades educacionais especiais no ensino regular. In: GLAT, R.
(Org.). Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio de Janeiro:
Editora Sette Letras, 53-64, 2007.
GLAT, R. & OLIVEIRA, E. da S. G. Adaptações Curriculares. Relatório de
consultoria técnica, projeto Educação Inclusiva no Brasil: Desafios Atuais
e Perspectivas para o Futuro. Banco Mundial, 2003. Disponível em http://
www.cnotinfor.pt/inclusiva, acessado em dez./2003.
GLAT, R. & BLANCO, L.de M. V. Educação Especial no contexto de uma
Educação Inclusiva. In: GLAT, R. (Org.). Educação Inclusiva: cultura e
cotidiano escolar. Rio de Janeiro: Editora Sette Letras, 15-35, 2007.
MCLAREN, P. A vida nas escolas – uma introdução à pedagogia crítica nos
fundamentos da Educação. Artes Médicas, Porto Alegre, 1997.
OLIVEIRA, E. da S. G. & MACHADO, K. Adaptações curriculares: caminho
para uma educação inclusiva. In: GLAT, R. (Org.). Educação Inclusiva: cultura
e cotidiano escolar. Rio de Janeiro: Editora Sette Letras, 36-51, 2007.
UNESCO, Declaração de Salamanca e Linha de Ação sobre Necessidades
Educativas Especiais. Brasília: CORDE, 1994.
47
CONFERÊNCIAS NACIONAIS
POSSIBILIDADES DE ESCRITA
PELOS SURDOS
Marianne Stumpf
Para compreender a leitura é preciso haver uma complementação entre
o conhecido, que está na nossa cabeça, e o desconhecido, que está no papel;
entre o que está atrás e o que está diante dos olhos.
Teatro, narrativas, literatura surda em geral, só podem ser escritos após
serem vertidos para uma língua falada, mesmo quando criados originalmente
em língua de sinais. Os surdos não podem construir sua própria escrita de
acordo com sua maneira de sinalizar.
As pessoas surdas também acham a língua de sinais, como qualquer outra
língua, uma maneira poderosa de expandir sua criatividade e prazer artístico.
Teatros nacionais de surdos em vários paises fizeram programas de grande
sucesso. Artistas surdos têm conseguido mostrar linguagem de sinais em suas
pinturas, ilustrações ou trabalhos esculturais. Pessoas surdas de talento criam
poesia e humor em língua de sinais. (YERKER, Anderson, ex-presidente da
FMS, 1981).
A escrita, o poder e a tecnologia são parceiros nas narrativas ocidentais
da origem da civilização. A Cultura Surda está minimamente registrada,
porque as situações que os surdos vivem não conseguem escrever em sua
própria língua.
Passadas mais de quatro décadas dos movimentos surdos, respaldados
pelos achados científicos, estarem mobilizados em favor do respeito à
sua especificidade cultural e lingüística, o processo mostra dificuldade de
avançar e por em prática aquilo que os surdos consideram seu direito: o de
aprender e se expressar em sua própria língua e desenvolver, já a partir da
escola, sua própria cultura.
O desenvolvimento intelectual e cultural das comunidades surdas tem
evoluído e o caminho natural dessa evolução passa pela aquisição de uma
escrita própria que pode proporcionar o acesso a um novo patamar em
suas expressões culturais e comunicativas. Com a aprendizagem de uma
escrita de sinais, os surdos vão ter a oportunidade de desenvolver uma nova
cultura, que é a cultura surda escrita, um pouco diferente da cultura surda
sinalizada.
As lideranças surdas, embora reconheçam o avanço que constituiu
validar a língua de sinais, e o esforço feito pelos responsáveis pelo ensino
48
especial para qualificar a Educação dos Surdos no Brasil, pontuam que
as mudanças precisam ser estruturais. O poder de decisão nas escolas e
classes para surdos continua só com os ouvintes e os surdos ainda são
vistos, em muitas escolas, apenas como instrutores de língua de sinais, ainda
assim, substituíveis por professores ouvintes que muitas vezes, dominam
muito mal essa língua. Ao mesmo tempo os artefatos da cultura surda,
preponderantemente visuais, estão ausentes das salas de aulas. A inclusão,
conceito bonito e desejável pode funcionar como exclusão. Exclusão da
plena comunicação e da real participação.
Os professores surdos representam para a criança surda um modelo
adulto e é importante que ela possa formar o conceito de que a pessoa surda
pode ser um adulto viável, pode liderar, pode agir com independência,
pode exercer um papel relevante na sociedade. As sutilezas do poder e
as implicações do mesmo com as responsabilidades dele derivadas, bem
como, a maioria das percepções importante para o jogo da vida, só podem
ser percebidas e exercitadas entre iguais. Sem a possibilidade de construir
sua identidade a pessoa surda fica para sempre imatura e dependente.
Na educação de surdos, além do deslocamento cultural entre professor e
aluno, ainda se intensifica a distância por não se compartilhar o mesmo código
lingüístico, incluindo aquelas escolas que consideram a língua de sinais, mas
que, no entanto não a vivem de forma efetiva. (Giordani, 2003. pg. 58)
No século XIX, Bébian1 (1817) escreveu que, em seus numerosos
trabalhos havia traçado um caminho para a educação dos surdos e que,
outro, mais hábil, ou mais bem assessorado, encontraria o fim desse
caminho. Sua posição era equilibrada, realista e moderna. Ele não pode
ser reduzido apenas a um defensor dos sinais, era sim, partidário de uma
educação que começando pelos sinais, pois dizia, essa é a única maneira de
comunicação com uma criança surda, chegaria à maioridade com o surdo
possuidor de duas línguas: a língua de sinais, inclusive escrita, e a língua
de seu país, esta somente na sua forma escrita. Bébian predisse, mas foi
necessário chegarmos aos anos 60 para que os trabalhos do americano
William Stokoe retomassem o caminho esboçado por ele.
As notações de lingüistas e o SignWriting
Stokoe (1919 – 2000) e a sua equipe de lingüistas da Universidade
Gallaudet, a quem devemos o estabelecimento do caráter lingüístico das
Bébian – professor surdo francês, publicou - Essai sur les sourds-muets,
1817
1
49
Anais do Congresso
línguas de sinais, criaram uma notação para escrever os sinais. Outros
lingüistas, como Neve e Jouison, igualmente criaram seus próprios sistemas
de escrita dos sinais, mas eles não tinham o objetivo de que servissem para
o uso comum dos surdos e sim o objetivo de atender a necessidades de
estudo das línguas de sinais.
O sistema de escrita para línguas de sinais denominado SignWriting foi
inventado há cerca de 30 anos por Valerie Sutton sua origem está em um
sistema que a autora criou para notar os movimentos da dança. Atendendo
pedidos de grupos de surdos, a autora começou a trabalhar com eles na
adaptação do sistema a escrita das línguas de sinais.
Conforme as publicações do DAC2 o sistema pode representar línguas
de sinais de um modo gráfico esquemático que funciona como um
sistema de escrita alfabético, em que as unidades gráficas fundamentais
representam unidades gestuais fundamentais, suas propriedades e relações.
O SignWriting pode registrar qualquer língua de sinais do mundo sem
passar pela tradução da língua falada. Cada língua de sinais vai adaptá-lo a
sua própria ortografia. Para escrever em SignWriting é preciso saber uma
língua de sinais.
O sistema comporta aproximadamente 900 símbolos. Entre esses
símbolos, muitos trazem mais precisão à notação dos símbolos gestuais,
mas não são indispensáveis à compreensão de um enunciado escrito por um
locutor de uma determinada língua de sinais. A quantidade do número de
símbolos que o SignWriting coloca para a notação dos elementos manuais
revela a complexidade desses movimentos na composição das línguas de
sinais.
Quais elementos são pertinentes, qual o status que ocupam em uma
determinada língua de sinais, se eles têm sentido, ou não, são perguntas
que não têm uma única resposta. Essas perguntas, são os surdos usuários do
sistema que ao correr do uso, poderão ir respondendo, e/ou modificando.
Cada língua de sinais precisará ir construindo suas próprias respostas.
A Dra. Boutora, lingüista francesa, descreve assim a apresentação
gráfica de um signo pelo sistema SignWriting:
“Retângulos virtuais compreendem um conjunto de símbolos alinhados
verticalmente. Um conjunto de símbolos representa um signo, quer dizer uma
unidade lexical eventualmente associada a um complemento de informações
gramaticais, os signos são separados por um espaço. No interior de um “signo
etiqueta” ou “pilha”, os símbolos são colocados verticalmente segundo a
lógica do corpo humano. Assim o círculo que configura a cabeça suporta os
símbolos que representam os elementos manuais. Os elementos não manuais
2
50
Deaf Action Committee For SignWriting – www.signwriting.org
(essencialmente os movimentos da face e o olhar) são inscritos dentro do círculo
cabeça.” (Boutora, 2003, pg. 80).
Estrutura do sistema SignWriting - Representação da sinalização e da
espacialização
As línguas de sinais utilizam três dimensões espaciais
essencialmente para a marcação das relações sintático-semânticas. O
sinalizador atribui a um lugar, uma data ou um protagonista do enunciado
uma porção do espaço de sinalização. Com esse procedimento ele cria um
referencial espacial, temporal de atuação. Quando a porção do espaço está
demarcada ela é apontada pelo sinalizador cada vez que ele precisar fazer
referência ao objeto que ele colocou lá. Em teoria, podemos criar quantos
referenciais sejam necessários para o discurso.
O marco teórico dos criadores do SignWriting propõe que os elementos
do signo escrito são equivalentes aos fonemas ou sons da língua oral.
Consideram estes elementos gráficos como letras. A criação do SignWriting
foi muito influenciada pela pesquisa lingüística que procurava transcrever
os elementos identificáveis da língua.
Boutora apóia a afirmação de que é uma escrita alfabética em que os
sinais podem ser decompostos em elementos, como as palavras em sílabas,
que correspondem aos diferentes sons da língua e os elementos do símbolo
escrito, aos diferentes movimentos dos sinais. Estes, quando escritos
formam o símbolo que permite uma leitura de reconhecimento rápido.
Uma percepção global icônica. A questão permanece aberta, mas coloca a
hipótese de que o SignWriting é um sistema de escrita analisável em dois
níveis, do ponto de vista interno e de um ponto de vista externo.
• Do ponto de vista interno que nos coloca ao nível dos elementos
gráficos mínimos, caracterizamos o sistema de ideofonográfico, composto
de signos fonéticos, os elementos gráficos que anotam a articulação, e
de signos “ideográficos” aqueles que anotam a prosódia. Até aqui se
assemelham às escritas ocidentais com dominância fonográfica.
• Do ponto de vista externo, colocado ao nível de uma figura que
percebemos globalmente, caracterizamos o sistema de ideográfico.
Na última versão do SignPrinting3, a notação e leitura do texto se efetua
em colunas da esquerda para a direita. Uma coluna comporta três trilhos:
O trilho do meio representa o eixo central que passa pela cabeça e o meio
do corpo em posição neutra; os trilhos da esquerda e da direita permitem
3
http://www.signwriting.org/forums/software/lisbon/lisbon01.html g
51
Anais do Congresso
delimitar duas sub-colunas simétricas em relação à trilha central. Essas
duas sub-colunas e os dois trilhos externos servem para criar referências
de deslocamentos em relação à posição neutra do corpo e da cabeça.
Passamos a dispor então de quatro posições possíveis sobre um mesmo
eixo horizontal. Essa escrita em colunas procura solucionar o interrogante
de como escrever uma língua tridimensional num espaço plano como é o
papel.
O trabalho de adaptação do SignWriting à Libras foi a primeira etapa
de uma caminhada que a comunidade surda brasileira, com o apoio de
pesquisadores, deverá empreender para conseguir uma escrita que dê conta
de todas as suas necessidades em sua própria língua.
O projeto SignNet
Este projeto se propôs a adaptar a tecnologia da Internet para as
línguas de sinais e à educação dos surdos, tinha como objetivo criar as bases
do processamento de Línguas de Sinais e ampliar as bases da Lingüística
Computacional de Sinais. Surgiu na PUCRS em 1996.
Foi um projeto de educação na informática voltado para difundir
o sistema de escrita SignWriting na Comunidade Surda do Brasil. Com
essa finalidade foi desenvolvido um software para apoio ao uso do sistema
a partir de uma investigação das características gerais de um sistema de
escrita de línguas de sinais e uma investigação sobre a aquisição da escrita
de línguas de sinais estimulando a produção de literatura impressa em
SignWriting.
O fundamento pedagógico da proposta consiste na proposição de que,
se é verdade que as línguas de sinais são as línguas naturais dos surdos,
então a alfabetização dos mesmos deve ser feita preferencialmente nessas
línguas e não nas línguas orais das sociedades em que eles vivem. No caso
do Brasil, isso significa que a alfabetização dos surdos deve ser feita na
Libras (Língua Brasileira de Sinais).
Deste projeto participaram: bolsistas pesquisadores de pedagogia e
lingüística, pesquisadores da área da informática, professores de escolas
surdas e de escolas regulares, intérpretes e a comunidade surda.
O efeito multiplicador do Projeto se mostra em duas direções:
na formação de alfabetizadores de línguas de sinais escritas e na difusão
dos softwares desenvolvidos para processamento de textos em línguas de
sinais
O Projeto resultou em diversas contribuições relevantes para a
questão da Educação dos Surdos, colocou a equipe em posição de destaque,
relativamente ao tema da escrita de línguas de sinais, difundiu a necessidade
de os surdos pensarem sobre esse tema e forneceu produtos concretos que
52
poderão ter utilização prática na educação de surdos, no fortalecimento da
cultura surda e na integração social dos surdos. Houve um deslocamento
da ênfase do Projeto, em relação à proposta inicial. O Projeto acabou tendo
um viés muito mais tecnológico, de desenvolvimento de produtos, do que
previsto inicialmente. Alguns dos objetivos de caráter mais conceitual
foram abandonados em favor dessa ênfase mais pragmática
A questão da Educação dos Surdos, colocou a equipe em posição
de destaque, relativamente ao tema da escrita de línguas de sinais, difundiu
a necessidade de os surdos pensarem sobre esse tema e forneceu produtos
concretos que poderão ter utilização prática na educação de surdos, no
fortalecimento da cultura surda e na integração social dos surdos. A
posteriori, essa escolha se mostrou muito positiva: o sentido pragmático
que o Projeto adquiriu impulsionou com força as atividades em torno da
escrita de língua de sinais, permitiu a inclusão efetiva de bolsistas surdos,
aproximou a equipe da comunidade internacional do sistema SignWriting
(quase toda ela formada por professores e pesquisadores efetivamente
envolvidos com questões práticas de educação de surdos) e possibilitou
a criação de uma base de software concreta de software, que poderá ser
difundida e tornada realmente útil para a comunidade surda.
Experiências
A escrita precisa ser uma atividade significativa para a criança. Pudemos
observar que no ambiente de uma classe de surdos, onde o professor e os
colegas se comunicam em língua de sinais, as crianças efetivamente tentam
escrever os sinais quando estimuladas a isso.
O SignWriting é para a criança surda “visualmente fonético” ou uma
escrita visual em perfeito acordo com as suas potencialidades. Como a
criança ouvinte constrói na escola suas aprendizagens da língua oral com
o concurso da língua escrita e, por essa construção, acede a níveis cada
vez mais elevados de conhecimento. Assim também, para a criança surda,
aceder à escrita de sua língua de sinais significa dotá-la de uma ferramenta
indispensável para qualificar seu grau de participação na cultura e na
sociedade. A população surda hoje é marginalizada, pois em sua quase
totalidade funcionalmente analfabeta, em uma sociedade cada vez mais
dependente da palavra escrita.
O oferecimento de um sistema democrático e participativo de vida,
dentro da sala de aulas, que respeita e olha o aluno, enxergando-o como
ele é, a comunicação estabelecida em sua língua natural para realizar um
trabalho comum, propicia que o próprio grupo gere regras de convivência
e aceite com seriedade a necessidade de atenção e respeito para que se
configure um espaço de trabalho produtivo. Começam a observar os
53
Anais do Congresso
símbolos apresentados pela pesquisadora e vão conseguindo diferenciá-los
qualitativa e quantitativamente, compreendem que eles correspondem aos
sinais da Libras e aprendem a estabelecer correspondência entre os sinais
e os símbolos do SignWriting.
A decomposição do sinal escrito, relacionando os diferentes elementos
gráficos mínimos, representados pela escrita, com os elementos fonológicos,
morfológicos, sintáticos e semântico-pragmáticos da língua sinalizada
permite ao aprendiz compreender o processo e tentar construir sua própria
escrita.
O sistema de representação SignWriting apenas começa a ser usado
pela população surda e seu uso precisa ser acompanhado por pesquisas
de lingüistas que possam observar e procurar soluções cada vez mais
econômicas para sua utilização. Também por estudiosos de pedagogia e
informática, pois sua vocação é ser uma ferramenta acessível ao surdo em
sua relação com o computador que terá também o poder de instrumentalizar
sua interação com os ouvintes pela possibilidade da tradução eletrônica
para a língua oral.
O uso do recurso computador traz a possibilidade às pessoas surdas de
uma alternativa de comunicação e incorpora novas tecnologias ao processo
de aprendizagem das crianças. A utilização de um editor de textos como
o Sign Writer ou o SW-Edit nas aulas para introdução às TI traz a essas
aulas muito maior interesse do que quando usamos o editor de textos em
português. Também as produções das crianças são mais sofisticadas. Essas
ferramentas, no entanto, tem limitações que podem ser ultrapassadas, pois
a evolução da informática possibilita esse salto de qualidade.
Bibliografia
ANDERSSON, Yerker. A Cross-cultural comparative study: Deafness.
Unpublished doctoral dissertation. College Park, Maryland: University of
Maryland. 1981.
BEBIAN, Roch A A . Essai sur les sourds-muets et sun lê language naturel.
Paris, Dentu, imprimeur-libraire, 1817.
BOUTORA, Leila. Étude des systèmes d´écriture des langues vocales et
des langues signées. Paris: Mémoire de D.E.A. des Sciences du Langage
– Université Paris VIII, 2003.
COSTA, Antônio Carlos da Rocha. SignNet: adaptando as tecnologias
da Internet para as linguagens de sinais e a educação de surdos. Projeto
submetido ao Edital CNPQ-Protem 01/99. 1999.
54
GIORDANI, Liliane F. “Quero escrever o que está escrito nas ruas”:
representações culturais da escrita de jovens e adultos surdos. Tese de
Doutorado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre,
2003.
SUTTON, Valerie. SignWriting: Manual. [online] disponível em www.
signwrting.org, 1996. Consultado em outubro de 1996.
STUMPF, Marianne Rossi. Aprendizagem de Escrita de Língua de Sinais
pelo sistema SignWriting: Línguas de Sinais no papel e no computador
/Porto Alegre: UFRGS, CINTED, PGIE, 2005.
Marianne Rossi Stumpf [email protected]
Professora Adjunta – UFSC
Diretora de Políticas Educacionais -FENEIS
55
Painéis Internacionais
PAINEL INTERNACIONAL
INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE
SURDOS
Solange Rocha
Fundado em 1857
O Instituto Nacional de Educação de Surdos foi criado em meados do
século XIX por iniciativa do surdo francês E. Huet. Em junho de 1855, Huet apresenta ao Imperador D. Pedro II um relatório
cujo conteúdo revela a intenção de fundar uma escola para surdos no
Brasil e também informa da sua experiência anterior como diretor de uma
instituição para surdos na França. O governo imperial apóia a iniciativa de
Huet e destaca o Marquês de Abrantes para acompanhar de perto o processo
de criação da primeira escola para surdos no Brasil.
O novo estabelecimento começa a funcionar em 1º de janeiro de 1856,
mesma data em que foi publicado o programa de ensino, apresentado por
Huet, o qual compreendia as disciplinas de língua portuguesa, aritmética,
geografia, história do Brasil, escrituração mercantil, linguagem articulada,
doutrina cristã e leitura sobre os lábios. Até o ano de 1908 era considerada
a data de fundação do Instituto o dia 1º de Janeiro de 1856.
A mudança deu-se através do artigo 7º do decreto nº. 6.892 de 19 de
março de 1908 que transferiu a data de fundação para a da promulgação da
Lei 939 de 26 de setembro de 1857 que em seu artigo 16, inciso 10, consta
que o Império passa a subvencionar o Instituto. Antes desse decreto, os
alunos eram bolsistas de entidades particulares ou públicas.
No seu percurso de quase dois séculos, a instituição respondeu pelas
denominações de Instituto de Surdos-Mudos e Imperial Instituto dos
Surdos-Mudos, no séc. XIX; Instituto Nacional de Surdos Mudos, com o
advento da República e, no ano de 1957, ocasião de seu primeiro centenário,
passou à denominação de Instituto Nacional de Educação de Surdos, assim
permanecendo até os dias de hoje.
A substituição da palavra Mudo pela palavra Educação refletia o ideário
de modernização da década de 50 no Brasil, no qual o Instituto e suas
discussões sobre educação de surdos também estavam inscritos.
Em razão de ser a única instituição de educação de surdos em território
brasileiro e mesmo em países vizinhos, por muito tempo, o INES recebeu
alunos de todo o Brasil e do exterior, configurando-se em uma Instituição de
referência para os assuntos de educação, profissionalização e socialização
de surdos. A comunicação gestual, hoje reconhecida como LIBRAS, Língua
Brasileira de Sinais, de forte influência francesa em função da nacionalidade
57
Anais do Congresso
do fundador do instituto, foi espalhada por todo Brasil pelos alunos que
regressavam aos seus Estados quando do término do curso. Em 1875, o ex-aluno do Instituto Flausino José da Gama desenha o
livro Iconographia dos Signaes dos Surdos-Mudos contribuindo para a
difusão dessa língua.
Nas décadas iniciais do século XX, o Instituto oferecia, além da
instrução literária, o ensino profissionalizante. A terminalidade dos estudos
estava condicionada à aprendizagem de um ofício. Os alunos freqüentavam,
de acordo com suas aptidões, oficinas de sapataria, alfaiataria, gráfica,
marcenaria e também artes plásticas e bordado.
Por muito tempo, o trabalho realizado na gráfica do Instituto foi
referência no Rio de Janeiro recebendo encomenda de encadernação de
quase todas as instituições públicas e particulares das primeiras décadas
da República.
As questões relativas ao ensino para alunos surdos sempre foram objeto
de muita polêmica, situação essa agravada pelos resultados do Congresso
realizado em Milão em 1880, os quais indicaram a oralização do surdo como
o modo mais adequado de educá-lo, condenando a utilização dos gestos no
processo de ensino. Essa indicação foi muito criticada por alguns professores
e alunos que reconheciam a importância e a legitimidade da comunicação
pelos gestos. A
principal crítica que se fazia a oralização era de que ela demandava um
tempo enorme de treinamento da fala e dos resíduos auditivos, concorrendo
com a escolarização formal que ia sendo abandonada pela importância que
era dada à expressão pela palavra oral. Essa perspectiva de escolarização
não tinha como prioridade o ensino e sim o desenvolvimento da fala. Os incipientes resultados dessa abordagem oralista para a educação
dos surdos, que demandavam ensino público de massa, estimularam o
surgimento, em meados da década de 80, do século XX, de um movimento
transnacional, contando com acadêmicos, profissionais da área da surdez
e dos próprios surdos no sentido de apontar outros caminhos para a sua
escolarização e socialização. Com apoio de pesquisas realizadas na área da lingüística que conferiu
status de língua à comunicação gestual entre surdos, esse movimento ganha
corpo. Já no final dos anos 80, no Brasil, os surdos lideram o movimento
de oficialização da LIBRAS.
Em 1993,
um projeto de Lei da então senadora Benedita da Silva deu início a uma
longa batalha de legalização e regulamentação da LIBRAS em âmbito
federal.
Atualmente, a Lei já está regulamentada e o debate continua aberto.
As discussões avançam em direção ao novo desafio que trazem as atuais
políticas públicas educacionais para surdos. Por um lado, a proposta de
58
inclusão, que é o acesso a qualquer ambiente escolar sem nenhuma restrição
aos alunos surdos que podem e devem ser matriculados em classes regulares
junto com ouvintes. Por outro lado, a regulamentação da lei da LIBRAS
indica que o ensino de português deve ser oferecido como segunda língua
e a língua de sinais como língua de instrução.
O Instituto, único em âmbito federal, ocupa importante centralidade
nessas discussões, promovendo fóruns de debates, publicações, seminários,
pesquisas e assessorias em todo território nacional. Possui uma vasta
produção de material pedagógico, fonoaudiológico e de vídeos em língua
de sinais, distribuídos para os sistemas de ensino.
Atualmente, além de oferecer no seu Colégio de Aplicação, educação
precoce (O a 3 anos), ensinos fundamental e médio, oferece também a
possibilidade de formar profissionais da educação, surdos e ouvintes, no
Instituto Superior Bilíngüe recém inaugurado, experiência essa pioneira na
América Latina.
Rio de Janeiro, 17 de maio de 2007
Solange Rocha
Professora do INES, Historiadora
Doutoranda em Educação pela PUC-RJ
59
PAINEL INTERNACIONAL
ORIGINES HISTORIQUES DE LA DÉMARCHE D’ERNEST HUET, FONDATEUR DE
I’INES EN 1857
Jean François Dutheil1
Avant de débuter cet exposé, je voudrai remercier très chaleureusement
les organisateurs de ce congrès et tout particulièrement M. Marcelo Ferreira
De Vasconcelos Cavalcanti, directeur général de l’INES pour la qualité de
son accueil. Je suis véritablement très touché et particulièrement honoré de
cette invitation. J’ai compris dès notre premier contact au téléphone à quel
point ce rattachement à l’institut de Paris au travers la création par Ernest
HUET de l’INES en 1857 était important pour mes amis brésiliens.
On sait peu de choses malheureusement d’Ernest HUET, professeur
sourd à ce qui s’appelait à l’époque « Institution impériale des sourdsmuets de Paris ». Les archives de l’Institut National de Jeunes Sourds
de Paris (INJS), appellation actuelle de cette maison chargée d’histoire,
sont malheureusement muettes concernant le fondateur de l’INES. Des
recherches effectuées aux Archives Nationales à Paris n’ont pas non plus
donné de résultats. De même, l’amicale des anciens élèves de l’INJS, fondée
en 1937 et dépositaire d’archives et de documents importants de l’histoire
de la surdité, notamment la liste des banquets organisés au XIXème siècle
dont je reparlerai, ne possède aucun élément sur Ernest HUET. Je regrette
de décevoir mes amis brésiliens sur ce point qui je sais est très important
pour eux. Il nous faut progresser encore dans la connaissance historique,
malgré les nombreux travaux qui ont déjà été réalisés. Je donnerai tout de
même quelques éléments à la fin de mon exposé mais il est possible qu’ils
soient déjà connus au Brésil. Cela peut-être un élément du partenariat que
nous allons développer avec l’INES suite à l’événement qui nous réunit
aujourd’hui.
A défaut de pouvoir reconstituer une biographie du fondateur de
l’INES, je me propose d’illustrer, au travers des personnages qui l’ont
précédé depuis l’Abbé de l’Epée dont certains ont eu un rayonnement
mondial durable, le mouvement qui a fondé la démarche exemplaire
d’Ernest HUET. Le XIXème siècle, plus précisément la période 17601880, a été une période unique dans l’histoire de l’éducation des jeunes
sourds, période de développement, de recherches, d’expérimentation de
méthodes nouvelles, d’échanges entre les spécialistes de différents pays.
Cette période a été marquée en France par la présence active des personnes
60
sourdes dans l’enseignement spécialisé et par un fort développement
de la vie associative dans la communauté sourde. L’Abbé de l’Epée
a véritablement ouvert une ère d’émancipation et d’insertion sociale
des sourds. C’est ce bouillonnement d’idées et d’initiatives qui a rendu
possibles les initiatives prises par de nombreux professionnels, notamment
des sourds, pour créer des institutions dans d’autres pays dont le Brésil. Ils
ont été de fait nombreux à émigrer pour créer une éducation spécialisée là
où elle n’existait pas encore.
1. Le fondateur : Charles Michel de l’Epée,
Abbé de l’Epée (1712-1789)
L’Abbé de l’Epée est connu dans le monde entier comme le bienfaiteur
des sourds. Il n’a pas tout créé puisque plusieurs personnages se sont
intéressés avant lui à l’éducation des enfants sourds. On peut citer
notamment :
­
Pedro Ponce de Leon (1520-1584)
­
Juan Pablo Bonnet (1579-1623), initiateur des méthodes
d’éducation orale
­
John Wallis (1616-1703), utilisateur de langue écrite
­
Johann Conrad Amman (1669-1724), qui a accordé une importance
prédominante à l’articulation en refusant l’emploi de tout signe gestuel
­
Jacob Rodrigues Pereire (1715-1780) qui s’est intéressé
particulièrement à la démutisation des sourds-muets
­
Samuel Heinicke (1727-1790) met en œuvre une éducation
centrée sur l’expression orale ce qui lui vaut une controverse avec l’Abbé
de l’Epée
­
L’abbé Etienne-François Deschamps (1745-1791), initiateur d’une
méthode mixte et auteur de plusieurs ouvrages.
Du XVIème au XVIIIème siècle, les pionniers de l’éducation des sourds
sont pour la plupart entendants et précepteurs d’enfants de familles riches.
Ils n’ont pas de véritable contact avec la communautré sourde.
L’Abbé de l’Epée va fonder à Paris en 1760 la première véritable école
ouverte aux enfants sourds de toutes conditions sociales. Il est par ailleurs
le premier à avoir compris l’importance du jeu et de la communication
visuelle et gestuelle dans l’instruction comme dans la vie quotidienne des
enfants sourds. Ces deux éléments fondent la vénération dont il est encore
l’objet aujourd’hui et marqueront l’éducation des enfants sourds d’une
empreinte indélébile.
Pour comprendre la démarche de l’Abbé de l’Epée, il nous faut évoquer
ses options religieuses et philosophiques. Dès son plus jeune âge et jusqu’à
1 Instituto
Nacional de Jovens Surdos de Paris – França.
61
Anais do Congresso
sa mort, il fut un adepte du jansénisme, donc d’un idéal de vertu et de piété
austère, d’amour de la pauvreté et de tolérance. Cela lui valut beaucoup de
difficultés avec l’église et une quasi interdiction de parole. Il s’est voué à
la défense des pauvres lorsqu’il fut mis en présence de deux jeunes sœurs
sourdes et muettes. Influencé par Saint Augustin, il pense que le langage
est le résultat d’une convention humaine, qu’il est un ensemble de signes
arbitraires marqué par l’intention de montrer ses sentiments, perceptions
et pensées et que l’intelligence ne grandit pas uniquement à partir de
l’apparition de la parole. Saint Augustin place au même niveau les signes
et la parole, étant même réservé sur la capacité de cette dernière à exprimer
ce que le cœur ressent.
En observant les sœurs jumelles, l’Abbé de l’Epée aperçut leurs signes
imitatifs et descriptifs motivés par la forme des choses, l’action et la nature
des idées : il ne douta guère qu’il venait de découvrir enfin des signes
naturels par excellence. Il lui restait à les organiser en une langue ayant droit
de cité. Cette approche était identique à celle des philosophes de la même
époque (Diderot, Condillac) pour lesquels, et c’est la grande leçon d’espoir
du XVIIIème siècle, il n’existait aucun obstacle à l’intelligence humaine.
Par ailleurs, la philosophie des Lumières (Jean-Jacques ROUSSEAU)
valorisait la nature et donc les gestes.
L’Abbé de l’Epée ouvre donc une école publique et gratuite dans sa
maison familiale en 1760. Il met en œuvre une méthode basée sur des signes
méthodiques traduisant toutes les idées de l’esprit humain ordonnées selon
la syntaxe du français. Il écrivit deux livres : « L’institution des sourds
et muets par la voie des signes méthodiques » et « La véritable manière
d’instruire les sourds et muets, confirmée par une longue expérience ».
Il ne bénéficia pas d’un réel soutien du roi Louis XVI en raison des
ses positions jansénistes. Il mourut le 23 décembre 1789. La Révolution
Française lui rendit hommage. En effet, par décret de l’Assemblée
Nationale du 10 au 14 septembre 1791, l’institution nationales des sourds
de naissance fut créée et l’Abbé de l’Epée placé au rang de ceux des
citoyens qui ont le mieux mérité de l’humanité et de la patrie. L’institution
des sourds s’installa en 1794 dans les locaux de la rue Saint Jacques où elle
se trouve encore aujourd’hui.
La Révolution ne s’y est pas trompée : l’Abbé de l’Epée a véritablement,
en s’appuyant sur la religion et l’humanité, voulu permettre aux sourds
de sortir de leur condition d’exclusion pour accéder véritablement à
la citoyenneté. Ce message reste actuel pour toutes les personnes qui
s’occupent de l’éducation des jeunes sourds. Bien sûr des progrès importants
ont été accomplis depuis l’époque de l’Abbé de l’Epée, mais il reste encore
beaucoup à faire, y compris dans les pays riches et développés pour garantir
aux sourds une égalité d’accès à la formation et dans le domaine du travail.
62
Une récente étude du ministère de la Santé en France l’a bien montré.
Après la mort de l’Abbé de l’Epée et à partir de son œuvre et de
son message, s’ouvre comme je l’ai dit en introduction une période
d’une grande richesse pour l’éducation des enfants sourds, même, et j’y
reviendrai, si certaines des nombreuses méthodes développées ont entraîné
beaucoup de souffrances. Les directeurs, les enseignants et les médecins
se succèdent à l’institution de Paris. Certains ont véritablement marqué
l’histoire de la surdité au travers d’une influence internationale durable et
d’autres ont mené des travaux qui ont influencé de manière importante le
développement de la médecine.
2. Les médecins
L’abbé Sicard, successeur de l’abbé de l’Épée, sut donner l’école
de Paris pour modèle en France, en Europe et notamment dans les pays
scandinaves, et en Amérique. À l’éducation oraliste individuelle, réservée
jusqu’alors aux familles nanties, s’ajouta une instruction par les signes
dans les établissements nouvellement créés et spécialement conçus pour
enfants sourds-muets. Par ricochet, la Révolution Française permit à la
médecine des oreilles de sortir des limbes en offrant à Itard les conditions
les plus propices pour la défricher.
Très tôt apparurent des divergences dans la conception de la prise en
charge des sourds-muets. Langue des signes, oralisation, bilinguisme,
thérapeutiques médicales, autant de sujets de controverse.
Pendant la plus grande partie du XIXe siècle, les médecins des
oreilles participèrent aux débats à plus d’un titre. Ils s’ingéniaient à
améliorer l’audition, chimère fort ancienne. La création d’établissements
pour sourds-muets offrait un véritable défi aux médecins, donnant lieu
à une débauche de “thérapeutiques” les plus invraisemblables. Mais les
médecins voulurent aussi différencier les types de surdité pour mieux
orienter la pédagogie. De là à donner des avis sur la pédagogie, le pas
était vite franchi.
Ainsi le balancier oscilla pendant près d’un siècle pour se bloquer en
1880, année du célèbre congrès de Milan. L’oralisme ne se discutait plus
: c’était “la” vérité. Curieusement, c’est à partir de cette époque que les
médecins cessèrent en grande partie de s’intéresser à la surdi-mutité.
Tout au long des trois premiers quarts du XIXe siècle, la médecine des
oreilles s’est beaucoup plus souvent développée dans les établissements
63
Anais do Congresso
de sourds-muets que dans les hôpitaux. La diminution de l’activité
médicale consacrée aux sourds-muets à la fin du XIX siècle a correspondu
à l’implantation progressive dans les hôpitaux de cette nouvelle spécialité
qu’était l’Oto-Rhino-Laryngologie.
Sous le terme général de “surdi-mutité”, on désignait des déficits
fonctionnels très divers. La surdité de naissance appelée volontiers
“surdité congéniale “ pendant une grande partie du XIXème siècle, n’était
pas toujours nettement distinguée de la surdité acquise, parfois à un âge
relativement tardif.
Ainsi, pendant toute cette période du XIXe siècle jusqu’au congrès de
Milan de 1880, devant chaque enfant sourd-muet, médecins et pédagogues
se trouvaient confrontés à deux grandes questions:
• Comment corriger le déficit fonctionnel?
• Quelle pédagogie adopter face à ce déficit fonctionnel?
Lorsque Jean-Marc-Gaspard Itard(1774-1838), premier médecin
de l’Institution Nationale des Sourds-Muets de Paris, prit ses fonctions
de médecin de l’Institution des Sourds-muets en 1800, les maladies des
oreilles souffraient d’un double handicap. Elles avaient très peu intéressé
la médecine officielle, et leur côté mystérieux attirait les guérisseurs de tout
genre. Ces oracles ne se contentaient pas de philosopher sur la surdi-mutité
; ils n’hésitaient pas à entreprendre des thérapeutiques agressives.
L’arrivée d’Itard à l’Institution des Sourds-Muets correspondait
à l’avènement d’une nouvelle conception de la médecine, abandonnant
les discussions scholastiques pour entrer dans la période clinique. Un des
chantres de cette rupture a justement été Itard. Ce jeune chirurgien initié
aux nouvelles conceptions de la médecine par les plus grands maîtres
d’alors, comme Pinel, fut amené à jeter les bases de l’otologie moderne et à
relativiser ce qu’elle pouvait apporter à l’amélioration de la surdi-mutité.
Les grands noms des médecins français qui bâtirent l’otologie française
au XIX siècle se trouvent impliqués dans l’histoire de la surdi-mutité.
D’ailleurs, plusieurs furent médecins de l’Institution des Sourds-Muets
de Paris. Le poste de médecin de cet établissement était alors très envié
par les auristes, leur procurant un revenu fixe et un logement de fonction.
Prosper Menière et Jules Ladreit de Lacharrière furent les plus éminents
successeurs d’Itard.
64
Dès son installation dans l’Institution, l’abbé Sicard lui confia
l’éducation de “Victor, l’enfant sauvage de l’Aveyron” dont l’arrivée
à Paris fit grand bruit. En quelques mois, les phares furent braqués sur
“le médecin des sourds et muets”. Il fit de longs mémoires concernant
l’éducation de cet enfant, notamment en 1801 et 1806, et lui consacra une
bonne partie de son énergie pendant plusieurs années. Sa notoriété dépassa
rapidement les frontières. Recruté pour veiller à la bonne santé des enfants,
son rôle dépassa rapidement cette mission.
Très tôt, il fut confronté à la surdité des enfants de l’Institution. Il
nourrit au début l’espoir de trouver quelque méthode de guérison parmi les
moyens tirés de la thérapeutique ; il employa successivement le séton, les
vésicatoires sur la tête, le moxa, l’électricité, le galvanisme etc. sans aucun
succès ; la perforation du tympan, le cathétérisme tubaire. Itard sut très
tôt qu’il n’arriverait pas à améliorer l’audition des enfants sourds-muets, à
quelques exceptions près.
Itard a cherché à éduquer les organes de la parole par l’entremise de
l’ouïe en essayant de faire entendre leur voix et non en les portant à observer
et à imiter ce qu’il y a de plus visible dans le mécanisme de la parole ce qui
l’a conduit à un certain rejet des signes.
Le Traité des maladies de l’oreille et de l’audition d’Itard paru en
1821 peut être considéré comme un des ouvrages fondateurs de l’otologie
moderne. En tant que médecin de l’enfant sauvage de l’Aveyron JeanMarc-Gaspard Itard est demeuré l’emblême des psycho-pédagogues,
des éducateurs et des pédo-psychiatres. Ses recherches ont fait progresser
la psychiatrie de manière déterminante et véritablement initié la prise en
charge d’enfants qui auparavant étaient considérés inéducables.
Prosper Menière (1799-1862), successeur d’Itard à l’Institution
des Sourds-Muets constate en 1853, dans son livre De la guérison de la
surdi-mutité et l’éducation des sourds-muets publié en 1853, qu’ Itard,
après quarante ans de soins avait reconnu par expérience que la plupart
de ses idées premières étaient bien plutôt des désirs et des illusions que
des réalités...Il indique avoir vu une multitude d’enfants à qui l’on avait
fait subir les traitements les plus douloureux, les plus barbares, les plus
absurdes et les plus inutiles. Pour Menière, l’origine de l’erreur d’Itard
provenait de son principe que “La surdité de naissance ou acquise dans
l’enfance ne dépend pas de causes différentes de celles qui produisent la
surdité chez les adultes.
65
Anais do Congresso
Menière n’a pas critiqué son prédécesseur, bien au contraire. Placé
dans les mêmes conditions, il y a tout lieu de penser qu’il aurait agi de
façon identique. On ne peut faire endosser à Itard tous les épouvantables
traitements évoqués par Menière, subis par “une multitude d’enfants”.
En septembre 1860, soit quatre mois avant son célèbre mémoire sur
la maladie qui porte désormais son nom, Menière fit une lecture devant
l’Académie de médecine sur “De l’expérimentation en matière de surdimutité”. L’auteur rapportait la présence dans l’Institution d’enfants sur
lesquels on avait essayé une multitude de moyens et qui en portaient des
traces non équivoques : cautérisations violentes, applications de moxas
laissant des cicatrices profondes ; nuque labourée avec des sétons, emploi
de l’électricité et l’éther sulfurique. Menière se plaignait qu’aucune
méthode scientifique n’ait été appliquée.
Ainsi, les principaux protagonistes médicaux dans le domaine de la
surdité pendant ce XIXe siècle ont aussi joué un rôle important dans le
développement de l’otologie, avec chacun une marque particulière. Itard
fut un initiateur, un découvreur. Il sut tirer rapidement les conclusions
de ses essais thérapeutiques. Son Traité des maladies de l’oreille et de
l’audition a joué un rôle considérable. Menière était un grand clinicien, pétri
“d’humanités “et d’humanisme. Ses qualités d’observation l’amenèrent à
donner à l’otologie française cette magnifique découverte de la maladie qui
porte désormais son nom.
Pendant une grande partie du XIXe siècle, de nombreux enfants
sourds-muets furent soumis à des thérapeutiques agressives dans l’espoir
d’améliorer leur audition. Ces traitements chez des enfants, dont les
séquelles furent rapportées notamment par Menière, paraissent aujourd’hui
révoltants.
Lorsque Itard devint médecin de l’Institution des Sourds-Muets
de Paris en 1800, il se trouva devant une tâche immense car il n’avait
pratiquement aucune référence pour se guider. Il dut littéralement défricher
une otologie balbutiante. Il est donc à bon droit considéré comme un des
fondateurs de la médecine moderne des oreilles. Son travail de pionnier
a eu aussi pour champ d’activité la psychiatrie. Ayant réalisé la première
psychothérapie d’un enfant autiste et su identifier le mutisme par la lésion
des fonctions intellectuelles dans un mémoire présenté devant l’Académie
de médecine en 1828, il est aussi considéré comme un des fondateurs de la
pédopsychiatrie.
66
La surdi-mutité fut le moteur du développement de l’otologie pendant
une bonne partie du XIXe siècle. Les sourds-muets en furent les victimes.
Les cicatrices ne furent pas seulement physiques ; elles sont encore très
sensibles.
Il n’en demeure pas moins que les travaux des médecins de l’institution
ont eu un retentissement très important, bien au-delà de la France et de
l’Europe. Dans leur sillage, la clinique naissante des maladies du langage et
le discours positiviste entraînent un renversement considérable de l’image
des sourds. La gestualité sera inscrite dans le registre de l’expression
inarticulée et d’une sensualité qui s’accommodera mal avec les rigueurs
morales du positivisme. Les approches héritées de l’Abbé de l’Epée et des
philosophes qui ont inspiré la Révolution Française se trouvent remises en
cause.
3. Les professeurs sourds et entendants
Dans les décennies qui suivirent la mort de l’Abbé de l’Epée et à
partir de l’approche ouverte et humaniste qu’il avait développée, plusieurs
professeurs sourds furent amenés à enseigner à l’institut de Paris. Certains
d’entre eux ont joué un rôle très important pour le développement de
l’éducation spécialisée en France et dans le monde et pour l’émergence
d’une vie citoyenne et associative très active au sein de la communauté
sourde. La Révolution Française, en créant l’institut de Paris, a favorisé
l’émergence de la communauté sourde et l’affirmation de son identité
spécifique. Je souhaiterais maintenant vous dire quelques mots de ces
personnages et de leur œuvre qui je pense a dû fortement inspirer Ernest
HUET lorsqu’en 1855 il a rédigé son rapport pour l’empereur Don Pedro
II lui proposant de créer un institut pour sourds à Rio de Janeiro. Ernest
HUET était alors directeur de l’institut des sourds muets de Bourges dans
le centre de la France et donnait des cours à l’institut de Paris.
La période qui nous intéresse est en effet unique par la présence de
sourds parmi les personnels d’éducation de l’institut de Paris. Ce ne sera
plus le cas après 1880 et il faudra attendre la fin du XXème siècle pour
retrouver une présence significative de sourds dans les effectifs des instituts
spécialisés en France.
Jean MASSIEU (1772-1846), sourd de naissance, arrive à l’institut de
Paris en même temps que son premier directeur, l’Abbé SICARD, en 1794.
Il deviendra le deuxième professeur sourd de l’histoire, après Etienne de
FAY au début du XVIII ème siècle. MASSIEU est une figure importante
67
Anais do Congresso
de la première génération de sourds ayant eu accès à la culture grâce aux
pédagogies de l’Abbé de l’Epée. Il a été célèbre pour la poésie, mais aussi la
précision et la rapidité des réponses qu’il faisait au public lors des nombreuses
séances de démonstration organisées par SICARD. Il a rencontré les plus
grands personnages de son époque. En 1815, invité par Thomas Hopkins
GALLAUDET à se rendre aux Etats-Unis, il décline l’offre en raison de sa
santé et c’est Laurent CLERC qui y va (j’en reparlerai). En 1823, après la
mort de SICARD à qui il était très lié mais qui s’était beaucoup servi de
lui pour sa promotion sociale, il devient professeur et directeur à l’école
de Rodez puis part à Lille en 1835 pour fonder une institution pour sourds
et muets. MASSIEU fut le précurseur : ses élèves et ceux de la génération
suivante furent les étoiles du mouvement sourd au XIX ème siècle.
Laurent CLERC (1785-1869), devenu sourd à la suite d’un accident à
l’âge d’un an, est placé en tant qu’élève à l’institut de Paris en 1797. Jean
MASSIEU est son professeur. En 1805, il devient répétiteur puis professeur
et aura parmi ses élèves Ferdinand BERTHIER (voir plus loin). En 1815, il
part à Londres avec SICARD et MASSIEU et rencontre Thomas Hopkins
GALLAUDET, pasteur américain, venu à Londres pour apprendre une
méthode d’éducation pour les enfants sourds des Etats-Unis. En 1816, il
émigre. Durant la traversée, il apprend la langue des signes à GALLAUDET
qui lui apprend l’anglais écrit. Ils fondent tous deux la première école
spécialisée des Etats-Unis à HARTFORD (Etat de New York) en 1817.
Il forme de nombreux sourds qui deviendront professeurs et directeurs.
Son action rend possible la création de l’université GALLAUDET à
WASHINGTON en 1864. A travers lui, la langue des signes française a eu
une forte influence sur l’American Sign Langage (ASL). Ces deux langues
ont encore aujourd’hui de nombreux points communs.
Malgré son dévouement SICARD, premier directeur de l’institut de Paris
n’avait rien compris à la réalité sociale et psychologique des sourds. A sa mort
en 1822, l’échec des signes méthodiques est évident. Ses incohérences dans
les méthodes pédagogiques employées poussent des professeurs entendants
qui connaissent bien la langue des signes à s’allier avec les répétiteurs sourds
devenus professeurs, pour revendiquer l’utilisation de la langue des signes en
classe. C’est notamment le cas de Roch Ambroise Augustin BEBIAN (17891839), entendant, responsable pédagogique de l’institut à partir de 1817, qui
devient le premier porte parole d’un type original d’éducation qui utiliserait
la « langue naturelle des sourds ». BEBIAN mit au point une pédagogie
originale d’accès au Français écrit, à partir de la Langue des Signes Française
dont il avait une connaissance approfondie. En 1825, il fit paraître la première
tentative connue de transcrire la langue des signes afin de pouvoir garder
68
des traces écrites de discours, récits, poèmes directement pensés dans cette
langue. Ce système, appelé mimographie, ne fut pas utilisé.
BEBIAN était considéré par BERTHIER dont je vais vous parler
ensuite comme « l’homme digne de saisir la pensée entière de l’Abbé de
l’Epée et de la féconder ». BEBIAN propose une thèse révolutionnaire pour
l’époque, celle d’une éducation véritablement bilingue. Son opinion est que
l’acquisition de la langue est facilitée quand l’idée a déjà été comprise grâce
à la langue des signes. Loin de négliger le français, les élèves apprenaient
à le lire et à l’écrire très correctement. De nombreuses œuvres littéraires et
poétiques composées à l’époque par des sourds éduqués de cette manière
sont là pour l’attester. BEBIAN ne rejette pas l’apprentissage de la parole
mais réserve plutôt celle-ci pour les échanges familiers et pour rendre aisées
les relations avec les entendants dans la vie quotidienne. Quand il s’agit du
développement intellectuel, auquel il consacre tous ses efforts, il a recours
aux explications en langue des signes.
L’accession de la langue des signes au rang de langue d’enseignement va
avoir pour effet de légitimer le rôle des professeurs sourds. Elle est adoptée
par de nombreuses écoles à cette époque et les anciens élèves, devenus
professeurs, participent activement à l’enrichissement et à la diffusion de
leur langue. Les grandes écoles se multiplient en France et deviennent des
centres de ralliement des communautés sourdes dans chaque région.
Cependant, les partisans de l’éducation bilingue commettent l’erreur
de ne pas s’intéresser à l’enseignement de la parole et ne pensent pas à
organiser la relève en formant des professeurs entendants. Il en résulte
un raidissement des partisans de l’éducation oraliste et nous verrons que
le XIXème siècle est aussi marqué par une lutte acharnée entre ces deux
conceptions qui se clôturera par la victoire des oralistes au congrès de
Milan en 1880.
Néanmoins, le milieu du XIXème siècle va être marqué par un
formidable développement des initiatives et de la créativité au sein de la
population sourde. Les sourds accèdent à des responsabilités et forment
notamment au sein de leur communauté de nombreuses associations.
L’épanouissement intellectuel des sourds progresse de façon spectaculaire.
On voit apparaître de nombreux artistes sourds, écrivains, poètes, peintres,
graveurs… L’exemple le plus frappant de cette évolution est Ferdinand
BERTHIER (1803-1886).
Attardons-nous un peu sur ce personnage d’une grande importance
aujourd’hui encore vénéré par la communauté sourde. Elève à l’institution
69
Anais do Congresso
de Paris en 1811, il eu pour professeurs Laurent CLERC, Jean MASSIEU
et Auguste BEBIAN. Il devient répétiteur en 1824, puis professeur en 1829.
En 1830, il rencontre le roi Louis-Philippe avec un autre professeur sourd
Alphonse LENOIR pour lui décrire la situation lamentable de l’école. En
1834, il décide d’organiser chaque année un banquet des sourds pour rendre
hommage à l’Abbé de l’Epée. Ces banquets connaîtront un grand succès et
draineront des participants de nombreux pays. J’y reviendrai. En 1838, il
fonde la société centrale des sourds-muets, première association de sourds
dans le monde qui existe encore aujourd’hui. Lors de la révolution de 1848,
il se bat pour défendre la République et sera le premier sourd à être décoré
de la Légion d’Honneur en 1849. Il publiera plusieurs ouvrages destinés à
aider les sourds à mieux connaître leurs droits et leur histoire.
A l’époque de BERTHIER, la communauté sourde française joue un
rôle de guide dans les échanges entre sourds de plusieurs pays. L’idée d’une
culture internationale et d’un langage compris dans toutes les parties du
monde émerge. L’avenir montrera que les choses ne sont pas si simples.
Quelques mots maintenant sur les banquets de sourds créés à
l’initiative de BERTHIER. Il est indéniable que ces banquets ont eu une
influence importante. Ils rassemblaient l’élite des sourds qui avaient réussi
socialement et aussi une élite internationale (Europe, Etats-Unis, Amérique
du Sud). Ils étaient le lieu du culte de l’Abbé de l’Epée, véritable ciment
de la nation sourde, et aussi une tribune politique. Il est raisonnable de
penser que ces rencontres intellectuelles ont suscité ensuite des initiatives
dans de nombreux pays. Les organisateurs avaient en outre l’intelligence
d’organiser la communication autour de ces banquets en invitant les
rédacteurs de nombreux journaux, ainsi que des fonctionnaires et des
responsables politiques. Il y eut également de nombreux invités prestigieux
du monde des arts et des lettres. Les circonstances empêchèrent Victor
HUGO de participer malgré plusieurs invitations. Il s’en excusa par écrit
dans des termes qui sont restés célèbres, notamment : « qu’importe la
surdité de l’oreille quand l’esprit entend. La seule surdité, la vraie surdité,
la surdité incurable, c’est celle de l’intelligence. ».
CONCLUSION
Le XIXème siècle fut donc une période d’une richesse exceptionnelle.
Beaucoup d’écoles furent créées dans divers pays à partir de l’institut ou à
70
partir d’initiatives de professeurs sourds qui y avaient enseigné.
Les pays scandinaves mirent en place une éducation des sourds basée sur
des principes issus de l’institut parisien :
­
__ Ecole accessible à tous les sourds quelle que soit leur origine et
la capacité des parents à payer les études,
­
__ Place naturelle de la langue des signes dans l’enseignement et
présence d’enseignants sourds,
­
__ Mise en place de formations professionnelles,
La place des sourds aujourd’hui dans les sociétés du Nord de l’Europe doit
beaucoup à ces initiatives.
Ernest HUET (ou Edouard…les sources varient concernant son prénom)
est bien un homme de cette époque. Né à Paris en 1822, dans une famille
de la noblesse, il devient sourd à l’âge de 12 ans après avoir contracté
la rougeole. Elève brillant, il parlait déjà français, allemand et portugais
avant de devenir sourd. Après sa surdité, il apprend l’espagnol et étudie à
l’institut de Paris pour devenir professeur. Il enseigne ensuite à l’institut et
devient directeur de l’institut des sourds de Bourges. Il a très certainement
été influencé par le dynamisme qui régnait à l’époque dans le monde de la
surdité.
HUET émigre au Brésil en 1855 avec comme principal objectif la
fondation d’une école de sourds. Il était motivé par des sentiments de
solidarité humaine vis-à-vis de ses semblables. Il apporte une lettre de
recommandation du ministre français de l’Instruction Publique. Vous
connaissez bien sûr son action au Brésil à partir de la création de l’INES en
1857 et jusqu’à la fin de son mandat de directeur en 1861. J’ai découvert,
mais peut être cela est-il connu ici au Brésil, que HUET fut invité au
Mexique en 1865 par le président JUAREZ pour organiser et diriger une
école pour sourds. Il accepta avec enthousiasme l’invitation.
Le destin exceptionnel d’Ernest (Edouard) HUET illustre bien tout
l’intérêt de la période à laquelle il a vécu en ce qui concerne l’éducation
des enfants sourds.
Je me suis donc penché sur cette période grâce aux organisateurs du
congrès et cela a été un travail véritablement passionnant. Il nous faut
71
Anais do Congresso
essayer de tirer les leçons de cet épisode exceptionnel pour partager nos
connaissances, échanger et développer des relations et des partenariats
internationaux notamment. Il reste encore beaucoup à faire pour faire
progresser l’éducation des enfants sourds, même dans les pays développés.
L’acquisition et la maîtrise de la langue demeurent des questions complexes.
L’essentiel est d’adopter un esprit d’ouverture, de ne pas considérer qu’on
est seul à posséder la vérité, d’utiliser probablement la complémentarité
des différentes méthodes, de ne pas opposer l’oral et la langue des signes,
la médecine et la communication, l’approche pratique, utilitaire et l’accès
à la culture. La grande leçon du XIX ème siècle est surtout que les sourds
ont participé activement au mouvement de développement de l’éducation
et cela a été déterminant bien sûr pour les progrès dont j’ai parlé.
Les valeurs d’ouverture, de tolérance et de respect de l’autre portées par
l’Abbé de l’Epée conservent toute leur valeur en 2007. Il est possible sur
cette base de réaliser de nouveaux progrès.
Je vous remercie de votre attention.
72
PAINEL INTERNACIONAL
MEIO SÉCULO TRABALHANDO COM O
SURDOCEGO E MÚLTIPLO DEFICIENTE NO
Helena Burgés Olmos1
BRASIL
A visita da ilustre surdocega Helen Keller, em 1953 no Brasil, estimulou
a professora de cegos do Instituto Padre Chico, em São Paulo, Nice Tonhosi,
a também compreender a comunicação dos surdos, levando-a fazer um
curso em uma escola do Rio de Janeiro. Assim, com o conhecimento
das duas deficiências, esta entusiasta professora conseguiu uma bolsa de
estudos para especializar-se na Perkins School for the Blind, nos Estados
Unidos.
Ao retornar a São Paulo em 1961, iniciou oficialmente a educação do
surdocego brasileiro atendendo duas crianças na Escola para Cegos “Padre
Chico”.
Por dificuldades financeiras essa classe se extinguiu, mas a professora
Nice, juntamente com outra professora de cegos, Thereza Adelina Barros
Tavares, procuraram outra Instituição para dar continuidade a esse pioneiro
serviço. Foi então que, depois de obterem uma verba da Campanha Nacional
de Educação de Cegos, criaram um setor de educação de Deficiências
Audiovisuais, SEDAV, na Fundação para o livro do Cego no Brasil,
atualmente Fundação Dorina Nowill.
A professora Nice, em 1968, ao saber de um projeto em que um deputado
em São Caetano do Sul iria montar uma escola de excepcionais, propôs
para o mesmo espaço uma escola de deficientes audiovisuais. Sendo assim,
foi fundada a Escola Residencial para Deficientes Audiovisuais – ERDAV.
Descobriu a primeira surdacega adulta com uma boa comunicação,
Maria Francisca da Silva. As duas mantinham correspondência em Braille.
Participaram de muitos congressos, palestras: sempre demonstrando a
possibilidade de comunicação e as potencialidades do surdocego.
No ano de 1995, Dona Nice foi homenageada pelos serviços prestados `a
educação ao surdocego com a Medalha “Anne Sullivan” na XI Conferência
Internacional DBI-Cordoba – Argentina (Conferência Internacional sobre
surdocegueira).
Em 1977, foi instalada a Fundação Municipal “Anne Sullivan”, de
São Caetano do Sul, mantenedora até hoje da Escola de Educação Básica
“Anne Sullivan”, que substituiu a ERDAV, tendo inicio um programa
de atendimento a surdocegos liderado por Neusa Basseto, que também
1
ADejAV/SP – Brasil.
73
Anais do Congresso
se especializou na Perkins School for the Blind e com Liek de Liew na
escola de surdocegos de Saint Michielgestel , na Holanda . Revelando-se
uma grande líder muito dedicada e com plena consciência da urgência em
fortalecer a educação do surdocego no Brasil.
Desde então muitos trabalhos surgiram no Brasil. Instituições foram
criadas com o apoio técnico e financeiro do Programa Hilton Perkins para
América Latina, que vem capacitando profissionais com o objetivo único
de multiplicar os conhecimentos adquiridos nessa área da surdocegueira e
da múltipla deficiência, conforme apresentamos a seguir.
Em 1982, pelo empenho e idealismo da Dra. Silvia Vietzman, foi
criado na Irmandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, um serviço
que pertence ao Setor de Baixa Visão do Departamento de Oftalmologia,
nomeado de Centro Eva Lindsted. Esse Centro visa dar atendimento clínico,
avaliação funcional da visão, orientação a pais, programa de reabilitação,
atividades com as famílias dos portadores de baixa-visão associados e
outros comprometimentos, como a surdez ou problemas motores. Tem
ainda como objetivo a pesquisa, educação de profissionais e apoio e
desenvolvimento de outros centros, oferecendo cursos de capacitação
e apoiando o desenvolvimento de serviços em todo o Brasil e América
Latina. Desde 1991 o programa Hilton Perkins (EUA) e outras instituições
internacionais são parceiros desse empreendimento.
Em 1983, foi fundada a Associação para Deficientes da Áudio Visão ADefAV, na cidade de São Paulo, por uma equipe de profissionais que tinha
o objetivo de atender surdocegos e surdos sem outros comprometimentos.
Tem atuado com surdocegos e multideficientes em parceria com a
Perkins School desde 1991, da qual recebe consultorias, além de preparar
profissionais da ADefAV, que têm a responsabilidade de repassar os
conhecimentos adquiridos para outras Instituições do Brasil: Recife(PE),
Natal(RN), Fortaleza(CE), Salvador(BA), Belém(PA), Porto Alegre(RS),
Maceió(AL) e São Paulo.
Em 1991, nascia AHIMSA, Associação Educacional para a Múltipla
Deficiência, Instituição que atua com surdocegos e multideficientes. Em
1997, uma ONG se formava, o Grupo Brasil de apoio ao surdocego e múltiplo
deficiente sensorial, oficializada em 1999. Seu objetivo é o de promover
a qualidade de vida e ampliar os serviços para o surdocego e o múltiplo
deficiente sensorial. Agregou um grupo de Instituições que atendiam outras
deficiências e que passaram a receber surdocegos e múltiplos deficientes:
Pró-Visão em São José dos Campos, CENTRAU em Curitiba, ASSUMU em
Umuarama, MARLENE ROCHA em Campo Grande – MG, BENJAMIN
CONSTANT – RJ, FUNDAÇÃO CATARINENSE – (SC).
Em 1997 o Brasil foi convidado a participar do IIIº Seminário POSCAL
- Programa de apoio a Organizações de Pessoas Surdocegas na América
74
Latina e a 6a. Conferência Internacional Helen Keller, realizada na
Colômbia. A partir dessa data sempre houve a participação do Brasil, na
maioria das vezes, sendo representado por Claudia Sofia Indalécio Pereira,
sudacega, primeira presidente da ABRASC - Associação Brasileira de
Surdocegos, que foi fundada em 1998, com o apoio da POSCAL e
instituições Brasileiras.
Claudia Sofia acompanhada por Sr. Manuel Osório surdocego de Minas
Gerais ou Alex Garcia do Rio Grande do Sul e (seus guiasintérpretes),
participaram de outros seminários POSCAL, preparando-se para a liderança
no Brasil e na América Latina.
1997- IIIº SEMINARIO POSCAL- Colômbia.
IVº CONFERENCIA MUNDIAL HELEN KELLER
Presentes- Claudia Sofia indalécio Pereira e Maria Francisca da Silva
1998- IIª. REUNIÃO DE LIDERES- Colômbia
Presentes- Claudia Sofia indalécio Pereira- Sr. Manuel Osório e
esposa
1998- IVº SEMINARIO POSCAL- Equador
Presentes- Claudia Sofia indalécio Pereira - Alex Garcia
1999- Vº SEMINARIO POSCAL- Cuba
Presentes- Claudia Sofia indalécio Pereira - Alex Garcia
Em 1999, foi criada a ABRAPASCEM - Associação Brasileira de Pais
e Amigos dos Surdocegos e Múltiplos Deficientes Sensoriais. Objetivando
reunir, auxiliar e orientar pais e outros membros da família, promover ações
que alcançassem o mais pleno desenvolvimento dos seus filhos, garantir
seus direitos como cidadãos e tantas outras ações. Essa associação de pais
se espalhou por todo o Brasil, como São José dos Campos, Curitiba (PR),
Umuarama (PR), Florianópolis (SC), Brusque (SC), Santa Maria (RS),
Pato Branco (RS), Dourados (MS), Barreiras (BA), Ji-Paraná (RO).
Outra associação de pais foi instalada com o nome de Centro de
Integração Vitor Eduardo - CIVE, situada em São Caetano do Sul, no
ano 2000, e trouxe como proposta o atendimento médico-terapêutico e
educacional a surdocegos e multideficientes com o objetivo de valorizar ao
máximo o potencial deste indivíduo.
Foi pela necessidade de preparar profissionais que atendessem
indivíduos com surdocegueria e múltiplas deficiências que se iniciou em
2000 o primeiro curso de pós-graduação lato sensu, FORMAÇÃO DE
EDUCADORES DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS SENSORIAIS E
MÚLTIPLAS DEFICIÊNCIAS, da Universidade Presbiteriana Mackenzie
em São Paulo, a qual tem como parceira a Perkins School for the Blind
– MA/EUA.
Nestes 50 anos, desde a vinda de Helen Keller no Brasil, acompanhamos
um variado número de Instituições que se organizaram com o intuito de
75
Anais do Congresso
educar o surdocego por todo o Brasil.
Com o número crescente de crianças com surdocegueira, sequeladas
pela Síndrome de Rubéola Congênita, Síndrome de Usher ou com
Múltiplas Deficiências, causas de diferentes síndromes como Down,
Trissomia 13, CHARGE, disfunções peri-natal congênitas, AIDS, Herpes,
Sífilis, Toxoplasmose, Meningite, asfixia, encefalite, derrame cerebral,
trauma craniano, mais programas de educação foram se estabelecendo e
desenvolvendo recursos tanto para a pessoa com necessidades especiais
como para seus familiares, no empenho de educar, orientar e prevenir,
assim como o fortalecimento de profissionais que necessitam formações
especiais para lidar com este tipo de deficiência.
Algumas dessas Instituições localizadas em São Paulo, como a
ADefAV, Santa Casa, Ahimsa, Universidade Presbiteriana Mackenzie
e Grupo Brasil contam com a parceria fundamental da escola “Perkins
School for the Blind”, escola que há aproximadamente 180 anos se dedica
a educação de surdocegos, e veio implantar programas no Brasil e na
América Latina incentivando a formação de profissionais multiplicadores
deste conhecimento a trabalho com esta população.
Com o objetivo de multiplicar o conhecimento na área da surdocegueira
e da múltipla deficiência é que a Perkins School for the Blind. MA- EUA,
vem atuando no Brasil e na América Latina aproximadamente duas
décadas.
A AdefAV, capacita cerca de 340 profissonais por ano, somando 325
horas de treinamento por ano, atingindo assim, 997 alunos. Site das
Instituições:
ADefAV – www.adefav.org.br
AHIMSA- www.ahimsa.org.br
Grupo Brasil- www.grupobrasil.com
Universidade Mackenzie- www.mackenzie.br
Cive- www.cive.org.br
ABRASC- www.abrasc.org.br
INES – RJ – www.ines.org.br
Agapasm – www.agapasm.com.br
Abrapascem – www.abrapascem.org.br
Bibliografia
OLMOS, H.B. – Mães de adolescentes surdocegos : expectativas quanto ao
futuro. Dissertação, São Paulo, 2005 .
SILVA, A. M.B.- Histórico da Educação do surdocego no Brasil, et at.
Formação Continuada:Guia-Intérprete Empírico, São Paulo: Projet
76
PAINEL INTERNACIONAL
PROGRAMA HILTON PERKINS
Sara Nolla1
Introducción
Es un placer y honor estar hoy aquí en Río de Janeiro, Brasil participando
del “VI Congreso Internacional y del XII Seminario Nacional, en los 150
años de la Educación Brasileña”, acompañada de grandes amigos y colegas;
y facilitando un espacio para dar a conocer las implicancias del Programa
Hilton Perkins en América Latina
He estado involucrada en el trabajo con niños con Discapacidad
Visual y con discapacidad múltiple desde hace 23 años en mi país Uruguay
y vinculada con el Programa Hilton Perkins desde hace 12 años.
En América Latina, los sistemas de Educación se iniciaron a fines
del siglo XIX y desde esa época hasta 1981 “Año internacional de
los Impedidos”, y a pesar de Normas Uniformes, sobre la igualdad de
oportunidades para los Impedidos, emanadas de las Naciones Unidas,
aún se observa a los Sistemas Educativos limitados en dar respuesta a
los derechos de las personas con necesidades múltiples y a sus familias.
(Ferioli, G; 2005)
Partiendo de que la persona con necesidades múltiples es aquella que
detenta una combinación de necesidades físicas, de salud, pedagógicas
y socio-emocionales que limitan el “normal” acceso a los beneficios
educativos , comunitarios , vocacionales y otros, estas personas requieren
de servicios adecuados / adicionales para que sus necesidades y las de sus
familias sean satisfechas. Fred P. Orelove, Ph. D. Dick Sobsey, Ed. D.;
1994.
Al examinar el documento de Acción Internacional que propone la
Deafblind Internacional del año 2005, para los servicios de las personas
sorda ciegas con discapacidad adicional y multi impedidos, dice que
debemos focalizar sobre:
* “ reconocimiento de la sordo ceguera con discapacidad adicional
1
Representante da Perkins School of the Blind – Uruguai.
77
Anais do Congresso
y multi impedidos por parte de los gobiernos, servicios, profesionales y
público en general como una discapacidad única y heterogénea;
*identificación de la población;
*participación de la persona sorda ciega con discapacidad adicional y
multi impedidas en la planificación del servicio;
*diagnóstico e intervención temprana;
*ofrecer evaluaciones para detectar las necesidades que tiene para
acceder a su educación o rehabilitación;
*asegurarle a la persona y su familia los servicios especializados con
flexibilidad en el número de horas, tiempo y días;
*ofrecer oportunidades para comunicarse y establecer relaciones
sociales;
*ofrecer información y formación a los padres y otros familiares e
incluirlos en la planificación y ejecución de los servicios;
*facilitar el acceso al medio ambiente y a obtener información dotándolo
de edificios accesibles y disponibilidad de equipamiento;
*reconocimiento de que las personas sorda ciegas con discapacidad
adicional y multi impedidos tienen el derecho de recibir los servicios a
través de profesionales formados en la especialidad para que las necesidades
sean satisfechas”.
Si nosotros como Latinoamericanos creemos que la población que hoy
nos convoca y que todos los días vemos a través de nuestras prácticas
diarias en nuestros lugares de trabajo, tiene derecho a disfrutar de una plena
inclusión en nuestra sociedad necesitamos antes de determinar el rumbo
para alcanzar nuestra creencia, analizar los hechos acontecidos en la
última década y el contexto actual para luego poder proponer las posibles
acciones que se deberían implementar para seguir destejiendo la trama para
un futuro mejor.
Los invito entonces, a examinar los datos obtenidos del estudio de
investigación “Exclusión Cero: Barreras Institucionales y Educativas
que enfrentan los niños y jóvenes con impedimentos multi sensoriales y
discapacidades adicionales y sus familias en el cono sur de América Latina”
(Ferioli, G; 2003)
*Actitud Profesional en relación a la Participación de los Padres:
Metas alcanzadas al día de la fecha:
•
Creación de Grupos o Asociaciones de Padres creando sus propias
redes de trabajo.
•
Paulatino aumento por parte de los padres en el conocimiento de
sus derechos como padres de personas multi impedidas y como ciudadanos,
78
lo que les brinda la seguridad y la certeza de saber qué, dónde, cuándo,
cómo y a quién demandar.
•
Mayor demanda por parte de los padres a las instituciones
escolares ejerciendo presiones políticas para que sus hijos sean aceptados
en los programas educativos públicos originándose desde la escuela
públicas iniciativas para ofrecer nuevas ofertas educativas.
* Recursos Administrativos Escolares-Reglamentación Vigente:
Metas alcanzadas al día de la fecha:
•
Las autoridades están comenzando en algunos países a considerar
la población ofreciendo los recursos humanos y materiales que necesitan
para que la oferta educativa responda a las necesidades de la persona.
•
Algunas escuelas públicas especiales del Cono Sur de América
Latina se encuentran en un proceso de transformación en cuanto a ofertas
educativas. Los datos permiten afirmar que si bien aún hay un largo camino
por recorrer, algunas instituciones educativas públicas de modalidad especial
están sumamente interesadas en revisar sus objetivos institucionales
* Estrategias de Formación Docente Continua:
Metas alcanzadas al día de la fecha:
•
Los Ministerios de Educación están comenzando a ejecutar
programas de capacitación de personal como una forma de garantizar la
inclusión de la población y no solo piensan en lograrlo a través de las
reglamentaciones existentes
•
Las Universidades y los Institutos Superiores de Educación han
comenzado a desarrollar programas de grado y post grado en la especialidad
de discapacidad multi sensorial y discapacidad múltiple.
•
En algunos casos, los gobiernos están cubriendo con pequeños
subsidios para que los docentes puedan acceder a ese nivel de formación.
*Visión de los Servicios de Salud:
Metas alcanzadas al día de la fecha:
•
Algunos centros hospitalarios han comenzado a ofrecer servicios
de atención temprana lo que ha facilitado las derivaciones acertadas a los
servicios educativos estableciéndose ciertas redes en los momentos de las
transiciones.
•
Incremento en el número de servicios de atención temprana en
las escuelas lo que ha llevado a las escuelas especiales a acercarse a los
79
Anais do Congresso
servicios de salud para la detección de la población.
•
Incremento de encuentros de salud-educación aunque un índice
bajo de participación de los agentes de salud a los eventos educativos.
* El Equilibrio entre las Necesidades de la Persona y su Familia, y los
Servicios Sociales: Los datos recogidos revelan que un alto porcentaje de niños / jóvenes con
discapacidades múltiples pertenecen a familias indigentes y desinformadas,
que viven en condiciones infrahumanas, con escasez de alimentos o falta de
agua potable. Estos individuos no reciben controles médicos sistemáticos
ni asisten a la escuela regularmente. Los servicios sociales dependientes
del Estado hacen grandes esfuerzos por cubrir necesidades primarias tales
como alimentación, salud y educación; estos esfuerzos, no obstante, se
ven dificultados por la falta de coordinación entre las distintas áreas de
gobierno. Las Áreas Sociales deberían tomar medidas para satisfacer las
necesidades primarias de la población alcanzando un equilibrio entre las
necesidades y los recursos disponibles. Como las necesidades son mayores
que los recursos, resulta imprescindible el trabajo mancomunado en las
áreas de salud y educación, para que las familias puedan hacer buen uso de
los recursos disponibles, si se los asesora, informa y educa de manera clara.
A su vez, estos recursos podrían ser potencializados a través de proyectos
familiares y comunitarios. El éxito de este proceso educativo revertiría la
mendicidad y permitiría el reconocimiento de los valores inherentes de
cada persona para contribuir a la sociedad a la que pertenece.
* El Equilibrio entre las Necesidades de la Persona y su Familia, y los
Servicios Sociales: Los datos obtenidos en este estudio revelan que las sociedades
latinoamericanas asumen una conducta de total desinterés por el tema, o
bien actúan sobreprotectoramente. Estas conductas extremas limitan la
inclusión de las personas multi impedidas y multi impedidas sensoriales
en la sociedad. En consecuencia, es necesario que el gobierno, las
organizaciones de padres, las ONGs, los medios masivos de comunicación
y toda fuerza viva de la comunidad brinden información simple, clara y
precisa sobre las oportunidades de educación y rehabilitación que tiene esta
población y sobre los recursos y programas disponibles. La información
que se ofrezca bajo cualquier estrategia alentará a los ciudadanos de la
región a buscar el modo adecuado de facilitar la inclusión de personas multi
impedidas y multi impedidas sensoriales y sus familias en la comunidad a
la cual pertenecen.
80
Metas alcanzadas al día de la fecha
•
Reconocimiento y reglamentación en algunos países de la sordo
ceguera como discapacidad.
PROGRAMA HILTON PERKINS
A_- Declaración de nuestra Misión
1-La misión de Hilton Perkins es mejorar la calidad de vida de los
niños y jóvenes con multiimpedimento visuales y necesidades múltiples
(incluida la sordo ceguera) y de sus familias, acrecentando sus oportunidades
educacionales.
2-El programa ofrece en colaboración con otras entidades liderazgo,
experiencia y recursos para mejorar y ampliar los servicios a través de
esfuerzos nacionales e internacionales orientados a la comunidad.
3-El propósito de nuestra labor es el proveer asistencia técnica a nivel
local, nacional y regional.
4-Todas las actividades se desarrollan mediante la planificación en
colaboración con agencias locales y regionales y tienen como enfoque
aumentar la capacidad local para proveer servicios cuando es posible, se
emplea la experiencia y los recursos locales y regionales en combinación
con especialistas del exterior para llevar acabo las actividades.
B- Objetivos del Programa
1- Desarrollar, perfeccionar y ampliar programas y servicios
educacionales y de apoyo para niños ciegos, multiimpedidos y sordo
ciegos.
2- Fortalecer y perfeccionar la organización formal e informal entre los
proveedores de servicios, familias y otras agencias en cada región.
3- Expandir y fortalecer experiencias locales y regionales y también
materiales y literatura profesional en cada región.
4- Despertar y /o aumentar la conciencia pública en todos los niveles de
la sociedad sobre mérito de proveer apoyo y servicios para niños y jóvenes
ciegos multiimpedidos y sordo ciegos y también para sus familias.
C- Principios fundamentales
Nuestras prioridades son:
1- servicios para bebés, niños y jóvenes con multimpedimento
visuales y otras discapacidades agregadas, incluyendo la sordo ceguera y
sus familias.
2- apoyo al desarrollo de organizaciones de familias de niños con
impedimentos visuales y otras discapacidades agregadas.
3- programas de apoyo para capacitación, preparación de materiales
y otros tipos de asistencia técnica.
81
Anais do Congresso
4- la duración y las actividades de los proyectos redeterminan
individualmente.
5- énfasis sobre el apoyo para mejorar los proyectos específicos
locales, poniendo atención en los sistemas nacionales cuando sea posible y
necesario.
6- el apoyo para los países seleccionados dependerá de la limitación
de nuestros recursos y de la disposición de los países para establecer
servicios.
7- se ofrecen consultas, información y asesoramiento a cualquier
agencia, sin tener en cuenta si tenemos o no un proyecto con ésta
8- colaboración con otros proveedores de servicios que estarán
basados solamente
en un interés común en los programas.
9- los materiales desarrollados a través del programa comprenderán
específicamente las necesidades de los niños con impedimentos visuales y
otras discapacidades agregadas.
10- los responsables de los proyectos colaborarán con las
organizaciones locales,
utilizando todos los recursos y experiencias locales disponibles.
EXPERIENCIA EN URUGUAY.
Mi país Uruguay, ha tenido una importante evolución en el campo de
la atención de niños con sordo ceguera y /o multiimpedimento En el año
1995 el Programa Hilton Perkins en forma conjunta con el Ministerio de
Educación y la Administración Nacional de Educación Primaria a través
de Enseñanza Especial, organizan el 1er. Encuentro de Padres de niños con
Discapacidad Visual y Discapacidad Asociada. Se forma así APPEDIVIDA
(Asociación de Padres de Personas con Discapacidad Visual y Discapacidad
Asociada.
Esto fortaleció a los padres y junto a profesionales comenzamos
a caminar un largo y difícil camino…el del hacer comprender a las
autoridades de la Educación que los servicios para niños y adultos con
Discapacidad Visual están siendo desafiados por una nueva población que
no puede responder al modelo tradicional de servicio .Algunos programas
con un modelo de educación y un currículo para alumnos con discapacidad
visual continuaban expulsando personas cuyas necesidades requerían una
nueva manera de focalizar la provisión de estos servicios y el contenido
curricular que a través de ellos se desarrollan. Otros ofrecían servicios a
un reducido número de personas, pero con un programa separado, con una
carga horaria reducida, escasos recursos y personal. Tradicionalmente, los
centros terciarios y universitarios han formado maestros en métodos
82
de trabajo con una discapacidad y sus efectos sobre el desarrollo y el
aprendizaje, pero ofrecen un mínimo apoyo para enseñar cuando una
discapacidad adicional está presente.
Conocedores de que teníamos esta gran dificultad en la formación
de profesionales, a través del programa Hilton Perkins y por gestiones
de APPEDIVIDA, algunos pocos maestros del Área de Discapacidad
Visual que teníamos alumnos con sordo ceguera y / o multiimpedimento,
comenzamos a capacitarnos en cursos, donde intervenían también la
FBU (Fundación Braille del Uruguay) y Educación Primaria y Enseñanza
Especial, del Ministerio de Educación.
Cada vez, era más grande la demanda de los alumnos…cada vez más
alumnos con multiimpedimento ingresaban a nuestras aulas y escuelas
Fue así que en el año 2001, el Centro de Capacitación y Perfeccionamiento
Docente perteneciente a la Administración Nacional de Educación Pública
y con el apoyo del Programa Hilton Perkins de la Perkins School for the
Blind, decidió enfrentar el desafío de formar a los profesionales y a los padres
uruguayos con la finalidad de que los profesionales en servicio adquiriesen
las competencias para trabajar con las personas con necesidades múltiples y
sus familias. Asimismo, la capacitación focalizó la inclusión de los padres/
tutores y miembros de la comunidad como agentes imprescindibles en el
desarrollo de los servicios y en la implementación de las acciones futuras
para dar cumplimiento a los derechos de esta población.
El curso se implementa y se desarrolla en los años 2003 y 2004 ,es
así que 50 personas (25 maestros y 25 técnicos que trabajaban en la
Educación Pública ) son capacitadas en la atención de de alumnos con
necesidades múltiples, a este grupo se le agregaron además muchos padres
y /o tutores.
Esta instancia de formación ya ha tenido su impacto hoy al disponerse
de profesionales capacitados, las comunidades educativas han comenzado
a reflexionar y a iniciar acciones que han conducido a que:
-
el número de alumnos con necesidades múltiples matriculados en
las escuelas públicas ha aumentado dada la apertura de estas instituciones
públicas por recibirlos porque disponen de profesionales capacitados.
-
los programas comienzan a estar centrados en el niño/ joven, en
sus familias y en el medio donde está inserto, más que en un contenido
curricular generalista que no permitía dar respuesta a las necesidades
únicas y propias de cada alumno con necesidades múltiples y sus familias.
-
se hayan incrementado el número de horas que el alumno
permanece en la escuela o fraccionado los horarios, de acuerdo a las
83
Anais do Congresso
necesidades del alumno, porque se dispone de una propuesta pedagógica
y de un equipo donde se ha incluido a la familia que desea colaborar en el
desarrollo de la misma.
- se disponga de mayor cantidad y variedad de material didáctico y
equipamiento confeccionado a bajo costo permitiendo enseñar y aprender
en condiciones apropiadas, respetando las necesidades particulares y
proyectándolo al hogar.
- los profesionales, las instituciones y los padres estén trabajando juntos
existiendo un mayor contacto entre ellos.
- los padres se encuentran más informados y fortalecidos lo que favorece
el apoyo entre padres y el trabajo cooperativo con los profesionales.
Transitamos así un año y realizamos una evaluación…y así
comprendimos que era necesario realizar un curso de Actualización en el
Abordaje de la sordo ceguera y/o multiimpedimento para Directores de
Escuelas Especiales y para Inspectores de Enseñanza Especial, quienes
desde su gestión podían realizar importantes cambios.
En el año 2006, con el apoyo de Hilton Perkins y de APPEDIVIDA se
realizó dicha actualización para 14 Inspectores que cubren todo el país y
50 directores en su mayoría del interior del país. Esto generó cambios…
pero lo realmente impactante fue, que de este curso surgió la necesidad de
dividir el país en
cuatro regiones y realizar “Jornadas de Actualización para maestros
del interior del país” y en cada jornada asistieron un promedio de 90
maestros especiales.
Cada vez eran más y más profesionales de la educación, los que se
formaban acerca de la atención de esta población.
Este año 2007…un nuevo desafío, nuevamente, en forma conjunta el
Programa Hilton Perkins, APPEDIVIDA y el Ministerio de Educación a
través de Enseñanza Especial y el IPES (Instituto de Perfeccionamiento
de Estudios Superiores), están desarrollando un nuevo curso de
Perfeccionamiento en la Atención de Alumnos con Necesidades Múltiples
para 35 profesionales (maestros y técnicos ) y también padres .
Sin dudas, han sido años de esfuerzos personales, profesionales e
institucionales.
De aquí en más nuevos desafíos deberán encontrarnos unidos, para
que nuestros niños y jóvenes / adultos dispongan de nuevos servicios, una
red entre los profesionales para mejorar los programas que se ofrecen,
continuidad de los cursos de actualización desarrollados por y para
profesionales y padres locales, mayor conocimiento y conciencia para que
84
los derechos de los niños y jóvenes /adultos con necesidades múltiples sean
respetados y la creación de una base de datos única con la información
disponible actualizada y accesible a toda persona que necesite de ella.
Estos nuevos retos nos deberán encontrar unidos si esperamos que
este pequeño grupo de personas con limitaciones múltiples y sus familias,
puedan encontrar respuesta a sus variadas necesidades en la comunidad
uruguaya .Mantengamos siempre encendida una llama para que nos ilumine
el camino ya iniciado.
Para finalizar esta presentación quiero expresar esta frase: “Sólo
aquellos que se atreven a soñar, sabrán adonde pueden llegar”....entonces
soñemos con una comunidad donde podamos ver incluidos a nuestros
niños / jóvenes haciendo pleno uso de sus derechos como ciudadanos.
85
PAINEL INTERNACIONAL
A EDUCAÇÃO DO SURDOCEGO E DO DEFICIENTE MÚLTIPLO NO INES
Marcia Regina Gomes1
Acredita-se que, ao longo dos 150 anos de história no universo
da surdez, muitos surdocegos2 tenham passado pelo corpo discente
do Instituto Nacional de Educação de Surdos sem que tivessem sido
identificados tal como hoje são definidos, sobretudo, no que se refere às
recomendações específicas para sua educação. Estudos sobre o processo
ensino-aprendizagem desses alunos é relativamente recente, ainda que se
encontre na literatura referências a casos isolados como o de Hellen Keller,
surdocega conhecida internacionalmente..
Esses estudos tiveram sua origem nos anos 60, inicialmente na Europa
e, logo em seguida nos Estados Unidos. Em ambos os lugares devido ao
nascimento de muitas crianças que apresentavam déficits visual e auditivo
associados, muitas vezes, a outros comprometimentos como conseqüência
da epidemia do vírus da Rubéola que afetou mulheres gestantes na
ocasião. Esse fato levou profissionais da época buscar novas formas de
conduzir o processo educacional de crianças que apresentavam prejuízos
multisensoriais, já que a literatura disponível em educação não contemplava
as necessidades específicas dessa “nova” população de crianças (van Dijk,
1968).
No Brasil, a educação de surdocegos teve início no final dos anos 60
com a fundação da primeira escola destinada a essa população com o nome
de Escola Residencial para o Deficiente Áudio Visual (ERDAV), no ano
de 1968, localizada em São Caetano do Sul, por iniciativa de Nice Tonhosi
Saraiva. Posteriormente, essa escola foi transformada em Fundação
Municipal Anne Sullivan, mantenedora da Escola de Educação Especial
Anne Sullivan, sob a responsabilidade de Neusa Basseto (Silva,2002). Cabe
86
1
Professora do INES. Especialista na educação de surdocegos pela
Perkins School for the BLIND-EUA.
Mestre em Educação pela UERJ.
2
Surdocegos – crianças e jovens que apresentam perdas parcial ou total
dos dois canais sensoriais de distância (visão e audição), cuja combinação produz graves problemas de comunicação e em outros aspectos
do desenvolvimento e de aprendizagem (McInnes,1997; Miles,1999;
SEESP,2003; Amaral,2004; Gomes,2006)
esclarecer, no entanto, que na ocasião não havia curso de formação para
professores nessa área, mas que da mesma forma que as duas precursoras
e, por iniciativa das mesmas, outros profissionais puderam desenvolver sua
prática formativa na Perkins School for the Blind, localizada em Boston,
nos EUA, em parceria com o programa Hilton Perkins.
Muitos desses profissionais, por volta de meados dos anos 80, se
empenharam em outras iniciativas com o mesmo propósito de levar adiante
a educação de surdocegos. Dentre elas a Associação para Deficientes da
Áudio Visão – ADEFAV e a Associação para Múltipla Deficiência –
AHIMSA, ambas localizadas em São Paulo. No Rio de Janeiro, em 1983,
acontece a primeira prática formativa para professores de diversas cidades
brasileiras na educação de crianças surdocegas, promovida pelo CENESP
(Centro Nacional de Educação Especial), sediada no INES. Na ocasião
havia dois alunos surdocegos que freqüentavam turmas de alunos surdos em
diferentes séries no INES que foram acompanhados pela professora Rosa
Passos, a primeira professora do Instituto a receber orientação baseada na
característica sensorial desses alunos.
Só bem mais tarde, em meados dos anos 90, é que outras crianças
ingressaram no Serviço de Educação Infantil do INES, onde se iniciou o
programa de atendimento ao surdocego congênito. Paralelamente, inicia-se
o programa de atendimento ao surdocego pós-lingüístico, ou seja, aqueles
que perderam a audição e visão depois de terem adquirido uma língua
(língua oral ou de sinais) no Instituto Benjamim Constant – IBC.
Com a perspectiva educacional inclusiva, ou seja, todas as crianças,
independentemente de sua condição ou estilo de aprendizagem, em
idade escolar, deveriam ter garantido a sua matricula nas escolas é que
outras famílias de crianças que apresentavam a surdez associada a outros
comprometimentos, devido a causas diversas, vinham em busca de uma
vaga para seus filhos neste Instituto.
Nessa ocasião, o segmento que compreendia os alunos matriculados
nas séries iniciais já se deparava com o fato de que alguns alunos vinham
apresentando muita dificuldade em acompanhar o currículo acadêmico
desenvolvido nas turmas de alunos surdos, fazendo com que ficassem
retidos numa mesma série por anos seguidos. Para esses alunos foi
proposto, então, o atendimento educacional diferenciado. Entretanto, este
atendimento não dava conta, ainda, daqueles alunos que, devido a seus
graves comprometimentos de etiologia congênita, não apresentavam
autonomia para as necessidades básicas do dia-a-dia, como é o caso de
alguns surdocegos e aqueles com deficiência múltipla. Estes últimos
tinham como prioridade o desenvolvimento de habilidades comunicativas
baseadas em atividades de vida real para a sua interação com o ambiente,
necessitando, portanto, de um acompanhamento individual.
87
Anais do Congresso
A partir deste novo contexto, alguns profissionais da equipe de
avaliação de ingresso de alunos no INES e professores que já promoviam
o atendimento educacional destes alunos elaboraram um projeto de
atendimento alternativo ao surdo com outros comprometimentos. Esse
projeto, denominado CAAF (Centro de Atendimento Alternativo Florescer),
que a despeito do enfoque clínico inicial (2001) dado ao impacto que a
condição desses novos alunos causava; hoje se configura em um espaço
pedagógico, cujo objetivo é atender às necessidades de aprendizagem dos
alunos que o freqüentam.
Assim, o CAAF atualmente se constitui em um ambiente de ensinoaprendizagem para alunos surdocegos e aqueles com deficiência múltipla
de etiologia congênita, cuja abordagem educacional se pauta nas reais
necessidades dos alunos visando o desenvolvimento de suas potencialidades
e aquisição de competências para atuar da melhor maneira possível no
contexto familiar, escolar e comunitário.
Os alunos que ingressam neste programa apresentam um diagnóstico
preliminar de surdez como a deficiência principal associada a outros
comprometimentos de ordem física, sensorial, mental e de comportamento
social, ainda que ao longo do processo educativo verifica-se que alguns
deles parecem demonstrar respostas pela via sensorial auditiva. No
entanto, não é possível a confirmação deste dado por meio de testes devido
à ausência de respostas objetiva da criança. Esses alunos apresentam em
comum uma inabilidade para se comunicar, que se traduz em transtornos de
conduta como isolamento, comportamentos estereotipados, auto-agressão
e agressão a outros, bem como dificuldades na alimentação sólida, demora
no controle do esfíncter, alternância entre sono e vigília e problemas de
saúde.
Estas características variam muito de acordo com: a) fatores que levaram
a condição dos mesmos; b) manifestações e conseqüências da combinação
das deficiências; c) ambientes familiar, social e cultural e; d) recursos do
atendimento clínico, escolar. A combinação desses fatores influencia o
desenvolvimento das crianças, a forma como elas funcionam nos diferentes
ambientes e o modo como aprendem, sobretudo no que se refere à aquisição
das habilidades comunicativas. Essa diversidade impede que seja traçado
um perfil único desses sujeitos em função das necessidades individuais tão
distintas, tanto quanto de suas potencialidades e habilidades.
Causas ambientais e de origem genética determinam tal condição. Em
recente estudo piloto, realizado por Silva e colaboradores3 , no qual foram
feitas avaliações retrospectivas de 88 alunos atendidos no CAAF, entre os
3
88
O estudo foi desenvolvido pelo Dr Eduardo Jorge Custódio da Silva,
médico e pesquisador do Instituto Fernandes Figueira com a colaboração
da equipe do Centro de Atendimento Alternativo Florescer -
anos de 2001 e 2004, indicou que: 33 deles tinham etiologia indefinida;
27 tinham a rubéola congênita; 7, 6 e 2 alunos exibiam meningite,
prematuridade e citomegalovirus respectivamente. Outros fatores como,
sífilis congênita, toxoplasmose, hereditariedade, síndrome Wolf-Hishorne,
foram identificados em apenas um aluno cada, totalizando assim o restante
dos alunos avaliados.
O estudo revelou que as infecções congênitas, especialmente a rubéola,
estão presentes como a principal causa no diagnóstico clínico desses
sujeitos, fato que pode ser explicado pela presença dos defeitos no nervo
auditivo e no globo ocular. No entanto, muitos desses diagnósticos não
apresentam o exame de sangue, cuja taxa viral indica a presença do vírus
(Silva, Pinto, Lima, Maia, Silva, Lima, Fulco, Gomes, Oliveira, Lima,
Griner e Pimenta, 2005, p.5-6).
O termo surdocego se refere a uma condição única de privação de dois
canais sensoriais importantes para a apreensão dos conceitos do mundo
que cerca um indivíduo. A combinação de perdas parcial ou total dos dois
sentidos de distância (visão e audição) em crianças tem como conseqüência
grave problema de comunicação e em outros aspectos do desenvolvimento
e de aprendizagem (McInnes e Treffry, 1997; Miles e Riggio, 1999;
SEESP, 2003; Amaral, 2004; Gomes, 2006). Muitas crianças surdocegas
apresentam outros comprometimentos que não se restringem apenas
a privação dos canais sensoriais, visão e audição, mas podem envolver,
dependendo da causa que originou tal condição, prejuízos neurológicos,
cognitivos, motores e de saúde que vão interferir sobremaneira em seu
desenvolvimento, os deficientes múltiplos.
Dado o fato de que a surdez é a deficiência principal e, em geral, de
causa congênita ou adquirida antes da aquisição de uma língua, esses alunos
têm como prioridade a comunicação e a necessidade de uma intervenção
educacional específica que os ajude a alcançar o melhor do seu potencial
comunicativo e conseqüentemente sua aprendizagem. Eles, em geral, não
se comunicam de uma forma simbólica, contudo, se expressam por meio
de movimentos, expressões faciais e vocalizações para se conectarem com
o ambiente, dependendo de sua experiência sensorial. O desenvolvimento
da comunicação, portanto, se constitui tanto em um meio como em um fim
no processo educativo e compreende o ensino de formas comunicativas
próprias, ajustadas à capacidade perceptiva de cada um dos alunos.
Partimos do pressuposto de que a surdocegueira e a deficiência múltipla
não se caracterizam pelo somatório de duas ou mais deficiências, mas
sim pelo nível de desenvolvimento, pelas possibilidades funcionais de
3
CAAF do Instituo Nacional de Educação de Surdos-INES e teve como
objetivo levantar as características dos alunos atendidos neste centro.
89
Anais do Congresso
comunicação, interação social e de aprendizagem. Entende-se, portanto,
que esses aspectos é que determinarão as necessidades educacionais desses
indivíduos.
Com base na perspectiva educacional inclusiva, apontada pela Secretaria
de Educação Especial do MEC (SEESP, 2003), temos como premissa básica
a educação de crianças e jovens surdocegos e os com deficiência múltipla
pautada nas reais necessidades desses alunos visando o desenvolvimento
de suas potencialidades e aquisição de competências para atuar da melhor
maneira possível no ambiente familiar, escolar e comunitário.
Destacamos a abordagem sociológica e relacional como a base para a
elaboração de programas funcionais, também chamados ecológicos, mais
apropriados para a educação de alunos com deficiência múltipla (Orelove e
Sobsey, 1996; Eichinger e Downing, 1996; Amaral, 2004, Cormedi, 2005;
Gomes, 2006). Um programa baseado em uma abordagem sócio-funcional
e ecológica tem como foco o ensino de habilidades que sejam prioritárias
para a funcionalidade dos mesmos em seus contextos sociais de acordo com
a idade cronológica e levam em conta as necessidades, desejos, interesses
dos alunos e de seus familiares.
A concepção funcional ou ecológica na elaboração de um programa
educacional individualizado para os surdocegos e os deficientes
múltiplos considera os pais como parceiros; cooperadores do processo de
desenvolvimento e aprendizagem de seus filhos.
Essa perspectiva se baseia na convicção de que a unidade familiar é
de vital importância para qualquer indivíduo e considera-a como principal
suporte para as crianças e jovens, que na maioria das vezes, se constitui na
única conexão com o mundo.
Considerando a complexidade das combinações das necessidades
físicas, médicas, educacionais e sócio-emocionais, o programa funcional ou
ecológico prevê a modalidade transdiciplinar de planejamento em equipe,
ou seja, os profissionais que têm relação com o aluno devem compartilhar
conhecimentos sobre suas respectivas especialidades sob uma concepção
holística na condução de um mesmo objetivo na educação de cada aluno.
O modelo de planejamento transdiciplinar é centrado na criança e as
decisões deverão ser tomadas por todos os elementos da equipe. Dessa
forma, a responsabilidade sobre o processo educativo do aluno é partilhada
por todos, cabendo ao professor e aos pais o papel de impulsionar sua
educação ( Smith e Levack,1996, citado por Nunes, 2001).
Entendemos, portanto, que ao proporcionarmos atividades pautadas em
um currículo funcional e apoiadas na comunicação alternativa estaríamos
contribuindo para minimizar o impacto de uma desvantagem acadêmica
desses alunos. No entanto, o maior desafio na aplicação desse construto
teórico é com relação à dificuldade que os professores têm em considerar
90
as atividades funcionais que coincidam com as necessidades e os desejos
pessoais dos alunos, pouco tem a ver com o desempenho acadêmico.
Nesse sentido, o CAAF foi lócus de pesquisa cujo objeto de estudo
foi a formação de professores sintonizada com a concepção de educação
comprometida com a funcionalidade desses alunos. O estudo aponta para
aspectos importantes a serem considerados na interação de professores
com os alunos surdocegos no que diz respeito ao desenvolvimento de
habilidades comunicativas, bem como apresenta um modelo de formação
continuada para professores nessa área(Gomes, 2006).
Os dados levantados neste estudo têm sido utilizados para subsidiar
as reuniões pedagógicas da equipe atual do CAAF; o desenvolvimento
de material específico para o processo ensino-aprendizagem do aluno; as
orientações nos encontros de famílias dos alunos surdocegos; nas consultorias
técnicas às Secretárias de Educação como forma de descentralizar a prática
educativa oferecida por este programa, bem como nos Seminários do INES
realizados nas diversas cidades brasileiras, desempenhando assim a sua
atribuição de disseminação de novos conhecimentos na área da surdez e
agora na área da surdocegueira.
Cabe ressaltar que nos seminários sobre Educação e Surdez promovidos
pelo INES no sentido de desenvolver ações de cooperação técnica junto
às Secretarias Municipais e Estaduais em território Nacional, os temas
relativos a surdocegueira e deficiência múltipla vêm sendo solicitados cada
vez mais por profissionais de diversas cidades brasileiras, dada a crescente
demanda de alunos que apresentam tais deficiências nas escolas. Nesses
eventos, o tema é contemplado com uma palestra inicial, cujo objetivo é
levar informações sobre os aspectos mais importantes da área para um maior
número de pessoas possível, para em seguida, aqueles que se interessarem
pelo assunto possam participar dos workshops que acontecem nos dois dias
subseqüentes, com vagas para até 50 participantes e duração de 3 horas
cada. As oficinas permitem que alguns tópicos, sobretudo aqueles que
emergem das práticas dos participantes, sejam abordados de forma mais
abrangente. No entanto, parece claro que esse tempo não é suficiente o
bastante para repercutir na prática desses professores, apontando assim
para futuras parcerias de cooperação técnica no sentido de desenvolver
ações formativas continuadas para professores quanto aos programas de
atendimento dessa população naquela localidade.
Finalmente, o CAAF pode ser considerado hoje como referência
na educação de crianças e jovens que apresentam a surdocegueira e a
deficiência múltipla de etiologia congênita, ou seja, aqueles alunos que
funcionam em nível pré-lingüístico. Espera-se que a nossa contribuição
possa oportunizar uma educação mais apropriada, sobretudo no que se
refere ao estilo de aprendizagem próprio dessa população.
91
Anais do Congresso
Bibliografia
AMARAL, I., DUARTE, F., NUNES, C.; GONÇALVES, A., SARAMAGO,
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93
Mesa-Redonda Internacional
MESA-REDONDA INTERNACIONAL
HEARING IN THE NEW MILLENIUM –
PERSPECTIVES AND PROSPECTS
Ulf Rosenhall1
Knowledge about extent and causes of hearing impairments is, to a
great extent, limited to highly developed so called post-industrialised
countries. However, a majority of the world’s population lives in countries
where the living conditions are very different. It is not plausible that the
hearing of people living in highly developed post-industrialised countries
represent the human hearing in general. Populations living under ideal,
pristine conditions, with little noise exposure, have often, but not always,
better hearing. Many very large countries like Brazil, China and India
undergo at present a very rapid industrialising. The positive sides of this
process are that living conditions, health, and economy improve. There
are also negative sides, like deterioration of the general and occupational
environments. Comparisons between these countries and western countries
show that the hearing is fairly similar in spite of great dissimilarities
between the different populations.
In the poorest countries of the world not only the economy is problematic,
but also the state of health. We do not know exactly how common hearing
losses are in these countries, only that prevalence and incidence figures
are frightfully high. The differences to highly developed countries are
especially pronounced for children and young adults. According to WHO
more than 62 million children of the world have profound hearing loss
or total deafness. Two thirds of these children live in poor developing
countries. The prevalence values of moderate to profound hearing loss
and total deafness have been estimated to vary from 2.7 to 10 per 1000 in
developing countries. These figures shall be compared to prevalence values
of 1 to 2 per 1000 children in Europe.
Some causative factors keep appearing repeatedly in different studies.
One important factor is chronic otitis media and exposure to intense
noise. A number of infections might result in severe hearing impairment.
Meningitis, septicaemia and different viral diseases are examples of
infectious diseases that can cause hearing loss. Rubella embryopathy
as a cause of deafness is rare in western countries because of a highly
successful vaccination programme, but it is still common in other countries.
1
96
Karolinska University Hospital/Karolinska Institutet, Stockholm, Sweden
The most common cause of deaf-blindness in Brazil is probably rubella.
Vaccination programmes can eradicate hearing impairments caused by
rubella, heamophilus influenzae, and pneumococcal infections. Treatments
of infections and malignant tumours might cause ototoxic hearing loss.
Genetic hearing loss is present in all populations around the world, in
affluent countries as well as in poor ones.
WHO pursues an ambitious programme, “Prevention of blindness and
deafness (PBD)”. According to WHO at least 50 % of hearing impairments
in developing countries is preventable. The means to do so is by achieving
primary and secondary prevention. Medical measures are to develop
maternity health care and child health centres. Prevention programmes
of noise induced and ototoxic hearing impairments should be arranged.
Secondary prevention is also important, including ENT service and middle
ear surgery. It is of the utmost importance to develop easily available
habilitation / rehabilitation programmes, including hearing aid fitting and
educational and psychosocial measures.
Hearing impairments are common in all kinds of societies, in highly
developed countries, countries with a rapid economic growth, and
developing countries. Aural health is therefore a global commitment
affecting all countries, irrespective of the state of development.
97
Mesas-Redondas Nacionais
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
CORPOREIDADE E SURDEZ
Marise Pedalino1
Desenvolvo um trabalho de Educação Psicomotora com crianças do
Serviço de Educação Infantil – SEDIN -, do INES. São crianças da Educação
Precoce - 0 a 3 anos - que são atendidas individualmente, e crianças do
Maternal ao Jardim III, atendidas em grupo. Essas são crianças que por
diferentes motivos, apresentam atrasos no seu processo de maturação,
expressando esse sofrimento pela via do corpo, como na hiperatividade e
nas inibições, ou por dificuldades cognitivas e relacionais.
A partir da compreensão de que a construção do psiquismo não se dá
de forma espontânea; que o processo de maturação psicológica da criança
demanda investimento afetivo de quem dela cuida; que é essa relação de
maternagem que vai possibilitar ao bebê tornar-se uma pessoa, inserida
numa cultura; que o psiquismo se funda a partir das sensações corporais
vividas nas interações, desde a gestação, podemos supor que a criança
surda viva diferenças nesse processo, em relação à criança ouvinte, pela
impossibilidade de perceber a sonoridade do mundo a sua volta.
Um exemplo da importância da audição nesse processo é o fato do bebê
humano reconhecer a voz da mãe desde o fim da segunda semana de vida,
antes mesmo de diferenciar seu rosto de outros rostos. A voz da mãe o
acalma, o provê emocionalmente de segurança. E essa responsividade do
bebê alimenta o investimento da mãe sobre ele, favorecendo a formação do
vínculo mãe- bebê.
Outro exemplo: os diversos ruídos do ambiente dão referências do
universo no qual o bebê está imerso, além de dar informações sobre o
que não está presente no campo visual, contribuindo para a formação da
permanência do objeto e para a segurança emocional da criança. Quando a
criança começa a andar a voz da mãe possibilitará que ela se distancie, sem
perder o contato, favorecendo sua autonomia.
Esses são alguns exemplos do papel fundamental da audição na
construção do psiquismo, pois todos os sons e comunicações verbais, desde
os primórdios da vida uterina auxiliam na construção da confiança básica,
1
100
Professora de Educação Física do INES. Sócia Titular da Sociedade
Brasileira de Psicomotricidade. Psicóloga Clínica – UNESA. Terapeuta
de Família - ITF.
da permanência do objeto, da autonomia e na aquisição da linguagem,
portanto, no desenvolvimento do pensamento, o que nos leva a supor que a
criança surda encontra dificuldades nesse processo.
Além disso, a surdez pode ser causada por diversos fatores congênitos
e adquiridos, como a rubéola materna durante a gravidez e a meningite,
doenças que podem deixar seqüelas neurológicas, visuais, cognitivas e/ou
motoras, altamente incapacitantes para a criança, trazendo sofrimentos
para esta e sua família.
Também é importante considerar a condição emocional dos pais ao
viverem a experiência de um filho surdo: sua capacidade de acolhimento
e disponibilidade para investir na criança e aprender sobre um mundo
novo que se abre. Quem acompanha esses pais sabe que são processos
emocionais difíceis, que estão sujeitos à sua possibilidade de suportar a
ferida narcísica e viver o luto da perda da criança ideal, para encontrar a
criança real e se relacionar com ela.
O momento do diagnóstico da surdez, também interfere nesse processo.
A descoberta precoce muitas vezes altera o investimento emocional da
mãe sobre seu bebê, impedindo-a de agir naturalmente e bloqueando a
comunicação entre eles, porém é importante por possibilitar a busca de
soluções para os problemas interativos e o atendimento às necessidades da
criança.
Assim, o processo de desenvolvimento da criança surda será mais ou
menos dificultado dependendo da etiologia da surdez, de fatores sócioculturais, e familiares e emocionais, que poderão resultar em dificuldades
motoras, emocionais, lingüísticas, cognitivas e/ou relacionais.
O Grupo de Ajuda é um projeto de Educação Psicomotora dentro dos
princípios da Prática Psicomotora Aucouturier (PPA). É um “processo de
ajuda que acompanha a criança em seu próprio percurso maturativo, que vai
desde a expressividade motora até o acesso à capacidade de descentração”
(Sánchez, Martinez e Penãlver,2003:13). É, portanto, uma ajuda à maturação
psicológica da criança pela via do jogo e da brincadeira, pois a brincadeira
contribui para a “unificação e integração geral da personalidade”, além
de auxiliar a criança a “dominar a angústia, controlar idéias ou impulsos
que conduzem à angustia se não forem dominados” (Winnicott, 1982:
162), encontrando um bem estar fundamental ao seu desenvolvimento,
pois é pelo prazer que a criança se abre ao mundo da comunicação e da
aprendizagem. É no prazer de brincar e interagir que a criança vive o
prazer de ser e de conhecer. Logo, nesse processo são atendidos aspectos
fundamentais da globalidade da criança – a afetividade, a motricidade e o
conhecimento.
Trabalhamos a partir da atividade espontânea da criança e de sua
expressividade motora. E do que as crianças brincam?
101
Anais do Congresso
Aparece naturalmente em todas as crianças as brincadeiras de reasseguramento profundo, que são brincadeiras universais, tais como as
brincadeiras de destruição, de prazer sensório-motor, de envelopamento
(envolver-se com panos, construir uma cama, mais tarde uma casa), de
esconder e aparecer, de perseguição e as brincadeiras de identificação ao
agressor (ser o lobo, a bruxa). São chamadas de re-asseguramento profundo
porque tocam o inconsciente da criança, mobilizam o que existe de mais
profundo nela, liberam emoções, fazem funcionar os afetos, especialmente
quando são vividas na relação com um adulto.
Nesse sentido, se destacam as brincadeiras sensório-motoras que
envolvem o cair, saltar, girar, desequilibrar-se... São brincadeiras que
solicitam o sistema labiríntico e estimulam a musculatura profunda do
corpo, proporcionando forte prazer corporal. Promovem o acesso às
brincadeiras simbólicas porque liberam a motricidade, a linguagem, a
comunicação e o pensamento.
Temos ainda as brincadeiras de identificação com personagens da vida
familiar e social, por exemplo, mãe/filha, motorista do carro, super heróis,
e outros. E também as brincadeiras ligadas à castração, como os acidentes,
o hospital, o médico e o enfermeiro.
As crianças vivem a repetição dessas brincadeiras com muito prazer,
pois é a repetição de um mesmo prazer, que na verdade nunca é idêntico, que
vai possibilitando à criança ajustar-se ao mundo externo, desenvolvendo a
inteligência prática. Além de, como pode ser antecipado, gerar segurança
Enfim, todas essas brincadeiras vividas num fundo de prazer asseguram
à criança uma apropriação de sua totalidade corporal e a construção de sua
unidade psíquica.
Nesse espaço existem materiais móveis, como blocos de espuma,
almofadas, tecidos, bichos de pelúcia, cordas, bastões, além de um
espaldar para os saltos. O material não é figurativo, para que a criança
possa investir em transformá-lo, projetando no objeto seu mundo interno,
ou seja, simbolizando.
É sempre o mesmo material, a mesma sala e é nesse igual, nessa
estabilidade, que a criança vai viver a diferença, o seu jeito de ser e criar
naquele espaço, com aqueles materiais, com aquele grupo.
Esta prática favorece a maturação psicológica da criança, pois através
da expressividade psicomotora vivida numa dinâmica de prazer, num
enquadre próprio e com material específico, “estimula a comunicação, a
criação e a simbolização, fatores fundadores do acesso ao pensamento
operatório e à descentração” (Aucouturier, 1996, 7).
A comunicação é a condição básica do desenvolvimento harmônico da
criança, pois permite a relação, a criação, o trabalho com o outro, ao mesmo
tempo em que é uma afirmação de si. A experiência de prazer vivida numa
102
ação compartilhada – saltar, subir, cair, construir, destruir - faz a criança
abrir-se ao outro, pois essa comunicação não-verbal que é troca, é ter que
colocar a atenção sobre o outro, é acolher seu ponto de vista. Comunicar é
então, ao mesmo tempo, afirmação de si e socialização.
Criação se refere a toda produção vocal, artística, gestual e cognitiva.
Criar é “concretizar imagens por meio da ação, do corpo e de suas formas
de representação: o desenho, a modelagem, a linguagem a escrita”
(Sánchez, Martinez e Penãlver,2003:70). Logo, “criar é uma maneira muito
personalizada de dizer de si ao outro: é afirmar sua competência em investir
o espaço, os objetos, as pessoas e dar a estes uma variedade de sentidos
simbólicos” (Aucouturier, 1986: 24). E uma produção que é reconhecida,
é o reconhecimento do próprio sujeito ali representado. Então, ajudar
a criança a criar é, mais uma vez, favorecer a afirmação da criança, seu
comportamento social e seu sentimento de pertinência ao grupo.
Essa proposta de trabalho que privilegia a expressão, a comunicação e
a criação, vai favorecer o desenvolvimento do pensamento operatório - um
pensamento lógico no qual a criança passa a operar a partir de esquemas
conceituais, onde “as ações físicas, típicas da inteligência sensório-motora,
passam a ser internalizadas, passam a ocorrer mentalmente” (Rappaport,
1981:72) -, e a descentração.
A descentração pode ser considerada como “o ponto de articulação
entre o afetivo e o operatório: é o resultado de uma perda sensóriomotora
afetiva e fantasmática, bem compensada por um ganho substitutivo,
da abstração plena e criativa” (Aucouturier, 1994: 9). Num primeiro
momento, a criança é centrada nela mesma, vê o mundo através das lentes
de sua emotividade, logo, deformado em função do excesso de afeto. Na
medida em que vai adquirindo uma representação de si mais estável, a
criança vai sendo capaz de ligar essas emoções às representações mentais,
ou seja, torna-se capaz de viver uma parte das emoções nas imagens. Não
se trata de perder as emoções, nem de separá-las das representações, mas de
integrá-las, permitindo à criança sair da dominação de seus afetos, podendo
ver o mundo de uma maneira diferente, menos interferida pelas emoções.
A criança, então, deixa de ser o ponto de partida de todo olhar em direção
ao mundo dos objetos, dos outros e a si próprio.
Compreende-se então que o trabalho não é focado no aspecto
instrumental, mecanicista, nem vai agir diretamente sobre o sintoma,
mas está voltado para o campo relacional e afetivo da criança, para suas
necessidades e motivações, favorecendo seu bem estar, base de sua
maturação psicológica.
A sessão de Psicomotricidade é para as crianças um lugar de prazer,
de comunicação e de desejo. Lugar aonde elas sempre vão com muito
interesse e felicidade. Esperam a sessão e dão continuidade às brincadeiras
103
Anais do Congresso
de uma sessão para a outra. As crianças naturalmente deram ao trabalho
o sinal/nome de pular (indicador e dedo médio da mão direita “pulam”,
como se fossem duas pernas, na palma da mão esquerda), atividade bastante
prazerosa e presente nas sessões, ao mesmo tempo em que é o sinal para
designar estar alegre, alegria.
Bibliografia
AUCOUTURIER, B.; DARRAULT, I.; EMPINET, J. A Prática
Psicomotora - reeducação e terapia. Porto Alegre: Artes Médicas,
1986.
AUCOUTURIER, B. Formação em Prática Psicomotora Aucouturier.
2002 e 2003. Notas de Aula.
AUCOUTURIER, B.
Letras,2007
O Método Aucouturier.
São Paulo: Idéias e
RAPPAPORT, R.; FIORI, W.; DAVIS, C. Teorias do Desenvolvimento,
volume 1. São Paulo: EPU, 1981.
SÁNCHEZ, P.; MARTINEZ, M.; PENÃLVER, I. A Psicomotricidade na
Educação Infantil, uma prática preventiva e educativa. Porto Alegre:
Artmed, 2003.
WINNICOTT, D. W. A criança e o seu mundo. Rio de Janeiro: Zahar
Editores, 1982.
104
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
CORPOREIDADE E SURDEZ
Ana Regina Griner1
Gostaria inicialmente de agradecer o convite que muito nos
“movimentou”para que pudéssemos participar desse encontro. Ao sermos
convidadas para esse seminário comemorativo dos 150 anos da instituição,
nos pediram que contássemos um pouco da nossa história desses 22 anos
de trabalho com a pré-escola(hoje chamada de educação infantil).
Optamos por iniciar nossa apresentação com esse primeiro momento de
movimento e consequentemente de prazer. Prazer pelo movimento, prazer
através do movimento. Começamos a nos mover, desde que estamos sendo
gerados, ainda na barriga de nossas mães em que estamos em movimento
constante e já sentimos prazer. A partir do nascimento, todo movimento do
bebê é de busca de satisfazer suas necessidades e conhecer o mundo, o que
leva ao prazer.
Ao chegarmos ao INES, ainda nos anos 80, recém formadas em
Educação Física e “engatinhando” no trabalho com crianças surdas,
decidimos juntas “tentar” um trabalho psicomotor para as crianças da préescola. Nesta época fazíamos a formação em Psicomotricidade Relacional
e decidimos então,propor um trabalho nessa linha.
Como observávamos as crianças sempre muito receptivas ao trabalho
corporal, porem de uma forma muito imitativa, copiando sempre o modelo
que o adulto lhes apresentava,entendemos que essa linha de trabalho seria
bastante adequada pois propõe um trabalho mais livre,mais lúdico,que
nós mesmas experimentávamos em vivências práticas nos cursos de
Psicomotricidade Relacional. Neste momento, Lenita Viana,então
diretora da instituição e também psicomotricista nos apoiava bastante e
nos estimulava a acreditar e investir na nova proposta com as crianças. A
proposta consistia em proporcionar às crianças, através do brincar, a partir
do jogo simbólico, um espaço de prazer sensório- motor, de busca do auto
conhecimento e de comunicação consigo e com o outro.
1
INES - Brasil
Professora de Educação Física do I.N.E.S.
Sócia titular da Sociedade Brasileira de Psicomotricidade.
Psicomotricista Relacional
Watsuterapeuta
105
Anais do Congresso
“A Psicomotricidade Relacional acontece a partir e através do
movimento sobre a globalidade do indivíduo. Objetiva permitir a expressão
de seus potenciais e de suas dificuldades relacionais e ajuda a evoluir
utilizando a expressão livre e o brincar. Brincar com o que a criança traz
para que com isso ela evolua.”André Lapierre
Na prática isso se dava da seguinte forma: as crianças ao chegarem
ao espaço da aula, encontravam, a cada dia, diferentes materiais como
bolas, cordas, bambolês, panos, almofadas, jornais, etc.e lhes era permitido
explorar livremente o material oferecido, o espaço e os outros, criando
situações e/ ou brincadeiras que as agradassem. A postura do adulto sempre
foi de espera e de disponibilidade corporal para o “jogo” proposto.
Percebemos que cada vez mais as crianças se mostravam mais confiantes,
criativas, com maior independência e, conseqüentemente indivíduos mais
autônomos.
Depois de 10 anos desenvolvendo esse trabalho, diversos acontecimentos
nos levaram à transformação dessa proposta original resultando na
dissolução da dupla de trabalho.
Hoje, 22 anos depois, eu continuo trabalhando com as crianças como
professora de Educação Física atendendo-as duas vezes por semana e, com
a construção de uma piscina na escola, e com toda a formação e experiência
que tenho no desenvolvimento de atividades na água (Especialização
em natação para bebês, Watsuterapeuta) acrescentei ao trabalho de
psicomotricidade, uma proposta de atividades,também em grupo,na
piscina.
Água, lugar de prazer e muitas vezes lugar de insegurança, de perda de
controle, de mudança de apoio... Para algumas crianças, a imersão é um
prazer profundo, mas para outras provoca um medo intenso. O contato da
criança pequena com o meio aquático sempre inclui tensões emocionais,
positivas ou negativas. Muitas vezes ela precisa de um contato assegurador
com um corpo adulto. Mais ainda que no solo, o corpo do adulto deve ser o
elo de segurança para as crianças.
É um espaço de trabalho muito rico já que as crianças podem vivenciar
suas emoções, independente do espaço e do material utilizado, e o adulto
as acolhe com um olhar atento, cuidadoso e muitas vezes cúmplice. Cada
movimento criado pelas crianças é valorizado e estimulado para que os
outros alunos tentem experimentá-lo e assim possam descobrir novas
formas de exploração de seu próprio corpo.
Com isso, visa-se potencializar novas descobertas de movimentos,
trabalhando sempre naquilo que as crianças podem oferecer e não na falta.
Isso gera mais confiança em seu próprio corpo e, em decorrência maior
autonomia.
É um momento de grande prazer para as crianças. Seus rostos felizes
106
e suas gargalhadas durante as aulas ou, ainda antes, sua excitação e
contentamento quando me vêem chegar à sala de aula para buscá-los, me
dão a certeza de estar trilhando o caminho certo.
ASPECTOS IMPORTANTES PARA A REALIZAÇÃO
DO TRABALHO
- Não existe cobrança no desempenho.
- Não se valoriza o acerto e o erro.
- Não se valoriza a competição.
- Valorização da possibilidade de cada um.
- Criação de um
desejo autêntico
de comunicação.
- Maior autonomia.
ADULTO
- Disponibilidade corporal e lúdica.
- Imagem de segurança.
- Representante da lei.
- Continente.
- Maior possibilidade
de iniciativa.
- Aumento das
possibilidades de
relação e de vivências
em grupos.
ESPAÇO
- Exploração (reconhecimento).
- Diferenças materiais.
- Segurança / Contenção.
- Livre expressão.
- Desculpabilizante.
- Crianças mais soltas.
- Crianças mais criativas
- Crianças mais confiantes
VERDADEIRA SOCIALIZAÇÃO DA CRIANÇA
107
Anais do Congresso
Bibliografia
FREIRE, João B. Educação de Corpo Inteiro. São Paulo: Editora Scipione, 1994.
LAPIERRE, André. A Educação Psicomotora na Escola Maternal. São
Paulo: Editora Manole, 1986.
__ e LAPIERRE, Anne. O Adulto Diante da Criança. São Paulo: Editora Manole, 1987.
__ e AUCOUTURIER, Bernard. A Simbologia do Movimento. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1986.
__. Fantasmas Corporais e Prática Psicomotora. São Paulo: Editora
Manole, 1984.
108
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
VI Congresso Internacional
XII Seminário Nacional do INÊS
Mesa Redonda “Corporeidade e surdez”
Psicomotricidade Relacional:
A importância da corporeidade
no processo de aprendizagem
Professor Ms. José Leopoldo Vieira1
A Psicomotricidade Relacional é um método de trabalho que proporciona
um espaço de legitimação de desejos e sentimentos e potencializa o
desenvolvimento global, a aprendizagem, o equilíbrio da personalidade,
facilitando as relações afetivas e sociais. O sujeito - criança ou o adulto,
aluno ou professor - pode se mostrar na sua inteireza, com seu corpo, seus
medos, desejos, fantasias e ambivalências, na relação consigo mesmo, com
o outro e com o meio.
Visa, de forma prática, desenvolver e aplicar os conceitos relacionados
à corporeidade, portanto ao enfoque da globalidade humana. Busca
superar o dualismo cartesiano corpo/mente, enfatizando a importância da
comunicação corporal, não apenas pela compreensão da organicidade e de
suas manifestações, mas essencialmente pelas relações psicofísicas e sócioemocionais. Preza por uma abordagem preventiva, com uma perspectiva
qualitativa e, portanto, com ênfase na saúde e não na doença.
É uma práxis que procura dar um espaço de liberdade onde à criança
mostra-se inteira, com seu corpo, suas emoções, sua fantasia, sua inteligência
em formação. No espaço da Psicomotricidade Relacional, o sujeito pode
expressar seus conflitos, seus medos, sua ambivalência, seus sentimentos,
dentro da estrutura narrativa do jogo simbólico e espontâneo e nas relações
Jose Leopoldo Vieira
• Mestre em Educação Especial – UFRJ.
• Pós-Graduado em Educação na Área de Movimento Humano – Boston
University .
• Psicomotricista Relacional Didata Siac – França.
• Analista Corporal da Relação Siac – França.
• Pedagogo.
• Educador Físico.
1
109
Anais do Congresso
que estabelecem com seus coetâneos e com o psicomotricista relacional.
A Psicomotricidade Relacional se configura como um espaço de
legitimação de desejos, necessidades, limites e do conhecimento e
reconhecimento de si e dos outros. Espaço de desenvolvimento pessoal e
interpessoal, de estruturação da criança como SER, de investimento não
em dificuldades e sintomas, mas nas suas possibilidades de crescimento.
Para tanto se faz imprescindível, por parte do psicomotricista relacional,
uma atitude corporal de aceitação incondicional, de reconhecimento das
possibilidades que a criança possui, de modo a fazê-la sentir-se existir
como sujeito de sua própria história.
A atitude corporal de aceitação do outro, por parte de psicomotricista
relacional, implica apropriação do conceito de corporeidade como aspecto
fundamental de sua prática, uma vez que é através do movimento corporal
que a criança se comunica e amplia seu conhecimento.
O desenvolvimento dos aspectos psicomotores e relacionais são
fundamentais para a aprendizagem e socialização do sujeito. É através do
corpo e de suas experiências relacionais que ele se faz presente no mundo
e com o mundo.
O corpo compreendido como presença do sujeito no mundo torna-se
ferramenta fundamental da aprendizagem e da socialização em todos os
níveis de ensino, dentro de uma visão sistêmica.
A Psicomotricidade Relacional concebe o corpo e o sujeito como uma
unidade, portanto reforça o conceito de corporeidade aplicado às práticas
pedagógicas com a criança surda, favorecendo a conexão entre corpo e
mente e a expressão criativa do corpo que se comunica e se relaciona. A criança surda, encontra no jogo espontâneo da Psicomotricidade
Relacional, a possibilidade de se expressar, se comunicar, vivenciar suas
habilidades relacionais e encontrar soluções para suas dificuldades e
necessidades diárias, uma vez que integra o desejo à ação.
A seguir apresento uma experiência realizada pelo CIAR - Centro
Internacional de Análise Relacional, em convênio com a Secretaria
Municipal de Desenvolvimento Social de Fortaleza-CE, utilizando a
metodologia da Psicomotricidade Relacional:
Objetivo:
Despertar o desejo para aprender e elevar o nível de eficiência do
processo ensino-aprendizagem; buscar reduzir a taxa de repetência e evasão
escolar de crianças da primeira série do ensino fundamental de escolas da
rede pública do município de Fortaleza, situadas em áreas denominadas
“Cinturão de Pobreza”.
Metodologia:
110
1. Seleção dos Sujeitos:
De 3500 alunos de 25 escolas da rede pública municipal foram
selecionados 5%, o equivalente a 175 crianças que apresentavam dificuldades
de aprendizagem, altos níveis de repetência e evasão escolar, distúrbio
de atenção, hiperatividade, agressividade exacerbada, comportamentos
destrutivos, tristeza, depressão, necessidades educativas especiais, exclusão
social e um grande número de delinqüência infanto-juvenil.
Também foram atendidos os professores e os pais destas crianças.
2. Estratégias de Atendimento:
À Criança: 12 encontros em Psicomotricidade Relacional, com
freqüência semanal, com 90 minutos de duração, sendo as crianças
divididas em 14 grupos.
Aos Professores: 5 encontros em Psicomotricidade Relacional com
freqüência mensal, perfazendo um total de 30 horas.
Aos Pais: 8 encontros com freqüência mensal, sendo 4 para palestras
informativas e 4 para reuniões de acompanhamento, orientação e avaliação
do processo evolutivo de seus filhos.
Resultados finais:
Os atendimentos foram ampliados e atingiram um total de 3660
crianças,além de seus pais ou responsáveis e professores, propiciando:
•
•
•
•
•
•
•
Redução do índice de comportamentos destrutivos.
Favorecimento das relações afetivas professor - aluno, aluno aluno.
Elevação da auto-estima e auto-confiança.
Fortalecimento da autonomia e identidade.
Melhoria nos níveis de comunicação e desempenho escolar.
Crescimento do potencial criativo e construtivo
Redução dos níveis de stress.
Relato da experiência
Nos encontros de Psicomotricidade Relacional realizados pôde-se
observar: crianças em sua maioria desacreditadas, desrespeitadas, assustadas,
porém guerreiras. Cada uma, a seu modo, buscava se auto desenvolver para
preencher vazios afetivos e enfim, lutavam por um espaço de escuta de
seus mais profundos sentimentos. Algumas crianças eram provenientes de
estruturas familiares desfeitas ou desagregadas e não encontravam, nem
em casa e tão pouco na escola, um lugar de segurança. Pareciam viver,
portanto, na ameaça da rejeição, do abandono e do espancamento. Em
contrapartida, agiam e reagiam com agressividade e violência, embora não
tivessem perdido ainda o desejo de se sentirem aceitas e amadas. Outras
111
Anais do Congresso
crianças eram superprotegidas e mimadas, recusavam as propostas, e se
fechavam em crises de birra quando se deparavam com limites e frustrações,
refletindo um despreparo na capacidade de superação de obstáculos: se
paralisavam, perdendo a oportunidade de aprender, viver e SER de forma
melhor e diferente, refletindo as dificuldades dos pais em lidarem com seus
próprios limites de não poderem lhes oferecer uma perspectiva de vida
melhor do que a que tiveram.
Inicialmente, as crianças, chegavam à clínica cheios de expectativas
e explodiam de euforia ao perceber que havia ali um tempo, um espaço
e um adulto que lhes permitia jogar por inteiro, num jogo sem palavras,
porém cheio de significados vividos corporalmente, significados estes
muitas vezes negados, bloqueados ou proibidos pelas instituições sociais
em que viviam: família, escola, meio social, entre outros. Estas situações
despertavam na criança tensões afetivas de ansiedade e de angústia, o que
lhe dificultavam o aprendizado e as relações de um modo geral.
Constatou-se inicialmente, nas sessões de Psicomotricidade Relacional,
que as atividades se orientavam espontaneamente em 2 direções opostas:
de um lado a agressividade, expressa sob a forma de brincadeira, mas, às
vezes, investida em crises de violência e de raiva, com forte implicação
emocional desembocando, com freqüência, no assassinato simbólico do
adulto, símbolo de poder. De outro lado, a procura de um acordo, carregado
de afetividade e de ternura, exprimindo-se, freqüentemente, sob uma forma
regressiva, por meio de relações do tipo parental - pai ou mãe.
Observou-se que esse jogo corporal, inicialmente vivido em forma
de agressividade primitiva, violenta, e, por conseguinte, culpabilizada,
sinalizava que as crianças necessitavam desculpabilizar e destensionar os
contatos corporais, para poderem contatar com uma comunicação mais
verdadeira, onde pudessem se deixar envolver e se entregar em relações
afetivas, onde se sentissem aceitas e sintonizados afetivamente com o
outro.
Após essa vivência, puderam retomar a pulsão de agressividade de
forma positiva, construtiva e investida em situações de bem estar e de
autonomia, para conseqüentemente, melhorar seu desempenho escolar.
Observou-se que a situação de miséria social, nutricional e
afetiva, em que viviam as crianças, acionavam negativamente as pulsões
agressivas, no entanto, percebia-se que essas pulsões eram também de
auto-conservação e lhes ajudavam a manter a auto-estima.
Conforme Lapierre (1987),
a relação da criança não é, como fazem crer os manuais de pedagogia,
uma relação em sentido único, na qual o adulto atua sempre consciente e
racionalmente sobre a criança. Os comportamentos da criança, e especialmente
seus comportamentos mais autênticos, os menos “culturais”, despertam um eco
112
no adulto, envolvem-no pessoalmente, provocando respostas que nem sempre
são conscientes. E nas quais ele expressa seus próprios problemas. Não levar
em conta este aspecto da relação é uma atitude cômoda, confortável para o
adulto, mas que elude uma parte essencial do problema da educação.
A agressividade aparecia, em suma, como uma procura de relações e
uma defesa da identidade.
Liberada da agressividade primária que puderam exprimir, e da sua
agressividade secundária reacional, através da aceitação do adulto, a
criança está disponível para a busca do acordo. O acordo é uma procura
de simultaneidade, de escuta e disponibilidade para o outro; O acordo
vivenciado na Psicomotricidade Relacional, foi transposto para todas as
atividades de construção diárias e buscas intelectuais, num trabalho em
grupo onde as relações de ajuda tornaram-se mais importantes do que as
competitivas.
A busca de acordo levou as crianças a uma verdadeira socialização e não
somente à submissão a uma regra comum, ou seja, surgiram a possibilidades
de trocas autênticas com os outros, de compreensão, aceitação e respeito.
Procurou-se canalizar a energia combativa, de forma que fosse orientada
individual e coletivamente, não mais contra o outro, contra o mundo
exterior; não mais para destruí-lo, mas para construí-lo e dominá-lo, e,
nessa conquista do mundo, o outro deixou de ser um obstáculo tornando-se
um parceiro na busca constantemente do desejo de aprender.
Bibliografia
Harper, B. at alii (1980). Cuidado escola! Desigualdade, domesticação
e algumas saídas. São Paulo: Brasiliense.
Lapierre, A & Lapierre A (1987). O adulto diante da criança, de 0 a
3 anos. São Paulo: Manole
Lapierre, A & Aucouturier, B. (1988). A simbologia do Movimento,
Psicomotricidade e educação. Porto Alegre: Artes Médicas
113
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
POLÍTICAS PÚBLICAS E A EDUCAÇÃO DE
ALUNOS SURDOS
Claudia Pereira Dutra*
O Ministério da Educação difunde nacionalmente a política de educação
inclusiva, que se define pela promoção do acesso de todos os alunos à escola
da sua comunidade, independente de suas diferenças sociais, culturais,
étnicas, raciais, sexuais, físicas, intelectuais, emocionais, lingüísticas e
outras. A política educacional adotada tem como objetivo alterar a estrutura
tradicional da escola, fundada em padrões de ensino homogêneo e critérios
de seleção e classificação, passando a orientar os sistemas educacionais
inclusivos para que garantam o direito de todos à educação, desenvolvam
projetos educacionais que contemplem a diversidade presente no contexto
escolar e atendam as necessidades educacionais dos seus alunos.
Dentre as diferentes áreas do campo de conhecimento da educação
especial, destaca-se a educação de alunos surdos, fortalecida nos últimos
anos pelos programas de educação inclusiva, que visam à promoção da
participação e aprendizagem de todos os alunos nas escolas da rede regular
de ensino. Fundamentada na concepção de direitos humanos, para além da
igualdade de oportunidades, a inclusão focaliza a valorização das diferenças
na escola e a mudança nas práticas pedagógicas, de modo a eliminar as
barreiras para o acesso ao currículo. A organização das políticas públicas
traz o acúmulo das conquistas dos movimentos sociais representativos
da comunidade surda, das pesquisas desenvolvidas pelas universidades
brasileiras e das experiências das escolas que constituíram avanços para a
educação inclusiva.
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada
pela ONU em 2006, ultrapassa a visão da limitação da pessoa para enfatizar
suas relações com o ambiente, configurando o compromisso entre os países
para assegurar um sistema de educação inclusiva em todos os níveis de
ensino, maximizando o desenvolvimento acadêmico e social, tendo
estabelecido a meta de inclusão plena e garantir que as crianças do sistema
educacional geral não sejam excluídas sob alegação de deficiência e possam
ter acesso ao ensino fundamental inclusivo na comunidade em que vivem.
*Secretária Nacional de Educação Especial.
114
A conseqüência dessa mudança de concepção pode ser observada no
aumento do número de alunos surdos na educação básica e superior nos
últimos anos e na valorização profissional dos professores e instrutores de
Libras, que passaram a fazer parte da comunidade escolar e da comunidade
acadêmica. No Brasil, os dados do Censo Escolar/2006 registram a matrícula
de 69.420 alunos surdos ou com deficiência auditiva na Educação Básica e
os indicadores do Censo da Educação Superior/2005 apontam 2.428 alunos
com deficiência auditiva. Atualmente existem 17.415 escolas de educação
básica que registram a matrícula de alunos com deficiência auditiva.
Com o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais (Libras), e
principalmente com a publicação do Decreto n.º 5.626/05, a oferta do
ensino de Libras, como direito dos alunos surdos, passa a ser a diretriz que
norteia todos os sistemas de ensino. A orientação para sua implementação,
por meio do desenvolvimento da política de educação inclusiva, torna-se
condição necessária para viabilizar a ampliação do acesso e a qualidade do
processo educacional a todos os alunos.
A Libras e a Língua Portuguesa como segunda língua, na modalidade
escrita, constituem parte do atendimento educacional especializado a serem
desenvolvidas nas escolas em que os alunos surdos estão matriculados,
compreendida como para integrante da sua formação. Assim, os sistemas
de ensino devem organizar classes abertas a alunos surdos e ouvintes,
viabilizar cursos de formação de professores, disponibilizar serviços de
tradutor e intérprete de Libras/Língua Portuguesa e organizar a oferta do
atendimento educacional especializado nas salas de recursos, de forma
complementar à escolarização.
O direito que os alunos surdos têm de se matricular na rede regular
de ensino determina que as escolas devam organizar-se para atender
à sua diferença lingüística, assumindo novas responsabilidades no
desenvolvimento do processo educacional dos alunos surdos. O acesso à
comunicação, à informação e à educação deverá ser garantido mediante
a implementação da Libras e da Língua Portuguesa como línguas de
instrução. O conhecimento de duas ou mais línguas, o convívio com as
diferenças de todos na escola e na comunidade constituem um conjunto
de competências e experiências que aproximam a prática docente das
necessidades de aprendizagem dos alunos. Dessa forma, a formação de
professores altera a perspectiva clínica e passa a dar ênfase ao enfoque
pedagógico que modifica a atuação docente e lhe permite tomar as decisões
quanto ao processo educacional, dando respostas às diferenças dos alunos.
115
Anais do Congresso
O Brasil destaca-se na América Latina, porque tem uma política
educacional que prevê a inclusão de todos os alunos, o que tem provocado
uma profunda mudança na estrutura dos cursos de educação superior.
Projeta-se, porque reconheceu a Língua de Sinais como meio legal de
comunicação, utilizada por um expressivo grupo de brasileiros, fato que
colocou a Libras como disciplina na formação inicial de todos os professores
e fonoaudiólogos e desencadeou a oferta de cursos de licenciatura que
contemplam as especificidades lingüísticas. A formação de professores
para ensinar alunos surdos da educação básica e superior possibilitará a
construção de uma identificação positiva com a língua de sinais e uma nova
visão de mundo e da surdez.
Neste momento, de redefinição da política educacional e de
transformação na educação, denota-se a importância da oficialização
e regulamentação da Língua Brasileira de Sinais, um ato que teve papel
preponderante nesse processo que envolveu as dimensões relacionadas à
garantia dos direitos dos alunos, da formação dos professores, da organização
escolar e das atitudes. Sem perder de vista os desafios a serem enfrentados
pela escola que ainda está aprendendo a compreender esse percurso na
educação dos alunos surdos, torna-se imprescindível realizar um projeto
pedagógico fundamentado na concepção da educação inclusiva, que não
anule as diferenças e passe a estabelecer um novo olhar que reconhece a
singularidade de cada aluno como fator de enriquecimento pessoal e de
toda a comunidade, contribuindo para a conquista de espaços educacionais,
sociais e culturais que fortaleçam a inclusão dos alunos surdos.
A Secretaria de Educação Especial/MEC, ao implementar as políticas
que dizem respeito ao cumprimento Decreto n.º 5.626/2005, que dispõe
sobre a Língua Brasileira de Sinais, desenvolve ações que visam apoiar os
sistemas de ensino para garantir as condições de acesso ao currículo aos
alunos surdos. Dentre os programas, destacam-se:
• Prolibras – Exame Nacional para Certificação de Proficiência em
Língua Brasileira de Sinais (Libras) e Exame Nacional para Certificação
de Proficiência em Tradução e Interpretação de Libras/Língua Portuguesa,
realizado por instituições federais de ensino credenciadas. Em sua primeira
edição, em 2006, o Prolibras teve mais de quatro mil participantes, dos
quais 1.349 foram certificados. Esse exame, que acontecerá anualmente
pelo período de dez anos a contar da data de publicação do Decreto, visa
colocar à disposição dos sistemas de ensino profissionais habilitados para
ensino da Libras e para os serviços de tradução/interpretação de Libras/
Língua Portuguesa;
116
• Curso de Pedagogia Bilíngüe – Libras/Língua Portuguesa – No
Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), teve início o primeiro
curso superior bilíngüe para a formação de professores surdos e ouvintes
para a atuação nos anos iniciais do ensino fundamental e na educação
infantil;
• Curso Superior de Letras com Licenciatura em Língua Brasileira
de Sinais/Libras – Implantado em 2006, por meio da parceria do MEC
com a Universidade Federal de Santa Catarina, visando à formação de
professores surdos e ouvintes para o ensino da Libras, esse curso acontece
na modalidade a distância e é oferecido por nove instituições federais de
ensino superior: Universidade Federal do Amazonas, Universidade Federal
do Ceará, Universidade Federal da Bahia, Universidade de Brasília, Centro
Federal de Educação Tecnológica de Goiás, Instituto Nacional de Educação
dos Surdos, Universidade de São Paulo, Universidade Federal de Santa
Maria. Os quinhentos alunos desse curso serão os primeiros professores
licenciados para ministrar a disciplina de Libras nos cursos da educação
superior e nos cursos da educação básica;
• Programa Interiorizando Libras – Desenvolvido em parceria do
MEC com a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos
(FENEIS) e com a Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Auditivos
(APADA/DF). O programa promove cursos de formação continuada de
professores para o atendimento educacional especializado de alunos surdos
e com deficiência auditiva, que contempla quatro eixos temáticos: Ensino
de Língua Portuguesa para surdos, Formação de Tradutor e Intérprete de
Libras/Língua Portuguesa, Formação de Instrutores Surdos, Formação de
professores para o uso da Libras;
• Centro de Formação de Profissionais da Educação e de Atendimento
às Pessoas com Surdez (CAS) – Implementado em parceria com o MEC e
todos os estados, os CAS constituem espaços com equipamentos e recursos
para serem utilizados em cursos de formação continuada de professores, em
produção de material bilíngüe, em atendimento educacional especializado
às pessoas com surdez e têm a função de atuar como multiplicadores dos
cursos do Programa Interiorizando Libras;
• Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais
– Criado no âmbito do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), para
apoiar os sistemas de ensino na institucionalização da oferta do atendimento
educacional especializado nas escolas da rede pública de ensino. Esses
espaços se destacam na produção de materiais, organização de recursos e
117
Anais do Congresso
atividades para a promoção da acessibilidade ao currículo. No que se refere
à educação de alunos surdos, as atividades desenvolvidas, no turno inverso
da escolarização possibilitam aos alunos surdos a aprendizagem da Libras
e da Língua Portuguesa como segunda língua;
• Programa de Formação Continuada de Professores na Educação
Especial – Com objetivo de formar professores na perspectiva da
educação inclusiva, o programa, que integra as ações do PDE, forma uma
rede de instituições públicas de educação superior para oferta de cursos
de extensão, aperfeiçoamento e especialização nas áreas do atendimento
educacional especializado. Com relação à educação de alunos com surdez,
foram credenciados seis cursos: Educação de Surdos sob o Enfoque
da Inclusão, pela Universidade Federal do Pará (UEPA); A Educação
Especial: Déficit Cognitivo e Educação de Surdos, pela Universidade
Federal de Santa Maria (UFSM); Professor e Surdez: Cruzando Caminhos,
Produzindo Novos Olhares, pela Universidade Federal de Uberlândia
(UFU); Libras a Distância: Uma Proposta de Formação Continuada
de Professores no Contexto Educacional Inclusivo, pela Universidade
Estadual Paulista (UNESP/Marília); Formação Continuada em Educação
Especial: Deficiência Auditiva, pela Universidade Federal do Amazonas
(UFAM); Deficiência Sensorial Auditiva e Educação Escolar Indígena,
pela Universidade Estadual de Maringá (UEM);
• Programa Incluir: Acessibilidade na Educação Superior – Iniciado
em 2005, o programa foi fortalecido ao compor o conjunto de ações do
PDE, atuando no fomento à criação de núcleos de acessibilidade nas
instituições federais de educação superior para o desenvolvimento de ações
de eliminação das barreiras físicas, pedagógicas e nas comunicações que
possibilitem garantir condições de acesso e permanência dos alunos com
deficiência na educação superior.
Além dessas ações, destacam-se os avanços com relação à acessibilidade
nos programas do livro didático e paradidático desenvolvidos pelo Fundo
Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Por meio do Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD) e do Programa Nacional da Biblioteca
Escolar (PNBE), foram distribuídos os clássicos da literatura em Libras, os
dicionários ilustrados trilíngües – Libras/Português/Inglês –, o livro didático
de alfabetização acessível em Libras, e também a produção da coleção de
livros nas disciplinas de língua portuguesa, matemática, ciências, geografia
e história, em Libras, destinados aos alunos com surdez dos anos iniciais do
ensino fundamental que começam a ser distribuídos no próximo ano.
A ampliação dos títulos em Libras distribuídos pelo programa vem
118
atender a necessidade de acesso aos materiais didáticos disponibilizados
a todos os alunos e sua utilização pelos alunos surdos na língua que
lhes possibilite maior facilidade para compreensão e interpretação. Por
meio dessas ações governamentais, os sistemas de ensino passam a ter
referenciais para atender à diferença lingüística dos alunos surdos dentro de
uma classe comum. A educação bilíngüe acontece na classe comum, onde
o ensino é ministrado na língua portuguesa, e pode contar com a presença
de tradutor-intérprete da Libras; uma escola que oferta a Libras para os
alunos surdos e pode estendê-la aos colegas e aos professores para que haja
comunicação entre todos. Nesse contexto, a atuação docente, especialmente
dos professores surdos, para o ensino de Libras dará possibilidade às
crianças surdas de desenvolver-se tendo atendidas as suas singularidades
lingüísticas, e com o conhecimento de que a pessoa surda tem potenciais
para exercer as mesmas funções de um professor ouvinte.
Bibliografia
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Lei
n.º. 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de
Sinais (LIBRAS) e dá outras providências.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial.
Decreto n.º 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei n.º
10.436, de 24 de abril de 2002.
BRASIL. INEP. Censo Escolar, 2006. Disponível em: <http://www.inep.
gov.br/basica/censo/default.asp >. Acesso em: 20 de jan. 2007.
ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência, 2006.
119
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO
ESPECIAL DA SECRETARIA DE ESTADO
DE EDUCAÇÃO DO RIO DE JANEIRO: AS
QUESTÕES DA INCLUSÃO ESCOLAR DE
ALUNOS COM NECESSIDADES
EDUCACIONAIS ESPECIAIS
Roseni Cardoso*
A Educação Especial vem exercendo papel de grande relevância no
sistema educacional brasileiro, considerando as crescentes exigências
de uma sociedade em processo de desenvolvimento e de afirmação da
democracia. Para tal, faz-se necessária, portanto, uma Política em Educação
de qualidade, em que todos os alunos recebam o apoio particular requerido
por suas necessidades individuais de aprendizagem, com vistas à educação
inclusiva.
Historicamente, a Educação Especial assumiu diferentes concepções,
terminologias e modalidades de atendimento educacional. Ao final do
século XIX e início do século XX, sob uma concepção segregacionista,
surgiram as instituições de internação e asilamento de todos os indivíduos
que tinham seqüelas físicas ou mentais.
Na década de 50, foram criadas as escolas especiais de atendimento
exclusivo aos alunos com deficiência, então chamados de excepcionais.
Posteriormente, as disposições da LDB nº 4.024/1961 apontavam o direito
dos excepcionais à educação, preferencialmente no sistema geral de
ensino.
Sob a concepção integracionista foram criadas as classes especiais nas
escolas da rede regular. Nesse contexto, o encaminhamento do aluno às
classes comuns estava atrelado às suas condições de se adaptar aos padrões
estabelecidos pela escola regular.
Em 1988, a Constituição Federal do Brasil assim como outros
documentos oficiais, consoantes com a demanda humana e social por
inclusão das pessoas com necessidades especiais nas diversas instâncias
sociais, preconiza sua inclusão na escola regular.
Essa determinação fortaleceu-se por intermédio do compromisso
político e ético assumido pelo Brasil ao manifestar consonância com os
120
*
SEE/RJ
postulados elaborados em Salamanca (Espanha, 1994) na Conferência
Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais: Acesso e Qualidade.
Entretanto, em 1994, a Política Nacional de Educação Especial elaborada
pelo MEC/SEESP ainda adota o discurso integracionista, condicionando
o acesso às classes comuns àqueles que “[...] possuem condições de
acompanhar e desenvolver as atividades curriculares programadas do
ensino comum, no mesmo ritmo que os alunos ditos normais”.
É importante destacar que, por outro lado, a LDB n.º 9394/1996
define a Educação Especial como modalidade de educação escolar e deve
ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para os
educandos com necessidades educacionais especiais, devendo assegurarlhes: “Currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização
específica para atender às suas necessidades”.
Ao regulamentar o Capítulo V – Educação Especial –, da LDB em vigor,
o Conselho Nacional de Educação, por meio da Resolução n.º 2/2001,
determina a obrigatoriedade dos sistemas de ensino quanto à matrícula de
todos os alunos, cabendo às escolas organizarem-se para o atendimento
aos educando com necessidades educacionais especiais, assegurando as
condições necessárias para uma educação de qualidade para todos.
Dessa maneira, contrapondo-se ao Paradigma da Integração, a Inclusão
Escolar implica a organização das escolas no sentido de oferecer as
condições necessárias para o atendimento às necessidades educacionais de
todos os alunos, em um ambiente pedagógico acolhedor e diversificado,
contribuindo assim de maneira significativa para o seu desenvolvimento
cognitivo, desiderativo, social e cultural.
A inclusão escolar se fundamenta em pressupostos éticos e democráticos
de reconhecimento e valorização da diversidade humana e cultural,
como características inerentes à constituição de qualquer sociedade, com
princípios éticos e políticos estabelecidos no cenário dos Direitos Humanos,
afirmando a importância de garantir o acesso e a participação de todos, a
todas as oportunidades, independentemente das peculiaridades dos alunos.
Nessa perspectiva, a Educação Especial é entendida como
elemento integrante e indistinto do sistema educacional que se realiza
transversalmente, em todos os níveis e modalidades de ensino, nas
instituições escolares, cujo projeto, organização e prática pedagógica devem
respeitar a diversidade dos alunos. Suas ações devem refletir a capacidade
que todos têm de aprender, dando ênfase à convivência e aprendizagem na
heterogeneidade como a melhor forma para a construção do conhecimento
e promoção da cidadania.
No que diz respeito à educação de alunos surdos, foco temático
deste Congresso, a Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro/
SEEDUC/RJ, com base em dispositivos legais e documentos oficiais, vem
121
Anais do Congresso
implementando a política de inclusão desse alunado nas classes comuns
das escolas regulares.
De acordo com o Censo Escolar de 2006, a rede estadual possui 1.229
alunos surdos e com deficiência auditiva matriculados, sendo 710 em
classes e escolas especiais e 519 incluídos na rede regular de ensino. No
decorrer dos últimos anos podemos constatar uma demanda cada vez maior
desse alunado às escolas estaduais. Entretanto, reconhecemos que muitos
ainda não estão tendo acesso à educação.
Entendendo que a inclusão social e educacional se processará de forma
gradativa e responsável, a rede estadual de ensino do Rio de Janeiro vem
oferecendo as seguintes modalidades de atendimento:
Exclusivas para alunos com necessidades educacionais especiais:
Os professores que atuam nestes espaços são especializados, bilíngües,
conhecedores das necessidades educacionais especiais dos alunos surdos e
com deficiência auditiva.
ESCOLAS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO ESPECIAL
Anne Sullivan – Niterói
Maria Ivete de Vasconcelos – Rio de Janeiro
Neuza Goulart Brizola – Nova Friburgo
CENTROS INTEGRADOS DE EDUCAÇÃO ESPECIAL
Castorina Faria Lima - Nova Iguaçu
Diogo Levenhagen - Volta Redonda
CLASSES ESPECIAIS
Com base na Lei n.º 10.436/2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira
de Sinais (Libras), regulamentada pelo Decreto n.º 5.626, de 22 de dezembro
de 2005, como também em outros dispositivos legais que preconizam a
inclusão dos alunos surdos nas escolas da rede regular de ensino, a
SEEDUC/RJ vem desenvolvendo ações e implementando projetos com o
intuito de garantir o acesso, a participação e a aprendizagem desse alunado
no ambiente escolar comum.
Destacaremos a seguir alguns artigos do Decreto supracitado, fazendo
um paralelo com a Política de Inclusão da SEEDUC/RJ, demonstrando
assim a consonância de suas diretrizes.
Conforme o que dispõe o Art. 9.º do Decreto n.º 5.626/2005, “As
instituições de ensino médio que oferecem cursos de formação para o
magistério na modalidade normal devem incluir Libras como disciplina
curricular.”
No ano de 2007, onze Institutos de Educação da rede estadual do Rio de
122
Janeiro ofereceram cursos de Libras, sob a chancela da Associação de Pais e
Amigos dos Deficientes Auditivos (APADA) de Niterói, para alunos do 4.º
ano do Curso Normal como atividade complementar, enquanto aguardamos
a conclusão do processo de inclusão da Libras, como disciplina, na Matriz
Curricular do referido curso.
O Art.14, complementado pelo § 3.º, dispõe que as instituições de ensino
devem garantir, obrigatoriamente, às pessoas surdas acesso à comunicação,
à informação e à educação nos processos seletivos, nas atividades e
nos conteúdos curriculares desenvolvidos em todos os níveis, etapas e
modalidades de educação, desde a educação infantil até a superior.
Para tanto, preconiza ainda em seu § 1º que, para garantir o atendimento
educacional especializado e o acesso previsto no caput, as instituições de
ensino devem:
a) Promover cursos de formação de professores
Nesse sentido, considerando que os professores que atuam no
sistema regular de ensino não tiveram, em sua formação inicial, acesso a
conhecimentos relativos às necessidades especiais educacionais dos alunos
surdos, a SEEDUC/RJ vem desenvolvendo um Programa de Formação
Continuada desses professores para o atendimento educacional demandado
por esse alunado.
Assim, esta Secretaria tem oferecido sistematicamente cursos na área
da surdez para professores que, em sua maioria, desenvolveram concepções
equivocadas a respeito da educação de surdos no que se refere ao potencial
deste alunado para a escolarização, autonomia e emancipação.
Esses cursos também abordam aspectos como:
•
a singularidade lingüística manifestada pelos alunos surdos;
•
o reconhecimento da Língua Portuguesa como segunda língua
para as pessoas surdas, enfatizando a necessidade do ensino dessa língua
na modalidade escrita para esses educandos;
•
a valorização do aspecto semântico em detrimento do aspecto
formal na produção escrita do aluno surdo, adotando mecanismos de
avaliação coerentes com aprendizado de segunda língua, na correção das
provas escritas;
•
a importância da utilização de recursos visuais e a correlação dos
conteúdos curriculares com situações do cotidiano para o desenvolvimento
da capacidade representativa e lingüística dos alunos surdos.
Fazendo parte desse Programa são oferecidos também cursos de Libras,
com prioridade aos professores que estão interagindo com alunos surdos
incluídos nas classes comuns.
b) Prover as escolas com tradutor e intérprete de Libras – Língua
Portuguesa
Com vistas à inclusão do aluno surdo, a SEEDUC/RJ iniciou em
123
Anais do Congresso
2003 o projeto de Contratação de Tradutor e Intérprete de Libras/Língua
portuguesa com 30 intérpretes atuando em 12 escolas. Atualmente a rede
estadual de ensino do Rio de Janeiro possui um total de 130 intérpretes de
Libras exercendo suas funções em 62 escolas da rede estadual de ensino,
constituindo-se dessa forma em escolas bilíngües.
Esses profissionais vêm atuando nas salas de aula para viabilizar o
acesso dos alunos surdos aos conhecimentos e conteúdos curriculares, em
todas as atividades didático-pedagógicas, como também em momentos
livres, viabilizando uma conversa informal dos alunos surdos com os
alunos ouvintes.
Temos clareza de que o uso da Libras no cotidiano da sala de aula
não é suficiente para viabilizar a aprendizagem do aluno surdo, pois
contrário a esta lógica seria afirmar que todos os alunos ouvintes teriam
ótimo aproveitamento escolar, dada a sua condição de usuários da língua
portuguesa.
Algumas mudanças estruturais fazem-se necessárias no contexto da
sala de aula de modo que o professor reflita sobre sua práxis pedagógica
com base nos princípios da educação inclusiva, promovendo um ambiente
acolhedor, interativo, diversificado, atraente e desafiador, que potencialize
a capacidade de aprender de todos os alunos, sejam surdos ou ouvintes.
Ainda vem a ser do entendimento comum pensar que o professor da
classe regular com alunos surdos incluídos, ao aprender a Libras, não
precisaria da mediação do tradutor e intérprete. A função deste profissional
é distinta e indissociável da função de professor docente. Isto porque na
sala de aula são utilizadas simultaneamente duas línguas (Libras e língua
portuguesa), o que se torna uma tarefa impossível para a atuação do
professor regente.
Com o intuito de evitar que o tradutor e intérprete assuma a tutoria dos
alunos surdos no espaço escolar, a SEEDUC/RJ vem oferecendo, conforme
afirmado anteriormente, cursos de Libras para professores para que possam
estabelecer com os alunos surdos interações sociais e de comunicação,
minimizando a dependência do intérprete.
c) Garantir o atendimento às necessidades educacionais especiais de
alunos surdos, desde a educação infantil, nas salas de aula e, também, em
Salas de Recursos, em turno contrário ao da escolarização
Nesta perspectiva, a rede estadual de ensino do Rio de Janeiro iniciou
este ano, 2007, uma experiência de participação de instrutores surdos
em duas turmas de educação infantil regular com duas crianças surdas
incluídas. Esse trabalho vem sendo acompanhado por professoras do
Núcleo de Apoio Pedagógico Especializado (NAPES), assim como por
profissionais da APADA de Niterói/RJ.
Reconhecendo a importância da Sala de Recursos como um espaço
124
de complementação curricular, a SEEDUC/RJ vem investindo na
implementação dessa modalidade de atendimento educacional especializado
na rede estadual de ensino, e, no que diz respeito ao aluno surdo, enfatiza-se
o ensino da modalidade escrita da língua portuguesa como segunda língua,
na perspectiva dialógica, funcional e instrumental.
Esse serviço de apoio pedagógico à inclusão escolar é oferecido no
contraturno da escolarização do aluno surdo e se destina somente a alunos
surdos incluídos nas classes comuns das escolas públicas estaduais do Rio
de Janeiro. Nesse ambiente são disponibilizados equipamentos, permitindo
o acesso às novas tecnologias de informação e comunicação, bem como
recursos didáticos para apoiar a educação de alunos surdos.
A SEEDUC/RJ publicou a Resolução n.º 3.129/2005, que normatiza a
estrutura e o funcionamento das Salas de Recursos, e, no que diz respeito
ao atendimento educacional especializado para os alunos surdos incluídos,
esta Resolução determina que os professores, para atuarem nesses espaços,
precisam ser proficientes em Libras.
Em conformidade com o Art. 22 do Decreto n.º 5.626/2005, as
instituições de ensino responsáveis pela educação básica devem garantir
a inclusão de alunos surdos ou com deficiência auditiva, por meio da
organização de escolas bilíngües ou escolas comuns da rede regular de
ensino, abertas a alunos surdos e ouvintes, com docentes conhecedores da
singularidade lingüística dos alunos surdos, além da mediação de tradutores
intérpretes de Libras / Língua Portuguesa.
Podemos afirmar que as escolas da rede estadual de ensino do Rio
de Janeiro que possuem alunos surdos incluídos nas classes comuns
constituem-se escolas bilíngües, haja vista que a Libras e a modalidade
escrita da Língua Portuguesa são línguas de instrução utilizadas no
desenvolvimento de todo o processo educativo desse alunado.
Serviços de apoio especializado
Núcleos de Apoio Pedagógico Especializado (NAPES)
Formados por professores especialistas que têm por competência
oferecer, de forma itinerante, orientações e capacitações aos professores
das classes comuns, viabilizando um atendimento educacional adequado
às necessidades especiais dos alunos, principalmente daqueles com
deficiência, surdez, cegueira e transtornos no desenvolvimento.
Centro de Formação de Profissionais da Educação e de Atendimento às
Pessoas com Surdez – CAS (MEC/ SEEDUC/RJ)
125
Anais do Congresso
Este projeto da SEESP/MEC em parceria com a SEEDUC/RJ, que está
sendo implementado no IE Carmela Dutra (RJ), deverá ser a referência
para a rede estadual de ensino no processo de apoio à inclusão dos alunos
com surdez ou com surdocegueira.
Através das ações citadas anteriormente, voltadas à educação dos
alunos surdos, a Secretaria de Estado de Educação/RJ incrementará as
competências e atribuições do CAS que visam socializar a política de
inclusão escolar/social desses educandos, assim como assegurar-lhes o
atendimento às suas necessidades educacionais especiais.
Concluindo, é evidente que a consolidação de uma educação inclusiva
de qualidade para todos alunos, com e sem necessidades educacionais
especiais, implica necessariamente uma readequação da estrutura
organizativa da educação e das escolas, ressignificando conceitos de
aprendizagem, avaliação, currículo, metodologias de ensino, ambiente
escolar, gestão e outras práticas pedagógicas, consistindo em um olhar
cuidadoso de reconhecimento, identificação e valorização da diversidade
humana e social e suas demandas educacionais no contexto escolar.
126
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
A LÍNGUA ESCRITA COMO SEGUNDA
LÍNGUA: UMA EXPERIÊNCIA DE
LETRAMENTO
Elaine da Rocha Baptista Plaisant
O presente trabalho é parte da dissertação de mestrado intitulada
“Análise das Estratégias de Ensino que Facilitam a Leitura do Surdo, nas
Séries Iniciais do Ensino Fundamental” desenvolvida no Instituto Nacional
de Educação de Surdos – INES no período de 2004 a 2005 e apresentada
no VIII Congresso Latinoamericano de Educação Bilíngüe para Surdos,
realizado em Havana – Cuba em novembro de 2005.
A investigação foi desenvolvida com o intuito de compreender o
processo de aquisição da língua portuguesa escrita como segunda língua
por alunos surdos numa turma de 1ª série do ensino fundamental, de acordo
com as estratégias de ensino utilizadas pelo professor.
Vale ressaltar que a fundamentação teórica que será descrita, vem sendo
construída por um grupo de professores desde 1994 no qual faço parte.
Ela tem como base a abordagem sócio-interacionista de aprendizagem em
que o conhecimento é uma construção social compartilhada entre sujeitos
por meio da língua. Segundo Bakthin (1997), “a verdadeira substância da
língua não é constituída por um sistema abstrato de formas lingüísticas
nem pela enunciação monológica isolada, mas pelo fenômeno da interação
verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação
verbal constitui assim a realidade fundamental da língua” (p. 123).
Portanto, todas as nossas atividades de leitura/escrita se pautam na
função comunicativa da língua, onde:
•
Ler é “saber-se envolvido em uma interação com alguém em
um momento sócio-histórico específico e que o escritor, como qualquer
interlocutor, usa a linguagem a partir de um lugar social marcado. Ler é
se envolver em uma prática social” (Moita Lopes, 1996).
•
“A escrita difere do discurso oral pois pressupõe um interlocutor
ausente ou o próprio autor (lembretes, agendas, diários, p. ex.).”
(Souza,1997)
•
“A escrita deve ter como objetivo essencial o fato de alguém ler o
que está escrito” (Cagliari, 1995).
127
Anais do Congresso
Acreditando que a língua de sinais é a primeira língua do aprendiz
surdo e que, por meio dela, ele constrói sua identidade e leitura do
mundo, abordamos o ensino de língua portuguesa como segunda língua,
nas habilidades de leitura e escrita, que se encontra em consonância
com diversos estudos sobre aquisição de linguagem por surdos e com os
Parâmetros Curriculares do MEC.
•
“A língua é um sistema de signos histórico e social que possibilita
ao homem significar o mundo e a realidade. Assim, aprendê-la é aprender
não só as palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles,
os modos pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam
a realidade e a si mesmo” (PCN de Língua Portuguesa, 1998: 24).
•
“A convivência entre comunidades locais e imigrantes ou
indígenas pode ser um critério para a inclusão de determinada língua no
currículo escolar. Justifica-se pelas relações envolvidas nessa convivência:
as relações culturais, afetivas e de parentesco. Por outro lado, em
comunidades indígenas e em comunidades de surdos, nas quais a língua
materna não é o português, justifica-se o ensino de Língua Portuguesa
como segunda língua” (PCN de Língua Estrangeira, 1998:23).
Esta perspectiva norteia os objetivos curriculares, a organização dos
conteúdos e os procedimentos metodológicos em torno de três tipos de
conhecimento: O conhecimento de mundo, o conhecimento de organização
textual e o conhecimento de organização sistêmica.
O primeiro se refere ao pré-conhecimento do leitor sobre o tema e
às experiências armazenadas na memória. Já o segundo, diz respeito aos
diferentes tipos de texto, orais ou escritos, vivenciados numa sociedade
letrada (descrições, entrevistas, cartas, entre outros). Por último, o
conhecimento sistêmico, envolve os conhecimentos lingüísticos nos níveis
sintático, semântico e lexical, (Moita Lopes,1996, Kleiman, 1999, Freire,
1998). Estes conhecimentos preparam o aluno para atuar como sujeito por
meio do discurso.
Por isso, optamos pelo termo “letramento” para designar o processo de
ensino e aprendizagem de leitura e escrita que desenvolvemos no instituto,
de acordo com os Parâmetros Curriculares do MEC.
•
“Produto da participação em práticas sociais, que usam a
escrita como sistema simbólico e tecnologia. São práticas discursivas
que precisam da escrita para torná-las significativas, ainda que às vezes
128
não envolvam atividades específicas de ler ou escrever. Dessa concepção
decorre o entendimento de que, nas sociedades urbanas modernas, não
existe grau zero de letramento, pois nelas é impossível não participar, de
alguma forma, de algumas dessas práticas”. (PCN de Língua Portuguesa
1998:23)
Logo, seguimos uma proposta de educação bilíngüe onde:
•
A língua de sinais é concebida como língua de instrução;
•
O indivíduo como ser social situado no contexto sócio-histórico
e cultural;
•
Língua como instrumento de comunicação;
•
Foco na função comunicativa da língua;
•
Ensino baseado na interação entre os interlocutores;
•
Modelo de professor como construtor de “andaimes”;
•
O aluno como ser ativo na construção de conhecimento;
•
O “erro” como significado-sinal de processo;
•
Papel da língua 1 como mediadora no ensino da língua 2;
•
Aquisição de língua através de negociação criativa com
levantamento de hipóteses.
Em consonância com a fundamentação teórica descrita anteriormente,
os conteúdos programáticos da série foram organizados em projetos
pedagógicos, uma vez que, oportunizam a discussão de assuntos de interesse
dos alunos num enfoque interdisciplinar e a abordagem de temas importantes
na relação do sujeito com o seu meio social. Também, possibilitam a imersão
da criança surda em práticas discursivas e significativas para ela, o que vai
torná-la competente numa segunda língua, no caso a língua portuguesa.
Em 2004, minha turma era composta por alunos novos na instituição
com faixa etária entre 11 a 14 anos e portadores de surdez sensório-neural
bilateral profunda. Desconheciam a LIBRAS, se comunicavam por meio
de gestos espontâneos e alguns sinais constituídos no ambiente familiar;
ignoravam a função da leitura e não se identificavam como pessoas
surdas.
A fim de criar um envolvimento dos alunos novos com o contexto
escolar e sua identificação como sujeitos pertencentes a um grupo social foi
desenvolvido o primeiro projeto intitulado “Eu e a Escola”. Assim, como
uma das primeiras atividades de leitura, realizou-se a pesquisa do nome,
data e local de nascimento em todos os documentos disponíveis tais como,
caderneta escolar, cartão de gratuidade em transportes coletivos e certidão
de nascimento. Em seguida, as informações coletadas foram organizadas
de diferentes maneiras, por meio de registros em tabelas, gráficos, linhas
de tempo e calendário, oportunizando discussões que abrangeram outras
129
Anais do Congresso
áreas do conhecimento além do português, como matemática, ciências e
estudos sociais.
Na medida em que se aproximou o aniversário de uma criança da
turma, outro projeto foi iniciado a fim de oportunizar a leitura e a produção
escrita de diversos tipos de textos com funções sociais diferentes, além
do estudo da organização sistêmica da língua portuguesa. É importante
citar que ele acontece várias vezes durante o período letivo, na medida em
que as crianças vão aniversariando e se desenvolve paralelamente a outros
projetos pedagógicos, que abrangem temas relevantes e de interesse dos
alunos.
Com o intuito de enriquecer o conhecimento de mundo nos aprendizes,
contamos com a presença do Assistente Educacional em LIBRAS (AEL)1 , que auxilia o professor em sala de aula. Ao utilizar estratégias próprias
de comunicação, esse profissional atua como facilitador na aquisição
de informações por meio da LIBRAS e, como modelo de sujeito surdo
competente e inserido socialmente, contribui para a construção da identidade
surda e o desenvolvimento de uma auto-estima positiva nos aprendizes.
Assim, a partir da discussão em LIBRAS sobre tudo que envolve
uma festa de aniversário, iniciou-se o planejamento e organização da
festa idealizada pelas crianças. Com isso, mais conteúdos pedagógicos
foram trabalhados de forma interdisciplinar tais como medidas e preços
de ingredientes. Outros tipos de textos também foram utilizados para as
atividades de leitura e escrita, tais como: receitas, notas fiscais, encartes,
rótulos de produtos, convites, listas de aniversários, de compras e de
convidados, promovendo nos alunos o conhecimento de organização textual.
Tal processo permitiu trabalhar: itens lexicais de forma contextualizada,
alguns aspectos morfológicos da língua portuguesa, como por exemplo,
gênero e número do substantivo, bem como, o uso de letras maiúsculas
e sinais de pontuação. Em outros termos, o conhecimento sistêmico da
língua alvo.
Outros projetos intitulados “Olimpíadas: O Corpo em Ação”, “Festa
Junina”, “Água” e “Os Seres Vivos” também foram desenvolvidos
e oportunizaram várias discussões em sala de aula num enfoque
interdisciplinar. O primeiro aconteceu durante o mês de agosto de 2004
e envolveu outra turma de 1ª série. Como experiências de aprendizagem,
várias atividades foram planejadas tais como: visita ao Complexo Esportivo
do Maracanã; palestra sobre a história das Olimpíadas; entrevista com a
nutricionista da escola; apresentação de vídeos relacionados ao tema; além
1
130
Esse termo denomina o profissional surdo, que é contratado pela escola para
atuar junto aos alunos e professores, favorecendo a interlocução adequada em
LIBRAS durante as aulas.
dos “aulões”2 , que são ministrados pelo AEL, como por exemplo, o que
são as Olimpíadas e suas modalidades esportivas. Dessa forma, foi possível
discutir os temas sob vários aspectos, que ultrapassaram aos conteúdos
planejados para a série.
Como conhecimento específico em Estudos Sociais, trabalhou-se as
noções de espaço e tempo, a partir da localização da Grécia e do Brasil
no mapa, identificando os meios de transportes possíveis para se fazer o
percurso entre os dois países, bem como, dias e horários das competições.
Em Ciências, abordou-se a questão da saúde, tais como, hábitos de higiene
e alimentação. As atividades de Matemática envolveram os cinco blocos
de conteúdos propostos pelo PCN, tais como, as noções de número;
operações; espaço e forma; tratamento da informação; grandezas e
medidas; como, por exemplo, o estudo das moedas brasileiras. Tal recurso
possibilitou o desenvolvimento de muitas habilidades nos educandos, tais
como: reconhecer as cédulas e moedas que circulam no Brasil, identificar
a função do número em diferentes contextos; utilizar diversas estratégias
para registrar quantidades e comparar grandezas; solucionar situaçõesproblemas tendo as Olimpíadas como cenário, bem como, ler listas e
tabelas simples.
O trabalho de Língua Portuguesa foi realizado a partir de jornais,
revistas, calendário dos jogos e mapas. Esses textos foram muitos explorados
durante o projeto, pois, despertaram os interesses dos alunos, que buscavam
as informações que consideravam relevantes. Nesse contexto, alguns
exercícios de leitura e escrita foram realizados pelos alunos oportunizando
a discussão de várias estratégias de leitura em segunda língua.
A avaliação do desempenho dos alunos foi realizada durante todo o
desenvolvimento do projeto, por meio de observações das atividades
desenvolvidas em sala de aula pelos aprendizes, de relatos de pais sobre
o envolvimento dos filhos no trabalho e de produções escritas. Com isso,
foi possível observar que eles começaram a se situar no tempo e no espaço
e a identificar diferentes tipos de textos por sua formatação, conhecendo
sua utilização e, conseqüentemente, significando-os. Verificou-se também,
que os alunos ampliaram seus conhecimentos para outras situações da vida
escolar e familiar, entretanto, ainda não eram capazes, ao final do ano,
de refletir e fazer inferências sobre a língua portuguesa, uma vez que, se
encontravam em processo inicial de aquisição de LIBRAS.
No ano letivo seguinte, tive a oportunidade de permanecer com a turma
dando continuidade ao trabalho realizado anteriormente. Tal experiência
me permitiu observar que na medida em que os alunos foram se tornando
2
Refere-se às aulas dadas pelo assistente educacional a duas ou mais turmas
juntas
131
Anais do Congresso
mais proficientes em LIBRAS, ou seja, expressando-se com mais clareza e
adequando o discurso aos diferentes contextos em que ele é utilizado, eles
começaram a se interessar pela língua escrita e a utilizá-la como mais uma
forma de comunicação, com função social específica.
Com a Língua de Sinais mediando a construção do conhecimento em sala
de aula, foi possível analisar com os alunos alguns aspectos morfológicos
da língua portuguesa que ocorreram repetidas vezes nos textos trabalhados.
Com isso, eles começaram a inferir sobre algumas regras da língua
portuguesa, promovendo uma leitura mais consciente e autônoma.
No primeiro bilhete produzido pela turma, os alunos inseriram um texto
produzido por mim, como por exemplo:
132
Entretanto, no ano seguinte, foram capazes de produzir textos
individualmente, tais como:
133
Anais do Congresso
Outros exemplos:
134
Portanto, a partir da análise e interpretação dos dados, que investigou o
desempenho dos alunos em relação às estratégias de ensino utilizadas pela
professora/pesquisadora, concluiu-se que esses aprendizes desenvolveram
habilidades de leitura e escrita acima do esperado, considerando-se que ao
ingressarem no INES, eles não possuíam uma língua a ser compartilhada,
prejudicando, portanto, a interação entre professor x aluno e aluno x aluno
em sala de aula.
Os fundamentos teóricos desse trabalho se mostraram eficientes,
uma vez que, promoveram o desenvolvimento global dos educandos
enquanto sujeitos ativos na sociedade: A abordagem sócio-interacionista
de aprendizagem oportunizou a troca de informações entre os pares
envolvidos em sala de aula e, conseqüentemente, a construção coletiva do
conhecimento. O trabalho pedagógico organizado por projetos ou temas
geradores, num enfoque interdisciplinar, possibilitou a discussão de temas
importantes e significativos para os alunos, que ultrapassaram o conteúdo
planejado para a série. O ensino pautado na função comunicativa da língua
portuguesa em torno dos conhecimentos de mundo, de organização textual e
sistêmico desenvolveu habilidades nos educandos, que os tornaram capazes
de atuarem na sociedade por meio do discurso. A LIBRAS como língua
de instrução, ou seja, utilizada como uma estratégia a fim de alcançar os
objetivos propostos, melhorou a auto-estima dos estudantes, que passaram
a executar suas tarefas com mais segurança e autonomia. E, finalmente, a
presença do Assistente Educacional, como representante da comunidade
surda, utilizando estratégias próprias de aprendizagem em LIBRAS
possibilitou uma melhor interlocução em sala de aula e o desenvolvimento
da identidade surda nos alunos. Vale ressaltar a importância dos recursos
visuais, principalmente, como ilustração dos textos em língua portuguesa
para esses aprendizes, que utilizam estratégias de leitura em segunda língua
para significá-los.
A seguir, farei um breve relato sobre o trabalho que vem sendo
desenvolvido neste ano de 2007 no INES. A Coordenação de Orientação
e Apoio à Prática Pedagógica - COAPP propôs o projeto intitulado “Terra
em Perigo: O Futuro Começa em Você” com o objetivo de possibilitar a
discussão de um tema de interesse e prioridade mundial. Ele vem sendo
desenvolvido por vários profissionais e, no nosso setor, cada série escolheu
um aspecto relacionado ao tema para estudar, a saber:
•
1ª Séries: “Preservando o Nosso Planeta: Reduzindo,
reaproveitando e reciclando”;
•
2ª Séries: “A importância da água”
•
3ª Séries: “Causas e Conseqüências do Aquecimento Global na
Natureza”;
135
Anais do Congresso
•
4ª Séries: “Conseqüências do Aquecimento Global no Corpo
Humano”.
A partir daí, várias atividades pedagógicas vêm sendo realizadas
envolvendo alunos e professores. Como dois exemplos de sucesso pela
grande repercussão no instituto foram: O Jornal da Quarta e a brincadeira
intitulada pelos alunos da professora Geise como “Digitando”. O primeiro
vem possibilitando aos alunos compartilhar todo o saber construído com
seus colegas e familiares e o segundo vem oportunizando a memorização
das palavras relacionadas aos temas trabalhados, uma vez que, esse
vocabulário é utilizado numa competição onde os alunos devem “soletrar”
as palavras por meio do alfabeto dactilológico.
136
Conclui-se, portanto, que a abordagem Bilíngüe tem-se mostrado
como um possível caminho para esses sujeitos. Entretanto, essa concepção
de ensino deve ser assumida por toda a escola, gerando sementes para a
construção de um projeto político e educacional na educação de surdos.
Bibliografia
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo:
Hucitec, 1977.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria do Ensino Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua portuguesa. Brasília: MEC/
SEF, 1998.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria do Ensino Fundamental.
Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua estrangeira. Brasília: MEC/
SEF, 1998.
CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e lingüística. 8ª ed. São Paulo:
Scipione, 1995.
FREIRE, Alice. “Aquisição de português como segunda língua: uma
proposta de currículo”. In Revista Espaço n. 9, Rio de Janeiro: I.N.E.S. pp.
46-52, 1998.
KLEIMAN, Ângela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. 6ª ed.
Campinas, SP: Pontes, 1999.
MOITA LOPES, L. P. Oficina de lingüística aplicada. Campinas: Mercado
das letras, 1996.
SOUZA, R. M. A Escrita das Diferenças. In: Anais do Seminário: Desafios
e Possibilidades na Educação Bilíngüe para Surdos, I.N.E.S., Rio de
Janeiro, 1997.
137
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
A LÍNGUA ESCRITA COMO SEGUNDA
LÍNGUA: UMA EXPERIÊNCIA
DE LETRAMENTO
Maria Cristina da Cunha Pereira1
Depois de quase cem anos de oralismo, a Língua de Sinais vem
gradativamente conquistando mais espaço na educação de alunos surdos.
O Decreto Federal 56262 , de 22 de dezembro de 2005, representa o
resultado de muitas lutas por parte da comunidade de surdos e de ouvintes
comprometidos com a educação de surdos. Entre os pontos fundamentais,
vale destacar o fato de ter sido o primeiro documento a usar o termo
“surdo” e a definir a surdez como diferença e não como deficiência. No
artigo 2º do documento lê-se que “a pessoa surda é definida como aquela
que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio
de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso
da Língua Brasileira de Sinais”.
O mesmo documento reconhece o direito dos surdos a uma educação
bilíngüe, na qual a Língua de Sinais é a primeira língua e a Língua
Portuguesa, na modalidade escrita, a segunda. A modalidade oral da Língua
Portuguesa é uma possibilidade, mas deve ser trabalhada fora do espaço
escolar. Em outras palavras, não cabe ao professor responder pelo trabalho
de produção da fala pelos alunos.
Considerando que a maioria das crianças surdas tem famílias ouvintes,
que não usam a Língua de Sinais, cabe à escola propiciar condições para que
seus alunos surdos a adquiram, em contextos semelhantes aos vivenciados
pelas crianças ouvintes ou surdas, filhas de pais surdos na interação com
seus familiares. Para isso, deve-se possibilitar a interação das crianças com
adultos surdos, usuários fluentes da língua, os quais, envolvendo-as em
práticas discursivas e interpretando os enunciados produzidos por elas,
insiram-nas no funcionamento desta língua. Assim como os adultos ouvintes
não oferecem sílabas, palavras ou frases extremamente simplificados,
mas textos orais espontâneos, decorrentes da vida cotidiana, para que as
1
DERDIC/PUCSP.
Este decreto regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe
sobre a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, e o art. 18 da Lei nº 10.098, de 19
de dezembro de 2000.
2
138
crianças aprendam a falar, também na aquisição da língua de sinais devemse oferecer textos sinalizados às crianças surdas. É desta forma que elas vão
poder adquirir não só os sinais, mas a língua.
Adquirida a Língua de Sinais, ela dará o arcabouço para a aprendizagem
da segunda língua, a Língua Portuguesa. Possibilitar a aquisição, pelos
alunos surdos, da Língua Portuguesa, na modalidade escrita, é um dos
desafios que os educadores enfrentam. Contribuir para a reflexão sobre esta
questão é o objetivo deste trabalho.
Aprendizado da Língua Portuguesa por alunos
surdos
Numa proposta bilíngüe, a língua portuguesa é considerada a segunda,
no sentido de que sua aquisição pressupõe a aquisição da Língua de Sinais.
A questão que tem preocupado os profissionais que trabalham com alunos
surdos é como possibilitar a aquisição da Língua Portuguesa por seus
alunos.
Nos últimos anos tenho defendido a idéia de que a concepção de língua
que se adota e a representação que se tem do aluno surdo são fatores
fundamentais na elaboração de propostas para aprendizagem da Língua
Portuguesa pelos alunos.
Em relação à concepção de língua, durante todo o século XX
predominou, no ensino de línguas em geral, a concepção de língua como
código. Tal concepção valoriza o conhecimento das regras da língua como
requisito para o seu uso correto. Subjacente a esta concepção parece estar
a pressuposição de que, conhecendo as regras da língua, os alunos venham
a usá-la adequadamente.
Visando ao aprendizado das regras da Língua Portuguesa, o professor
iniciava a exposição dos alunos a palavras e prosseguia com a utilização
destas palavras em estruturas frasais, primeiramente simples e depois
cada vez mais longas e morfossintaticamente mais complexas. Por meio
de exercícios de substituição e de repetição, esperava-se que os alunos
memorizassem as estruturas frasais trabalhadas e as usassem.
O resultado desta prática está muito bem ilustrado na tese de doutorado
de Trenche (1995), do qual destaco apenas um exemplo dentre os muitos
que a autora apresenta:
139
Anais do Congresso
“A professora pede aos alunos que cada um escreva uma frase na lousa com a
palavra sabonete. Dois alunos escrevem: “O sabonete é grande”; “O sabonete
é verde”. A professora pede que escrevam uma frase diferente e apresenta
o modelo: “A Carla tem dois sabonetes”. Pede que todos leiam, mas, antes,
chama a atenção dos alunos para o “s” final da palavra “sabonetes” que indica
plural. A palavra seguinte é “sofá” e o aluno escreve “O sofá é marrom”. A
professora não aceita porque, segundo ela, as frases estão muito iguais. Sugere,
então, outras possibilidades, como “é meu”, “é da”, e o aluno escreve: “o sofá
é da Carla”. Apontando para o artigo que introduz a frase, a professora corrige,
dizendo que “o” pequeno não pode começar a frase. Ao serem solicitados que
escrevessem sozinhos no caderno, os alunos formaram frases como: “O papai é
do sapato”, “A mamãe é da mala”, “O Allan é do telefone”, “A lata é de cinza”.”
(Trenche, 1995, p. 123)
Como se pode observar no exemplo, para cumprirem a atividade que
lhes foi solicitada, os alunos se apóiam em algumas estruturas frasais já
aprendidas. A professora tenta introduzir um outro modelo de frase e parece
esperar que o mesmo seja imediatamente aceito e usado pelos alunos. Diante
da insistência do aluno em usar a mesma estrutura frasal apresentada pelos
colegas, a professora fornece outro modelo de frase, que passa a ser tomado
como modelo para todas as frases que os alunos, individualmente, escrevem
no caderno. As frases produzidas atendem aos requisitos morfossintáticos
da língua, mas o resultado são frases sem sentido.
Estruturas como esta, que causam tanta estranheza em professores
ouvintes, são comuns em exercícios de formação de frases por alunos
surdos, e, embora sejam atribuídas freqüentemente à surdez, revelam
falta de conhecimento da Língua Portuguesa, além de revelarem falha no
método de ensino, já que é ensinada a estrutura sem explicação sobre o
conteúdo envolvido nela.
A adoção da concepção de língua como código no ensino da Língua
Portuguesa não foi algo privativo dos surdos, mas reforçou a representação
de incapacidade deles, uma vez que, com acesso reduzido às informações
pela audição, eles apresentavam dificuldades acentuadas na utilização de
todos os aspectos da língua, desde vocabulário até combinação de palavras
nas estruturas frasais.
Comportamento semelhante ao observado no ensino de alunos surdos
é relatado também no aprendizado de Língua Estrangeira. Coracini (2002)
afirma que a falta de conhecimento da língua por parte dos alunos vem
reforçar ainda mais o hábito de se ater à palavra como portadora do
significado do texto, hábito este que a escola enfatiza como o ensino por
meio da gramática e do léxico.
Visando ao aprendizado da Língua Portuguesa pelos alunos surdos, a
escola deveria propiciar-lhes o seu uso como prática social, na qual eles
140
possam relacionar forma e função. Em outras palavras, assim como na
exposição à Língua de Sinais, os alunos surdos deveriam ser inseridos em
atividades que envolvam o uso da Língua Portuguesa em textos autênticos
e não adaptados pelos professores, com vocábulos e estruturas frasais
simplificados.
A inserção dos alunos surdos na língua, de Sinais e Portuguesa, em
funcionamento, é compatível com a concepção de língua como atividade
discursiva, a qual privilegia o texto, concebido como lugar de interação. O
texto, nesta concepção, é visto como lugar de interação e os interlocutores,
como sujeitos ativos que, dialogicamente, nele se constroem e são
construídos (Koch, 2001).
Como atividade discursiva, deve-se inserir os alunos surdos em situações
de uso da Língua Portuguesa escrita, possibilitando, assim, a apreensão da
sua convencionalidade.
Conceber os alunos surdos como interlocutores requer uma mudança
na representação que predominou na educação dos surdos desde 1880,
quando se optou pela adoção do oralismo. Os professores devem acreditar
no potencial dos alunos surdos e propiciar-lhes condições para que eles
se tornem leitores e escritores. O grau de proficiência de cada aluno vai
depender do seu conhecimento de Língua Portuguesa.
Para se tornarem leitores e escritores competentes, é fundamental que
os alunos surdos, assim como os ouvintes, disponham de conhecimento de
mundo e de língua, os quais vão constituir seu conhecimento prévio.
A importância do conhecimento prévio para atribuição de sentido na
leitura e produção de sentido na escrita é defendida tanto por autores que
se dedicam à questão da leitura e da escrita por alunos ouvintes, como
Kleiman (2004); Fulgêncio e Liberato, (2001; 2003), entre outros, como
por surdos (Lane, Hoffmeister e Bahan, 1996). Para todos estes autores, é a
interação do conhecimento lingüístico, textual e de mundo que permite ao
leitor atribuir sentido ao texto.
Lane, Hoffmeister e Bahan (1996) destacam que o conhecimento
prévio, que eles chamam de conhecimento de fundo, ajuda os alunos a
criarem expectativas e a formularem hipóteses sobre os significados dos
textos, a abstraírem significado de passagens de textos e não apenas de
vocábulos isolados.
Considerando que, de modo geral, as crianças surdas, de pais ouvintes,
chegam à escola sem uma língua que as possa auxiliar na constituição de
conhecimento prévio, cabe aos profissionais propiciar a estas crianças
interação com surdos adultos visando à aquisição da Língua de Sinais.
Uma vez adquirida a Língua de Sinais, ela vai possibilitar a ampliação
do conhecimento de mundo, bem como a inserção em atividades que
envolvam a escrita, como relatos de história e leitura de livros.
141
Anais do Congresso
A leitura é considerada, por pesquisadores da área da surdez, a principal
fonte de informação para a criança surda adquirir a Língua Portuguesa
escrita. Svartholm (2003) propõe que a leitura de livros e revistas seja feita
com crianças desde a Educação Infantil porque diverte, estimula e satisfaz
a curiosidade. Além disso, ela é ferramenta fundamental na constituição
do conhecimento da Língua Majoritária. Para a mesma autora, os alunos
devem ser apresentados ao maior número possível de textos e o professor
deverá ser capaz não somente de “traduzi-los” para a Língua de Sinais e
vice-versa, como também de explicar e explicitar características dos textos
para as crianças. Tais explicações deveriam ser dadas em uma perspectiva
contrastiva, na qual as diferenças e as semelhanças entre a Língua de Sinais
e a Língua Majoritária escrita seriam esclarecidas. A idéia subjacente é
explicar o conteúdo dos textos e mostrar como o significado é expresso
nas duas línguas. Neste ponto chamo a atenção para a necessidade de os
alunos terem acesso ao material escrito, uma vez que é pela visão que eles
constituirão seu conhecimento sobre a Língua Portuguesa.
Na medida em que adquiram a Língua Portuguesa, faz-se necessário
que os alunos tenham acesso a materiais escritos, de diferentes gêneros e
tipos textuais, para que ampliem seu conhecimento lingüístico e textual
e, assim, possam não só ampliar suas habilidades de compreensão como
também de produção de textos.
Como para os alunos ouvintes, o objetivo no ensino da linguagem
escrita deve ser a habilidade de produzir textos e não palavras e frases, daí
a importância de se trabalhar muito bem o texto, inicialmente na Língua
de Sinais. Esta prática serve de base para que os alunos formulem suas
hipóteses sobre como funcionam os textos escritos. A tarefa do professor
é viabilizar o acesso do aluno, ouvinte e surdo, ao universo dos textos
que circulam socialmente e ensinar a produzi-los. Desta forma, o aluno
surdo poderá aprender o sistema da língua como também ampliar seu
conhecimento letrado.
Visando ilustrar a importância do conhecimento prévio para a produção
de escrita e, ao mesmo tempo, a possibilidade de os alunos surdos se
constituírem como produtores de textos, apresento, a seguir, um exemplo,
extraído de um trabalho anterior (Pereira, 2005, p. 69).
O autor deste texto é aluno de escola estadual em um município de São
Paulo, tinha 15 anos, na época da produção do exemplo, e tem um irmão
surdo mais velho, com o qual usa Língua de Sinais.
Antes de apresentar o exemplo, penso ser importante contextualizá-lo
O irmão do menino iniciou um curso de Língua Japonesa com a
intenção de ir para o Japão, onde já mora um tio dos meninos. O tio estava,
na época da produção da escrita, de visita ao Brasil. O menino trouxe para
a professora ver algumas fotos e uma revista de carros do Japão. Eles
142
conversaram sobre o assunto em Língua de Sinais, após o que a professora
pediu que ele escrevesse sobre seu desejo de conhecer o Japão.
Em seu texto, o aluno relata, com clareza, todas as etapas da viagem
que imagina fazer ao Japão. Seu relato é bem organizado, mantendo a
seqüência temporal dos fatos, incluindo introdução e fechamento ao texto.
Revela conhecimento sobre o Japão, mostra que ele sabe que é distante e
que leva muitas horas para chegar; diferença na comida, nas roupas, nas
pessoas, nas lojas, nas casas e nos carros. Depois fala do tio e dos seus
planos de vida. Faz uma apreciação sobre o Japão e retorna ao Brasil, e
assim fecha a viagem.
Chamam a atenção, nesta produção, as flexões verbais, bem empregadas,
na maior parte das vezes.
O conhecimento que o aluno tem sobre o Japão, o conhecimento sobre
organização de textos, assim como sobre a Língua Portuguesa responderam
pelo sucesso na produção do texto.
143
Anais do Congresso
Conclusão:
Neste trabalho, procurei mostrar que é possível mudar os baixos
resultados que geralmente os alunos surdos apresentam no uso da Língua
Portuguesa. Para isso faz-se necessário adotar uma concepção discursiva
de língua, a qual privilegia o texto e não o vocábulo, o sentido e não a
codificação e decodificação.
Embora as concepções propostas para o ensino de alunos surdos sejam
as mesmas adotadas com crianças ouvintes, a adoção de uma ou de outra
parece estar relacionada à representação que os professores têm em relação
às potencialidades dos seus alunos.
A concepção de língua como código, na medida em que conduz o
aluno no processo de aprendizado da língua, parece compatível com
a representação dos alunos surdos como deficientes. A concepção de
língua como atividade discursiva, por outro lado, concebe o aluno como
interlocutor ativo na constituição do seu próprio conhecimento e a sua
adoção vai exigir mudança na representação de incapacidade do surdo que
ainda hoje está muito presente não só no discurso dos ouvintes como dos
próprios surdos.
Faz-se necessário, também, que o professor propicie conhecimento
prévio para que os alunos surdos tenham condições de entender o que lêem
e de produzir sentidos na escrita. Por virem de famílias ouvintes, as crianças
surdas, na maioria das vezes, não participam das conversas em casa, o
que resulta em empobrecimento em relação ao conhecimento. Privadas
de uma língua e com pouca interação verbal com a família, as crianças
surdas constituem seu conhecimento de mundo baseadas, principalmente,
na visão, sendo este restringido pela falta de alguém que interprete o que
elas vêem numa língua que lhe seja acessível.
Considerando-se que a Língua de Sinais preenche as mesmas funções
que as línguas orais desempenham para os ouvintes, é ela que vai propiciar
aos surdos conhecimento de mundo e de língua, com base na qual possam
constituir seu conhecimento de Língua Portuguesa. No entanto, é a leitura
que vai possibilitar acesso à Língua Portuguesa, daí a importância de os
alunos surdos lerem muito mais do que os ouvintes.
144
Bibliografia
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial.
Decreto 5.626, 2005.
CORACINI, M.J.R.F. Leitura, decodificação, processo discursivo...? In
M.J.Coracini (org.) O jogo discursivo na aula de leitura: língua materna
e língua estrangeira. 2ª edição. Campinas, S.P.: Pontes, 2002, p.13-20.
FULGÊNCIO, L.; LIBERATO, Y. A leitura na escola. 2ª edição. São
Paulo: Contexto.
______ Como facilitar a leitura. 7ª edição. São Paulo: Contexto, 2003.
KLEIMAN, A. Oficina de leitura – teoria & prática. 6ª edição. Campinas,
S.P.: Editora Pontes, 1998.
______ Texto e Leitor – Aspectos cognitivos da leitura. 9ª edição.
Campinas, SP: Pontes, 2004.
KOCH, I.V. O texto e a construção dos sentidos. 5ª edição. São Paulo:
Editora Contexto, 2001.
______ Desvendando os segredos do texto. 2ª edição. São Paulo: Cortez
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LANE, H.; HOFFMEISTER, R.; BAHAN, B. Language and literacy. A
journey into the Deaf-World. California: DawnSign Press, 1996, p. 266292.
PEREIRA, M.C.C. Leitura, escrita e surdez. Secretaria da Educação,
CENP/CAPE. São Paulo: FDE, 2005.
SVARTHOLM, K. Como leerles a los sordos?
In www.sitiodesordos.com.ar, 2003
TRENCHE, M.C.B. A criança surda e a linguagem no contexto escolar.
Tese de doutorado. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, 1995.
145
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
PANORAMA INTERNACIONAL DE
EDUCAÇÃO DE SURDOS NOS
ÚLTIMOS 150 ANOS
Leila Couto Mattos1
Para traçarmos um panorama internacional da educação de surdos nos
últimos 150 anos é importante, primeiro, fazermos uma rápida retrospectiva.
É no século XVII que vamos encontrar toda a fundamentação prática e
teórica da Educação de surdos através de estudiosos como Juan Bonet, na
Espanha (1620 - leitura; escrita, fala e alfabeto manual); George Dalgarmo,
na Grã-Bretanha (1628/1687 – alfabeto manual, naturalmente, com bebes);
Abbé Charles-Michel de l`Epée, na França (1712/1789 - língua de sinais
metódica/natural) e Samuel Heinicke, na Alemanha (1729/1784 – língua
oral/musicalidade e escrita).
Já no século XVIII, tendo como base legal o legado intelectual deixado
pelo século anterior, foram fundadas as primeiras escolas públicas na
Europa e importantes questões em relação à educação de surdos começaram
a ser discutidas, internacionalmente. Estas considerações encontramse presentes, ainda hoje, no meio acadêmico e na prática pedagógica, e
referem-se á:
Relação entre linguagem e pensamento
Abordagem natural ou gramatical para o desenvolvimento da
linguagem
Educação segregada ou integrada
Ensino precoce da leitura
Eficácia do ensino da fala
Educação precoce em casa
Treinamento auditivo
Processamento de informações através dos canais auditivo e visual
Treinamento da sensação/percepção tátil
Como pode ser visto, as questões metodológicas e os programas
educacionais na área da surdez fazem parte de um contexto que vem sendo
historicamente construído a mais de 200 anos, e desde então a comunicação
é considerada como ponte para a aquisição do conhecimento formal.
1
146
Pedagoga. Fonoaudióloga. Mestre em Educação Especial. Doutora em
Saúde Pública. Professora do Instituto Nacional de Educação de Surdos
– INES/RJ.
No século XIX, Thomas H. Gallaudet (1848) publicou A linguagem
natural dos Sinais; seu valor e uso na instrução do Surdo Mudo no
American Annals of the Deaf and Dumb, apresentando uma discussão
sobre linguagem e instrução.
Ainda neste mesmo século, em 1857, o atual Instituto Nacional de
Educação de Surdos foi fundado. O instituto sempre buscou seguir as
tendências mundiais da educação de surdos e em uma determinada época
priorizou o método oral, mas, também, oferece o método escrito e o
método auricular ou auditivo. O INES pode ser considerado como berço do
desenvolvimento da língua brasileira de sinais – LIBRAS.
Outro importante fato diretamente relacionado à educação de surdos
ocorreu em 1880, o Congresso de Milão. Este congresso teve como principal
objetivo a escolha do melhor método para a educação de surdos cujas
idéias prevaleceram até aproximadamente o final do séc. XX. É importante
lembrar que neste final de século havia uma sociedade confiante nos novos
conhecimentos, a chegada da iluminação e o confronto, entre a realidade e
a fantasia, que marcam o romantismo da época.
Na passagem do século XIX para o século XX, duas importantes figuras
se sobressaíram no campo da educação de surdos, Edward Miner Gallaudet
(1837-1917) – presidente da primeira faculdade de surdos, hoje Gallaudet
University e defensor do método combinado, oral e manual e Alexander
Graham Bell (1847-1922) – inventor do telefone e do audiômetro e defensor
do método oral puro.
No século XX, em 1931 temos a publicação dos Métodos de instrução
nas escolas americanas para surdos, publicado no American Annals of the
Deaf que define os seguintes métodos para a educação do surdo:
Método manual – sinais, alfabeto manual e escrita
Método do alfabeto manual – alfabeto manual e escrita
Método auricular – audição dos semimudos, fala e escrita
Método sistema combinado – fala, leitura labial, método manual e o
método do alfabeto manual.
Método oral – fala, leitura labial e escrita
Houve predominância do método oral até 1970 nos Estados Unidos da
América e até 1980 no Brasil/INES. Em seguida a comunicação total foi
ganhando forma e hoje, temos o bilingüismo de forma bastante abrangente
em todo o mundo.
Alguns documentos indutores internacionais e nacionais vêem
conduzindo as políticas públicas no campo da educação de surdos, no
Brasil. A Declaração Mundial sobre Educação para Todos que se realizou
em 1990 em Jomtien/Tailândia; a Declaração de Salamanca, em 1994
em Salamanca/Espanha e a Lei Nº 10.098/1994 sobre a promoção da
acessibilidade para as PPNE.
147
Anais do Congresso
Desde então, a relação entre educação e surdez considera uma educação
especial com escolas e professores especializados e diferentes métodos e
modalidades de comunicação. As escolas especiais possibilitaram o encontro
dos surdos, o desenvolvimento de uma forma própria de comunicação e
a descoberta de especificidades. Daí se organiza e estrutura a Língua de
Sinais e o Bilingüismo.
Do outro lado, temos um novo sentido educacional, com uma escola
onde todos os alunos sejam olhados individualmente, e tenham suas
especificidades reconhecidas. Uma escola onde a diferença seja valorizada
e não apagada, onde a flexibilidade curricular possibilite a permanência do
aluno com real participação no processo de aquisição de conhecimento e,
por conseguinte seu desenvolvimento.
Para a construção de uma escola para todos é preciso considerar alguns
importantes requisitos de acessibilidade:
Propiciar, sempre que necessário, intérprete de LIBRAS, especialmente
na realização e revisão de provas.
Adotar flexibilidade na correção das provas escritas, valorizando o
conteúdo semântico.
Estimular o aprendizado da LP
Proporcionar aos professores acesso a literatura e informações sobre a
especificidade lingüística do portador de DA.
Importante considerar a questão da surdez em relação à comunicação. A
esse respeito, a declaração de Salamanca, nos diz: ... Face as necessidades
específicas de comunicação de surdos e de surdos-cegos, seria mais
conveniente que a educação lhes fosse ministrada em escolas especiais
ou em classes ou unidades especiais nas escolas comuns (Declaração de
Salamanca, p. 30).
Portanto, a escola especial para surdos se caracteriza por valorizar os
princípios e os valores da comunidade surda, ter a língua de sinais como
língua de instrução, a língua escrita como segunda lingual e o bilingüismo
como abordagem metodológica.
Em um cenário internacional, diferentes países com diferentes níveis
econômicos, sociais, de saúde e educacionais vivem diferentes contextos.
Surdos sem diagnóstico e acesso à escola; escolas especiais para todos os
alunos que possuem alguma NEE; escolas especiais para surdos e escolas
para todos. No Brasil, pela sua vasta extensão territorial encontramos todas
essas diferentes situações.
Em relação aos alunos surdos, existem aqueles que passaram tanto pela
escola especial como pela escola regular, fazendo o ensino fundamental
e secundário na escola especial e o ensino superior na faculdade regular;
alunos que fizeram toda a formação em escolas regulares ou escolas
especiais; alunos que farão toda a sua formação em escolas para todos.
148
Hoje temos novas possibilidades educacionais para a educação de
surdos. Uma visibilidade em relação à pessoa surda que foi alcançada
através das políticas públicas educacionais internacionais e nacionais,
no caminho da inclusão. O reconhecimento da LIBRAS através da Lei
Nº 10.436/2002 e a Lei n.10.098/1994 sobre acessibilidade permitiram o
início desta nova caminhada.
Podemos então concluir sublinhando que, a educação de surdos, na
atualidade, conta com duas possibilidades, a escola para todos e a escola
especial.
Bibliografia
BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica.
Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação. Resolução
CNE/CEB n.2 de 11 de setembro de 2001. Diário Oficial da União de 14
de setembro de 2001.
BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Lei n.10436/02. Dispõe
sobre a língua brasileira de sinais – LIBRAS. Brasília: MEC/Secretaria de
Educação Especial, 2002.
ROSENHALL. U. Features of deaf-blindness impairments. EspaçoInformativo técnico-científico do INES. Rio de Janeiro, n.25/26, p.4-11.
Jan-Dez/2006.
MANTOAN. M. T. E. Igualdade e diferenças na escola: como andar no
fio da navalha. In: ARANTES, V. A. (org). Inclusão escolar – pontos e
contrapontos. São Paulo: Summus, 2006.
MAIA, R. F. C. et all. A educação de surdos no Brasil, a saúde e a assistência
social: intercessões. In: V Congresso Internacional e XI Seminário Nacional
[do] INES Surdez: família, linguagem e educação. Anais... Rio de Janeiro:
INES, 2006. p. 294-304.
149
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
O ENSINO SUPERIOR BILÍNGÜE
Maria Marta Costa Coccone1
O sociolingüista Woodward (1982 : 11-16)* nos diz de uma básica
diferenciação entre dois tipos possíveis de bilingüismo : o individual e
o grupal. No específico campo em que atuamos, o primeiro (bilingüismo
individual) o autor relaciona ao fato de um único indivíduo dominar duas
línguas : a língua de sinais dos surdos e a língua dos ouvintes, oral e/ou
escrita. Já o segundo (bilingüismo grupal), o mesmo autor relaciona ao fato
dessas duas línguas estarem sendo praticadas por vários membros de uma
única grupalidade de surdos e/ou de ouvintes, ainda que alguns integrantes
não sejam exímios usuários de ambas, ou de uma delas.
Frente ao tempo de que disponho na presente ocasião e com base no
que acabo de referir, sobre o Curso de Pedagogia do ISBE-INES acentuarei
então seu caráter Bilíngüe de clara natureza grupal, também em virtude deste
seu diferencial ser inegavelmente inédito em nosso país. Realmente, em
idêntica proporção são anualmente admitidos e equitativamente distribuídos
em dois turnos (Vespertino e Noturno) sessenta (60) candidatos surdos e
não surdos que obrigatoriamente apresentem suficiente fluência em Língua
Brasileira de Sinais - LIBRAS - porquanto, devidamente já regulamentada,
a LIBRAS constitui a própria Língua de Instrução do Curso, além de
seus usos ainda aprofundarem-se em uma Atividade Formadora intitulada
Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe. Já a Língua Portuguesa consta
como Atividade Formadora obrigatória apenas em sua modalidade escrita,
sendo que aulas e demais atividades do Curso estão a cargo de docentes com
suficiente informação sobre características lingüísticas próprias do campo
da surdez, docentes estes que apresentarão flexibilidade na correção de
provas e/ou trabalhos redigidos pelo discente surdo, quando irão considerar
o aspecto semântico e a singularidade lingüística manifesta no nível formal
de sua escrita.
Como não poderia deixar de ser, durante todo o transcorrer do Curso
fica garantida pois a presença de capacitados intérpretes de LIBRAS/Língua
Portuguesa, seja em atividades de sala de aula, seja em outras que se derem
1 Responsável
*
150
pela Equipe do ISBE-INES.
WOODWARD, J. How You Gonna Get Heaven If You Can’t Talk With Jesus.
Silver Spring : TJ Publishers, 1982.
extra-classe. Estão sempre disponibilizados inclusive mecanismos próprios
para registros também de avaliações de conhecimentos expressos em nossa
Língua Brasileira de Sinais.
Por semelhantes razões, este constitui um Curso Superior cujos
egressos surdos e não surdos poderão não apresentar exímias autonomias
discursivas em ambas as línguas em pauta. A um só tempo, tal Curso atende
ao desejo já nacionalmente manifesto de serem promovidas urgentes
reformulações na formação e capacitação de pedagogos, que realmente
possam contribuir para com o efetivo percurso também de alunos
surdos igualmente em nossa rede brasileira pública de ensino, por
alcançarem Licenciatura Plena nas seguintes vertentes : Educação Infantil;
Anos Iniciais do Ensino Fundamental, contemplando inclusive a Educação
de Jovens e Adultos (EJA); e Magistério das Disciplinas Pedagógicas do
Ensino Médio.
Mantidos tais termos, passemos então a seguir ao próprio
MAPEAMENTO DO CURSO BILÍNGÜE DE PEDAGOGIA DO INES
1°SEMESTRE
2°SEMESTRE
3°SEMESTRE
4°SEMESTRE
5°SEMESTRE
6°SEMESTRE
7°SEMESTRE
8°SEMESTRE
RECONSTRUINDO A
TRAJETÓRIA
EDUCATIVA
CONSTRUINDO OLHARES
SOBRE O
COTIDIANO
ESCOLAR
PROBLEMÁTICAS COTIDIANAS DA
PROFISSÃO
DOCENTE
APROFUNDANDO RELAÇÕES
ENSINOAPRENDIZAGEM NO
TRABALHO
PEDAGÓGICO
REDESENHANDO
ENTENDIMENTOS
EDUCATIVOS
DELINEANDO
PROPOSTAS
METODOLÓGICAS
RECONSTRUINDO A
TRAJETÓRIA
DA FORMAÇÃO
REDISCUTINDO
PROPOSTAS
EDUCATIVAS
E METODOLÓGICAS
Escola, Cultura
e Sociedade
Genealogias em
Posicionamentos
Educacionais
Docência e
Implicações
Socioculturais
Construção do
Conhecimento e
Escolarização
Saberes Educacionais, Diversidade e Cultura e
Docência
Ensino da
Educação Física
- tendências
atuais
80hs
Revisões Críticas
Sobre a Autoformação
Retomada da
Experiência
Educativa
80hs
80hs
Tempos-Espaços
e Sujeito Social
em Currículos
de História e
Geografia
80 hs
Retomada de
Conhecimentos
Construídos
80hs
80hs
80hs
80hs
80hs
Ensino-Aprendizagem e
Escolarização
80hs
Cultura Escolar,
Conhecimento
e Linguagem
80hs
Refletindo Sobre
a Formação
Docente
80hs
Saberes
Educacionais
e Diversidade
Cultural
80hs
Concepções
Sobre Criança
80hs
Leituras e
Escritas
54hs
Corporeidade e
Cultura
80hs
A Escola como
Espaço PolíticoPedagógico
80hs
Construção
Compartilhada
do Conhecimento Escolar
80h
ApropriaçõesLingüísticas
120h
80 hs
Cognição,
Corporeidade e
Contexto
80hs
Textos e
Pretextos
80h
Tempos, Espaços
e Sujeito Social
80hs
Temáticas
Transversais
80hs
Corporeidade,
Cultura e
Discurso
120hs
Arte em
Processo na
Escola
80hs
ESTÁGIO
SUPERVISIONADO I
60hs
Ciência e Territórios
do Cidadão
Contemporâneo
80hs
Construções
Cognitivas e Ensino
da Matemática
80hs
Leituras e
Escritas e
Diversidades
Lingüísticas
80h
Propostas Educativas- Revisões
Conceptuais
80hs
Educação e sua
Gestão – metas
e mitos
80 hs
Consecução
Supervisionada
de Trabalho
Monográfico II
80hs
Consecução
Supervisionada
de Trabalho
Monográfico I
80hs
Práticas
Pedagógicas
80hs
ESTÁGIO
SUPERVISIONADO III
130hs
ESTÁGIO
SUPERVISIONADO IV
130hs
Topicalizando
Discursos e
Narrativas
80hs
ConstruçõesCognitivas
80hs
Práticas
Discursivas e
Especificidades
Lingüísticas
80hs
Tópicos Avançados de Âmbito
Bilíngüe
80hs
Tópicos Avançados de Âmbito
Bilíngüe
80hs
Tópicos Avançados de Âmbito
Bilíngüe
80hs
Tópicos Avançados de Âmbito
Bilíngüe
80hs
ESTÁGIO
SUPERVISIONADO II
60hs
Tópicos Avançados de Âmbito
Bilíngüe
80hs
Tópicos Avançados de Âmbito
Bilíngüe
80hs
Língua
Portuguesa
Escrita I
120hs
Língua
Portuguesa
Escrita II
80hs
Língua
Portuguesa
Escrita III
80hs
Língua
Portuguesa
Escrita IV
80hs
Língua
Portuguesa
Escrita V
80hs
Tópicos Avançados de Âmbito
Bilíngüe
80hs
Língua
Portuguesa
Escrita VI
80hs
Língua
Portuguesa
Escrita VII
80hs
NOTA: Eixos Norteadores em espaço incolor; Núcleo de Estudo Básicos em cinza médio, Núcleo de Aprofundamento e
Diversificação de Estudos em cinza escuro; Núcleo de Estudos Integradores em cinza mais claro. Atividades Formadoras de
cunho lingüístico em vermelho.
151
Anais do Congresso
A seguir, vejamos quadros contendo detalhamentos por Atividades
Formadoras que, em sucessivos Períodos Acadêmicos do Curso, priorizam
seu já inicialmente comentado caráter de cunho Bilíngüe.
1º PERÍODO ACADÊMICO
Leituras e Escritas
Estudos relacionados com a LIBRAS e a Língua Portuguesa como meios de partilha
da linguagem no contexto escolar e na vida cotidiana. São então trabalhadas
abordagens sobre reaprender a ler compreensivamente, a escrever com autonomia,
a expressar as próprias idéias.
Topicalizando Discursos e Narrativas
Conteúdos partem de uma visão do discurso como modo de ação no mundo. Abordam-se
a aquisição da linguagem e usos de narrativas de textos literários produzidos em
Português e/ou em LIBRAS também no contexto de sala de aula, agregando-se
então a estas questões sobre literatura infantil.
Práticas Discursivas e Especificidades Lingüísticas
Especificidades lingüísticas de surdos falantes de LIBRAS. Abordam-se a escrita como
território cultural e narrativas de textos literários e acadêmicos no espaço da escola.
Introduzem-se visões retrospectiva e prospectiva do exercício da narrativa escolar e da
reescrita de sua própria prática.
3º PERÍODO ACADÊMICO
Corporeidade, Cultura e Discurso
Relações entre linguagem e corporeidade vistas sob óticas históricas, discursivas e
socioculturais. São reposicionadas matérias sobre o contemporâneo descentramento do
sujeito e sobre mesclados matizes identitários discursivamente exercidos em complexas
conjunturas socioculturais.
4º PERÍODO ACADÊMICO
Apropriações Lingüísticas
São detidamente trabalhados os seguintes tópicos : gênese do pensamento e da palavra;
a palavra como território do significado e de sentidos; a questão do sentido em processos
de apropriação da linguagem; a inter-relação pensamento/linguagem; discurso interior e
fala egocêntrica x dialogismo; diferentes enfoques teóricos e conseqüências para a prática
docente.
5º PERÍODO ACADÊMICO
Textos e Pretextos
Usos de textos escritos na escolarização de crianças menores. São igualmente abordados
o texto como pretexto para a construção de sentidos e significados do/no mundo e da/na
vida, além de relações entre literatura e jogos de “ficção na realidade” e de “realidade na
ficção”.
6º PERÍODO ACADÊMICO
Leituras, Escritas e Diversidades Lingüísticas
Noções de língua materna (LM), primeira língua (L1) e segunda língua (L2). Questões
sobre o discurso escrito em LM e em L2, sendo também discutindos usos de literaturas
em línguas ágrafas e em LIBRAS. Tendo em vista atuações dos licenciandos que incluirão
trabalhos ligados ao Português Escrito e à própria LIBRAS, contrapõem-se então
especificidades sistêmicas próprias de cada qual.
152
2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º PERÍODOS ACADÊMICOS
Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe
Esta Atividade Formadora é desenvolvida em moldes de Estudos Dirigidos, Oficinas de
Libras, Monitorias, Laboratórios e possíveis Extensões e participações em Pesquisas.
1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 7º e 8º PERÍODOS ACADÊMICOS
Língua Portuguesa Escrita I,II, III, IV, V, VI, VII
Disciplina trabalhada de forma autônoma durante todo o Curso. São selecionados
textos articulados a informações de mundo, que possam gerar demandas discursivas e
gramaticais a serem ensinadas/aprendidas de modo amplo e conseqüente. Aborda-se a
maior variedade textual possível, com ênfase na leitura. Tratado o Português Escrito como
L2 de surdos falantes de LIBRAS, promovem-se assim conhecimentos reflexivos e críticos
de construção e reconstrução expressional, que lhes permitam desenvolver também suas
potencialidades.
153
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
O ENSINO SUPERIOR BILÍNGÜE
Vilmar Silva*
Para iniciar a minha fala gostaria de agradecer à direção do Instituto
Nacional de Educação e Integração de Surdos e à Comissão Organizadora
do Evento pelo honroso convite de participar desta mesa-redonda
intitulada “O ensino superior bilíngüe”. Ao saber do título da palestra, o
sentimento que tive foi de atração e de repulsão, pois, ao mesmo tempo
que me fez reviver algumas conquistas no ensino superior para surdos
em Santa Catarina, também vieram à tona os impasses, os conflitos, os
enfrentamentos nas mesas de negociações das quais participei enquanto
educador e representante dos movimentos de resistência surda. Relembro
com freqüência que a negociação com as instituições de ensino superior –
Universidade do Estado de Santa Catarina, Universidade Federal de Santa
Catarina e Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina
– eram extremamente tensas frente às representações colonialistas de
alguns dirigentes dessas instituições quanto à inserção do ser surdo1 nas
universidades brasileiras. Contudo, é importante salientar que esses espaços
foram determinantes na definição da concepção de educação bilíngüe a ser
adotada em cada uma dessas instituições de ensino.
* Professor do Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina e
pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Surdos nesta
instituição de ensino.
1
Segundo Perlin (2003, p. 100), o ser surdo se constitui na própria experiência de
si, que não é outra coisa “senão o resultado de um complexo processo histórico
de fabricação no qual se entrecruzam os diversos discursos que definem a verdade
do sujeito, as práticas que regulam seu comportamento e as formas de subjetividade nas quais se constitui sua própria interioridade”. Nesse sentido, Perlin e
Quadros (2006, p. 171) levantam três aspectos que consideram determinantes na
formação do ser surdo: “(a) a experiência (estar fazendo) no ato de transformarse: faz-se experiência no contato com a diferença que está no outro surdo. É um
ato de ir construindo a identidade, ato que permite novamente colocar a descoberto as identidades nunca prontas, fragmentadas, em contínua construção; (b) a experiência (exportada) no ato do surdo dar: de sua experiência do estar sendo surdo
ao outro surdo, identidades em questão de dependência, que tem a necessidade do
outro igual e (c) a experiência de resistência ou fragmentação: é a experiência que
acontece nas trocas com os ouvintes”.
154
Nesta apresentação, portanto, procuro fazer uma reflexão introdutória
sobre as representações em ser surdo no ensino superior. Para tanto,
(re)visito pressupostos políticos dos estudos pós-coloniais na tentativa de
encontrar brechas para um outro olhar que não se localiza apenas no campo
das representações da cultura hegemônica, mas também em territórios
simbólicos que se constituem a partir da cultura surda.
A dimensão política, aqui proposta, não se restringe às ações oficiais
voltadas à educação bilíngüe, mas às relações de poder no espaço acadêmico.
É uma política especificamente cultural, que se refere às representações
flutuantes e instáveis que provocam embates, muitas vezes conflitantes,
sobre o ser surdo nas universidades brasileiras.
As representações do ser surdo, em um universo essencialmente
regulado pelo som, ouvir e falar, traduzidos na prática pedagógica pelo ler e
escrever, tornaram-se tão essencializadas na academia, que qualquer outra
forma de ensino não centrado na língua portuguesa provoca estranheza
e sofre profundas restrições, se não impedimentos legais no processo de
implantação de cursos superiores bilíngües. A idéia é colocar em dúvida se
a produção e a socialização do conhecimento acadêmico em nosso país só
é possível a partir da de currículo centrado no som. É na tensão provocada
nos espaços de negociação que se constrói esta apresentação.
A educação bilíngüe na pós-colonialidade
A educação bilíngüe no Brasil pode ser compreendida a partir de uma
insuficiência representacional sobre o ser surdo gerada pela política de
homogeneidade e normalidade do mundo moderno, em que os sujeitos que
estão à margem encontram dificuldades de colocar em circulação as suas
próprias narrativas. Dito de outra forma, o ser surdo, na maioria das vezes,
não tem tido o controle sobre a sua própria representação frente às forças
desiguais e irregulares de representação cultural no contexto escolar.
Contrapondo-se a essa lógica colonialista, podemos encontrar outros
discursos sobre a educação bilíngüe, dentre eles, o da crítica pós-colonial
que emerge das lutas das minorias sociais. Segundo Bhabha (1998, p.
239), a análise pós-colonial formula “suas revisões críticas em torno de
questões de diferença cultural, autoridade social e discriminação política
a fim de revelar os momentos antagônicos e ambivalentes no interior das
‘racionalizações’ da modernidade”.
155
Anais do Congresso
O pós-colonialismo não se dá no campo das homogeneidades,
normalidades e certezas históricas da modernidade, mas sim em suas
contingências, que são “freqüentemente os fundamentos da necessidade
histórica de elaborar estratégias legitimadoras de emancipação” (Bhabha,
1998, p. 240). A diferença cultural2 para os sujeitos que estão à margem não
representa apenas uma estratégica de emancipação, mas de sobrevivência,
tornando-se inevitável a construção de um outro olhar não agenciado3 à
colonialidade. Porém, esta construção não exige apenas uma mudança
de conteúdos acadêmicos, mas de “uma revisão radical da temporalidade
social na qual histórias emergentes possam ser escritas; demanda também a
rearticulação do “signo” no qual se possam inscrever identidades culturais”
(Bhabha, 1998, p. 240). As contingências também históricas são marcas “do
espaço conflituoso mais produtivo, no qual a arbitrariedade da significação
cultural emerge no interior das fronteiras reguladas do discurso social”,
onde a reconstrução terá o seu real significado “se for reconstruída por
aqueles que sofreram o sentenciamento da história” (Bhabha, 1998, p.
240).
Ao contrário da educação bilíngüe pautada nos pressupostos da
modernidade, os estudos pós-coloniais se propõem construir o conhecimento
acadêmico a partir das margens, representando os próprios discursos dos
sujeitos que estão nas margens. O intelectual surdo pós-colonial não apenas
narra as suas histórias de resistência, mas também se alinha aos movimentos
A diferença cultural como uma forma de intervenção política “participa de uma
lógica de subversão [...] nos confronta com uma disposição de saber ou com uma
distribuição de práticas que existem lado a lado, [...] designando uma forma de
contradição ou antagonismo social que tem que ser negociado em vez de ser negado [...] intervém para transformar o cenário de articulação – não simplesmente
para expor a lógica da discriminação política. Ela altera a posição de enunciação
e as relações de interpelação em seu interior; não somente aquilo que é falado,
mas de onde é falado; não simplesmente a lógica de articulação, mas o topo da
enunciação. O objetivo da diferença cultural é rearticular a soma do conhecimento a partir da perspectiva da posição de significação da minoria que resiste à
totalização.” (BHABHA, 1998, pp. 227 e 228)
3
Segundo Ashcroft (2005, p. 8), o termo agência refere-se à “habilidade de
atuar ou fazer a performance de uma ação. Na teoria contemporânea depende da
seguinte questão: se os indivíduos podem começar uma ação de maneira livre e
autônoma ou se as coisa que eles fazem são, de alguma forma, determinadas pelas
maneiras nas quais suas identidades foram construídas. A agência é particularmente importante na teoria pós-colonial por se referir à habilidade que os sujeitos
pós-coloniais têm em começar ações de engajamento ou de resistência ao poder
imperial”.
2
156
de resistência como uma estratégia de levar o olhar hegemônico a uma crise.
Uma das possibilidades de compreender a resistência surda está no próprio
discurso colonial, que supõe representações e práticas de significação em
que o ser surdo é visto como um sujeito incapaz, primitivo e incompleto.
Esse discurso coloca um eu ouvinte, supostamente superior em relação a
um outro não-ouvinte – o surdo –, supostamente inferior. Segundo Skliar
(1999, p. 7), essas práticas colonialistas criaram um “conjunto de políticas
para a surdez, políticas de representações dominantes da normalidade, que
exercem pressões sobre a linguagem, as identidades e, fundamentalmente,
sobre o corpo dos surdos”. No fundo o que o colonialismo fez e continua
fazendo é expandir ainda mais sua dominação cultural, e isso não é uma
mera coincidência: o colonialismo criou um objeto – o não-ouvinte – a ser
manipulado para seu propósito clínico, cultural, social e econômico.
Mas, será que realmente existe um discurso colonialista que ordena e
regula tudo sobre o ser surdo? Para Homi Bhabha esse discurso colonial que
a tudo ordena e regula simplesmente parece ter sucesso em sua dominação
sobre o colonizado. O sucesso aparente do discurso colonial está marcado
pela resistência dos colonizados. A autoridade colonial sabe que a suposta
diferença – os surdos são inferiores aos ouvintes – é uma ficção que pode
ser desconstruída pela resistência da população colonizada. Entretanto, essa
resistência é simultaneamente reconhecida e negada pelo colonizador. De
forma significativa, há uma tensão permanente entre a ilusão da diferença
imposta pelo discurso colonial e a resistência dos povos colonizados.
Para Bhabha, o poder colonial é ansioso, e nunca consegue totalmente
o que quer. Isto é, não existe uma situação estável entre colonizadores e
colonizados. Essa ansiedade abre uma brecha no discurso colonial, que
pode ser explorada pelo colonizado.
O agenciamento lingüístico dos movimentos de
resistência surda
No Brasil, o processo de colonização na educação bilíngüe passou a
ser denunciado quando alguns educadores, militantes dos movimentos
de resistência surda, no final do século passado, passaram a estruturar
um movimento, no meio acadêmico, questionando as representações
colonialistas e adotando como estratégia política o reconhecimento da
língua brasileira de sinais como a língua acadêmica.
O agenciamento lingüístico foi uma das estratégias adotada, por
esse movimento, para deslocar a língua de sinais brasileira do campo da
157
Anais do Congresso
clandestinidade para o político. Este agenciamento unificou a organização
política dos movimentos de resistência surda, captando, registrando e
refletindo os interesses das comunidades surdas brasileiras. Ao trazerem a
língua de sinais brasileira para o debate acadêmico, os surdos, ao mesmo
tempo que evidenciam a fragilidade de se pensar o ensino centrado apenas
no ouvir e no falar, também procuram libertar-se das amarras da língua
portuguesa em seu desenvolvimento intelectual. Para eles a língua de sinais
não é um instrumento de comunicação para facilitar a aprendizagem da língua
portuguesa, mas uma língua que também contribui no desenvolvimento
das relações sociais, culturais e institucionais.
É importante compreender que este movimento não converge com as
políticas monolíngües construídas pelos estados nacionais, como o caso do
Brasil, muito pelo contrário, ela se apóia nas políticas pós-coloniais em que
as línguas de grupos minoritários estão no mesmo status da língua oficial
do país tanto no campo lingüístico como no político, social e cultural.
Segundo Quadros (2006, p. 26), imagina-se que no Brasil todas as pessoas
adquirem a língua portuguesa como primeira língua, ignorando que:
os falantes de famílias imigrantes (japoneses, alemães, italianos, espanhóis,
etc.), que temos as várias comunidades indígenas que falam várias línguas
nativas (mais de 170 línguas indígenas de famílias totalmente diferentes) e que
temos, também, falantes, digo “sinalizantes” da língua de sinais brasileira (os
surdos e familiares surdos brasileiros). Todas essas línguas faladas no Brasil,
também são línguas brasileiras caracterizando o país que o Brasil realmente é,
um país multilíngue.
No caso dos surdos, o governo brasileiro, mesmo reconhecendo o
estatuto da língua de sinais brasileira  Lei 10.436/2002 , impõe a língua
portuguesa na modalidade escrita como a língua acadêmica. Ao definir
esta política, cuja premissa é de que o uso da língua de sinais leva ao
não-uso da língua portuguesa, o governo gera uma política de exclusão
dos surdos no meio acadêmico4. Ao contrário do Brasil, no Canadá,
por exemplo, dependendo da região, a língua acadêmica é o inglês ou o
francês. Os canadenses, por terem mais de uma língua oficial, ampliam as
suas possibilidades de interação social e conseqüentemente a produção de
sentidos.
Para uma população de 5.735.099 surdos (censo IBGE/2000), tínhamos em
2006 apenas 2.428 surdos nas universidades brasileira, sendo que, destes, 353
estão em instituições públicas e 2.075 em instituições particulares, o que corresponde a 0,042% de surdos no ensino superior (MEC/INEP/2006).
4
158
O fato dos surdos poderem vir a ter uma língua acadêmica diferente da
maioria do povo brasileiro não implica uma ameaça para a nação, muito
pelo contrário, amplia os espaços de interação entre surdos e ouvintes. Os
surdos parecem “estrangeiros em seu próprio país”, embora estejam em
contato permanente com a língua portuguesa e, dependendo do contexto, a
utilizem de diferentes formas. Nos estudos em língua de sinais brasileira no
Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina (CEFET/SC),
quando algum educador ouvinte não compreende o que educador surdo
falou em língua de sinais, ele escreve na língua portuguesa para facilitar
a negociação de sentidos. Essa postura dos educadores surdos acontece a
partir de uma necessidade e não por imposição de uma política lingüística.
Porém, o exemplo anterior não representa a complexidade da situação
bilíngüe dos surdos no Brasil. Não podemos esquecer que a língua de sinais
e a língua portuguesa são de modalidades diferentes; a maioria dos surdos
são filhos de pais ouvintes que não dominam a língua de sinais brasileira;
os surdos aprendem tardiamente a língua de sinais brasileira; os surdos da
zona rural, geralmente, não dominam a língua de sinais brasileira e são raros
os surdos brasileiros que dominam a língua portuguesa com proficiência.
Para Quadros (2206, p. 28):
Se não fosse a diferença na modalidade, todos teriam tranqüilidade em
reconhecer as pessoas surdas enquanto bilíngües. Elas nascem no Brasil e,
portanto, falariam a língua portuguesa. Convivem com os surdos, portanto, usam
a língua de sinais brasileira. No entanto, não é dessa forma que caracterizamos
a situação bilíngüe dos surdos brasileiros, se é que podemos considerá-los
genericamente com este status.
Portanto, compreender a situação bilíngüe dos surdos no Brasil exige,
no mínimo,
outros referenciais teóricos que não se situam apenas no campo da
aquisição de uma segunda língua. Os surdos freqüentemente afirmam que
a língua portuguesa, por ser de um sistema de representação diferente das
línguas de sinais, não tem como ser a sua segunda língua. Para eles, as
outras línguas visual-espaciais, como por exemplo, língua americana de
sinais, devem ser a sua segunda língua; além disso, propõem que os surdos
devem aprender a língua portuguesa na modalidade escrita depois de
aprenderem a escrita da língua de sinais brasileira. Capovilla (2002, 256)
corrobora essa idéia ao explicar sobre a descontinuidade na aprendizagem
de uma segunda língua por crianças surdas.
159
Anais do Congresso
Na criança ouvinte e falante, há uma continuidade entre três contextos
comunicativos básicos: a comunicação transitória consigo mesma (i.é., o
pensar), a comunicação transitória com outrem na relação face a face (i.é., o
falar), e a comunicação perene na relação remota e mediada (i.é., o escrever).
Com isto todo o seu processamento lingüístico pode concentrar-se na palavra
falada de uma mesma língua: para pensar, comunicar-se e escrever, ela pode
fazer uso das mesmas palavras de sua própria língua falada primária. Para essa
criança há uma compatibilidade entre sistemas de representação lingüística
primária (i.é., a língua falada) e secundária (i.é, a língua escrita alfabética). [...]
da criança surda, no entanto, espera-se muito mais. Ela pensa e se comunica
em sua língua de sinais primária na modalidade visual e quiroarticulatória (i.é.,
quiro, do Grego, mão). Mas, frente à tarefa de escrever, espera-se que o faça
por meio de palavras de uma língua falada estrangeira – a Língua Portuguesa
(grifos do autor).
Segundo Quadros (2006), há dois movimentos de resistência surda
quanto o uso da língua portuguesa, enquanto uma outra língua, e não como
a uma segunda língua. O primeiro é o movimento oposicional, que enfatiza
a noção da diferença cultural, porém, de forma estática, ignorando o papel
das interações sociais no desenvolvimento político, histórico e cultural dos
próprios surdos. Seriam surdos só os surdos com “S” maiúsculo, os surdos
militantes, isto é, os surdos que se opõem frontalmente aos ouvintes. Por
se colocarem dessa forma, ao mesmo tempo que denunciam o apagamento
da língua de sinais brasileira pela imposição do uso da língua portuguesa
como língua acadêmica, também reduzem as possibilidades de interação
entre surdos e ouvintes. O outro movimento, defino-o de pós-colonial;
mesmo se apresentando de forma embrionária, é um movimento de
resistência surda que se desloca das relações oposicionais  surdos/ouvintes,
língua de sinais/língua portuguesa  e entra em espaços de negociação sem
uma preocupação de vigiar as fronteiras. A língua, independente de sua
modalidade, é vista como um instrumento de poder que pode desconstruir
as próprias representações hegemônicas sobre o ser surdo. Porém, os dois
movimentos convergem em um ponto: a língua de sinais deve ser a língua
acadêmica dos surdos, por uma questão muito simples: a língua de sinais é
a língua que lhes permite ser o que sempre foram: surdos.
Bibliografia
BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. 4. ed. São Paulo:
Hucitec, 1992.
160
_____. Estética da Criação Verbal. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes,
2003.
BHABHA, H. K. Local da Cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998.
CAPOVILLA, F. C. e outros. O desafio do bilingüismo na educação de
surdos: Descontinuidade entre a língua de sinais e a escrita alfabética e
estratégias para resolvê-la. IN: CAPOVILLA, F.C. (Org). Neuropsicologia
e aprendizagem: uma abordagem multidisciplinar. 2. ed. São Paulo,
2004.
HUDDART, D. Homi K. Bhabha. London/New Iork: Routledge, 2006.
LARROSA, J. Tecnologias do Eu e Educação. In: SILVA, T. (Org). O
Sujeito da Educação: estudos foucaultianos. Petrópolis: Vozes, 1994.
MACHADO, I. J. R. Reflexões sobre o pós-colonialismo. São Carlos:
UFSCar (texto do Mini-curso “Pós-colonialismo” da Semana de Ciências
Sociais).
PERLIN, G. T. T. O Ser e o Estar Sendo Surdo: alteridade, diferença e
identidade. Porto Alegre: UFRGS/CED, 2003 (Tese).
QUADROS, R.M. & SCHMIEDT. Idéias para ensinar português para
alunos surdos. Brasília: MEC/SEESP, 2006.
_____. O “Bi” em bilingüismo na educação de surdos. In: FERNANDEZ,
Eulália. Surdez e bilingüismo. Porto Alegre: Mediação, 2005.
SKLIAR, C. (Org). Atualidade da educação bilíngüe para surdos. Porto
Alegre: Mediação, vol.I-II, 1999.
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L. (Org). Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturais. Belo
Horizonte: Ed. UFMG, 2003.
SOUZA, L. M. T. M. Hibridismo e tradução cultural e Bhabha. In:
JUNIOR, B. A. (Org.). Margens da cultura: mestiçagem, hibridismo &
outras misturas. São Paulo: Boitempo, 2004.
_____. Language, Culture, Multimodality and Dialogic Emergence.
São Paulo: USP, S/D (texto).
161
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
AQUISIÇÃO DE LÍNGUA DE SINAIS POR
SURDOS ADULTOS:
CONDIÇÃO PARA ESCOLARIDADE
Vera Regina Loureiro1
Este trabalho pretende discutir o processo de ensino-aprendizagem
de jovens e adultos surdos que, por não terem tido a oportunidade de
constituírem-se como sujeitos discursivos em uma língua (seja ela sinalizada,
oral ou escrita), encontram-se excluídos do processo educacional.
Essa é uma realidade que, apesar de alarmante, ainda não encontrou
espaço nos trabalhos acadêmicos. A falta de abordagem sobre o tema por
estudiosos da linguagem e da surdez poderia indicar, equivocadamente, a
inexistência de tal situação, ou seja, a de surdos adultos não conhecedores/
usuários de sua própria língua e de nenhuma outra.
No entanto, para nós, profissionais da educação de surdos, para os
familiares desses indivíduos, e também para a comunidade surda, o contato
e a convivência com grande número de surdos adultos nessa condição
confirma a dimensão do problema.
Se considerarmos que, no Brasil, ainda há um contingente de analfabetos
de cerca de 13%, que o analfabetismo funcional é uma realidade que
atinge mais da metade da população e que apenas 15% dos deficientes
recebem algum tipo de atendimento educacional, poderemos pensar que,
possivelmente, há uma imensa população de surdos à margem de qualquer
interação lingüística.
Esse fato é passível de verificação e comprovação por meio da chegada
tardia de pessoas surdas adultas às escolas de surdos (como o INES, por
exemplo), às associações de surdos, ou até mesmo às igrejas que possuem
cultos e trabalhos voltados para a comunidade surda, em uma busca
1 INES-Brasil
162
desesperada (na maior parte das vezes, de seus familiares) por algum tipo
de escolarização.
O acesso à escolaridade seria, então, a possibilidade de redenção
desses sujeitos, que poderíamos chamar de sem-língua ou de pessoas com
“habilidades mínimas de linguagem”, conceito utilizado por Cokely (19901993) em seus estudos sobre os meios de comunicação, sobre o ensino e
as políticas educacionais para surdos nos Estados Unidos da América, para
definir os surdos que não apresentam competência em língua alguma – de
sinais, oral, ou escrita.
A realização deste trabalho é fruto de questionamentos e reflexões
que venho elaborando durante os muitos anos de prática profissional na
educação de surdos. Minha experiência com dois grupos de surdos tão
distintos quanto crianças da pré-escola e adultos do curso noturno acabou
por apontar-me uma semelhança crucial nas dificuldades vivenciadas por
ambos no processo de ensino-aprendizagem, ou seja, a falta de uma língua
natural de mediação das interações em sala de aula.
Buscando enfrentar essa realidade, tive a oportunidade, por dois anos,
de desenvolver (em parceria com uma professora surda) um trabalho com
jovens e adultos surdos, das primeiras séries do Ensino Fundamental do curso
noturno do INES, que apresentavam “habilidades mínimas de linguagem”.
A proposta tinha como principal objetivo oferecer oportunidades reais de
interação desses alunos com uma falante nativa da língua de sinais, para
possibilitar a aquisição dessa língua, o desenvolvimento da competência
comunicativa nessa mesma língua e ampliar o conhecimento de mundo
desses aprendizes.
A aula de língua de sinais, conduzida em língua de sinais por uma
professora surda falante nativa, apresenta, como aspecto marcante, o fato
de que a língua de sinais é, ao mesmo tempo, tanto o foco da aula (aprender
língua de sinais) quanto o instrumento de mediação ou língua de instrução
(a própria língua de sinais). Em outras palavras, pode-se dizer que tanto
o objetivo quanto a maneira de se chegar a ele é o mesmo: a língua de
sinais.
As discussões aqui realizadas são orientadas por uma concepção sóciohistórica e dialógica de linguagem, do discurso como prática social situada
e lugar de constituição de relações sociais e identitárias, no qual os falantes
se tornam sujeitos. Entendemos, portanto, que, ao usarmos a linguagem,
ao falarmos uma língua, ou seja, ao produzirmos um discurso em uma
163
Anais do Congresso
determinada comunidade de fala, constituímo-nos enquanto sujeitos sociais
ao mesmo tempo em que construímos os significados e o mundo à nossa
volta. É a linguagem, também, nessa concepção, o principal instrumento
de mediação dos processos mentais, isto é, instrumento de organização do
pensamento.
Adquirir a língua de sinais para tornar-se interlocutor e passar a produzir
enunciados próprios é, portanto, condição necessária para a conquista
de novas aprendizagens, para entrar, verdadeiramente, no processo de
escolarização.
Como transformar um problema do cotidiano em uma equação
matemática? Como estudar geografia sem poder nomear os estados, países
ou continentes? Como entender a própria história e a história de seu país
para poder exercer sua cidadania? Como aprender a leitura e a escrita de
uma segunda língua, quando ainda não há condições mínimas de interação
em uma língua natural e acessível?
As reflexões aqui desenvolvidas apontam para a urgente necessidade de
mudanças no que a escola tem proposto para esses aprendizes.
O reconhecimento oficial da língua de sinais como língua da
comunidade surda brasileira poderia servir de impulso a uma proposta de
educação bilíngüe para surdos no país. No entanto, o que se tem visto é
a discussão de formas de inserção desses sujeitos nas classes do ensino
regular, com intérpretes ou professores-intérpretes, e a negação de seus
direitos lingüísticos mínimos, sob a bandeira da inclusão social – a inclusão
excludente, que continua a produzir surdos apáticos, emocionalmente
imaturos e debilitados cognitivamente.
É preciso, mais uma vez, trazer para o debate nacional a necessidade
de uma política lingüística que, ao assumir a educação bilíngüe para
surdos como meta, respeite a comunidade surda como minoria lingüística
e cultural, reconheça seus direitos lingüísticos e combata as práticas
ouvintistas e as políticas hegemônicas que ainda persistem na educação
de surdos e que parecem querer ocultar a diferença a partir de uma suposta
luta pela igualdade.
164
Bibliografia
COKELY, Dennis. The effectiveness of three means of communication in
the college classroom. In: Sign language Studies 69. Linstok Press, Inc.,
Winter, 1990.
LOUREIRO, Vera Regina. Aquisição tardia de língua de sinais por
surdos adultos: construindo possibilidades de significação e inserção
no mundo social. 2004. Dissertação (Mestrado em Lingüística Aplicada)
– Faculdade de Letras da UFRJ, Rio de Janeiro, 2004.
SKLIAR, Carlos (Org.). A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto
Alegre: Mediação, 1998.
SKUTNABB-KANGAS, Tove. Linguistic Human Rights: a prerequisite
for Bilingualism. In: AHLGREN, Inger; HYLTENSTAM, Kenneth (eds.).
Bilingualism in Deaf Education. Hamburg: Signum-Verl, 1994.
SOUZA, Regina Maria de. Que palavra que te falta: lingüística e
educação: considerações epistemológicas a partir da surdez. São Paulo:
Martins Fontes, 1998.
VYGOTSKY, Lev Semenovich. Fundamentos de Defectología. Obras
completas. Tomo cinco. Habana: Editorial Pueblo y Educación, 1989.
165
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
A ESCOLARIZAÇÃO DE SURDOS
Gladys S. Carvalho*
No cenário da educação brasileira, o Instituto Nacional de Educação de
Surdos, há 150 anos, ontem comemorados, tem em sua gama de funções a
escolarização de surdos, em qualquer fase de suas vidas.
Hoje, o cenário educacional mundial aponta para que as escolas sejam
inclusivas, como um direito inalienável à educação, partindo do pressuposto
de que todos somos iguais.
Nós, no INES, buscamos essa inclusão através do respeito à diversidade
lingüística do surdo. Temos a obrigação histórica de garantir que nosso
alunado – infantil, juvenil ou adulto – seja respeitado no seu bem mais
precioso, sua comunicação e constituição enquanto humano, o direito à
sua língua, e o de estar com seus pares, constituindo não uma minoria, mas
sim uma maioria lingüística, mesmo que apenas em seu horário de aula. O
INES é, portanto, uma Escola Especial para surdos e para outras pessoas
com necessidades especiais, cuja principal característica seja a surdez,
independentemente de seu grau.
Hoje, estou aqui para apresentá-los a uma parte da escola do INES, o
Ensino Noturno, que possui características bastante peculiares. Vou tentar
apresentá-lo de maneira simples e buscando a melhor forma para os surdos,
usando as imagens que tão bem representam esse turno em nossa escola.
1. Ingresso e escolarização
- A situação social das pessoas surdas, no Brasil, e entre elas os nascidos
em nosso Estado ou Município, faz com que procurem a escola tardiamente,
quer por seus familiares, devido à demora na confirmação do diagnóstico da
surdez, ou quando já estão em idade de tomar suas próprias decisões, sem a
interferência ou responsabilidade familiar, seja por necessidade individual
ou coletiva por participar de grupo ou associação de surdos.
- No Colégio de Aplicação do INES, que atende do Ensino Fundamental
ao Médio, é adotado o ensino em seriação, não havendo proposta de
* Professora do INES.
166
Educação de Jovens e Adultos, nem qualquer outra modalidade de ensino
que tenha o objetivo de abreviar ou atender em caráter de suplência.
Sendo assim, nossa escola é freqüentada, no diurno, por alunos das mais
variadas idades, a partir da 5.ª série, hoje equivalente ao 6.º ano. Devido a
essa realidade, temos em nossa instituição um setor que trata da qualificação
e encaminhamento ao mercado de trabalho, e a freqüência desses alunos,
na escola, é adequada às suas necessidades específicas. Preferencialmente
o aluno maior de 16 anos estudará no noturno, priorizando a vaga no diurno
para os mais jovens, em idade adequada à série pleiteada.
1.1 – O primeiro segmento do Ensino Fundamental (1.º ao 5.º ano), no
noturno:
- o aluno ingressará em qualquer fase da vida, após 16 anos de
idade e ter-se candidatado à vaga no Colégio de Aplicação do INES, no
período aberto para cadastro de ingresso ou por transferência de outro
estabelecimento. Passa por uma avaliação e verificação se o nível de
escolaridade pleiteado é compatível com seus resultados e documentação.
No caso de incompatibilidade de horário, o caso será estudado, visando não
prejudicar o aluno.
É nesse início da escolaridade que estamos caminhando para que a
LIBRAS seja priorizada, por entendermos ser esta a sua língua natural e
cumprindo a Lei de reconhecimento desta pela nação brasileira.
Na maioria das vezes, o aluno chega ao INES sem um sistema real de
comunicação; por isso, há uma preocupação que vem sendo gradualmente
desenvolvida, dando ênfase à fluência em LIBRAS como possibilidade de
aprovação ao 2.º segmento dessa fase de ensino, além dos conhecimentos
básicos das áreas comuns às escolas nesse segmento de ensino. Há esse
intuito, e estamos caminhando nesse sentido, mas ainda não é uma
realidade.
1.2 – No segundo segmento do Ensino Fundamental (6.º ao 9.º ano) e
Ensino Médio (1ª à 3ª série), no noturno:
- o aluno ingressará em qualquer fase da vida, após 16 anos de idade e terse candidatado à vaga no Colégio de Aplicação do INES, no período aberto
para cadastro de ingresso ou por transferência de outro estabelecimento,
apresentando documentação comprobatória.
167
Anais do Congresso
2. A realidade do educando que inicia o primeiro segmento do Ensino
Fundamental do INES:
2.1 – Da realidade social
- Em sua maioria, esses educandos são oriundos de situações de total
exclusão social e afetiva.
- Alguns passaram por uma série de tentativas frustradas de escolarização
e atendimentos clínicos.
- Geralmente somos procurados por jovens na faixa dos vinte anos,
acompanhados ou não por alguma representação familiar.
- Quase todos não são proficientes em qualquer língua, seja o Português
(oral ou escrito) ou LIBRAS. São raríssimos os que chegam com LIBRAS
e que estejam incluídos em comunidade surda.
- As tentativas de comunicação, em sua maioria, se traduzem em gestos
naturais, que quase não são entendidos, o que traz grande frustração,
angústia e sofrimento a esse indivíduo e para o professor que o recebe.
A característica mais marcante da escolarização no INES é que o aluno,
após 16 anos de idade, poderá freqüentar qualquer dos três turnos a ele
disponível, desde que:
- esteja matriculado a partir do 6.º ano do segundo segmento do Ensino
Fundamental;
- haja vaga na turma e turno pretendidos;
- avalie-se a troca de turno como real e necessária. Nesse sentido, o
aluno poderá trocar de turno de acordo com sua necessidade e existência de
vaga, contribuindo assim para sua permanência na escola e a conclusão de
seus estudos, possibilitando ainda o encaminhamento profissional.
Consideramos essas duas características como um “divisor de águas”
na inclusão social e acesso à escola para a minoria lingüística surda, em
nosso país.
Outra forte característica do turno da noite do INES é que os alunos
chegam sem uma língua! E sem língua não há comunicação, compreensão
e aprendizagem acadêmica. Não há livre expressão e escolhas. Não há uma
real identidade humana. Não há aceitação e inclusão social.
As barreiras a serem transpostas são imensas, o que acaba originando
outra característica grave desse turno no 1.º e 2.º ano do Ensino Fundamental:
a desistência escolar.
168
Lutamos contra muitos anos de solidão e total abandono social e
emocional destes alunos! Somos uma escola e, por mais que nos esforcemos,
não temos a qualificação necessária que de imediato supra tantos anos
de esforços sem resultados, como vieram sofrendo essas pessoas que se
encontram em tal situação.
Bom, mas nada melhor do que nos apresentarmos através de nossas
imagens.
Apresento-lhes o turno da noite do INES, com seus alunos, professores,
técnicos, enfim ... NÓS ...
169
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS NA
EDUCAÇÃO PRECOCE DO INES
Ana Lucia do Nascimento*
Para falar do atendimento pedagógico da criança surda, no período de 0
a 3 anos de idade, no Instituto de Educação de Surdos é necessário se fazer
referência ao seu processo histórico uma vez que este período está ligado,
atualmente, à primeira fase do ensino básico. Entretanto, há alguns anos
atrás as crianças desta fase recebiam atendimento com uma visão voltada
para a área da saúde e tanto o termo “estimulação” quanto “intervenção”
refletia esta idéia.
Neste contexto histórico podemos citar duas professoras que marcaram
esta trajetória não perdendo de vista que o trabalho em equipe sempre foi
uma marca, dentro deste atendimento, no INES.
A professora Ana Rimoli de Faria Dória foi incansável em seu trabalho
visando o melhor atendimento ao surdo. Foi diretora do INES, no período
de 1951 a 1961. Escreveu vários livros e artigos que falavam da importância
tanto do trabalho com a pessoa surda quanto da participação de seus
familiares neste processo de aprendizagem.
Alguns de seus pensamentos são atuais e apresentam propostas que
ainda embasam este atendimento, principalmente, na Educação Infantil.
Em um de seus últimos trabalhos, Ana Rimoli escreveu para pais e
mestres norteando seus pensamentos numa visão mais ampla de vida.
A capacidade de aprender que o homem traz ao nascer possibilita uma educação
e um crescimento indefinido que, muito mais sensível na infância, onde tem
seu máximo de intensidade, perdura por todo o período de vida da pessoa.
A capacidade de aprender, que nada mais é do que o poder de reter uma
experiência é, também, algo que poderá transformar as futuras experiências.
Aprender é uma função permanente do organismo e é por meio dessa atividade
que o homem cresce.
(...) A criança de hoje será, fatal e irreversivelmente, o homem de amanhã e por
* Professora
da Educação Precoce, no INES. Especialização: Psicopedagogia e
Estimulação Essencial e Desenvolvimento Infantil. Capacitação: Avaliação Neonatal, método Dubowitk e Clínica dos Primórdios - ABENEP/RJ.
170
isso se constitui no fulcro das atenções de todos aqueles que, de uma forma ou
de outra, acompanham seu desabrochar pleno e ininterrupto, no lar, na escola,
na comunidade em geral.
(...) Uma criança não poderá ser formada, educativamente, apenas freqüentando
a escola; o fundamento de todo o sucesso em sua vida futura é a vivência do lar;
é aqui que começa seu verdadeiro e definitivo preparo.
Em 1972 a professora Ivete Vascolcellos veio trabalhar no INES.
Como já tinha um trabalho anterior, na Estimulação Precoce e observando
que muitas crianças esperavam completar a idade para ingressar na PréEscola percebeu a necessidade de implantar um trabalho com estas
famílias, enquanto aguardavam uma vaga. Formou uma equipe e iniciou
este atendimento em 1975. Três anos após sua implantação, este serviço
foi agregado à Pré-Escola que já existia na instituição. Seu pensamento,
também, era o de apoiar e orientar as famílias de crianças surdas bem
como oferecer-lhes um atendimento onde todo o seu potencial pudesse ser
desenvolvido.
“... quanto mais cedo se diagnosticar e tratar uma deficiência, tanto melhor será
o prognóstico educacional da criança.
Realizado o diagnóstico, é importante que a criança participe de um programa
de estimulação precoce elaborado para ser realizado no lar, pela família”.
“Estimular uma criança é trabalhar com ela, é torná-la mais ativa, mais esperta,
mais participante”.
Hoje, este atendimento é denominado de Educação Precoce. É a
primeira fase da Educação Infantil e segue as orientações das Diretrizes
Curriculares Nacionais, organizadas pelo Ministério da Educação.
O INES como uma escola especializada na área da surdez tem em seu
projeto pedagógico a filosofia sócio-interacionista, com a proposta de
comunicação baseada nas propostas do bilingüismo.
Na Educação Precoce o ambiente deve ser preparado num clima
lúdico onde as estratégias de intervenção possam promover experiências
significativas através da brincadeira, pois, sabemos que a criança traz para
a escola um saber construído em suas experiências anteriores mas, que são
exploradas numa linguagem própria do mundo infantil. Portanto, todas as
atividades planejadas para esta fase não podem perder de vista as etapas
da evolução infantil e o histórico de vida de cada criança, levando em
consideração sua perda auditiva e os anseios da família. Referindo-se ao
processo de intervenção o MEC (1995, p.20) diz que
171
Anais do Congresso
o atendimento tem por finalidade proporcionar à criança condições para alcançar
seu pleno desenvolvimento, mediante experiências significativas resultantes de
seu contato com as pessoas, objetos e espaços. Ao lado desse objetivo incluem-se
aqueles relacionados com as mudanças de atitudes das pessoas de seu convívio,
particularmente aquelas que assumem a função de mediadoras (facilitadoras)
nesse processo, ou seja: os pais, familiares, educadores, atendentes e outros.
Para nós, brincar é indício de saúde física e psíquica. A professora
treinando seu olhar para a criança poderá ajudá-la no desenvolvimento
de suas potencialidades. A postura do adulto como mediador, deve ser de
amor e compreensão, assim a criança, gradativamente, adquire autonomia
necessária para confrontar-se com as várias situações de aprendizagem.
Currículo
O currículo da Educação Precoce, no INES abrange as áreas de
conhecimento propostas pelo MEC enfatizando as diferentes formas de
comunicação que são próprias para esta faixa etária.
I - Noções Lógicas e Topológicas
A criança observa e explora diferentes objetos adquirindo a capacidade
de classificá-los de acordo com seus atributos; cria soluções novas para os
diferentes problemas que surgem em cada atividade e vai adquirindo, aos
pouco, noção de tempo e espaço.
Com o responsável pela criança participando dos atendimentos, podemos
pontuar suas conquistas. Desta forma a família passa a compreender que
o surdo possui potenciais a serem desenvolvidos, da mesma maneira que
todas as crianças: brincando.
II – Ciências
Em várias atividades a criança é levada a conhecer seu corpo e suas
possibilidades, utilizando-o como instrumento para explorar diferentes
situações.
Algumas crianças chegam à Educação Precoce com idade de andar, por
exemplo, mas não o fazem porque não tiveram oportunidade para este jogo
de exercício.
Nestes casos a professora planeja estratégias que ofereçam esta
172
experiência, além de orientar a família para deixar a criança explorar os
espaços, sempre na presença de um adulto, com o cuidado para não lhe
transmitir insegurança e que as quedas fazem parte do aprendizado.
III - Estudos Sociais
As atividades envolvendo esta área promovem estratégias significativas
para que a criança estabeleça e amplie suas relações sociais formando
vínculos afetivos tanto com crianças quanto com adultos. Nesta interação
ela terá oportunidade de fazer relação entre eu/outro, passando a conhecer
os seus limites e o do próximo.
Em conversa com a família a professora aponta que desde o nascimento
toda criança é imersa em um meio cultural onde regras pré-estabelecidas
dentro do grupo já refletem situações de limites. Portanto, é necessário
que a criança comece a compreendê-los para, gradativamente, buscar seu
equilíbrio psíquico.
IV – Linguagem
A linguagem está presente em todas as atividades. De início o choro é
um dos elementos de comunicação junto com o olhar e o toque, promovendo
uma troca entre a criança e o meio. Aos pouco esta comunicação ganha
novos elementos, estabelecidos pelos padrões que são apresentados na
relação adulto/criança.
Surge o sorriso social; as diferenciações de choro, expressando dor,
sono, fome, variações de temperatura ou mesmo solicitação da presença do
outro. Os gestos naturais e os rituais significativos (antecipando situação –
banho; alimentação; hora de dormir; de ir passear; etc.). Mais adiante surge
a possibilidade de adquirir uma língua. Para Fernandes (2005, p.18) através
da aquisição de um sistema simbólico, como é o da língua, o ser humano
descobre novas formas de pensamento, transformando sua concepção de
mundo.
A família (na maioria das vezes, ouvinte) busca ansiosamente pelo
momento em que sua criança dirá as primeiras palavras. Na “falta”
deste elemento que as aproximem, se desestruturam. Em muitos casos,
desfragmentando-se por não compreender as questões da surdez.
Na maioria das vezes, nos deparamos com situações em que os
173
Anais do Congresso
primeiros atendimentos são, basicamente, voltados para apoiar e orientar
a família diante do laudo da surdez. Nossa orientação está sempre voltada
para o envolvimento da família nas questões da aprendizagem, olhando
a criança globalmente e não apenas como uma criança surda. Entretanto,
não deixamos de orientá-la no sentido de conversar com os profissionais
da área de Fonoaudiologia, que atendem sua criança para que compreenda
as especificidades dela, não a comparando com nenhuma outra, porque é
única, com sua história de vida.
Na Educação Precoce do INES, as crianças são expostas à Língua
Brasileira de Sinais – LIBRAS e seus familiares são orientados quanto
à importância da aquisição desta língua o mais cedo possível para que o
desenvolvimento de sua criança ocorra plenamente. Seguindo o pensamento
de Fernandes (2005, p.19), propiciar à pessoa surda a exposição a uma
língua o mais cedo possível, obedecendo às fases naturais de sua aquisição
é fundamental ao seu desenvolvimento.
A Língua Portuguesa é sistematizada através de contextos lúdicos e
significativos, respeitando-se as especificidades de cada criança.
Família e Escola
Atualmente é inconcebível o processo de aprendizagem ficar apenas a
cargo da escola. Sabemos que a participação da família é fundamental. Um
dos pontos determinantes para o atendimento pedagógico, na Educação
Precoce é apoiar e orientar a família tendo a compreensão de que ela
prosseguirá com o trabalho, fora da escola, complementando-o.
Com isto mantemos em nossos atendimentos a proposta inicial da
Educação Precoce, no INES. Ao longo do processo podemos constatar
mudanças significativas dentro do próprio grupo familiar e muitos ganhos
da criança são atribuídos a esta mudança de postura.
Avaliação
A avaliação é feita ao longo do período em que a criança se encontra na
Educação Precoce, através de observações da professora, tanto em relação
à criança quanto à própria família.
174
Próximo aos três ou quatro anos de idade, de acordo com o
desenvolvimento e levando em consideração o tempo em que se encontra
na Educação Precoce, a professora aponta para a família, os progressos
feitos pela criança ao longo do tempo e a necessidade dela prosseguir em
seu processo escolar, em outra etapa de sua vida, na Pré-Escola.
Neste momento é importante haver um diálogo entre escola e família
onde as propostas do Colégio de Aplicação – CAP/INES são avaliadas e
ponderadas. A família é ouvida, orientada e apoiada em suas decisões.
Para que a criança ingresse na Pré-Escola é necessário que ela tenha
atingido alguns requisitos básicos, levando em consideração à continuidade
do processo pedagógico iniciado na Educação Precoce, e, que tenha a idade
próxima a 3 anos.
1. Apresentar um desenvolvimento motor, dentro das possibilidades
individuais, aproximando-se do esperado para sua faixa etária;
2. Apresentar um grau de atenção; compreensão e memorização,
aproximando-se do esperado para sua faixa etária;
3. Possuir atenção necessária para perceber a presença e a ausência
do som, possibilitando principalmente a conclusão de um laudo
audiométrico;
4. Possuir alguns hábitos de independência, tais como:
a) separar-se da mãe ou quem a acompanha, sem dificuldade, iniciando
o processo de interação no grupo escolar (adultos e crianças);
b) ter iniciado o controle dos esfíncteres, não usando
fraldas durante o dia;
c) comer sozinho, mastigando alimentos sólidos.
5. Comunicar-se com outras crianças e adultos, demonstrando
compreender situações cotidianas.
Quanto mais a criança se aproxima dos quatro anos, mais complexas ficam as
dramatizações. Pouco a pouco ensaia um simbolismo coletivo, tentando manter
uma cena em conjunto com outras crianças. Isso vai exigir dela muito esforço
de descentralização, de aceitar o que a outra criança quer, para poder continuar a
brincar. Começa assim a viver o drama de ter que ceder para poder conviver. Em
geral, crianças mais velhas introduzem de forma lúdica e natural esse ingresso
no social, organizando e liderando brincadeiras em conjunto. O convívio com
outras crianças, de diversas idades é fundamental para o desenvolvimento
cognitivo e afetivo-emocional (OLIVEIRA, p.32-33).
175
Anais do Congresso
A partir de um olhar reflexivo a professora busca a criança em seus
aspectos cognitivos, emocionais e sociais, não deixando de levar em conta
suas especificidades na área da comunicação.
A criança surda é antes de tudo uma criança que precisa brincar, pegar,
olhar, tocar e ser tocada. Observar e tirar conclusões utilizando todo seu
potencial criativo.
Bibliografia
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Brasília; SEESP, 1995.
DORIA, Ana Rímili de Faria. Educando para a imortalidade: orientação
para pais e mestres. 2 ed. PR: Ordem Rosacruz – AMORC, 1989.
FERNANDES, Eulália (Org.); QUADROS, Ronice M.de...et al. Surdez e
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176
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
A FAMÍLIA EM DISCUSSÃO
Rosária de Fátima Corrêa Maia*
Adriana Lima Guedes**
Cila Ferreira Portugal Ramos***
A CONCEPÇÃO DE FAMÍLIA
A nova forma de organização social tira da família a esfera da produção
e transfere seus antigos papéis para o espaço público, tornando-a reduto
de vidas privadas individuais. Entendemos que a cisão público/privado
operada no decorrer deste processo, dispõe a vida privada intimamente
ligada à família e a vida pública circunscrita ao mundo do trabalho. Nesta
conjuntura, observamos, na atualidade, uma linha tênue que divide a esfera
pública e a esfera privada. É nesse movimento que a relação entre Estado e
família adquire centralidade nas sociedades contemporâneas.
A interferência do Estado na família pode ser entendida como uma
invasão e controle estatal, mas também como possibilitadora de uma
progressiva emancipação dos indivíduos, colocando em choque dois
direitos: à privacidade e à proteção. Essa interferência é percebida através
da legislação, das políticas demográficas e da difusão de uma cultura
de especialistas nos aparatos policialescos e assistencialistas do Estado.
(MIOTO, 2004).
Dito isso, temos na Política Nacional de Assistência Social (2004)
um importante mecanismo de interferência estatal, no sentido de dar
subsídios à família para a provisão de seus membros. Esta política tem
como objetivo a proteção social básica ou especial a quem dela necessitar,
contribuindo com a inclusão e a eqüidade e ampliando o acesso a bens e
serviços socioassistenciais, numa constante preocupação em assegurar a
centralidade familiar no âmbito das ações desta política.
Contudo, o que presenciamos é uma redução à rotulação das famílias em
capazes e incapazes, pelos programas de apoio sociofamiliar, predominando
* Assistente Social do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES/DISOP);
especialista na área de Políticas Sociais e Serviço Social pela UnB.
** Estagiária de Serviço Social do Instituto Nacional de Educação de Surdos
(INES/DISOP); graduanda pela UFRJ.
*** Estagiária de Serviço Social do Instituto Nacional de Educação de Surdos
(INES/DISOP); graduanda pela UERJ.
177
Anais do Congresso
concepções estereotipadas da família e dos papéis familiares. O fenômeno
de reconhecimento das transformações na família, em relação à estrutura
e organização que preserva a expectativa quanto a suas funções, gera uma
tendência a soluções residuais dos problemas da família, trabalhando em
situações-limite e não no cotidiano. Ou seja, instaurou-se uma cultura
assistencialista a fim de dar sustentabilidade à família, através de políticas
que pontuam que a satisfação das necessidades dos cidadãos devem
ser providas pelo mercado e pela família, e que o Estado só intervém
temporariamente na falha destes.
Ainda numa preocupação com a interface entre Estado e família,
realizaremos a seguir um balanço da definição legal de família, bem como
da ampla gama de leis que asseguram a sua inserção no contexto escolar.
FAMÍLIA NA EDUCAÇÃO: ASPECTOS LEGAIS
Um primeiro passo para analisarmos a inserção da família na educação
é entender de que família estamos falando, ou seja, perceber a definição
legal de família. Segundo a Política Nacional de Assistência Social:
[...] as novas feições da família estão intrínseca e dialeticamente condicionadas
às transformações societárias contemporâneas, ou seja, às transformações
econômicas e sociais, de hábitos e costumes e ao avanço da ciência e da
tecnologia. O novo cenário tem remetido à discussão do que seja a família,
uma vez que as três dimensões clássicas de sua definição (sexualidade,
procriação e convivência) já não têm o mesmo grau de imbricamento que se
acreditava outrora. Nesta perspectiva, podemos dizer que estamos diante de
uma família quando encontramos um conjunto de pessoas que se acham unidas
por laços consangüíneos, afetivos e, ou, de solidariedade. Como resultado das
modificações acima mencionadas, superou-se a referência de tempo e de lugar
para a compreensão do conceito de família. (PNAS, 2004, p.25).
A concepção citada revela um avanço na forma de percepção da
família; contudo, como já foi exposto no item anterior, essa política se
revela extremamente contraditória no sentido de que tem como diretriz
a matricialidade sociofamiliar, mas só atua em famílias em situação de
vulnerabilidade social. Uma das condições para encaminhamento aos
programas sociais é matrícula e freqüência escolar. E de que maneira a
escola pode influir na situação de vulnerabilidade social?
No que tange à interface entre Estado e família na provisão da
educação, temos como importante marco na redemocratização do país a
promulgação da Constituição Federal de 1988, fruto de lutas da sociedade
178
civil organizada. A chamada Constituição Cidadã traz a noção ampliada
de educação realizando uma interface entre Estado e família na provisão
da mesma, representando um avanço no que concerne à Constituição de
1967, que apregoava apenas como função estatal a provisão da educação
quando provada a insuficiência de meios da família e da sociedade para tal.
(Quadro comparativo das leis que asseguram a interseção Estado/família/
educação, Anexo I).
Como reflexo das lutas sociais na área de educação dos anos 80, temos
ainda a promulgação da nova LDB (1996), que, no entanto, reflete também
a política neoliberal brasileira. Em comparação com a LDB anterior (Lei
nº 4.024/61), avança na ampliação do conceito de educação, incluindo os
processos formativos que ocorrem nas várias instâncias sociais – como no
trabalho e na educação –, além de incorporar os fundamentos do artigo 2061 da Constituição Federal de 1988. Contudo, a questão orçamentária denota
a preocupação no barateamento da implantação da política educacional, e a
flexibilização do financiamento da educação abre brecha para investimentos
privados que colocam essa política setorial refém de empresas privadas,
demarcando os retrocessos da referida lei.
A participação da família no ambiente escolar, assim como na provisão
da educação em parceria com o Estado, já proposta na Constituição Federal
de 1988, é reforçada tanto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),
quanto na LDB, respeitando-se, é claro, os avanços e retrocessos da
preconização dessa participação.
Comparada com a Constituição de 88, a LDB mantém a interface
entre Estado e família, porém reverte a prioridade do dever de provisão
da educação, que passa a ser, em primeiro lugar, da família em detrimento
do Estado. Tal mudança reproduz uma visão política sobre a questão dos
direitos de transferência de responsabilidade, bem como de culpabilização
da família, já citada anteriormente.
Destarte, e tendo em vista a realidade do Estado mínimo que ocasiona
a transferência ao seio da família de questões de ordem pública para a
privada, faz-se necessária uma articulação dos usuários com os movimentos
sociais, visando formas de participação social e política, de modo a exercer
o controle social. É nesta medida que destacaremos a seguir a importância
da participação da família na gestão educacional.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei.
1
179
Anais do Congresso
Família e escola na construção
político-pedagógico
do
projeto
A transformação fundamental na divisão dos papéis entre Estado e
família se relaciona intimamente com a liberalização da educação familiar.
Antes da década de 50, os filhos não tinham direito a uma vida privada;
eram os pais que tomavam as decisões que repercutiam diretamente na vida
das crianças. Com a liberalização da educação familiar, a família transfere
para a escola o aprendizado da vida em sociedade. A família se revela
incapaz no cumprimento desse papel, já que a educação é voltada para a
vida pública (educação para o trabalho) e o espaço familiar é estritamente
privado.
Essa mudança ilustra o processo de reorganização estrutural ocorrida
no campo educacional, principalmente a partir dos anos 20 e 30, com a
necessidade de se formar um trabalhador em sintonia com o processo
de industrialização ocorrido à época e reforçado com o surgimento de
estabelecimentos voltados para a formação e capacitação de mão-de-obra
especializada nos anos 40; processo que vai culminar com as escolas
técnicas das décadas de 60 e 70, fruto da complexificação e crescimento
industrial. Assim, podemos afirmar que há uma forte vinculação entre
educação e trabalho presente no nosso país2 , manifesta nas transformações
na organização educacional, em consonância com as mudanças no processo
produtivo.
Na atualidade, observamos o financiamento da educação pública pelo
Banco Mundial, firmado a partir do estabelecimento de metas que elevam o
nível de escolarização da população e reduzem a evasão escolar a qualquer
custo, transformando o direito à educação numa categoria de atenção às
necessidades do mercado. Tais mudanças são ilustrativas do Estado mínimo
neoliberal.
Contudo, no rol de mudanças ligadas ao modelo neoliberal, estão não só
a redefinição do papel do Estado, como também uma revalorização do poder
local. Disto resultam transformações de responsabilidades e competências
pelas instâncias locais advindas da descentralização estatal, que acarretam
profundas mudanças no que se refere ao sistema de decisões municipais,
Esta vinculação está expressa também, e principalmente, na Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (1996), que regulamenta, em seu artigo 1.º, parágrafo 2.º: “a
educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social”.
2
180
bem como à pratica dos atores políticos. A descentralização transfere para
o âmbito local as competências e recursos públicos capazes de fortalecer
a participação e o controle social. (SANTOS JR., 2001). Deste modo, o
processo de descentralização pode ser entendido como um “instrumento da
lógica democrática”.
Neste ínterim é de fundamental importância destacar o papel dos
Conselhos de direito enquanto mecanismos de controle social e que têm
como meta a gestão democrática das políticas sociais. Os Conselhos
Municipais são compostos por representantes do poder público e da
sociedade civil organizada (ONGs), organizações comunitárias, sindicatos,
associações, etc. – tendo caráter deliberativo e/ou consultivo e criando
condições para fiscalização da gestão pública.
Na área da educação, a lei preconiza três tipos de conselho de gestão no
nível do poder municipal, com caráter consultivo/deliberativo, ligados ao
Poder Executivo, a saber: o Conselho Municipal de Educação, o Conselho
de Alimentação Escolar e o Conselho de Acompanhamento e Controle Social
do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de
Valorização do Magistério, Fundef. (GOHN, 2002, p.104).
Vale ressaltar que, acompanhando o processo de redemocratização,
que tem como ponto fulcral a promulgação da constituinte, e respeitando o
aparato jurídico-legal desde então, há um movimento no interior das escolas
voltado para a participação social: os Conselhos Escolares, compostos pelo
poder público, por profissionais da educação e pelos responsáveis. O papel
desses Conselhos concentra-se na luta pela efetivação do direito à educação,
ou seja, pela garantia do acesso à escola, pela melhoria da qualidade do
projeto político-pedagógico e pela garantia do financiamento da educação,
fortalecendo-se como instância de controle social e auxiliando a escola no
cumprimento da sua função social, uma vez que:
O financiamento da educação é um tema urgente nas discussões sobre os rumos
que se pretende dar à educação em nosso País, uma vez que, sem os recursos
adequados, torna-se praticamente impossível atender ao princípio constitucional
que assegura uma escola de qualidade para todos os brasileiros. (Relatório do
Grupo de Trabalho sobre Financiamento da Educação, 2001: 117)
Com ação semelhante à dos Conselhos Escolares, podemos incluir as
associações de pais (APAs), que, enquanto instituições autônomas, revelam
a família como ator político na luta pela garantia do direito à educação.
Além de atuarem no planejamento, implementação e avaliação das ações
da escola, as APAs buscam a participação na elaboração e implementação
do projeto político-pedagógico (PPP), entendendo que é através dele que
181
Anais do Congresso
as ações da escola se materializam3 . Portanto, participar da elaboração do
PPP é discutir e delimitar o tipo de educação para torná-la democrática.
Neste panorama, podemos concluir que, para alcançarmos uma efetiva
gestão democrática na educação, faz-se necessária a implementação
e fortalecimento dos Conselhos Escolares e/ou APAs, no sentido de
constituírem-se enquanto órgãos de pressão frente ao Estado para que este
objetive a organização das ações da escola.
Considerações Finais.
Uma leitura dos movimentos sociais no campo educacional no Brasil
nos remete à questão da cidadania. Historicamente, a noção de direitos
nos marcos do liberalismo está intimamente ligada à questão da cidadania,
e o exercício desta, restrito ao proprietário. A mudança dessa concepção
transforma a questão da cidadania em uma questão educativa e, com
a consolidação do modo de produção capitalista, a educação volta a ser
pensada enquanto mecanismo de controle social. (GONH, 1992).
A idéia de cidadania tem como cerne a educação em sentido ampliado,
tendo em vista que é construída no processo de luta, ou seja, num movimento
educativo, isto porque sua construção se dá através da experiência vivida.
Por tudo isso, afirmamos que o objetivo da política social não deve ser
o de pressionar a família para assumir responsabilidades do Estado, mas
oferecer alternativas de participação cidadã.
Dito isso, afirmamos que o Estado deve voltar sua inserção na realidade
para o acesso à informação e discussão das políticas sociais de maneira
geral, numa articulação com os movimentos sociais, com vistas a promover
a participação social e política dos usuários no controle social.
Entendemos, portanto, que a escola, no atual contexto de violência,
miserabilidade e naturalização da pobreza, deveria ter como um de seus
eixos principais a formação de cidadãos, a defesa intransigente da melhoria
da qualidade do ensino público, propiciando às classes trabalhadoras
condições mínimas de participação enquanto sujeito político consciente, ou
seja, a escola deve dar respostas à questão social com caráter preventivo,
e não punitivo.
É no projeto político-pedagógico que são estabelecidos os conteúdos, metodologias e avaliações a serem desenvolvidos na escola, tendo como eixo a formação
humana e a construção da cidadania.
3
182
Outra questão importante é que exista uma articulação entre a escola e
a família no sentido de serem dadas orientações das duas partes em uma
mesma direção, de forma que não sejam passadas informações contraditórias,
pois os valores dos profissionais de educação podem ser diferenciados das
famílias que são atendidas pelas escolas. Neste sentido é importante que
os profissionais da educação tenham acesso ao conhecimento da realidade
socioeconômica dos alunos (conforme preconizado na LDB) para adaptação
dos currículos escolares à realidade concreta dos alunos.
Por tudo posto, acreditamos na formação cidadã pautada nos valores
de solidariedade, igualdade e participação, via interlocução escola/família
enquanto parceiros na construção de uma nova sociedade.
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Anexo I. Quadro comparativo das leis que asseguram a interseção
Estado/família/educação.
184
LDB (1961)
Art. 2º A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola.
Parágrafo único. À família cabe escolher o gênero de educação que
deve dar a seus filhos.
Art. 3º O direito à educação é assegurado:
II - pela obrigação do Estado de fornecer recursos indispensáveis para
que a família e, na falta desta, os demais membros da sociedade se
desobriguem dos encargos da educação, quando provada a
insuficiência de meios, de modo que sejam asseguradas
iguais oportunidades a todos.
Constituição Federal (1967)
Art 167. A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos Poderes Públicos.
Art 168 - A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola;
assegurada a igualdade de oportunidade, deve inspirar-se no princípio
da unidade nacional e nos ideais de liberdade e de solidariedade humana.
Constituição Federal (1988)
Art.205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família,
será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando
ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei.
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção
do Estado.
185
Anais do Congresso
ECA (1990)
Art.53. A criança e o adolescente tem direito à educação, visando ao
pleno desenvolvimento da sua pessoa, preparo par a o exercício da
cidadania e qualificação para o trabalho assegurando-lhes:
Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do
processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas
educacionais.
Art.54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente:
§ 3º Compete ao poder público recensear os educandos no ensino
fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsável, pela freqüência à escola.
LDB (1996)
Art.12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns
e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:
VI - articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos
de integração da sociedade com a escola;
VII - informar os pais e responsáveis sobre a freqüência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta
pedagógica.
Art.14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas
peculiaridades e conforme os seguintes princípios:
II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.
186
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
A FAMÍLIA EM DISCUSSÃO
Fátima Gonçalves Cavalcante*
Cada ser humano que nasce pulsa, como as batidas do próprio coração,
em busca de se expressar, de conhecer a si e o mundo que o cerca, de
aprender a ver, escutar, falar, andar, tocar, explorar as facetas de um universo
repleto de formas, cores, sons, odores, sensações que se organizam em
experiências. A pessoa, para ir ao encontro do seu pleno desenvolvimento,
depende de cuidados que se iniciam na família e se complementam na vida
social, do percurso escolar à profissionalização, da inserção profissional à
formação de sua própria família.
A presença de alguma incapacidade (visual, auditiva, física, mental ou
múltipla) poderá interferir mais ou menos na evolução global da criança, a
depender do modo como a família irá identificar e reconhecer os limites e
as potencialidades de seu filho, do impacto afetivo e social da deficiência
na família e de como a família conseguirá ir ao encontro de diferentes
formas de ajuda na sociedade, na comunidade, na saúde, na educação,
entre amigos e parentes, etc. Se a família se fechar, se isolar e não inserir o
filho em apoios continuados, de diversos tipos, a deficiência será um fardo
para todos, o desenvolvimento psíquico e social do filho ficará prejudicado.
Se a família se abrir para compreender a incapacidade e tentar reduzir as
desvantagens, através de formas de ajuda que atendem a necessidades
específicas, então a deficiência poderá tornar-se um ‘trampolim’ para
muitas aprendizagens e diferentes formas de superação para todos.
O livro de Oliver Sacks (2002), Vendo Vozes, me ajudou a representar
aqui, de modo abreviado, o mundo dos surdos. Ter um filho cego, surdo,
autista ou prodígio requer flexibilidade e engenhosidade dos pais. Muitos
pais e familiares de crianças surdas sentem-se impotentes diante de
tamanha barreira de comunicação, e a possibilidade de essa barreira ser
derrubada é algo que irá depender da adaptabilidade dos pais, do grupo
familiar e da criança surda. Para que o surdo desenvolva competência
lingüística e intelectual e se organize afetiva e socialmente, é fundamental
* Psicóloga. Doutora em Saúde Pública. Professora do Mestrado em Psicanálise,
Saúde e Sociedade da UVA-RJ e Pesquisadora-colaboradora da área ‘Deficiência,
Violência & Saúde’ do Claves/ENSP/Fiocruz.
187
Anais do Congresso
a aquisição de uma língua em idade “normal”, principalmente no início da
vida, ou até a puberdade, seja ela em língua de sinais ou falada. A ausência
de uma língua produz profundo isolamento, falta de noção de causalidade
(não saber formular perguntas ou respostas), falta de senso histórico, de
dimensão autobiográfica; a inteligência fica limitada ao visual, sem idéias
abstratas (refletir, planejar, brincar), sem lidar com a esfera imaginativa
e figurativa, ou com hipóteses e possibilidades. Nesse caso, a mente não
é utilizada por completo e a pessoa fica confinada a um mundo imediato
e pequeno. Muitas crianças com surdez pré-lingüística, após educação
intensiva, adquirem língua e comunicação adequadas.
Ter pais ouvintes ou surdos é algo bem diferente. Quando a língua de
sinais é nativa, entre pais e filho surdos, o isolamento é menor, havendo
menos risco de o filho ficar privado da língua. Quando a criança surda
convive numa família de ouvintes em que prevalecem distorções da vida
comunicativa desde o início, com a predominância de uma linguagem
rudimentar, haverá conseqüências no crescimento intelectual, vida
emocional, social e desenvolvimento da linguagem de um modo simultâneo
e inseparável. A língua é uma capacidade inata que só pode ser desenvolvida
a dois, só pode ser ativada por outra pessoa. A primeira comunicação é
adquirida na relação mãe-filho. A qualidade das experiências nos primeiros
momentos irá influir decisivamente no futuro da criança. É fundamental
que haja certo tipo de conversa, um diálogo rico em intenção comunicativa,
que desperte a curiosidade da criança e a busca de significados: “Por quê?”,
“Como?”, “E se?”, como diz Sacks (2002). É fundamental despertar na
criança surda o senso de questionamento e o espírito investigador.
Schlesinger (1988) faz uma descrição interessante de como a
“qualidade da conversa” entre mãe e filho surdo, nas fases iniciais da vida,
pode prejudicar ou beneficiar o desenvolvimento da criança: (1) algumas
compartilham um diálogo fundamental, outras basicamente falam para o
filho; (2) algumas apóiam ou não as ações do filho e informam as razões,
outras controlam as ações dos filhos sem explicar o porquê; (3) algumas
fazem perguntas genuínas, outras perguntas restritivas; (4) algumas
são impelidas pelo que a criança diz ou faz, outras por suas próprias
necessidades e interesses; (5) algumas descrevem um mundo amplo,
marcado por eventos passados e perspectivas de futuro, outras comentam
apenas sobre o aqui e agora; (6) algumas são mediadoras entre a criança e
o ambiente, dotando os estímulos de significados, outras não. Não apenas a
língua deve ser introduzida, mas também o pensamento e, por essa razão, a
reciprocidade comunicativa que busca ser esclarecedora, ou um monólogo
indiferente que deixa tudo sem explicação, são atitudes comunicativas que
188
fazem a diferença, favorecendo ou não o desenvolvimento da capacidade
comunicativa da criança e o seu desenvolvimento global. O diálogo
inadequado não apenas inibe o intelecto, mas também produz timidez e
passividade. O diálogo comunicativo desperta a imaginação e a mente,
leva à auto-suficiência. Esse diálogo que ocorre primeiro com os pais
depois é internalizado em forma de pensamento, numa fala interna, quase
sem palavras, para dar luz ao pensamento, como diz Vygotsky (1984). Ao
“falar consigo mesma”, a criança desenvolve os seus próprios conceitos e
significados.
A língua permite novas orientações, aprendizados e ações; transforma a
experiência, permite lidar com coisas à distância, juntar eventos separados
no tempo ou separar coisas que não sejam isoladas, permitindo explorar
o universo de múltiplas maneiras. O aprendizado da língua produz uma
explosão da linguagem e da mente, como se abrisse as portas de uma
mente aprisionada. Um mundo de coisas percebidas como isoladas e
ancoradas no aqui-e-agora passa a ser um mundo de coisas conectadas, um
mundo relacionado, inteligível e inteligente. Para Sacks (2002), a língua
de sinais, uma linguagem visual-espacial, favorece o desenvolvimento de
aquisições compensatórias no córtex cerebral, revelando a adaptabilidade
e plasticidade do cérebro, que se torna diferente. O surdo ou o filho de
surdos que adquire a língua de sinais, desde tenra idade, desenvolve uma
maior habilidade visual, uma capacidade de “encenação” do mundo, uma
sensibilidade e inteligência visuais que o tornam “perito” visual. Quando
ele se pronuncia, as criaturas e objetos estão situados, numa capacidade
descritiva arquitetônica, havendo um detalhamento que jamais apareceria
na linguagem oral. Se, de um lado, a surdez subtrai certas funções, de outro
permite recriar formas originais de língua.
No livro Pessoas Muito Especiais (Cavalcante, 2003), embora eu
não tenha abordado a surdez quando analiso as deficiências (múltipla,
mental, psicose infantil e autismo) na complexidade da vida, sob um
olhar psicossociocultural, sinalizo questões relevantes sobre o impacto da
deficiência na família. Demonstro como a família terá que, de um lado,
construir um novo estoque de conhecimentos, para aprender a decifrar seu
filho e encontrar meios apropriados de ajudá-lo, contando com o apoio de
amigos, parentes, profissionais de saúde, educação, reabilitação, assistência
social e dos recursos providos pelas políticas públicas; de outro, a família
terá que olhar para os recursos internos do grupo familiar (afetivos, sociais,
culturais, intergeracionais) de modo a elaborar psíquica e socialmente a
deficiência que afetou um de seus membros.
189
Anais do Congresso
O sentido que o filho com deficiência irá adquirir para a família, desde
os primeiros momentos, será crucial para determinar o futuro da criança
e as atitudes que a família irá tomar dali para frente. Esse “sentido”, que
na fase inicial poderá estar associado a dor, desespero, pânico, descrença,
raiva, depressão, tristeza, produzidos pela descoberta da deficiência no filho,
tenderá a ser ressignificado, de acordo com valores, crenças e o sentido
atribuído à vida, na medida em que a família vai conseguindo se mobilizar
em busca de apoios para o filho e para ajudar o grupo familiar a se adaptar aos
desafios que virão. Um dos fatores que dificulta a elaboração do sofrimento
familiar é a negação da deficiência, associada à fantasia do filho sonhado.
Enquanto a família não puder se confrontar com a real condição de seu filho,
sua diferença, e não puder fazer o luto do filho idealizado, ela terá poucas
chances de ajudá-lo. Nessa circunstância, a família poderá estar paralisada,
ou canalizando suas ações na busca de uma cura milagrosa, atitude que
tenderá a prepará-la para um contato mais amplo com a realidade do filho.
O contato interno com emoções conflituosas e um balanço profundo da
situação podem gerar aceitação e apreciação, quando a família irá descobrir
forças insuspeitadas para enfrentar a situação, encontrando um novo tipo
de postura e atitude.
Ajudar um filho com deficiência é recorrer a múltiplas fontes de apoio,
na vida íntima, no interior da família, nos apoios técnicos especializados
e na vida social. A história de Dionísio (Cavalcante, 2003), que retrata
sua infância e adolescência com múltipla deficiência (epilepsia grave,
deficiência mental e visual, traços autísticos), revela como sua mãe foi
abalada em sua vida cotidiana, na organização do tempo e espaço, nos
cuidados dispensados ao marido e demais filhos, sem perder o foco no
problema de Dionísio. Nos momentos difíceis, conseguia tomar pequenas
decisões importantes, o que acalmava o marido, embora o peso e a
complexidade do problema do filho fossem esmagadores. Os apoios da saúde
o fragmentavam conforme as diferentes especialidades, e a “voracidade”
das práticas terapêuticas se impunham como algo necessário, de um modo
extremamente desarticulado. Como construir um ser de um monte de
defeitos?, frase que norteou um novo trabalho institucional integrado. Foi
preciso “esquecer” a fatalidade de um quadro gravíssimo e organizar a
desordem terapêutica que paradoxalmente traumatizava. Era preciso olhar a
pessoa que estava ali, por trás daquela deficiência. Um apoio minucioso foi
minimizando passo-a-passo suas deficiências: ele foi retirado do isolamento
autista, trabalhado no elo simbiótico e diferenciado, aprendeu a usar a voz,
as mãos, a descobrir o corpo, o espaço, despir-se, vestir-se, a socializar-se.
Se hoje ele poderia estar em estado vegetativo, seus progressos driblaram
a “fatalidade”. Apesar da gravidade de suas crises convulsivas, chamam
190
atenção os ganhos. Melhor organizados, mãe e filho puderam se diferenciar,
cada um com suas respectivas rotinas. Ela pode deixar de ser a “supermãe”,
reassumir os cuidados da casa, do marido, dos outros filhos, dividindo a
atenção do Dionísio com o pai, a avó materna, ou a instituição. Os irmãos
também participaram das brincadeiras e jogos com Dionísio, que gosta de
beijar a todos, especialmente a mãe, num beijo “babado”, às vezes batizado
de beijo maluco. Essa é uma família que foi capaz de amar e incluir na
vida um filho “cheio de defeitos”, tendo como bússola dois lemas: “ele tem
direito a ter a sua história” e “seus tratamentos precisam lhe dar prazer”.
O Mito das Beijocácias é uma história de superação marcada por um afeto
organizador e pela parceria família-instituição.
As famílias e deficiências são mais complexas do que nossos tratados
psicopatológicos. Elas devem ser vistas na pulsação da vida. Se as famílias
forem apoiadas na extensão e profundidade de que necessitam, e tratadas
como parceiras, e não apenas como “usuárias”, elas poderão assumir um
lugar proeminente de apoio aos próprios filhos. As experiências familiares
devem ser entendidas na complexa trama da vida afetiva, social e cultural.
Sem esses nexos causais fundamentais, e apenas pelos cânones patológicos,
não se pode colocar verdadeiramente a família em discussão.
Bibliografia
CAVALCANTE, F.G., Pessoas Muito Especiais: a construção social do
portador de deficiência e a reinvenção da família. Rio de Janeiro: Editora
Fiocruz, 2003
SACKS, O. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos, 2002
SCHLESINGER, H. Questions and answers in the development of deaf
children. In: Strong, Michael (ed.) Language learning and deafness.
Cambridge, Nova York: Cambridge Univesity Press, 1988
VYGOTSKY, L.S.A. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins
Fontes, 1984
191
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
MULTI-TRILHAS: UM JOGO PARA AUXILIAR
CRIANÇAS SURDAS NO PROCESSO DE
AQUISIÇÃO DE SEGUNDA LÍNGUA
Rita Maria de Souza Couto*
O Multi-Trilhas é um material educativo idealizado principalmente,
mas não exclusivamente, para auxiliar crianças surdas no processo inicial
de aquisição de segunda língua. Com ele, o professor pode trabalhar verbos,
substantivos, adjetivos e pronomes em duas línguas: Língua Brasileira de
Sinais (Libras) e português escrito, apresentadas em contextos temáticos
variados.
Projetado em duas versões – multimídia e concreta para mesa ou
piso – o jogo Multi-Trilhas apresenta três cenários da cidade do Rio de
Janeiro: Jardim Zoológico, Pão de Açúcar e Quartel Central do Corpo de
Bombeiros. Nesses cenários são trabalhados percursos, ações, repetições,
deslocamentos, além de raciocínio, interação e tomada de decisão, entre
outros aspectos.
O Multi-Trilhas pode ser jogado em grupo ou individualmente. Contudo,
em função das tarefas propostas pelo jogo, é imprescindível a presença de
um mediador com fluência na Língua Brasileira de Sinais, seja na figura do
professor, do fonoaudiólogo ou de qualquer outra pessoa envolvida com o
indivíduo surdo.
Desenvolvido por um grupo de pesquisa do Laboratório de Pedagogia
do Design, LPD, a partir de uma parceria entre o Departamento de Artes &
Design da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio)
e o Instituto Nacional de Educação de Surdos do Rio de Janeiro, INES-RJ,
com apoio da FAPERJ e do CNPq, o Multi-Trilhas é resultado de uma
investigação inserida no âmbito da linha de pesquisa intitulada Design de
Situações Educativas, que tem como princípio básico a reflexão crítica
sobre objetos, sistemas e linguagens utilizados em ambientes concretos
ou mediados pela tecnologia, nos quais, de alguma forma, objetive-se
construção de conhecimentos. Esta é uma área ampla, que se preocupa não
só com o desenvolvimento de um objeto ou de um sistema de objetos, mas
também com o seu entendimento, utilização e eficácia.
* Professora
192
Doutora da PUC-Rio.
O indivíduo surdo tem uma linguagem espaço-visual que se expressa
por meio da língua de sinais, e sua capacidade de comunicação precisa
ser desenvolvida desde a mais tenra idade, para que ele possa crescer
como cidadão. A alfabetização bilíngüe, neste particular, é uma aliada,
pois propicia ao surdo usufruir não apenas de sinais, por meio da Língua
Brasileira de Sinais, sua primeira língua, como também do português
escrito e, com isso, ter acesso ao universo da leitura (Quadros, 1997; Sacks,
1998).
O contato com colegas surdos da mesma faixa etária e com surdos
adultos é importante para que a criança possa obter fluência em Libras e
perceber a surdez como diferença em vez de deficiência. Neste particular,
o material educativo projetado oferece um rico potencial para auxiliar
crianças surdas no processo inicial de aquisição do português escrito como
segunda língua, uma vez que trabalha ambas as formas de comunicação de
maneira lúdica e interativa, sem privilegiar, contudo, a língua dos ouvintes
(Skliar, 1997).
A linguagem digital permite múltiplas formas de comunicação
concernentes à oralidade, à escrita, à imagem, ao som, ao colorido, às ações,
aos sentimentos e valores. Em função disso, optou-se por desenvolver um
jogo multimídia segundo uma visão multissensorial.
Após uma série de encontros com professores e fonoaudiólogos do
INES, nos quais foram discutidos os objetivos do ambiente de aprendizagem
virtual, o perfil do usuário desse ambiente, o conteúdo a ser trabalhado, os
recursos disponíveis em termos de equipamentos, entre outras questões,
a equipe de pesquisa deu início à seleção e organização do conteúdo do
jogo Multi-trilhas multimídia. Fez parte do seu planejamento, além da
definição do conteúdo a ser disponibilizado e sua forma de organização,
a determinação de quanto tempo seria preciso para completar cada uma
das tarefas propostas, tendo em vista a dificuldade de manter a atenção
do indivíduo surdo. Nessa etapa, foram levadas em consideração questões
relacionadas com a usabilidade do sistema, com sua aplicabilidade e
acessabilidade.
No tocante ao “design” do conteúdo do ambiente virtual, sua organização
detalhada e montagem, foram observados aspectos relacionados com a
linguagem visual, a percepção visual, as relações figura e fundo, variações
de “browsers”, “frames”, mapa de navegação, “lay-outs” de telas, menus,
cabeçalhos e rodapés, ícones, tipografia, “lay-out” de tabelas, sistemas de
cores e recursos multimídia, entre outros.
193
Anais do Congresso
Um fluxograma com o esboço visual das informações foi desenvolvido,
em que cada nível ou “link” representava uma tela ou um controle a ser
criado. Uma programação visual específica foi criada para o “software”,
incluindo identidade e linguagem visual. Ficou definido que a entrada no
ambiente virtual se daria por meio de uma página inicial, que levaria o
usuário para páginas secundárias. A partir dessa definição, os controles da
interface (ou como o usuário irá interagir com a tela do computador) foram
projetados.
Para a execução do “software” do jogo Multi-Trilhas foi contratado
um “designer” e programador, que trabalhou por cerca de oito meses
em conjunto com a equipe de projeto e esta, em conjunto com o INES.
Foram realizados vários protótipos até que se chegasse à versão 1.0 do
jogo, composta por cenários que devem ser explorados com o “mouse”,
permitindo a execução de diferentes tarefas.
Com o intuito de manter uma identidade do jogo multimídia com o
jogo concreto, os cenários deste último foram redesenhados para ficarem
compatíveis com a mídia digital. As telas apresentam, então, três cenas do
Jardim Zoológico, três do Pão de Açúcar e três do Quartel Central do Corpo
de Bombeiros.
Foi identificada a pertinência de utilizar elementos animados, pois
animação é um recurso multimídia que ajuda a motivar o usuário a
explorar as potencialidades do jogo. Os personagens animados escolhidos
representam turistas, que estão visitando os diversos cenários do jogo: um
menino, uma menina, uma mulher adulta, um homem adulto e um ancião.
O estilo de interação utilizado foi a manipulação direta, composta de
ações baseadas numa analogia entre o cursor e a mão, as representações
gráficas e os objetos do domínio. Este estilo de interface de manipulação
direta foi escolhido por permitir ao usuário agir diretamente sobre os
objetos da tela com o “mouse” (dados ou representações de objetos do
domínio) sem a necessidade de outros comandos.
As imagens para uso nos cenários foram otimizadas para que o
tamanho do arquivo gerado fosse pequeno, melhorando, assim, o tempo
de carregamento das telas. O número de cores, as palhetas, a resolução e o
tamanho foram considerados para a mídia utilizada.
No jogo Multi-Trilhas multimídia o acesso às tarefas se dá a partir
de zonas clicáveis presentes nas ilustrações, que por sua vez conduzem
194
necessariamente a palavras em Libras e português escrito. As palavras
em Libras são apresentadas por meio de vídeo (imagens do Dicionário de
Libras disponível no sítio do INES) e as palavras em português apresentamse escritas na tela. O jogo foi gravado em um CD auto-executável. As
ilustrações clicáveis de cada cenário que apresentam os vídeos em Libras
e as palavras em português escrito foram trabalhadas a partir de palavraschave.
Elementos do jogo e modo de jogar
1. Tela de abertura composta inicialmente por um mapa da cidade do
Rio de Janeiro e a seguir telas com logotipos da PUC-Rio, INES, FAPERJ,
CNPq e LPD.
2. Tela HOME com imagens dos personagens e de uma prancheta para
escrever o nome do jogador. Vídeo em Libras. Estão disponíveis ícones
para tela de atividade de desenho, dicionário em Libras, pontuação no jogo,
apresentação do jogo, saída do jogo, opção pela cor de fundo da tela.
3. A partir da escolha de uma personagem, o jogador vai para uma tela
onde estão disponíveis os nove cenários, cada um dos quais chama três
atividades:
a) tornar visíveis imagens fantasmas presentes no cenário, que levam
a telas onde o jogador posiciona a imagem por cima do nome que a
representa. Em caso de acerto, aparece uma animação da personagem
comemorando e automaticamente entra uma tela de pontuação;
b) tornar visíveis imagens fantasmas presentes no cenário, que levam a
telas onde o jogador entra em uma atividade de liga-pontos numerados.
Em caso de acerto, aparece uma animação do personagem comemorando
e automaticamente entra uma tela de pontuação;
c) tornar visíveis imagens fantasmas presentes no cenário, que levam
a telas onde o jogador entra em uma atividade de quebra-cabeça. Em
caso de acerto, aparece uma animação do personagem comemorando e
automaticamente entra uma tela de pontuação.
Em todas as situações aparecem as palavras que estão sendo trabalhadas
em Libras (dicionário) e em português escrito.
4. Além dos vários elementos sensíveis na tela, onde o jogador ao
“clicar” estará aprendendo português e Libras, o jogo disponibiliza uma
atividade livre. Nela, é possível desenhar, pintar e compor cenários com
195
Anais do Congresso
elementos e personagens presentes nos nove cenários do jogo. Tudo isso é
feito com o auxílio do “mouse”.
5. Telas de pontuação – são telas que computam os acertos do jogador
em todas as atividades, exceto na tarefa livre.
O Multi-Trilhas em experimentação
No primeiro semestre deste ano (2007), a versão 1.0 do jogo MultiTrilhas multimídia, em fase final de teste, foi instalada no sistema de intranet
do INES e testada com a turma de 1ª série B do Ensino Fundamental,
composta por vinte crianças. Esses alunos foram para o laboratório de
informática, que está equipado com vinte máquinas, com as professoras do
INES Ana Cristina da Fonsêca Flores, Eloisa Gonzaga de Alvarenga, Maria
da Graça Guimarães, que já haviam utilizado em sala de aula o jogo na sua
versão concreta. O consultor pedagógico de Libras, Alex Curione, também
esteve presente à sessão.
Na tela inicial do jogo, onde o nome do jogador é escrito e é, também,
escolhido um personagem, a maioria das crianças realizou a tarefa
proposta sem nenhum problema, mas algumas delas tiveram um pouco de
dificuldade. Foi visto que o local dos vídeos em Libras que explica a tarefa
a ser realizada não estava adequado e foram feitas as mudanças necessárias
posteriormente.
De uma maneira geral, as crianças ficaram concentradas e interessadas
no jogo. Impossível seria descrever aqui todas as estratégias utilizadas,
dificuldades e reações aos elementos do jogo. Assim, optou-se por
relatar apenas algumas ocorrências com vistas a ilustrar esta sessão de
experimentação.
Uma das crianças optou pela tarefa do quebra-cabeça no cenário do
bombeiro e para iniciá-la clicou no botão “ajuda”, onde aparecem os
números referentes a cada peça do quebra-cabeça e o local onde deve ser
colocada cada uma das peças. Ela clicou nesse mesmo botão umas três
vezes e depois montou o quebra-cabeça com facilidade. Quando finalizou a
montagem e o personagem balançou os braços em sinal de alegria, a criança
também comemorou com gritos. A seguir, quando apareceu a imagem do
elemento do cenário do bombeiro escrito em português e em Libras, ela fez
o sinal da palavra em língua de sinais e repetiu a palavra em datilologia.
Pode-se perceber que, de um modo geral, as crianças gostaram muito de
196
montar o quebra-cabeça e, quando estavam em grupo, uma colaborava com
a outra.
Em relação à tarefa de associar a palavra à imagem, no início da
experimentação as crianças entravam na tela e saíam imediatamente, pois
a tela só tem palavras em português e, como elas não as associavam a
nada, saíam imediatamente. Entretanto, depois de navegar pelas tarefas
montando o quebra-cabeça, o liga-pontos e passear pelos cenários, elas
começaram a entrar naquela tela, passando a experimentar as opções
possíveis, descobrindo que para cada palavra escrita em português havia
uma chamada para um vídeo em Libras. Com o auxílio do consultor, uma
das crianças passou primeiro a tentar reconhecer a palavra em português
para depois associá-la à imagem correspondente. Na quarta tarefa, depois de
ler todas as palavras, ela arrastou a imagem para a palavra correspondente
e vibrou quando acertou.
Na atividade de liga-pontos as crianças tiveram bastante desenvoltura.
Como aconteceu anteriormente, quando completaram a tarefa e apareceu a
palavra escrita em português e o vídeo em Libras, elas repetiram a palavra
em Libras e em datilologia.
Na tarefa livre de desenho, as crianças foram explorando e experimentando
as ferramentas e descobrindo suas funções, criando cenários, personagens,
apagando os desenhos, aumentando e diminuindo os elementos, colocando
para frente para trás as imagens e assim por diante. Depois, apagavam tudo
e iniciavam um outro desenho.
As professoras comentaram que o jogo está condizente com a realidade
de ensino-aprendizagem das crianças e disseram que, além dessa maneira
espontânea de explorá-lo, elas podem apresentar o jogo de modo mais
direcionado para as crianças, desenvolvendo conteúdos mais específicos,
como, por exemplo, estudar sobre animais; desenhar cenários e animais;
utilizar o dicionário disponibilizado no jogo para as crianças aprenderem
tanto os nomes dos animais em português quanto em Libras, pois o contexto
do jogo está rico e motivador.
A experimentação teve a duração de 1 hora 30 minutos, e as tarefas
que o jogo possibilita desenvolver foram exploradas satisfatoriamente. De
um modo geral, as crianças conseguiram fazer a pontuação de 01 cenário
completo, pois nessa experimentação elas navegaram de uma forma
aleatória, como é comum no meio digital.
197
Anais do Congresso
À guisa de conclusão
Ao desenvolver um material educativo, é indispensável considerar que a
aprendizagem é melhor e mais duradoura quando adquirida de forma ativa.
O objeto que foi projetado, além de oferecer possibilidades de interpretação
e permitir a participação ativa de professores e estudantes no seu uso, tem
por fio condutor múltiplos recursos de interatividade.
Segundo o entendimento do grupo de pesquisa, todo material educativo a
ser projetado deve oferecer possibilidades de interpretação que demandam o
desenvolvimento de juízos e a participação ativa dos intérpretes e não apenas
uma simples relação de uso unilateral. Esta linha de atuação tem por base as
idéias de Frascara (1988), para quem, no “design” educativo, o indivíduo é
motivado a pensar, julgar e desenvolver-se independentemente.
De acordo com esse autor, educar é mais que ensinar, e relaciona-se
com o desenvolvimento total do indivíduo como ser social, e não somente
como acumulador de conhecimentos. Ademais, a aprendizagem é melhor
e mais duradoura quando adquirida de forma ativa. Com isso, amplia-se a
abrangência do material educativo para fora dos muros da escola.
Particularmente, o trabalho aqui relatado exemplifica o modelo triangular
que deve compor as atividades desenvolvidas no âmbito da universidade:
incluiu a pesquisa, contemplado que foi com duas bolsas de órgãos de
fomento – FAPERJ e CNPq –, o que permitiu o projeto e a confecção
do material educativo e viabilizará a continuidade desta investigação;
teve reflexos no ensino, com a vinculação de bolsistas PIBIC/CNPq, de
uma mestranda que defendeu dissertação tendo por base o mesmo tema,
enfocando o Design da Informação de situações de utilidade pública, e de
uma aluna de doutorado que está propondo um aprofundamento teórico da
linha de pesquisa Design de Situações Educativas; desenvolveu trabalho
de extensão universitária, por meio da parceria com o Instituto Nacional de
Educação de Surdos, INES-RJ, na figura de fonoaudiólogos, professores,
alunos e consultores em Libras.
198
Bibliografia
Couto, R. M. de S.; Wilmer, C.; Portugal, C.; Correa, A. Do concreto ao
virtual: interação e interatividade no letramento de indivíduos surdos. Anais
do 2.° Congresso Internacional de Design da Informação (SBDI). São
Paulo, 2005.
COUTO, R.M.S.; PORTUGAL, Cristina. Design Didático aplicado ao
letramento bilíngüe de crianças surdas. In: Anais do 7.º Congresso
Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design. Curitiba, 2006.
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bilíngüe de crianças surdas. In: Anais do Congresso Internacional de
Design. Lisboa, 2006.
FRASCARA, J. Diseño gráfico y comunicación. Buenos Aires: Infinito,
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KOSLOWSKI, L. A proposta bilíngüe de educação do surdo. In: Espaço:
Informativo técnico-científico do INES. n.º10, jul-dez, p. 47-53. Rio de
Janeiro: INES, 1998.
MACEDO, Lino; PETTY, Ana Lúcia Sicoli; PASSOS, Norimar Christe.
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MARTINS, Bianca Maria Rêgo. Design de Informação em situações
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QUADROS, Ronice M. Educação de surdos: efeitos de modalidade e
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VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins
Fontes, 1984.
_____. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987.
200
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
PROJETO CINES – CINEMA DO INES
Maria Lucia Cunha1
“... o ser diferente é excluído porque vira
desafio, ameaça”
Objetivo: Encontrar uma forma pedagógica de trabalhar o cinema na escola
como fator de introdução de pessoas Surdas no mundo da literatura e das
novas tecnologias de informação e comunicação
O ensino de literatura e do cinema na escola promove o contato com novas
realidades. A presença das novas tecnologias de informação e comunicação
na escola abre janelas e novas possibilidades. Estas criam alternativas
para o ensino, propondo a quebra de paradigmas. O pensamento linear é
substituído pelo pensamento hipertextual. O hipertexto é um caminho, às
vezes mais de um, que se pode percorrer, ou não, para acessar informações.
Sabendo sempre que se pode voltar e começar tudo de novo. Mas quando
voltar já não será o mesmo....
Pensamentos fragmentados sempre me invadiram ao imaginar de
que maneira poderíamos inserir as novas tecnologias de comunicação e
informação, como elemento catalisador de um movimento necessário para
que possamos entender a educação de uma forma diferente. Com esse fim,
proponho novos caminhos, novas possibilidades, novas alternativas de
ensinar e de aprender que determinam o trabalho proposto para o ensino de
literatura para pessoas surdas.
Desde julho de 2006 venho desenvolvendo o Projeto CINES com o
qual pretendo através de uma rede de conhecimentos, promover links de
ensino entre a literatura, o cinema e a informática.
Avaliar esse trabalho é um pouco difícil, pois tudo é muito recente. Não
há ainda um distanciamento histórico que permita uma avaliação profunda
de todo o processo, além disso, minhas impressões estão carregadas de
envolvimento, o que muitas vezes não permite um julgamento imparcial
dos fatos. Apesar disso algumas observações já podem ser feitas.
Nossa história, começa com o filme Romeu no Mundo de Julieta,
uma releitura do filme de Franco Zeffirelli adaptado da obra de William
1
INES – Brasil. Prof.ª de Literatura. Prof.ª Pós-graduada em Docência no
Ensino Superior ( UFRJ ) Idealizadora do Projeto CINES .
201
Anais do Congresso
Shakespeare, feito de junho até setembro/2006. É simbólica a representação
de novidade para a comunidade surda do INES de uma história escrita no
século XVI lida, relida e adaptada inúmeras vezes em diversas línguas
e em diferentes canais de comunicação. É surpreendente e assustador o
vácuo de informações provocado pela falta de acesso aos bens culturais
simbólicos, quase todos em língua escrita. E esta é uma das razões desse
trabalho, propor o ensino de literatura através do cinema e o acesso a esse
mundo distante. Ter contato com a literatura através de outras linguagens
já é uma prática corriqueira usada pelo cinema, pelo teatro e pela televisão,
a novidade é entender e inserir as novas linguagens de comunicação no
contexto pedagógico.
A escola continua a valorizar o texto escrito em detrimento da oralidade
e do audiovisual, mesmo em uma sociedade cada vez mais envolvida
pelas novas tecnologias de comunicação e informação. Com esse projeto
proponho o audiovisual como texto. No nosso caso específico valorizar o
visual é facilitar o desenvolvimento do trabalho sem termos comparativos.
Até quando a escola deixará de aproveitar todo o encantamento que
as novas tecnologias oferecem a essa nova geração? Esse é o grande
desafio do professor do século XXI. Será que ele está preparado? Novas
formas de aprender requerem novas formas de ensinar, novas habilidades
e trocas de papéis. Alunos aprendendo sozinhos, alunos aprendendo com
alunos, professores aprendendo com alunos e alunos aprendendo com seus
professores, porém não mais como detentores absolutos de um saber que
está cada vez mais disponível para todos. Que bom! Perdemos um pouco
o poder, mas ganhamos o direito de não saber. Professor não é aquele que
sabe tudo. Ninguém sabe tudo. Professor é alguém que pesquisa e que
precisa estar preparado para ser parte fundamental nesse processo, que é o
de ajudar a transformar as informações que navegam em tantas redes, em
conhecimento. As novas tecnologias de informação e de comunicação, que
modificaram nossa maneira de entender o mundo exercem um verdadeiro
fascínio na pessoa surda. Não existe na comunicação humana nada que
se compare com a Internet, portanto usá-la pedagogicamente além de ser
fundamental para o desenvolvimento e envolvimento dessas pessoas com a
grande rede é uma aposta certa de sucesso.
Nosso segundo trabalho foi Olhar Surdo, de setembro até dezembro/2006,
baseado no filme Filhos do Silêncio. Com formato de documentário,
tratamos da incomunicabilidade humana, no caso específico, pessoas
surdas emersas em um mundo ouvinte.
Em ambos os filmes os alunos ficaram livres para expor suas dores e
sofrimentos, seus dramas, suas dificuldades de comunicação e sua exclusão
social, provocada pelo preconceito e a falta de visibilidade de sua Língua.
202
Essa temática parece ser uma prática comum em manifestações artísticas
de populações que estão à margem, excluídas, na periferia social.
O uso do cinema como fonte de conhecimento tornou possível o
ensino de Literatura, ao permitir, através de um texto audiovisual, o
acesso a histórias, a leitura que seria impossível em língua escrita. Acessar
diferentes fontes, ter referências de vários autores de diferentes épocas
e valores permitem que, ao entrarmos em contato com outras formas de
pensar, reflitamos também sobre nós mesmos.
O contato com novas histórias, novas visões de mundo e novas formas
de pensar e de viver parecem ser condições indispensáveis para qualquer
indivíduo que queira povoar seu imaginário e assim criar. Ninguém cria
do nada. Um ser sem referências é uma pessoa com poucas possibilidades
de usar sua imaginação e por isso, tornam-se almas e mentes engessadas
incapazes de sonhar.
Lygia Fagundes Telles em seu livro A disciplina do amor, faz algumas
reflexões sobre o ato de contar histórias. Para ela conhecer histórias e saber
contá-las ajuda a vencer o medo e as dúvidas do mundo em que vivemos.
Essas reflexões indicam o valor do círculo de criação, feito de recepção e
produção. Não basta ler histórias, é preciso contá-las e para isso é preciso
conhecê-las.
Pensando em tudo isso, o Projeto CINES propõe um ensino em redes
de saberes e conhecimentos. Nesse ano começamos uma proposta de
trabalho interdisciplinar, partindo de uma crônica de Rubem Braga, Ai de
ti, Copacabana! Esta crônica é de 1958 e por ser um gênero efêmero e
contextualizado historicamente, fala de um cotidiano, de uma época de
fatos e de pessoas que já estão distantes e por isso, dissociada de sentido
para leitores que não pertençam ao mesmo tempo histórico.
A literatura foi o estofo do trabalho, mas para entendê-la melhor
necessitamos de informações das seguintes disciplinas: história e biologia.
Na tentativa de entendermos a educação e a busca pelo conhecimento
através de novas alternativas de comunicação entre as disciplinas, iniciamos
a elaboração de novos ambientes de aprendizagem, propondo o acesso
às informações através de uma aprendizagem hipertextual. A quebra da
linearidade permite que cada aluno escolha seu caminho e a profundidade
de suas informações, que serão mediadas pela curiosidade e o interesse de
cada um.
Ao final, os alunos expostos a várias informações de diferentes fontes
adquiriram conhecimentos para confeccionarem filmes sobre Copacabana.
O Projeto CINES iniciou a partir da dificuldade encontrada para o ensino
de literatura de uma forma convencional, ou seja, através da palavra, do
texto escrito. Encontrou no cinema sua fonte de conhecimento, seu texto;
203
Anais do Congresso
nas produções fílmicas, suas narrativas e na informática sua ferramenta
para editar as idéias propostas. Apesar de recente esse projeto já oferece
possibilidades de propor novos caminhos para pessoa surda em busca de
um cinema de identidade que será todo feito pelos surdos gerenciados pelo
GINES, grêmio do INES.
O cinema é um canal de comunicação tão poderoso que não podemos
ter a visão ingênua e romanceada de usá-lo em uma comunidade, que
precisa tanto de visibilidade, só para contar histórias. Cinema filma, revela
e pode transformar a realidade. Deve ser usado como janela para novos
mundos e para novas possibilidades. Aprendendo com a experiência de
outros e também apresentando a nossa. A língua usada em nossos filmes é
logicamente a LIBRAS e ao usá-la dessa forma percebemos sua força ao
apresentar histórias que emocionam, divertem e podem provocar mudanças
na forma de aceitação da diferença da pessoa surda. Encontrar alternativas
que promovam a inserção de pessoas surdas em qualquer contexto social,
parece ser uma das metas de uma educação que precisa ser cada vez mais
ser inclusiva. Sem apontar seus estereótipos apresentamos sua diferença,
expomos seu potencial e suas necessidades.
Percebo com muita alegria a participação dos alunos nessa proposta de
trabalho, me surpreendo, me encanto e ratifico mais uma vez a necessidade
de entendermos a educação de uma forma diferente, principalmente para
pessoas com outras peculiaridades..
Os objetivos propostos inicialmente continuam os mesmos, apostar
no inesperado, na espontaneidade da pessoa surda é captar instantâneos
da vida sem ensaios, sem repetições. É a busca da simplicidade do que é
natural no ser humano que habita em todos nós. Filmamos rápido captando
as primeiras emoções, deixando fluir, é um trabalho feito por surdos , para
surdos e ouvintes e muito prazeroso para todos. Não procuro artistas, apesar
do envolvimento quase natural com a arte e a representação, pretendo
formar pessoas que pensem, criem e reflitam sobre sua realidade. Procuro
incentivá-los a descobrir o seu melhor, o seu prazer, o seu desejo.
Entendo o cinema como arte coletiva, onde todos os papéis são
importantes e por respeitar o coletivo incentivo a troca de papéis, o gosto
pelos bastidores e a rede de relacionamentos. Os “famosos” os protagonistas
do primeiro filme se transformaram em roteiristas, diretores, câmeras,
fotógrafos e além de perceberem a importância de cada papel praticam uma
realidade social bem contemporânea que é a de assumir múltiplas faces em
uma realidade cada vez mais fragmentada.
Tudo está no início. Não sei onde chegaremos. A vida é feita de tentativas.
De riscos. Às vezes acertamos, outras não. Mas de uma coisa tenho certeza
a auto-estima desses alunos nunca mais será a mesma. Pessoas capazes de
204
inventar histórias e transformá-las em filmes modificam seus ambientes
internos, criam novos caminhos, ficam mais fortes e mais felizes. E ser feliz
é tanto que é quase tudo.
Bibliografia
DUARTE, R. - Cinema e Educação – Editora Autêntica
ASSMANN, H. (org) Redes Digitais e Metamorfose do Aprender Editora
Vozes
CITELLI, A (coordenador) Outras linguagens na Escola – volume 6 Editora
Cortez
TEDESCO, J.C (org) Educação e Novas Tecnologias: Esperança ou
incerteza?
YUNES, E (org) – Pensar a Leitura: complexidade - Editora Puc – Rio
TELLES, L. F - A Disciplina do Amor - Editora Rocco
205
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
SURDEZ E TRANSTORNOS INVASIVOS DO
DESENVOLVIMENTO
Paulo Mattos1
Os transtornos abrangentes, também denominados invasivos ou globais,
compreendem um grupo de desordens que incluem o Autismo clássico, o
Asperger e vários quadros menores, compondo o Espectro Autista.
As dificuldades de comunicação fazem parte da tríade de sintomas
destes transtornos, juntamente com falhas significativas na interação social
e presença de interesses restritos ou estereotipados.
Deste modo, é necessário identificar crianças com transtornos
abrangentes no universo de portadores de dificuldades de comunicação;
mais da metade dos autistas não fala.
O diagnóstico deve ser o mais precoce possível, uma vez que as
estratégias reconhecidamente eficazes para o tratamento são bastante
especificas e exigem profissionais experimentados. Não é incomum na
pratica clinica que pacientes só recebam este diagnóstico mais tardiamente,
quando existe um significativo atraso escolar, graves dificuldades de
relacionamento social e familiar, além de sintomas secundários.
Bibliografia
CUNHA JA e cols. Psicodiagnóstico-V: 5a edição revisada e ampliada.
Artmed, Porto Alegre, 2000.
Médico Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
[email protected]
1
206
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO E
SURDEZ
OBSERVAÇÕES E PRÁTICAS
Correlação de fatores etiológicos e déficits cognitivos e/ou distúrbios comportamentais em portadores de surdez
Roberta Pinheiro Lima*
Não tenho como iniciar esta palestra sem falar de meu passado
profissional, pois foi em função deste histórico que cheguei às conclusões
que ora apresento.
Sou redistribuída da antiga FCBIA (ex-FUNABEM), e lá trabalhei
voltada para jovens adolescentes com distúrbios de conduta, vivência de
rua, dependência química e/ou tráfico de drogas. Não utilizava testes, sendo
minha abordagem direta, cujo canal de comunicação era pleno, baseado
no diálogo e na observação da expressão corporal, que muitas vezes
nos diz mais do que simples palavras. Trabalhava no pátio, interagindo
com os então “menores”, forma através da qual conseguia adquirir o que
formalmente era mais difícil: confiabilidade.
Ao ingressar no INES em 1996, deparei-me com a barreira da língua,
e, embora buscasse aprender a LIBRAS, fui designada ao atendimento de
crianças da estimulação precoce, educação infantil e ensino fundamental,
primeiro ciclo, ou seja, em sua maioria não comunicantes. Se considerarmos
que, para aprender uma língua mais facilmente, necessita-se vivenciar a
cultura a esta relacionada, ficava claro que eu enfrentaria problemas. Não
tive auxílio de outros profissionais da área, e, nesses onze anos de trabalho,
desenvolvi estratégias próprias, adaptadas a partir de campos os quais me vi
obrigada a buscar, entre eles a neuropsicologia no CNA/RJ (curso básico).
Sou a única psicóloga atuante na instituição há pelo menos seis anos,
cujo contingente oscila em torno de cerca de seiscentos alunos.
* Psicóloga
do INES
207
Anais do Congresso
O que mais me chamou a atenção inicialmente foram os problemas
comportamentais e afetivo-emocionais, frente à vasta gama de casos
encaminhados. Na ocasião também reparei que um grande número de alunos
do ensino fundamental do primeiro ciclo eram maiores de idade, estudando
em horário diurno e com crianças de faixas etárias bem diferenciadas – o
que significava várias repetências.
Logo constatei duas situações:
1. as dificuldades de interação interpessoal eram conseqüentes de
uma falta de comunicação comum entre o surdo e sua família, na maioria
de ouvintes, não comunicantes de LIBRAS, o que gerava grande parte dos
distúrbios comportamentais observados;
2. os surdos levavam anos para serem alfabetizados, aparentemente
apresentando uma série de disfunções cognitivas.
Portanto, considerando que linguagem e cognição estão intimamente
interligadas no processo de desenvolvimento humano; considerando que a
ausência de um canal comunicativo comum também favorecia problemas
de relacionamento de amplo espectro, concluí que necessitava entender
de forma mais objetiva e aprofundada o funcionamento desse indivíduo
surdo.
Nesse contexto, como iria avaliar as reais causas desses problemas?
Vi-me obrigada a buscar no psicodiagnóstico, realizado por meio de
testes psicométricos, uma forma de amparar minhas intervenções; e na
neuropsicologia, que então emergia como instrumento de abordagem,
elementos para analisar as causas do fracasso escolar desses indivíduos.
É importante frisar que não existem testes validados para pessoas
surdas; portanto, elaborei adaptações, e minhas conclusões se basearam
não em escores absolutos, mas em dados qualitativos, o que, para fim de
pesquisa, não é considerado válido. Se aplicados e computados os valores
dados aos ouvintes, os surdos seriam em sua totalidade identificados como
infradotados, o que não é verdadeiro.
Efetuei um levantamento considerando o contingente existente hoje no
INES, que é flutuante, e associei alguns casos de ex-alunos submetidos às
referidas avaliações (Fig. 1).
208
Levantamento de Alunos
Alunos do INES
Pesquisados
5%
Ex-Alunos do
INES
95%
Fig 1
Tipo de Levantamento
Sem Dados
10%
8%
Anamnese
47%
Avaliações
Completas
35%
IFF
Fig 2
Note-se que grande contingente do INES sequer foi submetido a
qualquer tipo de avaliação ou possui registro de informação, o que indica
que há muito aprofundamento a ser feito para chegar-se a conclusões mais
expressivas (Fig. 2). Dos alunos pesquisados, a maioria não foi submetida
a testes psicométricos e/ou neuropsicológicos, restringindo-se a dados de
prontuário, nem sempre completos. A quantidade de avaliações “formais”,
portanto, é insignificante, considerando o quantitativo de alunos que
subjetivamente apresentam problemas.
209
Anais do Congresso
Um outro fator que ficou claro, assim que iniciei meus passos na
neuropsicologia, foi que os fatores etiológicos, bem como os dados
contidos nas anamneses não estavam claros, sequer eram considerados
com relevância. Muitos prontuários apresentavam inúmeras informações,
mas não havia um interesse em correlacionar fator etiológico à história do
aluno, seja no âmbito comportamental ou escolar.
Os surdos foram submetidos por décadas à oralização como único
processo comunicativo. Não lhes foi dado o direito a relacionarem-se na
sua língua natural, que foi traumaticamente cerceada. No momento em que
esse panorama sofreu radical modificação, com a aceitação da LIBRAS e do
respeito à cultura surda, a conseqüência foi a rejeição dos modelos médicos
e/ou clínicos, até então existentes, o que gerou um fosso informativo, vez
que os profissionais, ao que parece, passaram a negligenciar tais dados.
A partir de 2001, com o início do Programa Centro de Atendimento
Alternativo Florescer – CAAF/ INES –, do qual fiz parte integrante e que
objetivava o atendimento a múltiplos deficientes, criei então uma anamnese
mais aprofundada, que contemplava informações que subsidiaram minhas
observações. Posteriormente esse instrumento, ou parte dele, passou a ser
utilizado em toda a escola, chegando-se a conclusões que ora se seguem
(Fig. 3):
Idiopatica
Rubéola Congênita
5%
4%
2%
Sem informação
17%
Alunos com mais de um
Fator para Surdez
Meningite
7%
8%
15%
Antibioticoterapia
Anóxia
8%
Genética/sindrômica
9%
11%
Etiologia Para Surdez
Fig 3
210
Prematuriedade
14%
Outros Fatores
Outras Condiçoes
Víróticas/Bacterianas
Ora, a primeira coisa que reparamos é o grande contingente de alunos
que apresentam fatores idiopáticos (sem causa definida), seguidos por
aqueles portadores de rubéola congênita, que produz inúmeras seqüelas,
incluindo retardo mental. Em terceiro lugar aparecem aqueles que sequer
possuem qualquer informação de base etiológica. A meningite, que atinge
o córtex cerebral e pode causar outros comprometimentos cognitivos, é
seguida pela prematuridade e antecedida por casos que possuem mais
de um fator para surdez, ou fatores conjugados. A antibioticoterapia
relaciona-se à ototoxidade, que atinge crianças nascidas ouvintes. A anóxia
é seguida pelos fatores genéticos e/ou sindrômicos, que podem ou não estar
associados a outros déficits cognitivos. Outras causas, como gestação de
risco, otites de repetição, fator RH, etc. são seguidos de condições viróticas
ou bacterianas, como sífilis, citomegalovirus, dentre outros. Note-se que a
maioria é caracterizada por fatores ambientais.
Devo ressaltar que a prematuridade gera infecções e condições pós-natais
que podem desencadear outros fatores causadores de surdez, mas que aqui
não foram devidamente correlacionados por falta de maiores informações.
A anóxia, constatada como fator, mais recentemente pesquisado, pode
estar associada a quadros idiopáticos ou sem informação, simplesmente
porque sequer foi alvo de anamneses anteriores. Dos indivíduos que
comprovadamente tiveram causa da surdez relacionada a anóxia, somente
dois casos foram identificados por exames de ressonância magnética.
Porém, considerando-se lesões mais difusas, que aparecem somente em
exames funcionais, temos apenas o registro subjetivo. Outra constatação é
de que grande parte dos responsáveis não receberam ou perderam o boletim
de alta hospitalar, o que dificulta ainda mais a confirmação dos dados.
Em 2006, minha colega do Serviço Social apresentou, no Congresso
Internacional do INES, a correlação entre condições sociais e as causas
da surdez – um estudo inédito, que objetivava mostrar que os fatores
ambientais, passíveis de prevenção, eram causadores de surdez, pelo menos
no universo do INES, cuja população em sua maioria é de baixa renda.
Neste trabalho, pretendi demonstrar que tais fatores etiológicos produzem
também outros comprometimentos cognitivos e/ou comportamentais que
interferem no pleno desenvolvimento do surdo.
1
Rosária de Fátima Correa Maia – Assistente Social da DISOP/INES – Divisão
Sociopsicopedagógica, à qual também pertenço.
211
Anais do Congresso
É imprescindível enfatizar que, ao longo de anos, a população do INES
era, em sua maioria, constituída de surdos ditos “puros”. Isto porque aqueles
muito comprometidos ao nascimento, em geral, não sobreviviam. Com o
desenvolvimento da medicina neonatal, as crianças começaram a sobreviver,
a partir de cuidados médicos especializados, mas ainda sem condições ou
qualidade de vida. Por essa razão, na última década começamos a receber
um contingente de surdos que apresentavam, de forma menos sutil, déficits
intelectivos, cognitivos e motores, que deixavam clara a necessidade de
um melhor suporte diagnóstico e conseqüente acompanhamento. Os dados
adiante, embora não reflitam a realidade subjetiva vivenciada em sala de
aula, indicam que um aprofundamento faz-se necessário, a fim de se atender
essa demanda reprimida.
Percebe-se, ainda, que questões comportamentais aparecem com
dimensão ligeiramente superior à das questões cognitivas. Isso reflete
as dificuldades de comunicação encontradas dentro da família, mas não
se descartam as lesões neurológicas que interferem no funcionamento
eletroencefálico, o que, dependendo da área afetada, pode favorecer
mudanças de humor e comportamento (Fig. 4).
Quanto aos fatores cognitivos aqui relacionados, cabe enfatizar:
problemas atentivos de variado espectro, déficits mnêmicos, seqüenciamento
lógico, percepção visual (rubéolicos), déficits na compreensão, déficits na
aquisição de linguagem, vez que alguns alunos, embora expostos à LIBRAS
desde pequenos, não conseguem desenvolver nem a língua gestual, nem a
oral, nem a escrita. Tais achados refletem a perspectiva de lesão cerebral
relacionada a algum dos fatores etiológicos anteriormente descritos.
Também foi percebido que o seqüenciamento lógico em alguns casos
se dá de forma correta, mas invertidamente. Isso poderia refletir a própria
estrutura da LIBRAS, que é taquigráfica e igualmente inversa ao português.
Mas ainda é uma questão a ser aprofundada.
212
Sem Transtornos
Transtornos Encontrados
3%
4%
5%
7%
3%
3%
Comportamentais
Cognitivos
2%
Déficits Intelectivo
Multiplo Deficiente
62%
11%
Motores
Transtornos Específicos
do Desenvolvimento
Afetivo/Emocionais
Transtornos Inespecíficos
do Desenvolvimento
Fig 4
Os transtornos específicos identificados frente ao total de alunos
encontrados no INES (Fig.5) representam valores insignificantes, mas,
se correlacionados apenas entre eles (Fig. 6), verifica-se que os quadros
psicóticos e o Transtorno do Déficit de Atenção são os mais perceptíveis.
Transtornos Específicos - População
0%
Fig 5
1%
Geral
Total de alunos
1%
TDAHI
1%
Psicóticos
Hiperléxicos
97%
Autistas
Transtornos Específicos do
Desenvolvimento
18%
Fig 6
35%
TDAHI
Psicóticos
12%
Hiperléxicos
35%
Autistas
213
Anais do Congresso
O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade e Impulsividade
(TDAHI), em surdos, não é considerado pelo Manual Diagnóstico e
Estatístico de Doença Mental (DSM-IV), instrumento internacional que
disciplina as categorias de desordens mentais. Isto porque os surdos,
por serem portadores de perda sensorial, costumam, em sua maioria,
apresentar comportamentos desatentos e por vezes hiperativos, até que sua
comunicação se estruture e ele passe a se fazer entender.
Entretanto, os seis casos identificados, alguns diagnosticados no INES,
vêm sendo tratados clinicamente com metilfenidato (ritalina), respondendo
com efetiva positividade. Isso leva à inferência de que, apesar de não
esperado, alguns surdos apresentam sinais e sintomas clínicos de transtornos
do desenvolvimento específico, independentemente do quadro sensorial.
Um grande contingente de surdos podem apresentar quadros de
psicose, hiperatividade e autismo sem que efetivamente sejam portadores
de doença psiquiátrica. Isso tem sido comumente observado entre pessoas
surdas adolescentes ou adultos que não desenvolveram qualquer tipo de
comunicação. Por apresentarem vida interior como qualquer indivíduo
dessa faixa etária, sem conseguir expressar seus sentimentos, eles acabam
por fazer “surtos”, ou quadros funcionais sugestivos de doença psiquiátrica,
geralmente tratados com tranqüilizantes e/ou barbitúricos, sem que a causa
principal seja identificada ou minimizada.
Esta fala objetiva desmistificar os estereótipos de que surdos são mental
e/ou cognitivamente prejudicados. Ao contrário, surdez não é sinônimo
de incapacitação. Porém, não se deve desconsiderar que alguns fatores
etiológicos podem influenciar o desenvolvimento de indivíduos surdos. A
preocupação é entender como isso ocorre e de que forma se pode prevenir
e garantir melhor qualidade de vida a esses indivíduos, seja na área do
relacionamento, seja na do aprendizado.
214
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
Descrição da língua de sinais:
desafios teóricos e práticos
Prof. Dr. Tanya Amara Felipe (FENEIS)1
Resumo: Este trabalho apresenta um estudo sobre o uso de classificador
em relações anafóricas. Os dados foram coletados no Corpus do Projeto
Tradutor: LIBRAS x Português, 2004. O trabalho procura demonstrar que,
nessas relações, há uma anáfora associativa com função coesiva e que esse
tipo de anáfora indireta pode ser correferencial e parece basear-se numa
associação que pressupõe um conhecimento lexical preexistente. Esta
descrição, mesmo ainda preliminar, permite refletir sobre a existência de
complementaridade entre a abordagem léxico-semântica e a cognitivotextual na análise da funcionalidade do léxico no texto.
Palavras chave: correferência textual, linguagem natural, anáfora,
meronímia, classificadores na Libras, anotação de corpus.
1.Introdução
Este trabalho, na área de Lingüística aplicada à Língua de Sinais
Brasileira, a Libras, surgiu em decorrência da pesquisa Tradutor: Português
x Libras, quando descrevíamos gramaticalmente textos em Libras para o
processamento de linguagem natural. Por isso o objetivo dessa pesquisa é
propiciar descrições gramáticas da Libras para o tratamento computacional
de um corpus lingüístico visando à resolução da correferência em textos da
Libras que serão traduzidos para a Língua Portuguesa. Ao depararmos, a
partir de dados coletados, com expressões lingüísticas que não poderiam ser
classificadas em termos de classes gramaticais, tentamos identificar essas
seqüências de expressões que se referiam a uma mesma entidade. Para isso
Consultora na área de lingüística, Lingüística Aplicada, Estudos sobre a Libras,
Educação de Surdos.
Coordenadora, pela Feneis, do Programa Nacional Interiorizando a Libras.
Coordenadora do GPLIBRAS do Projeto Tradutor: LIBRAS X Português.
Financiado pelo MEC/FNDE - FENEIS
[email protected]
1
215
Anais do Congresso
estamos trabalhando inicialmente com o caso particular dos classificadores
em função anafórica.
Este estudo sobre o uso anafórico dos classificadores foi realizado
em um corpus de frases filmadas e transcritas de um livro didático que
estava sendo utilizado para o trabalho de tradução automática. Assim, ele
poderá servir para o desenvolvimento de uma interface para a realização
manual de anotação de correferência e servirá de base para a construção e
avaliação do sistema que está sendo desenvolvimento para esse trabalho de
tradução, uma vez que a compreensão de relações anafóricas é uma tarefa
fundamental do parser sintático, isto é, do mecanismo de processamento
de frases. As questões básicas da área da atribuição da correferência estão
relacionadas a se, quando e como as relações correferenciais corretas são
estabelecidas entre os componentes de uma frase. O foco dessa pesquisa
está na possibilidade que têm elementos referencialmente dependentes,
tais como os classificadores, de facilitar a compreensão de um sintagma
nominal mencionado previamente.
Nesse processo de tradução da Libras para o Português, deparamos
com a impossibilidade de traduzir uma língua, que se apresenta
tridimensionalmente, a partir de unidades lineares que não conseguem dar
conta de correferências espacializadas a partir de classificadores que são
anáfora meronímicas.
2. Escolhas de teorias para análise de línguas
A partir dos estudos saussurianos, uma perspectiva estruturalista
norteou os estudos lingüísticos e, com o advento do gerativismo, esse
enfoque formalista se aprofundou. As línguas, enquanto sistemas, conjuntos
de regras nos níveis fonológico, morfológico e sintático foram analisadas
separadamente do usuário e das situações de uso e a linguagem foi vista
apenas como uma manifestação biológica da natureza humana, fazendo
parte dos estudos das ciências naturais. A partir de meados dos anos 60, com
o surgimento da Sociolingüística com suas várias vertentes de concepções
sobre variação lingüística, tanto variacionista como culturalista, as línguas
passam a ser analisas como fato social, inserido em uma cultura.
Além dessas abordagens sócio-antropológicas, as línguas foram também
estudadas sob perspectivas da Psicolingüística, da Lingüística Aplicada, da
Gramática de casos, da Análise do Discurso e da Análise da Conversação,
considerando as questões sobre aquisição de língua e ensino de língua como
primeira língua - L1 e segunda língua - L2, aspectos semânticos, cognitivos
e pragmáticos das línguas, relacionados, também, enquanto atos de fala, às
diversas situações de fala e usos por grupos sociais e outras variáveis.
216
Assim, a unidade lingüística para estudo não seria mais somente a
frase, mas o texto como uma rede constituída de elementos coesivos que
estabelecem a sua coerência, como propôs a Lingüística textual.
Com o advento Lingüística Computacional, que utiliza procedimentos
automáticos para análise de dados, tem-se expandido o conceito de classe de
palavras para o de categorias morfossintáticas, a fim de melhor aproveitar
as informações disponíveis nas formas literais. Para isso já existem
programas capazes de atribuir classes gramaticais às palavras de um texto
legível por máquina automaticamente. Estes programas são geralmente
chamados de rotuladores de estruturas/categorias morfossintáticas, cuja
complexidade do esquema de rótulos tem variado, mas sempre têm estado
presentes certas classificações básicas como substantivo, verbo, adjetivo
e pronome. Mas embora esses rotuladores sejam capazes de atribuir uma
classificação a todas as palavras de um texto, há necessidade de se repensar
essas categorias para contemplar especificidades das línguas gesto-visuais
como, por exemplo, os classificadores.
Assim, esse estudo dos classificadores em função anafórica se insere
no tipo de abordagem de fenômenos lingüísticos, atualmente conhecida
como Lingüística de Corpus, uma vez que a interpretação do fenômeno
lingüístico foi baseada na observação dos dados do corpus e não em
intuições da analista. Daí, a partir de um mínimo de noções teóricas
a priori, o resultado final da análise está fundamentado no uso real da
língua, que induziu a formulação de uma gramática baseada na observação
(Aarts 1991) e não em exemplos criados com o propósito de demonstrar
concepções previamente definidas.
Para essa abordagem proposta no projeto de tradução automática do
português para a Libras, a anáfora deverá ser abordada depois que algumas
análises preliminares forem realizadas sobre o texto que está sendo
processado. Após essa fase de identificação da gramática da Libras, será a
vez da resolução da anáfora, que é uma questão crucial no Processamento
da Linguagem Natural (PLN). Muitos projetos na área da lingüística
computacional, incluindo a tradução automática, a recuperação de
informações e o processamento de diálogos têm que alocar uma parte do
sistema para resolver esse problema. Isso implica também em decidir as
abordagens teóricas que serão usadas e em qual estágio do processo devese abordar essa questão.
Diante de todas essas abordagens teóricas que geraram diferentes
enfoques para os estudos das línguas oral-auditivas, a partir da década de
60, surgiram também os estudos sobre as línguas gesto-visuais, ou seja, as
línguas de sinais.
217
Anais do Congresso
3. Estudos sobre as línguas de sinais
Há algumas décadas, a partir das pesquisas de Stokoe (1960) e Stokoe
et al.(1965) que, nos Estados Unidos, vêm desenvolvendo-se pesquisas
sobre a American Sign Language (ASL). Com esses estudos, lingüistas de
outros países começaram a pesquisar também as línguas de sinais de suas
comunidades Surdas.
Os primeiros estudos, sobre a ASL e outras línguas de sinais,
relacionados a concepções estruturalistas e gerativistas, mostravam que as
línguas de sinais possuem os mesmos universais lingüísticos com relação
às línguas orais auditivas, variando apenas a modalidade e várias pesquisas
apresentaram essas línguas em seus níveis fonológico, morfológico e
sintático.
Mas, como essas línguas possuem uma tridimensionalidade e outras
características que as línguas oral-auditivas não possuem, outros paradigmas
precisaram ser criados para dar conta da descrição dessa nova modalidade
de língua e os estudos avançaram não apenas na perspectiva do que seria
universal, mas apresentando as diferenças e contribuição desses estudos
para a compreensão da linguagem.
Assim, começaram as análises dos elementos não-manuais, ou seja,
os estudos das expressões faciais e corporais enquanto componentes
lingüísticos a partir da análise do nível morfológico-sintático e, depois,
semântico-pragmático dessas línguas. O texto tornou-se também a unidade
de análise.
Pesquisas na área da neurolingüística e psicolongüística também
contribuíram para abrir discussão sobre a importância da aquisição dessas
línguas, como primeira língua (L1), por crianças surdas.
A aquisição de certos aspectos da gramática da ASL foi, também,
pesquisada como, por exemplo: a aquisição de pronomes dêiticos
(Hoffmeister,1978; Pizzuto & Williams,1980; Bellugi & Klima,1981,1982;
Petitto,1983), as relações semânticas (Newport & Ashbrook,1977), a
aquisição da fonologia da ASL (Boyes-Braem,1973 e McIntire,1977)
e estudos de input para a aquisição da ASL (Maestas & Moores,1980;
Kantor,1982a,b; Launer,1982a,b; Meier,1983).
Todas estas pesquisas citadas tiveram como sujeitos, crianças surdas,
filhas de pais surdos, portanto, a aquisição da ASL se deu como L1, mas,
além destas pesquisas, outras foram feitas também com crianças surdas,
filhas de pais ouvintes e com crianças ouvintes, filhas de pais surdos
(Schlesinger & Meadow,1972; Prinz & Prinz,1979; Bonvillian, Orlansky
& Novack,1983). Outros, ainda, também pesquisaram as crianças surdas
com pais ouvintes que, devido ao fato de não serem expostas à ASL,
desenvolveram sistemas de comunicação gestual inventados (Goldin-
218
Meadow & Feldman,1975; Feldman, Goldin-Meadow & Gleitman,1978,
Goldin-Meadow & Mylander,1983,1984) e, pesquisas apresentaram o
sucesso do aprendizado da ASL, embora as crianças tivessem sido expostas
em um período posterior ao “período crítico” para a aquisição de uma
língua ( Mayberry, Fischer & Hatfield,1983).
Os dados coletados para estas pesquisas variaram, tendo a ASL como
L1 ou L2, a Língua Inglesa como L1 ou L2, conversas espontâneas de
crianças, interação de mãe surda com criança surda, de mãe ouvinte com
criança surda, e de pais surdos com criança ouvinte, além de dados licitados
específicos.
Destas pesquisas pôde-se destacar que o processo de aquisição da
ASL é igual ao processo de aquisição de línguas oral-auditivas, ou seja,
obedecendo a maturação da criança que vai internalizando a língua a partir
do mais simples para o mais complexo, segue as mesmas fases das crianças
ouvintes (Felipe, 1992a).
As pesquisas sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras teve início
na década de 80 e sob influência dos estudos principalmente da ASL,
os pesquisadores do Brasil também começaram as pesquisas sob uma
perspectiva estruturalista e gerativista, mas abordando também aspectos
semântico-pragmáticos. (Felipe, 2000).
4. Os estudos sobre Anáfora na Lingüística de
corpus
O estudo da anáfora tem sido instigante e vários pesquisadores de
diferentes enfoques teóricos têm proposto conceituações e tipologias
formais, semântico-pragmática .
Segundo Ducrot e Todorov (1972:358), um segmento do discurso é
compreendido como anafórico, quando para interpretá-lo há necessidade
de se reportar a um outro segmento mencionado anteriormente no discurso,
ou seja, segundo Kuramoto (1995), o termo fonte da anáfora.
Assim, há Anáfora, quando se estabelece uma relação de referência
ou co-referência com algum tema do texto. (http://www.inf.unisinos.br/
~renata/[email protected])
A anáfora também vem sendo estudada sob a perspectiva da cognição,
como nos trabalhos de Langacker (1996) Van Hoek (1992), sob a pesrpectiva
do discurso, como os trabalhos de McEnery and Botley (1998) e Indursky
(1997), sob a perspectiva das restrições textuais, como os trabalhos de
Dagani and Itai (1990), Nasukawa (1994) e Mitkov and Belguith (1998) e
ainda sob a abordagem de “mecanismos de rastreamento”, como o trabalho
de Du Bois (1980).
219
Anais do Congresso
Essas pesquisas na área da computação e linguagem natural têm buscado
na psicolingüística e na Teoria da Reativação fundamentos para avaliar
a compreensão da relação entre a anáfora objeto e seus antecedentes, uma
vez que a compreensão de relações anafóricas é uma tarefa fundamental
do parser sintático, isto é, do mecanismo de processamento de frases. Há
pesquisas cujos enfoques são os elementos referencialmente dependentes
que estabelecem relações de correferência. Segundo Tulvin e Schacter
(1990), a memória de reativação é uma forma não-consciente da memória
humana desempenhar um papel fundamental na identificação perceptual
de objetos lingüísticos.
Pesquisas na área de processamento de linguagem natural (PLN), como
as de Adriens(1986), Devos (1988), Fum (1988), Csuhaj-Varju (1993),
Boitet (1994), Guha (1994), entre outros, têm sido ultimamente identificadas
pelo termo engenharia de linguagem natural. Esses estudos, através de
um tratamento computacional de um corpus lingüístico, têm por objetivo
identificar as seqüências de expressões em um texto que se referem a uma
mesma entidade, assim, visam à resolução da correferência e o estudo da
Anáfora tem sido o objeto de várias dessas pesquisas
A luz dessas novas pesquisas, devido à necessidade de se construir
dicionários e tradutor por computador, houve uma mudança no tratamento
dos dados da Libras que passaram a ser analisados a partir de um tipo
de abordagem de fenômenos lingüísticos atualmente conhecida como
Lingüística de Corpus, Poesio & Vieira (1998). Com já foi dito acima,
esse enfoque se caracteriza pelo uso intensivo de dados coletados em
situações reais de uso da língua para fins de comunicação. Portanto, o
enfoque gerativista, que analisa os fenômenos lingüísticos a partir das
intuições do analista, é confrontado com a análise dos dados coletados
e observados em um corpus. Assim, essa análise tem como resultado o
uso dessa língua em situações de fala, portanto, utiliza dados coletados
a partir dos usos dessa língua e não exemplos criados com a finalidade
de comprovar um determinado enfoque teórico. A perspectiva é inversa,
ou seja, dos dados busca-se a teoria, como afirma Aarts (1991). Essa
abordagem está sendo possível graças às inovações tecnológicas que têm
permitido armazenamento e confronto de grande número de dados.
Assim, nesse estudo, optou por uma análise das restrições sintáticasemânticas e textuais, pressupondo-se que uma descrição completa de
aspectos restritos ofereça uma contribuição maior para o mapeamento de
todo processo.
220
4.1. Anáfora Indireta e Meronímia
A conceituação de anáfora adotada neste trabalho é o nome dado a
uma relação ou processo no qual um termo anafórico em uma instância de
discurso se vincula a um elemento identificável, chamado de antecedente,
para que a interpretação semântica seja realizada com êxito.
Vários autores, citando VIEIRA, Renata. et al. (2000) e Marcuschi
(2000), têm apresentado os seguintes tipos de anáforas: Anáforas diretas,
: Anáforas indiretas, Associativas e Novas no discurso.
Para nos atermos apenas em um desses tipos, as “Anáforas indiretas
têm o mesmo critério semântico de classificação das descrições anáforas
indiretas. O que as difere destas é que não têm o mesmo nome-núcleo do
seu antecedente. Este pode ser um sinônimo do antecedente ou mesmo
uma elipse. Mas, como as anteriores, referem-se à mesma entidade já
introduzida no discurso.”
Dividindo esse tipo de anáfora indireta em outros três subtipos, o autor
apresenta um deles como sendo a anáfora indireta de natureza mereológica,
que é uma possibilidade inferencial inscrita no léxico, já que ela mantém
uma relação de parte-todo com seu antecedente. Assim esse tipo de anáfora
implica um processo de meronímia.
Em trabalhos, como os de Lyons (1977), Cruse (1986), Tamba (1991),
Vossen (1995), Diez Orzas (1999) e Salles (2000), a meronímia, sob um
ponto de vista léxico-semântico, pode ser conceituada como uma relação
semântica em que uma unidade léxica é parte de uma outra unidade
léxica.
Winston et al. (1987), propondo uma tipologia de seis categorias para
essa relação semântica de meronímia, caracteriza uma delas como sendo
uma relação componente-objeto integral, que corresponde à relação partetodo típica, ou seja, o “todo inclui a parte e é constituído por várias
componentes, normalmente discretas, que apresentam limites e funções
definidas em relação a esse todo.” (apud Silva)
Aprofundando na conceituação da meronímia, VIEIRA, Renata. et
al.(2000), argumenta que essa relação material-objecto corresponde a
uma conexão entre uma entidade concreta e a matéria de que é feita essa
entidade, sendo definida por esses traços relacionais. Assim, o todo liga-se
às partes mediante uma dependência ontológica na qual se definem as suas
partes necessárias ou típicas.
A partir dessa conceituação, pode-se considerar a existência de dois
tipos de merônimos : os canônicos, que correspondem às partes típicas de
um todo, e os facultativos, que não se encontram inscritos no estereótipo do
todo ao qual estão ligados.
Portanto, a meronímia é especializada quando ocorre em contextos
221
Anais do Congresso
específicos, nos quais se produz uma inferência automática e direta,
freqüentemente relacionada com a existência de uma denotação prévia ao
uso das unidades léxicas em contexto. Portanto, essas relações semânticas
devem ser descritas tanto do ponto de vista do sistema como do uso.
A meronímia foi estudada também sob um ponto de vista cognitivotextual por Koch e Marcuschi (1998) e por Silva
(www.filologia.org.br/viicnlf/anais/caderno06-13.html - 101k). Nesse
último trabalho, o léxico foi analisado “na dupla perspectiva de componente
do sistema lingüístico e de estratégia lingüística em situação de uso.”
Neste enfoque, o texto é visto como uma unidade de relações
seqüenciadas, cuja tessitura se dá através de processos de progressão tópica
e referencial, que vão estabelecendo as coesões e produzindo sentido.
Assim, a partir desses estudos acima e do Projeto ANACORT (Anotação
Automática de Correferência Textual), que teve como objetivo geral a
construção e o tratamento computacional de um corpus lingüístico visando
à resolução da correferência em textos da Língua Portuguesa, através da
resolução automática que geraria as cadeias de correferência em textos da
língua natural, podemos verificar como esse processo poderia acontecer na
Libras e como as anáforas, na Libras, são fundamentais para a retomada de
elementos informacionais no texto, estabelecendo uma relação complexa
de manutenção e progressão textual.
Assim, as relações lexicais anafóricas atuam tanto no nível da
continuidade textual como no nível das inferências a ela subjacentes. Neste
contexto, a anáfora indireta, constituída de meronímia apresenta uma
saliência semântica de um objeto já introduzido no discurso, que implica
um conhecimento de mundo e uma representação simbólica do objeto,
que correferenciado, através de um classificador, garante a progressão
referencial e progressão tópica, que como uma cena, um script, pode-se
visualizar tridimensionalmente esse objeto na narrativa. Felipe (1992).
5. Exemplos de Classificadores enquanto meronímia
no processo anafórico:
Em estudos anteriores, Felipe (1998 e 2002) analisou os sob uma
prespectiva morfo-sintático-semântica.
A partir dos dados coletados, através de filmagens, para o Tradutor:
Libras x Português, foi verificado a utilização de classificadores na seleção
do léxico, quando se resgatava a memória textual na utilização de anáforas
indiretas correferenciais. Nesses usos dos classificadores enquanto
meronímias, podemos constatar que subjazem um conhecimento lexical
pré-existencial à essas relações anafóricas, relacionado ao nível pragmático
222
e conhecimento de mundo do usuário.
Por isso, o informante ao se referir ao sinal CASA, ao sinal LIVRO,
ao sinal soletrado T-I-J-O-L-O e ao sinal soletrado M-O-R-R-O, manteve
a progressão tópica, através de um classificador que, estabelecendo a
coesão textual, apresentou uma característica do objeto: objeto pesado,
plano e inclinado que situado no espaço, estabelecia as relações semânticopragmáticas com esse antecedente:
CASA
CASA-À-ESQUERDA
223
Anais do Congresso
224
À guisa de Conclusão
• Esse estudo dos classificadores em função anafórica, inserindo-se no
tipo de abordagem de fenômenos lingüísticos atualmente conhecida como
lingüística de corpus, permite que a interpretação do fenômeno lingüístico
seja baseada na observação dos dados do corpus e não em intuições da
analista;
• Esta descrição, ainda que sumária, permite reiterar a existência de
complementaridade entre a perspectiva léxico-semântica e a perspectiva
cognitivo-textual na análise da funcionalidade do léxico no texto;
• Este princípio, que manifesta uma clara interdependência entre
semântica e pragmática, visível nos sentidos lexicais e no texto, permite
validar a hipótese de que uma teoria baseada no léxico para explicitar
a anáfora é relevante desde que suportada por um esquema cognitivo e
pragmático de análise.
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228
MESAS-REDONDAS NACIONAIS
SIGN LANGUAGE DESCRIPTION:
THEORETICAL AND PRACTICAL
CHALLENGES
Karen Petronio1
A variety of challenges confront us when we try to describe a natural
sign language such as LIBRAS or American Sign Language. To understand
the reason for many of these challenges, this paper starts with a review of
the modality differences between signed and spoken languages. Challenges
created by differences in modality and other factors are then presented.
These include the lack of a written system to accurately represent signed
languages, the diverse language background of deaf people, and the
theoretical issues that can arise when we describe signed languages with
linguistic models designed for spoken languages. In addition to discussing
common challenges, this paper also provides background for Tanya Amare
Felipe’s paper, which is included in these annals.
Modality differences are the most obvious differences between signed
and spoken languages. Spoken languages are aural/oral while signed
languages are visual/gestural. Signed and spoken languages have each
evolved in ways that make maximal use of their modalities, and each have
developed successful, although very different, means for conveying and
receiving linguistics information.
In spoken language, speech is produced by the interaction of the vocal
cords, air flow and the tongue moving to different locations in the mouth.
The mechanisms that produce speech are all located within a small area.
The tongue, also being small, is able to quickly move between different
locations in the mouth. This results in sounds that can be quickly produced,
sequentially one after the other. Sequences of sounds form words which
are then heard and understood by another person.
The structure of signed languages differs. Signs are composed of
combinations of handshapes, movements, palm orientations and locations.
Instead of a relatively small tongue quickly moving to locations within a
small mouth, the larger hands move slowly to locations within a larger area
ranging from the top of the head to the waist. To produce speech, speakers
have only one tongue. However, to produce sign language, signers can use
each hand independently, use their upper and lower face, and additionally
use shifts of their head and body. Information is conveyed sequentially
in both signed and spoken languages. However, the visual/gestural
1
Eastern Kentucky University – EUA.
229
Anais do Congresso
modality additionally allows sign languages to easily convey a great deal of
information simultaneously. For example, each hand can convey different
information, while at the same time, the mouth can provide adverbial
or adjectival information, and the brows provide information about the
sentence type (e.g., a declarative sentence or a question). Although the
components in speech are smaller and allow words to be produced faster
than signs, the ability of sign languages to simultaneously produce several
meaningful units at the same time results in both types of language
conveying information at the same rate.
Modality also affects how we receive languages, and the design of
spoken and signed languages reflects these differences. Our ears hear
best when auditory information is presented sequentially without a great
deal of other simultaneous auditory noise occurring. If there are too many
sounds/noises at one time, particularly if they are loud, we become unable
to hear or process speech. In contrast, our eyes can see and process many
things at the same time. Therefore, it is not a problem to simultaneously
receive information from the hands, the upper and lower face, and various
positions of the head and body. While our eyes and ears are equipped to
handle and produce the simultaneous information that make sign languages
very efficient, this simultaneity can create challenges for those trying to
describe sign languages.
A major challenge resulting from simultaneity is the lack of an
accurate, efficient written representation for signed languages. A written
representation must be able to include information about the signs
(handshape, movement, orientation, location) as well other nonmanual
information including configurations of the brows, mouth, head and body.
There have been attempts at various written representations, but these
are usually rejected due to not being accurate enough and/or being too
cumbersome for efficient use.
For spoken languages, speakers usually know both a spoken and a
written form. A written representation allows ease in writing books,
teaching languages classes, producing study materials, and in giving tests.
The lack of a written representation for signed languages creates a practical
challenge for those involved in teaching or assessing sign language. This
is true for assessing the signing skills of deaf students as well as the skills
of teachers and interpreters. This situation is changing with technological
advances that are making it easy to produce and show signs via digital
video. In the future, the ease of using digital video will help eliminate the
problems associated with not having written representations.
The lack of an accurate written representation has also created theoretical
challenges for linguistics work on sign languages. Since the late 1890’s,
spoken language linguistics have used the International Phonetic Alphabet
230
(IPA) as a standardized way to represent the sounds of any language. When
a linguist writes an article and uses IPA to describe the data, someone else
can read the article and get an accurate understanding of the data. This
is often not the case with sign language research. Because we do not
have an efficient written way to represent sign language, linguists usually
resort to glossing – using a word from the spoken language to represent
a sign. There are two major difficulties with glossing. First, the person
reading a linguistic article that uses glosses is not always sure which signs
the glosses represent; and second, glossing focuses on the signs, with
little or no indication of nonmanual or prosodic components that affect
the grammatically of signed sentences. Not having an accurate way to
represent data has greatly hindered sign language research. Linguists
would write articles supporting or disagreeing with another researcher’s
data -- only to later realize they were not referring to the exact same data
set. Recent advances in technology now allow us to quickly and easily post
sign language data on the internet. This will have a tremendous impact on
research and will help with many of the challenges and misunderstandings
that occurred in the past. People studying and describing signed languages
are now able to actually see the signed data instead of trying to decipher
inadequate written representations.
Another challenge for describing signed languages is due to the
variation that is found in the language background of deaf people. With
spoken languages, hearing babies acquire language from their parents
and, regardless of the language they learn, they go through similar stages
of language acquisition. Research has shown that deaf babies with deaf
signing parents go through the same language acquisition stages as they
naturally acquire language from their deaf parents. However, only 5 to
10% of deaf babies have deaf parents; the remaining 90 – 95 % have
hearing parents. These deaf babies, whose parents do not sign, typically
do not receive the linguistic input that allows them to naturally acquire
language, nor do they go through the acquisition stages in a timely manner.
This results in a wide range of linguistic diversity in the deaf population.
For example, while a small percent of deaf people acquire sign language
naturally from deaf parents, others will learn at a young age when they
attend residential schools for the deaf and become fluent signers, and still
others might not learn any language until a much later age and may never
become fluent.
When research on signed languages first started, researchers did not
always account for the age a deaf person learned sign. For example, some
researchers automatically assumed that if a deaf person signed, they were
fluent in sign language – even if the deaf person did not learn sign until
they were in their twenties. Because of this, some of the early descriptive
231
Anais do Congresso
work on sign language does not accurately describe the language used by
the fluent native signers in the deaf community.
In several countries, including the United States, educators have invented
signed systems in the mistaken belief that the system could accurately
represent a spoken language. In comparison, natural sign languages, such
as LIBRAS and ASL, have naturally evolved within the deaf communities.
The existence of these invented systems creates other interesting challenges
that are not faced by those working with spoken languages. There are some
educators and linguists who do not have an adequate knowledge of signing
and do not distinguish the differences between natural sign languages and
invented systems. Some of these people have innocently published articles
on what they assumed was the sign language used in the deaf community;
however, in reality the signing they studied was based or strongly influenced
by these invented systems.
Another unique challenge faces teachers and students who live in
countries where educators have invented these sign systems. For instance,
when teaching ASL to college students in the United States, students often
come to class and show a sign they learned outside of class. Often this
is an actual ASL sign. However, in some cases, the sign looks odd, does
not fit the phonological patterns of ASL, and the teacher has never see the
sign before. When asked where they learned the sign, student’s replies
include that they learned it from a deaf friend who attended a mainstream
school (where invented signs were used); from a sign language teacher
from another school; from an book or TV; or, more recently, they saw it
on the internet. This creates difficulties because new students do not have
sufficient background to tell if these signs are part of ASL or not. In extreme
cases, unfortunate students have taken a sign class at one university and,
upon transferring to another university, learned that their sign class is not
transferable because it was not ASL, and more sadly that deaf people do
not understand the invented sign system they had learned. This challenge
typically does not face learners of languages such as Spanish or French.
As the field of education is turning more toward a bilingual approach and
the use of invented sign systems becomes less popular, hopefully this
particular challenge will be alleviated for those trying to teach and learn
natural signed languages such as ASL.
I will end this paper by briefly looking at how sign languages research has
impacted the field of theoretical linguistics and challenges we have in these
areas. When research on signed languages first started, most researchers
focused on proving that these were actual languages. Accordingly, this
research looked at similarities, not differences, between signed and spoken
languages. To date, linguistic analysis has successfully shown that signed
languages follow the same phonological, morphological and syntactic
232
principles and have hierarchal structures that are in accord with analyses of
spoken languages.
Looking at similarities has been very fruitful and has strengthened our
understanding of the linguistic properties that are shared by all human
languages. However, in focusing on similarities, many important differences
between signed and spoken languages were ignored or overlooked. When
one seriously addresses these differences, one quickly faces theoretical
challenges. Linguistic theories were based on spoken languages, but these
models often do not have a way to explain or account for features that
result from modality differences. Every natural signed language that has
been studied makes us of space – this is an important area that is creating a
challenge for theoretical linguistics. For instance, research has shown that
space can be used for the following ways in ASL:
•
For comparison and contrasts – e.g., signs related to one concept
can be signed to the left and signs relating to another topic can be signed to
the right.
•
Signers can ‘become’ another character and then act as if they
were addressing and interacting with other imaginary characters located
in the space around the signer. The phonological form of pronouns and
agreement verbs will be determined by the size and location of these
‘imaginary’ characters.
•
Signers can use signs to create an imaginary three-dimensional
‘model’ in the space in front of them. Prepositional relations, usually
conveyed by separate morphemes in spoken languages, are conveyed by
where signs are positioned in relation to each other in three-dimensional
space.
•
Space is often used for conveying concepts relating to time. Signs
for the past often reference space behind the signer, and signs for the future
reference space in front of the signer.
The challenge is determining how to treat the use of space and how do
we notate the various spatial locations in the phonological forms of signs.
In spoken languages, the pronunciation of a word has a given form which
we can transcribe using IPA. In signed languages the forms or pronouns
and agreement verbs differ depending on the type of space that is being
use and where previous ‘entities’ occurred withiin the space. In addition to
challenge of these signs not having a set form, another challenge occurs in
determining how we should deal the different uses space. For instance, is
this use of space ‘strictly’ linguistic, or is the linguistic system interacting
with another conceptual component that we use for visualizing and creating
imagery? This is one of the examples of a current challenge that many sign
language linguists are currently exploring.
233
Anais do Congresso
In this paper, we have touched on several challenges faced by those trying
to describe sign languages. We started by looking at modality differences
and saw the different ways that information can be conveyed and received.
We then looked the difficulties that are due to signed languages not having
an adequate efficient written representational system. This was followed
by a brief look at the various language backgrounds that can be found in the
deaf community and how this creates further challenges. This paper has
ended with a look at how signed languages use space, and briefly discussed
some of the theoretical challenges that space presents to linguistic models
that were developed for spoken languages. The information in this paper
has provided background for Tanya Amare Felipe’s paper, included in the
annals, which presents an in-depth look a constructions commonly referred
to as classifiers. As will be shown in that paper, classifiers create their own
set of practical and theoretical challenges for linguists - these constructions
have been found in all natural signed languages, yet have characteristics
very different from what we find in spoken languages.
234
Comunicações
COMUNICAÇÕES
ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE
NO ATENDIMENTO AO PACIENTE SURDO
Neuma Chaveiro*
Maria Alves Barbosa**
Celmo Celeno Porto***
Objetivo: analisar a atuação dos profissionais da saúde no atendimento
ao paciente surdo.
Método: estudo de natureza descritivo-analítica, com abordagem
qualitativa. Participaram da pesquisa onze pessoas surdas; todas utilizavam
a língua de sinais para se comunicarem.
Resultados
Para os sujeitos desse estudo, são raros os profissionais da saúde que
sabem língua de sinais ou que aproveitam recursos visuais para facilitar
a relação. Identificaram-se também muitos obstáculos a serem superados,
destacando-se a ineficiência na comunicação, podendo chegar ao extremo
de sentirem-se impedidos de buscar assistência; falta de confiança nos
profissionais da saúde e nos intérpretes. Verificou-se que o princípio
bioético da autonomia não está sendo respeitado.
CONCLUSÃO: pacientes surdos e profissionais da saúde, quando se
encontram, deparam-se com barreiras comunicativas que comprometem o
vínculo a ser estabelecido e a assistência prestada, podendo interferir no
diagnóstico e no tratamento. Ficou clara a necessidade de as instituições
públicas oportunizarem programas que visem à formação dos profissionais
da área de saúde para um adequado atendimento aos pacientes surdos.
Mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de Goiás. Fonoaudióloga do Centro Estadual de Apoio ao Deficiente e Intérprete da Língua Brasileira
de Sinais (LIBRAS). Email: [email protected]
** Professor Adjunto III, Doutora em Enfermagem, Docente da Faculdade de
Enfermagem da Universidade Federal de Goiás. Email: [email protected]
*** Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de
Goiás. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da
Universidade Federal de Goiás. Email: [email protected]
*1
237
Anais do Congresso
A linguagem não-verbal é um recurso de comunicação que precisa ser
conhecido e valorizado na prática das ações em saúde. Mesmo que não se
conheça a língua de sinais, é fundamental interpretar seus aspectos suprasegmentais.
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BARNETT, S. Communication with deaf and hard-of-hearing people: a
guide for medical education. Acad Med. New York, v. 77, n. 7, p. 694-700.
jul. 2002.
CHAVEIRO, N.; BARBOSA, M.A. Assistência ao surdo na área de saúde
como fator de inclusão social. Revista da Escola de Enfermagem. São
Paulo, USP, v. 39, n.4, p.417-422, dez. 2005.
DINIZ, D. Autonomia reprodutiva: um estudo de caso sobre a surdez.
Cadernos de Saúde Pública. Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, p. 175-181. jan./
feb. 2003.
HUDSON, R. Including deaf patients in the conversation. Fam Pract
Manag. United States, v. 11, n. 6, p. 37-40, nov./dec. 2004.
LEZZONI, L.I.; O’DAY, B.L.; KILLEEN, M.; HARKER, H.
Communicating about health care: observations from persons who are deaf
or hard of hearing. Ann Intern Med. United States, v. 104, n. 5, p. 356362, mar. 2004.
MCALEER, M. Communicating effectively with deaf patients. Nurs
Stand. Nottingham, v. 20, n. 19, p. 51-54, jan. 2006.
MEADOR, H.E.; ZAZOVE, P. Health care interactions with deaf culture. J
Am Board Fam Pract. Michigan, v. 18, n.3, p. 218-222, may/june. 2005
238
COMUNICAÇÕES
PINDORAMA: UMA PLATAFORMA
COMPUTADORIZADA COMO FERRAMENTA
NA PRODUÇÃO TEXTUAL DE CRIANÇAS
ESCRITORAS SURDAS ENTRE 7 E 12 ANOS
DE IDADE
Lívia Monnerat Castro*
Carlo Emmanoel Tolla de Oliveira**
Carla Verônica Machado Marques***
O Pindorama é um jogo computadorizado que tem como objetivo servir
de meio mediacional para a produção de textos através da elaboração
dirigida e metacognição. O jogo oferece a ambientação virtual para a
construção de aventuras, que promovem a oportunidade de estruturar o
pensamento narrativo na condição de autor escritor. As aventuras criadas
podem ser compartilhadas, provocando a interação social para a construção
do texto como uma atividade social colaborativa.
A construção é feita a partir da montagem seqüenciada de um
mapa conceitual referente à estrutura textual narrativa (apresentação,
desenvolvimento, clímax e desfecho). O tema depende apenas do que for
proposto pelo professor e do interesse dos alunos.
Além disso, a ferramenta provoca a elaboração de regras gramaticais
generativas, ou universais, envolvidas na construção sintática de sentenças
na língua portuguesa, pois o programa exige, como ponto de partida,
apenas o verbo e o objeto, não sendo necessários conectivos para construir
automaticamente as frases que compõem o texto. Esse procedimento inicial
solicita o uso de uma linguagem verbal formada por itens lexicais, que se
assemelha à estrutura da LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), tornando
o Pindorama uma ferramenta de mediação ímpar no processo de aquisição
de escrita por crianças surdas.
PPGI-NCE-UFRJ. E-mail: [email protected]
PPGI-NCE-UFRJ. E-mail: [email protected]
***
INES. E-mail: [email protected]
*
**
239
Anais do Congresso
Bibliografia
ALLIENDE, F.; CONDEMARÍN, M. Leitura, Teoria, Avaliação e
Desenvolvimento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987.
SEMINÉRIO, F. L. P. Elaboração dirigida: um caminho para o
desenvolvimento metaprocessual da cognição humana. FGV; ISSO,
1987.
_____. Metaprocesso: a chave do desenvolvimento cognitivo:
desenvolvimento cognitivo: uma reavaliação da pedagogia
contemporânea. FGV; ISOP, 1988.
240
COMUNICAÇÕES
A CONSTRUÇÃO DE CONCEITOS
CIENTÍFICOS POR ESTUDANTES SURDOS
Gisele Morisson Feltrin*
Paulo Salles**
Uma das maiores dificuldades no aprendizado de Ciências relaciona-se
à apropriação da linguagem científica (WELLINGTON e OSBORN, 2001).
A compreensão de como os estudantes aprendem conceitos científicos tem
sido tema de interesse para pesquisas em ensino de Ciências. Entretanto,
compreender o processo ensino-aprendizagem desses conceitos, por
estudantes surdos, constitui um campo específico de investigação. A
especificidade lingüística dos surdos faz de sua escolarização uma situação
complexa, que interfere na construção de conceitos científicos. Salles,
Salles e Bredeweg (2004) apontam a importância dos modelos qualitativos
na educação de surdos. Apoiado nesse enfoque, o presente trabalho
apresenta o uso de modelos qualitativos como ferramenta capaz de dar
suporte aos alunos surdos na aquisição de conceitos e no aprendizado da
língua portuguesa.
Bibliografia
WELLINGTON, J.; OSBORN, J. Language and Literacy in Science
Education. Open University Press, McGraw-Hill, 2001.
SALLES, H.; SALLES, P.; BREDEWEG, B. Qualitative reasoning in the
education of deaf students: scientifc education and aquisition of portuguese
as a second language. In: 18th International Workshop on Qualitative
Reasoning (QR2004). Evanston Illinois, EUA. Proceedings of the 18th
International Workshop on Qualitative Reasoning, 2004.
*
PPGEC-UnB. E-mail: [email protected]
IB-UnB. E-mail: [email protected]
**
241
COMUNICAÇÕES
O FILOSOFAR EXPRESSO PELO CORPO
Péterson R. Costa*
Neste trabalho o autor aborda a construção e expressão dos conceitos
filosóficos a partir do corpo e sua capacidade de movimento e visão. Busca
responder basicamente a pergunta: o sujeito surdo é capaz de construir,
pensar, expressar e discutir conceitos filosóficos? Sua resposta é dada a partir
da psicologia sociointeracionista, que concebe a aquisição da linguagem
e o processo de abstração fortemente ligado ao meio social em que o
sujeito está inserido. No pensamento de Merleau Ponty, o autor encontra a
possibilidade da expressão e compreensão dos conceitos filosóficos a partir
da percepção do movimento e visão do corpo.
Palavras- Chave: Merleau Ponty. Sociointeracionismo. Língua de
Sinais. Movimento. Visão. Corpo.
ABSTRACT
In this work the author approaches the construction and expression of
the philosophical concepts from the body and its capacity of movement and
vision. Search to answer the basically question: Is the deaf citizen capable
of constructing, of thinking, of expresing and of arguing philosophical
concepts? The answer is given by social interaionist psychology strongly
conected which conceives the acquisition of language and the process of
abstraction to the social environment where the citizen is inserted. In the
thought of Merleau Ponty the author finds the possibility of the expression
and understanding of the philosophical concepts from the perception of the
movement and vision of the body.
Key Words: Merleau Ponty. Social-Interacionist. Language of Signals.
Movement. Vision. Body.
Graduado em Filosofia, capacitado em Educação Especial Surdez, intérprete de
LIBRAS. E-mail: [email protected]
*
242
Bibliografia
BERNARDINO, Ediléa Lúcia. Absurdo ou lógica? Os surdos e sua
produção lingüística. Belo Horizonte: Sinai, 2000.
BOTELHO, Paula. Segredos e silêncios na educação de surdos. Belo
Horizonte: Autêntica, 1998.
FERNANDES, Eulália. Linguagem e surdez. Porto Alegre: Artmed,
2003.
GOLDFELD, Márcia. A criança surda: linguagem e cognição numa
perspectiva sócio-interacionista. São Paulo, SP: Plexus, 1997.
LABORIT, Emmanuelle. O vôo da gaivota. São Paulo: Best Seller, 1994.
PONTY, Maurice Merleau. O olho e o espírito. São Paulo: Abril Cultural,
1980.
_____. Signos. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
QUADROS, Ronice M.; KARNOPP, Lodenir B. Língua de Sinais
Brasileira: estudos lingüísticos. Porto Alegre: Artemed, 2004.
SACKS, Oliver. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. São
Paulo, SP: Companhia das Letras, 1998.
243
COMUNICAÇÕES
A AQUISIÇÃO DE CLASSIFICADORES NA
LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA
Elidéa Lúcia Almeida Bernardino*
O sistema de classificadores na Língua de Sinais Brasileira, como em
outras línguas de sinais, é bastante complexo e demanda tempo para ser
usado com maestria. A aquisição de classificadores, em um ambiente em
que a criança tem contato com a língua de sinais desde o nascimento, é
algo que só ocorre plenamente por volta dos oito ou nove anos de idade,
devido à complexidade dessas construções (KANTOR, 1980; SCHICK,
1990; EMMOREY, 2002). As crianças surdas que só têm acesso à língua de
sinais após entrarem para a escola, e normalmente não têm bons modelos
de surdos sinalizadores, entretanto adquirem e usam classificadores
quando têm necessidade de expressar alguma informação que não possa
ser expressa de outra forma. Teriam os gestos caseiros alguma influência
nessa aquisição? (GOLDIN-MEADOW, 2003) Será que a criança percebe
a iconicidade existente nos classificadores, sem que ela seja exposta a
sinalizadores fluentes? Quais seriam as estratégias que ela usa para tentar
passar essas informações? Este trabalho é uma pequena mostra da pesquisa
de doutorado realizada pela autora e procura mostrar como é o sistema
de classificadores usado pelos surdos adultos brasileiros e quais fatores
influenciam na aquisição desse sistema.
Doutora em Lingüística Aplicada pela Boston University. E-mail: elidea@
pucminas.br
*
244
Bibliografia
BERNARDINO, Elidéa L. A. The acquisition of classifiers in verbs
of motion and verbs of location in Brazilian Sign Language. 2006.
Dissertação (Doutorado em Lingüística Aplicada).Boston, MA (USA):
Boston University, 208 p.
BOYES-BRAEM, P. Features of the handshape in American Sign
Language. 1981. Tese (Unpublished doctoral dissertation) Berkeley:
University of California, 254 p.
EMMOREY, Karen. Language, cognition and the brain: insights from
Sign language research. Mahwah, NJ and London: Lawrence Erlbaum
Associates, Publishers, 2002. 383 p.
GOLDIN-MEADOW, Susan. The resilience of language: what gesture
creation in deaf children can tell us about how all children learn language.
New York, Hove: Psychology Press, 2003. 262 p.
KANTOR, R. The acquisition of classifiers in American Sign Language.
Sign language studies, 28 p. 193-208, 1980.
SCHICK, Brenda. The acquisition of classifier predicates in American
Sign Language. 1987. Tese (unpublished doctoral dissertation). Purdue
University. 127 p.
SUPALLA, Ted. Structure and acquisition of verbs of motion and
location in American Sign Language. (s.d.) Tese. (unpublished doctoral
dissertation) San Diego: University of California.
245
COMUNICAÇÕES
ENTRE LÍNGUAS E CAMINHOS: UMA
PROPOSTA DE ATUAÇÃO DO INTÉRPRETE
DE LIBRAS-LP NO CONTEXTO
EDUCACIONAL
Carlos Henrique Rodrigues*
Fernando Eustáquio Guedes**
Nesta apresentação, abordaremos questões surgidas a partir da
investigação da atuação do intérprete de Libras– LP em salas de
aula mistas e em salas somente de surdos. Este estudo adotou uma
perspectiva interpretativa, guiada pelas teorias e métodos oferecidos pela
Sociolingüística, para a identificação, análise e triangulação de “casos
expressivos” e tem como objetivo compreender aspectos sociolingüísticoculturais presentes no processo de tradução e interpretação nesse contexto
singular. Para isso, examinou-se como os intérpretes organizam sua
atividade interpretativa, como utilizam técnicas e recursos interpretativos
e como lidam com os “problemas de interpretação” decorrentes da
desinformação, do desconhecimento de conceitos e da relação de
equivalência tomada como base para construção da interpretação. Adotouse como referência para esta apresentação estudo desenvolvido no Centro
de Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas
com Surdez, de Minas Gerais – CAS-MG, durante o segundo semestre de
2006. A partir da análise de casos expressivos, examinaram-se os desafios
enfrentados pelos intérpretes educacionais no processo de construção de
um entendimento comum dos objetivos e das formas de participação nas
atividades pedagógicas a serem desenvolvidas em sala, bem como questões
culturais e lingüísticas evidenciadas durante esse processo.
Intérprete de Libras, especialista em Educação Inclusiva, mestrando em Educação – CAS-MG/ Uni-BH/ Fame-BH/ Fae-UFMG.
E-mail: [email protected]
**
Intérprete de Libras, tecnólogo em Comunicação Assistiva – CAS-MG/ Puc
Minas. E-mail: [email protected]
*
246
Bibliografia
ALVES, Fábio. Tradução e Interpretação na perspectiva da Surdez: a busca
de semelhança interpretativa sob a ótica do princípio de relevância. In:
CEALE/ Anais do I Seminário sobre linguagem, leitura e escrita de
surdos. Belo Horizonte: FAE/UFMG, 1998, p.184-191.
AMMANN, Margret. O Problema das diferenças culturais na interpretação.
In: Tradução: alvos e ferramentas. IV Encontro Nacional de Tradutores.
São Paulo: USP/FFLCH/DLM/CET, 1990, p.213-216.
BERNARDINO, Elidéa Lúcia. O papel do intérprete na Educação de
Surdos. In: CEALE/ Anais do I Seminário sobre linguagem, leitura e
escrita de surdos. Belo Horizonte: FAE/UFMG, 1998, p.164-173.
COKELY, D. Sign language Interpreter and Interpreting, SLS
Monographs Series Linstok Press, 1992.
COUTINHO, D. M. D. et. al. O Intérprete da LIBRAS: um olhar sobre a
prática profissional. In: MEC/ Anais do Seminário: Surdez: desafios para
o próximo milênio. SEE/ INES. Rio de Janeiro: INES, 2001. p.77-86.
ISHAM, W. P. Signed language interpreting. In: BAKER, Mona. Routledge
encyclopedia of translation studies. London; New York: Routledge, 1998,
p. 231-235.
LUCIANO, A. H. T. A Interpretação simultânea sob a ótica da lingüística
Aplicada. Campinas, SP: [s.n.], 2005.
MEHAN, H. The Structure of Classroom Events and their Consequences
for Student Perfomance. In: PERRY, G. & ALLAN, G. Children in and out
of school. University of Pensylvania: The Center for Applied Linguistcs,
1982.
PAGURA, R. A Interpretação de Conferências: interfaces com a
tradução escrita e implicações para a formação de intérpretes e
tradutores. D.E.L.T.A., 19: ESPECIAL, (209-236), 2003.
ROSA, A. S. Entre a visibilidade da tradução da língua de sinais e a
invisibilidade da tarefa do intérprete. Campinas, SP: [s.n.], 2005.
247
COMUNICAÇÕES
PROBLEMATIZANDO O ENSINO DE
MATEMÁTICA PARA SURDOS NA ESCOLA
INCLUSIVA: O PROFESSOR DE
MATEMÁTICA E INTÉRPRETE
DE LÍNGUA DE SINAIS
Luiz Cláudio Nóbrega Ayres1
Lucyenne Matos da Costa2
No Brasil, com a questão da escola inclusiva, os alunos surdos vêm
tendo dificuldade de aprender matemática na sala de aula, principalmente
quando dependem do intérprete para que ocorra a aprendizagem, pois o
professor não está habilitado a trabalhar com alunos surdos. Por isso, esses
alunos perdem a oportunidade de ter uma qualidade nos estudos. Entretanto,
a legislação atual incentiva a inclusão escolar dos alunos surdos, garantindo
o direito de estarem na escola regular, dentro de sala de aula. Então, entram
em cena os intérpretes, que não estão preparados didaticamente em relação
às práticas de aulas de matemática, geralmente nem conhecem o conteúdo
passado pelo professor. Como conseqüência, as avaliações são retratadas
com o fracasso no processo dos alunos surdos. Eu, como professor surdo
de matemática, encontro algumas falhas interpretadas em aula.
Este relato de experiência vem tratar de métodos criados por mim em
sala de aula, construídos no cotidiano com os alunos surdos no ensino
de multiplicação e fração. Trata-se de métodos que levam em conta a
visualização das operações e a compreensão na troca de informações entre
professor surdo e aluno surdo, valorizando assim ambas as identidades.
Enfim, os surdos precisam visualizar as operações em suas mãos e é
necessário que o professor saiba LIBRAS. É complicado contar com o
intérprete nessa relação ensino-aprendizagem.
Professor surdo de Matemática em LIBRAS na Escola Estadual de Educação
Oral e Auditiva e professor surdo Bilíngüe de língua de sinais. Aprendendo a
Matemática em LIBRAS para Surdos. 2007. Artigo(formação de professor
bilíngüe) – pós-graduação em Educação, da Universidade Federal do
Espírito Santo, Vitória, 2007. E-mail: [email protected]
2
Mestre em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Professora
Bilíngüe e intérprete de língua de sinais. Coordenadora do trabalho com surdos no
município de Vila Velha no estado do Espírito Santo.
E-mail: [email protected]
1
248
COMUNICAÇÕES
A AQUISIÇÃO DA TEORIA DA MENTE PELA
CRIANÇA SURDA
Laura Cristina Stobäus*
Sylvia Beatriz Joffily**
A Teoria da Mente é a capacidade de inferir os pensamentos e as
intenções dos outros. É a partir dela que a criança se socializa. De acordo
com Thommen e Rimbert (2005), ela se instala na mente da criança aos
18 meses de idade cronológica. Este recurso cognitivo favorece não só os
relacionamentos como também a aprendizagem.
Para a aquisição da Teoria da Mente são necessárias habilidades que
pressupõem a coordenação atencional de um par social e de um objeto de
interesse mútuo; dentre elas estão: o olhar compartilhado, a comunicação
através de gestos, o gesto de apontar, a imitação e, mais tarde, o uso de
uma linguagem verbal. Se a linguagem possui um papel fundamental na
aquisição da Teoria da Mente, as crianças surdas apresentam um atraso
significativo neste aspecto da cognição. De acordo com Russel et al. (1998),
elas só atribuem estados mentais aos outros tardiamente, por volta dos 13
anos.
Esta comunicação tem como finalidade conscientizar as pessoas que
convivem com indivíduos surdos das dificuldades que eles enfrentam para
estabelecer relações sociais.
Mestranda em Cognição e Linguagem do Centro de Ciências do Homem da
Universidade Estadual do Norte Fluminense - Darcy Ribeiro -UENF. Pesquisadora no Núcleo de Pesquisas e Estudos em Neuropsicologia Cognitiva – NEPENC.
Formação na Prática Psicomotora Aucouturier. Graduada em Psicomotricidade
pelo UNI-IBMR. Contato e-mail: [email protected]
**
Doutora em psicologia pela Université Louis Pasteur – Strassburg – França.
Professora do programa de pós-graduação em Cognição e Linguagem do Centro
de Ciências do Homem da Universidade Estadual do Norte Fluminense – Darcy
Ribeiro. Coordenadora do Núcleo de Pesquisas e Estudos em Neuropsicologia
Cognitiva – NEPENC. Contato e-mail: [email protected]
*
249
Anais do Congresso
Bibliografia:
RUSSEL et al. The Development of Theory of Mind in Deaf Children. In:
Journal of Child Psychology Psychiatry, vol. 39 (6), 1998, págs. 903910.
THOMMEN, Évelyne; RIMBERT, Guillaume.
connaissances sur autrui. Paris: Belin sup, 2005.
250
L’enfant
et
les
COMUNICAÇÕES
UMA EDUCAÇÃO E ESCOLAS LÍQUIDAS?
UMA OUTRA FORMA DE SE TRABALHAR
COM OS ALUNOS COM NECESSIDADES
EDUCATIVAS ESPECIAIS NO ENSINO REGULAR A PARTIR DA EDUCAÇÃO
INCLUSIVA?
Leny Magalhães Mrech*
A Educação atual vem passando por uma série de mudanças. De uma
educação pautada em um modelo da modernidade sólida (Bauman), onde a
transmissão se dava através de um modelo normativo, passamos para uma
proposta que se renova a cada momento. De que maneira este processo
afeta ao aluno que apresenta necessidades educativas especiais? Como ele
altera as relações entre alunos e professores no Ensino Regular?
Este trabalho visa discutir a passagem da Modernidade Sólida
para a Modernidade Líquida e a maneira como ela vem trazendo certas
modificações para os contextos educativos. Neste caso, analisaremos a
passagem da escola da modernidade sólida para a escola da modernidade
líquida, identificando um novo processo de formação do professor a
partir dos referenciais trazidos pela Educação Inclusiva e a Modernidade
Líquida.
O referencial que adotaremos parte de autores como Zigmunt Bauman,
Anthony Giddens e da perspectiva psicanalítica freudiana e lacaniana.
Estudaremos mais detidamente os efeitos destas transformações no processo
de constituição dos professores, destacando os seus aspectos emocionais.
Professora Livre Docente da Faculdade de Educação da Universidade de São
Paulo. Psicóloga, Socióloga e psicanalista. Coordenadora Geral do Núcleo de
Pesquisa de Psicanálise e Educação da Faculdade de Educação da Universidade de
São Paulo. E-mail: [email protected]
*
251
Anais do Congresso
Bibliografia
BAUMAN, Zigmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 2001.
_____. O mal-estar na pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 1998.
_____. Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005.
FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização. Rio de Janeiro: Editora
Imago, 1997.
_____. O Futuro de uma Ilusão. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1997.
252
COMUNICAÇÕES
LÍNGUA DE SINAIS E IMPLANTE COCLEAR
NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA
ESCRITA
Esmeralda Figueira Queiroz*
Celeste Azulay Kelman**
Esta pesquisa tem como objetivo analisar a influência da oralidade e da
língua de sinais no processo de aquisição da escrita de uma criança surda
com implante coclear. O sujeito pesquisado é filho de pais surdos e recebeu
o implante aos quatro anos, quando já era fluente em língua de sinais. É o
único aluno surdo em uma classe de alfabetização de uma escola particular.
A maioria dos estudos sobre a escrita dos surdos dedica-se às produções
textuais de surdos em séries mais avançadas do nosso sistema educacional.
Nessas séries, as formas próprias de suas construções tornam-se visíveis
e representam problemas para os professores das escolas regulares. Na
concepção teórica adotada, a teoria histórico-cultural do desenvolvimento
humano, a escrita é entendida como um elemento cultural de aprendizagem
social. O estudo realizado utilizou a análise microgenética das observações
no ambiente da sala de aula. Através desta modalidade metodológica, buscase a inserção na complexidade e nas minúcias que envolvem o processo,
possibilitando a descrição e interpretação dos episódios selecionados.
Os resultados apontam para a necessidade urgente da compreensão de
que língua de sinais e implante coclear podem contribuir igualmente na
alfabetização de uma criança surda, influenciando-se mutuamente.
Mestranda em Educação da Universidade de Brasília.
E-mail: [email protected]
**
Professora do Programa de Pós Graduação em Educação da
Universidade de Brasília.
*
253
Anais do Congresso
Bibliografia
FERNANDES, E. (Org.) Surdez e bilingüismo. Porto Alegre: Mediação,
2005.
VIROLE, B. A influência dos implantes cocleares no desenvolvimento
sócio-afetivo da criança surda. In: Surdez e Escolaridade: desafios e
reflexões. II Congresso Internacional do INES e VIII Seminário Nacional
do INES. Rio de Janeiro: INES, 2003, p. 39-47.
VYGOTSKY, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. São
Paulo: Martins Fontes, 2001.
VYGOTSKY, L. S. Obras Escogidas, Tomo V: Fundamentos de
Defectología. Madrid: Visor, 1997.
254
COMUNICAÇÕES
UTILIZAÇÃO DO CONCEITO DE
REABILITAÇÃO OROFACIAL E
CORPORAL CASTILLO MORALES
NA SÍNDROME DE WAARDENBURG
Leny Meirelles1
INTRODUÇÃO
A síndrome de Waardenburg é caracterizada pela associação da surdez
com anomalias pigmentares.
OBJETIVO
Utilizar o Conceito de Reabilitação Orofacial e Corporal Castillo
Morales na síndrome de Waardenburg, no INES.
MÉTODO
A família de I., um menino de quatro anos, procurou atendimento
no INES após ser constatada a síndrome de Waardenburg e a deficiência
auditiva neurossensorial profunda bilateral. A avaliação fonoaudiológica
revelou que apresentava um atraso significativo no desenvolvimento
global
Fonoaudióloga do INES,
Terapeuta do Conceito de Reabilitação Castillo Morales e
Mestranda de Fonoaudiologia da UVA.
[email protected]
1
255
Anais do Congresso
TERAPIA
Iniciou na Estimulação Precoce. A terapia fonoaudiológica foi elaborada
abordando o desenvolvimento das habilidades auditivas e de acordo com
o Conceito Castillo Morales,que é reconhecido atualmente em diversos
países do mundo. Prioriza em seus atendimentos, a individualidade de
cada paciente, suas capacidades, respeita o tempo de desenvolvimento
individual e este deve ser observado como condição fundamental para as
aprendizagens. As famílias devem ser orientadas para colaborar e atuar
como guias.
RESULTADOS PARCIAIS
Avaliando qualitativamente o seu desenvolvimento, verificou-se
que a intervenção vem propiciando a atenção indispensável para um
melhor desempenho de suas capacidades funcionais, reorganização
no desenvolvimento sensório motor, regulação orofacial, corporal e
dos padrões respiratórios para estimular a fala. Comunica-se através de
gestos expressivos, fazendo uso da leitura orofacial para compreender as
mensagens.
Bibliografia
ANNUNCIATO,N. O Sistema Auditivo e os Processos Plásticos do
Sistema Nervoso: Revista Espaço, n. 14, p. 37-43, Rio de Janeiro: INES,
2000.
DOUGLAS,C.R. Tratado de Fisiologia aplicado à Fonoaudiologia:
S.Paulo: Robe Editorial, 2002.
MORALES, R. C. Terapia de Regulação Orofacial: São Paulo: Editora
Memnon, 1999.
READ AP, NEWTON VE. Waardenburg syndrome. J Med Genet n. 34,
p. 656-665, 1997.
RUSSO, L. C. P., SANTOS, T. M. M. Audiologia Infantil: São Paulo:
Editora Cortez, 1984.
YOSHINAGA, I. et al. Language of early-and-later-identified children
with hearing loss.: Pediatrics ( American Academy of Pediatrics), v. 102,
n.5, Colorado, EUA, 1998.
256
COMUNICAÇÕES
AS POLÍTICAS PÚBLICAS E A
IMPLANTAÇÃO DO ATENDIMENTO
FONOAUDIOLÓGICO À SURDOCEGUEIRA
EM PERNAMBUCO
Wanilda Maria Alves Cavalcanti1
Luiz Carlos Souza Bezerra2
A surdocegueira constitui-se uma condição única com características
próprias, podendo trazer conseqüências negativas para o desenvolvimento
global, principalmente no que se refere à comunicação, educação e interação
no ambiente onde está inserida. As políticas públicas, nos últimos anos
têm estimulado a atenção a essas pessoas através de programas específicos.
No entanto, percebe-se que os recursos humanos e materiais ainda são
bastante reduzidos o que dificulta a implementação das atividades. Dentre
os profissionais envolvidos o fonoaudiólogo pode trazer contribuições
efetivas para a melhoria da comunicação do surdocego, possibilitando o
acesso à informação através da adoção da comunicação alternativa dentre
as quais as abordagens Co-ativas. O presente estudo tem como objetivo
identificar a inserção do fonoaudiólogo nos atendimentos ao surdocego.
Mapeamos um reduzido número de profissionais que se dedicam a esse
atendimento, por esse motivo, a amostra constituiu-se de dois gestores,
duas fonoaudiólogas e duas pedagogas. Os dados foram analisados através
de uma metodologia qualitativa utilizando os referenciais de teóricos de
Minayo. Os resultados evidenciaram que as políticas públicas ainda não
conseguiram o seu objetivo uma vez que a sociedade não está devidamente
instrumentalizada para tal fim, ou seja, os serviços da saúde e educação são
precários e desarticulados.
MINAYO, M. C. S.Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. 10 ed.
Petrópolis: Vozes, 80p., 1998.
Doutora em Psicologia, professora da graduação e coordenadora do mestrado em
Ciências da Linguagem da Universidade Católica de Pernambuco.
E-mail: wanilda [email protected]
2
Estudante de Fonoaudiologia pela Universidade Católica de Pernambuco.
E-mail: [email protected]
1
257
Anais do Congresso
TEXTOS NÃO-DISPONIBILIZADOS
Não foram disponibilizados os textos das apresentações abaixo. Os interessados deverão entrar em contato com os autores.
“O difícil são as palavras”: discursos e práticas”:
discursos e práticas na escolarização de alunos surdos
Palestrante: Drª. Wilma Favorito
E-mail: [email protected]
Panorama internacional da educação de surdos nos últimos 150 anos
Palestrante: Maria Aparecida Leite Soares
E-mail: [email protected]
A influência do diagnóstico no desenvolvimento da criança surda
Palestrante: Maria Cristina Simonek
E-mail: [email protected]
258
Realização
INES
Instituto Nacional de
Educação de Surdos
Secretaria
de Educação
Especial
Ministério
da Educação
GOVERNO FEDERAL