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Hubble Space Telescope/ AFP
hipertexto
An
o
11
Jornal da Famecos/ PUCRS. Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009 – Ano 11 – Nº 69
Pedro Revillion/Hiper
Pró-Mata preserva
a natureza na Serra
Página 7
Camila Domingues/Hiper
Pichações na história
eternizada em pedra
Página 4
E mais
Pedro Simon
Reitor Clotet
Mulheres na prisão
Inter e Grêmio
Começa o Ano
da Astronomia
Telescópios serão instalados
em locais públicos, no mundo todo
Página 9
2 abertura
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
hipertexto
Comentário
amazônia
O Narciso moderno
Devastação e desempregos
Por Maurício Círio
a idéia de que o produto não é
simplesmente um produto, mas
sim um conjunto de valores desejáveis pelo consumidor. Uma
roupa pode trazer beleza, um
relógio garante status, um colchão
oferece conforto, e um videogame
é sinônimo de entretenimento.
Como diria o americano Warren
Buffet, 78 anos, considerado pela
Pessoas fascinadas pela autoimagem, num excesso de amor
rabiscam no espelho o próprio
nome. Eu, eu, sempre eu. Reflexos deste tipo de comportamento tangenciam os filhos do
capitalismo e o vasto mercado da
propaganda mundial. Na mídia,
Reprodução
campanhas publicitárias
repletas de subjetividade
e de promessas ao forte
ego dos consumidores
modernos.
A palavra em questão
é o Narcisismo. Na lenda
grega, Narciso apaixonase pelo reflexo da própria
imagem refletida na lagoa de Eco. A admiração
é tanta que ele acaba
permanecendo lá, admirando-se até definhar e
morrer, nascendo ali uma
bela flor. Assim como na
lenda, o cotidiano dos
novos tempos carrega
personagens dotados Michelangelo, El Caravaggio (1573-1610)
de exageros referentes à
auto-estima. Os narcisos moder- revista Forbes como o homem
nos são os que mais facilmente mais rico do planeta, “o preço é
absorvem as campanhas de publi- o que você paga. O valor é o que
cidade que associam a compra do você leva”. Assim é o Narciso
produto a sentimentos de poder, moderno: iludido com a oniposensualidade, reconhecimento tência de um produto capaz de
mudar o rumo de sua história.
social, e segurança.
Há uma infinidade de produ- Porém, de acordo com Freud, esse
tos no mercado que se encaixam desejo tão realçado pela mídia é
nessa demanda: cosméticos, die- inatingível, já que ele nunca se
tas light e diet, além das comple- concretizará em sua totalidade,
xas cirurgias plásticas (algumas visto que os objetos são efêmeros,
até perigosas à saúde estética). A assim como sujeitos a renovações
velhice está cada vez mais temi- e substituições.
As campanhas de publicidade
da, e as rugas são exterminadas
por aparelhos de alta geração. não provocam, mas sim se aproNão existem limites para os veitam da sempre atual egomania
neo-narcisos e os criativos publi- dos consumidores. Todo mundo
citários sabem disso. Tanto que quer estar bem consigo mesmo, e
suas campanhas freqüentemente isso não tem como mudar.
Os narcisos atuais são ingêbuscam um texto com apelos
subjetivos voltados à aceitação do nuos o bastante para acreditarem
eu perante a sociedade, passando que na compra de um produto
a mensagem de que o produto irão ganhar e levar a felicidade
pode transformar as relações do instantânea. É, os filhos do capitaconsumidor com as pessoas em lismo continuam ingênuos como
todo filho, e narcisistas como todo
sua volta.
A publicidade tende a passar capitalista.
Por Mariana Ávila
A máxima a “Amazônia é o
pulmão do mundo” é amplamente
declamada por ambientalistas,
ecologistas e pela sociedade em
geral como uma tentativa de
mostrar o interesse pela causa
ambiental que a floresta reserva.
Entretanto, mais do que cuidar
do pulmão metafórico e verde
que o mundo vê como a salvação
para as depredações irreversíveis
que já foram feitas a Terra, é
preciso olhar para as pessoas que
lá vivem.
Manaus, capital do Amazonas
– estado que ainda preserva boa
parte de sua floresta – teve um
crescimento sua população nos
últimos 20 anos cresceu acima
da média brasileira. Hoje com
mais de dois milhões de habitantes, muitos migrantes do Sul
e Nordeste, a metrópole sofre
com os problemas de habitação,
saneamento básico e planejamento viário. 80% dos empregados trabalham na indústria,
fundamentada na Zona Franca de
Manaus. O pólo foi criado como
uma tentativa de esquentar a
economia brasileira e seguindo a
política militar de 70 de “integrar
para não entregar” a Amazônia à
responsabilidade internacional.
A ZF trouxe à Manaus um parque
de multinacionais atraídas pela
isenção de impostos. Hoje, dão
emprego à região e produzem
para todo o mundo.
Apesar do Planalto assegurar
que a economia brasileira mantém a estabilidade, Zona Franca
dá sinais de que já foi atingida
pela crise internacional. As fábricas diminuíram significamente a
produção, desacelerando o ritmo
de trabalho até a completa parada
de linhas. Em 21 de novembro
do ano passado, uma sexta-feira,
uma empresa fabricante de carregadores de celular fechou sua
principal linha de montagem.
Os 400 funcionários demitidos
são vítimas da crise econômica
Hipertexto
Jornal mensal da Faculdade de Comunicação
Social (Famecos) da Pontifícia Universidade
Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Avenida Ipiranga 6681, Jardim Botânico,
Porto Alegre, RS, Brasil.
E-mail: [email protected]
Site: http:// www.pucrs.br/ famecos/ hipertexto/ 045/ index.php
Reitor: Ir. Joaquim Clotet
Vice-reitor: Ir. Evilázio Teixeira
Diretora da Famecos: Mágda Cunha
Coordenadora de Jornalismo: Cristiane
mundial.
O consumidor, no mundo inteiro e principalmente no exterior,
resistiu ao desejo de comprar novos e potentes aparelhos celulares
com medo do gasto pesar muito
ao bolso. Essa mudança de prioridades nas compras desestrutura
uma pirâmide de postos de trabalhos que dependem das vendas
dessas “frivolidades”. A redução
da demanda diminui a produção
de aparelhos e de acessórios,
como os carregadores. Dificilmente esses trabalhadores demitidos
serão reinseridos no mercado de
trabalho. Apesar das 500 indústrias com sede na região, todas são
dependente da economia mundial
pelo seu caráter exportador.
As empresas mantêm um
vínculo meramente trabalhista
com a região, por usufruírem da
mão de obra local, mas o comércio nacional sempre se mostrou
insuficiente para a colocação dos
produtos, exigindo uma forte
demanda de exportações. Com a
recessão internacional, a situação
se torna vulnerável. Criada pela
ditadura militar para desenvolver
a região por 30 anos, oferecendo
incentivos fiscais e livre importação para empresas que lá se
instalassem, sua validade já foi
prorrogada em 2003 e o novo
término está previsto para 2033,
quando o governo federal deixaria
de abonar os impostos fiscais. O
senador Arthur Virgílio (PSDBAM) alerta que o pior, ainda, são
os projetos de levar a idéia de
Zona Franca para outras regiões
do País. Em qualquer das circunstâncias, o fim ou a ampliação, poderão provocar o deslocamento de
empresas como Siemens, Philips,
Honda, Nokia e Semp-Toshiba.
Enquanto não acontece, os trabalhadores já sofrem com qualquer
deslize financeiro mundial do
capitalismo globalizado.
A evasão mostrará que Manaus, quarto maior PIB per capta
do país segundo o IBGE de 2004,
não passa de um hotel de capital
dependente do setor industrial.
A floresta tem toda a atenção
midiática, mas a causa ambiental
também apresenta desdobramentos humanos na região, com
os empregos dependentes de um
efêmero funcionamento de fábricas, forjado artificialmente e com
datas marcadas para vigorar. A
falência do sistema, na capital do
Amazonas, levará à devastação
dos empregos, junto com a floresta já combalida. Serão homens
e árvores.
Evaristo Sá/ AFP
O complexo industrial da Zona Franca, em Manaus, e o início da floresta
Apoio cultural: Zero Hora. Impressão: Pioneiro, Caxias do Sul. Tiragem 5.000
Finger
Produção dos Laboratórios de Jornalismo
Gráfico e de Fotografia.
Professores Responsáveis:
Tibério Vargas Ramos e Ivone Cassol (redação
e edição), Celso Schröder (arte e editoração
eletrônica) e Elson Sempé Pedroso (fotojornalismo).
Estagiários matriculados e voluntários:
Gerente de produção: Carla Castro
Editores: Matheus Piovesan e Patrícia
Dyonisio de Carvalho.
Editora de Arte: Juliana Freitas
Editores de Fotografia: Vinícius Roratto
Carvalho e Camila Domingues.
Redação: Aline Vargas, Carla Castro,
Débora Ely Silveira, Fernando S. Soares
Junior, Gustavo Lacerda, Juliana Freitas,
Juliana Ulrich Lima, Lívia Costa, Luísa
Fedrizzi, Luiza Gaidzinski Carneiro,
Marcus Perez, Mariana Lenz, Matheus
Piovesan, Maurício Círio, Patrícia Dyonisio
de Carvalho, Sérgio Giacomel.
Repórteres Fotográficos: Amanda
Copstein Telles da Silva, Bruno Todeschini,
Camila Domingues, Daniela Curtis do Lago,
Juliana Arias Martins, Lívia Stumpf, Maria
Helena Sponchiado Neuwald, Patrícia Dyonisio de Carvalho, Paula Cunha Tanscheit,
Pedro Revillion, Tyssiani Avila Vidaletti e
Vinícius Roratto Carvalho.
hipertexto
entrevista 3
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
30 anos do primeiro golpe na ditadura
Pedro Simon foi um dos vitoriosos na eleição de 78, que abriu caminho para a Anistia de 79
O Movimento Democrático Brasileiro (MDB) nasceu em 24
de março de 1966. Para camuflar o autoritarismo do Regime
Militar, vigente a partir de 1964, fazia o ingrato papel de partido
de oposição à Arena. Com a abertura política orquestrada pelo
general Ernesto Geisel, a lei nº 6.767, de 20 de dezembro de 1979,
concedeu anistia a todos os exilados, restabeleceu o pluripartidarismo no país e extinguiu ambas as legendas. A idéia era apagar
o nome Arena do mapa político com a redemocratização, dando
sobrevida aos seus fiéis colaboradores, e impedir o fortalecimento
da sigla MDB, que resistira aos anos de arbítrio.
Os remanecentes da oposição consentida foram obrigados a
acrescentar um “P” ao velho MDB. Não era a mesma coisa. A frente
enfraqueceu e dela saíram o PP, liderado por Tancredo Neves;
o PTB, que depois virou PDT, de Leonel Brizola e o PT, reunindo
sindicalistas das regiões Sul e Sudeste do Brasil. Mais tarde, surge
uma nova dissidência, o PSDB, de tendência social democrata,
liderado pelo governador de São Paulo, Franco Montoro, e o
senador paulista Fernando Henrique Cardoso, entre outros.
A resistência democrática durante a ditadura foi árdua, com
prisões e cassações. A Anistia de 79 não pode ser resumida a uma
concessão militar. Um ano antes, a ditadura sofreu 16 retumbantes derrotas para o Senado, única eleição majoritária regional
permitida até então. É neste cenário que foi eleito senador, em 78,
Pedro Simon, gaúcho de Caxias do Sul, cidade na qual foi vereador
em 1954. Exercendo o cargo de 1979 a 1987, Simon ficaria marcado pela defesa dos interesses do Rio Grande do Sul na tribuna do
Senado. De 1987 a 1990, elege-se governador do Estado. Em 1991,
Simon retorna à Casa para cumprir três mandatos consecutivos:
de 1991 a 1999, de 1999 a 2007 e, no atual, de 2007 a 2015.
Em entrevista para o Hipertexto, feita por e-mail, o senador
relata a sua experiência durante a ditadura militar, explica o
seu vínculo com o PMDB e conta um pouco da sua história na
política brasileira.
Por Gustavo Lacerda
Desde o restabelecimento do pluripartidarismo no
Brasil, em 1979, partidos
de esquerda e de direita
surgiram do PMDB (até então, MDB). Além disso, a
legenda já sofreu diversas
repartições internas. A que
se deve este fator: seria uma
conseqüência do tamanho do
partido ou uma característica democrática da política
peemedebista?
Ao contrário do que aconteceu em outros países, em que
regimes ditatoriais conseguiram
eliminar qualquer possibilidade
de atuação parlamentar, no Brasil
foi diferente. O autoritarismo foi
obrigado a permitir o funcionamento de uma oposição, mesmo
que dentro de limites. O MDB
foi o estuário dessa oposição,
abrigando todos os descontentes
com o regime militar. Nunca foi
fácil a vida da oposição, mesmo
dentro dos limites consentidos.
Alvo permanente da ditadura,
vítima de seus desmandos, vendo
cair pela cassação, prisão, exílio e
assassinatos, diversos quadros, o
MDB manteve a linha da luta democrática. Enquanto enfrentava
a ditadura por um lado, por outro
o MDB sofria com os ataques de
militantes que aderiram à luta
armada, pregavam o voto em
branco e alegavam que não havia
futuro para a agremiação. Para
debater os rumos da resistência
democrática e buscar uma unidade na ação, realizamos, em Porto
Alegre, em 25 de abril de 1971, um
grande encontro das oposições
brasileiras. Tiramos as bandeiras
do MDB, quem não as adotasse
e preferisse outro caminho não
estaria mais falando em nome
do MDB. Assim, aprovamos,
como eixos da luta democrática,
o fim da censura e da tortura, a
anistia, o voto direto, liberdade
de imprensa e Assembléia Nacional Constituinte, entre outros. O
povo compreendeu a intenção do
MDB e dali em diante a oposição
cresceu, com a adesão popular
que levou às campanhas das
Diretas, Já!, Constituinte, e, por
fim, à vitória no colégio eleitoral
que inverteu a lógica da escolha
dos presidentes-generais e elegeu
Tancredo Neves.
Com o fim do bipartidarismo,
criamos o PMDB, transformando
a frente nacional num verdadeiro
partido político que conduziu o
povo brasileiro à conquista da
democracia. Eu defendia a tese
da manutenção da frente até a
eleição da Constituinte, quando
os partidos seriam dissolvidos. Os
políticos se agrupariam conforme
os interesses em debate na Constituinte e, com a assinatura da Carta
Magna, se abriria um prazo de seis
Agência Senado
Pedro Simon foi um dos líderes da resistência democrática e remanescente do velho MDB que permanece vivo
meses para a formação dos partidos. Acredito que dessa forma
os partidos teriam maior conteúdo. Esse é o problema maior da
política brasileira, partidos sem
história e sem doutrina.
Mesmo com tantas derivações, o PMDB, nestes quase
30 anos, sempre esteve entre
os partidos mais fortes do
país. Prova disto foram as
eleições municipais do ano
passado, nas quais o partido
elegeu seis prefeitos em capitais e conquistou o maior
eleitorado do Brasil. Como
se sustenta esta soberania
que completará três décadas
este ano?
Ainda hoje o PMDB sobrevive das glórias passadas e das
sementes plantadas na época da
luta contra a ditadura. Com a
morte de Tancredo Neves e outras
figuras referenciais, como Ulysses
Guimarães e Teotônio Vilela, o
partido perdeu substância. Hoje,
é dominado por um grupo que
não traduz em sua prática política
a história e os ideais fundadores
do PMDB.
Há 30 anos, o senhor teve
o seu primeiro mandato
como senador. O PMDB completa 30 anos de existência.
Hoje, cumprindo o quarto
mandato como senador, defendendo a mesma legenda,
como o senhor vê a sua história política e a sua relação
com o partido?
Minha história é conhecida,
sou oriundo do antigo PTB, não
o PTB de Getúlio Vargas, pois
sempre segui as idéias de Alberto
Pasqualini. Fui eleito vereador
pelo PTB de Caxias do Sul, minha
cidade natal, depois deputado,
governador e senador. Quando
veio o golpe militar, estava na
Assembléia Legislativa, a única
do país que permaneceu funcionando durante a ditadura. Chefiei
a oposição no Rio Grande do Sul,
sempre sob o lema: “O que é bom
para o Rio Grande do Sul, é bom
para o MDB.” Nunca fizemos
uma oposição sectária e, por isso
mesmo, conseguimos em plena
ditadura, unir as forças políticas
do estado, convencer o governo a
construir no Rio Grande o III Pólo
Petroquímico do país. Presido o
PMDB do Rio Grande do Sul e
não tenho relação próxima com a
direção nacional do partido.
Existem traços ideológicos e ideais que se conservam
no senador Pedro Simon
herdados do vereador eleito
em Caxias do Sul, em 1954? É
possível ainda defender estes
ideais, mesmo com a mudança no fazer política que
ocorreu no Brasil daquela
época, passando pelo regime
militar, até hoje?
Sou um discípulo de Pasqualini, o senador gaúcho teórico do
trabalhismo e criador do conceito do solidarismo, isto é, uma
terceira via entre o socialismo e
o capitalismo. Ele defendia que
sobre toda a propriedade existe
uma hipoteca social, e que o trabalhador deveria receber o suficiente
para ter uma vida digna. Os bens
de produção poderiam ficar em
mãos de particulares, mas dentro
da perspectiva do bem comum e
do solidarismo. Embora pouco
conhecido, Pasqualini permanece atual e deveria ser melhor
estudado.
O seu nome sempre será
lembrado pela moral inquestionável e pela luta a favor
da ética. Foram inúmeros
os casos que comprovam tal
afirmação, e ainda há outros tantos que respaldam
o seu compromisso com o
Rio Grande do Sul, como a
permanência na tribuna do
Senado por seis horas para
garantir um empréstimo
internacional ao Estado, em
junho do ano passado. Quais
valores o senhor gostaria
de passar para as próximas
gerações peemedebistas e de
políticos do Brasil?
O Brasil é um país que perdeu,
ou está perdendo, suas referências.
Isso acontece em praticamente todas as áreas, desde a política, até a
religiosa e intelectual. Tínhamos
nomes como Darcy Ribeiro, Teotônio Vilela, Tancredo Neves; ou
Raimundo Faoro e Barbosa Lima
Sobrinho; ou, ainda, Dom Hélder
Câmara. Pessoas que quando falavam indicavam um rumo. Hoje,
a família e a escola foram substituídas pela televisão e a política
virou terreno em que os ideais se
perderam. Meu livro mais recente,
“Reflexões para o Brasil do século
21”, aborda justamente essa questão. No entanto, permaneço um
otimista, tenho fé no Brasil e no
povo brasileiro.
4 sociedade
hipertexto
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
Os pichadores
riscam história
escrita a pedra
Camila Domingues/ Hiper
Pichadores desafiam legislação
e sistema de combate ao vandalismo.
Penas brandas não inibem as ações
Por Edgar Maciel
Quem passa pelas ruas e avenidas de Porto Alegre já se acostumou em observar prédios e
bens públicos como alvo de depredações. Gangues de vândalos
desafiam a polícia sem medo do
flagrante e durante a madrugada
saem para pichar. Desde de março
de 2006, a administração de Porto
Alegre lançou projetos que visam
diminuir as agressões e o descaso
com o espaço público da Capital.
O Disque-Pichação permite
à população denunciar atos de
vandalismo contra prédios particulares e monumentos de Porto
Alegre por meio do número 153.
Desde o lançamento do serviço,
em 25 de março de 2006, houve
uma diminuição de 40% dos casos
de depredação e um total de 183
detenções. Os números mostram
que as ações de vândalos diminuíram, mas o combate às depredações ainda revelam problemas
graves.
Um estudante de publicidade
e propaganda, D.R, de 21 anos,
da PUCRS, mostra a realidade
que a cidade vive. Ele integra
um grupo com dez pichadores
nas imediações da avenida Bento
Gonçalves, um dos alvos mais
freqüentes pelos pichadores. D.R
participa do grupo há mais de três
anos e diz que entre os colegas o
vandalismo é visto como arte. A
Internet virou o canal para dar
visibilidade ao mundo da pichação. Existem blogs e sites que
expõem os trabalhos das gangues
e acirram a competição entre elas.
Ofensas e trocas de ameaça são
freqüentes. “Se não correr atrás
de onde pichar, os outros passam
na frente. Tem de estar sempre
ligado”, relata o estudante.
O jovem afirma que a prática
de vandalismo é normal durante
o período da madrugada e que
não tem “medo nenhum”, mesmo
com a possibilidade de ser pego
em flagrante. “Nós já pichamos
em corredores de ônibus, prédios,
viadutos e no Arroio Dilúvio e
nem uma vez fomos abordados”,
Monumento positivista a Júlio de Castilhos, na Praça da Matriz, junto aos prédios de quatro poderes
vangloria-se. Durante o dia, os jovens têm vida normal. Trabalham,
estudam e atividades sociais agitadas na noite porto-alegrense
fazem parte da rotina. “A pichação
fica como o momento de viver com
adrenalina”, declara.
Disque-Pichação
A Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Segurança Urbana trabalha com 12 atendentes e
60 guardas municipais de plantão
no programa Disque-Pichação.
O número 153 já recebeu 960
denúncias até o mês de outubro
de 2008, e registra 183 capturas
entre adultos e adolescentes.
A secretaria disponibiliza quatro viaturas que fazem rondas no
Centro para a proteção do patrimônio público. O serviço funciona
24 horas e os vândalos flagrados
são autuados no procedimento
de “Apuração de Ato Infracional”
na Lei de Crime Ambiental, que
prevê pena de três meses a um
ano, com prestação de serviço à
comunidade ou reparação.
O secretário Marco Antonio
Seadi assegura que grupos de
vândalos são alvo constante da
secretaria, da Brigada Militar
e dos guardas municipais, mas
reconhece que o projeto ainda
apresenta falhas. “Precisamos
de mais viaturas e policiais que
estejam à disposição da secretaria.
Estamos entrando em processo
de concurso para a contratação
de mais policiais para suprir essa
necessidade”, diz.
Camila Domingues/ Hiper
Lançado o programa SOS Monumentos
A coordenadora do atelier Alice Prati de Restaurações, restauradora Alice Prati, que lançou o
projeto SOS Monumentos, recuperou 30 monumentos na capital, como a estátua de Bento Gonçalves, em parceria com a Secretaria Municipal
do Meio Ambiente. O projeto, com repercussão
nos Estados Unidos, Inglaterra e Alemanha,
funciona de forma independente e filantrópica.
A especialista conhece os problemas do vandalismo e as falhas que prejudicam os trabalhos de
restauração e conservação dos bens públicos. “O
meu trabalho não é de faxineira dos monumentos,
mas sim de pesquisar as causas do vandalismo em
geral”, diz Alice.
O atelier, juntamente com a prefeitura, tinha
uma parceria para restaurar e conservar o patrimônio público da capital. O governo municipal
prometeu laboratórios para que o projeto começasse, mas já faz um ano e nove dez meses e nada
resultou. “Estamos esperando a manifestação da
prefeitura, que até agora não demonstrou importância e não se manifestou mais sobre o assunto”,
lamenta a restauradora.
Alice enumera quatro pontos fundamentais
para a atual situação do vandalismo e impunidade
dos depredadores. O primeiro deles é a falta de
Disque-Pichação já recebeu mais de 900 denúncias, mas pena é pequena
integração entre governo e cidadão. “As pessoas
acham que o patrimônio público é dos políticos
e as ações tomadas hoje em dia não visam o
cidadão, apenas núcleos isolados”. O segundo
ponto é a falta de educação civil e social em toda
sociedade. Juntamente com a delegada de polícia
Rejane Teles, uma das coordenadoras do projeto
Disque-Pichação, fazia palestras nas escolas e observava nenhuma consideração com o patrimônio
e obediência de regras. A penalização aplicada pela
Justiça também é deficitária. O Disque-Pichação,
segundo ela, é uma boa prática de combate, porém
as penas para quem comete a contravenção são
muito leves e quem acaba mais punido é o próprio
cidadão. Nas ações culturais, Alice enfatiza a elitização como uma das causas deficitárias. “Existem
investimentos gigantes para um único monumento
ou ação e a recuperação desses começam a partir
dos interesses do próprio governo.”
Mesmo com as ações tomadas pela prefeitura,
quem continua ganhando a briga são os vândalos.
Cada vez mais surgem grupos no qual a intenção é
a depredação da cidade. “A pichação é o primeiro
passo de um projeto de marginal e as gangues de
vândalos são inteiramente alimentadas pelo crime
e o tráfico”, conclui Alice Prati.
hipertexto
sociedade 5
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
Exclusivo
Elas vivem no mundo
sombrio da prisão
Subterrâneos
da liberdade
Fotos Aline Bassan Martins/ Hiper
Nossa repórter entrou no presídio feminino e conta o
drama das mulheres que cumprem penas por seus crimes
Por Aline Bassan Martins
São sete galerias, muitas histórias humanas e uma série de
atividades ocupacionais, recuperação e ressocialização para
mulheres que, por um ou outro
motivo, entraram para a vida do
crime e agora pagam por isso.
Por detrás da mesa, em uma sala
espaçosa, Sílvia Ragel, diretora
da penitenciária feminina Madre
Pelletier, no bairro Teresópolis,
em Porto Alegre, traça o perfil das
detentas:
“São mulheres geralmente
de 20 a 30 anos, com primeiro
grau incompleto, pertencentes às
camadas mais pobres da população e que caíram no mundo do
crime muitas vezes por questões
sentimentais e amorosas, a paixão
por um assaltante ou traficante e,
conseqüente, mergulharam neste
universo sombrio e complicado,
cujo prêmio-castigo está sendo
vivido diariamente por detrás de
paredes e grades que as isolam do
mundo exterior.”
Quase todas, porém, ocupam-se com alguma atividade e
ganham pelo seu trabalho. Há
uma oficina onde oito detentas
passam o dia em meio a máquinas industriais de costura,
confeccionando filtros para óleo
de caminhão, prendedores de
roupas, lençóis e fronhas para o
Hospital Conceição. É o caso de
Clair, a coordenadora da equipe,
orgulhosa de produzir 6 mil peças
por mês. A equipe dela é a mais
bem remunerada, faturando um
salário mínimo regional por mês
no valor de R$ 477,20, sendo que
deste total, 20% é destinado ao
pecúlio, uma poupança destinada
originalmente a ser retirada no
dia da soltura. “Mas muitas tiram
antes e mandam o dinheiro para
suas famílias”, informa Clair.
Embora ainda longe do ideal,
não faltam atividades no Madre
Pelletier: além da oficina, há detentas que trabalham para uma
pizzaria, montando o produto
que já sai embalado, pronto para
a venda. Há ainda artesanato,
aulas de alfabetização, limpeza,
refeitório e tarefas de digitação
para a Procergs. Todas, por mais
irrisório que seja o valor, recebem
por suas tarefas. Bom para elas e
melhor ainda para as empresas
que fazem parte do Protocolo de
Ação Conjunta, PAC. Elas não
pagam encargos sociais e têm um
serviço a baixo custo. Ao total, 60
presas trabalham nesse sistema.
Não é o dinheiro, porém, o
mais importante nisso tudo e sim
a chamada “remissão de pena”,
instrumento de benefício que
consiste na redução de um dia na
pena a ser cumprida para cada
três dias trabalhados. É o caso de
VG., 27 anos, condenada por tráfico e que está no Pelletier há sete
meses. VG. cuida da biblioteca do
presídio, uma pequena sala que,
segundo ela, contém 6.400 livros,
“contados a dedo”. As obras são,
em sua totalidade, provenientes de
doações da população e mostramse bem cuidados e catalogados.
Engana-se quem pensa que elas
não lêem: diariamente cerca de 15
mulheres vêm ao local escolher livros, que podem levar para ler em
suas celas, à noite. A bibliotecária
observa que não há preferência
por autores e sim por temas como
romances “com muitas histórias”
e obras espíritas, além de livros
de direito e do código penal. Cada
uma pode retirar três volumes de
uma só vez, devendo devolvê-los
em um prazo de oito dias, passível
de renovação.
A história de VG., se não daria um livro, ao menos poderia
render um longo artigo: casada
aos 12 anos, natural de São Luís
Gonzaga, tem um filho de 9, hoje
aos cuidados da avó. Quando pequena, foi entregue a um casal de
argentinos que a criaram durante
algum tempo na província de
Missiones, onde chegou a cursar
as primeiras séries colegiais. “Não
tive infância, adolescência e nem
brinquei de boneca como todas as
outras”, conta, sem que isso soe
teatral ou piegas. Depois, morando em Foz do Iguaçu, arranjou um
companheiro e envolveu-se com o
tráfico de drogas.
Morena, baixa, de traços finos
e delicados, com uma farta cabeleira preta, VG. exibe um belo
sorriso quando fala do filho, o qual
raramente vê. Alguns minutos de
conversa são o suficiente para que
ela enxuge as lágrimas e passe
a falar dos planos para o futuro,
algo que não deve acontecer nos
próximos cinco ou seis anos por
responder a um outro processo,
tão complicado quanto o anterior.
Evangélica, ela divide a cela com
mais cinco companheiras. Jun-
tas, elas formaram um grupo de
oração. “Graças a Deus, a nossa
galeria é uma benção, não tem
briga, e ninguém precisa se dopar
para dormir”, relata.
Além de bibliotecária, VG. tem
dotes peculiares: é manicure e cuida da beleza das outras presas de
sua galeria, todas vaidosas como
ela. Isso a faz sonhar em abrir um
negócio próprio no futuro, possivelmente salão de beleza.
Um casarão só de mulheres onde ninguém quer entrar
Elas vivem em outro mundo.
Tão peculiar que quem está dentro só pensa em sair e quem está
fora jamais quer ser chamado a
entrar. São 383 mulheres cumprindo pena pelos mais variados
crimes: tráfico, roubo, homicídio,
latrocínio. A Penitenciária Feminina Madre Pelletier, na avenida
Teresópolis, Zona Sul de Porto
Alegre, é o único presídio exclusivamente feminino em todo o
Estado do Rio Grande do Sul. Um
prédio em tom de rosa desbotado,
erguido em 1947 e que até então
era chamado Instituto Feminino
de Reabilitação Social Bom Pastor, administrado pelas irmãs da
Congregação Nossa Senhora da
Caridade Bom Pastor. Encampado pelo Estado em 1971, já com a
denominação atual, foi dirigido
até 1980 por religiosas da Igreja
Católica. Atualmente faz parte do
sistema prisional da Superintendência dos Serviços Penitenciários
do Rio Grande do Sul (Susepe).
Razoavelmente bem aparelhada, a biblioteca ressente-se de
algumas lacunas em seu acervo,
especialmente revistas, que as
presas adoram. A apenada VG.
aproveita e faz um apelo: quer doações de periódicos, sejam quais
forem, novos ou antigos. “Só não
vale revista de homem pelado”,
brinca.
Ao contrário dos conturbados
e violentos presídios masculinos,
o Madre Pelletier é relativamente
calmo e sem um visível clima de
tensão. Isso se explica pelas naturais diferenças entre os sexos.
Rangel teoriza: “É muito diferente
um presídio para homem e outro
para mulher. A mulher vive em
outro contexto, não consegue se
desligar da sua família. E a mulher é bem mais carente, sente
falta do trabalho, já que todas
trabalharam dentro de casa. São
mais disciplinadas, embora mais
histéricas”.
Não é de estranhar, portanto,
que o índice de ressocialização
seja bem superior ao dos presídios
masculinos. “A ressocialização é
bem mais fácil”, afirma a diretora
Silvia Ragel, calculando tal quociente em cerca de 50%. Nisso,
ajuda o fato de pelo menos 80%
delas serem mães. Há, inclusive,
uma creche dentro do Pelletier.
As próprias apenadas cuidam de
seus filhos. As crianças podem
permanecer na cadeia junto às
mães até os três anos de idade.
Assim que ficam maiores voltam
para a casa de parentes ou o Conselho tutelar recolhe. “É claro que
também existem as perigosas e
as que sempre voltam”, avalia a
diretora. A despeito de ser mais
humano e digno do que qualquer
penitenciária masculina, o Madre
Pelletier também sofre com a superlotação. Existem cerca de 100
presas além da capacidade. “A Galeria E, das provisórias, realmente
está superlotada. Antigamente
eram mais condenações por ho-
micídio. Hoje o artigo 155, furto,
e o 33, tráfico, são muito maiores.
Ragel admite que a sociedade mudou muito. Mesmo assim, ela diz
não se arrepender da sua opção
de vida, pelo contrário. Marlusa
Netto, auxiliar penitenciário que
trabalha no Madre Pelletier há 10
anos, com tatuagens nos ombros
e muito bom humor no dia-a-dia,
transita desinibida entre as detentas. “Adoro isso aqui, adoro esse
trabalho”, diz ela. Fora dali, causa
certa estranheza nas outras pessoas quando ela conta que trabalha
em uma penitenciária. “Alguns se
espantam e fazem piadas, perguntam se eu tenho namoradas aqui,
mas eu também acho graça.”
Marlusa está tão integrada ao
cotidiano do presídio que, ao lado
de mais uma dezena de prisioneiras, passou no Vestibular para
Serviço Social. Daqui a três anos
poderá dizer que fez parte da primeira turma de detentas formada
no próprio local de reclusão.
6 última hora
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
Ramon Fernandes/ PUCRS
hipertexto
Agronegócio em queda
Crise mundial encolhe produção
Por Débora Ely Silveira
Chanceler Dom Dadeus Grings empossou Joaquim Clotet para um novo período de quatro anos à frente da PUCRS
PUCRS busca inovação,
qualidade e ação social
Reitor Clotet define as metas de sua nova gestão
A safra agrícola de 2009 será
inferior a de 2008, prevê a Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul) em função da
crise econômica mundial. “Teremos surpresas negativas”, admite
o presidente Carlos Sperotto. As
principais causas desta redução
são os altos custos de produção e
os baixos preços das commodities
no mercado internacional.
A crise dos créditos pode afetar o agronegócio brasileiro que,
segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior, corresponde a um terço
do Produto Interno Bruto (PIB)
nacional e é responsável por 42%
das exportações do Brasil. Assim,
a Farsul projeta uma queda do
PIB brasileiro de 5,3% para 1,7%
em 2009.
Devido à dificuldade de acesso
ao crédito rural, houve redução
no uso de tecnologia no plantio.
A agricultura também sofreu o
impacto da queda nas exportações. Além disto, a produção de
soja, principal produto de exportação do Rio Grande do Sul,
teve redução de 17% no ano de
2008. “Com a crise, o mundo se
retraiu, por isso o Brasil está com
uma produção menor”, explicou
Sperotto em dezembro, ao fazer
um balanço do ano.
Porém, comparado aos outros
setores da economia afetados pela
crise mundial, o agronegócio está
otimista em relação às perspectivas para 2009. “O superávit das
exportações do agronegócio está
sustentando os outros setores”,
destaca o presidente da Farsul.
O otimismo é apoiado pelos
projetos do governo federal que
priorizam o combate à fome. “O
presidente Lula se elegeu com
programas como o Fome Zero e
se reelegeu com o Bolsa Família”,
sustenta. Em 2009, o mercado
interno pode ser a sustentação da
economia brasileira. A boa notícia
é que a população nunca deixará
de se alimentar, portanto, o agronegócio sempre será fundamental
à economia. “Produzimos o essencial: alimento”, diz Sperotto.
O agronegócio brasileiro foi
o principal responsável pelo
superávit comercial em 2008.
A perspectiva para a agricultura
em 2009 é preocupante, mas
ela não deixará de ser a base da
economia brasileira. “O campo
vai ser apenas mais um setor atingido pela crise ou será a salvação
para ela?”, questiona Sperotto.
A Farsul aposta no preparo e na
qualificação da mão-de-obra do
produtor rural, além do projeto
de armazenagem de grãos nas
propriedades para combater as
más perspectivas para 2009.
Farsul Divulgação
Da Redação
Encontro marcado: dia 2 de
março, segunda-feira, começam
as aulas na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Seis décadas após sua consolidação como universidade, a PUCRS
se preparou para atravessar a
primeira década do século XXI
e planeja o futuro para vencer os
desafios de uma época de incertezas mercadológicas, descobertas
científicas, afirmações humanas
e compromissos sociais.
Reitor desde 2004 e empossado para novo período de quatro
anos, em 9 de dezembro de 2008,
o irmão e doutor Joaquim Clotet
definiu os vértices de sua gestão:
qualidade com sustentabilidade,
inovação e empreendedorismo,
integração ensino-pesquisa-extensão, relacionamento com a
sociedade com responsabilidade
social e ações solidárias.
O reitor Clotet e seu vice, irmão e doutor Evilázio Teixeira,
foram empossados pelo arcebispo
metropolitano de Porto Alegre e
chanceler da Universidade, Dom
Dadeus Grings. A solenidade,
no prédio 40 do campus, contou
com a presença do presidente da
União Brasileira de Educação e
Assistência (Ubea), entidade Marista mantenedora da PUC, irmão
Lauro Francisco Hochscheidt. Na
mesma ocasião, foram nomeados
os pró-reitores e diretores da
instituição, alguns novos, outros
reconduzidos.
Em seu pronunciamento, Joaquim Clotet lembrou afirmação do
papa Bento XVI de que “a missão
da Universidade Católica vai além
da transmissão de conhecimento,
pois ela tem também uma exigência educativa”. A partir desta
ótica, a PUC gaúcha tem o compromisso de formar pessoas, e não
apenas profissionais, “capazes
de respeitar princípios e valores
imprescindíveis à construção de
uma sociedade justa e humana
em seus fundamentos essenciais”,
enfatizou Clotet. “Com esses sentimentos e muito ânimo, convidoos a vislumbrar o futuro, fazendo
com que o próximo período administrativo prossiga pautado
pelo esforço, trabalho, eficiência
e entusiasmo que caracterizaram
o quadriênio que estamos encerrando”. O reitor convocou a todos
para que a PUCRS seja ainda mais
pujante e “continue lidando pela
excelência do ensino, na pesquisa
e na extensão como universidade
comunitária, confessional católica e sob a orientação espiritual e
educativa marista”.
Matrículas e aulas
O período de matrículas na
PUC iniciou-se ainda em 15 de
dezembro com a chamada dos
aprovados no vestibular de verão.
Para preencher as 3.948 vagas
em 57 cursos, ainda pode haver
uma segunda chamada em 28 de
janeiro e uma lista de espera com
matrícula dois dias depois. Os
veteranos matriculam-se de 7 a 14
de janeiro, com datas e horários
marcados. Dia 28 de janeiro foi
reservado para as reuniões de professores, a critério das faculdades,
para planejamento de 2009.
Com o início das aulas, em
março, a Cidade Universitária volta a pulsar com seus 27 mil alunos
em 74 cursos da graduação, cinco
mil em 39 cursos de mestrado e
doutorado e mais 116 de especialização, 1.600 professores e dois
mil funcionários.
Complementações de matrículas estarão sendo recebidas de
3 a 13 de março. A recepção aos
calouros será nos dias 12 e 13 de
março. Bem-vindos.
Sperotto fez previsões para a safra 2009 em entrevista coletiva em dezembro
hipertexto
ambiente 7
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
Pró-Mata pesquisa e preserva a natureza
Três mil hectares de flora e fauna nativas na Serra à disposição de alunos e ecologistas
Fotos Divulgação /PUCRS
Por Juliana Arias
Um visual de encher os olhos
em plena Serra gaúcha. Este é
o cenário onde está instalado o
Centro de Pesquisas e Conservação da Natureza – Pró-Mata,
unidade vinculada ao Instituto
do Meio Ambiente da PUCRS.
A sede fica no município de São
Francisco de Paula, a cerca de
200 quilômetros da Capital. São
mais de três mil hectares com
flora e fauna nativas, paisagem
que encanta os visitantes.
O Instituto do Meio Ambiente
foi criado em 1998. A iniciativa
demonstrou uma posição de vanguarda da PUC gaúcha, enfatizou
o diretor Jorge Alberto Villwock,
doutor em Geociências. “A Universidade vem aliando a educação
à conscientização ambiental, para
promover um desenvolvimento
sustentável, em observância à
legislação, zelando pelos recursos naturais e pela melhoria da
qualidade de vida”, sublinha o
professor.
Há mais de dez anos, equipes
da universidade e de instituições
parceiras realizam trabalhos na
região. São pesquisas científicas,
projetos de conscientização ambiental e também atividades de
manejo sustentável. Tudo com
o objetivo de encontrar soluções
para preservar o meio-ambiente.
O Centro de Pesquisas é aberto à visitação dos alunos e funcionários da PUCRS e de instituições
conveniadas e oferece atividades
didáticas e científicas. A estrutura
do Pró-Mata conta com hospedagem para 40 pessoas com três
refeições diárias. Os visitantes
podem percorrer trilhas e conhecer a flora e fauna da região. “No
momento, a visitação é restrita
a comunidade universitária. No
entanto, a equipe gestora do centro prepara investimentos para
melhorar a capacidade de recepção, como a ampliação dos aloja-
A sede localizada em São Francisco de Paula é uma excelente escolha para quem pretende realizar trabalhos científicos relacionados ao meio ambiente
mentos e novas atividades para
receber também a comunidade
externa”, anuncia o coordenador
científico do projeto, professor
Cláudio Augusto Mondin, doutor
em Botânica.
No Pró-Mata, são desenvolvidos projetos de pesquisa científica.
Os estudos podem ser realizados
por acadêmicos e pesquisadores
vinculados à PUCRS ou a instituições conveniadas. Para participar,
é preciso solicitar autorização
para as atividades, com as informações sobre a pesquisa.
O formulário está disponível
no site www.pucrs.br/promata.
Outras informações na secretaria
do Instituto do Meio Ambiente da
PUCRS, fone: (51) 3320.3640.
Visitantes do Pró-Mata podem percorrer trilhas e conhecer a flora da região
Projeto prevê retirada de pinus da região
Por Giulia Perachi
Criado com o objetivo de tornar o Pró-Mata auto-sustentável,
o Projeto Pinus visa retirar os pinheiros da área e no lugar plantar
espécies nativas para a produção
de lenha. “A substituição dos três
hectares dessas plantas exóticas
pela Bracatinga acontecerá aos
poucos devido a preocupação com
preservação do local”, ressalva
Cláudio Augusto Mondin, responsável pelo projeto.
O cultivo de pinus vem aumentando devido a demanda das
indústrias de papel. “O problema
está no adensamento das árvores
e no grande número de hectares
abrangidos”, observa o professor.
Segundo ele, espécimes como os
pinus e os eucaliptos consomem
muita água e seu plantio causa
o empobrecimento do solo. “O
aumento da salinidade e da acidez
deixa a terra inutilizável”, garante
o pesquisador.
Embora seja uma alternativa
em termos de sustentabilidade, a
vasta plantação de árvores para a
produção de celulose vem sendo
encarada como um desafio ambiental. No Rio Grande o Sul, com
subsídio do governo, as papeleiras
estão promovendo a criação de
florestas artificiais, para a produção de madeira, incentivando
a iniciativa individual ou adquirindo campos mais arenosos,
com custo baixo, próprios para a
plantação de pinus e eucaliptos.
Apesar de estarem sendo deixadas
de lado as pastagens especiais, na
fronteira com Uruguai e Argentina, mais valorizadas e próprias
para a pecuária de alta qualidade,
as plantações de árvores avançam
nos campos. “Por possuir um
pampa rico e único em biodiversidade, o Estado corre o risco de
perder suas espécies endêmicas”,
alerta o pesquisador. Estudos indicam que na Argentina a mesma
situação fez com que houvesse
redução de água nos rios em 53%
e que 13% secassem.
Em contrapartida, a Amazônia
vem sendo desmatada, formando
campos para a criação de gado
de corte. O professor Mondin
trata o assunto como um paradoxo humano. “A Amazônia tem
caráter florestal. O solo é pobre.
O que mantém a floresta viva é
o ciclo em que as folhas caem, se
decompõe e fornecem nutrientes
necessários para o renascimento”,
argumenta. Em sua opinião, a
irresponsabilidade do homem
em relação à natureza causa a
degradação da terra e escassez
de alimentos indispensáveis para
sua sobrevivência. No caso do Rio
Grande do Sul, uma das ameaças
tem nome: pinus. Cláudio Mondin
partilha da opinião que a solução
mais eficaz é a conscientização
das pessoas, contudo, até que isso
aconteça, a maior parte do campo
será perdido.
Objetivos
Projetos da PUCRS de
Desenvolvimento Sustentável da Região Nordeste do Estado envolvem os seguintes temas:
auso e ocupação do solo
arecursos florestais, híbridos, costeiros e minerais
não energéticos
a ecossistemas e patrimônio biológico (biodiversidade)
aambiente em assentamentos humanos
aenergia e indústria
aarmazenamento geológico de CO2
8 Brasil
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
Uma tragédia
anunciada
Neiva Daltrozo/ AFP
Deslizamentos, casas tragadas
pela água, rodovias bloqueadas, falta
de alimentos. Nada é novidade lá
Por Mariana Lenz
“Cidades inundadas e pontes
destruídas: Governo de Santa
Catarina decreta Estado de Calamidade Pública”. Não seria
difícil imaginar essa manchete
estampando as capas dos jornais
de novembro de 2008, que destacaram os estragos e mortes causados pelas cheias na região do Vale
do Itajaí. No entanto, a frase em
questão foi publicada pelo Correio
do Povo há 34 anos, no dia 26 de
março de 1974, e evidencia que o
problema vivido nesse momento
e alvo da solidariedade de todo
o Brasil não é novidade para o
estado vizinho.
As enchentes já mataram mais
catarinenses do que o Furacão Catarina, que deixou quatro mortos
e sete desaparecidos em março de
2004. De 1980 a 2004, as águas
assolaram o Estado pelos menos
nove vezes de forma violenta e
desabrigaram mais de 800 mil
pessoas, e acordo com o “Atlas de
Desastres Naturais do Estado de
Santa Catarina”, elaborado pela
Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC) para o governo do Estado. Ainda segundo a
publicação, Blumenau registrou,
nos 24 anos pesquisados, 32
inundações.
Mas é possível ir ainda mais
longe: matéria do Diário Catarinense de 29 de novembro deste
ano divulgou uma carta escrita em
1856 pelo fundador da cidade de
Blumenau, Hermann Blumenau,
a um conselheiro do Império. No
documento, que consta no livro
“Imigrantes 1748-1900: Viagens
que descobriram Santa Catarina”,
de Mariléa e Raimundo Caruso,
o alemão descreve uma enchente
ocorrida em 1855, em que o rio
Itajaí-Açu ficou 15 metros acima
do nível normal: “O rio alagou
quase todos os seus barrancos e
as casas neles estabelecidas, causando inúmeros males e prejuízos
diretos, tanto na colônia quanto
em todo o seu território habitado”, relata Blumenau na carta.
São diversas as razões que
podem tornar Santa Catarina
uma região propensa a sofrer
mais com sucessivas e violentas
inundações. “Esses eventos são
um somatório de fatores, como
altas taxas de precipitação mensal e diária, geologia, tipo de solo
e topografia, associados com a
ocupação humana de áreas muitas
vezes inadequadas”, explica o engenheiro agrônomo e professor de
Agrometeorologia da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC),
Marcelino Hoppe. Segundo ele,
o relevo de Santa Catarina, com
uma planície costeira seguida pela
Serra do Mar, amplia o problema:
“O ar úmido de encontro a essa
barreira orográfica se eleva, diminui de temperatura, condensa
e precipita”.
Se as catástrofes naturais
são difíceis de serem evitadas
por fatores físicos, há sempre a
possibilidade de reduzir as conseqüências de uma enchente com
a ação preventiva do homem. Hoppe acredita que o primeiro passo
é definir zonas de risco. Dessa
forma, seria possível realizar um
mapeamento de áreas apropriadas para habitação e evitar que
a população se instale em locais
de risco depois de tempestades
prolongadas. Enquanto isso não
é feito, Santa Catarina continua
colecionando tragédias como as
relatas a seguir.
Florianópolis,
1995
Em dezembro de 1995, nova
enchente afetou municípios do
sul de Santa Catarina, como Araranguá, Forquilhinha e Jacinto
Machado, além de Florianópolis.
No total, 40 pessoas morreram e
mais de 28 mil ficaram desabrigadas. Na Capital, a região mais
afetada foi a Bacia do Itacorubi,
onde ficam bairros residenciais
como Córrego Grande, Parque
São Jorge e Jardim Santa Mônica.
Nesse ano, Luciane Alexi
Freitas já morava em Porto Alegre, mas em 1991 ela viveu uma
situação parecida em Florianópolis. Depois de dias de chuva,
viu a água começar a invadir sua
casa e chegar na altura dos joelhos. “A água vem entrando e não
dá para explicar”, relembra.
Luciane foi resgatada junto
com os filhos – a mais nova, Luíza, com então três meses, estava
com catapora – por amigos que
chegaram em uma caminhonete.
Apenas seu marido, Mário, continuou na casa. De avião, Luíza
foi levada para Porto Alegre para
ficar com uma tia. “Retornamos
três dias depois e ficamos acampados na sala de casa, com o que
tinha sobrado. A água molhou
tudo, tudo, e a maioria das coisas não tinha mais conserto”,
relata.
Blumenau, 1983 e 1984
Tubarão, 1974
As cheias de março de
1974 atingiram 20% do Brasil, mas a pior situação foi em
Santa Catarina, em especial
no município de Tubarão,
no sul do Estado. O número
oficial de mortos chegou a
199, mas muitos permanecem desaparecidos. Cerca
de 65 mil pessoas ficaram
desabrigadas, o que na época
representava 85% dos habitantes, e faltaram gêneros de
primeira necessidade, além
de água potável.
Em dois dias de chuvas
ininterruptas, o rio Tubarão
subiu 10,22 metros acima
do normal. Nas ruas, a água
chegou a ficar 3 metros acima da calçada, alcançando a
marquise do Teatro Oscar.
No meio da noite de 24 de
março, moradores foram
surpreendidos pela chuva
que começou a entrar nas
residências com forte correnteza. Em entrevista ao jornal
Zero Hora publicada no dia
25, o lavrador Evaristo Mar-
Resgate às vítimas da tragédia ambiental em Santa Catarina
hipertexto
tins conta que acordou com o
barulho dos cavalos batendo
na parede de madeira: “Minha casa estava toda cercada
de água, como uma ilha”.
Muitas pessoas fugiram
para os telhados, onde esperaram pelo único helicóptero
disponível para o salvamento. A falta de comunicação da
cidade com o resto do país –
os telefones ficaram mudos,
os transmissores das rádios
foram danificados pela água
e as rodovias estavam quase
todas bloqueadas – dificultava a ajuda.
No dia 27, a chuva parou
e as águas começaram a baixar, deixando uma camada
de lodo de 30 centímetros
a 1,20 metros. Só então os
danos puderam ser contabilizados. O Correio do Povo
de 28 de março relata que
“a visão que se tem ao chegar a Tubarão, agora que as
chuvas cessaram, é de que a
cidade foi arrasada por uma
guerra”.
Cerca de 127 anos depois de
Hermann Blumenau relatar em
sua carta a enchente de 1855, o
município fundado por ele sofria
mais uma vez o mesmo desastre.
Em 1983, Blumenau passou todo
o mês de julho debaixo d’água,
quanto o rio Itajaí-Açu subiu
15,34 metros. Também foram
afetadas as cidades catarinenses
de Rio do Sul, União da Vitória,
Porto União, entre outras, além
do interior do Rio Grande do Sul.
Um ano depois, um dia de chuva
intensa destruiu o que já havia
sido reconstruído. Nos dois anos,
o saldo de mortos foi de 140 em
Santa Catarina e de 400 mil desabrigados na região Sul.
A bioquímica Heloísa Sporleder morava em Blumenau em
1983 com o marido, Stênio Vieira,
e o filho, Caio, então com seis
meses. “Foi horrível porque não
se esperava. Nossa casa ficava em
cima do morro e foi o primeiro
local a ter acesso fechado depois
que o rio transbordou”, conta.
Através de um atalho, a família
conseguiu chegar ao centro da
cidade, onde ficou hospedada com
amigos durante dez dias em uma
residência na parte alta: “Não
tinha luz, nem água, e o dinheiro
estava acabando. Eu olhava para
fora e enxergava só os telhados
das casas”. Enquanto a chuva não parava,
Vieira resolveu escrever um diário, que foi publicado na edição
de 20 de julho de 1983 da revista
Veja. Confira alguns trechos do
relato.
Dia 9: a cidade está um
caos. Não há energia. As rádios,
que promoviam um importante
serviço de comunicação e informação, silenciaram. Ninguém
sabe de nada. Começa a procura
desesperada de mantimentos.
Nem adivinhamos o drama dos
bairros mais baixos e afastados,
como Fortaleza, Itopava e outros.
Daqui de cima, vemos carros,
caminhões, ônibus, pavimentos
inteiros de casas e edifícios, árvores, tudo desaparecendo sob as
águas. A cidade está totalmente às
escuras. Silêncio absoluto.
Dia 11: procuramos reforçar
nossas reservas de mantimentos.
Começam a surgir comentários e
boatos de toda ordem. Mortos e
desaparecidos, os dramas mais
variados, saques e roubos. Já
estamos utilizando água de uma
cisterna improvisada em uma
calha pluvial. O racionamento
dos alimentos é controlado pela
polícia nos supermercados. Filas
para adquirir o que resta. Leite,
uma lata por família. À noite,
outra barreira que cai, desta vez
na casa de nosso amigo Chico,
que também tem de buscar abrigo
com um vizinho.
Dia 13: não há luz, não há
água, não há gás de cozinha, mas a
população se vira como pode. Uns
auxiliam os outros. Consegui chegar até a Prefeitura. Há ali uma
situação de penúria, pessoas recolhendo gêneros em extensas filas
enquanto outras dormem ali mesmo, acampadas – mas ouvi pouca
lamentação. Uma rádio da cidade
voltou ao ar e possibilita recados
e localização de familiares. Aqui
em casa, onde somos dois casais,
duas crianças e vizinhos, temos
feito racionamento de água, leite
e alimentação. Cozinhamos para
várias refeições, para economizar
gás. Higiene pessoal, a esta altura,
é irrelevante.
hipertexto
ciência 9
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
Ano da astronomia
Mundo olha para o céu em 2009
O físico e filósofo Matsuura fala sobre as descobertas do ser humano no cosmo
Por Cristiano Hoppe Navarro
2009, ano internacional da
astronomia. Telescópios serão
instalados em lugares públicos em
todo o mundo. O objetivo é trazer
de volta um hábito que já foi comum entre as pessoas: o de olhar
para o céu. E que com esse olhar
sobrevenha discutir a imensidão
cósmica da qual somos parte.
Oscar Toshiaki Matsuura sempre sentiu atração pelas coisas
do céu. Casualmente, acabou trilhando trajetória profissional na
astronomia, formando-se mestre
em rádio-astronomia solar e doutor em astronomia de cometas.
Até se aposentar como professor
associado em 1997, o filósofo e físico liderou o Grupo de Astrofísica
do Sistema Solar do Instituto de
Astronomia, Geofísica e Ciências
Atmosféricas da USP. Trabalhou
em seguida na divulgação e ensino básico de astronomia e em
história da astronomia no Museu
de Astronomia no Rio de Janeiro.
Foi Diretor do Planetário e Escola
Municipal de Astrofísica “Prof.
Aristóteles Orsini”, do Parque Ibirapuera, São Paulo e editor associado de Astronomy Brasil. Hoje é
representante da América Latina
junto ao Grupo de Trabalho “Arquivos” da Comissão 41 (História
da Astronomia) da União Astronômica Internacional.
Mesmo que o trabalho do
astrônomo hoje seja menos na
observação direta com telescópio
e mais na análise no computador das fotografias dos grandes
telescópios orbitais, ainda assim
sua matéria-prima principal é o
céu. Nesta entrevista exclusiva
ao Hipertexto, por e-mail, Matsuura discorre sobre as recentes
descobertas no espaço, como o
planeta extra-solar Fomalhaut B,
e avanços como os experimentos
da Mars Phoenix Lander em solo
marciano. Trata também do fundamental conceito da entropia e
revela que as atitudes mundanas,
dos humanos que habitam a terra,
também influenciam no estudo
do céu – seja na ideologia sobre
inteligência extraterrestre, seja
na longa história de obstaculizar
o conhecimento.
Quais os principais equívocos que atravancaram o
desenvolvimento da ciência
e da astronomia em toda a
história?
O equívoco que mais atravancou o desenvolvimento da ciência
ao longo da história foi o cultivo da
Divulgação/ pucrs
Visitas noturnas
No Observatório da PUCRS,
localizado no topo do prédio 8,
são possíveis observações à noite. Qualquer um pode agendar
visitas noturnas de duas horas,
formadas por uma hora inicial
de teoria no Laboratório de Astronomia e uma complementar
de observação celeste na cúpula,
que comporta até uma dúzia de
falsa auto-suficiência intelectual
através da adesão a uma doutrina
hegemônica tida como ortodoxa,
acompanhado do temor do uso da
razão considerado atividade proibida e pecaminosa. Esse equívoco
de postura, ligado a sectarismo e
pré-concepção, é bem diferente
dos equívocos cometidos eventualmente na própria busca do
conhecimento. Claro, a vontade
dos cientistas é a de sempre acertar. Mas, como cegos, eles tateiam
a natureza tentando descrevêla da melhor forma e lhe dar a
inteligibilidade possível. Seus
equívocos são parte integrante
da construção do conhecimento
científico. Um bom exemplo é o
sistema geocêntrico do mundo.
Foi pela crítica a esse modelo que
surgiu o sistema heliocêntrico: um
modelo que descrevia o universo
com mais fidelidade, coerência e
abrangência.
O que é a entropia?
Entropia é o conceito central
da 2a. Lei da Termodinâmica.
Essa lei expressa a idéia de que
pessoas. Gratuitas, as visitações
ocorrem nas segundas, quartas
e sextas-feiras, mediante um
contato prévio via site (www.
pucrs.br/fisica/astronomia). Adicionalmente, há a
disciplina de Astronomia, subordinada ao Departamento
de Física na grade curricular da
universidade.
sistemas constituídos de muitas
partículas (p. ex., moléculas do
ar num recipiente de laboratório) tendem a evoluir ao longo
do tempo para estados cada vez
mais prováveis. Um estado mais
provável é aquele em que a configuração macroscópica do sistema,
caracterizada por parâmetros médios (p. ex., temperatura, pressão,
densidade etc), corresponde a
um número maior de microestados. Embora os microestados
sejam diferentes do ponto de vista
microscópico, não percebemos
nenhuma mudança no macroestado. O estado mais provável é o
de equilíbrio termodinâmico em
que não há mais possibilidade de
ocorrência de alteração macroscópica, inclusive de vida. O equilíbrio termodinâmico é o estado
derradeiro sinônimo de morte.
A 2a. Lei da Termodinâmica é
importante porque implica na inelutável evolução para estados em
que diminui a energia disponível
para a realização de mudanças
macroscópicas. Embora a 1a. Lei
da Termodinâmica afirme que a
energia se conserva, com o passar
do tempo há uma degradação da
energia de alta qualidade para
energia de baixa qualidade. A 2a.
Lei da Termodinâmica afirma que
essa degradação, a entropia, nunca decresce. Ela é cumulativa. Na
melhor das hipóteses permanece
constante. Se não, só aumenta.
Assim a entropia determina a
seta do tempo, direciona o fluir do
tempo do passado para o futuro
(e não vice-versa). É oportuno
popularizar a noção de entropia
nos dias de hoje. Afinal ela é
importante para a discussão dos
problemas ambientais e da proteção do meio ambiente. Curiosamente ela é utilizada também
na teoria da informação como
sendo medida da quantidade de
informação contida num signo de
comunicação.
Carl Sagan uma vez questionou: “Se há um contínuo
das moléculas que se autoreproduzem, como o DNA,
até os micróbios, e um contínuo da seqüência evolutiva
dos micróbios até os seres
humanos, por que devemos
imaginar que o contínuo pare
nos seres humanos?”. Qual
sua posição a respeito da inteligência extraterrestre?
A emergência do homem faz
parte da evolução da vida. No
teatro cósmico representamos o
nosso papel aqui e agora como
personagens efêmeros. Seria muita presunção nossa imaginar que
somos personagens eternos ou do
grand finale da evolução cósmica.
Por isso acredito que estamos
fadados a desaparecer para ceder
lugar a herdeiros de nossos genes
que poderão desenvolver faculdades muito mais estranhas e misteriosas do que a nossa inteligência.
Afinal a evolução é pontuada por
descontinuidades, verdadeiras
transições de fase ou emergências
do “novo” ou do imprevisível.
Como disse Haldane, “a vida não
é mais extravagante do que imaginamos; ela é mais extravagante do
que somos capazes de imaginar.”
Por isso mesmo, se não queremos
nos equivocar, é bom conceber a
inteligência extraterrestre sem
“chauvinismo terrestre”.
O que 2008 trouxe de
importante em termos de
avanços e descobertas na
astronomia?
Ultimamente os avanços e
descobertas da astronomia vêm
aumentando exponencialmente
e, com isso, até se trivializaram.
Hoje não causa mais impacto a
descoberta de um novo planeta
extra-solar ou de uma nova lente
gravitacional. Mas recentemente
foram apresentadas fotografias
diretas de um sistema extra-solar
(HR 8799) em infravermelho e de
um planeta extra-solar (Fomalhaut b) na luz visível. A elusiva
matéria escura foi mapeada em
aglomerados de galáxias com
base na deformação da imagem de
galáxias distantes, resultante do
desvio da luz causado pela matéria
escura. Esse estudo permite investigar o comportamento da matéria
escura quando aglomerados de
galáxias colidem e, assim, lança
uma luz sobre a sua natureza
ainda desconhecida. Foi também
este ano que a missão Mars Phoenix Lander realizou experimentos
para estudar a história da água e
o potencial de habitabilidade no
solo do ártico marciano. O importante é que essa foi a primeira
missão da NASA dentro da filosofia de ampliar ou complementar
grandes missões evitando despesas com esforços redundantes.
Este ano foi também lançado o
telescópio espacial Glast para
fazer observações em raios gama
com grau inédito de detalhamento. Há um mês foi lançado
o IBEX para estudar a interação
do vento solar com o meio interestelar nas últimas fronteiras do
sistema solar. Estes são apenas
alguns exemplos apanhados ao
acaso de diferentes áreas. Tudo
é igualmente importante como
tijolos na construção de uma casa.
Já há uma publicação anual dos
principais avanços e descobertas
da astronomia. Publicada pela
Springer ela se chama State of the
Universe.
E o que podemos esperar
de 2009?
Será o Ano Internacional da
Astronomia. Dedicado à celebração da astronomia como conquista
humana, marca o quarto centenário da primeira observação astronômica ao telescópio por Galileu e
a publicação de Astronomia Nova
de Kepler. As mais recentes descobertas da astronomia deverão ser
popularizadas e a importância da
astronomia na educação científica
deverá ser sublinhada. Para nós,
brasileiros, a grande novidade
será a realização pela primeira
vez em nosso País da Assembléia
Geral da União Astronômica Internacional, no Rio de Janeiro,
de 3 a 14 de agosto.
10 solidariedade
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
Uma vida de cão
hipertexto
Camila Domingues/ Hiper
Casal Ceres e Acyr cuida de 172
cachorros em sítio de Viamão
Lívia Stumpf/ Hiper
Sinal vermelho social
Hora da esmola na sinaleira mostra a exclusão
Por Débora Ely Silveira
“Aqui é uma fartura. Farta
tudo: água, comida, remédios...”.
Ceres Moutinho, 48 anos, usa o
bom humor para lidar com a difícil situação que vive. Em parceria
com o marido, Acyr Martins, 49
anos, cuida de 172 cachorros no
seu sítio em Viamão. Este número
aumenta a cada semana devido às
dezenas de doações de filhotes e
outros cães que o casal recebe.
Eles abandonaram a
vida social, a família e os amigos
para cuidar dos cães. Os salários
da professora estadual Ceres e
do funcionário do Trensurb Acyr
são os recursos que possuem
para manter os animais. Com o
intuito de tirá-los das ruas, o casal
abriga no sítio qualquer cão abandonado. Independente de raça,
idade ou sexo, recebem o mesmo
tratamento. “Mesmo na difícil
condição que vivemos, podemos
dar carinho e conforto aos cães.
É melhor do que estivessem nas
ruas”, declara Acyr.
O casal enfrenta dificuldades
devido à falta de recursos. Diariamente, acordam às 4h30min para
limpar os canis e alimentar os
cães. Voltam do trabalho à noite
e usam o tempo livre para tratar
os animais. “Nunca imaginei que
iríamos chegar a essa situação”,
lamenta Ceres.
A paixão pelos bichos começou
quando Ceres ganhou um poddle,
o Infante, que ela tratava como filho. Quando ele morreu, sua dona
ficou muito deprimida. O casal já
namorava e Acyr a presenteou
com um filhote. De uma hora para
outra, eles tinham quatro cães no
apartamento na Rua da Praia, no
Centro de Porto Alegre.
Ceres e Acyr se mudaram
para uma casa em Esteio, onde
passaram a cuidar de 33 cachor-
ros, todos recolhidos da rua. Por
onde passavam, sofriam pressão
de vizinhos insatisfeitos com a
quantidade de cães, os cheiros e
os latidos.
Apelo por doações
Foram para o sítio de Viamão em 2005. Adotaram mais
cachorros de rua, até atingir 172
cães. Somente em ração, gastam
R$ 2.500 por mês. Em julho de
2008, a situação chegou ao limite. Desesperados devido à falta
de dinheiro para a alimentação,
o casal lançou uma campanha
pedindo a doação de ração. Sempre no último final de semana do
mês, eles comparecem à Usina do
Gasômetro para renovar o pedido.
A divulgação por e-mails também
ajudou e a resposta das pessoas
foi boa. “Descobrimos que ajuda é
uma palavra mágica”, contam.
As doações aliviaram temporariamente a situação. Desde o
início da campanha, a alimentação dos cachorros é garantida graças à solidariedade. Entretanto,
vacinas, remédios e abrigos são
necessidades prementes.
Apesar da boa vontade de
Ceres e Acyr, não é mais possível
cuidar de tantos cachorros porque
o casal já acusa problemas de
saúde devido ao desgaste. “Precisamos doar cachorros para dar
qualidade de vida para eles e para
nós”, desabafa Ceres. Entretanto,
quanto mais eles ficam conhecidos, mais cachorros chegam ao
sítio, o que agrava a situação.
A professora trata cada animal
como se fosse único. Chama pelo
nome e alguns têm até apelido. A
Declaração Universal dos Direitos
dos Animais afirma que “cada animal tem direito à consideração, à
cura e à proteção do homem”. É
isso que Ceres e Acyr procuram
garantir aos seus filhos caninos.
Por Maurício Círio
Um homem de moletom abarrotado, boné sujo e calça dobrada
até a metade da canela caminha
descompassado sobre as linhas
da faixa de pedestres. As pessoas
atravessam a rua com pressa,
desviando-se do indivíduo. Os
motoristas torcem para não serem
importunados com mais pedidos
de esmola. Ele parece estar bêbado, ou sob efeito de drogas, pois
não aparenta medo nenhum de
ser atropelado, quando o sinal,
finalmente, se torna verde.
Tal cena é comum e pode ser
vista nas mais movimentadas
sinaleiras de Porto Alegre, por
diversos outros protagonistas.
Debaixo do arroio Dilúvio, no
cruzamento da avenida Ipiranga
com a Salvador França, vivem
alguns moradores de rua. Outros
preferem dormir sob o abrigo das
paradas de ônibus. É uma área
de grande movimentação, pois
fica entre a PUCRS (Pontifícia
Universidade Católica) e o shopping Bourbon Ipiranga. Dados da
Empresa Pública de Transporte e
Circulação (EPTC) mostram que,
durante 24 horas, registra-se quase 70 mil passagens de veículos
sob os semáforos do cruzamento.
É muita gente dividindo o mesmo
espaço, o que salienta os contrastes sociais. Nas paradas de ônibus,
uns de salto, outros descalços.
O professor
A população já não se choca
mais, e os miseráveis se acomodaram. É o que pensa Hermílio
Santos, professor de sociologia
da PUCRS. Para ele, “a sociedade
os considera inúteis, e por isso
muitos deles acreditam, e passam
a se considerar assim”. O estudioso, ao se dirigir ao carro que
o conduzirá de volta para casa,
depois de uma aula de sociologia
à noite, lamenta: “Eles têm um
sentimento de que ‘nada vale o
esforço’. Ao mesmo tempo em que
eles sentem essa desmotivação
pessoal, a sociedade se mostra
incapaz de absorvê-los com suas
limitações”.
Por outro lado, há quem garanta: muitos daqueles que pedem dinheiro nas sinaleiras possuem moradia. “Vários que estão
ali pedindo têm casa“, revela Eder
Lidiomar Paivas Pass, um homem
humilde, de 28 anos, que se sustenta vendendo paçoquinhas,
cocadas e pés-de-moleque. Com
sua carrocinha e seus petiscos,
ele caminha todo dia pela Ipiranga e diz conhecer a realidade
dos mendigos. “Conheço eles. A
maioria está ali por que quer”,
garante. Eder, que já trabalhou
também em obras como pedreiro,
acredita que esta é uma situação
sem volta: “Trabalho é o que não
falta, mas pra eles é mais fácil
ficar pedindo dinheiro. A gente
até tenta ajudar, mas eles voltam
pra rua, não adianta”, e completa:
“Pra eles saírem dali, só morrendo
ou indo pra prisão”.
Entretanto, para o sargento
Vitor Guimarães, do 4º RPMON,
colocar no presídio não é a solução. Segundo ele, os presídios de
Porto Alegre estão lotados, e não
há Brigada Militar para tantas
ocorrências: “Não têm cadeia,
nem trabalho para todos. Mesmo
se construírem quatro presídios,
os quatro vão lotar e ainda vai
existir o problema”. Os procedimentos recomendados aos militares são de retirar os mendigos
da via, revistá-los, procurar por
drogas, e verificar a carteira de
identidade. Se estiver tudo em
ordem, o mendigo é liberado, se
não, é encaminhado para a prisão.
Porém, para evitar a superlotação
nas cadeias, eles são condenados a
penas alternativas, que vão desde
cumprir em liberdade à realização
de trabalhos comunitários.
De acordo com Vitor, foragidos da prisão e usuários de
drogas são figuras freqüentes
nas sinaleiras, e a população sabe
bem disso. É por isso que muitos
mendigos ganham na insistência
algumas moedas. “O motorista, às
vezes, dá dinheiro mais por medo
de ser assaltado do que por pena”,
acredita Bitelo Chaves, fiscal de
trânsito da EPTC. Os únicos que
parecem não ser importunados
pelos mendigos são os taxistas.
Ernesto Spinder revela o porquê:
“Nós, taxistas, não somos incomodados, pois temos um trato de
nunca dar esmolas”.
Apesar de não ter poder nenhum para efetuar prisões, Bitelo
conta que pessoas já o abordaram
para denunciar assaltos. O cruzamento Ipiranga/Salvador França
é uma das áreas da capital onde
mais ocorrem furtos a pedestres.
O azulzinho atribui tanta violência
às drogas. Ele afirma, inclusive,
que já viu um casal bem vestido
esgueirando-se para debaixo do
viaduto, provavelmente, em busca
de crack. “Todo mundo sabe onde
são os pontos de droga, só que
ninguém faz nada. Essa é a real”,
critica Bitelo. O consumo de crack
cresceu nos últimos três anos, se
tornando o pior problema de saúde pública do Rio Grande do Sul.
Dados da Secretaria Estadual da
Saúde (SES) apontam que a cada
mil gaúchos, aproximadamente
cinco são usuários de pedra, equivalente a 50 mil dependentes. Tal
problema é refletido no cotidiano
com violência, constrangimento,
desespero e desigualdade.
Empurra daqui, empurra de
lá. Não há prisão para todos, não
existe aceitação e inclusão social,
o aumento do uso de drogas está
incontrolável e, para completar, o
mendigo não quer sair das ruas.
Trata-se de um crime perfeito a
uma sociedade de mãos para o ar
diante do sinal vermelho.
hipertexto
entretenimento 11
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
Arte popular
aos domingos
em Porto Alegre
Fotos Paula Tanscheit/ Hiper
Artistas são presença constante
nos parques aos finais de semana
Por Luísa Silveira
Inteligentes, talentosos, cada
um no seu estilo e cheios de história. São os artistas dos parques
que todos domingos representam
o lazer dos passantes devido às
suas características. Chamam a
atenção dos que estão buscando
um pouco de paz nos fins de semana, tentando fugir da correria
do dia-a-dia em Porto Alegre.
Pessoas vêm de longe prestigiar
seus trabalhos que caracterizam
o cenário cultural da cidade.
São palhaços, atores, pintores, artesãos, cada um na sua
função, viajam por diversos lugares, deixando seu trabalho à
mostra, e seu espaço reservado
em Porto Alegre, tendo a mesma
repercussão do início da atividade. “Isso mostra que mesmo com
a tecnologia de hoje, tudo isso não
foi perdido, não foi esquecido”,
afirma o artesão Marcelo Tcheli.
Ele faz teatro de bonecos em miniatura, partindo do princípio do
Artistas acreditam no destaque do artesanal e na expressão da sua cultura
Apesar dos avanços tecnológicos, as apresentações em locais públicos continuam chamando a atenção
cinema mudo. Assegura ser muito
gratificante receber a admiração
de quem vem de longe assistir
seu trabalho e também daqueles
que já conhecem e continuam a
admirar.
Os palhaços são a alegria, o
teatro é a arte por si só, as estátuas vivas representam a beleza
escondida por trás de tanta vida
em movimento. A maioria dos
artistas vive apenas das exibições,
dependendo da reação das pessoas que colaboram ou não diante
das performances. “É a beleza,
a paz, um cara que fia durante
oito horas expondo sua individualidade, merece ser retribuído”,
disponibiliza-se a colaborar com
os artistas de rua, Denise de Azevedo, turista de Goiânia em passeio com a mãe Lurdes no parque
da Redenção.
Em uma hora de caminhada,
escuta-se o som ambiente daqueles que se utilizam da música para
mostrar sua arte, o sino da igreja
e as conversas paralelas. Tudo
isso contribui para construir a
cada domingo o cenário de Porto
Alegre que muitos admiram. Estes
personagens da cultura acreditam
no seu próprio trabalho e acham
que o artesanal não deve ser
perdido apesar da expansão e do
predomínio da tecnologia.
cercar ou não os parques?
A circulação nos parques
da cidade com segurança, permitindo o desenvolvimento de
atividades culturais e físicas, é
sempre um assunto recorrente.
Alguns defendem que as áreas
de lazer deveriam ser cercadas,
como na Alemanha, outros são
contra e apresentam pesquisa
em que a população teria se
posicionado contrária.
No bairro Jardim Europa,
próximo ao shopping Iguatemi,
surgiu um novo parque já cercado, ao estilo alemão. O parque Harmonia – um dos mais
tradicionais da capital gaúcha
– também é isolado. O cronista
Paulo Sant´Anna, de Zero Hora,
defende há anos a ampliação
da medida à Redenção. Os
opositores entendem que os
parques existentes deveriam
ficar da maneira como estão.
Eles defendem o lazer aberto ao
público, com programações de
cultura, entretenimento e atividades físicas em convênio com
academias, sem custo algum às
pessoas que freqüentariam os
parques com segurança garantida pelo poder público.
Alegria em festas públicas depende de cuidados com a segurança
Por Débora Ely e Luiza Carneiro
Verão, carnaval, formaturas.
Não faltam motivos para comparecer a animadas festas. Quando
há aglomeração de pessoas e bebidas à vontade, um desentendimento pode ser o estopim de uma
grande confusão. Se o tumulto
crescer, pode se tornar uma tragédia com perdas de vidas. Foi o
que aconteceu com o jovem Igor
Carneiro, de 18 anos, atingido por
uma bala perdida em uma festa na
Capital, em outubro de 2008.
“A população age passivamente em meio à guerra civil que
vivemos”, reclama Corina Breton,
presidente do Instituto Chega de
Violência. A escassez de políticas
públicas de segurança afeta toda
a sociedade. “A maneira como os
jovens agem também contribui
para a expansão da violência”,
acrescenta José Rocha, sócio da
Squadra, empresa de consultoria em segurança que organiza
eventos.
Em Porto Alegre, os casos de
homicídios cresceram 19% nos
últimos anos. A cidade ocupa
a 12ª posição no ranking das
capitais mais violentas do País,
conforme dados da Brigada Militar. As razões para o aumento
de casos violentos são diversas.
O baixo investimento do poder
público em segurança é um dos
motivos. O consumo e o comércio de drogas, lícitas ou ilícitas
também são fatores relevantes.
Segundo a Constituição de 1988,
o Governo Estadual é responsável
pela segurança do cidadão, por
meio das polícias Civil e Militar.
“A sociedade civil tem que se
movimentar para exigir eficiência no combate à criminalidade”,
enfatiza Corina.
Vencer a passividade
Para romper com a atitude
passiva das pessoas frente à
realidade, foi criado o Instituto
Chega de Violência que nasceu da
iniciativa de três pessoas: Corina
Breton, Helena Ibañez e Mathias
Nagelstein. Após a morte de um
conhecido, resolveram protestar
e pedir medidas de proteção mais
eficazes e pela paz. Há três anos
realizam eventos, como caminhadas e protestos, além de encontros
em que a segurança é discutida.
O trabalho é voluntário, a
ONG sobrevive de doações e realiza projetos em comunidades
carentes com psicólogos especializados, estimulando a cidadania
e o discernimento entre o certo
e o errado. Contam com a ajuda
da polícia e da Brigada Militar e
executam o projeto Vizinhança
Segura, que recebe apoio da Prefeitura. “Construímos junto da
Prefeitura, e damos alguma ajuda
para os guardas municipais”, explica Corina.
Após a morte do estudante
Igor Carneiro, devido à bala
perdida em festa, familiares e
amigos revoltados se mobilizaram
e lançaram campanha para que
haja fiscalização dos eventos e organização mais criteriosa. Assim,
surgiu a Ficar. “O objetivo da ONG
é orientar festas, principalmente
quando a bebida é liberada e a segurança insuficiente”, conta Jorge
Krug, um dos idealizadores.
O descaso das autoridades e
dos pais também contribui para
que tragédias continuem a acontecer. Além de estrutura falha e
superlotação, em muitas festas
são servidas bebidas a menores de
idade. “Os organizadores montam
festas com o objetivo de ganhar
dinheiro, há um controle mínimo.
A Ficar não quer a proibição das
festas, mas, sim, o controle. É preciso ter regras”, propõe Krug.
Raiz da violência
“Os casos violentos aumentaram e na maioria deles há jovens
envolvidos”, lamenta o tenentecoronel Leo Emar da Cunha,
chefe do Serviço de Inteligência
da PM. Até dezembro de 2008,
160 jovens haviam sido mortos
no ano apenas em Porto Alegre.
Entre os bairros mais perigosos
estão Rubem Berta e Sarandi. A
principal causa das mortes na
faixa dos 15 aos 29 anos é o uso de
drogas. “Tem-se feito grandes trabalhos para coibir o tráfico, mas
é necessário um esforço maior da
sociedade”, conclama o oficial.
12 ponto final
Porto Alegre, janeiro-fevereiro 2009
Cada vez mais
Internacional
hipertexto
Neco Varella / AFL
Conquistou todos os títulos possíveis
Por Paula Tanscheit
Os últimos 120 minutos que antecederam a conquista do único título que faltava
no armário do Beira-Rio foram intermináveis. Toda a tranqüilidade e qualidade que
o time apresentou no primeiro jogo contra
o Estudiantes, em La Plata, na Argentina,
parecia ter ficado por lá mesmo. Porém, o
destino do Internacional já estava definido.
Foi sofrido e suado, mas, a poucos meses do
seu centenário, a torcida pôde comemorar
e gritar: Campeão de tudo.
Estádio lotado, 51.803 sócios. Festa
preparada para assistir o que acreditavase ser uma partida sem muitas surpresas
e, quem sabe, muitos gols. Com a vitória
por 1 a 0 em La Plata, o time do técnico
Tite podia até ceder a um empate. Porém,
a noite não era das melhores. Com Alex,
D’Alessandro e Nilmar, as grandes estrelas
do time apresentando uma atuação atípica,
e sem a garra de Guiñazu, expulso no primeiro jogo, e a firmeza de Índio, lesionado,
o Inter parou diante do Estudiantes.
Assim como o time, a torcida também
passou por momentos tensos. O grito e a
festa que transformaram o Beira-Rio em
um caldeirão na entrada dos jogadores
em campo cedeu espaço ao nervosismo e
à apreensão. A torcida argentina presente
do estádio, 2.500 pessoas, não parou de
pular e cantar ao ver que o seu time dava
trabalho ao Colorado. Com o meio-campo
melhor organizado, o Estudiantes avançava com perigo. No entanto, se os craques
não estavam colaborando, sobressaiu-se a
qualidade do zagueiro Danny Morais, que,
juntamente com Álvaro, Bolívar e Marcão
garantiram um bom sistema defensivo.
Após o gol de Alayes, aos 20 minutos do
segundo tempo, o colorado ficou paralisado. Sem Alex, substituído aos 34 minutos
por Taison, veio a prorrogação. Mas, se o
Internacional já estava sem sua estrela, foi
a vez do Estudiantes perder a sua: Verón, já
cansado, foi para o banco. A partir daí o ataque passou a ser do Inter. Até que, aos 8 minutos já do segundo tempo, D’Alessandro
cobra escanteio, Danny cabeceia, o goleiro
defende, bola na trave, Gustavo Nery pega
o rebote, a bola passa na frente da goleira e
Nilmar manda para dentro, 1 a 1, campeão
sul-americano invicto.
Lucas Uebel / Vipcomm
Comemoração dos jogadores e comissão técnica após o primeiro lugar na Copa Sul-Americana
Campeão sul-americano invicto
O Internacional começou a Copa SulAmericana desacreditado. Ainda lutando
para chegar ao G4 do Brasileiro, que garantia a classificação à Libertadores de 2009,
ano de seu centenário, mas sem grandes
progressos na competição, o clube optou
por jogar a taça pan-americana com os titulares, colocando os reservas no nacional.
O primeiro adversário acabou por dar
uma maior motivação ao colorado. No clássico Grenal, o tricolor jogou com os reservas. O primeiro jogo, no Beira-Rio marcou
a estréia de D’Alessandro, mas terminou
em 1 a 1, sem muita emoção. Na casa do
adversário, outro empate por 2 a 2 garantiu
a classificação do Colorado. Nas oitavasde-final, diante de uma tênue melhora na
classificação do Brasileiro, desta vez foi
o Inter que lançou os suplentes contra o
Universidad Católica, Chile. O regulamento
contribuiu novamente. Depois do empate
de 1 a 1 no estádio adversário e o 0 a 0 no
Beira-Rio, os gaúchos se viram na frente do
seu maior desafio: o Boca Juniors.
Os argentinos já haviam eliminado o
Internacional da Copa Sul-Americana em
2004 e 2005. Porém, 2008 foi diferente.
No Beira-Rio, só festa. Estádio cheio e show
de Alex e D’Alessandro garantiram uma
grande vitória por 2 a 0. Na Bombonera,
apesar da pressão, Magrão abriu o placar.
Logo após Riquelme marca gol de pênalti.
Ainda assim o Inter continuou firme e
marcou o segundo gol através de Alex.A
semifinal contra o Chivas, do México, foi
um passeio e consolidou a boa fase colorada. No jogo de ida, em Guadalajara, com
gols de Alex e Nilmar, o time conquistou a
vantagem. Em Porto Alegre, em outra noite
inspirada, veio a goleada por 4 a 0.
Tcheco, jogador que liderou campanha do clube gremista no Campeonato Brasileiro de 2008
Grêmio está na
Libertadores
Vice-campeão brasileiro sai valorizado
Por Gustavo Lacerda
O Grêmio fez o que pôde na última
rodada do Brasileirão para, numa virada
dramática, passar o São Paulo e sagrar-se
campeão. Porém, a vitória por 2 a 0 em
cima do Atlético-MG, num Estádio Olímpico lotado, com 46 mil pessoas, não foi o
suficiente.
Precisava de uma mão do Goiás – ou
melhor, de um pé: do pé de Paulo Baier
que quase acertou, de letra, o canto de
Rogério Ceni, aos 19 minutos do primeiro
tempo, em Brasília. No Estádio Bezerrão,
São Paulo e Goiás definiam o rumo do
campeonato.
A 2.029 quilômetros, em Porto Alegre,
os torcedores gremistas eram onipresentes.
Apoiavam o time sem parar. Ao mesmo
tempo, não desgrudavam o ouvido do
rádio, concentrados na partida no Distrito
Federal. Foram ao delírio quando entenderam, por engano, que o Goiás havia
marcado um gol. Abalaram-se quando
Borges, três minutos depois do lance de
Paulo Baier, impedido, colocou a bola para
dentro e confirmou o título para o São Paulo. “Não tem coração que agüente. Ainda
mais assim, com gol ilegal”, lamentava-se,
aos prantos, o torcedor Raphael Gondar.
O intervalo do jogo foi melancólico no
Olímpico. Sem conseguir se impor em campo, o Grêmio ameaçou pouco e amargava
um empate sem gols com o Atlético-MG.
Para completar, o calor, que atingiu 35ºC,
fazia com que os presentes no estádio esvaziassem as águas e refrigerantes dos bares.
Enquanto isso, em Brasília, o São Paulo ia
para o segundo tempo tranqüilizado pelo 1
a 0 e pelo domínio exercido em campo.
Aos 12 minutos do segundo tempo,
Celso Roth sacou Rafael Carioca do time,
colocando Felipe Mattioni na ala direita. A
substituição gerou vaias da torcida. Entretanto, aos 15 minutos, o jogador avançou
pela grande área e foi derrubado por César
Prates: pênalti. Tcheco converteu, renovando o ânimo tricolor.
André Luis e Soares ainda entraram
no jogo, nos lugares de, respectivamente,
Helder e Marcel. Aos 37 minutos, Soares
cabeceou e ampliou a vantagem tricolor.
Chegando aos momentos finais da partida,
um provocativo avião sobrevoava o estádio
Olímpico com o escrito: “Inter campeão
de tudo”.
O jogo no Bezerrão havia começado
cerca de quatro minutos antes. Portanto,
quando o juiz Jaílson Macedo de Freitas
deu o apito final, acabando com a esperança tricolor, o duelo em Porto Alegre ainda
estava em andamento. Por cerca de dois
minutos, o estádio inteiro aplaudiu sem
parar, reconhecendo a boa campanha e o
esforço dos jogadores e da equipe técnica
do Grêmio. Comovido, Tcheco, findada a
partida, deu a volta olímpica empunhando
a bandeira do clube. “Só me resta agradecer
ao apoio dos torcedores”, afirmou.
O São Paulo ergueu a sua sexta taça em
campeonatos brasileiros (1977, 1986, 1991,
2006, 2007 e 2008), as três últimas, sob o
comando de Muricy Ramalho. Encharcado
pela chuva que caiu em Brasília, o treinador
desabafou: “Estive para sair, foi um ano
difícil. Mas a torcida sempre me apoiou e
decidi seguir com o meu trabalho”.
O Grêmio, com o vice-campeonato,
ficou com a vaga para a Libertadores deste
ano. Além dele e do São Paulo, Cruzeiro e
Palmeiras se classificaram para o torneio.
Suspeita de manipulação
Após uma denúncia feita pelo presidente da FPF (Federação Paulista de Futebol),
Marco Polo del Nero, a CBF (Confederação
Brasileira de Futebol) decidiu trocar a arbitragem da partida entre São Paulo e Goiás.
Segundo Del Nero, o clube paulista haveria
tentado manipular o juiz Wagner Tardelli.
A suspeita surgiu após uma secretária do
São Paulo ligar para uma secretária da FPF
para combinar a entrega de ingressos cortesia para o show da cantora Madonna. Na
conversa, haveria sido citado um envelope
para ser dado ao árbitro.

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