Litiase Urinaria

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Litiase Urinaria
CAPITULO
6
Litíase Urinária
Nelson Rodrigues Netto Jr.
A urolitíase é uma das doenças mais freqüentes
do trato urinário, cuja existência há sete mil anos foi
documentada por meio de estudos antropológicos que
revelaram a presença de cálculos em múmias egípcias.
Dados japoneses recentes indicam que a possibilidade de a população desenvolver cálculo urinário
no decurso da vida é de 5,4%.
EPIDEMIOLOGIA
Os fatores epidemiológicos da urolitíase envolvem raça, sexo, idade, aspectos nutricionais e dietéticos, clima, ocupação profissional e atividade física,
sendo os mais importantes a herança hereditária e os
fatores dietéticos.
Nos Estados Unidos, no período de 1976 a 1980,
foram entrevistados 25.286 indivíduos. Verificou-se
que a prevalência de cálculo renal aumenta com a idade até os 70 anos, diminuindo a seguir, porém mantendo-se mais elevada no homem do que na mulher e
maior nos brancos do que nos negros. Nos hispânicos e asiáticos, a prevalência é intermediária entre
brancos e negros.
O pico máximo ocorre entre os 30 e os 50 anos,
afetando predominantemente o sexo masculino, numa
relação 3:1.
FATORES EXTRÍNSECOS
Geografia
FATORES INTRÍNSECOS
A incidência de urolitíase é maior em regiões
montanhosas e tropicais.
Hereditariedade
O caráter familiar da doença é há muito tempo
conhecido. A predisposição à litíase é decorrente da
alteração poligênica de penetrância variável, de maneira que a gravidade da doença varia de geração para
geração, sendo rara entre negros e índios.
UROLOGIA PRÁTICA
Idade e Sexo
Condições Climáticas
A incidência da litíase está sujeita à variação sazonal; é maior nos meses mais quentes, relacionados
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com o aumento da perspiração e conseqüente aumento da concentração urinária. A temperatura ambiente
e a maior exposição à luz solar constituem variáveis
de risco para a litíase urinária. Assim, nos Estados
Unidos, os estados do Sul têm maior prevalência de
cálculo do que os estados do Norte.
facilmente alcançada com o aumento da ingestão de
água. As Forças Armadas americanas verificaram que
a incidência de calculose renal era de 2,2/1.000 nos
aviadores, em comparação com 1,2/1.000 na população civil. A explicação baseou-se na predisposição
à desidratação que ocorre com os aviadores.
Ingestão Hídrica
Condições Socioeconômicas e Nível de Educação
O aumento da ingestão hídrica com o intuito de
diminuir a ocorrência de urolitíase é uma observação
clínica há muito conhecida. A experiência realizada
em duas cidades vizinhas, em Israel, é um exemplo
clássico. Na cidade A, os habitantes foram instruídos
a ingerir 2.000-3.000ml/dia de água, ao passo que, na
cidade B, o consumo não ultrapassou 1.000ml/dia.
Após um período previamente estabelecido, verificouse que a cidade A apresentou estatisticamente menos
episódios de calculose urinária. Os demais constituintes da dieta foram os mesmos em ambas as populações, assim como não havia diferença climática entre
as cidades.
A calculose urinária é um problema muito sério
em países em desenvolvimento, como na Turquia.
Nesse país, a prevalência de litíase é alta nos indivíduos de baixo nível socioeconômico e menor índice
de educação. Não se verificou diferença entre habitantes da zona urbana e da rural.
Dieta
Durante os períodos em que o consumo de proteína animal esteve reduzido, como durante as duas
guerras mundiais, a incidência de cálculos também
esteve reduzida. A incidência de cálculo vesical endêmico está associada à desnutrição, ao passo que o
cálculo renal é mais freqüente na população de padrão
de vida mais elevado.
Um estudo realizado no Japão mostrou que,
após a Segunda Guerra Mundial, com a mudança do
estilo de vida, a industrialização e a introdução de hábitos ocidentais no país, a prevalência de litíase urinária passou de 53,8/100.000 habitantes em 1965
para 92,5/100.000 em 1985.
Ocupação
Os indivíduos que trabalham em ambientes quentes apresentam maior incidência de urolitíase.
A pesquisa de litíase em trabalhadores mostrou
que aqueles que atuam em ambientes externos têm
prevalência de cálculo cinco vezes maior do que
aqueles que trabalham em locais internos. A desidratação crônica é o principal fator de risco de operários que
atuam em zonas tropicais, e a prevenção pode ser
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Estudos epidemiológicos sugerem que a interação entre os fatores de risco intrínsecos e extrínsecos
resulta na formação de cálculos.
ETIOLOGIA
Embora a nefrolitíase ainda não seja conhecida
na sua totalidade, sabe-se que vários fatores concorrem para a formação das cinco categorias de cálculos
de importância clínica. Como os cálculos ureterais originam-se nos rins e migram para o ureter, entende-se
que sua etiologia seja a mesma da nefrolitíase e, portanto, as duas entidades serão tratadas em conjunto.
CÁLCULOS DE ÁCIDO ÚRICO
Os cálculos de ácido úrico (AcUr) correspondem a 8% dos cálculos observados nos países industrializados. O ácido úrico resulta não só da produção
endógena, mas principalmente de fonte exógena, por
meio da ingestão protéica. Cristais de ácido úrico
podem agir como núcleo para o crescimento de cristais de oxalato de cálcio (epitaxia) ou formar cálculos de ácido úrico puro (Fig. 6.1). Apenas 25% dos
portadores de cálculos de ácido úrico apresentam
gota como enfermidade associada, o que reflete o
aumento da produção endógena de ácido úrico; os
restantes 75% ingerem proteínas em excesso. Muitos dos pacientes com gota formam os cálculos durante o uso de uricosúricos no tratamento da artrite;
entretanto, nem a gota nem a hiperuricemia são condições necessárias para a formação de cálculos de
ácido úrico.
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zindo amônia e alcalinizando a urina (Fig. 6.2). O fator primário da gênese desse tipo de cálculo é a enzima bacteriana urease, que hidrolisa a uréia formando
CO2 e amônia. Os cristais de estruvita começam a se
formar em pH de aproximadamente 7,5, e a precipitação aumenta à medida que aumenta o pH. Assim é
explicada a presença desses cálculos em pacientes
com infecção por bactérias que alcalinizam a urina,
como Proteus, Pseudomonas e Klebsiella.
Fig. 6.1 — Cálculo de ácido úrico.
O ácido úrico é o produto final do metabolismo das
purinas. Nas condições associadas ao aumento do metabolismo das purinas e, conseqüentemente aumento da
produção de ácido úrico, há maior incidência de cálculos de ácido úrico, como nas doenças mieloproliferativas,
ou em tratamento quimioterápico. Esse tipo de cálculo
ocorre mais freqüentemente em judeus e italianos, podendo também ser observado em pacientes com diarréia
crônica, ileostomia e desidratação. De modo geral, surge em situações em que a urina torna-se muito ácida,
favorecendo a precipitação do ácido úrico.
CÁLCULOS DE CISTINA
Os cálculos de cistina ocorrem na cistinúria, alteração hereditária do metabolismo de aminoácidos, com
característica autossômica recessiva. Essa entidade corresponde a 1% de todos os cálculos em nosso serviço.
Nessa condição, existe o transporte anormal da
cistina, ornitina, lisina e arginina no rim e no trato gastrintestinal. A única manifestação clínica dessa anormalidade é a formação de cálculos de cistina, que são
pouco solúveis na urina.
Assim, o paciente portador dessa alteração metabólica, ingerindo uma dieta normal, absorve a metionina, que é transformada em cistina no fígado. A cistina é eliminada pelos rins por filtração glomerular e,
não sendo reabsorvida, atinge concentrações excessivas na urina, o que resulta em cristalização e formação de cálculos.
Fig. 6.2 — Cálculo de estruvita.
O cálculo de estruvita é mais freqüente em mulheres, provavelmente porque são mais suscetíveis à
infecção do trato urinário. A prevalência também é
maior em pacientes com lesão medular e nos portadores de conduto ileal, que em geral mantém a urina
persistentemente infectada. A bactéria mais freqüentemente identificada pertence ao gênero Proteus, e o
cálculo geralmente é do tipo coraliforme. Cálculo coraliforme é aquele que acomete a pelve renal e pelo
menos um grupo calicinal. Denomina-se cálculo coraliforme completo quando ocupa toda a via excretora, ou seja, a pelve e os três grupos calicinais. Caracteriza-se por apresentar, em sua composição, estruvita
e carbonato de cálcio.
O quadro clínico é variado, podendo ser representado pela forma clássica, com dor lombar, febre (infecção urinária) e presença do cálculo, ou silenciosa e insidiosa, com comprometimento da função renal, até ser
estabelecido, finalmente, o diagnóstico do cálculo.
O tratamento, em linhas gerais, visa à extração cirúrgica do cálculo, combate à infecção urinária e, eventualmente, tratamento de algum distúrbio metabólico.
CÁLCULOS DE FOSFATO AMONÍACO MAGNESIANO
(ESTRUVITA)
CÁLCULOS DE OXALATO DE CÁLCIO
E DE FOSFATO DE CÁLCIO
A presença da estruvita indica que houve infecção prévia por bactéria desdobradora de uréia, produ-
Tanto os cálculos de oxalato de cálcio quanto
os de fosfato de cálcio são, basicamente, decor-
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rentes de alterações do metabolismo do cálcio e,
portanto, serão analisados em conjunto. Estes cálculos acometem o trato urinário superior e são os
que mais freqüentemente ocorrem nos Estados
Unidos e no Brasil.
O termo hipercalciúria idiopática foi usado
para definir a associação de cálculos de cálcio recorrentes com hipercalciúria de etiologia desconhecida.
A hipercalciúria pode ser classificada em três tipos: absortiva, renal e reabsortiva.
Hipercalciúria Reabsortiva
Hipercalciúria Absortiva
A hipercalciúria absortiva ocorre pelo aumento da
absorção intestinal de cálcio, e é a forma mais freqüente
da hipercalciúria. Em decorrência disso, aumenta o cálcio sangüíneo e, conseqüentemente, o aporte de cálcio
ao túbulo renal, determinando a supressão da função da
paratireóide. A hipercalciúria é decorrente do aumento
da filtração renal de cálcio, mas com diminuição da reabsorção tubular do cálcio decorrente da supressão da função paratireóidea. O excesso de eliminação urinária de
cálcio é compensado pela maior absorção intestinal, o
que permite manter o cálcio sangüíneo dentro de níveis
normais (Fig. 6.4)
A hipercalciúria reabsortiva é caracterizada pelo
hiperparatireoidismo primário. A alteração básica é a
produção excessiva de hormônio (PTH) pelas paratireóides, o que condiciona o aumento da reabsorção
óssea (atividade osteoclástica); como produto final,
ocorre o aumento do cálcio no plasma sangüíneo (hipercalcemia) e na urina (hipercalciúria). Apesar de
haver aumento da reabsorção do cálcio pelo túbulo
renal, não é possível a compensação do excesso de
cálcio que chega ao túbulo renal, culminando com a
elevada eliminação urinária de cálcio (Fig. 6.3).
Fig. 6.4 —Representação esquemática da hipercalciúria absortiva.
Hipercalciúria Absortiva Tipo I
O cálcio urinário encontra-se elevado durante
todo o exame laboratorial.
Hipercalciúria Absortiva Tipo II
Fig. 6.3 — Representação esquemática da hipercalciúria reabsortiva.
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O cálcio urinário encontra-se elevado somente na fase de sobrecarga de cálcio do exame laboratorial.
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LITÍASE URINÁRIA
Hipercalciúria Renal
PATOLOGIA
Na hipercalciúria renal, detecta-se defeito primário no rim, havendo deficiência na reabsorção tubular
de cálcio. A redução da concentração do cálcio sangüíneo estimula a paratireóide. A hiperatividade da paratireóide mobiliza o cálcio dos ossos e aumenta a absorção intestinal de cálcio devido ao excesso de hormônio
da paratireóide (PTH). Ao contrário do hiperparatireoidismo primário, no hiperparatireoidismo secundário o
cálcio sangüíneo é normal (Fig. 6.5).
As alterações patológicas causadas pela urolitíase
são decorrentes da obstrução e da infecção urinária. De
acordo com o tamanho e a localização do cálculo no trato urinário, as lesões decorrentes podem até causar a
destruição do rim. Assim, pequenos cálculos situados na
junção pieloureteral ou no ureter podem causar obstrução urinária. Como conseqüência, e de maneira progressiva, desenvolve-se lesão do parênquima renal (Fig. 6.6).
O comportamento do cálcio é variável de acordo com o tipo de hipercalciúria (Tabela 6.1)
A estase, outra complicação da urolitíase, geralmente leva à infecção urinária secundária quando o
cálculo causa obstrução do trato urinário.
Fig. 6.6 — Hidronefrose.
QUADRO CLÍNICO
Sintomas
Fig. 6.5 —Representação esquemática da hipercalciúria renal.
Os cálculos pequenos, localizados nos cálices e raramente produzindo obstrução, são geralmente assintomáticos. Por outro lado, os cálculos que causam obstrução, quer dos cálices, quer da junção pieloureteral, geralmente se manifestam por dor lombar secundária à
distensão, tanto do parênquima como da cápsula renal.
As cólicas ocorrem secundariamente ao hiperperistaltismo e ao espasmo da musculatura lisa dos cálices e dos
Tabela 6.1
Mecanismo do cálcio na hipercalciúria
Cálcio
Hipercalciúria
reabsortiva
Hipercalciúria
absortiva
Hipercalciúria
Sangue
+
n
n
Urina
+
+
+
Absorção intestinal
n
+
+
Mobilização óssea
+
n
+
renal
n, normal; +, aumentado.
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bacinetes. Esse quadro pode ser acompanhado de náuseas e vômitos, distensão abdominal devido a íleo paralítico, hematúria macroscópica e febre com calafrios, no
caso de haver infecção associada.
Ao contrário dos cálculos metabólicos, os cálculos infecciosos, como são os cálculos coraliformes,
podem não apresentar sintomatologia dolorosa. Cálculo coraliforme é aquele que ocupa toda a pelve renal e
pelo menos um grupo calicinal. Quando situado na
pelve renal e nos três grupos calicinais, denomina-se
coraliforme completo ou de grau III (Fig. 6.7).
EXAMES SUBSIDIÁRIOS
O paciente portador de cólica renal, ao ser atendido em caráter de urgência, deve realizar os seguintes exames:
Urina
Proteinúria discreta, devido à hematúria, às vezes
macroscópica, acompanha a maioria dos casos. O pH
da urina, quando maior que 7,6, sugere infecção por
bactérias que desdobram a uréia, numa evidência de
que o cálculo pode ser de fosfato amoníaco magnesiano. O exame do sedimento pode revelar leucocitúria,
hematúria, bacteriúria e cristalúria, e o tipo de cristal
encontrado pode ser indicativo do tipo de cálculo.
Radiografia Simples do Abdome
O exame radiológico, sem o uso de contraste, demonstra cerca de 90% dos cálculos renais (Fig. 6.8).
Os 10% restantes incluem os casos de cálculos radiotransparentes e os cálculos não demonstráveis, por serem muito pequenos (menos de 2mm de diâmetro) ou
estarem sobrepostos a estruturas ósseas.
Fig. 6.7 — Cálculo coraliforme completo bilateral.
O quadro clínico pode manifestar-se por bacteriúria persistente ou recorrente, geralmente associada
a sintomas de cistite ou, muitas vezes, totalmente assintomático.
O cálculo do ureter tem sintomatologia dependente da localização. Quando no terço superior do
ureter, a dor irradia-se para o testículo homolateral, e
à medida que se aproxima da bexiga, a dor é irradiada para o escroto e a uretra nos homens e para a vulva e a uretra nas mulheres. Esse achado clínico é decorrente da inervação comum desses órgãos.
Sinais
O paciente com cólica renal geralmente se apresenta
ansioso e inquieto, devido à dor intensa, diferindo, portanto, do paciente com irritação peritoneal. O sinal de
percussão do punho lombar (sinal de Giordano) é positivo em decorrência da distensão da cápsula renal.
O testículo homolateral pode encontrar-se “hipersensível” se o cálculo estiver no terço superior do ureter, podendo haver também hiperestesia da bolsa escrotal, quando localizado no terço inferior. Além disso, a
distensão abdominal, com diminuição do peristaltismo
intestinal, geralmente acompanha a cólica renal.
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Fig. 6.8 — Radiografia simples: cálculo renal.
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LITÍASE URINÁRIA
A radiodensidade dos cálculos varia de acordo com
sua composição. Assim, os cálculos mais radiodensos
são os de fosfato de cálcio, que têm densidade semelhante à do osso, seguidos dos cálculos de oxalato de
cálcio. Os cálculos de fosfato amoníaco magnesiano, por
sua vez, são menos radiodensos que os cálculos de cálcio. Os cálculos de cistina são parcialmente radiodensos,
e os de ácido úrico, radiotransparentes (Tabela 6.2).
Tabela 6.2
Composição química e aspecto radiológico do cálculo
Composição
Radiopacidade
Fosfato de cálcio
Muito radiopaco
Oxalato de cálcio
Radiopaco
Fosfato amoníaco magnesiano
Moderadamente radiopaco
Cistina
Levemente radiopaco
Ácido úrico
Radiotransparente
Fig. 6.9 — Ultra-sonografia: cálculo piélico.
No diagnóstico diferencial dos cálculos radiopacos,
incluem-se os gânglios mesentéricos calcificados, os flebólitos, os cálculos biliares, as calcificações de cartilagens
costais e os comprimidos no trato intestinal.
Exceto no caso dos cálculos coraliformes, facilmente identificáveis por sua morfologia característica, a radiografia simples oferece um diagnóstico presuntivo, que necessita ser confirmado pela urografia
excretora.
fisiológico”. A obstrução é parcial na maioria das vezes,
geralmente acompanhada de dilatação a montante, que
varia de acordo com o tempo e grau de oclusão da via
excretora. Durante a gestação, a sintomatologia da litíase
é geralmente atípica, e a investigação deve ser feita por
meio da urografia simplificada. Tal procedimento consiste em uma radiografia simples e outra exposição 20 minutos após a injeção do contraste endovenoso, protegendo com isso o feto da ação dos raios X.
Quando o cálculo for radiotransparente, como
os de ácido úrico, a urografia excretora revela falhas de enchimento na via excretora, o que eventualmente pode simular processos neoplásicos.
Ultra-sonografia
CONDUTA NOS CÁLCULOS
RECIDIVANTES
A ultra-sonografia permite avaliar o tamanho e a
localização do cálculo, assim como a presença de dilatação da via excretora e a espessura do parênquima
renal. Está indicada também nos pacientes com alergia ao contraste iodado e na gestação (Fig. 6.9).
Os pacientes que apresentam o primeiro cálculo
urinário são medicados e acompanhados até a eliminação do cálculo. A partir do segundo episódio, todos
os pacientes devem ser estudados mediante um perfil
metabólico e análise do cálculo.
Urografia Excretora
PERFIL METABÓLICO
Geralmente, a urografia excretora não é solicitada
na fase de urgência. Esse exame permite o diagnóstico
do cálculo, a localização e o grau de dilatação do trato
urinário. A indicação da urografia excretora pressupõe
que a função renal esteja preservada.
O perfil metabólico realizado nos casos de rotina
consiste na dosagem dos seguintes elementos: urina de
24 horas: cálcio, fósforo, ácido úrico e citrato; plasma
sangüíneo: cálcio, fósforo, ácido úrico, magnésio, sódio, potássio, creatinina; urina: sedimento quantitativo
e cultura quantitativa com eventual antibiograma.
A primeira indicação da presença de cálculo é o retardo na excreção do contraste, devido à obstrução do trato urinário causada pelo cálculo. Os locais mais freqüentes de obstrução encontram-se na junção pieloureteral, no
ureter no nível do cruzamento dos vasos ilíacos ou na
junção ureterovesical, que são os pontos de “estreitamento
UROLOGIA PRÁTICA
ANÁLISE DO CÁLCULO
A análise do cálculo é importante no diagnóstico
etiológico e na profilaxia. A simples análise qualitativa,
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identificando apenas os radicais e íons presentes no
cálculo, pode ser feita na maioria dos hospitais.
TRATAMENTO
A cristalografia permite a análise dos diversos componentes do cálculo, individualizando o núcleo e os elementos periféricos do cálculo. Dessa forma, indica a composição qualitativa e quantitativa dos cálculos (Fig. 6.10).
Analisaremos separadamente o tratamento clínico
e o tratamento cirúrgico. O tratamento clínico, em particular, abrange aspectos gerais imediatos e aspectos específicos que variam de acordo com o tipo de cálculo.
TRATAMENTO CLÍNICO DA UROLITÍASE
Medidas Gerais: Tratamento da Cólica Renal
Fig. 6.10 — Cristalografia.
DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS
Dentre as entidades que podem mimetizar a urolitíase, destacam-se as seguintes:
TUMOR RENAL
O tumor renal pode simular a urolitíase principalmente quando um coágulo obstrui o ureter, causando
a sintomatologia característica de cólica renal. A urografia excretora permite a diferenciação entre as duas
entidades.
Os tumores da pelve renal ou dos cálices podem
causar cólica renal e hematúria, e a urografia excretora
pode, nesses casos, evidenciar falhas de enchimento no
sistema coletor, devendo ser diferenciadas dos cálculos radiotransparentes. Nesses casos, a citologia oncótica do sedimento urinário pode auxiliar no diagnóstico
diferencial.
PIELONEFRITE AGUDA
A pielonefrite aguda pode simular cálculo localizado na junção pieloureteral, principalmente quando o
quadro se iniciar por dor lombar de forte intensidade.
A presença de leucócitos e bactérias na urina pode ocorrer nos cálculos com infecção secundária. A urografia
excretora possibilita o diagnóstico diferencial.
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O primeiro passo é o combate à dor, que geralmente é de forte intensidade. A dor decorrente da obstrução aguda da via excretora urinária é conhecida
como cólica renal ou cólica nefrética ou cólica néfrica.
A obstrução aguda da via excretora determina a súbita
elevação da pressão intraluminar a montante do local
da obstrução. Em decorrência dessa hiperpressão, há
distensão do bacinete e da cápsula renal, que, através
dos nervos esplâncnicos e do plexo celíaco, estimula o
sistema nervoso central, causando a dor. Esta localizase no ângulo costovertebral, com irradiação pela parede anterior do abdome, área de distribuição dos 11o e
12o nervos torácicos e primeiro lombar.
Utilizam-se nessa fase os analgésicos e antiespasmódicos por via endovenosa, podendo-se, eventualmente, utilizar opiáceos quando não há resposta à terapia
inicial. Nesses casos, utilizam-se 10-15mg de sulfato de
morfina ou 50-100mg de meperidina por via intramuscular. Drogas antiinflamatórias não-hormonais são ministradas com o intuito de diminuir o edema ao redor da
obstrução, além de inibir a síntese de prostaglandina e,
conseqüentemente, a redução da produção da urina.
Além de analgesia, a hidratação do paciente, quer
por via oral quer endovenosa, deve ser introduzida com
o intuito de promover a diurese através do local da obstrução e, assim, induzir a eliminação do cálculo. Não se
recomenda hiper-hidratação, pois acarreta maior distensão da via excretora e aumento da dor (Fig. 6.11).
Como cerca de 80% dos cálculos são eliminados
espontaneamente, é importante orientar o paciente no
sentido de recuperar o cálculo quando eliminado, para
posterior análise.
O tratamento está indicado quando a infecção
urinária tem repercussão clínica. A infecção causada
por bactérias que desdobram a uréia é responsável
pela formação de cálculos de fosfato amoníaco magnesiano. A antibioticoterapia isolada não é eficaz, sendo preciso extração cirúrgica do cálculo.
O tratamento clínico conservador está indicado
nas seguintes situações: cálculos assintomáticos loca-
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LITÍASE URINÁRIA
sos em que a hiperuricemia se mantém apesar dessas medidas, está indicado o uso de alopurinol na
dose de 300-600mg ao dia. As reações adversas à
droga são alérgicas e hematológicas.
Cálculos de Cistina
A solubilidade da cistina, como a do ácido úrico,
aumenta em pH alcalino. A excreção urinária normal
é de 400mg/dia.
Algumas medidas são recomendáveis, a saber:
• Realizar o tratamento pelo aumento do débito urinário, até três litros por dia, com o objetivo de aumentar sua solubilidade.
Fig. 6.11 — Fisiopatologia da cólica renal.
• Reduzir o maior precursor de cistina, a metionina, cuja fonte principal é a carne. Entretanto, a
dieta apresenta resultados insatisfatórios.
lizados nos cálices; cálculos ureterais com diâmetro
menor que 5mm, pois geralmente são eliminados espontaneamente; cálculos coraliformes em pacientes
de alto risco cirúrgico.
Cálculos de Ácido Úrico
O ácido úrico é encontrado na urina sob duas formas: uma pouco solúvel, constituída pelo ácido livre
(AcUr), e uma formada de sal (urato), 20 vezes mais
solúvel. Os valores normais da uricosúria de 24 horas
variam de 0,25g a 0,75g; os valores normais da uricemia variam de 2,6mg/dl a 6,8mg/dl no sexo masculino
e de 2,0mg/dl a 6,3mg/dl no sexo feminino.
O pka do ácido úrico, isto é, o ponto em que
50% encontram-se na forma ionizada (urato), corresponde ao pH 5,75. Assim, a produção de urina
com pH abaixo de 5,75 contribui para aumentar a
concentração da forma menos solúvel do ácido úrico. Por outro lado, à medida que o pH aumenta, eleva-se a quantidade de ácido úrico e de uratos em
suspensão na urina. As medidas terapêuticas são
três: 1) aumentar a ingestão hídrica com conseqüente diluição do ácido úrico na urina. Dieta restrita em
purinas (pobre em carnes, grãos e álcool); 2) alcalinizar a urina (pH entre 6,5 e 7,0). Pode-se utilizar
nessa fase o bicarbonato de sódio, 650mg, três ou
quatro vezes ao dia, ou citrato de potássio, 2-6g, em
duas a três tomadas ao longo do dia. A preferência
é pelo citrato, que é um antiagregante, além de ser
um agente alcalinizante. O bicarbonato de sódio
pode causar edema ou hipertensão arterial; 3) diminuir a excreção de ácido úrico urinário. A dieta pobre em proteínas e purinas, associada às medidas
anteriores, geralmente é suficiente. Porém, nos caUROLOGIA PRÁTICA
• Manter o pH urinário entre 6,5 e 7,0. O pH acima
de 7,5 favorece a precipitação de fosfato de cálcio.
O melhor resultado é obtido com o uso de citrato
de potássio, 500mg, três vezes ao dia, controlando
o pH urinário com fita. No caso de intolerância gastrintestinal, pode-se administrar bicarbonato de sódio em quantidade suficiente para elevar o pH urinário. O inconveniente é a possível indução de calciúria, aumentando a litogênese.
• Administrar drogas que controlam a excreção da
cistina: glutamina: reduz a excreção urinária da
cistina, sendo usada por via oral ou endovenosa.
A melhor explicação para a atuação da droga seria pela secreção da glutamina em nível tubular,
de forma competitiva com a cistina, dando origem à amônia, que causaria a elevação do pH
urinário; D-penicilamina: atua interagindo com
a cistina na formação de um composto 50 vezes
mais solúvel. A posologia diária é de 2g (Cuprimine®, cápsulas de 250mg, quatro vezes ao dia).
Os efeitos colaterais são muito freqüentes e muitas vezes impossibilitam a manutenção do tratamento; thiol (µa-mercaptopropionilglicina
[Thiola®]): atua formando um composto quimicamente mais solúvel que a cistina. A dose diária de 600mg a 2g em 24 horas, dividida em vezes, propicia a eliminação de cistina inferior a
200mg/24 horas. Apresenta menor incidência de
efeitos colaterais e eficácia semelhante à da Dpenicilamina, sendo, portanto, a preferida.
Cálculos de Fosfato Amoníaco Magnesiano
Nesse tipo de cálculo, a urease bacteriana é o fator fisiopatológico primário. O tratamento, em linhas
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gerais, visa à extração cirúrgica do cálculo, combate à infecção urinária, mediante terapia antimicrobiana prolongada e de acordo com o antibiograma,
e, eventualmente, tratamento de algum distúrbio
metabólico.
Hipocitratúria
A hipocitratúria é muito freqüente como doença
isolada ou associada a outros distúrbios metabólicos.
O citrato é um fator protetor contra a litíase causada
tanto pelo oxalato de cálcio quanto pelo ácido úrico.
Dessa forma, o uso do citrato de potássio é útil, tanto
na hipocitratúria como em outros distúrbios metabólicos.
O citrato de potássio pode ser formulado em pó,
cápsula ou xarope. Em geral, são ministrados de 2g a
6g por dia, ingeridos às refeições. Verifica-se, com
relativa freqüência, intolerância gastrintestinal obrigando a suspensão do medicamento.
Resultado muito favorável é obtido com o suco
de limão. Recomendam-se, como dose diária, 150ml
do suco puro, dissolvido em 2 litros de água. A limonada, além do baixo custo, é muito bem tolerada pelos pacientes. É usada durante uma a duas semanas;
a seguir, mede-se o citrato na urina de 24 horas. O
valor normal da citratúria em adultos é de 4001.000mg/24 horas (1,92-4,80mmol/dia).
Cálculo de Cálcio
A hipercalciúria e a hiperoxalúria encontradas
nos cálculos de cálcio geralmente são fisiológicas.
A hiperoxalúria é doença pouco freqüente em
nosso meio. A hiperoxalúria primária é grave, com
formação de litíase recorrente e progressiva deterioração da função renal. O tratamento consiste no aumento da ingestão hídrica e administração de piridoxina (200mg/dia) ou ortofosfato (1,5-2,5g/dia). A hiperoxalúria secundária, mais freqüente, é decorrente de curtos-circuitos intestinais (bypass), e somente
com a correção da causa primária poderá ser alcançada a cura. Os valores normais do oxalato na urina
de 24 horas são de 8-40mg/24 horas.
O termo hipercalciúria idiopática foi usado
para definir a associação de cálculos recorrentes
de cálcio com hipercalciúria de etiologia desconhecida. Os valores normais do cálcio na urina de
24 horas são de 55-220mg/dia no adulto (1,45,5mmol/dia).
70
Atualmente, acredita-se que a hipercalciúria na
nefrolitíase recorrente compreende três grupos distintos, a saber:
Hipercalciúria reabsortiva: esse tipo de hipercalciúria tem sua fisiopatologia bem conhecida e
corresponde ao hiperparatireoidismo primário. O
tratamento é cirúrgico e consiste na remoção das paratireóides.
Hipercalciúria absortiva: ocorre pelo aumento da absorção intestinal de cálcio, sendo a forma
mais freqüente de hipercalciúria. O tratamento consiste em aumento da ingestão hídrica; dieta com
restrição de cálcio (leite e derivados); administração de fosfatos neutros; administração de 10-15g
de farelo de milho ou de arroz por dia, durante as
refeições.
Hipercalciúria renal: o defeito primário é a
deficiência na reabsorção tubular de cálcio, e o
tratamento se faz pela administração de diuréticos
tiazídicos que reduzem a excreção urinária de cálcio.
TRATAMENTO CIRÚRGICO DA UROLITÍASE
A indicação do tratamento cirúrgico do cálculo renoureteral baseia-se na tríade clássica: dor, infecção e obstrução. Qualquer que seja a localização do cálculo na via excretora, sempre deverão
ser observadas essas condições. Portanto, a presença de uma delas já é suficiente para que seja
indicado o tratamento. Cálculo obstrutivo em um
rim infectado constitui indicação de cirurgia de
emergência.
Em ordem de freqüência, os métodos usados
no tratamento da litíase urinária são litotripsia extracorpórea por ondas de choque (LEOC), endourologia e cirurgia aberta.
LEOC
A introdução do litotridor extracorpóreo (Fig.
6.12) revolucionou o tratamento da urolitíase, ampliando a indicação do tratamento intervencionista e possibilitando até o tratamento profilático dos
pequenos cálculos calicinais assintomáticos.
O método consiste na fragmentação dos cálculos por ondas de choque originadas por uma centelha produzida por um arco voltaico que se encon-
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LITÍASE URINÁRIA
Fig. 6.13 — Litotridor: fonte geradora das ondas de choque sob o
paciente.
Fig. 6.12 — Litotridor extracorpóreo.
tra submerso em água, meio ideal para a propagação dessas ondas (Fig. 6.13). Assim, as ondas geradas no primeiro foco de um elipsóide convergem
para o segundo foco, ponto em que o cálculo deve
ser colocado com o auxílio de dois sistemas de raios X ou ultra-som que possibilitam a orientação
espacial de manobra.
Há vários modelos de litotridor disponíveis,
uns mais potentes e que exigem anestesia, geralmente epidural, outros menos potentes e que dispensam totalmente o uso de anestesia, tornando a
fragmentação dos cálculos um procedimento ambulatorial.
A grande indicação para a litotrícia extracorpórea
são os cálculos até 2cm de diâmetro. Nos cálculos
maiores, a porcentagem de sucesso diminui, havendo a necessidade, geralmente, de repetição do tratamento. Nesses cálculos maiores, a cirurgia percutânea
estaria indicada. Como regra geral, não se deve usar
a LEOC na presença de obstrução da via excretora,
pois, além de não serem eliminados os fragmentos, é
UROLOGIA PRÁTICA
muito grande a possibilidade de ocorrerem infecção
urinária grave e septicemia.
A litotrícia extracorpórea pode ser repetida quando necessária, apresentando índice de sucesso ao redor de 90%. Estudos demonstraram não haver comprometimento da função renal no adulto.
O cálculos devem ser reduzidos a partículas de
aproximadamente 2mm, a fim de que sejam eliminados espontaneamente sem dor, embora 16% dos pacientes tratados por este método apresentem cólica
com necessidade de utilização de antiespasmódicos.
Existem dúvidas se os fragmentos de até 5mm
poderiam ser considerados clinicamente insignificantes, ou seja, não funcionariam como núcleo de formação de novos cálculos, e também seriam eliminados
espontaneamente. Os resultados dependem do tempo de acompanhamento pós-tratamento. Estudos em
cálculos de oxalato de cálcio demonstraram a persistência de 8,3% de cálculos no cálice inferior, 2,5 anos
após a LEOC (Fig. 6.14).
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para a remoção mecânica de pequenos cálculos ou,
um probe (Fig. 6.17), para a fragmentação de cálculos maiores com o ultra-som (Figs. 6.18 e 6.19).
Fragmentos residuais ≤ mm
30 dias
C1
4,3%
C2
4,2%
C3
36,3%
LEOC
C1
0%
2,5 anos
C2
0%
..... JUP
10,4
..... JUP
0%
..... U
10,4
..... U
4,2%
C3
8,3%
Fig. 6.14 — Cálculo residual pós-LEOC.
Fig. 6.15 — Punção percutânea sob controle fluoroscópico.
Endourologia
Endourologia é a técnica de acesso ao trato
urinário íntegro para diagnóstico ou tratamento de
diversas enfermidades, como a remoção de cálculos urinários.
O acesso renal por via percutânea foi primeiramente realizado por Goodwin e cols., em 1955.
A aceitação e a utilização do novo método foi lenta até o final da década de 1970. A partir dessa
época, quando novos instrumentos foram introduzidos no tratamento percutâneo dos cálculos renais,
tornou-se de grande popularidade. A nefrolitotomia
percutânea (NPC) ultrapassou com vantagens a
cirurgia aberta, estendendo suas indicações para
cálculos mais complexos e em diversos locais da via
excretora.
NPC
Fig. 6.16 — Via de acesso renal.
Alguns aspectos técnicos da NPC devem ser
conhecidos, pois são de importância no sucesso do
tratamento. As características morfológicas do rim
são estudadas por meio da urografia excretora. O
ultra-som reserva-se para rins exclusos ou pacientes
alérgicos ao contraste iodado. As discrasias hematológicas representam contra-indicação à NPC.
O paciente em decúbito ventral, a via excretora é
atingida através de uma punção percutânea sob controle fluoroscópico ou ultra-sonográfico (Fig. 6.15). Utilizando-se fio-guia e dilatadores, estabelece-se uma nefrostomia, ou seja, o acesso à via excretora renal (Fig.
6.16). Pela nefrostomia é introduzido o nefroscópio,
com o elemento óptico, pinças e sondas extratoras,
72
Fig. 6.17 — Introdução do nefroscópio.
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LITÍASE URINÁRIA
Fig. 6.18 — Procedimento completo de acesso e tratamento
percutâneo do cálculo renal.
Fig. 6.20 — Lombotomia.
Pielolitotomia: a remoção do cálculo se faz
através de incisão transversal do bacinete, preservando-se a junção pieloureteral (Fig. 6.22).
Pielolitotomia ampliada: a incisão do bacinete
é feita em forma de U, ampliando-se até o infundíbulo calicinal. Assim como na técnica anterior, não há
incisão do parênquima renal, reduzindo o sangramento (Fig. 6.23).
Fig. 6.19 — Litotridor ultra-sônico e sondas.
Cirurgia Aberta
A via de acesso ao rim, terço superior e eventualmente terço médio do ureter, é feita através da
lombotomia (Fig. 6.20) e, menos freqüentemente,
pela incisão vertical posterior (Fig. 6.21). O terço
inferior do ureter é atingido através de uma incisão
na região inguinal, extraperitoneal.
As técnicas cirúrgicas abertas, também ditas convencionais, mais utilizadas na remoção dos cálculos
são as seguintes:
UROLOGIA PRÁTICA
Nefrolitotomia anatrófica: realizada através
de lombotomia com ressecção da 12 a costela,
com o intuito de atingir facilmente o pedículo
renal. Após o clampeamento da artéria renal
(para evitar sangramento), a incisão do parênquima é realizada sob resfriamento, o que se consegue envolvendo o rim com soro fisiológico congelado (Figs. 6.24 e 6.25).
Nefrectomia parcial: indicada nos casos de
litíase situada nos pólos renais, os quais se encontram dilatados e com alterações inflamatórias, tendo como resultado a perda de parênquima renal
(Fig. 6.26).
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Fig. 6.23 — Pielolitotomia ampliada.
Fig. 6.24 — Nefrolitotomia anatrófica.
Fig. 6.21 — Lombotomia vertical posterior.
Fig. 6.22 — Pielolitotomia.
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Fig. 6.25 — Nefrolitotomia anatrófica (rins e gelo).
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LITÍASE URINÁRIA
TRATAMENTO PREFERENCIAL
DO CÁLCULO RENAL
Levando-se em consideração que a litotrícia extracorpórea por ondas de choque e a endourologia são os métodos de tratamento mais usados, a seguir apresentamos
a forma de tratamento preferencial, de acordo com a localização dos cálculos (Tabela 6.3 e Figs. 6.27, a 6.30).
Tabela 6.3
Tratamento preferencial do cálculo renal
de acordo com a localização
Fig. 6.26 — Nefrectomia parcial.
Nefrectomia: indicada nos grandes cálculos coraliformes unilaterais, com perda da função renal e/ou
componente infeccioso grave.
CÁLCULO RENAL NA CRIANÇA
O cálculo urinário é pouco freqüente na criança.
Em geral, é decorrente de distúrbio metabólico hereditário, anomalia anatômica congênita ou refluxo vesicoureteral.
Local
Dimensão
NPC
Renal
> 3cm
< 3cm
< 2cm
> 2cm
+
Calicinal
Coraliforme (Fig. 6.30)
Coraliforme na infância
Divertículo calicinal
Rim transplantado
(Figs. 6.27 e 6.28)
Rim “em ferradura” (Fig. 6.29)
LEOC
+
+
+
+
+
+
+
+
A LEOC trouxe grande impacto no tratamento
dos cálculos na criança. Diversos tipos de litotridores foram usados com eficiência e segurança. Existem, entretanto, muitas dúvidas sobre a inocuidade
do método. Na clínica, não foram determinadas, até
o presente, lesões em longo prazo nos rins em fase
de crescimento. No entanto, experimentos em animais demonstraram comprometimento da morfofisiologia renal, sem contudo afetar o crescimento do
animal ou do rim submetido à LEOC.
Outra preocupação refere-se à eliminação dos
fragmentos do cálculo, que, tratando-se de estrutura
de pequeno calibre como é o ureter de uma criança,
poderia causar obstrução de difícil tratamento endoscópico. Entretanto, a literatura refere a eliminação
mais fácil de fragmentos pelo ureter da criança do que
pelo dos adultos.
Fig. 6.27 — Radiografia simples: cálculo em rim transplantado.
A NPC pode ser aplicada no tratamento de cálculos na infância; porém, sempre que possível, devese dar preferência às técnicas que, além de eficientes,
sejam pouco agressivas.
Em conclusão, a LEOC é sem dúvida o método
de escolha no tratamento dos cálculos urinários na infância, a despeito das dúvidas existentes quanto aos
efeitos renais, em longo prazo, das ondas de choque.
UROLOGIA PRÁTICA
Fig. 6.28 — Urografia excretora: cálculo em rim transplantado.
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Fig. 6.29 — Rim “em ferradura”.
Fig. 6.30 — Cálculo coraliforme.
Fig. 6.31 — Radiografia simples: dois cálculos no ureter direito.
TRATAMENTO DO CÁLCULO
URETERAL
URETER LOMBAR
Os cálculos ureterais maiores que 5mm têm
grande possibilidade de serem extraídos cirurgicamente. A cirurgia aberta, também denominada
clássica, hoje em dia é excepcional no tratamento do cálculo ureteral. Entretanto, alguns casos
ainda são tratados por essa técnica, como os cálculos de grandes dimensões, ou quando existem
alterações anatômicas associadas (Figs. 6.31 e
6.32).
A abordagem depende da localização do cálculo, ou seja: terço médio e superior — lombotomia; terço inferior — incisão inguinal (Figs. 6.33
e 6.34).
Embora a LEOC apresente cerca de 85% de
sucesso no tratamento in situ dos cálculos ureterais, a ureterolitotripsia transuretral, com baixa
morbidade, tem aproximadamente 97% de sucesso na remoção dos cálculos ureterais localizados
abaixo dos vasos ilíacos.
76
Ureter lombar é o segmento do ureter que vai
da junção pieloureteral até a linha imaginária que
passa pela borda superior da crista ilíaca. Atualmente existe pouca controvérsia quanto à indicação da
LEOC no tratamento do cálculo lombar. A endourologia é excepcional nestes cálculos.
Resultados mais significativos foram obtidos
com a fragmentação in situ, com índice de fragmentação de 98%.
A introdução da segunda geração de litotridores,
que dispensa o uso de anestesia e de cateteres para a
localização do cálculo, impeliu o autor ao tratamento
in situ do cálculo ureteral.
URETER SACRAL
Maior dificuldade da LEOC ocorre nos cálculos do segmento sacral do ureter. Entretanto, com o
paciente em posição prona (decúbito horizontal ven-
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LITÍASE URINÁRIA
Fig. 6.33 — Incisão inguinal.
Fig. 6.32 — Urografia excretora: duplicidade ureteral direita com
presença de cálculos.
Fig. 6.34 — Extração do cálculo no ureter pélvico.
tral) obtêm-se bons resultados. Representa a primeira opção para os cálculos de até 2cm de diâmetro.
A endourologia pode ser indicada em condições especiais, como na falha da LEOC. Nesta técnica, dispõe-se do acesso pela via anterógrada ou transuretral. A via transuretral é a de escolha; excepcionalmente, recorre-se à via anterógrada, percutânea.
Embora pouco freqüente, a endourologia pode ser
indicada para cálculos com mais de 2cm no maior
diâmetro ou, fixos no local, por tempo superior a
seis semanas.
A LEOC, no tratamento do cálculo do ureter distal, apresenta resultados variáveis. A experiência mostra melhores resultados com a endourologia.
URETER DISTAL
Os cálculos do ureter inferior ou distal situam-se
no ureter pélvico, abaixo do cruzamento dos vasos
ilíacos. A preferência do urologista, desde os primórdios, recai no tratamento endoscópico. A ureteroscopia, com a introdução de aparelhos de calibre mais
reduzido, tornou mais fácil o procedimento, com danos mínimos ao ureter.
UROLOGIA PRÁTICA
CONCLUSÃO
Nos cálculos situados no ureter lombar e sacro,
de até 2cm, a indicação é a LEOC; nos cálculos sacrais maiores que 2cm, a endourologia está indicada.
Por último, nos cálculos ureterais distais, apesar do
freqüente uso da LEOC, a endourologia recebe a nossa recomendação. O alto índice de sucesso e a relativamente baixa taxa de complicação fazem com que a
nossa opção seja a endourologia no tratamento dos
cálculos distais. Atualmente, embora necessitando
anestesia, estes pacientes têm sido tratados, muitas
vezes, em regime ambulatorial.
O imenso progresso acumulado no último decênio permitiu, todavia, que se atingisse um nível de
perfeito entendimento quanto à melhor indicação do
tratamento (Tabela 6.4).
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Tabela 6.4
Cálculo ureteral: tratamento preferencial
Local
Dimensão
Endourologia
Lombar
Sacral
LEOC
+
1 ≤ 2cm
≥ 2cm
Distal
+
+
+
CÁLCULO VESICAL
A calculose vesical é uma patologia heterogênea que abrange duas entidades nosológicas distintas: os cálculos vesicais primários e os secundários.
Cálculo Vesical Primário
A calculose vesical primária, ou calculose vesical
endêmica, é uma patologia própria dos países subdesenvolvidos, ocorrendo principalmente em crianças do
sexo masculino. Embora não se conheça exatamente a
fisiopatologia desses cálculos, sabe-se que ocorrem em
crianças de baixo nível socioeconômico, provavelmente em decorrência de desnutrição protéico-calórica e
deficiência de vitaminas, especialmente A e B6. Como
característica, esses cálculos não costumam apresentar
recidivas após serem removidos.
Cálculo Vesical Secundário
A calculose vesical secundária é decorrente de
outras alterações urológicas, como estenose da uretra, hiperplasia nodular da próstata, divertículo da
bexiga, cistocele e bexiga neurogênica. Nesses casos, a formação do cálculo seria decorrente da contaminação bacteriana da urina residual, principalmente por bactérias que desdobram a uréia formando cálculos.
terrupção súbita do jato urinário. Nos doentes do
sexo masculino pode haver dor irradiada para a
uretra, por vezes atingindo a extremidade do pênis, situação em que o paciente, caracteristicamente, comprime a glande na tentativa de diminuir
a dor. Na criança, é comum o chamado “sinal do
pênis”, em que a criança fica constantemente manipulando o pênis. Disúria e polaciúria são achados freqüentes, principalmente quando há infecção associada, podendo ocorrer enurese e priapismo nas crianças.
Diagnóstico
O diagnóstico presuntivo pode ser feito quando existe, na história do paciente, dor suprapúbica
que se agrava com o exercício, interrupção súbita
do jato urinário, hematúria terminal, embora esses
achados não sejam patognomônicos dos cálculos
vesicais.
O exame físico é inconclusivo na maioria das
vezes, exceto nos casos de cálculos volumosos que
podem ser palpados ao toque vaginal ou retal, ou
quando a passagem de uma sonda metálica pela uretra produz uma sensação característica ao atingir o
cálculo.
Exames Subsidiários
Devem-se realizar os seguintes exames subsidiários:
Outro fator importante na gênese dos cálculos vesicais secundários são os corpos estranhos,
que, uma vez introduzidos na bexiga, quer pela
uretra, como grampos e agulhas, quer pelo uso de
fio inabsorvível na sutura da bexiga, agem como
“núcleo” de precipitação de sais, geralmente complicada com a infecção urinária secundária.
Exame de urina: o sedimento urinário geralmente
está alterado, apresentando leucocitúria e hematúria.
Como é freqüente infecção associada, a bacterioscopia
é positiva, assim como a urocultura. Imagenologia. Ultra-som: é atualmente o exame mais requisitado por ser
menos invasivo. Radiografia simples do abdome: os
cálculos vesicais geralmente são detectados pelo exame
não-contrastado. Urografia excretora: pode revelar uretero-hidronefrose secundária à obstrução do colo vesical, além da presença de divertículos da bexiga. Uretrocistografia retrógrada e miccional: é um exame complementar, que, além de localizar o cálculo, pode diagnosticar estenose da uretra e refluxo vesicoureteral, que
podem estar associados ao cálculo.
Quadro Clínico
Tratamento
A sintomatologia do cálculo vesical pode ser
bastante típica nos pacientes que apresentam in-
O tratamento visa à retirada do cálculo e à
correção dos fatores que predispõem a sua forma-
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LITÍASE URINÁRIA
ção. A retirada cirúrgica do cálculo pode ser feita por via endoscópica ou aberta, dependendo da
idade do paciente, tamanho do cálculo e presença
de enfermidades associadas, por exemplo, estenose da uretra. A litotripsia endoscópica pode ser
mecânica, utilizando os litotridores convencionais, ou elétrica, à custa de choques elétricos aplicados nos cálculos, promovendo sua fragmentação (Fig. 6.35).
A correção dos fatores predisponentes, isto é, a eliminação da obstrução ou dos divertículos, associada ao
tratamento da infecção urinária, torna pouco provável a
recidiva, e o prognóstico é bastante favorável.
BIBLIOGRAFIA
1. Borghi, L.; Meschi, T.; Amato, F; Novarini, A.; Romanelli A &
Cigala, F. Hot occupation and nephrolithiasis. J. Urol.,
150(6): 1757-1760, 1993.
2. Rodrigues Netto Jr., N. Endourologia e litotrícia extracorpórea.
São Paulo, Pancast, 1987.
3. Rodrigues Netto Jr., N, Claro JFA, Lemos GC, Cortado PL.
Renal calculi in Lower Pole Calices: What is the best Method of Treatment? J. Urol., 146: 721-723, 1991.
4. Rodrigues Netto Jr., N.; Claro, J.F.A. & Lemos, G.C. Treatment options for ureteral calculi: endourology or extracorporeal shock wave lithotripsy. J. Urol., 146: 5-7, 1991.
5. Rodrigues Netto Jr., N. Endourologia no tratamento do cálculo
reno-ureteral. In: Schor, N. & Heilberg, I.P. Calculose renal: fisiopatologia, diagnóstico, tratamento. São Paulo, Sarvier, 1995. pp. 251-261.
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Fig. 6.35 — Cálculo vesical.
UROLOGIA PRÁTICA
7. Wroclawski, E.R. Cólica nefrética. Urol. Contemp., 2(4): 2629, 1996.
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RECORDANDO
1. Qual dos seguintes fatores é importante na incidência de
cálculo urinário?
a) Clima e variações sazonais
b) Ingestão de água
c) Dieta
d) Ocupação
e) Todas acima
2. Náuseas e vômitos são freqüentes na cólica renal pelo
seguinte motivo:
a) O sistema nervoso autônomo transmite a dor
b) O cálculo está impactado no rim ou no ureter
c) O plexo celíaco atua tanto no estômago como nos rins
d) A infecção urinária associa-se com hiperacidez
3. Quais elementos podem ser encontrados no exame de
urina de paciente calculoso?
a) Hemácias
b) Leucócitos
c) Cristais
d) Bactérias
e) Todos acima
4. Qual dos seguintes cálculos é mais denso e mais radiopaco?
a) Oxalato de cálcio
b) Fosfato de cálcio
c) Fosfato amoníaco magnesiano
d) Cistina
7. Qual das seguintes opções é indicação de cirurgia de
emergência na doença calculosa?
a) Cálculo obstrutivo num rim infectado
b) Cálculo em rim único
c) Cálculo ureteral
d) Cálculos em ambos os rins e ureteres
8. Qual o pH da urina para formar cálculo de estruvita?
a) 5,5-6,0
b) 6,0-6,5
c) 6,5-7,0
d) Acima de 7,2
9. Qual é o agente desdobrador de uréia mais comum?
a) Pseudomonas
b) Klebsiella
c) Escherichia coli
d) Proteus
10. Paciente do sexo masculino, 34 anos, procura o pronto-socorro com temperatura de 38,5°C e queixas que
levaram ao diagnóstico de cálculo ureteral de aproximadamente 2cm no maior diâmetro, em nível de L4
(quarta vértebra lombar). Qual destas condutas NÃO
está indicada no tratamento desse cálculo ureteral, de
grande dimensão, associado a infecção urinária?
a) Observação
b) Cateterismo ureteral
c) Remoção cirúrgica
d) Nefrostomia
5. Qual das seguintes afirmações é incorreta no que se refere à urografia excretora no cálculo urinário?
a) Há retardo no aparecimento do contraste
b) Radiografias com retardo não são necessárias
c) Pode ocorrer ruptura da pelve renal ou do ureter
d) A infusão em bolo do contraste pode ser útil
em certos casos
6. Qual das seguintes opções é contra-indicação à nefrolitotomia percutânea?
a) Cálculo pélvico
b) Rim solitário
c) Discrasia hematológica
d) Cálculo calicinal
80
Respostas:
1) e; 2) c; 3) e; 4) b; 5) b; 6) c; 7) a; 8) d; 9) d; 10) a.
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LITÍASE URINÁRIA

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