Anais 2008
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Anais 2008
Anais do Congresso INES: 150 anos no Cenário da Educação Brasileira De 26 a 28 de Setembro de 2007 VI CONGRESSO INTERNACIONAL E XII SEMINÁRIO NACIONAL DO INES De 26 a 28 de Setembro de 2007 Rio de Janeiro/RJ INES: 150 ANOS NO CENÁRIO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA Ministério da Educação Secretaria de Educação Especial Instituto Nacional de Educação de Surdos PRESIDENTE DA REPÚBLICA Luiz Inácio Lula da Silva MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO Fernando Haddad SECRETARIA DE EDUCAÇÃO ESPECIAL Cláudia Pereira Dutra INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS Marcelo Ferreira de Vasconcelos Cavalcanti DEPARTAMENTO DE DESENVOLVIMENTO HUMANO, CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO Leila de Campos Dantas Maciel COORDENAÇÃO DE PROJETOS EDUCACIONAIS E TECNOLÓGICOS Alvanei dos Santos Viana DIVISÃO DE ESTUDOS E PESQUISAS Maria Inês Batista Barbosa Ramos CIP - BRASIL. Catalogação na fonte Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ. S474s Congresso INES: 150 Anos no Cenário da Educação Brasileira (2007, Rio de Janeiro,RJ) Congresso INES: 150 Anos no Cenário da Educação Brasileira. De 26 a 28 de setembro de 2007/ (organização) INES. Divisão de Estudos e Pesquisas - Rio de Janeiro Inclui bibliografia I.INES 150 anos - Educação - Congresso: I. Instituto Nacional de Educação de Surdos (Brasil). Divisão de Estudos e Pesquisas. II. Título II. Título 96-2048 CDD - 371.912 CDU - 373.33 131296 161296 002373 ANAIS DO CONGRESSO INES: 150 ANOS NO CENÁRIO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA EDIÇÃO Instituto Nacional de Educação de Surdos COMISSÃO EXECUTIVA Drª Monique Mendes Franco (INES/UERJ) Profª Ms. Janete Mandelblatt (INES/ISBE) REVISÃO Comissão Executiva de Publicação DIAGRAMAÇÃO Gibbor Brasil IMPRESSÃO Santa Clara Editora TIRAGEM 4.000 exemplares Instituto Nacional de Educação de Surdos Rua das Laranjeiras, 232 CEP 22 240 - 001 Rio de Janeiro - RJ - Brasil Telefax: (21) 2285-7284 e 2205-0224 e-mail: [email protected] Sumário CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS Formação do intérprete Karen Petronio............................................................16 Bera - diferentes leituras e interpretações Ulf Rosenhall...............................................................24 Bilingüismo e educação Kristina Svartholm........................................................26 CONFERÊNCIAS NACIONAIS Inclusão escolar e desigualdades sociais José Geraldo Silveira Bueno.........................................29 Terapia fonoaudiológica na área da surdez Cilmara Levy...............................................................39 Adaptações curriculares no contexto da educação inclusiva Rosana Glat................................................................42 Possibilidades de escrita pelos surdos Marianne Stumpf.........................................................48 PAINÉIS INTERNACIONAIS Ines 150 anos Solange Rocha............................................................57 Jean François Dutheil...................................................60 Surdocegueira e deficiência múltipla: panorama educacional da América Latina Helena Burgés Olmos..................................................73 Sara Nolla..................................................................77 Marcia Regina Gomes.................................................86 MESA-REDONDA INTERNACIONAL Educação de surdos: desafios para as próximas décadas Ulf Rosenhall.............................................................................. 96 MESAS-REDONDAS NACIONAIS Corporeidade e surdez Marise Pedalino....................................................................... 100 Ana Regina Griner.................................................................... 105 José Leopoldo Vieira................................................................. 109 Políticas públicas educacionais Cláudia Pereira Dutra............................................................... 114 Roseni Cardoso........................................................................ 120 A língua escrita como segunda língua: uma experiência de letramento Elaine da Rocha Baptista Plaisant.............................................. 127 Maria Cristina da Cunha Pereira............................................... 138 Panorama internacional da educação de surdos nos últimos 150 anos Leila Couto Mattos................................................................... 146 O ensino superior bilíngüe Maria Marta Costa Ciccone...................................................... 150 Vilmar Silva.............................................................................. 154 Aquisição da língua de sinais por surdos adultos: Condição para a escolaridade Vera Regina Loureiro................................................................ 162 Gladys S. Carvalho.................................................................. 166 A influência do diagnóstico no desenvolvimento da criança surda Ana Lúcia do Nascimento......................................................... 170 A família em discussão Rosária de Fátima Corrêa Maia................................................. 177 Fátima Gonçalves Cavalcante................................................... 187 Sujeitos surdos no contexto das novas tecnologias Rita Maria de Souza Couto....................................................... 192 Maria Cristina da Cunha Pereira............................................... 201 Surdez e transtornos invasivos do desenvolvimento Paulo Mattos............................................................................ 206 Roberta Pinheiro Lima............................................................... 207 Descrição da língua de sinais: desafios teóricos e práticos Tanya Amara Felipe (FENEIS)..................................................... 215 Karen Petronio......................................................................... 229 COMUNICAÇÕES Atuação dos profissionais da saúde no atendimento ao paciente surdo Neuma Chaveiro Maria Alves Barbosa Celmo Celeno Porto................................................................. 237 Pindorama: uma plataforma computadorizada como ferramenta na produção textual de crianças escritoras surdas entre 7 e 12 anos de idade Lívia Monnerat Castro Carlo Emmanoel Tolla de Oliveira Carla Verônica Machado Marques............................................ 239 A construção de conceitos científicos por estudantes surdos Gisele Morisson Feltrini Paulo Salles............................................................................. 241 O filosofar expresso pelo corpo Péterson R. Costa..................................................................... 242 A aquisição de classificadores na Língua de Sinais Brasileira Elidéa Lúcia Almeida Bernardino............................................... 244 Entre línguas e caminhos: uma proposta de atuação do intérprete de Libras-LP no contexto educacional Carlos Henrique Rodrigues Fernando Eustáquio Guedes..................................................... 246 Problematizando o ensino de matemática para surdos na escola inclusiva: o professor de matemática e intérprete de língua de sinais Luiz Cláudio Nóbrega Ayres Lucyenne Matos da Costa......................................................... 248 Aquisição da teoria da mente pela criança surda Laura Cristina Stobäus Sylvia Beatriz Joffily................................................................... 249 Uma educação e escolas líquidas? Uma forma de se trabalhar com os alunos com necessidades educativas especiais no ensino regular a partir da educação inclusiva. Leny Magalhães Mrech............................................................. 251 Língua de sinais e implante coclear no processo de construção da escrita Esmeralda Figueira Queiroz Celeste Azulay Kelman.............................................................. 253 Utilização do conceito de reabilitação orofacial e corporal Castilho Morales na Síndrome de Waaedenburg Leny Meirelles.......................................................................... 255 As políticas públicas e a implatação do atendimento fonoaudiológico à surdocegueira em Pernambuco Wanilda Maria Alves Cavalcanti Luiz Carlos Souza Bezerra......................................................... 257 Textos não-disponibilizados. ............................................. 258 Conferências Internacionais CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS THE INTERPRETER EDUCATION PROGRAM KAREN PETRONIO1 The fields of interpreting and interpreter education are in different stages in different countries, or even in different parts of the same country. While there are differences, the overall goal of any interpreter education program is the same: to train more qualified individuals who can successfully interpret between a spoken language and a signed language.This paper starts with a look at factors affecting interpreter education in the United States and then gives a detailed description of one 4-year program. The fields of interpreting and interpreter education are in different stages in different countries, or even in different parts of the same country. While there are differences, the overall goal of any interpreter education program is the same: to train more qualified individuals who can successfully interpret between a spoken language and a signed language. This paper starts with a look at factors affecting interpreter education in the United States and then gives a detailed description of one 4-year program. Looking at our past helps us understand how things have come to be and provides guidance for where we want to go in the future. Currently, in the United States, as in many places throughout the world, there is a great need for qualified sign language interpreters. One response to this has been the development of more than 170 interpreter education programs throughout the United States. This seems like a large number of programs; however, there is great variation in the design of the programs, the qualification of the faculty, and the success rate of the students. For instance, while some programs graduate a high percentage of students who become skilled interpreters and remain in the field, there are other programs where only a small number of graduates actually become working interpreters In this paper, I start by taking a historical view of different factors that have influenced the field of interpreter education in the United States. After looking at these factors, I will describe in detail the structure, design and philosophy of an interpreter education program where I have worked for the past 12 years. At this program, which is under the Department of American Sign Language (ASL) and Interpreter Education at Eastern Kentucky University, our goal is to provide an education that will prepare 1 16 Eastern Kentucky University -EUA students to enter and remain in the field, and to leave with the tools that will allow them to continue developing their skills so they can pass the national interpreter certification test. Before looking at the details of our interpreter education program, it is important to look at the many factors that have shaped our field and influenced programs such as ours. These factors included the growth of organizations relating to the field of interpreting, changes in who becomes an interpreter, changes in the models of what interpreters should be doing, and changes in the length of interpreter training programs. Growth in Organizations Related to the Field of Interpreting: In the United States, the first workshop for sign language interpreters was held in 1964. At this workshop, a group of people formed an organization, which was later called the Registry of Interpreters for the Deaf (RID). Through the years, RID has offered three different types of certifications tests. The most recent test, developed by working collaboratively with the National Association of the Deaf (NAD), is called the National Interpreter Certification (NIC). To become NIC certified, an interpreter must first pass a written test and then take a performance test, which includes questions about ethics. RID currently has chapters in 48 states, has numerous local and regional conferences, and hosts a national conference every two years. A newsletter and journal keep its 12,000 members updated and informed of various issues that impact the field of interpreting. In the 1970’s, the federal government funded several interpreter training programs throughout the United States. The early teachers for these programs were usually RID- certified interpreters who had no experience in teaching. In the late 1970’s, many of these teachers formed an organization called the Conference of Interpreter Trainers (CIT). CIT has a newsletter, a journal and a national conference every two years to promote effective teaching practices and research in the field of interpreter education. The teaching of interpreting skills is a crucial part of all interpreter education programs. However, skills can only be taught if students have a strong foundation in English and ASL. The concern and need for qualified ASL teachers lead to the formation of the American Sign Language Teachers Association (ASLTA) in 2002. This organization certifies ASL teachers, has state chapters and offers local, regional and national workshops focusing on best practices for teaching ASL. As the number of interpreter education programs were increasing, organizations, such as CIT, RID, NAD and ASLTA, became concerned 17 Anais do Congresso with the quality of these programs. CIT took the lead and, with input from many other organizations, developed National Interpreting Standards for interpreter training programs and dreamed of having a body to accredit interpreter training programs. Their dream came true in 2006, with the establishment of the Commission of Collegiate Interpreter Education (CCIE). Now, one year after it was formed, CCIE has accredited one interpreter training program (the University of New Hampshire) and has several programs in various stages of the accreditation process. All of the above organizations (RID, NAD, CIT, and ASLTA) have shaped and continue to influence the growing field of interpreter education. Changes in characteristics of people becoming interpreters Before interpreter training programs started, the largest number of people who functioned as interpreters were usually from families with deaf members, often hearing children of deaf adults (CODAs). The second largest group of the early interpreters were people who learned sign language through their churches. After RID was established in 1964, workshops were offered, articles written and interpreters started appearing in public venues. People slowly started realizing that interpreting could be a career option. In addition to interpreters who had deaf family members and those who came from the churches, in the late 1970’s, many hearing people who had deaf friends and were involved in the deaf community started becoming interpreters. Continuing through the 1980’s, it appears that the majority of interpreters started learning their signing skills through, and been nurtured by, the deaf community. Starting in the 1990’s, we saw an increase in two new groups of students who are becoming interpreters. The first group includes young students who arrive at college with the desire to become an interpreter, even though they have never met a deaf person or taken a sign language class. The second group consists of students who enter interpreter training programs after taking ASL classes during high school or have learned ASL from a deaf peer who was mainstreamed in their public school. In contrast with people who previously had become interpreters, these new students are arriving without any prior experience or with only having met one or two deaf people (their teachers or their deaf peers). This has implications for interpreter training programs because now, in addition to the students we 18 were use to - those having prior experience in the deaf communities, we are now also getting an increasing number of students who arrive without this background. Changes in the model of what interpreters should do Along with changes in the characteristics of people who are becoming interpreters, the expectations of what interpreters should do has also changed. Before the establishment of RID, sign language interpreting was not viewed as a profession. The earliest interpreters were family members and people associated with the church who interpreted to help with communication. At times, helping with communication extended to helping with other matters, which could include ‘helping’ with or making decisions for the deaf person. This type of role became known as the ‘helper model’. Over time, as deaf people obtained better education and jobs, and as NAD and RID worked on a Code of Ethics for interpreters, the helper model was rejected and replaced with the extremely opposite ‘machine model’. Under the machine model, the role of the interpreter was to strictly sign everything that was said and say everything that was signed. If a person started talking, the interpreter immediately started signing; if a person started signing, the interpreter immediately started talking. The machine model did not account for the modality differences of the languages (visual/ gestural vs. auditory/spoken), nor did it allow any time for the interpreter to understand the message or consider how to convey the message in the other language. Interpreting was a very fast-paced activity of replacing words with signs, and signs with words. Eventually many interpreters started developing carpel tunnel syndrome from overuse, and both deaf and hearing people realized they were having trouble understanding the intent and meaning of the interpretations produced using the machine model. The 1990’s saw the introduction of the ‘Interpreting Process Model’ by Betty Colomonous. This Process Model respected ASL and English as two separate languages and recognized that interpreters need time to process and understand a message before they can accurately convey the message in another language. Although there are other models, the basic concepts of the Process Model are still in use today by many interpreters and interpreter training programs in the United States. 19 Anais do Congresso Changes in the length of interpreter education programs When interpreter training first started, it was common to hear of threemonth, six-month or nine-month programs. By the 1980’s, the majority of programs were longer, and two-year programs became the norm. However, unless a student entered a two-year program with adequate signing skills, it was difficult, if not impossible, to teach enough sign language and interpreting skills in two years to prepare students to enter the field. In the 1990’s, many programs started changing to four-year programs. In 2007, information on RID’s webpage lists 72 two-year programs and 37 four-year programs. Of the two-year programs, an increasing number require that students have proven signing skills before they start the program. A Description of a Four-Year Interpreter Education Program Below I will describe the design of the 4-year Interpreter Training Program at Eastern Kentucky Program where I have worked for the past 12 years. Our program is an example of a program that started as a two-year program in the 1980’s and then changed to a 4-year program in the 1990’s. In describing our program, I will start with a description of the faculty and then give an overview of our program, including the application and selection process. Our program currently has six teachers. Two of the teachers are deaf; two are hearing with deaf parents; and two are hearing. All of the teachers are RID certified and/or ASLTA certified. The hearing teachers were all interpreters before they became teachers, and all continue to do community interpreting. In terms of academic degrees, two teachers have their Doctoral Degree, three have a Masters Degree, and one has a Bachelor’s degree. In addition to going to the regular classes, we also have a sign language lab that students must attend as part of their ASL classes. The lab staff consists of four deaf people: a sign lab manager, an assistant manager and two part-time people (usually one or both are students). The graphics below show an overview of our four-year program: Year 1 and 2 Prerequisites/Preparatory and General Education Classes Applyinf, Interviews & Selection Process Years 3 and 4 Advanced ASL, Interpreting Knowledge & Skill Classes 20 As shown in the above, in the first two years, the students take prerequisite and general education classes. In the spring of their second year, they apply for admission to the program. The arrow coming from the left shows that students from other schools, if they meet the prerequisites, can also apply to our program. After our interview and screening process, the selected students then continue on to the third and fourth year, which are almost all ASL and Interpreting classes In the first two years, in addition to general education classes required to get a four-year bachelors degree, students take the following preparatory/prerequisite courses: • • • • • Four ASL classes: ASL 1, 2, 3, and 4 Fingerspelling and Numbers Deaf Culture Professional Ethics and Issues in Interpreting Processing Skills for Interpreters Each of these 3-credit classes meets three hours a week during 16-week semesters. Students taking ASL classes are also required to attend the sign lab at least one hour a week. For the ASL and Fingerspelling and Numbers classes, we try to limit the number of students to 20; lecture classes, such as Deaf Culture and Professional Ethics and Issues in Interpreting, are larger. In the spring of their second year, students apply for admission into our program. In order to meet the prerequisite requirements, students must have already taken or be enrolled in the classes listed above, except for the Fingerspelling and Numbers class. In addition, students must submit a letter of intent, two letters of recommendation, take an English test offered in our department, and have a grade point average of at least 2.5. Students completing these requirements can then schedule an interview. The interview is conducted in ASL and, ideally, involves all the faculty members. After the interview, each faculty member scores applicants for signing skills, knowledge, and disposition. These scores, along with the applicant’s grade point average and English test scores, are used to rank all applicants. The size of our faculty and our resources determine the number of students that we can accept; we typically select the top 20 – 22 students every two years. This careful selection process has allowed us to successfully teach students who are very motivated, who are remaining in the field after they graduate, and who are becoming nationally certified within a few years of graduation. After students are accepted into the program, they continue taking intense classes to prepare them with the knowledge and skills necessary to become a successful interpreter. In the third year, and the first semester of the fourth year, students take the following classes: 21 Anais do Congresso • • • • • • • • 2 ASL classes (ASL 5 and 6) 2 Sign to Voice classes 2 Voice to Sign classes 2 Specialized Topics classes 2 Linguistics classes 1 Deaf History class 1 Business Practice class 1 Pre-Practicum class With the exception of the Business Practice class, each of these classes is three-credits and meets three hours per week for 16 weeks. Students also take five supporting classes offered by other departments; these include: Anthropology, Public Speaking, Introduction to Special Education, and Education of the Deaf and Hard-of-Hearing. In the Pre-Practicum class, which they take in the first semester of their fourth year, students prepare portfolios that include video samples of their interpreting work. This is the semester the students decide where they want to do their internships and send letters, with their portfolios, to the different places. In the second semester of their final year, students are out in the community doing a fulltime internship under the guidance of professional interpreters. Intern sites can be within our state and at other locations throughout the United States. Sites have included interpreter referral agencies, residential schools for the deaf, community services for the deaf, vocational rehabilitation, and even theatrical interpreting at Disney World. For the past several years, we have had a graduation rate of over 95% and also a very high percentage of students who continue in the field and later become nationally certified. I will end with the comment that although we think our program is good, we are continually discussing and modifying classes, materials and technology to try to best prepare our students to become successful interpreters with the right attitudes and skills. 22 References Most of the agencies I have mentioned in this paper have websites where you can obtain further information. This includes: National Association of the Deaf, www.nad.org Registry of Interpreters for the Deaf, www.rid.org Conference of Interpreter Trainers, www.cit-asl.org American Sign Language Teachers Association, www.aslt.org Commission on Collegiate Interpreter Education, www.ccie-accreditation.org You can find more information about the our interpreter education program at www.interpreting.eku.edu . At this website you can see an further descriptions for each of four years including a suggested list of classes for each semester and descriptions for each class. During the presentation, a video was shown that a student made about the interpreting program at EKU. We hope to soon have this on our web page. For now, you can view it by going to www.youtube.com and then entering ‘EKU Promo’ in the search box. 23 CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS BRAINSTEM EVOKED RESPONSES – READINGS AND INTERPRETATIONS Ulf Rosenhall1 Brainstem evoked responses (BERA or ABR, auditory brainstem responses) was described for the first time in 1967, 40 years ago. Ten years later it was introduced as a clinical method in audiological practice, and it has changed audiological diagnostic procedures profoundly. However, during the last decade its diagnostic capacity has been challenged. ABR is an evoked response test in which short acoustic stimuli generate electrical potentials in the cochlear nerve and the brainstem. These potentials are recorded with far-field technique, and processed with computerised technique. An ABR consists of five reproducible waves. Auditory physiological research has shown that waves I and II are generated in the cochlear nerve, wave III in the cochlear nuclei, and wave V in the superior olivary complex. One great advantage with ABR is that the responses are robust, reproducible, uninfluenced by sleep, and not overly sensitive to anaesthetics. The following abnormalities can be defined in an ABR-recording: 1) prolongation of absolute latencies of the waves, 2) prolongation of interpeak latencies (IPLs), 3) prolongation of interaural time difference (ITD), 4) loss of later ABR-waves, 5) loss of all ABR-waves, 6) reduced amplitude of wave V and 7) abnormal configuration and increased variability. Applications/indications of ABR: 1) Diagnosis of sensorineural hearing loss. ABR is the best audiological method to differentiate between cochlear and retrocochlear hearing loss. In a retrocochlear lesion there is a pattern of latency prolongations of wave V, the I-V IPL, and the I-III IPL. The interaural time difference is generally abnormal. Loss of ABR-waves is another common abnormal pattern. For large vestibular schwannomas (acoustic tumours) the sensitivity of ABR is 100%. However, for small vestibular schwannomas (< 1 cm) the sensitivity is unacceptably low, between 58% and 92% according to a review of recent literature. 2) Assessment of hearing thresholds. ABR is an objective audiometric method for patients that are difficult to test. It is most often used in pediatric audiology. ABR gives an estimate of the hearing capacity in the high frequency range. Methods to test discrete frequencies have been 1 24 Karolinska University Hospital/Karolinska Institutet, Stockholm, Sweeden developed. The method is of the utmost importance for assessing hearing in infants who have failed in neonatal hearing screening. 3) Diagnosis of auditory neuropathy. ABR is of decisive importance to diagnose this audiological entity, preferably at an early time. The diagnosis can be suspected when speech perception is poor, and is established by abnormal ABR in combination with normal OAEs. 4) Peroperative monitoring. ABR can be used to monitor the hearing capacity and brainstem function during surgery for vestibular schwannomas and posterior fossa surgery. 5) Other indications. ABR can be used to detect neurological lesions in the upper brainstem (pons and mesencephalon). Modern imaging techniques, above all MRI, have almost totally replaced ABR for this indication. Conclusions and prospects: ABR has for many decades been one of the most important tools in audiological diagnostic practice. There is a clear trend that pediatric hearing assessment in is becoming its most important indication. The capacity of ABR to diagnose small vestibular schwannomas has been questioned. One way to deal with this problem is to define scrupulous indications aiming to screen for low risk cases. Another way is technique development, and there is promising research in progress to improve the diagnostic capacity of ABR, e.g. by the so called stacked ABR technique. 25 CONFERÊNCIAS INTERNACIONAIS BILINGUALISM AND EDUCATION Kristina Svartholm1 Tbeen in the forefront within the area bilingual education for the deaf for long. Swedish Sign Language was recognized as a language in its own right by the Swedish Parliament as early as in 1981 and need of bilingualism among the deaf was officially acknowledged (1). Since then many efforts have been made in order to develop an educational situation within the special schools for the deaf and hard of hearing in Sweden that enhances this special kind of bilingualism. In my lecture I will present some of the developmental work that has been carried through within the Swedish special schools as well as the research basis for this work (2). One important source is linguistic research about the two languages: what are the most important similarities and differences between them, how can they best be described so that efficient teaching is promoted, how can this linguistic information be applied in the educational situation? Another source is research about bilingualism among the hearing: what methods known from teaching hearing children two languages can be used with the deaf and what adaptations must be made in order to gain successful results? And what is there to learn from research about literacy in general as well as about literacy for the hearing in a bilingual context? I will also present some of the main results from our last 25 years of experience from bilingual education. In the Swedish National Curriculum, valid since 1994, it is stated that the special schools are responsible for ensuring that “… all pupils, who are deaf or have impaired hearing, on completing school are bilingual”(3). How can this goal be defined – and how is it fulfilled today? Other important questions concern the growing number of children with cochlear implants that attend the special schools for the deaf in Sweden (4). Their parents claim for bilingualism for them and they are offered spoken language as an alternative to Swedish Sign Language as the language of instruction in these schools – but what is their actual need of bilingualism? And what is the difference, if any, between their bilingualism and the bilingualism for the deaf? 1 26 Stockholm University, [email protected] References Svartholm, Kristina 1993. Bilingual Education for the Deaf in Sweden. Sign Language Studies 81, 291–332. Svartholm, Kristina 2005. Teaching Literacy to Deaf Learners. In Cortese, Giuseppina / Duszak, Anna (eds) Identity, Community, Discourse. English in Intercultural Settings. Bern: Peter Lang, 345-358. LPO 94 1994. Information on the 1994 Curriculum for the Compulsory School System LPo94. Stockholm: Swedish Ministry of Education and Science. Svartholm, Kristina 2007. Cochlear-Implanted Children in Sweden’s Bilingual Schools. In Komesaroff, Linda (ed.) Surgical Consent. Bioethics and Cochlear Implantation. Washington, D.C.: Gallaudet University Press, 137-150. 27 Conferências Nacionais CONFERÊNCIAS NACIONAIS EDUCAÇÃO ESPECIAL, INCLUSÃO ESCOLAR E DESIGUALDADES SOCIAIS José Geraldo Silveira Bueno1 RESUMO Este trabalho tem por finalidade analisar a educação especial como uma das expressões dos processos de inclusão/exclusão escolar e a sua relação com a origem social dos alunos, particularmente aqueles do ensino básico, na medida em que parte do princípio de que a escola no Brasil, pelo menos desde o advento da República, possui um duplo caráter: de um lado, de seleção e classificação social, e de outro, de promotora do acesso aos bens culturais necessários à inserção social. Nesse sentido, embora não restrinja as causas desse fracasso exclusivamente às condições sociais de origem, especialmente as econômicas, por considerar que esta perspectiva reduz fenômenos altamente complexos a uma única causa, considera que, no caso da sociedade brasileira, que possui um dos piores indicadores de distribuição de renda do mundo, com uma vasta população abaixo da linha da miséria, as condições econômicas da população não podem ser ignoradas, sob o risco de produzirmos investigações sobre processos e sujeitos abstratos. Com base nessa perspectiva, procura analisar o fenômeno da escolarização de alunos com surdez, em nosso País, a partir de três eixos de análise: os processos de escolarização e a seletividade escolar no Brasil; as políticas de inclusão escolar; e a surdez como patologia ou condição. Introdução Quero deixar público os meus mais sinceros agradecimentos pelo honroso convite do Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES, do Ministério de Educação, para participar do VI Congresso Internacional do INES e XII Seminário Nacional, INES: 150 anos, evento da mais alta importância e que reúne um conjunto de especialistas nacionais e estrangeiros voltados para os mais diversos temas envolvendo a surdez. Vou procurar, neste trabalho, polemizar algumas questões teórico- 1 Professor Titular do PEPG em Educação: História, Política, Sociedade - PUC/SP E-mail: [email protected] 29 Anais do Congresso políticas sobre a surdez, sem a pretensão de que meus argumentos sejam aceitos, mesmo porque mesmo que eu a tivesse, nada garantiria a priori que ela se concretizasse de fato. Mas, exatamente em respeito ao caráter plural do conhecimento que deve existir numa sociedade democrática, a minha única pretensão é a de que eu seja ouvido (e interpretado em LIBRAS), nada mais. Assim, vou desenvolver as minhas reflexões sobre três eixos: - os processos de escolarização e a seletividade escolar no Brasil; - as políticas de inclusão escolar; e - a surdez como patologia ou condição. Processos escolar de escolarização e seletividade Os processos de escolarização em nosso país, especialmente os voltados para o período de escolarização obrigatória e da atual educação básica, têm se caracterizado, via de regra, por seu caráter de seletividade que dificulta aos membros das camadas populares atingir níveis mais elevados de escolarização. Se, no passado, os processos de seletividade se davam pelo não acesso ou pelas retenções e evasões provocadas pela repetência escolar, no momento atual, com a ampliação das possibilidades de acesso para a quase totalidade de crianças com idade de ingresso no ensino fundamental, e pelos mecanismos de redução da repetência (sistema de ciclos, regime de progressão continuada, programas paralelos de recuperação, etc.), esta seletividade se expressa fundamentalmente pelos baixos índices de aprendizagem que continuam afetando, de forma contundente, os alunos provenientes dos estratos sociais mais empobrecidos. Considerando que o fracasso escolar, expresso por formas diferenciadas de seleção e classificação dos alunos, em diferentes momentos históricos, é marca constitutiva do sistema escolar brasileiro desde a Independência, os processos de seletividade escolar têm sido uma das grandes preocupações que acompanham a produção intelectual sobre a educação escolar desde, pelos menos, o período republicano, especialmente a partir das primeiras décadas do século XX. Dessa forma, a organização do sistema escolar e o desenvolvimento de processos pedagógicos que respondessem aos interesses da maioria da população brasileira têm sido as “pedras de toque” para a implementação de reformas e das análises de proposições políticas desde, pelo menos, o advento da República. Sob a mesma justificativa, se disseminaram propostas educacional- 30 pedagógicas, neste largo período, abrangendo desde a defesa da escola nova em contraposição ao ensino tradicional, até os atuais Parâmetros e Diretrizes Curriculares para o Ensino Fundamental, Médio e Educação Infantil, passando por proposições nacionais e/ou locais regionais, como os antigos Programas de Ensino para a Escola Primária, os trabalhos produzidos no âmbito do convênio PABAEE2 , pelos Guias e Propostas Curriculares de diferentes Estados brasileiros. Por fim, no âmbito das unidades de ensino, foram desenvolvidas práticas escolares que tiveram, e ainda têm, como núcleo central, a finalidade de reduzir os índices de fracasso, como a organização de suas atividades em torno de centros de interesse, de junção de disciplinas, de trabalho interdisciplinar, de reorganização e remanejamento de turmas e de adoção de diferentes metodologias de ensino para as distintas disciplinas escolares, como a adoção da “matemática moderna” ou os processos de alfabetização baseados em novas correntes teóricas, que vão desde a adoção do “método global”, até aqueles com base em Ferreiro & Teberosky (1986) ou Vygotsky (1989 e 1996). Políticas de inclusão escolar Se é verdade que a seletividade escolar se abate fundamentalmente sobre os alunos oriundos das camadas populares, não se pode negar que o acesso à escola brasileira, da educação infantil ao ensino superior, foi sendo ampliado de forma significativa, desde o início do século XX, com a educação básica, em especial o ensino obrigatório, chegando, ao final do século, a se constituir efetivamente como “escola de massa”, e que hoje as oportunidades desse acesso são muito maiores do que foram em épocas passadas. No momento atual, as políticas educacionais brasileiras, assim como em praticamente todo o planeta, têm como uma de suas bandeiras mais significativas a da inclusão escolar de todas as crianças, entre elas as crianças com deficiência. Tanto é assim, que parte de literatura acadêmica nacional, que se volta para análises conceituais e políticas, se refere ao “paradigma da inclusão”, tecendo críticas sobre as formas de implementação que não se baseiam nos princípios fundamentais desse paradigma. (Cf. Mrech, 1999). Da mesma forma, boa parte dessa produção afirma que a inclusão nasceu nos países escandinavos, passou para os Estados Unidos, se disseminou pelo mundo e 2 Programa de Assistência Brasileiro-Americana ao Ensino Elementar desenvolvido pelo Centro Regional de Pesquisas Educacionais, de Minas Gerais, a partir da década de 1950. 31 Anais do Congresso culminou com a Declaração de Salamanca, em 1994, quando foi instaurado o novo paradigma, que deveria substituir o da integração, ultrapassado e conservador. Se, no entanto, nos reportarmos ao texto original da Declaração, constataremos que a população que ela denomina como “com necessidades educacionais especiais” não se confina às pessoas com deficiência, bem como não há uma referência sequer aos termo “inclusão” e “educação especial”. Ao contrário, por considerar que a escola atual, tal como foi sendo construída historicamente, não conseguiu incorporar com qualidade uma gama imensa de crianças e jovens com características orgânicas, psicológicas, sociais e culturais, a Declaração recomenda que seja adotadas políticas educacionais que efetivem a incorporação de toda e qualquer criança, desde aquelas que possuem deficiência, até as que apresentam alguma necessidade temporária, passando pelas minorias étnicas, pelos meninos de rua, pelas comunidades nômades, etc. Em nosso país, parece ocorrer uma inversão dessa perspectiva, quando as próprias orientações oficiais confinam as políticas de inclusão escolar à educação especial, como se pode verificar na Resolução do CNE que estabelece as diretrizes nacionais da educação especial, definida como modalidade que visa garantir a educação escolar e a promover o desenvolvimento das potencialidades dos educandos que apresentam necessidades educacionais especiais, em todas as etapas e modalidades da educação básica. (Brasil. CNE. Resolução n. 02/01, Art. 3º). Isto é, a resolução emanada do órgão oficial competente amplia o âmbito da educação especial a todos alunos com necessidades educacionais especiais. Poder-se-ia, entretanto, argumentar que o Conselho estaria considerando o termo necessidades educativas especiais como sinônimo de deficiência, mas não é o caso, quando se verifica que, no inciso I, do artigo 5º, considera como tal os educandos que apresentam dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento que dificultem o acompanhamento das atividades curriculares, de um lado, ligadas a condições relacionadas a condições, disfunções, limitações ou deficiências (item “b”) e, de outro, aquelas não vinculadas a uma causa orgânica específica (item “a”). Ora, quem são os alunos que apresentam dificuldades acentuadas de aprendizagem ou limitações no processo de desenvolvimento por causas não vinculadas a um fator orgânico específico? Pelo teor da própria Resolução, seriam todos aqueles indicados na Declaração de Salamanca, com exceção das crianças deficientes (crianças bem dotadas; crianças que vivem nas ruas e que trabalham; crianças de populações distantes ou nômades; crianças de minorias lingüísticas, étnicas ou culturais e crianças de outros 32 grupos ou zonas desfavorecidos ou marginalizados), e que não deveriam ser incluídas no âmbito restrito da educação especial, mas de uma política global de qualificação da educação nacional que abrangesse, inclusive, os alunos deficientes, estes sim, atendidos por políticas educacionais que respondessem às suas características peculiares. Ao criar uma proposição política ambígua e imprecisa, o CNE contribui, para a criação ou, no mínimo para a manutenção, de uma situação de indefinição em relação à instauração de políticas educacionais que se contraponham àquelas que têm historicamente privilegiado o caráter seletivo e excludente da educação escolar brasileira. Mas, além de diminuir a amplitude das recomendações de Salamanca, o fato de não incluir a inclusão escolar de alunos com deficiência no âmbito de uma política global de incorporação, pela escola básica, de todas as crianças e jovens, esta perspectiva contribui, também, para que se continue a tratar os primeiros como se a única marca que implica na sua exclusão escolar fosse a da limitação causada pela deficiência, reiterando uma visão abstrata e a-histórica dessa população, pois que não leva em conta as outras marcas sociais que constituem a identidade dos sujeitos, em especial as de classe, raça e gênero. A surdez: patologia ou condição? Em contraposição a essa perspectiva, que reduz a problemática da inclusão escolar à educação especial, o grupo de pesquisa que coordeno na PUC/ SP tem procurado desenvolver investigações, exatamente na inter-relação entre as marcas advindas da deficiência e a construção da identidade social desses sujeitos, com privilegiamento daquelas originárias de suas condições econômico-sociais, de gênero e de raça na expectativa de oferecermos nossa contribuição para a compreensão mais aprofundada dos processos de inclusão/exclusão escolar das crianças e jovens com deficiência. É a partir dessa perspectiva, de procurar analisar a relação entre os processos de escolarização e a deficiência, não restrito somente às suas marcas, que apresento algumas reflexões críticas sobre determinados postulados, hoje hegemônicos, no campo da educação de surdos. Uma das bases de sustentação da corrente sócio-antropológica da surdez e do bilingüismo, pelo menos no Brasil, tem sido a crítica ao conceito da surdez como patologia, porque o conceito de deficiência advém exclusivamente da medicina. Vale a pena refletirmos sobre esta afirmativa, pois a crítica ao conceito 3 Publicado originalmente em francês em 1865. 33 Anais do Congresso de patologia construído pela medicina moderna, tal como encarado por parte dos defensores do bilingüismo, não leva em consideração que, mesmo nesse campo, ele foi objeto de polêmicas e de disputas, desde pelo menos o estudo clássico de Claude Bernard (1978), Introdução à Medicina Experimental3 , até os nossos dias, passando por pensadores como Canguilhem (1982), Basaglia (1986) e tantos outros. Isto é, dependendo da ótica do teórico, a patologia, como conceito advindo do saber médico, adquire conotação muito diversa e até mesmo antagônica. Porém, do ponto de vista biológico, quem pode fazer avançar o conhecimento? Segundo as mais avançadas correntes da epistemologia, Habermas (1989), por exemplo, não cabe nem mais à filosofia fazer a crítica epistemológica ao conhecimento científico, mas exatamente à própria disciplina científica, na medida em que o conhecimento de cada uma delas é hoje tão vasto, complexo e diversificado, que fica praticamente impossível que uma crítica consistente possa ser feita por pensadores de fora dela. De qualquer forma, o que a medicina, no mínimo, pode nos oferecer (e ela fez precisamente isto) é o conhecimento cada vez mais consistente dos efeitos sobre o organismo de qualquer tipo de afecção. Se ela ultrapassou este limite, cabe, sim, fazer a crítica, mas não a todo e qualquer conhecimento que a ”visão médica” conseguiu produzir nestes cerca de 400 anos de estudos, investigações e intervenções. É verdade, entretanto, que a perspectiva médica que se tornou hegemônica, desde, pelo menos a obra de Bernard, foi a do positivismo, mas isto não faz com que todo e qualquer saber médico deva ser encarado como tal. Da mesma forma que a corrente do bilingüismo, a perspectiva sócioantropológica da surdez nasce da crítica da visão reducionista sobre os sujeitos surdos, originária da concepção médica e, nesse sentido, contesta a surdez como patologia, afirmando que ela é uma condição produzida por uma apropriação viso-manual do mundo que se diferencia do ouvinte. Apesar de se denominar sócio-antropológica, esta abordagem teórica se prende exclusivamente ao caráter patológico da surdez: a marca distintiva entre surdos e ouvintes é de que os primeiros não ouvem e os segundos, sim, com os últimos sendo encarados como opressores dos primeiros por imporem uma língua que não corresponde às características destes, o que Skliar (1997) cunhou de “ouvintismo”. Ao não levar em consideração as mais diferentes marcas de vida que levam à construção da identidade social dos indivíduos, entre elas o fato de que os surdos não ouvem, esta corrente não consegue se desvencilhar de uma visão reduzida, pois procura produzir conhecimento sobre um sujeito com base somente em uma única marca: a da surdez. Isto é, fala-se de um 34 sujeito abstrato, que não tem sexo, idade, naturalidade ou nacionalidade, cujas condições sociais de origem não fazem diferença: são todos membros de uma mesma comunidade, cujo ponto em comum é somente uma marca, a da surdez. Para finalizar, não poderia deixar de me referir a um radicalismo exacerbado dos defensores do bilingüismo e da corrente sócioantropológica de recusa a qualquer espécie de debate com opositores de suas perspectivas. Embora eu não aceite esta atitude sectária e intransigente por parte dos surdos, ela é compreensível, na medida em que parece que aqueles que não comungam com essa perspectiva estejam reiterando uma visão estreita e preconceituosa sobre ele, mesmo que, em nenhum momento, esta tivesse sido a intenção, mas que pode ser assim interpretada por quem sofre na carne as discriminações e preconceitos por ser surdo. O que mais me espanta são profissionais e acadêmicos se recusarem a ouvir quem não se coaduna com suas idéias, não porque elas fossem obrigatoriamente melhores, mas porque expressam um sectarismo e uma intransigência naqueles que, por dever de ofício, deveriam ser os baluartes da pluralidade de idéias porque, é no embate entre diferentes concepções, que poderão ser construídas novas perspectivas de análise e de práticas sociais. À guisa de fechamento Para terminar estas breves reflexões, gostaria de apresentar neste encontro, em que, com certeza, minha posição é minoritária, alguns princípios básicos que têm norteado as investigações do grupo de pesquisa pelo qual sou responsável na PUC/SP, em especial aquelas investigações, com base especialmente nas contribuições de Bourdieu (1998), sobre os processos de escolarização de alunos surdos. (Cukierkorn, 1996 e 2005; Illiano, 2001; Santos, 2002; Oliveira, 2005; Souza, 2005; Dantas, 2006; Viana, 2006; Mendonça, 2007) Reitero que uma das perspectivas teóricas possíveis, não ultrapassada e com consistência, é aquela que considera que uma lesão orgânica nos órgãos dos sentidos (entre eles, o da audição) gera uma limitação, uma deficiência, enfim, um quadro organicamente patológico. Segundo, que as comunidades de surdos, na medida em que estabelecem práticas sociais e relações significativas entre os seus membros são, sim, produtoras de culturas, aqui entendidas como as sínteses dessas práticas individuais e coletivas. Entretanto, estas práticas individuais e coletivas não parecem ser tão distantes, nem completamente distintas, em sua essência, das manifestações culturais praticadas pelos ouvintes de comunidades próximas. 35 Anais do Congresso Terceiro, que o fato de que muitas comunidades de surdos utilizarem a língua de sinais como padrão lingüístico comum, não pode ser encarado como uma escolha ético-política, mas como uma decorrência de determinadas formas de organização social, historicamente construídas, assim como foram criadas todas as línguas utilizadas pelo homem. Quarto, que a deficiência auditiva severa ou surdez não é razão suficiente para que todos aqueles afetados por ela sejam incapazes de se apropriar da língua majoritária, desde que lhes sejam oferecidas condições e recursos que favoreçam o acesso a ela. Quinto, que sujeitos surdos cujas trajetórias pessoais singulares resultaram na apropriação da língua oral como forma básica de comunicação não podem ser considerados nem como inimigos da surdez, nem como indivíduos que não possuem uma identidade adequada. Se considerarmos que a identidade social é construída nas relações sociais concretas, esses sujeitos têm, sim, uma identidade, nem melhor nem pior do que aqueles que convivem em comunidades de surdos, mas simplesmente identidades distintas. Sexto, que a história dos sujeitos com esse tipo de deficiência não comprova, de forma nenhuma, que, embora discriminados e vítimas de preconceitos, eles tivessem sido “oprimidos” pelos ouvintes, como se todos esses últimos fossem algozes dos primeiros. Na verdade, a história mostra que os processos de opressão estavam e estão intimamente relacionados a outros fatores, em especial, aqueles relacionados à origem social. Oprimidos e quase dizimados foram os índios brasileiros; processos de opressão se abateram sobre os negros escravos; ambos, pelo caráter predatório da América colonizada, cuja dívida social está sendo paga de forma muito distinta, em razão da extrema diferença entre as formas como essas etnias foram tratadas pelo colonizador branco: - aos índios, ao lado de uma possível integração na sociedade, deve-se dar a garantia de preservação de espaço geográfico onde possa preservar a sua cultura, por se reconhecer que os verdadeiros ocupantes da América brasileira foram eles, dizimados pela invasão européia; - aos negros, entretanto, a solução não poderia ser a mesma, porque eles, de alguma forma, mesmo que à força, também foram invasores, na condição de escravos; isto faz com que a dívida social deva ser paga na sua efetiva integração na sociedade brasileira que foi sendo construída, com suor e sacrifício dos negros colocados sob abjeta condição pelo branco colonizador. E aos surdos, qual é a dívida que a “sociedade ouvinte” tem, se não são, segundo os defensores do bilingüismo, nem índios ou negros, mas produtores de uma cultura própria que, nas palavras do nosso poetinha Vinicius de Morais, não é branca, negra, mulata, verde ou amarela, mas uma cultura à parte de todos esses ouvintes? 36 A resposta? Não gostaria de terminar estas reflexões pontificando sobre tema tão controverso, mas não posso deixar de expressar, pelo menos, um princípio básico que entendo deva ser norteador de toda e qualquer busca de maior justiça social: não é pelo isolamento e pela preservação de traços culturais apartados daqueles produzidos pelos ouvintes que estaremos contribuindo para a construção de uma sociedade crescentemente democrática para todos, sejam eles surdos ou ouvintes. Bibliografia BASAGLIA, Franco, O homem no pelourinho. Educação e sociedade, CEDES/UNICAMP: n. 25, 1986. BERNARD, Claude. Introdução à medicina experimental. Lisboa: Guimarães, 1978. BOURDIEU, P. (1998). Escritos de educação. Organizado por Maria Alice Nogueira e Afrânio Catani. Petrópolis, Vozes. BRASIL. CNE. Resolução n. 02/01. Institui as diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica. CANGUILHEM, Georges. O normal e o patológico. Rio de Janeiro, Forense-Universitária, 1982. CUKIERKORN, Mônica Moreira de Oliveira Braga. (1996) A escolaridade especial do deficiente auditivo: estudo crítico sobre os procedimentos didáticos especiais. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Dissertação de Mestrado. CUKIERKORN, Mônica Moreira de Oliveira Braga. (2005) Os processos de escolarização de alunos surdos das camadas populares: um estudo em escola especial do município de São Paulo. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Tese de Doutoramento. DANTAS, Mauriza Moura. (2006) Práticas cotidianas de ensino de língua escrita em classe especial para surdos. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Dissertação de Mestrado. FERREIRO, Emilia. & TEBEROSKY, Ana. (1986) Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre, Artes Médicas. 37 Anais do Congresso HABERMAS, J. Consciência Moral e Agir Comunicativo. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1989. ILLIANO, Fernanda Cortez. (2002) Trajetória curricular de uma escola de surdos: entre o ensino regular e as demandas do alunado.São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Dissertação de Mestrado. MENDONÇA, Suelene Regina Donola. (2007) Trajetórias escolares e sociais de alunos surdos: entre as marcas da deficiencia e a origem social. Início: São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Tese de Doutorado. (no prelo) MRECH. Leny M. (1999) Educação Inclusiva: realidade ou utopia? Trabalho apresentado no Seminário Educação Inclusiva: realidade ou utopia? São Paulo, Faculdade de Educação, USP. OLIVEIRA, Mércia Aparecida da Cunha. (2005) Práticas de professores do ensino regular com alunos surdos inseridos: entre a democratizção do acesso e permanência qualificada e a reiteração da incapacidade de aprender. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Tese de Doutorado. SANTOS, Wanderley José Pereira dos. (2002) Do ensino médio à universidade: a trajetória escolar de alunos surdos formados em uma escola especial de São Paulo, no período de 1965 a 1996. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Dissertação de Mestrado. SKLIAR, Carlos. La educación de los sordos: una reconstrucción histórica, cognitiva y pedagógica. Mendonza, Argentina: Ediunc, 1997. SOUZA, Alberto Alves de. (2005) A progressão escolar de alunos com deficiência em classes comuns. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Dissertação de Mestrado. VIANA Edson Alves. (2006) A trajetória de escolarização e acesso à profissão docente de professores deficientes no ensino público de São Paulo. São Paulo, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Dissertação de Mestrado. VYGOTSKY, Lev S. (1989) Pensamento e linguagem. São Paulo, Martins Fontes. 38 CONFERÊNCIAS NACIONAIS TERAPIA FONOAUDIOLÓGICA NA ÁREA DA SURDEZ Cilmara Levy1 O processo fonoaudiológico na área da surdez parece estar em evidência atualmente. A comunidade surda tem logrado o reconhecimento da língua brasileira de sinais (LIBRAS) em vários estados e diversas pesquisas legitimam seu uso, inclusive em propagandas políticas, e, mais recentemente, ela vem sendo incorporada à grade curricular de faculdades de fonoaudiologia. De fato, são conquistas importantes. Por outro lado, as triagens auditivas neonatais (TAN), os sistemas de inclusão escolar e as concessões de próteses auditivas relevam uma situação diferente. Ao mesmo tempo em que a surdez passa a ser considerada e sua língua, reconhecida, parece que não há uma conduta inclusiva em relação ao surdo por seus iguais, seus familiares e a sociedade, mesmo com o uso de aparelho e identificando-se a surdez precocemente. Pensando a historia da surdez através do tempo, a partir de uma perspectiva mais ampla, que inclua fundamentações teóricas, filosóficas e políticas, nos deparam com situações que ora favorecem a oralidade, ora as peculiaridades do surdo e da surdez. Hoje, ela pode ser vista como resultado o de um esforço coletivo de conhecimento integrado do indivíduo e de suas conquistas. No passado, havia vários indicadores de que, de fato, havia ainda muito a conhecer sobre a surdez, pois não era raro que, surpreendentemente, os surdos conseguissem aprender – por mérito de preceptores, da familia; e de seu próprio empenho. Eles representavam uma façanha intelectual de extraordinária magnitude, não só por seu esforço, mostrando que não eram incapazes, mas sobretudo pela profundidade incalculável que levou estes indivíduos a formularem e suscitarem idéias, pensamentos e diretrizes que imprimiram a toda a filosofia dedicada à diversidade entre as pessoas. Muitos séculos se passaram, e ainda nos dedicamos a descobrir como se explica “tamanho esforço intelectual” para se entender a surdez como singularidade, sobretudo para se partilharem com ela as diferenças entre ouvir e não ouvir. Conhecer através da ciência consiste em, por meio da dialética e das discussões, incluir a capacidade audiológica no sistema maior de saúde 1 PFCMSCSP - Brasil 39 Anais do Congresso e – aí, sim - situarem-se as triagens auditivas conscientes (grifo meu) neonatais e as justiças sociais como formas de liberdade – a liberdade de se expressar através da língua de sinais. Parafraseando Platão, em linhas gerais, as idéias são a unidade ontológica da significação, ou seja, o que é o real para alguns não representa uma essência homogênea para toda a sociedade. Assim, a identificação do ser com o pensar e as condições do pensar com a determinação do ser é que geram os paradigmas da interpretação da surdez no individuo e na sociedade, uma vez que, segundo Berger e Luckmann (1998), a socialização do indivíduo está intimamente ligada aos modelos que recebe dos familiares e que são aprovados pela sociedade, numa incessante determinação das identidades coletivas (Ciampa, 1996). As diferenças – e, entre elas, a surdez - estão à mercê das oportunidades políticas e sociais, assim como do trabalho incessante dos pesquisadores dessa área tão polêmica. E qual é o lugar do terapeuta da surdez nesse imenso complexo de significações? Acredito que se deva voltar para o trabalho com a linguagem e se propor interlocutor da família, situando-a e orientando-a no processo terapêutico, por ser ela a base e a unidade de socialização primária do indivíduo. Como fazer o atendimento com a família? Periodicamente e sempre em função da necessidade da criança; os atendimentos podem ocorrer em sessões individuais, em grupo ou mesmo em conjunto com a criança. As prioridades são a teorização da relação, a pontencialização da criança como um ser capaz e também da mãe, como capaz de ser mãe de uma criança surda. O aspecto mais importante dessa visão é o resgate do papel de mãe e/ou pai eventualmente perdido na incerteza de um diagnóstico de surdez. Parece, a princípio, que os pais são acometidos de “ uma surdez súbita” da fala dos profissionais sobre a surdez do filho, e é nesse sentido que se recomenda atendimento e acompanhamento especializado. Quando se pensa em terapia fonoaudiólogica para a criança surda, há certos princípios que se devem levar em conta no planejamento dos atendimentos e que, para muitos autores, são mesmo a chave do êxito terapêutico : • Visão: visão clínica do caso - conhecimento geral da criança e de suas características pessoais, familiares, cognitivas, auditivas, comunicativas e intelectuais; • Habilidades: habilidades terapêuticas incluem intuição, agilidade e criatividade, além de um bom conhecimento do desenvolvimento infantil e dos interesses da criança; • Motivação: o entusiasmo em cada sessão e o compromisso com as seguintes exigem harmonia e um bom relacionamento entre as partes; • Suporte técnico: é preciso entender a configuração audiológica da 40 criança, à qual se devem adequar as características eletroacústicas do aparelho indicado e seu benefício. Assim como o monitoramento audiológico e, se necessário, também um acompanhamento multidisciplinar; • Planejamento: O planejamento terapêutico se baseia em estratégias previamente elaboradas baseada a partir da visão clinica. Se houver falha em algum desses tópicos, rompe-se uma cadeia de integração, acarretando possivelmente expectativas irreais e prejudicando a terapêutica. Podem-se evitar confusões, incertezas e frustrações repensandose cada uma dessas etapas, favorecendo-se a conquista do êxito. Assim, apesar do momento histórico conturbado que envolve as diversas conquistas dos surdos, não têm sido em vão as angústias de muitos profissionais que buscam o melhor desempenho terapêutico para essa população. Que primem a qualidade, o respeito e a merecida consideração para com esse grupo minoritário. 41 CONFERÊNCIAS NACIONAIS ADAPTAÇÕES CURRICULARES NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA Rosana Glat1 Este trabalho objetiva refletir, de forma sucinta, sobre as transformações ou adaptações curriculares subjacentes à proposta de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais no ensino regular. Em sua essência a Educação Inclusiva diz respeito à responsabilidade dos sistemas escolares de oferecer para todas as crianças e jovens, processos de ensinoaprendizagem significativos, tendo como pressuposto o reconhecimento das diferenças individuais de qualquer origem (GLAT & BLANCO, 2007). De acordo com a Declaração de Salamanca, Educação Inclusiva significa que todos os alunos, independente de suas condições sócio-econômicas, raciais, culturais ou de desenvolvimento, sejam acolhidos nas escolas regulares, as quais devem se adaptar para atender às suas necessidades. (UNESCO, 1994). Nesta direção, a escola não pode mais ser seletiva, mas sim, promover o acesso e a permanência de todos os alunos, inclusive os que apresentam deficiências. Para tal, precisa possibilitar aos seus professore e gestores uma formação continuada; rever sua estrutura, organização, e projeto políticopedagógico; atualizar seus recursos didáticos, metodologias, estratégias de ensino e práticas avaliativas; e, sobretudo, repensar as suas escolhas curriculares. Estas ações são essenciais porque Educação Inclusiva não se resume à matrícula do aluno com deficiência na turma comum ou à sua presença na escola. Uma escola ou turma considerada inclusiva precisa ser mais do que um espaço para a convivência, um ambiente onde ele aprenda os conteúdos socialmente valorizados para todos os alunos da mesma faixa etária. Assim, cabe ao professor da classe comum onde este aluno está inserido, desenvolver ações que garantam sua participação plena nas atividades cotidianas. Pois o objetivo desta proposta é a possibilidade de ingresso e permanência do aluno na escola com sucesso acadêmico, e isso só poderá se dar a partir da atenção às suas peculiaridades de aprendizagem e desenvolvimento (GLAT e BLANCO, 2007). Em outras palavras, a inclusão em classes regulares de alunos com deficiências ou outras condições que afetam a aprendizagem não pode ser 1 42 Porfª Drº Programa de Pós-Graduação em Educação - Universidade do Estado do Rio de Janeiro um processo “espontâneo”. Ao contrário, exige reflexão e planejamento para que sejam identificadas as necessidades de aprendizagem específicas que ele apresenta em sua interação com o contexto educacional, que as formas tradicionais de ensino não podem contemplar. Ou seja, não é o aluno que tem que se adaptar ao contexto educacional (como no modelo de Integração) mas sim, o ensino deverá ser adequado ao aluno. Este é o sentido dos conceitos interelacionados de necessidades educacionais especiais e de adaptações curriculares. E sua compreensão é fundamental para atender às demandas postas pela escola contemporânea referentes à diversidade presente em sala de aula. Necessidades Educacionais Especiais são as demandas especificas de sujeitos que, para aprender o que é esperado para o seu grupo referência, precisam de diferentes formas de interação pedagógica e/ou suportes adicionais: recursos, metodologias e currículos adaptados, bem como tempos diferenciados, durante todo ou parte do seu percurso escolar (CORREIA, 1999; BLANCO, 2001). Para Glat e Blanco (2007, p. 26): O conceito de necessidade educacional especial engloba tanto a especificidade do aluno em sua subjetividade, como o contexto histórico-cultural em que ele vive e se constitui. Costumam desenvolver necessidades educacionais especiais, por exemplo, alunos que migram para comunidades com língua, costumes e valores diferentes daqueles que já vinham sendo constituídos por eles no convívio familiar e social. Também são freqüentes, nos alunos das escolas e sistemas de ensino que oferecem currículos fechados e pouco flexíveis, sobretudo se estes forem pautados em valores e expectativas das camadas hegemônicas da população e desvinculados de suas vivências cotidianas. Necessidades educacionais especiais são, finalmente, apresentadas pelos alunos com diferenças qualitativas no desenvolvimento com origem nas deficiências físicas, motoras, sensoriais e/ou cognitivas, distúrbios psicológicos e /ou de comportamento (condutas típicas) e com altas habilidades. Embora esses termos sejam muitas vezes utilizados como sinônimos é importante frisar que necessidades educacionais especiais não é o mesmo que deficiência. O conceito de deficiência se reporta às condições orgânicas do indivíduo, que podem resultar em uma necessidade educacional especial, porém não obrigatoriamente. O conceito de necessidade educacional especial, por sua vez, está intimamente relacionado à interação do aluno à proposta ou realidade educativa com a qual ele se depara. Igualmente, necessidade educacional especial não é uma característica homogênea fixa de um grupo etiológico também supostamente homogêneo, e sim uma condição individual e específica; em outras palavras, é a demanda de um determinado aluno em relação a uma aprendizagem no contexto em que é vivida. Dois alunos com o mesmo tipo e grau de deficiência podem requisitar diferentes adaptações de recursos didáticos e metodológicos. Da mesma forma, um aluno que 43 Anais do Congresso não tenha qualquer deficiência, pode, sob determinadas circunstâncias, apresentar dificuldades para aprendizagem escolar formal que demandem apoio especializado (GLAT e BLANCO, 2007). Assim, para garantir o atendimento às necessidades educacionais especiais dos alunos, sobretudo aqueles que vêm de um contexto educacional especializado, a escola regular precisa urgentemente repensar e redimensionar sua dimensão curricular. Este talvez seja o maior desafio, e ao mesmo tempo o pré-requisito para a implementação da proposta de Educação Inclusiva. Pois, independente da causa, se a escola organizar e desenvolver adaptações curriculares adequadas, as necessidades educacionais especiais do aluno podem ser transitórias e ele obter sucesso escolar. Isso não significa que a deficiência esteja “curada”, ou que as condições emocionais, sócio-familiares ou culturais do aluno tenham se modificado. Porém, a transformação na prática pedagógica possibilitará que ele tenha um bom desempenho e integração escolar. Não cabe no escopo deste texto entrar em uma discussão aprofundada sobre o conceito de currículo, que é, é variado e múltiplo, e depende da concepção ou modelo de ensino e escola a ele adjacente. O currículo corresponde “a um conjunto de intenções, situadas no continuum que vai da máxima generalidade à máxima concretização, traduzidas por uma relação de comunicação que veicula significados social e historicamente válidos” (PACHECO, 1996 apud OLIVEIRA & MACHADO, 2007, p. 37). Uma outra definição de currículo que dá conta da diversidade e necessidades educacionais presentes no contexto escolar é a de Mc Laren (1997): O currículo representa muito mais do que um programa de estudos, um texto em sala de aula ou o vocabulário de um curso. Mais do que isso, ele representa a introdução de uma forma particular de vida; ele serve, em parte, para preparar os estudantes para posições dominantes ou subordinadas na sociedade existente. O currículo favorece certas formas de conhecimento sobre outras e afirma os sonhos, desejos e valores de grupos seletos de estudantes sobre outros grupos, com freqüência discriminando certos grupos, de classe, ou gênero [acrescentase aqui as pessoas com necessidades educacionais especiais] (p. 216). Com base no exposto, serão a seguir discutidos alguns mais proeminentes relativos a um currículo inclusivo e as possíveis adaptações para atender aos alunos com necessidades educacionais especiais incluídos no ensino regular. Em termos simples, adaptações curriculares são os ajustes realizados no currículo, para que ele se torne apropriado ao aluno que apresente necessidades educacionais especiais. Segundo Oliveira e Machado (2007, p. 36): As adaptações curriculares, de modo geral, envolvem modificações 44 organizativas, nos objetivos e conteúdos, nas metodologias e na organização didática, na organização do tempo e na filosofia e estratégias de avaliação, permitindo o atendimento às necessidades educacionais de todos os alunos, em relação à construção do conhecimento. Conforme sistematizado nos Parâmetros Curriculares Nacionais, da Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação, o currículo deve ser construído a partir do projeto-político-pedagógico da escola, envolvendo a identidade da instituição, sua organização e funcionamento, e o papel que exerce, a partir das aspirações e expectativas da sociedade e da cultura. O currículo inclui as experiências postas à disposição dos alunos, planificadas no âmbito da escola, com o objetivo de propiciar o desenvolvimento pleno dos educandos. Não se deve se fixar no que há de especial na educação dos alunos, mas flexibiliza a prática educacional, para atender a todos (BRASIL, 1998). Já as adaptações curriculares são definidas como: (…) estratégias e critérios de atuação docente, admitindo decisões que oportunizam adequar a ação educativa escolar às maneiras peculiares de aprendizagem dos alunos, considerando que o processo de ensino-aprendizagem pressupõe atender à diversificação de necessidades dos alunos na escola (BRASIL, 1998, p. 15). Para o referido documento as adaptações curriculares, realizam-se em três níveis: • Adaptações no nível do projeto pedagógico (currículo escolar) que devem focalizar, principalmente, a organização escolar e os serviços de apoio, propiciando condições estruturais que possam ocorrer no nível de sala de aula e no nível individual. • Adaptações relativas ao currículo da classe, que se referem, principalmente, à programação das atividades elaboradas para sala de aula. • Adaptações individualizadas do currículo, que focalizam a atuação do professor na avaliação e no atendimento a cada aluno. As adaptações curriculares também são classificadas em pequeno e grande porte. As primeiras, também chamadas de “não-significativas”, são aquelas realizadas facilmente pelos próprios professores no planejamento das atividades cotidianas de sala de aula. Servem para ampliar a participação no processo ensino-aprendizagem de alunos com necessidades educacionais especiais. As segundas, “significativas”, são as que exigem envolvimento da gestão e da instituição como um todo. Ou seja, são aquelas que exigem ações de natureza política, administrativa, financeira. Convém também diferenciar as adaptações de acessibilidade curricular 45 Anais do Congresso e as adaptações pedagógicas. As primeiras se referem a acessibilidade de todos os alunos aos espaços e processos pedagógicos, eliminando barreiras arquitetônicas, de sinalização e de utilização dos recursos didáticos nas escolas. Ou seja, incluem as condições físicas, materiais e de comunicação que a escola proporciona para receber alunos com diferentes tipos de necessidades especiais e propiciando sua participação em atividades e desenvolvimento acadêmico (GLAT & OLIVEIRA, 2003; FERNANDES, ANTUNES & GLAT, 2007). As segundas estão diretamente ligadas às adaptações pedagógicas realizadas na apresentação dos conteúdos e das atividades propostas para os alunos. No entanto, é importante enfatizar que adaptar um currículo não significa empobrecê-lo, mas em rever as estratégias e recursos usados para que o aluno com necessidades educacionais especiais possa participar de todas as atividades da escola. Dias, Silva e Braun (2007, p 108-112), apresentam alguns exemplos de adaptações curriculares que podem favorecer a aprendizagem de alunos surdos em situação de ensino regular: (...) utilizar vocabulário e comandos simples e claros nos exercícios; modificar o vocabulário, os comandos, as instruções, as questões, principalmente na hora das avaliações; dar-lhe oportunidades para ler, escrever no quadro, levar recado para outros professores e colegas; certificar-se de que ele participa das atividades extra classe; etc. (...) embora sabendo “ler” (ver o significante, a letra), os alunos surdos muitas vezes não entendem o significado daquilo que leram, sendo necessário “traduzir”, trocar ou simplificar a forma da mensagem. Igualmente, na organização de conceitos lógicos matemáticos. (...) Na fase da alfabetização, é fundamental a representação dos conceitos de forma concreta e vivenciada, pois o aluno surdo precisa “ver” inicialmente o conceito para poder compreender seu significado. (..) propor situações a partir do cotidiano que abordem em suas relações esses conceitos. Em atividades que enfocam a interpretação de texto, considerando os objetivos para cada ciclo ou série, também é fundamental o uso de recursos que possibilitem a significação e contextualização do que se está lendo. Em síntese, a Educação Inclusiva, demanda que a escola transforme concepções e práticas tradicionais de educação pautadas no déficit do aluno para uma concepção curricular flexível e adaptada às suas necessidades específicas e que propicie a aprendizagem e construção de conhecimentos. Certamente, a constituição de ambientes de aprendizagem inclusivos demanda não apenas condições de trabalho adequadas para os educadores, como também programas de formação inicial e continuada voltados para as especificidades do desenvolvimento humano. 46 Bibliografia BRASIL. Parâmetros Curriculares: adaptações curriculares – estratégias para a educação de alunos com necessidades educacionais especiais. Brasília: MEC/SEESP, 1998. BLANCO, L. Falando sobre necessidades educacionais especiais. Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro - Instituto Helena Antipoff, Rio de Janeiro, 2001. CORREIA, L. de M. Alunos com necessidades educativas especiais nas classes regulares. Porto – Portugal: Editora Porto, 1999. DIAS, V. L.; SILVA, V. de A. & BRAUN, P. A inclusão do aluno com deficiência auditiva na classe regular: reflexões sobre a prática pedagógica. In: GLAT, R. (Org.). Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio de Janeiro: Editora Sette Letras, 97-115, 2007. FERNANDES, E. M.; ANTUNES, K. C. V. & GLAT, R. Acessibilidade ao currículo: pré-requisito para o processo ensino-aprendizagem de alunos com necessidades educacionais especiais no ensino regular. In: GLAT, R. (Org.). Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio de Janeiro: Editora Sette Letras, 53-64, 2007. GLAT, R. & OLIVEIRA, E. da S. G. Adaptações Curriculares. Relatório de consultoria técnica, projeto Educação Inclusiva no Brasil: Desafios Atuais e Perspectivas para o Futuro. Banco Mundial, 2003. Disponível em http:// www.cnotinfor.pt/inclusiva, acessado em dez./2003. GLAT, R. & BLANCO, L.de M. V. Educação Especial no contexto de uma Educação Inclusiva. In: GLAT, R. (Org.). Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio de Janeiro: Editora Sette Letras, 15-35, 2007. MCLAREN, P. A vida nas escolas – uma introdução à pedagogia crítica nos fundamentos da Educação. Artes Médicas, Porto Alegre, 1997. OLIVEIRA, E. da S. G. & MACHADO, K. Adaptações curriculares: caminho para uma educação inclusiva. In: GLAT, R. (Org.). Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio de Janeiro: Editora Sette Letras, 36-51, 2007. UNESCO, Declaração de Salamanca e Linha de Ação sobre Necessidades Educativas Especiais. Brasília: CORDE, 1994. 47 CONFERÊNCIAS NACIONAIS POSSIBILIDADES DE ESCRITA PELOS SURDOS Marianne Stumpf Para compreender a leitura é preciso haver uma complementação entre o conhecido, que está na nossa cabeça, e o desconhecido, que está no papel; entre o que está atrás e o que está diante dos olhos. Teatro, narrativas, literatura surda em geral, só podem ser escritos após serem vertidos para uma língua falada, mesmo quando criados originalmente em língua de sinais. Os surdos não podem construir sua própria escrita de acordo com sua maneira de sinalizar. As pessoas surdas também acham a língua de sinais, como qualquer outra língua, uma maneira poderosa de expandir sua criatividade e prazer artístico. Teatros nacionais de surdos em vários paises fizeram programas de grande sucesso. Artistas surdos têm conseguido mostrar linguagem de sinais em suas pinturas, ilustrações ou trabalhos esculturais. Pessoas surdas de talento criam poesia e humor em língua de sinais. (YERKER, Anderson, ex-presidente da FMS, 1981). A escrita, o poder e a tecnologia são parceiros nas narrativas ocidentais da origem da civilização. A Cultura Surda está minimamente registrada, porque as situações que os surdos vivem não conseguem escrever em sua própria língua. Passadas mais de quatro décadas dos movimentos surdos, respaldados pelos achados científicos, estarem mobilizados em favor do respeito à sua especificidade cultural e lingüística, o processo mostra dificuldade de avançar e por em prática aquilo que os surdos consideram seu direito: o de aprender e se expressar em sua própria língua e desenvolver, já a partir da escola, sua própria cultura. O desenvolvimento intelectual e cultural das comunidades surdas tem evoluído e o caminho natural dessa evolução passa pela aquisição de uma escrita própria que pode proporcionar o acesso a um novo patamar em suas expressões culturais e comunicativas. Com a aprendizagem de uma escrita de sinais, os surdos vão ter a oportunidade de desenvolver uma nova cultura, que é a cultura surda escrita, um pouco diferente da cultura surda sinalizada. As lideranças surdas, embora reconheçam o avanço que constituiu validar a língua de sinais, e o esforço feito pelos responsáveis pelo ensino 48 especial para qualificar a Educação dos Surdos no Brasil, pontuam que as mudanças precisam ser estruturais. O poder de decisão nas escolas e classes para surdos continua só com os ouvintes e os surdos ainda são vistos, em muitas escolas, apenas como instrutores de língua de sinais, ainda assim, substituíveis por professores ouvintes que muitas vezes, dominam muito mal essa língua. Ao mesmo tempo os artefatos da cultura surda, preponderantemente visuais, estão ausentes das salas de aulas. A inclusão, conceito bonito e desejável pode funcionar como exclusão. Exclusão da plena comunicação e da real participação. Os professores surdos representam para a criança surda um modelo adulto e é importante que ela possa formar o conceito de que a pessoa surda pode ser um adulto viável, pode liderar, pode agir com independência, pode exercer um papel relevante na sociedade. As sutilezas do poder e as implicações do mesmo com as responsabilidades dele derivadas, bem como, a maioria das percepções importante para o jogo da vida, só podem ser percebidas e exercitadas entre iguais. Sem a possibilidade de construir sua identidade a pessoa surda fica para sempre imatura e dependente. Na educação de surdos, além do deslocamento cultural entre professor e aluno, ainda se intensifica a distância por não se compartilhar o mesmo código lingüístico, incluindo aquelas escolas que consideram a língua de sinais, mas que, no entanto não a vivem de forma efetiva. (Giordani, 2003. pg. 58) No século XIX, Bébian1 (1817) escreveu que, em seus numerosos trabalhos havia traçado um caminho para a educação dos surdos e que, outro, mais hábil, ou mais bem assessorado, encontraria o fim desse caminho. Sua posição era equilibrada, realista e moderna. Ele não pode ser reduzido apenas a um defensor dos sinais, era sim, partidário de uma educação que começando pelos sinais, pois dizia, essa é a única maneira de comunicação com uma criança surda, chegaria à maioridade com o surdo possuidor de duas línguas: a língua de sinais, inclusive escrita, e a língua de seu país, esta somente na sua forma escrita. Bébian predisse, mas foi necessário chegarmos aos anos 60 para que os trabalhos do americano William Stokoe retomassem o caminho esboçado por ele. As notações de lingüistas e o SignWriting Stokoe (1919 – 2000) e a sua equipe de lingüistas da Universidade Gallaudet, a quem devemos o estabelecimento do caráter lingüístico das Bébian – professor surdo francês, publicou - Essai sur les sourds-muets, 1817 1 49 Anais do Congresso línguas de sinais, criaram uma notação para escrever os sinais. Outros lingüistas, como Neve e Jouison, igualmente criaram seus próprios sistemas de escrita dos sinais, mas eles não tinham o objetivo de que servissem para o uso comum dos surdos e sim o objetivo de atender a necessidades de estudo das línguas de sinais. O sistema de escrita para línguas de sinais denominado SignWriting foi inventado há cerca de 30 anos por Valerie Sutton sua origem está em um sistema que a autora criou para notar os movimentos da dança. Atendendo pedidos de grupos de surdos, a autora começou a trabalhar com eles na adaptação do sistema a escrita das línguas de sinais. Conforme as publicações do DAC2 o sistema pode representar línguas de sinais de um modo gráfico esquemático que funciona como um sistema de escrita alfabético, em que as unidades gráficas fundamentais representam unidades gestuais fundamentais, suas propriedades e relações. O SignWriting pode registrar qualquer língua de sinais do mundo sem passar pela tradução da língua falada. Cada língua de sinais vai adaptá-lo a sua própria ortografia. Para escrever em SignWriting é preciso saber uma língua de sinais. O sistema comporta aproximadamente 900 símbolos. Entre esses símbolos, muitos trazem mais precisão à notação dos símbolos gestuais, mas não são indispensáveis à compreensão de um enunciado escrito por um locutor de uma determinada língua de sinais. A quantidade do número de símbolos que o SignWriting coloca para a notação dos elementos manuais revela a complexidade desses movimentos na composição das línguas de sinais. Quais elementos são pertinentes, qual o status que ocupam em uma determinada língua de sinais, se eles têm sentido, ou não, são perguntas que não têm uma única resposta. Essas perguntas, são os surdos usuários do sistema que ao correr do uso, poderão ir respondendo, e/ou modificando. Cada língua de sinais precisará ir construindo suas próprias respostas. A Dra. Boutora, lingüista francesa, descreve assim a apresentação gráfica de um signo pelo sistema SignWriting: “Retângulos virtuais compreendem um conjunto de símbolos alinhados verticalmente. Um conjunto de símbolos representa um signo, quer dizer uma unidade lexical eventualmente associada a um complemento de informações gramaticais, os signos são separados por um espaço. No interior de um “signo etiqueta” ou “pilha”, os símbolos são colocados verticalmente segundo a lógica do corpo humano. Assim o círculo que configura a cabeça suporta os símbolos que representam os elementos manuais. Os elementos não manuais 2 50 Deaf Action Committee For SignWriting – www.signwriting.org (essencialmente os movimentos da face e o olhar) são inscritos dentro do círculo cabeça.” (Boutora, 2003, pg. 80). Estrutura do sistema SignWriting - Representação da sinalização e da espacialização As línguas de sinais utilizam três dimensões espaciais essencialmente para a marcação das relações sintático-semânticas. O sinalizador atribui a um lugar, uma data ou um protagonista do enunciado uma porção do espaço de sinalização. Com esse procedimento ele cria um referencial espacial, temporal de atuação. Quando a porção do espaço está demarcada ela é apontada pelo sinalizador cada vez que ele precisar fazer referência ao objeto que ele colocou lá. Em teoria, podemos criar quantos referenciais sejam necessários para o discurso. O marco teórico dos criadores do SignWriting propõe que os elementos do signo escrito são equivalentes aos fonemas ou sons da língua oral. Consideram estes elementos gráficos como letras. A criação do SignWriting foi muito influenciada pela pesquisa lingüística que procurava transcrever os elementos identificáveis da língua. Boutora apóia a afirmação de que é uma escrita alfabética em que os sinais podem ser decompostos em elementos, como as palavras em sílabas, que correspondem aos diferentes sons da língua e os elementos do símbolo escrito, aos diferentes movimentos dos sinais. Estes, quando escritos formam o símbolo que permite uma leitura de reconhecimento rápido. Uma percepção global icônica. A questão permanece aberta, mas coloca a hipótese de que o SignWriting é um sistema de escrita analisável em dois níveis, do ponto de vista interno e de um ponto de vista externo. • Do ponto de vista interno que nos coloca ao nível dos elementos gráficos mínimos, caracterizamos o sistema de ideofonográfico, composto de signos fonéticos, os elementos gráficos que anotam a articulação, e de signos “ideográficos” aqueles que anotam a prosódia. Até aqui se assemelham às escritas ocidentais com dominância fonográfica. • Do ponto de vista externo, colocado ao nível de uma figura que percebemos globalmente, caracterizamos o sistema de ideográfico. Na última versão do SignPrinting3, a notação e leitura do texto se efetua em colunas da esquerda para a direita. Uma coluna comporta três trilhos: O trilho do meio representa o eixo central que passa pela cabeça e o meio do corpo em posição neutra; os trilhos da esquerda e da direita permitem 3 http://www.signwriting.org/forums/software/lisbon/lisbon01.html g 51 Anais do Congresso delimitar duas sub-colunas simétricas em relação à trilha central. Essas duas sub-colunas e os dois trilhos externos servem para criar referências de deslocamentos em relação à posição neutra do corpo e da cabeça. Passamos a dispor então de quatro posições possíveis sobre um mesmo eixo horizontal. Essa escrita em colunas procura solucionar o interrogante de como escrever uma língua tridimensional num espaço plano como é o papel. O trabalho de adaptação do SignWriting à Libras foi a primeira etapa de uma caminhada que a comunidade surda brasileira, com o apoio de pesquisadores, deverá empreender para conseguir uma escrita que dê conta de todas as suas necessidades em sua própria língua. O projeto SignNet Este projeto se propôs a adaptar a tecnologia da Internet para as línguas de sinais e à educação dos surdos, tinha como objetivo criar as bases do processamento de Línguas de Sinais e ampliar as bases da Lingüística Computacional de Sinais. Surgiu na PUCRS em 1996. Foi um projeto de educação na informática voltado para difundir o sistema de escrita SignWriting na Comunidade Surda do Brasil. Com essa finalidade foi desenvolvido um software para apoio ao uso do sistema a partir de uma investigação das características gerais de um sistema de escrita de línguas de sinais e uma investigação sobre a aquisição da escrita de línguas de sinais estimulando a produção de literatura impressa em SignWriting. O fundamento pedagógico da proposta consiste na proposição de que, se é verdade que as línguas de sinais são as línguas naturais dos surdos, então a alfabetização dos mesmos deve ser feita preferencialmente nessas línguas e não nas línguas orais das sociedades em que eles vivem. No caso do Brasil, isso significa que a alfabetização dos surdos deve ser feita na Libras (Língua Brasileira de Sinais). Deste projeto participaram: bolsistas pesquisadores de pedagogia e lingüística, pesquisadores da área da informática, professores de escolas surdas e de escolas regulares, intérpretes e a comunidade surda. O efeito multiplicador do Projeto se mostra em duas direções: na formação de alfabetizadores de línguas de sinais escritas e na difusão dos softwares desenvolvidos para processamento de textos em línguas de sinais O Projeto resultou em diversas contribuições relevantes para a questão da Educação dos Surdos, colocou a equipe em posição de destaque, relativamente ao tema da escrita de línguas de sinais, difundiu a necessidade de os surdos pensarem sobre esse tema e forneceu produtos concretos que 52 poderão ter utilização prática na educação de surdos, no fortalecimento da cultura surda e na integração social dos surdos. Houve um deslocamento da ênfase do Projeto, em relação à proposta inicial. O Projeto acabou tendo um viés muito mais tecnológico, de desenvolvimento de produtos, do que previsto inicialmente. Alguns dos objetivos de caráter mais conceitual foram abandonados em favor dessa ênfase mais pragmática A questão da Educação dos Surdos, colocou a equipe em posição de destaque, relativamente ao tema da escrita de línguas de sinais, difundiu a necessidade de os surdos pensarem sobre esse tema e forneceu produtos concretos que poderão ter utilização prática na educação de surdos, no fortalecimento da cultura surda e na integração social dos surdos. A posteriori, essa escolha se mostrou muito positiva: o sentido pragmático que o Projeto adquiriu impulsionou com força as atividades em torno da escrita de língua de sinais, permitiu a inclusão efetiva de bolsistas surdos, aproximou a equipe da comunidade internacional do sistema SignWriting (quase toda ela formada por professores e pesquisadores efetivamente envolvidos com questões práticas de educação de surdos) e possibilitou a criação de uma base de software concreta de software, que poderá ser difundida e tornada realmente útil para a comunidade surda. Experiências A escrita precisa ser uma atividade significativa para a criança. Pudemos observar que no ambiente de uma classe de surdos, onde o professor e os colegas se comunicam em língua de sinais, as crianças efetivamente tentam escrever os sinais quando estimuladas a isso. O SignWriting é para a criança surda “visualmente fonético” ou uma escrita visual em perfeito acordo com as suas potencialidades. Como a criança ouvinte constrói na escola suas aprendizagens da língua oral com o concurso da língua escrita e, por essa construção, acede a níveis cada vez mais elevados de conhecimento. Assim também, para a criança surda, aceder à escrita de sua língua de sinais significa dotá-la de uma ferramenta indispensável para qualificar seu grau de participação na cultura e na sociedade. A população surda hoje é marginalizada, pois em sua quase totalidade funcionalmente analfabeta, em uma sociedade cada vez mais dependente da palavra escrita. O oferecimento de um sistema democrático e participativo de vida, dentro da sala de aulas, que respeita e olha o aluno, enxergando-o como ele é, a comunicação estabelecida em sua língua natural para realizar um trabalho comum, propicia que o próprio grupo gere regras de convivência e aceite com seriedade a necessidade de atenção e respeito para que se configure um espaço de trabalho produtivo. Começam a observar os 53 Anais do Congresso símbolos apresentados pela pesquisadora e vão conseguindo diferenciá-los qualitativa e quantitativamente, compreendem que eles correspondem aos sinais da Libras e aprendem a estabelecer correspondência entre os sinais e os símbolos do SignWriting. A decomposição do sinal escrito, relacionando os diferentes elementos gráficos mínimos, representados pela escrita, com os elementos fonológicos, morfológicos, sintáticos e semântico-pragmáticos da língua sinalizada permite ao aprendiz compreender o processo e tentar construir sua própria escrita. O sistema de representação SignWriting apenas começa a ser usado pela população surda e seu uso precisa ser acompanhado por pesquisas de lingüistas que possam observar e procurar soluções cada vez mais econômicas para sua utilização. Também por estudiosos de pedagogia e informática, pois sua vocação é ser uma ferramenta acessível ao surdo em sua relação com o computador que terá também o poder de instrumentalizar sua interação com os ouvintes pela possibilidade da tradução eletrônica para a língua oral. O uso do recurso computador traz a possibilidade às pessoas surdas de uma alternativa de comunicação e incorpora novas tecnologias ao processo de aprendizagem das crianças. A utilização de um editor de textos como o Sign Writer ou o SW-Edit nas aulas para introdução às TI traz a essas aulas muito maior interesse do que quando usamos o editor de textos em português. Também as produções das crianças são mais sofisticadas. Essas ferramentas, no entanto, tem limitações que podem ser ultrapassadas, pois a evolução da informática possibilita esse salto de qualidade. Bibliografia ANDERSSON, Yerker. A Cross-cultural comparative study: Deafness. Unpublished doctoral dissertation. College Park, Maryland: University of Maryland. 1981. BEBIAN, Roch A A . Essai sur les sourds-muets et sun lê language naturel. Paris, Dentu, imprimeur-libraire, 1817. BOUTORA, Leila. Étude des systèmes d´écriture des langues vocales et des langues signées. Paris: Mémoire de D.E.A. des Sciences du Langage – Université Paris VIII, 2003. COSTA, Antônio Carlos da Rocha. SignNet: adaptando as tecnologias da Internet para as linguagens de sinais e a educação de surdos. Projeto submetido ao Edital CNPQ-Protem 01/99. 1999. 54 GIORDANI, Liliane F. “Quero escrever o que está escrito nas ruas”: representações culturais da escrita de jovens e adultos surdos. Tese de Doutorado, Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, 2003. SUTTON, Valerie. SignWriting: Manual. [online] disponível em www. signwrting.org, 1996. Consultado em outubro de 1996. STUMPF, Marianne Rossi. Aprendizagem de Escrita de Língua de Sinais pelo sistema SignWriting: Línguas de Sinais no papel e no computador /Porto Alegre: UFRGS, CINTED, PGIE, 2005. Marianne Rossi Stumpf [email protected] Professora Adjunta – UFSC Diretora de Políticas Educacionais -FENEIS 55 Painéis Internacionais PAINEL INTERNACIONAL INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS Solange Rocha Fundado em 1857 O Instituto Nacional de Educação de Surdos foi criado em meados do século XIX por iniciativa do surdo francês E. Huet. Em junho de 1855, Huet apresenta ao Imperador D. Pedro II um relatório cujo conteúdo revela a intenção de fundar uma escola para surdos no Brasil e também informa da sua experiência anterior como diretor de uma instituição para surdos na França. O governo imperial apóia a iniciativa de Huet e destaca o Marquês de Abrantes para acompanhar de perto o processo de criação da primeira escola para surdos no Brasil. O novo estabelecimento começa a funcionar em 1º de janeiro de 1856, mesma data em que foi publicado o programa de ensino, apresentado por Huet, o qual compreendia as disciplinas de língua portuguesa, aritmética, geografia, história do Brasil, escrituração mercantil, linguagem articulada, doutrina cristã e leitura sobre os lábios. Até o ano de 1908 era considerada a data de fundação do Instituto o dia 1º de Janeiro de 1856. A mudança deu-se através do artigo 7º do decreto nº. 6.892 de 19 de março de 1908 que transferiu a data de fundação para a da promulgação da Lei 939 de 26 de setembro de 1857 que em seu artigo 16, inciso 10, consta que o Império passa a subvencionar o Instituto. Antes desse decreto, os alunos eram bolsistas de entidades particulares ou públicas. No seu percurso de quase dois séculos, a instituição respondeu pelas denominações de Instituto de Surdos-Mudos e Imperial Instituto dos Surdos-Mudos, no séc. XIX; Instituto Nacional de Surdos Mudos, com o advento da República e, no ano de 1957, ocasião de seu primeiro centenário, passou à denominação de Instituto Nacional de Educação de Surdos, assim permanecendo até os dias de hoje. A substituição da palavra Mudo pela palavra Educação refletia o ideário de modernização da década de 50 no Brasil, no qual o Instituto e suas discussões sobre educação de surdos também estavam inscritos. Em razão de ser a única instituição de educação de surdos em território brasileiro e mesmo em países vizinhos, por muito tempo, o INES recebeu alunos de todo o Brasil e do exterior, configurando-se em uma Instituição de referência para os assuntos de educação, profissionalização e socialização de surdos. A comunicação gestual, hoje reconhecida como LIBRAS, Língua Brasileira de Sinais, de forte influência francesa em função da nacionalidade 57 Anais do Congresso do fundador do instituto, foi espalhada por todo Brasil pelos alunos que regressavam aos seus Estados quando do término do curso. Em 1875, o ex-aluno do Instituto Flausino José da Gama desenha o livro Iconographia dos Signaes dos Surdos-Mudos contribuindo para a difusão dessa língua. Nas décadas iniciais do século XX, o Instituto oferecia, além da instrução literária, o ensino profissionalizante. A terminalidade dos estudos estava condicionada à aprendizagem de um ofício. Os alunos freqüentavam, de acordo com suas aptidões, oficinas de sapataria, alfaiataria, gráfica, marcenaria e também artes plásticas e bordado. Por muito tempo, o trabalho realizado na gráfica do Instituto foi referência no Rio de Janeiro recebendo encomenda de encadernação de quase todas as instituições públicas e particulares das primeiras décadas da República. As questões relativas ao ensino para alunos surdos sempre foram objeto de muita polêmica, situação essa agravada pelos resultados do Congresso realizado em Milão em 1880, os quais indicaram a oralização do surdo como o modo mais adequado de educá-lo, condenando a utilização dos gestos no processo de ensino. Essa indicação foi muito criticada por alguns professores e alunos que reconheciam a importância e a legitimidade da comunicação pelos gestos. A principal crítica que se fazia a oralização era de que ela demandava um tempo enorme de treinamento da fala e dos resíduos auditivos, concorrendo com a escolarização formal que ia sendo abandonada pela importância que era dada à expressão pela palavra oral. Essa perspectiva de escolarização não tinha como prioridade o ensino e sim o desenvolvimento da fala. Os incipientes resultados dessa abordagem oralista para a educação dos surdos, que demandavam ensino público de massa, estimularam o surgimento, em meados da década de 80, do século XX, de um movimento transnacional, contando com acadêmicos, profissionais da área da surdez e dos próprios surdos no sentido de apontar outros caminhos para a sua escolarização e socialização. Com apoio de pesquisas realizadas na área da lingüística que conferiu status de língua à comunicação gestual entre surdos, esse movimento ganha corpo. Já no final dos anos 80, no Brasil, os surdos lideram o movimento de oficialização da LIBRAS. Em 1993, um projeto de Lei da então senadora Benedita da Silva deu início a uma longa batalha de legalização e regulamentação da LIBRAS em âmbito federal. Atualmente, a Lei já está regulamentada e o debate continua aberto. As discussões avançam em direção ao novo desafio que trazem as atuais políticas públicas educacionais para surdos. Por um lado, a proposta de 58 inclusão, que é o acesso a qualquer ambiente escolar sem nenhuma restrição aos alunos surdos que podem e devem ser matriculados em classes regulares junto com ouvintes. Por outro lado, a regulamentação da lei da LIBRAS indica que o ensino de português deve ser oferecido como segunda língua e a língua de sinais como língua de instrução. O Instituto, único em âmbito federal, ocupa importante centralidade nessas discussões, promovendo fóruns de debates, publicações, seminários, pesquisas e assessorias em todo território nacional. Possui uma vasta produção de material pedagógico, fonoaudiológico e de vídeos em língua de sinais, distribuídos para os sistemas de ensino. Atualmente, além de oferecer no seu Colégio de Aplicação, educação precoce (O a 3 anos), ensinos fundamental e médio, oferece também a possibilidade de formar profissionais da educação, surdos e ouvintes, no Instituto Superior Bilíngüe recém inaugurado, experiência essa pioneira na América Latina. Rio de Janeiro, 17 de maio de 2007 Solange Rocha Professora do INES, Historiadora Doutoranda em Educação pela PUC-RJ 59 PAINEL INTERNACIONAL ORIGINES HISTORIQUES DE LA DÉMARCHE D’ERNEST HUET, FONDATEUR DE I’INES EN 1857 Jean François Dutheil1 Avant de débuter cet exposé, je voudrai remercier très chaleureusement les organisateurs de ce congrès et tout particulièrement M. Marcelo Ferreira De Vasconcelos Cavalcanti, directeur général de l’INES pour la qualité de son accueil. Je suis véritablement très touché et particulièrement honoré de cette invitation. J’ai compris dès notre premier contact au téléphone à quel point ce rattachement à l’institut de Paris au travers la création par Ernest HUET de l’INES en 1857 était important pour mes amis brésiliens. On sait peu de choses malheureusement d’Ernest HUET, professeur sourd à ce qui s’appelait à l’époque « Institution impériale des sourdsmuets de Paris ». Les archives de l’Institut National de Jeunes Sourds de Paris (INJS), appellation actuelle de cette maison chargée d’histoire, sont malheureusement muettes concernant le fondateur de l’INES. Des recherches effectuées aux Archives Nationales à Paris n’ont pas non plus donné de résultats. De même, l’amicale des anciens élèves de l’INJS, fondée en 1937 et dépositaire d’archives et de documents importants de l’histoire de la surdité, notamment la liste des banquets organisés au XIXème siècle dont je reparlerai, ne possède aucun élément sur Ernest HUET. Je regrette de décevoir mes amis brésiliens sur ce point qui je sais est très important pour eux. Il nous faut progresser encore dans la connaissance historique, malgré les nombreux travaux qui ont déjà été réalisés. Je donnerai tout de même quelques éléments à la fin de mon exposé mais il est possible qu’ils soient déjà connus au Brésil. Cela peut-être un élément du partenariat que nous allons développer avec l’INES suite à l’événement qui nous réunit aujourd’hui. A défaut de pouvoir reconstituer une biographie du fondateur de l’INES, je me propose d’illustrer, au travers des personnages qui l’ont précédé depuis l’Abbé de l’Epée dont certains ont eu un rayonnement mondial durable, le mouvement qui a fondé la démarche exemplaire d’Ernest HUET. Le XIXème siècle, plus précisément la période 17601880, a été une période unique dans l’histoire de l’éducation des jeunes sourds, période de développement, de recherches, d’expérimentation de méthodes nouvelles, d’échanges entre les spécialistes de différents pays. Cette période a été marquée en France par la présence active des personnes 60 sourdes dans l’enseignement spécialisé et par un fort développement de la vie associative dans la communauté sourde. L’Abbé de l’Epée a véritablement ouvert une ère d’émancipation et d’insertion sociale des sourds. C’est ce bouillonnement d’idées et d’initiatives qui a rendu possibles les initiatives prises par de nombreux professionnels, notamment des sourds, pour créer des institutions dans d’autres pays dont le Brésil. Ils ont été de fait nombreux à émigrer pour créer une éducation spécialisée là où elle n’existait pas encore. 1. Le fondateur : Charles Michel de l’Epée, Abbé de l’Epée (1712-1789) L’Abbé de l’Epée est connu dans le monde entier comme le bienfaiteur des sourds. Il n’a pas tout créé puisque plusieurs personnages se sont intéressés avant lui à l’éducation des enfants sourds. On peut citer notamment : Pedro Ponce de Leon (1520-1584) Juan Pablo Bonnet (1579-1623), initiateur des méthodes d’éducation orale John Wallis (1616-1703), utilisateur de langue écrite Johann Conrad Amman (1669-1724), qui a accordé une importance prédominante à l’articulation en refusant l’emploi de tout signe gestuel Jacob Rodrigues Pereire (1715-1780) qui s’est intéressé particulièrement à la démutisation des sourds-muets Samuel Heinicke (1727-1790) met en œuvre une éducation centrée sur l’expression orale ce qui lui vaut une controverse avec l’Abbé de l’Epée L’abbé Etienne-François Deschamps (1745-1791), initiateur d’une méthode mixte et auteur de plusieurs ouvrages. Du XVIème au XVIIIème siècle, les pionniers de l’éducation des sourds sont pour la plupart entendants et précepteurs d’enfants de familles riches. Ils n’ont pas de véritable contact avec la communautré sourde. L’Abbé de l’Epée va fonder à Paris en 1760 la première véritable école ouverte aux enfants sourds de toutes conditions sociales. Il est par ailleurs le premier à avoir compris l’importance du jeu et de la communication visuelle et gestuelle dans l’instruction comme dans la vie quotidienne des enfants sourds. Ces deux éléments fondent la vénération dont il est encore l’objet aujourd’hui et marqueront l’éducation des enfants sourds d’une empreinte indélébile. Pour comprendre la démarche de l’Abbé de l’Epée, il nous faut évoquer ses options religieuses et philosophiques. Dès son plus jeune âge et jusqu’à 1 Instituto Nacional de Jovens Surdos de Paris – França. 61 Anais do Congresso sa mort, il fut un adepte du jansénisme, donc d’un idéal de vertu et de piété austère, d’amour de la pauvreté et de tolérance. Cela lui valut beaucoup de difficultés avec l’église et une quasi interdiction de parole. Il s’est voué à la défense des pauvres lorsqu’il fut mis en présence de deux jeunes sœurs sourdes et muettes. Influencé par Saint Augustin, il pense que le langage est le résultat d’une convention humaine, qu’il est un ensemble de signes arbitraires marqué par l’intention de montrer ses sentiments, perceptions et pensées et que l’intelligence ne grandit pas uniquement à partir de l’apparition de la parole. Saint Augustin place au même niveau les signes et la parole, étant même réservé sur la capacité de cette dernière à exprimer ce que le cœur ressent. En observant les sœurs jumelles, l’Abbé de l’Epée aperçut leurs signes imitatifs et descriptifs motivés par la forme des choses, l’action et la nature des idées : il ne douta guère qu’il venait de découvrir enfin des signes naturels par excellence. Il lui restait à les organiser en une langue ayant droit de cité. Cette approche était identique à celle des philosophes de la même époque (Diderot, Condillac) pour lesquels, et c’est la grande leçon d’espoir du XVIIIème siècle, il n’existait aucun obstacle à l’intelligence humaine. Par ailleurs, la philosophie des Lumières (Jean-Jacques ROUSSEAU) valorisait la nature et donc les gestes. L’Abbé de l’Epée ouvre donc une école publique et gratuite dans sa maison familiale en 1760. Il met en œuvre une méthode basée sur des signes méthodiques traduisant toutes les idées de l’esprit humain ordonnées selon la syntaxe du français. Il écrivit deux livres : « L’institution des sourds et muets par la voie des signes méthodiques » et « La véritable manière d’instruire les sourds et muets, confirmée par une longue expérience ». Il ne bénéficia pas d’un réel soutien du roi Louis XVI en raison des ses positions jansénistes. Il mourut le 23 décembre 1789. La Révolution Française lui rendit hommage. En effet, par décret de l’Assemblée Nationale du 10 au 14 septembre 1791, l’institution nationales des sourds de naissance fut créée et l’Abbé de l’Epée placé au rang de ceux des citoyens qui ont le mieux mérité de l’humanité et de la patrie. L’institution des sourds s’installa en 1794 dans les locaux de la rue Saint Jacques où elle se trouve encore aujourd’hui. La Révolution ne s’y est pas trompée : l’Abbé de l’Epée a véritablement, en s’appuyant sur la religion et l’humanité, voulu permettre aux sourds de sortir de leur condition d’exclusion pour accéder véritablement à la citoyenneté. Ce message reste actuel pour toutes les personnes qui s’occupent de l’éducation des jeunes sourds. Bien sûr des progrès importants ont été accomplis depuis l’époque de l’Abbé de l’Epée, mais il reste encore beaucoup à faire, y compris dans les pays riches et développés pour garantir aux sourds une égalité d’accès à la formation et dans le domaine du travail. 62 Une récente étude du ministère de la Santé en France l’a bien montré. Après la mort de l’Abbé de l’Epée et à partir de son œuvre et de son message, s’ouvre comme je l’ai dit en introduction une période d’une grande richesse pour l’éducation des enfants sourds, même, et j’y reviendrai, si certaines des nombreuses méthodes développées ont entraîné beaucoup de souffrances. Les directeurs, les enseignants et les médecins se succèdent à l’institution de Paris. Certains ont véritablement marqué l’histoire de la surdité au travers d’une influence internationale durable et d’autres ont mené des travaux qui ont influencé de manière importante le développement de la médecine. 2. Les médecins L’abbé Sicard, successeur de l’abbé de l’Épée, sut donner l’école de Paris pour modèle en France, en Europe et notamment dans les pays scandinaves, et en Amérique. À l’éducation oraliste individuelle, réservée jusqu’alors aux familles nanties, s’ajouta une instruction par les signes dans les établissements nouvellement créés et spécialement conçus pour enfants sourds-muets. Par ricochet, la Révolution Française permit à la médecine des oreilles de sortir des limbes en offrant à Itard les conditions les plus propices pour la défricher. Très tôt apparurent des divergences dans la conception de la prise en charge des sourds-muets. Langue des signes, oralisation, bilinguisme, thérapeutiques médicales, autant de sujets de controverse. Pendant la plus grande partie du XIXe siècle, les médecins des oreilles participèrent aux débats à plus d’un titre. Ils s’ingéniaient à améliorer l’audition, chimère fort ancienne. La création d’établissements pour sourds-muets offrait un véritable défi aux médecins, donnant lieu à une débauche de “thérapeutiques” les plus invraisemblables. Mais les médecins voulurent aussi différencier les types de surdité pour mieux orienter la pédagogie. De là à donner des avis sur la pédagogie, le pas était vite franchi. Ainsi le balancier oscilla pendant près d’un siècle pour se bloquer en 1880, année du célèbre congrès de Milan. L’oralisme ne se discutait plus : c’était “la” vérité. Curieusement, c’est à partir de cette époque que les médecins cessèrent en grande partie de s’intéresser à la surdi-mutité. Tout au long des trois premiers quarts du XIXe siècle, la médecine des oreilles s’est beaucoup plus souvent développée dans les établissements 63 Anais do Congresso de sourds-muets que dans les hôpitaux. La diminution de l’activité médicale consacrée aux sourds-muets à la fin du XIX siècle a correspondu à l’implantation progressive dans les hôpitaux de cette nouvelle spécialité qu’était l’Oto-Rhino-Laryngologie. Sous le terme général de “surdi-mutité”, on désignait des déficits fonctionnels très divers. La surdité de naissance appelée volontiers “surdité congéniale “ pendant une grande partie du XIXème siècle, n’était pas toujours nettement distinguée de la surdité acquise, parfois à un âge relativement tardif. Ainsi, pendant toute cette période du XIXe siècle jusqu’au congrès de Milan de 1880, devant chaque enfant sourd-muet, médecins et pédagogues se trouvaient confrontés à deux grandes questions: • Comment corriger le déficit fonctionnel? • Quelle pédagogie adopter face à ce déficit fonctionnel? Lorsque Jean-Marc-Gaspard Itard(1774-1838), premier médecin de l’Institution Nationale des Sourds-Muets de Paris, prit ses fonctions de médecin de l’Institution des Sourds-muets en 1800, les maladies des oreilles souffraient d’un double handicap. Elles avaient très peu intéressé la médecine officielle, et leur côté mystérieux attirait les guérisseurs de tout genre. Ces oracles ne se contentaient pas de philosopher sur la surdi-mutité ; ils n’hésitaient pas à entreprendre des thérapeutiques agressives. L’arrivée d’Itard à l’Institution des Sourds-Muets correspondait à l’avènement d’une nouvelle conception de la médecine, abandonnant les discussions scholastiques pour entrer dans la période clinique. Un des chantres de cette rupture a justement été Itard. Ce jeune chirurgien initié aux nouvelles conceptions de la médecine par les plus grands maîtres d’alors, comme Pinel, fut amené à jeter les bases de l’otologie moderne et à relativiser ce qu’elle pouvait apporter à l’amélioration de la surdi-mutité. Les grands noms des médecins français qui bâtirent l’otologie française au XIX siècle se trouvent impliqués dans l’histoire de la surdi-mutité. D’ailleurs, plusieurs furent médecins de l’Institution des Sourds-Muets de Paris. Le poste de médecin de cet établissement était alors très envié par les auristes, leur procurant un revenu fixe et un logement de fonction. Prosper Menière et Jules Ladreit de Lacharrière furent les plus éminents successeurs d’Itard. 64 Dès son installation dans l’Institution, l’abbé Sicard lui confia l’éducation de “Victor, l’enfant sauvage de l’Aveyron” dont l’arrivée à Paris fit grand bruit. En quelques mois, les phares furent braqués sur “le médecin des sourds et muets”. Il fit de longs mémoires concernant l’éducation de cet enfant, notamment en 1801 et 1806, et lui consacra une bonne partie de son énergie pendant plusieurs années. Sa notoriété dépassa rapidement les frontières. Recruté pour veiller à la bonne santé des enfants, son rôle dépassa rapidement cette mission. Très tôt, il fut confronté à la surdité des enfants de l’Institution. Il nourrit au début l’espoir de trouver quelque méthode de guérison parmi les moyens tirés de la thérapeutique ; il employa successivement le séton, les vésicatoires sur la tête, le moxa, l’électricité, le galvanisme etc. sans aucun succès ; la perforation du tympan, le cathétérisme tubaire. Itard sut très tôt qu’il n’arriverait pas à améliorer l’audition des enfants sourds-muets, à quelques exceptions près. Itard a cherché à éduquer les organes de la parole par l’entremise de l’ouïe en essayant de faire entendre leur voix et non en les portant à observer et à imiter ce qu’il y a de plus visible dans le mécanisme de la parole ce qui l’a conduit à un certain rejet des signes. Le Traité des maladies de l’oreille et de l’audition d’Itard paru en 1821 peut être considéré comme un des ouvrages fondateurs de l’otologie moderne. En tant que médecin de l’enfant sauvage de l’Aveyron JeanMarc-Gaspard Itard est demeuré l’emblême des psycho-pédagogues, des éducateurs et des pédo-psychiatres. Ses recherches ont fait progresser la psychiatrie de manière déterminante et véritablement initié la prise en charge d’enfants qui auparavant étaient considérés inéducables. Prosper Menière (1799-1862), successeur d’Itard à l’Institution des Sourds-Muets constate en 1853, dans son livre De la guérison de la surdi-mutité et l’éducation des sourds-muets publié en 1853, qu’ Itard, après quarante ans de soins avait reconnu par expérience que la plupart de ses idées premières étaient bien plutôt des désirs et des illusions que des réalités...Il indique avoir vu une multitude d’enfants à qui l’on avait fait subir les traitements les plus douloureux, les plus barbares, les plus absurdes et les plus inutiles. Pour Menière, l’origine de l’erreur d’Itard provenait de son principe que “La surdité de naissance ou acquise dans l’enfance ne dépend pas de causes différentes de celles qui produisent la surdité chez les adultes. 65 Anais do Congresso Menière n’a pas critiqué son prédécesseur, bien au contraire. Placé dans les mêmes conditions, il y a tout lieu de penser qu’il aurait agi de façon identique. On ne peut faire endosser à Itard tous les épouvantables traitements évoqués par Menière, subis par “une multitude d’enfants”. En septembre 1860, soit quatre mois avant son célèbre mémoire sur la maladie qui porte désormais son nom, Menière fit une lecture devant l’Académie de médecine sur “De l’expérimentation en matière de surdimutité”. L’auteur rapportait la présence dans l’Institution d’enfants sur lesquels on avait essayé une multitude de moyens et qui en portaient des traces non équivoques : cautérisations violentes, applications de moxas laissant des cicatrices profondes ; nuque labourée avec des sétons, emploi de l’électricité et l’éther sulfurique. Menière se plaignait qu’aucune méthode scientifique n’ait été appliquée. Ainsi, les principaux protagonistes médicaux dans le domaine de la surdité pendant ce XIXe siècle ont aussi joué un rôle important dans le développement de l’otologie, avec chacun une marque particulière. Itard fut un initiateur, un découvreur. Il sut tirer rapidement les conclusions de ses essais thérapeutiques. Son Traité des maladies de l’oreille et de l’audition a joué un rôle considérable. Menière était un grand clinicien, pétri “d’humanités “et d’humanisme. Ses qualités d’observation l’amenèrent à donner à l’otologie française cette magnifique découverte de la maladie qui porte désormais son nom. Pendant une grande partie du XIXe siècle, de nombreux enfants sourds-muets furent soumis à des thérapeutiques agressives dans l’espoir d’améliorer leur audition. Ces traitements chez des enfants, dont les séquelles furent rapportées notamment par Menière, paraissent aujourd’hui révoltants. Lorsque Itard devint médecin de l’Institution des Sourds-Muets de Paris en 1800, il se trouva devant une tâche immense car il n’avait pratiquement aucune référence pour se guider. Il dut littéralement défricher une otologie balbutiante. Il est donc à bon droit considéré comme un des fondateurs de la médecine moderne des oreilles. Son travail de pionnier a eu aussi pour champ d’activité la psychiatrie. Ayant réalisé la première psychothérapie d’un enfant autiste et su identifier le mutisme par la lésion des fonctions intellectuelles dans un mémoire présenté devant l’Académie de médecine en 1828, il est aussi considéré comme un des fondateurs de la pédopsychiatrie. 66 La surdi-mutité fut le moteur du développement de l’otologie pendant une bonne partie du XIXe siècle. Les sourds-muets en furent les victimes. Les cicatrices ne furent pas seulement physiques ; elles sont encore très sensibles. Il n’en demeure pas moins que les travaux des médecins de l’institution ont eu un retentissement très important, bien au-delà de la France et de l’Europe. Dans leur sillage, la clinique naissante des maladies du langage et le discours positiviste entraînent un renversement considérable de l’image des sourds. La gestualité sera inscrite dans le registre de l’expression inarticulée et d’une sensualité qui s’accommodera mal avec les rigueurs morales du positivisme. Les approches héritées de l’Abbé de l’Epée et des philosophes qui ont inspiré la Révolution Française se trouvent remises en cause. 3. Les professeurs sourds et entendants Dans les décennies qui suivirent la mort de l’Abbé de l’Epée et à partir de l’approche ouverte et humaniste qu’il avait développée, plusieurs professeurs sourds furent amenés à enseigner à l’institut de Paris. Certains d’entre eux ont joué un rôle très important pour le développement de l’éducation spécialisée en France et dans le monde et pour l’émergence d’une vie citoyenne et associative très active au sein de la communauté sourde. La Révolution Française, en créant l’institut de Paris, a favorisé l’émergence de la communauté sourde et l’affirmation de son identité spécifique. Je souhaiterais maintenant vous dire quelques mots de ces personnages et de leur œuvre qui je pense a dû fortement inspirer Ernest HUET lorsqu’en 1855 il a rédigé son rapport pour l’empereur Don Pedro II lui proposant de créer un institut pour sourds à Rio de Janeiro. Ernest HUET était alors directeur de l’institut des sourds muets de Bourges dans le centre de la France et donnait des cours à l’institut de Paris. La période qui nous intéresse est en effet unique par la présence de sourds parmi les personnels d’éducation de l’institut de Paris. Ce ne sera plus le cas après 1880 et il faudra attendre la fin du XXème siècle pour retrouver une présence significative de sourds dans les effectifs des instituts spécialisés en France. Jean MASSIEU (1772-1846), sourd de naissance, arrive à l’institut de Paris en même temps que son premier directeur, l’Abbé SICARD, en 1794. Il deviendra le deuxième professeur sourd de l’histoire, après Etienne de FAY au début du XVIII ème siècle. MASSIEU est une figure importante 67 Anais do Congresso de la première génération de sourds ayant eu accès à la culture grâce aux pédagogies de l’Abbé de l’Epée. Il a été célèbre pour la poésie, mais aussi la précision et la rapidité des réponses qu’il faisait au public lors des nombreuses séances de démonstration organisées par SICARD. Il a rencontré les plus grands personnages de son époque. En 1815, invité par Thomas Hopkins GALLAUDET à se rendre aux Etats-Unis, il décline l’offre en raison de sa santé et c’est Laurent CLERC qui y va (j’en reparlerai). En 1823, après la mort de SICARD à qui il était très lié mais qui s’était beaucoup servi de lui pour sa promotion sociale, il devient professeur et directeur à l’école de Rodez puis part à Lille en 1835 pour fonder une institution pour sourds et muets. MASSIEU fut le précurseur : ses élèves et ceux de la génération suivante furent les étoiles du mouvement sourd au XIX ème siècle. Laurent CLERC (1785-1869), devenu sourd à la suite d’un accident à l’âge d’un an, est placé en tant qu’élève à l’institut de Paris en 1797. Jean MASSIEU est son professeur. En 1805, il devient répétiteur puis professeur et aura parmi ses élèves Ferdinand BERTHIER (voir plus loin). En 1815, il part à Londres avec SICARD et MASSIEU et rencontre Thomas Hopkins GALLAUDET, pasteur américain, venu à Londres pour apprendre une méthode d’éducation pour les enfants sourds des Etats-Unis. En 1816, il émigre. Durant la traversée, il apprend la langue des signes à GALLAUDET qui lui apprend l’anglais écrit. Ils fondent tous deux la première école spécialisée des Etats-Unis à HARTFORD (Etat de New York) en 1817. Il forme de nombreux sourds qui deviendront professeurs et directeurs. Son action rend possible la création de l’université GALLAUDET à WASHINGTON en 1864. A travers lui, la langue des signes française a eu une forte influence sur l’American Sign Langage (ASL). Ces deux langues ont encore aujourd’hui de nombreux points communs. Malgré son dévouement SICARD, premier directeur de l’institut de Paris n’avait rien compris à la réalité sociale et psychologique des sourds. A sa mort en 1822, l’échec des signes méthodiques est évident. Ses incohérences dans les méthodes pédagogiques employées poussent des professeurs entendants qui connaissent bien la langue des signes à s’allier avec les répétiteurs sourds devenus professeurs, pour revendiquer l’utilisation de la langue des signes en classe. C’est notamment le cas de Roch Ambroise Augustin BEBIAN (17891839), entendant, responsable pédagogique de l’institut à partir de 1817, qui devient le premier porte parole d’un type original d’éducation qui utiliserait la « langue naturelle des sourds ». BEBIAN mit au point une pédagogie originale d’accès au Français écrit, à partir de la Langue des Signes Française dont il avait une connaissance approfondie. En 1825, il fit paraître la première tentative connue de transcrire la langue des signes afin de pouvoir garder 68 des traces écrites de discours, récits, poèmes directement pensés dans cette langue. Ce système, appelé mimographie, ne fut pas utilisé. BEBIAN était considéré par BERTHIER dont je vais vous parler ensuite comme « l’homme digne de saisir la pensée entière de l’Abbé de l’Epée et de la féconder ». BEBIAN propose une thèse révolutionnaire pour l’époque, celle d’une éducation véritablement bilingue. Son opinion est que l’acquisition de la langue est facilitée quand l’idée a déjà été comprise grâce à la langue des signes. Loin de négliger le français, les élèves apprenaient à le lire et à l’écrire très correctement. De nombreuses œuvres littéraires et poétiques composées à l’époque par des sourds éduqués de cette manière sont là pour l’attester. BEBIAN ne rejette pas l’apprentissage de la parole mais réserve plutôt celle-ci pour les échanges familiers et pour rendre aisées les relations avec les entendants dans la vie quotidienne. Quand il s’agit du développement intellectuel, auquel il consacre tous ses efforts, il a recours aux explications en langue des signes. L’accession de la langue des signes au rang de langue d’enseignement va avoir pour effet de légitimer le rôle des professeurs sourds. Elle est adoptée par de nombreuses écoles à cette époque et les anciens élèves, devenus professeurs, participent activement à l’enrichissement et à la diffusion de leur langue. Les grandes écoles se multiplient en France et deviennent des centres de ralliement des communautés sourdes dans chaque région. Cependant, les partisans de l’éducation bilingue commettent l’erreur de ne pas s’intéresser à l’enseignement de la parole et ne pensent pas à organiser la relève en formant des professeurs entendants. Il en résulte un raidissement des partisans de l’éducation oraliste et nous verrons que le XIXème siècle est aussi marqué par une lutte acharnée entre ces deux conceptions qui se clôturera par la victoire des oralistes au congrès de Milan en 1880. Néanmoins, le milieu du XIXème siècle va être marqué par un formidable développement des initiatives et de la créativité au sein de la population sourde. Les sourds accèdent à des responsabilités et forment notamment au sein de leur communauté de nombreuses associations. L’épanouissement intellectuel des sourds progresse de façon spectaculaire. On voit apparaître de nombreux artistes sourds, écrivains, poètes, peintres, graveurs… L’exemple le plus frappant de cette évolution est Ferdinand BERTHIER (1803-1886). Attardons-nous un peu sur ce personnage d’une grande importance aujourd’hui encore vénéré par la communauté sourde. Elève à l’institution 69 Anais do Congresso de Paris en 1811, il eu pour professeurs Laurent CLERC, Jean MASSIEU et Auguste BEBIAN. Il devient répétiteur en 1824, puis professeur en 1829. En 1830, il rencontre le roi Louis-Philippe avec un autre professeur sourd Alphonse LENOIR pour lui décrire la situation lamentable de l’école. En 1834, il décide d’organiser chaque année un banquet des sourds pour rendre hommage à l’Abbé de l’Epée. Ces banquets connaîtront un grand succès et draineront des participants de nombreux pays. J’y reviendrai. En 1838, il fonde la société centrale des sourds-muets, première association de sourds dans le monde qui existe encore aujourd’hui. Lors de la révolution de 1848, il se bat pour défendre la République et sera le premier sourd à être décoré de la Légion d’Honneur en 1849. Il publiera plusieurs ouvrages destinés à aider les sourds à mieux connaître leurs droits et leur histoire. A l’époque de BERTHIER, la communauté sourde française joue un rôle de guide dans les échanges entre sourds de plusieurs pays. L’idée d’une culture internationale et d’un langage compris dans toutes les parties du monde émerge. L’avenir montrera que les choses ne sont pas si simples. Quelques mots maintenant sur les banquets de sourds créés à l’initiative de BERTHIER. Il est indéniable que ces banquets ont eu une influence importante. Ils rassemblaient l’élite des sourds qui avaient réussi socialement et aussi une élite internationale (Europe, Etats-Unis, Amérique du Sud). Ils étaient le lieu du culte de l’Abbé de l’Epée, véritable ciment de la nation sourde, et aussi une tribune politique. Il est raisonnable de penser que ces rencontres intellectuelles ont suscité ensuite des initiatives dans de nombreux pays. Les organisateurs avaient en outre l’intelligence d’organiser la communication autour de ces banquets en invitant les rédacteurs de nombreux journaux, ainsi que des fonctionnaires et des responsables politiques. Il y eut également de nombreux invités prestigieux du monde des arts et des lettres. Les circonstances empêchèrent Victor HUGO de participer malgré plusieurs invitations. Il s’en excusa par écrit dans des termes qui sont restés célèbres, notamment : « qu’importe la surdité de l’oreille quand l’esprit entend. La seule surdité, la vraie surdité, la surdité incurable, c’est celle de l’intelligence. ». CONCLUSION Le XIXème siècle fut donc une période d’une richesse exceptionnelle. Beaucoup d’écoles furent créées dans divers pays à partir de l’institut ou à 70 partir d’initiatives de professeurs sourds qui y avaient enseigné. Les pays scandinaves mirent en place une éducation des sourds basée sur des principes issus de l’institut parisien : __ Ecole accessible à tous les sourds quelle que soit leur origine et la capacité des parents à payer les études, __ Place naturelle de la langue des signes dans l’enseignement et présence d’enseignants sourds, __ Mise en place de formations professionnelles, La place des sourds aujourd’hui dans les sociétés du Nord de l’Europe doit beaucoup à ces initiatives. Ernest HUET (ou Edouard…les sources varient concernant son prénom) est bien un homme de cette époque. Né à Paris en 1822, dans une famille de la noblesse, il devient sourd à l’âge de 12 ans après avoir contracté la rougeole. Elève brillant, il parlait déjà français, allemand et portugais avant de devenir sourd. Après sa surdité, il apprend l’espagnol et étudie à l’institut de Paris pour devenir professeur. Il enseigne ensuite à l’institut et devient directeur de l’institut des sourds de Bourges. Il a très certainement été influencé par le dynamisme qui régnait à l’époque dans le monde de la surdité. HUET émigre au Brésil en 1855 avec comme principal objectif la fondation d’une école de sourds. Il était motivé par des sentiments de solidarité humaine vis-à-vis de ses semblables. Il apporte une lettre de recommandation du ministre français de l’Instruction Publique. Vous connaissez bien sûr son action au Brésil à partir de la création de l’INES en 1857 et jusqu’à la fin de son mandat de directeur en 1861. J’ai découvert, mais peut être cela est-il connu ici au Brésil, que HUET fut invité au Mexique en 1865 par le président JUAREZ pour organiser et diriger une école pour sourds. Il accepta avec enthousiasme l’invitation. Le destin exceptionnel d’Ernest (Edouard) HUET illustre bien tout l’intérêt de la période à laquelle il a vécu en ce qui concerne l’éducation des enfants sourds. Je me suis donc penché sur cette période grâce aux organisateurs du congrès et cela a été un travail véritablement passionnant. Il nous faut 71 Anais do Congresso essayer de tirer les leçons de cet épisode exceptionnel pour partager nos connaissances, échanger et développer des relations et des partenariats internationaux notamment. Il reste encore beaucoup à faire pour faire progresser l’éducation des enfants sourds, même dans les pays développés. L’acquisition et la maîtrise de la langue demeurent des questions complexes. L’essentiel est d’adopter un esprit d’ouverture, de ne pas considérer qu’on est seul à posséder la vérité, d’utiliser probablement la complémentarité des différentes méthodes, de ne pas opposer l’oral et la langue des signes, la médecine et la communication, l’approche pratique, utilitaire et l’accès à la culture. La grande leçon du XIX ème siècle est surtout que les sourds ont participé activement au mouvement de développement de l’éducation et cela a été déterminant bien sûr pour les progrès dont j’ai parlé. Les valeurs d’ouverture, de tolérance et de respect de l’autre portées par l’Abbé de l’Epée conservent toute leur valeur en 2007. Il est possible sur cette base de réaliser de nouveaux progrès. Je vous remercie de votre attention. 72 PAINEL INTERNACIONAL MEIO SÉCULO TRABALHANDO COM O SURDOCEGO E MÚLTIPLO DEFICIENTE NO Helena Burgés Olmos1 BRASIL A visita da ilustre surdocega Helen Keller, em 1953 no Brasil, estimulou a professora de cegos do Instituto Padre Chico, em São Paulo, Nice Tonhosi, a também compreender a comunicação dos surdos, levando-a fazer um curso em uma escola do Rio de Janeiro. Assim, com o conhecimento das duas deficiências, esta entusiasta professora conseguiu uma bolsa de estudos para especializar-se na Perkins School for the Blind, nos Estados Unidos. Ao retornar a São Paulo em 1961, iniciou oficialmente a educação do surdocego brasileiro atendendo duas crianças na Escola para Cegos “Padre Chico”. Por dificuldades financeiras essa classe se extinguiu, mas a professora Nice, juntamente com outra professora de cegos, Thereza Adelina Barros Tavares, procuraram outra Instituição para dar continuidade a esse pioneiro serviço. Foi então que, depois de obterem uma verba da Campanha Nacional de Educação de Cegos, criaram um setor de educação de Deficiências Audiovisuais, SEDAV, na Fundação para o livro do Cego no Brasil, atualmente Fundação Dorina Nowill. A professora Nice, em 1968, ao saber de um projeto em que um deputado em São Caetano do Sul iria montar uma escola de excepcionais, propôs para o mesmo espaço uma escola de deficientes audiovisuais. Sendo assim, foi fundada a Escola Residencial para Deficientes Audiovisuais – ERDAV. Descobriu a primeira surdacega adulta com uma boa comunicação, Maria Francisca da Silva. As duas mantinham correspondência em Braille. Participaram de muitos congressos, palestras: sempre demonstrando a possibilidade de comunicação e as potencialidades do surdocego. No ano de 1995, Dona Nice foi homenageada pelos serviços prestados `a educação ao surdocego com a Medalha “Anne Sullivan” na XI Conferência Internacional DBI-Cordoba – Argentina (Conferência Internacional sobre surdocegueira). Em 1977, foi instalada a Fundação Municipal “Anne Sullivan”, de São Caetano do Sul, mantenedora até hoje da Escola de Educação Básica “Anne Sullivan”, que substituiu a ERDAV, tendo inicio um programa de atendimento a surdocegos liderado por Neusa Basseto, que também 1 ADejAV/SP – Brasil. 73 Anais do Congresso se especializou na Perkins School for the Blind e com Liek de Liew na escola de surdocegos de Saint Michielgestel , na Holanda . Revelando-se uma grande líder muito dedicada e com plena consciência da urgência em fortalecer a educação do surdocego no Brasil. Desde então muitos trabalhos surgiram no Brasil. Instituições foram criadas com o apoio técnico e financeiro do Programa Hilton Perkins para América Latina, que vem capacitando profissionais com o objetivo único de multiplicar os conhecimentos adquiridos nessa área da surdocegueira e da múltipla deficiência, conforme apresentamos a seguir. Em 1982, pelo empenho e idealismo da Dra. Silvia Vietzman, foi criado na Irmandade Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, um serviço que pertence ao Setor de Baixa Visão do Departamento de Oftalmologia, nomeado de Centro Eva Lindsted. Esse Centro visa dar atendimento clínico, avaliação funcional da visão, orientação a pais, programa de reabilitação, atividades com as famílias dos portadores de baixa-visão associados e outros comprometimentos, como a surdez ou problemas motores. Tem ainda como objetivo a pesquisa, educação de profissionais e apoio e desenvolvimento de outros centros, oferecendo cursos de capacitação e apoiando o desenvolvimento de serviços em todo o Brasil e América Latina. Desde 1991 o programa Hilton Perkins (EUA) e outras instituições internacionais são parceiros desse empreendimento. Em 1983, foi fundada a Associação para Deficientes da Áudio Visão ADefAV, na cidade de São Paulo, por uma equipe de profissionais que tinha o objetivo de atender surdocegos e surdos sem outros comprometimentos. Tem atuado com surdocegos e multideficientes em parceria com a Perkins School desde 1991, da qual recebe consultorias, além de preparar profissionais da ADefAV, que têm a responsabilidade de repassar os conhecimentos adquiridos para outras Instituições do Brasil: Recife(PE), Natal(RN), Fortaleza(CE), Salvador(BA), Belém(PA), Porto Alegre(RS), Maceió(AL) e São Paulo. Em 1991, nascia AHIMSA, Associação Educacional para a Múltipla Deficiência, Instituição que atua com surdocegos e multideficientes. Em 1997, uma ONG se formava, o Grupo Brasil de apoio ao surdocego e múltiplo deficiente sensorial, oficializada em 1999. Seu objetivo é o de promover a qualidade de vida e ampliar os serviços para o surdocego e o múltiplo deficiente sensorial. Agregou um grupo de Instituições que atendiam outras deficiências e que passaram a receber surdocegos e múltiplos deficientes: Pró-Visão em São José dos Campos, CENTRAU em Curitiba, ASSUMU em Umuarama, MARLENE ROCHA em Campo Grande – MG, BENJAMIN CONSTANT – RJ, FUNDAÇÃO CATARINENSE – (SC). Em 1997 o Brasil foi convidado a participar do IIIº Seminário POSCAL - Programa de apoio a Organizações de Pessoas Surdocegas na América 74 Latina e a 6a. Conferência Internacional Helen Keller, realizada na Colômbia. A partir dessa data sempre houve a participação do Brasil, na maioria das vezes, sendo representado por Claudia Sofia Indalécio Pereira, sudacega, primeira presidente da ABRASC - Associação Brasileira de Surdocegos, que foi fundada em 1998, com o apoio da POSCAL e instituições Brasileiras. Claudia Sofia acompanhada por Sr. Manuel Osório surdocego de Minas Gerais ou Alex Garcia do Rio Grande do Sul e (seus guiasintérpretes), participaram de outros seminários POSCAL, preparando-se para a liderança no Brasil e na América Latina. 1997- IIIº SEMINARIO POSCAL- Colômbia. IVº CONFERENCIA MUNDIAL HELEN KELLER Presentes- Claudia Sofia indalécio Pereira e Maria Francisca da Silva 1998- IIª. REUNIÃO DE LIDERES- Colômbia Presentes- Claudia Sofia indalécio Pereira- Sr. Manuel Osório e esposa 1998- IVº SEMINARIO POSCAL- Equador Presentes- Claudia Sofia indalécio Pereira - Alex Garcia 1999- Vº SEMINARIO POSCAL- Cuba Presentes- Claudia Sofia indalécio Pereira - Alex Garcia Em 1999, foi criada a ABRAPASCEM - Associação Brasileira de Pais e Amigos dos Surdocegos e Múltiplos Deficientes Sensoriais. Objetivando reunir, auxiliar e orientar pais e outros membros da família, promover ações que alcançassem o mais pleno desenvolvimento dos seus filhos, garantir seus direitos como cidadãos e tantas outras ações. Essa associação de pais se espalhou por todo o Brasil, como São José dos Campos, Curitiba (PR), Umuarama (PR), Florianópolis (SC), Brusque (SC), Santa Maria (RS), Pato Branco (RS), Dourados (MS), Barreiras (BA), Ji-Paraná (RO). Outra associação de pais foi instalada com o nome de Centro de Integração Vitor Eduardo - CIVE, situada em São Caetano do Sul, no ano 2000, e trouxe como proposta o atendimento médico-terapêutico e educacional a surdocegos e multideficientes com o objetivo de valorizar ao máximo o potencial deste indivíduo. Foi pela necessidade de preparar profissionais que atendessem indivíduos com surdocegueria e múltiplas deficiências que se iniciou em 2000 o primeiro curso de pós-graduação lato sensu, FORMAÇÃO DE EDUCADORES DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIAS SENSORIAIS E MÚLTIPLAS DEFICIÊNCIAS, da Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo, a qual tem como parceira a Perkins School for the Blind – MA/EUA. Nestes 50 anos, desde a vinda de Helen Keller no Brasil, acompanhamos um variado número de Instituições que se organizaram com o intuito de 75 Anais do Congresso educar o surdocego por todo o Brasil. Com o número crescente de crianças com surdocegueira, sequeladas pela Síndrome de Rubéola Congênita, Síndrome de Usher ou com Múltiplas Deficiências, causas de diferentes síndromes como Down, Trissomia 13, CHARGE, disfunções peri-natal congênitas, AIDS, Herpes, Sífilis, Toxoplasmose, Meningite, asfixia, encefalite, derrame cerebral, trauma craniano, mais programas de educação foram se estabelecendo e desenvolvendo recursos tanto para a pessoa com necessidades especiais como para seus familiares, no empenho de educar, orientar e prevenir, assim como o fortalecimento de profissionais que necessitam formações especiais para lidar com este tipo de deficiência. Algumas dessas Instituições localizadas em São Paulo, como a ADefAV, Santa Casa, Ahimsa, Universidade Presbiteriana Mackenzie e Grupo Brasil contam com a parceria fundamental da escola “Perkins School for the Blind”, escola que há aproximadamente 180 anos se dedica a educação de surdocegos, e veio implantar programas no Brasil e na América Latina incentivando a formação de profissionais multiplicadores deste conhecimento a trabalho com esta população. Com o objetivo de multiplicar o conhecimento na área da surdocegueira e da múltipla deficiência é que a Perkins School for the Blind. MA- EUA, vem atuando no Brasil e na América Latina aproximadamente duas décadas. A AdefAV, capacita cerca de 340 profissonais por ano, somando 325 horas de treinamento por ano, atingindo assim, 997 alunos. Site das Instituições: ADefAV – www.adefav.org.br AHIMSA- www.ahimsa.org.br Grupo Brasil- www.grupobrasil.com Universidade Mackenzie- www.mackenzie.br Cive- www.cive.org.br ABRASC- www.abrasc.org.br INES – RJ – www.ines.org.br Agapasm – www.agapasm.com.br Abrapascem – www.abrapascem.org.br Bibliografia OLMOS, H.B. – Mães de adolescentes surdocegos : expectativas quanto ao futuro. Dissertação, São Paulo, 2005 . SILVA, A. M.B.- Histórico da Educação do surdocego no Brasil, et at. Formação Continuada:Guia-Intérprete Empírico, São Paulo: Projet 76 PAINEL INTERNACIONAL PROGRAMA HILTON PERKINS Sara Nolla1 Introducción Es un placer y honor estar hoy aquí en Río de Janeiro, Brasil participando del “VI Congreso Internacional y del XII Seminario Nacional, en los 150 años de la Educación Brasileña”, acompañada de grandes amigos y colegas; y facilitando un espacio para dar a conocer las implicancias del Programa Hilton Perkins en América Latina He estado involucrada en el trabajo con niños con Discapacidad Visual y con discapacidad múltiple desde hace 23 años en mi país Uruguay y vinculada con el Programa Hilton Perkins desde hace 12 años. En América Latina, los sistemas de Educación se iniciaron a fines del siglo XIX y desde esa época hasta 1981 “Año internacional de los Impedidos”, y a pesar de Normas Uniformes, sobre la igualdad de oportunidades para los Impedidos, emanadas de las Naciones Unidas, aún se observa a los Sistemas Educativos limitados en dar respuesta a los derechos de las personas con necesidades múltiples y a sus familias. (Ferioli, G; 2005) Partiendo de que la persona con necesidades múltiples es aquella que detenta una combinación de necesidades físicas, de salud, pedagógicas y socio-emocionales que limitan el “normal” acceso a los beneficios educativos , comunitarios , vocacionales y otros, estas personas requieren de servicios adecuados / adicionales para que sus necesidades y las de sus familias sean satisfechas. Fred P. Orelove, Ph. D. Dick Sobsey, Ed. D.; 1994. Al examinar el documento de Acción Internacional que propone la Deafblind Internacional del año 2005, para los servicios de las personas sorda ciegas con discapacidad adicional y multi impedidos, dice que debemos focalizar sobre: * “ reconocimiento de la sordo ceguera con discapacidad adicional 1 Representante da Perkins School of the Blind – Uruguai. 77 Anais do Congresso y multi impedidos por parte de los gobiernos, servicios, profesionales y público en general como una discapacidad única y heterogénea; *identificación de la población; *participación de la persona sorda ciega con discapacidad adicional y multi impedidas en la planificación del servicio; *diagnóstico e intervención temprana; *ofrecer evaluaciones para detectar las necesidades que tiene para acceder a su educación o rehabilitación; *asegurarle a la persona y su familia los servicios especializados con flexibilidad en el número de horas, tiempo y días; *ofrecer oportunidades para comunicarse y establecer relaciones sociales; *ofrecer información y formación a los padres y otros familiares e incluirlos en la planificación y ejecución de los servicios; *facilitar el acceso al medio ambiente y a obtener información dotándolo de edificios accesibles y disponibilidad de equipamiento; *reconocimiento de que las personas sorda ciegas con discapacidad adicional y multi impedidos tienen el derecho de recibir los servicios a través de profesionales formados en la especialidad para que las necesidades sean satisfechas”. Si nosotros como Latinoamericanos creemos que la población que hoy nos convoca y que todos los días vemos a través de nuestras prácticas diarias en nuestros lugares de trabajo, tiene derecho a disfrutar de una plena inclusión en nuestra sociedad necesitamos antes de determinar el rumbo para alcanzar nuestra creencia, analizar los hechos acontecidos en la última década y el contexto actual para luego poder proponer las posibles acciones que se deberían implementar para seguir destejiendo la trama para un futuro mejor. Los invito entonces, a examinar los datos obtenidos del estudio de investigación “Exclusión Cero: Barreras Institucionales y Educativas que enfrentan los niños y jóvenes con impedimentos multi sensoriales y discapacidades adicionales y sus familias en el cono sur de América Latina” (Ferioli, G; 2003) *Actitud Profesional en relación a la Participación de los Padres: Metas alcanzadas al día de la fecha: • Creación de Grupos o Asociaciones de Padres creando sus propias redes de trabajo. • Paulatino aumento por parte de los padres en el conocimiento de sus derechos como padres de personas multi impedidas y como ciudadanos, 78 lo que les brinda la seguridad y la certeza de saber qué, dónde, cuándo, cómo y a quién demandar. • Mayor demanda por parte de los padres a las instituciones escolares ejerciendo presiones políticas para que sus hijos sean aceptados en los programas educativos públicos originándose desde la escuela públicas iniciativas para ofrecer nuevas ofertas educativas. * Recursos Administrativos Escolares-Reglamentación Vigente: Metas alcanzadas al día de la fecha: • Las autoridades están comenzando en algunos países a considerar la población ofreciendo los recursos humanos y materiales que necesitan para que la oferta educativa responda a las necesidades de la persona. • Algunas escuelas públicas especiales del Cono Sur de América Latina se encuentran en un proceso de transformación en cuanto a ofertas educativas. Los datos permiten afirmar que si bien aún hay un largo camino por recorrer, algunas instituciones educativas públicas de modalidad especial están sumamente interesadas en revisar sus objetivos institucionales * Estrategias de Formación Docente Continua: Metas alcanzadas al día de la fecha: • Los Ministerios de Educación están comenzando a ejecutar programas de capacitación de personal como una forma de garantizar la inclusión de la población y no solo piensan en lograrlo a través de las reglamentaciones existentes • Las Universidades y los Institutos Superiores de Educación han comenzado a desarrollar programas de grado y post grado en la especialidad de discapacidad multi sensorial y discapacidad múltiple. • En algunos casos, los gobiernos están cubriendo con pequeños subsidios para que los docentes puedan acceder a ese nivel de formación. *Visión de los Servicios de Salud: Metas alcanzadas al día de la fecha: • Algunos centros hospitalarios han comenzado a ofrecer servicios de atención temprana lo que ha facilitado las derivaciones acertadas a los servicios educativos estableciéndose ciertas redes en los momentos de las transiciones. • Incremento en el número de servicios de atención temprana en las escuelas lo que ha llevado a las escuelas especiales a acercarse a los 79 Anais do Congresso servicios de salud para la detección de la población. • Incremento de encuentros de salud-educación aunque un índice bajo de participación de los agentes de salud a los eventos educativos. * El Equilibrio entre las Necesidades de la Persona y su Familia, y los Servicios Sociales: Los datos recogidos revelan que un alto porcentaje de niños / jóvenes con discapacidades múltiples pertenecen a familias indigentes y desinformadas, que viven en condiciones infrahumanas, con escasez de alimentos o falta de agua potable. Estos individuos no reciben controles médicos sistemáticos ni asisten a la escuela regularmente. Los servicios sociales dependientes del Estado hacen grandes esfuerzos por cubrir necesidades primarias tales como alimentación, salud y educación; estos esfuerzos, no obstante, se ven dificultados por la falta de coordinación entre las distintas áreas de gobierno. Las Áreas Sociales deberían tomar medidas para satisfacer las necesidades primarias de la población alcanzando un equilibrio entre las necesidades y los recursos disponibles. Como las necesidades son mayores que los recursos, resulta imprescindible el trabajo mancomunado en las áreas de salud y educación, para que las familias puedan hacer buen uso de los recursos disponibles, si se los asesora, informa y educa de manera clara. A su vez, estos recursos podrían ser potencializados a través de proyectos familiares y comunitarios. El éxito de este proceso educativo revertiría la mendicidad y permitiría el reconocimiento de los valores inherentes de cada persona para contribuir a la sociedad a la que pertenece. * El Equilibrio entre las Necesidades de la Persona y su Familia, y los Servicios Sociales: Los datos obtenidos en este estudio revelan que las sociedades latinoamericanas asumen una conducta de total desinterés por el tema, o bien actúan sobreprotectoramente. Estas conductas extremas limitan la inclusión de las personas multi impedidas y multi impedidas sensoriales en la sociedad. En consecuencia, es necesario que el gobierno, las organizaciones de padres, las ONGs, los medios masivos de comunicación y toda fuerza viva de la comunidad brinden información simple, clara y precisa sobre las oportunidades de educación y rehabilitación que tiene esta población y sobre los recursos y programas disponibles. La información que se ofrezca bajo cualquier estrategia alentará a los ciudadanos de la región a buscar el modo adecuado de facilitar la inclusión de personas multi impedidas y multi impedidas sensoriales y sus familias en la comunidad a la cual pertenecen. 80 Metas alcanzadas al día de la fecha • Reconocimiento y reglamentación en algunos países de la sordo ceguera como discapacidad. PROGRAMA HILTON PERKINS A_- Declaración de nuestra Misión 1-La misión de Hilton Perkins es mejorar la calidad de vida de los niños y jóvenes con multiimpedimento visuales y necesidades múltiples (incluida la sordo ceguera) y de sus familias, acrecentando sus oportunidades educacionales. 2-El programa ofrece en colaboración con otras entidades liderazgo, experiencia y recursos para mejorar y ampliar los servicios a través de esfuerzos nacionales e internacionales orientados a la comunidad. 3-El propósito de nuestra labor es el proveer asistencia técnica a nivel local, nacional y regional. 4-Todas las actividades se desarrollan mediante la planificación en colaboración con agencias locales y regionales y tienen como enfoque aumentar la capacidad local para proveer servicios cuando es posible, se emplea la experiencia y los recursos locales y regionales en combinación con especialistas del exterior para llevar acabo las actividades. B- Objetivos del Programa 1- Desarrollar, perfeccionar y ampliar programas y servicios educacionales y de apoyo para niños ciegos, multiimpedidos y sordo ciegos. 2- Fortalecer y perfeccionar la organización formal e informal entre los proveedores de servicios, familias y otras agencias en cada región. 3- Expandir y fortalecer experiencias locales y regionales y también materiales y literatura profesional en cada región. 4- Despertar y /o aumentar la conciencia pública en todos los niveles de la sociedad sobre mérito de proveer apoyo y servicios para niños y jóvenes ciegos multiimpedidos y sordo ciegos y también para sus familias. C- Principios fundamentales Nuestras prioridades son: 1- servicios para bebés, niños y jóvenes con multimpedimento visuales y otras discapacidades agregadas, incluyendo la sordo ceguera y sus familias. 2- apoyo al desarrollo de organizaciones de familias de niños con impedimentos visuales y otras discapacidades agregadas. 3- programas de apoyo para capacitación, preparación de materiales y otros tipos de asistencia técnica. 81 Anais do Congresso 4- la duración y las actividades de los proyectos redeterminan individualmente. 5- énfasis sobre el apoyo para mejorar los proyectos específicos locales, poniendo atención en los sistemas nacionales cuando sea posible y necesario. 6- el apoyo para los países seleccionados dependerá de la limitación de nuestros recursos y de la disposición de los países para establecer servicios. 7- se ofrecen consultas, información y asesoramiento a cualquier agencia, sin tener en cuenta si tenemos o no un proyecto con ésta 8- colaboración con otros proveedores de servicios que estarán basados solamente en un interés común en los programas. 9- los materiales desarrollados a través del programa comprenderán específicamente las necesidades de los niños con impedimentos visuales y otras discapacidades agregadas. 10- los responsables de los proyectos colaborarán con las organizaciones locales, utilizando todos los recursos y experiencias locales disponibles. EXPERIENCIA EN URUGUAY. Mi país Uruguay, ha tenido una importante evolución en el campo de la atención de niños con sordo ceguera y /o multiimpedimento En el año 1995 el Programa Hilton Perkins en forma conjunta con el Ministerio de Educación y la Administración Nacional de Educación Primaria a través de Enseñanza Especial, organizan el 1er. Encuentro de Padres de niños con Discapacidad Visual y Discapacidad Asociada. Se forma así APPEDIVIDA (Asociación de Padres de Personas con Discapacidad Visual y Discapacidad Asociada. Esto fortaleció a los padres y junto a profesionales comenzamos a caminar un largo y difícil camino…el del hacer comprender a las autoridades de la Educación que los servicios para niños y adultos con Discapacidad Visual están siendo desafiados por una nueva población que no puede responder al modelo tradicional de servicio .Algunos programas con un modelo de educación y un currículo para alumnos con discapacidad visual continuaban expulsando personas cuyas necesidades requerían una nueva manera de focalizar la provisión de estos servicios y el contenido curricular que a través de ellos se desarrollan. Otros ofrecían servicios a un reducido número de personas, pero con un programa separado, con una carga horaria reducida, escasos recursos y personal. Tradicionalmente, los centros terciarios y universitarios han formado maestros en métodos 82 de trabajo con una discapacidad y sus efectos sobre el desarrollo y el aprendizaje, pero ofrecen un mínimo apoyo para enseñar cuando una discapacidad adicional está presente. Conocedores de que teníamos esta gran dificultad en la formación de profesionales, a través del programa Hilton Perkins y por gestiones de APPEDIVIDA, algunos pocos maestros del Área de Discapacidad Visual que teníamos alumnos con sordo ceguera y / o multiimpedimento, comenzamos a capacitarnos en cursos, donde intervenían también la FBU (Fundación Braille del Uruguay) y Educación Primaria y Enseñanza Especial, del Ministerio de Educación. Cada vez, era más grande la demanda de los alumnos…cada vez más alumnos con multiimpedimento ingresaban a nuestras aulas y escuelas Fue así que en el año 2001, el Centro de Capacitación y Perfeccionamiento Docente perteneciente a la Administración Nacional de Educación Pública y con el apoyo del Programa Hilton Perkins de la Perkins School for the Blind, decidió enfrentar el desafío de formar a los profesionales y a los padres uruguayos con la finalidad de que los profesionales en servicio adquiriesen las competencias para trabajar con las personas con necesidades múltiples y sus familias. Asimismo, la capacitación focalizó la inclusión de los padres/ tutores y miembros de la comunidad como agentes imprescindibles en el desarrollo de los servicios y en la implementación de las acciones futuras para dar cumplimiento a los derechos de esta población. El curso se implementa y se desarrolla en los años 2003 y 2004 ,es así que 50 personas (25 maestros y 25 técnicos que trabajaban en la Educación Pública ) son capacitadas en la atención de de alumnos con necesidades múltiples, a este grupo se le agregaron además muchos padres y /o tutores. Esta instancia de formación ya ha tenido su impacto hoy al disponerse de profesionales capacitados, las comunidades educativas han comenzado a reflexionar y a iniciar acciones que han conducido a que: - el número de alumnos con necesidades múltiples matriculados en las escuelas públicas ha aumentado dada la apertura de estas instituciones públicas por recibirlos porque disponen de profesionales capacitados. - los programas comienzan a estar centrados en el niño/ joven, en sus familias y en el medio donde está inserto, más que en un contenido curricular generalista que no permitía dar respuesta a las necesidades únicas y propias de cada alumno con necesidades múltiples y sus familias. - se hayan incrementado el número de horas que el alumno permanece en la escuela o fraccionado los horarios, de acuerdo a las 83 Anais do Congresso necesidades del alumno, porque se dispone de una propuesta pedagógica y de un equipo donde se ha incluido a la familia que desea colaborar en el desarrollo de la misma. - se disponga de mayor cantidad y variedad de material didáctico y equipamiento confeccionado a bajo costo permitiendo enseñar y aprender en condiciones apropiadas, respetando las necesidades particulares y proyectándolo al hogar. - los profesionales, las instituciones y los padres estén trabajando juntos existiendo un mayor contacto entre ellos. - los padres se encuentran más informados y fortalecidos lo que favorece el apoyo entre padres y el trabajo cooperativo con los profesionales. Transitamos así un año y realizamos una evaluación…y así comprendimos que era necesario realizar un curso de Actualización en el Abordaje de la sordo ceguera y/o multiimpedimento para Directores de Escuelas Especiales y para Inspectores de Enseñanza Especial, quienes desde su gestión podían realizar importantes cambios. En el año 2006, con el apoyo de Hilton Perkins y de APPEDIVIDA se realizó dicha actualización para 14 Inspectores que cubren todo el país y 50 directores en su mayoría del interior del país. Esto generó cambios… pero lo realmente impactante fue, que de este curso surgió la necesidad de dividir el país en cuatro regiones y realizar “Jornadas de Actualización para maestros del interior del país” y en cada jornada asistieron un promedio de 90 maestros especiales. Cada vez eran más y más profesionales de la educación, los que se formaban acerca de la atención de esta población. Este año 2007…un nuevo desafío, nuevamente, en forma conjunta el Programa Hilton Perkins, APPEDIVIDA y el Ministerio de Educación a través de Enseñanza Especial y el IPES (Instituto de Perfeccionamiento de Estudios Superiores), están desarrollando un nuevo curso de Perfeccionamiento en la Atención de Alumnos con Necesidades Múltiples para 35 profesionales (maestros y técnicos ) y también padres . Sin dudas, han sido años de esfuerzos personales, profesionales e institucionales. De aquí en más nuevos desafíos deberán encontrarnos unidos, para que nuestros niños y jóvenes / adultos dispongan de nuevos servicios, una red entre los profesionales para mejorar los programas que se ofrecen, continuidad de los cursos de actualización desarrollados por y para profesionales y padres locales, mayor conocimiento y conciencia para que 84 los derechos de los niños y jóvenes /adultos con necesidades múltiples sean respetados y la creación de una base de datos única con la información disponible actualizada y accesible a toda persona que necesite de ella. Estos nuevos retos nos deberán encontrar unidos si esperamos que este pequeño grupo de personas con limitaciones múltiples y sus familias, puedan encontrar respuesta a sus variadas necesidades en la comunidad uruguaya .Mantengamos siempre encendida una llama para que nos ilumine el camino ya iniciado. Para finalizar esta presentación quiero expresar esta frase: “Sólo aquellos que se atreven a soñar, sabrán adonde pueden llegar”....entonces soñemos con una comunidad donde podamos ver incluidos a nuestros niños / jóvenes haciendo pleno uso de sus derechos como ciudadanos. 85 PAINEL INTERNACIONAL A EDUCAÇÃO DO SURDOCEGO E DO DEFICIENTE MÚLTIPLO NO INES Marcia Regina Gomes1 Acredita-se que, ao longo dos 150 anos de história no universo da surdez, muitos surdocegos2 tenham passado pelo corpo discente do Instituto Nacional de Educação de Surdos sem que tivessem sido identificados tal como hoje são definidos, sobretudo, no que se refere às recomendações específicas para sua educação. Estudos sobre o processo ensino-aprendizagem desses alunos é relativamente recente, ainda que se encontre na literatura referências a casos isolados como o de Hellen Keller, surdocega conhecida internacionalmente.. Esses estudos tiveram sua origem nos anos 60, inicialmente na Europa e, logo em seguida nos Estados Unidos. Em ambos os lugares devido ao nascimento de muitas crianças que apresentavam déficits visual e auditivo associados, muitas vezes, a outros comprometimentos como conseqüência da epidemia do vírus da Rubéola que afetou mulheres gestantes na ocasião. Esse fato levou profissionais da época buscar novas formas de conduzir o processo educacional de crianças que apresentavam prejuízos multisensoriais, já que a literatura disponível em educação não contemplava as necessidades específicas dessa “nova” população de crianças (van Dijk, 1968). No Brasil, a educação de surdocegos teve início no final dos anos 60 com a fundação da primeira escola destinada a essa população com o nome de Escola Residencial para o Deficiente Áudio Visual (ERDAV), no ano de 1968, localizada em São Caetano do Sul, por iniciativa de Nice Tonhosi Saraiva. Posteriormente, essa escola foi transformada em Fundação Municipal Anne Sullivan, mantenedora da Escola de Educação Especial Anne Sullivan, sob a responsabilidade de Neusa Basseto (Silva,2002). Cabe 86 1 Professora do INES. Especialista na educação de surdocegos pela Perkins School for the BLIND-EUA. Mestre em Educação pela UERJ. 2 Surdocegos – crianças e jovens que apresentam perdas parcial ou total dos dois canais sensoriais de distância (visão e audição), cuja combinação produz graves problemas de comunicação e em outros aspectos do desenvolvimento e de aprendizagem (McInnes,1997; Miles,1999; SEESP,2003; Amaral,2004; Gomes,2006) esclarecer, no entanto, que na ocasião não havia curso de formação para professores nessa área, mas que da mesma forma que as duas precursoras e, por iniciativa das mesmas, outros profissionais puderam desenvolver sua prática formativa na Perkins School for the Blind, localizada em Boston, nos EUA, em parceria com o programa Hilton Perkins. Muitos desses profissionais, por volta de meados dos anos 80, se empenharam em outras iniciativas com o mesmo propósito de levar adiante a educação de surdocegos. Dentre elas a Associação para Deficientes da Áudio Visão – ADEFAV e a Associação para Múltipla Deficiência – AHIMSA, ambas localizadas em São Paulo. No Rio de Janeiro, em 1983, acontece a primeira prática formativa para professores de diversas cidades brasileiras na educação de crianças surdocegas, promovida pelo CENESP (Centro Nacional de Educação Especial), sediada no INES. Na ocasião havia dois alunos surdocegos que freqüentavam turmas de alunos surdos em diferentes séries no INES que foram acompanhados pela professora Rosa Passos, a primeira professora do Instituto a receber orientação baseada na característica sensorial desses alunos. Só bem mais tarde, em meados dos anos 90, é que outras crianças ingressaram no Serviço de Educação Infantil do INES, onde se iniciou o programa de atendimento ao surdocego congênito. Paralelamente, inicia-se o programa de atendimento ao surdocego pós-lingüístico, ou seja, aqueles que perderam a audição e visão depois de terem adquirido uma língua (língua oral ou de sinais) no Instituto Benjamim Constant – IBC. Com a perspectiva educacional inclusiva, ou seja, todas as crianças, independentemente de sua condição ou estilo de aprendizagem, em idade escolar, deveriam ter garantido a sua matricula nas escolas é que outras famílias de crianças que apresentavam a surdez associada a outros comprometimentos, devido a causas diversas, vinham em busca de uma vaga para seus filhos neste Instituto. Nessa ocasião, o segmento que compreendia os alunos matriculados nas séries iniciais já se deparava com o fato de que alguns alunos vinham apresentando muita dificuldade em acompanhar o currículo acadêmico desenvolvido nas turmas de alunos surdos, fazendo com que ficassem retidos numa mesma série por anos seguidos. Para esses alunos foi proposto, então, o atendimento educacional diferenciado. Entretanto, este atendimento não dava conta, ainda, daqueles alunos que, devido a seus graves comprometimentos de etiologia congênita, não apresentavam autonomia para as necessidades básicas do dia-a-dia, como é o caso de alguns surdocegos e aqueles com deficiência múltipla. Estes últimos tinham como prioridade o desenvolvimento de habilidades comunicativas baseadas em atividades de vida real para a sua interação com o ambiente, necessitando, portanto, de um acompanhamento individual. 87 Anais do Congresso A partir deste novo contexto, alguns profissionais da equipe de avaliação de ingresso de alunos no INES e professores que já promoviam o atendimento educacional destes alunos elaboraram um projeto de atendimento alternativo ao surdo com outros comprometimentos. Esse projeto, denominado CAAF (Centro de Atendimento Alternativo Florescer), que a despeito do enfoque clínico inicial (2001) dado ao impacto que a condição desses novos alunos causava; hoje se configura em um espaço pedagógico, cujo objetivo é atender às necessidades de aprendizagem dos alunos que o freqüentam. Assim, o CAAF atualmente se constitui em um ambiente de ensinoaprendizagem para alunos surdocegos e aqueles com deficiência múltipla de etiologia congênita, cuja abordagem educacional se pauta nas reais necessidades dos alunos visando o desenvolvimento de suas potencialidades e aquisição de competências para atuar da melhor maneira possível no contexto familiar, escolar e comunitário. Os alunos que ingressam neste programa apresentam um diagnóstico preliminar de surdez como a deficiência principal associada a outros comprometimentos de ordem física, sensorial, mental e de comportamento social, ainda que ao longo do processo educativo verifica-se que alguns deles parecem demonstrar respostas pela via sensorial auditiva. No entanto, não é possível a confirmação deste dado por meio de testes devido à ausência de respostas objetiva da criança. Esses alunos apresentam em comum uma inabilidade para se comunicar, que se traduz em transtornos de conduta como isolamento, comportamentos estereotipados, auto-agressão e agressão a outros, bem como dificuldades na alimentação sólida, demora no controle do esfíncter, alternância entre sono e vigília e problemas de saúde. Estas características variam muito de acordo com: a) fatores que levaram a condição dos mesmos; b) manifestações e conseqüências da combinação das deficiências; c) ambientes familiar, social e cultural e; d) recursos do atendimento clínico, escolar. A combinação desses fatores influencia o desenvolvimento das crianças, a forma como elas funcionam nos diferentes ambientes e o modo como aprendem, sobretudo no que se refere à aquisição das habilidades comunicativas. Essa diversidade impede que seja traçado um perfil único desses sujeitos em função das necessidades individuais tão distintas, tanto quanto de suas potencialidades e habilidades. Causas ambientais e de origem genética determinam tal condição. Em recente estudo piloto, realizado por Silva e colaboradores3 , no qual foram feitas avaliações retrospectivas de 88 alunos atendidos no CAAF, entre os 3 88 O estudo foi desenvolvido pelo Dr Eduardo Jorge Custódio da Silva, médico e pesquisador do Instituto Fernandes Figueira com a colaboração da equipe do Centro de Atendimento Alternativo Florescer - anos de 2001 e 2004, indicou que: 33 deles tinham etiologia indefinida; 27 tinham a rubéola congênita; 7, 6 e 2 alunos exibiam meningite, prematuridade e citomegalovirus respectivamente. Outros fatores como, sífilis congênita, toxoplasmose, hereditariedade, síndrome Wolf-Hishorne, foram identificados em apenas um aluno cada, totalizando assim o restante dos alunos avaliados. O estudo revelou que as infecções congênitas, especialmente a rubéola, estão presentes como a principal causa no diagnóstico clínico desses sujeitos, fato que pode ser explicado pela presença dos defeitos no nervo auditivo e no globo ocular. No entanto, muitos desses diagnósticos não apresentam o exame de sangue, cuja taxa viral indica a presença do vírus (Silva, Pinto, Lima, Maia, Silva, Lima, Fulco, Gomes, Oliveira, Lima, Griner e Pimenta, 2005, p.5-6). O termo surdocego se refere a uma condição única de privação de dois canais sensoriais importantes para a apreensão dos conceitos do mundo que cerca um indivíduo. A combinação de perdas parcial ou total dos dois sentidos de distância (visão e audição) em crianças tem como conseqüência grave problema de comunicação e em outros aspectos do desenvolvimento e de aprendizagem (McInnes e Treffry, 1997; Miles e Riggio, 1999; SEESP, 2003; Amaral, 2004; Gomes, 2006). Muitas crianças surdocegas apresentam outros comprometimentos que não se restringem apenas a privação dos canais sensoriais, visão e audição, mas podem envolver, dependendo da causa que originou tal condição, prejuízos neurológicos, cognitivos, motores e de saúde que vão interferir sobremaneira em seu desenvolvimento, os deficientes múltiplos. Dado o fato de que a surdez é a deficiência principal e, em geral, de causa congênita ou adquirida antes da aquisição de uma língua, esses alunos têm como prioridade a comunicação e a necessidade de uma intervenção educacional específica que os ajude a alcançar o melhor do seu potencial comunicativo e conseqüentemente sua aprendizagem. Eles, em geral, não se comunicam de uma forma simbólica, contudo, se expressam por meio de movimentos, expressões faciais e vocalizações para se conectarem com o ambiente, dependendo de sua experiência sensorial. O desenvolvimento da comunicação, portanto, se constitui tanto em um meio como em um fim no processo educativo e compreende o ensino de formas comunicativas próprias, ajustadas à capacidade perceptiva de cada um dos alunos. Partimos do pressuposto de que a surdocegueira e a deficiência múltipla não se caracterizam pelo somatório de duas ou mais deficiências, mas sim pelo nível de desenvolvimento, pelas possibilidades funcionais de 3 CAAF do Instituo Nacional de Educação de Surdos-INES e teve como objetivo levantar as características dos alunos atendidos neste centro. 89 Anais do Congresso comunicação, interação social e de aprendizagem. Entende-se, portanto, que esses aspectos é que determinarão as necessidades educacionais desses indivíduos. Com base na perspectiva educacional inclusiva, apontada pela Secretaria de Educação Especial do MEC (SEESP, 2003), temos como premissa básica a educação de crianças e jovens surdocegos e os com deficiência múltipla pautada nas reais necessidades desses alunos visando o desenvolvimento de suas potencialidades e aquisição de competências para atuar da melhor maneira possível no ambiente familiar, escolar e comunitário. Destacamos a abordagem sociológica e relacional como a base para a elaboração de programas funcionais, também chamados ecológicos, mais apropriados para a educação de alunos com deficiência múltipla (Orelove e Sobsey, 1996; Eichinger e Downing, 1996; Amaral, 2004, Cormedi, 2005; Gomes, 2006). Um programa baseado em uma abordagem sócio-funcional e ecológica tem como foco o ensino de habilidades que sejam prioritárias para a funcionalidade dos mesmos em seus contextos sociais de acordo com a idade cronológica e levam em conta as necessidades, desejos, interesses dos alunos e de seus familiares. A concepção funcional ou ecológica na elaboração de um programa educacional individualizado para os surdocegos e os deficientes múltiplos considera os pais como parceiros; cooperadores do processo de desenvolvimento e aprendizagem de seus filhos. Essa perspectiva se baseia na convicção de que a unidade familiar é de vital importância para qualquer indivíduo e considera-a como principal suporte para as crianças e jovens, que na maioria das vezes, se constitui na única conexão com o mundo. Considerando a complexidade das combinações das necessidades físicas, médicas, educacionais e sócio-emocionais, o programa funcional ou ecológico prevê a modalidade transdiciplinar de planejamento em equipe, ou seja, os profissionais que têm relação com o aluno devem compartilhar conhecimentos sobre suas respectivas especialidades sob uma concepção holística na condução de um mesmo objetivo na educação de cada aluno. O modelo de planejamento transdiciplinar é centrado na criança e as decisões deverão ser tomadas por todos os elementos da equipe. Dessa forma, a responsabilidade sobre o processo educativo do aluno é partilhada por todos, cabendo ao professor e aos pais o papel de impulsionar sua educação ( Smith e Levack,1996, citado por Nunes, 2001). Entendemos, portanto, que ao proporcionarmos atividades pautadas em um currículo funcional e apoiadas na comunicação alternativa estaríamos contribuindo para minimizar o impacto de uma desvantagem acadêmica desses alunos. No entanto, o maior desafio na aplicação desse construto teórico é com relação à dificuldade que os professores têm em considerar 90 as atividades funcionais que coincidam com as necessidades e os desejos pessoais dos alunos, pouco tem a ver com o desempenho acadêmico. Nesse sentido, o CAAF foi lócus de pesquisa cujo objeto de estudo foi a formação de professores sintonizada com a concepção de educação comprometida com a funcionalidade desses alunos. O estudo aponta para aspectos importantes a serem considerados na interação de professores com os alunos surdocegos no que diz respeito ao desenvolvimento de habilidades comunicativas, bem como apresenta um modelo de formação continuada para professores nessa área(Gomes, 2006). Os dados levantados neste estudo têm sido utilizados para subsidiar as reuniões pedagógicas da equipe atual do CAAF; o desenvolvimento de material específico para o processo ensino-aprendizagem do aluno; as orientações nos encontros de famílias dos alunos surdocegos; nas consultorias técnicas às Secretárias de Educação como forma de descentralizar a prática educativa oferecida por este programa, bem como nos Seminários do INES realizados nas diversas cidades brasileiras, desempenhando assim a sua atribuição de disseminação de novos conhecimentos na área da surdez e agora na área da surdocegueira. Cabe ressaltar que nos seminários sobre Educação e Surdez promovidos pelo INES no sentido de desenvolver ações de cooperação técnica junto às Secretarias Municipais e Estaduais em território Nacional, os temas relativos a surdocegueira e deficiência múltipla vêm sendo solicitados cada vez mais por profissionais de diversas cidades brasileiras, dada a crescente demanda de alunos que apresentam tais deficiências nas escolas. Nesses eventos, o tema é contemplado com uma palestra inicial, cujo objetivo é levar informações sobre os aspectos mais importantes da área para um maior número de pessoas possível, para em seguida, aqueles que se interessarem pelo assunto possam participar dos workshops que acontecem nos dois dias subseqüentes, com vagas para até 50 participantes e duração de 3 horas cada. As oficinas permitem que alguns tópicos, sobretudo aqueles que emergem das práticas dos participantes, sejam abordados de forma mais abrangente. No entanto, parece claro que esse tempo não é suficiente o bastante para repercutir na prática desses professores, apontando assim para futuras parcerias de cooperação técnica no sentido de desenvolver ações formativas continuadas para professores quanto aos programas de atendimento dessa população naquela localidade. Finalmente, o CAAF pode ser considerado hoje como referência na educação de crianças e jovens que apresentam a surdocegueira e a deficiência múltipla de etiologia congênita, ou seja, aqueles alunos que funcionam em nível pré-lingüístico. Espera-se que a nossa contribuição possa oportunizar uma educação mais apropriada, sobretudo no que se refere ao estilo de aprendizagem próprio dessa população. 91 Anais do Congresso Bibliografia AMARAL, I., DUARTE, F., NUNES, C.; GONÇALVES, A., SARAMAGO, A.R. Avaliação e Intervenção em Multideficiência. Lisboa. Ministério da Educação. Departamento de EducaçãoBásica, 2004. CORMEDI, M.A. Referências de Currículo na Elaboração de Programas Educacionais Individualizados para Surdocegos Congênitos e Múltiplos Deficientes. Dissertação de Mestrado defendida na Universidade Presbiteriana Mackenzie. São Paulo, 2005. GOMES, M.R. Estudo Descritivo de uma Prática Interativo-Reflexiva para Professores em Formação Inicial: Subsídios para Formação de Professores de Crianças Surdocegas e aquelas com Deficiência Múltipla. Dissertação de Mestrado defendida na Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2006. McINNES, J.M. e TREFFRY, J.A. Deaf-Blind infants and children: a development guide. Toronto, University of Toronto Press, 1997. MILES, B. e RIGGIO, M. Understanding Deafbliness. In: MILES, B. e RIGGIO, M. (Eds) Remarkable Conversations: A guide to developing meaningful communication with children and young adults who are deafblind. Boston: Perkins School for the Blind, 1999. p.22-37. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA. Secretaria de Educação Especial. Saberes e prática da inclusão: Dificuldades de comunicação e sinalização: surdocegueira e múltipla deficiência sensorial. Brasília, v.6, 2003 NUNES, C. Aprendizagem Activa na Criança com Multideficiência: guia para educadores. Lisboa. Ministério da Educação Departamento de Educação Básica, 2001. ORELOVE, F. P. e MALATCHI, A. Curriculum and Instruction. In: ORELOVE,F.P. E SOBSEY,D.(orgs) Educating Children with Multiple Disabilities. A Transdiciplinary Approach. 3th ed. Baltimore: Paul H. Brooks Publishing Co., 1996.p.377-409 SILVA, A. M. B. ADEFAV – Associação para Deficientes da Áudio Visão. In: MASINI, E, F.S. (org). Do sentido... pelos sentidos... para os sentidos... sentidos das pessoas com deficiência sensorial. Niterói, Intertexto. São 92 Paulo, Vetor Editora. 2002.p.223-232 SILVA,E.J.C. et al. Características de uma população com múltiplas deficiências associadas à surdez; um estudo piloto. Informativo TécnicoCientífico Espaço, INES, Rio de Janeiro.n.23, jan-jun 2005. p.3-7. VAN DIJK, J. Moviment and Communication with Rubéola Children. Unidad de Sordo-Ciegos, St.Michielsgestel,Holand. In: Conferência pronunciada en la Reunión General Anual. Associacion Nacional de Sordo-Ciegos y Niños Rubeolicos –ONCE Madrid. 1968. 93 Mesa-Redonda Internacional MESA-REDONDA INTERNACIONAL HEARING IN THE NEW MILLENIUM – PERSPECTIVES AND PROSPECTS Ulf Rosenhall1 Knowledge about extent and causes of hearing impairments is, to a great extent, limited to highly developed so called post-industrialised countries. However, a majority of the world’s population lives in countries where the living conditions are very different. It is not plausible that the hearing of people living in highly developed post-industrialised countries represent the human hearing in general. Populations living under ideal, pristine conditions, with little noise exposure, have often, but not always, better hearing. Many very large countries like Brazil, China and India undergo at present a very rapid industrialising. The positive sides of this process are that living conditions, health, and economy improve. There are also negative sides, like deterioration of the general and occupational environments. Comparisons between these countries and western countries show that the hearing is fairly similar in spite of great dissimilarities between the different populations. In the poorest countries of the world not only the economy is problematic, but also the state of health. We do not know exactly how common hearing losses are in these countries, only that prevalence and incidence figures are frightfully high. The differences to highly developed countries are especially pronounced for children and young adults. According to WHO more than 62 million children of the world have profound hearing loss or total deafness. Two thirds of these children live in poor developing countries. The prevalence values of moderate to profound hearing loss and total deafness have been estimated to vary from 2.7 to 10 per 1000 in developing countries. These figures shall be compared to prevalence values of 1 to 2 per 1000 children in Europe. Some causative factors keep appearing repeatedly in different studies. One important factor is chronic otitis media and exposure to intense noise. A number of infections might result in severe hearing impairment. Meningitis, septicaemia and different viral diseases are examples of infectious diseases that can cause hearing loss. Rubella embryopathy as a cause of deafness is rare in western countries because of a highly successful vaccination programme, but it is still common in other countries. 1 96 Karolinska University Hospital/Karolinska Institutet, Stockholm, Sweden The most common cause of deaf-blindness in Brazil is probably rubella. Vaccination programmes can eradicate hearing impairments caused by rubella, heamophilus influenzae, and pneumococcal infections. Treatments of infections and malignant tumours might cause ototoxic hearing loss. Genetic hearing loss is present in all populations around the world, in affluent countries as well as in poor ones. WHO pursues an ambitious programme, “Prevention of blindness and deafness (PBD)”. According to WHO at least 50 % of hearing impairments in developing countries is preventable. The means to do so is by achieving primary and secondary prevention. Medical measures are to develop maternity health care and child health centres. Prevention programmes of noise induced and ototoxic hearing impairments should be arranged. Secondary prevention is also important, including ENT service and middle ear surgery. It is of the utmost importance to develop easily available habilitation / rehabilitation programmes, including hearing aid fitting and educational and psychosocial measures. Hearing impairments are common in all kinds of societies, in highly developed countries, countries with a rapid economic growth, and developing countries. Aural health is therefore a global commitment affecting all countries, irrespective of the state of development. 97 Mesas-Redondas Nacionais MESAS-REDONDAS NACIONAIS CORPOREIDADE E SURDEZ Marise Pedalino1 Desenvolvo um trabalho de Educação Psicomotora com crianças do Serviço de Educação Infantil – SEDIN -, do INES. São crianças da Educação Precoce - 0 a 3 anos - que são atendidas individualmente, e crianças do Maternal ao Jardim III, atendidas em grupo. Essas são crianças que por diferentes motivos, apresentam atrasos no seu processo de maturação, expressando esse sofrimento pela via do corpo, como na hiperatividade e nas inibições, ou por dificuldades cognitivas e relacionais. A partir da compreensão de que a construção do psiquismo não se dá de forma espontânea; que o processo de maturação psicológica da criança demanda investimento afetivo de quem dela cuida; que é essa relação de maternagem que vai possibilitar ao bebê tornar-se uma pessoa, inserida numa cultura; que o psiquismo se funda a partir das sensações corporais vividas nas interações, desde a gestação, podemos supor que a criança surda viva diferenças nesse processo, em relação à criança ouvinte, pela impossibilidade de perceber a sonoridade do mundo a sua volta. Um exemplo da importância da audição nesse processo é o fato do bebê humano reconhecer a voz da mãe desde o fim da segunda semana de vida, antes mesmo de diferenciar seu rosto de outros rostos. A voz da mãe o acalma, o provê emocionalmente de segurança. E essa responsividade do bebê alimenta o investimento da mãe sobre ele, favorecendo a formação do vínculo mãe- bebê. Outro exemplo: os diversos ruídos do ambiente dão referências do universo no qual o bebê está imerso, além de dar informações sobre o que não está presente no campo visual, contribuindo para a formação da permanência do objeto e para a segurança emocional da criança. Quando a criança começa a andar a voz da mãe possibilitará que ela se distancie, sem perder o contato, favorecendo sua autonomia. Esses são alguns exemplos do papel fundamental da audição na construção do psiquismo, pois todos os sons e comunicações verbais, desde os primórdios da vida uterina auxiliam na construção da confiança básica, 1 100 Professora de Educação Física do INES. Sócia Titular da Sociedade Brasileira de Psicomotricidade. Psicóloga Clínica – UNESA. Terapeuta de Família - ITF. da permanência do objeto, da autonomia e na aquisição da linguagem, portanto, no desenvolvimento do pensamento, o que nos leva a supor que a criança surda encontra dificuldades nesse processo. Além disso, a surdez pode ser causada por diversos fatores congênitos e adquiridos, como a rubéola materna durante a gravidez e a meningite, doenças que podem deixar seqüelas neurológicas, visuais, cognitivas e/ou motoras, altamente incapacitantes para a criança, trazendo sofrimentos para esta e sua família. Também é importante considerar a condição emocional dos pais ao viverem a experiência de um filho surdo: sua capacidade de acolhimento e disponibilidade para investir na criança e aprender sobre um mundo novo que se abre. Quem acompanha esses pais sabe que são processos emocionais difíceis, que estão sujeitos à sua possibilidade de suportar a ferida narcísica e viver o luto da perda da criança ideal, para encontrar a criança real e se relacionar com ela. O momento do diagnóstico da surdez, também interfere nesse processo. A descoberta precoce muitas vezes altera o investimento emocional da mãe sobre seu bebê, impedindo-a de agir naturalmente e bloqueando a comunicação entre eles, porém é importante por possibilitar a busca de soluções para os problemas interativos e o atendimento às necessidades da criança. Assim, o processo de desenvolvimento da criança surda será mais ou menos dificultado dependendo da etiologia da surdez, de fatores sócioculturais, e familiares e emocionais, que poderão resultar em dificuldades motoras, emocionais, lingüísticas, cognitivas e/ou relacionais. O Grupo de Ajuda é um projeto de Educação Psicomotora dentro dos princípios da Prática Psicomotora Aucouturier (PPA). É um “processo de ajuda que acompanha a criança em seu próprio percurso maturativo, que vai desde a expressividade motora até o acesso à capacidade de descentração” (Sánchez, Martinez e Penãlver,2003:13). É, portanto, uma ajuda à maturação psicológica da criança pela via do jogo e da brincadeira, pois a brincadeira contribui para a “unificação e integração geral da personalidade”, além de auxiliar a criança a “dominar a angústia, controlar idéias ou impulsos que conduzem à angustia se não forem dominados” (Winnicott, 1982: 162), encontrando um bem estar fundamental ao seu desenvolvimento, pois é pelo prazer que a criança se abre ao mundo da comunicação e da aprendizagem. É no prazer de brincar e interagir que a criança vive o prazer de ser e de conhecer. Logo, nesse processo são atendidos aspectos fundamentais da globalidade da criança – a afetividade, a motricidade e o conhecimento. Trabalhamos a partir da atividade espontânea da criança e de sua expressividade motora. E do que as crianças brincam? 101 Anais do Congresso Aparece naturalmente em todas as crianças as brincadeiras de reasseguramento profundo, que são brincadeiras universais, tais como as brincadeiras de destruição, de prazer sensório-motor, de envelopamento (envolver-se com panos, construir uma cama, mais tarde uma casa), de esconder e aparecer, de perseguição e as brincadeiras de identificação ao agressor (ser o lobo, a bruxa). São chamadas de re-asseguramento profundo porque tocam o inconsciente da criança, mobilizam o que existe de mais profundo nela, liberam emoções, fazem funcionar os afetos, especialmente quando são vividas na relação com um adulto. Nesse sentido, se destacam as brincadeiras sensório-motoras que envolvem o cair, saltar, girar, desequilibrar-se... São brincadeiras que solicitam o sistema labiríntico e estimulam a musculatura profunda do corpo, proporcionando forte prazer corporal. Promovem o acesso às brincadeiras simbólicas porque liberam a motricidade, a linguagem, a comunicação e o pensamento. Temos ainda as brincadeiras de identificação com personagens da vida familiar e social, por exemplo, mãe/filha, motorista do carro, super heróis, e outros. E também as brincadeiras ligadas à castração, como os acidentes, o hospital, o médico e o enfermeiro. As crianças vivem a repetição dessas brincadeiras com muito prazer, pois é a repetição de um mesmo prazer, que na verdade nunca é idêntico, que vai possibilitando à criança ajustar-se ao mundo externo, desenvolvendo a inteligência prática. Além de, como pode ser antecipado, gerar segurança Enfim, todas essas brincadeiras vividas num fundo de prazer asseguram à criança uma apropriação de sua totalidade corporal e a construção de sua unidade psíquica. Nesse espaço existem materiais móveis, como blocos de espuma, almofadas, tecidos, bichos de pelúcia, cordas, bastões, além de um espaldar para os saltos. O material não é figurativo, para que a criança possa investir em transformá-lo, projetando no objeto seu mundo interno, ou seja, simbolizando. É sempre o mesmo material, a mesma sala e é nesse igual, nessa estabilidade, que a criança vai viver a diferença, o seu jeito de ser e criar naquele espaço, com aqueles materiais, com aquele grupo. Esta prática favorece a maturação psicológica da criança, pois através da expressividade psicomotora vivida numa dinâmica de prazer, num enquadre próprio e com material específico, “estimula a comunicação, a criação e a simbolização, fatores fundadores do acesso ao pensamento operatório e à descentração” (Aucouturier, 1996, 7). A comunicação é a condição básica do desenvolvimento harmônico da criança, pois permite a relação, a criação, o trabalho com o outro, ao mesmo tempo em que é uma afirmação de si. A experiência de prazer vivida numa 102 ação compartilhada – saltar, subir, cair, construir, destruir - faz a criança abrir-se ao outro, pois essa comunicação não-verbal que é troca, é ter que colocar a atenção sobre o outro, é acolher seu ponto de vista. Comunicar é então, ao mesmo tempo, afirmação de si e socialização. Criação se refere a toda produção vocal, artística, gestual e cognitiva. Criar é “concretizar imagens por meio da ação, do corpo e de suas formas de representação: o desenho, a modelagem, a linguagem a escrita” (Sánchez, Martinez e Penãlver,2003:70). Logo, “criar é uma maneira muito personalizada de dizer de si ao outro: é afirmar sua competência em investir o espaço, os objetos, as pessoas e dar a estes uma variedade de sentidos simbólicos” (Aucouturier, 1986: 24). E uma produção que é reconhecida, é o reconhecimento do próprio sujeito ali representado. Então, ajudar a criança a criar é, mais uma vez, favorecer a afirmação da criança, seu comportamento social e seu sentimento de pertinência ao grupo. Essa proposta de trabalho que privilegia a expressão, a comunicação e a criação, vai favorecer o desenvolvimento do pensamento operatório - um pensamento lógico no qual a criança passa a operar a partir de esquemas conceituais, onde “as ações físicas, típicas da inteligência sensório-motora, passam a ser internalizadas, passam a ocorrer mentalmente” (Rappaport, 1981:72) -, e a descentração. A descentração pode ser considerada como “o ponto de articulação entre o afetivo e o operatório: é o resultado de uma perda sensóriomotora afetiva e fantasmática, bem compensada por um ganho substitutivo, da abstração plena e criativa” (Aucouturier, 1994: 9). Num primeiro momento, a criança é centrada nela mesma, vê o mundo através das lentes de sua emotividade, logo, deformado em função do excesso de afeto. Na medida em que vai adquirindo uma representação de si mais estável, a criança vai sendo capaz de ligar essas emoções às representações mentais, ou seja, torna-se capaz de viver uma parte das emoções nas imagens. Não se trata de perder as emoções, nem de separá-las das representações, mas de integrá-las, permitindo à criança sair da dominação de seus afetos, podendo ver o mundo de uma maneira diferente, menos interferida pelas emoções. A criança, então, deixa de ser o ponto de partida de todo olhar em direção ao mundo dos objetos, dos outros e a si próprio. Compreende-se então que o trabalho não é focado no aspecto instrumental, mecanicista, nem vai agir diretamente sobre o sintoma, mas está voltado para o campo relacional e afetivo da criança, para suas necessidades e motivações, favorecendo seu bem estar, base de sua maturação psicológica. A sessão de Psicomotricidade é para as crianças um lugar de prazer, de comunicação e de desejo. Lugar aonde elas sempre vão com muito interesse e felicidade. Esperam a sessão e dão continuidade às brincadeiras 103 Anais do Congresso de uma sessão para a outra. As crianças naturalmente deram ao trabalho o sinal/nome de pular (indicador e dedo médio da mão direita “pulam”, como se fossem duas pernas, na palma da mão esquerda), atividade bastante prazerosa e presente nas sessões, ao mesmo tempo em que é o sinal para designar estar alegre, alegria. Bibliografia AUCOUTURIER, B.; DARRAULT, I.; EMPINET, J. A Prática Psicomotora - reeducação e terapia. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986. AUCOUTURIER, B. Formação em Prática Psicomotora Aucouturier. 2002 e 2003. Notas de Aula. AUCOUTURIER, B. Letras,2007 O Método Aucouturier. São Paulo: Idéias e RAPPAPORT, R.; FIORI, W.; DAVIS, C. Teorias do Desenvolvimento, volume 1. São Paulo: EPU, 1981. SÁNCHEZ, P.; MARTINEZ, M.; PENÃLVER, I. A Psicomotricidade na Educação Infantil, uma prática preventiva e educativa. Porto Alegre: Artmed, 2003. WINNICOTT, D. W. A criança e o seu mundo. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1982. 104 MESAS-REDONDAS NACIONAIS CORPOREIDADE E SURDEZ Ana Regina Griner1 Gostaria inicialmente de agradecer o convite que muito nos “movimentou”para que pudéssemos participar desse encontro. Ao sermos convidadas para esse seminário comemorativo dos 150 anos da instituição, nos pediram que contássemos um pouco da nossa história desses 22 anos de trabalho com a pré-escola(hoje chamada de educação infantil). Optamos por iniciar nossa apresentação com esse primeiro momento de movimento e consequentemente de prazer. Prazer pelo movimento, prazer através do movimento. Começamos a nos mover, desde que estamos sendo gerados, ainda na barriga de nossas mães em que estamos em movimento constante e já sentimos prazer. A partir do nascimento, todo movimento do bebê é de busca de satisfazer suas necessidades e conhecer o mundo, o que leva ao prazer. Ao chegarmos ao INES, ainda nos anos 80, recém formadas em Educação Física e “engatinhando” no trabalho com crianças surdas, decidimos juntas “tentar” um trabalho psicomotor para as crianças da préescola. Nesta época fazíamos a formação em Psicomotricidade Relacional e decidimos então,propor um trabalho nessa linha. Como observávamos as crianças sempre muito receptivas ao trabalho corporal, porem de uma forma muito imitativa, copiando sempre o modelo que o adulto lhes apresentava,entendemos que essa linha de trabalho seria bastante adequada pois propõe um trabalho mais livre,mais lúdico,que nós mesmas experimentávamos em vivências práticas nos cursos de Psicomotricidade Relacional. Neste momento, Lenita Viana,então diretora da instituição e também psicomotricista nos apoiava bastante e nos estimulava a acreditar e investir na nova proposta com as crianças. A proposta consistia em proporcionar às crianças, através do brincar, a partir do jogo simbólico, um espaço de prazer sensório- motor, de busca do auto conhecimento e de comunicação consigo e com o outro. 1 INES - Brasil Professora de Educação Física do I.N.E.S. Sócia titular da Sociedade Brasileira de Psicomotricidade. Psicomotricista Relacional Watsuterapeuta 105 Anais do Congresso “A Psicomotricidade Relacional acontece a partir e através do movimento sobre a globalidade do indivíduo. Objetiva permitir a expressão de seus potenciais e de suas dificuldades relacionais e ajuda a evoluir utilizando a expressão livre e o brincar. Brincar com o que a criança traz para que com isso ela evolua.”André Lapierre Na prática isso se dava da seguinte forma: as crianças ao chegarem ao espaço da aula, encontravam, a cada dia, diferentes materiais como bolas, cordas, bambolês, panos, almofadas, jornais, etc.e lhes era permitido explorar livremente o material oferecido, o espaço e os outros, criando situações e/ ou brincadeiras que as agradassem. A postura do adulto sempre foi de espera e de disponibilidade corporal para o “jogo” proposto. Percebemos que cada vez mais as crianças se mostravam mais confiantes, criativas, com maior independência e, conseqüentemente indivíduos mais autônomos. Depois de 10 anos desenvolvendo esse trabalho, diversos acontecimentos nos levaram à transformação dessa proposta original resultando na dissolução da dupla de trabalho. Hoje, 22 anos depois, eu continuo trabalhando com as crianças como professora de Educação Física atendendo-as duas vezes por semana e, com a construção de uma piscina na escola, e com toda a formação e experiência que tenho no desenvolvimento de atividades na água (Especialização em natação para bebês, Watsuterapeuta) acrescentei ao trabalho de psicomotricidade, uma proposta de atividades,também em grupo,na piscina. Água, lugar de prazer e muitas vezes lugar de insegurança, de perda de controle, de mudança de apoio... Para algumas crianças, a imersão é um prazer profundo, mas para outras provoca um medo intenso. O contato da criança pequena com o meio aquático sempre inclui tensões emocionais, positivas ou negativas. Muitas vezes ela precisa de um contato assegurador com um corpo adulto. Mais ainda que no solo, o corpo do adulto deve ser o elo de segurança para as crianças. É um espaço de trabalho muito rico já que as crianças podem vivenciar suas emoções, independente do espaço e do material utilizado, e o adulto as acolhe com um olhar atento, cuidadoso e muitas vezes cúmplice. Cada movimento criado pelas crianças é valorizado e estimulado para que os outros alunos tentem experimentá-lo e assim possam descobrir novas formas de exploração de seu próprio corpo. Com isso, visa-se potencializar novas descobertas de movimentos, trabalhando sempre naquilo que as crianças podem oferecer e não na falta. Isso gera mais confiança em seu próprio corpo e, em decorrência maior autonomia. É um momento de grande prazer para as crianças. Seus rostos felizes 106 e suas gargalhadas durante as aulas ou, ainda antes, sua excitação e contentamento quando me vêem chegar à sala de aula para buscá-los, me dão a certeza de estar trilhando o caminho certo. ASPECTOS IMPORTANTES PARA A REALIZAÇÃO DO TRABALHO - Não existe cobrança no desempenho. - Não se valoriza o acerto e o erro. - Não se valoriza a competição. - Valorização da possibilidade de cada um. - Criação de um desejo autêntico de comunicação. - Maior autonomia. ADULTO - Disponibilidade corporal e lúdica. - Imagem de segurança. - Representante da lei. - Continente. - Maior possibilidade de iniciativa. - Aumento das possibilidades de relação e de vivências em grupos. ESPAÇO - Exploração (reconhecimento). - Diferenças materiais. - Segurança / Contenção. - Livre expressão. - Desculpabilizante. - Crianças mais soltas. - Crianças mais criativas - Crianças mais confiantes VERDADEIRA SOCIALIZAÇÃO DA CRIANÇA 107 Anais do Congresso Bibliografia FREIRE, João B. Educação de Corpo Inteiro. São Paulo: Editora Scipione, 1994. LAPIERRE, André. A Educação Psicomotora na Escola Maternal. São Paulo: Editora Manole, 1986. __ e LAPIERRE, Anne. O Adulto Diante da Criança. São Paulo: Editora Manole, 1987. __ e AUCOUTURIER, Bernard. A Simbologia do Movimento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986. __. Fantasmas Corporais e Prática Psicomotora. São Paulo: Editora Manole, 1984. 108 MESAS-REDONDAS NACIONAIS VI Congresso Internacional XII Seminário Nacional do INÊS Mesa Redonda “Corporeidade e surdez” Psicomotricidade Relacional: A importância da corporeidade no processo de aprendizagem Professor Ms. José Leopoldo Vieira1 A Psicomotricidade Relacional é um método de trabalho que proporciona um espaço de legitimação de desejos e sentimentos e potencializa o desenvolvimento global, a aprendizagem, o equilíbrio da personalidade, facilitando as relações afetivas e sociais. O sujeito - criança ou o adulto, aluno ou professor - pode se mostrar na sua inteireza, com seu corpo, seus medos, desejos, fantasias e ambivalências, na relação consigo mesmo, com o outro e com o meio. Visa, de forma prática, desenvolver e aplicar os conceitos relacionados à corporeidade, portanto ao enfoque da globalidade humana. Busca superar o dualismo cartesiano corpo/mente, enfatizando a importância da comunicação corporal, não apenas pela compreensão da organicidade e de suas manifestações, mas essencialmente pelas relações psicofísicas e sócioemocionais. Preza por uma abordagem preventiva, com uma perspectiva qualitativa e, portanto, com ênfase na saúde e não na doença. É uma práxis que procura dar um espaço de liberdade onde à criança mostra-se inteira, com seu corpo, suas emoções, sua fantasia, sua inteligência em formação. No espaço da Psicomotricidade Relacional, o sujeito pode expressar seus conflitos, seus medos, sua ambivalência, seus sentimentos, dentro da estrutura narrativa do jogo simbólico e espontâneo e nas relações Jose Leopoldo Vieira • Mestre em Educação Especial – UFRJ. • Pós-Graduado em Educação na Área de Movimento Humano – Boston University . • Psicomotricista Relacional Didata Siac – França. • Analista Corporal da Relação Siac – França. • Pedagogo. • Educador Físico. 1 109 Anais do Congresso que estabelecem com seus coetâneos e com o psicomotricista relacional. A Psicomotricidade Relacional se configura como um espaço de legitimação de desejos, necessidades, limites e do conhecimento e reconhecimento de si e dos outros. Espaço de desenvolvimento pessoal e interpessoal, de estruturação da criança como SER, de investimento não em dificuldades e sintomas, mas nas suas possibilidades de crescimento. Para tanto se faz imprescindível, por parte do psicomotricista relacional, uma atitude corporal de aceitação incondicional, de reconhecimento das possibilidades que a criança possui, de modo a fazê-la sentir-se existir como sujeito de sua própria história. A atitude corporal de aceitação do outro, por parte de psicomotricista relacional, implica apropriação do conceito de corporeidade como aspecto fundamental de sua prática, uma vez que é através do movimento corporal que a criança se comunica e amplia seu conhecimento. O desenvolvimento dos aspectos psicomotores e relacionais são fundamentais para a aprendizagem e socialização do sujeito. É através do corpo e de suas experiências relacionais que ele se faz presente no mundo e com o mundo. O corpo compreendido como presença do sujeito no mundo torna-se ferramenta fundamental da aprendizagem e da socialização em todos os níveis de ensino, dentro de uma visão sistêmica. A Psicomotricidade Relacional concebe o corpo e o sujeito como uma unidade, portanto reforça o conceito de corporeidade aplicado às práticas pedagógicas com a criança surda, favorecendo a conexão entre corpo e mente e a expressão criativa do corpo que se comunica e se relaciona. A criança surda, encontra no jogo espontâneo da Psicomotricidade Relacional, a possibilidade de se expressar, se comunicar, vivenciar suas habilidades relacionais e encontrar soluções para suas dificuldades e necessidades diárias, uma vez que integra o desejo à ação. A seguir apresento uma experiência realizada pelo CIAR - Centro Internacional de Análise Relacional, em convênio com a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social de Fortaleza-CE, utilizando a metodologia da Psicomotricidade Relacional: Objetivo: Despertar o desejo para aprender e elevar o nível de eficiência do processo ensino-aprendizagem; buscar reduzir a taxa de repetência e evasão escolar de crianças da primeira série do ensino fundamental de escolas da rede pública do município de Fortaleza, situadas em áreas denominadas “Cinturão de Pobreza”. Metodologia: 110 1. Seleção dos Sujeitos: De 3500 alunos de 25 escolas da rede pública municipal foram selecionados 5%, o equivalente a 175 crianças que apresentavam dificuldades de aprendizagem, altos níveis de repetência e evasão escolar, distúrbio de atenção, hiperatividade, agressividade exacerbada, comportamentos destrutivos, tristeza, depressão, necessidades educativas especiais, exclusão social e um grande número de delinqüência infanto-juvenil. Também foram atendidos os professores e os pais destas crianças. 2. Estratégias de Atendimento: À Criança: 12 encontros em Psicomotricidade Relacional, com freqüência semanal, com 90 minutos de duração, sendo as crianças divididas em 14 grupos. Aos Professores: 5 encontros em Psicomotricidade Relacional com freqüência mensal, perfazendo um total de 30 horas. Aos Pais: 8 encontros com freqüência mensal, sendo 4 para palestras informativas e 4 para reuniões de acompanhamento, orientação e avaliação do processo evolutivo de seus filhos. Resultados finais: Os atendimentos foram ampliados e atingiram um total de 3660 crianças,além de seus pais ou responsáveis e professores, propiciando: • • • • • • • Redução do índice de comportamentos destrutivos. Favorecimento das relações afetivas professor - aluno, aluno aluno. Elevação da auto-estima e auto-confiança. Fortalecimento da autonomia e identidade. Melhoria nos níveis de comunicação e desempenho escolar. Crescimento do potencial criativo e construtivo Redução dos níveis de stress. Relato da experiência Nos encontros de Psicomotricidade Relacional realizados pôde-se observar: crianças em sua maioria desacreditadas, desrespeitadas, assustadas, porém guerreiras. Cada uma, a seu modo, buscava se auto desenvolver para preencher vazios afetivos e enfim, lutavam por um espaço de escuta de seus mais profundos sentimentos. Algumas crianças eram provenientes de estruturas familiares desfeitas ou desagregadas e não encontravam, nem em casa e tão pouco na escola, um lugar de segurança. Pareciam viver, portanto, na ameaça da rejeição, do abandono e do espancamento. Em contrapartida, agiam e reagiam com agressividade e violência, embora não tivessem perdido ainda o desejo de se sentirem aceitas e amadas. Outras 111 Anais do Congresso crianças eram superprotegidas e mimadas, recusavam as propostas, e se fechavam em crises de birra quando se deparavam com limites e frustrações, refletindo um despreparo na capacidade de superação de obstáculos: se paralisavam, perdendo a oportunidade de aprender, viver e SER de forma melhor e diferente, refletindo as dificuldades dos pais em lidarem com seus próprios limites de não poderem lhes oferecer uma perspectiva de vida melhor do que a que tiveram. Inicialmente, as crianças, chegavam à clínica cheios de expectativas e explodiam de euforia ao perceber que havia ali um tempo, um espaço e um adulto que lhes permitia jogar por inteiro, num jogo sem palavras, porém cheio de significados vividos corporalmente, significados estes muitas vezes negados, bloqueados ou proibidos pelas instituições sociais em que viviam: família, escola, meio social, entre outros. Estas situações despertavam na criança tensões afetivas de ansiedade e de angústia, o que lhe dificultavam o aprendizado e as relações de um modo geral. Constatou-se inicialmente, nas sessões de Psicomotricidade Relacional, que as atividades se orientavam espontaneamente em 2 direções opostas: de um lado a agressividade, expressa sob a forma de brincadeira, mas, às vezes, investida em crises de violência e de raiva, com forte implicação emocional desembocando, com freqüência, no assassinato simbólico do adulto, símbolo de poder. De outro lado, a procura de um acordo, carregado de afetividade e de ternura, exprimindo-se, freqüentemente, sob uma forma regressiva, por meio de relações do tipo parental - pai ou mãe. Observou-se que esse jogo corporal, inicialmente vivido em forma de agressividade primitiva, violenta, e, por conseguinte, culpabilizada, sinalizava que as crianças necessitavam desculpabilizar e destensionar os contatos corporais, para poderem contatar com uma comunicação mais verdadeira, onde pudessem se deixar envolver e se entregar em relações afetivas, onde se sentissem aceitas e sintonizados afetivamente com o outro. Após essa vivência, puderam retomar a pulsão de agressividade de forma positiva, construtiva e investida em situações de bem estar e de autonomia, para conseqüentemente, melhorar seu desempenho escolar. Observou-se que a situação de miséria social, nutricional e afetiva, em que viviam as crianças, acionavam negativamente as pulsões agressivas, no entanto, percebia-se que essas pulsões eram também de auto-conservação e lhes ajudavam a manter a auto-estima. Conforme Lapierre (1987), a relação da criança não é, como fazem crer os manuais de pedagogia, uma relação em sentido único, na qual o adulto atua sempre consciente e racionalmente sobre a criança. Os comportamentos da criança, e especialmente seus comportamentos mais autênticos, os menos “culturais”, despertam um eco 112 no adulto, envolvem-no pessoalmente, provocando respostas que nem sempre são conscientes. E nas quais ele expressa seus próprios problemas. Não levar em conta este aspecto da relação é uma atitude cômoda, confortável para o adulto, mas que elude uma parte essencial do problema da educação. A agressividade aparecia, em suma, como uma procura de relações e uma defesa da identidade. Liberada da agressividade primária que puderam exprimir, e da sua agressividade secundária reacional, através da aceitação do adulto, a criança está disponível para a busca do acordo. O acordo é uma procura de simultaneidade, de escuta e disponibilidade para o outro; O acordo vivenciado na Psicomotricidade Relacional, foi transposto para todas as atividades de construção diárias e buscas intelectuais, num trabalho em grupo onde as relações de ajuda tornaram-se mais importantes do que as competitivas. A busca de acordo levou as crianças a uma verdadeira socialização e não somente à submissão a uma regra comum, ou seja, surgiram a possibilidades de trocas autênticas com os outros, de compreensão, aceitação e respeito. Procurou-se canalizar a energia combativa, de forma que fosse orientada individual e coletivamente, não mais contra o outro, contra o mundo exterior; não mais para destruí-lo, mas para construí-lo e dominá-lo, e, nessa conquista do mundo, o outro deixou de ser um obstáculo tornando-se um parceiro na busca constantemente do desejo de aprender. Bibliografia Harper, B. at alii (1980). Cuidado escola! Desigualdade, domesticação e algumas saídas. São Paulo: Brasiliense. Lapierre, A & Lapierre A (1987). O adulto diante da criança, de 0 a 3 anos. São Paulo: Manole Lapierre, A & Aucouturier, B. (1988). A simbologia do Movimento, Psicomotricidade e educação. Porto Alegre: Artes Médicas 113 MESAS-REDONDAS NACIONAIS POLÍTICAS PÚBLICAS E A EDUCAÇÃO DE ALUNOS SURDOS Claudia Pereira Dutra* O Ministério da Educação difunde nacionalmente a política de educação inclusiva, que se define pela promoção do acesso de todos os alunos à escola da sua comunidade, independente de suas diferenças sociais, culturais, étnicas, raciais, sexuais, físicas, intelectuais, emocionais, lingüísticas e outras. A política educacional adotada tem como objetivo alterar a estrutura tradicional da escola, fundada em padrões de ensino homogêneo e critérios de seleção e classificação, passando a orientar os sistemas educacionais inclusivos para que garantam o direito de todos à educação, desenvolvam projetos educacionais que contemplem a diversidade presente no contexto escolar e atendam as necessidades educacionais dos seus alunos. Dentre as diferentes áreas do campo de conhecimento da educação especial, destaca-se a educação de alunos surdos, fortalecida nos últimos anos pelos programas de educação inclusiva, que visam à promoção da participação e aprendizagem de todos os alunos nas escolas da rede regular de ensino. Fundamentada na concepção de direitos humanos, para além da igualdade de oportunidades, a inclusão focaliza a valorização das diferenças na escola e a mudança nas práticas pedagógicas, de modo a eliminar as barreiras para o acesso ao currículo. A organização das políticas públicas traz o acúmulo das conquistas dos movimentos sociais representativos da comunidade surda, das pesquisas desenvolvidas pelas universidades brasileiras e das experiências das escolas que constituíram avanços para a educação inclusiva. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, aprovada pela ONU em 2006, ultrapassa a visão da limitação da pessoa para enfatizar suas relações com o ambiente, configurando o compromisso entre os países para assegurar um sistema de educação inclusiva em todos os níveis de ensino, maximizando o desenvolvimento acadêmico e social, tendo estabelecido a meta de inclusão plena e garantir que as crianças do sistema educacional geral não sejam excluídas sob alegação de deficiência e possam ter acesso ao ensino fundamental inclusivo na comunidade em que vivem. *Secretária Nacional de Educação Especial. 114 A conseqüência dessa mudança de concepção pode ser observada no aumento do número de alunos surdos na educação básica e superior nos últimos anos e na valorização profissional dos professores e instrutores de Libras, que passaram a fazer parte da comunidade escolar e da comunidade acadêmica. No Brasil, os dados do Censo Escolar/2006 registram a matrícula de 69.420 alunos surdos ou com deficiência auditiva na Educação Básica e os indicadores do Censo da Educação Superior/2005 apontam 2.428 alunos com deficiência auditiva. Atualmente existem 17.415 escolas de educação básica que registram a matrícula de alunos com deficiência auditiva. Com o reconhecimento da Língua Brasileira de Sinais (Libras), e principalmente com a publicação do Decreto n.º 5.626/05, a oferta do ensino de Libras, como direito dos alunos surdos, passa a ser a diretriz que norteia todos os sistemas de ensino. A orientação para sua implementação, por meio do desenvolvimento da política de educação inclusiva, torna-se condição necessária para viabilizar a ampliação do acesso e a qualidade do processo educacional a todos os alunos. A Libras e a Língua Portuguesa como segunda língua, na modalidade escrita, constituem parte do atendimento educacional especializado a serem desenvolvidas nas escolas em que os alunos surdos estão matriculados, compreendida como para integrante da sua formação. Assim, os sistemas de ensino devem organizar classes abertas a alunos surdos e ouvintes, viabilizar cursos de formação de professores, disponibilizar serviços de tradutor e intérprete de Libras/Língua Portuguesa e organizar a oferta do atendimento educacional especializado nas salas de recursos, de forma complementar à escolarização. O direito que os alunos surdos têm de se matricular na rede regular de ensino determina que as escolas devam organizar-se para atender à sua diferença lingüística, assumindo novas responsabilidades no desenvolvimento do processo educacional dos alunos surdos. O acesso à comunicação, à informação e à educação deverá ser garantido mediante a implementação da Libras e da Língua Portuguesa como línguas de instrução. O conhecimento de duas ou mais línguas, o convívio com as diferenças de todos na escola e na comunidade constituem um conjunto de competências e experiências que aproximam a prática docente das necessidades de aprendizagem dos alunos. Dessa forma, a formação de professores altera a perspectiva clínica e passa a dar ênfase ao enfoque pedagógico que modifica a atuação docente e lhe permite tomar as decisões quanto ao processo educacional, dando respostas às diferenças dos alunos. 115 Anais do Congresso O Brasil destaca-se na América Latina, porque tem uma política educacional que prevê a inclusão de todos os alunos, o que tem provocado uma profunda mudança na estrutura dos cursos de educação superior. Projeta-se, porque reconheceu a Língua de Sinais como meio legal de comunicação, utilizada por um expressivo grupo de brasileiros, fato que colocou a Libras como disciplina na formação inicial de todos os professores e fonoaudiólogos e desencadeou a oferta de cursos de licenciatura que contemplam as especificidades lingüísticas. A formação de professores para ensinar alunos surdos da educação básica e superior possibilitará a construção de uma identificação positiva com a língua de sinais e uma nova visão de mundo e da surdez. Neste momento, de redefinição da política educacional e de transformação na educação, denota-se a importância da oficialização e regulamentação da Língua Brasileira de Sinais, um ato que teve papel preponderante nesse processo que envolveu as dimensões relacionadas à garantia dos direitos dos alunos, da formação dos professores, da organização escolar e das atitudes. Sem perder de vista os desafios a serem enfrentados pela escola que ainda está aprendendo a compreender esse percurso na educação dos alunos surdos, torna-se imprescindível realizar um projeto pedagógico fundamentado na concepção da educação inclusiva, que não anule as diferenças e passe a estabelecer um novo olhar que reconhece a singularidade de cada aluno como fator de enriquecimento pessoal e de toda a comunidade, contribuindo para a conquista de espaços educacionais, sociais e culturais que fortaleçam a inclusão dos alunos surdos. A Secretaria de Educação Especial/MEC, ao implementar as políticas que dizem respeito ao cumprimento Decreto n.º 5.626/2005, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais, desenvolve ações que visam apoiar os sistemas de ensino para garantir as condições de acesso ao currículo aos alunos surdos. Dentre os programas, destacam-se: • Prolibras – Exame Nacional para Certificação de Proficiência em Língua Brasileira de Sinais (Libras) e Exame Nacional para Certificação de Proficiência em Tradução e Interpretação de Libras/Língua Portuguesa, realizado por instituições federais de ensino credenciadas. Em sua primeira edição, em 2006, o Prolibras teve mais de quatro mil participantes, dos quais 1.349 foram certificados. Esse exame, que acontecerá anualmente pelo período de dez anos a contar da data de publicação do Decreto, visa colocar à disposição dos sistemas de ensino profissionais habilitados para ensino da Libras e para os serviços de tradução/interpretação de Libras/ Língua Portuguesa; 116 • Curso de Pedagogia Bilíngüe – Libras/Língua Portuguesa – No Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES), teve início o primeiro curso superior bilíngüe para a formação de professores surdos e ouvintes para a atuação nos anos iniciais do ensino fundamental e na educação infantil; • Curso Superior de Letras com Licenciatura em Língua Brasileira de Sinais/Libras – Implantado em 2006, por meio da parceria do MEC com a Universidade Federal de Santa Catarina, visando à formação de professores surdos e ouvintes para o ensino da Libras, esse curso acontece na modalidade a distância e é oferecido por nove instituições federais de ensino superior: Universidade Federal do Amazonas, Universidade Federal do Ceará, Universidade Federal da Bahia, Universidade de Brasília, Centro Federal de Educação Tecnológica de Goiás, Instituto Nacional de Educação dos Surdos, Universidade de São Paulo, Universidade Federal de Santa Maria. Os quinhentos alunos desse curso serão os primeiros professores licenciados para ministrar a disciplina de Libras nos cursos da educação superior e nos cursos da educação básica; • Programa Interiorizando Libras – Desenvolvido em parceria do MEC com a Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (FENEIS) e com a Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Auditivos (APADA/DF). O programa promove cursos de formação continuada de professores para o atendimento educacional especializado de alunos surdos e com deficiência auditiva, que contempla quatro eixos temáticos: Ensino de Língua Portuguesa para surdos, Formação de Tradutor e Intérprete de Libras/Língua Portuguesa, Formação de Instrutores Surdos, Formação de professores para o uso da Libras; • Centro de Formação de Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas com Surdez (CAS) – Implementado em parceria com o MEC e todos os estados, os CAS constituem espaços com equipamentos e recursos para serem utilizados em cursos de formação continuada de professores, em produção de material bilíngüe, em atendimento educacional especializado às pessoas com surdez e têm a função de atuar como multiplicadores dos cursos do Programa Interiorizando Libras; • Programa de Implantação de Salas de Recursos Multifuncionais – Criado no âmbito do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), para apoiar os sistemas de ensino na institucionalização da oferta do atendimento educacional especializado nas escolas da rede pública de ensino. Esses espaços se destacam na produção de materiais, organização de recursos e 117 Anais do Congresso atividades para a promoção da acessibilidade ao currículo. No que se refere à educação de alunos surdos, as atividades desenvolvidas, no turno inverso da escolarização possibilitam aos alunos surdos a aprendizagem da Libras e da Língua Portuguesa como segunda língua; • Programa de Formação Continuada de Professores na Educação Especial – Com objetivo de formar professores na perspectiva da educação inclusiva, o programa, que integra as ações do PDE, forma uma rede de instituições públicas de educação superior para oferta de cursos de extensão, aperfeiçoamento e especialização nas áreas do atendimento educacional especializado. Com relação à educação de alunos com surdez, foram credenciados seis cursos: Educação de Surdos sob o Enfoque da Inclusão, pela Universidade Federal do Pará (UEPA); A Educação Especial: Déficit Cognitivo e Educação de Surdos, pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM); Professor e Surdez: Cruzando Caminhos, Produzindo Novos Olhares, pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU); Libras a Distância: Uma Proposta de Formação Continuada de Professores no Contexto Educacional Inclusivo, pela Universidade Estadual Paulista (UNESP/Marília); Formação Continuada em Educação Especial: Deficiência Auditiva, pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM); Deficiência Sensorial Auditiva e Educação Escolar Indígena, pela Universidade Estadual de Maringá (UEM); • Programa Incluir: Acessibilidade na Educação Superior – Iniciado em 2005, o programa foi fortalecido ao compor o conjunto de ações do PDE, atuando no fomento à criação de núcleos de acessibilidade nas instituições federais de educação superior para o desenvolvimento de ações de eliminação das barreiras físicas, pedagógicas e nas comunicações que possibilitem garantir condições de acesso e permanência dos alunos com deficiência na educação superior. Além dessas ações, destacam-se os avanços com relação à acessibilidade nos programas do livro didático e paradidático desenvolvidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Por meio do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) e do Programa Nacional da Biblioteca Escolar (PNBE), foram distribuídos os clássicos da literatura em Libras, os dicionários ilustrados trilíngües – Libras/Português/Inglês –, o livro didático de alfabetização acessível em Libras, e também a produção da coleção de livros nas disciplinas de língua portuguesa, matemática, ciências, geografia e história, em Libras, destinados aos alunos com surdez dos anos iniciais do ensino fundamental que começam a ser distribuídos no próximo ano. A ampliação dos títulos em Libras distribuídos pelo programa vem 118 atender a necessidade de acesso aos materiais didáticos disponibilizados a todos os alunos e sua utilização pelos alunos surdos na língua que lhes possibilite maior facilidade para compreensão e interpretação. Por meio dessas ações governamentais, os sistemas de ensino passam a ter referenciais para atender à diferença lingüística dos alunos surdos dentro de uma classe comum. A educação bilíngüe acontece na classe comum, onde o ensino é ministrado na língua portuguesa, e pode contar com a presença de tradutor-intérprete da Libras; uma escola que oferta a Libras para os alunos surdos e pode estendê-la aos colegas e aos professores para que haja comunicação entre todos. Nesse contexto, a atuação docente, especialmente dos professores surdos, para o ensino de Libras dará possibilidade às crianças surdas de desenvolver-se tendo atendidas as suas singularidades lingüísticas, e com o conhecimento de que a pessoa surda tem potenciais para exercer as mesmas funções de um professor ouvinte. Bibliografia BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Lei n.º. 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) e dá outras providências. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Decreto n.º 5.626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei n.º 10.436, de 24 de abril de 2002. BRASIL. INEP. Censo Escolar, 2006. Disponível em: <http://www.inep. gov.br/basica/censo/default.asp >. Acesso em: 20 de jan. 2007. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, 2006. 119 MESAS-REDONDAS NACIONAIS POLÍTICAS PÚBLICAS EM EDUCAÇÃO ESPECIAL DA SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO DO RIO DE JANEIRO: AS QUESTÕES DA INCLUSÃO ESCOLAR DE ALUNOS COM NECESSIDADES EDUCACIONAIS ESPECIAIS Roseni Cardoso* A Educação Especial vem exercendo papel de grande relevância no sistema educacional brasileiro, considerando as crescentes exigências de uma sociedade em processo de desenvolvimento e de afirmação da democracia. Para tal, faz-se necessária, portanto, uma Política em Educação de qualidade, em que todos os alunos recebam o apoio particular requerido por suas necessidades individuais de aprendizagem, com vistas à educação inclusiva. Historicamente, a Educação Especial assumiu diferentes concepções, terminologias e modalidades de atendimento educacional. Ao final do século XIX e início do século XX, sob uma concepção segregacionista, surgiram as instituições de internação e asilamento de todos os indivíduos que tinham seqüelas físicas ou mentais. Na década de 50, foram criadas as escolas especiais de atendimento exclusivo aos alunos com deficiência, então chamados de excepcionais. Posteriormente, as disposições da LDB nº 4.024/1961 apontavam o direito dos excepcionais à educação, preferencialmente no sistema geral de ensino. Sob a concepção integracionista foram criadas as classes especiais nas escolas da rede regular. Nesse contexto, o encaminhamento do aluno às classes comuns estava atrelado às suas condições de se adaptar aos padrões estabelecidos pela escola regular. Em 1988, a Constituição Federal do Brasil assim como outros documentos oficiais, consoantes com a demanda humana e social por inclusão das pessoas com necessidades especiais nas diversas instâncias sociais, preconiza sua inclusão na escola regular. Essa determinação fortaleceu-se por intermédio do compromisso político e ético assumido pelo Brasil ao manifestar consonância com os 120 * SEE/RJ postulados elaborados em Salamanca (Espanha, 1994) na Conferência Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais: Acesso e Qualidade. Entretanto, em 1994, a Política Nacional de Educação Especial elaborada pelo MEC/SEESP ainda adota o discurso integracionista, condicionando o acesso às classes comuns àqueles que “[...] possuem condições de acompanhar e desenvolver as atividades curriculares programadas do ensino comum, no mesmo ritmo que os alunos ditos normais”. É importante destacar que, por outro lado, a LDB n.º 9394/1996 define a Educação Especial como modalidade de educação escolar e deve ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para os educandos com necessidades educacionais especiais, devendo assegurarlhes: “Currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específica para atender às suas necessidades”. Ao regulamentar o Capítulo V – Educação Especial –, da LDB em vigor, o Conselho Nacional de Educação, por meio da Resolução n.º 2/2001, determina a obrigatoriedade dos sistemas de ensino quanto à matrícula de todos os alunos, cabendo às escolas organizarem-se para o atendimento aos educando com necessidades educacionais especiais, assegurando as condições necessárias para uma educação de qualidade para todos. Dessa maneira, contrapondo-se ao Paradigma da Integração, a Inclusão Escolar implica a organização das escolas no sentido de oferecer as condições necessárias para o atendimento às necessidades educacionais de todos os alunos, em um ambiente pedagógico acolhedor e diversificado, contribuindo assim de maneira significativa para o seu desenvolvimento cognitivo, desiderativo, social e cultural. A inclusão escolar se fundamenta em pressupostos éticos e democráticos de reconhecimento e valorização da diversidade humana e cultural, como características inerentes à constituição de qualquer sociedade, com princípios éticos e políticos estabelecidos no cenário dos Direitos Humanos, afirmando a importância de garantir o acesso e a participação de todos, a todas as oportunidades, independentemente das peculiaridades dos alunos. Nessa perspectiva, a Educação Especial é entendida como elemento integrante e indistinto do sistema educacional que se realiza transversalmente, em todos os níveis e modalidades de ensino, nas instituições escolares, cujo projeto, organização e prática pedagógica devem respeitar a diversidade dos alunos. Suas ações devem refletir a capacidade que todos têm de aprender, dando ênfase à convivência e aprendizagem na heterogeneidade como a melhor forma para a construção do conhecimento e promoção da cidadania. No que diz respeito à educação de alunos surdos, foco temático deste Congresso, a Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro/ SEEDUC/RJ, com base em dispositivos legais e documentos oficiais, vem 121 Anais do Congresso implementando a política de inclusão desse alunado nas classes comuns das escolas regulares. De acordo com o Censo Escolar de 2006, a rede estadual possui 1.229 alunos surdos e com deficiência auditiva matriculados, sendo 710 em classes e escolas especiais e 519 incluídos na rede regular de ensino. No decorrer dos últimos anos podemos constatar uma demanda cada vez maior desse alunado às escolas estaduais. Entretanto, reconhecemos que muitos ainda não estão tendo acesso à educação. Entendendo que a inclusão social e educacional se processará de forma gradativa e responsável, a rede estadual de ensino do Rio de Janeiro vem oferecendo as seguintes modalidades de atendimento: Exclusivas para alunos com necessidades educacionais especiais: Os professores que atuam nestes espaços são especializados, bilíngües, conhecedores das necessidades educacionais especiais dos alunos surdos e com deficiência auditiva. ESCOLAS ESTADUAIS DE EDUCAÇÃO ESPECIAL Anne Sullivan – Niterói Maria Ivete de Vasconcelos – Rio de Janeiro Neuza Goulart Brizola – Nova Friburgo CENTROS INTEGRADOS DE EDUCAÇÃO ESPECIAL Castorina Faria Lima - Nova Iguaçu Diogo Levenhagen - Volta Redonda CLASSES ESPECIAIS Com base na Lei n.º 10.436/2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais (Libras), regulamentada pelo Decreto n.º 5.626, de 22 de dezembro de 2005, como também em outros dispositivos legais que preconizam a inclusão dos alunos surdos nas escolas da rede regular de ensino, a SEEDUC/RJ vem desenvolvendo ações e implementando projetos com o intuito de garantir o acesso, a participação e a aprendizagem desse alunado no ambiente escolar comum. Destacaremos a seguir alguns artigos do Decreto supracitado, fazendo um paralelo com a Política de Inclusão da SEEDUC/RJ, demonstrando assim a consonância de suas diretrizes. Conforme o que dispõe o Art. 9.º do Decreto n.º 5.626/2005, “As instituições de ensino médio que oferecem cursos de formação para o magistério na modalidade normal devem incluir Libras como disciplina curricular.” No ano de 2007, onze Institutos de Educação da rede estadual do Rio de 122 Janeiro ofereceram cursos de Libras, sob a chancela da Associação de Pais e Amigos dos Deficientes Auditivos (APADA) de Niterói, para alunos do 4.º ano do Curso Normal como atividade complementar, enquanto aguardamos a conclusão do processo de inclusão da Libras, como disciplina, na Matriz Curricular do referido curso. O Art.14, complementado pelo § 3.º, dispõe que as instituições de ensino devem garantir, obrigatoriamente, às pessoas surdas acesso à comunicação, à informação e à educação nos processos seletivos, nas atividades e nos conteúdos curriculares desenvolvidos em todos os níveis, etapas e modalidades de educação, desde a educação infantil até a superior. Para tanto, preconiza ainda em seu § 1º que, para garantir o atendimento educacional especializado e o acesso previsto no caput, as instituições de ensino devem: a) Promover cursos de formação de professores Nesse sentido, considerando que os professores que atuam no sistema regular de ensino não tiveram, em sua formação inicial, acesso a conhecimentos relativos às necessidades especiais educacionais dos alunos surdos, a SEEDUC/RJ vem desenvolvendo um Programa de Formação Continuada desses professores para o atendimento educacional demandado por esse alunado. Assim, esta Secretaria tem oferecido sistematicamente cursos na área da surdez para professores que, em sua maioria, desenvolveram concepções equivocadas a respeito da educação de surdos no que se refere ao potencial deste alunado para a escolarização, autonomia e emancipação. Esses cursos também abordam aspectos como: • a singularidade lingüística manifestada pelos alunos surdos; • o reconhecimento da Língua Portuguesa como segunda língua para as pessoas surdas, enfatizando a necessidade do ensino dessa língua na modalidade escrita para esses educandos; • a valorização do aspecto semântico em detrimento do aspecto formal na produção escrita do aluno surdo, adotando mecanismos de avaliação coerentes com aprendizado de segunda língua, na correção das provas escritas; • a importância da utilização de recursos visuais e a correlação dos conteúdos curriculares com situações do cotidiano para o desenvolvimento da capacidade representativa e lingüística dos alunos surdos. Fazendo parte desse Programa são oferecidos também cursos de Libras, com prioridade aos professores que estão interagindo com alunos surdos incluídos nas classes comuns. b) Prover as escolas com tradutor e intérprete de Libras – Língua Portuguesa Com vistas à inclusão do aluno surdo, a SEEDUC/RJ iniciou em 123 Anais do Congresso 2003 o projeto de Contratação de Tradutor e Intérprete de Libras/Língua portuguesa com 30 intérpretes atuando em 12 escolas. Atualmente a rede estadual de ensino do Rio de Janeiro possui um total de 130 intérpretes de Libras exercendo suas funções em 62 escolas da rede estadual de ensino, constituindo-se dessa forma em escolas bilíngües. Esses profissionais vêm atuando nas salas de aula para viabilizar o acesso dos alunos surdos aos conhecimentos e conteúdos curriculares, em todas as atividades didático-pedagógicas, como também em momentos livres, viabilizando uma conversa informal dos alunos surdos com os alunos ouvintes. Temos clareza de que o uso da Libras no cotidiano da sala de aula não é suficiente para viabilizar a aprendizagem do aluno surdo, pois contrário a esta lógica seria afirmar que todos os alunos ouvintes teriam ótimo aproveitamento escolar, dada a sua condição de usuários da língua portuguesa. Algumas mudanças estruturais fazem-se necessárias no contexto da sala de aula de modo que o professor reflita sobre sua práxis pedagógica com base nos princípios da educação inclusiva, promovendo um ambiente acolhedor, interativo, diversificado, atraente e desafiador, que potencialize a capacidade de aprender de todos os alunos, sejam surdos ou ouvintes. Ainda vem a ser do entendimento comum pensar que o professor da classe regular com alunos surdos incluídos, ao aprender a Libras, não precisaria da mediação do tradutor e intérprete. A função deste profissional é distinta e indissociável da função de professor docente. Isto porque na sala de aula são utilizadas simultaneamente duas línguas (Libras e língua portuguesa), o que se torna uma tarefa impossível para a atuação do professor regente. Com o intuito de evitar que o tradutor e intérprete assuma a tutoria dos alunos surdos no espaço escolar, a SEEDUC/RJ vem oferecendo, conforme afirmado anteriormente, cursos de Libras para professores para que possam estabelecer com os alunos surdos interações sociais e de comunicação, minimizando a dependência do intérprete. c) Garantir o atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos surdos, desde a educação infantil, nas salas de aula e, também, em Salas de Recursos, em turno contrário ao da escolarização Nesta perspectiva, a rede estadual de ensino do Rio de Janeiro iniciou este ano, 2007, uma experiência de participação de instrutores surdos em duas turmas de educação infantil regular com duas crianças surdas incluídas. Esse trabalho vem sendo acompanhado por professoras do Núcleo de Apoio Pedagógico Especializado (NAPES), assim como por profissionais da APADA de Niterói/RJ. Reconhecendo a importância da Sala de Recursos como um espaço 124 de complementação curricular, a SEEDUC/RJ vem investindo na implementação dessa modalidade de atendimento educacional especializado na rede estadual de ensino, e, no que diz respeito ao aluno surdo, enfatiza-se o ensino da modalidade escrita da língua portuguesa como segunda língua, na perspectiva dialógica, funcional e instrumental. Esse serviço de apoio pedagógico à inclusão escolar é oferecido no contraturno da escolarização do aluno surdo e se destina somente a alunos surdos incluídos nas classes comuns das escolas públicas estaduais do Rio de Janeiro. Nesse ambiente são disponibilizados equipamentos, permitindo o acesso às novas tecnologias de informação e comunicação, bem como recursos didáticos para apoiar a educação de alunos surdos. A SEEDUC/RJ publicou a Resolução n.º 3.129/2005, que normatiza a estrutura e o funcionamento das Salas de Recursos, e, no que diz respeito ao atendimento educacional especializado para os alunos surdos incluídos, esta Resolução determina que os professores, para atuarem nesses espaços, precisam ser proficientes em Libras. Em conformidade com o Art. 22 do Decreto n.º 5.626/2005, as instituições de ensino responsáveis pela educação básica devem garantir a inclusão de alunos surdos ou com deficiência auditiva, por meio da organização de escolas bilíngües ou escolas comuns da rede regular de ensino, abertas a alunos surdos e ouvintes, com docentes conhecedores da singularidade lingüística dos alunos surdos, além da mediação de tradutores intérpretes de Libras / Língua Portuguesa. Podemos afirmar que as escolas da rede estadual de ensino do Rio de Janeiro que possuem alunos surdos incluídos nas classes comuns constituem-se escolas bilíngües, haja vista que a Libras e a modalidade escrita da Língua Portuguesa são línguas de instrução utilizadas no desenvolvimento de todo o processo educativo desse alunado. Serviços de apoio especializado Núcleos de Apoio Pedagógico Especializado (NAPES) Formados por professores especialistas que têm por competência oferecer, de forma itinerante, orientações e capacitações aos professores das classes comuns, viabilizando um atendimento educacional adequado às necessidades especiais dos alunos, principalmente daqueles com deficiência, surdez, cegueira e transtornos no desenvolvimento. Centro de Formação de Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas com Surdez – CAS (MEC/ SEEDUC/RJ) 125 Anais do Congresso Este projeto da SEESP/MEC em parceria com a SEEDUC/RJ, que está sendo implementado no IE Carmela Dutra (RJ), deverá ser a referência para a rede estadual de ensino no processo de apoio à inclusão dos alunos com surdez ou com surdocegueira. Através das ações citadas anteriormente, voltadas à educação dos alunos surdos, a Secretaria de Estado de Educação/RJ incrementará as competências e atribuições do CAS que visam socializar a política de inclusão escolar/social desses educandos, assim como assegurar-lhes o atendimento às suas necessidades educacionais especiais. Concluindo, é evidente que a consolidação de uma educação inclusiva de qualidade para todos alunos, com e sem necessidades educacionais especiais, implica necessariamente uma readequação da estrutura organizativa da educação e das escolas, ressignificando conceitos de aprendizagem, avaliação, currículo, metodologias de ensino, ambiente escolar, gestão e outras práticas pedagógicas, consistindo em um olhar cuidadoso de reconhecimento, identificação e valorização da diversidade humana e social e suas demandas educacionais no contexto escolar. 126 MESAS-REDONDAS NACIONAIS A LÍNGUA ESCRITA COMO SEGUNDA LÍNGUA: UMA EXPERIÊNCIA DE LETRAMENTO Elaine da Rocha Baptista Plaisant O presente trabalho é parte da dissertação de mestrado intitulada “Análise das Estratégias de Ensino que Facilitam a Leitura do Surdo, nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental” desenvolvida no Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES no período de 2004 a 2005 e apresentada no VIII Congresso Latinoamericano de Educação Bilíngüe para Surdos, realizado em Havana – Cuba em novembro de 2005. A investigação foi desenvolvida com o intuito de compreender o processo de aquisição da língua portuguesa escrita como segunda língua por alunos surdos numa turma de 1ª série do ensino fundamental, de acordo com as estratégias de ensino utilizadas pelo professor. Vale ressaltar que a fundamentação teórica que será descrita, vem sendo construída por um grupo de professores desde 1994 no qual faço parte. Ela tem como base a abordagem sócio-interacionista de aprendizagem em que o conhecimento é uma construção social compartilhada entre sujeitos por meio da língua. Segundo Bakthin (1997), “a verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas lingüísticas nem pela enunciação monológica isolada, mas pelo fenômeno da interação verbal, realizada através da enunciação ou das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua” (p. 123). Portanto, todas as nossas atividades de leitura/escrita se pautam na função comunicativa da língua, onde: • Ler é “saber-se envolvido em uma interação com alguém em um momento sócio-histórico específico e que o escritor, como qualquer interlocutor, usa a linguagem a partir de um lugar social marcado. Ler é se envolver em uma prática social” (Moita Lopes, 1996). • “A escrita difere do discurso oral pois pressupõe um interlocutor ausente ou o próprio autor (lembretes, agendas, diários, p. ex.).” (Souza,1997) • “A escrita deve ter como objetivo essencial o fato de alguém ler o que está escrito” (Cagliari, 1995). 127 Anais do Congresso Acreditando que a língua de sinais é a primeira língua do aprendiz surdo e que, por meio dela, ele constrói sua identidade e leitura do mundo, abordamos o ensino de língua portuguesa como segunda língua, nas habilidades de leitura e escrita, que se encontra em consonância com diversos estudos sobre aquisição de linguagem por surdos e com os Parâmetros Curriculares do MEC. • “A língua é um sistema de signos histórico e social que possibilita ao homem significar o mundo e a realidade. Assim, aprendê-la é aprender não só as palavras, mas também os seus significados culturais e, com eles, os modos pelos quais as pessoas do seu meio social entendem e interpretam a realidade e a si mesmo” (PCN de Língua Portuguesa, 1998: 24). • “A convivência entre comunidades locais e imigrantes ou indígenas pode ser um critério para a inclusão de determinada língua no currículo escolar. Justifica-se pelas relações envolvidas nessa convivência: as relações culturais, afetivas e de parentesco. Por outro lado, em comunidades indígenas e em comunidades de surdos, nas quais a língua materna não é o português, justifica-se o ensino de Língua Portuguesa como segunda língua” (PCN de Língua Estrangeira, 1998:23). Esta perspectiva norteia os objetivos curriculares, a organização dos conteúdos e os procedimentos metodológicos em torno de três tipos de conhecimento: O conhecimento de mundo, o conhecimento de organização textual e o conhecimento de organização sistêmica. O primeiro se refere ao pré-conhecimento do leitor sobre o tema e às experiências armazenadas na memória. Já o segundo, diz respeito aos diferentes tipos de texto, orais ou escritos, vivenciados numa sociedade letrada (descrições, entrevistas, cartas, entre outros). Por último, o conhecimento sistêmico, envolve os conhecimentos lingüísticos nos níveis sintático, semântico e lexical, (Moita Lopes,1996, Kleiman, 1999, Freire, 1998). Estes conhecimentos preparam o aluno para atuar como sujeito por meio do discurso. Por isso, optamos pelo termo “letramento” para designar o processo de ensino e aprendizagem de leitura e escrita que desenvolvemos no instituto, de acordo com os Parâmetros Curriculares do MEC. • “Produto da participação em práticas sociais, que usam a escrita como sistema simbólico e tecnologia. São práticas discursivas que precisam da escrita para torná-las significativas, ainda que às vezes 128 não envolvam atividades específicas de ler ou escrever. Dessa concepção decorre o entendimento de que, nas sociedades urbanas modernas, não existe grau zero de letramento, pois nelas é impossível não participar, de alguma forma, de algumas dessas práticas”. (PCN de Língua Portuguesa 1998:23) Logo, seguimos uma proposta de educação bilíngüe onde: • A língua de sinais é concebida como língua de instrução; • O indivíduo como ser social situado no contexto sócio-histórico e cultural; • Língua como instrumento de comunicação; • Foco na função comunicativa da língua; • Ensino baseado na interação entre os interlocutores; • Modelo de professor como construtor de “andaimes”; • O aluno como ser ativo na construção de conhecimento; • O “erro” como significado-sinal de processo; • Papel da língua 1 como mediadora no ensino da língua 2; • Aquisição de língua através de negociação criativa com levantamento de hipóteses. Em consonância com a fundamentação teórica descrita anteriormente, os conteúdos programáticos da série foram organizados em projetos pedagógicos, uma vez que, oportunizam a discussão de assuntos de interesse dos alunos num enfoque interdisciplinar e a abordagem de temas importantes na relação do sujeito com o seu meio social. Também, possibilitam a imersão da criança surda em práticas discursivas e significativas para ela, o que vai torná-la competente numa segunda língua, no caso a língua portuguesa. Em 2004, minha turma era composta por alunos novos na instituição com faixa etária entre 11 a 14 anos e portadores de surdez sensório-neural bilateral profunda. Desconheciam a LIBRAS, se comunicavam por meio de gestos espontâneos e alguns sinais constituídos no ambiente familiar; ignoravam a função da leitura e não se identificavam como pessoas surdas. A fim de criar um envolvimento dos alunos novos com o contexto escolar e sua identificação como sujeitos pertencentes a um grupo social foi desenvolvido o primeiro projeto intitulado “Eu e a Escola”. Assim, como uma das primeiras atividades de leitura, realizou-se a pesquisa do nome, data e local de nascimento em todos os documentos disponíveis tais como, caderneta escolar, cartão de gratuidade em transportes coletivos e certidão de nascimento. Em seguida, as informações coletadas foram organizadas de diferentes maneiras, por meio de registros em tabelas, gráficos, linhas de tempo e calendário, oportunizando discussões que abrangeram outras 129 Anais do Congresso áreas do conhecimento além do português, como matemática, ciências e estudos sociais. Na medida em que se aproximou o aniversário de uma criança da turma, outro projeto foi iniciado a fim de oportunizar a leitura e a produção escrita de diversos tipos de textos com funções sociais diferentes, além do estudo da organização sistêmica da língua portuguesa. É importante citar que ele acontece várias vezes durante o período letivo, na medida em que as crianças vão aniversariando e se desenvolve paralelamente a outros projetos pedagógicos, que abrangem temas relevantes e de interesse dos alunos. Com o intuito de enriquecer o conhecimento de mundo nos aprendizes, contamos com a presença do Assistente Educacional em LIBRAS (AEL)1 , que auxilia o professor em sala de aula. Ao utilizar estratégias próprias de comunicação, esse profissional atua como facilitador na aquisição de informações por meio da LIBRAS e, como modelo de sujeito surdo competente e inserido socialmente, contribui para a construção da identidade surda e o desenvolvimento de uma auto-estima positiva nos aprendizes. Assim, a partir da discussão em LIBRAS sobre tudo que envolve uma festa de aniversário, iniciou-se o planejamento e organização da festa idealizada pelas crianças. Com isso, mais conteúdos pedagógicos foram trabalhados de forma interdisciplinar tais como medidas e preços de ingredientes. Outros tipos de textos também foram utilizados para as atividades de leitura e escrita, tais como: receitas, notas fiscais, encartes, rótulos de produtos, convites, listas de aniversários, de compras e de convidados, promovendo nos alunos o conhecimento de organização textual. Tal processo permitiu trabalhar: itens lexicais de forma contextualizada, alguns aspectos morfológicos da língua portuguesa, como por exemplo, gênero e número do substantivo, bem como, o uso de letras maiúsculas e sinais de pontuação. Em outros termos, o conhecimento sistêmico da língua alvo. Outros projetos intitulados “Olimpíadas: O Corpo em Ação”, “Festa Junina”, “Água” e “Os Seres Vivos” também foram desenvolvidos e oportunizaram várias discussões em sala de aula num enfoque interdisciplinar. O primeiro aconteceu durante o mês de agosto de 2004 e envolveu outra turma de 1ª série. Como experiências de aprendizagem, várias atividades foram planejadas tais como: visita ao Complexo Esportivo do Maracanã; palestra sobre a história das Olimpíadas; entrevista com a nutricionista da escola; apresentação de vídeos relacionados ao tema; além 1 130 Esse termo denomina o profissional surdo, que é contratado pela escola para atuar junto aos alunos e professores, favorecendo a interlocução adequada em LIBRAS durante as aulas. dos “aulões”2 , que são ministrados pelo AEL, como por exemplo, o que são as Olimpíadas e suas modalidades esportivas. Dessa forma, foi possível discutir os temas sob vários aspectos, que ultrapassaram aos conteúdos planejados para a série. Como conhecimento específico em Estudos Sociais, trabalhou-se as noções de espaço e tempo, a partir da localização da Grécia e do Brasil no mapa, identificando os meios de transportes possíveis para se fazer o percurso entre os dois países, bem como, dias e horários das competições. Em Ciências, abordou-se a questão da saúde, tais como, hábitos de higiene e alimentação. As atividades de Matemática envolveram os cinco blocos de conteúdos propostos pelo PCN, tais como, as noções de número; operações; espaço e forma; tratamento da informação; grandezas e medidas; como, por exemplo, o estudo das moedas brasileiras. Tal recurso possibilitou o desenvolvimento de muitas habilidades nos educandos, tais como: reconhecer as cédulas e moedas que circulam no Brasil, identificar a função do número em diferentes contextos; utilizar diversas estratégias para registrar quantidades e comparar grandezas; solucionar situaçõesproblemas tendo as Olimpíadas como cenário, bem como, ler listas e tabelas simples. O trabalho de Língua Portuguesa foi realizado a partir de jornais, revistas, calendário dos jogos e mapas. Esses textos foram muitos explorados durante o projeto, pois, despertaram os interesses dos alunos, que buscavam as informações que consideravam relevantes. Nesse contexto, alguns exercícios de leitura e escrita foram realizados pelos alunos oportunizando a discussão de várias estratégias de leitura em segunda língua. A avaliação do desempenho dos alunos foi realizada durante todo o desenvolvimento do projeto, por meio de observações das atividades desenvolvidas em sala de aula pelos aprendizes, de relatos de pais sobre o envolvimento dos filhos no trabalho e de produções escritas. Com isso, foi possível observar que eles começaram a se situar no tempo e no espaço e a identificar diferentes tipos de textos por sua formatação, conhecendo sua utilização e, conseqüentemente, significando-os. Verificou-se também, que os alunos ampliaram seus conhecimentos para outras situações da vida escolar e familiar, entretanto, ainda não eram capazes, ao final do ano, de refletir e fazer inferências sobre a língua portuguesa, uma vez que, se encontravam em processo inicial de aquisição de LIBRAS. No ano letivo seguinte, tive a oportunidade de permanecer com a turma dando continuidade ao trabalho realizado anteriormente. Tal experiência me permitiu observar que na medida em que os alunos foram se tornando 2 Refere-se às aulas dadas pelo assistente educacional a duas ou mais turmas juntas 131 Anais do Congresso mais proficientes em LIBRAS, ou seja, expressando-se com mais clareza e adequando o discurso aos diferentes contextos em que ele é utilizado, eles começaram a se interessar pela língua escrita e a utilizá-la como mais uma forma de comunicação, com função social específica. Com a Língua de Sinais mediando a construção do conhecimento em sala de aula, foi possível analisar com os alunos alguns aspectos morfológicos da língua portuguesa que ocorreram repetidas vezes nos textos trabalhados. Com isso, eles começaram a inferir sobre algumas regras da língua portuguesa, promovendo uma leitura mais consciente e autônoma. No primeiro bilhete produzido pela turma, os alunos inseriram um texto produzido por mim, como por exemplo: 132 Entretanto, no ano seguinte, foram capazes de produzir textos individualmente, tais como: 133 Anais do Congresso Outros exemplos: 134 Portanto, a partir da análise e interpretação dos dados, que investigou o desempenho dos alunos em relação às estratégias de ensino utilizadas pela professora/pesquisadora, concluiu-se que esses aprendizes desenvolveram habilidades de leitura e escrita acima do esperado, considerando-se que ao ingressarem no INES, eles não possuíam uma língua a ser compartilhada, prejudicando, portanto, a interação entre professor x aluno e aluno x aluno em sala de aula. Os fundamentos teóricos desse trabalho se mostraram eficientes, uma vez que, promoveram o desenvolvimento global dos educandos enquanto sujeitos ativos na sociedade: A abordagem sócio-interacionista de aprendizagem oportunizou a troca de informações entre os pares envolvidos em sala de aula e, conseqüentemente, a construção coletiva do conhecimento. O trabalho pedagógico organizado por projetos ou temas geradores, num enfoque interdisciplinar, possibilitou a discussão de temas importantes e significativos para os alunos, que ultrapassaram o conteúdo planejado para a série. O ensino pautado na função comunicativa da língua portuguesa em torno dos conhecimentos de mundo, de organização textual e sistêmico desenvolveu habilidades nos educandos, que os tornaram capazes de atuarem na sociedade por meio do discurso. A LIBRAS como língua de instrução, ou seja, utilizada como uma estratégia a fim de alcançar os objetivos propostos, melhorou a auto-estima dos estudantes, que passaram a executar suas tarefas com mais segurança e autonomia. E, finalmente, a presença do Assistente Educacional, como representante da comunidade surda, utilizando estratégias próprias de aprendizagem em LIBRAS possibilitou uma melhor interlocução em sala de aula e o desenvolvimento da identidade surda nos alunos. Vale ressaltar a importância dos recursos visuais, principalmente, como ilustração dos textos em língua portuguesa para esses aprendizes, que utilizam estratégias de leitura em segunda língua para significá-los. A seguir, farei um breve relato sobre o trabalho que vem sendo desenvolvido neste ano de 2007 no INES. A Coordenação de Orientação e Apoio à Prática Pedagógica - COAPP propôs o projeto intitulado “Terra em Perigo: O Futuro Começa em Você” com o objetivo de possibilitar a discussão de um tema de interesse e prioridade mundial. Ele vem sendo desenvolvido por vários profissionais e, no nosso setor, cada série escolheu um aspecto relacionado ao tema para estudar, a saber: • 1ª Séries: “Preservando o Nosso Planeta: Reduzindo, reaproveitando e reciclando”; • 2ª Séries: “A importância da água” • 3ª Séries: “Causas e Conseqüências do Aquecimento Global na Natureza”; 135 Anais do Congresso • 4ª Séries: “Conseqüências do Aquecimento Global no Corpo Humano”. A partir daí, várias atividades pedagógicas vêm sendo realizadas envolvendo alunos e professores. Como dois exemplos de sucesso pela grande repercussão no instituto foram: O Jornal da Quarta e a brincadeira intitulada pelos alunos da professora Geise como “Digitando”. O primeiro vem possibilitando aos alunos compartilhar todo o saber construído com seus colegas e familiares e o segundo vem oportunizando a memorização das palavras relacionadas aos temas trabalhados, uma vez que, esse vocabulário é utilizado numa competição onde os alunos devem “soletrar” as palavras por meio do alfabeto dactilológico. 136 Conclui-se, portanto, que a abordagem Bilíngüe tem-se mostrado como um possível caminho para esses sujeitos. Entretanto, essa concepção de ensino deve ser assumida por toda a escola, gerando sementes para a construção de um projeto político e educacional na educação de surdos. Bibliografia BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1977. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria do Ensino Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua portuguesa. Brasília: MEC/ SEF, 1998. BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria do Ensino Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: Língua estrangeira. Brasília: MEC/ SEF, 1998. CAGLIARI, Luiz Carlos. Alfabetização e lingüística. 8ª ed. São Paulo: Scipione, 1995. FREIRE, Alice. “Aquisição de português como segunda língua: uma proposta de currículo”. In Revista Espaço n. 9, Rio de Janeiro: I.N.E.S. pp. 46-52, 1998. KLEIMAN, Ângela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. 6ª ed. Campinas, SP: Pontes, 1999. MOITA LOPES, L. P. Oficina de lingüística aplicada. Campinas: Mercado das letras, 1996. SOUZA, R. M. A Escrita das Diferenças. In: Anais do Seminário: Desafios e Possibilidades na Educação Bilíngüe para Surdos, I.N.E.S., Rio de Janeiro, 1997. 137 MESAS-REDONDAS NACIONAIS A LÍNGUA ESCRITA COMO SEGUNDA LÍNGUA: UMA EXPERIÊNCIA DE LETRAMENTO Maria Cristina da Cunha Pereira1 Depois de quase cem anos de oralismo, a Língua de Sinais vem gradativamente conquistando mais espaço na educação de alunos surdos. O Decreto Federal 56262 , de 22 de dezembro de 2005, representa o resultado de muitas lutas por parte da comunidade de surdos e de ouvintes comprometidos com a educação de surdos. Entre os pontos fundamentais, vale destacar o fato de ter sido o primeiro documento a usar o termo “surdo” e a definir a surdez como diferença e não como deficiência. No artigo 2º do documento lê-se que “a pessoa surda é definida como aquela que, por ter perda auditiva, compreende e interage com o mundo por meio de experiências visuais, manifestando sua cultura principalmente pelo uso da Língua Brasileira de Sinais”. O mesmo documento reconhece o direito dos surdos a uma educação bilíngüe, na qual a Língua de Sinais é a primeira língua e a Língua Portuguesa, na modalidade escrita, a segunda. A modalidade oral da Língua Portuguesa é uma possibilidade, mas deve ser trabalhada fora do espaço escolar. Em outras palavras, não cabe ao professor responder pelo trabalho de produção da fala pelos alunos. Considerando que a maioria das crianças surdas tem famílias ouvintes, que não usam a Língua de Sinais, cabe à escola propiciar condições para que seus alunos surdos a adquiram, em contextos semelhantes aos vivenciados pelas crianças ouvintes ou surdas, filhas de pais surdos na interação com seus familiares. Para isso, deve-se possibilitar a interação das crianças com adultos surdos, usuários fluentes da língua, os quais, envolvendo-as em práticas discursivas e interpretando os enunciados produzidos por elas, insiram-nas no funcionamento desta língua. Assim como os adultos ouvintes não oferecem sílabas, palavras ou frases extremamente simplificados, mas textos orais espontâneos, decorrentes da vida cotidiana, para que as 1 DERDIC/PUCSP. Este decreto regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, e o art. 18 da Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000. 2 138 crianças aprendam a falar, também na aquisição da língua de sinais devemse oferecer textos sinalizados às crianças surdas. É desta forma que elas vão poder adquirir não só os sinais, mas a língua. Adquirida a Língua de Sinais, ela dará o arcabouço para a aprendizagem da segunda língua, a Língua Portuguesa. Possibilitar a aquisição, pelos alunos surdos, da Língua Portuguesa, na modalidade escrita, é um dos desafios que os educadores enfrentam. Contribuir para a reflexão sobre esta questão é o objetivo deste trabalho. Aprendizado da Língua Portuguesa por alunos surdos Numa proposta bilíngüe, a língua portuguesa é considerada a segunda, no sentido de que sua aquisição pressupõe a aquisição da Língua de Sinais. A questão que tem preocupado os profissionais que trabalham com alunos surdos é como possibilitar a aquisição da Língua Portuguesa por seus alunos. Nos últimos anos tenho defendido a idéia de que a concepção de língua que se adota e a representação que se tem do aluno surdo são fatores fundamentais na elaboração de propostas para aprendizagem da Língua Portuguesa pelos alunos. Em relação à concepção de língua, durante todo o século XX predominou, no ensino de línguas em geral, a concepção de língua como código. Tal concepção valoriza o conhecimento das regras da língua como requisito para o seu uso correto. Subjacente a esta concepção parece estar a pressuposição de que, conhecendo as regras da língua, os alunos venham a usá-la adequadamente. Visando ao aprendizado das regras da Língua Portuguesa, o professor iniciava a exposição dos alunos a palavras e prosseguia com a utilização destas palavras em estruturas frasais, primeiramente simples e depois cada vez mais longas e morfossintaticamente mais complexas. Por meio de exercícios de substituição e de repetição, esperava-se que os alunos memorizassem as estruturas frasais trabalhadas e as usassem. O resultado desta prática está muito bem ilustrado na tese de doutorado de Trenche (1995), do qual destaco apenas um exemplo dentre os muitos que a autora apresenta: 139 Anais do Congresso “A professora pede aos alunos que cada um escreva uma frase na lousa com a palavra sabonete. Dois alunos escrevem: “O sabonete é grande”; “O sabonete é verde”. A professora pede que escrevam uma frase diferente e apresenta o modelo: “A Carla tem dois sabonetes”. Pede que todos leiam, mas, antes, chama a atenção dos alunos para o “s” final da palavra “sabonetes” que indica plural. A palavra seguinte é “sofá” e o aluno escreve “O sofá é marrom”. A professora não aceita porque, segundo ela, as frases estão muito iguais. Sugere, então, outras possibilidades, como “é meu”, “é da”, e o aluno escreve: “o sofá é da Carla”. Apontando para o artigo que introduz a frase, a professora corrige, dizendo que “o” pequeno não pode começar a frase. Ao serem solicitados que escrevessem sozinhos no caderno, os alunos formaram frases como: “O papai é do sapato”, “A mamãe é da mala”, “O Allan é do telefone”, “A lata é de cinza”.” (Trenche, 1995, p. 123) Como se pode observar no exemplo, para cumprirem a atividade que lhes foi solicitada, os alunos se apóiam em algumas estruturas frasais já aprendidas. A professora tenta introduzir um outro modelo de frase e parece esperar que o mesmo seja imediatamente aceito e usado pelos alunos. Diante da insistência do aluno em usar a mesma estrutura frasal apresentada pelos colegas, a professora fornece outro modelo de frase, que passa a ser tomado como modelo para todas as frases que os alunos, individualmente, escrevem no caderno. As frases produzidas atendem aos requisitos morfossintáticos da língua, mas o resultado são frases sem sentido. Estruturas como esta, que causam tanta estranheza em professores ouvintes, são comuns em exercícios de formação de frases por alunos surdos, e, embora sejam atribuídas freqüentemente à surdez, revelam falta de conhecimento da Língua Portuguesa, além de revelarem falha no método de ensino, já que é ensinada a estrutura sem explicação sobre o conteúdo envolvido nela. A adoção da concepção de língua como código no ensino da Língua Portuguesa não foi algo privativo dos surdos, mas reforçou a representação de incapacidade deles, uma vez que, com acesso reduzido às informações pela audição, eles apresentavam dificuldades acentuadas na utilização de todos os aspectos da língua, desde vocabulário até combinação de palavras nas estruturas frasais. Comportamento semelhante ao observado no ensino de alunos surdos é relatado também no aprendizado de Língua Estrangeira. Coracini (2002) afirma que a falta de conhecimento da língua por parte dos alunos vem reforçar ainda mais o hábito de se ater à palavra como portadora do significado do texto, hábito este que a escola enfatiza como o ensino por meio da gramática e do léxico. Visando ao aprendizado da Língua Portuguesa pelos alunos surdos, a escola deveria propiciar-lhes o seu uso como prática social, na qual eles 140 possam relacionar forma e função. Em outras palavras, assim como na exposição à Língua de Sinais, os alunos surdos deveriam ser inseridos em atividades que envolvam o uso da Língua Portuguesa em textos autênticos e não adaptados pelos professores, com vocábulos e estruturas frasais simplificados. A inserção dos alunos surdos na língua, de Sinais e Portuguesa, em funcionamento, é compatível com a concepção de língua como atividade discursiva, a qual privilegia o texto, concebido como lugar de interação. O texto, nesta concepção, é visto como lugar de interação e os interlocutores, como sujeitos ativos que, dialogicamente, nele se constroem e são construídos (Koch, 2001). Como atividade discursiva, deve-se inserir os alunos surdos em situações de uso da Língua Portuguesa escrita, possibilitando, assim, a apreensão da sua convencionalidade. Conceber os alunos surdos como interlocutores requer uma mudança na representação que predominou na educação dos surdos desde 1880, quando se optou pela adoção do oralismo. Os professores devem acreditar no potencial dos alunos surdos e propiciar-lhes condições para que eles se tornem leitores e escritores. O grau de proficiência de cada aluno vai depender do seu conhecimento de Língua Portuguesa. Para se tornarem leitores e escritores competentes, é fundamental que os alunos surdos, assim como os ouvintes, disponham de conhecimento de mundo e de língua, os quais vão constituir seu conhecimento prévio. A importância do conhecimento prévio para atribuição de sentido na leitura e produção de sentido na escrita é defendida tanto por autores que se dedicam à questão da leitura e da escrita por alunos ouvintes, como Kleiman (2004); Fulgêncio e Liberato, (2001; 2003), entre outros, como por surdos (Lane, Hoffmeister e Bahan, 1996). Para todos estes autores, é a interação do conhecimento lingüístico, textual e de mundo que permite ao leitor atribuir sentido ao texto. Lane, Hoffmeister e Bahan (1996) destacam que o conhecimento prévio, que eles chamam de conhecimento de fundo, ajuda os alunos a criarem expectativas e a formularem hipóteses sobre os significados dos textos, a abstraírem significado de passagens de textos e não apenas de vocábulos isolados. Considerando que, de modo geral, as crianças surdas, de pais ouvintes, chegam à escola sem uma língua que as possa auxiliar na constituição de conhecimento prévio, cabe aos profissionais propiciar a estas crianças interação com surdos adultos visando à aquisição da Língua de Sinais. Uma vez adquirida a Língua de Sinais, ela vai possibilitar a ampliação do conhecimento de mundo, bem como a inserção em atividades que envolvam a escrita, como relatos de história e leitura de livros. 141 Anais do Congresso A leitura é considerada, por pesquisadores da área da surdez, a principal fonte de informação para a criança surda adquirir a Língua Portuguesa escrita. Svartholm (2003) propõe que a leitura de livros e revistas seja feita com crianças desde a Educação Infantil porque diverte, estimula e satisfaz a curiosidade. Além disso, ela é ferramenta fundamental na constituição do conhecimento da Língua Majoritária. Para a mesma autora, os alunos devem ser apresentados ao maior número possível de textos e o professor deverá ser capaz não somente de “traduzi-los” para a Língua de Sinais e vice-versa, como também de explicar e explicitar características dos textos para as crianças. Tais explicações deveriam ser dadas em uma perspectiva contrastiva, na qual as diferenças e as semelhanças entre a Língua de Sinais e a Língua Majoritária escrita seriam esclarecidas. A idéia subjacente é explicar o conteúdo dos textos e mostrar como o significado é expresso nas duas línguas. Neste ponto chamo a atenção para a necessidade de os alunos terem acesso ao material escrito, uma vez que é pela visão que eles constituirão seu conhecimento sobre a Língua Portuguesa. Na medida em que adquiram a Língua Portuguesa, faz-se necessário que os alunos tenham acesso a materiais escritos, de diferentes gêneros e tipos textuais, para que ampliem seu conhecimento lingüístico e textual e, assim, possam não só ampliar suas habilidades de compreensão como também de produção de textos. Como para os alunos ouvintes, o objetivo no ensino da linguagem escrita deve ser a habilidade de produzir textos e não palavras e frases, daí a importância de se trabalhar muito bem o texto, inicialmente na Língua de Sinais. Esta prática serve de base para que os alunos formulem suas hipóteses sobre como funcionam os textos escritos. A tarefa do professor é viabilizar o acesso do aluno, ouvinte e surdo, ao universo dos textos que circulam socialmente e ensinar a produzi-los. Desta forma, o aluno surdo poderá aprender o sistema da língua como também ampliar seu conhecimento letrado. Visando ilustrar a importância do conhecimento prévio para a produção de escrita e, ao mesmo tempo, a possibilidade de os alunos surdos se constituírem como produtores de textos, apresento, a seguir, um exemplo, extraído de um trabalho anterior (Pereira, 2005, p. 69). O autor deste texto é aluno de escola estadual em um município de São Paulo, tinha 15 anos, na época da produção do exemplo, e tem um irmão surdo mais velho, com o qual usa Língua de Sinais. Antes de apresentar o exemplo, penso ser importante contextualizá-lo O irmão do menino iniciou um curso de Língua Japonesa com a intenção de ir para o Japão, onde já mora um tio dos meninos. O tio estava, na época da produção da escrita, de visita ao Brasil. O menino trouxe para a professora ver algumas fotos e uma revista de carros do Japão. Eles 142 conversaram sobre o assunto em Língua de Sinais, após o que a professora pediu que ele escrevesse sobre seu desejo de conhecer o Japão. Em seu texto, o aluno relata, com clareza, todas as etapas da viagem que imagina fazer ao Japão. Seu relato é bem organizado, mantendo a seqüência temporal dos fatos, incluindo introdução e fechamento ao texto. Revela conhecimento sobre o Japão, mostra que ele sabe que é distante e que leva muitas horas para chegar; diferença na comida, nas roupas, nas pessoas, nas lojas, nas casas e nos carros. Depois fala do tio e dos seus planos de vida. Faz uma apreciação sobre o Japão e retorna ao Brasil, e assim fecha a viagem. Chamam a atenção, nesta produção, as flexões verbais, bem empregadas, na maior parte das vezes. O conhecimento que o aluno tem sobre o Japão, o conhecimento sobre organização de textos, assim como sobre a Língua Portuguesa responderam pelo sucesso na produção do texto. 143 Anais do Congresso Conclusão: Neste trabalho, procurei mostrar que é possível mudar os baixos resultados que geralmente os alunos surdos apresentam no uso da Língua Portuguesa. Para isso faz-se necessário adotar uma concepção discursiva de língua, a qual privilegia o texto e não o vocábulo, o sentido e não a codificação e decodificação. Embora as concepções propostas para o ensino de alunos surdos sejam as mesmas adotadas com crianças ouvintes, a adoção de uma ou de outra parece estar relacionada à representação que os professores têm em relação às potencialidades dos seus alunos. A concepção de língua como código, na medida em que conduz o aluno no processo de aprendizado da língua, parece compatível com a representação dos alunos surdos como deficientes. A concepção de língua como atividade discursiva, por outro lado, concebe o aluno como interlocutor ativo na constituição do seu próprio conhecimento e a sua adoção vai exigir mudança na representação de incapacidade do surdo que ainda hoje está muito presente não só no discurso dos ouvintes como dos próprios surdos. Faz-se necessário, também, que o professor propicie conhecimento prévio para que os alunos surdos tenham condições de entender o que lêem e de produzir sentidos na escrita. Por virem de famílias ouvintes, as crianças surdas, na maioria das vezes, não participam das conversas em casa, o que resulta em empobrecimento em relação ao conhecimento. Privadas de uma língua e com pouca interação verbal com a família, as crianças surdas constituem seu conhecimento de mundo baseadas, principalmente, na visão, sendo este restringido pela falta de alguém que interprete o que elas vêem numa língua que lhe seja acessível. Considerando-se que a Língua de Sinais preenche as mesmas funções que as línguas orais desempenham para os ouvintes, é ela que vai propiciar aos surdos conhecimento de mundo e de língua, com base na qual possam constituir seu conhecimento de Língua Portuguesa. No entanto, é a leitura que vai possibilitar acesso à Língua Portuguesa, daí a importância de os alunos surdos lerem muito mais do que os ouvintes. 144 Bibliografia BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Decreto 5.626, 2005. CORACINI, M.J.R.F. Leitura, decodificação, processo discursivo...? In M.J.Coracini (org.) O jogo discursivo na aula de leitura: língua materna e língua estrangeira. 2ª edição. Campinas, S.P.: Pontes, 2002, p.13-20. FULGÊNCIO, L.; LIBERATO, Y. A leitura na escola. 2ª edição. São Paulo: Contexto. ______ Como facilitar a leitura. 7ª edição. São Paulo: Contexto, 2003. KLEIMAN, A. Oficina de leitura – teoria & prática. 6ª edição. Campinas, S.P.: Editora Pontes, 1998. ______ Texto e Leitor – Aspectos cognitivos da leitura. 9ª edição. Campinas, SP: Pontes, 2004. KOCH, I.V. O texto e a construção dos sentidos. 5ª edição. São Paulo: Editora Contexto, 2001. ______ Desvendando os segredos do texto. 2ª edição. São Paulo: Cortez Editora, 2003. LANE, H.; HOFFMEISTER, R.; BAHAN, B. Language and literacy. A journey into the Deaf-World. California: DawnSign Press, 1996, p. 266292. PEREIRA, M.C.C. Leitura, escrita e surdez. Secretaria da Educação, CENP/CAPE. São Paulo: FDE, 2005. SVARTHOLM, K. Como leerles a los sordos? In www.sitiodesordos.com.ar, 2003 TRENCHE, M.C.B. A criança surda e a linguagem no contexto escolar. Tese de doutorado. São Paulo: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 1995. 145 MESAS-REDONDAS NACIONAIS PANORAMA INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS NOS ÚLTIMOS 150 ANOS Leila Couto Mattos1 Para traçarmos um panorama internacional da educação de surdos nos últimos 150 anos é importante, primeiro, fazermos uma rápida retrospectiva. É no século XVII que vamos encontrar toda a fundamentação prática e teórica da Educação de surdos através de estudiosos como Juan Bonet, na Espanha (1620 - leitura; escrita, fala e alfabeto manual); George Dalgarmo, na Grã-Bretanha (1628/1687 – alfabeto manual, naturalmente, com bebes); Abbé Charles-Michel de l`Epée, na França (1712/1789 - língua de sinais metódica/natural) e Samuel Heinicke, na Alemanha (1729/1784 – língua oral/musicalidade e escrita). Já no século XVIII, tendo como base legal o legado intelectual deixado pelo século anterior, foram fundadas as primeiras escolas públicas na Europa e importantes questões em relação à educação de surdos começaram a ser discutidas, internacionalmente. Estas considerações encontramse presentes, ainda hoje, no meio acadêmico e na prática pedagógica, e referem-se á: Relação entre linguagem e pensamento Abordagem natural ou gramatical para o desenvolvimento da linguagem Educação segregada ou integrada Ensino precoce da leitura Eficácia do ensino da fala Educação precoce em casa Treinamento auditivo Processamento de informações através dos canais auditivo e visual Treinamento da sensação/percepção tátil Como pode ser visto, as questões metodológicas e os programas educacionais na área da surdez fazem parte de um contexto que vem sendo historicamente construído a mais de 200 anos, e desde então a comunicação é considerada como ponte para a aquisição do conhecimento formal. 1 146 Pedagoga. Fonoaudióloga. Mestre em Educação Especial. Doutora em Saúde Pública. Professora do Instituto Nacional de Educação de Surdos – INES/RJ. No século XIX, Thomas H. Gallaudet (1848) publicou A linguagem natural dos Sinais; seu valor e uso na instrução do Surdo Mudo no American Annals of the Deaf and Dumb, apresentando uma discussão sobre linguagem e instrução. Ainda neste mesmo século, em 1857, o atual Instituto Nacional de Educação de Surdos foi fundado. O instituto sempre buscou seguir as tendências mundiais da educação de surdos e em uma determinada época priorizou o método oral, mas, também, oferece o método escrito e o método auricular ou auditivo. O INES pode ser considerado como berço do desenvolvimento da língua brasileira de sinais – LIBRAS. Outro importante fato diretamente relacionado à educação de surdos ocorreu em 1880, o Congresso de Milão. Este congresso teve como principal objetivo a escolha do melhor método para a educação de surdos cujas idéias prevaleceram até aproximadamente o final do séc. XX. É importante lembrar que neste final de século havia uma sociedade confiante nos novos conhecimentos, a chegada da iluminação e o confronto, entre a realidade e a fantasia, que marcam o romantismo da época. Na passagem do século XIX para o século XX, duas importantes figuras se sobressaíram no campo da educação de surdos, Edward Miner Gallaudet (1837-1917) – presidente da primeira faculdade de surdos, hoje Gallaudet University e defensor do método combinado, oral e manual e Alexander Graham Bell (1847-1922) – inventor do telefone e do audiômetro e defensor do método oral puro. No século XX, em 1931 temos a publicação dos Métodos de instrução nas escolas americanas para surdos, publicado no American Annals of the Deaf que define os seguintes métodos para a educação do surdo: Método manual – sinais, alfabeto manual e escrita Método do alfabeto manual – alfabeto manual e escrita Método auricular – audição dos semimudos, fala e escrita Método sistema combinado – fala, leitura labial, método manual e o método do alfabeto manual. Método oral – fala, leitura labial e escrita Houve predominância do método oral até 1970 nos Estados Unidos da América e até 1980 no Brasil/INES. Em seguida a comunicação total foi ganhando forma e hoje, temos o bilingüismo de forma bastante abrangente em todo o mundo. Alguns documentos indutores internacionais e nacionais vêem conduzindo as políticas públicas no campo da educação de surdos, no Brasil. A Declaração Mundial sobre Educação para Todos que se realizou em 1990 em Jomtien/Tailândia; a Declaração de Salamanca, em 1994 em Salamanca/Espanha e a Lei Nº 10.098/1994 sobre a promoção da acessibilidade para as PPNE. 147 Anais do Congresso Desde então, a relação entre educação e surdez considera uma educação especial com escolas e professores especializados e diferentes métodos e modalidades de comunicação. As escolas especiais possibilitaram o encontro dos surdos, o desenvolvimento de uma forma própria de comunicação e a descoberta de especificidades. Daí se organiza e estrutura a Língua de Sinais e o Bilingüismo. Do outro lado, temos um novo sentido educacional, com uma escola onde todos os alunos sejam olhados individualmente, e tenham suas especificidades reconhecidas. Uma escola onde a diferença seja valorizada e não apagada, onde a flexibilidade curricular possibilite a permanência do aluno com real participação no processo de aquisição de conhecimento e, por conseguinte seu desenvolvimento. Para a construção de uma escola para todos é preciso considerar alguns importantes requisitos de acessibilidade: Propiciar, sempre que necessário, intérprete de LIBRAS, especialmente na realização e revisão de provas. Adotar flexibilidade na correção das provas escritas, valorizando o conteúdo semântico. Estimular o aprendizado da LP Proporcionar aos professores acesso a literatura e informações sobre a especificidade lingüística do portador de DA. Importante considerar a questão da surdez em relação à comunicação. A esse respeito, a declaração de Salamanca, nos diz: ... Face as necessidades específicas de comunicação de surdos e de surdos-cegos, seria mais conveniente que a educação lhes fosse ministrada em escolas especiais ou em classes ou unidades especiais nas escolas comuns (Declaração de Salamanca, p. 30). Portanto, a escola especial para surdos se caracteriza por valorizar os princípios e os valores da comunidade surda, ter a língua de sinais como língua de instrução, a língua escrita como segunda lingual e o bilingüismo como abordagem metodológica. Em um cenário internacional, diferentes países com diferentes níveis econômicos, sociais, de saúde e educacionais vivem diferentes contextos. Surdos sem diagnóstico e acesso à escola; escolas especiais para todos os alunos que possuem alguma NEE; escolas especiais para surdos e escolas para todos. No Brasil, pela sua vasta extensão territorial encontramos todas essas diferentes situações. Em relação aos alunos surdos, existem aqueles que passaram tanto pela escola especial como pela escola regular, fazendo o ensino fundamental e secundário na escola especial e o ensino superior na faculdade regular; alunos que fizeram toda a formação em escolas regulares ou escolas especiais; alunos que farão toda a sua formação em escolas para todos. 148 Hoje temos novas possibilidades educacionais para a educação de surdos. Uma visibilidade em relação à pessoa surda que foi alcançada através das políticas públicas educacionais internacionais e nacionais, no caminho da inclusão. O reconhecimento da LIBRAS através da Lei Nº 10.436/2002 e a Lei n.10.098/1994 sobre acessibilidade permitiram o início desta nova caminhada. Podemos então concluir sublinhando que, a educação de surdos, na atualidade, conta com duas possibilidades, a escola para todos e a escola especial. Bibliografia BRASIL. Conselho Nacional de Educação. Câmara de Educação Básica. Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação. Resolução CNE/CEB n.2 de 11 de setembro de 2001. Diário Oficial da União de 14 de setembro de 2001. BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Lei n.10436/02. Dispõe sobre a língua brasileira de sinais – LIBRAS. Brasília: MEC/Secretaria de Educação Especial, 2002. ROSENHALL. U. Features of deaf-blindness impairments. EspaçoInformativo técnico-científico do INES. Rio de Janeiro, n.25/26, p.4-11. Jan-Dez/2006. MANTOAN. M. T. E. Igualdade e diferenças na escola: como andar no fio da navalha. In: ARANTES, V. A. (org). Inclusão escolar – pontos e contrapontos. São Paulo: Summus, 2006. MAIA, R. F. C. et all. A educação de surdos no Brasil, a saúde e a assistência social: intercessões. In: V Congresso Internacional e XI Seminário Nacional [do] INES Surdez: família, linguagem e educação. Anais... Rio de Janeiro: INES, 2006. p. 294-304. 149 MESAS-REDONDAS NACIONAIS O ENSINO SUPERIOR BILÍNGÜE Maria Marta Costa Coccone1 O sociolingüista Woodward (1982 : 11-16)* nos diz de uma básica diferenciação entre dois tipos possíveis de bilingüismo : o individual e o grupal. No específico campo em que atuamos, o primeiro (bilingüismo individual) o autor relaciona ao fato de um único indivíduo dominar duas línguas : a língua de sinais dos surdos e a língua dos ouvintes, oral e/ou escrita. Já o segundo (bilingüismo grupal), o mesmo autor relaciona ao fato dessas duas línguas estarem sendo praticadas por vários membros de uma única grupalidade de surdos e/ou de ouvintes, ainda que alguns integrantes não sejam exímios usuários de ambas, ou de uma delas. Frente ao tempo de que disponho na presente ocasião e com base no que acabo de referir, sobre o Curso de Pedagogia do ISBE-INES acentuarei então seu caráter Bilíngüe de clara natureza grupal, também em virtude deste seu diferencial ser inegavelmente inédito em nosso país. Realmente, em idêntica proporção são anualmente admitidos e equitativamente distribuídos em dois turnos (Vespertino e Noturno) sessenta (60) candidatos surdos e não surdos que obrigatoriamente apresentem suficiente fluência em Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS - porquanto, devidamente já regulamentada, a LIBRAS constitui a própria Língua de Instrução do Curso, além de seus usos ainda aprofundarem-se em uma Atividade Formadora intitulada Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe. Já a Língua Portuguesa consta como Atividade Formadora obrigatória apenas em sua modalidade escrita, sendo que aulas e demais atividades do Curso estão a cargo de docentes com suficiente informação sobre características lingüísticas próprias do campo da surdez, docentes estes que apresentarão flexibilidade na correção de provas e/ou trabalhos redigidos pelo discente surdo, quando irão considerar o aspecto semântico e a singularidade lingüística manifesta no nível formal de sua escrita. Como não poderia deixar de ser, durante todo o transcorrer do Curso fica garantida pois a presença de capacitados intérpretes de LIBRAS/Língua Portuguesa, seja em atividades de sala de aula, seja em outras que se derem 1 Responsável * 150 pela Equipe do ISBE-INES. WOODWARD, J. How You Gonna Get Heaven If You Can’t Talk With Jesus. Silver Spring : TJ Publishers, 1982. extra-classe. Estão sempre disponibilizados inclusive mecanismos próprios para registros também de avaliações de conhecimentos expressos em nossa Língua Brasileira de Sinais. Por semelhantes razões, este constitui um Curso Superior cujos egressos surdos e não surdos poderão não apresentar exímias autonomias discursivas em ambas as línguas em pauta. A um só tempo, tal Curso atende ao desejo já nacionalmente manifesto de serem promovidas urgentes reformulações na formação e capacitação de pedagogos, que realmente possam contribuir para com o efetivo percurso também de alunos surdos igualmente em nossa rede brasileira pública de ensino, por alcançarem Licenciatura Plena nas seguintes vertentes : Educação Infantil; Anos Iniciais do Ensino Fundamental, contemplando inclusive a Educação de Jovens e Adultos (EJA); e Magistério das Disciplinas Pedagógicas do Ensino Médio. Mantidos tais termos, passemos então a seguir ao próprio MAPEAMENTO DO CURSO BILÍNGÜE DE PEDAGOGIA DO INES 1°SEMESTRE 2°SEMESTRE 3°SEMESTRE 4°SEMESTRE 5°SEMESTRE 6°SEMESTRE 7°SEMESTRE 8°SEMESTRE RECONSTRUINDO A TRAJETÓRIA EDUCATIVA CONSTRUINDO OLHARES SOBRE O COTIDIANO ESCOLAR PROBLEMÁTICAS COTIDIANAS DA PROFISSÃO DOCENTE APROFUNDANDO RELAÇÕES ENSINOAPRENDIZAGEM NO TRABALHO PEDAGÓGICO REDESENHANDO ENTENDIMENTOS EDUCATIVOS DELINEANDO PROPOSTAS METODOLÓGICAS RECONSTRUINDO A TRAJETÓRIA DA FORMAÇÃO REDISCUTINDO PROPOSTAS EDUCATIVAS E METODOLÓGICAS Escola, Cultura e Sociedade Genealogias em Posicionamentos Educacionais Docência e Implicações Socioculturais Construção do Conhecimento e Escolarização Saberes Educacionais, Diversidade e Cultura e Docência Ensino da Educação Física - tendências atuais 80hs Revisões Críticas Sobre a Autoformação Retomada da Experiência Educativa 80hs 80hs Tempos-Espaços e Sujeito Social em Currículos de História e Geografia 80 hs Retomada de Conhecimentos Construídos 80hs 80hs 80hs 80hs 80hs Ensino-Aprendizagem e Escolarização 80hs Cultura Escolar, Conhecimento e Linguagem 80hs Refletindo Sobre a Formação Docente 80hs Saberes Educacionais e Diversidade Cultural 80hs Concepções Sobre Criança 80hs Leituras e Escritas 54hs Corporeidade e Cultura 80hs A Escola como Espaço PolíticoPedagógico 80hs Construção Compartilhada do Conhecimento Escolar 80h ApropriaçõesLingüísticas 120h 80 hs Cognição, Corporeidade e Contexto 80hs Textos e Pretextos 80h Tempos, Espaços e Sujeito Social 80hs Temáticas Transversais 80hs Corporeidade, Cultura e Discurso 120hs Arte em Processo na Escola 80hs ESTÁGIO SUPERVISIONADO I 60hs Ciência e Territórios do Cidadão Contemporâneo 80hs Construções Cognitivas e Ensino da Matemática 80hs Leituras e Escritas e Diversidades Lingüísticas 80h Propostas Educativas- Revisões Conceptuais 80hs Educação e sua Gestão – metas e mitos 80 hs Consecução Supervisionada de Trabalho Monográfico II 80hs Consecução Supervisionada de Trabalho Monográfico I 80hs Práticas Pedagógicas 80hs ESTÁGIO SUPERVISIONADO III 130hs ESTÁGIO SUPERVISIONADO IV 130hs Topicalizando Discursos e Narrativas 80hs ConstruçõesCognitivas 80hs Práticas Discursivas e Especificidades Lingüísticas 80hs Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe 80hs Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe 80hs Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe 80hs Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe 80hs ESTÁGIO SUPERVISIONADO II 60hs Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe 80hs Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe 80hs Língua Portuguesa Escrita I 120hs Língua Portuguesa Escrita II 80hs Língua Portuguesa Escrita III 80hs Língua Portuguesa Escrita IV 80hs Língua Portuguesa Escrita V 80hs Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe 80hs Língua Portuguesa Escrita VI 80hs Língua Portuguesa Escrita VII 80hs NOTA: Eixos Norteadores em espaço incolor; Núcleo de Estudo Básicos em cinza médio, Núcleo de Aprofundamento e Diversificação de Estudos em cinza escuro; Núcleo de Estudos Integradores em cinza mais claro. Atividades Formadoras de cunho lingüístico em vermelho. 151 Anais do Congresso A seguir, vejamos quadros contendo detalhamentos por Atividades Formadoras que, em sucessivos Períodos Acadêmicos do Curso, priorizam seu já inicialmente comentado caráter de cunho Bilíngüe. 1º PERÍODO ACADÊMICO Leituras e Escritas Estudos relacionados com a LIBRAS e a Língua Portuguesa como meios de partilha da linguagem no contexto escolar e na vida cotidiana. São então trabalhadas abordagens sobre reaprender a ler compreensivamente, a escrever com autonomia, a expressar as próprias idéias. Topicalizando Discursos e Narrativas Conteúdos partem de uma visão do discurso como modo de ação no mundo. Abordam-se a aquisição da linguagem e usos de narrativas de textos literários produzidos em Português e/ou em LIBRAS também no contexto de sala de aula, agregando-se então a estas questões sobre literatura infantil. Práticas Discursivas e Especificidades Lingüísticas Especificidades lingüísticas de surdos falantes de LIBRAS. Abordam-se a escrita como território cultural e narrativas de textos literários e acadêmicos no espaço da escola. Introduzem-se visões retrospectiva e prospectiva do exercício da narrativa escolar e da reescrita de sua própria prática. 3º PERÍODO ACADÊMICO Corporeidade, Cultura e Discurso Relações entre linguagem e corporeidade vistas sob óticas históricas, discursivas e socioculturais. São reposicionadas matérias sobre o contemporâneo descentramento do sujeito e sobre mesclados matizes identitários discursivamente exercidos em complexas conjunturas socioculturais. 4º PERÍODO ACADÊMICO Apropriações Lingüísticas São detidamente trabalhados os seguintes tópicos : gênese do pensamento e da palavra; a palavra como território do significado e de sentidos; a questão do sentido em processos de apropriação da linguagem; a inter-relação pensamento/linguagem; discurso interior e fala egocêntrica x dialogismo; diferentes enfoques teóricos e conseqüências para a prática docente. 5º PERÍODO ACADÊMICO Textos e Pretextos Usos de textos escritos na escolarização de crianças menores. São igualmente abordados o texto como pretexto para a construção de sentidos e significados do/no mundo e da/na vida, além de relações entre literatura e jogos de “ficção na realidade” e de “realidade na ficção”. 6º PERÍODO ACADÊMICO Leituras, Escritas e Diversidades Lingüísticas Noções de língua materna (LM), primeira língua (L1) e segunda língua (L2). Questões sobre o discurso escrito em LM e em L2, sendo também discutindos usos de literaturas em línguas ágrafas e em LIBRAS. Tendo em vista atuações dos licenciandos que incluirão trabalhos ligados ao Português Escrito e à própria LIBRAS, contrapõem-se então especificidades sistêmicas próprias de cada qual. 152 2º, 3º, 4º, 5º, 6º, 7º e 8º PERÍODOS ACADÊMICOS Tópicos Avançados de Âmbito Bilíngüe Esta Atividade Formadora é desenvolvida em moldes de Estudos Dirigidos, Oficinas de Libras, Monitorias, Laboratórios e possíveis Extensões e participações em Pesquisas. 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 7º e 8º PERÍODOS ACADÊMICOS Língua Portuguesa Escrita I,II, III, IV, V, VI, VII Disciplina trabalhada de forma autônoma durante todo o Curso. São selecionados textos articulados a informações de mundo, que possam gerar demandas discursivas e gramaticais a serem ensinadas/aprendidas de modo amplo e conseqüente. Aborda-se a maior variedade textual possível, com ênfase na leitura. Tratado o Português Escrito como L2 de surdos falantes de LIBRAS, promovem-se assim conhecimentos reflexivos e críticos de construção e reconstrução expressional, que lhes permitam desenvolver também suas potencialidades. 153 MESAS-REDONDAS NACIONAIS O ENSINO SUPERIOR BILÍNGÜE Vilmar Silva* Para iniciar a minha fala gostaria de agradecer à direção do Instituto Nacional de Educação e Integração de Surdos e à Comissão Organizadora do Evento pelo honroso convite de participar desta mesa-redonda intitulada “O ensino superior bilíngüe”. Ao saber do título da palestra, o sentimento que tive foi de atração e de repulsão, pois, ao mesmo tempo que me fez reviver algumas conquistas no ensino superior para surdos em Santa Catarina, também vieram à tona os impasses, os conflitos, os enfrentamentos nas mesas de negociações das quais participei enquanto educador e representante dos movimentos de resistência surda. Relembro com freqüência que a negociação com as instituições de ensino superior – Universidade do Estado de Santa Catarina, Universidade Federal de Santa Catarina e Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina – eram extremamente tensas frente às representações colonialistas de alguns dirigentes dessas instituições quanto à inserção do ser surdo1 nas universidades brasileiras. Contudo, é importante salientar que esses espaços foram determinantes na definição da concepção de educação bilíngüe a ser adotada em cada uma dessas instituições de ensino. * Professor do Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina e pesquisador do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação de Surdos nesta instituição de ensino. 1 Segundo Perlin (2003, p. 100), o ser surdo se constitui na própria experiência de si, que não é outra coisa “senão o resultado de um complexo processo histórico de fabricação no qual se entrecruzam os diversos discursos que definem a verdade do sujeito, as práticas que regulam seu comportamento e as formas de subjetividade nas quais se constitui sua própria interioridade”. Nesse sentido, Perlin e Quadros (2006, p. 171) levantam três aspectos que consideram determinantes na formação do ser surdo: “(a) a experiência (estar fazendo) no ato de transformarse: faz-se experiência no contato com a diferença que está no outro surdo. É um ato de ir construindo a identidade, ato que permite novamente colocar a descoberto as identidades nunca prontas, fragmentadas, em contínua construção; (b) a experiência (exportada) no ato do surdo dar: de sua experiência do estar sendo surdo ao outro surdo, identidades em questão de dependência, que tem a necessidade do outro igual e (c) a experiência de resistência ou fragmentação: é a experiência que acontece nas trocas com os ouvintes”. 154 Nesta apresentação, portanto, procuro fazer uma reflexão introdutória sobre as representações em ser surdo no ensino superior. Para tanto, (re)visito pressupostos políticos dos estudos pós-coloniais na tentativa de encontrar brechas para um outro olhar que não se localiza apenas no campo das representações da cultura hegemônica, mas também em territórios simbólicos que se constituem a partir da cultura surda. A dimensão política, aqui proposta, não se restringe às ações oficiais voltadas à educação bilíngüe, mas às relações de poder no espaço acadêmico. É uma política especificamente cultural, que se refere às representações flutuantes e instáveis que provocam embates, muitas vezes conflitantes, sobre o ser surdo nas universidades brasileiras. As representações do ser surdo, em um universo essencialmente regulado pelo som, ouvir e falar, traduzidos na prática pedagógica pelo ler e escrever, tornaram-se tão essencializadas na academia, que qualquer outra forma de ensino não centrado na língua portuguesa provoca estranheza e sofre profundas restrições, se não impedimentos legais no processo de implantação de cursos superiores bilíngües. A idéia é colocar em dúvida se a produção e a socialização do conhecimento acadêmico em nosso país só é possível a partir da de currículo centrado no som. É na tensão provocada nos espaços de negociação que se constrói esta apresentação. A educação bilíngüe na pós-colonialidade A educação bilíngüe no Brasil pode ser compreendida a partir de uma insuficiência representacional sobre o ser surdo gerada pela política de homogeneidade e normalidade do mundo moderno, em que os sujeitos que estão à margem encontram dificuldades de colocar em circulação as suas próprias narrativas. Dito de outra forma, o ser surdo, na maioria das vezes, não tem tido o controle sobre a sua própria representação frente às forças desiguais e irregulares de representação cultural no contexto escolar. Contrapondo-se a essa lógica colonialista, podemos encontrar outros discursos sobre a educação bilíngüe, dentre eles, o da crítica pós-colonial que emerge das lutas das minorias sociais. Segundo Bhabha (1998, p. 239), a análise pós-colonial formula “suas revisões críticas em torno de questões de diferença cultural, autoridade social e discriminação política a fim de revelar os momentos antagônicos e ambivalentes no interior das ‘racionalizações’ da modernidade”. 155 Anais do Congresso O pós-colonialismo não se dá no campo das homogeneidades, normalidades e certezas históricas da modernidade, mas sim em suas contingências, que são “freqüentemente os fundamentos da necessidade histórica de elaborar estratégias legitimadoras de emancipação” (Bhabha, 1998, p. 240). A diferença cultural2 para os sujeitos que estão à margem não representa apenas uma estratégica de emancipação, mas de sobrevivência, tornando-se inevitável a construção de um outro olhar não agenciado3 à colonialidade. Porém, esta construção não exige apenas uma mudança de conteúdos acadêmicos, mas de “uma revisão radical da temporalidade social na qual histórias emergentes possam ser escritas; demanda também a rearticulação do “signo” no qual se possam inscrever identidades culturais” (Bhabha, 1998, p. 240). As contingências também históricas são marcas “do espaço conflituoso mais produtivo, no qual a arbitrariedade da significação cultural emerge no interior das fronteiras reguladas do discurso social”, onde a reconstrução terá o seu real significado “se for reconstruída por aqueles que sofreram o sentenciamento da história” (Bhabha, 1998, p. 240). Ao contrário da educação bilíngüe pautada nos pressupostos da modernidade, os estudos pós-coloniais se propõem construir o conhecimento acadêmico a partir das margens, representando os próprios discursos dos sujeitos que estão nas margens. O intelectual surdo pós-colonial não apenas narra as suas histórias de resistência, mas também se alinha aos movimentos A diferença cultural como uma forma de intervenção política “participa de uma lógica de subversão [...] nos confronta com uma disposição de saber ou com uma distribuição de práticas que existem lado a lado, [...] designando uma forma de contradição ou antagonismo social que tem que ser negociado em vez de ser negado [...] intervém para transformar o cenário de articulação – não simplesmente para expor a lógica da discriminação política. Ela altera a posição de enunciação e as relações de interpelação em seu interior; não somente aquilo que é falado, mas de onde é falado; não simplesmente a lógica de articulação, mas o topo da enunciação. O objetivo da diferença cultural é rearticular a soma do conhecimento a partir da perspectiva da posição de significação da minoria que resiste à totalização.” (BHABHA, 1998, pp. 227 e 228) 3 Segundo Ashcroft (2005, p. 8), o termo agência refere-se à “habilidade de atuar ou fazer a performance de uma ação. Na teoria contemporânea depende da seguinte questão: se os indivíduos podem começar uma ação de maneira livre e autônoma ou se as coisa que eles fazem são, de alguma forma, determinadas pelas maneiras nas quais suas identidades foram construídas. A agência é particularmente importante na teoria pós-colonial por se referir à habilidade que os sujeitos pós-coloniais têm em começar ações de engajamento ou de resistência ao poder imperial”. 2 156 de resistência como uma estratégia de levar o olhar hegemônico a uma crise. Uma das possibilidades de compreender a resistência surda está no próprio discurso colonial, que supõe representações e práticas de significação em que o ser surdo é visto como um sujeito incapaz, primitivo e incompleto. Esse discurso coloca um eu ouvinte, supostamente superior em relação a um outro não-ouvinte – o surdo –, supostamente inferior. Segundo Skliar (1999, p. 7), essas práticas colonialistas criaram um “conjunto de políticas para a surdez, políticas de representações dominantes da normalidade, que exercem pressões sobre a linguagem, as identidades e, fundamentalmente, sobre o corpo dos surdos”. No fundo o que o colonialismo fez e continua fazendo é expandir ainda mais sua dominação cultural, e isso não é uma mera coincidência: o colonialismo criou um objeto – o não-ouvinte – a ser manipulado para seu propósito clínico, cultural, social e econômico. Mas, será que realmente existe um discurso colonialista que ordena e regula tudo sobre o ser surdo? Para Homi Bhabha esse discurso colonial que a tudo ordena e regula simplesmente parece ter sucesso em sua dominação sobre o colonizado. O sucesso aparente do discurso colonial está marcado pela resistência dos colonizados. A autoridade colonial sabe que a suposta diferença – os surdos são inferiores aos ouvintes – é uma ficção que pode ser desconstruída pela resistência da população colonizada. Entretanto, essa resistência é simultaneamente reconhecida e negada pelo colonizador. De forma significativa, há uma tensão permanente entre a ilusão da diferença imposta pelo discurso colonial e a resistência dos povos colonizados. Para Bhabha, o poder colonial é ansioso, e nunca consegue totalmente o que quer. Isto é, não existe uma situação estável entre colonizadores e colonizados. Essa ansiedade abre uma brecha no discurso colonial, que pode ser explorada pelo colonizado. O agenciamento lingüístico dos movimentos de resistência surda No Brasil, o processo de colonização na educação bilíngüe passou a ser denunciado quando alguns educadores, militantes dos movimentos de resistência surda, no final do século passado, passaram a estruturar um movimento, no meio acadêmico, questionando as representações colonialistas e adotando como estratégia política o reconhecimento da língua brasileira de sinais como a língua acadêmica. O agenciamento lingüístico foi uma das estratégias adotada, por esse movimento, para deslocar a língua de sinais brasileira do campo da 157 Anais do Congresso clandestinidade para o político. Este agenciamento unificou a organização política dos movimentos de resistência surda, captando, registrando e refletindo os interesses das comunidades surdas brasileiras. Ao trazerem a língua de sinais brasileira para o debate acadêmico, os surdos, ao mesmo tempo que evidenciam a fragilidade de se pensar o ensino centrado apenas no ouvir e no falar, também procuram libertar-se das amarras da língua portuguesa em seu desenvolvimento intelectual. Para eles a língua de sinais não é um instrumento de comunicação para facilitar a aprendizagem da língua portuguesa, mas uma língua que também contribui no desenvolvimento das relações sociais, culturais e institucionais. É importante compreender que este movimento não converge com as políticas monolíngües construídas pelos estados nacionais, como o caso do Brasil, muito pelo contrário, ela se apóia nas políticas pós-coloniais em que as línguas de grupos minoritários estão no mesmo status da língua oficial do país tanto no campo lingüístico como no político, social e cultural. Segundo Quadros (2006, p. 26), imagina-se que no Brasil todas as pessoas adquirem a língua portuguesa como primeira língua, ignorando que: os falantes de famílias imigrantes (japoneses, alemães, italianos, espanhóis, etc.), que temos as várias comunidades indígenas que falam várias línguas nativas (mais de 170 línguas indígenas de famílias totalmente diferentes) e que temos, também, falantes, digo “sinalizantes” da língua de sinais brasileira (os surdos e familiares surdos brasileiros). Todas essas línguas faladas no Brasil, também são línguas brasileiras caracterizando o país que o Brasil realmente é, um país multilíngue. No caso dos surdos, o governo brasileiro, mesmo reconhecendo o estatuto da língua de sinais brasileira Lei 10.436/2002 , impõe a língua portuguesa na modalidade escrita como a língua acadêmica. Ao definir esta política, cuja premissa é de que o uso da língua de sinais leva ao não-uso da língua portuguesa, o governo gera uma política de exclusão dos surdos no meio acadêmico4. Ao contrário do Brasil, no Canadá, por exemplo, dependendo da região, a língua acadêmica é o inglês ou o francês. Os canadenses, por terem mais de uma língua oficial, ampliam as suas possibilidades de interação social e conseqüentemente a produção de sentidos. Para uma população de 5.735.099 surdos (censo IBGE/2000), tínhamos em 2006 apenas 2.428 surdos nas universidades brasileira, sendo que, destes, 353 estão em instituições públicas e 2.075 em instituições particulares, o que corresponde a 0,042% de surdos no ensino superior (MEC/INEP/2006). 4 158 O fato dos surdos poderem vir a ter uma língua acadêmica diferente da maioria do povo brasileiro não implica uma ameaça para a nação, muito pelo contrário, amplia os espaços de interação entre surdos e ouvintes. Os surdos parecem “estrangeiros em seu próprio país”, embora estejam em contato permanente com a língua portuguesa e, dependendo do contexto, a utilizem de diferentes formas. Nos estudos em língua de sinais brasileira no Centro Federal de Educação Tecnológica de Santa Catarina (CEFET/SC), quando algum educador ouvinte não compreende o que educador surdo falou em língua de sinais, ele escreve na língua portuguesa para facilitar a negociação de sentidos. Essa postura dos educadores surdos acontece a partir de uma necessidade e não por imposição de uma política lingüística. Porém, o exemplo anterior não representa a complexidade da situação bilíngüe dos surdos no Brasil. Não podemos esquecer que a língua de sinais e a língua portuguesa são de modalidades diferentes; a maioria dos surdos são filhos de pais ouvintes que não dominam a língua de sinais brasileira; os surdos aprendem tardiamente a língua de sinais brasileira; os surdos da zona rural, geralmente, não dominam a língua de sinais brasileira e são raros os surdos brasileiros que dominam a língua portuguesa com proficiência. Para Quadros (2206, p. 28): Se não fosse a diferença na modalidade, todos teriam tranqüilidade em reconhecer as pessoas surdas enquanto bilíngües. Elas nascem no Brasil e, portanto, falariam a língua portuguesa. Convivem com os surdos, portanto, usam a língua de sinais brasileira. No entanto, não é dessa forma que caracterizamos a situação bilíngüe dos surdos brasileiros, se é que podemos considerá-los genericamente com este status. Portanto, compreender a situação bilíngüe dos surdos no Brasil exige, no mínimo, outros referenciais teóricos que não se situam apenas no campo da aquisição de uma segunda língua. Os surdos freqüentemente afirmam que a língua portuguesa, por ser de um sistema de representação diferente das línguas de sinais, não tem como ser a sua segunda língua. Para eles, as outras línguas visual-espaciais, como por exemplo, língua americana de sinais, devem ser a sua segunda língua; além disso, propõem que os surdos devem aprender a língua portuguesa na modalidade escrita depois de aprenderem a escrita da língua de sinais brasileira. Capovilla (2002, 256) corrobora essa idéia ao explicar sobre a descontinuidade na aprendizagem de uma segunda língua por crianças surdas. 159 Anais do Congresso Na criança ouvinte e falante, há uma continuidade entre três contextos comunicativos básicos: a comunicação transitória consigo mesma (i.é., o pensar), a comunicação transitória com outrem na relação face a face (i.é., o falar), e a comunicação perene na relação remota e mediada (i.é., o escrever). Com isto todo o seu processamento lingüístico pode concentrar-se na palavra falada de uma mesma língua: para pensar, comunicar-se e escrever, ela pode fazer uso das mesmas palavras de sua própria língua falada primária. Para essa criança há uma compatibilidade entre sistemas de representação lingüística primária (i.é., a língua falada) e secundária (i.é, a língua escrita alfabética). [...] da criança surda, no entanto, espera-se muito mais. Ela pensa e se comunica em sua língua de sinais primária na modalidade visual e quiroarticulatória (i.é., quiro, do Grego, mão). Mas, frente à tarefa de escrever, espera-se que o faça por meio de palavras de uma língua falada estrangeira – a Língua Portuguesa (grifos do autor). Segundo Quadros (2006), há dois movimentos de resistência surda quanto o uso da língua portuguesa, enquanto uma outra língua, e não como a uma segunda língua. O primeiro é o movimento oposicional, que enfatiza a noção da diferença cultural, porém, de forma estática, ignorando o papel das interações sociais no desenvolvimento político, histórico e cultural dos próprios surdos. Seriam surdos só os surdos com “S” maiúsculo, os surdos militantes, isto é, os surdos que se opõem frontalmente aos ouvintes. Por se colocarem dessa forma, ao mesmo tempo que denunciam o apagamento da língua de sinais brasileira pela imposição do uso da língua portuguesa como língua acadêmica, também reduzem as possibilidades de interação entre surdos e ouvintes. O outro movimento, defino-o de pós-colonial; mesmo se apresentando de forma embrionária, é um movimento de resistência surda que se desloca das relações oposicionais surdos/ouvintes, língua de sinais/língua portuguesa e entra em espaços de negociação sem uma preocupação de vigiar as fronteiras. A língua, independente de sua modalidade, é vista como um instrumento de poder que pode desconstruir as próprias representações hegemônicas sobre o ser surdo. Porém, os dois movimentos convergem em um ponto: a língua de sinais deve ser a língua acadêmica dos surdos, por uma questão muito simples: a língua de sinais é a língua que lhes permite ser o que sempre foram: surdos. Bibliografia BAKHTIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. 4. ed. São Paulo: Hucitec, 1992. 160 _____. Estética da Criação Verbal. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003. BHABHA, H. K. Local da Cultura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1998. CAPOVILLA, F. C. e outros. O desafio do bilingüismo na educação de surdos: Descontinuidade entre a língua de sinais e a escrita alfabética e estratégias para resolvê-la. IN: CAPOVILLA, F.C. (Org). Neuropsicologia e aprendizagem: uma abordagem multidisciplinar. 2. ed. São Paulo, 2004. HUDDART, D. Homi K. Bhabha. London/New Iork: Routledge, 2006. LARROSA, J. Tecnologias do Eu e Educação. In: SILVA, T. (Org). O Sujeito da Educação: estudos foucaultianos. Petrópolis: Vozes, 1994. MACHADO, I. J. R. Reflexões sobre o pós-colonialismo. São Carlos: UFSCar (texto do Mini-curso “Pós-colonialismo” da Semana de Ciências Sociais). PERLIN, G. T. T. O Ser e o Estar Sendo Surdo: alteridade, diferença e identidade. Porto Alegre: UFRGS/CED, 2003 (Tese). QUADROS, R.M. & SCHMIEDT. Idéias para ensinar português para alunos surdos. Brasília: MEC/SEESP, 2006. _____. O “Bi” em bilingüismo na educação de surdos. In: FERNANDEZ, Eulália. Surdez e bilingüismo. Porto Alegre: Mediação, 2005. SKLIAR, C. (Org). Atualidade da educação bilíngüe para surdos. Porto Alegre: Mediação, vol.I-II, 1999. STUART, H. Quando foi o pós-colonial: pensando no limite. In:. SOVIK, L. (Org). Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturais. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2003. SOUZA, L. M. T. M. Hibridismo e tradução cultural e Bhabha. In: JUNIOR, B. A. (Org.). Margens da cultura: mestiçagem, hibridismo & outras misturas. São Paulo: Boitempo, 2004. _____. Language, Culture, Multimodality and Dialogic Emergence. São Paulo: USP, S/D (texto). 161 MESAS-REDONDAS NACIONAIS AQUISIÇÃO DE LÍNGUA DE SINAIS POR SURDOS ADULTOS: CONDIÇÃO PARA ESCOLARIDADE Vera Regina Loureiro1 Este trabalho pretende discutir o processo de ensino-aprendizagem de jovens e adultos surdos que, por não terem tido a oportunidade de constituírem-se como sujeitos discursivos em uma língua (seja ela sinalizada, oral ou escrita), encontram-se excluídos do processo educacional. Essa é uma realidade que, apesar de alarmante, ainda não encontrou espaço nos trabalhos acadêmicos. A falta de abordagem sobre o tema por estudiosos da linguagem e da surdez poderia indicar, equivocadamente, a inexistência de tal situação, ou seja, a de surdos adultos não conhecedores/ usuários de sua própria língua e de nenhuma outra. No entanto, para nós, profissionais da educação de surdos, para os familiares desses indivíduos, e também para a comunidade surda, o contato e a convivência com grande número de surdos adultos nessa condição confirma a dimensão do problema. Se considerarmos que, no Brasil, ainda há um contingente de analfabetos de cerca de 13%, que o analfabetismo funcional é uma realidade que atinge mais da metade da população e que apenas 15% dos deficientes recebem algum tipo de atendimento educacional, poderemos pensar que, possivelmente, há uma imensa população de surdos à margem de qualquer interação lingüística. Esse fato é passível de verificação e comprovação por meio da chegada tardia de pessoas surdas adultas às escolas de surdos (como o INES, por exemplo), às associações de surdos, ou até mesmo às igrejas que possuem cultos e trabalhos voltados para a comunidade surda, em uma busca 1 INES-Brasil 162 desesperada (na maior parte das vezes, de seus familiares) por algum tipo de escolarização. O acesso à escolaridade seria, então, a possibilidade de redenção desses sujeitos, que poderíamos chamar de sem-língua ou de pessoas com “habilidades mínimas de linguagem”, conceito utilizado por Cokely (19901993) em seus estudos sobre os meios de comunicação, sobre o ensino e as políticas educacionais para surdos nos Estados Unidos da América, para definir os surdos que não apresentam competência em língua alguma – de sinais, oral, ou escrita. A realização deste trabalho é fruto de questionamentos e reflexões que venho elaborando durante os muitos anos de prática profissional na educação de surdos. Minha experiência com dois grupos de surdos tão distintos quanto crianças da pré-escola e adultos do curso noturno acabou por apontar-me uma semelhança crucial nas dificuldades vivenciadas por ambos no processo de ensino-aprendizagem, ou seja, a falta de uma língua natural de mediação das interações em sala de aula. Buscando enfrentar essa realidade, tive a oportunidade, por dois anos, de desenvolver (em parceria com uma professora surda) um trabalho com jovens e adultos surdos, das primeiras séries do Ensino Fundamental do curso noturno do INES, que apresentavam “habilidades mínimas de linguagem”. A proposta tinha como principal objetivo oferecer oportunidades reais de interação desses alunos com uma falante nativa da língua de sinais, para possibilitar a aquisição dessa língua, o desenvolvimento da competência comunicativa nessa mesma língua e ampliar o conhecimento de mundo desses aprendizes. A aula de língua de sinais, conduzida em língua de sinais por uma professora surda falante nativa, apresenta, como aspecto marcante, o fato de que a língua de sinais é, ao mesmo tempo, tanto o foco da aula (aprender língua de sinais) quanto o instrumento de mediação ou língua de instrução (a própria língua de sinais). Em outras palavras, pode-se dizer que tanto o objetivo quanto a maneira de se chegar a ele é o mesmo: a língua de sinais. As discussões aqui realizadas são orientadas por uma concepção sóciohistórica e dialógica de linguagem, do discurso como prática social situada e lugar de constituição de relações sociais e identitárias, no qual os falantes se tornam sujeitos. Entendemos, portanto, que, ao usarmos a linguagem, ao falarmos uma língua, ou seja, ao produzirmos um discurso em uma 163 Anais do Congresso determinada comunidade de fala, constituímo-nos enquanto sujeitos sociais ao mesmo tempo em que construímos os significados e o mundo à nossa volta. É a linguagem, também, nessa concepção, o principal instrumento de mediação dos processos mentais, isto é, instrumento de organização do pensamento. Adquirir a língua de sinais para tornar-se interlocutor e passar a produzir enunciados próprios é, portanto, condição necessária para a conquista de novas aprendizagens, para entrar, verdadeiramente, no processo de escolarização. Como transformar um problema do cotidiano em uma equação matemática? Como estudar geografia sem poder nomear os estados, países ou continentes? Como entender a própria história e a história de seu país para poder exercer sua cidadania? Como aprender a leitura e a escrita de uma segunda língua, quando ainda não há condições mínimas de interação em uma língua natural e acessível? As reflexões aqui desenvolvidas apontam para a urgente necessidade de mudanças no que a escola tem proposto para esses aprendizes. O reconhecimento oficial da língua de sinais como língua da comunidade surda brasileira poderia servir de impulso a uma proposta de educação bilíngüe para surdos no país. No entanto, o que se tem visto é a discussão de formas de inserção desses sujeitos nas classes do ensino regular, com intérpretes ou professores-intérpretes, e a negação de seus direitos lingüísticos mínimos, sob a bandeira da inclusão social – a inclusão excludente, que continua a produzir surdos apáticos, emocionalmente imaturos e debilitados cognitivamente. É preciso, mais uma vez, trazer para o debate nacional a necessidade de uma política lingüística que, ao assumir a educação bilíngüe para surdos como meta, respeite a comunidade surda como minoria lingüística e cultural, reconheça seus direitos lingüísticos e combata as práticas ouvintistas e as políticas hegemônicas que ainda persistem na educação de surdos e que parecem querer ocultar a diferença a partir de uma suposta luta pela igualdade. 164 Bibliografia COKELY, Dennis. The effectiveness of three means of communication in the college classroom. In: Sign language Studies 69. Linstok Press, Inc., Winter, 1990. LOUREIRO, Vera Regina. Aquisição tardia de língua de sinais por surdos adultos: construindo possibilidades de significação e inserção no mundo social. 2004. Dissertação (Mestrado em Lingüística Aplicada) – Faculdade de Letras da UFRJ, Rio de Janeiro, 2004. SKLIAR, Carlos (Org.). A surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Mediação, 1998. SKUTNABB-KANGAS, Tove. Linguistic Human Rights: a prerequisite for Bilingualism. In: AHLGREN, Inger; HYLTENSTAM, Kenneth (eds.). Bilingualism in Deaf Education. Hamburg: Signum-Verl, 1994. SOUZA, Regina Maria de. Que palavra que te falta: lingüística e educação: considerações epistemológicas a partir da surdez. São Paulo: Martins Fontes, 1998. VYGOTSKY, Lev Semenovich. Fundamentos de Defectología. Obras completas. Tomo cinco. Habana: Editorial Pueblo y Educación, 1989. 165 MESAS-REDONDAS NACIONAIS A ESCOLARIZAÇÃO DE SURDOS Gladys S. Carvalho* No cenário da educação brasileira, o Instituto Nacional de Educação de Surdos, há 150 anos, ontem comemorados, tem em sua gama de funções a escolarização de surdos, em qualquer fase de suas vidas. Hoje, o cenário educacional mundial aponta para que as escolas sejam inclusivas, como um direito inalienável à educação, partindo do pressuposto de que todos somos iguais. Nós, no INES, buscamos essa inclusão através do respeito à diversidade lingüística do surdo. Temos a obrigação histórica de garantir que nosso alunado – infantil, juvenil ou adulto – seja respeitado no seu bem mais precioso, sua comunicação e constituição enquanto humano, o direito à sua língua, e o de estar com seus pares, constituindo não uma minoria, mas sim uma maioria lingüística, mesmo que apenas em seu horário de aula. O INES é, portanto, uma Escola Especial para surdos e para outras pessoas com necessidades especiais, cuja principal característica seja a surdez, independentemente de seu grau. Hoje, estou aqui para apresentá-los a uma parte da escola do INES, o Ensino Noturno, que possui características bastante peculiares. Vou tentar apresentá-lo de maneira simples e buscando a melhor forma para os surdos, usando as imagens que tão bem representam esse turno em nossa escola. 1. Ingresso e escolarização - A situação social das pessoas surdas, no Brasil, e entre elas os nascidos em nosso Estado ou Município, faz com que procurem a escola tardiamente, quer por seus familiares, devido à demora na confirmação do diagnóstico da surdez, ou quando já estão em idade de tomar suas próprias decisões, sem a interferência ou responsabilidade familiar, seja por necessidade individual ou coletiva por participar de grupo ou associação de surdos. - No Colégio de Aplicação do INES, que atende do Ensino Fundamental ao Médio, é adotado o ensino em seriação, não havendo proposta de * Professora do INES. 166 Educação de Jovens e Adultos, nem qualquer outra modalidade de ensino que tenha o objetivo de abreviar ou atender em caráter de suplência. Sendo assim, nossa escola é freqüentada, no diurno, por alunos das mais variadas idades, a partir da 5.ª série, hoje equivalente ao 6.º ano. Devido a essa realidade, temos em nossa instituição um setor que trata da qualificação e encaminhamento ao mercado de trabalho, e a freqüência desses alunos, na escola, é adequada às suas necessidades específicas. Preferencialmente o aluno maior de 16 anos estudará no noturno, priorizando a vaga no diurno para os mais jovens, em idade adequada à série pleiteada. 1.1 – O primeiro segmento do Ensino Fundamental (1.º ao 5.º ano), no noturno: - o aluno ingressará em qualquer fase da vida, após 16 anos de idade e ter-se candidatado à vaga no Colégio de Aplicação do INES, no período aberto para cadastro de ingresso ou por transferência de outro estabelecimento. Passa por uma avaliação e verificação se o nível de escolaridade pleiteado é compatível com seus resultados e documentação. No caso de incompatibilidade de horário, o caso será estudado, visando não prejudicar o aluno. É nesse início da escolaridade que estamos caminhando para que a LIBRAS seja priorizada, por entendermos ser esta a sua língua natural e cumprindo a Lei de reconhecimento desta pela nação brasileira. Na maioria das vezes, o aluno chega ao INES sem um sistema real de comunicação; por isso, há uma preocupação que vem sendo gradualmente desenvolvida, dando ênfase à fluência em LIBRAS como possibilidade de aprovação ao 2.º segmento dessa fase de ensino, além dos conhecimentos básicos das áreas comuns às escolas nesse segmento de ensino. Há esse intuito, e estamos caminhando nesse sentido, mas ainda não é uma realidade. 1.2 – No segundo segmento do Ensino Fundamental (6.º ao 9.º ano) e Ensino Médio (1ª à 3ª série), no noturno: - o aluno ingressará em qualquer fase da vida, após 16 anos de idade e terse candidatado à vaga no Colégio de Aplicação do INES, no período aberto para cadastro de ingresso ou por transferência de outro estabelecimento, apresentando documentação comprobatória. 167 Anais do Congresso 2. A realidade do educando que inicia o primeiro segmento do Ensino Fundamental do INES: 2.1 – Da realidade social - Em sua maioria, esses educandos são oriundos de situações de total exclusão social e afetiva. - Alguns passaram por uma série de tentativas frustradas de escolarização e atendimentos clínicos. - Geralmente somos procurados por jovens na faixa dos vinte anos, acompanhados ou não por alguma representação familiar. - Quase todos não são proficientes em qualquer língua, seja o Português (oral ou escrito) ou LIBRAS. São raríssimos os que chegam com LIBRAS e que estejam incluídos em comunidade surda. - As tentativas de comunicação, em sua maioria, se traduzem em gestos naturais, que quase não são entendidos, o que traz grande frustração, angústia e sofrimento a esse indivíduo e para o professor que o recebe. A característica mais marcante da escolarização no INES é que o aluno, após 16 anos de idade, poderá freqüentar qualquer dos três turnos a ele disponível, desde que: - esteja matriculado a partir do 6.º ano do segundo segmento do Ensino Fundamental; - haja vaga na turma e turno pretendidos; - avalie-se a troca de turno como real e necessária. Nesse sentido, o aluno poderá trocar de turno de acordo com sua necessidade e existência de vaga, contribuindo assim para sua permanência na escola e a conclusão de seus estudos, possibilitando ainda o encaminhamento profissional. Consideramos essas duas características como um “divisor de águas” na inclusão social e acesso à escola para a minoria lingüística surda, em nosso país. Outra forte característica do turno da noite do INES é que os alunos chegam sem uma língua! E sem língua não há comunicação, compreensão e aprendizagem acadêmica. Não há livre expressão e escolhas. Não há uma real identidade humana. Não há aceitação e inclusão social. As barreiras a serem transpostas são imensas, o que acaba originando outra característica grave desse turno no 1.º e 2.º ano do Ensino Fundamental: a desistência escolar. 168 Lutamos contra muitos anos de solidão e total abandono social e emocional destes alunos! Somos uma escola e, por mais que nos esforcemos, não temos a qualificação necessária que de imediato supra tantos anos de esforços sem resultados, como vieram sofrendo essas pessoas que se encontram em tal situação. Bom, mas nada melhor do que nos apresentarmos através de nossas imagens. Apresento-lhes o turno da noite do INES, com seus alunos, professores, técnicos, enfim ... NÓS ... 169 MESAS-REDONDAS NACIONAIS ESTRATÉGIAS PEDAGÓGICAS NA EDUCAÇÃO PRECOCE DO INES Ana Lucia do Nascimento* Para falar do atendimento pedagógico da criança surda, no período de 0 a 3 anos de idade, no Instituto de Educação de Surdos é necessário se fazer referência ao seu processo histórico uma vez que este período está ligado, atualmente, à primeira fase do ensino básico. Entretanto, há alguns anos atrás as crianças desta fase recebiam atendimento com uma visão voltada para a área da saúde e tanto o termo “estimulação” quanto “intervenção” refletia esta idéia. Neste contexto histórico podemos citar duas professoras que marcaram esta trajetória não perdendo de vista que o trabalho em equipe sempre foi uma marca, dentro deste atendimento, no INES. A professora Ana Rimoli de Faria Dória foi incansável em seu trabalho visando o melhor atendimento ao surdo. Foi diretora do INES, no período de 1951 a 1961. Escreveu vários livros e artigos que falavam da importância tanto do trabalho com a pessoa surda quanto da participação de seus familiares neste processo de aprendizagem. Alguns de seus pensamentos são atuais e apresentam propostas que ainda embasam este atendimento, principalmente, na Educação Infantil. Em um de seus últimos trabalhos, Ana Rimoli escreveu para pais e mestres norteando seus pensamentos numa visão mais ampla de vida. A capacidade de aprender que o homem traz ao nascer possibilita uma educação e um crescimento indefinido que, muito mais sensível na infância, onde tem seu máximo de intensidade, perdura por todo o período de vida da pessoa. A capacidade de aprender, que nada mais é do que o poder de reter uma experiência é, também, algo que poderá transformar as futuras experiências. Aprender é uma função permanente do organismo e é por meio dessa atividade que o homem cresce. (...) A criança de hoje será, fatal e irreversivelmente, o homem de amanhã e por * Professora da Educação Precoce, no INES. Especialização: Psicopedagogia e Estimulação Essencial e Desenvolvimento Infantil. Capacitação: Avaliação Neonatal, método Dubowitk e Clínica dos Primórdios - ABENEP/RJ. 170 isso se constitui no fulcro das atenções de todos aqueles que, de uma forma ou de outra, acompanham seu desabrochar pleno e ininterrupto, no lar, na escola, na comunidade em geral. (...) Uma criança não poderá ser formada, educativamente, apenas freqüentando a escola; o fundamento de todo o sucesso em sua vida futura é a vivência do lar; é aqui que começa seu verdadeiro e definitivo preparo. Em 1972 a professora Ivete Vascolcellos veio trabalhar no INES. Como já tinha um trabalho anterior, na Estimulação Precoce e observando que muitas crianças esperavam completar a idade para ingressar na PréEscola percebeu a necessidade de implantar um trabalho com estas famílias, enquanto aguardavam uma vaga. Formou uma equipe e iniciou este atendimento em 1975. Três anos após sua implantação, este serviço foi agregado à Pré-Escola que já existia na instituição. Seu pensamento, também, era o de apoiar e orientar as famílias de crianças surdas bem como oferecer-lhes um atendimento onde todo o seu potencial pudesse ser desenvolvido. “... quanto mais cedo se diagnosticar e tratar uma deficiência, tanto melhor será o prognóstico educacional da criança. Realizado o diagnóstico, é importante que a criança participe de um programa de estimulação precoce elaborado para ser realizado no lar, pela família”. “Estimular uma criança é trabalhar com ela, é torná-la mais ativa, mais esperta, mais participante”. Hoje, este atendimento é denominado de Educação Precoce. É a primeira fase da Educação Infantil e segue as orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais, organizadas pelo Ministério da Educação. O INES como uma escola especializada na área da surdez tem em seu projeto pedagógico a filosofia sócio-interacionista, com a proposta de comunicação baseada nas propostas do bilingüismo. Na Educação Precoce o ambiente deve ser preparado num clima lúdico onde as estratégias de intervenção possam promover experiências significativas através da brincadeira, pois, sabemos que a criança traz para a escola um saber construído em suas experiências anteriores mas, que são exploradas numa linguagem própria do mundo infantil. Portanto, todas as atividades planejadas para esta fase não podem perder de vista as etapas da evolução infantil e o histórico de vida de cada criança, levando em consideração sua perda auditiva e os anseios da família. Referindo-se ao processo de intervenção o MEC (1995, p.20) diz que 171 Anais do Congresso o atendimento tem por finalidade proporcionar à criança condições para alcançar seu pleno desenvolvimento, mediante experiências significativas resultantes de seu contato com as pessoas, objetos e espaços. Ao lado desse objetivo incluem-se aqueles relacionados com as mudanças de atitudes das pessoas de seu convívio, particularmente aquelas que assumem a função de mediadoras (facilitadoras) nesse processo, ou seja: os pais, familiares, educadores, atendentes e outros. Para nós, brincar é indício de saúde física e psíquica. A professora treinando seu olhar para a criança poderá ajudá-la no desenvolvimento de suas potencialidades. A postura do adulto como mediador, deve ser de amor e compreensão, assim a criança, gradativamente, adquire autonomia necessária para confrontar-se com as várias situações de aprendizagem. Currículo O currículo da Educação Precoce, no INES abrange as áreas de conhecimento propostas pelo MEC enfatizando as diferentes formas de comunicação que são próprias para esta faixa etária. I - Noções Lógicas e Topológicas A criança observa e explora diferentes objetos adquirindo a capacidade de classificá-los de acordo com seus atributos; cria soluções novas para os diferentes problemas que surgem em cada atividade e vai adquirindo, aos pouco, noção de tempo e espaço. Com o responsável pela criança participando dos atendimentos, podemos pontuar suas conquistas. Desta forma a família passa a compreender que o surdo possui potenciais a serem desenvolvidos, da mesma maneira que todas as crianças: brincando. II – Ciências Em várias atividades a criança é levada a conhecer seu corpo e suas possibilidades, utilizando-o como instrumento para explorar diferentes situações. Algumas crianças chegam à Educação Precoce com idade de andar, por exemplo, mas não o fazem porque não tiveram oportunidade para este jogo de exercício. Nestes casos a professora planeja estratégias que ofereçam esta 172 experiência, além de orientar a família para deixar a criança explorar os espaços, sempre na presença de um adulto, com o cuidado para não lhe transmitir insegurança e que as quedas fazem parte do aprendizado. III - Estudos Sociais As atividades envolvendo esta área promovem estratégias significativas para que a criança estabeleça e amplie suas relações sociais formando vínculos afetivos tanto com crianças quanto com adultos. Nesta interação ela terá oportunidade de fazer relação entre eu/outro, passando a conhecer os seus limites e o do próximo. Em conversa com a família a professora aponta que desde o nascimento toda criança é imersa em um meio cultural onde regras pré-estabelecidas dentro do grupo já refletem situações de limites. Portanto, é necessário que a criança comece a compreendê-los para, gradativamente, buscar seu equilíbrio psíquico. IV – Linguagem A linguagem está presente em todas as atividades. De início o choro é um dos elementos de comunicação junto com o olhar e o toque, promovendo uma troca entre a criança e o meio. Aos pouco esta comunicação ganha novos elementos, estabelecidos pelos padrões que são apresentados na relação adulto/criança. Surge o sorriso social; as diferenciações de choro, expressando dor, sono, fome, variações de temperatura ou mesmo solicitação da presença do outro. Os gestos naturais e os rituais significativos (antecipando situação – banho; alimentação; hora de dormir; de ir passear; etc.). Mais adiante surge a possibilidade de adquirir uma língua. Para Fernandes (2005, p.18) através da aquisição de um sistema simbólico, como é o da língua, o ser humano descobre novas formas de pensamento, transformando sua concepção de mundo. A família (na maioria das vezes, ouvinte) busca ansiosamente pelo momento em que sua criança dirá as primeiras palavras. Na “falta” deste elemento que as aproximem, se desestruturam. Em muitos casos, desfragmentando-se por não compreender as questões da surdez. Na maioria das vezes, nos deparamos com situações em que os 173 Anais do Congresso primeiros atendimentos são, basicamente, voltados para apoiar e orientar a família diante do laudo da surdez. Nossa orientação está sempre voltada para o envolvimento da família nas questões da aprendizagem, olhando a criança globalmente e não apenas como uma criança surda. Entretanto, não deixamos de orientá-la no sentido de conversar com os profissionais da área de Fonoaudiologia, que atendem sua criança para que compreenda as especificidades dela, não a comparando com nenhuma outra, porque é única, com sua história de vida. Na Educação Precoce do INES, as crianças são expostas à Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS e seus familiares são orientados quanto à importância da aquisição desta língua o mais cedo possível para que o desenvolvimento de sua criança ocorra plenamente. Seguindo o pensamento de Fernandes (2005, p.19), propiciar à pessoa surda a exposição a uma língua o mais cedo possível, obedecendo às fases naturais de sua aquisição é fundamental ao seu desenvolvimento. A Língua Portuguesa é sistematizada através de contextos lúdicos e significativos, respeitando-se as especificidades de cada criança. Família e Escola Atualmente é inconcebível o processo de aprendizagem ficar apenas a cargo da escola. Sabemos que a participação da família é fundamental. Um dos pontos determinantes para o atendimento pedagógico, na Educação Precoce é apoiar e orientar a família tendo a compreensão de que ela prosseguirá com o trabalho, fora da escola, complementando-o. Com isto mantemos em nossos atendimentos a proposta inicial da Educação Precoce, no INES. Ao longo do processo podemos constatar mudanças significativas dentro do próprio grupo familiar e muitos ganhos da criança são atribuídos a esta mudança de postura. Avaliação A avaliação é feita ao longo do período em que a criança se encontra na Educação Precoce, através de observações da professora, tanto em relação à criança quanto à própria família. 174 Próximo aos três ou quatro anos de idade, de acordo com o desenvolvimento e levando em consideração o tempo em que se encontra na Educação Precoce, a professora aponta para a família, os progressos feitos pela criança ao longo do tempo e a necessidade dela prosseguir em seu processo escolar, em outra etapa de sua vida, na Pré-Escola. Neste momento é importante haver um diálogo entre escola e família onde as propostas do Colégio de Aplicação – CAP/INES são avaliadas e ponderadas. A família é ouvida, orientada e apoiada em suas decisões. Para que a criança ingresse na Pré-Escola é necessário que ela tenha atingido alguns requisitos básicos, levando em consideração à continuidade do processo pedagógico iniciado na Educação Precoce, e, que tenha a idade próxima a 3 anos. 1. Apresentar um desenvolvimento motor, dentro das possibilidades individuais, aproximando-se do esperado para sua faixa etária; 2. Apresentar um grau de atenção; compreensão e memorização, aproximando-se do esperado para sua faixa etária; 3. Possuir atenção necessária para perceber a presença e a ausência do som, possibilitando principalmente a conclusão de um laudo audiométrico; 4. Possuir alguns hábitos de independência, tais como: a) separar-se da mãe ou quem a acompanha, sem dificuldade, iniciando o processo de interação no grupo escolar (adultos e crianças); b) ter iniciado o controle dos esfíncteres, não usando fraldas durante o dia; c) comer sozinho, mastigando alimentos sólidos. 5. Comunicar-se com outras crianças e adultos, demonstrando compreender situações cotidianas. Quanto mais a criança se aproxima dos quatro anos, mais complexas ficam as dramatizações. Pouco a pouco ensaia um simbolismo coletivo, tentando manter uma cena em conjunto com outras crianças. Isso vai exigir dela muito esforço de descentralização, de aceitar o que a outra criança quer, para poder continuar a brincar. Começa assim a viver o drama de ter que ceder para poder conviver. Em geral, crianças mais velhas introduzem de forma lúdica e natural esse ingresso no social, organizando e liderando brincadeiras em conjunto. O convívio com outras crianças, de diversas idades é fundamental para o desenvolvimento cognitivo e afetivo-emocional (OLIVEIRA, p.32-33). 175 Anais do Congresso A partir de um olhar reflexivo a professora busca a criança em seus aspectos cognitivos, emocionais e sociais, não deixando de levar em conta suas especificidades na área da comunicação. A criança surda é antes de tudo uma criança que precisa brincar, pegar, olhar, tocar e ser tocada. Observar e tirar conclusões utilizando todo seu potencial criativo. Bibliografia BRASIL. Diretrizes educacionais sobre estimulação precoce. Série n. 3. Brasília; SEESP, 1995. DORIA, Ana Rímili de Faria. Educando para a imortalidade: orientação para pais e mestres. 2 ed. PR: Ordem Rosacruz – AMORC, 1989. FERNANDES, Eulália (Org.); QUADROS, Ronice M.de...et al. Surdez e bilingüismo. Porto Alegre: Mediação, 2005. FILHO, Laurista C.; CORREA, Maria Elena G.; FRANÇA, Paulo S. (Org.). Novos olhares sobre a gestação e a criança até 3 anos: saúde perinatal, educação e desenvolvimento do bebê. Brasília: L.G.E. Ed, 2002. GOMES, Angélica M. A criança em desenvolvimento: cérebro, cognição e comportamento. Rio de Janeiro: Revinter Ltda, 2005. INSTITUTO NACIONAL DE EDUCAÇÃO DE SURDOS. Coletânea de documentos da educação precoce. Acervo do SEDIN. Rio de Janeiro: 1975 a 2007. OLIVEIRA, Vera B. de; BOSSA, Nádia A. (Orgs.); BARRONE, Leda Maria C. et al. Avaliação psicopedagógica da criança de zero a seis anos. 7. ed. Petrópolis/RJ: Ed. Vozes, 1998. PIAGET, Jean. Seis estudos de psicologia. Tradução por Maria Alice M d’Amorim e Paulo Sérgio L. Silva. 22. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997. SOULÉ, Michel; CYRULNIK, Boris (Orgs.); ALAMEDA, Antoine et al. A inteligência anterior à palavra: novos enfoques sobre o bebê. Tradução por Cláudia Schilling. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999. 176 MESAS-REDONDAS NACIONAIS A FAMÍLIA EM DISCUSSÃO Rosária de Fátima Corrêa Maia* Adriana Lima Guedes** Cila Ferreira Portugal Ramos*** A CONCEPÇÃO DE FAMÍLIA A nova forma de organização social tira da família a esfera da produção e transfere seus antigos papéis para o espaço público, tornando-a reduto de vidas privadas individuais. Entendemos que a cisão público/privado operada no decorrer deste processo, dispõe a vida privada intimamente ligada à família e a vida pública circunscrita ao mundo do trabalho. Nesta conjuntura, observamos, na atualidade, uma linha tênue que divide a esfera pública e a esfera privada. É nesse movimento que a relação entre Estado e família adquire centralidade nas sociedades contemporâneas. A interferência do Estado na família pode ser entendida como uma invasão e controle estatal, mas também como possibilitadora de uma progressiva emancipação dos indivíduos, colocando em choque dois direitos: à privacidade e à proteção. Essa interferência é percebida através da legislação, das políticas demográficas e da difusão de uma cultura de especialistas nos aparatos policialescos e assistencialistas do Estado. (MIOTO, 2004). Dito isso, temos na Política Nacional de Assistência Social (2004) um importante mecanismo de interferência estatal, no sentido de dar subsídios à família para a provisão de seus membros. Esta política tem como objetivo a proteção social básica ou especial a quem dela necessitar, contribuindo com a inclusão e a eqüidade e ampliando o acesso a bens e serviços socioassistenciais, numa constante preocupação em assegurar a centralidade familiar no âmbito das ações desta política. Contudo, o que presenciamos é uma redução à rotulação das famílias em capazes e incapazes, pelos programas de apoio sociofamiliar, predominando * Assistente Social do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES/DISOP); especialista na área de Políticas Sociais e Serviço Social pela UnB. ** Estagiária de Serviço Social do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES/DISOP); graduanda pela UFRJ. *** Estagiária de Serviço Social do Instituto Nacional de Educação de Surdos (INES/DISOP); graduanda pela UERJ. 177 Anais do Congresso concepções estereotipadas da família e dos papéis familiares. O fenômeno de reconhecimento das transformações na família, em relação à estrutura e organização que preserva a expectativa quanto a suas funções, gera uma tendência a soluções residuais dos problemas da família, trabalhando em situações-limite e não no cotidiano. Ou seja, instaurou-se uma cultura assistencialista a fim de dar sustentabilidade à família, através de políticas que pontuam que a satisfação das necessidades dos cidadãos devem ser providas pelo mercado e pela família, e que o Estado só intervém temporariamente na falha destes. Ainda numa preocupação com a interface entre Estado e família, realizaremos a seguir um balanço da definição legal de família, bem como da ampla gama de leis que asseguram a sua inserção no contexto escolar. FAMÍLIA NA EDUCAÇÃO: ASPECTOS LEGAIS Um primeiro passo para analisarmos a inserção da família na educação é entender de que família estamos falando, ou seja, perceber a definição legal de família. Segundo a Política Nacional de Assistência Social: [...] as novas feições da família estão intrínseca e dialeticamente condicionadas às transformações societárias contemporâneas, ou seja, às transformações econômicas e sociais, de hábitos e costumes e ao avanço da ciência e da tecnologia. O novo cenário tem remetido à discussão do que seja a família, uma vez que as três dimensões clássicas de sua definição (sexualidade, procriação e convivência) já não têm o mesmo grau de imbricamento que se acreditava outrora. Nesta perspectiva, podemos dizer que estamos diante de uma família quando encontramos um conjunto de pessoas que se acham unidas por laços consangüíneos, afetivos e, ou, de solidariedade. Como resultado das modificações acima mencionadas, superou-se a referência de tempo e de lugar para a compreensão do conceito de família. (PNAS, 2004, p.25). A concepção citada revela um avanço na forma de percepção da família; contudo, como já foi exposto no item anterior, essa política se revela extremamente contraditória no sentido de que tem como diretriz a matricialidade sociofamiliar, mas só atua em famílias em situação de vulnerabilidade social. Uma das condições para encaminhamento aos programas sociais é matrícula e freqüência escolar. E de que maneira a escola pode influir na situação de vulnerabilidade social? No que tange à interface entre Estado e família na provisão da educação, temos como importante marco na redemocratização do país a promulgação da Constituição Federal de 1988, fruto de lutas da sociedade 178 civil organizada. A chamada Constituição Cidadã traz a noção ampliada de educação realizando uma interface entre Estado e família na provisão da mesma, representando um avanço no que concerne à Constituição de 1967, que apregoava apenas como função estatal a provisão da educação quando provada a insuficiência de meios da família e da sociedade para tal. (Quadro comparativo das leis que asseguram a interseção Estado/família/ educação, Anexo I). Como reflexo das lutas sociais na área de educação dos anos 80, temos ainda a promulgação da nova LDB (1996), que, no entanto, reflete também a política neoliberal brasileira. Em comparação com a LDB anterior (Lei nº 4.024/61), avança na ampliação do conceito de educação, incluindo os processos formativos que ocorrem nas várias instâncias sociais – como no trabalho e na educação –, além de incorporar os fundamentos do artigo 2061 da Constituição Federal de 1988. Contudo, a questão orçamentária denota a preocupação no barateamento da implantação da política educacional, e a flexibilização do financiamento da educação abre brecha para investimentos privados que colocam essa política setorial refém de empresas privadas, demarcando os retrocessos da referida lei. A participação da família no ambiente escolar, assim como na provisão da educação em parceria com o Estado, já proposta na Constituição Federal de 1988, é reforçada tanto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), quanto na LDB, respeitando-se, é claro, os avanços e retrocessos da preconização dessa participação. Comparada com a Constituição de 88, a LDB mantém a interface entre Estado e família, porém reverte a prioridade do dever de provisão da educação, que passa a ser, em primeiro lugar, da família em detrimento do Estado. Tal mudança reproduz uma visão política sobre a questão dos direitos de transferência de responsabilidade, bem como de culpabilização da família, já citada anteriormente. Destarte, e tendo em vista a realidade do Estado mínimo que ocasiona a transferência ao seio da família de questões de ordem pública para a privada, faz-se necessária uma articulação dos usuários com os movimentos sociais, visando formas de participação social e política, de modo a exercer o controle social. É nesta medida que destacaremos a seguir a importância da participação da família na gestão educacional. Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei. 1 179 Anais do Congresso Família e escola na construção político-pedagógico do projeto A transformação fundamental na divisão dos papéis entre Estado e família se relaciona intimamente com a liberalização da educação familiar. Antes da década de 50, os filhos não tinham direito a uma vida privada; eram os pais que tomavam as decisões que repercutiam diretamente na vida das crianças. Com a liberalização da educação familiar, a família transfere para a escola o aprendizado da vida em sociedade. A família se revela incapaz no cumprimento desse papel, já que a educação é voltada para a vida pública (educação para o trabalho) e o espaço familiar é estritamente privado. Essa mudança ilustra o processo de reorganização estrutural ocorrida no campo educacional, principalmente a partir dos anos 20 e 30, com a necessidade de se formar um trabalhador em sintonia com o processo de industrialização ocorrido à época e reforçado com o surgimento de estabelecimentos voltados para a formação e capacitação de mão-de-obra especializada nos anos 40; processo que vai culminar com as escolas técnicas das décadas de 60 e 70, fruto da complexificação e crescimento industrial. Assim, podemos afirmar que há uma forte vinculação entre educação e trabalho presente no nosso país2 , manifesta nas transformações na organização educacional, em consonância com as mudanças no processo produtivo. Na atualidade, observamos o financiamento da educação pública pelo Banco Mundial, firmado a partir do estabelecimento de metas que elevam o nível de escolarização da população e reduzem a evasão escolar a qualquer custo, transformando o direito à educação numa categoria de atenção às necessidades do mercado. Tais mudanças são ilustrativas do Estado mínimo neoliberal. Contudo, no rol de mudanças ligadas ao modelo neoliberal, estão não só a redefinição do papel do Estado, como também uma revalorização do poder local. Disto resultam transformações de responsabilidades e competências pelas instâncias locais advindas da descentralização estatal, que acarretam profundas mudanças no que se refere ao sistema de decisões municipais, Esta vinculação está expressa também, e principalmente, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (1996), que regulamenta, em seu artigo 1.º, parágrafo 2.º: “a educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social”. 2 180 bem como à pratica dos atores políticos. A descentralização transfere para o âmbito local as competências e recursos públicos capazes de fortalecer a participação e o controle social. (SANTOS JR., 2001). Deste modo, o processo de descentralização pode ser entendido como um “instrumento da lógica democrática”. Neste ínterim é de fundamental importância destacar o papel dos Conselhos de direito enquanto mecanismos de controle social e que têm como meta a gestão democrática das políticas sociais. Os Conselhos Municipais são compostos por representantes do poder público e da sociedade civil organizada (ONGs), organizações comunitárias, sindicatos, associações, etc. – tendo caráter deliberativo e/ou consultivo e criando condições para fiscalização da gestão pública. Na área da educação, a lei preconiza três tipos de conselho de gestão no nível do poder municipal, com caráter consultivo/deliberativo, ligados ao Poder Executivo, a saber: o Conselho Municipal de Educação, o Conselho de Alimentação Escolar e o Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, Fundef. (GOHN, 2002, p.104). Vale ressaltar que, acompanhando o processo de redemocratização, que tem como ponto fulcral a promulgação da constituinte, e respeitando o aparato jurídico-legal desde então, há um movimento no interior das escolas voltado para a participação social: os Conselhos Escolares, compostos pelo poder público, por profissionais da educação e pelos responsáveis. O papel desses Conselhos concentra-se na luta pela efetivação do direito à educação, ou seja, pela garantia do acesso à escola, pela melhoria da qualidade do projeto político-pedagógico e pela garantia do financiamento da educação, fortalecendo-se como instância de controle social e auxiliando a escola no cumprimento da sua função social, uma vez que: O financiamento da educação é um tema urgente nas discussões sobre os rumos que se pretende dar à educação em nosso País, uma vez que, sem os recursos adequados, torna-se praticamente impossível atender ao princípio constitucional que assegura uma escola de qualidade para todos os brasileiros. (Relatório do Grupo de Trabalho sobre Financiamento da Educação, 2001: 117) Com ação semelhante à dos Conselhos Escolares, podemos incluir as associações de pais (APAs), que, enquanto instituições autônomas, revelam a família como ator político na luta pela garantia do direito à educação. Além de atuarem no planejamento, implementação e avaliação das ações da escola, as APAs buscam a participação na elaboração e implementação do projeto político-pedagógico (PPP), entendendo que é através dele que 181 Anais do Congresso as ações da escola se materializam3 . Portanto, participar da elaboração do PPP é discutir e delimitar o tipo de educação para torná-la democrática. Neste panorama, podemos concluir que, para alcançarmos uma efetiva gestão democrática na educação, faz-se necessária a implementação e fortalecimento dos Conselhos Escolares e/ou APAs, no sentido de constituírem-se enquanto órgãos de pressão frente ao Estado para que este objetive a organização das ações da escola. Considerações Finais. Uma leitura dos movimentos sociais no campo educacional no Brasil nos remete à questão da cidadania. Historicamente, a noção de direitos nos marcos do liberalismo está intimamente ligada à questão da cidadania, e o exercício desta, restrito ao proprietário. A mudança dessa concepção transforma a questão da cidadania em uma questão educativa e, com a consolidação do modo de produção capitalista, a educação volta a ser pensada enquanto mecanismo de controle social. (GONH, 1992). A idéia de cidadania tem como cerne a educação em sentido ampliado, tendo em vista que é construída no processo de luta, ou seja, num movimento educativo, isto porque sua construção se dá através da experiência vivida. Por tudo isso, afirmamos que o objetivo da política social não deve ser o de pressionar a família para assumir responsabilidades do Estado, mas oferecer alternativas de participação cidadã. Dito isso, afirmamos que o Estado deve voltar sua inserção na realidade para o acesso à informação e discussão das políticas sociais de maneira geral, numa articulação com os movimentos sociais, com vistas a promover a participação social e política dos usuários no controle social. Entendemos, portanto, que a escola, no atual contexto de violência, miserabilidade e naturalização da pobreza, deveria ter como um de seus eixos principais a formação de cidadãos, a defesa intransigente da melhoria da qualidade do ensino público, propiciando às classes trabalhadoras condições mínimas de participação enquanto sujeito político consciente, ou seja, a escola deve dar respostas à questão social com caráter preventivo, e não punitivo. É no projeto político-pedagógico que são estabelecidos os conteúdos, metodologias e avaliações a serem desenvolvidos na escola, tendo como eixo a formação humana e a construção da cidadania. 3 182 Outra questão importante é que exista uma articulação entre a escola e a família no sentido de serem dadas orientações das duas partes em uma mesma direção, de forma que não sejam passadas informações contraditórias, pois os valores dos profissionais de educação podem ser diferenciados das famílias que são atendidas pelas escolas. Neste sentido é importante que os profissionais da educação tenham acesso ao conhecimento da realidade socioeconômica dos alunos (conforme preconizado na LDB) para adaptação dos currículos escolares à realidade concreta dos alunos. Por tudo posto, acreditamos na formação cidadã pautada nos valores de solidariedade, igualdade e participação, via interlocução escola/família enquanto parceiros na construção de uma nova sociedade. Bibliografia BRASIL. Constituição Federal, 1988. __. Constituição Federal, 1967. __. Decreto nº 5.296, de dezembro de 2004. __. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei n.º 8.069, de julho de 1990. __. Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Lei n.º 4.024, de 1961. __. Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Lei n.º 9.394, de dezembro de 1996. __. Política Nacional de Assistência Social, 2004. FARNESI, Luciana. Investir mais e distribuir melhor os recursos entre regiões e escolas. In: Sete soluções para a escola pública. Treinamento Folha. Folha On-line, 24/06/2005. <http://1.folha.uol.com.br/folha/ treinamento/educacao/te24062005.shtml>. GOHN, Maria da Glória. Movimentos sociais e educação. Coleção Questões da nossa época, vol. 5. São Paulo: Cortez, 1992. 183 Anais do Congresso __. Educação, trabalho e lutas sociais. In: FRIGOTTO, Gaudêncio; GENTILI, Pablo (Orgs.). A cidadania negada: políticas de exclusão na educação e no trabalho. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2002. INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS PEDAGÓGICOS (INEP). Relatório do Grupo de Trabalho sobre Financiamento da Educação. In: Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. v. 82, n. 200/201/202. Brasília: INEP, jan./dez., 2001. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Conselho Escolar e a educação do campo. Programa Nacional de Fortalecimento dos Conselhos Escolares. Caderno 9. Brasília, junho de 2006. MIOTO, Regina Célia Tamaso. Novas propostas e velhos princípios: a assistência às famílias no contexto de programas de orientação e apoio sociofamiliar. In: SALES, Mione Apolinário et al. (Orgs.). Política social, família e juventude: uma questão de direitos. São Paulo: Cortez, 2004. NEVES, Maria Lúcia Wanderley. Por que dois planos nacionais de educação? In: __ (Org.). Educação e política no limiar do século XXI. Campinas: Autores Associados, 2000. PROST, Antonie. Fronteiras e espaço do privado. In: __ et al. (Orgs). História da vida privada v.5: da Pimeira Guerra a nossos dias. São Paulo: Companhia das Letras, 2003. SANTOS JÚNIOR, Orlando Alves dos. Democracia e governo local: dilemas da reforma municipal no Brasil. Rio de Janeiro: Renavan, 2001. TELLES, V. da S. Pobreza e família: a precariedade das condições de vida. In: __. A cidadania inexistente: incivilidade e pobreza – um estudo sobre o trabalho e a família na grande São Paulo. São Paulo: USP, tese de doutorado, mimeo, 1992. Anexo I. Quadro comparativo das leis que asseguram a interseção Estado/família/educação. 184 LDB (1961) Art. 2º A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola. Parágrafo único. À família cabe escolher o gênero de educação que deve dar a seus filhos. Art. 3º O direito à educação é assegurado: II - pela obrigação do Estado de fornecer recursos indispensáveis para que a família e, na falta desta, os demais membros da sociedade se desobriguem dos encargos da educação, quando provada a insuficiência de meios, de modo que sejam asseguradas iguais oportunidades a todos. Constituição Federal (1967) Art 167. A família é constituída pelo casamento e terá direito à proteção dos Poderes Públicos. Art 168 - A educação é direito de todos e será dada no lar e na escola; assegurada a igualdade de oportunidade, deve inspirar-se no princípio da unidade nacional e nos ideais de liberdade e de solidariedade humana. Constituição Federal (1988) Art.205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei. Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. 185 Anais do Congresso ECA (1990) Art.53. A criança e o adolescente tem direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento da sua pessoa, preparo par a o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho assegurando-lhes: Parágrafo único. É direito dos pais ou responsáveis ter ciência do processo pedagógico, bem como participar da definição das propostas educacionais. Art.54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: § 3º Compete ao poder público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsável, pela freqüência à escola. LDB (1996) Art.12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: VI - articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade com a escola; VII - informar os pais e responsáveis sobre a freqüência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua proposta pedagógica. Art.14. Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: II - participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. 186 MESAS-REDONDAS NACIONAIS A FAMÍLIA EM DISCUSSÃO Fátima Gonçalves Cavalcante* Cada ser humano que nasce pulsa, como as batidas do próprio coração, em busca de se expressar, de conhecer a si e o mundo que o cerca, de aprender a ver, escutar, falar, andar, tocar, explorar as facetas de um universo repleto de formas, cores, sons, odores, sensações que se organizam em experiências. A pessoa, para ir ao encontro do seu pleno desenvolvimento, depende de cuidados que se iniciam na família e se complementam na vida social, do percurso escolar à profissionalização, da inserção profissional à formação de sua própria família. A presença de alguma incapacidade (visual, auditiva, física, mental ou múltipla) poderá interferir mais ou menos na evolução global da criança, a depender do modo como a família irá identificar e reconhecer os limites e as potencialidades de seu filho, do impacto afetivo e social da deficiência na família e de como a família conseguirá ir ao encontro de diferentes formas de ajuda na sociedade, na comunidade, na saúde, na educação, entre amigos e parentes, etc. Se a família se fechar, se isolar e não inserir o filho em apoios continuados, de diversos tipos, a deficiência será um fardo para todos, o desenvolvimento psíquico e social do filho ficará prejudicado. Se a família se abrir para compreender a incapacidade e tentar reduzir as desvantagens, através de formas de ajuda que atendem a necessidades específicas, então a deficiência poderá tornar-se um ‘trampolim’ para muitas aprendizagens e diferentes formas de superação para todos. O livro de Oliver Sacks (2002), Vendo Vozes, me ajudou a representar aqui, de modo abreviado, o mundo dos surdos. Ter um filho cego, surdo, autista ou prodígio requer flexibilidade e engenhosidade dos pais. Muitos pais e familiares de crianças surdas sentem-se impotentes diante de tamanha barreira de comunicação, e a possibilidade de essa barreira ser derrubada é algo que irá depender da adaptabilidade dos pais, do grupo familiar e da criança surda. Para que o surdo desenvolva competência lingüística e intelectual e se organize afetiva e socialmente, é fundamental * Psicóloga. Doutora em Saúde Pública. Professora do Mestrado em Psicanálise, Saúde e Sociedade da UVA-RJ e Pesquisadora-colaboradora da área ‘Deficiência, Violência & Saúde’ do Claves/ENSP/Fiocruz. 187 Anais do Congresso a aquisição de uma língua em idade “normal”, principalmente no início da vida, ou até a puberdade, seja ela em língua de sinais ou falada. A ausência de uma língua produz profundo isolamento, falta de noção de causalidade (não saber formular perguntas ou respostas), falta de senso histórico, de dimensão autobiográfica; a inteligência fica limitada ao visual, sem idéias abstratas (refletir, planejar, brincar), sem lidar com a esfera imaginativa e figurativa, ou com hipóteses e possibilidades. Nesse caso, a mente não é utilizada por completo e a pessoa fica confinada a um mundo imediato e pequeno. Muitas crianças com surdez pré-lingüística, após educação intensiva, adquirem língua e comunicação adequadas. Ter pais ouvintes ou surdos é algo bem diferente. Quando a língua de sinais é nativa, entre pais e filho surdos, o isolamento é menor, havendo menos risco de o filho ficar privado da língua. Quando a criança surda convive numa família de ouvintes em que prevalecem distorções da vida comunicativa desde o início, com a predominância de uma linguagem rudimentar, haverá conseqüências no crescimento intelectual, vida emocional, social e desenvolvimento da linguagem de um modo simultâneo e inseparável. A língua é uma capacidade inata que só pode ser desenvolvida a dois, só pode ser ativada por outra pessoa. A primeira comunicação é adquirida na relação mãe-filho. A qualidade das experiências nos primeiros momentos irá influir decisivamente no futuro da criança. É fundamental que haja certo tipo de conversa, um diálogo rico em intenção comunicativa, que desperte a curiosidade da criança e a busca de significados: “Por quê?”, “Como?”, “E se?”, como diz Sacks (2002). É fundamental despertar na criança surda o senso de questionamento e o espírito investigador. Schlesinger (1988) faz uma descrição interessante de como a “qualidade da conversa” entre mãe e filho surdo, nas fases iniciais da vida, pode prejudicar ou beneficiar o desenvolvimento da criança: (1) algumas compartilham um diálogo fundamental, outras basicamente falam para o filho; (2) algumas apóiam ou não as ações do filho e informam as razões, outras controlam as ações dos filhos sem explicar o porquê; (3) algumas fazem perguntas genuínas, outras perguntas restritivas; (4) algumas são impelidas pelo que a criança diz ou faz, outras por suas próprias necessidades e interesses; (5) algumas descrevem um mundo amplo, marcado por eventos passados e perspectivas de futuro, outras comentam apenas sobre o aqui e agora; (6) algumas são mediadoras entre a criança e o ambiente, dotando os estímulos de significados, outras não. Não apenas a língua deve ser introduzida, mas também o pensamento e, por essa razão, a reciprocidade comunicativa que busca ser esclarecedora, ou um monólogo indiferente que deixa tudo sem explicação, são atitudes comunicativas que 188 fazem a diferença, favorecendo ou não o desenvolvimento da capacidade comunicativa da criança e o seu desenvolvimento global. O diálogo inadequado não apenas inibe o intelecto, mas também produz timidez e passividade. O diálogo comunicativo desperta a imaginação e a mente, leva à auto-suficiência. Esse diálogo que ocorre primeiro com os pais depois é internalizado em forma de pensamento, numa fala interna, quase sem palavras, para dar luz ao pensamento, como diz Vygotsky (1984). Ao “falar consigo mesma”, a criança desenvolve os seus próprios conceitos e significados. A língua permite novas orientações, aprendizados e ações; transforma a experiência, permite lidar com coisas à distância, juntar eventos separados no tempo ou separar coisas que não sejam isoladas, permitindo explorar o universo de múltiplas maneiras. O aprendizado da língua produz uma explosão da linguagem e da mente, como se abrisse as portas de uma mente aprisionada. Um mundo de coisas percebidas como isoladas e ancoradas no aqui-e-agora passa a ser um mundo de coisas conectadas, um mundo relacionado, inteligível e inteligente. Para Sacks (2002), a língua de sinais, uma linguagem visual-espacial, favorece o desenvolvimento de aquisições compensatórias no córtex cerebral, revelando a adaptabilidade e plasticidade do cérebro, que se torna diferente. O surdo ou o filho de surdos que adquire a língua de sinais, desde tenra idade, desenvolve uma maior habilidade visual, uma capacidade de “encenação” do mundo, uma sensibilidade e inteligência visuais que o tornam “perito” visual. Quando ele se pronuncia, as criaturas e objetos estão situados, numa capacidade descritiva arquitetônica, havendo um detalhamento que jamais apareceria na linguagem oral. Se, de um lado, a surdez subtrai certas funções, de outro permite recriar formas originais de língua. No livro Pessoas Muito Especiais (Cavalcante, 2003), embora eu não tenha abordado a surdez quando analiso as deficiências (múltipla, mental, psicose infantil e autismo) na complexidade da vida, sob um olhar psicossociocultural, sinalizo questões relevantes sobre o impacto da deficiência na família. Demonstro como a família terá que, de um lado, construir um novo estoque de conhecimentos, para aprender a decifrar seu filho e encontrar meios apropriados de ajudá-lo, contando com o apoio de amigos, parentes, profissionais de saúde, educação, reabilitação, assistência social e dos recursos providos pelas políticas públicas; de outro, a família terá que olhar para os recursos internos do grupo familiar (afetivos, sociais, culturais, intergeracionais) de modo a elaborar psíquica e socialmente a deficiência que afetou um de seus membros. 189 Anais do Congresso O sentido que o filho com deficiência irá adquirir para a família, desde os primeiros momentos, será crucial para determinar o futuro da criança e as atitudes que a família irá tomar dali para frente. Esse “sentido”, que na fase inicial poderá estar associado a dor, desespero, pânico, descrença, raiva, depressão, tristeza, produzidos pela descoberta da deficiência no filho, tenderá a ser ressignificado, de acordo com valores, crenças e o sentido atribuído à vida, na medida em que a família vai conseguindo se mobilizar em busca de apoios para o filho e para ajudar o grupo familiar a se adaptar aos desafios que virão. Um dos fatores que dificulta a elaboração do sofrimento familiar é a negação da deficiência, associada à fantasia do filho sonhado. Enquanto a família não puder se confrontar com a real condição de seu filho, sua diferença, e não puder fazer o luto do filho idealizado, ela terá poucas chances de ajudá-lo. Nessa circunstância, a família poderá estar paralisada, ou canalizando suas ações na busca de uma cura milagrosa, atitude que tenderá a prepará-la para um contato mais amplo com a realidade do filho. O contato interno com emoções conflituosas e um balanço profundo da situação podem gerar aceitação e apreciação, quando a família irá descobrir forças insuspeitadas para enfrentar a situação, encontrando um novo tipo de postura e atitude. Ajudar um filho com deficiência é recorrer a múltiplas fontes de apoio, na vida íntima, no interior da família, nos apoios técnicos especializados e na vida social. A história de Dionísio (Cavalcante, 2003), que retrata sua infância e adolescência com múltipla deficiência (epilepsia grave, deficiência mental e visual, traços autísticos), revela como sua mãe foi abalada em sua vida cotidiana, na organização do tempo e espaço, nos cuidados dispensados ao marido e demais filhos, sem perder o foco no problema de Dionísio. Nos momentos difíceis, conseguia tomar pequenas decisões importantes, o que acalmava o marido, embora o peso e a complexidade do problema do filho fossem esmagadores. Os apoios da saúde o fragmentavam conforme as diferentes especialidades, e a “voracidade” das práticas terapêuticas se impunham como algo necessário, de um modo extremamente desarticulado. Como construir um ser de um monte de defeitos?, frase que norteou um novo trabalho institucional integrado. Foi preciso “esquecer” a fatalidade de um quadro gravíssimo e organizar a desordem terapêutica que paradoxalmente traumatizava. Era preciso olhar a pessoa que estava ali, por trás daquela deficiência. Um apoio minucioso foi minimizando passo-a-passo suas deficiências: ele foi retirado do isolamento autista, trabalhado no elo simbiótico e diferenciado, aprendeu a usar a voz, as mãos, a descobrir o corpo, o espaço, despir-se, vestir-se, a socializar-se. Se hoje ele poderia estar em estado vegetativo, seus progressos driblaram a “fatalidade”. Apesar da gravidade de suas crises convulsivas, chamam 190 atenção os ganhos. Melhor organizados, mãe e filho puderam se diferenciar, cada um com suas respectivas rotinas. Ela pode deixar de ser a “supermãe”, reassumir os cuidados da casa, do marido, dos outros filhos, dividindo a atenção do Dionísio com o pai, a avó materna, ou a instituição. Os irmãos também participaram das brincadeiras e jogos com Dionísio, que gosta de beijar a todos, especialmente a mãe, num beijo “babado”, às vezes batizado de beijo maluco. Essa é uma família que foi capaz de amar e incluir na vida um filho “cheio de defeitos”, tendo como bússola dois lemas: “ele tem direito a ter a sua história” e “seus tratamentos precisam lhe dar prazer”. O Mito das Beijocácias é uma história de superação marcada por um afeto organizador e pela parceria família-instituição. As famílias e deficiências são mais complexas do que nossos tratados psicopatológicos. Elas devem ser vistas na pulsação da vida. Se as famílias forem apoiadas na extensão e profundidade de que necessitam, e tratadas como parceiras, e não apenas como “usuárias”, elas poderão assumir um lugar proeminente de apoio aos próprios filhos. As experiências familiares devem ser entendidas na complexa trama da vida afetiva, social e cultural. Sem esses nexos causais fundamentais, e apenas pelos cânones patológicos, não se pode colocar verdadeiramente a família em discussão. Bibliografia CAVALCANTE, F.G., Pessoas Muito Especiais: a construção social do portador de deficiência e a reinvenção da família. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2003 SACKS, O. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos, 2002 SCHLESINGER, H. Questions and answers in the development of deaf children. In: Strong, Michael (ed.) Language learning and deafness. Cambridge, Nova York: Cambridge Univesity Press, 1988 VYGOTSKY, L.S.A. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984 191 MESAS-REDONDAS NACIONAIS MULTI-TRILHAS: UM JOGO PARA AUXILIAR CRIANÇAS SURDAS NO PROCESSO DE AQUISIÇÃO DE SEGUNDA LÍNGUA Rita Maria de Souza Couto* O Multi-Trilhas é um material educativo idealizado principalmente, mas não exclusivamente, para auxiliar crianças surdas no processo inicial de aquisição de segunda língua. Com ele, o professor pode trabalhar verbos, substantivos, adjetivos e pronomes em duas línguas: Língua Brasileira de Sinais (Libras) e português escrito, apresentadas em contextos temáticos variados. Projetado em duas versões – multimídia e concreta para mesa ou piso – o jogo Multi-Trilhas apresenta três cenários da cidade do Rio de Janeiro: Jardim Zoológico, Pão de Açúcar e Quartel Central do Corpo de Bombeiros. Nesses cenários são trabalhados percursos, ações, repetições, deslocamentos, além de raciocínio, interação e tomada de decisão, entre outros aspectos. O Multi-Trilhas pode ser jogado em grupo ou individualmente. Contudo, em função das tarefas propostas pelo jogo, é imprescindível a presença de um mediador com fluência na Língua Brasileira de Sinais, seja na figura do professor, do fonoaudiólogo ou de qualquer outra pessoa envolvida com o indivíduo surdo. Desenvolvido por um grupo de pesquisa do Laboratório de Pedagogia do Design, LPD, a partir de uma parceria entre o Departamento de Artes & Design da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e o Instituto Nacional de Educação de Surdos do Rio de Janeiro, INES-RJ, com apoio da FAPERJ e do CNPq, o Multi-Trilhas é resultado de uma investigação inserida no âmbito da linha de pesquisa intitulada Design de Situações Educativas, que tem como princípio básico a reflexão crítica sobre objetos, sistemas e linguagens utilizados em ambientes concretos ou mediados pela tecnologia, nos quais, de alguma forma, objetive-se construção de conhecimentos. Esta é uma área ampla, que se preocupa não só com o desenvolvimento de um objeto ou de um sistema de objetos, mas também com o seu entendimento, utilização e eficácia. * Professora 192 Doutora da PUC-Rio. O indivíduo surdo tem uma linguagem espaço-visual que se expressa por meio da língua de sinais, e sua capacidade de comunicação precisa ser desenvolvida desde a mais tenra idade, para que ele possa crescer como cidadão. A alfabetização bilíngüe, neste particular, é uma aliada, pois propicia ao surdo usufruir não apenas de sinais, por meio da Língua Brasileira de Sinais, sua primeira língua, como também do português escrito e, com isso, ter acesso ao universo da leitura (Quadros, 1997; Sacks, 1998). O contato com colegas surdos da mesma faixa etária e com surdos adultos é importante para que a criança possa obter fluência em Libras e perceber a surdez como diferença em vez de deficiência. Neste particular, o material educativo projetado oferece um rico potencial para auxiliar crianças surdas no processo inicial de aquisição do português escrito como segunda língua, uma vez que trabalha ambas as formas de comunicação de maneira lúdica e interativa, sem privilegiar, contudo, a língua dos ouvintes (Skliar, 1997). A linguagem digital permite múltiplas formas de comunicação concernentes à oralidade, à escrita, à imagem, ao som, ao colorido, às ações, aos sentimentos e valores. Em função disso, optou-se por desenvolver um jogo multimídia segundo uma visão multissensorial. Após uma série de encontros com professores e fonoaudiólogos do INES, nos quais foram discutidos os objetivos do ambiente de aprendizagem virtual, o perfil do usuário desse ambiente, o conteúdo a ser trabalhado, os recursos disponíveis em termos de equipamentos, entre outras questões, a equipe de pesquisa deu início à seleção e organização do conteúdo do jogo Multi-trilhas multimídia. Fez parte do seu planejamento, além da definição do conteúdo a ser disponibilizado e sua forma de organização, a determinação de quanto tempo seria preciso para completar cada uma das tarefas propostas, tendo em vista a dificuldade de manter a atenção do indivíduo surdo. Nessa etapa, foram levadas em consideração questões relacionadas com a usabilidade do sistema, com sua aplicabilidade e acessabilidade. No tocante ao “design” do conteúdo do ambiente virtual, sua organização detalhada e montagem, foram observados aspectos relacionados com a linguagem visual, a percepção visual, as relações figura e fundo, variações de “browsers”, “frames”, mapa de navegação, “lay-outs” de telas, menus, cabeçalhos e rodapés, ícones, tipografia, “lay-out” de tabelas, sistemas de cores e recursos multimídia, entre outros. 193 Anais do Congresso Um fluxograma com o esboço visual das informações foi desenvolvido, em que cada nível ou “link” representava uma tela ou um controle a ser criado. Uma programação visual específica foi criada para o “software”, incluindo identidade e linguagem visual. Ficou definido que a entrada no ambiente virtual se daria por meio de uma página inicial, que levaria o usuário para páginas secundárias. A partir dessa definição, os controles da interface (ou como o usuário irá interagir com a tela do computador) foram projetados. Para a execução do “software” do jogo Multi-Trilhas foi contratado um “designer” e programador, que trabalhou por cerca de oito meses em conjunto com a equipe de projeto e esta, em conjunto com o INES. Foram realizados vários protótipos até que se chegasse à versão 1.0 do jogo, composta por cenários que devem ser explorados com o “mouse”, permitindo a execução de diferentes tarefas. Com o intuito de manter uma identidade do jogo multimídia com o jogo concreto, os cenários deste último foram redesenhados para ficarem compatíveis com a mídia digital. As telas apresentam, então, três cenas do Jardim Zoológico, três do Pão de Açúcar e três do Quartel Central do Corpo de Bombeiros. Foi identificada a pertinência de utilizar elementos animados, pois animação é um recurso multimídia que ajuda a motivar o usuário a explorar as potencialidades do jogo. Os personagens animados escolhidos representam turistas, que estão visitando os diversos cenários do jogo: um menino, uma menina, uma mulher adulta, um homem adulto e um ancião. O estilo de interação utilizado foi a manipulação direta, composta de ações baseadas numa analogia entre o cursor e a mão, as representações gráficas e os objetos do domínio. Este estilo de interface de manipulação direta foi escolhido por permitir ao usuário agir diretamente sobre os objetos da tela com o “mouse” (dados ou representações de objetos do domínio) sem a necessidade de outros comandos. As imagens para uso nos cenários foram otimizadas para que o tamanho do arquivo gerado fosse pequeno, melhorando, assim, o tempo de carregamento das telas. O número de cores, as palhetas, a resolução e o tamanho foram considerados para a mídia utilizada. No jogo Multi-Trilhas multimídia o acesso às tarefas se dá a partir de zonas clicáveis presentes nas ilustrações, que por sua vez conduzem 194 necessariamente a palavras em Libras e português escrito. As palavras em Libras são apresentadas por meio de vídeo (imagens do Dicionário de Libras disponível no sítio do INES) e as palavras em português apresentamse escritas na tela. O jogo foi gravado em um CD auto-executável. As ilustrações clicáveis de cada cenário que apresentam os vídeos em Libras e as palavras em português escrito foram trabalhadas a partir de palavraschave. Elementos do jogo e modo de jogar 1. Tela de abertura composta inicialmente por um mapa da cidade do Rio de Janeiro e a seguir telas com logotipos da PUC-Rio, INES, FAPERJ, CNPq e LPD. 2. Tela HOME com imagens dos personagens e de uma prancheta para escrever o nome do jogador. Vídeo em Libras. Estão disponíveis ícones para tela de atividade de desenho, dicionário em Libras, pontuação no jogo, apresentação do jogo, saída do jogo, opção pela cor de fundo da tela. 3. A partir da escolha de uma personagem, o jogador vai para uma tela onde estão disponíveis os nove cenários, cada um dos quais chama três atividades: a) tornar visíveis imagens fantasmas presentes no cenário, que levam a telas onde o jogador posiciona a imagem por cima do nome que a representa. Em caso de acerto, aparece uma animação da personagem comemorando e automaticamente entra uma tela de pontuação; b) tornar visíveis imagens fantasmas presentes no cenário, que levam a telas onde o jogador entra em uma atividade de liga-pontos numerados. Em caso de acerto, aparece uma animação do personagem comemorando e automaticamente entra uma tela de pontuação; c) tornar visíveis imagens fantasmas presentes no cenário, que levam a telas onde o jogador entra em uma atividade de quebra-cabeça. Em caso de acerto, aparece uma animação do personagem comemorando e automaticamente entra uma tela de pontuação. Em todas as situações aparecem as palavras que estão sendo trabalhadas em Libras (dicionário) e em português escrito. 4. Além dos vários elementos sensíveis na tela, onde o jogador ao “clicar” estará aprendendo português e Libras, o jogo disponibiliza uma atividade livre. Nela, é possível desenhar, pintar e compor cenários com 195 Anais do Congresso elementos e personagens presentes nos nove cenários do jogo. Tudo isso é feito com o auxílio do “mouse”. 5. Telas de pontuação – são telas que computam os acertos do jogador em todas as atividades, exceto na tarefa livre. O Multi-Trilhas em experimentação No primeiro semestre deste ano (2007), a versão 1.0 do jogo MultiTrilhas multimídia, em fase final de teste, foi instalada no sistema de intranet do INES e testada com a turma de 1ª série B do Ensino Fundamental, composta por vinte crianças. Esses alunos foram para o laboratório de informática, que está equipado com vinte máquinas, com as professoras do INES Ana Cristina da Fonsêca Flores, Eloisa Gonzaga de Alvarenga, Maria da Graça Guimarães, que já haviam utilizado em sala de aula o jogo na sua versão concreta. O consultor pedagógico de Libras, Alex Curione, também esteve presente à sessão. Na tela inicial do jogo, onde o nome do jogador é escrito e é, também, escolhido um personagem, a maioria das crianças realizou a tarefa proposta sem nenhum problema, mas algumas delas tiveram um pouco de dificuldade. Foi visto que o local dos vídeos em Libras que explica a tarefa a ser realizada não estava adequado e foram feitas as mudanças necessárias posteriormente. De uma maneira geral, as crianças ficaram concentradas e interessadas no jogo. Impossível seria descrever aqui todas as estratégias utilizadas, dificuldades e reações aos elementos do jogo. Assim, optou-se por relatar apenas algumas ocorrências com vistas a ilustrar esta sessão de experimentação. Uma das crianças optou pela tarefa do quebra-cabeça no cenário do bombeiro e para iniciá-la clicou no botão “ajuda”, onde aparecem os números referentes a cada peça do quebra-cabeça e o local onde deve ser colocada cada uma das peças. Ela clicou nesse mesmo botão umas três vezes e depois montou o quebra-cabeça com facilidade. Quando finalizou a montagem e o personagem balançou os braços em sinal de alegria, a criança também comemorou com gritos. A seguir, quando apareceu a imagem do elemento do cenário do bombeiro escrito em português e em Libras, ela fez o sinal da palavra em língua de sinais e repetiu a palavra em datilologia. Pode-se perceber que, de um modo geral, as crianças gostaram muito de 196 montar o quebra-cabeça e, quando estavam em grupo, uma colaborava com a outra. Em relação à tarefa de associar a palavra à imagem, no início da experimentação as crianças entravam na tela e saíam imediatamente, pois a tela só tem palavras em português e, como elas não as associavam a nada, saíam imediatamente. Entretanto, depois de navegar pelas tarefas montando o quebra-cabeça, o liga-pontos e passear pelos cenários, elas começaram a entrar naquela tela, passando a experimentar as opções possíveis, descobrindo que para cada palavra escrita em português havia uma chamada para um vídeo em Libras. Com o auxílio do consultor, uma das crianças passou primeiro a tentar reconhecer a palavra em português para depois associá-la à imagem correspondente. Na quarta tarefa, depois de ler todas as palavras, ela arrastou a imagem para a palavra correspondente e vibrou quando acertou. Na atividade de liga-pontos as crianças tiveram bastante desenvoltura. Como aconteceu anteriormente, quando completaram a tarefa e apareceu a palavra escrita em português e o vídeo em Libras, elas repetiram a palavra em Libras e em datilologia. Na tarefa livre de desenho, as crianças foram explorando e experimentando as ferramentas e descobrindo suas funções, criando cenários, personagens, apagando os desenhos, aumentando e diminuindo os elementos, colocando para frente para trás as imagens e assim por diante. Depois, apagavam tudo e iniciavam um outro desenho. As professoras comentaram que o jogo está condizente com a realidade de ensino-aprendizagem das crianças e disseram que, além dessa maneira espontânea de explorá-lo, elas podem apresentar o jogo de modo mais direcionado para as crianças, desenvolvendo conteúdos mais específicos, como, por exemplo, estudar sobre animais; desenhar cenários e animais; utilizar o dicionário disponibilizado no jogo para as crianças aprenderem tanto os nomes dos animais em português quanto em Libras, pois o contexto do jogo está rico e motivador. A experimentação teve a duração de 1 hora 30 minutos, e as tarefas que o jogo possibilita desenvolver foram exploradas satisfatoriamente. De um modo geral, as crianças conseguiram fazer a pontuação de 01 cenário completo, pois nessa experimentação elas navegaram de uma forma aleatória, como é comum no meio digital. 197 Anais do Congresso À guisa de conclusão Ao desenvolver um material educativo, é indispensável considerar que a aprendizagem é melhor e mais duradoura quando adquirida de forma ativa. O objeto que foi projetado, além de oferecer possibilidades de interpretação e permitir a participação ativa de professores e estudantes no seu uso, tem por fio condutor múltiplos recursos de interatividade. Segundo o entendimento do grupo de pesquisa, todo material educativo a ser projetado deve oferecer possibilidades de interpretação que demandam o desenvolvimento de juízos e a participação ativa dos intérpretes e não apenas uma simples relação de uso unilateral. Esta linha de atuação tem por base as idéias de Frascara (1988), para quem, no “design” educativo, o indivíduo é motivado a pensar, julgar e desenvolver-se independentemente. De acordo com esse autor, educar é mais que ensinar, e relaciona-se com o desenvolvimento total do indivíduo como ser social, e não somente como acumulador de conhecimentos. Ademais, a aprendizagem é melhor e mais duradoura quando adquirida de forma ativa. Com isso, amplia-se a abrangência do material educativo para fora dos muros da escola. Particularmente, o trabalho aqui relatado exemplifica o modelo triangular que deve compor as atividades desenvolvidas no âmbito da universidade: incluiu a pesquisa, contemplado que foi com duas bolsas de órgãos de fomento – FAPERJ e CNPq –, o que permitiu o projeto e a confecção do material educativo e viabilizará a continuidade desta investigação; teve reflexos no ensino, com a vinculação de bolsistas PIBIC/CNPq, de uma mestranda que defendeu dissertação tendo por base o mesmo tema, enfocando o Design da Informação de situações de utilidade pública, e de uma aluna de doutorado que está propondo um aprofundamento teórico da linha de pesquisa Design de Situações Educativas; desenvolveu trabalho de extensão universitária, por meio da parceria com o Instituto Nacional de Educação de Surdos, INES-RJ, na figura de fonoaudiólogos, professores, alunos e consultores em Libras. 198 Bibliografia Couto, R. M. de S.; Wilmer, C.; Portugal, C.; Correa, A. Do concreto ao virtual: interação e interatividade no letramento de indivíduos surdos. Anais do 2.° Congresso Internacional de Design da Informação (SBDI). São Paulo, 2005. COUTO, R.M.S.; PORTUGAL, Cristina. Design Didático aplicado ao letramento bilíngüe de crianças surdas. In: Anais do 7.º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design. Curitiba, 2006. COUTO, R.M.S.; PORTUGAL, Cristina. Jogo para auxiliar o letramento bilíngüe de crianças surdas. In: Anais do Congresso Internacional de Design. Lisboa, 2006. FRASCARA, J. Diseño gráfico y comunicación. Buenos Aires: Infinito, 1988. KOSLOWSKI, L. A proposta bilíngüe de educação do surdo. In: Espaço: Informativo técnico-científico do INES. n.º10, jul-dez, p. 47-53. Rio de Janeiro: INES, 1998. MACEDO, Lino; PETTY, Ana Lúcia Sicoli; PASSOS, Norimar Christe. Aprender com jogos. Porto Alegre: Artmed, 2000. MARTINS, Bianca Maria Rêgo. Design de Informação em situações de interesse público. 2007. Dissertação (Mestrado em Artes e Design), Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 183 p. NEVES, S. B.; GIANINI, E. Leitura em segunda língua por surdos: a produção de sentidos na abordagem histórico-discursiva. In: Anais III Conferência Sócio-cultural. Campinas, SP, 2000. PORTUGAL, Cristina. Design como interface de comunicação para ambientes de aprendizado mediados pela internet. 2004. Dissertação (Mestrado em Artes & Design). PUC-Rio. QUADROS, Ronice M. Educação de surdos: efeitos de modalidade e práticas pedagógicas. Temas em Educação Especial IV. Santa Catarina: EDOFSCar. 2004. 199 Anais do Congresso Sacks, O. Vendo Vozes: Uma viagem ao mundo dos surdos. São Paulo: Companhia das Letras, 1998. SKLIAR, C. (Org.). Educação & Exclusão: abordagens sócioantropológicas em Educação Especial. 3. ed. Porto Alegre: Mediação, 1977. TWYMAN, Michael. L. A schema for the study of graphic language. In: Processing of visible language. Nova York & Londres: Plenum Press, vol. 117-150, 1979. VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1984. _____. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1987. 200 MESAS-REDONDAS NACIONAIS PROJETO CINES – CINEMA DO INES Maria Lucia Cunha1 “... o ser diferente é excluído porque vira desafio, ameaça” Objetivo: Encontrar uma forma pedagógica de trabalhar o cinema na escola como fator de introdução de pessoas Surdas no mundo da literatura e das novas tecnologias de informação e comunicação O ensino de literatura e do cinema na escola promove o contato com novas realidades. A presença das novas tecnologias de informação e comunicação na escola abre janelas e novas possibilidades. Estas criam alternativas para o ensino, propondo a quebra de paradigmas. O pensamento linear é substituído pelo pensamento hipertextual. O hipertexto é um caminho, às vezes mais de um, que se pode percorrer, ou não, para acessar informações. Sabendo sempre que se pode voltar e começar tudo de novo. Mas quando voltar já não será o mesmo.... Pensamentos fragmentados sempre me invadiram ao imaginar de que maneira poderíamos inserir as novas tecnologias de comunicação e informação, como elemento catalisador de um movimento necessário para que possamos entender a educação de uma forma diferente. Com esse fim, proponho novos caminhos, novas possibilidades, novas alternativas de ensinar e de aprender que determinam o trabalho proposto para o ensino de literatura para pessoas surdas. Desde julho de 2006 venho desenvolvendo o Projeto CINES com o qual pretendo através de uma rede de conhecimentos, promover links de ensino entre a literatura, o cinema e a informática. Avaliar esse trabalho é um pouco difícil, pois tudo é muito recente. Não há ainda um distanciamento histórico que permita uma avaliação profunda de todo o processo, além disso, minhas impressões estão carregadas de envolvimento, o que muitas vezes não permite um julgamento imparcial dos fatos. Apesar disso algumas observações já podem ser feitas. Nossa história, começa com o filme Romeu no Mundo de Julieta, uma releitura do filme de Franco Zeffirelli adaptado da obra de William 1 INES – Brasil. Prof.ª de Literatura. Prof.ª Pós-graduada em Docência no Ensino Superior ( UFRJ ) Idealizadora do Projeto CINES . 201 Anais do Congresso Shakespeare, feito de junho até setembro/2006. É simbólica a representação de novidade para a comunidade surda do INES de uma história escrita no século XVI lida, relida e adaptada inúmeras vezes em diversas línguas e em diferentes canais de comunicação. É surpreendente e assustador o vácuo de informações provocado pela falta de acesso aos bens culturais simbólicos, quase todos em língua escrita. E esta é uma das razões desse trabalho, propor o ensino de literatura através do cinema e o acesso a esse mundo distante. Ter contato com a literatura através de outras linguagens já é uma prática corriqueira usada pelo cinema, pelo teatro e pela televisão, a novidade é entender e inserir as novas linguagens de comunicação no contexto pedagógico. A escola continua a valorizar o texto escrito em detrimento da oralidade e do audiovisual, mesmo em uma sociedade cada vez mais envolvida pelas novas tecnologias de comunicação e informação. Com esse projeto proponho o audiovisual como texto. No nosso caso específico valorizar o visual é facilitar o desenvolvimento do trabalho sem termos comparativos. Até quando a escola deixará de aproveitar todo o encantamento que as novas tecnologias oferecem a essa nova geração? Esse é o grande desafio do professor do século XXI. Será que ele está preparado? Novas formas de aprender requerem novas formas de ensinar, novas habilidades e trocas de papéis. Alunos aprendendo sozinhos, alunos aprendendo com alunos, professores aprendendo com alunos e alunos aprendendo com seus professores, porém não mais como detentores absolutos de um saber que está cada vez mais disponível para todos. Que bom! Perdemos um pouco o poder, mas ganhamos o direito de não saber. Professor não é aquele que sabe tudo. Ninguém sabe tudo. Professor é alguém que pesquisa e que precisa estar preparado para ser parte fundamental nesse processo, que é o de ajudar a transformar as informações que navegam em tantas redes, em conhecimento. As novas tecnologias de informação e de comunicação, que modificaram nossa maneira de entender o mundo exercem um verdadeiro fascínio na pessoa surda. Não existe na comunicação humana nada que se compare com a Internet, portanto usá-la pedagogicamente além de ser fundamental para o desenvolvimento e envolvimento dessas pessoas com a grande rede é uma aposta certa de sucesso. Nosso segundo trabalho foi Olhar Surdo, de setembro até dezembro/2006, baseado no filme Filhos do Silêncio. Com formato de documentário, tratamos da incomunicabilidade humana, no caso específico, pessoas surdas emersas em um mundo ouvinte. Em ambos os filmes os alunos ficaram livres para expor suas dores e sofrimentos, seus dramas, suas dificuldades de comunicação e sua exclusão social, provocada pelo preconceito e a falta de visibilidade de sua Língua. 202 Essa temática parece ser uma prática comum em manifestações artísticas de populações que estão à margem, excluídas, na periferia social. O uso do cinema como fonte de conhecimento tornou possível o ensino de Literatura, ao permitir, através de um texto audiovisual, o acesso a histórias, a leitura que seria impossível em língua escrita. Acessar diferentes fontes, ter referências de vários autores de diferentes épocas e valores permitem que, ao entrarmos em contato com outras formas de pensar, reflitamos também sobre nós mesmos. O contato com novas histórias, novas visões de mundo e novas formas de pensar e de viver parecem ser condições indispensáveis para qualquer indivíduo que queira povoar seu imaginário e assim criar. Ninguém cria do nada. Um ser sem referências é uma pessoa com poucas possibilidades de usar sua imaginação e por isso, tornam-se almas e mentes engessadas incapazes de sonhar. Lygia Fagundes Telles em seu livro A disciplina do amor, faz algumas reflexões sobre o ato de contar histórias. Para ela conhecer histórias e saber contá-las ajuda a vencer o medo e as dúvidas do mundo em que vivemos. Essas reflexões indicam o valor do círculo de criação, feito de recepção e produção. Não basta ler histórias, é preciso contá-las e para isso é preciso conhecê-las. Pensando em tudo isso, o Projeto CINES propõe um ensino em redes de saberes e conhecimentos. Nesse ano começamos uma proposta de trabalho interdisciplinar, partindo de uma crônica de Rubem Braga, Ai de ti, Copacabana! Esta crônica é de 1958 e por ser um gênero efêmero e contextualizado historicamente, fala de um cotidiano, de uma época de fatos e de pessoas que já estão distantes e por isso, dissociada de sentido para leitores que não pertençam ao mesmo tempo histórico. A literatura foi o estofo do trabalho, mas para entendê-la melhor necessitamos de informações das seguintes disciplinas: história e biologia. Na tentativa de entendermos a educação e a busca pelo conhecimento através de novas alternativas de comunicação entre as disciplinas, iniciamos a elaboração de novos ambientes de aprendizagem, propondo o acesso às informações através de uma aprendizagem hipertextual. A quebra da linearidade permite que cada aluno escolha seu caminho e a profundidade de suas informações, que serão mediadas pela curiosidade e o interesse de cada um. Ao final, os alunos expostos a várias informações de diferentes fontes adquiriram conhecimentos para confeccionarem filmes sobre Copacabana. O Projeto CINES iniciou a partir da dificuldade encontrada para o ensino de literatura de uma forma convencional, ou seja, através da palavra, do texto escrito. Encontrou no cinema sua fonte de conhecimento, seu texto; 203 Anais do Congresso nas produções fílmicas, suas narrativas e na informática sua ferramenta para editar as idéias propostas. Apesar de recente esse projeto já oferece possibilidades de propor novos caminhos para pessoa surda em busca de um cinema de identidade que será todo feito pelos surdos gerenciados pelo GINES, grêmio do INES. O cinema é um canal de comunicação tão poderoso que não podemos ter a visão ingênua e romanceada de usá-lo em uma comunidade, que precisa tanto de visibilidade, só para contar histórias. Cinema filma, revela e pode transformar a realidade. Deve ser usado como janela para novos mundos e para novas possibilidades. Aprendendo com a experiência de outros e também apresentando a nossa. A língua usada em nossos filmes é logicamente a LIBRAS e ao usá-la dessa forma percebemos sua força ao apresentar histórias que emocionam, divertem e podem provocar mudanças na forma de aceitação da diferença da pessoa surda. Encontrar alternativas que promovam a inserção de pessoas surdas em qualquer contexto social, parece ser uma das metas de uma educação que precisa ser cada vez mais ser inclusiva. Sem apontar seus estereótipos apresentamos sua diferença, expomos seu potencial e suas necessidades. Percebo com muita alegria a participação dos alunos nessa proposta de trabalho, me surpreendo, me encanto e ratifico mais uma vez a necessidade de entendermos a educação de uma forma diferente, principalmente para pessoas com outras peculiaridades.. Os objetivos propostos inicialmente continuam os mesmos, apostar no inesperado, na espontaneidade da pessoa surda é captar instantâneos da vida sem ensaios, sem repetições. É a busca da simplicidade do que é natural no ser humano que habita em todos nós. Filmamos rápido captando as primeiras emoções, deixando fluir, é um trabalho feito por surdos , para surdos e ouvintes e muito prazeroso para todos. Não procuro artistas, apesar do envolvimento quase natural com a arte e a representação, pretendo formar pessoas que pensem, criem e reflitam sobre sua realidade. Procuro incentivá-los a descobrir o seu melhor, o seu prazer, o seu desejo. Entendo o cinema como arte coletiva, onde todos os papéis são importantes e por respeitar o coletivo incentivo a troca de papéis, o gosto pelos bastidores e a rede de relacionamentos. Os “famosos” os protagonistas do primeiro filme se transformaram em roteiristas, diretores, câmeras, fotógrafos e além de perceberem a importância de cada papel praticam uma realidade social bem contemporânea que é a de assumir múltiplas faces em uma realidade cada vez mais fragmentada. Tudo está no início. Não sei onde chegaremos. A vida é feita de tentativas. De riscos. Às vezes acertamos, outras não. Mas de uma coisa tenho certeza a auto-estima desses alunos nunca mais será a mesma. Pessoas capazes de 204 inventar histórias e transformá-las em filmes modificam seus ambientes internos, criam novos caminhos, ficam mais fortes e mais felizes. E ser feliz é tanto que é quase tudo. Bibliografia DUARTE, R. - Cinema e Educação – Editora Autêntica ASSMANN, H. (org) Redes Digitais e Metamorfose do Aprender Editora Vozes CITELLI, A (coordenador) Outras linguagens na Escola – volume 6 Editora Cortez TEDESCO, J.C (org) Educação e Novas Tecnologias: Esperança ou incerteza? YUNES, E (org) – Pensar a Leitura: complexidade - Editora Puc – Rio TELLES, L. F - A Disciplina do Amor - Editora Rocco 205 MESAS-REDONDAS NACIONAIS SURDEZ E TRANSTORNOS INVASIVOS DO DESENVOLVIMENTO Paulo Mattos1 Os transtornos abrangentes, também denominados invasivos ou globais, compreendem um grupo de desordens que incluem o Autismo clássico, o Asperger e vários quadros menores, compondo o Espectro Autista. As dificuldades de comunicação fazem parte da tríade de sintomas destes transtornos, juntamente com falhas significativas na interação social e presença de interesses restritos ou estereotipados. Deste modo, é necessário identificar crianças com transtornos abrangentes no universo de portadores de dificuldades de comunicação; mais da metade dos autistas não fala. O diagnóstico deve ser o mais precoce possível, uma vez que as estratégias reconhecidamente eficazes para o tratamento são bastante especificas e exigem profissionais experimentados. Não é incomum na pratica clinica que pacientes só recebam este diagnóstico mais tardiamente, quando existe um significativo atraso escolar, graves dificuldades de relacionamento social e familiar, além de sintomas secundários. Bibliografia CUNHA JA e cols. Psicodiagnóstico-V: 5a edição revisada e ampliada. Artmed, Porto Alegre, 2000. Médico Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. [email protected] 1 206 MESAS-REDONDAS NACIONAIS TRANSTORNOS DO DESENVOLVIMENTO E SURDEZ OBSERVAÇÕES E PRÁTICAS Correlação de fatores etiológicos e déficits cognitivos e/ou distúrbios comportamentais em portadores de surdez Roberta Pinheiro Lima* Não tenho como iniciar esta palestra sem falar de meu passado profissional, pois foi em função deste histórico que cheguei às conclusões que ora apresento. Sou redistribuída da antiga FCBIA (ex-FUNABEM), e lá trabalhei voltada para jovens adolescentes com distúrbios de conduta, vivência de rua, dependência química e/ou tráfico de drogas. Não utilizava testes, sendo minha abordagem direta, cujo canal de comunicação era pleno, baseado no diálogo e na observação da expressão corporal, que muitas vezes nos diz mais do que simples palavras. Trabalhava no pátio, interagindo com os então “menores”, forma através da qual conseguia adquirir o que formalmente era mais difícil: confiabilidade. Ao ingressar no INES em 1996, deparei-me com a barreira da língua, e, embora buscasse aprender a LIBRAS, fui designada ao atendimento de crianças da estimulação precoce, educação infantil e ensino fundamental, primeiro ciclo, ou seja, em sua maioria não comunicantes. Se considerarmos que, para aprender uma língua mais facilmente, necessita-se vivenciar a cultura a esta relacionada, ficava claro que eu enfrentaria problemas. Não tive auxílio de outros profissionais da área, e, nesses onze anos de trabalho, desenvolvi estratégias próprias, adaptadas a partir de campos os quais me vi obrigada a buscar, entre eles a neuropsicologia no CNA/RJ (curso básico). Sou a única psicóloga atuante na instituição há pelo menos seis anos, cujo contingente oscila em torno de cerca de seiscentos alunos. * Psicóloga do INES 207 Anais do Congresso O que mais me chamou a atenção inicialmente foram os problemas comportamentais e afetivo-emocionais, frente à vasta gama de casos encaminhados. Na ocasião também reparei que um grande número de alunos do ensino fundamental do primeiro ciclo eram maiores de idade, estudando em horário diurno e com crianças de faixas etárias bem diferenciadas – o que significava várias repetências. Logo constatei duas situações: 1. as dificuldades de interação interpessoal eram conseqüentes de uma falta de comunicação comum entre o surdo e sua família, na maioria de ouvintes, não comunicantes de LIBRAS, o que gerava grande parte dos distúrbios comportamentais observados; 2. os surdos levavam anos para serem alfabetizados, aparentemente apresentando uma série de disfunções cognitivas. Portanto, considerando que linguagem e cognição estão intimamente interligadas no processo de desenvolvimento humano; considerando que a ausência de um canal comunicativo comum também favorecia problemas de relacionamento de amplo espectro, concluí que necessitava entender de forma mais objetiva e aprofundada o funcionamento desse indivíduo surdo. Nesse contexto, como iria avaliar as reais causas desses problemas? Vi-me obrigada a buscar no psicodiagnóstico, realizado por meio de testes psicométricos, uma forma de amparar minhas intervenções; e na neuropsicologia, que então emergia como instrumento de abordagem, elementos para analisar as causas do fracasso escolar desses indivíduos. É importante frisar que não existem testes validados para pessoas surdas; portanto, elaborei adaptações, e minhas conclusões se basearam não em escores absolutos, mas em dados qualitativos, o que, para fim de pesquisa, não é considerado válido. Se aplicados e computados os valores dados aos ouvintes, os surdos seriam em sua totalidade identificados como infradotados, o que não é verdadeiro. Efetuei um levantamento considerando o contingente existente hoje no INES, que é flutuante, e associei alguns casos de ex-alunos submetidos às referidas avaliações (Fig. 1). 208 Levantamento de Alunos Alunos do INES Pesquisados 5% Ex-Alunos do INES 95% Fig 1 Tipo de Levantamento Sem Dados 10% 8% Anamnese 47% Avaliações Completas 35% IFF Fig 2 Note-se que grande contingente do INES sequer foi submetido a qualquer tipo de avaliação ou possui registro de informação, o que indica que há muito aprofundamento a ser feito para chegar-se a conclusões mais expressivas (Fig. 2). Dos alunos pesquisados, a maioria não foi submetida a testes psicométricos e/ou neuropsicológicos, restringindo-se a dados de prontuário, nem sempre completos. A quantidade de avaliações “formais”, portanto, é insignificante, considerando o quantitativo de alunos que subjetivamente apresentam problemas. 209 Anais do Congresso Um outro fator que ficou claro, assim que iniciei meus passos na neuropsicologia, foi que os fatores etiológicos, bem como os dados contidos nas anamneses não estavam claros, sequer eram considerados com relevância. Muitos prontuários apresentavam inúmeras informações, mas não havia um interesse em correlacionar fator etiológico à história do aluno, seja no âmbito comportamental ou escolar. Os surdos foram submetidos por décadas à oralização como único processo comunicativo. Não lhes foi dado o direito a relacionarem-se na sua língua natural, que foi traumaticamente cerceada. No momento em que esse panorama sofreu radical modificação, com a aceitação da LIBRAS e do respeito à cultura surda, a conseqüência foi a rejeição dos modelos médicos e/ou clínicos, até então existentes, o que gerou um fosso informativo, vez que os profissionais, ao que parece, passaram a negligenciar tais dados. A partir de 2001, com o início do Programa Centro de Atendimento Alternativo Florescer – CAAF/ INES –, do qual fiz parte integrante e que objetivava o atendimento a múltiplos deficientes, criei então uma anamnese mais aprofundada, que contemplava informações que subsidiaram minhas observações. Posteriormente esse instrumento, ou parte dele, passou a ser utilizado em toda a escola, chegando-se a conclusões que ora se seguem (Fig. 3): Idiopatica Rubéola Congênita 5% 4% 2% Sem informação 17% Alunos com mais de um Fator para Surdez Meningite 7% 8% 15% Antibioticoterapia Anóxia 8% Genética/sindrômica 9% 11% Etiologia Para Surdez Fig 3 210 Prematuriedade 14% Outros Fatores Outras Condiçoes Víróticas/Bacterianas Ora, a primeira coisa que reparamos é o grande contingente de alunos que apresentam fatores idiopáticos (sem causa definida), seguidos por aqueles portadores de rubéola congênita, que produz inúmeras seqüelas, incluindo retardo mental. Em terceiro lugar aparecem aqueles que sequer possuem qualquer informação de base etiológica. A meningite, que atinge o córtex cerebral e pode causar outros comprometimentos cognitivos, é seguida pela prematuridade e antecedida por casos que possuem mais de um fator para surdez, ou fatores conjugados. A antibioticoterapia relaciona-se à ototoxidade, que atinge crianças nascidas ouvintes. A anóxia é seguida pelos fatores genéticos e/ou sindrômicos, que podem ou não estar associados a outros déficits cognitivos. Outras causas, como gestação de risco, otites de repetição, fator RH, etc. são seguidos de condições viróticas ou bacterianas, como sífilis, citomegalovirus, dentre outros. Note-se que a maioria é caracterizada por fatores ambientais. Devo ressaltar que a prematuridade gera infecções e condições pós-natais que podem desencadear outros fatores causadores de surdez, mas que aqui não foram devidamente correlacionados por falta de maiores informações. A anóxia, constatada como fator, mais recentemente pesquisado, pode estar associada a quadros idiopáticos ou sem informação, simplesmente porque sequer foi alvo de anamneses anteriores. Dos indivíduos que comprovadamente tiveram causa da surdez relacionada a anóxia, somente dois casos foram identificados por exames de ressonância magnética. Porém, considerando-se lesões mais difusas, que aparecem somente em exames funcionais, temos apenas o registro subjetivo. Outra constatação é de que grande parte dos responsáveis não receberam ou perderam o boletim de alta hospitalar, o que dificulta ainda mais a confirmação dos dados. Em 2006, minha colega do Serviço Social apresentou, no Congresso Internacional do INES, a correlação entre condições sociais e as causas da surdez – um estudo inédito, que objetivava mostrar que os fatores ambientais, passíveis de prevenção, eram causadores de surdez, pelo menos no universo do INES, cuja população em sua maioria é de baixa renda. Neste trabalho, pretendi demonstrar que tais fatores etiológicos produzem também outros comprometimentos cognitivos e/ou comportamentais que interferem no pleno desenvolvimento do surdo. 1 Rosária de Fátima Correa Maia – Assistente Social da DISOP/INES – Divisão Sociopsicopedagógica, à qual também pertenço. 211 Anais do Congresso É imprescindível enfatizar que, ao longo de anos, a população do INES era, em sua maioria, constituída de surdos ditos “puros”. Isto porque aqueles muito comprometidos ao nascimento, em geral, não sobreviviam. Com o desenvolvimento da medicina neonatal, as crianças começaram a sobreviver, a partir de cuidados médicos especializados, mas ainda sem condições ou qualidade de vida. Por essa razão, na última década começamos a receber um contingente de surdos que apresentavam, de forma menos sutil, déficits intelectivos, cognitivos e motores, que deixavam clara a necessidade de um melhor suporte diagnóstico e conseqüente acompanhamento. Os dados adiante, embora não reflitam a realidade subjetiva vivenciada em sala de aula, indicam que um aprofundamento faz-se necessário, a fim de se atender essa demanda reprimida. Percebe-se, ainda, que questões comportamentais aparecem com dimensão ligeiramente superior à das questões cognitivas. Isso reflete as dificuldades de comunicação encontradas dentro da família, mas não se descartam as lesões neurológicas que interferem no funcionamento eletroencefálico, o que, dependendo da área afetada, pode favorecer mudanças de humor e comportamento (Fig. 4). Quanto aos fatores cognitivos aqui relacionados, cabe enfatizar: problemas atentivos de variado espectro, déficits mnêmicos, seqüenciamento lógico, percepção visual (rubéolicos), déficits na compreensão, déficits na aquisição de linguagem, vez que alguns alunos, embora expostos à LIBRAS desde pequenos, não conseguem desenvolver nem a língua gestual, nem a oral, nem a escrita. Tais achados refletem a perspectiva de lesão cerebral relacionada a algum dos fatores etiológicos anteriormente descritos. Também foi percebido que o seqüenciamento lógico em alguns casos se dá de forma correta, mas invertidamente. Isso poderia refletir a própria estrutura da LIBRAS, que é taquigráfica e igualmente inversa ao português. Mas ainda é uma questão a ser aprofundada. 212 Sem Transtornos Transtornos Encontrados 3% 4% 5% 7% 3% 3% Comportamentais Cognitivos 2% Déficits Intelectivo Multiplo Deficiente 62% 11% Motores Transtornos Específicos do Desenvolvimento Afetivo/Emocionais Transtornos Inespecíficos do Desenvolvimento Fig 4 Os transtornos específicos identificados frente ao total de alunos encontrados no INES (Fig.5) representam valores insignificantes, mas, se correlacionados apenas entre eles (Fig. 6), verifica-se que os quadros psicóticos e o Transtorno do Déficit de Atenção são os mais perceptíveis. Transtornos Específicos - População 0% Fig 5 1% Geral Total de alunos 1% TDAHI 1% Psicóticos Hiperléxicos 97% Autistas Transtornos Específicos do Desenvolvimento 18% Fig 6 35% TDAHI Psicóticos 12% Hiperléxicos 35% Autistas 213 Anais do Congresso O Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade e Impulsividade (TDAHI), em surdos, não é considerado pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Doença Mental (DSM-IV), instrumento internacional que disciplina as categorias de desordens mentais. Isto porque os surdos, por serem portadores de perda sensorial, costumam, em sua maioria, apresentar comportamentos desatentos e por vezes hiperativos, até que sua comunicação se estruture e ele passe a se fazer entender. Entretanto, os seis casos identificados, alguns diagnosticados no INES, vêm sendo tratados clinicamente com metilfenidato (ritalina), respondendo com efetiva positividade. Isso leva à inferência de que, apesar de não esperado, alguns surdos apresentam sinais e sintomas clínicos de transtornos do desenvolvimento específico, independentemente do quadro sensorial. Um grande contingente de surdos podem apresentar quadros de psicose, hiperatividade e autismo sem que efetivamente sejam portadores de doença psiquiátrica. Isso tem sido comumente observado entre pessoas surdas adolescentes ou adultos que não desenvolveram qualquer tipo de comunicação. Por apresentarem vida interior como qualquer indivíduo dessa faixa etária, sem conseguir expressar seus sentimentos, eles acabam por fazer “surtos”, ou quadros funcionais sugestivos de doença psiquiátrica, geralmente tratados com tranqüilizantes e/ou barbitúricos, sem que a causa principal seja identificada ou minimizada. Esta fala objetiva desmistificar os estereótipos de que surdos são mental e/ou cognitivamente prejudicados. Ao contrário, surdez não é sinônimo de incapacitação. Porém, não se deve desconsiderar que alguns fatores etiológicos podem influenciar o desenvolvimento de indivíduos surdos. A preocupação é entender como isso ocorre e de que forma se pode prevenir e garantir melhor qualidade de vida a esses indivíduos, seja na área do relacionamento, seja na do aprendizado. 214 MESAS-REDONDAS NACIONAIS Descrição da língua de sinais: desafios teóricos e práticos Prof. Dr. Tanya Amara Felipe (FENEIS)1 Resumo: Este trabalho apresenta um estudo sobre o uso de classificador em relações anafóricas. Os dados foram coletados no Corpus do Projeto Tradutor: LIBRAS x Português, 2004. O trabalho procura demonstrar que, nessas relações, há uma anáfora associativa com função coesiva e que esse tipo de anáfora indireta pode ser correferencial e parece basear-se numa associação que pressupõe um conhecimento lexical preexistente. Esta descrição, mesmo ainda preliminar, permite refletir sobre a existência de complementaridade entre a abordagem léxico-semântica e a cognitivotextual na análise da funcionalidade do léxico no texto. Palavras chave: correferência textual, linguagem natural, anáfora, meronímia, classificadores na Libras, anotação de corpus. 1.Introdução Este trabalho, na área de Lingüística aplicada à Língua de Sinais Brasileira, a Libras, surgiu em decorrência da pesquisa Tradutor: Português x Libras, quando descrevíamos gramaticalmente textos em Libras para o processamento de linguagem natural. Por isso o objetivo dessa pesquisa é propiciar descrições gramáticas da Libras para o tratamento computacional de um corpus lingüístico visando à resolução da correferência em textos da Libras que serão traduzidos para a Língua Portuguesa. Ao depararmos, a partir de dados coletados, com expressões lingüísticas que não poderiam ser classificadas em termos de classes gramaticais, tentamos identificar essas seqüências de expressões que se referiam a uma mesma entidade. Para isso Consultora na área de lingüística, Lingüística Aplicada, Estudos sobre a Libras, Educação de Surdos. Coordenadora, pela Feneis, do Programa Nacional Interiorizando a Libras. Coordenadora do GPLIBRAS do Projeto Tradutor: LIBRAS X Português. Financiado pelo MEC/FNDE - FENEIS [email protected] 1 215 Anais do Congresso estamos trabalhando inicialmente com o caso particular dos classificadores em função anafórica. Este estudo sobre o uso anafórico dos classificadores foi realizado em um corpus de frases filmadas e transcritas de um livro didático que estava sendo utilizado para o trabalho de tradução automática. Assim, ele poderá servir para o desenvolvimento de uma interface para a realização manual de anotação de correferência e servirá de base para a construção e avaliação do sistema que está sendo desenvolvimento para esse trabalho de tradução, uma vez que a compreensão de relações anafóricas é uma tarefa fundamental do parser sintático, isto é, do mecanismo de processamento de frases. As questões básicas da área da atribuição da correferência estão relacionadas a se, quando e como as relações correferenciais corretas são estabelecidas entre os componentes de uma frase. O foco dessa pesquisa está na possibilidade que têm elementos referencialmente dependentes, tais como os classificadores, de facilitar a compreensão de um sintagma nominal mencionado previamente. Nesse processo de tradução da Libras para o Português, deparamos com a impossibilidade de traduzir uma língua, que se apresenta tridimensionalmente, a partir de unidades lineares que não conseguem dar conta de correferências espacializadas a partir de classificadores que são anáfora meronímicas. 2. Escolhas de teorias para análise de línguas A partir dos estudos saussurianos, uma perspectiva estruturalista norteou os estudos lingüísticos e, com o advento do gerativismo, esse enfoque formalista se aprofundou. As línguas, enquanto sistemas, conjuntos de regras nos níveis fonológico, morfológico e sintático foram analisadas separadamente do usuário e das situações de uso e a linguagem foi vista apenas como uma manifestação biológica da natureza humana, fazendo parte dos estudos das ciências naturais. A partir de meados dos anos 60, com o surgimento da Sociolingüística com suas várias vertentes de concepções sobre variação lingüística, tanto variacionista como culturalista, as línguas passam a ser analisas como fato social, inserido em uma cultura. Além dessas abordagens sócio-antropológicas, as línguas foram também estudadas sob perspectivas da Psicolingüística, da Lingüística Aplicada, da Gramática de casos, da Análise do Discurso e da Análise da Conversação, considerando as questões sobre aquisição de língua e ensino de língua como primeira língua - L1 e segunda língua - L2, aspectos semânticos, cognitivos e pragmáticos das línguas, relacionados, também, enquanto atos de fala, às diversas situações de fala e usos por grupos sociais e outras variáveis. 216 Assim, a unidade lingüística para estudo não seria mais somente a frase, mas o texto como uma rede constituída de elementos coesivos que estabelecem a sua coerência, como propôs a Lingüística textual. Com o advento Lingüística Computacional, que utiliza procedimentos automáticos para análise de dados, tem-se expandido o conceito de classe de palavras para o de categorias morfossintáticas, a fim de melhor aproveitar as informações disponíveis nas formas literais. Para isso já existem programas capazes de atribuir classes gramaticais às palavras de um texto legível por máquina automaticamente. Estes programas são geralmente chamados de rotuladores de estruturas/categorias morfossintáticas, cuja complexidade do esquema de rótulos tem variado, mas sempre têm estado presentes certas classificações básicas como substantivo, verbo, adjetivo e pronome. Mas embora esses rotuladores sejam capazes de atribuir uma classificação a todas as palavras de um texto, há necessidade de se repensar essas categorias para contemplar especificidades das línguas gesto-visuais como, por exemplo, os classificadores. Assim, esse estudo dos classificadores em função anafórica se insere no tipo de abordagem de fenômenos lingüísticos, atualmente conhecida como Lingüística de Corpus, uma vez que a interpretação do fenômeno lingüístico foi baseada na observação dos dados do corpus e não em intuições da analista. Daí, a partir de um mínimo de noções teóricas a priori, o resultado final da análise está fundamentado no uso real da língua, que induziu a formulação de uma gramática baseada na observação (Aarts 1991) e não em exemplos criados com o propósito de demonstrar concepções previamente definidas. Para essa abordagem proposta no projeto de tradução automática do português para a Libras, a anáfora deverá ser abordada depois que algumas análises preliminares forem realizadas sobre o texto que está sendo processado. Após essa fase de identificação da gramática da Libras, será a vez da resolução da anáfora, que é uma questão crucial no Processamento da Linguagem Natural (PLN). Muitos projetos na área da lingüística computacional, incluindo a tradução automática, a recuperação de informações e o processamento de diálogos têm que alocar uma parte do sistema para resolver esse problema. Isso implica também em decidir as abordagens teóricas que serão usadas e em qual estágio do processo devese abordar essa questão. Diante de todas essas abordagens teóricas que geraram diferentes enfoques para os estudos das línguas oral-auditivas, a partir da década de 60, surgiram também os estudos sobre as línguas gesto-visuais, ou seja, as línguas de sinais. 217 Anais do Congresso 3. Estudos sobre as línguas de sinais Há algumas décadas, a partir das pesquisas de Stokoe (1960) e Stokoe et al.(1965) que, nos Estados Unidos, vêm desenvolvendo-se pesquisas sobre a American Sign Language (ASL). Com esses estudos, lingüistas de outros países começaram a pesquisar também as línguas de sinais de suas comunidades Surdas. Os primeiros estudos, sobre a ASL e outras línguas de sinais, relacionados a concepções estruturalistas e gerativistas, mostravam que as línguas de sinais possuem os mesmos universais lingüísticos com relação às línguas orais auditivas, variando apenas a modalidade e várias pesquisas apresentaram essas línguas em seus níveis fonológico, morfológico e sintático. Mas, como essas línguas possuem uma tridimensionalidade e outras características que as línguas oral-auditivas não possuem, outros paradigmas precisaram ser criados para dar conta da descrição dessa nova modalidade de língua e os estudos avançaram não apenas na perspectiva do que seria universal, mas apresentando as diferenças e contribuição desses estudos para a compreensão da linguagem. Assim, começaram as análises dos elementos não-manuais, ou seja, os estudos das expressões faciais e corporais enquanto componentes lingüísticos a partir da análise do nível morfológico-sintático e, depois, semântico-pragmático dessas línguas. O texto tornou-se também a unidade de análise. Pesquisas na área da neurolingüística e psicolongüística também contribuíram para abrir discussão sobre a importância da aquisição dessas línguas, como primeira língua (L1), por crianças surdas. A aquisição de certos aspectos da gramática da ASL foi, também, pesquisada como, por exemplo: a aquisição de pronomes dêiticos (Hoffmeister,1978; Pizzuto & Williams,1980; Bellugi & Klima,1981,1982; Petitto,1983), as relações semânticas (Newport & Ashbrook,1977), a aquisição da fonologia da ASL (Boyes-Braem,1973 e McIntire,1977) e estudos de input para a aquisição da ASL (Maestas & Moores,1980; Kantor,1982a,b; Launer,1982a,b; Meier,1983). Todas estas pesquisas citadas tiveram como sujeitos, crianças surdas, filhas de pais surdos, portanto, a aquisição da ASL se deu como L1, mas, além destas pesquisas, outras foram feitas também com crianças surdas, filhas de pais ouvintes e com crianças ouvintes, filhas de pais surdos (Schlesinger & Meadow,1972; Prinz & Prinz,1979; Bonvillian, Orlansky & Novack,1983). Outros, ainda, também pesquisaram as crianças surdas com pais ouvintes que, devido ao fato de não serem expostas à ASL, desenvolveram sistemas de comunicação gestual inventados (Goldin- 218 Meadow & Feldman,1975; Feldman, Goldin-Meadow & Gleitman,1978, Goldin-Meadow & Mylander,1983,1984) e, pesquisas apresentaram o sucesso do aprendizado da ASL, embora as crianças tivessem sido expostas em um período posterior ao “período crítico” para a aquisição de uma língua ( Mayberry, Fischer & Hatfield,1983). Os dados coletados para estas pesquisas variaram, tendo a ASL como L1 ou L2, a Língua Inglesa como L1 ou L2, conversas espontâneas de crianças, interação de mãe surda com criança surda, de mãe ouvinte com criança surda, e de pais surdos com criança ouvinte, além de dados licitados específicos. Destas pesquisas pôde-se destacar que o processo de aquisição da ASL é igual ao processo de aquisição de línguas oral-auditivas, ou seja, obedecendo a maturação da criança que vai internalizando a língua a partir do mais simples para o mais complexo, segue as mesmas fases das crianças ouvintes (Felipe, 1992a). As pesquisas sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras teve início na década de 80 e sob influência dos estudos principalmente da ASL, os pesquisadores do Brasil também começaram as pesquisas sob uma perspectiva estruturalista e gerativista, mas abordando também aspectos semântico-pragmáticos. (Felipe, 2000). 4. Os estudos sobre Anáfora na Lingüística de corpus O estudo da anáfora tem sido instigante e vários pesquisadores de diferentes enfoques teóricos têm proposto conceituações e tipologias formais, semântico-pragmática . Segundo Ducrot e Todorov (1972:358), um segmento do discurso é compreendido como anafórico, quando para interpretá-lo há necessidade de se reportar a um outro segmento mencionado anteriormente no discurso, ou seja, segundo Kuramoto (1995), o termo fonte da anáfora. Assim, há Anáfora, quando se estabelece uma relação de referência ou co-referência com algum tema do texto. (http://www.inf.unisinos.br/ ~renata/[email protected]) A anáfora também vem sendo estudada sob a perspectiva da cognição, como nos trabalhos de Langacker (1996) Van Hoek (1992), sob a pesrpectiva do discurso, como os trabalhos de McEnery and Botley (1998) e Indursky (1997), sob a perspectiva das restrições textuais, como os trabalhos de Dagani and Itai (1990), Nasukawa (1994) e Mitkov and Belguith (1998) e ainda sob a abordagem de “mecanismos de rastreamento”, como o trabalho de Du Bois (1980). 219 Anais do Congresso Essas pesquisas na área da computação e linguagem natural têm buscado na psicolingüística e na Teoria da Reativação fundamentos para avaliar a compreensão da relação entre a anáfora objeto e seus antecedentes, uma vez que a compreensão de relações anafóricas é uma tarefa fundamental do parser sintático, isto é, do mecanismo de processamento de frases. Há pesquisas cujos enfoques são os elementos referencialmente dependentes que estabelecem relações de correferência. Segundo Tulvin e Schacter (1990), a memória de reativação é uma forma não-consciente da memória humana desempenhar um papel fundamental na identificação perceptual de objetos lingüísticos. Pesquisas na área de processamento de linguagem natural (PLN), como as de Adriens(1986), Devos (1988), Fum (1988), Csuhaj-Varju (1993), Boitet (1994), Guha (1994), entre outros, têm sido ultimamente identificadas pelo termo engenharia de linguagem natural. Esses estudos, através de um tratamento computacional de um corpus lingüístico, têm por objetivo identificar as seqüências de expressões em um texto que se referem a uma mesma entidade, assim, visam à resolução da correferência e o estudo da Anáfora tem sido o objeto de várias dessas pesquisas A luz dessas novas pesquisas, devido à necessidade de se construir dicionários e tradutor por computador, houve uma mudança no tratamento dos dados da Libras que passaram a ser analisados a partir de um tipo de abordagem de fenômenos lingüísticos atualmente conhecida como Lingüística de Corpus, Poesio & Vieira (1998). Com já foi dito acima, esse enfoque se caracteriza pelo uso intensivo de dados coletados em situações reais de uso da língua para fins de comunicação. Portanto, o enfoque gerativista, que analisa os fenômenos lingüísticos a partir das intuições do analista, é confrontado com a análise dos dados coletados e observados em um corpus. Assim, essa análise tem como resultado o uso dessa língua em situações de fala, portanto, utiliza dados coletados a partir dos usos dessa língua e não exemplos criados com a finalidade de comprovar um determinado enfoque teórico. A perspectiva é inversa, ou seja, dos dados busca-se a teoria, como afirma Aarts (1991). Essa abordagem está sendo possível graças às inovações tecnológicas que têm permitido armazenamento e confronto de grande número de dados. Assim, nesse estudo, optou por uma análise das restrições sintáticasemânticas e textuais, pressupondo-se que uma descrição completa de aspectos restritos ofereça uma contribuição maior para o mapeamento de todo processo. 220 4.1. Anáfora Indireta e Meronímia A conceituação de anáfora adotada neste trabalho é o nome dado a uma relação ou processo no qual um termo anafórico em uma instância de discurso se vincula a um elemento identificável, chamado de antecedente, para que a interpretação semântica seja realizada com êxito. Vários autores, citando VIEIRA, Renata. et al. (2000) e Marcuschi (2000), têm apresentado os seguintes tipos de anáforas: Anáforas diretas, : Anáforas indiretas, Associativas e Novas no discurso. Para nos atermos apenas em um desses tipos, as “Anáforas indiretas têm o mesmo critério semântico de classificação das descrições anáforas indiretas. O que as difere destas é que não têm o mesmo nome-núcleo do seu antecedente. Este pode ser um sinônimo do antecedente ou mesmo uma elipse. Mas, como as anteriores, referem-se à mesma entidade já introduzida no discurso.” Dividindo esse tipo de anáfora indireta em outros três subtipos, o autor apresenta um deles como sendo a anáfora indireta de natureza mereológica, que é uma possibilidade inferencial inscrita no léxico, já que ela mantém uma relação de parte-todo com seu antecedente. Assim esse tipo de anáfora implica um processo de meronímia. Em trabalhos, como os de Lyons (1977), Cruse (1986), Tamba (1991), Vossen (1995), Diez Orzas (1999) e Salles (2000), a meronímia, sob um ponto de vista léxico-semântico, pode ser conceituada como uma relação semântica em que uma unidade léxica é parte de uma outra unidade léxica. Winston et al. (1987), propondo uma tipologia de seis categorias para essa relação semântica de meronímia, caracteriza uma delas como sendo uma relação componente-objeto integral, que corresponde à relação partetodo típica, ou seja, o “todo inclui a parte e é constituído por várias componentes, normalmente discretas, que apresentam limites e funções definidas em relação a esse todo.” (apud Silva) Aprofundando na conceituação da meronímia, VIEIRA, Renata. et al.(2000), argumenta que essa relação material-objecto corresponde a uma conexão entre uma entidade concreta e a matéria de que é feita essa entidade, sendo definida por esses traços relacionais. Assim, o todo liga-se às partes mediante uma dependência ontológica na qual se definem as suas partes necessárias ou típicas. A partir dessa conceituação, pode-se considerar a existência de dois tipos de merônimos : os canônicos, que correspondem às partes típicas de um todo, e os facultativos, que não se encontram inscritos no estereótipo do todo ao qual estão ligados. Portanto, a meronímia é especializada quando ocorre em contextos 221 Anais do Congresso específicos, nos quais se produz uma inferência automática e direta, freqüentemente relacionada com a existência de uma denotação prévia ao uso das unidades léxicas em contexto. Portanto, essas relações semânticas devem ser descritas tanto do ponto de vista do sistema como do uso. A meronímia foi estudada também sob um ponto de vista cognitivotextual por Koch e Marcuschi (1998) e por Silva (www.filologia.org.br/viicnlf/anais/caderno06-13.html - 101k). Nesse último trabalho, o léxico foi analisado “na dupla perspectiva de componente do sistema lingüístico e de estratégia lingüística em situação de uso.” Neste enfoque, o texto é visto como uma unidade de relações seqüenciadas, cuja tessitura se dá através de processos de progressão tópica e referencial, que vão estabelecendo as coesões e produzindo sentido. Assim, a partir desses estudos acima e do Projeto ANACORT (Anotação Automática de Correferência Textual), que teve como objetivo geral a construção e o tratamento computacional de um corpus lingüístico visando à resolução da correferência em textos da Língua Portuguesa, através da resolução automática que geraria as cadeias de correferência em textos da língua natural, podemos verificar como esse processo poderia acontecer na Libras e como as anáforas, na Libras, são fundamentais para a retomada de elementos informacionais no texto, estabelecendo uma relação complexa de manutenção e progressão textual. Assim, as relações lexicais anafóricas atuam tanto no nível da continuidade textual como no nível das inferências a ela subjacentes. Neste contexto, a anáfora indireta, constituída de meronímia apresenta uma saliência semântica de um objeto já introduzido no discurso, que implica um conhecimento de mundo e uma representação simbólica do objeto, que correferenciado, através de um classificador, garante a progressão referencial e progressão tópica, que como uma cena, um script, pode-se visualizar tridimensionalmente esse objeto na narrativa. Felipe (1992). 5. Exemplos de Classificadores enquanto meronímia no processo anafórico: Em estudos anteriores, Felipe (1998 e 2002) analisou os sob uma prespectiva morfo-sintático-semântica. A partir dos dados coletados, através de filmagens, para o Tradutor: Libras x Português, foi verificado a utilização de classificadores na seleção do léxico, quando se resgatava a memória textual na utilização de anáforas indiretas correferenciais. Nesses usos dos classificadores enquanto meronímias, podemos constatar que subjazem um conhecimento lexical pré-existencial à essas relações anafóricas, relacionado ao nível pragmático 222 e conhecimento de mundo do usuário. Por isso, o informante ao se referir ao sinal CASA, ao sinal LIVRO, ao sinal soletrado T-I-J-O-L-O e ao sinal soletrado M-O-R-R-O, manteve a progressão tópica, através de um classificador que, estabelecendo a coesão textual, apresentou uma característica do objeto: objeto pesado, plano e inclinado que situado no espaço, estabelecia as relações semânticopragmáticas com esse antecedente: CASA CASA-À-ESQUERDA 223 Anais do Congresso 224 À guisa de Conclusão • Esse estudo dos classificadores em função anafórica, inserindo-se no tipo de abordagem de fenômenos lingüísticos atualmente conhecida como lingüística de corpus, permite que a interpretação do fenômeno lingüístico seja baseada na observação dos dados do corpus e não em intuições da analista; • Esta descrição, ainda que sumária, permite reiterar a existência de complementaridade entre a perspectiva léxico-semântica e a perspectiva cognitivo-textual na análise da funcionalidade do léxico no texto; • Este princípio, que manifesta uma clara interdependência entre semântica e pragmática, visível nos sentidos lexicais e no texto, permite validar a hipótese de que uma teoria baseada no léxico para explicitar a anáfora é relevante desde que suportada por um esquema cognitivo e pragmático de análise. 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To understand the reason for many of these challenges, this paper starts with a review of the modality differences between signed and spoken languages. Challenges created by differences in modality and other factors are then presented. These include the lack of a written system to accurately represent signed languages, the diverse language background of deaf people, and the theoretical issues that can arise when we describe signed languages with linguistic models designed for spoken languages. In addition to discussing common challenges, this paper also provides background for Tanya Amare Felipe’s paper, which is included in these annals. Modality differences are the most obvious differences between signed and spoken languages. Spoken languages are aural/oral while signed languages are visual/gestural. Signed and spoken languages have each evolved in ways that make maximal use of their modalities, and each have developed successful, although very different, means for conveying and receiving linguistics information. In spoken language, speech is produced by the interaction of the vocal cords, air flow and the tongue moving to different locations in the mouth. The mechanisms that produce speech are all located within a small area. The tongue, also being small, is able to quickly move between different locations in the mouth. This results in sounds that can be quickly produced, sequentially one after the other. Sequences of sounds form words which are then heard and understood by another person. The structure of signed languages differs. Signs are composed of combinations of handshapes, movements, palm orientations and locations. Instead of a relatively small tongue quickly moving to locations within a small mouth, the larger hands move slowly to locations within a larger area ranging from the top of the head to the waist. To produce speech, speakers have only one tongue. However, to produce sign language, signers can use each hand independently, use their upper and lower face, and additionally use shifts of their head and body. Information is conveyed sequentially in both signed and spoken languages. However, the visual/gestural 1 Eastern Kentucky University – EUA. 229 Anais do Congresso modality additionally allows sign languages to easily convey a great deal of information simultaneously. For example, each hand can convey different information, while at the same time, the mouth can provide adverbial or adjectival information, and the brows provide information about the sentence type (e.g., a declarative sentence or a question). Although the components in speech are smaller and allow words to be produced faster than signs, the ability of sign languages to simultaneously produce several meaningful units at the same time results in both types of language conveying information at the same rate. Modality also affects how we receive languages, and the design of spoken and signed languages reflects these differences. Our ears hear best when auditory information is presented sequentially without a great deal of other simultaneous auditory noise occurring. If there are too many sounds/noises at one time, particularly if they are loud, we become unable to hear or process speech. In contrast, our eyes can see and process many things at the same time. Therefore, it is not a problem to simultaneously receive information from the hands, the upper and lower face, and various positions of the head and body. While our eyes and ears are equipped to handle and produce the simultaneous information that make sign languages very efficient, this simultaneity can create challenges for those trying to describe sign languages. A major challenge resulting from simultaneity is the lack of an accurate, efficient written representation for signed languages. A written representation must be able to include information about the signs (handshape, movement, orientation, location) as well other nonmanual information including configurations of the brows, mouth, head and body. There have been attempts at various written representations, but these are usually rejected due to not being accurate enough and/or being too cumbersome for efficient use. For spoken languages, speakers usually know both a spoken and a written form. A written representation allows ease in writing books, teaching languages classes, producing study materials, and in giving tests. The lack of a written representation for signed languages creates a practical challenge for those involved in teaching or assessing sign language. This is true for assessing the signing skills of deaf students as well as the skills of teachers and interpreters. This situation is changing with technological advances that are making it easy to produce and show signs via digital video. In the future, the ease of using digital video will help eliminate the problems associated with not having written representations. The lack of an accurate written representation has also created theoretical challenges for linguistics work on sign languages. Since the late 1890’s, spoken language linguistics have used the International Phonetic Alphabet 230 (IPA) as a standardized way to represent the sounds of any language. When a linguist writes an article and uses IPA to describe the data, someone else can read the article and get an accurate understanding of the data. This is often not the case with sign language research. Because we do not have an efficient written way to represent sign language, linguists usually resort to glossing – using a word from the spoken language to represent a sign. There are two major difficulties with glossing. First, the person reading a linguistic article that uses glosses is not always sure which signs the glosses represent; and second, glossing focuses on the signs, with little or no indication of nonmanual or prosodic components that affect the grammatically of signed sentences. Not having an accurate way to represent data has greatly hindered sign language research. Linguists would write articles supporting or disagreeing with another researcher’s data -- only to later realize they were not referring to the exact same data set. Recent advances in technology now allow us to quickly and easily post sign language data on the internet. This will have a tremendous impact on research and will help with many of the challenges and misunderstandings that occurred in the past. People studying and describing signed languages are now able to actually see the signed data instead of trying to decipher inadequate written representations. Another challenge for describing signed languages is due to the variation that is found in the language background of deaf people. With spoken languages, hearing babies acquire language from their parents and, regardless of the language they learn, they go through similar stages of language acquisition. Research has shown that deaf babies with deaf signing parents go through the same language acquisition stages as they naturally acquire language from their deaf parents. However, only 5 to 10% of deaf babies have deaf parents; the remaining 90 – 95 % have hearing parents. These deaf babies, whose parents do not sign, typically do not receive the linguistic input that allows them to naturally acquire language, nor do they go through the acquisition stages in a timely manner. This results in a wide range of linguistic diversity in the deaf population. For example, while a small percent of deaf people acquire sign language naturally from deaf parents, others will learn at a young age when they attend residential schools for the deaf and become fluent signers, and still others might not learn any language until a much later age and may never become fluent. When research on signed languages first started, researchers did not always account for the age a deaf person learned sign. For example, some researchers automatically assumed that if a deaf person signed, they were fluent in sign language – even if the deaf person did not learn sign until they were in their twenties. Because of this, some of the early descriptive 231 Anais do Congresso work on sign language does not accurately describe the language used by the fluent native signers in the deaf community. In several countries, including the United States, educators have invented signed systems in the mistaken belief that the system could accurately represent a spoken language. In comparison, natural sign languages, such as LIBRAS and ASL, have naturally evolved within the deaf communities. The existence of these invented systems creates other interesting challenges that are not faced by those working with spoken languages. There are some educators and linguists who do not have an adequate knowledge of signing and do not distinguish the differences between natural sign languages and invented systems. Some of these people have innocently published articles on what they assumed was the sign language used in the deaf community; however, in reality the signing they studied was based or strongly influenced by these invented systems. Another unique challenge faces teachers and students who live in countries where educators have invented these sign systems. For instance, when teaching ASL to college students in the United States, students often come to class and show a sign they learned outside of class. Often this is an actual ASL sign. However, in some cases, the sign looks odd, does not fit the phonological patterns of ASL, and the teacher has never see the sign before. When asked where they learned the sign, student’s replies include that they learned it from a deaf friend who attended a mainstream school (where invented signs were used); from a sign language teacher from another school; from an book or TV; or, more recently, they saw it on the internet. This creates difficulties because new students do not have sufficient background to tell if these signs are part of ASL or not. In extreme cases, unfortunate students have taken a sign class at one university and, upon transferring to another university, learned that their sign class is not transferable because it was not ASL, and more sadly that deaf people do not understand the invented sign system they had learned. This challenge typically does not face learners of languages such as Spanish or French. As the field of education is turning more toward a bilingual approach and the use of invented sign systems becomes less popular, hopefully this particular challenge will be alleviated for those trying to teach and learn natural signed languages such as ASL. I will end this paper by briefly looking at how sign languages research has impacted the field of theoretical linguistics and challenges we have in these areas. When research on signed languages first started, most researchers focused on proving that these were actual languages. Accordingly, this research looked at similarities, not differences, between signed and spoken languages. To date, linguistic analysis has successfully shown that signed languages follow the same phonological, morphological and syntactic 232 principles and have hierarchal structures that are in accord with analyses of spoken languages. Looking at similarities has been very fruitful and has strengthened our understanding of the linguistic properties that are shared by all human languages. However, in focusing on similarities, many important differences between signed and spoken languages were ignored or overlooked. When one seriously addresses these differences, one quickly faces theoretical challenges. Linguistic theories were based on spoken languages, but these models often do not have a way to explain or account for features that result from modality differences. Every natural signed language that has been studied makes us of space – this is an important area that is creating a challenge for theoretical linguistics. For instance, research has shown that space can be used for the following ways in ASL: • For comparison and contrasts – e.g., signs related to one concept can be signed to the left and signs relating to another topic can be signed to the right. • Signers can ‘become’ another character and then act as if they were addressing and interacting with other imaginary characters located in the space around the signer. The phonological form of pronouns and agreement verbs will be determined by the size and location of these ‘imaginary’ characters. • Signers can use signs to create an imaginary three-dimensional ‘model’ in the space in front of them. Prepositional relations, usually conveyed by separate morphemes in spoken languages, are conveyed by where signs are positioned in relation to each other in three-dimensional space. • Space is often used for conveying concepts relating to time. Signs for the past often reference space behind the signer, and signs for the future reference space in front of the signer. The challenge is determining how to treat the use of space and how do we notate the various spatial locations in the phonological forms of signs. In spoken languages, the pronunciation of a word has a given form which we can transcribe using IPA. In signed languages the forms or pronouns and agreement verbs differ depending on the type of space that is being use and where previous ‘entities’ occurred withiin the space. In addition to challenge of these signs not having a set form, another challenge occurs in determining how we should deal the different uses space. For instance, is this use of space ‘strictly’ linguistic, or is the linguistic system interacting with another conceptual component that we use for visualizing and creating imagery? This is one of the examples of a current challenge that many sign language linguists are currently exploring. 233 Anais do Congresso In this paper, we have touched on several challenges faced by those trying to describe sign languages. We started by looking at modality differences and saw the different ways that information can be conveyed and received. We then looked the difficulties that are due to signed languages not having an adequate efficient written representational system. This was followed by a brief look at the various language backgrounds that can be found in the deaf community and how this creates further challenges. This paper has ended with a look at how signed languages use space, and briefly discussed some of the theoretical challenges that space presents to linguistic models that were developed for spoken languages. The information in this paper has provided background for Tanya Amare Felipe’s paper, included in the annals, which presents an in-depth look a constructions commonly referred to as classifiers. As will be shown in that paper, classifiers create their own set of practical and theoretical challenges for linguists - these constructions have been found in all natural signed languages, yet have characteristics very different from what we find in spoken languages. 234 Comunicações COMUNICAÇÕES ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE NO ATENDIMENTO AO PACIENTE SURDO Neuma Chaveiro* Maria Alves Barbosa** Celmo Celeno Porto*** Objetivo: analisar a atuação dos profissionais da saúde no atendimento ao paciente surdo. Método: estudo de natureza descritivo-analítica, com abordagem qualitativa. Participaram da pesquisa onze pessoas surdas; todas utilizavam a língua de sinais para se comunicarem. Resultados Para os sujeitos desse estudo, são raros os profissionais da saúde que sabem língua de sinais ou que aproveitam recursos visuais para facilitar a relação. Identificaram-se também muitos obstáculos a serem superados, destacando-se a ineficiência na comunicação, podendo chegar ao extremo de sentirem-se impedidos de buscar assistência; falta de confiança nos profissionais da saúde e nos intérpretes. Verificou-se que o princípio bioético da autonomia não está sendo respeitado. CONCLUSÃO: pacientes surdos e profissionais da saúde, quando se encontram, deparam-se com barreiras comunicativas que comprometem o vínculo a ser estabelecido e a assistência prestada, podendo interferir no diagnóstico e no tratamento. Ficou clara a necessidade de as instituições públicas oportunizarem programas que visem à formação dos profissionais da área de saúde para um adequado atendimento aos pacientes surdos. Mestre em Ciências da Saúde pela Universidade Federal de Goiás. Fonoaudióloga do Centro Estadual de Apoio ao Deficiente e Intérprete da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS). Email: [email protected] ** Professor Adjunto III, Doutora em Enfermagem, Docente da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás. Email: [email protected] *** Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás. Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade Federal de Goiás. Email: [email protected] *1 237 Anais do Congresso A linguagem não-verbal é um recurso de comunicação que precisa ser conhecido e valorizado na prática das ações em saúde. Mesmo que não se conheça a língua de sinais, é fundamental interpretar seus aspectos suprasegmentais. Bibliografia ALLEN, B.; MEYERS, N.; SULLIVAN, J; SULLIVAN, M. American Sign Language and end-of-life care: research in the deaf community. E C Fórum, Minnesota, v. 14, n. 3, p. 247-251, sep. 2002. BARNETT, S. Communication with deaf and hard-of-hearing people: a guide for medical education. Acad Med. New York, v. 77, n. 7, p. 694-700. jul. 2002. CHAVEIRO, N.; BARBOSA, M.A. Assistência ao surdo na área de saúde como fator de inclusão social. Revista da Escola de Enfermagem. São Paulo, USP, v. 39, n.4, p.417-422, dez. 2005. DINIZ, D. Autonomia reprodutiva: um estudo de caso sobre a surdez. Cadernos de Saúde Pública. Rio de Janeiro, v. 19, n. 1, p. 175-181. jan./ feb. 2003. HUDSON, R. Including deaf patients in the conversation. Fam Pract Manag. United States, v. 11, n. 6, p. 37-40, nov./dec. 2004. LEZZONI, L.I.; O’DAY, B.L.; KILLEEN, M.; HARKER, H. Communicating about health care: observations from persons who are deaf or hard of hearing. Ann Intern Med. United States, v. 104, n. 5, p. 356362, mar. 2004. MCALEER, M. Communicating effectively with deaf patients. Nurs Stand. Nottingham, v. 20, n. 19, p. 51-54, jan. 2006. MEADOR, H.E.; ZAZOVE, P. Health care interactions with deaf culture. J Am Board Fam Pract. Michigan, v. 18, n.3, p. 218-222, may/june. 2005 238 COMUNICAÇÕES PINDORAMA: UMA PLATAFORMA COMPUTADORIZADA COMO FERRAMENTA NA PRODUÇÃO TEXTUAL DE CRIANÇAS ESCRITORAS SURDAS ENTRE 7 E 12 ANOS DE IDADE Lívia Monnerat Castro* Carlo Emmanoel Tolla de Oliveira** Carla Verônica Machado Marques*** O Pindorama é um jogo computadorizado que tem como objetivo servir de meio mediacional para a produção de textos através da elaboração dirigida e metacognição. O jogo oferece a ambientação virtual para a construção de aventuras, que promovem a oportunidade de estruturar o pensamento narrativo na condição de autor escritor. As aventuras criadas podem ser compartilhadas, provocando a interação social para a construção do texto como uma atividade social colaborativa. A construção é feita a partir da montagem seqüenciada de um mapa conceitual referente à estrutura textual narrativa (apresentação, desenvolvimento, clímax e desfecho). O tema depende apenas do que for proposto pelo professor e do interesse dos alunos. Além disso, a ferramenta provoca a elaboração de regras gramaticais generativas, ou universais, envolvidas na construção sintática de sentenças na língua portuguesa, pois o programa exige, como ponto de partida, apenas o verbo e o objeto, não sendo necessários conectivos para construir automaticamente as frases que compõem o texto. Esse procedimento inicial solicita o uso de uma linguagem verbal formada por itens lexicais, que se assemelha à estrutura da LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais), tornando o Pindorama uma ferramenta de mediação ímpar no processo de aquisição de escrita por crianças surdas. PPGI-NCE-UFRJ. E-mail: [email protected] PPGI-NCE-UFRJ. E-mail: [email protected] *** INES. E-mail: [email protected] * ** 239 Anais do Congresso Bibliografia ALLIENDE, F.; CONDEMARÍN, M. Leitura, Teoria, Avaliação e Desenvolvimento. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987. SEMINÉRIO, F. L. P. Elaboração dirigida: um caminho para o desenvolvimento metaprocessual da cognição humana. FGV; ISSO, 1987. _____. Metaprocesso: a chave do desenvolvimento cognitivo: desenvolvimento cognitivo: uma reavaliação da pedagogia contemporânea. FGV; ISOP, 1988. 240 COMUNICAÇÕES A CONSTRUÇÃO DE CONCEITOS CIENTÍFICOS POR ESTUDANTES SURDOS Gisele Morisson Feltrin* Paulo Salles** Uma das maiores dificuldades no aprendizado de Ciências relaciona-se à apropriação da linguagem científica (WELLINGTON e OSBORN, 2001). A compreensão de como os estudantes aprendem conceitos científicos tem sido tema de interesse para pesquisas em ensino de Ciências. Entretanto, compreender o processo ensino-aprendizagem desses conceitos, por estudantes surdos, constitui um campo específico de investigação. A especificidade lingüística dos surdos faz de sua escolarização uma situação complexa, que interfere na construção de conceitos científicos. Salles, Salles e Bredeweg (2004) apontam a importância dos modelos qualitativos na educação de surdos. Apoiado nesse enfoque, o presente trabalho apresenta o uso de modelos qualitativos como ferramenta capaz de dar suporte aos alunos surdos na aquisição de conceitos e no aprendizado da língua portuguesa. Bibliografia WELLINGTON, J.; OSBORN, J. Language and Literacy in Science Education. Open University Press, McGraw-Hill, 2001. SALLES, H.; SALLES, P.; BREDEWEG, B. Qualitative reasoning in the education of deaf students: scientifc education and aquisition of portuguese as a second language. In: 18th International Workshop on Qualitative Reasoning (QR2004). Evanston Illinois, EUA. Proceedings of the 18th International Workshop on Qualitative Reasoning, 2004. * PPGEC-UnB. E-mail: [email protected] IB-UnB. E-mail: [email protected] ** 241 COMUNICAÇÕES O FILOSOFAR EXPRESSO PELO CORPO Péterson R. Costa* Neste trabalho o autor aborda a construção e expressão dos conceitos filosóficos a partir do corpo e sua capacidade de movimento e visão. Busca responder basicamente a pergunta: o sujeito surdo é capaz de construir, pensar, expressar e discutir conceitos filosóficos? Sua resposta é dada a partir da psicologia sociointeracionista, que concebe a aquisição da linguagem e o processo de abstração fortemente ligado ao meio social em que o sujeito está inserido. No pensamento de Merleau Ponty, o autor encontra a possibilidade da expressão e compreensão dos conceitos filosóficos a partir da percepção do movimento e visão do corpo. Palavras- Chave: Merleau Ponty. Sociointeracionismo. Língua de Sinais. Movimento. Visão. Corpo. ABSTRACT In this work the author approaches the construction and expression of the philosophical concepts from the body and its capacity of movement and vision. Search to answer the basically question: Is the deaf citizen capable of constructing, of thinking, of expresing and of arguing philosophical concepts? The answer is given by social interaionist psychology strongly conected which conceives the acquisition of language and the process of abstraction to the social environment where the citizen is inserted. In the thought of Merleau Ponty the author finds the possibility of the expression and understanding of the philosophical concepts from the perception of the movement and vision of the body. Key Words: Merleau Ponty. Social-Interacionist. Language of Signals. Movement. Vision. Body. Graduado em Filosofia, capacitado em Educação Especial Surdez, intérprete de LIBRAS. E-mail: [email protected] * 242 Bibliografia BERNARDINO, Ediléa Lúcia. Absurdo ou lógica? Os surdos e sua produção lingüística. Belo Horizonte: Sinai, 2000. BOTELHO, Paula. Segredos e silêncios na educação de surdos. Belo Horizonte: Autêntica, 1998. FERNANDES, Eulália. Linguagem e surdez. Porto Alegre: Artmed, 2003. GOLDFELD, Márcia. A criança surda: linguagem e cognição numa perspectiva sócio-interacionista. São Paulo, SP: Plexus, 1997. LABORIT, Emmanuelle. O vôo da gaivota. São Paulo: Best Seller, 1994. PONTY, Maurice Merleau. O olho e o espírito. São Paulo: Abril Cultural, 1980. _____. Signos. São Paulo: Martins Fontes, 1991. QUADROS, Ronice M.; KARNOPP, Lodenir B. Língua de Sinais Brasileira: estudos lingüísticos. Porto Alegre: Artemed, 2004. SACKS, Oliver. Vendo vozes: uma viagem ao mundo dos surdos. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 1998. 243 COMUNICAÇÕES A AQUISIÇÃO DE CLASSIFICADORES NA LÍNGUA DE SINAIS BRASILEIRA Elidéa Lúcia Almeida Bernardino* O sistema de classificadores na Língua de Sinais Brasileira, como em outras línguas de sinais, é bastante complexo e demanda tempo para ser usado com maestria. A aquisição de classificadores, em um ambiente em que a criança tem contato com a língua de sinais desde o nascimento, é algo que só ocorre plenamente por volta dos oito ou nove anos de idade, devido à complexidade dessas construções (KANTOR, 1980; SCHICK, 1990; EMMOREY, 2002). As crianças surdas que só têm acesso à língua de sinais após entrarem para a escola, e normalmente não têm bons modelos de surdos sinalizadores, entretanto adquirem e usam classificadores quando têm necessidade de expressar alguma informação que não possa ser expressa de outra forma. Teriam os gestos caseiros alguma influência nessa aquisição? (GOLDIN-MEADOW, 2003) Será que a criança percebe a iconicidade existente nos classificadores, sem que ela seja exposta a sinalizadores fluentes? Quais seriam as estratégias que ela usa para tentar passar essas informações? Este trabalho é uma pequena mostra da pesquisa de doutorado realizada pela autora e procura mostrar como é o sistema de classificadores usado pelos surdos adultos brasileiros e quais fatores influenciam na aquisição desse sistema. Doutora em Lingüística Aplicada pela Boston University. E-mail: elidea@ pucminas.br * 244 Bibliografia BERNARDINO, Elidéa L. A. The acquisition of classifiers in verbs of motion and verbs of location in Brazilian Sign Language. 2006. Dissertação (Doutorado em Lingüística Aplicada).Boston, MA (USA): Boston University, 208 p. BOYES-BRAEM, P. Features of the handshape in American Sign Language. 1981. Tese (Unpublished doctoral dissertation) Berkeley: University of California, 254 p. EMMOREY, Karen. Language, cognition and the brain: insights from Sign language research. Mahwah, NJ and London: Lawrence Erlbaum Associates, Publishers, 2002. 383 p. GOLDIN-MEADOW, Susan. The resilience of language: what gesture creation in deaf children can tell us about how all children learn language. New York, Hove: Psychology Press, 2003. 262 p. KANTOR, R. The acquisition of classifiers in American Sign Language. Sign language studies, 28 p. 193-208, 1980. SCHICK, Brenda. The acquisition of classifier predicates in American Sign Language. 1987. Tese (unpublished doctoral dissertation). Purdue University. 127 p. SUPALLA, Ted. Structure and acquisition of verbs of motion and location in American Sign Language. (s.d.) Tese. (unpublished doctoral dissertation) San Diego: University of California. 245 COMUNICAÇÕES ENTRE LÍNGUAS E CAMINHOS: UMA PROPOSTA DE ATUAÇÃO DO INTÉRPRETE DE LIBRAS-LP NO CONTEXTO EDUCACIONAL Carlos Henrique Rodrigues* Fernando Eustáquio Guedes** Nesta apresentação, abordaremos questões surgidas a partir da investigação da atuação do intérprete de Libras– LP em salas de aula mistas e em salas somente de surdos. Este estudo adotou uma perspectiva interpretativa, guiada pelas teorias e métodos oferecidos pela Sociolingüística, para a identificação, análise e triangulação de “casos expressivos” e tem como objetivo compreender aspectos sociolingüísticoculturais presentes no processo de tradução e interpretação nesse contexto singular. Para isso, examinou-se como os intérpretes organizam sua atividade interpretativa, como utilizam técnicas e recursos interpretativos e como lidam com os “problemas de interpretação” decorrentes da desinformação, do desconhecimento de conceitos e da relação de equivalência tomada como base para construção da interpretação. Adotouse como referência para esta apresentação estudo desenvolvido no Centro de Capacitação de Profissionais da Educação e de Atendimento às Pessoas com Surdez, de Minas Gerais – CAS-MG, durante o segundo semestre de 2006. A partir da análise de casos expressivos, examinaram-se os desafios enfrentados pelos intérpretes educacionais no processo de construção de um entendimento comum dos objetivos e das formas de participação nas atividades pedagógicas a serem desenvolvidas em sala, bem como questões culturais e lingüísticas evidenciadas durante esse processo. Intérprete de Libras, especialista em Educação Inclusiva, mestrando em Educação – CAS-MG/ Uni-BH/ Fame-BH/ Fae-UFMG. E-mail: [email protected] ** Intérprete de Libras, tecnólogo em Comunicação Assistiva – CAS-MG/ Puc Minas. E-mail: [email protected] * 246 Bibliografia ALVES, Fábio. Tradução e Interpretação na perspectiva da Surdez: a busca de semelhança interpretativa sob a ótica do princípio de relevância. In: CEALE/ Anais do I Seminário sobre linguagem, leitura e escrita de surdos. Belo Horizonte: FAE/UFMG, 1998, p.184-191. AMMANN, Margret. O Problema das diferenças culturais na interpretação. In: Tradução: alvos e ferramentas. IV Encontro Nacional de Tradutores. São Paulo: USP/FFLCH/DLM/CET, 1990, p.213-216. BERNARDINO, Elidéa Lúcia. O papel do intérprete na Educação de Surdos. In: CEALE/ Anais do I Seminário sobre linguagem, leitura e escrita de surdos. Belo Horizonte: FAE/UFMG, 1998, p.164-173. COKELY, D. Sign language Interpreter and Interpreting, SLS Monographs Series Linstok Press, 1992. COUTINHO, D. M. D. et. al. O Intérprete da LIBRAS: um olhar sobre a prática profissional. In: MEC/ Anais do Seminário: Surdez: desafios para o próximo milênio. SEE/ INES. Rio de Janeiro: INES, 2001. p.77-86. ISHAM, W. P. Signed language interpreting. In: BAKER, Mona. Routledge encyclopedia of translation studies. London; New York: Routledge, 1998, p. 231-235. LUCIANO, A. H. T. A Interpretação simultânea sob a ótica da lingüística Aplicada. Campinas, SP: [s.n.], 2005. MEHAN, H. The Structure of Classroom Events and their Consequences for Student Perfomance. In: PERRY, G. & ALLAN, G. Children in and out of school. University of Pensylvania: The Center for Applied Linguistcs, 1982. PAGURA, R. A Interpretação de Conferências: interfaces com a tradução escrita e implicações para a formação de intérpretes e tradutores. D.E.L.T.A., 19: ESPECIAL, (209-236), 2003. ROSA, A. S. Entre a visibilidade da tradução da língua de sinais e a invisibilidade da tarefa do intérprete. Campinas, SP: [s.n.], 2005. 247 COMUNICAÇÕES PROBLEMATIZANDO O ENSINO DE MATEMÁTICA PARA SURDOS NA ESCOLA INCLUSIVA: O PROFESSOR DE MATEMÁTICA E INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS Luiz Cláudio Nóbrega Ayres1 Lucyenne Matos da Costa2 No Brasil, com a questão da escola inclusiva, os alunos surdos vêm tendo dificuldade de aprender matemática na sala de aula, principalmente quando dependem do intérprete para que ocorra a aprendizagem, pois o professor não está habilitado a trabalhar com alunos surdos. Por isso, esses alunos perdem a oportunidade de ter uma qualidade nos estudos. Entretanto, a legislação atual incentiva a inclusão escolar dos alunos surdos, garantindo o direito de estarem na escola regular, dentro de sala de aula. Então, entram em cena os intérpretes, que não estão preparados didaticamente em relação às práticas de aulas de matemática, geralmente nem conhecem o conteúdo passado pelo professor. Como conseqüência, as avaliações são retratadas com o fracasso no processo dos alunos surdos. Eu, como professor surdo de matemática, encontro algumas falhas interpretadas em aula. Este relato de experiência vem tratar de métodos criados por mim em sala de aula, construídos no cotidiano com os alunos surdos no ensino de multiplicação e fração. Trata-se de métodos que levam em conta a visualização das operações e a compreensão na troca de informações entre professor surdo e aluno surdo, valorizando assim ambas as identidades. Enfim, os surdos precisam visualizar as operações em suas mãos e é necessário que o professor saiba LIBRAS. É complicado contar com o intérprete nessa relação ensino-aprendizagem. Professor surdo de Matemática em LIBRAS na Escola Estadual de Educação Oral e Auditiva e professor surdo Bilíngüe de língua de sinais. Aprendendo a Matemática em LIBRAS para Surdos. 2007. Artigo(formação de professor bilíngüe) – pós-graduação em Educação, da Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2007. E-mail: [email protected] 2 Mestre em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo. Professora Bilíngüe e intérprete de língua de sinais. Coordenadora do trabalho com surdos no município de Vila Velha no estado do Espírito Santo. E-mail: [email protected] 1 248 COMUNICAÇÕES A AQUISIÇÃO DA TEORIA DA MENTE PELA CRIANÇA SURDA Laura Cristina Stobäus* Sylvia Beatriz Joffily** A Teoria da Mente é a capacidade de inferir os pensamentos e as intenções dos outros. É a partir dela que a criança se socializa. De acordo com Thommen e Rimbert (2005), ela se instala na mente da criança aos 18 meses de idade cronológica. Este recurso cognitivo favorece não só os relacionamentos como também a aprendizagem. Para a aquisição da Teoria da Mente são necessárias habilidades que pressupõem a coordenação atencional de um par social e de um objeto de interesse mútuo; dentre elas estão: o olhar compartilhado, a comunicação através de gestos, o gesto de apontar, a imitação e, mais tarde, o uso de uma linguagem verbal. Se a linguagem possui um papel fundamental na aquisição da Teoria da Mente, as crianças surdas apresentam um atraso significativo neste aspecto da cognição. De acordo com Russel et al. (1998), elas só atribuem estados mentais aos outros tardiamente, por volta dos 13 anos. Esta comunicação tem como finalidade conscientizar as pessoas que convivem com indivíduos surdos das dificuldades que eles enfrentam para estabelecer relações sociais. Mestranda em Cognição e Linguagem do Centro de Ciências do Homem da Universidade Estadual do Norte Fluminense - Darcy Ribeiro -UENF. Pesquisadora no Núcleo de Pesquisas e Estudos em Neuropsicologia Cognitiva – NEPENC. Formação na Prática Psicomotora Aucouturier. Graduada em Psicomotricidade pelo UNI-IBMR. Contato e-mail: [email protected] ** Doutora em psicologia pela Université Louis Pasteur – Strassburg – França. Professora do programa de pós-graduação em Cognição e Linguagem do Centro de Ciências do Homem da Universidade Estadual do Norte Fluminense – Darcy Ribeiro. Coordenadora do Núcleo de Pesquisas e Estudos em Neuropsicologia Cognitiva – NEPENC. Contato e-mail: [email protected] * 249 Anais do Congresso Bibliografia: RUSSEL et al. The Development of Theory of Mind in Deaf Children. In: Journal of Child Psychology Psychiatry, vol. 39 (6), 1998, págs. 903910. THOMMEN, Évelyne; RIMBERT, Guillaume. connaissances sur autrui. Paris: Belin sup, 2005. 250 L’enfant et les COMUNICAÇÕES UMA EDUCAÇÃO E ESCOLAS LÍQUIDAS? UMA OUTRA FORMA DE SE TRABALHAR COM OS ALUNOS COM NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS NO ENSINO REGULAR A PARTIR DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA? Leny Magalhães Mrech* A Educação atual vem passando por uma série de mudanças. De uma educação pautada em um modelo da modernidade sólida (Bauman), onde a transmissão se dava através de um modelo normativo, passamos para uma proposta que se renova a cada momento. De que maneira este processo afeta ao aluno que apresenta necessidades educativas especiais? Como ele altera as relações entre alunos e professores no Ensino Regular? Este trabalho visa discutir a passagem da Modernidade Sólida para a Modernidade Líquida e a maneira como ela vem trazendo certas modificações para os contextos educativos. Neste caso, analisaremos a passagem da escola da modernidade sólida para a escola da modernidade líquida, identificando um novo processo de formação do professor a partir dos referenciais trazidos pela Educação Inclusiva e a Modernidade Líquida. O referencial que adotaremos parte de autores como Zigmunt Bauman, Anthony Giddens e da perspectiva psicanalítica freudiana e lacaniana. Estudaremos mais detidamente os efeitos destas transformações no processo de constituição dos professores, destacando os seus aspectos emocionais. Professora Livre Docente da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. Psicóloga, Socióloga e psicanalista. Coordenadora Geral do Núcleo de Pesquisa de Psicanálise e Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo. E-mail: [email protected] * 251 Anais do Congresso Bibliografia BAUMAN, Zigmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001. _____. O mal-estar na pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998. _____. Identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2005. FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1997. _____. O Futuro de uma Ilusão. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1997. 252 COMUNICAÇÕES LÍNGUA DE SINAIS E IMPLANTE COCLEAR NO PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA ESCRITA Esmeralda Figueira Queiroz* Celeste Azulay Kelman** Esta pesquisa tem como objetivo analisar a influência da oralidade e da língua de sinais no processo de aquisição da escrita de uma criança surda com implante coclear. O sujeito pesquisado é filho de pais surdos e recebeu o implante aos quatro anos, quando já era fluente em língua de sinais. É o único aluno surdo em uma classe de alfabetização de uma escola particular. A maioria dos estudos sobre a escrita dos surdos dedica-se às produções textuais de surdos em séries mais avançadas do nosso sistema educacional. Nessas séries, as formas próprias de suas construções tornam-se visíveis e representam problemas para os professores das escolas regulares. Na concepção teórica adotada, a teoria histórico-cultural do desenvolvimento humano, a escrita é entendida como um elemento cultural de aprendizagem social. O estudo realizado utilizou a análise microgenética das observações no ambiente da sala de aula. Através desta modalidade metodológica, buscase a inserção na complexidade e nas minúcias que envolvem o processo, possibilitando a descrição e interpretação dos episódios selecionados. Os resultados apontam para a necessidade urgente da compreensão de que língua de sinais e implante coclear podem contribuir igualmente na alfabetização de uma criança surda, influenciando-se mutuamente. Mestranda em Educação da Universidade de Brasília. E-mail: [email protected] ** Professora do Programa de Pós Graduação em Educação da Universidade de Brasília. * 253 Anais do Congresso Bibliografia FERNANDES, E. (Org.) Surdez e bilingüismo. Porto Alegre: Mediação, 2005. VIROLE, B. A influência dos implantes cocleares no desenvolvimento sócio-afetivo da criança surda. In: Surdez e Escolaridade: desafios e reflexões. II Congresso Internacional do INES e VIII Seminário Nacional do INES. Rio de Janeiro: INES, 2003, p. 39-47. VYGOTSKY, L. S. A construção do pensamento e da linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001. VYGOTSKY, L. S. Obras Escogidas, Tomo V: Fundamentos de Defectología. Madrid: Visor, 1997. 254 COMUNICAÇÕES UTILIZAÇÃO DO CONCEITO DE REABILITAÇÃO OROFACIAL E CORPORAL CASTILLO MORALES NA SÍNDROME DE WAARDENBURG Leny Meirelles1 INTRODUÇÃO A síndrome de Waardenburg é caracterizada pela associação da surdez com anomalias pigmentares. OBJETIVO Utilizar o Conceito de Reabilitação Orofacial e Corporal Castillo Morales na síndrome de Waardenburg, no INES. MÉTODO A família de I., um menino de quatro anos, procurou atendimento no INES após ser constatada a síndrome de Waardenburg e a deficiência auditiva neurossensorial profunda bilateral. A avaliação fonoaudiológica revelou que apresentava um atraso significativo no desenvolvimento global Fonoaudióloga do INES, Terapeuta do Conceito de Reabilitação Castillo Morales e Mestranda de Fonoaudiologia da UVA. [email protected] 1 255 Anais do Congresso TERAPIA Iniciou na Estimulação Precoce. A terapia fonoaudiológica foi elaborada abordando o desenvolvimento das habilidades auditivas e de acordo com o Conceito Castillo Morales,que é reconhecido atualmente em diversos países do mundo. Prioriza em seus atendimentos, a individualidade de cada paciente, suas capacidades, respeita o tempo de desenvolvimento individual e este deve ser observado como condição fundamental para as aprendizagens. As famílias devem ser orientadas para colaborar e atuar como guias. RESULTADOS PARCIAIS Avaliando qualitativamente o seu desenvolvimento, verificou-se que a intervenção vem propiciando a atenção indispensável para um melhor desempenho de suas capacidades funcionais, reorganização no desenvolvimento sensório motor, regulação orofacial, corporal e dos padrões respiratórios para estimular a fala. Comunica-se através de gestos expressivos, fazendo uso da leitura orofacial para compreender as mensagens. Bibliografia ANNUNCIATO,N. O Sistema Auditivo e os Processos Plásticos do Sistema Nervoso: Revista Espaço, n. 14, p. 37-43, Rio de Janeiro: INES, 2000. DOUGLAS,C.R. Tratado de Fisiologia aplicado à Fonoaudiologia: S.Paulo: Robe Editorial, 2002. MORALES, R. C. Terapia de Regulação Orofacial: São Paulo: Editora Memnon, 1999. READ AP, NEWTON VE. Waardenburg syndrome. J Med Genet n. 34, p. 656-665, 1997. RUSSO, L. C. P., SANTOS, T. M. M. Audiologia Infantil: São Paulo: Editora Cortez, 1984. YOSHINAGA, I. et al. Language of early-and-later-identified children with hearing loss.: Pediatrics ( American Academy of Pediatrics), v. 102, n.5, Colorado, EUA, 1998. 256 COMUNICAÇÕES AS POLÍTICAS PÚBLICAS E A IMPLANTAÇÃO DO ATENDIMENTO FONOAUDIOLÓGICO À SURDOCEGUEIRA EM PERNAMBUCO Wanilda Maria Alves Cavalcanti1 Luiz Carlos Souza Bezerra2 A surdocegueira constitui-se uma condição única com características próprias, podendo trazer conseqüências negativas para o desenvolvimento global, principalmente no que se refere à comunicação, educação e interação no ambiente onde está inserida. As políticas públicas, nos últimos anos têm estimulado a atenção a essas pessoas através de programas específicos. No entanto, percebe-se que os recursos humanos e materiais ainda são bastante reduzidos o que dificulta a implementação das atividades. Dentre os profissionais envolvidos o fonoaudiólogo pode trazer contribuições efetivas para a melhoria da comunicação do surdocego, possibilitando o acesso à informação através da adoção da comunicação alternativa dentre as quais as abordagens Co-ativas. O presente estudo tem como objetivo identificar a inserção do fonoaudiólogo nos atendimentos ao surdocego. Mapeamos um reduzido número de profissionais que se dedicam a esse atendimento, por esse motivo, a amostra constituiu-se de dois gestores, duas fonoaudiólogas e duas pedagogas. Os dados foram analisados através de uma metodologia qualitativa utilizando os referenciais de teóricos de Minayo. Os resultados evidenciaram que as políticas públicas ainda não conseguiram o seu objetivo uma vez que a sociedade não está devidamente instrumentalizada para tal fim, ou seja, os serviços da saúde e educação são precários e desarticulados. MINAYO, M. C. S.Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. 10 ed. Petrópolis: Vozes, 80p., 1998. Doutora em Psicologia, professora da graduação e coordenadora do mestrado em Ciências da Linguagem da Universidade Católica de Pernambuco. E-mail: wanilda [email protected] 2 Estudante de Fonoaudiologia pela Universidade Católica de Pernambuco. E-mail: [email protected] 1 257 Anais do Congresso TEXTOS NÃO-DISPONIBILIZADOS Não foram disponibilizados os textos das apresentações abaixo. Os interessados deverão entrar em contato com os autores. “O difícil são as palavras”: discursos e práticas”: discursos e práticas na escolarização de alunos surdos Palestrante: Drª. Wilma Favorito E-mail: [email protected] Panorama internacional da educação de surdos nos últimos 150 anos Palestrante: Maria Aparecida Leite Soares E-mail: [email protected] A influência do diagnóstico no desenvolvimento da criança surda Palestrante: Maria Cristina Simonek E-mail: [email protected] 258 Realização INES Instituto Nacional de Educação de Surdos Secretaria de Educação Especial Ministério da Educação GOVERNO FEDERAL