FILEVisao 2 Maio 2013
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FILEVisao 2 Maio 2013
SOCIEDADE TENDÊNCIA ...conhece as regras do jogo baduk (jogo de tabuleiro) ... sabe cozinhar kimchi, prato típico coreano UMA VERDADEIRA FÃ DE K-POP... ...domina algum vocabulário coreano ...pertence a clubes de admiradoras de várias bandas ... não perde as séries dramáticas protagonizadas pelos seus ídolos musicais GONÇALO ROSA DA SILVA ... pratica as coreografias das suas bandas preferidas K pop é este? Há cada vez mais adolescentes que trauteiam músicas sul-coreanas de manhã à noite. O fenómeno explodiu com Psy e o seu gangnam style, mas já movia centenas de portugueses, apaixonados pela cultura asiática POR SARA VAREDA O quarto de Mariana está forrado com posters de boys bands sul-coreanas. Diante da objetiva fotográfica, ela e as suas quatro melhores amigas ensaiam, com um misto de timidez e entusiasmo, poses e movimentos adotados pelos seus ídolos musicais. Numa pequena sala contígua ao quarto, contam que antes do sucesso mundial de gangnam style, do músico Psy, já vibravam com o K-pop – ou Korean pop, um estilo musical que abrange pop, electropop, r&b, hip-hop e rock, caracterizado pelos seus videoclips cheios de jogos de cores e pela grande aposta em elaboradas coreografias. Muito ativas nas redes sociais, Cláudia, Sara, Rute, Mariana e Diana, com idades entre os 18 e os 23 anos, assumem agora uma missão maior: querem promover e difundir 68 v 2 DE MAIO DE 2013 a cultura sul-coreana em Portugal. Esse esforço de dar a conhecer este país asiático a cada vez mais pessoas tem um objetivo escondido, admitem: «Somos parte interessada, uma vez que desejamos muito que se realize, num futuro próximo, o primeiro concerto do género em Portugal.» Para isso, pensaram, quanto maiores forem o interesse e a adesão do público, mais rapidamente o evento se concretizará. Cada uma destas cinco raparigas pertence a clubes de fãs de diferentes bandas, os quais promovem, através da internet, variadas iniciativas: flash mobs, sessões de culinária, demonstrações de artes marciais, aulas de coreano e de caligrafia. Como elas, existem registadas mais de mil fãs portuguesas. São muito empenhadas, com o profissionalismo de quem trabalha para uma empresa. Divul- gam, diariamente, notícias e videoclips dos artistas sul-coreanos e indicam os sites oficiais que vendem produtos com as marcas dos grupos musicais. Outra fã, Ana Medeiros, de 21 anos, administradora do blogue Nskpt, refere que, através do seu trabalho de divulgação, acaba por fazer publicidade ao kpopmart, uma loja online que vende artigos relacionados com o pop coreano (cds, calendários, séries, filmes, acessórios, etc.). Em Portugal, a embaixada da República da Coreia, embora não contribuindo financeiramente, estabelece parcerias com os sites dos fãs e ajuda na divulgação da cultura coreana. Cede, por exemplo, revistas, livros, Cds e DVDs, e anuncia quando abrem vagas para estudar no país. «São muito prestáveis», elogia Rute. As cinco amigas consomem, também, de enfiada, os famosos dramas televisivos – séries protagonizadas pelos membros das bandas, em tramas com poucas personagens e episódios. Rute e Ana já as traduzem do inglês para português e Sara conseguiu mesmo que a sua avó, de 80 anos, se juntasse ao restrito grupo de espetadores. Ana diverte-se com as histórias mas também com pormenores muito típicos destas séries, que recorrem, ainda mais do que o ha- SOCIEDADE TENDÊNCIA JOSÉ CARLOS CARVALHO Paixão Mariana, Cláudia, Sara, Rute e Diana querem divulgar em Portugal tudo o que sabem sobre as estrelas da Coreia do Sul bitual, às técnicas de «product placement» (colocação de produtos nas cenas, com fins publicitários), revelando em tom irónico: «Até as personagens mais pobrezinhas têm telemóveis de última geração.» Um sonho: trabalhar na Samsung Qualquer amante de K-pop que se preze domina, igualmente, vocabulário e expressões específicas da língua coreana. O léxico entra de tal forma no dia a dia que Cláudia até trata, às vezes, os seus pais por appa (pai) e omma (mãe). Já o sonho de todas é, senão trabalhar, pelo menos estudar na Coreia do Sul. Nem o elevado preço da viagem de avião para Seul e o nível de exigência nas escolas daquele país as demove. Rute, a mais faladora do grupo, diz mesmo que sonha, «desde muito nova», trabalhar na multinacional sul-coreana Samsung. Já foi a uma entrevista mas não conseguiu o lugar. Diz, contudo, que vai continuar a lutar por isso. Outro projeto que andam a magicar, com mais fãs, é a abertura de uma discoteca que passe exclusivamente música asiática. Enquanto tal não acontece, vão apurando a técnica de cozinhar kimchi, o mais característico acompanhamento coreano, uma receita de vegetais fermentados, que varia conforme os produtos cultivados em cada região da Coreia do Sul. Ana explica que aprendeu a prepará-lo através do Star Kitchen, um programa televisivo coreano, que convida vários artistas para prepararem pratos. Provando ser uma entendida na matéria, Sara constatou que o kimchi provado num restaurante coreano em Lisboa, não estava confecionado como no Oriente: «Era muito menos picante.» Rute que, durante alguns anos, viveu em Inglaterra, reforça a ideia, A COREIA EM PORTUGAL Como descodificar as letras de K-pop, aprender a fazer kimchi ou taekwondo APRENDER A LÍNGUA • Instituto Oriental de Lisboa • Instituto de Línguas da Universidade Nova de Lisboa • Universidade do Porto • Escola da Comunidade Coreana em Portugal (Colégio São João de Brito, Lumiar) APURAR A COZINHA • Workshops, no Museu do Oriente • Aulas no Ateliê Feed me • Goyo-ya (supermercados com produtos coreanos) DOMINAR AS ARTES MARCIAIS • Academia do Mestre Chung, Lisboa • Com Taekwondo (arte de defesa • pessoal); Haidong Kumdo (Arte Marcial da Espada) e Koryo Sooji Tchim (Acupuntura Coreana da Mão) Escola de Kuk Sool Won, Matosinhos afirmando que também os pratos dos estabelecimentos coreanos em Chinatown não são elaborados como no país de origem: «Os restaurantes adaptam as receitas consoante os gostos da população local.» Mas salienta que não saiu de lá totalmente desiludida porque, pelo menos, «deu para vislumbrar os rapazes giros que por lá andavam» – um comentário que provocou a risota geral e a corroboração imediata das outras amigas. Muitos suspiros se soltam, também, olhando para as telas de cinema, onde desfilam estes novos artistas de ar adolescente. Por cá, no último Fantasporto, foram exibidos três filmes coreanos: Pietá, de Kim-KiDuk, The Weight, de Jeon Kyu-Hwan, e The Grand Heist, de Kim-Joo-Ho. Embora completamente vidradas no mundo do K-pop, acusam as agências de entretenimento de explorarem os artistas, sujeitando-os a um exaustivo ritmo de trabalho. Rute conta, indignada: «A agência dos DSKB, um dos grupos de K-pop com mais sucesso, impôs aos artistas uma dieta à base de pão e água, durante uma semana, a fim de ficarem mais magros para uma produção fotográfica.» E acrescenta: «Eles têm que treinar coreografias muito intensas e aprender mandarim e inglês, desde muito novos», para uma mais rápida e eficaz promoção, tanto na Ásia como no resto do mundo. Sara entende que os artistas se prestam a estes tratamentos devido à feroz concorrência existente no universo pop coreano. Só em 2012, nota, lançaram-se 62 novos grupos. Com uma população de 48 milhões de habitantes e uma área ligeiramente maior que a de Portugal, a República da Coreia é hoje a 15.ª maior economia mundial e a exportação dos seus produtos culturais é uma grande aposta do Governo em funções. Por cá, o número de fãs não para de aumentar e, reflexo dessa tendência, a ZON e a MEO começaram, em fevereiro, a emitir o canal coreano KBS World. Nas rádios, já rola Gentleman, a nova música de Psy, que sucede ao epidémico gangnam style. Para alguns, a nova música é uma desilusão. Mas o certo é que o artista coreano se mantém firme no caminho do sucesso: nas 24 horas seguintes ao lançamento, a 13 de abril, o vídeo da nova música foi visto por mais de 20 milhões de pessoas – um novo recorde absoluto no YouTube. 2 DE MAIO DE 2013 v 69