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ESTADOS UNIDOS E AMÉRICA LATINA: POLÍTICA EXTERNA E IMPERIALISMO
ESTADOS UNIDOS E AMÉRICA LATINA: POLÍTICA EXTERNA E IMPERIALISMO
INTRODUÇÃO
O imperialismo norte-americano não é o mesmo imperialismo europeu baseado no
colonialismo e na conquista física e direta de territórios. Os Estados Unidos, pelo contrário,
repudiam a idéia de colonização, mas exercem seu imperialismo através de meios indiretos
de dominação.
Se em termos globais o avanço da influência dos Estados Unidos ocorreu apenas
após a 2ª Guerra Mundial, para a América Latina as políticas visavam à soberania do país no
continente desde o início do século XIX. Os Estados Unidos estabelecem sua hegemonia
através de assistências militares, econômicas e ideológicas, propagando sua cultura e estilo
de vida e garantindo que seus interesses sejam prioridade em nações alheias.
Logo, para compreender de que forma o imperialismo norte-americano aplica-se na
América Latina é preciso entender as políticas dirigidas à mesma pelos EUA e a forma desse
país enxergar a região.
A DOUTRINA MONROE DE 1823
No início do século XIX deu-se na América Latina o processo de independência das
antigas colônias ibéricas, processo que durou de 1808 a 1826 facilitado e impulsionado
pelo menor controle europeu no continente devido a seus problemas internos (expansão
napoleônica).
Nesse período a grande preocupação dos Estados Unidos era manter-se distante da
Europa, o que significava preservar-se das influências e interferências européias,
diferenciando-se dela e, ao mesmo tempo, garantir as condições para a manutenção,
consolidação e aprofundamento de seu modo de vida, baseado no governo republicano,
instaurado desde a indepencência em 1776.
Segundo Cristina Pecequilo (2005, p. 67),
A adoção da república como forma de governo criou uma afinidade natural
entre os Estados Unidos e os países latino-americanos, sustentada pelo
princípio da democracia e da liberdade – ser republicano era ser
americano e tal sistema deveria ser preservado, permitindo-se que seu
desenvolvimento ocorresse sem qualquer interferência dos poderes
externos.
Visando, portanto, garantir os governos republicanos instaurados no continente,
temendo as intenções espanholas de reverter o processo de independência, os Estados
Unidos lançaram a Doutrina Monroe fixando limites à intervenção das potências européias
na região.
Com a Doutrina Monroe os Estados Unidos apresentavam sua posição para o
continente americano, apresentando os principais temas que norteariam sua política para o
mesmo ao longo da história. São esses temas:
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1. A garantia da autonomia e a separação definitiva entre os sistemas europeu e
americano.
2. A distância e a diferenciação entre o Novo e Velho Mundo, com valores,
percepções e ordens políticas, sociais e econômicas distintas, compartilhadas
pelo hemisfério e provenientes dos Estados Unidos; reconhecimento da
separação de destinos, regimes políticos e interesses nacionais.
3. A “América para os americanos”.
4. A definição da centralidade e da importância dos Estados Unidos na região.
O COROLÁRIO ROOSEVELT DE 1904 E A POLÍTICA DO BIG STICK
No início do século XX uma reinterpretação da Doutrina Monroe intensificou as
ações norte-americanas para a América Latina. O Corolário Roosevelt de 1904, também
conhecido como a política do big stick, assegurava aos Estados Unidos o direito de
intervenção e interferência nos assuntos internos dos países do continente. Tal direito seria
exercido quando uma nação comprovasse ser incapaz de conduzir sua política de forma
responsável, ameaçando a estabilidade do hemisfério – sob o ponto de vista dos Estados
Unidos, é claro.
A política do big stick promoveu uma série de intervenções em países da América
Central e Caribe, destacando-se, dentre elas: a assinatura da Emenda Platt que estabeleceu
aos Estados Unidos a tutela sobre Cuba e a autorização para a instalação de uma base
militar em Guantánamo; o apoio ao Panamá em sua insurreição separatista em relação à
Colômbia culminando na formação de um novo estado e a cessão do controle da zona do
canal aos Estados Unidos; e o desembarque de tropas na República Dominicana, em que os
Estados Unidos assumem a administração das aduanas com o objetivo de garantir o
pagamento da dívida externa.
A POLÍTICA DE BOA VIZINHANÇA NA DÉCADA DE 1930
A Política de Boa Vizinhança (PBV), aplicada por Franklin Roosevelt, mudou as bases
do relacionamento hemisférico, visando à exclusão das ameaças externas e à estabilidade
doméstica através da cooperação e não de coerção. Politicamente os dois princípios
fundamentais da PBV eram o reconhecimento da soberania nacional dos países da América
Latina e a promoção de uma política de não-interferência e não-intervenção norte-americana.
Na economia, eram prioridades a promoção do comércio continental, em meio a um cenário
internacional que se fechava.
Oficialmente essa política consistia em investimentos e venda de tecnologia norteamericana para os países latino-americanos, mas em troca, estes deviam dar apoio a política
norte-americana. Ela consistia, no entanto, de um esforço para aproximação cultural entre
EUA e América Latina, cujas relações vinham se deteriorando devido ao forte
intervencionismo norte-americano durante a política do "Big Stick", lançada por Theodore
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Roosevelt em 1901. Ela foi praticada em diversas frentes, sendo centrais o cinema e o rádio
(o Zé carioca, por exemplo, foi criado nesse período), sendo que se manifestava tanto nos
EUA como na América Latina. Porém, ela nunca foi simétrica: enquanto na América Latina
propagavam-se as qualidades da cultura norte-americana, como os valores democráticos e o
industrialismo, nos EUA caracterizava-se a cultura Latina pelas belezas naturais e o exotismo.
DOUTRINA TRUMAN, 1945
Com o fim da Segunda Guerra Mundial os Estados Unidos foram beneficiados mais
do que qualquer outro país, tornando-se o centro do sistema internacional, devido à
devastação das antigas potências européias. A Doutrina Truman foi lançada através de um
discurso do presidente ao Congresso, em março de 1947, no qual defendeu a lógica de que
as nações teriam de escolher entre dois estilos de vida, um livre (capitalista, representado
pelos Estados Unidos) e outro opressor (comunista, representado pela União Soviética).
Apesar do discurso da defesa do mundo livre, o objetivo principal dos Estados Unidos no
período a concentração dos esforços norte-americanos na Europa, considerada a região
mais sensível à atração soviética.
A REVOLUÇÃO CUBANA E A REAÇÃO NORTE-AMERICANA NOS ANOS 1960
De 1945 a 1959 a preocupação norte-americana para a América Latina era mínima.
Os Estados Unidos entendiam os países latinos como diretamente alinhados e, portanto, não
precisavam de atenção específica.
A Revolução Cubana deixou claro que a negligência norte-americana para a região
poderia ter pesadas conseqüências contra sua hegemonia. Cuba surgia como uma ameaça
dentro da região entendida como de menor risco e poderia servir de exemplo àqueles países
que ansiavam por uma reforma econômica e de política interna, aspirando a uma melhor
vida para as massas e à capacidade de determinar seu próprio destino. Segundo Túlio
Halperin Donghi (1975), a revolução cubana transformou os problemas sócio-econômicos
latino-americanos em problemas políticos e teve como consequência mais óbvia o
surgimento de movimentos que tentariam seguir seu exemplo.
Em resposta à ameaça cubana, o governo Kennedy lançou em março de 1961 a
Aliança para o Progresso (Alpro), reorientando a política norte-americana de forma atraente
à América Latina, ao propor um acordo de cooperação e de desenvolvimento, através do
qual os Estados Unidos se comprometeriam a promover e trabalhar junto com os países da
América Latina para atingir metas de progresso e reestruturação social, política e
econômica. A Alpro levou a um aumento imediato e substancial na ajuda para a América
Latina, entretanto, seus resultados não foram satisfatórios, tornando viáveis outras
alternativas para a defesa da região.
Conjuntamente à Aliança para o Progresso, a administração Kennedy desenvolveu
uma política de defesa com a expansão dos gastos militares e a reestruturação das Forças
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Armadas, modificando os programas de treinamento, enfatizando nas medidas de contrainsurgência e fortalecendo as forças defensivas de cada país para enfrentar inimigos
internos. Após o assassinato de Kennedy, a Aliança para o Progresso perdeu seu principal
defensor. No governo Johnson, sucessor de Kennedy, os Estados Unidos se envolveram cada
vez mais no conflito do Vietnã, diminuindo a importância da América Latina em sua política. A
nova orientação da política externa para o continente voltou-se para uma postura neutra em
relação ao caráter ditatorial ou democrático dos regimes políticos da região, privilegiando os
interesses norteCARTER E OS DIREITOS HUMANOS
O padrão baseado em apoios a regimes “amigos” dos Estados Unidos (isto é, não
comunistas), com a interferências e ações periódicas limitadas, foi abandonado por completo
no governo Carter. Embora seu governo tenha sido marcado pelo uso da diplomacia para
garantir a paz mundial, diminuindo o tom beligerante da Guerra Fria, e pela prioridade dada a
questões sociais, Carter adquiriu reputação de parcimônia e indecisão - características que
não foram bem recebidas pelo eleitorado americano.
REAGAN E A RETOMADA DA CONTRA-INSURGÊNCIA
Criticando Carter por sua complacência com o avanço dos regimes hostis aos
Estados Unidos na região (especialmente na América Central e no Caribe), e pelo
afastamento de antigos aliados tradicionais pelas pressões dos direitos humanos e da
democracia, Reagan promoveu uma total reformulação na política externa para a região,
retomando a luta intensa contra o comunismo.
Sustentada pelos princípios da Doutrina Reagan, a presidência apoiou abertamente
os movimentos contra-revolucionários envolvidos nas lutas de libertação nacional. Segundo
as avaliações da presidência Reagan, os Estados Unidos haviam aberto mão de suas
posições nas Américas durante a Guerra Fria e havia chegado a hora de recuperá-las. De
acordo com as recomendações do Comitê de Santa Fé, era preciso promover uma
revitalização da Doutrina Monroe, reforçando e estabelecendo novos acordos de segurança
e militares na região.
A Nicarágua é o exemplo mais significativo da Doutrina Reagan e seu apoio aos
movimentos contra-revolucionários na América Central. Mesmo com um baixo apoio do
Congresso, Reagan forneceu intensa ajuda financeira e militar ao movimento contrarevolucionário. Para o governo de Reagan, assim como tradicionalmente na mentalidade
política dos EUA, a América Latina devia ser entendida como uma linha de dominós
enfileirados, onde a queda de uma peça poderia significar a reação em cadeia de toda a
região, por isso nenhuma área deveria sair do controle norte-americano.
Em 1979, a Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN) conseguiu, através da
revolução armada, retirar do poder o governo da família Somoza, aliada dos EUA e que
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governava o país desde a década de 1920. No poder os sandinistas declararam-se não
alinhados e recorreram a créditos de qualquer governo, sendo que, em 1984, 20% desse
provinha da URSS enquanto o resto era fornecido por países latino-americanos. Devido ao
caráter revolucionário do movimento, Reagan se opunha a sua manutenção no país e
acreditava que a política de Carter fora culpada pela perda da Nicarágua na zona de
influência norte-americana.
PÓS-GUERRA FRIA
Atualmente, a maior ameaça à segurança [na América Latina para os Estados
Unidos] vem do crime organizado e principalmente do tráfico de drogas. As drogas são
identificadas como uma fonte de promoção do crime e do terrorismo internacional. Desde os
anos 80, os Estados Unidos enviam não somente recursos, mas também tropas para ajudar
os países mais afetados, avaliando seu progresso pela política de certificação criada pelo
Congresso norte-americano em 1986. Tal política avalia os países latino-americanos e sua
performance contra as drogas, retirando a ajuda dos que não tiveram um desempenho
satisfatório. A certificação e a política adotada para combater as drogas são criticadas
diretamente pela América Latina por atuarem somente na oferta e por repetirem um padrão
de ação unilateral norte-americano. No que se refere à agenda de segurança, as maiores
preocupações são norte-americanas, tentando impedir os fluxos Sul-Norte de drogas,
imigração, ameaças ambientais, entre outros.
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