Revista de Pediatria - SOPERJ Sociedade de Pediatria do Estado

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Revista de Pediatria - SOPERJ Sociedade de Pediatria do Estado
Revista de Pediatria
Revista da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro
Ano 10 - N° 1 • junho 2009
ISSN 1676-1014
Revisões em Pediatria
Dislipidemias na Infância e na Adolescência: um caso de saúde pública?
Maria Cristina Brito Faulhaber, Márcia Antunes Fernandes, Maria de Marilacc Lima Roiseman e Walter Taam Filho__ 4
O ensino da puericultura e da pediatria no Rio de Janeiro: a propósito do bicentenário da Faculdade
de Medicina da UFRJ
Clemax Couto Sant Anna__________________________________________________________________________ 16
Doença de von Gierke: estudo de revisão
Frederico Henrique Salles Nunes___________________________________________________________________ 21
Relato de Caso
Dificuldades no Diagnostico e Manejo da Acidemia Metilmalônica - Relato de Caso Sugestivo
Raphaella de Oliveira Cunha Trindade, Raquel Siqueira Leonel de Paula, Carlos Alberto Bhering e
Isaias Soares de Paiva ____________________________________________________________________________ 28
Ponto de vista
Glicogenoses: uma visão geral para o pediatra
Célia Regina Moutinho de Miranda Chaves____________________________________________________________ 35
Resumos de Teses e Dissertações
Nível Plasmático de Lactato nas primeiras 24 horas de vida e Morbimortalidade Neonatal
Aurora: Herminia Guimarães Couto Fernandez, Orientador: Adauto Dutra Moraes Barbosa_____________________ 38
Avaliação dos Níveis Séricos da Proteína C-Reativa na Infecção Neonatal
Autor: Suyen Heizer Villela, Orientador: Adauto Dutra Moraes Barbosa, Co-orientador: Alan Araújo Vieira_________ 39
O primeiro ano
de vida
dura para
sempre.
Na ausência do leite materno, a fórmula infantil é o substituto adequado para a alimentação do lactente, durante o primeiro ano de vida.9
Programação
metabólica
Desenvolvimento
cerebral
Amadurecimento
imunológico
A programação metabólica indica a relação entre as experiências
nutricionais e metabólicas no período crítico do desenvolvimento
e as doenças que surgem na idade adulta a partir de mecanismos
biológicos adaptativos.1
A proteína exerce papel fundamental na programação metabólica,
já que o consumo excessivo deste nutriente no primeiro ano de vida está associado
a um ganho acelerado de peso nessa fase e obesidade na vida adulta.2-8
Nestlé Nutrition: Expertise em Nutrição Infantil
Tecnologia exclusiva no desenvolvimento de fórmulas infantis
com proteína otimizada.*
Referências Bibliográficas: 1. Motta MEFA, Araújo CMT, Silva GAP. Bases Conceituais da Alimentação da Criança; Temas de Pediatria n° 84; 2008: 18p. 2. Günther AL et al. Early protein intake and later obesity risk: which protein sources at which time points throughout infancy and childhood are important for body mass index and body fat
percentage at 7 y of age? Am J Clin Nutr. 2007 Dec;86(6):1765-72. 3. Karaolis-Danckert N, et al. How early dietary factors modify the effect of rapid weight gain in infancy on subsequent body-composition development in term children whose birth weight was appropriate for gestational age. Am J Clin Nutr. 2007 Dec;86(6):1700-8. 4. Stettler
N, et al. Weight gain in the first week of life and overweight in adulthood: a cohort study of European American subjects fed infant formula. Circulation. 2005 Apr 19;111(15):1897-903. 5. Günther AL, et al. The influence of habitual protein intake in early childhood on BMI and age at adiposity rebound: results from the DONALD Study.Int J Obes
(Lond). 2006 Jul;30(7):1072-9. 6. Rolland-Cachera MF, et al. Influence of macronutrients on adiposity development: a follow up study of nutrition and growth from 10 months to 8 years of age. Int J Obes Relat Metab Disord. 1995 Aug;19(8):573-8. 7. Karaolis-Danckert N, et al. How early dietary factors modify the effect of rapid weight gain in
infancy on subsequent body-composition development in term children whose birth weight was appropriate for gestational age. Am J Clin Nutr. 2007 Dec;86(6):1700-8. 8. Hoppe C, et al. High intakes of milk, but not meat, increase s-insulin and insulin resistance in 8-year-old boys. Eur J Clin Nutr. 2005 Mar;59(3):393-8. 9. American Academy of
Pediatrics, Committee on Nutrition. Formula Feeding of Term Infants. In: Pediatric Nutrition Handbook. 5th ed, 2004; pp 87-97.
NOTA IMPORTANTE: AS GESTANTES E NUTRIZES PRECISAM SER INFORMADAS QUE O LEITE MATERNO É O IDEAL PARA O LACTENTE, CONSTITUINDO-SE A MELHOR NUTRIÇÃO E PROTEÇÃO PARA ESTAS CRIANÇAS. A MÃE DEVE SER ORIENTADA QUANTO À IMPORTÂNCIA DE UMA DIETA EQUILIBRADA NESTE PERÍODO E QUANTO À MANEIRA
DE SE PREPARAR PARA O ALEITAMENTO AO SEIO ATÉ OS DOIS ANOS DE IDADE DA CRIANÇA OU MAIS. O USO DE MAMADEIRAS, BICOS E CHUPETAS DEVE SER DESENCORAJADO, POIS PODE TRAZER EFEITOS NEGATIVOS SOBRE O ALEITAMENTO NATURAL. A MÃE DEVE SER PREVENIDA QUANTO À DIFICULDADE DE VOLTAR A AMAMENTAR
SEU FILHO UMA VEZ ABANDONADO O ALEITAMENTO AO SEIO. ANTES DE SER RECOMENDADO O USO DE UM SUBSTITUTO DO LEITE MATERNO, DEVEM SER CONSIDERADAS AS CIRCUNSTÂNCIAS FAMILIARES E O CUSTO ENVOLVIDO. A MÃE DEVE ESTAR CIENTE DAS IMPLICAÇÕES ECONÔMICAS E SOCIAIS DO NÃO ALEITAMENTO AO
SEIO – PARA UM RECÉM-NASCIDO ALIMENTADO EXCLUSIVAMENTE COM MAMADEIRA SERÁ NECESSÁRIA MAIS DE UMA LATA POR SEMANA. DEVE-SE LEMBRAR À MÃE QUE O LEITE MATERNO NÃO É SOMENTE O MELHOR, MAS TAMBÉM O MAIS ECONÔMICO ALIMENTO PARA O LACTENTE. CASO VENHA A SER TOMADA A DECISÃO
DE INTRODUZIR A ALIMENTAÇÃO POR MAMADEIRA É IMPORTANTE QUE SEJAM FORNECIDAS INSTRUÇÕES SOBRE OS MÉTODOS CORRETOS DE PREPARO COM HIGIENE RESSALTANDO-SE QUE O USO DE MAMADEIRA E ÁGUA NÃO FERVIDAS E DILUIÇÃO INCORRETA PODEM CAUSAR DOENÇAS. OMS – CÓDIGO INTERNACIONAL DE
COMERCIALIZAÇÃO DE SUBSTITUTOS DO LEITE MATERNO. WHA 34:22, MAIO DE 1981. PORTARIA Nº 2.051 – MS DE 08 DE NOVEMBRO DE 2001, RESOLUÇÃO Nº 222 – ANVISA – MS DE 05 DE AGOSTO DE 2002 E LEI 11.265/06 DE 04.01.2006 – PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA – REGULAMENTAM A COMERCIALIZAÇÃO DE ALIMENTOS PARA
LACTENTES E CRIANÇAS DE PRIMEIRA INFÂNCIA E TAMBÉM A DE PRODUTOS DE PUERICULTURA CORRELATOS.
www.nestle.com.br/nutricaoinfantil
*Quantidade e qualidade de proteína mais próximas do padrão de referência.
Serviço de Atendimento Nutrição Infantil ao Profissional de Saúde 0800-7701599
Revista de Pediatria SOPERJ
Sociedade de Pediatria
do Estado do Rio de Janeiro
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(enfermagem)
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psicologia)
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Presidentes dos Comitês Científicos
da SOPERJ
Editorial
Onde as disciplinas se encontram
Com o a globalização, o processo de aquisição do conhecimento na área médica se expandiu e hoje em dia é quase impossível que os profissionais estejam atualizados em relação a
todas as descobertas e avanços do seu ramo de atuação. Por mais que um especialista queira
entender de outras áreas, ele não será capaz de ser eficaz em todas. E foi neste contexto que
a multidisciplinaridade conquistou espaço em todos os setores da saúde.
A inserção da equipe multidisciplinar nos serviços de saúde e no corpo docente das pósgraduações reflete uma preocupação maior com a saúde integral do indivíduo. Neste sentido, a
revista de Pediatria SOPERJ ao longo do tempo vem se estruturando a fim de priorizar profissionais cada vez mais capacitados a perceber a importância do diálogo entre as disciplinas.
O espaço do corpo editorial destinado aos revisores multidisciplinares na revista de Pediatria SOPERJ reflete a forma de cuidado integral que a Pediatria tanto necessita e contribui,
portanto, para o principal objetivo da Especialidade: O bem-estar da criança e sua família.
Por isso, é com grande satisfação que escrevo estas palavras referentes ao editorial desta
revista em nome de todos os profissionais de saúde que compõem a equipe multidisciplinar.
Este é mais um espaço onde as disciplinas irão se encontrar!
Adriana Duarte Rocha
Doutora em Ciência-Saúde da Criança e da Mulher- IFF/FIOCRUZ
Fonoaudióloga - Revisora multidisciplinar
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Revisões em Pediatria
Dislipidemias na Infância e na Adolescência:
um caso de saúde pública?
Dyslipidemias in childhood and
adolescence: a public healthy problem?
Resumo
As dislipidemias na infância e na adolescência adquiriram maior importância entre as patologias mais estudadas neste século pelas repercussões que trazem na vida adulta. É uma das
principais causas de morbidade e mortalidade em adultos em todo o mundo, com tendência
a acometer pessoas cada vez mais jovens, em especial em países em desenvolvimento. A
obesidade, a hipertensão arterial, o sedentarismo, o tabagismo estão entre os fatores de
risco mais importantes para a instalação da doença aterosclerótica, hoje sabidamente uma
doença inflamatória crônica que se inicia na primeira década de vida. Neste artigo de revisão
apresentamos as mais recentes publicações, com os índices preconizados para avaliação das
dislipidemias, os pontos de corte para as faixas etárias e a abordagem terapêutica. O artigo
visa reforçar junto ao pediatra a importância de recomendar hábitos saudáveis de vida e de
alimentação.
Palavras-chave: dislipidemias, aterosclerose, criança, adolescente
Maria Cristina Brito Faulhaber1
Márcia Antunes Fernandes2
Maria de Marilacc Lima Roiseman3
Walter Taam Filho4
1 Especialista (Médica pediatra e hebiatra)
2 Professora Adjunta da Universidade Federal
Fluminense (Médica pediatra)
3 Mestre em Saúde da Criança (Cardiologista
Pediátrica)
4 Doutor em Ciência dos Alimentos
(Coordenador e Professor da Pós Graduação
Universidade Veiga de Almeida)
Endereço para correspondencia
Sociedade de Pediatria do Rio de Janeiro
(SOPERJ)
Maria Cristina Faulhaber, Instituto de
Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira da
UFRJ (Ambulatório de Adolescentes)
Avenida Trompowiski sem nº Galeão
CEP 21949 900 - Rio de Janeiro - RJ
Summary
Dyslipidemias in childhood and adolescence have become a matter of major importance
among most studied pathologies this century from its repercussion in adult life. It’s one of the
main causes of morbidity and mortality in adults around the world, tending to happen with
younger people, especially in developing countries. Obesity, arterial hypertension, sedentary
lifestyle and smoking are among the most important factors of risk to develop atherosclerosis
disease, known as an inflammatory chronic disease that begins in the first decade of life.
Keywords: dyslipidemias, atherosclerosis, children, adolescent
4
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p4-15, junho 2009
A doença aterosclerótica é uma doença inflamatória crônica, que se inicia na
primeira década de vida, mas com um
longo período pré-sintomático, caracterizado por obstrução progressiva da luz
arterial por placas de ateroma e trombos, disfunção endotelial e processo inflamatório. É uma das principais causas
de morbidade e mortalidade em adultos
em todo o mundo, com tendência a acometer pessoas cada vez mais jovens, em
especial em países em desenvolvimento
(Levi et al., 2002).
A patogenia mais encontrada nas doenças cardiovasculares (DCV) é, indiscutivelmente, a aterosclerose coronária,
que pode acometer, inclusive, crianças
e pacientes jovens. Monckberg, citado
por Cresanta e colaboradores, examinou aortas de crianças que faleceram
durante a 1ª guerra mundial e, em
1921, relatou que 36% de jovens com
menos de 20 anos e 76% dos que tinham entre 20 e 25 anos, por ocasião
do óbito, já apresentavam ateromatose
da camada íntima da aorta. Em 1930,
Zeek citou que a aterosclerose ocorre
em qualquer idade.
Holman et al (1958), no artigo: “Observations on The Natural History of Atherosclerosis”, analisaram mais de 2000
aortas e centenas de artérias coronárias
em exames post-mortem de indivíduos
de 1 a 40 anos de oito áreas geográficas: Estados Unidos, Espanha, África do
Sul, Inglaterra, Porto Rico, Guatemala,
Costa Rica e Columbia. Esses autores
descreveram os estágios seqüenciais de
desenvolvimento da aterosclerose: (1)
estria gordurosa, (2) placa fibrosa, (3)
complicação da lesão com hemorragia
ou trombose e (4) doença clínica. Concluíram que todos os pacientes acima de
3 anos de idade tinham algum grau de
estria gordurosa. O grau de estria gordurosa foi similar nas várias áreas geográficas do mundo e em todas ocorreu
um rápido aumento destas estrias entre
8 e 18 anos de idade, sugerindo uma
relação com as mudanças hormonais da
puberdade. Concluíram, também, que a
estria gordurosa é reversível, enquanto
o potencial de reversibilidade da placa
fibrosa é limitado.
Em 1958, Holman lançou, no V Congresso Internacional de Pediatria, um
questionamento da doença aterosclerose como um problema pediátrico.
As manifestações clínicas da aterosclerose, em geral, surgem a partir da
meia-idade.
Entre os fatores de risco clássicos estão a obesidade, hipertensão arterial,
dislipidemias, diabetes mellitus, sedentarismo, tabagismo e história familiar
positiva para doença cardiovascular.
A relação entre fatores de risco específicos e aceleração do processo aterosclerótico, no adulto, está bem estabelecida.
No caso da doença aterosclerótica, os
efeitos dos fatores de risco associados
potencializam-se e a probabilidade de
eventos clínicos torna-se exponencialmente maior (WHO, 1998).
Vários estudos mostram a importância
da avaliação dos fatores de risco desde o
início da vida para a prevenção da DCV
na fase adulta, dentre eles o estudo de
Bogalusa (Frerichs et al., 1976; Nicklas
et al., 2002; Berenson et al., 1979). Este
estudo foi iniciado nos EUA a partir de
1972 e se estende até os dias de hoje,
foi o de maior impacto sobre os fatores
de risco para a doença aterosclerótica
na infância. Deu a origem a mais de 800
publicações sobre os fatores de risco para
a doença coronariana na infância.
Neste estudo foram selecionadas
22.000 pessoas de 5 a 14 anos de idade
em uma comunidade semi-rural composta por brancos e negros, onde foram
avaliados: dieta, tabagismo, atividade
física, história familiar, dados antropométricos e dosagem de lipídeos séricos. Os dados foram coletados a cada
3 anos (Nicklas et al., 2002) a fim de
traçar padrões de normalidade, detectar
inter-relações entre os fatores de risco e
determinar qual a tendência dos fatores
se manterem com o crescimento.
Através deste estudo, os autores concluíram que:
• Os fatores de risco para aterosclerose e a hipertensão arterial sistêmica
já são encontrados na infância.
• Para cada idade há valores considerados normais para IMC, lipídeos
séricos e pressão arterial.
• Dieta, sedentarismo e tabagismo
podem influenciar estes fatores
(obesidade, dislipidemia e hipertensão arterial).
• A educação precoce pode modificar o risco de doença aterosclerótica
coronariana.
Outro estudo importante no enfoque
preventivo cardiovascular na infância
foi o Estudo de Muscatine em Iowa nos
EUA, em 1970, que avaliou a saúde
de escolares e reforçou os achados de
Bogalusa, principalmente no que diz
respeito à alteração do perfil lipídico
durante o crescimento e desenvolvimento (Lauer et al., 1988). Uma coorte de crianças em Muscatine, Iowa, foi
acompanhada desde 1971. Os fatores
de risco foram avaliados entre as faixas etárias de 8 aos 18 anos de idade
e em adultos jovens, dos 20 aos 33
anos. O estudo de Muscatine utilizou
a ultrasonografia da artéria carótida de
uma amostra desta coorte para avaliar
a espessura média da íntima (EMI). Já
havia sido demonstrado haver uma associação entre valores altos de EMI da
carótida com a presença de calcificação
da artéria coronária. Constatou-se que
a EMI aumentada da carótida estava
associada com aumento da concentração total de colesterol e outros fatores
de risco, como pressão arterial elevada
na infância.
Em 1972, pesquisadores americanos,
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5
canadenses, israelenses e russos desenvolveram um estudo multicêntrico,
o “Lipid Research Clinics-Prevalence
Study” cujo objetivo principal era determinar qual a distribuição dos níveis
lipídicos na população infantil e sugerir
critérios de normalidade para as frações
lipídicas (Rifkind et al., 1983).
Estudos epidemiológicos têm mostrado que as DCV seriam uma causa relativamente rara de morte na ausência dos
principais fatores de risco (Beaghole,
2001). Stamler e colaboradores (1999)
mostraram que, aproximadamente
75% dos casos novos dessas doenças
ocorridos em países desenvolvidos, nas
décadas de 70 e 80, poderiam ser explicados por dieta e atividades físicas inadequadas, expressas por níveis lipídicos
desfavoráveis, obesidade e elevação da
pressão arterial associados ao hábito de
fumar.
Panorama no Brasil
Um dos grandes desafios da Pediatria
deste milênio é a prevenção das doenças crônicas do adulto e do idoso, que
geralmente tem raízes na infância, por
vezes na vida intra-uterina1. Se o ambiente intra-uterino for desfavorável, o
feto pode apresentar retardo de crescimento intra-uterino ou macrossomia,
condições clínicas associadas ao desenvolvimento tardio de diabetes, doença
cardiovascular, dislipidemia e hipertensão arterial2. Nos últimos anos as doenças do aparelho circulatório têm sido
as principais causas de óbito no Brasil.
Os dados mais recentes publicados pelo
Ministério da Saúde mostram um aumento nas taxas de 2005 em relação a
2004, sendo as doenças cardiovasculares responsáveis respectivamente por
31,5% e 27,8% do total de óbitos3.
Principalmente após a Segunda Guerra Mundial houve mudanças no perfil epidemiológico, com aumento da
prevalência de doenças crônicas não
6
transmissíveis, tais como as doenças
cardiovasculares, diversos tipos de câncer, diabetes e obesidade. Muitas mudanças socioculturais ocorreram nas
últimas décadas, no Brasil e no mundo,
trazendo consigo sedentarismo e alteração nos hábitos alimentares com maior
consumo de gorduras e ácidos graxos4.
As dislipidemias são consideradas um
dos mais importantes fatores responsáveis pelo desenvolvimento das doenças
cardiovasculares5.
As dislipidemias na população pediátrica têm gerado crescente preocupação,
justificando o aumento de pesquisas e
diagnóstico, buscando antes a prevenção do que o tratamento. O objetivo deste artigo é fomentar esta preocupação
entre os profissionais que lidam no dia a
dia com nossas crianças e adolescentes,
promovendo a discussão e a valorização
da abordagem do perfil lipídico em suas
consultas.
No Brasil, existem estudos epidemiológicos sobre hipertensão primária na
infância e adolescência onde a prevalência variou de 0,8% a 8,2% (Fuchs et
al, 2001; Gus et al, 2004). Assim como
já observado nos adultos, muitos destes
trabalhos demonstraram uma freqüente
associação de hipertensão arterial sistêmica com sobrepeso e obesidade.
Em Campinas-SP, Moura e colaboradores (2001) encontraram uma
prevalência de hipercolesterolemia de
35% numa população de escolares com
idade de 7 a 14 anos. Giuliano (2001),
em Florianopólis-SC, encontrou 10%
de hipercolesterolemia, 22% de hipertrigliceridemia, 6% de níveis elevados
de Lipoproteína de Baixa Densidade
(LDL-colesterol) e 5% de níveis baixos
Lipoproteína de Alta Densidade (HDLcolesterol).
Estudos nacionais sobre perfis lipídicos
na infância e na adolescência relacionam-se frequentemente com o perfil nutricional. Pesquisa realizada em Campina
Grande (PB), em 2007, procurou avaliar
a associação entre obesidade e dislipidemias em adolescentes do ensino público
e privado. Foi encontrada prevalência de
dislipidemia em 66,7% dos estudantes
avaliados, sendo que nestes constatouse alteração do HDL em 56,7%6. Já outro
trabalho no Vale do Itajaí (SC), de 2005,
avaliou o perfil lipídico de escolares de
baixa renda e relacionou com obesidade,
constatando apenas HDL baixo associado à presença de obesidade7. Em Maracaí (SP), durante 2002, foram avaliados
2029 escolares entre 7 e 17 anos, sendo
avaliado o colesterol não HDL, que foi
considerado um método confiável e de
menor custo para investigação de dislipidemias em crianças e adolescentes8.
Este trabalho comenta também o grande
impacto adverso do sobrepeso e obesidade na criança e no adolescente sobre
os valores de triglicerídeos. As Diretrizes Brasileiras sobre Dislipidemias9 e o
Programa Nacional de Educação sobre
Colesterol (NCEP)5 nos Estados Unidos recomendam a determinação do
LDL pela fórmula de Friedewald como
alvo prioritário para avaliação do risco
e tratamento para redução de lipídios.
A fórmula consiste em LDL= colesterol
total - HDL - triglicerídeos/5. Além de
ser uma medida indireta, a fórmula não
avalia outras partículas consideradas
aterogênicas, não pode ser usada se triglicerídeos forem maiores que 400 mg/
dl e requer jejum de 12 horas. Por outro
lado, o não HDL calculado pela diferença entre o colesterol total e o HDL, inclui
todo o colesterol presente nas partículas
de lipoproteínas consideradas potencialmente aterogênicas (LDL, VLDL, lipoproteínas de intensidade intermediária
(IDL) e lipoproteína A) - e exclui o HDL,
considerado anti-aterogênico. Além de
ser um cálculo simples de obtenção do
HDL, envolve baixo custo e não sofre
influência dos valores de triglicerídeos,
que não precisam ser mensurados, ha-
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vendo assim a vantagem adicional de
não exigir jejum10.
As concentrações de lipídios variam
conforme a idade e o grau de maturação. Dados do NHANES de 1988-1994,
em crianças e adolescentes com idades
entre 4 e 19 anos mostraram um valor
médio de colesterol de 165 mg/dl. Este
valor sobe para 171 quando se especifica
a faixa etária de 9 aos 11 anos de idade.
Estes valores diminuem durante o desenvolvimento puberal para tornarem
a aumentar depois. Estas constatações
são importantes porque refletirão qual a
época ideal para realização de screening
e determinação dos pontos de corte do
colesterol, pois as concentrações lipídicas são dependentes da idade e do grau
de maturação.
Fisiopatologia da Aterosclerose
Recentes pesquisas mostram que o
conceito vigente por longo tempo de
aterosclerose como uma doença degenerativa, de evolução lenta, acometendo predominantemente idosos e com
sintomas causados por uma obstrução
mecânica no fluxo sangüíneo, não corresponde ao que efetivamente ocorre.
O conhecimento da fisiopatologia desta doença tem evoluído desde o século passado, quando, na década de 70,
a idéia da existência de relação direta
entre lipídios e aterosclerose dominava
o pensamento médico devido a estudos
experimentais e clínicos demonstrando
forte relação entre hiperlipidemia e formação de ateroma 11.
Atualmente as evidências científicas
demonstram que os mecanismos envolvidos na gênese da doença aterosclerótica são extremamente complexos e
envolvem a interação de componentes
genéticos, ambientais e resposta inflamatória. 11-14.
Observando os componentes celulares e moleculares envolvidos no processo de desenvolvimento e evolução
da aterosclerose podemos afirmar que
se trata de um processo dinâmico, inflamatório e modificável, o que implica na
possibilidade de intervenção.
A palavra aterosclerose deriva do grego atero, que significa caldo ou pasta, e
esclerose, que corresponde a endurecimento. A aterosclerose deve der vista
como uma doença multifatorial, lenta
e progressiva, resultante de uma série
de respostas celulares e moleculares altamente específicas17.
O acúmulo de lípides, células inflamatórias e elementos fibrosos, que se
depositam na parede das artérias, são
os responsáveis pela formação de placas
ou estrias gordurosas, e que geralmente ocasionam a obstrução das mesmas.
Na patogenia da doença aterosclerótica,
um conjunto de fatores de risco, alguns
clássicos e outros emergentes, têm sido
correlacionados, tais como:
• Marcadores inflamatórios
• Proteína C-reativa, Interleucinas, Moléculas de Adesão, CD40,Amilóide A
sérica.
• Marcadores hemostáticos/trombóticos
• Fibrinogênio, Fator von Willebrand,
Pró-trombina fragmento1+2, Fatores
V, VII e VIII, Dímero D, Fibrinopeptídeo A, PAI-1,Ativador Plasminogênio
Tecidual.
• Fatores Plaquetários
• Agregação Plaquetária, Atividade
Plaquetária, Tamanho e volume de
Plaquetas.
• Fatores Lipídicos
• Lp(a), APO A e B, LDL-ox, Lípase A2.
• Outros Fatores
• Homocisteína, Microalbuminúria,
ECA, Polimorfismo APOE, Agentes
Infecciosos.
Marcadores e fatores envolvidos na aterogênese, segundo Hackman GD and Anand SS, JAMA.
2003; 290:932-40.14
A incidência de doença coronariana
depende, em geral, da prevalência de
seus fatores de risco. Quanto maior a
presença de fatores de risco para a aterosclerose, maior a probabilidade de
incidir uma coronariopatia. Dentre os
fatores de risco mais freqüentes estão a
hipercolesterolemia, o hábito de fumar,
a hipertensão arterial, a hipertrigliceridemia, a obesidade e a história familiar
de cardiopatia isquêmica27.
As lipoproteínas, particularmente as
lipoproteínas de baixa densidade (LDLc) têm ocupado um papel de destaque
na etiologia da doença aterosclerótica,
ainda que, muitos indivíduos desenvolvam doença cardiovascular na ausência
de anormalidades no perfil das lipoproteínas 15.
Apesar de qualquer artéria poder ser
afetada, os principais acometimentos
se dão na aorta e nas artérias coronárias e cerebrais, tendo como principais
conseqüências o infarto do miocárdio,
a isquemia cerebral e o aneurisma aórtico.
Cresanta e col 16 fazem referência ao
trabalho de Monckberg no qual ele relata que ao examinar aortas de crianças que faleceram durante a 1ª guerra
mundial constatou que 36% de jovens
com menos de 20 anos e 76% dos que
tinham entre 20 e 25 anos, por ocasião
do óbito, apresentavam ateromatose da
íntima da artéria. Anos após, Zeek 17, na
década de 30, corroborou que a aterosclerose ocorre em qualquer idade.
Holman e col 18 relataram, em 1958,
que todas as crianças com três anos de
idade ou mais já eram portadoras de
estrias de gordura em aorta e que todas as pessoas com 20 ou mais anos de
idade tinham estrias gordurosas nas artérias coronárias. Estas lesões vistas em
crianças estão diretamente relacionadas
com as lesões macroscópicas observadas
mais tarde 19.
Alguns estudos detectaram a preva-
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p4-15, junho 2009
7
lência de placas ateroscleróticas superior
a 40% nas autópsias de adultos jovens,
sugerindo que o processo aterosclerótico
ocorra precocemente20. De forma ainda
mais contundente, Napoli et al 21 sugerem que a aterosclerose pode ter início
ainda na fase de desenvolvimento intrauterino, podendo ser potencializada se
a mãe apresenta hipercolesterolemia, e
progredir lentamente na adolescência
e apresentar manifestações clínicas na
idade adulta.
Dois estudos, o Pathobiological Determinants of Atherosclerosis inYouth
(PDAY)22 e o Bogalusa Heart Study23 foram fundamentais para o entendimento
de como as lesões se desenvolvem e sua
precocidade, salientando a atenção que
deve ser dada aos fatores de risco a ser
iniciada na infância, deixando claro que
aterosclerose deve ser encarada como
um problema pediátrico.
As seqüências de eventos fisiopatológicos que levam a aterosclerose
são o resultado de uma interação de
acentuada complexidade, envolvendo
elementos sangüíneos, fluxo alterado
e comprometimento da camada de revestimento do vaso. Isto implica em
aumento da permeabilidade e ativação do endotélio, havendo migração
de monócitos e ativação de células inflamatórias, proliferação de células da
musculatura lisa e síntese de matriz,
degeneração com depósito de gordura, necrose devida a oxidação lipídica,
calcificação e ruptura da placa, recrutamento de plaquetas, fibrina e formação
de trombos.
A disfunção endotelial, desencadeada
por diversos fatores como hipertensão
arterial, diabetes, tabagismo e dislipidemias, inicia o processo aterogênico.
A resposta inflamatória na aterogênese
é mediada através de mudanças funcionais em células endoteliais, linfócitos T,
macrófagos derivados de monócitos e
células do músculo liso 15,24. A ativação
destas células desencadeia a elaboração
e interação de um extenso espectro de
citoquinas, moléculas de adesão, fatores de crescimento, acúmulo de lípides
e proliferação de células do músculo
liso21. Adicionalmente, a resposta inflamatória pode ser induzida pelo estresse
oxidativo, principalmente à oxidação
da LDL-c 13,15,26. A penetração de lipoproteínas no espaço subendotelial, em
especial LDL ativa a geração de glicoproteínas de adesão na superfície das
células endoteliais e secreção de fatores
de crescimento e citocinas responsáveis pela migração, proliferação celular
e coagulação. Os monócitos penetram
na camada íntima e no espaço subendotelial e transformam-se em macrófagos ativados que não reconhecem
as moléculas de LDL oxidadas como
próprias e as capturam. Ao atingirem
sua capacidade de armazenamento dos
lipídios, estes macrófagos são denominados de “foam cells”, ou seja, células
espumosas. O acúmulo de lipídios intracelularmente nas células espumosas
ou extracelularmente, dá origem às estrias lipídicas, que podem ser detectadas já nos primeiros anos de vida. O
processo fibrótico que se segue possui
uma cobertura composta por células
musculares lisas e material abundan-
te em colágeno e proteoglicanos que
recobrem o núcleo necrótico repleto
de lipídios. Com a progressão as placas
podem se apresentar como estruturas
com calcificações, ulcerações e áreas
com sangramento de pequenos vasos. As placas que possuem o núcleo
gorduroso mole são bastante instáveis
podendo sofrer rompimento, liberando na corrente sangüínea material com
potencial trombogênico, responsável
pela maior parte das manifestações clínicas agudas da doença25.
Etiologia
Os fatores desencadeantes das dislipidemias podem ser genéticos e/ou ambientais28. As dislipidemias primárias são
mais freqüentes que as secundárias29.
De uma maneira geral, as dislipidemias
de origem genética como a hipercolesterolemia familiar cursam com manifestações cardiovasculares mais precoces
e de maior gravidade30. Uma desordem
hereditária deve ser sempre considerada em crianças e adolescentes com pais
e avós com história de Infarto Agudo do
Miocárdio (IAM) precoce (≤55 anos);
angina pectoris; doença vascular periférica; doença vascular cerebral e morte súbita assim como aumento dos níveis séricos de LDL-C; triglicerídeos e
HDL-C baixos31. A elevação dos níveis
de colesterol, LDL-C, triglicerídeos e a
diminuição da HDL costumam ser mais
acentuadas quando comparadas com as
observadas nas de origem ambiental.
(tabela 1)
A dosagem dos níveis de colesterol e
triglicerídeos tem relação direta como o
Tabela 1 – Níveis séricos dos lipídeos, lipoproteínas e apolipoproteína B em crianças com dislipidemias genéticas28.
Desordem das lipoproteínas
Colesterol Total
Triglicerídeos
HDL-C
LDL-C
ApoB
LDL-C/apoB
Hipercolesterolemia familiar
323±44
86±36
44±8
262±45
219±42
1,22±0.22
Hiperlipemia familiar combinada
220±51
120±91
45±11
149±48
153±39
0.98±0.19
Hyperapobetalipoproteinemia
200±20
91±35
52±7
130±16
138±21
0,95±0.10
Normal
162±31
70±39
51±10
97±27
85±20
1,15±0.20
8
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p4-15, junho 2009
Tabela 2 – Classificação modificada de Fredrickson e recomendada pela OMS:
Tipo
Colesterol Total
LDL-C
Triglicerídeos Anormalidades das
(TGL)
lipoproteínas
Causa Primária
Causa Secundária
I
Elevado
Baixa ou
normal
Elevado
Deficiência de lípase lipoprotéica
Deficiência de Apo C II
Hipercolesterolemia familiar
Lupus
Excesso de quilomicrons
Eritematoso sistêmico,
Ia
Elevado ou normal
Elevada
Normal
Excesso de LDL
Hipercolesterolemia Familiar
Hipotireoidismo
Ib
Elevado
Elevada
Elevado
Excesso de LDL e VLDL
Hiperlipemia familiar combinada
Síndrome Nefrótica, diabetes,
anorexia nervosa
III
Elevado
Baixa ou
normal
Elevado
Excesso de quilomicron e IDL
Familiar tipo III
hiperlipoproteinemia
Hipotireoidismo, diabetes,
obesidade
Normal
Elevado
Familiar combinada
Diabetes
Hiperlipidemia familiar
Doença renal crônica
IV
Elevada ou Normal
Excesso de VLDL
hipertrigliceridemia
V
Elevada
Normal
Elevada
Excesso de quilomicron e VLDL
Hipertrigliceridemia Familiar
Álcool, diurético, beta bloqueador
Deficiência de ApoC
VLDL=Lipoproteína de muito baixa densidade
LDL= lipoproteínade baixa densidade
IDL=lipoproteína de densidade intermediária
Apo=apolipoproteína
tipo de partícula elevada. Para algumas
anormalidades lipídicas classificadas, a
determinação do defeito metabólico e
genético pode ser realizada. Contudo,
para o clínico, é suficiente o conhecimento dos níveis de LDL, HDL e triglicerídeos32.
A classificação modificada de Fredrickson e recomendada pela Organização
Mundial de Saúde utilizam como critério diferencial a lipoproteína predominante. (tabela 2)
As causas de dislipidemias secundárias mais observadas na infância e
adolescência são as encontradas na
obesidade, síndrome nefrótica, diabetes e hipotireoidismo. A obesidade é a
causa secundária mais comum de dislipidemia e, ao contrário do que muitos
clínicos pensam, a hipertrigliceridemia
é mais freqüente que a hipercolesterolemia e está também associada com
níveis reduzidos de HDL. Discretas elevações dos níveis séricos de LDL-C têm
sido assinalados em 20% dos pacientes
obesos.
Causas Secundárias de
Hipercolesterolemia em Pediatria
Endócrinas
aHipotireoidismo; Hipopituitarismo; Diabetes;
Lipodistrofia; gravidez
Exógena
Drogas (corticóides, contraceptivos orais,
isotrenoína; álcool;obesidade;dieta cetogênica
Renais
Síndrome Nefrótica; Insuficiência Renal Crônica;
Síndrome hemolítica urêmica
Hepáticas
Atresia biliar; condições colestáticas; hepatites;
cirrose biliar
Outras
Anorexia Nervosa; lupus eritematoso sistêmico;
Síndrome de Klinefelter; hipercalcemia idiopática
Doenças Metabólicas e de Depósito
Doença de Nieman Pick; doença de Tay-Sachs;
Sitosterolemia; porfiria
Fatores de risco
Obesidade
A obesidade é considerada um critério para triagem de perfil lipídico em
crianças e adolescentes33. No Brasil houve significativo aumento na proporção
de adolescentes com excesso de peso:
3,9% dos garotos e 7,5% das garotas
entre 10 e 19 anos, em 1974-1975 para
17,9% e 15,4% respectivamente, em
2002-2003. Em ambos os sexos, a freqüência da obesidade é maior nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do que
nas regiões Norte e Nordeste e, dentro
de cada região, tende a ser maior no
meio urbano do que no meio rural34.
A obesidade visceral confere pior prognóstico. Estudo realizado com cerca de
3000 indivíduos entre 5 e 17 anos mostrou que o predomínio de gordura na
região tronco-abdominal, avaliada pela
medida da cintura, estava relacionada a
uma concentração adversa de TG, LDL,
HDL e insulina, independente de raça,
sexo, idade, peso e altura35. Um recente
trabalho brasileiro mostrou a validação
da circunferência abdominal como indicador de parâmetro clínico ligado à
obesidade infanto-juvenil, substituindo
dosagens laboratoriais que possam não
estar ao alcance do profissional, como
insulinemia e leptinemia36.
Valores altos de índice de massa corporal (IMC = P/A2) têm sido associados
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p4-15, junho 2009
9
com história familiar positiva de doença cardiovascular (DCV) e com marcadores de DCV37, 38. Por outro lado,
trabalhos mostram que uma história
familiar positiva de DCV isoladamente
é um fraco preditor de hiperlipidemia.
A dislipidemia na infância pode estar
associada ao desenvolvimento de obesidade na vida adulta, especialmente no
sexo feminino, o que pode sugerir que
haja algum mecanismo geneticamente
determinado que explique a associação
dessas variáveis39. Mesmo crianças obesas com níveis normais de LDL podem
ter um perfil lipídico desfavorável, dada
a proporção entre as subclasses de suas
lipoproteínas. Quanto menor a partícula
de LDL, provavelmente maior será seu
poder de aterogênese, tendo as crianças
obesas um maior percentual de LDL de
padrão B (partículas menores) do que
as crianças com peso normal para a
estatura40. A distribuição da gordura
corpórea tanto em adultos como em
crianças e adolescentes deve ser avaliada, pois a concentração da gordura
na região tronco abdominal (obesidade
andróide) apresenta uma maior associação com a morbidade e mortalidade do
que a concentração na região glúteo-femural (obesidade ginecóide). Trabalhos
mostram que crianças e adolescentes
obesos, principalmente com acúmulo
de gordura abdominal, apresentam perfil lipídico desfavorável, caracterizado
por níveis elevados de triglicerídeos, de
LDL, de insulina e diminuídos de HDL,
independente de raça, sexo, idade, peso
e altura41. A obesidade está fortemente
associada a um perfil lipídico adverso
e essa relação é mais evidente em meninos que em meninas, sendo a mais
significativa o aumento de VLDL42. As
mudanças dos níveis lipídicos durante
a puberdade são diferentes nos sexos
masculino e feminino. Em indivíduos
com IMC normal, o colesterol total, o
LDL e o não HDL diminuem em ambos
10
os sexos durante a puberdade. A fração
HDL diminui nos adolescentes do sexo
masculino durante a adolescência, mas
permanece o mesmo nas meninas43,44.
O número de adipócitos é definido até
cerca de 20 anos de idade, tornandose constante na idade adulta, quando
cresce em tamanho. Este número é influenciado principalmente por fatores
genéticos e hábitos alimentares. O adulto que teve ganho ponderal excessivo
na infância terá maior dificuldade em
perder peso na idade adulta. No emagrecimento, adipócitos perdem volume,
mas quantitativamente seu número se
mantém. Hoje se sabe que indivíduos
obesos submetidos à cirurgia de redução
gástrica dois anos depois mantinham o
mesmo número de adipócitos, havendo um processo dinâmico de morte e
reposição das células gordurosas. Anualmente 10% das células adiposas são
renovadas.
Trabalhos questionam se há relação
causal entre hiperlipidemia na infância e eventos cardiovasculares na idade
adulta. Sabe-se que 31% das crianças
americanas têm IMC acima do percentil 85 e devem ser avaliadas quanto ao
lipidograma. Resultados lipídicos normais devem ser rechecados a cada 3 a
5 anos45.
aumento da pressão sangüínea, como
também a carga de trabalho cardíaco e a
demanda por oxigênio. Níveis elevados
de catecolaminas também estimulam
a liberação de ácidos graxos livres. Os
vasos coronarianos também são sensíveis a tais efeitos, admitindo-se que a
vasoconstrição crônica possa promover
lesão endotelial, dando início ao desenvolvimento de placas ateroscleróticas ou
à progressão de trombose local. Além
disso, o monóxido de carbono (CO),
um dos constituintes da fumaça do cigarro, ocasiona redução do conteúdo
de oxigênio sangüíneo, o que pode ser
um adjuvante para o desenvolvimento
de isquemia miocárdica. Outros efeitos
ocasionados incluem: alterações da coagulação, ativação plaquetária e interferência no metabolismo lipídico, que
potencializam muito o risco de eventos
isquêmicos em tabagistas. A incidência
de infarto do miocárdio aumenta cerca
de seis vezes nas mulheres e três vezes nos homens que fumam cerca de
20 cigarros por dia, comparativamente
àqueles que nunca fumaram. Entre homens com menos de 65 anos, o tabagismo dobra o risco de morte cardiovascular, ao passo que em homens com idade
igual ou superior a 85 anos, este risco é
aumentado em apenas 20%.
Tabagismo
No Brasil, segundo dados da Comprev/Inca/MS e do Cebrid (Centro de
Informações sobre Drogas), 90% dos
fumantes experimentam o primeiro
cigarro antes dos 13 anos de idade. O
tabagismo é um importante e reversível
fator de risco para doença coronariana provocando efeitos hemodinâmicos
relacionados à ativação do sistema nervoso simpático. A nicotina estimula a
liberação de catecolaminas (epinefrina
e norepinefrina), as quais aumentam
o ritmo cardíaco e a constrição vascular periférica. Como resultado, há um
Sedentarismo
O sedentarismo parece ser um dos fatores de risco mais importantes para doenças cardiovasculares na sociedade atual.
É considerado um problema de saúde
pública devido à elevada prevalência na
população em geral. No estado de São
Paulo, o sedentarismo atinge 79% da
população, sendo mais prevalente que o
tabagismo (38%), a hipertensão arterial
sistêmica (22%), a obesidade (18%) e
o alcoolismo (8%). Estudos epidemiológicos têm demonstrado uma relação
inversa entre o nível de atividade física
diária ou a condição física e o risco de
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p4-15, junho 2009
morbimortalidade cardiovascular. Nesse sentido, um estudo realizado por Paffenbarger e col. demonstrou que indivíduos ativos apresentam um risco 36%
menor de morte por doença da artéria
coronária que indivíduos sedentários,
e esse risco será tanto menor quanto
maior for a atividade física praticada46.
Sabendo-se dos potenciais benefícios
do exercício aeróbico um estudo procurou avaliar seus efeitos na fração não
HDL do colesterol em crianças e adolescentes. Esta fração é calculada pela diferença entre o colesterol total e a fração
HDL e mostrou ser um preditor melhor
da morbidade e da mortalidade por DCV
em adultos. O estudo concluiu que o
exercício aeróbico não reduz a fração
não HDL, porém melhora o percentual
de gordura corporal e a capacidade aeróbica em crianças e adolescentes47.
Reduzir o número de horas assistindo
TV e usando computador pode ter um
importante papel na prevenção da obesidade e na redução do IMC em crianças
e adolescentes. Estas mudanças parecem
estar mais relacionadas às alterações na
ingesta excessiva de alimentos do que
ao aumento na atividade física.
Hipertensão arterial (HAS)
O reconhecimento precoce de elevações anormais da pressão arterial (PA)
em crianças e adolescentes é responsabilidade dos médicos de assistência
primária. A incorporação da medição
da PA no exame pediátrico rotineiro
permite a descoberta da hipertensão
assintomática significativa secundária
a um distúrbio previamente ignorado e
confirma que elevações discretas da PA
são mais comuns do que se acreditava
antigamente, sobretudo em adolescentes. Embora possa ser um sinal de uma
doença cardíaca, endócrina ou renal, a
PA elevada também pode representar
um início precoce da hipertensão essencial. A prevalência de HAS em crian-
A hipertensão arterial pode ser classificada em crianças e adolescentes como:
Nomenclatura
critério
NORMAL
PAS e PAD em
percentis* <90
PRÉ HIPERTENSÃO
PAS E/OU PAD em
percentis* > 90 e < 95 ou
sempre que PA > 120/80 mmHg
HAS ESTÁGIO I
PAS E/OU PAD em
percentis* entre 95 e 99
acrescido de 5 mmHg
HAS ESTÁGIO I
PAS E/OU PAD em
percentis* > 99 acrescido de
5 mmHg
ças e adolescentes pode variar de 2%
a 13%.
Uma influência familiar sobre a PA
pode ser identificada no início da vida.
As crianças de famílias com hipertensão tendem a ter PA mais alta que as
crianças de famílias normotensas**. Os
irmãos de crianças com hipertensão
apresentam uma PA significativamente mais alta que os irmãos de crianças
com PA baixa.*
Antes de uma criança ou adolescente
ser diagnosticado como hipertenso devem ser realizadas várias aferições da
PA. Fatores de risco devem ser observados, como história familiar, obesidade,
erros dietéticos, tabagismo e sedentarismo. Cabe ressaltar a importante
associação entre excesso de peso e PA
predominantemente no adolescente. A
ingestão de álcool, o uso de drogas (particularmente a cocaína) e a utilização
de hormônios esteróides, anabolizantes e anticoncepcionais orais devem ser
considerados como possíveis causas de
HAS. O tratamento não-medicamentoso é obrigatório a partir do percentil 90
de pressão sistólico-diastólica, com ênfase para adoção de medidas em âmbito
familiar, em especial a correção do excesso de peso. A presença de hiperten-
são arterial por si não contra-indica a
prática de esportes. Essa atividade deve
ser estimulada, sob supervisão, como
uma das modalidades de terapêutica
não-medicamentosa. Um estudo comparativo do perfil lipídico, PA e aspectos
nutricionais em adolescentes filhos de
hipertensos e normotensos mostrou
que há maiores níveis de PA e perfil
lipídico mais desfavorável entre filhos
de hipertensos, onde os níveis baixos de
HDL foram o achado mais relevante e
independente de variáveis antropométricas ou nutricionais.
Diagnóstico
Os pacientes pediátricos, acima de 2
anos, devem ser submetidos a dosagem
do colesterol total, caso tenham:
• História familiar positiva: casos de
coronariopatias, acidentes vasculares cerebrais ou doenças vasculares
periféricas em pais, avós, tios e irmãos com menos de 55 anos (sexo
masculino) e abaixo dos 65 anos
(sexo feminino). Considera-se coronariopatias: angina que exija tratamento, infarto agudo do miocárdio,
casos de morte súbita, coronariopatia comprovada com estudo hemodinâmico, revascularização miocár-
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p4-15, junho 2009
11
•
•
dica (cirúrgica ou por angioplastia
com stent) e insuficiência cardíaca
por coronariopatia. Relato de pais
com dosagem do colesterol sérico
acima de 240mg/dl.
Pacientes que, com história familiar
ou não, mas que apresentem dois
outros fatores de risco, tais como:
obesidade, sedentarismo, tabagismo, diabetes, hipertensão.
Pacientes que são filhos adotivos e
desconhecem a história familiar.
Caso o valor do colesterol encontrado esteja acima de 170mg/dl, deve-se
repetir a dosagem, solicitando-se o lipidograma completo: colesterol total e
frações e triglicerídeos. O resultado deve
ser avaliado utilizando-se as tabelas
específicas por idade. Resultados com
valores acima dos valores de referência
devem ser repetidos. Medidas terapêuticas específicas devem ser instituídas
se a média das duas últimas avaliações
persistirem acima dos valores considerados normais.
Tratamento
A- Terapia Nutricional
A terapia nutricional deve ser considerada a primeira medida terapêutica em
todas as crianças e adolescentes com
dislipidemia documentada. Entretanto, a eficácia da recomendação de dietas com baixo teor lipídico permanece
baixa48. Nenhuma restrição de gorduras
ou colesterol deve ser recomendada em
crianças com menos de dois anos de idade, época de rápido crescimento e desenvolvimento e, conseqüentemente,
maior necessidade calórica49. O plano
alimentar deve considerar a idade, para
que não haja prejuízos no crescimento e
desenvolvimento. É recomendável contemplar questões culturais, regionais,
sociais e econômicas, devendo ser visualmente atraente e com paladar agradável. A primeira opção deve ser a dieta
12
com baixos teores em gordura saturada
e colesterol. Em 2002, a American Heart
Association, com base no Commitee on
Atherosclerosis, Hypertension and Obesity in theYoung (AHOY), sugeriu um
algoritmo para tratamento das dislipidemias de acordo com o risco individual
e o perfil lipídico obtido. Desta forma,
todas as crianças com LDL-C >130mg/
dl devem ser acompanhadas.
B- Atividade Física
A atividade física constitui medida auxiliar para o controle das dislipidemias
e tratamento da doença arterial coronária. A prática de atividade de exercícios
físicos aeróbicos promove redução dos
níveis plasmáticos de triglicerídeos, aumento dos níveis de HDL-C, porém sem
alterações significativas sobre a concentração de LDL-C. De uma maneira geral,
devemos conciliar a atividade de forma
prazerosa para que a assimilação seja
incorporada desde cedo e exercida de
forma regular.
C- Tratamento Medicamentoso das Dislipidemias
Os pacientes que devem ser selecionados são os de alto risco que mantém
LDL-C acima de 130mg/dl. Nestes casos recomenda-se uma monitorização
contínua da dieta e acompanhamento
clínico e laboratorial.
O uso de medicamentos só deve ser
considerado em crianças abaixo de 10
anos quando não houver resposta por
um mínimo de 6-12 meses de terapia
nutricional e exercícios.
O tratamento farmacológico deve ser
considerado em crianças com LDL-C
persistente em níveis >190mg/dl ou
naquelas com LDL-C de 160mg/dl na
presença de fatores de risco como história familiar de coronariopatia precoce.
O objetivo é manter LDL-C abaixo de
Algoritmo para tratamento das dislipidemias em crianças e adolescentes:
Estratificação de
HF +/CT elevado nos pais / DAC
Perfil lipídico em jejum
Desejável
LDL – C < 110 mg/dL
Limítrofe
LDL – C 110-129 mg/dL
Elevado
LDL – C > 130 mg/dL
HDL – C
< 35 mg/dL
Desejável
LDL – C < 110 mg/dL
Repetir perfil
lipídico em
5 anos
Recomendação de
padrão alimentar e
de Estilo de vida
Para redução de
fatores de risco
Limítrofe
LDL – C 110-129 mg/dL
Recomendção para
fatores de risco
Dieta fase I e
Intervensão
Reavaliação
em 1 ano
Persistentemente elevado
LDL – C > 130 mg/dL
Avaliação Clínica
Exame físico e laboratorial
Avaliar causas secundárias
Avaliar doenças familiares
Testar familiares
Dieta fase I, depois fase II
LDL – C alvo
Minimo < 130 mg/dL
Ideal < 110 mg/dL
Repetir
perfil lipídico
com média de
dosagem prévia
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130mg/dl, com ponto ideal em torno
de 110mg/dl50.
Escolha do Medicamento:
a - Resinas quelantes dos ácidos biliares
Muito utilizadas no passado. Esses
agentes ligam-se aos ácidos biliares
na luz intestinal e diminuem sua
recaptação, reduzindo, assim o colesterol. Utilizadas mais em crianças
pela segurança uma vez que não são
absorvidos.
Dose: 4-5g/dia
Efeitos colaterais: aumento dos níveis de triglicerídeos e interferem na
absorção de vitaminas lipossolúveis
e algumas medicações.
Recomenda-se complementação de
ácido fólico e vitamina D
Limitações: queixas gastrointestinais (flatulência, dor, diarréia, etc.),
sabor desagradável com pouca aceitação pelas crianças
b - Inibidores da HMG CoA redutase (estatinas)
As estastinas têm revolucionado o
tratamento das dislipidemias, reduzindo a mortalidade por doença
cardiovascular aterosclerótica em
adultos. O seu uso só deve ser considerado em crianças acima de 10
anos, embora existam estudos em
escolares com hipercolesterolemia
familiar com resultados satisfatórios e sem efeitos adversos sobre o
crescimento e maturação sexual9.
Elas atuam diminuindo a síntese do
colesterol endógeno, depletando o
pool intracelular de colesterol e,
conseqüentemente, disponibilizando um maior número de receptores
de LDL-C com diminuição da LDLC circulante.
Devem ser administradas por via
oral, em dose única diária, preferencialmente à noite para os fármacos
de curta meia-vida ou em qualquer
horário naqueles com meia vida
maiores, como a atorvastatina e a
rosuvastatina. Os efeitos adversos
são raros, sendo os de maior gravidade a hepatite, miosite e a rabdomiólise. Desta forma recomenda-se
a dosagem dos níveis basais de creatinofosfoquinase (CK), de transaminases e a repetição na primeira reavaliação e a cada aumento da dose.
As meninas devem ser advertidas
quanto à necessidade de usar contraceptivos, pois a gravidez contraindica o seu uso.
c - Ezetimiba
Inibe a absorção de colesterol que
atua na borda em escova das células
intestinais, inibindo a ação da proteína transportadora. Têm sido observados melhores resultados quando empregada em associação com
as estatinas, e devem ser utilizadas
apenas em situações especiais.
Dose: única diária- 10mg/dia
defeito herdado no metabolismo do colesterol, outra é estender o uso de estatinas para crianças com risco de DCV por
fatores modificáveis no estilo de vida.
Atualmente não se sabe quantas crianças ou adolescentes preencherão os
critérios para tratamento com estatinas
pelos efeitos da obesidade, dieta inadequada ou sedentarismo. Cabe avaliar se
o tratamento da obesidade na infância
incorporará um poderoso arsenal de
drogas usadas em adultos: betabloqueadores e diuréticos para hipertensão,
aspirina para coagulopatias, insulina
para diabetes e assim por diante. Uma
vez que esta porta foi aberta, a indústria
farmacêutica passará alegremente por
ela. Será que ao invés de advertências
sobre os perigos de fast food estaremos
assistindo novos comerciais promovendo o uso de drogas redutoras de colesterol em crianças? Cabe uma reflexão
sobre o imenso abismo existente entre
tratar doenças com drogas e nossa relutância em instituir medidas preventivas
de saúde pública52.
Segundo a Academia Americana de
Pediatria o uso de estatinas deve ser
considerado em crianças com idade superior a 8 anos, com LDL ≥ 190 mg/dL
(ou ≥ 160 mg/dL com história familiar
de doença cardíaca ou ≥ 130 mg/dL se
diabetes mellitus estiver presente ou se
houver 2 fatores de risco adicionais),
principalmente se não houver adesão
a alterações na dieta nem mudanças no
estilo de vida. Sabe-se hoje que as estatinas estão sendo prescritas nos EEUU
para crianças a partir dos 8 anos de idade e que das ~ 75.000.000 de crianças
abaixo dos 18 anos de idade estima-se
que 17.000 podem estar em uso de estatinas51.
Um interessante artigo aborda a controvérsia no tratamento farmacológico
de crianças com estatinas. Uma coisa
é tratar os raros casos de crianças com
A Academia Americana de Cardiologia não utiliza mais os termos dieta
fase I e II como referências para dietas
saudáveis para o coração. A dieta fase I
restringia a gordura total para não mais
do que 30% do total de calorias, gordura saturada não mais do que 10% das
calorias e o total de colesterol devia ser
menor do que 300 mg/dia. A dieta fase
II preconizava menos de 7% de gordura
saturada e o total de colesterol menos
do que 200 mg/dia. Atualmente é utilizada a dieta I para a população em geral,
a dieta fase II para pacientes com níveis
de colesterol considerados de alto risco
(240 mg ou mais) ou que tenham antecedentes de IAM. Para pacientes com
alto risco ou que sabidamente tenham
doença cardiovascular é recomendada
uma dieta com mudanças terapêuticas
do estilo de vida (do inglês TLC - The-
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p4-15, junho 2009
13
rapeutic Lifestyle Changes diet). Em
crianças e adolescentes devemos calcular as calorias sempre em quantidade
suficiente para promover crescimento e
desenvolvimento normais e garantindo
a manutenção ou ganho ponderal, conforme for o caso.
Considerações Finais
As concentrações de lipídios e de lipoproteínas aumentam durante a lactância, atingindo valores próximos aos dos
adultos jovens por volta dos dois anos
de idade. Este dado é importante para
realização de recomendações de screening, visto que valores obtidos antes
dos dois anos podem não refletir valores dos anos subseqüentes da infância
ou valores do adulto. Estando estes
valores dentro da normalidade, deve
ser incentivada uma dieta saudável e
estimulação da atividade física, não
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14
Tabela 3 – Os valores de referência lipídica propostos pela Sociedade
Brasileira de Cardiologia, através da I Diretriz de Prevenção da
Aterosclerose na Infância e Adolescência para a faixa etária
de 2 a 19 anos são:
Lipídeos
Desejáveis (mg/dL)
Limítrofes (mg/dL)
Aumentados (mg/dL)
CT
<150
150-169
≥170
LDL-C
<100
100-129
≥130
HDL-C
≥45
100-129
≥130
TG
<100
esquecendo que o prazer do esporte
é fundamental para a consolidação do
hábito de praticar exercícios. Também
deve ser reforçado o combate ao tabagismo e limitado o número de horas em
frente ao monitor de TV/computador/
videogame. No início da adolescência,
toda criança a partir dos 10 anos de
idade deve ter uma determinação do
colesterol total. Caso haja fatores de
risco familiares (doença arterial coronariana, HAS, dislipidemias), é indicado
um lipidograma completo. Para valores
de colesterol entre 150 e 170 deve ser
orientado aos pais mudanças no estilo
de vida, devendo o exame ser repetido
anualmente. Valores acima de 170 já indicam a realização de análise completa
dos lipídios e medidas de intervenção
nas comorbidades existentes.
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2. Atualmente os níveis preconizados
como ideais ou desejáveis para crianças
e adolescentes no perfil lipídico, em
mg/dL, são:
a) CT <150, HDL ≥ 45, LDL < 120, TG < 120
b) CT <150, HDL ≥ 45, LDL < 130, TG < 150
c) CT < 150, HDL ≥ 45, LDL < 100, TG < 100
d) CT < 100, HDL ≥ 45, LDL < 120, TG < 110
3. Embora sempre seja recomendado
atividade física e hábitos alimentares
saudáveis na prevenção de dislipidemias, pode ser necessário introduzir
uma estatina. Isto pode ser feito a partir
dos:
a) 6 anos de idade
b) 8 anos de idade
c) 10 anos de idade
d) 12 anos de idade
Avaliação
1. O aumento na incidência das doenças
crônico degenerativas do adulto muitas
vezes tem sua origem na infância.
Dentre as principais causas podemos
citar:
a) obesidade e dislipidemias
b) tabagismo e stress
c) sedentarismo e uso de drogas
d) erro alimentar e hipertensão arterial
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Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p4-15, junho 2009
15
Revisões em Pediatria
O ensino da puericultura e da pediatria no
Rio de Janeiro: a propósito do bicentenário
da Faculdade de Medicina da UFRJ
The teaching of Child care and Pediatrics in
Rio de Janeiro: concerning the bicentennial of
Faculty of Medicine of UFRJ
Clemax Couto Sant Anna1
Resumo Objetivo: revisão não sistemática da literatura sobre ensino da Pediatria e da
Puericultura, buscando situar historicamente o tema por ocasião dos 200 anos de criação do
ensino médico no país. Resultados: embora já se identifique livros sobre doenças na infância
na época do Brasil Colônia, o ensino regular só veio a se firmar ao final do século XIX por
influência de Moncorvo de Figueiredo. Só em 1937 foi criada a Clínica pediátrica médica e
Puericultura e clínica da primeira infância, sob a responsabilidade do Prof. Martagão Gesteira,
responsável pela formação de inúmeros profissionais no Brasil desde então. Conclusão: a
Puericultura e a Pediatria são especialidades jovens e expandiram-se nas últimas décadas do
período neonatal à adolescência
1 Doutorado (Professor Associado da Faculdade
de Medicina da UFRJ)
Endereço para correspondencia
Faculdade de Medicina da Universidade Federal
do Rio de Janeiro
Clemax Couto Sant´Anna
R. Cinco de Julho 350 ap. 604 ---- Copacabana
22051-030-- Rio de Janeiro, RJ
Palavras-chave: Puericultura, Pediatria, criança, adolescentes, ensino
Objective: review on teaching of the Pediatrics and Child care, looking for to place the theme
historically for occasion of the 200 years of creation of the medical teaching in Brazil. Method:
non- systematic review of the literature. Results: although on already identifies books on childhood diseases at that time of Brasil Colônia, the regular teaching only starts at the end of the
XIX Century for influence of Moncorvo de Figueiredo. Only in 1937 it was created the Clinic
pediatric (Clínica pediátrica médica e Puericultura e clínica da primeira infância) under the
responsibility of Prof. Martagão Gesteira, responsible for the countless professionals’ formation
in Brazil ever since. Conclusion: the Child Care and the Pediatrics are young specialties.They
expanded in the last decades of the period neonatal to the adolescence
Keywords: Child care, Pediatrics, child, adolescent, Teaching
16
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p16-20, junho 2009
Notas sobre a Pediatria no mundo
Na Antiguidade há registros de que a
sociedade dava um tratamento pouco
atencioso à criança. São correntes na
literatura as referencias a infanticídio
como prática religiosa ou como estratégia de controle populacional. Mesmo séculos mais tarde, a criança não
era vista como um ser com direitos e
dignidade a serem preservados. Práticas
de trabalho escravo, por exemplo, são
referidas nas tripulações de navios até
a época dos descobrimentos. Do ponto
de vista da Medicina, o primeiro livro
sobre doenças infantis foi publicado em
latim em 1472 por Paolo Begellardi Flumine (1).
Após o Renascimento, os progressos
trazidos no século XVII pelos descobrimentos e teorias desenvolvidas por
Newton, Descartes, Bacon, dentre outros, conduziram ao aparecimento de
sociedades médicas científicas e revistas
médicas na Europa. Na América Latina
ainda vigorava a apropriação de conhecimentos indígenas com os postulados
da medicina tradicional no tratamento
das doenças conhecidas à época.
O século XVIII caracterizou-se pelos
avanços no ensino da pediatria na Europa, baseado nos estudo dos sinais e
sintomas. Começam a aparecer importantes trabalhos científicos, de autores
como Corvisart e Bichat na França,
Rosensteim, na Suissa e Codogan na
Inglaterra. Destaca-se nesse período a
descoberta da vacina antivariólica por
Jenner (2).
No século XIX, com o advento dos
progressos trazidos pela Revolução industrial houve redução da mortalidade
infantil nos países industrializados. Verificou-se grande progresso na Medicina, com a criação de várias especialidades médicas, dentre elas a Puericultura,
clínica da criança sadia, nas línguas de
origem latina.
Médicos de todo o mundo acorreram
à França para desenvolver formação em
Puericultura e a Pediatria, dado o protagonismo da medicina francesa à época.
Do mesmo modo, a cirurgia pediátrica
passou a se desenvolver. Em 1802 foi
inaugurado em Paris o primeiro hospital pediátrico do mundo, o Hôpital des
enfants malades (1). Outros países, como
a Inglaterra, Alemanha, Suíça, Bélgica, Espanha também experimentaram
avanços. Começou a haver maior intercâmbio científico entre Europa e Estados
Unidos, decorrendo disso os progressos
na medicina americana. Paulatinamente na América Central e América do Sul
vieram a se desenvolver ações voltadas
para a proteção a infância (1, 2).
A Pediatria no Rio
As primeiras ações voltadas para o
cuidado com a infância registradas no
Brasil, são da época dos Padres Manoel
da Nóbrega e José de Anchieta que se
empenharam em trabalhos humanitários junto aos índios e a população que
habitava o país naquela época. Há também relatos de outras ações pontuais
por parte dos governantes no tempo da
colônia.
Francisco de Melo Franco autor de
Tratado da educação física dos meninos,
publicado em 1790, pode ser considerado o pioneiro da puericultura brasileira (3).
Com a chegada ao Brasil de D. João
VI e a corte portuguesa em 1808 foram
criadas as Academias médico- cirúrgicas na
Bahia e no Rio de Janeiro, com intervalo de alguns meses entre elas. Na época
da regência, D. Pedro II promulgou decreto a 3 de outubro de 1832 que reorganizou o ensino médico no país, criou
e deu autonomia de expedir diplomas
às Faculdades de Medicina do Rio de
Janeiro e da Bahia. A primeira veio a
se transformar na Faculdade Nacional de
Medicina da Universidade do Brasil em
1937, atual Faculdade de Medicina da
UFRJ. (1,3)
O ensino da medicina infantil, na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro,
começou vinculado ao da obstetrícia,
como era comum na época, em 1833
na cadeira de Partos, doenças de mulheres
pejadas e paridas e de recém-nascidos, cujo
catedrático foi o Prof. Francisco Júlio
Xavier.
Só cinqüenta anos depois, em 1883,
por sugestão de Carlos Arthur Moncorvo de Figueiredo, foi instituída a cadeira
de Clínica médica e cirúrgica de crianças. Moncorvo de Figueiredo, formado
pela Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro em 1872, especializou-se na
França e junto com outros médicos de
renome fundou a Policlínica do Rio de
Janeiro em 1881 (3). Apoiado pelo imperador D. Pedro II, criou o primeiro
curso livre de pediatria no Rio em 1882,
portanto um ano antes de a Faculdade
de Medicina iniciar curso idêntico, e o
manteve até sua morte em 1901. Pelo
seu protagonismo na criação da cadeira
de moléstias de crianças e por sua obra
científica é considerado o Pai da Pediatria Brasileira (1).
Em 1883, a recém criada cadeira de
Clínica médica e cirúrgica de crianças, teve
como primeiro professor o Senador
Cândido Barata Ribeiro, que se dedicava principalmente à ortopedia. Em
1910 foi substituído pelo Prof. Francisco
Simões Correia, por sua vez, sucedido
pelo Prof. Luiz do Nacimento Gurgel em
1925 (1,3).
No século XIX a mortalidade infantil
no Brasil alcançava cifras preocupantes.
No Rio de Janeiro era da ordem de 250/
1000 nascidos vivos e foi objeto de um
artigo de José Pereira no primeiro número dos Anais Brasileiros de Medicina
em 1847.
Em 1891 foi fundado no Rio o Instituto de Proteção e Assistência a Infância,
levando ao incremento de formação em
pediatria de médicos brasileiros que se
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p16-20, junho 2009
17
Figura 1 - Bebe no andador. Ilustração do livro De arte medica infantium libri quatuor de
Omnibonus Ferrarius. Século 16.
Fonte: http://www.bium.univ-paris5.fr/histmed/debut.htm
dirigiam, preferencialmente, a Portugal
e Espanha (2).
No início do século XX, destacou-se
como um dos principais fundadores da
pediatria no Brasil, a figura do Dr. Fernandes Figueira, autor de vários trabalhos, dentre eles, Eléments de sémiologie
infantile, em 1903; Consultas práticas
de higiene infantil e Patologia infantil.
Fernandes Figueira foi o fundador da
atual Sociedade Brasileira de Pediatria
em 1910 e da qual foi o primeiro presidente, até seu falecimento em 1926.
Além disso, foi fundador do serviço de
Higiene infantil e assistência a infância,
do Departamento Nacional de Saúde,
em 1920 (3).
Em 1911, a Reforma governamental
Rivadávia, subdividiu o ensino de pediatria em: Clínica cirúrgica infantil e
ortopedia e Clínica pediátrica médica e
higiene infantil. De 1928 a 1939 o catedrático de ensino da pediatria foi o Prof.
Luiz Pedro Barbosa, que em 1915 havia
sido nomeado professor substituto de
Clínica pediátrica médica e higiene infantil. Este iniciou o curso de pediatria
na Policlínica de Botafogo e ampliou os
quadros de assistentes da cadeira.
Em novembro de 1937, no bojo de
grandes reformas do ensino, o Governo
decidiu criar as cadeiras de Clínica pediátrica médica e Puericultura e clínica da
18
primeira infância. Neste mesmo ano foi
criada a Faculdade Nacional de Medicina
e o Instituto Nacional de Puericultura
(Lei 378 de 13.01.1937), inicialmente vinculado ao Ministério da Saúde e
Educação e, mais tarde, à Universidade do Brasil. Nessa oportunidade, veio
transferido da Bahia para o Rio de Janeiro, o Prof. Joaquim Martagão Gesteira, incumbido de dirigir o Instituto e
a cátedra recém criada de Puericultura
e clínica da primeira infância. Dentre as
obras do Prof. Martagão Gesteira, des-
tacam-se Higiene individual e social da
criança, de 1942 e Pediatria de 1944.
Graças a seu prestígio, foi planejado e
edificado o Instituto de Puericultura da
Universidade do Brasil, inaugurado a
1 de outubro de 1953, hoje Instituto de
Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira
da Universidade Federal do Rio de Janeiro
(IPPMG- UFRJ). O primeiro diretor foi
o próprio Martagão Gesteira que ministrou aula inaugural de recém criada
Cidade Universitária na Ilha do Fundão
( Fig2) e veio a falecer meses depois, em
1954. Nesse ano, houve concurso para
catedrático, em função da vaga por aposentadoria do Prof. Luiz Pedro Barbosa
em 1939, vencido pelo Prof. José Martinho de Rocha, que assumiu também
a direção do Instituto.
Em 1957, nova lei criou a Clínica
pediátrica e puericultura, cujo primeiro
professor no Rio, foi Martinho da Rocha.(3)
O ensino da pediatria na atual UFRJ
A história do IPPMG - UFRJ está intrinsecamente ligada ao ensino da pediatria
no Rio de Janeiro e no Brasil, já que
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p16-20, junho 2009
seu projeto foi minuciosamente voltado
para as atividades docentes, de pesquisa e de assistência. Além disso, havia a
concepção de que não poderia haver estudo de puericultura num hospital com
crianças doentes. A par das aulas ministradas pela cadeira no sexto ano da Faculdade Nacional de Medicina, o IPPMG
começou a realizar diversos cursos de
extensão universitária, especialização
e aperfeiçoamento em puericultura e
clínica da primeira infância.
Durante a gestão do Prof. Martinho da
Rocha, o IPPMG continuou a expandirse, foram criadas várias especialidades
pediátricas e consolidou-se o Boletim
do Instituto de Puericultura que vinha
sendo publicado desde 1938, que circulou até 1971 e tinha indexação internacional (4).
A Organização Mundial de Saúde
realizou investigação sobre o ensino
médico na América Latina em 1956,
por Huges e Puffer. Naquele ano, das
79 escolas médicas avaliadas, ainda
não havia o ensino da pediatria em 10.
Enquanto a Argentina era o país onde
havia a maior proporção de estudantes
de pediatria, alcançando a taxa de 8/
100.000 habitantes, no Brasil a taxa era
de 2,4/100.000habs. Chamava a atenção para a insuficiência de laboratórios,
de leitos e de professores, principalmente para as atividades práticas, enfatizando que o ideal é o ensino da pediatria
em ambulatórios. Naquela época havia
o conceito que o ensino da pediatria deveria perfazer 300 horas no currículo
médico. Além disso, numa época que
ainda vigorava a estrutura da cátedra,
havia a compreensão de que o ideal seria o modelo departamental, isto é, um
conjunto de professores, subdivididos
em vários cursos, com laboratórios e estrutura administrativa complementar,
muito semelhante ao que já havia no
IPPMG desde sua fundação em 1953.
Havia crítica, já naquela época, à sub-
divisão entre pediatria e puericultura,
uma vez que os aspectos de crescimento
desenvolvimento, sociais e de prevenção de doenças só poderiam ser compreendidos em conjunto. Concluía o
relatório apontando como falhas no
ensino, o fato de que em muitas escolas
os estudantes eram meros observadores
de pacientes e que havia uma grande
lacuna no que se refere à pesquisa em
pediatria. A preocupação com o ensino
da pediatria fez com que em outubro de
1961 viesse a se realizar a I conferência sobre o ensino da pediatria no Brasil, sob a coordenação do Prof. Renato
Woiski, de Riberão Preto (5).
Em 1969 aposentou-se o Prof. Martinho de Rocha e nesse ano veio transferido da Universidade Federal Fluminense o Prof. César Pernetta que assumiu a cátedra e a direção do IPPMG,
cumprindo a disposição regulamentar
da instituição.
Cabe lembrar que a Lei 5540 de
28.11.1968 extinguiu o sistema de cátedras e instituiu o sistema departamental. Assim, o Prof. Pernetta em 1969 foi
o primeiro chefe do Departamento de
Pediatria da Faculdade de Medicina,
cargo quer ocupou até ser jubilado em
1976 (Fig. 3).
O Prof. Pernetta marcou o ensino da
pediatria com sua inegável competência
e carisma, além de ser autor de inúmeras obras até hoje consultadas, como
Semiologia pediátrica, Diagnóstico diferencial em pediatria, Alimentação do
lactente sadio, Terapêutica infantil e
muitas outras.
Até 1979 o ensino da Pediatria era feito em parte no quinto ano da graduação
(Semiologia e clínica) e no sexto ano,
no internato eletivo, cuja duração era
de um ano. A partir de então, foi instituído o sistema de períodos no curso
de graduação, no bojo da reforma universitária. Ao longo do tempo, outras
mudanças de currículo conduziram a
que o ensino da pediatria seja feito hoje
em diversos períodos do curso médico,
a partir do quarto período, alcançando o 12 0 período para os alunos que
optarem pelo internato eletivo nessa
disciplina.
Em 1980 houve concurso para provimento de vaga de professor titular
de pediatria, que foi vencido pelo Prof.
Gerson Carakushansky que também assumiu a chefia do Departamento e mais
tarde foi sucedido nessa função por vários outros professores eleitos pelo colegiado. O Prof. Gerson Carakushansky,
geneticista - que publicou artigos e livros, como Semiologia básica do recémnascido e Doença genética em Pediatria,
dentre outros, projetou a Pediatria da
UFRJ em nosso meio - exerceu a titularidade até 2005, quando se retirou
pela aposentadoria compulsória. Novo
concurso naquele ano foi vencido pelo
Prof. Antonio José Ledo A. da Cunha
que assumiu o cargo de professor titular
em 2006 (4). O Prof. Antonio Ledo que já
havia sido diretor do IPPMG no período
de 2002 a 2004, foi eleito Diretor da
Faculdade de Medicina em 2006, cargo
que exerce atualmente e que coincide
com o fato de ter sido o primeiro pediatra a ocupar tal função na UFRJ.
Epílogo
As primeiras décadas do século XX foram marcadas pelas graves conseqüências sócio-econômicas decorrentes das
duas Guerras Mundiais. Naturalmente
os efeitos sobre as famílias e a sociedade
repercutiram na saúde infantil de forma
expressiva. Por outro lado, observouse que a medicina americana tornou-se
mais forte ao fim da Segunda Guerra
e, além disso, conhecimentos das áreas
básicas, como microbiologia, imunologia, parasitologia, genética, bem como
os conhecimentos da Psicanálise, Epidemiologia e Saúde Pública vieram a
contribuir para o avanço da Pediatria
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p16-20, junho 2009
19
como especialidade médica. Mais tarde
foram se consolidando as especialidades pediátricas, que incorporaram os
avanços em vacinação - desenvolvidos
desde Jenner, no século XVIII - e que
levaram as grandes contribuições de
Salk e Sabin, bem como no descobrimento progressivo dos antimicrobianos,
na incorporação de novas tecnologias
para diagnóstico e para procedimentos
cirúrgicos e a partir dos anos 50, com
a Pediatria Social e a consolidação da
Seguridade Social.
Cabe lembrar que a Puericultura ex-
perimentou expansão de sua abrangência que hoje se estende do período
neonatal (e pré-natal) a adolescência.
Ao final do século XX constatava-se
que diversos organismos internacionais desenvolviam ações de vigilância
sobre a criança, como a ONU, Centro
Internacional de Proteção a Infância,
OMS, UNICEF, FAO e muitos outros.
No entanto, só em 1959 foi divulgada
a Declaração Universal dos Direitos da
Criança que veio a originar no Brasil,
em 1992, o Estatuto da Criança e do
Adolescente. (1,2)
1. Carneiro G. Um compromisso com a esperança. História da Sociedade Brasileira
de Pediatria - 1910-2000. Rio de Janeiro,
Sociedade Brasileira de Pediatria, 2000,
560p.
2. Figueroa E. La pediatría y la puericultura desde las sociedades primitivas hasta nuestros
dias. Rev. Fac. Medicina 1995 18: 117-130
3. Martinho da Rocha J. Short chronicle of Brazilian Puericulture and Pediatrics. Bol.Inst.
Puer. Univ. Brasil 1959: 16: 73-84.
4. Aires VLT, Aires R, Cunha AJLA. Pediatria
In: Gomes MM, Vargas SSM, Valladares AF.
20
A Faculdade de Medicina primaz do Rio de
Janeiro em dois dos cinco séculos de história
do Brasil. Rio de Janeiro, Atheneu, 2001,
258p; p.161-71.
5. Martinho da Rocha J. Ensino da pediatria na
América Latina (tradução e síntese). Bol.
Inst. Puer.Univ. Brasil 1958; 15: 341-49.
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p16-20, junho 2009
Revisões em Pediatria
Doença de von Gierke: estudo de revisão
Von Gierke disease: revision study
Frederico Henrique Salles Nunes 1
Resumo
As glicogenoses são doenças de armazenamento de glicogênio e a doença de von Gierke é a
mais comum delas, sendo que as complicações metabólicas da doença incluem hipoglicemia,
acidemia láctica, hiperuricemia, hipofosfatemia e adenoma hepático. Nesse trabalho foi feita
uma revisão dos conhecimentos atuais acerca da doença Von Gierke com suas características
e tratamento aplicado. Verificou-se que a adesão ao tratamento é de vital importância para
o controle da doença.
1 Graduação (Nutricionista)
Fundação Hospitalar do Estado de Minas
Gerais - FHEMIG - Hospital Infantil João
Paulo II.
Endereço para correspondência
Frederico Henrique Salles Nunes
Rua Nilo 121A, Bairro: São Salvador
Belo Horizonte, MG.
e-mail: [email protected]
Palavras-chave: Doença de von Gierke, Glicogenoses, Nutrição.
The glycogenosis are glycogen storage diseases, the von Gierke disease is the more common
of them, the metabolic complications of the disease include, hypoglycemia, lactic acidemia,
hyperuricemia, hypercholesterolemia and hepatic adenoma. Our goal with this study was to
make a review of the current knowledge concerning the disease von Gierke your characteristics and applied treatment. The adhesion to the treatment is of vital importance for the
control of the disease.
Keywords: Von Gierke disease, Glycogenosis, Nutrition.
Introdução
Como todos os erros inatos de metabolismo são individualmente raros e
têm apresentações clínicas inespecíficas é comum o pediatra cogitá-los tardiamente1. Diagnosticar rapidamente é
essencial para impedir o agravamento
e a irreversibilidade dos sintomas, podendo representar a vida do paciente
em alguns casos2.
Objetivo
Foi objetivo do trabalho atual, fazer
uma revisão sobre a glicogenose tipo
Ia, doença de depósito de glicogênio
resultante da deficiência da enzima glicose-6-fosfatase com o intuito de dotar
os pediatras, nutricionistas e demais
profissionais da saúde de informações
necessárias para o diagnóstico e tratamento adequado dos indivíduos acometidos por essa doença.
Metodologia
A revisão de literatura foi realizada
através da seleção de artigos da base de
dados Medline, Scielo e Google Acadêmico, com os artigos de periódicos
médicos e nutricionais nacionais e internacionais mais importantes dos úl-
timos vinte anos e livros nutricionais
e médicos com informações relevantes
sobre a glicogenose tipo Ia.
Revisão
Definição
As Doenças Metabólicas Hereditárias
são causadas por erros inatos do metabolismo e resultam da falta de atividade
de uma ou mais enzimas específicas ou
defeitos no transporte de proteínas3.
São denominadas glicogenoses as afecções decorrentes de erro metabólico hereditário que resulta em anormalidade
da concentração e/ou da estrutura do
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p21-27, junho 2009
21
glicogênio em qualquer tecido do organismo4.
A glicogenose tipo I é caracterizada pela
deficiência de glicose-6-fosfatase (G-6Pase), uma enzima composta por um
sistema multicomponente que compreende o sítio ativo na superfície luminal
do retículo endoplasmático e três translocases4. A glicogenose tipo Ia envolve
a deficiência da unidade catalítica que é
responsável por desfosforilar a glicose6-fosfato1,5.
A entidade foi denominada doença de
von Gierke em homenagem ao seu descobridor Edgar von Gierke4. Os tipo de
glicogenose são descritos na tabela I.
Diagnóstico
A clínica que alia a história da doença e
um bom exame físico contribui imensamente para um diagnóstico preciso
através da identificação de sinais característicos de cada grupo de erros inatos
do metabolismo2,6.
Os primeiros sinais e sintomas que
podem levar a investigação da presença
TABELA I – TIPOS DE GLICOGENOSES.
TIPO
DENOMINAÇÃO
ENZIMA DEFEITUOSA
TECIDOS ATINGIDOS
0
Glicogenose A
glicogênio sintetase
Fígado, músculo
Ia
D. de von Gierke
Glicose-6-fosfatase
Fígado, rins e intestino
IaSP
Subunidade catalítica
Fígado, músculos e
intestino
Ib
Translocase 1
Fígado, músculos e
intestino
Ic
Translocase 2
Fígado, músculos e
intestino
Id
Translocase 3
Fígado, músculos e
intestino
II
D. de Pompe
α -1,4-glicosidade
glicosidase lisossômica
Coração, músculos e
intestino
III
D. de Cori
Amilo-1,6-glicosidase
Fígado, músculos e
coração
IV
D. de Andersen
Amilo-(1,4 - 1,6)-transglicosidase Fígado
V
D. de McArdle
Fosforilase do glicogênio do
músculo
Músculos
VI
D. de Hers
Fosforilase do glicogênio do
fígado
Fígado
VII
Fosfofrutoquinase do músculo
Músculos
VIII
Fosforilase hepática inativada
Fígado e cérebro
IX
Fosforilase quinase
Fígado e músculo
X
Fosforilase quinase dependente
de AMP- cíclico
Fígado, músculos
XI
Desconhecida
Fígado e rins
Adaptado de 4
22
de glicogenoses em recém-nascido são:
quadro neurológico grave com manifestação precoce de convulsão e aumento
de ácido láctico no sangue, hipoglicemia, convulsão, acidose metabólica,
hiperuricemia e hepatomegalia4,7.
A doença é descrita nos primeiros 28
dias de vida (período neonatal) quando os bebês costumam apresentar hipoglicemia após pequenos períodos de
jejum ou após infecções. A hipoglicemia se caracteriza por palidez, suor frio
e convulsões. Ao exame físico nota-se
o aumento hepático, a obesidade troncular e a “face de boneca”7.
O diagnóstico pela determinação da
atividade enzimática só pode ser realizado em órgão com grande expressão da
enzima exigindo uma biópsia hepática.
São descritas atualmente 14 alterações genéticas diferentes capazes de
alterar ou inativar a atividade da G-6Pase causando a doença de von Gierke,
5,9
podendo o diagnóstico baseado no
DNA ser realizado em qualquer tecido
disponível como sangue, pele ou em
caso de teste pré-natal vilosidade corionica e aminiócitos10-12.
A glicose-6-fosfatase é codificada
pelo gene 17, LEI em estudo descreve
que a informação para a codificação da
enzima ocupa um espaço de 12,5 Kb
e consiste de cinco exons, desse modo
podem ocorrer varias alterações capazes
de afetar a atividade da enzima7,13-15.
Epidemiologia
A glicogenose tipo Ia é de herança genética autossômica recessiva, ou seja,
têm um risco de ocorrência de 25%
a cada gestação de pais heterozigotos,
apresentando incidência de 1:100.000
nascidos vivos3,16. Essa incidência pode
estar subestimada, pois estudos indicam
que muitas crianças morrem antes do
diagnóstico da doença.
A glicogenose tipo Ia representa cerca
de 25% das glicogenoses4.
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p21-27, junho 2009
Fisiopatologia
O glicogênio é um polímero de armazenamento encontrado no citosol de todas as células do organismo, entretanto
está em maior concentração no fígado e
músculo esquelético,17 a formação deste
permite o acúmulo de glicose nas células sem aumentar a pressão osmótica
dentro destas18.
A degradação do glicogênio envolve três etapas: a liberação de glicose
1-fosfato do glicogênio; remodelação
do glicogênio para que seja possível
uma nova degradação e a conversão da
glicose-1-fosfato em glicose-6-fosfato,
para sua devida metabolização17.
O glicogênio é um polímero de glicose ramificado unido através de ligações
glicosidicas α-1,4 em sua cadeia linear
e α-1,6 em suas ramificações que ocorrem a cada oito a dez unidades de glicose
em cadeia linear, por isso a degradação
do glicogênio necessita de varias enzimas. A fosforólise das ligações α-1,4 gera
glicose-1-fosfato, já a quebra das ligação
α-1,6 libera uma glicose livre, esse mecanismo produz cerca de 90% de glicose1-fosfato e 10% de glicose livre19,20.
A glicose-6-fosfato então pode seguir
três destinos: ser usada como substrato
energético na glicólise, seguir pela via
das pentoses-fosfato e gerar NADPH e
derivados de glicose ou ser convertida
à glicose livre sendo liberada na corrente sanguínea17. A glicose fosforilada
(glicose-6-fosfato) não pode atravessar
a membrana e difundir-se para fora da
célula hepática, para a liberação da glicose é preciso a ação da enzima glicose
6-fosfatase que cliva a fosforila formando glicose livre e ortofosfato17.
O metabolismo de glicogênio e os possíveis destinos da glicose são mostrados
na figura I.
A glicose 6-fosfatase está localizada
no lado da luz da membrana do reticulo endoplasmático liso para onde a
glicose 6-fosfato é transportada e en-
tão hidrolisada à ortofosfato e glicose
livre pela unidade catalítica da glicose6-fosfatase19.
A doença de von Gierke se apresenta
quando a atividade da unidade catalítica
da glicose 6-fosfatase está ausente ou
com atividade reduzida no fígado, rim
e intestino.
Quadro clínico e laboratorial
Hipoglicemia
Com a deficiência da glicose-6-fosfatase
a glicose-6-fosfato principal produto
da glicogenólise e gliconeogenese não
pode ser convertida em glicose livre, o
que torna impossível a travessia desta
pela membrana citoplasmática. Como
consequência apenas 8 a 10% da glicose
retirada do glicogênio pode ser usada
para o controle da glicemia, sendo que
essa glicose é proveniente da quebra das
ligações α-1,617. Com isso o fígado não
é capaz de manter os níveis de glicose
no sangue normais, ocorrendo a hipoglicemia.
Há relatos que com o aumento idade
há uma tendência para a diminuição da
hipoglicemia pela redução do consumo
energético4.
Acidose Láctica
A presença de glicose-6-fosfato em excesso no fígado dispara a glicólise, com
o excesso de piruvato produzido o tecido não pode ser suprido de oxigênio
suficiente para suportar toda a oxidação aeróbica desse nutriente. Com isso
utiliza-se o metabolismo anaeróbico
com produção de lactato, levando ao
aumento dos níveis de lactato e piruvato no sangue17.
Em situações normais o lactato é convertido no fígado em glicose por um ciclo de reações chamado de ciclo de Cori,
realizando o processo de gliconeogênese, porém isso não ocorre na glicogenose tipo Ia, aumentando os níveis de
Figura 1 – Metabolismo de glicogênio. - Adapatado de 4
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p21-27, junho 2009
23
lactato cerca de quatro vezes acima dos
valores normais21.
Mesmo com o tratamento ideal em
que a glicose é mantida a níveis normais, a concentração de lactato não
diminui a níveis de 3 a 5 mmoles/L valores considerados normais.
Hiperuricemia
A hiperuricemia resulta tanto da diminuição da depuração renal de urato
secundária à competição com o ácido
láctico e outros, quanto do aumento da
produção do ácido úrico4,22.
A glicose-6-fosfato acumulada é desviada para a via das pentoses fosfato,
levando ao aumento da síntese de purinas, com a grande produção os produtos purínicos são degradados até ácido
úrico21.
A degradação do ATP se acelera em
resposta à hipoglicemia e ao aumento
dos níveis de glucagon e sua ressíntese
requer glicose. Com a baixa disponibilidade de glicose livre para a distribuição
aos tecidos, ocorre acúmulo de ADP que
é convertido a ácido úrico4.
A gota, os cálculos renais e a nefropatia são as consequências da hiperuricemia, a doença renal crônica de etiologia
desconhecida também é uma complicação comum da glicogenose tipo Ia
incluindo fibrose intersticial, atrofia
tubular, focal e segmentar e glomeruloesclerose4,23.
Hipofosfatemia
Uma das consequências metabólicas da
deficiência da G-6-Pase é a hipofosfatemia observada durante os episódios
hipoglicêmicos, pois devido à impossibilidade de conversão da glicose-6-fosfato
em glicose, o fosfato não é liberado da
molécula de glicose-6-fosfato, resultando em baixa de fosfato intracelular livre.
Como há necessidade do fosfato para
outras atividades, ocorre desvio compensatório do fósforo extracelular para
24
o interior da célula gerando hipofosfatemia4,24,25.
Hiperlipidemia
Os níveis de triglicérides podem chegar
a 4.000 a 6.000 mg/dl e o colesterol
pode atingir 400 a 600 mg/dl com LDL
elevado e HDL reduzido.
A hiperlipidemia se deve ao aumento dos produtos da via glicolítica como
o NADPH, NADH, fosfato, glicerol-3fosfato e coenzima A, essenciais para a
síntese de colesterol e ácidos graxos. Os
triacilgliceróis são sintetizados a partir
de um ácido graxo ativado e um produto fosforilado de três carbonos, proveniente do catabolismo da glicose4,19.
A hepatomegalia acentuada característica da glicogenose é atribuída mais
à deposição de gordura no fígado do
que ao acúmulo de glicogênio, causando tumefação dos hepatócitos4. Porém
mesmo com o perfil lipídico alterado os
pacientes mostram risco de doença coronariana e isquêmicas iguais a de um
individuo normal4.
O manejo da dieta associa-se com a
queda dos níveis de triglicérides, mas
estes não chegam a alcançar valores
normais e a associação de clofibrato e
niacina obtém sucesso no controle da
trigliceridemia em pacientes que não
responderam à dieta.
Complicações renais
Pacientes com glicogenose tipo Ia sob
bom controle metabólico da glicemia
ainda experimentam a longo prazo
complicações da doença, eles continuam a sofrer de hiperlipidemia, hiperuricemia, hipercalciúria e acidemia láctica e doença renal crônica de etiologia
desconhecida23.
A nefropatia por gota e a nefrocalcinose podem estar presentes. A hipercalciúria provavelmente é um fenômeno
secundário a alterações da acidificação
renal4,26.
Pacientes com glicogenose tipo I
também manifestam hiperuricemia e
hiperlipidemia que podem ser fatores
independentes de risco para o desenvolvimento e a progressão da doença
renal23.
A disfunção renal é vista na maioria
dos pacientes a partir da segunda década de vida4.
Adenomas e neoplasias hepáticas
A partir da segunda e terceira década de
vida cerca de 50 a 70% dos indivíduos
com glicogenose tipo I desenvolvem
adenomas hepáticos, que podem levar
a hemorragia aguda e transformação
maligna, os tumores são múltiplos, pequenos e não capsulados4.
Os pacientes do sexo masculino apresentam adenomas hepáticos na proporção de 2:1 em relação ao sexo feminino,
sendo que a patogênese dos carcinomas
em geral não esta elucidada, porém
existem algumas hipóteses que incluem
desequilíbrio da relação glucagon/insulina, sobrecarga de glicogênio celular e
ativação de protooncogenes4.
Tratamento
O tratamento da doença de von Gierke
é feito principalmente através da dieta.
Os objetivos da dietoterapia são manter
a homeostase da glicose para prevenir
as reações hipoglicêmicas e fornecer
proteínas e calorias suficientes para o
balanço positivo de nitrogênio e para
o crescimento normal evitando déficit
de crescimento e as demais alterações
metabólicas27.
Deve-se atingir a Recommended Dietary Allowances (RDA). A distribuição
de macronutrientes da dieta deve ter
percentual de 30 a 45% de carboidrato
oferecido na forma de amido de milho
cru e os carboidratos totais deve atingir de 60 a 70% do total energético da
dieta. A distribuição de lipídeos deve
abranger de 20 a 25% das calorias sen-
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p21-27, junho 2009
do seguida a mesma proporção de uma
dieta comum para as gorduras monoinsaturada, poliinsaturada, saturada e colesterol, a proteína deve atingir de 10 a
15% 4,16,27.
A frutose e a galactose são metabolizados à glicose-6-fosfato, portanto
deve-se evitar o consumo de lactose,
frutose e sacarose, que podem provocar acidose láctica, no entanto não há
concordância cientifica sobre a restrição
desses monossacarídeos4,16.
Há duas abordagens dietoterápicas
tradicionais para manter os níveis de
glicemia dentro dos valores normais
de referência; uma delas é alimentação
contínua por sonda que é considerada o
maior avanço no tratamento da glicogenose, a administração oral de polímeros
de glicose de digestão lenta é outra conduta adotada para a manutenção dos
níveis de glicemia podendo-se ainda fazer a combinação das duas técnicas4,16.
Tanto através do tratamento com amido
de milho cru como a Infusão noturna de
glicose (ING) consegue-se bons resultados no controle da glicemia e da taxa de
crescimento4.
O uso do amido de milho cru para a
manutenção da glicemia é recomendado a cada 2 a 4 horas, dependendo do
intervalo de tolerância ao jejum relativo
à atividade residual da enzima, em menores de 2 anos deve-se diluir 1,65 g/kg
de peso/dose de amido de milho em 1:2
partes de água à temperatura ambiente,
e para crianças maiores de 2 anos em
intervalos de quatro horas na dose de
1,75 a 2,5g por kg de peso por dose.
O amido deve ser dado com água fria,
pois a mistura com água morna, quente
ou limonada acelera sua hidrólise, não
obtendo o efeito desejado4,8,28.
O início da ING é realizado no hospital
com taxa de infusão de glicose igual a
7mg/kg/min e posteriormente ajustada
para 4-6mg/kg/min para manter a glicemia recomendando a solução de dex-
trose a 25% ou 50 %. Na primeira noite
a glicemia precisa ser controlada a cada
quatro horas e antes da retirada a cada
manhã. Para a infusão noturna de glicose é necessária a realização do cálculo
da taxa basal de produção de glicose: y
= 0,0014x³ - 0,214x² + 10,411x - 9,084,
onde y = mg de glicose por minuto e x
= peso em kg, o resultado representa
a quantidade mínima de glicose necessária para manter a glicemia em níveis
normais 4,16.
A transição entre a ING e a alimentação e vice-versa deve ser bem controlada para impedir a hipoglicemia, a
última refeição deve ser oferecida não
ultrapassando três horas para o inicio
da ING, já a primeira refeição deve ser
oferecida antes de se interromper a ING,
com antecedência mínima de 30 minutos antes da interrupção4,16.
Entre 4 e 6 meses de idade é indicada
a introdução de outros alimentos como
é habitual na idade, porém carboidratos
complexos devem ter ênfase na forma
de aveia, cevada, arroz, massas e legumes, preterindo batatas e pães 4,16.
O uso do amido de milho cru é recomendado após os dois anos de idade,
pois das enzimas amilase pancreática e
a glicoamilase intestinal responsáveis
pela digestão de amido no organismo só
a glicoamilase apresenta atividade comparada a de um adulto a partir do primeiro mês de vida, a atividade da amilase pancreática no período neonatal é
considerada desprezível, só alcançando níveis comparados ao de um adulto
aos dois anos de idade. No entanto sua
atividade pode ser estimulada a partir
do oitavo mês de vida, antes disso as
crianças podem não apresentar digestão
TABELA II – Tratamento da doença de von Gierke conforme a idade
Idade
Período do dia/Indicação
Entre 0-12
meses
Dia: Leite materno / leite de fórmula (com maltodextrina e sem lactose) a cada 2-3 horas.
Dos 6 meses em diante substituir até as 6% como máximo e a maltodextrina para arroz na
alimentação.
Noite: Se possível, ANINC durante 12 horas (diminuindo progressivamente de 50% até 35%
da energia diária). caso contrário alimentação freqüente.
Entre 1-3 anos
Dia: 3 refeições com AMPC e 2 refeições principais (preferencialmente AMPC). AMC a cada
4 horas (1,0 - 1,5 g/kg).
Noite: ANINC durante 12 horas (35% da energia). AMC cada 4 horas (1,0 - 1,5 g/kg).
Entre 3-6 anos
Dia: 3 refeições com AMPC e 2 almoços (preferentemente AMPC). AMC cada 4-6 horas
(1,5 - 2,0 g/kg).
Noite: ANINC durante 12 horas (35% da energia). AMC cada 4-6 horas (1,5 - 2,0 g/kg).
Entre 6-12 anos
Dia: 3 refeições com AMPC e 2 almoços (preferentemente AMPC). AMC cada 6 horas
(1,5 - 2,0 g/kg).
Noite: ANINC durante 10 horas (30% da energia). AMC cada 6 horas (1,5 - 2,0 g/kg).
Adolescentes
Dia: 3 refeições com PCCS e 2 almoços (preferentemente AMPC). AMC cada 6 horas
(1,5 - 2,0 g/kg).
Noite: ANINC durante 10 horas (30% da energia).
AMC cada 6 horas (1,5 - 2,0 g/kg).
Adultos
Dia: 3 refeições com AMPC e 2 almoços (preferentemente AMPC). AMC cada 6 horas
(1,5 - 2,0 g/kg).
Noite: ANINC durante 8-10 horas (25-30% da energia). AMC cada 6-8 horas (2,0 g/kg).
ANINC e AMC intercalados nos períodos noturnos (férias / fim de semana).
Adaptado de 29.
Legenda: AMPC: amido de milho pré-cozido; AMC: amido de milho cru; ANINC: Alimentação noturna por infusão
nasogástrica contínua.
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p21-27, junho 2009
25
adequada do amido4,16.
O plano dietético deve ser feito cuidadosamente e revisado para proporcionar
aqueles nutrientes essenciais, merecendo atenção especial o cálcio, devido ao
limitado consumo de leite e a vitamina
D. Além disso, o aumento do metabolismo dos carboidratos necessita de grandes quantidades de vitamina B129.
A dietoterapia apresenta-se como um
eficiente método para controle da doença. A avaliação do sucesso do tratamento pode ser realizada através dos níveis
de lactato e acido úrico no sangue, o
nível sérico de lactato reflete o estado
metabólico recente decorrente da queda da glicemia no dia, enquanto que os
níveis do ácido úrico e dos triglicérides
refletem o controle a longo prazo16.
O tratamento para portadores da doença de von Gierke conforme a idade é
apresentado na TABELA II.
O tratamento dietético da glicogenose
é acompanhado da melhora das alterações renais. A rápida resposta ao tratamento pode explicar a razão pela qual a
disfunção renal não é encontrada mais
frequentemente4.
O tratamento medicamentoso pode
ser usado nos casos em que a dietote-
rapia não é capaz de evitar as complicações metabólicas. O alopurinol pode ser
usado em casos em que não se consegue
controlar os níveis de ácido úrico8.
Em casos de hipoglicemia grave devese administrar imediatamente uma solução de glicose por via intravenosa29.
O transplante hepático pode ser considerado nos casos em que o manejo dietético não obtém sucesso, necessitando
de frequentes internações. O transplante
de fígado é considerado o procedimento mais complexo da cirurgia moderna,
pois interfere em muitas funções do organismo. O sucesso da operação depende de uma boa infra-estrutura hospitalar,
uma experiente e bem treinada equipe
multiprofissional. 27,30.
O transplante hepático é utilizado
com sucesso nos casos de adenoma hepático com aumento gradativo, quando
não se pode afastar a possibilidade da
transformação maligna e que a ressecção esteja inviabilizada4.
1. Jardim LB, Ashton-Prolla P. Erros inatos do
metabolismo em crianças e recém-nascidos
agudamente enfermos: guia para o seu diagnóstico e manejo. J Ped 1996;72:63-72.
Leone CR, Costa MTZ, Corradini HB. Erros
inatos de metabolismo: Uma abordagem
diagnóstica. Ped 1994;16:82-6.
7. Brunoni D. Avaliação Genético-Clínica do
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9. Stroppiano M, Regis S, Dirocco M, Caroli
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6. Feferbaum R, Ceccon MEJ, Diniz EMA,
26
Prognóstico
O descumprimento do tratamento resulta em sérias consequências metabólicas,
com graves crises de hipoglicemia acompanhada de danos neurológicos4,31.
O tratamento proposto atualmente
apresenta significante melhora do quadro clínico, sendo refletido na melhora
do prognóstico nos pacientes com glicogenose tipo Ia, com expectativa de vida
ultrapassando a terceira década4.
Devido à relativa raridade da doença
não existem dados sobre a porcentagem
de sobrevida de acordo com as diferentes faixas etárias.
Conclusão
O diagnóstico precoce dos erros inatos
do metabolismo é de extrema importância para o inicio imediato do tratamento, sendo necessário conhecer
a fisiopatologia para a adoção da dietoterapia ideal e para o indispensável
aconselhamento familiar que compreenda principalmente, o prognóstico do
paciente e a importância da adesão ao
tratamento.
Agradecimento
Agradeço a Dr. Neuza Maria de Magalhães pelas opiniões criticas e incentivo
na realização do trabalho e a Nutricionista do Hospital Infantil João Paulo II,
Olindina Neme Barbosa Miranda pelas
informações disponibilizadas.
defects. Arch Dis Child 1990;65:59-67.
12. Lei KJ, Chen YT, Chen H, Wong LC, Liu J.
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inatos do metabolismo. In: Bodinski LH, Ritt
R. Dietoterapia Princípios e pratica. São Paulo: Atheneu, 2006. p. 282-3.
2 A doença de von Gierke pode ser confirmada pelos seguintes
exames, exceto:
a) Determinação da atividade enzimática de
glicose-6-fosfatase em tecido hepático
b) Ausência de glicose-6-fosfatase no sangue
c) Analise de DNA, detectando-se uma das
alterações do gene 17, compatível com as
alterações encontradas na doença de von
Gierke
d) Teste pré-natal de vilosidade corionica e aminiócitos
3. Em relação à dietoterapia para a doença
de von Gierke é correto afirmar que:
a) A frutose e a galactose são metabolizados à
glicose-6-fosfato, portanto deve-se evitar o
consumo de lactose, frutose e sacarose, que
podem provocar hipofosfatemia
b) A infusão noturna de glicose é o tratamento
ideal, indicado a todos os paciente
c) Não se deve atingir a Recommended Dietary
Allowances (RDA) dos nutrientes.
d) O amido deve ser dado com água fria, a mistura com água morna, quente ou limonada
acelera sua hidrólise, não obtendo o efeito
desejado.
28. Martins AM, Micheletti C, Vertemati T. Erros
inatos de metabolismo grupo 3. [período na
internet] 2007 [citado 2008 Nov 23]. Disponível em: www.unirio.br/dmp/Graduacao/
Medicina/Patologia/Erros%20Inatos%20
do%20Metabolismo.pdf.
29. Rake JP. Estudio Europeo sobre Glucogenosis Tipo I. Rijksunniversiteit [período na
internet] 2006 Set [citado 2008 Out 07].
Disponível em: www.glucogenosis.org/docs/
ESGSDI.pdf.
30. Mies S. Transplante de fígado. Revista Associação Médica Brasileira, 1998;44:127-34.
31. Rennie J, Boylan G. Tratamento das convulsões neonatais. 2007. Arc Dis Child Fetal
Neonatal 2007;92:148-50.
Avaliação
Questões artigo “Doença de von Gierke: estudo
de revisão”.
1. Dentre os sinais e sintomas que podem
levar a investigação da presença de
glicogenoses em recém-nascido são,
exceto:
a) Convulsão
b) Hepatomegalia
c) Hiperglicemia
d) Face de Boneca
Preencher ficha na página 43 e enviar à SOPERJ
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p21-27, junho 2009
27
Relato de Caso
Dificuldades no Diagnostico e Manejo da
Acidemia Metilmalônica - Relato de Caso
Sugestivo
Difficulties in diagnosis and treatment of
Methylmalonic Aciduria - Suggestive Case
Report
Introdução: A acidemia metilmalônica (AMM) é um erro inato do metabolismo (EIM) dos
ácidos orgânicos. Existem duas formas clínicas : uma neonatal e outra tardia, a maioria com
apresentação súbita no período neonatal. Os afetados apresentam sintomas graves, que muitas
vezes os levam ao óbito, e são freqüentemente confundidos com septicemia, pois ambas as
situações apresentam acidose e encefalopatia aguda. Objetivo: Relatar um recém-nascido
com quadro sugestivo de AMM que evoluiu para o óbito por dificuldades e demora no
diagnóstico e tratamento, visando a divulgação do conhecimento deste EIM. Materiais e
Métodos: Estudo descritivo constando de relato de caso. Resultados: KSC, 22 dias de vida, foi
trazido ao pronto-socorro com história de intolerância alimentar desde o nascimento. O RN
estava desnutrido grau III e desidratado e foi internado na UTI neonatal. Considerado sepse
e iniciado esquema empírico de antibioticoterapia. Após persistência do quadro, foi iniciado
screening para EIM que mostrou aumento moderado de C3. Os ciclos de metronidazol, a
suplementação de L-carnitina e megadoses de vitaminas foram feitos, como recomenda o
protocolo. Com a dificuldade em se obter a fórmula láctea recomendada (XMTVI analog),
foi tentada associação de TCM e leite 80056, sem sucesso. O início da referida fórmula láctea
deu-se no 87º dia de internação, dois dias antes do óbito do neonato. Considerações Finais: Ressaltamos a necessidade do conhecimento da AMM, pois o prognóstico do paciente
está relacionado ao tempo para instituir o tratamento adequado. As dificuldades em seguir
o protocolo diagnóstico e terapêutico contribuem para um pior desfecho.
Raphaella de Oliveira Cunha Trindade 1
Raquel Siqueira Leonel De Paula 2
Carlos Alberto Bhering 3
Isaias Soares De Paiva 4
1 Residencia Medica (Medico Residente em
Pediatria)
2 Medico residente em pediatria (medico)
3 Doutor (coordenador uti neonatal)
4 Doutor (geneticista)
Endereço para correspondencia
Av Domingos Mariano 339 apto 504
Centro - Barra Mansa cep 27345-310
Palavras-chave: Acidemia Metilmalônica, Erro Inato do Metabolismo, Acidemias, Diagnostico,
neonato
28
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p28-34, junho 2009
Introduction: Methylmalonic aciduria (MMA) is an inborn error of metabolism (IEM) of
organic acids. We can find two clinical forms, the first, in neonatal period and the other with
late onset. Most of cases show up in neonatal period.These patients are seriously injured and
most of them have fatal outcome and the symptoms are frequently confused with sepsis,
since both of situations present acidosis and acute encephalopathy. Objective: To relate a
newborn with a suggested case of MMA who had a fatal outcome due to difficulties and delay
in diagnosis and treatment, emphasizing the importance of knowing this disease. Materials
and Methods: Descriptive study consisting of case report. Results: KSC, 22 days old, was
brought to emergency with past of food intolerance since his birth.. The newborn was malnourished and dehydrated and was admitted to the Neonatal Intensive Care Unity. Sepsis
was considered and empirical antibiotic therapy was introduced. A screening for IEM was
started and has shown a moderate increase of C3. Metronidazole cycles, supplementation of
L-carnitin and large doses of vitamins were done according to the recommended protocol for
MMA´s treatment. Because of the difficulty to obtain the recommended milt formula (XMTV
analog®), another association was tried and failed. The referred milt formula was introduced
at the 87º day placed in hospital, two days before newborn’s death. Final Considerations:
We emphasize the need of knowing MMA, because the prognosis is related to the early
diagnosis and appropriate treatment. Difficulties to follow diagnosis and treatment protocols
contribute to a worse outcome.
Keywords: Methylmalonic Aciduria, Inborn Error Of Metabolism, Acidurias, Diagnosis, Newborn
1 - INTRODUÇÃO
A acidemia metilmalônica (AMM) é
um dos mais freqüentes erros inatos
do metabolismo (EIM) dos ácidos orgânicos. O defeito bioquímico se localiza no metabolismo do propionato, na
etapa de conversão de ácido metilmalônico a ácido succínico. Existem dois
tipos de alterações básicas: o defeito
na apoenzima (metilmalonil-mutase)
e o defeito de coenzimas (metil B-12
e 5-desoxiadenosil-B12)1[i] . A maioria dos pacientes tem um defeito na
conversão de metilmalonil CoA a succinil CoA pelo defeito de apoenzima
(metilmalonil-mutase). Esse grupo é
o mais comum e não responde a administração de vitamina B12. No outro
grupo, com defeito de coenzimas, a
vitamina B12 (1mg/dia) reduz significativamente a excreção do ácido
metilmalônico2[ii] 3[iii] 4[iv] 5[v] 6[vi] 7[vii] .
Clinicamente se podem diferenciar duas formas, uma neonatal e outra de início tardio1, sendo a maioria
com apresentação súbita no período
neonatal8[viii]. Em ambas as formas, se
destacam a existência de cetoacidose,
dificuldade de desenvolvimento e hipotonia muscular1. A AMM se apresenta
com crises de descompensação que são
precipitadas pela ingesta de proteínas e
de vários aminoácidos, principalmente
leucina. As manifestações neurológicas
são hipotonia e convulsões mioclônicas
que podem levar ao coma2 3 4 9[ix] 10[x]. Os
afetados apresentam sintomas graves,
que muitas vezes os levam ao óbito, e
são freqüentemente confundidos com
septicemia, visto que ambas situações
se caracterizam por acidose e encefalopatia aguda8. Embora rara, a preva-
lência da AMM é de 1 em 48000 na
população geral11[xi].
É essencial que o pediatra se familiarize com a apresentação clínica dessas desordens, com uma investigação
laboratorial mais adequada, com um
melhor manejo na estabilização de
pacientes criticamente doentes, e com
a identificação daquelas crianças que
poderiam se beneficiar de investigação
e tratamento específicos12[xii].
O objetivo deste estudo é relatar um
caso de um recém-nascido com quadro sugestivo de AMM que evoluiu
para o óbito por dificuldades e demora
no diagnóstico e tratamento, visando
a divulgação do conhecimento deste
EIM.
2 - MATERIAIS E MÉTODOS
Estudo descritivo constando de relato
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p28-34, junho 2009
29
de caso. Os dados foram obtidos através
de revisão de prontuário do paciente
internado na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal da Santa Casa de
Misericórdia de Barra Mansa - RJ. Foi
realizada também entrevista com os
médicos assistentes, além de pesquisa
na Internet em base de dados da literatura médica (Bireme, PubMed e Scielo)
utilizando os termos “methylmalonic
aciduria”.
3 - RESULTADOS
KSC, 22 dias de vida, procedente de
Barra Mansa, filho de JSC, 20 anos,
dona de casa, GII PI AI, tipo sanguíneo O positivo. Pré-natal completo (10
consultas). Mãe referiu perda de líquido a partir do sétimo mês de gestação e
oligodramnia. Nasceu de parto cesáreo,
no termo, na 38ª semana de gestação,
sem evidências de asfixia. Pesou 2.990
gramas, mediu 46 centímetros, sendo
classificado como adequado para a idade gestacional (AIG), tipo sanguíneo B
positivo e de cor negra. Recebeu alta da
maternidade com 48 horas de vida com
aleitamento materno exclusivo.
O neonato é filho de pais jovens, não
consangüíneos, aparentemente saudáveis, sem história de óbitos neonatais
precoces anteriormente. Nega casos
semelhantes em grupo familiar próximo.
Aos 22 dias de vida, o recém-nascido
(RN) foi trazido ao pronto-socorro do
hospital pela primeira vez. A mãe relatava história de intolerância alimentar
desde o nascimento, com episódios de
vômitos constantes e evacuações amareladas e amolecidas. Os vômitos eram
pós-prandiais e a freqüência das evacuações aumentada. A mãe relatava também ter mudado o tipo de leite várias
vezes sem sucesso.
No 22º dia de vida, o RN mostrava
desnutrição grave (grau III) e sinais
de desidratação (irritado, olhos enco-
30
vados, fontanelas deprimidas, choro
fraco e sem lágrimas, pulsos finos e
elasticidade da pele diminuída), com
descamação cutânea e hipotonia generalizadas, sem desconforto respiratório,
anictérico, acianótico e afebril. Peso de
2.165g (percentil menor que 3). Exame
físico segmentar sem anormalidades. O
RN foi considerado desnutrido grau III
e desidratado e internado na Unidade
de Terapia Intensiva Neonatal do referido hospital sendo instituída hidratação
venosa (HV) (80ml/ Kg/ dia) com taxa
de infusão de glicose (TIG) de 5,0 mg/
kcal/min e dieta oral por sucção (37
ml/ Kg/ dia) de LHO ou NAN I 3/3 hs.
A HV foi suspensa no 5º dia de internação. Os exames complementares realizados durante a internação constam
no apêndice 1. Tendo em vista persistência dos vômitos, foi iniciado o leite
Pregestimil por gastróclise e Motilium
com melhora relativa. Do 5º ao 34º dia
de internação, evoluiu com estabilidade
clínica e vômitos esporádicos e dificuldade de ganho de peso (Apêndice 2 gráfico do peso). No 35º dia, apresentou
hipotonia, hiporreatividade, palidez
cutâneo-mucosa e síndrome diarreica
(fezes líquidas, 7 a 8 episódios por dia),
necessitando de hidratação venosa. Foi
considerada sepse e iniciado esquema
empírico de antibioticoterapia (oxacilina e cefotaxime) mantidos por 10 dias.
Evoluiu, nas duas semanas seguintes,
apresentando hipoxemia corrigida com
oxigenioterapia (no hood com FiO2
média de 0,3) que, por vezes, provocava episódios de hiperóxia. Havia também acidose metabólica necessitando
de infusão de bicarbonato de sódio.
Tentativas de diminuição ou retirada
da infusão de bicarbonato de sódio produziram piora da acidose e, somente no
42º dia, foi possível sua retirada.
O screening para EIM (“teste do pezinho alargado ou completo” - perfil
tandem), colhido no 37º dia de vida,
mostrou resultado negativo para aminoacidopatias, distúrbios do ciclo da
uréia e galactosemia, além das doenças do teste de screening padrão. Foi
observado aumento moderado de C3,
uma acilcarnitina com excreção urinaria aumentada em ambas acidemias
metilmalônica e propiônica. Esta alteração pode ser encontrada na AMM ou
acidemia propiônica. Foi então sugerida
realização de análise quantitativa dos
ácidos orgânicos urinários.
Aos 48 dias, seguindo orientação de
especialista em EIM, foi iniciado ciclo
de metronidazol por 5 dias, benzoato de
sódio, biotina, tiamina, vitamina B12 e
L-carnitina. Neste período, apresentou
abalos de extremidades interpretados
como crise convulsiva e iniciado dose
de ataque de fenobarbital (10mg/ Kg)
e manutenção de 5 mg/ Kg por 12 dias.
Ocorreu, também, evento de desidratação grave e bradicardia com repercussão hemodinâmica necessitando de
reanimação com ventilação com pressão positiva, masssagem cardíaca externa, adrenalina (3 doses), duas etapas
rápidas de SF 0,9% (50 e 20 ml/ Kg),
furosemida (3 doses), e reposição de bicarbonato de sódio. Persistia a acidose
metabólica e necessidade de administração de bicarbonato de sódio.
Aos 49 dias de internação, foi iniciado o leite 80056® por gastróclise e em
bomba de infusão contínua (BIC) por
30 minutos. Após três dias de seu início,
voltou a apresentar intolerância à dieta.
Foi tentado aumentar a taxa calórica
diariamente associando também o triglicerídeo de cadeia média (TCM). Aos
52 dias de internação, iniciou-se coleta
de gasometria arterial diariamente com
o objetivo de manter o bicarbonato acima de 18 mosm/l. Iniciou-se o segundo
ciclo de metronidazol por 5 dias e programado repetição a cada 20 dias. Aos
70 dias de internação, por apresentar
edema periférico e palpebral, iniciou-
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p28-34, junho 2009
se controle de proteínas plasmáticas,
repondo albumina quando necessário.
Evoluiu com alternância de desidratação e anemia e melhora relativa. No 84º
dia foi iniciado o leite XMTVI analog
na dose de 1g/ Kg/ dia com aumento
progressivo de 0,5g/ Kg/ dia associado a
NAN Soy e TCM. Evoluiu, entretanto,
com persistência de acidose metabólica.
No 89º dia, pesando 2.460g, apresentou
episódio de hipotermia e bradicardia
evoluindo para o óbito.
4 - REVISÃO DA LITERATURA
Muitos erros inatos do metabolismo
(EIM) surgem precocemente, e, freqüentemente no período neonatal. Os
principais grupos de EIM com aguda
e severa apresentação na infância incluem: defeitos do metabolismo de
carboidratos (galactosemia clássica),
defeitos no ciclo da uréia (deficiência
da transcarbamilase ornitina), acidúria
orgânica (acidúria propiônica), aminoacidopatias (hiperglicemia não cetótica),
defeitos no metabolismo de ácidos graxos (deficiência da cadeia média acilCoA desidrogenase)13[i].
Acidúrias ou Acidemias Orgânicas
são doenças hereditárias autossômicas
recessivas causadas por deficiência severa da atividade de uma enzima, usualmente do metabolismo dos aminoácidos, resultando no acúmulo tecidual
de um ou mais ácidos carboxílicos14[ii]
15[iii]
(figura 1). Se comparada a outros
grupos de EIM, as acidemias orgânicas são consideradas as doenças metabólicas mais freqüentes em crianças
severamente enfermas16[iv] 17[v] e dos
mais freqüentes grupos de enfermidades hereditárias do metabolismo18[vi] .
A prevalência é provavelmente subestimada, uma vez que uma proporção substancial de casos permanece
não diagnosticada ou diagnosticada
erroneamente19[vii] . O quadro 1 demonstra a freqüência das acidemias
Quadro 1
Quadro 2
orgânicas na população geral.
A acidemia metilmalônica (AMM) é
um dos mais freqüentes erros inatos do
metabolismo (EIM) dos ácidos orgânicos. O defeito bioquímico se localiza no
metabolismo do propionato, na etapa
de conversão de ácido metilmalônico a
ácido succínico. Existem dois tipos de
alterações básicas: o defeito na apoenzima (metilmalonil-mutase) e o defeito
de coenzimas (metil B-12 e 5-desoxiadenosil-B12)1. A maioria dos pacientes
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p28-34, junho 2009
31
Quadro 3
Quadro 4
tem um defeito na conversão de metilmalonil CoA a succinil CoA pelo defeito
de apoenzima (metilmalonil-mutase).
Esse grupo é o mais comum e não responde a administração de vitamina B12.
No outro grupo, com defeito de coenzimas, a vitamina B12 (1mg/dia) reduz
significativamente a excreção do ácido
metilmalônico2 3 4 5 6 7.
A forma de apresentação mais comum da doença é a de início súbito no
período neonatal. Cetoacidose, dificuldade de desenvolvimento e hipotonia
muscular estão presentes nas duas formas da doença, seja com início no período neonatal ou mais tardiamente1 As
convulsões mioclônicas podem levar
ao coma e as crises de descompensação
são precipitadas pela ingesta proteica,
principalmente de leucina 2 3 4 ii[ix] iii[x]
.Os sintomas são geralmente graves e
confundidos com septicemia devido a
32
ocorrência de acidose e encefalopatia
aguda em ambas as situações.8
De acordo com a figura 2, que ilustra um protocolo laboratorial para o
diagnóstico das acidúrias orgânicas, o
recomendado seria a análise dos ácidos
orgânicos que é feito por cromatografia
gasosa ou, de preferência, por cromatografia gasosa associada à espectrometria de massa 20[viii] em amostras ocasionais de urina, devendo-se dar preferência à amostras colhidas durante
crises de descompensação (Quadro 2).
O diagnóstico correto de uma acidúria
orgânica depende da identificação de
vários metabólitos (ácidos orgânicos específicos). Muitas vezes, o diagnóstico é
somente conseguido através da análise
repetitiva de amostras coletadas em períodos distintos, especialmente durante
descompensação metabólica, quando
os níveis dos metabólitos anormais au-
mentam sua concentração. Quando o
diagnóstico não é conseguido por esse
método, podem ser realizados testes de
sobrecarga com substratos proximais
ao bloqueio metabólico ou, excepcionalmente, pela determinação da atividade enzimática em células cultivadas
(fibroblastos)21[ix] 22[x].
Em algumas ocasiões a criança afetada morre sem definição do diagnóstico
da doença metabólica genética suspeita.
Nestes casos, é essencial coletar amostras post mortem para esclarecimento
diagnóstico e posterior aconselhamento
genético e diagnóstico pré-natal. Os estudos mais importantes para essas situações são a determinação quantitativa
de aminoácidos no plasma e líquido cefalorraquidiano, a determinação de ácidos orgânicos na urina e de acilcarnitinas em plasma, urina ou papel de filtro
impregnado com sangue ou plasma8.
O diagnóstico pré-natal em gravidezes
de risco pode ser confirmado pela demonstração de diminuição significativa
da atividade enzimática em vilosidades
coriônicas e em fibroblastos23[xi].
O tratamento se baseia na restrição
dos aminoácidos que se metabolizam
a propionato e, em muitos casos, em
preparados especiais que garantem o
mínimo de proteína necessária para o
crescimento1. As estratégias de tratamento estão resumidas no quadro 38.
O tratamento deve ser fundamentado
na prevenção do acúmulo de substâncias tóxicas com a restrição de ingesta
protéica ou de outros substratos e inibição do catabolismo com a prevenção de
infecções, jejum prolongado ou abuso
alimentar; na eliminação dos metabólitos tóxicos por exsanguíneo transfusão,
hemodiálise e, por medidas de suporte
geral (correção do pH sérico, ventilação mecânica assistida e hidratação
adequada)24[xii].
Para o caso das doenças metabólicas
com apresentação aguda neonatal, o
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p28-34, junho 2009
tratamento deve iniciar o mais precocemente possível durante as crises metabólicas agudas, mesmo que a etiologia
da doença seja ainda desconhecida. A
terapia deve ser ampla e abranger vários
grupos de doenças: acidúrias orgânicas,
doenças do ciclo da uréia e defeitos no
catabolismo de glicídeos e lipídeos. A
retirada de toda a proteína da dieta durante as crises se faz necessária, uma
vez que, a grande maioria das acidemias orgânicas é decorrente da falta de
atividade enzimática em um passo do
metabolismo dos aminoácidos. É também fundamental manter o anabolismo através da administração isocalórica ou hipercalórica (mais de 150 Kcal/
Kg/dia) além da infusão intravenosa de
grande quantidade de líquidos para evitar a desidratação. Sonda nasogástrica
com alto aporte de alimentação lipídica
é bastante útil. Com a melhora do paciente, deve-se adicionar gradualmente
proteína até atingir uma quantidade tolerável que é individual para cada afetado. Megadoses de vitaminas específicas
também são indicadas para os pacientes
durante os episódios agudos, visto que
o defeito metabólico em várias acidemias orgânicas pode ocorrer ao nível da
formação das coenzimas, derivadas das
vitaminas e essenciais para as reações
enzimáticas25[xiii].
Alguns estudos têm recomendado o
emprego de metronidazol como parte
da terapêutica desta entidade26[xiv] 27[xv].
O uso desta droga e de outros agentes
antibacterianos intestinas na acidemia
metilmalônica é relativamente recente e apresenta resultados animadores26
27
. A utilização desta droga se apóia na
base teórica de tentar diminuir a produção de ácido metilmalônico pelas
bactérias intestinais, síntese esta que
alcança 30% do total 28[xvi]. Espera-se
com o tratamento a longo prazo, o aumento do apetite e ganho de peso além
da diminuição da eliminação urinária
de ácido metilmalônico26 27.
A terapia dietética de longo prazo é
essencial para reduzir as concentrações
dos metabólitos tóxicos e promover o
desenvolvimento normal8. Suas metas
visam estabilizar o balanço metabólico através da restrição dietética dos
aminoácidos, isoleucina, metionina,
treonina e valina, para manter a homeostase bioquímica. O aporte protéico inadequado pode resultar em déficit
de crescimento em crianças, perda de
peso, baixa concentração de albumina
sérica, osteopenia em adultos e perda
de cabelos em ambos. O aporte energético inadequado resulta em um déficit de crescimento e baixo peso. As
fontes de energia recomendadas são:
fórmula láctea de primeiro semestre,
fórmula para acidemia para o primeiro
ano (SHS XMTVI analog, Milupa OS1),
polímeros de glicose, açúcar simples,
saborizantes, triglicerídeos de cadeia
média (TCM) e óleos vegetais.
O quadro 4 apresenta os produtos
dietéticos comercialmente disponíveis
para o tratamento específico de algumas dessas doenças8.
A determinação seriada da concentração urinária dos ácidos orgânicos é
muito importante para verificar a adequação do tratamento dietético ou vitamínico. Através dos níveis plasmáticos
de albumina e de aminoácidos, bem
como a avaliação do desenvolvimento
físico (peso e altura) pode-se monitorar o tratamento e o estado nutricional do afetado. A suplementação de
L-carnitina (50 - 300mg/Kg/dia) tem
sido bastante útil, pois os metabólitos
tóxicos (ácidos) que se acumulam nas
acidemias orgânicas se unem à carnitina para serem excretados, provocando
déficit dessa substância que é essencial
para o transporte de ácidos graxos para
o interior da mitocôndria. A diminuição dos níveis teciduais de carnitina resulta, portanto, por um lado, na menor
excreção desses metabólitos e, por outro, em déficit de produção de energia
principalmente no músculo8.
Os recentes avanços no diagnóstico
e tratamento dos EIM têm significativamente melhorado o prognóstico de
muitas dessas doenças.
5 - DISCUSSÃO
Relatamos um lactente com quadro sugestivo de AMM, um EIM complexo,
grave e isoladamente raro. É sabido que
o diagnóstico das acidúrias orgânicas,
na prática, não é realizado oportunamente e isto sempre leva a um pior
prognóstico.
Neste caso, após o resultado do teste
do pezinho alargado, excluiram-se as
patologias relacionadas com o ciclo da
uréia, aminoacidopatias e a galactosemia, tendo sido observado um aumento
moderado de C3, que pode ser visto em
ambas as acidúrias propiônica ou metilmalônica. De acordo com o protocolo
diagnóstico, a análise quantitativa dos
ácidos orgânicos urinários deveria ter
sido realizada20. Porém, por dificuldades burocráticas, institucionais e governamentais, custo elevado do exame e
indisponibilidade de laboratório, não
foi possível realizá-la.
Deste modo, o tratamento foi iniciado para as acidúrias orgânicas, além da
correção dos distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-básicos com hidratação
venosa, quando necessário, e reposição de bicarbonato de acordo com as
gasometrias. Mesmo assim, o paciente
evoluiu com piora progressiva, necessitando de reposição contínua de bicarbonato de sódio. Evoluiu também com
episódios de edema periférico e periorbitário, sendo necessária a reposição de
albumina. Os ciclos de metronidazol,
a suplementação de L-carnitina e megadoses de vitaminas foram feitos, de
acordo com o protocolo recomendado
para tratamento de AMM 26 27.
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p28-34, junho 2009
33
Apesar de todos os esforços, com a
fórmula láctea iniciada tardiamente,
persistiu a acidose metabólica e o paciente nem chegou a recuperar o peso
de nascimento, evoluindo a óbito.
Ressaltamos as dificuldades do manuseio do paciente com um EIM complexo
como a AMM. A maior dificuldade do
caso foi obter o aporte nutricional adequado para o paciente. A fórmula láctea
recomendada, XMTVI analog8, foi iniciada tardiamente. Diante da demora,
foi tentada, sem sucesso, a associação
do leite 80056 e TCM.
Acreditamos que essas dificuldades
devem ter contribuído para o desfecho.
Apesar de ter sido seguido o protocolo
de tratamento8, a impossibilidade de
cumprir o protocolo de acompanhamento8 associada à não disponibilidade
do leite recomendado foram os fatores
mais influentes.
6 - CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conhecer a AMM é importante, pois
o prognóstico do paciente está relacionado ao tempo gasto para se chegar ao diagnóstico e, assim, instituir o
tratamento adequado. As dificuldades
de se seguir o protocolo diagnóstico e
terapêutico contribuem para um pior
desfecho. É essencial que o pediatra se
familiarize com esta desordem, para que
este diagnóstico seja aventado diante de
situações clínicas semelhantes.
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34
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p28-34, junho 2009
Ponto de vista
Glicogenoses: uma visão geral para o pediatra
As glicogenoses são doenças genéticas de herança autossômica recessiva,
secundárias a ausência ou deficiência
enzimática envolvidas na síntese ou degradação do glicogênio1. Isto resulta em
alteração na concentração ou estrutura do glicogênio de diversos tecidos do
organismo2. São classificadas em doze
tipos diferentes, nomeadas de acordo
com o defeito enzimático específico e
órgãos afetados. Subtipos são descritos,
devido a diferentes características clínicas, bioquímicas e genéticas3.
A glicogenose tipo I representa cerca
de 25% do total das glicogenoses e é
caracterizada pela deficiência da enzima
glicose-6-fosfatase, responsável pela reação final do processo de glicogenólise
e gliconeogênese. Portanto, os indivíduos com esta doença são incapazes de
converter a glicose-6-fosfato em glicose
livre para a circulação sangüínea4. Isto
resulta no acumulo excessivo de glicogênio no fígado, rins e mucosa intestinal.
O quadro clÍnico entre as glicogenoses
às vezes é de difícil diferenciação, mas
o tipo 1 é mais grave e de inicio mais
precoce. A hipoglicemia, convulsão,
hepatomegalia, cetose e acidemia láctica podem estar presentes no período
neonatal ou apos alguns meses de vida.
O fígado tem consistência habitual, superfície lisa e pode atingir a fossa ilíaca
direita e esquerda.5
O pediatra deve ficar atento porque
nos momentos de descompensação a
acidose metabólica e a hiperlacticidemia
podem levar a taquipneia sendo confundida com quadros respiratórios. Neste caso a gasometria arterial ou venosa,
glicemia, ausculta pulmonar e hepatomegalia auxiliam no diagnostico.
A hipoglicemia é associada ao jejum
noturno ou prolongado e a intercorrencias infecciosas.Ela deve ser controlada
porque episódios severos frequentes,
podem causar dano cerebral e essas
crianças tem a inteligência normal6.
Por isso, os cuidadores devem ser orientados que a criança pode fazer hipoglicemia quando deixa de se alimentar ou
apresenta vômitos após a refeição, pratica atividade física não usual ou quando
ficar doente. Nestes casos, devem acessar rapidamente formulas líquidas de
polímeros de glicose ou glicose (xarope
Karo® ou dextrose) para normalizar a
glicemia7. Muitos episódios de hipoglicemia são assintomáticos e podem diminuir com o aumento da idade8
Outros achados são: fácies de boneca,
epistaxes, diarréia intermitente, retardo
estatural que se instala logo e pode ser o
quadro clinico dominante e adiposidade
que pode ser exagerada e a musculatura
diminuída. Mais tardiamente, pode-se
encontrar: xantomas, alteração da retina, pancreatite, colelitiase, hipertensão
pulmonar devido a produção anômala
de aminas vaso ativas como serotonina
e doença renal crônica com nefromegalia e hipercalciuria. O adenoma hepático geralmente ocorre durante ou após
a puberdade, mas pode se desenvolver
em qualquer idade e se transformar em
hepatocarcinoma após muitos anos.9-10
Para fazer o diagnostico, associa-se o
quadro clinico com testes de tolerância oral a glicose, glicemia e lactato em
jejum e após dieta rica em carboidrato.
O lactato é muito alto em jejum e diminui após a administração de glicose
ou dieta. A biopsia hepática com dosagem da atividade enzimática e a analise
molecular fazem o diagnostico definitivo.11,12
Esses pacientes também apresentam
Célia Regina Moutinho de Miranda
Chaves 1
1 Pediatra e Doutora em Clínica Médica/
Nutrologia (UFRJ); Chefe do Departamento
de Alimentação e Nutrição do Instituto
Fernandes Figueira/Fiocruz
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p35-37, junho 2009
35
hipertrigliceridemia, hipercolesterolemia, hiperuricemia, transaminases discretamente elevadas e risco aumentado
de osteoporose.13
O artigo de revisão de Nunes F HS,
descreve os princípios dietoterapicos
da glicogenose tipo I ou Doença de Von
Gierke com muita propriedade,mas alguns ponderações devem ser feitas.Porque o tratamento dietético dessa afecção
altera significativamente o curso clinico
e o prognostico.Por isso, é indispensável
que o pediatra geral se familiarize com
o diagnostico e tratamento nutricional
dessa entidade clinica.O manejo dietético permite o melhor controle da hipoglicemia, metabolismo ósseo,crescimento
e hiperlipidemia.
Essas crianças dependem de fonte
exógena de glicose por isso na época
do diagnostico ou quando submetidos
a um jejum prolongado como no caso
de procedimentos cirúrgicos devem receber infusão endovenosa de glicose a
10%..
A base da terapia nutricional é alimentação sem açucares de rápida absorção e com alimentos ricos em amido.
A utilização da infusão intragastrica
continua durante a noite geralmente
é necessária na fase inicial ate a adaptação á dieta podendo ser realizada por
sonda ou gastrostomia. Utiliza-se glicose ou polímeros de glicose. A taxa de
infusão do carboidrato é empírica com
base na necessidade energética e glicemia. Existem algumas dificuldades com
este procedimento,os familiares dessas
crianças devem treinar a passagem da
sonda naso ou orogastrica e o controle
do gotejamento com o uso de bomba
infusora. Alem disso, não é bem aceita
por muitos pacientes, requer monitoração e possui o mesmo efeito do amido
cru. Entretanto não há consenso sobre
o seu tempo de utilização, um grupo sugere manter o tratamento durante todo
o período de crescimento linear, isto é,
36
até o fim da adolescência14. Outros defendem que pode ser interrompida a
partir do momento em que o paciente consegue obter controle metabólico
e uma taxa de crescimento adequado
através do tratamento com amido de
milho cru3. Outros só indicam na fase
inicial até a adaptação a dieta via oral,
mas não recomendam para o tratamento domiciliar pelas dificuldades e risco
de manuseio. Desta forma a utilização
desse procedimento deve ser avaliado
caso a caso de acordo com a evolução
do paciente.
A dieta deve ser fracionada em 5 a
6 refeições durante o dia, intercalando com o amido cru.O amido cozido
comporta-se como um carboidrato de
rápida absorção, por isso faz um pico na
glicemia seguido por uma rápida queda
dentro de 3 a 5 horas. Mas o amido cru
se comporta como um carboidrato de
absorção lenta, que libera glicose lentamente por hidrolise da amilase pancreática e fornece bastante glicose exógena
por muitas horas
Devido a atividade da amilase pancreática ser substrato induzida, o uso de
amido de milho cru pode ser recomendado a partir do oitavo mês de vida, 14.
Alem disso é possível a reposição exógena desta enzima antes da ingestão
do amido.
Alguns autores mantém o aleitamento materno a cada 3 horas junto com
a suplementação de glicose diluída em
água15.
A introdução de outros alimentos
pode ter início com idade entre 4 e 6
meses, dando prioridade a alimentos
ricos em amido16. O macarrão parcialmente cozido, comporta-se como amido
cru.A incorporação de alimentos de baixo índice glicêmico(< 55) torna a dieta
mais aceitável e sociável.O fornecimento de uma a lista do indice glicêmico e
de substituição para alimentos ricos em
amido é útil.Por exemplo, uma colher
das de sopa de amido de milho contem
8,3g de carboidrato então 2 colheres
das de sopa podem ser trocadas por 1 de
cereal ou meia xícara de flocos de milho sem açucar,, ou cevada, meia xícara
de vegetais ricos em amido ou batata
frita ou cozida17.
A dieta deve seguir a recomendação
energética da Dietary reference intakes
for energy\ (2002)18 para indivíduos
saudaveis de acordo com o sexo e faixa etária, sendo que 2\3 fornecida nas
refeições e 1\3 no amido cru. O valor
energético total deve ser constituído de:
60 a 70% de carboidratos complexos e
com baixo índice glicemico, 25 a 30%
de lipídeos preferencialmente em óleos
vegetais com menos de 200mg de colesterol e, 10 a 15% de proteína19,20.
A dieta com alto teor de proteína não
é aconselhada porque é limitada a habilidade em converter aminoácidos em
glicose livre e também pelo dano renal17.Alimentos e medicações com galactose e frutose (leite, frutas, e açúcar)
devem ser evitados ou limitados e utilizado formulas infantis sem lactose.
A Suplementação de Vitaminas e sais
minerais principalmente de cálcio podem ser necessários devido a limitada
ingestão de leite e frutas.
Acompanhamento destes pacientes
deve-se monitorizar periodicamente o
crescimento, a ingestão energética e os
parâmetros bioquímicos.A cada 3 meses : prova de função hepática, glicemia
(deve ser mantida acima de 76mg/dl),
triglicérides( abaixo de 290mg/dl), colesterol, microalbuminuria, acido úrico,
uréia e creatinina. A cada 6 meses ultrasonografia abdominal e anualmente
alfa feto proteína.21
A hiperuricemia e a dislipidemia
não resolvem somente com a dieta
por isso, para o tratamento da hiperuricemia recomenda-se Aluperinol
10mg por kg por dia em 3 doses; para
Hiperlipidemia:Clofibrato, sinvastatina,
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p35-37, junho 2009
niacina e Óleo de peixe22.
O transplante renal no caso de evolução para a insuficiencia renal crônica.
O transplante hepático é recomenda-
do para crianças com importante déficit
estatural ou que não responderam ao
tratamento dietético bem conduzido,
necessitando de internações freqüentes,
com grande prejuízo de sua qualidade
de vida6 ou quando existe adenoma hepático devido a possibilidade da transformação maligno.
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37
Teses e Dissertações
Nível Plasmático de Lactato nas primeiras 24
horas de vida e Morbimortalidade Neonatal
Aurora: Herminia Guimarães Couto Fernandez
Orientador: Adauto Dutra Moraes Barbosa
Resumo
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Saúde da Criança e do Adolescente,
como requisito para obtenção do grau de Mestre em Medicina: Área de Concentração:
Pediatria
Introdução: O desenvolvimento dos conhecimentos em medicina perinatal e a sofisticação
das terapias de suporte nas unidades de terapia intensiva neonatal (UTIN) têm permitido
um melhor acompanhamento do binômio mãe-filho, intervenção precoce, com redução nos
índices de mortalidade neonatal e aumento dos limites de viabilidade fetal. O lactato sérico
tem sido usado como indicador de hipóxia e hipoperfusão tecidual, e sua dosagem é uma
ferramenta que pode ser usada em pacientes criticamente doentes para detecção precoce
da injúria tecidual e avaliação da gravidade, morbidade e mortalidade da doença.
Objetivo: Avaliar o nível plasmático de lactato (NPL), nas primeiras 24 horas de vida, como
preditor de morbimortalidade neonatal.
Métodos: Estudo retrospectivo realizado numa unidade de terapia intensiva neonatal da
rede privada em Niterói,RJ, onde foram revisados, no arquivo médico, os prontuários de
todos recém nascidos internados no período de junho de 2005 a fevereiro de 2007. O nível
plasmático de lactato, realizado à admissão dos pacientes neste setor, foi obtido nas primeiras
24 horas de vida, através de sangue coletado por punção arterial. Os pacientes foram divididos
em dois grupos, baseados no melhor valor obtido através da curva ROC para predição de
óbito neonatal, levando-se em consideração o nível plasmático do lactato à admissão.
Resultados: O NPL à admissão que determinou melhores índices de sensibilidade - 72,7%
(IC95% 39,1-93,7) - e especificidade - 64,3% (IC95% 56,3-71,8) - para óbito neonatal nos
3 primeiros dias de vida, foi > 4,2 mmol/L. A área sob a curva ROC foi de 0,660 (IC 0,5830,732). Na população estudada, onde a mortalidade foi de 6,5%, isso significa um valor preditivo
positivo de 12,40% e um valor preditivo negativo de 97,13%. Foi observada associação entre
um NPL superior a 4,2 mmol/L e óbito nos primeiros 3 dias de vida (χ2 = 4,518 p=0,0335
OR = 4,81 IC95% 1,23-18,86). As médias de peso de nascimento foram diferentes entre os
grupos (t = 3,215 p =0,002). O grupo com NPL superior a 4,2 mmol/L apresentou aumento
na freqüência de convulsão (χ2 = 7,661 p=0,0056 OR = 8,34 IC95% 1,74-39,99) e de recémnascido pequeno para a idade gestacional (χ2 = 6,478 p=0,0109).
Conclusões: O nível plasmático de lactato, obtido no momento da admissão do recém
nascido na UTI neonatal, dentro das primeiras 24 horas de vida, mostrou-se como um bom
teste diagnóstico na predição de óbito nos primeiros 3 dias de vida, e seu valor plasmático
maior ou igual a 4,2 mmol/L está associado a uma maior freqüência na ocorrência de convulsão
neonatal e nascimento de recém-nascido pequeno para a idade gestacional.
38
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p38, junho 2009
Teses e Dissertações
Avaliação dos Níveis Séricos da Proteína
C-Reativa na Infecção Neonatal
Autor: Suyen Heizer Villela
Orientador: Adauto Dutra Moraes Barbosa
Co-orientador: Alan Araújo Vieira
Resumo
O diagnóstico precoce de infecção ainda é um desafio para os intensivistas neonatais porque
as manifestações clínicas nos recém-nascidos (RNs) são inespecíficas bem como os exames
laboratoriais disponíveis. Nos últimos anos a proteína C-reativa (PCR) vem sendo estudada
como marcador de infecção nos Rns.
Objetivo - Avaliar a acurácia da PCR como teste diagnóstico de infecção neonatal.
Metodologia – Estudo retrospectivo, onde foram revisados 190 prontuários de Rns internados no período de janeiro a dezembro de 2004, em uma UTI Neonatal da Rede Privada, do
Município de Niterói. Estes Rns foram alocados em 4 grupos: Grupo 1 – RNs sem infecção;
Grupo2 - RNs com infecção provada; Grupo 3 - com infecção presumida; Grupo 4 - Rns
prematuros (<37s) com sofrimento respiratório, sem história e ou exames laboratoriais
sugestivos de infecção, mas que fizeram uso de antibioticoterapia. Foram correlacionados
os níveis séricos da PCR nos diferentes grupos, traçado a curva ROC (Receiver Operator
Characterístic), determinado o melhor ponto de corte para o uso desta dosagem como
marcador de infecção e determinado a sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo
e valor preditivo negativo. Observado os resultados dos níveis séricos da PCR no 5º e 10º
dias de tratamento antimicrobiano.
Resultados - A análise dos dados identificou uma especificidade de 100% e uma sensibilidade de 71,42% para diagnóstico de infecção em Rns, quando a PCR foi coletada em até 24h
após o início da sintomatologia infecciosa. Foi observado uma correlação entre os valores
da PCR e a evolução clínica.
Conclusão - A PCR colhida com 24h de sintomatologia apresentou excelente especificidade;
O melhor ponto de corte determinado pela curva ROC considerando inicialmente somente os casos de infecção provada e, posteriormente, todos os casos de infecção (provada e
presumida) foi de 10mg/l; Observando a evolução do Rn com a queda dos valores da PCR,
podemos abreviar o tempo de tratamento antimicrobiano com segurança; A utilização da
PCR colhida com 24h de sintomatologia associada a exames laboratoriais e, principalmente
a avaliação clínica do paciente, pode auxiliar no diagnóstico de infecção neonatal.
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p39, junho 2009
39
Normas para publicação
A Revista de Pediatria SOPERJ, publicação científica da Sociedade de Pediatria do Rio de Janeiro (SOPERJ), divulga
material destinado a elevar o padrão da
prática pediátrica através de artigos de
revisão e relatos de casos, submetidos a
revisão editorial.
Artigos de revisão são avaliações críticas e ordenadas da literatura em relação
a um certo tema de importância clínica,
com ênfase em fatores como causas e
prevenção de doenças, seu diagnóstico,
tratamento e prognóstico. Metanálises
se incluem nesta categoria. Artigos de
revisão devem limitar-se a 6000 palavras, excluindo referências e tabelas.
As referências bibliográficas deverão ser
atuais e em número mínimo de 30.
Os relatos de casos devem limitar-se a
1000 palavras e a 20 referências.
A Revista de Pediatria SOPERJ dá preferência ao envio de material submetido
à publicação pelo site da SOPERJ (www.
soperj.org.br)
Instruções para envio de material por
e-mail
1. Enviar para: [email protected]
2. Assunto: Escrever o título abreviado
do artigo
3. Corpo da mensagem: Deve conter
todas as informações da página de
rosto, conforme instruções abaixo,
seguidas de uma declaração em
que os autores asseguram que (a) o
artigo é original; (b) nunca foi publicado e, caso venha a ser aceito pela
Revista de Pediatria SOPERJ, não
será publicado em outra revista; (c)
não foi enviado a outra revista e não
o será enquanto estiver sendo considerada sua publicação pela Revista
de Pediatria SOPERJ; (d) todos os
40
autores participaram da concepção
do trabalho, da análise e interpretação dos dados, de sua redação ou
revisão crítica e da leitura e aprovação da versão final; (e) não são omitidos quaisquer ligações ou acordos
de financiamento entre os autores e
companhias ou pessoas que possam
ter interesse no material abordado
no artigo; (f) todas as pessoas que
fizeram contribuições substanciais
para o artigo, mas não preencheram os critérios de autoria, são citados nos agradecimentos, para o que
forneceram autorização por escrito;
e reconhecem que a Sociedade de
Pediatria do Rio de Janeiro passa a
ter os direitos autorais, caso o artigo
venha a ser publicado. (Obs.: Caso
o artigo seja aceito para publicação,
será solicitado o envio desta declaração com a assinatura de todos os
autores.)
4. Arquivos anexados: Anexar dois
arquivos separados, contendo respectivamente: (a) resumo, palavraschave, abstract, keywords, texto e
referências bibliográficas, (b) tabelas e gráficos. Estes arquivos devem
permitir a leitura pelos programas
do Microsoft Office® (Word, Excel
e Access).
Instruções para envio de material por
correio comum
1. Enviar para:
Secretaria da SOPERJ
Rua da Assembléia nº 10 - grupo
1812 – CEP: 20011- 901 Centro –
Rio de Janeiro
2. Incluir uma carta de submissão, assinada por todos os autores, assegurando: (a) que o artigo é original;
(b) que nunca foi publicado e, caso
venha a ser aceito pela Revista de
Pediatria SOPERJ, não será publicado em outra revista; (c) que não
foi enviado a outra revista e não o
será enquanto estiver sendo considerada sua publicação pela Revista
de Pediatria SOPERJ; (d) que todos
os autores participaram da concepção do trabalho, da análise e interpretação dos dados, de sua redação
ou revisão crítica e da leitura e aprovação da versão final; (e) que não
são omitidos quaisquer ligações ou
acordos de financiamento entre os
autores e companhias ou pessoas
que possam ter interesse no material abordado no artigo; (f) todas as
pessoas que fizeram contribuições
substanciais para o artigo, mas não
preencheram os critérios de autoria,
são citados nos agradecimentos, para
o que forneceram autorização por
escrito; e reconhecendo que a Sociedade de Pediatria do Rio de Janeiro
passa a ter os direitos autorais, caso
o artigo venha a ser publicado.
3. A Revista de Pediatria SOPERJ não
se responsabiliza pelo eventual
extravio de originais; recomendase que os autores guardem cópia de
seus trabalhos enquanto sua publicação estiver sendo considerada pela
Revista de Pediatria SOPERJ.
4. O original deve ser enviado em três
cópias impressas em folha de papel
branco, tamanho A4 (210x297mm);
com margens de 25 mm em ambos
os lados, espaço duplo em todas as
seções; fonte Times New Roman,
tamanho 11; páginas numeradas
no canto superior direito, a começar pela página de rosto. Não usar
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p40, junho 2009
recursos de formatação, tais como
cabeçalhos e rodapés. Utilizar preferencialmente o processador de
textos Microsoft Word®; caso seja
usado um processador diferente,
empregar o formato ASCII.
5. Enviar uma cópia do original em disquete (não usar discos “zip”), que
contenha apenas arquivos relacionados ao artigo.
Diretrizes para a preparação do original
Orientações gerais
O original - incluindo tabelas, ilustrações e referências bibliográficas - deve
estar em conformidade com os “Requisitos Uniformes para Originais Submetidos a Revistas Biomédicas”, publicado
pelo Comitê Internacional de Editores
de Revistas Médicas (versão original da
atualização de outubro de 2001 disponível em http://www.icmje.org/).
Cada seção deve ser iniciada em nova
página (ou quebra de página, em caso
de envio do material por correio eletrônico), na seguinte ordem: página de
rosto, resumo em português, resumo
em inglês, texto, agradecimentos, referências bibliográficas, tabelas (cada
tabela completa, com título e notas de
rodapé, em página separada), gráficos
(cada gráfico completo, com título e
notas de rodapé em página separada) e
legendas das figuras.
A seguir, as principais orientações
sobre cada seção:
Página de rosto:
Deve conter:
(a) título do artigo, conciso e informativo, evitando termos supérfluos e
abreviaturas; evitar também a indicação do local e da cidade onde o
estudo foi realizado, exceto quando
isso for essencial para a compreensão das conclusões;
(b) versão exata do título para o idioma
inglês;
(c) título abreviado (para constar na
capa e topo das páginas), com
máximo de 50 caracteres, contando
os espaços;
(d) primeiro e último nome de cada
um dos autores e iniciais dos nomes
intermediários;
(e) titulação mais importante de cada
autor;
(f) indicação de quais autores possuem
Currículo Lattes;
(g) endereço eletrônico de cada
autor;
(h) a contribuição específica de cada
autor para o estudo;
(i) instituição ou serviço ao qual o trabalho está vinculado;
(j) nome, endereço, telefone, fax e
ende-reço eletrônico do autor responsável pela correspondência;
(k) nome, endereço, telefone, fax e
endereço eletrônico do autor responsável pelos contatos pré-publicação;
(l) fonte financiadora ou fornecedora de equipamento e materiais,
quando for o caso;
(m)contagem total das palavras do
texto, sem referências bibliográficas.
Resumo em português
O resumo deve ter no máximo 250
palavras ou 1.400 caracteres, evitando
o uso de abreviaturas. O resumo deve
ser apresentado também em inglês.
Todas as informações que aparecerem
no resumo devem constar também
no texto do artigo. O resumo deve
ser estruturado, conforme descrito a
seguir:
Abaixo do resumo, fornecer três a
seis descritores, que são palavras-chave
ou expressões-chave que auxiliarão
a inclusão adequada do resumo nos
bancos de dados bibliográficos. Empregar descritores integrantes da lista de
“Descritores em Ciências da Saúde”, elaborada pela BIREME e disponível nas
bibliotecas médicas. Somente quando
não houver descritores adequados na
referida lista, usar termos novos.
Resumo em inglês (abstract):
O “abstract” deve ser uma versão exata
do resumo para o idioma inglês, com o
mesmo número máximo de palavras e
com os subtítulos correspondentes. Os
descritores devem fazer parte da lista de
“Medical Subject Headings”, publicado
pela U.S. National Library of Medicine,
do National Institutes of Health.
Corpo do artigo
O texto pode variar de acordo com o
tema. Sugere-se:
Introdução: breve, em que os autores
explicam qual a importância da revisão
para a prática pediátrica, à luz da literatura médica.
Objetivo: Informar por que a revisão
da literatura foi feita, indicando se ela
enfatiza algum fator em especial, como
causa, prevenção, diagnóstico, tratamento ou prognóstico.
Fontes dos dados: Descrever as fontes
da pesquisa, definindo as bases de dados
e os anos pesquisados. Informar sucintamente os critérios de seleção de artigos
e os métodos de extração e avaliação da
qualidade das informações.
Síntese dos dados ou relato do
caso(s): Informar os principais resultados da pesquisa bibliográfica; relatar
o caso
Conclusões: Correlacionar as idéias
principais do artigo com as possíveis
aplicações clínicas.
OBS: Solicita-se enviar 3 perguntas
sobre o tema do artigo de revisão de
multipla escolha, com 5 opções
Os resumos de teses e dissertações serão
aceitos após análise do corpo editorial.
Os relatos de casos devem obedecer ao
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p41, junho 2009
41
seguinte formato:
(a) Introdução, relato do caso(s), discussão
(b) Número máximo de palavras:
4000
(c) Referências: Máximo de 5.
Referências
1. International Committee of Medical Journal Editors. Uniform requirements for manuscripts submitted to biomedical journals. JAMA
1993;269:2282-2286.
2. Comitê Internacional de Editores de
Revistas Médicas. Requisitos uniformes para originais submetidos a
revistas biomédicas. J. Pediatr (Rio
J.) 1997;73:213-24.
3. Haynes RB, Mulrow CD, Huth EJ,
Altman DJ, Gardner MJ. More
informative abstracts revisited. Ann
Intern Med 1990;113:69-76.
4. BIREME - Centro Latino-Americano
e do Caribe de Informação em Ciên-
42
cias da Saúde. DeCS - Descritores em
ciências da saúde: lista alfabética
2.ed. rev. amp. São Paulo: BIREME,
1992. 111p.
5. Ministério da Saúde. Conselho
Nacional de Saúde. Resolução
no 196 de 10/10/96 sobre pesquisa envolvendo seres humanos.
DOU 1996 Out 16; no 201, seção
1:21082-21085.
Lista de Checagem
Recomenda-se que os autores utilizem a lista de checagem abaixo para
certificarem-se de que todo o material
requerido está sendo enviado. Não é
necessário anexar a lista.
• Carta de submissão assinada por
todos os autores (ou declaração no
corpo da mensagem do e-mail)
• Original em 3 cópias impressas
(dispensado, em caso de envio por
e-mail)
• Cópia do original em disquete (dispensada, em caso de envio por
e-mail)
• Página de rosto com todas as informações solicitadas (no corpo da
mensagem, em caso de e-mail)
• Resumo em português e inglês,
com descritores (integrante do primeiro arquivo anexado, em caso de
e-mail)
• Texto contendo o corpo do artigo
(integrante do primeiro arquivo
anexado, em caso de e-mail)
• Referências bibliográficas no estilo
Index Medicus, numeradas por
ordem de aparecimento
• Tabelas numeradas por ordem
de aparecimento (integrante do
segundo arquivo anexado, em caso
de e-mail)
• Gráficos numerados por ordem
de aparecimento (integrante do
segundo arquivo anexado, em caso
de e-mail)
• Figuras (original e 2 cópias) identificadas
• Legendas das figuras
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p42, junho 2009
Ficha de Avaliação – Respostas
I) Dislipidemias na Infância e
na Adolescência: um caso de
saúde pública?
1. a) M b) M c) M d) M e) M
2. a) M b) M c) M d) M e) M
3. a) M b) M c) M d) M e) M
II) Doença de von Gierke:
estudo de revisão
1. a) M b) M c) M d) M e) M
2. a) M b) M c) M d) M e) M
3. a) M b) M c) M d) M e) M
4. a) M b) M c) M d) M e) M
Sócios: respostas no site www.soperj.org.br
Não sócios: enviar à SOPERJ (R da Assembléia, 10, g 1812 - Centro - Rio de Janeiro, 20011-901 - RJ, junto com
comprovação de depósito bancário de R$ 20,00 - Bradesco - ag. 2756-1, conta 1274-2.
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p43, junho 2009
43
44
Revista de Pediatria SOPERJ - v.10, no 1, p44, junho 2009
O primeiro ano
de vida
dura para
Programação
metabólica
Desenvolvimento
cerebral
Amadurecimento
imunológico
75% do desenvolvimento do cérebro ocorre
ao longo dos dois primeiros anos de vida.1
Carências nutricionais nesse período podem
ter conseqüências irreversíveis, uma vez que
os circuitos cerebrais estão em formação.2,3
Concentrações ideais de proteínas, DHA, ARA
e micronutrientes como ferro e zinco
são fundamentais para o adequado
desenvolvimento cerebral do lactente.3-5
Na ausência do leite materno, a Fórmula Infantil é o substituto adequado para a alimentação do lactente, durante o primeiro ano de vida.6
sempre.
Nestlé Nutrition: Expertise em Nutrição Infantil
Tecnologia exclusiva no desenvolvimento de Fórmulas Infantis
com proteína otimizada.*
Referências Bibliográficas: 1. Borghi E, de Onis M, Garza C et al; WHO Multicentre Growth Reference Study Group.Construction of the World Health Organization child growth standards: selection of methods for attained growth curves.Stat Med. 2006 Jan 30;25(2):247-65. 2. Rapoport J, Gogtay N. Brain
neuroplasticity in healthy, hyperactive and psychotic children: insights from neuroimaging. Neuropsychopharmacology 2008;33:181-197. 3. Georgieff MK.Nutrition and the developing brain: nutrient priorities and measurement.Am J Clin Nutr. 2007 Feb;85(2):614S-620S. 4. Innis SM.Fatty acids and early
human development.Early Hum Dev. 2007 Dec;83(12):761-6. 5. Lozoff B. Iron deficiency and child development.Food Nutr Bull. 2007 Dec;28(4 Suppl):S560-71. 6. American Academy of Pediatrics, Committee on Nutrition. Formula Feeding of Term Infants. In: Pediatric Nutrition Handbook. 5th ed, 2004; pp 87-97.
NOTA IMPORTANTE: AS GESTANTES E NUTRIZES PRECISAM SER INFORMADAS QUE O LEITE MATERNO É O IDEAL PARA O LACTENTE, CONSTITUINDO-SE A MELHOR NUTRIÇÃO E PROTEÇÃO PARA ESTAS CRIANÇAS. A MÃE DEVE SER ORIENTADA QUANTO À IMPORTÂNCIA DE UMA DIETA EQUILIBRADA NESTE
PERÍODO E QUANTO À MANEIRA DE SE PREPARAR PARA O ALEITAMENTO AO SEIO ATÉ OS DOIS ANOS DE IDADE DA CRIANÇA OU MAIS. O USO DE MAMADEIRAS, BICOS E CHUPETAS DEVE SER DESENCORAJADO, POIS PODE TRAZER EFEITOS NEGATIVOS SOBRE O ALEITAMENTO NATURAL. A MÃE DEVE SER
PREVENIDA QUANTO À DIFICULDADE DE VOLTAR A AMAMENTAR SEU FILHO UMA VEZ ABANDONADO O ALEITAMENTO AO SEIO. ANTES DE SER RECOMENDADO O USO DE UM SUBSTITUTO DO LEITE MATERNO, DEVEM SER CONSIDERADAS AS CIRCUNSTÂNCIAS FAMILIARES E O CUSTO ENVOLVIDO. A MÃE DEVE
ESTAR CIENTE DAS IMPLICAÇÕES ECONÔMICAS E SOCIAIS DO NÃO ALEITAMENTO AO SEIO – PARA UM RECÉM-NASCIDO ALIMENTADO EXCLUSIVAMENTE COM MAMADEIRA SERÁ NECESSÁRIA MAIS DE UMA LATA POR SEMANA. DEVE-SE LEMBRAR À MÃE QUE O LEITE MATERNO NÃO É SOMENTE O MELHOR,
MAS TAMBÉM O MAIS ECONÔMICO ALIMENTO PARA O LACTENTE. CASO VENHA A SER TOMADA A DECISÃO DE INTRODUZIR A ALIMENTAÇÃO POR MAMADEIRA É IMPORTANTE QUE SEJAM FORNECIDAS INSTRUÇÕES SOBRE OS MÉTODOS CORRETOS DE PREPARO COM HIGIENE RESSALTANDO-SE QUE O USO DE
MAMADEIRA E ÁGUA NÃO FERVIDAS E DILUIÇÃO INCORRETA PODEM CAUSAR DOENÇAS. OMS – CÓDIGO INTERNACIONAL DE COMERCIALIZAÇÃO DE SUBSTITUTOS DO LEITE MATERNO. WHA 34:22, MAIO DE 1981. PORTARIA Nº 2.051 – MS DE 08 DE NOVEMBRO DE 2001, RESOLUÇÃO Nº 222 – ANVISA – MS
DE 05 DE AGOSTO DE 2002 E LEI 11.265/06 DE 04.01.2006 – PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA – REGULAMENTAM A COMERCIALIZAÇÃO DE ALIMENTOS PARA LACTENTES E CRIANÇAS DE PRIMEIRA INFÂNCIA E TAMBÉM A DE PRODUTOS DE PUERICULTURA CORRELATOS.
www.nestle.com.br/nutricaoinfantil
*Quantidade e qualidade de proteína mais próximas do padrão de referência.
Serviço de Atendimento Nutrição Infantil ao Profissional de Saúde 0800-7701599
O primeiro ano
Programação
metabólica
de vida
dura para
Amadurecimento
imunológico
O primeiro ano de vida é decisivo para o
amadurecimento do sistema imunológico.1
A nutrição nesse período é determinante
para a formação de uma microbiota
intestinal protetora com predominância
de bifidobactérias.1
Probióticos, nutrientes que proporcionam
efeito bifidogênico, nucleotídeos, DHA e ARA
contribuem beneficamente para a formação
do futuro padrão de resposta imunológica
do lactente.1,2
Na ausência do leite materno, a Fórmula Infantil é o substituto adequado para a alimentação do lactente, durante o primeiro ano de vida.3
sempre.
Desenvolvimento
cerebral
Nestlé Nutrition: Expertise em Nutrição Infantil
Tecnologia exclusiva no desenvolvimento de Fórmulas Infantis
com proteína otimizada.*
Referências Bibliográficas: 1. Cummings JH, Antoine JM, Azpiroz F, Bourdet-Sicard R, Brandtzaeg P, Calder PC, Gibson GR, Guarner F, Isolauri E, Pannemans D, Shortt C, Tuijtelaars S, Watzl B. PASSCLAIM--gut health and immunity. Eur J Nutr. 2004 Jun;43 Suppl 2:II118-II173. 2. Prescott SL, Dunstan JA.
Prenatal fatty acid status and immune development: the pathways and the evidence. Lipids. 2007 Sep;42(9):801-10. 3. American Academy of Pediatrics, Committee on Nutrition. Formula Feeding of Term Infants. In: Pediatric Nutrition Handbook. 5th ed, 2004; pp 87-97.
NOTA IMPORTANTE: AS GESTANTES E NUTRIZES PRECISAM SER INFORMADAS QUE O LEITE MATERNO É O IDEAL PARA O LACTENTE, CONSTITUINDO-SE A MELHOR NUTRIÇÃO E PROTEÇÃO PARA ESTAS CRIANÇAS. A MÃE DEVE SER ORIENTADA QUANTO À IMPORTÂNCIA DE UMA DIETA EQUILIBRADA NESTE
PERÍODO E QUANTO À MANEIRA DE SE PREPARAR PARA O ALEITAMENTO AO SEIO ATÉ OS DOIS ANOS DE IDADE DA CRIANÇA OU MAIS. O USO DE MAMADEIRAS, BICOS E CHUPETAS DEVE SER DESENCORAJADO, POIS PODE TRAZER EFEITOS NEGATIVOS SOBRE O ALEITAMENTO NATURAL. A MÃE DEVE SER
PREVENIDA QUANTO À DIFICULDADE DE VOLTAR A AMAMENTAR SEU FILHO UMA VEZ ABANDONADO O ALEITAMENTO AO SEIO. ANTES DE SER RECOMENDADO O USO DE UM SUBSTITUTO DO LEITE MATERNO, DEVEM SER CONSIDERADAS AS CIRCUNSTÂNCIAS FAMILIARES E O CUSTO ENVOLVIDO. A MÃE DEVE
ESTAR CIENTE DAS IMPLICAÇÕES ECONÔMICAS E SOCIAIS DO NÃO ALEITAMENTO AO SEIO – PARA UM RECÉM-NASCIDO ALIMENTADO EXCLUSIVAMENTE COM MAMADEIRA SERÁ NECESSÁRIA MAIS DE UMA LATA POR SEMANA. DEVE-SE LEMBRAR À MÃE QUE O LEITE MATERNO NÃO É SOMENTE O MELHOR,
MAS TAMBÉM O MAIS ECONÔMICO ALIMENTO PARA O LACTENTE. CASO VENHA A SER TOMADA A DECISÃO DE INTRODUZIR A ALIMENTAÇÃO POR MAMADEIRA É IMPORTANTE QUE SEJAM FORNECIDAS INSTRUÇÕES SOBRE OS MÉTODOS CORRETOS DE PREPARO COM HIGIENE RESSALTANDO-SE QUE O USO DE
MAMADEIRA E ÁGUA NÃO FERVIDAS E DILUIÇÃO INCORRETA PODEM CAUSAR DOENÇAS. OMS – CÓDIGO INTERNACIONAL DE COMERCIALIZAÇÃO DE SUBSTITUTOS DO LEITE MATERNO. WHA 34:22, MAIO DE 1981. PORTARIA Nº 2.051 – MS DE 08 DE NOVEMBRO DE 2001, RESOLUÇÃO Nº 222 – ANVISA – MS
DE 05 DE AGOSTO DE 2002 E LEI 11.265/06 DE 04.01.2006 – PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA – REGULAMENTAM A COMERCIALIZAÇÃO DE ALIMENTOS PARA LACTENTES E CRIANÇAS DE PRIMEIRA INFÂNCIA E TAMBÉM A DE PRODUTOS DE PUERICULTURA CORRELATOS.
www.nestle.com.br/nutricaoinfantil
*Quantidade e qualidade de proteína mais próximas do padrão de referência.
Serviço de Atendimento Nutrição Infantil ao Profissional de Saúde 0800-7701599

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