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EDIÇÃO AGOSTO/2016 NESTA EDIÇÃO... 03 MATÉRIA PRINCIPAL NEUROCIÊNCIAS E A PSICOLOGIA E ESPORTE 08 ENTREVISTA PERSPECTIVAS E PERCEPÇÕES DOS PROFISSIONAIS DA SAÚDE SOBRE O ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL 11 RELATO DE PESQUISA NEUROMODULAÇÃO COGNITIVA NA PARALISIA CEREBRAL: EFEITOS SOBRE A COGNIÇÃO NUMÉRICA 17 RESUMO DE ARTIGO HÁ INSTRUMENTOS DO TIPO SCREENING COGNITIVO SENSÍVEIS E ESPECÍFICOS PARA PACIENTES APÓS AVC? 20 POLÍTICAS PÚBLICAS POLÍTICAS PÚBLICAS DE COMBATE AO AVC NO BRASIL MATÉRIA PRINCIPAL Neurociências e a Psicologia e Esporte Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro 2016 já trazem uma marca ficas publicadas no Brasil. importante e histórica, o recorde de O que faz um psicólogo espor- mais de 30 psicólogos esportivos que tivo com atletas dos jogos olímpicos? acompanharam diversas comissões Por definição da APA (1999) o objeti- técnicas das modalidades do Comitê vo de nosso trabalho no esporte de Olímpico Brasileiro (COB). Se num rendimento é a otimização da perfor- passado recente o COB contratou motivadores e escritores de autoaju- da, em detrimento de psicólogos que mance, e nele analisar e transformar os determinantes psíquicos que interferem no rendimento. Diversas técni- já trabalhavam em clubes ou de for- cas e modelos teóricos auxiliam o tra- ma particular com atletas, finalmente balho de psicólogos com atletas, que parece que nossa área se afirma a tem como uma das metas principais, nível institucional. o desenvolvimento de habilidades de Ainda considerada uma área autorregulação, tanto cognitiva quan- emergente por leigos, a psicologia do to emocional, considerando também esporte também não é muito conheci- particularidades de suas personalida- da mesmo no “mundo psi”, com pou- des, pensamentos, motivação e de- cos colegas sabendo do que se trata mandas específicas da modalidade. a área ou da prática de especialistas. Tais aplicações têm ajudado os atle- Isto ocorre, em parte, pelos raros cur- tas a estarem próximos aos estados sos de graduação que oferecem a mentais que favorecem a sua máxima disciplina e pela escassez de grupos performance dentro de cada etapa de pesquisa dentro dos programas de competitiva. pós-graduação em psicologia. Não só Diante da diversidade de mo- pouco se sabe sobre as práticas dos delos de atuação, a Neurociência psicólogos esportivos, como há ca- AGO/16 rência na difusão de pesquisas cientí- também vem se fortalecendo e se Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br MATÉRIA PRINCIPAL CONTINUANDO... constituindo como uma área científica galvânica, frequência respiratória, en- afim à psicologia do esporte (Takase, tre outras (Dupee & Werthner, 2011; 2005), oferecendo um corpo sólido de Hammond, 2007; Linden, & Strack, conhecimento que embasa práticas, 2011; van Quekelberghe, 1995). E teorias e avaliações. Nesse sentido, também, utilizando medidas centrais medidas psicofisiológicas têm sido como o EEG, HEG e outros procedi- cada vez mais utilizadas como impor- mentos de neuroimagem, os quais tantes indicadores de estados men- podem revelar ainda mais sobre os tais, complementando as avaliações estados mentais dos atletas, permitin- tradicionais da psicologia por preen- do inferências sobre capacidades cherem uma lacuna existente entre a cognitivas (como atenção, raciocínio, esfera fisiológica memória, aprendizagem, planejamen- (Sequeira, Hot, Silvert, & Delplanque, to e tomada de decisões) e também 2009). Enfatizamos que alterações na sobre aspectos relacionados ao con- homeostase entre os sistemas simpá- trole neural do movimento (Naito, & tico e parassimpático podem ser con- Hirose, 2014; Zhu, 2014). Testes neu- siderados como indicadores da reati- ropsicológicos também têm sido muito vidade emocional (como reações de utilizados estresse e ansiedade) e permitem um 2010). mental acompanhamento e a detalhado nesta direção (Webbe, sobre Para além da avaliação, as ino- níveis de ativação psicofisiológica dos vações no campo das neurociências atletas (Dupee & Werthner, 2011; Pa- também têm ajudado no treinamento gani, Lombardi, & Malliani, 1993). Ain- de habilidades mentais, auxiliando da nesse âmbito da avaliação, tam- aos atletas a ampliarem o controle bém seria possível analisar capacida- emocional, bem como de suas rea- des de autorregulação (Appelhans, & ções fisiológicas e comportamentais Luecken, 2006), verificando como tais (Dupee, & Werthner, 2011; Ham- indicadores se modificam a partir de mond, 2007; Takase, 2005). Sistemas uma linha de base traçada antes de de neuromodulação, neuroestimula- qualquer estratégia autorregulatória. ção, técnicas de biofeedback e rastre- Tais parâmetros podem ser observa- adores oculares tem servido ao referi- dos através de registros da atividade do propósito (Takase, 2005). Dentre periférica, como a variabilidade cardí- estes, as técnicas de biofeedback tem aca, a tensão muscular, a resposta AGO/16 Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br MATÉRIA PRINCIPAL CONTINUANDO... ganhado um espaço importante no Finalmente, concluímos que repertório instrumental de psicólogos estes métodos citados vêm ganhan- que trabalham com alto rendimento do cada vez mais espaço e a aceita- (Dupee, & Werthner, 2011; Linden, & ção de atletas, técnicos e dirigentes, Strack, 2011). O biofeedback trata-se por oferecer algo que faz parte do de uma técnica baseada na autorre- mundo esportivo de alto rendimento: gulação que se estabelece na retroa- indicadores palpáveis sobre estados limentação dos indicadores psicofisi- e capacidades mentais. A possibili- ológicos. Durante a sessão, o atleta dade de se mostrar, nem que seja aprende a controlar sua própria fisio- minimamente, às vezes até de forma logia e estados mentais enquanto gráfica, os avanços no treinamento realiza uma tarefa lúdica sensível às psicológico é muito relevante em um alterações psicofisiológicas. De acor- ambiente que está acostumado a se do com Mendes (2012), a Confedera- pautar em dados objetivos, para me- ção Brasileira de Judô foi pioneira dir sua progressão ou sucesso, se- em disponibilizar o biofeedback na jam pontos, tempos, pesos, distân- preparação psicológica de atletas cias, etc., Ainda que o grande instru- olímpicos brasileiros (Confederação mento de avaliação do psicólogo seja Brasileira de Judô, 2012; Globoes- sua capacidade de escuta, observa- porte.com; 2012; Mendes, 2012). ção, reflexão e comunicação de fenô- Atualmente, a técnica tem sido difun- menos, é inegável que abordagens dida e utilizada por muitas outras neurocientíficas oferecem subsídios Confederações e até mesmo no Co- e ferramentas que se ajustam à cul- mitê Olímpico Brasileiro (COB). tura esportiva no contexto do alto rendimento. AGO/16 Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br MATÉRIA PRINCIPAL CONTINUANDO... REFERÊNCIAS 1. Appelhans, B. M., & Luecken, L. J. (2006). 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AGO/16 Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br Relato de pesquisa ENTREVISTA SBNp entrevista: Drª. Andrea Garcia de Almeida Perspectivas e percepções dos profissionais da saúde sobre o acidente vascular cerebral 1. Primeiramente, gostaríamos de agradecer a sua disponibilidade em responder essa entrevista. Sabemos que você é uma profissional da saúde envolvida com a pesquisa sobre tratamento e prevenção do acidente vascular cerebral (AVC). Na sua percepção como estão as pesquisas no Brasil, em comparação com os estudos no exterior? O Brasil tem evoluído nas pesquisas em neurociências nos últimos anos. O interesse em avaliar as perspectivas brasileiras e o andamento do tratamento médico na população brasileira cresce anualmente. No Brasil, um país considerado em desenvolvimento, temos uma população carente de cuidados médicos especializados, e a realidade brasileira reflete um mundo real, com necessidades de aprimoramento no atendimento médico e pesquisa clínica. A pesquisa clínica na realidade brasileira é uma oportunidade de atendimento médico diferenciado à população carente e é também uma oportunidade de conhecimento, no universo científico, dos resultados dos registros brasileiros de pesquisa científica. 2. Na sua experiência de divulgar seu conhecimento no tratamento do AVC, você percebe que os profissionais da saúde estão preparados para identificar os sintomas dessa doença e tratá-la? Há diferenças entre a qualidade dos atendimentos no país quanto ao estado, ou se o hospital é público ou privado? As campanhas de AVC no Brasil, realizadas anualmente no mês de outubro, tem auxiliado na educação da população brasileira, sendo que está sendo identificado um número crescente de indivíduos (pacientes e familiares) que estão cientes dos sinais e sintomas de alerta do AVC e de que existe um tratamento para o AVC isquêmico com até 4 horas do ictus. A educação dos serviços de emergência, da população e do atendimento pré-hospitalar (SAMU) auxilia no atendimento precoce correto, identificação dos sinais e sintomas do AVC e encaminhamento para o hospital com possibilidade de tratamento de fase aguda. O atendimento está sendo organizado de forma sistematizada em todo o país, na grande maioria dos estados brasileiros, com suporte dos órgãos públicos federais. O atendimento mínimo possível para o diagnóstico e tratamento correto do AVC já é presente tanto em hospi- AGO/16 Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br Relato de pesquisa ENTREVISTA CONTINUANDO... tais públicos quanto em hospitais privados desde 2002 em Porto Alegre. A diferença maior entre os hospitais tanto públicos quanto privados é na disponibilidade de exames mais complexos de investigação da etiologia do AVC e na presença de unidades de reabilitação precoce. 3. Você poderia indicar sites, livros e materiais importantes para os profissionais da saúde se atualizarem na prevenção, tratamento e identificação do AVC? A página da rede Brasil AVC é uma oportunidade de aprimoramento de conhecimento tanto do público leigo quanto dos profissionais envolvidos com o atendimento dos pacientes. Há nesta página possibilidades de comunicação com a equipe e esclarecimento de dúvidas referentes ao AVC. Há também disponível na web o manual de atendimento do AVC realizado com o apoio de órgãos federais brasileiros. Foi realizado pela equipe multidisciplinar da unidade de AVC do HCPA um manual para pacientes com AVC e familiares, que visa auxiliar nos cuidados após AVC com ênfase na educação. Este manual é disponível na intranet do HCPA. 4. Que tipo de tratamentos e quais profissionais da saúde são importantes para envolverem-se com o processo de reabilitação do paciente após o AVC? O tratamento do AVC se subdivide em fase aguda e de reabilitação. Na fase aguda, o tratamento trombolítico e as unidades de AVC são tratamentos de nível IA de evidência científica. O tratamento trombolítico para o AVC isquêmico agudo pode ser realizado em sintomas até 4 horas de início, na ausência de contra-indicações. As unidades de AVC reduzem a mortalidade dos pacientes com AVC, sendo que há unidades de fase aguda e unidades de reabilitação. Estas unidades proporcionam redução das taxas de complicações após um AVC (pneumonia, úlceras de pressão, trombose venosa). A equipe multidisciplinar envolvida com o atendimento do AVC é composta por enfermagem, fisioterapeuta, fonoaudióloga, nutrição, psicologia, terapeuta ocupacional, médico, farmacêutico e administrativo. No processo de reabilitação precoce, o fisioterapeuta e a fonoaudióloga são de extrema importância para mobilização precoce e rastreamento de disfagia, auxiliando na redução das complicações hospitalares e assim, contribuindo para redução das incapacidades após o AVC. AGO/16 Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br CONTINUANDO... 5. Em relação aos aspectos cognitivos, a percepção do profissional da saúde sobre o paciente pós AVC é suficiente para identificar quais deles apresentam problemas de memó- ENTREVISTA ria, linguagem, atenção, dentre outros deficits neuropsicológicos? A avaliação neuropsicológica no leito hospitalar seria necessária em quais casos? Na fase hospitalar do atendimento do AVC há necessidade de avaliação cognitiva do paciente sem suporte familiar no aspecto que envolve o uso de medicamentos anticoagulantes, devido ao risco maior de complicações nestes pacientes sem entendimento correto do tratamento. Pacientes sem suporte social apresentam maior risco em determinados tratamentos preventivos. As incapacidades cognitivas geralmente já estão presentes em muitos dos pacientes com internação por AVC, pois a maioria dos casos são secundários a um estilo de vida não saudável ao longo dos anos, com fatores de risco cardiovasculares não tratados adequadamente ao longo da vida, ocasionando envelhecimento precoce do cérebro e comsequentemente déficits cognitivos. Existem estudos, que demonstram a associação de diabetes, fibrilação atrial, insuficiência cardíaca e aterosclerose com déficits cognitivos previamente ao AVC. Sendo, que estes são um dos principais fatores de risco para que ocorra um AVC. A avaliação neuropsicológica após AVC auxilia a equipe médica na conduta terapêutica, reduzindo riscos de complica- ções com o uso incorreto de medicamentos. A testagem cognitiva também auxilia no entendimento dos distúrbios comportamentais após AVC e propicia um melhor manejo medicamentoso e não medicamentoso, auxiliando o cuidador e a equipe assistente na abordagem dos pacientes. A abordagem ideal seria de todos os pacientes, pois a avaliação cognitiva auxilia no manejo terapêutico dos pacientes com AVC. Há necessidade de mais estudos que avaliem os principais grupos de risco para deterioro cognitivo após AVC. A avaliação cognitiva realizada por outros profissionais da área da saúde não apresenta a complexidade da avaliação neuropsicológica especializada, sendo então necessária a interação da neuropsicologia com a equipe multidisciplinar que atende o AVC. O melhor momento de realizar a testagem cognitiva ainda precisa ser estudado. A reabilitação cognitiva após AVC também deverá ser um método de terapêutica a ser instituído para serviços públicos. Muito obrigada pela sua participação! Andrea Garcia de Almeida Realizou Mestrado em Neurociências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS (2005) e Doutorado em Ciências Médicas pela UFRGS (2014). Atua como Neurologista no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) e Hospital Moinhos de Vento, com ênfase em Neurovascular e Doppler transcraniano. É médica Gestora da Unidade de Cuidados Especiais do HCPA. AGO/16 Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br RELATO DE PESQUISA Neuromodulação cognitiva na paralisia cerebral: efeitos sobre a cognição numérica A Estimulação Transcraniana anódico e outro catódico) colocados por Corrente Contínua (ETCC) é uma sob o escalpe (couro cabeludo). A nova proposta terapêutica em rápido ETCC possui duas modalidades de desenvolvimento nos últimos anos montagem conhecidas como anódica parecendo ser uma técnica promisso- (excitatória) e catódica (inibitória). No ra para o tratamento de vários distúr- caso da ETCC anódica, o ânodo está bios do neurodesenvolvimento, como ligado à área do couro cabeludo que a Paralisia Cerebral (PC). deve ser estimulada e o cátodo fica A ETCC tem sido objeto de mui- ligado à área supraorbital contralate- tos estudos sobre os seus possíveis ral na testa, a montagem é invertida efeitos cognitivos (Jacobson et al., para a ETCC catódica (Fregni, Bog- 2012). Um dos mecanismos de ação gio & Brunoni, 2012). Está bem esta- propostos para as técnicas de neuro- belecido que a ETCC anódica au- modulação, Estimulação menta a excitabilidade cortical, atra- Magnética Transcraniana Repetida vés da diminuição do limiar de excita- (EMTr) e a ETCC, é a indução de po- bilidade da membrana neuronal, en- tenciais de longa duração (PLD) e a quanto que a ETCC catódica aumen- depressão de longa duração (DLD), ta esse mesmo limiar, diminuindo ou como deprimindo como fenômenos a neurofisiológicos atividade cortical (Lomo, 2003; Esser et al., 2006). A (Jacobson et al., 2012). Em outras PLD e DLD também estão entre os palavras, a ETCC anódica está envol- mais importantes processos neurobi- vida na despolarização das membra- ológicos envolvidos na memória e aprendizagem (Marshall et al., 2005; nas neuronais, enquanto que a ETCC catódica induz hiperpolarização. Galea & Celnik, 2009). AGO/16 a A PC é uma síndrome não pro- Durante os protocolos de ETCC, gressiva, mas geralmente mutável, de uma corrente fraca (1 ou 2 mA), é alterações motoras secundárias à le- emitido por uma bateria, através de são ou anomalias do cérebro em de- um par de eletrodos (um eletrodo senvolvimento, que acontecem antes Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br RELATO DE PESQUISA CONTINUANDO... dos três anos (Camacho-Salas et al., hemiplegia esquerda, o comprometi- 2007; Lin, 2003). O diagnóstico clíni- mento de ambas as funções é mais co da PC é baseado nas manifesta- expressivo. ções motoras que são classificadas a Alguns autores estimam que até partir de uma avaliação física e neu- 75% das pessoas com PC tem algum rológica (Pharoah et al., 1998). Com importante distúrbio no funcionamen- o desenvolvimento da criança, as al- to cortical (Liptak & Accardo, 2004). terações motoras podem ser modifi- Consequentemente, as crianças e cadas como, por exemplo, a adapta- adolescentes com PC estão em risco ção à falta de controle muscular, que de pode provocar o encurtamento das aprendizagem. Uma investigação dos fibras musculares e consequente- registros educacionais de crianças mente deformações ósseas (Hartley com PC que frequentaram escolas & Thomas, 2003). regulares revelou que 46% tiveram dificuldades de As alterações cognitivas têm si- pelo menos uma dificuldade específi- do apontadas como resultantes das ca de aprendizagem (Schenker, Cos- lesões cerebrais, sendo um dos focos ter, e Parush, 2005). No entanto, sur- de investigação na PC a relação en- preendentemente, tre as áreas cerebrais comprometidas têm investigado a questão das dificul- e as consequências das mesmas dades de aprendizagem em crianças (Freitas, Cardoso & Siquara, 2009). com PC e ainda menos têm tentado Clinicamente, as alterações cogniti- desvendar a origem dessas dificulda- vas mais frequentes são os distúrbios des e formas de intervenção precoce. de linguagem, das praxias e do com- Uma análise dos poucos estudos dis- portamento social (Freitas, Cardoso & poníveis sobre as dificuldades de Siquara, 2009; Freitas, 2009). Freitas aprendizagem na PC indica que es- (2009), por exemplo, estudou as fun- tas crianças são mais propensas a ter ções dificuldades psicolinguísticas e viso- de poucos estudos aprendizagem na espaciais, demonstrando diversas es- área da matemática (Frampton, Yude pecificidades para os aspectos cogni- & Goodman, 1998; Jenks et al., 2007; tivos da PC como, por exemplo, que Jenks et al., 2012). nas crianças com hemiplegia direita em comparação com as crianças com AGO/16 apresentarem Especificamente, na paralisia cerebral, os estudos demonstram que Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br RELATO DE PESQUISA CONTINUANDO... a ETCC é uma técnica segura e de ção, os participantes realizavam tare- fácil aplicação, com adequada tole- fas de comparação e subtração nu- rância pela criança e com mínimos méricas simbólicas. Na tarefa de efeitos adversos descritos (sensação comparação numérica, por exemplo, de formigamento e vermelhidão local) os participantes tinham de dizer o (Grecco et al., 2014a; Grecco et al., mais rápido possível se o número 2014b). Por se tratar de uma técnica arábico apresentado era maior ou inovadora e relativa nova, os ensaios menor do que 65 (eram apresentados clínicos publicados até o momento números entre 31-99, exceto o 65). apresentam exclusivamente, o uso Diferentes protocolos de estimulação combinado da ETCC com o treino de foram utilizados em cada sessão: es- marcha em esteira ou o uso isolado timulação anódica esquerda (AE), es- para o tratamento da espasticidade. timulação anódica bilateral (AB), esti- Não há estudos que tenham analisa- mulação catódica bilateral (CB) e esti- do a neuromodulação cognitiva, atra- mulação sham (S). No segundo expe- vés da ETCC, aplicada a crianças e rimento, os autores mantiveram as adolescentes com paralisia cerebral. mesmas tarefas, porém realizaram Apenas um estudo avaliou os apenas duas sessões de estimula- efeitos benéficos da ETCC sobre o ção, com diferentes protocolos: esti- processamento de magnitudes numé- mulação anódica direita (AD) e esti- ricas e aritmética mental (Hauser et AGO/16 mulação sham. al., 2013). Devido a clara lateraliza- Os resultados do estudo foram ção dessa função em adultos, os au- que para a estimulação anódica es- tores estimularam regiões cerebrais à querda houve um aumento significati- direita, à esquerda e bilateralmente vo do desempenho dos participantes em dois experimentos. No primeiro em tarefas de comparação e subtra- experimento, 21 participantes destros ção numéricas, enquanto que a esti- com idade média de 22,8 anos (±3.1) mulação bilateral e anódica direita e sem histórico de doenças neuropsi- não induziu nenhuma melhora quan- quiátricas, discalculia ou DAM passa- do comparado à estimulação sham ram por quatro sessões de ETCC, (Hauser et al., 2013). Os autores tam- com intervalo mínimo de 24h entre as bém demonstraram que o Córtex Pa- sessões. Antes e depois da estimula- rietal Posterior (CPP) está causal- Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br RELATO DE PESQUISA CONTINUANDO... mente envolvido no processamento ciado a realização de tarefas com nú- de magnitudes numéricas e aritmética meros e cálculos em crianças e ado- metal. Eles também demonstraram lescentes com PC. A ETCC é uma que essas funções cognitivas podem ferramenta atraente para esse objeti- melhorar a partir da utilização da vo, pois é um método não-invasivo, ETCC (Hauser et al., 2013). seguro para modificar o limiar de ex- Esses achados encorajam futu- citabilidade da membrana neuronal e ras investigações sobre os potenciais a atividade cortical espontânea, e efeitos benéficos da ETCC sobre o consequentemente domínio da cognição numérica em processamento de informações de indivíduos saudáveis e com prejuízos forma eficaz. Até o momento, foi con- nas habilidades numéricas como cri- o duzido um estudo-piloto com 7 partici- anças com PC e discalculia do de- pantes - crianças e adolescentes com senvolvimento. Entretanto, até o mo- idade média de 11,29 anos (dp = mento não encontramos estudos que 3,25). Foram utilizadas como medi- tenham utilizado a EMTr ou a ETCC das cognitivas o Teste dos Cinco Dí- para o tratamento da discalculia do gitos (FDT) e a bateria de testes neu- desenvolvimento em adultos ou em ropsicológicos para a avaliação do crianças e adolescentes. Além disso, tratamento de números e cálculos os recentes estudos sobre o uso da (ZAREKI-R), e como medida de de- ETCC na PC têm se limitado ao do- sempenho acadêmico, o Teste de mínio motor (redução da espasticida- Desempenho Escolar (TDE). O proje- de), não investigando ainda a sua to está na etapa final de coleta de da- aplicação ao domínio cognitivo. dos e preparação da análise de da- Diante do exposto, no estudo de doutoramento que está sendo conduzido pelo autor, há interesse em investigar os potenciais efeitos benéficos da ETCC sobre a cognição numérica quando a estimulação é aplicada continuamente por 20 min durante 5 dias na região do CPP, asso- AGO/16 modificando dos preliminares. Em breve os dados serão disponibilizados para a comunidade acadêmica. O estudo é orientado pelo Dr. Mauro Muszkat (UNIFESP). Os pesquisadores envolvidos agradecem o apoio da CAPES e da Associação do Fundo de Incentivo à Pesquisa (AFIP). Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br RELATO DE PESQUISA CONTINUANDO... AGO/16 REFERÊNCIAS 1. Camacho-Salas, A., Pallás-Alonso C. R., De La Cruz-Bértolo, J., De Las Heras, R. S. & Mateos-Beato, F. (2007) Parálisis cerebral: concepto y registros de base poblacional. Rev Neurol; 45(8):503-508. 2. Esser, S. K., Huber, R., Massimini, M., Peterson, M. J., Ferrarelli, F., & Tononi, G. (2006). A direct demonstration of cortical LTP in humans: a combined TMS/EEG study. Brain Res. Bull. 69, 86–94. 3. Frampton, I., Yude, C., & Goodman, R. (1998). The prevalence and correlates of specific learning difficulties in a representative sample of children with hemiplegia. British Journal of Educational Psychology, 68, 39–51. 4. 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Cognitive correlates of mathematical achievement in children with cerebral palsy and typically developing children. British Journal of Educational Psychology; 82: 120–135. Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br RELATO DE PESQUISA CONTINUANDO... 14. Lin, J. P., (2003). The cerebral palsies: a physiological approach. J Neurol Neurosurg Psychiatry Mar; 74:(1) i23-9. 15. Liptak, G. S., & Accardo, P. J. (2004). Health and social outcomes of children with cerebral palsy. Journal of Pediatrics, 145(2), S36–S41. 16. Lomo, T. (2003). The discovery of long-term potentiation. Philos. Trans. R. Soc. Lond. B Biol. Sci.; 358: 617–620. 17. Marshall, L., Mölle, M., Siebner, H. R., and Born, J. (2005). Bifrontal transcranial direct current stimulation slows reaction time in a working memory task. BMC Neurosci.; 6, 23. 18. Pharoah, P. O. D., Cooke, T., Johnson, M. A., King. R. & Mutch, L., (1998). Epidemiology of cerebral palsy in England Scotland, 1984-1989. Archives of Disease in Childhood; 79(I): 21-25. 19. Schenker, R., Coster, W. J., & Parush, S. (2005). Neuroimpairments, activity performance, and participation in children with cerebral palsy mainstreamed in elementary schools. Developmental Medicine and Child Neurology; 47, 808–814. 20. Hauser, T. U., Rotzer, S., Grabner, H. R., Mérillat, S., & Jäncke, L. (2013). Enhancing performance in numerical magnitude processing and mental arithmetic using transcranial Direct Current Stimulation (tDCS). Frontiers in Human Neuroscience, 7(244), 1-9. Thiago da Silva Gusmão Cardoso Psicólogo no Centro Paulista de Neuropsicologia (CPN), Mestre em Educação e Saúde na Infância e Adolescência (UNIFESP), Doutorando em Ciências (UNIFESP). Docente no Centro Universitário Adventista de São Paulo (UNASP) e Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU). AGO/16 Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br RESUMO DE ARTIGO Há instrumentos do tipo screening cognitivo sensíveis e específicos para pacientes após AVC? Stolwyk, R. J., O´Neill, M. H., McKay, A. J. D., & Wong, D. K. (2014). Are cognitive screening tools sensitive and specific enough for use after stroke? A sistematic literature review. Stroke, 45(10), 3129-34. doi: 10.1161/ STROKEAHA.114.004232 Estima-se que três quartos dos pacientes apresentam comprometimento cognitivo após ter sofrido um acidente vascular cerebral (AVC), o que prejudica a recuperação funcional e a qualidade de vida dessa população (Nys et al., 2005). Contudo, as disfunções cognitivas não são percebidas pelos profissionais da saúde no leito hospitalar, sendo importante uma avaliação neuropsicológica de múltiplos domínios cognitivos, utilizando ferramentas válidas e fidedignas. No entanto, uma avaliação neuropsicológica completa mostra-se extensa e tem um alto custo para ser administrada na rotina do hospital. Por isso, recomenda-se o uso de medidas de screening (instrumentos de triagem) para avaliar déficits cognitivos e encaminhar os pacientes com indicadores de prejuízos para uma avaliação neuropsicológica mais ampla (Jaillard, Naegele, Trabucco-Miguel, LeBas, & Hommel, 2009). O artigo “Are cognitive screening tools sensitive and specific enough for use after stroke? A sistematic literature review” publicado em 2014 por Stolwyk, O´Neill, McKay e Wong na revista Stroke teve como objetivo re- AGO/16 visar sistematicamente especificidade (SP), sensibilidade (SE), valor preditivo positivo (PPV) e valor preditivo negativo (NPV) dos screenings cognitivos usados para avaliar pacientes que sofreram AVC. É importante que os instrumentos de screening apresentem SE (capacidade do teste detectar os indivíduos verdadeiramente positivos, ou seja, diagnosticar corretamente os casos clínicos), SP (capacidade que o teste tem de detectar os verdadeiros negativos, isto é, de identificar corretamente os casos saudáveis), PPV (qualidade que um teste tem de corretamente identificar dentre o total de positivos ao teste, quais os verdadeiros positivos) e NPV (probabilidade de, perante um resultado negativo, não haver doença) para a população a qual se destina. Stolwyk et al. (2014) buscaram nas bases de dados MedLine, PsychInfo, Scopus, PubMed e CINAHL, artigos com as seguintes palavras-chave: stroke, cerebrovasc*, cognit*, screen*, sensitivity, specificity. Encontraram-se 16 artigos com amostra de adultos, com AVC isquêmico ou hemorrágico, que realizaram análise de SE, SP, PPV e NPV de um scree- Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br RESUMO DE ARTIGO CONTINUANDO... ning cognitivo comparado com uma avaliação neuropsicológica padrãoouro. Todos calcularam a SE e a SP por meio de curvas ROC (Receiver Operative Characterisitics). Somente nove dos 16 estudos calcularam PPV e NPV. A avaliação padrão-ouro usada para classificar o perfil cognitivo dos participantes diferiu entre os estudos e frequentemente avaliavam linguagem, percepção, atenção, memória e funções executivas. Calculias, praxias e velocidade do processamento foram incluídas apenas em quatro estudos. O Mini Exame do Estado Mental (MMSE) e o Montreal Cognitive Assessment (MoCA) foram os instrumentos mais estudados. Onze estudos investigaram a SE e a SP do MMSE, e muitos verificaram sua falta de SE e SP, com três referindo níveis aceitáveis (SE > 80% e SP > 60%). Os três estudos utilizaram pontos de corte de 26/30 ou 27/30. Os dados de PPV dos três estudos foram geralmente maiores que 80%, contudo, o NPV foi menos significativo, variando de 65% a 73%. O MoCA foi analisado em cinco estudos que investigaram sua SE e SP e apenas três encontraram resultados aceitáveis. Estes justificaram que esse teste contém itens que avaliam as funções executivas, que são frequentemente afetadas no AVC e escores ajustados ao nível educacional. A SE e SP do MoCA foram mostradas para pontos de corte ajustados de 21 a 26 pontos. So- AGO/16 mente dois estudos apresentaram PPV e NPV >80%. Quatro estudos compararam o MMSE e o MoCA: dois não encontraram diferenças significativas entre esses instrumentos, um estudo identificou que o MoCA era superior ao MMSE em pacientes com um ano pós AVC, um estudo mostrou que o MoCA tinha maior SE em relação ao MMSE, quatro estudos verificaram que o MoCA tinha maior SE, mas pior SP em relação ao MMSE. Repeatable Battery for the Assessment of Neuropsychological Status (RBANS) e Cognistat demonstraram adequada SE e SP, mas o NPV foi de 53% para o RBANS, e não foram mostrados esses dados do Cognistat. Barrow Neurological Institute (BNI) apresentou dados aceitáveis em pessoas com mais de 55 anos de idade e não abaixo disso. Middlesex Elderly Assessment of Mental State (MEAMS), Addenbrooke Cognitive Examination, Revised (ACE-R), Screening Instrument for Neuropsychological Impairments in Stroke (SINS), e Clock Drawing Test não mostraram resultados aceitáveis de SE e SP. Stolwyk et al. (2014) destacaram que muitos pesquisadores indicaram que 80% de SE e 60% de SP é considerado o ideal. Contudo, 20% de pacientes não detectados com déficit cognitivo mostra-se inaceitável na prática clínica. Ainda, os screenings em sua maioria não continham tarefas que avaliam calculias, praxia Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br RESUMO DE ARTIGO CONTINUANDO... e velocidade do processamento, que são frequentemente prejudicadas no AVC, sugerindo que os screenings deveriam incluir essas medidas. O MMSE e o MoCA são dois screenings recomendados na prática clínica, embora não tenham sido construídos especificamente para AVC. No entanto, não se pode assumir que a validade e a fidedignidade dos screenings em outras populações clínicas são comparáveis à população com AVC. O perfil cognitivo dos pacientes pós AVC é heterogêneo, em que eles manifestam afasia, apraxia, heminegligência, agnosia, dentre outros déficits. O desenvolvimento de medidas de screening específicas para AVC são recomendadas se as já existentes não mostrarem resultados positivos em estudos futuros. Referências 1. Jaillard, A., Naegele, B., Trabucco-Miguel, S., LeBas, J. F., & Hommel, M. (2009). Hidden dysfunctioning in subacute stroke. Stroke, 40, 2473–2479. doi: 10.1161/ STROKEAHA.108.541144 2. Nys, G. M., van Zandvoort, M. J., de Kort, P. L., van der Worp, H. B., Jansen, B. P., Algra, A., ... Kappelle, L. J. (2005). The prognostic value of domain-specific cognitive abilities in acute first-ever stroke. Neurology, 64, 821–827. doi: 10.1212/01.WNL.0000152984.28420.5 3. Stolwyk, R. J., O´Neill, M. H., McKay, A. J. D., & Wong, D. K. (2014). Are cognitive screening tools sensitive and specific enough for use after stroke? A sistematic literature review. Stroke, 45(10), 3129-34. doi: 10.1161/STROKEAHA.114.004232 Jaqueline de Carvalho Rodrigues Psicóloga (CRP 07/19832). Especialista em Neuropsicologia (CFP), Mestre e Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Integrante do Núcleo de Estudos em Neuropsicologia Cognitiva (NEUROCOG) e da Sociedade Brasileira de Neuropsicologia Jovem (SBNp Jovem). Atua como profissional clínica e pesquisadora nas áreas de avaliação neuropsicológica e reabilitação cognitiva. AGO/16 Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br POLÍTICAS PÚBLICAS AGO/16 Políticas Públicas de Combate ao AVC no Brasil O acidente vascular cerebral um ou ambos os olhos, para cami- (AVC), também conhecido entre a po- nhar, tontura, perda de equilíbrio e/ou pulação como infarto cerebral, isque- coordenação motora, dor de cabeça mia ou derrame é mundialmente uma intensa, diminuição ou perda de cons- das principais causas de morte e de ciência (Ministério da Saúde, 2013). prejuízos cognitivos, motores e funcio- Quanto mais cedo o paciente chegar a nais, atingindo em torno de 16 milhões um hospital especializado, a partir da de pessoas a cada ano. No Brasil, são ocorrência dos sintomas, menor a registradas anualmente aproximada- chance de ficar com algum déficit mente 100 mil mortes, ocasionando após o evento, sendo importante a um impacto econômico e social na po- identificação e o tratamento precoces. pulação. De acordo com o Ministério O Ministério da Saúde e a Aca- da Saúde a doença, que era a princi- demia Brasileira de Neurologia têm pal causa de morte no país, está em realizado um Plano de Ações Estraté- segundo lugar, atrás apenas do infar- gicas para o Enfrentamento das Doen- to, desde 2011. Apesar disso, o AVC é ças Crônicas Não Transmissíveis, tais uma doença negligenciada, na qual os como o AVC, infarto agudo do miocár- brasileiros não sabem reconhecer sin- dio, dentre outras. Uma das estraté- tomas, atitudes frente ao quadro agu- gias é diminuir o número de casos de do, fatores de risco e prevenção. AVC auxiliando indivíduos a controlar Os sinais mais comuns de que os fatores de risco como diabetes, hi- uma pessoa está sofrendo um AVC pertensão, obesidade, tabagismo e são fraqueza repentina ou dormência alcoolismo. Há alguns anos existe um da face, braço e/ou perna, geralmente acordo entre o Ministério da Saúde e em um lado do corpo. Além disso, o a Associação das Indústrias da Ali- indivíduo pode manifestar confusão mentação que viabilizou a retirada de mental, alteração cognitiva (em me- grandes quantidades de sódio dos ali- mória, atenção e velocidade de pro- mentos cessamento da informação, por exem- que a diminuição do consumo excessi- plo), dificuldade para falar ou compre- vo de sal poderá reduzir até 15% os ender o que está sendo dito, proble- óbitos por AVC e 10% os óbitos por mas para engolir, para enxergar com infarto, de acordo com a Sociedade Sociedade Brasileira de Neuropsicologia industrializados. Estima-se www.sbnpbrasil.com.br POLÍTICAS PÚBLICAS CONTINUANDO... AGO/16 Brasileira de Cardiologia. Ainda, será sas, debates e outras atividades que feita uma economia nos medicamen- auxiliem na identificação de fatores de tos para hipertensão e aumentar a ex- risco, práticas preventivas, diagnósti- pectativa de vida dos indivíduos. Os cas, terapêuticas e de reabilitação próximos projetos pretendem reduzir o destinadas ao AVC. Acredita-se que açúcar nos alimentos processados. alertando a população sobre os bene- Outra ação do Ministério da Sa- fícios de práticas saudáveis de saúde úde e da Academia Brasileira de Neu- seja possível evitar em torno de 90% rologia para minimizar as mortes por dos casos de doenças cerebrovascula- AVC é adequar os hospitais para que res. sejam especializados, com equipe mé- No Brasil, também há uma or- dica treinada e neurologistas disponí- ganização não governamental, reunida veis em situações de intervenção. O a partir da iniciativa do Ministério da tratamento trombolítico, utilizado em Saúde, destinada a estimular políticas casos de AVC isquêmico (quando há públicas de prevenção ao AVC, intitu- falta de fluxo sanguíneo cerebral) atu- lada “Rede Brasil AVC”, tendo como almente é acessível pelo Sistema Úni- presidente atual o Dr. Octávio Mar- co de Saúde (SUS) e está disponível ques Pontes Neto. Essa organização é em diversos hospitais espalhados pelo formada por profissionais da saúde Brasil, desde 2012. Portanto, o contro- (médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, le dos fatores de risco para o AVC e a dentre outros) que buscam diminuir o criação de centros especializados são número de casos, adequar o atendi- políticas públicas importantes para di- mento pré-hospitalar e hospitalar, pro- minuir a mortalidade e as sequelas piciar a reabilitação precoce e reinte- provocadas por essa doença. gração social dos pacientes. Ainda, a O dia 29 de outubro é o Dia Rede Brasil AVC tem como objetivo Mundial de Combate ao AVC e tam- atuar no ensino, pesquisa e assistên- bém é considerado o Dia Nacional de cia de pacientes e seus familiares em Prevenção ao Acidente Vascular Cere- todo o país. A partir das políticas públi- bral no Brasil. Essa data tem por finali- cas destinadas à prevenção do AVC, dade estimular ações de conscientiza- estudos epidemiológicos devem ser ção populacional sobre os sinais, sin- conduzidos, a fim de identificar o im- tomas e controle dos fatores de risco pacto dessas práticas na saúde dos do AVC. Ainda, estimulam-se pesqui- brasileiros. Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br POLÍTICAS PÚBLICAS CONTINUANDO... Esse texto foi produzido a partir dos seguintes sites informativos e cartilha, que também podem ser acessados pelos leitores para maiores informações sobre políticas públicas e AVC: 1. http://portalsaude.saude.gov.br/index.php/o-ministerio/principal/secretarias/sas/sasnoticias/24351-acordo-ja-retirou-14-mil-toneladas-de-sodio-dos-alimentos-processados 2. http://www.brasil.gov.br/saude/2012/10/em-10-anos-pais-reduz-em-32-mortes-por-avc 3. http://www.revistahospitaisbrasil.com.br/noticias/novas-politicas-publicas-reforcando-ocombate-ao-avc 4. http://www.redebrasilavc.org.br/institucional/quem-somos 5. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas (2013). Diretrizes de atenção à reabilitação da pessoa com Acidente Vascular Cerebral. Disponível em http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/ diretrizes_atencao_reabilitacao_acidente_vascular_cerebral.pdf Jaqueline de Carvalho Rodrigues Psicóloga (CRP 07/19832). Especialista em Neuropsicologia (CFP), Mestre e Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Integrante do Núcleo de Estudos em Neuropsicologia Cognitiva (NEUROCOG) e da Sociedade Brasileira de Neuropsicologia Jovem (SBNp Jovem). Atua como profissional clínica e pesquisadora nas áreas de avaliação neuropsicológica e reabilitação cognitiva. AGO/16 Sociedade Brasileira de Neuropsicologia www.sbnpbrasil.com.br GESTÃO 2015-2017 Presidente: Neander Abreu Vice-presidente: Gabriel Coutinho Conselho deliberativo Leandro Fernandes Malloy-Diniz Paulo Mattos Jerusa Salles Lucia Iracema Conselho fiscal Rodrigo Grassi-Oliveira Annelise Júlio Laiss Bertola Secretária Executiva Carina Chaubet D’Alcante Valim Secretário Geral Andressa M. Antunes Tesouraria Executiva Beatriz Bitttencourt Tesouraria Geral Deborah Azambuja AGO/16 Presidente: Alina Teldeschi Vice-presidente: Gustavo Siquara Comissão SBNp Jovem: Adriele Wyzykowski Camila Bernardes Cássio Lima Fuuka Sunano Jaqueline Rodrigues Natália Becker Natália Canário Samara Reis Thais Quaranta Thales Coutinho Comissão SBNp Kids: Nayara Argollo Sociedade Brasileira de Neuropsicologia Editoração: Fuuka Sunano www.sbnpbrasil.com.br