capa de operacao black hole capitulo 1
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capa de operacao black hole capitulo 1
1 Operação Black Hole Capítulo 1 Um salto através do tempo Sempre sonhei em ver o futuro, ver uma era mais avançada, ver o progresso da humanidade. Emmett Brown 4 de agosto de 2012, Brookline, Massachusetts. A partir do Projeto Apollo que levou o Homem à Lua, os Americanos brindaram a humanidade com diversas novas tecnologias. Do tênis de corrida aos avanços no campo da medicina. Agora fariam a humanidade dar um salto ainda mais ousado. Não mais no Espaço, mas através do Tempo. Em uma mansão em Brookline, cidade vizinha a Boston, Massachusetts, alguns homens reuniam-se mais uma vez para discutir o andamento de um projeto sem precedentes. Dentre todas as casas daquele bairro nobre, iluminado por uma manhã ensolarada de agosto, a residência dos Montford era uma das mais antigas. Construída no estilo vitoriano, a mansão toda parecia congelada no tempo. Apenas por fora. Dentro havia todo o luxo e conforto que os eletrodomésticos do século XXI poderiam oferecer. O anfitrião, General norte-americano Oswald Montford, um senhor de 62 anos já grisalho nos cabelos e bigode, de olhar sério na cor castanho-escuro, recebia na sala de seu escritório particular os Ministros da Defesa da França e Inglaterra, além de outros dois oficiais militares dos Estados Unidos. Os militares, apesar da alta patente, estavam todos em roupas civis, como era de praxe nas reuniões do grupo, descaracterizando os motivos reais dos encontros. Estes nunca aconteciam em estabelecimentos das Forças Armadas ou por vídeo conferência, mas sim aleatoriamente na residência de cada um deles. O escritório mesclava uma decoração clássica, de paredes em revestimento de madeira na cor tabaco, com os mais modernos equipamentos de áudio e vídeo. O General era um cinéfilo nas horas vagas. Um computador de última geração estava ligado a um projetor que clareava uma grande tela branca, posicionada acima da lareira. Ainda assim o ambiente tinha a iluminação reduzida, principalmente pelos painéis que tapavam as janelas, bloqueando a forte luz do dia. 2 Os presentes estavam acomodados em um espaçoso sofá, de frente para a lareira, e em poltronas nas laterais. Ainda havia lugares sobrando, pois aguardavam o Chefe das Forças Armadas da Suíça chegar com os dois pesquisadores do CERN, o Centro Europeu de Pesquisas Nucleares, que trariam os resultados das últimas semanas de experimentos. Há pouco menos de dois meses a comunidade científica celebrava a comprovação da existência do Bóson de Higgs. Hoje os cientistas reencontrar-se-iam com o grupo que estava financiando outro tipo de pesquisa. Uma que não era rodada sob os holofotes da mídia, e nem mesmo constava nos relatórios oficiais do Centro Europeu ou do Exército Americano. O assunto na sala já havia acabado por tanto esperarem os outros envolvidos, e agora todos se entreolhavam com certa ansiedade. As reuniões marcadas às pressas traziam a expectativa de algum evento catastrófico para a Operação. Desde o início, nunca houve boas notícias da parte dos cientistas. Até o momento o maior progresso aconteceu apenas no cenário das simulações matemáticas. Sentado em uma das poltronas estava o General Gregory Foster. Nitidamente o mais novo dos militares, com seus 53 anos e aparência de um saudável quarentão frequentador de academia. Trajava uma camisa que, apesar de confortável, era justa o suficiente para notarem-se os músculos. Era também o mais bronzeado, fazendo-o destoar ainda mais do grupo de velhinhos quase apáticos. Diante de Foster, na poltrona do outro lado da sala, sentava o Almirante Robert Hines. Visivelmente incomodado por estar sem o quepe e não poder disfarçar sua aparente calvície, deixou penteado os parcos cabelos de maneira a formar uma capa de fios sobre a cabeça. Com os cotovelos apoiados sobre cada um dos joelhos, formava uma curiosa figura arqueada ao juntar as mãos apoiadas no queixo. Foi o primeiro a perder o olhar e mergulhar em seus próprios pensamentos, os quais Foster conseguia imaginar: “O que é que estou fazendo aqui?”. No grande sofá, além do General Montford, estavam os Ministros. De um lado o inglês Phillip Stone, um gordinho de baixa estatura, orelhas protuberantes e também desprovido de cabelos. Do outro o francês Charles Breton, alto, com um terno bem alinhado, penetrantes olhos negros e um volumoso bigode que quase cobria a própria boca. Enfim o silêncio foi quebrado pela entrada dos outros participantes. O esforço de viajar mais de seis mil quilômetros não incomodou o suíço Henri Moulin, muito menos os dois pesquisadores do CERN, Paolo Koulberg e Nicolas Brisson. Estes, visivelmente empolgados. Henri Moulin era um homem muito magro, loiro de olhos azuis. Seu nariz poderia competir com as orelhas de Phillip Stone, caso houvesse um concurso de feiura entre os membros da Operação. Chegou carregando o paletó nos braços, com marcas leves de suor nas costas, o que denunciava a falta de costume para temperaturas acima dos vinte graus. Em sua mão direita um 3 anel de ouro com um crucifixo cravejado de rubis. Os cientistas estavam bastante confortáveis. Paolo Koulberg parecia um garoto no meio de tanta gente enrugada. Sempre despojado, com uma simples blusa estampada, calça jeans e tênis. Seus óculos eram emoldurados pela cabeleira ruiva, que fazia questão de prender em um rabo de cavalo quando visitava a mansão dos Montfords. Achava que isso era algum sinal de respeito. Trazia consigo uma mochila com alguma papelada e seu laptop. Paolo praticamente carregava o destino da humanidade nas costas. Já Nicolas Brisson gostava sempre de parecer bem apessoado, em roupas caras, sapatos italianos, relógios de grife... Achava que o mundo todo agia como ele, julgando os livros pela capa. Era o tipo de pessoa que aparentava ser mais do que era na verdade. Quando se olhava no espelho estava sempre mais bonito do que na realidade. A animação dos cientistas automaticamente ditou o clima da reunião fazendo com que o General Norte-americano, Gregory Foster, descontraísse: — Podemos então, abrir o Champagne? — Podemos não. Devemos! — disse Paolo. Depois dos cumprimentos, e colocada rapidamente as conversas em dia, todos sentaram à mesa do escritório e tiveram início os trabalhos com Paolo e Nicolas apresentando os resultados de suas pesquisas. Apontando para o projetor com um laser, Nicolas circulava o desenho esquemático de duas partículas em choque. — Enquanto a equipe do Bóson de Higgs focava nesta área aqui, eu e Paolo percebemos que havia algo a mais nessa imagem. Aquilo que já havíamos discutido nos últimos encontros estava na cara de todo mundo e ninguém via — explicou com certa arrogância. — A tal da Singularidade? — indagou Phillip Stone, o Ministro da Defesa inglês. — Vendo agora a análise dos senhores, entendo porque os outros cientistas não conseguiram identificar o evento — apontou Robert Hines, Almirante dos Estados Unidos, o único dos militares que possuía bagagem científica necessária para realmente entender o que significava aquilo tudo. — Eles estavam tão empenhados em detectar os 125 de massa que ficaram completamente cegos para a distorção. — Senhores... Será que devo lembrar a vocês em todos os encontros... — interrompeu o anfitrião, Montford, sempre avesso às tecnicidades. — Desculpe General. Vamos passar para a prática e depois conversamos a parte chata no almoço — Hines acenou para que Paolo e Nicolas continuassem. — Somente para concluir, sim Almirante Hines, a distorção gravitacional apesar de não estar assinalada nos relatórios pode ser vista na imagem. Mas como ela aconteceu na periferia do campo de Higgs, passou despercebida. E respondendo ao Ministro Stone, sim! Enfim achamos 4 a nossa Maldita Partícula! Nicolas fazia referência a como chamavam anteriormente o Bóson de Higgs, depois popularizado como Partícula de Deus, nome que a mídia adorava estampar nas revistas e que causava desconforto entre diversos cientistas. — Finalmente! Depois de todos esses anos alguma notícia boa. E quando é que os senhores começarão a aplicar isto na nossa Operação? — o Ministro inglês representava o segundo maior investidor do projeto e, portanto, um dos principais interessados em ver um retorno financeiro o mais rápido possível. O Reino Unido e a França sempre foram os maiores investidores do laboratório CERN, além da Alemanha, que não foi incluída na Operação por motivos estratégicos. Já Henri Moulin entrou no projeto somente nos dois últimos anos, quando ficou decidido que os testes seriam realizados em solo suíço. Então, Nicolas largou o apontador laser e deu as costas para a projeção na tela. Apoiou as duas mãos sobre a mesa, e disse: — Já fizemos os testes práticos e... Sim, senhores. O deslocamento temporal é uma realidade! O Modelo teórico que postulamos, utilizando as Singularidades, é possível! — o grupo ficou boquiaberto e em silêncio. Hines, apesar da formação em Física, da época de Tenente, era da escola que considerava impossível o deslocamento temporal para o passado, e não tinha esperanças que aquele projeto secreto fosse adiante. Estava no grupo mais por sua posição de Almirante do que conhecedor do assunto. Apesar de reconhecer o avanço em relação à Singularidade, só acreditaria na viagem no tempo vendo com os próprios olhos. — O que vocês já podem nos mostrar? — perguntou o Almirante. — O equipamento, claro, ainda é frágil demais para trazer em uma viagem, e precisamos terminar o módulo com os relógios atômicos para aumentar a precisão nos testes, mas o vídeo a seguir mostra nossa última tentativa com sucesso — e tomando novamente o apontador, Nicolas clicou em um botão que iniciou o filme. O projetor mostrava Paolo em frente a um equipamento que ocupava uma mesa inteira. Ao centro da aparelhagem havia uma plataforma, e flutuando sobre ela, um artefato esférico em aço inoxidável. O objeto, que tinha a letra “C” entalhada na parte superior, exibia em seu painel digital um cronometro com milissegundos de precisão. O enquadramento recua, revelando um panorama maior do laboratório e Nicolas, que operava a câmera, finalmente aparece em cena. Abaixo do equipamento havia outro cronometro, em perfeita sincronia com o artefato. Paolo observava em um monitor os dois relógios focalizados, que eram fotografados para exibir a comparação dos registros: 0:01:23:063 nos dois 5 painéis. Uma marca d´água, no canto esquerdo do vídeo, indicava que esta era a sexta experiência temporal, gravada quinze dias antes. Enquanto na projeção os dois cientistas calibravam o equipamento, Nicolas comentava com os presentes. — O que os senhores estão vendo é resultado de dois meses de intenso desenvolvimento, iniciado no momento em que obtivemos a confirmação da Singularidade. A construção do gerador primário levou um mês e meio, e os testes práticos começaram logo a seguir. O equipamento ainda não consegue manter as Singularidades estáveis, ficando em atividade apenas por milésimos de segundo. — Aparentemente esse não foi o primeiro teste, certo? O que aconteceu com os outros relógios? — o Ministro Stone não encontrou uma palavra melhor para definir aquela bola de metal, que lembrava um despertador muito barulhento, de visor vermelho, que tivera. — As primeiras tentativas foram desastrosas! Transportavam o artefato de controle a oitenta metros de altura, mais de vinte metros afastado das instalações do laboratório — Paolo perdia a primeira chance de ficar calado do dia. Paolo Koulberg tinha 31. Além de ser o mais jovem do grupo, era o maior entusiasta do projeto. Ao contrário dos outros, aceitou entrar na Operação apenas pelo espírito aventureiro e a gana de fazer novas descobertas. Superinteligente, nascido em uma abastada família da Holanda, Paolo concluiu a faculdade de Física aos dezesseis anos e aos dezenove já trabalhava no Experimento Atlas, um dos braços do Grande Colisor de Hádrons. Seu QI era tão grande quanto sua ingenuidade. — Vocês também descobriram a téléportation? — perguntou com característico sotaque francês, o Ministro Charles Breton. — Não exatamente. A máquina enviava o artefato Bravo para um milissegundo no futuro, e devido o movimento da Terra através do espaço... — Nicolas respondeu enquanto lançava um olhar reprovador a Paolo, que resmungou baixinho fazendo uma coreografia com os dedos. — Terra ao redor do Sol, Sol ao redor da Galáxia, Galáxia ao redor do Aglomerado... — Isso — continuou Nicolas. — A bolha de deslocamento temporal não se move pelo espaço; somente a Terra. Portanto, ainda que o deslocamento ocorra apenas por intervalos ínfimos, quando o artefato surge no tempo de destino o planeta não está mais na mesma posição que antes. — Aliás, só a título de curiosidade, existe uma grande probabilidade de nossa primeira tentativa ter enviado o artefato Alpha a oitenta metros de profundidade. Na verdade nunca o encontramos, apenas chegamos a essa conclusão através de cálculos — e essa foi a segunda 6 chance que Paolo desperdiçou falando o que não devia. Nicolas Brisson e Paolo Koulberg conheceram-se há quinze anos, no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT. O primeiro fora professor do segundo, e apesar da genialidade de Paolo ter superado a do mestre, Nicolas tinha muito mais experiência para lidar com pessoas. Eram nessas horas que a diferença de idade entre os dois ficava mais aparente do que as rugas e calvície de um, e o cabelo comprido do outro. Foi Nicolas quem levou Paolo para trabalhar no CERN. — E o que vocês fizeram para a Terra não engolir mais esses equipamentos que estão saindo do bolso de nossos contribuintes? — o Ministro Stone tentou ser irônico. — Por incrível que pareça, foi preciso apenas mudar o horário dos testes para madrugada. Desta forma, nesta época do ano, o sentido da movimentação da Terra se afasta do ponto de deslocamento temporal, invés de passar por dentro dele — Paolo explicou meio sem graça. — Então, a partir do experimento de número seis, desenvolvemos no artefato Charlie um dispositivo de trava quântica que praticamente “cola” a bolha de deslocamento temporal no campo magnético do planeta. Assim, enquanto a bolha “passeia” entre a quarta dimensão, ela é arrastada pelo magnetismo da Terra que “vaza” através da terceira dimensão. Nicolas disse isso fazendo movimento de aspas com os dedos, enquanto enfatizava as palavras análogas aos termos técnicos que o General Montford tanto odiava, embora a palavra dimensão tenha causado mais desconforto aos Ministros do que se tivesse usado a expressão buraco do coelho. No vídeo os dois cientistas estavam prestes a acionar o experimento. Uma luz vermelha acende no equipamento, e ambos protegem-se atrás de uma barreira de chumbo. A câmera não os focaliza, mas um deles faz uma breve contagem regressiva: — Três, dois, um, e lá vai! Ouve-se apenas um estalo, e a luz do equipamento fica verde. O artefato Charlie nem se moveu. — Vocês quebraram o protocolo de contato e marcaram uma reunião extraordinária, só para mostrar isso?! — Monford falou exaltadamente, apontando a tela com a mão espalmada para cima. Henri Moulin, que estava calado desde o início da reunião, apenas olhou para os dois cientistas como quem diz: “Viu? Não falei?” e balançou negativamente a cabeça, deixando escapar um sorriso. O suíço já havia assistido ao vídeo e sabia que a reação dos presentes seria de descrédito. — General. Senhores. Vocês acabaram de assistir o primeiro deslocamento temporal com sucesso. Vejam! — e Nicolas apontou para o monitor que exibia os cronômetros do experimento. O artefato marcando 0:07:52:614 e o painel do equipamento 0:07:52:615. 7 — Eu entendo perfeitamente a ânsia de vocês mostrarem cada passo das descobertas — Hines passou muito por isso, enquanto tentava a promoção para Capitão e defendia sua tese de mestrado sobre “Detecção de projéteis utilizando varredura por matriz de radares”, que posteriormente foi utilizada para o desenvolvimento de um escudo antimíssil em veículos blindados. — Mas isso foi um tanto... decepcionante — arrematou. — Olha, para quem começou a desenvolver isso faz menos de dois meses, até que realizaram um trabalho espetacular! Qual a razão da barreira de chumbo? — Foster tentou levantar a moral dos cientistas, mostrando interesse. — O equipamento é completamente seguro. Porém é preciso obedecer alguns procedimentos na operação, pois o fenômeno do deslocamento temporal emite raios-x e raios-gama durante a partida e chegada do objeto. Por enquanto são intensidades desprezíveis, mas, nesse caso, é sempre melhor cumprir o protocolo. Nicolas Brisson era extremamente metódico, do tipo que desliga a chave geral de força para trocar uma lâmpada. Dava mais importância a esse tipo de protocolo, do que as paranoias do General Montford a respeito da comunicação entre os membros da Operação, os encontros secretos, e outros sigilos. — Bom, estamos pagando por uma máquina que viaje no tempo, e não uma que mostre as cáries nos meus dentes — Stone não perdia a chance de fazer uma piada, ainda que sem graça. — Agora, falando sério; viajar apenas um segundo no tempo não é a coisa mais extraordinária, concordam? Acho que fica um pouquinho longe de onde queremos chegar. Os dois cientistas nunca tiveram a oportunidade de explicar aos Ministros como era o funcionamento da máquina e de que forma ocorria o deslocamento temporal. Haviam conversado apenas com Foster e Hines, em um dos encontros passados. Tanto os Ministros quanto Montford tinham interesses puramente financeiros e estratégicos na Operação, não importando se a máquina funcionaria com tecnologia alienígena ou pó mágico. — Senhores Ministros, chegou a hora de entenderem como tudo isso funciona. É importante saberem que existem, sim, algumas limitações e imperfeições em nossa máquina, mas que elas não inviabilizam a Operação. Nicolas não queria que os Ministros desacreditassem no projeto e ameaçassem cortar as verbas mais uma vez. Por isso, achava que fazê-los compreender como era possível a viagem no tempo era mais relevante que mantê-los informados acerca dos progressos. — Este protótipo foi apenas o primeiro passo da nossa jornada. E para os senhores nos acompanharem até o final, será necessário o máximo de confiança em nosso trabalho. Muitas dessas limitações são determinadas pelas próprias leis da física, e por mais que não compreendam a matemática e engenharia usadas para tornar possível o deslocamento temporal, preci- 8 sarei que os senhores prestem atenção nos conceitos que vou apresentar agora. Nicolas fez uma pausa dramática, como se estivesse prestes a resumir todo o segredo do Universo em apenas uma frase. Deu um longo suspiro, e prosseguiu. — A viagem no tempo envolve quatro pilares: O volume a ser transportado; o intervalo a ser percorrido; a velocidade de deslocamento; e o mais importante, evitar a divergência temporal. Todos esses conceitos estavam no trabalho de Paolo Koulberg, que foi o ponto de partida da Operação, quinze anos atrás. Apesar de pouco ter contribuído no modelo, Nicolas agia como se tivesse criado tudo sozinho. — Deixe Paolo falar um pouco, Nicolas. Afinal, a teoria é dele. Montford não tinha filhos, mas sempre tratou Paolo como se fosse. Sua esposa, Margaret, ou Maggie, como a chamava carinhosamente, também gostava de paparicar o rapaz ruivo, desde a primeira vez que ele pisou na mansão, quase dez anos atrás. Era uma das poucas oportunidades em que podia praticar os instintos maternais. — Obrigado senhor Montford. Obrigado Nicolas. Paolo sorriu e tomou o apontador laser do amigo. — Como todos já sabem, para que o deslocamento temporal aconteça precisamos da Singularidade. O gerador que desenvolvemos não cria efetivamente a partícula. Ela tem origem no acelerador do LHC e depois é transferida para nosso laboratório. — Quer dizer que a máquina estará sempre vinculada ao CERN? Pensei que fossemos criar um veículo, ou alguma coisa com certa mobilidade — aquilo preocupou Montford. — Certamente não em um DeLorean, Oswald — brincou Foster. Gregory Foster possuía passatempos e gostos fora dos padrões dos militares de mais idade, e por isso era conhecido entre os colegas como o General Nerd. Tivera filhos muito cedo, que cresceram nos anos oitenta e viram nele um irmão mais velho. Acabou sendo influenciado a gostar de videogames, ficção científica e ler quadrinhos, pois esse era o único momento de lazer com os garotos. O velho Foster o mandara para o colégio militar aos dezesseis anos, “para largar dessa vida desregrada e virar um homem de verdade”, dizia ele. O que começou como um castigo, a carreira militar tornou-se sua grande paixão, depois dos filhos. — Ótima lembrança senhor Foster! — sorriu Paolo. — Mas não ficaremos dependentes do CERN. O nosso equipamento captura a partícula em um forte campo magnético, e a condiciona para realizar o deslocamento temporal. Atualmente ela entra em colapso, limitando o intervalo de atividade. Mas a próxima atualização do gerador será capaz de mantê-la estável em seu interior, até que seja necessário reativá-la. Deste modo, poderemos transferir a máquina para qualquer lugar, desde que permaneça conectada a uma fonte mínima de energia. Imagino que seja possível transportar o gerador em um veículo sem problemas. 9 — E a autonomia da máquina? Já chega ao alcance que precisamos? — Ainda não senhor Montford. Mas não se preocupe, vamos chegar lá e eu vou explicar para os senhores como faremos. Se fosse possível, gostaria de deixar as perguntas para o final. — Perfeitamente — concordou o General. — A Singularidade gerada é como se fosse um Buraco Negro em miniatura. Um objeto esférico, de densidade descomunal, que suga tudo a sua volta a partir de um horizonte de eventos. — Isso aí não vai abrir um buraco no meio da Europa, vai? — os presentes não conseguiram identificar se Stone continuava brincando ou realmente estava temeroso. — Fique tranquilo Ministro. A Singularidade, quando criada, tem o diâmetro dezenas de vezes menor que um elétron. Neste momento, aliás, ela é completamente inofensiva, e para dizer a verdade, inútil. O campo de distorção temporal está dentro do horizonte de eventos. Assim, qualquer coisa que tente viajar no tempo teria que penetrar esta fronteira, de onde tudo entra e nada, nem mesmo a luz, escapa. É aí que surge o nosso gerador. Ao prender a Singularidade em um fortíssimo campo magnético, dentro de uma cápsula hermética à quase cem por cento do vácuo perfeito, começamos um processo de bombardear massa em seu interior para aumentá-la e, consequentemente, ampliar o poder de seu campo de distorção. Paolo colocou no projetor a imagem de uma esfera no lado esquerdo e um toro, que o Ministro francês identificou como uma rosquinha, no lado direito. — Então injetamos elétrons na superfície da esfera, fazendo-a girar em uma velocidade tão grande que se transforma nessa figura toroidal. Nesta configuração, a Singularidade apresenta dois campos de distorção temporal; um interno ao horizonte e outro externo. No entanto precisamos de duas Singularidades como esta, pois é na interseção desses campos externos que vamos trabalhar. O cientista voltou alguns slides da apresentação, até chegar ao vídeo que exibiram anteriormente. — Vejam essas duas estruturas à esquerda, e à direita do artefato Charlie. As Singularidades ficam acondicionadas nestes compartimentos. Iniciamos os processos de inflação e rotação, e ao atingir as configurações desejadas, aquela luz vermelha acende, indicando que o gerador está pronto para ser ativado, e os campos já estão fortes suficientes para englobar o artefato. Com um comando, numa fração de segundo, o campo magnético que mantém a Singularidade em suspensão é invertido, liberando a distorção temporal para além das estruturas laterais, finalmente alcançando o artefato, que é transportado através do tempo. Com alguns cliques, avançou novamente a apresentação até exibir um gráfico, com círculos sobrepostos, semelhantes a um diagrama de Venn. — Os pontos no centro dos círculos representam as Singularidades. Notem que, neste 10 primeiro conjunto, os pontos estão fora da interseção. É a mesma disposição que temos no vídeo, logo a distorção temporal não acompanha o artefato, uma vez que as Singularidades permanecem no ponto de partida. É por isso que o nosso teste dura apenas uma fração de segundo. A próxima atualização da máquina será capaz de gerar um campo, grande o suficiente para englobar ela própria, e assim manter a viagem num curso constante — e apontou para outro gráfico, exibindo dois círculos muito próximos, em que os pontos nos centros estavam dentro da interseção. — Este é o primeiro pilar da viagem no tempo, o volume a ser transportado. Quanto maior a velocidade de giro das Singularidades, maior será o tamanho do toro e, consequentemente, da área do campo de distorção temporal. A próxima imagem exibia um tipo de tecido elástico, de padrão quadriculado, disposto em uma superfície plana. Havia sobre ele uma pequena esfera, criando uma reentrância, como se a puxassem para baixo. Ao lado, para efeitos de comparação, existia o mesmo cenário, porém com uma esfera maior e uma deformação mais acentuada. — O segundo pilar da viagem no tempo está atrelado ao terceiro. O intervalo a ser percorrido depende da velocidade de deslocamento e da manutenção da Singularidade. Paolo sabia que a figura estava conceitualmente incorreta, mas seguiu com as explicações, ainda que contrariado. — Quanto mais densa a partícula, maior é o poder de arrasto do campo de distorção temporal através da quarta dimensão. Como o nosso experimento de número seis não teve suporte constante das Singularidades, o deslocamento ocorreu como um arremesso do ponto A ao ponto B. Um salto através do tempo. E o intervalo percorrido, no caso um milissegundo, foi alcançado devido à configuração de massa, atribuída às Singularidades naquele momento. Como elas são muito pequenas, estão constantemente convertendo massa em radiação, e para evitar que evaporem, precisamos manter o bombardeamento com mais massa. Então avançou para um slide que exibia dois gráficos. À esquerda uma parábola convexa, com o eixo horizontal representando o tempo, indo de zero a “N”, e o eixo vertical escrito “interferência” tinha uma escala que partia de zero até cem por cento. Ao lado, outro gráfico, desta vez com uma parábola côncava, com os eixos idênticos ao da primeira, porém escrito “divergência” no vertical. — Este é o último e mais importante pilar da viagem no tempo. A divergência temporal. Todos os primeiros pilares influenciam diretamente no quarto. À medida que vamos adicionando massa e aumentando o giro da Singularidade, ela fica propícia a oscilar e vibrar, causando uma interferência no trajeto pela quarta dimensão. Conforme a interferência aumenta, vamos tomando distância de nossa linha do tempo de origem. Essa divergência nos leva a um universo cada vez mais diferente do nosso. Uma divergência de 0,001% é o suficiente para modificar os números 11 de uma loteria, por exemplo. Com meio por cento podemos presenciar diferenças em roteiros de filmes e na interpretação dos atores, além de variações climáticas, como a não formação de um furacão. O jovem seguiu apontando o laser por cima da curva ascendente. — Com cinco por cento de divergência, pessoas que estavam mortas podem estar vivas, e vice-versa. Em dez por cento, eventos históricos podem ser drasticamente alterados, como eleições, atentados terroristas ou guerras. A partir de vinte por cento começaremos a observar severas mudanças geológicas, como terremotos e vulcões ocorrendo com intensidades e em datas diferentes. Segundo nossos cálculos, em cinquenta por cento, eventos astronômicos podem ser desviados, como queda de asteroides ou mesmo mudanças nas órbitas de cometas. Em setenta por cento a chance do planeta Terra não ter sido formado é de um para dez. E finalmente, com cem por cento de divergência, teríamos um universo completamente distinto, talvez com leis da física próprias, ou, quem sabe, até mesmo a não existência. — Desculpe rapaz, mas o que isso quer dizer exatamente? — o Ministro Stone não quis esperar a rodada de perguntas para acabar com essa aflição pessoal. — Significa que, com cem por cento de divergência, você estará automaticamente morto — sentenciou o cientista. — Bom, acho que encerramos por aqui, vamos seguir com a parte orçamentária, certo Paolo? — Nicolas tinha a impressão que se a Operação fosse cancelada, o amigo teria uma grande parcela de culpa. — Um momento, eu gostaria de lançar umas perguntas — interrompeu Charles Breton, o francês. — Vocês falaram muito em “deslocamento” e “velocidade”. Essa viagem no tempo não é imediata? Nicolas procurou novamente o apontador para controlar a apresentação, mostrando um slide com tabelas e números, mas estes nada significaram para os leigos ali presentes. — Vamos imaginar que a máquina pudesse enviar o artefato para uma hora no futuro. Digamos que o experimento ocorresse ao meio dia. Veríamos o artefato partir num piscar de olhos, e apenas retornar quando o relógio marcasse uma hora. Até aí, igual à maioria dos filmes. Porém, o que acontece na realidade é completamente diferente. O nosso artefato levaria, conforme a potência mínima necessária para iniciar o deslocamento temporal, cerca de trinta segundos para percorrer uma hora de deslocamento. Esta razão de dois minutos por segundo pode ser melhorada, aumentando a densidade da Singularidade. — Guardem os números para vocês. Vamos tirar as dúvidas práticas para analisarmos o orçamento — o General Montford irritou-se mais uma vez. — Ainda que eu concorde com meu amigo Gregory, no que diz respeito do fabuloso trabalho realizado pelos dois, precisamos saber 12 quanto tempo ainda falta até que a Operação possa ser colocada em prática. — Mesmo se conseguirmos toda verba prevista, ainda será preciso realizar os testes de deslocamento para o passado, terminar os relógios atômicos, sensores, testes de colisão... Acredito que um pouco mais de três ou quatro anos — ponderou Nicolas. — Não temos esse tempo, senhor Brisson. Dou a vocês dois anos, no máximo, para que esta Operação seja realizada. Ela ainda é o meu plano de aposentadoria... — Vamos nos empenhar senhor Montford, podemos entregar em dois anos. Bom, vamos voltar às perguntas? Alguém tem mais alguma? — Paolo colocou panos quentes. — Sim! Aquele artefato que desapareceu... O que acham que aconteceu com ele? Estaria intacto? É possível recuperá-lo? Não preciso dizer o que aconteceria se um equipamento desses aparecesse na mídia, certo? — Montford encarou severamente os dois cientistas, denotando que a situação ficaria bem complicada para cada um. Mesmo sob o olhar reprovador de Nicolas, Paolo decidiu responder. — Excelente questão, senhor Montford. O artefato Bravo foi recuperado. Ele estava espatifado, depois de cair dezenas de metros ao lado do laboratório. Foi por este motivo que utilizamos um revestimento resistente no artefato Charlie. Já o destino do primeiro artefato é incerto. Mas eu e Nicolas chegamos a três situações possíveis. Ele pode ter sido esmagado pela pressão de oitenta metros de profundidade; fundido seus átomos aos do material pré-existente, no caso as rochas; ou desintegrado todas as moléculas, sendo pulverizado pelo subsolo. Acreditamos mais na primeira hipótese devido à natureza, ainda teórica, de como o campo de distorção parte e chega ao universo tridimensional. Infelizmente não preparamos um slide para representar a situação, mas os senhores podem imaginar o início do deslocamento como uma bolha encolhendo, e a chegada como uma bolha inflando a partir do nada. Paolo descreveu as situações gesticulando para o grupo. Primeiro, trazendo as mãos espalmadas ao encontro uma da outra, entrelaçando os dedos como quem se prepara para fazer uma oração. Depois, como se ali no meio estourasse um explosivo imaginário, o cientista afastou as palmas até parecer segurar uma bola de basquete invisível. Então continuou. — Ao tentar inflar em um espaço com matéria mais densa, essa bolha colapsaria e seria esmagada pela pressão. A segunda hipótese foi descartada, pois não detectamos nenhum traço de energia que fosse uma assinatura de fusão nuclear. A terceira hipótese pode ser viável, mas como expliquei, a primeira nos parece mais lógica. — Existe possibilidade de isso acontecer com os tripulantes da Operação? — o Almirante Hines parecia mais preocupado quanto à vida da equipe do que os demais. — Hoje com o sistema de trava quântica não corremos mais o risco de pararmos debaixo da terra ou no meio do espaço sideral. Porém, dependendo do período deslocado, podemos chegar 13 numa época em que existiu, ou existirá, uma construção, veículo ou até mesmo um aterro ou inundação. Por isso precisamos aperfeiçoar os sensores e relógios atômicos — Nicolas sempre achava bom enfatizar que o dinheiro gasto era para aumentar a segurança. — Com eles teremos um sistema de verificação de colisão. Momentos antes de desativar o campo de distorção temporal, a máquina medirá a densidade do local de destino, e caso seja algo que comprometa a integridade do volume transportado, ela iniciará um processo de desvio temporal, até chegar a um instante que não exista mais aquela massa de colisão. É por isso que o mais seguro é fazer a viagem no mar, pois a probabilidade de colidir com algo é remota, e a água por não ser sólida, molda-se ao redor do campo de distorção. Pode gerar uma onda de choque, mas a tripulação estará a salvo. — E no mar não existe o risco de alguém cavar um buraco enorme e a máquina do tempo cair, quando surgir no local — disse Paolo, para logo em seguida justificar-se pelo comentário catastrófico. — Os senhores sabem, temos sempre que prever o pior cenário, e evitar surpresas. — Eu também acho tudo isso muito perigoso. Não podemos apenas mandar robots para realizar a Opération, no lugar da equipe? — estranhamente, Charles Breton fez a pergunta como se a tivesse ensaiado umas quinze vezes, diante do espelho. — Não! Necessitaremos de improviso, argumentação e tomada de decisões. Coisas que somente seres humanos podem fazer! — Montford menosprezava e não confiava em máquinas. — Precisamos dos melhores soldados para realizar essa Operação. É por isso que contamos com você, Hines. Mandaremos seus melhores homens. — Mas quantos mandaremos afinal? E o equipamento necessário? Vocês pensam em colocar essa máquina para funcionar em que veículo? — começava cair a ficha em Hines, de que a Operação poderia mesmo acontecer. Não era mais devaneio de dois cientistas malucos. — Tanto faz. A decisão é dos senhores. Em teoria podemos mandar desde uma lancha até um porta-aviões, só depende de configurar corretamente o equipamento — explicou Paolo. — Você disse porta aviões? Isso pode mudar completamente nossa perspectiva da Operação. Além do objetivo primário ainda poderíamos interferir nos fatos. Geraríamos um resultado completamente novo e imprevisível, concorda Koulberg? Montford interrompeu. — Eu entendo Hines, mas... não acha um exagero? Não seria arriscado envolver tanta gente nisso? — o General não deixou claro se estava preocupado com o sigilo ou com a vida das pessoas. — Quais são os riscos de transportar um volume tão grande? — Foster perguntou aos amigos cientistas. — Com o equipamento calibrado, os sensores sensíveis o suficiente, podemos manter 14 o ponto de destino e aumentar o volume transportado sem comprometer a divergência. Talvez diminuindo um pouco a velocidade — disse Paolo, acompanhado de um assentimento de Nicolas com a cabeça, que aproveitou para defender a ideia. — Realmente aumentaríamos as chances de gerar um resultado melhor do que simplesmente executar o protocolo original. — Senhores... Pensem! Que perigo poderíamos correr? Estaríamos com enorme vantagem estratégica e tecnológica. Nossos equipamentos são muito superiores. Nossa defesa impenetrável — Hines comandava a Marinha mais poderosa do planeta. — Por mais que Montford não confie, temos aviões não tripulados que resolveriam metade dos problemas sem colocar uma vida em risco. Imaginem isso como o maior campo de treinamento já criado. Subjugaríamos o inimigo quase que instantaneamente. Acho até capaz de eles terem menos baixas que antes. Salvaríamos vidas em ambos os lados. — Não precisaríamos de GPS para isso? — levantou uma interessante questão, o Ministro inglês. — Agora temos uma máquina capaz de colocar qualquer coisa em órbita, num piscar de olhos — General Foster disse brincando, mas para sua surpresa, Nicolas concordou. — Posso programar o computador para isso — falou confiante. Toda parte computacional da máquina foi desenvolvida por Nicolas. Seu programa controlava os sensores, válvulas de injeção, sistema de trava quântica e tudo mais. Era sua verdadeira contribuição na Operação. Isso apenas porque Paolo detestava programar. — Bem, na pior das hipóteses, se a Operação não funcionar, pelo menos só com a patente de um método para colocar satélites em órbita, sem queimar milhares de dólares em combustível, já nos renderia milhões. Poderíamos até levar turistas à Lua! — E poderíamos mesmo, senhor Moulin! — disse Nicolas, com orgulho. — Nas devidas proporções, até montar uma rede de tele transportes, como sugeriu o Ministro Breton. Mas isso é apenas a ponta do iceberg, comparado com o que vamos atingir com o sucesso da Operação. Eu tenho absoluta certeza de que vamos conseguir! — No que depender de moi, o orçamento desta folha está mais que aprovado! — entusiasmou-se o Ministro Francês, dando um peteleco no papel que segurava. — Eu não tenho o que discordar. Os senhores terão sempre nosso apoio e suporte no território suíço — para todos os efeitos, Henri Moulin era quem menos se expunha, pois não precisava desviar rios de dinheiro como os Ministros. Bastava manter todos os testes em sigilo, sob o véu da Segurança Nacional. — Estamos em ano de Olimpíadas. Milhões a mais ou a menos não farão falta no tesouro da Rainha — desta vez foi o Ministro Stone quem ganhou um olhar reprovador do 15 General Montford. — He he he... Estou brincando, claro! Este investimento terá um retorno gordo suficiente para mandar reformar mil Palácios de Buckingham. — Estando todos de acordo, marcarei uma reunião em meu gabinete, com Foster e Hines. Vamos oficializar a Operação como uma grande, porém trivial, missão de treinamento. As duas coisas vão correr em paralelo a partir de agora. Enquanto montamos a equipe e planejamos as estratégias, os senhores seguem com o desenvolvimento da máquina — Montford disse isso apontando para os cientistas. — Voltaremos a nos encontrar para alinhar as coisas. O General levantou-se e pegou o interfone do escritório. Teclou alguma coisa, esperou um momento e disse: — Maggie, por favor, peça para trazerem o Champagne — e desligou. — Senhores, daqui a dois anos estaremos chutando traseiros Nazistas. Alguém bateu na porta do escritório. Era a senhora Montford, trazendo ela mesma um carrinho com um balde de prata e algumas garrafas no gelo. O General reclamou com a mulher, dizendo que pagava os empregados para que ela não precisasse fazer nenhum trabalho. Mas, talvez pelo tédio do ócio diário, Maggie aproveitava qualquer oportunidade para sentir-se útil. — Eles estão lá fora, arrumando a churrasqueira, Oswald — inventou uma desculpa. Foram todos para o jardim, onde havia uma grande churrasqueira, tipicamente americana, com hambúrgueres prontos para serem assados, pães cortados, alfaces, queijos, temperos e molhos para todos os gostos. — Tem aquele molho que você gosta! — Maggie paparicou Paolo. Oswald Montford gostava de cozinhar, quando isso envolvia apenas jogar a carne na grelha e esperar assar. Mas se divertia assim mesmo. Ainda que tivesse ajuda dos empregados para servir os convidados, ele apreciava manter algumas coisas simples, como nos tempos em que a vida era mais modesta. Comeram, beberam, contaram piadas. Logo dois grupos separaram-se por assunto. Montford, os Ministros e o suíço discutiam o orçamento e as estratégias da Operação. Foster, Hines e os cientistas conversavam sobre filmes de ficção-científica e minúcias do funcionamento da máquina. — Mas não é que ele tinha razão? Tudo que fomos descobrindo batia com o que postou naquele fórum. Poupou-nos tempo com deduções sobre o que estava acontecendo com a máquina — lembrou Paolo. — Então o Viajante Zero não era apenas mais um nerd pregando uma peça em idiotas da internet, não é Hines? — Foster alfinetou o Almirante. — Mas você também acredita em tudo o que lê na Internet, General. Parece o Paolo que vive querendo convencer os outros cientistas do CERN sobre a nova teoria conspiratória do momento. Nem parece um Ph.D em Física Quântica — Nicolas riu, debochando do colega. 16 — Depois dessa, eu vou até ao banheiro. Com a ausência do cientista, Foster aproveitou para dar conselhos a Paolo. — Não deixe que o trate assim. Nem que comande as coisas ou tome decisões sozinho na Operação. Você tem tanta, senão mais, importância que ele. Aqui ele não é o seu chefe, lembre-se disso. Ele te deu um emprego, mas você deu a ele uma chance de entrar para a história. Você é muito ingênuo, vou te passar o telefone dos meus filhos que moram na França. Quando voltar para a Europa e tirar umas férias, marque de sair com eles. Precisa conhecer gente nova, namorar umas francesas, elas são sensacionais, eu sei muito bem disso — Foster fora casado com uma modelo francesa durante 25 anos. — Eles vão te ensinar como se divertir de verdade, e não ficar trancado no laboratório. — Sobre o que estão falando? — voltava Nicolas. — De mulheres, francesas... — Hines respondeu com um sorriso sarcástico. Enquanto isso no outro lado do jardim, Montford estava confortável em uma espreguiçadeira, bebendo um uísque e falando aos Ministros. — Não se preocupem, o financiamento continuará entrando. Permaneçam com a boca fechada e o dinheiro continuará sendo pago. Nos próximos anos precisaremos colocar mais pressão nos dois. E vocês já sabem onde atacar. Quanto a você Moulin, continue ocultando os relatórios, silenciando quem precisa ser silenciado, e todos nós ficaremos tão ricos que nem a décima geração conseguirá gastar tanto dinheiro. É possível que aconteçam mudanças drásticas na estratégia da Operação. Se formos usar um destacamento tão grande, pode ser necessário maquiar mais as coisas. Isso acabará envolvendo mais gente da OTAN e precisarei de um motivo para não envolver os Alemães. Ao cair da tarde, Nicolas, o suíço e os Ministros já se despediam, pois tinham o voo marcado para noite. Foster e Hines, apesar de americanos moravam no sul do país, então também estavam de saída. Paolo ainda ficaria pela cidade de Boston, pois faria uma visita ao seu tio que tinha um apartamento pela região, mas resolveu não abusar da hospitalidade do casal e acompanhou o grupo na saída. Montford despediu-se dos colegas lembrando que, se o protocolo não fosse quebrado, daqui a seis meses receberiam a indicação de onde seria o próximo encontro. — Foi uma tarde agradável, Maggie. O almoço estava ótimo, como só você sabe organizar. Vou ao escritório fazer uma ligação e já venho — Montford deu um abraço e um carinhoso beijo na testa da esposa. Entrou no escritório, trancou a porta, e sentou-se em sua poltrona preferida da escrivaninha. O telão ainda exibia um dos slides da apresentação dos cientistas, a qual Montford ainda faria uma revisão. Pegou o telefone e discou um número, mas ninguém atendeu. Apenas ouviu um sinal e desligou. 17 Esperou alguns segundos encarando o aparelho, como se aguardasse uma resposta. Então seu telefone tocou. — Satisfação em falar novamente com o senhor. Sim, dessa vez parece que eles conseguiram. Ainda vai demorar um pouco, senhor. Eu sei, o tempo é precioso, mas eles já estão trabalhando na máquina, e prometeram que em dois anos teremos condições. Não senhor, é que eu nunca me sinto confortável quando diz que tem olhos e ouvidos em todo lugar. Vamos mudar um pouco os planos. Não, o escopo principal da Operação ainda é a prioridade. Eles nos prometeram ampliar a capacidade, vamos poder levar um contingente maior, mais equipamento. Isso dará mais segurança para realizar a missão primária. Sim, provavelmente teremos que envolver a OTAN. Sim, podemos cuidar disso. Fique tranquilo senhor, vamos trazê-los em segurança. Vamos achar todos eles. 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 Contato: Site: www.carlosmoffatt.com.br Email: [email protected] /autor.carlosmoffatt @carlosmoffatt /carlosmoffatt Capa: Carlos Moffatt É proibida a reprodução, total ou parcial, do conteúdo sem prévia autorização do autor da obra. Conteúdo exclusivo do site www.carlosmoffatt.com.br versão 20150527.0033 29