responsabilidade civil nas relações de trabalho

Transcrição

responsabilidade civil nas relações de trabalho
RESPONSABILIDADE CIVIL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO
Reflexões Atuais
Rodrigo Fortunato Goulart
Marco Antônio Villatore
coordenadores
RESPONSABILIDADE CIVIL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO
Reflexões Atuais
Homenagem ao Professor
José Affonso Dallegrave Neto
EDITORA LTDA.
© Todos os direitos reservados
Rua Jaguaribe, 571
CEP 01224-001
São Paulo, SP – Brasil
Fone (11) 2167-1101
www.ltr.com.br
Abril, 2015
Versão impressa: LTr 5243.9 — ISBN: 978-85-361-8352-7
Versão digital:
LTr 8648.8 — ISBN: 978-85-361-8342-8
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Responsabilidade civil nas relações de trabalho : reflexões atuais :
homenagem ao professor José Affonso Dallegrave Neto / Rodrigo
Fortunato Goulart, Marco Antônio Villatore, coordenadores. – São
Paulo: LTr, 2015.
Bibliografia.
1. Dallegrave Neto, José Affonso 2. Direito do trabalho – Brasil 3.
Responsabilidade (Direito) – Brasil I. Goulart, Rodrigo Fortunato. II.
Villatore, Marco Antônio. III. Série.
15-01654 CDU-347.51:331.823(81)
Índice para catálogo sistemático:
1. Brasil : Responsabilidade civil :
Direito do trabalho 347.51:331.823(81)
Sumário
Prefácio.......................................................................................................................................................9
Currículo do Homenageado – Prof. José Affonso Dallegrave Neto................................13
Fundamentos para uma Adequada Aplicação da Teoria da Responsabilidade Civil
no Direito do Trabalho........................................................................................................................17
José Affonso Dallegrave Neto
A Responsabilidade da Administração Pública Decorrente da Terceirização Ante
a Convenção n. 94 da Organização Internacional Trabalho.............................................35
Ana Maria Maximiliano e Rodrigo Fortunato Goulart
Terceirização e Responsabilidade Solidária: a aplicação da teoria dos contratos
coligados no Direito do Trabalho..................................................................................................47
Cássio Casagrande
O Termo Inicial do Prazo Prescricional nas Ações Acidentárias......................................57
Cláudio Brandão
A Causa de Pedir nas Ações Indenizatórias Decorrentes de Acidente do Trabalho
e o Limite de sua Análise Pelo Julgador. Algumas Ponderações........................................69
Daniel Natividade Rodrigues de Oliveira
Poder Diretivo do Empregador e a Preservação da Saúde do Empregado: um
perfil analítico da realidade contemporânea à luz dos direitos humanos e
fundamentais..................................................................................................................................75
Dinaura Godinho Pimentel Gomes
Responsabilidade Civil da Empresa nos Acidentes de Trabalho..........................................89
Domingos Sávio Zainaghi
Enfoque de Agresiones Nocivas en el Lugar de Trabajo. Su Construcción y Nexos
con la Responsabilidad Civil en Argentina.................................................................................93
Fabián Llanos
Da Nulidade do Pedido de Dispensa Realizado pela Empregada sem o Conhecimento
do seu Estado Gravídico.......................................................................................................................107
Fábio Túlio Barroso e Lucas Barbalho de Lima
6
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
Sumário
Responsabilidade Civil do Empregador – Quantum Indenizatório Decorrente do
Assédio e Dano Moral – Atos Repetidos..........................................................................................121
Felipe Augusto de Magalhães Calvet e Luana Popoliski Vilacio Pinto
Direito ao Trabalho Decente e a Proteção Internacional dos Direitos Sociais........127
Flávia Piovesan
O Cuidado, o Ser ao invés do Ter e a Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho.147
Francisco Alberto da Motta Peixoto Giordani
A Responsabilidade Civil e o Direito Constitucional do Trabalho (breves considerações sobre o acidente de trabalho)...........................................................................................159
Gilberto Stürmer
Responsabilidade Civil do Empregador e Tutela do Meio Ambiente de Trabalho.......165
Gustavo Filipe Barbosa Garcia
A Utilidade Marginal Decrescente e a Quantificação da Indenização por Dano
Moral Devida aos Altos Executivos................................................................................................175
Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho
A Prescrição do Direito à Reparação Civil na Justiça do Trabalho..................................185
Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante e Francisco Ferreira Jorge Neto
Excludentes Gerais da Responsabilidade Civil Objetiva.........................................................199
Júlio César Bebber
A Responsabilidade Civil dos Administradores na Terceirização Ilícita de Cooperativas...........................................................................................................................................................209
Leila Andressa Dissenha e Tiago de Araújo Gonçalves
A Responsabilidade Solidária na Terceirização Ilícita...........................................................223
Lorena Vasconcelos Porto
O Poder de Disposição sobre o Corpo: os direitos da personalidade e os direitos
fundamentais............................................................................................................................................237
Luciana Carneiro de Lara
Elementos para o Diálogo entre Relações Jurídicas de Direito Civil e de Direito
do Trabalho a partir da Recente Jurisprudência......................................................................251
Luiz Edson Fachin
Privacidade e Intimidade como Direitos na Relação Empregatícia..................................259
Luiz Eduardo Gunther
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
Sumário
7
Apontamentos Conceituais Propedêuticos da Responsabilidade Civil Acidentária.271
Manuela Souza Trindade
O Abuso de Direito: Relações Civis e do Trabalho Conexos ao Dano Existencial e
Sobreaviso...................................................................................................................................................281
Marco Aurélio de Macedo Loiola
Discriminação no Trabalho e Prova — Ampliação das Hipóteses da Súmula n. 443,
do TST............................................................................................................................................................291
Marcos Neves Fava
Dano Extrapatrimonial na Relação Empregatícia e a Função Social da Empresa. A
Produtividade Desmedida, Consequências e os Direitos Humanos....................................295
Martinho Martins Botelho e Marco Antônio Villatore
Breves Considerações sobre a Tutela Extrapatrimonial na Realidade Jurídica
Italiana: Danos Moral, Biológico e Existencial........................................................................307
Ney Maranhão
La Discriminación en el Contrato de Trabajo y su Debida Reparación............................319
Oscar Eduardo Benitez
A Necessidade de se Resgatar o Verdadeiro Sentido da Dignidade do Trabalhador.327
Rafael Carmezim Nassif
Responsabilidad Civil por Violaciones al Derecho de Asociación Sindical en el
Sistema Interamericano de Derechos Humanos.........................................................................335
Ricardo Barona Betancourt
A Responsabilidade Civil Mecanismo de Proteção à Dignidade da Pessoa Humana
no Ambiente de Trabalho: formas de efetivação......................................................................345
Ronald Silka de Almeida
Responsabilidade Pós-Contratual no Direito do Trabalho..................................................353
Rúbia Zanotelli de Alvarenga
Medo e Violência no Meio Ambiente de Trabalho: aspectos da responsabilidade
civil do empregador estatal no exercício de atividade de correspondente
bancário......................................................................................................................................................365
Sandro Lunard Nicoladeli, André Passos, Almir Antonio Fabricio de Carvalho, Luasses Gonçalves dos Santos,
Denise Vieira de Castro, Maria Luisa Altoé Nieweglowski, Fabio Augusto Mello Peres, João Guilherme Walski
de Almeida, Renan Gustavo Lourenço do Prado e Giovani Soares do Nascimento
Direitos Humanos e Liberdade sindical. A Atuação do Judiciário em face de Atos
Antissindicais Praticados pelos Empregadores: estudo de caso-referência...............381
Sayonara Grillo Coutinho Leonardo da Silva, Henrique Figueiredo de Lima e Thiago Patrício Gondim
8
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
Sumário
A Responsabilidade Civil nos Acidentes de Trabalho – Culpa, Risco Criado e Risco
Integral.......................................................................................................................................................393
Sergio Cavalieri Filho
Para uma Nova Percepção dos Acidentes de Trabalho e do Dever de Reparação........399
Sidnei Machado
A Responsabilidade Civil do Empregador no Assédio Moral e Sexual...............................409
Sônia Mascaro Nascimento
Terceirização e Acidente do Trabalho: responsabilidade civil do tomador de
serviços................................................................................................................................................. 425
Tânia Regina Silva Reckziegel, Verônica Seganfreddo Padão Schuster e Rafael Ely
Prefácio
É com imensa satisfação que apresentamos esta obra que homenageia a trajetória profissional do Professor
Doutor José Affonso Dallegrave Neto, notável juslaboralista, advogado, professor e titular da cadeira n. 28 da Academia Brasileira de Direito do Trabalho.
O lançamento deste livro, em paralelo ao 2º Congresso Nacional de Direito do Trabalho da PUCPR, evento
também em sua homenagem, é, por si só, um fato que deve ser destacado no rol dos esforços que se destinam, no
Brasil, a divulgar, discutir e ensinar a importante (e decisiva) influência do Direito Civil no Direito do Trabalho.
Dedicá-lo ao Professor Dallegrave empresta-nos maior expressão e representatividade, considerando a importância
deste mestre no contexto jurídico e cultural do país, e do reconhecimento de sua vasta literatura jurídica, de seu
magistério, da qualidade da sua produção acadêmica e profissional, em suma, de sua inquestionável contribuição
para o progresso, constitucionalização e democratização das relações trabalhistas.
José Affonso Dallegrave Neto inclui-se hoje, com destaque, entre os mais importantes juslaboralistas do Brasil.
Nesse sentido, nada mais válido do que a oportunidade de se reunir, num livro jurídico, a contribuição de
uma plêiade de escritores e estudiosos, procedendo, com suas visualizações lineares, uma conexão do Direito Civil
com o Direito do Trabalho, caminho profissional comum de advogados, magistrados, procuradores, promotores,
professores e operadores do Direito.
O rápido avanço do progresso técnico-científico ao longo do último século, elevou ao máximo a capacidade
produtiva do ser humano. Paralela a esta realidade, surgiram incomensuráveis danos na sociedade contemporânea,
sedenta na busca de ações indenizatórias perpetradas por ofensores desatentos. E, certamente, é no ambiente de
trabalho onde as relações interpessoais são preponderantes, que encontramos um terreno fértil para incontáveis
conflitos advindos da realidade laboral.
Nesse sentido, o debate sobre a Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho faz-se necessário e urgente.
Deparamo-nos com fatos que repercutem diretamente no dia a dia dos trabalhadores, das empresas e do próprio
Poder Judiciário Trabalhista. Questões relacionadas aos direitos fundamentais, à tipologia do dano, ao assédio
sexual e moral, etc., instigam e exigem a análise a partir de diversos ângulos.
Os temas abordados neste livro, sobremaneira, mesmo que realizados de forma sintética, solidificam a premissa da garantia do reconhecimento à reparação integral dos danos, demonstrando que a doutrina avança a passos
largos, desbravando conceitos e revelando o quanto é capaz de modificar a sociedade, e, em consequência, gerar
melhor qualidade de vida aos trabalhadores.
Participam desta obra renomados articuladores, os quais se dispuseram a escrever temas relativos à responsabilidade civil nas relações trabalhistas. São trinta e sete artigos cuja diversidade é marcante, sendo que, cada
texto, com seu conteúdo próprio, procurou abranger as mais variadas discussões doutrinárias e jurisprudenciais
do momento. Não se esqueceu, este livro, de reunir material decisório do maior interesse, para a interpretação do
direito contemporâneo, oportunizando ao leitor atualizar-se, em uma única obra, dos assuntos que estão na pauta
atual das cortes trabalhistas.
10
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
Prefácio
Os artigos relacionam a Responsabilidade Civil com inúmeros institutos trabalhistas e processuais, desde prazo prescricional, tutela do meio ambiente de trabalho, passando pela quantificação da indenização por dano moral,
terceirização ilícita de cooperativas até indenização pós-contratual, dentre outros.
Queremos que você, leitor, tenha uma visão tão nítida quanto possível das relevantes questões da responsabilidade civil nas relações de trabalho atuais, por isso, este livro tem o intuito comum de oferecer aos que se dedicam
aos estudos trabalhistas, novos cenários de reflexão jurídica.
O NEATES – Núcleo de Estudos Avançados em Direito do Trabalho e Socioeconômico, grupo de pesquisa fundado em 2003, e ligado ao Programa de Mestrado/Doutorado em Direito da Pontifícia Universidade Católica do
Paraná (PUCPR), se sente honrado, satisfeito e com sentimento de missão cumprida ao publicar esta obra, com as
mais elevadas discussões jurídicas, fomentando pesquisas, debates e trabalhos acadêmicos, a fim de fazer aflorar a
contínua necessidade de se discutirem temas pertinentes ao Direito do Trabalho. Boa leitura.
Rodrigo Fortunato Goulart
Marco Antônio Villatore
Coordenadores
Homenagem a
José Affonso Dallegrave Neto
Currículo do Homenageado
Apresentamos, a seguir, os títulos e a relação das principais obras do Professor Doutor José Affonso Dallegrave
Neto, todas as produções científicas da mais alta relevância
e originalidade, compreendendo livros, cursos, artigos, monografias, ensaios e pareceres que engrandecem a cultura
jurídica do nosso país. Considerando sua importância, inserção e reconhecimento nacional, podemos afirmar, sem o
temor de incorrer em exageros, que o Prof. Dallegrave Neto
é um dos mais notáveis juslaboralistas do nosso tempo.
Formação acadêmica/titulação:
(2002) Doutor em Direito, Universidade Federal do Paraná,
UFPR, Brasil.
Título: Fundamentos Para uma Teoria Crítica da Responsabilidade Civil Proveniente da (In)Execução do
Contrato de Trabalho à Luz do Solidarismo Constitucional, Ano de obtenção: 2002.
Orientador(a): Aldacy Rachid Coutinho.
(1997) Mestre em Direito, Universidade Federal do Paraná,
UFPR, Brasil.
Título: Elementos do Contrato Individual de Trabalho –
Reflexões acerca da sua gênese civilista, caracteres,
elementos essenciais e acidentais, Ano de Obtenção:
1997.
Orientador: João Regis Fassbender Teixeira.
Graduação em Direito (1987), Faculdade de Direito de
Curitiba, Unicuritiba, Brasil.
Magistério em Nível Superior
Faculdade de Direito de Curitiba, Unicuritiba
(1989 – 2007) Vínculo: Celetista, Enquadramento Funcional: Professor Titular, Carga horária: 40, Regime:
Dedicação exclusiva.
(2003 – 2011) Ensino, Stricto Sensu, Nível: Pós-Graduação em Direito/Mestrado.
Professor EMATRA – Escola de Magistratura Trabalhista
da 9ª região.
Professor do Curso de pós-graduação da PUC/PR.
Professor convidado da Universidade Clássica de LisboaPortugal (2005).
Professor LEG (aulas via-satélite ao vivo com 2000 alunos
para 200 salas distribuídas em todo território nacional).
Prêmios e Títulos
(2006) Membro Pesquisador, Instituto Brasileiro de Direito Social Cesarino Júnior.
(2005) Oficial da Ordem São José Operário do Mérito Judiciário do Trabalho, Tribunal Regional do Trabalho
23ª Região.
(2005) Presidente Membro da Comissão Temática para a
Conferência Estadual dos Advogados, Seção do Paraná da Ordem dos Advogados do Brasil.
(2004) Membro da cadeira 28, ABNT – Academia Nacional de Direito do Trabalho.
(2004) Ordem do Mérito Jus et Labor, Tribunal Regional da
8ª Região.
(2001 a 2006) Membro examinador de banca no exame de
ordem da OAB-PR.
(2000 a 2006) Membro examinador do Concurso Público
de Ingresso da Magistratura Trabalhista do Paraná,
Mato Grosso e Bahia.
(2006) Banca examinadora do Concurso Nacional do Ministério Público do Trabalho. – Membro convidado
na vaga de jurista nas cinco etapas do concurso.
(DEZEMBRO DE 2007) – Convidado especial da ANAMATRA para atuar como âncora na IV Comissão da
I Jornada de Direito do Trabalho realizado no TST.
(2012) Membro examinador do Concurso Público de Ingresso da Magistratura Trabalhista do PR.
14
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
Currículo do homenageado
Livros Publicados e/ou Organizados
1. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 4. ed. São
Paulo: LTr, 2010. v. 1.
2. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 3. ed. São
Paulo: LTr, 2008.
3. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 2. ed. São
Paulo: LTr, 2007.
4. (Org.). João. As novas faces do direito do trabalho. Estudos em memória de Gilberto Gomes. Coordenação:
João Alves Neto. Salvador: Juspodivm Editora, 2006.
5. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 1. ed. São
Paulo: Editora LTr, 2005.
6. DALLEGRAVE NETO, J. A. (Org.) Direito do trabalho contemporâneo: flexibilização e efetividade. São
Paulo: LTr, 2003.
7.(Org.). O impacto do novo código civil no direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2003.
8. (Org.) COUTINHO, Aldacy Rachid (Org.) Transformações do direito do trabalho. Curitiba: Juruá, 2002.
9. (Org.). FREITAS, N. J. Execução trabalhista: estudos
em homenagem ao Ministro João Oreste Dalazen. São
Paulo: LTr, 2002.
10. Inovações na legislação trabalhista: reforma trabalhista
ponto a ponto. 2. ed. São Paulo: LTr, 2002.
11. (Org.). VIANNA, C. S. V. Rescisão do contrato de trabalho: doutrina e prática. São Paulo: LTr, 2002.
12. Inovações na legislação trabalhista: aplicação e análise
crítica. São Paulo: LTr, 2000.
13.(Org.). Inovações no processo do trabalho. Rio de Janeiro: Forense, 2000.
14. Contrato individual de trabalho: uma visão estrutural.
São Paulo: LTr, 1998.
15.(Org.). Direito do trabalho: estudos. São Paulo: LTr,
1997.
16. Responsabilidade civil no direito do trabalho. 5. ed. São
Paulo: LTr, 2014.
17. Globalização, neoliberalismo e direitos sociais. Rio de
Janeiro: Destaque, 1997.
Capítulos de Livros Publicados
1. Elementos da Responsabilidade Civil nos Acidentes
do Trabalho. In: Roberto Parahya de Arruda Pinto.
(Org.). Manual de Processo do Trabalho sob a perspectiva do Advogado. São Paulo: LTr, 2012, p. 153-175.
2. O Mundo do Trabalho na Contemporaneidade: Diretivas para um debate crítico acerca da dogmática jurídica.
In: Gabriel Velloso; Ney Maranhão. (Org.). Contemporaneidade e Direito do Trabalho: Aspectos materiais e
processuais: Estudos em homenagem aos 30 anos da
ANAMATRA 8. São Paulo: LTr, 2011, p. 78-102.
3. A Relação Jurídica Vista em uma Perspectiva Dinâmica. In: Luiz Eduardo Gunther; Willians Franklin Lira
dos Santos; Noeli Gonçalves da Silva Gunther. (Org.).
Tutela dos Direitos Da Personalidade na Atividade Empresarial, vol. III. Curitiba: Juruá, 2010.
4. Contrato de Trabalho Especial de Aprendizagem. In:
Mariane Josviak; Regina Bergamaschi Bley. (Org.). Ser
Aprendiz! Aprendizagem Profissional e Políticas Públicas: Aspectos Jurídicos, teóricos e práticos. 1. ed. São
Paulo: LTr, 2009, v. 1, p. 61-82.
5. Tutela processual em acidentes do trabalho, espécies
de ações acidentárias e a distribuição do ônus da
prova. In: Marcos Neves Fava; José Luciano de Castilho Pereira; Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho. (Org.).
O Direito Material e Processual do Trabalho nos novos
tempos: estudos em homenagem ao professor Estêvão
Mallet. 1. ed. São Paulo: LTr, 2009, v. 1, p. 323-341.
6. O Procedimento Patronal de Revista Íntima. Possibilidade e Restrições. In: Georgenor de Sousa Franco
Filho. (Org.). Trabalho da Mulher: homenagem a Alice
Monteiro de Barros. 1. ed. São Paulo: LTr, 2009, v. 1,
p. 202-216.
7. O solidarismo constitucional e a ampla tutela aos
Direitos de Personalidade. Um debate a partir da
jurisprudência do TST. In: Grijalbo Fernandes Coutinho. (Org.). O Mundo do Trabalho. 1. ed. São Paulo:
LTr, 2009, v. 1, p. 249-273.
8. A Execução Trabalhista e a Disregaed Doctrine –
Execução dos Bens dos Sócios em face da Disregard
Doctrine. In: J. Hamilton Bueno. (Org.). Curso de Direito Processual do Trabalho: Homenagem ao Ministro
Pedro Paulo Teixeira Manus. São Paulo: LTr, 2008, p.
288-310.
9. O Direito Geral de Personalidade e o Conceito de
Dano Moral Trabalhista. In: Luiz Eduardo Gunther.
(Org.). Tutela dos Direitos da Personalidade na Atividade Empresarial. Curitiba: Juruá, 2008, p. 111-129.
10. Função social da empresa como princípio constitucional – art. 170, III da CF de 1988. In: Ronald Silka
de Almeida. (Org.). Direito Constitucional do Trabalho vinte anos depois da CF de 1988. 22. ed. Curitiba:
Juruá, 2008, v. 1, p. 745-757.
11. Prescrição da Ação Trabalhista Acidentária. In: José
Luciano de Castilho Pereira; Nilton Correia. (Org.).
A Prescrição nas Relações de Trabalho. 1. ed. São Paulo:
LTr, 2007, p. 48.
12. Prescrição da Ação Trabalhista Reparatória e Acidentária. In: José Affonso Dallegrave Neto; Luiz Eduardo
Gunther e Sérgio Luiz da Rocha Pombo. (Org.). Direito do Trabalho – Reflexões Atuais. Curitiba: Juruá,
2007, p. 289-312.
13. Primeiras linhas sobre a Nova Competência da Justiça do Trabalho fixada pela Reforma do Judiciário. In:
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
Currículo do homenagiado
Grijalbo Fernandes Coutinho e Marcos Neves Fava.
(Org.). Nova Competência da Justiça do Trabalho. São
Paulo: LTr, 2005, p. 191-219.
14. Execução de título extrajudicial na justiça do trabalho. In: Aldacy Rachid Coutinho; Thereza Cristina
Gosdal. (Org.). Temas de ação civil pública. Curitiba:
Genesis, 2003, p. 117-129.
15. Términos do contrato de trabalho. In: VOGEL NETO,
Gustavo Adolfho. (Org.). Curso de direito do trabalho:
estudos em homenagem ao Professor Arion Sayão
Romita. Rio de Janeiro: Forense, 2000.
16. Nulidade do contrato de trabalho em face do agente
incapaz e a emenda de 20/98. In: COUTINHO, Aldacy Rachid; WALDRAFF, Célio Horst. (Org.). Direito
do trabalho e processo do trabalho: temas atuais. Curitiba: Juruá, 2000, p. 363-380.
17. Dano Praticado por atletas profissionais In: Direito do
Trabalho Desportivo. São Paulo: LTr, 2013. v. 1, p. 175187.
18. Indenização do Dano Moral Decorrente de Acidente
de Trabalho In: Dano Moral e Direitos Fundamentais.
Curitiba: Juruá, 2013. v. 1, p. 153-175.
19. O Teletrabalho: Importância, Conceito e Implicações
Jurídicas In: Novos Temas no Mundo do Trabalho. São
Paulo: LTr, 2012. v. 1, p. 297.
20.Função Social da empresa como princípio constitucional – art 170. III da CF de 1988 In: Direito
Constitucional do Trabalho vinte anos depois da CF de
1988. 22. ed. Curitiba: Juruá, 2008, v. 1, p. 745- 757.
Artigos Completos Publicados em
Periódicos
1. Sustentação Oral no Tribunal Regional do Trabalho.
Cadernos Jurídicos (OAB PR), v. 16, p. 1-4, 2011.
2. O Procedimento Patronal de Revista Íntima: Possibilidades e restrições. Revista do Advogado, v. 110, p.
56-68, 2010.
3. Função Social da Empresa como Princípio Constitucional. Trabalho em Revista (Impresso), v. 340, p.
5859-5868, 2010.
4. Desconto Salarial para Pagamento de Empréstimo
Pessoal: Comentários à Lei n. 10.820/2003. Revista
Científica Virtual da Escola Superior de Advocacia da
OAB-SP, n 4, p. 46-57, 2010.
5. A Indenização do Dano Acidentário na Justiça do Trabalho. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª
Região, n. 64, p. 45, 2010.
6. Reparação Judicial dos Danos Decorrentes do Acidente do Trabalho. Juris PLENUM trabalhista e
previdenciária, v. CD 30, p. seção doutrina, 2010.
15
7. Indenização do Dano Moral Decorrente de Acidente
do Trabalho. Revista do Ministério Público do Trabalho no Paraná, v. 1, p. 59-72, 2010.
8. Acúmulo e desvio funcional. Há amparo legal para
deferir a indenização equivalente ao prejuízo?. Revista da AMATRA VI, v. 2, p. 246-253, 2009.
9. A crise econômica chegou. Quais os desafios para o
Direito do Trabalho?. Revista Trabalhista (Rio de Janeiro), v. I, p. 50-55, 2009.
10. Compromisso Social da Empresa e Sustentabilidade:
aspectos jurídicos. Synthesis (São Paulo), v. 46/08, p.
40-42, 2008.
11. Flexissegurança nas Relações de Trabalho. Que bicho
é esse?. Revista Trabalhista (Rio de Janeiro), v. 25, p.
49-53, 2008.
12. A evolução da reparação judicial dos danos decorrentes do acidente típico do trabalho. Revista do
Advogado (São Paulo), v. 97, p. 107-116, 2008.
13. Ônus da prova nas ações acidentárias. Revista Magister de
Direito Trabalhista e Previdenciário, v. 25, p. 72-77, 2008.
14. Doença ocupacional e nexo técnico epidemiológico.
Revista Jurídica (Curitiba), v. 1, p. 9-20, 2008.
15. Compromisso Social da Empresa e Sustentabilidade
- Aspectos Jurídicos. Revista LTr, v. 71, p. 71-03/34671-03/360, 2007.
16. Responsabilidade civil pré é pós-contratual no Direito
do Trabalho. Revista da Associação dos Magistrados
da Justiça do Trabalho da 5ª Região, Salvador, v. 4, p.
241-250, 2005.
17.Proteção ao Trabalhador: Anacronismo ou necessidade hodierna? Disgressões sobre um clássico da
literatura jurídica trabalhista e seu autor. Revista Jurídica (Curitiba), v. 17, p. 247-249, 2004.
18. Prevalência do negociado sobre o legislado e outros
conflitos de normas sobre o legislado e outros conflitos de normas trabalhistas. Reflexões à luz da Ordem
Constitucional. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região, v. 37, p. 125-136, 2004.
19. Responsabilidade Civil pré e pós-contratual no Direito do Trabalho. Revista do Tribunal Regional do
Trabalho da 9ª Região, v. 29, p. 53-70, 2004.
20. Acidente do trabalho: competência material da justiça do trabalho. Revista Nacional Trabalho em Revista,
Curitiba, v. 21, n. 254, set., p. 1.916-1.917, 2003.
21. Novos contornos da relação de emprego diante dos
avanços tecnológicos. Revista LTr, São Paulo, v. 67, n.
5, maio, p. 545-555, 2003.
22. Rescisão por aposentadoria: da necessidade do cancelamento da OJSDI-I n. 177 em face de recente decisão
do STF. Gênesis - Revista de Direito do Trabalho, Curitiba, n.127, jul., p. 60-66, 2003.
16
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
Currículo do homenageado
23.Sistema jurídico, flexibilização trabalhista e proeminência da Constituição. Revista da Academia
Brasileira de Direito Constitucional, Curitiba, v. 3, n.
3, p. 129-169, 2003.
24. Sistema jurídico e proeminência da Constituição. Revista Trabalhista (Rio de Janeiro), Rio de Janeiro, v. 4,
p. 127-153, 2003.
25. Termos de rescisão contratual: eficácia liberatória e
multa moratória. Gênesis. Revista de Direito do Trabalho, Curitiba, v. 128, n.128, ago., p. 183-191, 2003.
26. Execução de título extrajudicial na Justiça do Trabalho. Revista Trabalhista da Anamatra, Curitiba, v. 6,
p. 31-35, 2002.
27. Horas in Itinere e minutos de preparo. O Trabalho em
Revista, 2002.
28. Mora rescisória: artigo 467 e sua distinção com o artigo 477 da CLT. Boletim Informativo Bonijuris, v. 463,
p. 10-11, 2002.
29. A motivação do ato que dispensa servidor público
celetista. Informativo de Direito Administrativo e
Responsabilidade Fiscal, 2002.
30. Motivação do ato que dispensa servidor público celetista. Revista LTr, v. 66, p. 66-06/689-66-06/692, 2002.
31. Análise da conjuntura sócio-econômica e seu impacto no direito do trabalho. Revista do Tribunal
Regional do Trabalho da 9ª Região, Curitiba, v. 1, p.
117-145, 2001.
32. Análise de conjutura sócio-econômica e o impacto no
direito do trabalho. Revista LTr, v. 65, p. 65-04/39165-04/401, 2001.
33. Contrato de trabalho e figuras afins: estágio, sociedade,
representação comercial, cooperativa e voluntário. Revista Jurídica (Curitiba), Curitiba, v. 14, p. 73-90, 2001.
34. Eficácia liberatória geral e a nova redação da súmula
330 do TST. Informativo AATPR, 2001.
35. Salário In Natura e suas novas regras. Destaque JTB,
2001.
36.Transformações do Direito do Trabalho à luz do
neoliberalismo. Revista Jurídica (Curitiba), v. 13,
p. 139-160, 2000.
37. Sistema jurídico herdado do positivismo científico e
códigos civis novecentistas. Revista Jurídica (Curitiba), v. 11, p. 97-104, 1997.
38. Os princípios do Direito do Trabalho e a teoria crítica do direito (Reflexões a partir do Estado Liberal,
Bem-Estar Social e Neoliberalismo). Revista Jurídica
(Curitiba), v. 10, p. 78-90, 1996.
Fundamentos para uma Adequada Aplicação
da Teoria da Responsabilidade Civil no
Direito do Trabalho
José Affonso Dallegrave Neto(*)
“A constitucionalização dos direitos trabalhistas é a resposta que vem sendo apresentada pelo sistema normativo à
nova questão social surgida na contemporaneidade, apontado para a edificação de um novo padrão axiológico, que a
doutrina vem sedimentando na aplicação dos direitos fundamentais também às relações entre particulares, superando
o antigo modelo que os restringia às relações do cidadão com o Estado.”
Tereza Asta Gemignani e Daniel Gemignani(1).
Agradecimento
Não posso iniciar sem antes agradecer, de coração,
esta importante homenagem que os amigos me fazem.
Sinceramente, não me vejo merecedor de tamanha deferência. Por outro lado, confesso que estou muito feliz e
estimulado a permanecer fazendo o que já faço há mais de
duas décadas: estudar, escrever, abordar e aplicar o direito
do trabalho. Agradeço a todos que integram esta obra coletiva, em especial à Editora LTr e aos seus doutos Coordenadores pelo incansável trabalho de mobilizar e articular
os juristas em torno deste projeto. Que Deus os abençoe,
meus diletos amigos!
1. Solidarismo contratual previsto na
Constituição Federal
Se a expressão solidariedade contratual traduz um valor jurídico, é preciso recordar que, antes dela, o vocábulo
solidariedade, de per si, constitui um valor metajurídico
enaltecido, sobretudo, na filosofia e nas religiões éticas(2).
A solidariedade é em si mesma uma disposição ética do ser humano, consistente na vontade altruísta de
colaborar com os demais na obtenção dos fins comuns.
Entretanto, é de tal maneira indispensável para a melhor
organização e o bom êxito da vida social permitir ao legislador exigi-la de todos os indivíduos como uma obrigação
jurídica, pretendendo “que se generalize dentro do corpo
social por meio da virtude educativa que se reconhece à
lei”, assinala Eduardo Monreal(3).
Não se negue que o modelo vigente de sociedade não
favorece a solidariedade, mas a concorrência; não o diálogo e o consenso, mas a disputa e a luta de todos contra
todos, consoante observa Leonardo Boff(4).
No plano jurídico, a solidariedade contratual pode
ser vista como a negação da autonomia da vontade em
sua concepção voluntarista e egoística e também como
(*) Mestre e Doutor em Direito pela UFPR. Advogado.
(1) GEMIGNANI, Tereza Aparecida Asta; GEMIGNANI, Daniel. Meio ambiente de trabalho. Precaução e prevenção. Princípios norteadores de um novo padrão normativo. Revista Fórum Trabalhista – RFT, Belo Horizonte, ano 1, n. 1, jul/ago. 2012. p. 150.
(2) Na abalizada lição do teólogo italiano Valentino Salvoldi, “o ápice da solidariedade é vivido por aquele que crê em Cristo através
do mistério da encarnação, que permite falar do evangelho da solidariedade”. O docente da Universidade de Latrão explica que
evangelho significa “boa notícia e alegre anúncio”, enquanto solidariedade lembra “a possibilidade de sentir-se uma única realidade
com todos e de compartilhar as alegrias e as lágrimas alheias”. In: SALVOLDI, Valentino. O evangelho da solidariedade. Tradução: João
paixão Netto da obra original II Vangelo della solidarietá. São Paulo: Paulinas, 1997. p. 9. Não por acaso, Jesus proclamou: “Ninguém
tem maior amor do que este: de dar alguém a sua vida pelos seus amigos” (João 15: 12 e 13).
(3) MONREAL, Eduardo Novoa. O direito como obstáculo à transformação social. Tradução: Gérson Pereira dos Santos. Porto Alegre:
Sergio Fabris, 1988. p. 154.
(4) BOFF, Leonardo. Ética da vida. 2. ed. Brasília: Letraviva, 2000. p. 45.
18
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
José Affonso Dallegrave Neto
um aperfeiçoamento da autonomia privada. Tal evolução
representa a transição do Estado Liberal para o Estado Social, importando em uma nova visão de contrato: menos
individualista, mais sociável.
Nesse viés histórico-ontológico, verifica-se a existência de três estágios: a) autonomia da vontade; b) autonomia privada; c) solidariedade contratual.
No primeiro, a liberdade contratual era quase absoluta, fazendo o Estado o papel de mero garantidor da manifestação individual de cunho egoístico e de um liberalismo econômico expresso pela fórmula laissez faire, laissez
passer.
Na autonomia privada o contrato deixa de ser a mais
completa tradução da vontade dos signatários para, seguindo as palavras de Betti, ser a “autorregulação dos
interesses particulares”(5), dotada de eficácia, desde que
nas condições permitidas por lei. A atividade desenvolvida nessa direção somente se configura quando realizada
como “pressuposto e fonte geradora de relações jurídicas
já reguladas em abstrato e em geral, pelas normas jurídicas”(6).
Oportuna é a lição de Pontes de Miranda: não há autonomia absoluta ou ilimitada de vontade; a vontade tem
sempre limites, e a alusão ao que se pode querer dentro
desses limites(7). Há de se observar, pois, a dimensão distinta: na autonomia da vontade as partes detêm o poder de
criar normas de acordo com seus interesses, enquanto na
autonomia privada é a lei que vincula as partes a observar
o comportamento ajustado.
O enfoque que se apresenta hoje é o de superação da
divisão em ramos de direito público e privado. Tal fenômeno foi encetado, entre nós, a partir da gênese do Direito do Trabalho, sendo cristalizado com a promulgação da
Constituição Federal de 1988, que contém princípios e
valores supremos de socialidade, os quais, em certa medida, despatrimonializam o direito privado, funcionalizando os conceitos, a partir do primado da solidariedade e da
dignidade do ser humano. Nasce, pois, a terceira fase da
autonomia da vontade: o solidarismo contratual – o qual
provém do solidarismo constitucional – que supera a autonomia da vontade, forte no Estado Liberal do século XIX,
e aperfeiçoa a autonomia privada iniciada com o advento
do Estado Social do século XX.
Trata-se, pois, da exigência de justiça social, como escolha histórica e permanente, a qual se concretiza não por
uma igualdade meramente formal, mas, antes, substancial(8). Assim, os direitos subjetivos não podem ser vistos
de forma ilimitada, mas como interesses juridicamente tutelados, encerrando, entre si, limitações para o seu titular.
Ainda sobre o tema, Luiz Edson Fachin acrescenta que
a denominada justiça contratual implica uma espécie de
acesso de igualdade e de oportunidade: todo sujeito de
direito pode contratar. Isso, entretanto, não pode levar à
inferência de que todos são efetivamente iguais, pois diz
respeito a um conceito de justiça meramente formal. No
plano substancial, essa noção de equilíbrio se opera de
uma forma compensatória. Se Antônio, ao contratar com
Bernardo, tem a sua situação tratada de modo diferenciado é porque, substancialmente, a lei o considera desigual.
Supera-se o juízo formal, partindo-se para um juízo substancial, em que o conceito de igualdade que se leva em
conta é o obtido a partir da observação da vida, assevera o
jurista paranaense(9).
O solidarismo contratual é, assim, uma espécie de terceira fase na evolução da autonomia volitiva, expresso em
um ordenamento jurídico que responsabiliza o sujeito,
antes visto em uma concepção abstrata e isolada, como
mero elemento subjetivo da relação jurídica, doravante
como pessoa concreta, gente cidadão, que sonha, chora,
ri e, acima de tudo, anela e tem direito a uma vida digna.
Eis uma questão de “remodelação geral do velho princípio, ou do seu relançamento, então ilustrado com as novas cores constitucionais da funcionalização”(10). Percebe-se, pois, a intrínseca relação entre autonomia privada,
Constituição e solidariedade social, cabendo ao Judiciário
a precípua tarefa de conjugar todos esses valores, tomando
como norte o indivíduo, não na sua perspectiva individual e exclusivamente material, mas na coletiva, imaterial
e existencial(11).
É possível dizer, sob o ponto de vista etimológico, que
o solidarismo visa ao sujeito não como pessoa, mas como
gente. Observe-se que a palavra pessoa advém do latim
(5) BETTI, Emilio. Teoria geral do negócio jurídico. Tradução: Fernando Miranda. Coimbra: Coimbra, 1969. p. 41.
(6) GOMES, Orlando. Transformações gerais do direito das obrigações. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1980. p. 44.
(7) MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Tratado de direito privado. 2. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1962. t. XXXVIII, p. 39. Parte
especial.
(8) PERLINGIERI, Pietro. Perfis do direito civil. Introdução ao direito civil constitucional. 3. ed. Tradução: Maria Cristina de Cicco. Rio
de Janeiro: Renovar, 1997. p. 47.
(9) FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do direito civil, p. 298.
(10) NALIN, Paulo. Do contrato: conceito pós-moderno em busca de sua formulação na perspectiva civil-constitucional.Curitiba:
Juruá, 2001. p. 166.
(11) NALIN, Paulo. Op. cit., p. 166.
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
Fundamentos para uma Adequada Aplicação da Teoria da Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho
persona, que significa personagem, ou seja, cada um dos
papéis que deve ser encarnado por um ator numa determinada circunstância. In casu, no sistema liberal codificado,
a pessoa tinha apenas valor jurídico enquanto sujeito que
tinha bens – o “ter” em sua concepção patrimonialista. Já
o vocábulo gente provém do latim de mesma grafia ‘gente’, em sentido de ser humano, homem em sua condição
mais ampla, retratado não mais pelo ter patrimonialista,
mas pelo ser existencialista.
Está claro que o solidarismo constitucional refoge à visão individualista, enaltecendo a solidariedade como valor capaz de inserir os direitos individuais não em uma
perspectiva isolada ou egoísta, mas em comunidade. Tal
valor encontra-se estatuído diretamente na Constituição,
em seu art. 3º, I, quando apregoa ser objetivo fundamental
da República do Brasil a construção de “uma sociedade
livre, justa e solidária”.
A expressão máxima do solidarismo constitucional
não é apenas a extraída do art. 3º, I, mas, também, aquela
decorrente do art. 1º, III, que coloca como fundamento
do Estado Democrático de Direito a dignidade da pessoa
humana, e a do art. 170, caput, quando pontifica que a
ordem econômica se funda na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos
existência digna, conforme os ditames da justiça social.
Não se ignore, nessa esteira, o regramento constitucional que proclama uma ordem social com primado no
trabalho (art. 193) aliada à regra (do art. 7º) que assegura
inúmeros direitos trabalhistas sem prejuízo de outros que
visam uma melhor condição social ao trabalhador. Consigne-se também a busca do pleno emprego, valor da ordem
econômica (art. 170, VIII, da CF) capaz de estimular e
instituir a realização de políticas públicas que conduzam
à expansão das ofertas de trabalho, censurando quaisquer
medidas que estimulem o aumento do exército de desempregados ou a utilização precária de mão de obra.
O solidarismo constitucional é o ponto de partida
onde irá desembocar, in concreto, a função social da empresa, como manifestação da função social da propriedade
(art. 170, III, da CF) e como expressão do art. 193, da CF,
na parte que aponta para uma ordem social calcada no
bem-estar e na justiça social. Tais valores são decisivos
para a seara da execução das obrigações, sendo a boa-fé
objetiva (art. 422 do novo CCB) e a função social do contrato (art. 421 do novo CCB) seus marcos axiológicos.
No que concerne à reparação do dano procedente da
inexecução contratual, o novo arquétipo se alicerça no
19
princípio da restitutio in integrum e na compreensão ampla dos direitos da personalidade, alargando os casos de
responsabilidade objetiva da empresa em franca tendência
à inversão da ordem geral, tendo em vista a máxima tutela
da vítima.
Eis aí o novo arranjo capaz de credenciar o operador
jurídico a enfrentar os casuísmos da responsabilidade civil
oriunda da inexecução do contrato de trabalho. Tudo em
sintonia com a funcionalização dos conceitos, tendo como
primazia os valores e princípios constitucionais.
2.A limitação da vontade no contrato de
trabalho
Nas palavras de Aldacy Coutinho, o direito do trabalho é a revelação em si “de uma nova concepção do contrato, sustentada na autonomia privada, mediante a qual
a condição social e econômica das pessoas envolvidas o
dimensiona para uma postura jurídica promotora de uma
igualdade, recusando a vontade como elemento nuclear e
substituindo-a pela supremacia do interesse público”(12).
Deveras, a relação de emprego encerra natureza contratual. Entretanto, a manifestação volitiva das partes,
sobretudo a do empregado, é amainada, uma vez que se
está diante de um contrato dirigido, de adesão e com forte
subordinação jurídica do contratado. Examinemos, pois,
essas três características.
A primeira se dá em face do chamado dirigismo contratual, caracterizado pela intervenção do Estado, o que faz
aparecer um feixe de normas cogentes, as quais afetam o
conteúdo das obrigações contratuais(13). Nessa ótica, o regramento contido na CLT deve ser seguido pelas partes,
sendo, por isso, irrenunciáveis os direitos trabalhistas. A expressão tenaz do dirigismo encontra-se no art. 444 da CLT:
As relações contratuais de trabalho podem ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quando não
contravenha às disposições ao trabalho, aos contratos coletivos que lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades
competentes.
A segunda característica do contrato individual de trabalho é o seu enquadramento como contrato de adesão,
na medida em que as poucas condições que restam para
serem objeto de “livre estipulação das partes”, na prática,
geralmente, são impostas unilateralmente pelo empregador e aderidas pelo empregado, sem qualquer negociação,
debate, ou tratativa preliminar.
(12) COUTINHO, Aldacy Rachid. Função social do contrato individual de trabalho. In: Transformações do direito do trabalho. Estudo
em homenagem ao professor doutor João Régis Fassbender Teixeira. Curitiba: Juruá, 2000. p. 33. Nesse sentido também PERLINGIERI,
Pietro. Op. cit., p. 19.
(13) DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Contrato individual de trabalho. São Paulo: LTr, 1998. p. 39.
20
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
José Affonso Dallegrave Neto
A rigor, o contrato de trabalho é, simultaneamente,
dirigido e por adesão, o que vale dizer: contém uma parte
imposta pelo Estado (normas protetivas cogentes) e outra
predeterminada pelo empregador e aderida pelo empregado.
Acerca da presença concomitante do dirigismo e da adesão
do empregado na esfera do contrato de trabalho, Evaristo de
Moraes Filho observa, num primeiro momento, que o dirigismo contratual sobreveio para “restabelecer o equilíbrio
rompido entre as duas partes durante o (liberalismo do) século XIX”(14) para, em seguida, asseverar: “o empregado adere às condições oferecidas pelo empregador, condições estas,
entretanto, que devem obedecer todas as demais previamente
inscritas e escritas pelas fontes normativas superior”(15).
A terceira característica do contrato de trabalho, capaz de
inibir a manifestação plena da vontade, é a presença da subordinação jurídica e sua latente forma de ‘normalização’ que sujeita amplamente o empregado ao comando do empresário.
Nesse sentido invoquem-se os escólios de Ricardo
Marcelo Fonseca:
O Direito do Trabalho, ao adotar o conceito de ‘subordinação jurídica’ (com todas as suas decorrências)
como seu pilar constitutivo, impôs certas medidas de
contenção para a subordinação, mas não a eliminou.
No caso das relações de trabalho subordinadas, tal implicação vai desde a própria vigência do princípio da
‘subordinação jurídica’ (com os consequentes deveres
de lealdade, obediência, respeito, etc., ao seu patrão),
passando pelo uso do jus variandi patronal e todas as
formas de avaliação e controle do empregado possibilitadas pela própria lei, até chegar às formas legais de
punição do empregado (o ‘poder punitivo do empregador’), sobretudo as hipótese de justa causa.(16)
Destarte, arremata Fonseca, a lei propaga uma espécie
de controle que atua sobre o empregado como um todo,
buscando disciplinar sua conduta e sua lealdade, extrapolando os limites do contrato de trabalho(17).
3. Flexibilização ou solidarismo
contratual?
Ainda que, para alguns, a expressão “trabalhador hipossuficiente” ecoe como um ranço anacrônico, a realida-
de comprova que nunca o trabalhador brasileiro esteve
tão debilitado economicamente, justificando, pois, uma
adequada tutela jurídica compensatória, quando da realização do contrato de trabalho. E, assim, quanto maior a
debilidade econômica, maior deve ser o amparo jurídico.
Na mesma esteira, quando o contratado é um alto empregado, com elevado padrão salarial e exercente de cargo de
confiança, o hermeneuta há de mitigar a proteção jurídica.
São oportunas as críticas trazidas por Grijalbo Coutinho, ao esquadrinhar o aludido cenário de preconceito:
A classe dominante propagou a ideia de que o
Direito do Trabalho engessa as relações de trabalho
e atrapalha o desenvolvimento do País. Essa concepção foi assimilada pelos mais diversos segmentos da
sociedade brasileira, inclusive pelos juízes e tribunais
do trabalho.
Para se ter uma ideia dessa nefasta influência, entre os anos 1980 e 1990, não foram poucas as vozes
que gritaram contra o princípio basilar do Direito do
Trabalho, o da proteção, no sentido de que o referido
mandamento seria parte de um passado e de um mundo do trabalho totalmente distintos.
A partir de tal equívoco, o caminho ficou aberto
para a precarização ainda mais selvagem das frágeis
relações de trabalho no Brasil.(18)
De outro lado, a doutrina mais atenta acentua que o
princípio da tutela ao contratante que se encontra em posição de inferioridade na relação contratual ganha relevo
na nova teoria geral do contrato(19). Tal princípio decorre
da regra constitucional (art. 5º) que assegura igualdade
das pessoas, não mais em sua concepção liberal de igualdade apenas e meramente formal, mas numa dimensão
solidária, capaz de reconhecer o valor do outro, assegurando-lhe, in concreto, uma vida digna como tradução da
igualdade material.
Não se pode perder de vista que a função social do
contrato tem por fim restringir a liberdade contratual, direcionando-a contra as iniquidades atentatórias do valor
justiça, que igualmente tem peso social(20). Neste sentido
é o art. 421 do novo Código Civil, verbis: “A liberdade de
(14) MORAES FILHO, Evaristo de. Introdução ao direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 1993. p. 68.
(15) Ibidem, p. 228.
(16) FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e contrato de trabalho. Do sujeito de direito à sujeição jurídica. São Paulo: LTr, 2002.
p. 179.
(17) Idem, ibidem.
(18) COUTINHO, Grijalbo Fernandes. O direito do trabalho flexibilizado por FHC e Lula. São Paulo: LTr, maio 2009. p. 39.
(19) NOVAIS, Alinne Arquette Leite. Os novos paradigmas da teoria contratual: o princípio da boa-fé objetiva e o princípio da tutela
do hiposufissiente. In: TEPEDINO, Gustavo (coord.). Problemas de direito civil-constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 36.
(20) NORONHA, Fernando. O direito dos contratos e seus princípios fundamentais: autonomia privada, boa-fé, justiça contratual.
São Paulo: Saraiva, 1994. p. 82.
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
Fundamentos para uma Adequada Aplicação da Teoria da Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho
contratar será exercida em razão e nos limites da função
social do contrato.” Tal cláusula geral é legítima e escorada pelo solidarismo constitucional.
Num modelo capitalista, como o nosso, que valoriza a geração de riqueza e a reprodução do seu valor, o
sujeito (trabalhador) que a produz fica sempre relegado
a um segundo plano. Vale dizer: a satisfação das necessidades humanas subjaz à rentabilidade, elemento supremo
do mercado e que é aferida pelos valores de troca, bens e
serviços contratados.
Consigne-se a observação de Robert W. McChesney,
quando prefaciou a obra de Noam Chomsky, alertando
que a democracia neoliberal, com sua ideia de über alles,
nunca tem em mira o setor social; em vez de cidadãos, ela
produz consumidores; em vez de comunidades, produz
shopping centers; o que sobra é uma sociedade atomizada,
de pessoas sem compromisso, desmoralizadas e socialmente impotentes(21).
De forma arguta e realística, Luis Fernando Verissimo
descreve o estratagema da ideologia neoliberal em matéria
veiculada e epigrafada como “Os braços de Mike Tyson”:
Na recente reunião dos sete de ouro para tratar
do custo social da nova ordem econômica, os países
mais ricos do mundo chegaram a uma conclusão sobre como combater o desemprego. Surpresa! Deve-se
continuar enfatizando e receitando aos pobres austeridade fiscal sobre qualquer política de desenvolvimento e pedindo ao trabalhador que coopere trocando a
proteção social que tem pela possibilidade de mais
empregos. Algo como continuar batendo no supercílio que já está sangrando. Chama-se isso não de cruel
ou chantagem, mas de flexibilização do mercado de
trabalho. Podia se chamar de Maria Helena, não faria
diferença – o neoliberalismo triunfante conquistou o
direito de pôr os rótulos que quiser nos seus bíceps.
Quem chama a volta do capitalismo do século dezenove de “modernidade” e consegue vendê-lo merece
o privilégio.(22)
A atual problemática do desemprego estrutural não
pode ser vista de forma singela, como querem alguns economistas: “menor custo do trabalho, menor desemprego”.
Tal lógica representa um engodo, não elimina o problema original e, em razão da precarização das relações do
trabalho, gera outro problema, qual seja, o aumento do
fosso entre ricos e miseráveis, “acrescentando a cada dia o
número de pobres”(23).
21
Com efeito, encontram-se vivos e profícuos os valores e princípios constitucionais da atual Constituição-Dirigente. Nunca o Brasil precisou tanto que sua Carta
Política saísse do papel e fosse efetivamente cumprida. Os
princípios constitucionais de proteção ao trabalhador e do
primado ao trabalho, bem como a cláusula geral da função
social do contrato, devem ser abundantemente utilizados
pelo operador jurídico, mormente neste cenário de instabilidade econômica internacional.
Diante desse quadro, ganha relevância o caso emblemático e amiúde das cobranças de metas que o empregador faz sobre o empregado, em manifesto abuso do poder
diretivo e violação à dignidade humana (arts. 170 e 1º, III,
ambos da CF):
ASSÉDIO MORAL. O empregador detém o poder diretivo,
correspondente à faculdade de dirigir e fiscalizar a força de
trabalho que lhe é colocada à disposição em face do contrato
de trabalho, podendo inclusive aplicar sanções disciplinares. Todavia, esse poder diretivo, como qualquer direito, não
é ilimitado, encontrando limites no contrato, na lei e especialmente nos direitos fundamentais expressos e implícitos
na Constituição. Representa exercício abusivo desse poder
a utilização de métodos de gestão que aumentam a intensidade do trabalho e dos níveis de ansiedade dele decorrente.
O objetivo de lucro da empresa, legítimo dentro do nosso
sistema capitalista, não pode chegar ao ponto de produzir
um ambiente de trabalho de constante tensão e estresse para
conseguir maior produtividade dos empregados. Assim, não
é possível admitir, sem permitir agressão à dignidade do
empregado, que haja, como no caso, constante pressão e
cobrança para atingimento de metas de difícil realização, inclusive com a ameaça de perda de emprego através da identificação expressa e exposição perante os demais colegas de
que se encontrava em período de “definição”. Assédio moral configurado. (TRT 9ª R.; RO 02683-2008-019-09-00-0;
Ac. 36790/2010; 5ª. T.; Rel. Des. Arion Mazurkevic; DEJT
19.11.2010)
A opção hermenêutica que se faz nesse caso jurisprudencial é elucidativa, na medida em que envolve um confronto axiológico. De um lado, temos a velha e liberal
concepção proprietista do empresário, tão ampla que é
capaz de dispor livremente de seus empregados, ainda que
de maneira constrangedora. De outro lado, temos uma visão estribada no solidarismo constitucional, a qual inibe
atos abusivos do empregador, quando em flagrante lesão
à dignidade do empregado, visto não mais como mero sujeito de direito de um contrato de feição apenas mercantil,
(21) McCHESNEY, Robert W. Prefácio. CHOMSKY, Noam. O lucro ou as pessoas? Neoliberalismo e ordem global. Tradução: Pedro
Jorgensen Jr. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.
(22) VERISSIMO, Luis Fernando. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, coluna Opinião, set. 96. p. 9.
(23) MAIOR, Jorge Luiz Souto. O direito do trabalho como instrumento de justiça social. São Paulo: LTr, 2000. p. 181.
22
Responsabilidade Civil no Direito do Trabalho – Reflexões Atuais
José Affonso Dallegrave Neto
mas antes como gente e cidadão tutelado pela Constituição Federal de modo proeminente (art. 1º, III, CF).
Dessume-se daqui a importância do art. 170 da Carta
Constitucional, que autentica a ordem econômica fundamentada na livre iniciativa, porém com limites na função
social da propriedade e no respeito à dignidade do trabalhador.
Esse solidarismo constitucional é capaz de conjugar
e infundir a função social do contrato na função da
propriedade. Nas palavras de Luiz Edson Fachin: “a valorização da solidariedade traz a socialização do Direito,
sendo que esse processo carrega em si a ideia de função
social inerente à estrutura das instituições jurídicas”(24).
4. O poder patronal sobre a pessoa do
empregado
Considerando o contrato de trabalho simplesmente
como um acordo de vontade das partes, o empregado e
o empregador são vistos como meros sujeitos de direitos,
ou seja, elementos subjetivos da relação de emprego. Nessa medida abstrata e sem compromisso com os valores
constitucionais, a relação jurídica deixa de ponderar os
direitos fundamentais de pessoa gente e de cidadão, e assim o trabalhador é considerado apenas na medida da sua
força de trabalho, confundindo-se com o próprio objeto
do contrato(25).
Ao revés, se olharmos o contrato de emprego como
uma relação jurídica complexa, dinâmica, social e solidária, iremos, então, repersonalizar o sujeito, vendo o empregado não apenas como sujeito abstrato de direito, mas
também um cidadão que detém valor e uma pletora de
direitos fundamentais.
Com base na concepção solidarista da ordem constitucional (arts. 1º, III e 3º, I da CF), pode-se repersonalizar o sujeito do contrato, admitindo que patrimônio e
pessoas integram realidades distintas, realidades que não
se integram(26). Mais que isso: podemos proceder à correta inversão do foco de interesse do direito: o patrimônio
deve servir à pessoa, e, portanto, as situações subjetivas
patrimoniais devem ser funcionalizadas à dignidade da
pessoa(27).
Nesse compasso, faz-se mister examinar o próprio
conceito de subordinação jurídica que mantém o empregado sob o comando do empresário empregador. Com outras palavras: o trabalho subsumido ao capital.
Ricardo Marcelo Fonseca traça profícua análise, histórica e crítica, acerca da origem da subordinação jurídica
e de sua função legalmente legitimadora da sujeição do
empregado ao poder do empregador:
As relações de trabalho historicamente sedimentadas no Brasil (onde o instituto da escravidão vigorou até o final do século XIX) sempre foram marcadas
pelo controle, pela vigilância, pelo enquadramento,
pelo encarceramento, pela violência e pela presença
de todas as formas de punições (morais e físicas). Com
a República e a crescente urbanização brasileira (com
o consequente aumento da pressão reivindicatória dos
trabalhadores), a legislação trabalhista foi se implementando, até ser consolidada pelo Estado Novo de
Getúlio Vargas.(28)
O autor arremata a sua observação aproximando o
conceito de subordinação jurídica com o conceito de subordinação pura e simples, vista essa no sentido de um
contínuo poder sobre o trabalhador:
Pois bem: parece que o trabalhador, mesmo com
a legislação trabalhista, permaneceu como alguém
enquadrado, vigiado e controlado. Melhor dizendo:
foi também através do direito (mas não somente a
partir dele) que o trabalhador pôde continuar sendo
disciplinado e normalizado sob os olhos atentos do
empregador. Com efeito, a ideia de ‘subordinação jurídica’, que tentou parecer algo como que controlado
pelo direito, algo como que completamente diverso da
subordinação pura e simples (afinal, ela é ‘jurídica’...),
mostra-se, todavia, como um poder contínuo sobre o
trabalhador.(29)
Nessa medida, é imprescindível, então, que a subordinação se ajuste à função social do contrato de trabalho,
revelando-se não como um poder sobre a pessoa do empregado, mas apenas um comando sobre o objeto do contrato, e, ainda assim, sem deixar de respeitar a dignidade
do trabalhador(30).
(24) FACHIN, Luiz Edson. Estado jurídico do patrimônio mínimo. Rio de Janeiro: Renovar, 200. p. 46.
(25) COUTINHO, Aldacy Rachid. Op. cit., p. 45.
(26) FACHIN, Luiz Edson. Teoria crítica do direito civil. Rio de Janeiro: Renovar, 2000. p. 93-113, 154-190.
(27) COUTINHO, Aldacy Rachid. Op. cit., p. 50.
(28) FONSECA, Ricardo Marcelo. Modernidade e contrato de trabalho: do sujeito de direito à sujeição jurídica. São Paulo: LTr, 2002.
p. 166-167. A tese de Fonseca tem como esteio o método arqueogenealógico de Michel Foucault.
(29) Idem, ibidem.
(30) COUTINHO, Aldacy Rachid. Op. cit., p. 46.