O Monitor de Angola

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O Monitor de Angola
O Monitor de Angola
N° 3, 2015
O Monitor de Angola aborda a política, economia, desenvolvimento, democracia e direitos humanos em
Angola. Publicado trimestralmente pela Ação pela África Austral (ACTSA, sigla em inglês), também está
disponível em inglês.
Esta edição cobrirá:
Política: Presidente Hollande visita Angola, visitas oficiais do presidente José Eduardo dos Santos à
China e Itália, presidente angolano não deixará o cargo antes do fim do mandato.
Economia: Novo empréstimo do Banco Mundial, diversificação econômica, exportações para os
Estados Unidos alcançam níveis recordes, e a AGOA 2015
Direitos humanos: Novas informações sobre as mortes relacionadas à seita na província do Huambo,
julgamento de Rafael Marques, ONGs demonstram preocupação com sério padrão de desrespeito à
liberdade de opinião, expressão e reunião pacífica em Angola.
Assistência e desenvolvimento: Investimentos e obras de desenvolvimento chineses, Angola
conseguirá reduzir pobreza pela metade?, Feira Internacional de Luanda 2015.
Esta edição também está disponível em inglês.
Mensagens de nossos leitores são bem-vindas. Por favor envie os comentários para [email protected].
Para mais notícias e informações sobre Angola e a África austral, visite o sítio do ACTSA:
www.actsa.org
Política
Presidente francês visita a África
O presidente francês, François Hollande, participou do Fórum Econômico França-Angola durante uma
viagem recente à África. Na viagem de dois dias, o presidente também visitou as Repúblicas do Benin e
Camarões. A visita ocorreu pouco tempo após a visita de outros líderes europeus, da Alemanha e Itália,
para fortalecer as relações com Angola. O presidente Hollande também aproveitou a viagem para
fortalecer os laços econômicos com Angola. Cinquenta líderes do empresariado viajaram com o
presidente, incluindo representantes da Accor, o quarto maior grupo hoteleiro do mundo. Reporta-se
que durante a viagem, executivos do grupo assinaram um acordo para administrar cinquenta hotéis em
Angola.
Embora reconhecesse que as relações entre Angola e França não tenham sempre sido muito positivas,
o presidente Hollande afirmou que a renovação da parceria franco-angolana foi estimulada pela visita
do presidente José Eduardo dos Santos à França em abril de 2014 (sua primeira visita a Paris em vinte
anos). No entanto, ativistas pelos direitos humanos criticaram o presidente Hollande por focar nas
relações econômicas, ignorando os índices angolanos com relação aos direitos humanos. O presidente
Hollande aclamou Angola como uma força pela estabilidade na África e por ser “forte econômica e
politicamente”. Entende-se que acordos nas áreas de assistência internacional, vistos e cooperação
militar seriam assinados durante a visita.
Em um discurso proferido durante a Cúpula Mundial para Clima e Territórios, realizada em Lyon, um dia
antes de sua viagem à África, o presidente francês pediu que os líderes africanos respeitassem os
limites constitucionais de seus mandatos e demonstrou receio que alguns estejam preparados a causar
instabilidades políticas para permanecerem nos cargos. A França sediará a próxima Conferência das
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Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP21), entre 30 de novembro e 15 de dezembro. O
encontro acontecerá em Paris.
Presidente angolano realiza visita oficial à China e Itália
No mês de junho, o presidente José Eduardo dos Santos realizou uma visita oficial de cinco dias à
China. A visita focou-se na necessidade angolana de assistência financeira uma vez que os preços do
petróleo têm caído rapidamente. Fontes do governo angolano negaram que Angola solicitou uma
moratória do pagamento de suas dívidas. Discutiu-se também um auxílio chinês para que Angola
diversifique sua economia e promova um aumento da participação e investimentos do setor privado. Os
laços econômicos entre Angola e China não são detalhadamente e publicamente divulgados, mas
reporta-se amplamente que a China concedeu pelo menos 20 bilhões de dólares em empréstimos que
têm pagamento garantido por Angola através do fornecimento de petróleo à China.
No mês de julho, o presidente angolano realizou uma viagem de dois dias à Itália. Esta foi sua terceira
visita oficial ao país. A Itália foi o primeiro país da Europa Ocidental a reconhecer a independência de
Angola em 1975 e Angola é o terceiro maior parceiro comercial italiano na África subsaariana.
Presidente não deixará o cargo antes das eleições
As eleições nacionais angolanas serão em 2017. Há debates sobre quem será o próximo presidente
após estas eleições.
A última eleição angolana ocorreu em 2012. O partido governante, Movimento Popular de Libertação de
Angola (MPLA), obteve uma vitória avassaladora conquistando mais de dois terços dos votos (72%),
embora este número represente uma redução de votos em comparação ao pleito de 2008. O presidente
é eleito pela Assembleia Nacional. José Eduardo dos Santos é o segundo mais longevo chefe de estado
africano, perdendo apenas para o líder da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo. A
constituição introduzida em 2010 limita a presidência a um máximo de dois mandatos de cinco anos,
embora as novas regras não valham para os mandatos atuais, permitindo que José Eduardo dos Santos
ocupe o cargo até 2022, caso o MPLA vença as eleições e ele se candidate novamente.
No dia primeiro de julho, José Eduardo dos Santos disse durante um encontro do MPLA que pretende
ocupar o cargo até o fim do mandato, em 2017; as afirmações acabam com rumores de que ele poderia
terminar o mandato mais cedo. Ele pediu que o partido se preparasse para a transição, uma sucessão
gerenciada. Este pode ser um sinal de que o presidente pretende encerrar seu período em 2017 com
uma transição controlada a um novo presidente, este sendo provavelmente um sucessor apontado por
ele. No entanto, o presidente já surpreendeu anteriormente. Em seu discurso, José Eduardo dos Santos
surpreendeu observadores ao referir-se aos eventos de 27 de maio de 1977 (ver O Monitor de Angola
3/2014 e esta edição) como uma tentativa de golpe de estado que não pode ser permitida outra vez. É
incomum que os eventos de maio de 1977 sejam abordados publicamente por membros do
partido/governo, ainda mais incomum pelo presidente.
O comitê central do MPLA confirmou que o VII Congresso Ordinário ocorrerá entre os dias 17 e 20 de
agosto de 2016. É possível que este congresso decida quem será o presidente após 2017, caso o
MPLA vença.
Angola investe em mídia portuguesa
Grande parte da mídia angolana é controlada pelo ou apoia o governo. Para obterem informações
objetivas e o que seria entendido como uma cobertura imparcial sobre o que acontece no país, muitos
angolanos buscam notícias publicadas em veículos de imprensa de Portugal. Há notícias de que o
governo angolano esteja investindo em meios de comunicação portugueses.
Celso Filipe do Jornal de Negócios disse que “o que é publicado nos jornais angolanos não tem a
credibilidade do que é publicado em Portugal. Desta forma, a estratégia é influenciar o público angolano
através do que é publicado em Portugal”. Ao comprar e conquistar influência sobre um crescente
número de veículos de mídia portugueses, entende-se que o governo angolano queira controlar mais
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rigidamente o que os angolanos leem sobre seu país e governo. Ao inserir sua própria versão nestes
veículos portugueses, o governo angolano pode melhorar sua credibilidade dentro de Angola.
Economia
Banco Mundial auxilia Angola com 650 milhões de dólares para estabilizar economia em queda
No dia 30 de junho de 2015, o Conselho de Administração dos Diretores Executivos do Banco Mundial
aprovou um financiamento que combina um empréstimo de 450 milhões de dólares e uma garantia de
outros 200 milhões de dólares para auxiliar a economia angolana. O Banco Mundial afirma que esta
operação “representa um aumento da participação do Banco Mundial na economia angolana em uma
conjuntura crítica”. A ajuda é necessária devido à queda de 40% dos preços do óleo cru no último ano.
Segundo um pronunciado do Ministério das Finanças, este novo acordo irá “fortalecer o gerenciamento
financeiro” e criar a folga fiscal necessária para “melhorar a proteção dos [indivíduos] mais vulneráveis”.
Diversificação econômica
Em um contexto de queda dos preços do petróleo e da necessidade de Angola diversificar sua
economia, no início do Fórum Econômico Angola-França, o presidente Hollande ofereceu auxiliar este
processo de diversificação. O ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural angolano, Pedro Canga,
também afirmou que um setor agrícola produtivo é essencial tanto para a diversificação da economia do
país quanto para oferecer empregos estáveis.
O ministro das Relações Exteriores de Angola, Georges Chikoti, pediu que instituições de ensino
francesas considerem oferecer cursos profissionalizantes e de especialização a jovens angolanos
auxiliando o governo em sua tarefa de desenvolver a infraestrutura para continuar a garantir o
desenvolvimento econômico e social angolano.
Exportações de Angola aos Estados Unidos alcançam nível recorde, em parte devido a AGOA
As exportações de Angola para os Estados Unidos triplicaram entre 2004 e 2014, alcançando a cifra de
115,39 bilhões de dólares no último ano. A ministra do Comércio de Angola, Rosa Pacavira, afirmou que
o aumento das exportações é em parte resultado da adesão de Angola à lei de Crescimento e
Oportunidades para a África (AGOA, sigla em inglês), estabelecida pelo governo estadunidense em
maio de 2000. Pacavira explicou que a AGOA desenvolveu um sistema generalizado de preferência que
visa promover o crescimento de países em desenvolvimento através da isenção de taxas alfandegárias
para mais de quatro mil produtos. Diz–se também que a lei visa promover o desenvolvimento político.
Há quem critique a AGOA dizendo que ela busca explorar países africanos vulneráveis e ricos em
recursos naturais.
O governo estadunidense afirma que entre os 40 países africanos que aderiram, os principais
beneficiários da legislação até o momento são a África do Sul, Nigéria, Angola e Quênia. O petróleo é o
principal produto que está sendo exportado por Angola.
AGOA-2015
Alguns consideram que a AGOA apresente uma das características definidoras da relação comercial
entre os Estados Unidos e a África; assim sendo, o Fórum AGOA 2015 que será realizado em Libreville,
Gabão, entre os dias 29 e 31 de agosto deste ano, é visto como uma oportunidade para renovar e
renegociar os termos da lei. Este será o 14º Fórum AGOA. O tema do evento que ocorre este ano é
“AGOA aos 15: mapeando o caminho para uma parceria comercial e de investimentos sustentável EUAÁfrica”. O New York Forum Africa (NYFA) também alterou as datas de sua cimeira anual para coincidir
com estas datas. O presidente do Gabão caracterizou o NYFA como “o principal encontro da África
acerca de negócios pan-africanos” que prioriza parcerias estratégicas interafricanas, promovendo um
crescimento sustentável.
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Durante os preparativos finais para o encontro, os debates têm focado na possibilidade de estender a
legislação atual e, caso positivo, por quanto tempo e quais seriam os elementos da legislação atual a
serem modificados. O fórum é visto por alguns como uma oportunidade para os países africanos,
particularmente Angola, renegociarem os termos do acordo de modo a beneficiarem-se mais dele.
Neste sentido, observa-se que a maior parte do sucesso da AGOA é oriunda das indústrias do gás e do
petróleo.
A nova AGOA2015 foi renovada no Congresso pelos próximos 10 anos e promulgada pelo presidente
americano, Barack Obama, no dia 29 de junho de 2015. A lei expiraria em setembro. Apesar da
renovação do acordo, a AGOA agora permitirá que os Estados Unidos a extinga, suspenda ou limite os
benefícios caso países participantes não cumpram com seus critérios de elegibilidade.
Angola produzirá petróleo offshore em Cuba
Foi anunciado que a estatal petrolífera angolana, Sonangol, produzirá petróleo offshore nas águas de
Cuba até 2017. As operações dependem da eliminação das barreiras marítimas impostas à ilha pelos
Estados Unidos. A suspenção do bloqueio resulta do retorno das relações diplomáticas entre Estados
Unidos e Cuba. Embaixadas foram reabertas tanto em Havana, quanto em Washington D.C.
O vice-presidente do Conselho de Ministros de Cuba afirma que o primeiro poço de petróleo poderá
estar pronto para exploração entre 2016 e 2017 dependendo da localização da plataforma. Angola e
Cuba têm uma relação longa e próxima; forças cubanas foram cruciais em batalhas contra o apartheid
na África do Sul e no apoio ao governo do MPLA contra a UNITA.
Apesar das preocupações com relação às finanças da Sonangol, o vice-presidente do Conselho de
Ministros de Cuba, Ricardo Cabrisas Ruiz, emitiu uma declaração dizendo que está confiante que o
projeto de exploração de petróleo avançará. As preocupações financeiras baseiam-se na queda
vertiginosa dos preços de óleo cru que teve início em junho de 2014. A declaração foi emitida após a
visita de Ruiz à base da Sonangol Integrated Services Logistics, em Luanda, em meados de julho,
realizada para que se completassem averiguações antes que o projeto receba a liberação oficial. O
representante cubano também destacou que espera que os esforços de exploração offshore levem a
futuras parcerias entre os dois países.
Direitos Humanos
Novas informações sobre as mortes relacionadas a seita
O Monitor de Angola 2/2015 reportou as mortes ocorridas quando a polícia e forças militares agiram
contra a seita Kulupeteka no monte Sumi, província do Huambo. Kalupeteka é uma seita milenarista
que é uma ramificação da Igreja Adventista do Sétimo Dia e tem o nome de seu fundador, José
Kulupeteka. Desde os acontecimentos de abril, emergiram notícias bastante divergentes sobre o que
teria acontecido naquele dia. A linha oficial mantém que um total de 22 pessoas foram mortas, sendo
nove policiais e treze civis. O comandante da polícia local afirma que os civis eram “atiradores de elite”
e que haviam matado os nove policiais. Outros relatos têm surgido, no entanto, com informações de que
até mil pessoas haviam sido massacradas, incluindo crianças e mulheres (diz-se que haviam três mil
pessoas vivendo no acampamento). Um vídeo publicado online, aparentemente filmado
clandestinamente por um membro da polícia ou forças de segurança, mostra o que parece ser a cena
do massacre logo após este ter ocorrido.
O número de mortos ainda não foi confirmado por fontes confiáveis. Todavia, a UNITA, principal partido
de oposição, além de alguns ativistas pelos direitos humanos, reafirma que a notícia de mil mortos seja
verdadeira. Alguns têm dúvida de que os números sejam tão altos, uma vez que não tenham sido vistas
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evidências das mortes nesta escala, embora ainda considerem que o número de mortos mais provável
seja muito além do que a que o governo admite. Um experiente analista de política africana destaca que
mesmo se um décimo dos mais elevados números informados estiver correto, o total de mortos ainda
seria o maior visto em casos de violência policial na África Austral na última década. Não obstante, o
caso recebeu quase nenhuma atenção das mídias internacionais.
José Julino Kalupeteka, líder do grupo, foi preso durante o ataque de abril. Alguns dizem que esta foi
uma tentativa fracassada de prender o líder da seita como parte de uma mensagem mais ampla de que
oposição ao governo não será tolerada. Outros sugerem que o cerco teve como objetivo específico
massacrar um grande número de participantes da seita, como uma maneira de eliminar o grupo como
um todo. O grupo é visto como desobediente, desafiando, assim, o governo. Diz-se que a seita religiosa
rejeita certas ações promovidas pelo estado, como campanhas de vacinação, o censo nacional e a
educação pública. O presidente José Eduardo dos Santos classificou a seita como “uma ameaça à paz
e unidade nacional”, e justificou as ações dos grupos de defesa e segurança. Esta referência à paz e
unidade relaciona-se com uma retórica mais ampla usada para consolidar a paz e unidade de Angola.
Logo após o acontecido, forças do governo isolaram a área e a declararam “zona militar”. Isto preveniu
que parlamentares enviados pela UNITA ao Huambo entrassem na área. Luísa Rogério, membro do
Sindicato dos Jornalistas Angolanos, visitou o local duas semanas após os acontecimentos iniciais e
tirou diversas fotos do acampamento. Embora tenha-se fortes suspeitas de que a cena dos
acontecimentos tenha sido alterada, as fotografias ainda mostram a imensa devastação e pânico. As
fotos podem ser vistas online a partir da página da Rede Angola.
O ministro da Justiça, Rui Mangueira, rejeitou pedidos do Alto Comissariado das Nações Unidas para os
Direitos Humanos para que se permitisse uma investigação independente acerca dos eventos. O
ministro rejeitou a ideia afirmando que não permitirá que “instituições de soberania [de Angola] sejam
agredidas por instituições de fora”. Para alguns, a recusa a qualquer tipo de investigação externa
apenas serve para aumentar as especulações com relação ao acobertamento das evidências. Desde
então, o governo angolano tem solicitado retratação da ONU.
O que ocorreu no Monte Sumi no dia 16 de abril de 2015 tem sido ligado por alguns ao massacre de 27
de maio de 1977, quando, após uma manifestação contra a liderança do MPLA, reporta-se que dezenas
de milhares de civis foram assassinados, embora alguns contestem estes números (O Monitor de
Angola 3/2014, Em nome do povo: o massacre que Angola silenciou, de Lara Pawson). O massacre de
1977 é considerado por alguns como marcador do fim do “período de lua-de-mel” da independência de
Angola que começou no início da década de 1960. O fato de que o número de mortos e a simples
menção do massacre de 27 de maio de 1977 seguem como tabus é considerado preocupante por
alguns. Atualmente existem diferentes versões do que teria ocorrido no Monte Sumi em abril de 2015.
Novas informações sobre Rafael Marques de Morais
O Monitor de Angola 2/2015 reportou que Rafael Marques seria julgado em Luanda. No dia 28 de maio,
menos de uma semana após celebrar um aparente deferimento de todas as acusações, Rafael Marques
recebeu uma pena suspensa de seis meses.
Marques inicialmente foi acusado de difamar vários generais do exército em seu livro, Diamantes de
Sangue: Corrupção e Tortura em Angola, publicado em 2011, que trata de violações aos direitos
humanos cometidas pela indústria do diamante. Aparentemente um acordo entre todas as partes
envolvidas foi firmado prevendo a retirada das acusações em troca do compromisso de que Marques
não republicaria seu livro, podendo continuar trabalhando. O promotor do caso afirmou que o anúncio
de Marques foi uma admissão de culpa, pedindo que o jornalista recebesse uma suspensão da pena,
com a condenação de Marques por perseguição maliciosa, sugerindo que o réu tenha fornecido provas
falsas intencionalmente. As alegações feitas por Marques em seu livro não foram tratadas pela corte
quando ele foi acusado.
A pena suspensa de seis meses tem validade de dois anos. Caso ele se envolva em atividades que o
Estado considere ser criminosas durante este período, a sentença poderá ser executada.
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Marques apelou contra a decisão da justiça. Até o momento, ele obteve pouco sucesso. No entanto, o
caso atraiu considerável atenção da mídia internacional.
Carta de Rafael Marques ao presidente José Eduardo dos Santos
Rafael Marques escreveu recentemente uma carta aberta ao presidente José Eduardo dos Santos em
seu website, Maka Angola (“Maka” refere-se a um problema delicado, sério ou complexo). Na carta,
Marques convida o líder a iniciar conversas com ele. O jornalista detalha experiências e impressões
iniciais que teve do presidente, começando em sua infância e estórias de tanques militares que
viajavam com o presidente, passando pela rua onde ele morava com a sua mãe e fazendo com que sua
casa tremesse.
O jornalista passa a discutir, então, sua primeira experiência direta com o governo do país. Marques foi
à festa de aniversário do presidente em 1992 e ficou impressionado com os excessos materiais das
pessoas que cercavam o presidente. Isso o fez questionar o quão seguro estariam os recursos públicos
nas mãos destas pessoas.
Marques também fez referência ao período que passou na cadeia por chamar o presidente de “ditador e
corrupto”. A prisão e detenção de outros civis por estarem supostamente preparando um golpe de
estado foi mencionada como um exemplo das falhas do sistema judicial. Diz-se que estes civis estavam,
na verdade, discutindo dois livros que delineiam estratégias de resistência pacífica a regimes
opressores, sendo que um dos presos estaria especulando sobre a composição “ideal” de um novo
governo em caso de crise política. Pede-se na carta que os vários cidadãos que estão sendo mantidos
como presos políticos em Angola sejam libertados incondicionalmente.
Carta aberta ao governo de Angola sobre a “Supressão da Liberdade de Expressão, Associação
e Reunião Pacífica em Angola”
O Southern Africa Litigation Centre (SALC), Anistia Internacional, Associação dos Advogados da SADC
e a Front Line Defenders escreveram uma carta aberta ao presidente José Eduardo dos Santos
destacando preocupação com “um grave padrão de desrespeito pela liberdade de opinião, expressão e
reunião pacífica em Angola”.
A carta chama a atenção para três casos específicos, ocorridos no último ano, envolvendo 18 pessoas.
Menciona-se especificamente as prisões do dia 20 de junho de 2015 e as detenções continuadas que
os signatários da carta descrevem como arbitrárias de pelo menos 15 pessoas. Afirma-se que estes
casos envolvendo prisões arbitrárias e detenções continuadas de vários indivíduos são motivados pelo
envolvimento deles em diversas atividades que incluem a troca de opiniões de natureza política,
planejamento de manifestações e conexão com manifestações pacíficas.
A carta destaca a obrigação de Angola, reconhecida internacionalmente e ao redor da África, de
respeitar as liberdades básicas, além de relembrar o presidente e leitores da carta de princípios
fundamentais consagrados em 2010 pela Constituição de Angola e a referência nela contida sobre “a
participação democrática dos cidadãos e da sociedade civil na resolução dos problemas nacionais”.
Assistência e Desenvolvimento
Assistência chinesa em Angola
No início de junho, o presidente José Eduardo dos Santos visitou seu homólogo chinês, Xi Jinping, em
Pequim. A visita ocorreu principalmente para selar acordos econômicos entre os dois países. Reportase amplamente que a China forneceu empréstimos de pelo menos 20 bilhões de dólares a Angola.
A visita do presidente angolano à China ressaltou o fortalecimento das relações entre os dois países e é
vista como marcadora de uma nova fase das relações. Há uma sólida relação financeira entre os
países, mas ambos buscam reduzir qualquer dependência no médio e longo-prazo. A China deseja
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mover do envolvimento predominante com o setor estatal ou apoiado pelo Estado em direção ao setor
privado. Ainda não está claro qual o tipo de desenvolvimento resultará, mas a China está buscando uma
maior participação do setor privado chinês nas áreas da agricultura, indústria, transporte, energia e
telecomunicações. O envolvimento e investimento chinês permitiram uma melhoria visível da
infraestrutura angolana, profundamente impactada por muitos anos de guerra. Contudo, este
investimento tem um preço. Boa parte do trabalho tem sido realizado por mão de obra chinesa.
Empréstimos e contratos têm sido direcionados para empresas chinesas. Algumas pessoas reclamam
da qualidade do trabalho feito e do fato que os trabalhos oferecidos a angolanos são os mais
insignificantes e inseguros, além de serem os que pagam os piores salários. O envolvimento chinês
permitiu ao país asiático obter direitos a parcelas significativas das reservas de petróleo. No momento,
Angola pensa e quer manter o alto envolvimento chinês, mas também deseja atrair investimentos de
outros países.
Angola pode reduzir a pobreza pela metade?
O Diretor Geral da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), após
reunir-se com o presidente José Eduardo dos Santos durante sua visita a Itália (Roma é onde localizase o centro operacional da FAO), celebrou o fato de Angola estar compromissada e ver como questão
chave a redução da pobreza pela metade. O representante angolano na FAO afirmou que Angola
reduziu pela metade o número de angolanos subnutridos de 6,8 milhões para 3,2 milhões de pessoas,
ou 13% da população.
Produção agrícola acima da média
Uma produção agrícola acima da média é esperada para 2015, particularmente de cereais, com
expectativa de alta de 29% acima da média, principalmente devido a uma boa safra de milho.
Condições de estiagem e seca em algumas partes do país, especialmente o sudoeste, afetaram a safra.
Estima-se que cerca de meio milhão de pessoas foram afetadas pela seca. Apesar de haver
disponibilidade de alimentos, os preços aumentaram em algumas regiões do país devido a inflação,
que, por sua vez, está ligada a aumentos nos preços dos combustíveis devido à remoção dos subsídios.
Feira Internacional de Luanda 2015
A Feira Internacional de Luanda (FILDA) aconteceu entre os dias 21 e 26 de julho. A feira é
essencialmente uma grande mostra comercial realizada anualmente em Angola. O objetivo da feira,
agora no seu 32º ano, é promover o crescimento econômico e o desenvolvimento das parcerias
empresariais com outros países. Este ano 40 países participaram do evento.
Dois dos eventos relacionados e que foram motivo de comentários durante boa parte dos preparativos
para a feira foram os fóruns econômicos Alemanha/Angola e Angola/Itália que debateram a agricultura e
indústria alimentícia. A Itália foi o segundo país em número de representantes comerciais com 70
pessoas representando 63 empresas. Diz-se, também, que a Itália teve uma presença organizada com
ajuda governamental, ao invés de empresas participando independentemente. Mais uma vez, Portugal
foi o país com maior número de representantes com 95 empresas visitando o evento.
O Fórum Econômico Alemanha/Angola aconteceu pelo sexto ano e ocorreu no âmbito da feira
internacional. Este ano, de acordo com um funcionário alemão, a Alemanha teve status de “visitante
especial”. Ricardo Gerigk, delegado para Economia Alemã em Angola disse que “o fórum estabeleceuse, durante os últimos anos, como a plataforma mais importante para o desenvolvimento do comércio e
relações de investimento entre Alemanha e Angola”.
O embaixador interino da África do Sul em Angola, Motowe Mokwena, também reconheceu a
importância da FILDA. Ele afirmou que a feira contribui significantemente para melhorar as relações
econômicas bilaterais entre os dois países. Mokwena ainda disse que Angola é vista como parceira
estratégica da África do Sul na África.
As matérias do Monitor de Angola não representam necessariamente qualquer posição acordada
pelo ACTSA.
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