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A IMPLEMENTAÇÃO DE PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS COMO ALTERNATIVA PARA A PROVISÃO DE INFRA-ESTRUTURA E SERVIÇOS PÚBLICOS NO BRASIL: VISÃO GERAL Leonardo Grilo (1); Silvio Melhado (2); Sergio Alfredo Rosa Silva (3); Cliff Hardcastle (4); Ariovaldo Barbosa Pires J unior (5) (1) Doutorando, Departamento de Engenharia de Construção Civil e Urbana da EPUSP - [email protected] (2) Professor, Departamento de Engenharia de Construção Civil e Urbana da EPUSP - [email protected] (3) Doutor em Engenharia - [email protected] (4) Professor, School of Built and Natural Environment (GCal) – [email protected] (5) Advogado, Albino Advogados Associados – [email protected] RESUMO A crise fiscal e as dificuldades financeiras induziram mudanças profundas no modelo de desenvolvimento brasileiro nos anos 80. O processo foi acelerado após o lançamento do programa de privatizações no início da década de 90. A partir de então, a demanda por modelos inovadores para a prestação de serviços públicos conduziu ao programa de concessões e, recentemente, às Parcerias Público-Privadas (PPP), que ainda não foram utilizadas em virtude da carência de formas jurídicas e institucionais. Muitos países estão lançando programas de PPP para viabilizar investimentos em projetos de infraestrutura. Estes programas devem concorrer entre si pelos recursos privados, reconhecidamente limitados. Neste contexto, o êxito do programa de parcerias demanda cenários políticos e econômicos estáveis, formas jurídicas e institucionais adequadas, garantias para os investidores e rentabilidades compatíveis com o padrão de riscos transferido pelo setor público. A concorrência de uma PPP pode envolver investimentos vultosos, devido ao longo prazo de maturação e do nível de diligência do projeto. Desta forma, o projeto deve ser gerenciado de forma eficiente, a fim de agilizar a execução do investimento. Este artigo discute a emergência do setor privado na prestação de serviços públicos no Brasil e analisa a implementação da PFI no Reino Unido, que pode fundamentar a formulação de metodologias e acentuar a curva de aprendizagem no programa brasileiro de PPP. Palavras-chaves: Parcerias Público-Privadas; gestão de projetos; riscos; valor agregado; contrato. 1. CENÁRIOS POLÍTICOS E ECONÔMICOS E A QUEDA NOS INVESTIMENTOS PÚBLICOS NO BRASIL Instabilidade econômica, altas taxas de juros e custo do capital, endividamento interno e externo elevado, perda contínua de credibilidade, recorrentes quebras de contrato e carência de formas jurídicas e marcos regulatórios em setores estratégicos comprometeram a imagem brasileira no cenário internacional e a atratividade de investimentos de longo prazo nos anos noventa 1 . Adicionalmente, verificou-se uma redução do investimento externo direto (IDE) para os países emergentes, em especial da América Latina, com o aumento da aversão dos investidores estrangeiros ao risco. O ajuste fiscal proposto para atender o superávit primário, de modo a recuperar a confiança do mercado e assegurar os pagamentos das obrigações do país junto aos credores, tem limitado as despesas do setor público e os investimentos em infra-estrutura nos últimos anos (figura 1). A restrição fiscal, o fim do ciclo de privatizações e a indefinição regulatória contribuem para acentuar o quadro. Em 2002, a vantagem do 1 Ambrózio (2002) relaciona o custo do capital no Brasil com a perda de credibilidade devido a quebras de contrato por parte do governo e subseqüentes prejuízos para os portadores de títulos da dívida pública. Partido dos Trabalhadores nas pesquisas de opinião abalou a confiança do mercado quanto ao pagamento da dívida, à condução das reformas e ao ajuste fiscal, conduzindo a cotação do dólar, os índices de risco país e as taxas de juros a níveis muito elevados. 25 20 US$ bilhões 20 18 14,3 15 10 6,6 5 0 2000 2001 2002 2003 Figura 1 – Queda no investimento em infra-estrutura (OLIVEIRA, 2004). Contudo, a política macroeconômica do governo trabalhista mostrou-se ortodoxa, em função da austeridade fiscal, do controle da inflação e da redução da vulnerabilidade externa, com a melhoria nas transações correntes e do saldo comercial. A transição de governo comprovou a estabilidade institucional brasileira e os fundamentos macroeconômicos para a retomada do crescimento foram restabelecidos. Importantes reformas foram aprovadas e o superávit da balança comercial foi atingido, em parte, devido ao excelente desempenho do setor exportador. A inflação foi contida, pressionando a queda dos índices de risco país e a recuperação da economia no último trimestre de 2003. A taxa básic a de juros recuou cerca de 10% em 12 meses, atingindo o menor patamar dos últimos dez anos 2 . Apesar do crescimento negativo do PIB em 2003, influenciado fortemente pelo fraco desempenho da construção civil (-8%), os analistas prevêem um crescimento do PIB em torno de 3,5% em 2004. 1.1. Queda no investimento público e emergência do papel do setor privado na provisão de serviços públicos no Brasil A crise fiscal e as dificuldades financeiras induziram mudanças significativas no modelo de desenvolvimento brasileiro , simbolizando o começo de uma profunda reforma estrutural no papel do Estado durante os anos 80. O processo foi acelerado após 1991, quando o programa de privatizações foi lançado, e mais uma vez em 1994, com a ampliação dos horizontes de planejamento propiciado pela estabilidade econômica. De acordo com os itens 26 e 27 da orientação estratégica para o Plano Pluri-Anual 2004-2007, o contingenciamento dos gastos inviabiliza o atendimento à necessidade de expansão da infra-estrutura apenas com o investiment o público, conduzindo a medidas para viabilizar o investimento privado e avançar na consolidação de um marco regulatório que estimule a oferta de serviços de qualidade e viabilize o repasse aos usuários dos ganhos decorrentes do aumento da produtividade e da redução do custo do capital e que, ao mesmo tempo, dê segurança às empresas para investir (PPA, 2003) 3 . Atualmente, as reformas estão evoluindo de modo a indicar um período caracterizado pela redefinição do papel e da inserção do Estado no domínio econômico. A demanda crescente por modelos inovadores que possibilitem a prestação de serviços públicos por parceiros privados induziu a proposição das Parcerias 2 De 26,5% para 16% a.a. Mesmo assim trata-se de uma das maiores taxas básicas de juros do mundo. 3 Estima-se que somente o setor elétrico necessite de investimentos de R$ 20,1 bilhões por ano para um crescimento da ordem de 3,4% a.a. Espera-se que o setor privado participe com cerca de R$ 10 bilhões a.a. (Oliveira, 2004). Público-Privadas, que ainda não foram utilizadas devido à ausência de uma fôrma jurídica e instituc ional adequada4 (MPOG, 2002). As PPP são contratos entre o governo e os agentes da iniciativa privada com o objetivo de prover equipamentos, infra-estrutura e serviços públicos. As parcerias podem se beneficiar do emprego das competências públicas e privadas no estabelecimento de relações nas quais os riscos, investimentos, responsabilidades e resultados são compartilhados. Além disso, as PPP têm como propósito a execução de uma obra ou serviço tradicionalmente provido pelo ente público. Pressupõe-se que tanto o parceiro público quanto o privado dispõem de características que possam conferir vantagens para a obra ou o serviço executado. As PPP tipicamente envolvem o financiamento, o projeto, a construção, a operação e a manutenção das facilidades empregadas na prestação do serviço. A alocação de risco entre os parceiros é central nas parcerias, na medida em que influencia investimentos, resultados e responsabilidades. A transferência de riscos para o setor privado tem como finalidade reduzir os custos de construção e operação, incrementar a qualidade dos serviços e, por conseguinte, o valor agregado para o usuário. Contudo, não se restringe o papel do Estado, que permanece responsável pelo processo decisório e de contratação como um todo, bem como pela prestação do serviço, de modo a preservar o interesse público (MPOG, 2002). 1.2. A experiência internacional na implementação de programas de PPP Atualmente, cerca de 50 países possuem programas formais de PPP, que vem sendo utilizadas não somente como uma alternativa para a restrição fiscal, mas como um meio melhorar a qualidade e a eficiência dos serviços públicos. O desenvolvimento nos últimos anos tem sido intenso, tanto em países com programas novos quanto naqueles com programas estabelecidos. Os novos programas têm claramente se beneficiado da experiência dos pioneiros. Onde os programas estão mais maduros, pode -se constatar uma busca crescente pelo aumento da eficiência dos modelos de PPP aliada à busca pela adoção dos conceitos em aplicações inovadoras. Prazo (anos) Padronização e melhorias incrementais Reino Unido 10 Disseminação do uso em diferentes setores Grécia Projetos assinados Portugal Chile Finlândia Alemanha 7 Irlanda Holanda Projetos-piloto Itália Polônia Comprometimento Espanha Dinamarca político Áustria Bélgica Brasil Análise do Hungria Eslovênia conceito República Checa Interesse 8 França Suíça 5 3 1 0 Figura 2 – Implementação de programas de Parcerias Público-Privadas em diferentes países (MPOG, 2002). 1.3. As potenciais vantagens das Parcerias Público-Privadas Dentre as vantagens potenciais das PPP, destacam-se (AAA, 2004; OLIVEIRA, 2004; FIOCCA, 2004): § 4 compartilhamento de riscos entre a Administração Pública e o setor privado no contrato de PPP; Somente os estados de São Paulo e Minas Gerais aprovaram leis específicas sobre o tema. O projeto de lei federal foi aprovado na Câmara e encaminhado ao Senado. § eficiência, aperfeiçoamento e qualidade na prestação do serviço público, tendo em vista o emprego das competências do setor privado e a vinculação da sua remuneração ao seu respectivo desempenho; § otimização da construção em termos de prazo e custo devido à ausência de descontinuidades; § integração do projeto, da construção e da operação permite ponderações (trade-offs) entre investimentos e custos de manutenção, operação e modernização e atualização das facilidades; § garantia na prestação do serviço, pois a remuneração está vinculada à disponibilidade de uma utilidade ou à prestação de um serviço, não a uma atividade isolada (projeto, execução, manutenção, etc.) § possibilidade de antecipação de investimentos, com amortização ao longo do tempo por meio da exploração econômica do serviço ou pela remuneração paga pela administração; § aumento da carteira de projetos economicamente viáveis, tendo em vista a possibilidade de execução de projetos sem auto-sustentação financeira com contraprestação do Estado; § confiabilidade para o setor privado, em virtude da estabilidade e das garantias no contrato; § flexibilidade do contrato, uma vez que o contratado assume não somente obrigações de meio como também de resultado e dispõe de certa liberdade para a execução do serviço; § possibilidade de um investimento contínuo do ente privado durante todo o contrato; § prazo limite de execução (35 anos) superior ao fixado na legislação atual (05 anos), possibilitando o desenvolvimento de projetos de infra-estrutura de grande porte; § possibilidade de partilha de ganhos de refinanciamento ou aumento de eficiência entre o setor privado e a Administração Pública. 1.4. Desafios para a implementação das Parcerias Público-Privadas no Brasil A dificuldade de o governo oferecer garantias reais (incorporadas nos contratos) para os investidores privados representa uma das principais barreiras para o desenvolvimento das PPP, especialmente em projetos não auto-sustentáveis, ou seja, que dependam da alocação de recursos orçamentários em longo prazo5 . Apesar dos esforços do governo para honrar os seus compromissos pontualmente nos últimos anos, a obtenção de recursos com base no compromisso do setor público pode ser difícil, reforçando a necessidade de uma fôrma jurídica que assegure os pagamentos futuros em consonância com a Lei de Responsabilidade Fiscal. Um mecanismo de garantia consiste em transferir fundos para um banco responsável pela custódia e liberação gradual dos fundos para o consórcio (MPOG, 2002). Uma das maiores barreiras na legislação brasileira para a implementação das parcerias reside na necessidade de se adequar a contratação das parcerias e a gestão de um contrato de PPP às imposições da Lei 8.666/93, que regula a aquisição de bens e serviços no setor público. Contudo, inovações nos mecanismos de financiamento também são necessárias. As tarifas poderão cobrir parte dos custos, o consórcio poderá assumir parte do investimento e tomar empréstimos com recursos da Contribuição de Intervenção sobre Domínio Econômico (CIDE). Adequadamente reguladas, as PPP poderão prover investimentos em infra-estrutura, estimular o envolvimento do setor privado e reduzir o custo de construção e operação das facilidades, em consonância com os preceitos de transparência e responsabilidade fiscal (MPOG, 2002). O desenvolvimento de programas de PPP em diversos países com diferentes governos e estruturas legislativas demonstram um conjunto de características comuns à implementação bem-sucedida das PPP: i) comprometimento do governo central, por meio de ministérios ou unidades centrais, cujo papel consiste em definir e difundir boas práticas, desenvolver políticas e prover orientação às Unidades PPP; ii) implementação de mudanças legais necessárias: estabelecer e esclarecer a legalidade e os poderes das 5 O governo britânico assegura o pagamento das obrigações contratuais por meio de garantias (comfort letter), mesmo em um ambiente de contingenciamento dos gastos públicos, transmitindo segurança ao investidor privado. autoridades públicas para participar em contratos de PPP, remover tributos que possam dificultar a implementação das parcerias, e refinar os regimes de controles de gastos públicos para acomodar as PPP; iii) identificação e comprometimento com um programa de projetos-piloto: estabelecer parcerias ao invés de modelos teóricos para ampliar a confiança de administradores públicos e investidores privados (UNITED NATIONS, 2002). De uma forma geral, o setor privado busca institucionalidade legal e regulatória, segurança jurídica, retorno econômico e liquidez, riscos enquadrados e adequadamente distribuídos. Assim, os principais desafios para a implementação do programa brasileiro de Parceria Público-Privada envolvem: § austeridade fiscal: consonância com a Lei de Responsabilidade Fiscal, aspecto fundamental para a manutenção de um ambiente macroeconômico favorável; § estrutura legal: inflexibilidade dos contratos demanda um arcabouço legal que proporcione clareza e segurança jurídica aos contratos de parcerias, harmonizando-os com as leis existentes. Em paralelo, conscientizar o poder judiciário sobre mudanças nas leis; § avanço institucional: redução da discricionariedade do poder executivo e da captura política das agências reguladoras. Definir um novo modelo para as agências reguladoras. Estimular a cooperação entre agentes reguladores e o setor privado. Coordenar ações para simplificar o trâmite dos projetos para obtenção de aprovação ambiental; § políticas: transferência da discricionariedade do Poder Executivo, a fim de evitar a captura política das agências reguladoras; § garantias: pagamento pela Administração Pública diretamente ao agente financiador, criação de fundos garantidores constituídos por ativos não-financeiros sob a custódia de bancos; e possibilidade de solução de conflitos por meio de arbitragem; § marcos regulatórios: estabelecer um marco regulatório e legal que defina a PPP e as regras a serem seguidas para viabilizar a sua implementação, com o intuito de evitar a transferência de atribuições das agências para o Poder Executivo, reduzir a discricionariedade do administrador público e disciplinar a competência das agências e dos órgãos de defesa da concorrência em questões ligadas à concorrência ; § modelos setoriais: os modelos setoriais devem ser aprimorados para oferecer maior segurança aos investidores em longo prazo, conciliando interesses dos administradores, usuários e investidores; § governança, transparência e clareza de regras: o programa de PPP deve apresentar sólida governança, a fim de gerar credibilidade. Os conselhos gestores, as unidades PPP, os coordenadores dos fundos garantidores e os bancos de desenvolvimento devem contribuir para ampliar a visibilidade do programa. As unidades de PPP, por sua vez, devem se tornar centros de conhecimento, consolidar e disseminar metodologias, e coordenar os trabalhos técnicos na implementação da PPP; § fontes de crédito: financiamento facilitado por organismos multilaterais, bancos de desenvolvimento, fundos de pensão, agentes financeiros e ao mercado de capitais; § planejamento de longo prazo: priorização dos projetos por benefícios sociais e econômicos, criação do conselho gestor (diretrizes, procedimentos de contratação, priorização), estabelecimento de estruturas de apoio (Unidade PPP) no âmbito federal e estadual para apoiar órgãos públicos na adoção da PPP; § processo licitatório: a licitação para a contratação das PPP apresenta algumas inovações em relação ao modelo tradicional tratado na Lei 8.666/93, sem, todavia deixar a aplicação e os princípios encerrados por esta Lei. Dentre essas inovações, destaca-se o procedimento em etapas definidas, permitindo a negociação das propostas econômicas entre a Administração Pública e os licitantes posteriormente à fase de qualificação (AAA, 2004); § avaliação dos projetos: a avaliação dos projetos deve considerar aspectos como a transferência de riscos para as partes, a responsabilidade fiscal e o valor agregado pela parceria. Passos importantes envolvem (ATHAYDE, 2004): seleção de projetos bancáveis e com definição precisa dos serviços; avaliação econômica adequada; consultas públicas com vistas ao intercâmbio de informações e a um processo licitatório competitivo; convencimento dos beneficiários sobre o valor agregado pelos projetos; e consolidação do programa de PPP por meio da implementação de projetos-piloto; § gestão dos contratos: estabelecimento de objetivos claros e mecanismos de recompensa ou sanção dos contratantes e contratados especificados e efetivamente aplicados; § mercado de capitais: o mercado de capitais, o mercado secundário (provedor de liquidez) e o mercado securitário, pouco populares e com custos elevados, podem estimular a adoção de novos produtos financeiros no financiamento de projetos de infra-estrutura (Fundos de Investimento Imobiliário - FII, Securitização de Recebíveis Imobiliários - SRI, Fundos de Investimentos em Participações – FIP, Fundos de Investimento em Direitos Creditórios – FIDC, e Fundos Mezanino); § fundos de pensão6 : os fundos de pensão são candidatos naturais aos investimentos em PPP. Contudo, as garantias do governo são insuficientes para garantir, isoladamente, o envolvimento dos fundos em empreendimentos de longo prazo. O project finance possibilita que os fundos se comprometam com os projetos de infra-estrutura. No entanto, os fundos buscarão projetos com condições de retorno, prazo e risco compatíve is com sua carteira e com seu cálculo atuarial. O êxito na implementação das parcerias demanda ainda um conjunto de ações por parte do setor público, agentes do setor privado e das agências multilaterais (ATHAYDE, 2004): § setor público: estabelecimento do marco jurídico e regulatório; incentivo à participação do setor privado; apropriação de capital intelectual; revisão de experiências, legislação e práticas em uso; formação de capital institucional; definição da governança do processo para gerar transparência e credibilidade; definição da carteira de projetos; e desenvolvimento de projetos -piloto; § promotores, operadores e financiadores: participação na oferta de estudos de viabilidade; capacidade de implementação; e inovação no financiamento; § agências multilaterais: apoio na transferência de capital intelectual; apoio financeiro ao setor privado e criação de novas formas de financiar os inve stimentos, preferencialmente em moeda local; apoio aos governos para melhorar a percepção de risco junto ao setor privado, operadores e financiadores. 1.5. Uma fôrma jurídica para a adoção de Parcerias Público-Privadas no Brasil A Lei 8.666/93 disciplina o proc esso de aquisição e contratação pelo setor público. Certamente, esta Lei desempenhou um papel importante ao limitar o poder discricionário do administrador público nas concorrências. Por outro lado, a Lei tem sido criticada por inibir a participação do construtor no projeto, exceto em circunstâncias restritas ou quando a tecnologia requerida é protegida por patente, e ainda por valorizar o menor preço em prejuízo da qualidade. A Lei 8.666/93 induz a fragmentação da cadeia produtiva e dificulta a transferência de riscos para o construtor. O projeto, a construção e a operação são designados a fornecedores selecionados em concorrências independentes. A Lei nº 8.987/95 regula a concessão e permissão de serviços públicos ao setor privado, precedidos ou não pela execução de obras. Segundo esta Lei, o critério de seleção nas concorrências usualmente se baseia no menor preço ou no pagamento da maior outorga pelo uso da infra-estrutura existente. A Lei de Concessões estabelece um mecanismo de reajuste das tarifas que garante a manutenção do equilíbrio econômicofinanceiro da operação ao longo da vigência do contrato, comprometendo a transferência dos riscos para o setor privado. Inversamente, a lei não prevê a divisão de ganhos advindos do refinanciamento de dívidas, modernização ou introdução de novos usos nas concessões. As PPP estruturam as relações entre o setor público e privado a fim de assegurar que os riscos sejam transferidos para a parte mais apta a gerenciá-los e que os serviços sejam melhorados por meio da exploração das competências do setor privado. O governo propôs uma lei para regular a adoção das PPP no Brasil (Projeto de Lei da Câmara nº 10/2004, antigo Projeto de Lei nº 2.547/03). A proposta de lei 6 Os fundos de pensão atualmente gerenciam uma carteira de R$ 241,5 bilhões no Brasil (GARCIA, 2004). complementa os textos da Lei 8.666 e 8.987 nos seguintes aspectos: i) possibilidade de contraprestação do setor público quando a receita não suprir o custo do serviço; ii) ganhos de produtividade e refinanciamento podem ser compartilhados entre o setor público e privado; iii) arbitragens poderão ser utilizadas para solucionar conflitos; iv) demonstração de consonância com os planos orçamentários anuais; v) agências reguladoras coordenarão atividades operacionais e fornecerão suporte à implementação das parcerias; vi) os concorrentes poderão apresentar projetos alternativos durante a concorrência. A tabela 2 compara a PPP com outros contratos administrativos (AAA, 2004). Tabela 2 – Quadro comparativo entre PPP e correlatos (AAA, 2004). PPP Concessão Permissão Autorização Tipo de serviço Públicos ou privados Forma de contratação Licitação e contrato de parceria Duração Públicos ou privados desde que de utilidade pública Públicos ou privados Licitação e contrato de concessão Prazo determinado (em média, 05 anos) Licitação e ato unilateral do poder público Públicos ou privados Direta e ato unilateral do poder público Indeterminado (caráter precário, podendo ser revogado pelo ente estatal a qualquer momento, exceção feita à permissão condicionada) Indeterminado (caráter precário, podendo ser revogado pelo ente estatal a qualquer momento) Prazo determinado (até 35 anos) Remuneração do particular Tarifas e contraprestação (remuneração somente depois de disponibilizada a obra ou serviço e contraprestação somente quando tarifa não suprir o custo da obra ou do serviço) Tarifas, contraprestação (desde a contratação da concessão) Término do contrato Tarifas, contraprestação (desde a expedição do ato) A qualquer momento e não há direito algum garantido ao particular (salvo na permissão condicionada) Consoante o serviço prestado (se público, pela tarifa gerada ou contraprestação da Administração Pública; se privado, não há remuneração por parte da Administração Pública) A qualquer momento e não há direito algum garantido ao particular Reversão dos bens necessários à prestação do serviço e em caso de obra, há a transferência da propriedade para a Administração Pública Reversão dos bens indispensáveis à prestação do serviço Não se deve confundir a PPP com a privatização. Em um contrato de PPP, o setor público transfere a prestação do serviço ao parceiro privado, não a titularidade. Por outro lado, os riscos são compartilhados entre o ente privado e a Administração Pública, enquanto na privatização os riscos são absorvidos pelo setor privado. Na privatização há a desvinculação máxima entre o ente privado e a Administração Pública, permanecendo somente a relação entre o serviço e o prestador do serviço, isso somente para os casos em que o serviço privatizado for um serviço público. 1.6. Riscos em projetos de Parcerias Público-Privadas Riscos designam condições ou eventos que, caso ocorram, poderão impactar negativa ou positivamente os objetivos do projeto. Os projetos de PPP estão sujeitos a diferentes tipos de riscos. É essencial compreender como os riscos podem afetar a bancabilidade e a eficiência de um projeto, a fim de elaborar estratégias que permitam mitigar as ameaças e acentuar as oportunidades decorrentes dos riscos. Abordagens como a elaboração de matrizes de riscos constituem uma das principais atividades na avaliação dos projetos, envolvendo a identificação, avaliação, cálculo do valor do risco, alocação preliminar dos riscos para as partes mais aptas a gerenciá -los e a identificação de estratégias para mitigar os riscos. Dentre os riscos típicos de um projeto de parceria, destacam-se: § planejamento: riscos de que o projeto não possa ser implementado de acordo com as aprovações, ou de que o planejamento não possa ser alcançado ou possa ser alcançado somente com custos maiores; § projeto (design): risco de que o projeto não permita a prestação de um serviço de acordo com o desempenho requerido; § licitatórios: as PPP têm um processo licitatório mais complexo do que o convencional, requerendo estudos vultosos e em negociações prolongados com os concorrentes selecionados; § construção: risco de que a facilidade não seja construída no prazo, custo e qualidade acordados, gerando perdas de receita e aumento dos custos financeiros para o concessionário, além de atraso do início da prestação do serviço segundo a perspectiva do setor público. P ode ser mitigado por meio de penalidades ou coberto por meio de seguros contratados pela concessionária; § manutenção: risco de que o custo para manter a facilidade em boas condições difira do orçamento; § operação: risco de que os custos operacionais variem em relação ao orçamento; § ambientais: riscos de que os projetos não recebam aprovação ambiental. Este risco pode ser mitigado por meio da aprovação dos projetos pelo administrador público antes da realização da licitação; § tecnológicos: riscos de que as mudanças tecnológicas impliquem na provisão de um serviço com tecnologia obsoleta; § inflação: risco de descolamento da inflação em relação à taxa projetada; § disponibilidade: risco de que o serviço provido seja menor do que o requerido em contrato; § demanda: risco de que a demanda para o serviço não atinja o nível projetado. Inclui os riscos de ocupação, ou seja, de que a facilidade não seja ocupada pelos usuários. O governo não é imune ao risco de demanda, especialmente quando a parceria gera receita para o governo. O setor privado tipicamente assume o risco de demanda quando os usuários pagam a tarifa. Contudo, em alguns tipos de projeto, estes riscos são dificilmente transferidos; § cambial: risco de descasamento da moeda dificultando o pagamento de obrigações em moeda estrangeira ou a aquisição de insumos e equipamentos estrangeiros para uma determinada facilidade. Medidas para mitigar os riscos cambiais incluem: evitar o emprego de moedas distintas quanto possível; encorajar a aquisição de seguros; evitar o emprego de moedas estrangeiras nos estudos; utilizar equipamentos locais; e transferir operações cambiais para as diferentes partes do contrato; § legislativo: risco de que mudanças legais possam implicar em aumentos do custo; § regulatório: marcos legais insuficientes, modificação das tarifas, aumento das obrigações de investimento; § políticos ou soberanos: riscos de mudanças em políticas não advindos de mudanças legais, incluindo sazonalidade eleitoral, instabilidade social, terrorismo, expropriação, nacionalização e desvalorização cambial. A percepção deste risco pode decrescer com a melhoria da representação política e dos índices de desenvolvimento social, da consolidação de um ambiente de responsabilidade fiscal, do avanço institucional e da oferta de garantias executáveis para o setor privado. A alocação de riscos não constitui uma ciência exata e depende de hipóteses (arbitragens), que podem ou não se confirmar. Uma das dificuldades da alocação de riscos em parcerias diz respeito ao longo prazo de maturação dos projetos, de até 35 anos, que dificulta sobremaneira o estabelecimento de cenários realistas. Contudo, as arbitragens devem ser razoáveis e documentadas. Os projetos podem se beneficiar (valor agregado) de uma alocação de riscos adequada, ou seja, para a parte mais apta a gerenciá -los. Os projetos de PPP apresentam longo prazo de maturação. Logo, é difícil antever as mudanças requeridas futuramente. Assim, os contratos devem conter provisões apropriadas antevendo a possibilidade de mudança posterior nos requisitos. Neste contexto, coloca-se em relevo a importância das unidades PPP e das agências reguladoras, que poderão fornecer suporte aos órgãos públicos durante a implantação do projeto e da gestão do contrato. O fortalecimento das agências reguladoras poderá contribuir ainda para mitigar os riscos políticos e transmitir maior segurança aos investidores. A Administração Pública pode se beneficiar da identificação e alocação dos riscos nos contratos, que devem incorporar a probabilidade e gravidade de cada risco. Uma matriz de riscos deve ser elaborada no início do estudo de viabilidade. A matriz de risco constitui uma ferramenta essencial para identificar e rastrear riscos por meio da concorrência, negociação e fechamento do contrato de PPP. O setor público pode se beneficiar da padronização dos contratos e de um entendimento comum dos riscos técnicos, financeiros e operacionais em projetos de PPP, assim como de abordagens para transferência e compartilhamento de riscos e do cálculo do valor agregado pelo projeto. A experiência britânica e sulafricana indica que o prazo e o custo para a preparação do contrato e a negociação entre as partes pode ser reduzida por meio do emprego de contratos padronizados em determinados aspectos. 2. A IMPLEMENTAÇÃO DO PRIVATE FINANCE INITIATIVE NO REINO UNIDO: UMA RESPOSTA PARA A QUEDA NOS INVESTIMENTOS DO SETOR PÚBLICO O Private Finance Initiative (PFI) foi introduzido no Reino Unido com o objetivo declarado de mobilizar o setor privado para atender necessidades tradicionalmente supridas pelo setor público. A iniciativa foi anunciada no governo do Partido Conservador em 1992. O Partido Trabalhista tem continuado a iniciativa ao inserir o Private Finance Initiative no contexto do seu programa de parcerias público-privadas (AKINTOYE et al., 2002) 7 . O contrato mais popular no Reino Unido é o Design, Build, Finance and Operate (DBFO). Atualmente, a maior ia dos contratos de PFI são operados com um contrato de DBFO no qual o setor público realiza pagamentos mensais, trimestrais ou anuais pela utilização das facilidades8 privadas ao longo da vida útil da concessão. Os investimentos em infra-estrutura são essenciais para o crescimento econômico a longo prazo, o desenvolvimento regional sustentável e a qualidade de vida nas cidades. Evidência s indicam uma redução do investimento público em infra-estrutura no Reino Unido, bem como um investimento inferior ao de outros países europeus. Em função da preocupação do governo trabalhista com o controle fiscal, segundo os parâmetros estabelecidos pelo governo anterior, e a suscetibilidade do governo à avaliação do mercado financeiro quanto ao nível de endividamento, existe uma possibilidade restrita de investimentos maciços em infra-estrutura em um futuro próximo. Neste contexto, o Private Finance Initiative tornou-se uma alternativa essencial para contornar a queda nos investimentos (CLARK; ROOT, 1999). 2.1. Benefícios potenciais do Private Finance Initiative O Department of Transportation (1998) listou os benefícios do PFI para os governos locais, a saber: promover investimentos privados em facilidades requeridas para a prestação de serviços; gerar valor por meio da alocação de riscos para os agentes mais aptos a gerenciá-los; encorajar a modernização do patrimônio dos governos locais; transferir para o setor privado facilidades que podem se beneficiar de melhor aproveitamento e de uma utilização adicional das facilidades e dos terrenos; facilitar joint ventures para possibilitar uma maior participação do setor público em empresas privadas; e remover obstáculos desnecessários em parcerias para promover o desenvolvimento econômico. Também se espera que o PFI reduza alguns dos aspectos negativos na execução de obras públicas no Reino Unido, tais como excesso de projetos, gestão de projetos ineficiente, atrasos e aumento de custos, degradação prematura dos ativos, custos elevados de operação e manutenção, além de reduzido valor residual. O PFI possibilita o uso de técnicas eficientes para a obtenção de serviços de qualidade, a disponibilidade de especialistas, economias variadas, e adaptação e resposta à mudança, menos evidentes no setor público. O PFI inventa relações inovadoras, estimula o crescimento, exerce um efeito positivo na 7 No Reino Unido, o uso dos dois termos – PFI e PPP – como referência às relações entre o Governo e o setor privado pode gerar confusões. No entanto, o PFI designa um processo de contratação e a PPP, a estrutura de titularidade. Esta diferença é particularmente importante em relatórios financeiros. Na maioria dos contratos de PFI o governo é responsável por um fluxo de pagamentos em longo prazo. Em contraste, no contrato de PPP o governo detém parte da titularidade de um ativo ou companhia, o que é bastante diferente de um contrato de PFI. 8 O termo começa a ser empregado em português como substituição para facilities no inglês. criação de empregos e proporciona uma resposta efetiva para a competição global, além de propiciar relações desafiadoras e produtivas para as partes (FORSHAW, 1999; CELESTE, 1996 apud AKINTOYE et al. , 2002). O relatório do National Audit Office (2003) indica que o PFI incentiva o consórcio a: adotar uma abordagem de longo prazo para o projeto e construção; executar o empreendimento no custo e no prazo; encorajar uma maior integração entre o projeto e a construção; entregar a facilidade pontualmente; e incentivar a qualidade no projeto e na construção. O NAO aponta que o PFI tem proporcionado certeza do preço aos departamentos, visto que 29 projetos, dentro de uma amostra de 37 ao todo, não reportaram aumentos de custos após a assinatura do contrato (NAO, 2003). De acordo com o relatório, os órgãos contratantes devem ressaltar a importância da qualidade do projeto no edital de concorrência, a fim de esclarecer que não se busca somente o menor preço. Além disso, órgãos como a Commission of Architecture and Build Environment (CABE) estão envolvidos nos aspectos relativos a projetos nas concorrências. Os construtores reportaram que, na maioria dos casos, houve liberdade para inovar nos contratos de PFI. Contudo, eles enfatizam as restrições inerentes a alguns tipos de empreendimento, tais como rodovias, prisões e hospitais. As inovações são ainda restritas durante a concorrência, devido ao desejo de que os proponentes concorram exatamente sobre as mesmas condições. Tabela 2 – Melhoria do desempenho da construção com o PFI (NAO, 2003). Experiência prévia (Pesquisa do Governo em 1999) Experiência como o PFI (Censo do NAO em 2002) Empreendimentos nos quais o preço acordado no contrato foi superado 73% 22% Empreendimentos entregues após a data acordada 70% 24% 2.2. Desvantagens potenciais do PFI e a necessidade de avaliação detalhada do projeto Em geral, o PFI demanda contratos de longo prazo e envolve investimentos públicos por períodos extensos, de 30 anos ou mais. O setor público não precisa angariar recursos antecipadamente para atender aos custos iniciais. Contudo, os pagamentos posteriores geralmente superam os empreendimentos com financiamento convencional. O governo pode tomar empréstimos com taxas de juros inferiores às das empresas privadas. Portanto, para que a opção do PFI seja viável, os custos financeiros superiores do PFI devem ser superados pelos benefícios alcançados. Dentre as desvantagens do PFI, destacam-se (HM TREASURY, 2003): § as necessidades do negócio mudam ao longo do tempo. Logo, existe o risco de que o contrato se torne inadequado com as constantes mudanças ao longo da vigência do contrato; § alterações de projeto podem ser requeridas à medida que as necessidades do setor público mudarem. A gestão das alterações pode requerer a renegociação dos termos e preços do contrato; § as inovações nos métodos de prestação do serviço podem conduzir a um decréscimo na qualidade; § os pagamentos incorporam os custos para cobertura dos riscos transferidos para o construtor, tais como riscos na execução da obra e do serviço, que podem não se materializar; § existe a possibilidade de que o construtor não seja capaz de gerenciar os riscos transferidos. Os departamentos podem ainda permanecer com a impressão errônea de que os riscos foram transferidos; § os custos ao longo da vida útil serão remunerados por meio de pagamentos unitários baseados no arranjo financeiro do construtor, que toma empréstimos com taxas de juros superiores ao setor público. Antes de implementar o PFI, os órgãos contratantes devem considerar todas as opções de financiamento disponíveis para os seus projetos, incluindo outros tipos de arranjos em parceria e as formas variadas de financiamento convencional. A avaliação deve incluir uma análise realista e abrangente de custos, benefícios e riscos. Com freqüência, estas análises não são conduzidas corretamente, posto que o PFI tem sido selecionado antes que avaliações detalhadas tenham sido concluídas (HM TREASURY, 2003). Uma questão que precisa ser respondida é se os benefícios do PFI são suficientes para justificar os custos adicionais da utilização de um private finance. Uma das características positivas do financiamento privado consiste na diligência realizada pelos tomadores de risco. No entanto, o retorno para os financiadores deve ser balanceado com os riscos tomados, o que por sua vez depende do nível de informação e competitividade do mercado. Uma avaliação pormenorizada das vantagens e desvantagens das possíveis alternativas de estruturas de financiamento para os contratos de PFI é absolutamente necessária. 2.3. Valor agregado e Melhor Valor no Private Finance Initiative O valor agregado (value for money) deve representar uma preocupação no setor público, tanto para políticos e administradores quanto para os usuários, que contribuem e se beneficiam dos serviços proporcionados. O valor agregado representa uma expressão de economia, eficiência e eficácia sobre a qual as pequenas e grandes instituições do setor público se pautam. Por outro lado, o melhor valor (best value) corresponde a uma filosofia gerencial fundamentada na busca da melhoria contínua. O melhor valor implica em um processo composto por quatro elementos: desafio, consulta, comparação e competição. Os esquemas que alcançam o melhor valor no primeiro ano possivelmente não satisfarão o mesmo critério no quinto ano. Os termos melhor valor e valor agregado são similares em contexto e processo. Logo, uma solução que corresponde ao melhor valor para um serviço representa, em teoria, valor agregado para o mesmo propósito (PRICEWATERCOOPERS, 2001). Melhor valor e valor agregado são semelhantes em intento, embora possam existir diferenças. O melhor valor tem sido desenvolvido principalmente por governos locais e ainda não dispõe de contrapartida no governo central do Reino Unido. Visto que os preceitos das parcerias público-privadas são desenvolvidos no contexto do governo central, o uso do termo valor agregado possibilita a aprovação de esquemas no nível nacional (PRICEWATERCOOPERS, 2001). Uma pesquisa com gerentes de projeto do setor público indicou a existência de seis condicionantes primários para o valor agregado em projetos de PFI, descritos abaixo em ordem decrescente de importância percebida (ARTHUR ANDERSEN, 2000): transferência de riscos para os quais o setor privado está mais apto a gerenciar; emprego de especificações de desempenho e vínculo dos pagamentos com a qualidade e pontualidade na prestação dos serviços; adoção de contratos de longo prazo, proporcionando oportunidades para a recuperação dos investimentos iniciais, desenvolvimento de abordagens alternativas para prestar o serviço e o foco nos custos ao longo da vida útil; incentivos e medidas de desempenho; competição de preços; e competências em gestão de projetos no setor privado. Os condicionantes acima exercem um impacto significativo na geração de valor, embora nenhum opere isoladamente e todos interajam com um conjunto de outros condicionantes. Uma análise da classificação por setor sugeriu uma uniformidade ao longo dos setores, exceto no caso dos projetos de tecnologia da informação. A baixa pontuação de alguns condicionantes pode ser atribuída à perspectiva particular dos gerentes de projeto do setor público e à natureza dos projetos estudados (ARTHUR ANDERSEN, 2000). 2.4. Áreas para melhorias no Private Finance Initiative Desde seu lançamento em 1992, o PFI tem se tornado um dos principais métodos de contratação de serviços no setor público britânico. Mais de 500 contratos foram assinados com o montante aproximado de £50 bilhões. Um relatório recente evidenciou as seguintes áreas para melhorias no Private Finance Initiative (HM TREASURY, 2003): § apesar das vantagens potencia is, o PFI apresenta algumas desvantagens. Inúmeros contratos de PFI demonstram que os departamentos precisam aperfeiçoar o processo de contratação e gestão de contratos. As boas práticas precisam ser difundidas; § o PFI é visto assiduamente como a única alternativa. O setor público tem confiado suas decisões em Public Sector Comparators, que têm sido incorretamente utilizados ou manipulados; § com freqüência, os usuários não recebem o melhor contrato, visto que boas práticas gerenciais não estão sendo seguidas. A competição muitas vezes não é mantida, somente um construtor se habilita para a concorrência ou o construtor aumenta os preços após ter sido selecionado; § os projetos devem ser gerenciados efetivamente após a assinatura do contrato. O gerenciamento efetivo requer uma abordagem de parceria entre os contratantes e os construtores, um sistema de recompensas e penalidades de acordo com o desempenho obtido, e procedimentos para lidar com as mudanças; § os órgãos públicos devem salvaguardar o interesse público nas circunstância s nas quais o construtor não é mais capaz de prestar o serviço requerido no contrato. É preciso que se desenvolvam planos de contingência e se considere a rescisão contratual caso isso se mostre necessário. Quando os projetos entram em dificuldade, ações imediatas devem ser tomadas para que os custos não aumentem indefinidamente. 2.5. A demanda de redução de custos e prazos na aquisição de projetos em PFI As principais preocupações do setor privado quanto ao PFI referem-se ao alto custo, à transferência excessiva de riscos e à lentidão no processo licitatório. Os custos e os prazos de concorrência no PFI tendem a superar os do processo de contratação convencional. Por outro lado, os projetos de PFI beneficiam-se da contratação de serviços de projeto e construção em uma competição completa e de um envolvimento intenso do usuário na tomada de decisão sobre a solução predileta. No PFI, os concorrentes devem investir no planejamento detalhado das propostas e convencer os investidores a financiar o esquema proposto. O governo acredita que o processo estimula um alto grau de diligência pelo setor público e privado, além de uma análise e negociação detalhada dos aspectos de risco do projeto. As evidências sugerem que o empenho nos estágios iniciais do proje to tem incrementado os resultados de forma considerável, beneficiando o setor público e os usuários dos serviços. Após a identificação do método que oferece o maior valor para o setor público e a implantação de um projeto em Private Finance Initiative ou com investimento convencional, o governo deve assegurar que a execução seja realizada com eficiência e agilidade sem comprometer o valor obtido. Ainda que os investimentos estejam gerando resultados práticos, existe a necessidade de concentrar esforços para assegurar um maior valor agregado nos diferentes tipos de contratação. Particularmente, a análise aponta duas áreas nas quais melhorias poderiam incrementar o valor: os custos e prazos do processo de contratação. É reconhecida a necessidade de melhorar as competências e assegurar que os órgãos contratantes tenham a capacidade de implementar o PFI efetivamente. A melhoria da competência em contratação no setor público permite que os órgãos focalizem a geração do valor, o aumento da velocidade de entrega do investimento, a redução dos custos de contratação e o aumento do valor agregado, de modo a encorajar o setor privado a participar das concorrências e a intensificar a competição e inovação no PFI (HM TREASURY, 2003). Independentemente do método contratual adotado, boas práticas de contratação devem ser seguidas em todas as aquisições de bens e serviços. Neste aspecto, o PFI não é diferente de outros sistemas contratuais. Embora alguns detalhes possam ser diferentes, a filosofia de contratação deve assegurar, basicamente, a competição, a avaliação adequada das propostas, o controle dos custos de contratação, a adoção de uma abordagem de parceria, avaliações de desempenho do ente privado, a manutenção da pressão pelo valor agregado ao longo do contrato, a flexibilidade nos contratos antevendo mudanças nos requisitos, o desenvolvimento de competências em gestão de projetos; a proteção do usuário quando a concessionária falha (HM TREASURY, 2003). O processo de contratação é mais complexo no PFI do que nos projetos convencionais, podendo acarretar altos custos administrativos. No contrato do Newcastle Estate, por exemplo, o custo da contratação para o Departamento de Previdência Social saltou de uma estimativa inicial de £0.4 milhão para £4.4 milhões, um aumento de 11 vezes, refletindo a incapacidade do órgão público exercer as atividades requeridas na negociação do contrato. No contrato para transferência do edifício do Departamento de Seguridade Social para o setor priva do, os custos totalizaram £10.9 milhões e os três concorrentes finais investiram cerca de £27 milhões na preparação das propostas. Os custos com consultores também podem superar os orçamentos com margens expressivas no PFI. No contrato do Newcastle Estate, por exemplo, o custo da assessoria jurídica passou de uma estimativa de £70 mil para um total de £2.3 milhões. Após uma série de projetos hospitalares, o NHS Trust gastou £2.3 milhões com consultores no contrato do West Middlesex Hospital, aproximadamente o mesmo montante de quatro anos antes (HM TREASURY, 2003). 2.6. Medidas para aumentar o valor agregado pelos projetos de PFI Determinar e aplicar o PFI onde ele apresenta valor agregado constitui apenas uma parcela do processo de prestação de serviços públicos de qualidade. É importante que o processo de contratação seja gerenciado de forma eficiente, inteligente e pontual para maximizar os benefícios do PFI. Existem evidências de que a execução dos investimentos em serviços públicos com o PFI pode ser incrementada por meio da redução dos prazos e custos de contratação, de modo que o valor não seja comprometido. O incremento das competências do setor público constitui uma das principais alternativas os problemas associados com os custos de concorrência e os atrasos na contratação. Com esta finalidade, a abordagem do governo do Reino Unido tem sido (HM TREASURY, 2003): § padronizar os contratos de PFI, auxiliando a difusão de boas práticas, aperfeiçoando a contratação no setor público e reduzindo a extensão e o custo da contratação em PFI de forma significativa; § desenvolver modelos de contratação e incrementar as competências em contratação no setor público para assegurar que os órgãos públicos adotem boas práticas contratuais; § aumentar a transparência do programa PFI no futuro para encorajar os investimentos privados; § incentivar novos entrantes no mercado de PFI, incluindo empresas internacionais. O valor agregado pode ser ampliado por meio do aperfeiçoamento das competências do setor público, da padronização dos contratos, do estabelecimento de agências reguladoras como a Partnerships UK e o Project Review Group , da introdução de veículos de informação para coordenar a contratação em áreas particulares, da criação de suporte técnico para a contratação, do estabelecimento de um sistema de acreditação para os consultores do setor público, além da difusão de boas práticas e de uma melhor utilização da memória institucional no setor público. O Reino Unido tem adotado inúmeras medidas para incrementar as competências em contratação no setor público: criação do Treasury Taskforce (posteriormente restabelecido como Partnerships UK), que padronizou os contratos; o Office of Government Commerce, que introduziu o Gateway Process, uma ferramenta gerencial para permitir ao setor público rastrear e avaliar a eficácia das operações; a Commission of Architecture and Build Environment (CABE) para incrementar a qualidade do projeto no setor público; o Public Private Partnership Programme (4Ps); e o Project Review Group. 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Nos últimos anos, o ajuste fiscal comprometeu as despesas públicas e os investimentos em infra-estrutura e serviços. Em paralelo, a transição de governo comprovou a estabilidade institucional brasileira e os fundamentos macroeconômicos (controle da inflação, superávit primário e balança comercial positiva) para a retomada do crescimento foram restabelecidos. Contudo, o crescimento econômico esperado poderá ser prejudicado pela escassez de investimentos em infra-estrutura. Neste contexto, a Parceria PúblicoPrivada constitui uma alternativa para prover os investimentos necessários, estimular o envolvimento do setor privado e reduzir os custos de construção e operação das facilidades. Embora o Brasil possa se beneficiar da experiência de outros países, o êxito do programa de PPP demanda a suplantação de diversos desafios, tais como o estabelecimento de uma forma jurídica para oferecer segurança ao setor privado, o desenvolvimento dos marcos regulatórios setoriais e o lançamento dos projetos-piloto, mesmo que a um custo inicialmente elevado e parcialmente alavancados por recursos de bancos de desenvolvimento. Cerca de 50 países possuem programas formais de PPP. As PPP não estão sendo utilizadas somente como uma solução para a restrição fiscal, mas como um meio para melhorar a qualidade e a eficiência dos serviços públicos. Os novos programas têm se beneficiado claramente dos pioneiros. Onde os programas estão mais maduros, como no Reino Unido, verifica-se uma busca crescente pelo aumento da eficiência dos modelos de PPP/PFI. Nestes países, novos desafios têm sido apresentados, tais como a redução dos custos e prazos no processo licitatório, a padronização dos contratos, a disseminação de boas práticas e o estabelecimento de competências em gestão de projetos no setor público. A construção civil tem participado com cerca de 60% na Formação Bruta de Capital Fixo nos últimos dez anos (BCB, 2003). Logo, o programa de PPP pode exercer uma influência significativa no nível de atividade do setor, tanto em termos sócio-econômicos quanto tecnológicos e gerenciais. A transferência dos riscos de projeto, construção e operação para o setor privado pode induzir a integração da cadeia produtiva, a introdução de inovações tecnológicas e ponderações (trade-offs) entre investime nto e custo de manutenção, operação, atualização e modernização ao longo do ciclo de vida da facilidade. No entanto, as licitações demandam estudos vultosos, o que por um lado inibe a apresentação de propostas inadequadas e, por outro, pode restringir a participação das pequenas empresas nas concorrências. Finalmente, destaca-se que a PPP não deve ser entendida como a única alternativa para a provisão de infra-estrutura e serviços públicos, devendo ser utilizada quando demonstrar valor agregado em relação ao financiamento público convencional. Adicionalmente, não se deve atribuir à parceria com o setor privado a provisão de todos os investimentos de que o país precisa, visto que, mesmo no Reino Unido, onde o programa foi implementado com êxito, apenas 11% dos investimentos foram conduzidos por meio do PFI. Desta forma, constata -se que a importância da PPP justifica a proposição de uma linha de pesquisa sobre o tema, a exemplo de outros países. O intercâmbio com países nos quais o programa de PPP está maduro pode propiciar a aceleração da curva de aprendizagem na implementação das parcerias. Recentemente, pesquisadores do Departamento de Engenharia de Construção Civil da Universidade de São Paulo propuseram um projeto de pesquisa focando o processo de contrata ção e gestão de contratos em projetos de PPP em cooperação com pesquisadores da Escola de Ambiente Natural e Construído da Glasgow Caledonian University. A cooperação tem como intuito proporcionar o intercâmbio de informações sobre o processo de contratação dos projetos de parcerias no Brasil e na Escócia. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AKINTOYE, A; Beck, M; HARDCASTLE, C; CHINYIO, E; ASENOVA, D. Framework for risk assessment and management of private finance initiative projects. Glasgow: EPSRC/DTI, Glasgow Caledonian University, 2002. Final Report. ALBINO ADVOGADOS ASSOCIADOS. PPP: Parcerias público-privadas . São Paulo, 2004. AMBRÓZIO, D. Risk Brazil or risk Malan? Why Brazil’s risk indexes are so high? Disponível em: <http://www.decioambrozio.com.br/docs/Janeiro%202003%20Carta%20a%20Imprensa%20Mundial. doc>. Acesso em: may. 2004. ARTHUR ANDERSEN/LSE. Value for money drivers in the private finance initiative. Disponível em: <http://kenniscentrumpps.econom-i.com/nl/pps/pdf/value.pdf>. Acesso em: 15 jan. 2004. ATHAYDE, L. A. Parcerias público-privadas: riscos e governança. São Paulo, SP. 2004. 9p. 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