universidade tiradentes - Priscila Formigheri Feldens

Transcrição

universidade tiradentes - Priscila Formigheri Feldens
UNIVERSIDADE TIRADENTES
LAÍS MACIEL OLIVEIRA
O DELINQUENTE PSICOPATA FRENTE A REALIDADE
ATUAL BRASILEIRA: ASPECTOS DOUTRINÁRIOS E
JURISPRUDENCIAIS
Aracaju
2010
2
LAÍS MACIEL OLIVEIRA
O DELINQUENTE PSICOPATA FRENTE A REALIDADE
ATUAL BRASILEIRA: ASPECTOS DOUTRINÁRIOS E
JURISPRUDENCIAIS
Monografia
apresentada
à
Universidade Tiradentes como um
dos pré-requisitos para obtenção
do grau de bacharel em direito.
PRISCILA FORMIGHERI FELDENS
Aracaju
2010
3
LAÍS MACIEL OLIVEIRA
O DELINQUENTE PSICOPATA FRENTE A REALIDADE ATUAL
BRASILEIRA: ASPECTOS DOUTRINÁRIOS E JURISPRUDENCIAIS
Monografia apresentada ao curso
de
Direito
da
Universidade
Tiradentes - UNIT, como requisito
parcial para obtenção do grau de
bacharel em direito.
Aprovada em ____/____/____.
Banca Examinadora
_______________________________________
Priscila Formigheri Feldens
Universidade Tiradentes - UNIT
_______________________________________
Nome do Professor (a)
Universidade Tiradentes - UNIT
_______________________________________
Nome do Professor (a)
Universidade Tiradentes - UNIT
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Aos meus pais, Gualberto Oliveira Santos e
Maria Auxiliadora Maciel Oliveira por me
guiarem pelos melhores caminhos e aos
meus queridos irmãos, Guilherme Maciel
Oliveira e Gustavo Maciel Oliveira.
5
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, ao qual dedico minha divina fé, sem Ele
nada seria possível em minha vida. É o maior responsável por afastar qualquer
tristeza e insegurança que possa me enfraquecer, enchendo-me de esperança e
amor no coração. Continuará sendo a minha maior fonte de luz, capaz de me tornar
um ser humano cada vez mais justo.
Aos meus pais, Gualberto e Lia, que com todo o amor e dedicação a mim,
nunca mediram esforços e me apoiaram em cada etapa da minha vida. Estiveram
sempre ao meu lado, com toda paciência necessária. São o meu porto seguro que
amo com todo o meu coração.
Aos meus irmãos, Guilherme e Gustavo, que também me ajudaram
sempre que precisei e que estiveram ao meu lado todos os dias, me lembrando o
quanto é importante e necessário o apoio da família em todos os momentos de
nossas vidas.
A toda a minha família, avós, tias, tios, primos e primas. Em especial às
minhas primas, que são também minhas irmãs e amigas, Camila, Débora e Nayana,
as quais são as melhores que eu poderia desejar. Minha vida é repleta de felicidade
porque tenho todos sempre ao meu lado. Cada um, a sua maneira, com suas
qualidades e seus defeitos, me ensina e me fortalece.
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A todos os meus amigos. Àqueles que desde a época do colégio
estiveram comigo, Rebecca, Lorena, Giselle, Luiza, Fabiana, Alice, Juliana, Tiê,
Felipe, Pedro, Paulo, Rodrigo e Aloísio; àqueles com os quais convivi e pude
compartilhar tantos anos de aprendizado, durante o período da universidade,
Douglas, Bárbara, Thamirys, Viviane, Waneska, Patrícia, Danielle, Lara, Tânia,
Luísa, Adriana e Gustavo.
Aos meus amigos Maírla, Michelle, Priscilla e Will, companheiros e futuros
psicólogos, ao lado dos quais alcancei um dos maiores sonhos que já sonhei. Aos
meus queridos amigos Herbert e Mark, os melhores que alguém poderia ter. À
minha irmã Stephanie, amiga de infância, minha maior saudade de todos os dias.
À professora Priscila Formigheri Feldens pela contribuição direta na
construção deste trabalho, por toda paciência na orientação e incentivo, tornando
possível a conclusão do mesmo.
A todos os professores da UNIT por seus ensinamentos, responsáveis
pelo amadurecimento dos meus conhecimentos e que me levaram a execução e
conclusão desta monografia; todos muito importantes, a sua maneira, durante toda a
minha jornada acadêmica.
7
“Não somos apenas o que pensamos ser. Somos mais;
somos também, o que lembramos e aquilo de que nos
esquecemos; somos as palavras que trocamos, os
enganos que cometemos, os impulsos a que cedemos,
"sem querer".
Sigmund Freud
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RESUMO
O trabalho em tela visa apresentar um estudo psicopatológico e jurídico acerca dos
delinqüentes acometidos pela psicopatia. Tem por objetivo demonstrar que o
encarcerado psicopata, não apresentando condições de sociabilidade, constitui
perigo e corrompe a personalidade do encarcerado não portador de psicopatia,
dentro das penitenciarias e interfere na reabilitação do mesmo. Nesse contexto, o
presente trabalho versará sobre as principais teorias que envolvem a etiologia do
distúrbio psicológico da personalidade psicopática e suas características. Analisará a
natureza da inimputabilidade e semi-imputabilidade do delinqüente psicopata sob a
ótica do ordenamento jurídico brasileiro, demonstrando inclusive as possíveis
sanções penais, e seus respectivos fundamentos, que poderão ser adotadas em
casos de crimes cometidos pelos mesmos. Ademais, este trabalho identificará a
importância do estudo criminológico da pessoa do delinqüente, principalmente de
sua personalidade, e o papel que o exame criminológico desenvolve durante a sua
inserção no sistema criminal. Por fim, serão apontas algumas soluções para o
problema em questão, frisando-se a necessidade de uma política específica para
estes delinqüentes.
PALAVRAS-CHAVE: Delinqüente, personalidade, psicopata.
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ABSTRACT
The screen work aims to present a study about the legal and psychopathic offenders
affected by psychopathy. Aims to demonstrate that the jailed psychopath doesn‟t
have conditions of sociability that‟s why is dangerous and corrupting the personality
who isn‟t the wearer of psychopathy that is incarcerated in prisons and interferes in
their rehabilitation. In this context, this work will examine the major theories regarding
the etiology of psychological disorder and psychopathic personality characteristics.
Examine the nature of the psychopath delinqüent‟s incapacity and limited
accountability, from the perspective of Brazilian law, including demonstrating the
possible criminal penalties, and their respective foundations, which may be adopted
in cases of crimes committed by them. Moreover, this study identifies the importance
of criminological study of the delinquent person, especially of his personality, and the
role that criminological examination develops during its insertion into the criminal
system. Finally, there will be present some solutions to the problem at hand,
stressing the need for a specific policy for those criminals.
KEYWORDS: Offenders, personality, psychopath.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................12
2 ABORDAGEM SOBRE A PSICOPATIA................................................................15
2.1 Distúrbios Psicológicos.....................................................................................15
2.1.1 Evolução Histórica dos Distúrbios Psicológicos.......................................16
2.1.2 Conceito de Distúrbio Psicológico............................................................17
2.1.3 Distúrbio Psicológico da Personalidade...................................................21
2.2 Distúrbios Psicológicos da Personalidade Psicopática.....................................23
2.2.1 Evolução Histórica do Conceito de Psicopatia.........................................24
2.2.2 Etiologia do Distúrbio Psicológico da Personalidade Psicopática............26
2.2.3 Características da Psicopatia...................................................................32
3 IMPLICAÇÕES JURÍDICAS AO PSICOPATA.......................................................38
3.1 Inimputabilidade e Semi-imputabilidade do Psicopata .....................................38
3.1.1 Imputabilidade e Responsabilidade Penal...............................................39
3.1.2 Inimputabilidade e Semi-mutabilidade.....................................................41
3.2 O Psicopata como causa de Inimputabilidade e Semi-imputabilidade na
Jurisprudência............................................................................................................47
3.3 Sanções Penais aplicáveis aos Psicopatas......................................................49
3.3.1 Pena Privativa de Liberdade....................................................................50
11
3.3.2 Medida de Segurança..............................................................................55
3.3.3 Castração Química...................................................................................60
3.4 Casos Concretos de Psicopatas no Brasil........................................................61
4 O PSICOPATA E O DELINQUENTE COMUM.......................................................64
4.1 O Delinqüente como Objeto de Estudo da Criminologia...................................64
4.1.1 Evolução Histórica....................................................................................65
4.1.2 O Comportamento Delitivo do Delinqüente..............................................68
4.2 A Importância do Exame Criminológico............................................................70
4.2.1 O Estudo da Personalidade do Delinqüente............................................71
4.2.2 Principais Aspectos do Exame Criminológico..........................................75
4.3 Convívio entre Encarcerados Psicopatas e Encarcerados Comuns.................82
4.3.1 Comportamento dos Psicopatas dentro dos Presídios............................83
4.3.2 O Ideário do Projeto de Lei referente aos Psicopatas..............................87
5 CONCLUSÃO.........................................................................................................91
REFERÊNCIAS..........................................................................................................96
ANEXO.....................................................................................................................104
12
1 INTRODUÇÃO
A sociedade brasileira é consciente de que alguns indivíduos portadores
de
personalidades
desajustadas,
precisamente
anti-sociais,
denominados
psicopatas, apresentam traços criminais acentuados. A personalidade destas
pessoas, a sua maneira de ser e comportar-se no convívio social não respondem à
normalidade da natureza humana e por isso, os mesmos são capazes de provocar o
mal, praticar crimes da maior crueldade e frieza possíveis por simples vontade e
prazer.
É relevante, dessa maneira, que a sociedade brasileira atente-se para a
questão de que estes indivíduos não são prejudiciais apenas no âmbito do convívio
social, mas também inseridos no sistema criminal, dada a complexidade de sua
anomalia psicológica. Dentro das penitenciárias os indivíduos portadores de
personalidade psicopática podem proliferar sua natureza agressiva, insensível,
influenciando mentes passíveis de recuperação e reinserção à sociedade. Ademais,
casos notáveis nos últimos anos, de rebeliões podem estar relacionados com a
presença destes indivíduos no sistema prisional.
Nesse sentido é que reside a problemática do presente trabalho,
atribuindo-lhe cunho social e jurídico. O tema proposto foi escolhido por seu caráter
de urgência tendo em vista as conseqüências que a problemática gera, tanto à
sociedade brasileira, como à pessoa do delinqüente sendo ele psicopata ou não. A
metodologia utilizada teve como método de abordagem inicial o método dedutivo e
como métodos auxiliares o método histórico e observacional.
13
A fonte primordial de pesquisa utilizada foi a bibliográfica, sendo feita também
análise de jurisprudências e de textos legais. A pesquisa contou ainda com o auxílio
da advogada, especialista em ciências criminais e mestre em Direitos Fundamentais,
Priscila Formigheri Feldens; do diretor do hospital de custódia do estado de Sergipe,
Thiago Rodrigues. Estes tiveram papel fundamental dirimindo as dúvidas existentes
ao longo do trabalho.
Em seu primeiro tópico é traçado a evolução histórica, conceito e
classificação dos Distúrbios Psicológicos, frisando o enquadramento dos psicopatas
na categoria de Transtorno psicológico da personalidade e não na categoria de
doença mental. Estabelecem-se as denominações populares para a psicopatia,
enfatizando o conceito de personalidade anti-social, uma vez que todo psicopata
possui a personalidade anti-social, mas nem todo portador de personalidade antisocial é um psicopata. Por conseguinte, apresenta a etiologia responsável pelo
desenvolvimento do distúrbio psicológico da personalidade psicopática e as
características que traçam o perfil dos portadores desta anomalia.
No segundo tópico são estabelecidos os aspectos jurídicos que envolvem
o criminoso psicopata a partir do Código Penal, Processual Penal e da Lei de
Execuções
Penais.
Analisa-se,
desta
forma,
a
inimputabilidade
e
semi-
imputabilidade que estão principalmente relacionadas a parcial capacidade de
entendimento e determinação ou a ausência desta, que os psicopatas possuem e
também a agravante da sua periculosidade; e conseqüentemente analisa-se a forma
de punição, seja ela pena privativa de liberdade ou a medida de segurança,
apresentando seus respectivos fundamentos. Isto posto, apresenta alguns dos
casos de psicopatas que marcaram a história criminal do país.
Dando seguimento, o tópico posterior trata da pessoa do delinqüente e
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sua relação com a criminologia ao longo do tempo, fazendo referência ao estudo da
sua personalidade. Refere-se à importância do exame criminológico como
instrumento capaz de impedir que psicopatas possam viver em sociedade com
encarcerados comuns, projetando prejuízos a reabilitação destes. Enfim, traça
soluções e medidas que poderão evitar todas as conseqüências previstas.
Às considerações finais, foram reservadas as conclusões de todo o
estudo do tema apresentado, reafirmando a necessidade de que a sociedade fique a
par de toda a problemática que envolve o psicopata e a sua inserção no sistema
prisional; e afirmando ainda, a necessidade de uma política voltada para o
psicopata.
15
2 ABORDAGEM SOBRE A PSICOPATIA
2.1 Distúrbios Psicológicos
A Psicopatia apresenta-se como um distúrbio psicológico inerente a
personalidade do indivíduo que provoca alterações em seu comportamento. É uma
anormalidade que na lição de Farias Júnior (2006, p. 290) constitui-se pelo desvio
dos padrões de comportamento socialmente aceitáveis.
Os
psicopatas
são
portadores,
portanto,
de
“personalidades
desarmonicamente estruturadas” (FONSECA, 1997, p. 201). Essa personalidade,
que é dinâmica, de uma forma geral, poderá ser então alterada de acordo com
funções biopsicológicas e a interação social do portador de personalidade
psicopática.
Diversos estudiosos tentaram explicar por muitos anos, primordialmente,
a natureza constitutiva dos distúrbios psicológicos. Através das perspectivas
biológica, psicológica e biopsicológica, a evolução dos conceitos enquadrou-os no
âmbito das perturbações da saúde mental e não no âmbito das doenças mentais.
Tal aspecto representa bastante relevância juridicamente quando se refere aos
delinqüentes portadores de psicopatia.
16
2.1.1 Evolução Histórica dos Distúrbios Psicológicos
Na antiguidade e na idade média, os gregos e romanos presumiam que
forças estranhas, como os movimentos das estrelas ou espíritos do mal estavam
relacionadas à doença mental. Segundo Piedade Júnior (1982, p. 104), a mesma era
considerada conseqüência do pecado e do abuso de uma vida de liberdade
excessiva; sua cura podia ser se livrar da força maligna ou exorcizar os demônios.
Ás vezes, essas pessoas consideradas “loucas” eram apreendidas em jaulas como
animais ou recebiam “terapias” apropriadas para um demônio (MYERS, 1999, p.
319).
Reformadores como Philippe Pinel, Esquirol, Legrand Du Saule, na lição
de Piedade Júnior (1982, p. 106), estudando cientificamente a anormalidade
psíquica, demonstraram que a alienação mental equivale a uma doença orgânica
como qualquer outra. Esses reformadores defendiam que a loucura não era uma
possessão demoníaca, mas uma doença em resposta a intensas pressões e
condições inumana. Para Myers (1999, p. 320) os mesmos defendiam ainda, que o
tratamento deveria ser feito elevando o moral dos pacientes ao desacorrentá-los,
substituir a brutalidade pela gentileza e o isolamento pela atividade.
Surgiram, portanto, com esses reformadores a suposição de um modelo
médico, no qual, os distúrbios psicológicos seriam doenças. Dessa forma, salienta
ainda Myers, uma doença mental, também chamada de psicopatologia, precisava
ser diagnosticada com base nos sintomas e curada por meio de terapia, podendo
incluir tratamento em hospital psiquiátrico. Este tratamento, entretanto, não poderia
curar os distúrbios psicológicos da mesma forma que os médicos podiam curar uma
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doença qualquer como sarampo ou pneumonia.
Havia também a suposição de um modelo social, segundo o qual a
influência social, e não a médica, explicaria os transtornos psicológicos. Mas a
chamada perspectiva biopsicossocial foi a que melhor estabeleceu suas idéias,
englobando tanto as influências sociais como as médicas. Todo comportamento,
seja ele normal ou perturbado, deriva da interação da natureza, tanto com fatores
genéticos, fisiológicos e de criação, como com as experiências passadas e
presentes dos indivíduos. (MYERS, 1999, p. 320)
Os distúrbios psicológicos, portanto, são influenciados por predisposições
genéticas e estados fisiológicos, pela dinâmica psicológica interior e circunstâncias
sociais e culturais.
2.1.2 Conceito de Distúrbios Psicológicos
Na lição de Glassman e Hadad (2008, p. 403), a maioria das tentativas
de descrever a anormalidade baseia-se no conceito de Desvio das normas sociais,
de Inadaptação do comportamento e de Desvio de normas estatísticas. O Desvio
das normas sociais refere-se às transgressões aos padrões ou normas de
comportamento aceitáveis que toda sociedade possui. Um problema, no entanto, é
que alguns comportamentos considerados normais em uma sociedade podem ser
considerados anormais em outra sociedade. Além disso, o conceito de anormalidade
muda ao longo do tempo em uma mesma sociedade.
Já a Inadaptação do comportamento, entendem ainda Glassman e Hadad,
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se refere ao modo como o comportamento afeta o indivíduo e o grupo social. São
exemplos disto algumas formas de comportamento desviantes e sofrimento pessoal.
E por fim, o Desvio de normas estatísticas, sobre o qual é necessária a seguinte
análise:
A raridade estatística, assim como a não convencionalidade cria dificuldade
enquanto o critério para os transtornos mentais. É verdade que muitos
transtornos são relativamente raros, como implicaria o critério estatístico.
Mas alguns são bastante comuns (como as fobias e a depressão), e há
muitas formas raras de comportamento que não consideraríamos indicativas
de transtornos mental – por exemplo, o gênio musical. Por isso, nenhum
desses padrões é comumente usado hoje pelos psicólogos como parte da
definição de comportamento anormal. (GLASSMAN; HADAD, 2008, p. 403).
Observa-se, entretanto, que os critérios utilizados para definir um
distúrbio podem ser considerados vagos e por isso, é preferível evitar termos como
“anormal”, que implicam diretrizes absolutas. Nessa linha, assinala o CID-10,
Classificação Internacional das Doenças, em sua décima revisão (1993, p. 5), que o
termo “transtorno” evita problemas porque não é um termo exato e indica a
existência de um conjunto de sintomas e comportamentos clinicamente reconhecível
associado, na maioria dos casos, ao sofrimento e funções pessoais.
Paulo Dalgalarrondo, por sua vez, afirma em linhas gerais:
Pode-se concluir que os critérios de normalidade e de doença em
psicopatologia variam consideravelmente em função dos fenômenos
específicos com os quais se trabalha e, também, de acordo com as opções
filosóficas do profissional. Além disso, pode-se utilizar a associação de
vários critérios de normalidade ou doença, de acordo com o objetivo que se
tem em mente. De toda forma, essa é uma área da psicopatologia que exige
postura permanentemente critica e reflexiva dos profissionais.
(DALGALARRONDO, 2008, p. 34)
Os
agentes
de
saúde
mental
rotulam
um
comportamento
de
psicologicamente perturbado quando o julga atípico, conturbado, desajustado e
19
injustificável.
“Os
comportamentos
atípicos
e
desconcertantes
têm
mais
probabilidade de ser considerados distúrbios quando julgados como perniciosos.”
(MYERS, 1999, p. 319). É o entendimento desse autor que, para a identificação do
comportamento perturbado, clínicos utilizam critérios práticos observando a
deficiência no funcionamento cognitivo, no comportamento social, no autocontrole e
no sofrimento do paciente.
Dessa forma, a capacidade intelectual, como raciocinar, perceber, atentar,
comunicar são severamente afetadas. A conduta social também se desvia muito dos
padrões aceitáveis e extremos, controle rígido ou mínimo, por exemplo, serão
considerados desajustados. Além disso, sentimentos negativos como ansiedade,
raiva e tristeza não são lidadas adequadamente pelas pessoas que sofrem com
freqüência incomum, intensa ou persistentemente.
A definição de distúrbios psicológicos não inclui, no entanto, como dispõe
Myers (1999, p. 321), o termo “insanidade”, isso porque “são” e “insano” são termos
legais e não psicológicos. “Limitava a defesa por insanidade aos casos em que se
julgava que as pessoas não sabiam o que faziam ou não sabiam que a coisa era
errada.” (MYERS, 2006, p. 321).
Para os profissionais da área de saúde mental, a utilização da
denominação “insano”, ainda na lição de Myers, é utilizada para fins legais, pois as
leis criminais supõem que as pessoas atuem como agentes livres e que infratores
pratiquem intencionalmente o que é errado do ponto de vista moral. Mas, às vezes,
entretanto, parecem ser mentalmente deficientes ou incapazes de distinguir o certo e
o errado no momento em que cometeram um crime. Dessa forma, não teriam livrearbítrio, o qual poderia responsabilizá-los por seu comportamento.
No Canadá e em três estados americanos, a alegação de insanidade
20
sobrevive restritamente, há a transferência do ônus de provar a insanidade para a
defesa, Alguns Estados instituíram o veredicto “culpado, mas mentalmente doente”
afirma Myers (1999, p. 321). A cerca do surgimento da alegação de insanidade
como defesa judicial, apresentada na Inglaterra, pode-se analisar o que se segue:
Os britânicos criaram a alegação de insanidade em 1843, depois que um
escocês dominado por ilusões, tentou matar a tiros o primeiro-ministro, que
ele pensava que o estava perseguindo. O escocês errou e acabou matando
o secretário do primeiro ministro. Houve um clamor quando ele foi absolvido
como insano e enviado para um hospital psiquiátrico, em vez de prisão.
(MYERS, 1999, p. 321)
No tocante à classificação dos distúrbios psicológicos conforme o DSMIV-TR, Diagnostic and Statistical Manual of Mental Desordens, Manual diagnóstico e
estatístico dos transtornos mentais, em sua quarta edição, há 230 distúrbios
diferentes (MYERS, 1999, p. 322). Os transtornos patológicos podem ser
Transtornos pelo uso de substâncias psicoativas, Esquizofrenia, Transtornos do
humor, Transtornos sexuais, Transtornos do sono, Transtornos de controle de
impulsos e Transtornos da personalidade.
Este sistema de classificação utiliza dois critérios importantes:
Em vez disso, O DSM-IV-TR usa dois critérios fundamentais para
determinar se o comportamento de uma pessoa justifica ser descrito como
um transtorno mental: o sofrimento e a má adaptação. O sofrimento implica
que o comportamento causa a angustia ou ansiedade do individuo; a má
adaptação implica que o funcionamento da pessoa na vida diária é
significativamente prejudicado. (GLASSMAN; HADAD, 2008, p. 404)
É importante a classificação dos distúrbios de personalidade, salienta
Myers, para facilitar o seu tratamento e a sua pesquisa. “Em psiquiatria e psicologia,
a classificação diagnóstica visa idealmente a descrever um distúrbio, a prever o seu
curso futuro, a seguir o tratamento apropriado e a estimular a pesquisa de suas
21
causas.” (MYERS, 1999, p. 320).
2.1.3 Distúrbio Psicológico da Personalidade
A Estrutura da personalidade na abordagem psicanalítica desenvolvida
por Freud constitui-se em três partes. Como ensina Alcott kaplan e Sadock (2007, p.
477), o Id consiste nos impulsos biológicos básicos e é a parte mais primitiva a partir
da qual as outras duas se desenvolvem posteriormente. Ele procura a satisfação
imediata dos impulsos, operando a partir do principio do prazer.
O Ego é outra parte, que obedece ao principio da realidade, ou seja, a
gratificação dos impulsos deve ser adiada até que a situação seja apropriada,
lecionam ainda Alcott kaplan e Sadock. Então será o mesmo responsável por decidir
quais impulsos do Id serão satisfeitos e de que maneira, além de mediar as
demandas do próprio Id, as realidade do mundo e as demandas do superego.
Já o Superego é a parte da estrutura da personalidade que consiste na
representação internalizada dos valores e costumes da sociedade. Se os padrões
parentais são excessivamente rígidos, o individuo poderá ficar sobrecarregado de
culpa e inibir todos os impulsos agressivos ou sexuais. Em contraste, se não
incorpora quaisquer padrões de comportamento social aceitável, sentirá poucas
restrições a seu comportamento e poderá desviar-se a um comportamento de autosatisfação excessivo ou criminoso, diz-se nesta situação que a pessoa tem um
superego fraco. (ALCOTT KAPLAN; SADOCK, 2007, p. 477)
O primeiro autor a dar uma linha diretiva sobre personalidade (ALLPORT,
22
1937 apud PIEDADE JÚNIOR, 1982, p. 108) diz que “A personalidade é a
organização dinâmica dos sistemas psicofísicos do indivíduo que determinam a sua
particular adaptação ao meio ambiente”. Outra conceituação de personalidade é que
constitui “Padrões distintivos e característicos de pensamento, emoção e
comportamento que definem o estilo pessoal de interação da pessoa com os
ambientes físicos e sociais” (ATKINSON et al., 2002, p. 475)
A personalidade em seu desenvolvimento poderá, entretanto, sofrer
perturbações, alterações, casos de desdobramento de personalidade, idéias
delirantes de negação, transtornos da percepção, transtornos da relação do
individuo com o mundo exterior. Aduz a esse entendimento Mira y Lopez como
passa a expor a seguir.
A personalidade, sínteses funcional do organismo humano, não pode em
modo algum conceber como algo rígido e estático, incapaz de revolucionar
no tempo; bem antes, o individuo muda com sua idade, e do próprio modo
como as pegadas deste cambio se traduzem em modificações corporais
morfológicas, dão lugar também a alterações do aspecto da sua
personalidade. (MIRA y LOPÉZ, 2007, p. 57)
As alterações na personalidade caracterizam-se como comportamentos
inflexíveis e duradouros ou conjuntos de traços arraigados e inadaptados que
prejudicam a capacidade de funcionamento social da pessoa. Constituem também
modos imaturos e inadequados de enfrentar o estresse ou resolver problemas. Alcott
Kaplan e Sadock (2007, p. 853) proclamam que, o DSM-IV-TR define os transtornos
da personalidade como experiências subjetivas e persistentes que se desviam dos
padrões culturais com inicio na adolescência ou na vida adulta inicial.
Para a identificação dos distúrbios de personalidade clínicos utilizam
critérios práticos observando a deficiência no funcionamento cognitivo, no
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comportamento social, no autocontrole e no sofrimento do paciente. Os sintomas, de
acordo com o CID-10 (1993, p. 197), são na maioria das vezes reconhecidos desde
o início do desenvolvimento da criança ou do adolescente, mas perpetua-se pela
fase adulta, onde a periculosidade é ainda maior.
O CID-10 (1993, p. 194) define em seu item “F60” a classificação para os
Transtornos da personalidade. Cada uma das condições neste grupo pode ser
classificada de acordo com suas manifestações comportamentais predominante,
podendo ser do tipo paranóide, esquizóide, anti-social, emocionalmente instável que inclui a personalidade impulsiva e boderlaine - histriônica, anacástica, ansiosa e
dependente.
Os transtornos de personalidade são agrupados em três classes no DSMIV-TR. O grupo A cobre os transtornos de personalidade paranóide,
esquizóide e esquizotípica; os indivíduos com tais condições costumam ser
percebidos como estranhos e excêntricos. O grupo B é formado pelos
transtornos da personalidade anti-social, borderline, histriônica e narcisista;
os indivíduos incluídos nessa categoria parecem dramáticos, emocionais e
erráticos. O grupo C inclui os transtornos da personalidade esquiva,
dependente e obsessivo-compulsiva e uma categoria denominada
transtorno da personalidade sem outra especificação (como o da
personalidade passivo-agressiva e da personalidade depressiva); nesses
casos, os pacientes parecem ansiosos e medrosos. (ALCOTT KAPLAN e
SADOCK, 2007, p. 853)
2.2 Distúrbios Psicológicos Da Personalidade Anti-social ou Psicopatia
Genericamente define-se psicopatia ou personalidade psicopática como
“situação psicológica de desarmonia constitucional, por imaturação ou deterioração
da personalidade, com tendência para a impulsividade, ou ainda para um
comportamento amoral ou anti-social” (FONSECA, 1997, p. 270).
24
Esse distúrbio atinge um em cada 25 brasileiros, número esse que não
diz respeito em sua totalidade a criminosos e delinqüentes perigosos. O transtorno
da personalidade psicopática gera tanto comportamentos em grau leve, como
pequenos delitos, mentiras recorrentes, como em grau grave, assassinatos, grandes
golpes financeiros. (Revista Istoé, 2009, p. 82)
No entanto, os casos que mais abalam a sociedade e costumam ser
hediondos, provam o grau de frieza e crueldade a que pode chegar um psicopata.
Compõem pois, os psicopatas, um grupo com características próprias, modificações
do caráter, do afeto; porém, como delineia França (2004, p. 423), caracterizam-se
pela inteligência normal ou acima do norma, não constituindo personalidades
doentes ou patológicas.
2.2.1 Evolução Histórica do conceito de psicopatia
Na lição de Fonseca (1997, p. 468), a escola Alemã foi a primeira a
precisar uma definição do conceito de psicopatia. Kock em 1891 a definiu como uma
das formas de anormalidade psíquica congênita ou adquirida e que não constitui
uma doença mental propriamente dita. Já Moebius definiu as psicopatias como
variantes mórbidas do normal.
No fim do século XIX, ainda segundo leciona Fonseca, o conceito de
psicopatia passou a ser entendido a partir da doutrina dos desequilíbrios ou da
degenerescência, do psiquiatra Morel. Aduz também este autor que, a escola anglosaxônica foi outra que contribuiu para a evolução do conceito de psicopatia, a partir
25
de Prichard, que associou a psicopatia ao conceito de loucura moral.
Ademais, de acordo com o mesmo autor, Kraepelin foi o primeiro autor a
estabelecer a designação de personalidade psicopática, em 1921, a qual
correspondia a uma fase inicial de uma psicose autêntica. Já Kurt Schneider, um dos
que mais contribuíram para a evolução dos estudos sobre a psicopatia, defendia que
esta correspondia a uma personalidade anormal que sofre e faz sofrer, devendo
entender o conceito de anormal como um desvio do termo médio e não como um
desvio clínico-patológico.
Em 1805, Pinel havia descrito uma situação clinica denominada “Mania
sem delírio”, que correspondia aos quadros observados atualmente no tipo
psicopático. Ademais, autores anglo-saxónicos foram sem duvida os primeiros a
apresentar o conceito de psicopatia sob o âmbito da personalidade sociopática, antisocial ou associal. O termo associal caracteriza indivíduos com tendência para a
transgressão das normas sociais, com as quais entram freqüentemente em conflito,
em virtude de uma educação e aprendizagem de características amorais
(FONSECA, 1997, p. 469).
O termo anti-social refere-se em regra (de acordo com o Manual de
Diagnostico e Estatística da Associação Americana de Psiquiatria), a certos
comportamentos delinqüentes crônicos que não se corrigem pela
experiência nem pelo castigo. Destituídos de lealdade para com as pessoas
e os grupos, os indivíduos com comportamento anti-social são
emocionalmente imaturos e revelam uma marcada tendência para o
hedonismo e para a irresponsabilidade (GREGORY, 1970 apud FONSECA,
1997, p. 469)
Uma confusão, dessa forma, norteia a abrangência do conceito de
psicopatia
e
suas
designações:
“personalidade
anormal”,
“personalidade
psicopática”, “desenvolvimento psicopático”, “neuroses de caráter”, “sociopátas”,
26
“comportamento psicopático”.
De acordo com o CID-10 (1993, p. 200), o Transtorno de personalidade
anti-social inclui em sua classificação a personalidade amoral, dissocial, associal,
psicopática e sociopática. Deixando apenas excluídos os transtornos de conduta e o
transtorno de personalidade emocionalmente instável.
Como frisa D‟ANDREA (1990, p. 171), há duas ou três décadas a maioria
dos pacientes que hoje são classificados como personalidades anti-sociais, eram
enquadrados como personalidades psicopáticas. Há quem ainda hoje use este
termo, ou também personalidade sociopática; entretanto, segundo D‟Andrea (1990,
p. 171), o termo personalidades anti-sociais permite uma aplicação mais limitada.
Sustenta então, este autor, que de uma forma genérica, é preciso definir o
transtorno da personalidade anti-social como uma situação psicológica de
desarmonia constitucional, por imaturação ou deterioração da personalidade, com
tendência para a impulsividade, ou ainda para um comportamento amoral ou antisocial.
2.2.2 Etiologia dos Transtornos da Personalidade Psicopatia
Na causalidade dos transtornos da personalidade anti-social são
observadas influências de fatores genéticos ou hereditários, biológicos ou
somáticos, psicológicos e socioculturais.
O professor Adrian Raine é um dos que investiga a ligação genética e o
comportamento anti-social. Segundo ele, “Mais de 100 estudos com gêmeos e irmão
27
adotados provaram que 5% da variação em comportamento anti-social é genética”
(Revista Psique, 2007, p. 32). Um artigo, publicado pelo mesmo, confirma que
evidências sustentam uma provável relação entre o gene ligado à produção da
monoamina oxidase do tipo A (MAO-A) e a agressividade.
Estudo publicado em 1995 na revista Science realizou testes com ratos que
mostraram que quando esse gene foi literalmente eliminado, os animais
passaram a ser altamente agressivos, lutando entre si. E quando o mesmo
foi restabelecido, eles retornaram aos seus padrões de comportamento
normais. (Revista Psique, 2007, p. 32)
Atualmente,
além
desse
gene,
outros
seis
são
associados
ao
comportamento anti-social / agressivo em humanos e animais. Como disposto na
Revista Psique (2007, p. 32), são todos esses sete genes, influenciadores de
estruturas cerebrais e interferem no metabolismo de substancias como os hormônios
e no funcionamento de estruturas cerebrais.
No entanto, muito antes dessas recentes descobertas cientificas, em
1929, já havia publicações sobre tendências criminosas relacionadas à genética.
Refere-se Fonseca (1997, p. 473) a um valioso estudo publicado por Lange sobre as
tendências criminosas observadas em gêmeos monozigóticos, demonstrando que a
concordância dessas tendências podia ascender mais do que em dizigóticos.
Segundo o professor Gauer, a ocorrência do transtorno de personalidade
anti-social (TPAS) “é mais comum em familiares de pessoas com TPAS e
os filhos tem 16% de chance de apresentar este transtorno. A concordância
entre gêmeos monozigóticos (com a mesma carga genética) é de 67% e
dos dizigóticos 31%”. (Revista Psique, 2007, p. 33)
Quanto
aos
fatores
biológicos
ou
somáticos,
estudos
recentes
identificaram nos assassinos uma redução da função do corpo caloso, formado por
28
fibras nervosas brancas que permite a comunicação dos hemisférios cerebrais.
Esses estudos, apresentados pela Revista Psique (2007, p. 33), identificaram
também que em regiões como subcorticais, incluindo a amígdala, hipocampo e
tálamo, há uma tendência a diminuição da atividade quando pertencentes ao
hemisfério esquerdo e maior quando pertencentes ao hemisfério direito.
Os hormônios, segundo analisa ainda a Revista Psique, também são
importantes para o desenvolvimento de comportamentos anti-sociais. Segundo o
psiquiatra, professor da PUC-RS e pós- doutor pela University System of Maryland,
a testosterona é um exemplo, “o fato de que vários assassinatos cometidos por
atletas ocorreram quando estes estavam sob a influência de esteróides
anabolizantes” (Revista Psique, 2007, p. 33).
Adverte Fonseca (1997, p. 474), para a influência de lesões cerebrais
mínimas ocorridas ainda no período pré-natal. Estas lesões podem ser detectadas a
partir de modificações na condutibilidade elétrica no eletroencefalograma (EEG) dos
pacientes e comprometem definitivamente zonas extensas dos lobos frontais
(ALCOTT KAPLAN e SADOCK 2007, p. 854).
O pesquisador brasileiro Flavio Josef, do serviço de psiquiatria da UFRJ,
explica que os impulsos são modulados e controlados pelo córtex. Desse modo,
quando um indivíduo possuir um córtex frontal afetado por uma lesão, por exemplo,
poderão desencadear-se alterações no seu comportamento. (Revista Psique, 2007,
p. 31)
Comprovou-se também, como se proclama na Revista Istoé (2009, p. 84),
que o distúrbio da mente dos psicopatas está relacionado ao sistema límbico, uma
parte do cérebro responsável pelas emoções. Há uma dificuldade vinculada à
associação de determinados estímulos com determinadas respostas relacionada a
29
esse sistema. E por isso, reconhece Fonseca (1997, p. 476), os portadores de
psicopatia são deficientes em mecanismos fundamentais que engendram a emoção,
as tendências, os sentimentos, a vontade.
Nessas pessoas, a atividade cerebral na região funciona menos do que
deveria e, por isso, as emoções não afloram. Para elas, não há diferença
entre uma cena de estupro ou de um pôr do sol, por exemplo, como
comprovou um estudo de dois neurologistas brasileiros, Jorge Moll e
Ricardo Oliveira. Voluntários foram submetidos a uma seqüência de cenas,
que mesclavam guerras e crianças brincando, entre outras situações.
Exames de ressonância magnética revelam que, quando a imagem era
agressiva, o sistema límbico entrava em ebulição. A atividade registrada era
maior devido à repulsa. Para os psicopatas, não houve diferença. A
atividade cerebral não se alterava, independente da cena.” (Revista Istoé,
2009, p. 84)
Fatores psicanalíticos, por sua vez, apontados como responsáveis pela
organização de comportamentos anti-social estão relacionados à estrutura da
personalidade proposta por Freud. Esse entendimento apresentado por D„Andrea
(1990, p. 172) estabelece que portadores de personalidade anti-social não
apresentam desenvolvimento do superego que concorde com as normas sociais e
que ao mesmo tempo lhe integre a personalidade.
De acordo com a psicóloga Maria de Fátima Franco dos Santos,
professora de Psicologia Forense da Pontifícia Universidade Católica de Campinas e
especialista em segurança pública (Revista Psique, 2007, p. 26) a maioria dos
homicidas tem personalidade anti-social e esse problema tem origem comum em
ambientes familiares. Ambientes esses, em que os pais têm problemas em
estabelecer limites para os filhos, os quais, conforme passam da infância para a fase
adulta e não conseguem lidar com a necessidade de ultrapassar obstáculos, tornamse indivíduos revoltados socialmente.
Aduz sobre o assunto a psicóloga, psicanalista e autora do livro No traço
30
da violência, Maria Breves Ramos (Revista Psique, 2007, p. 27) que “Aprender a
passar por adversidade vem de dentro de casa.”. Ela também menciona que não só
pais e mães super-protetores ou omissos podem influenciar uma personalidade
voltada para a violência, mas também o convívio com parentes violentos.
Laços familiares são dos traços afetivos, provavelmente os mais marcantes.
Além de ser a primeira instituição social com a qual o ser humano tem
contado; a família, no primeiro momento da educação, é a estrutura
essencial para a transmissão de valores necessários à sobrevivência na
coletividade. Comportamentos atípicos, de caráter anti-social – como, nesse
caso, o de um homicida – possivelmente tem a ver com alguma deficiência
na estrutura familiar do individuo ou na forma como ele enxerga o ambiente
familiar ideal. (Revista Psique, 2007, p. 26)
Atribui-se
a
atuação
anti-social
também,
como
um
substituto
compensador ao sentimento de vazio e solidão que decorre de um ciclo vicioso de
necessidades frustradas, agressão, rejeição e até desapego de qualquer esperança
de receber carinho e atenção, oriundas de lares desarmônicos, desfeitos, hostis,
indulgentes (D‟ANDREA, 1990, p. 173). Para o jovem, ser querido pela policia
parece ser uma alternativa melhor do que não ser querido por ninguém e muitas
vezes os atos anti-sociais escondem uma busca inconsciente de ser preso ou de ser
morto.
Do ponto de vista dinâmico, tem-se valorizado, sobretudo, a chamada
“frustração precoce”, elaborada pela criança a partir de um sentimento de
má identificação, mães autoritárias, que não prestam a menor atenção à
personalidade do filho, provocariam neste a rejeição ulterior da sociedade.
(FONSECA, 1997, p. 517)
Diz ainda a psicanalista, Maria Beatriz (Revista Psique, 2007, p. 29) que
se a família esta desestruturada, mas a escola é de boa qualidade, pode haver uma
substituição e o ambiente escolar se torna uma segunda família. Entretanto, na
31
atualidade,
a
escola
também
perde
parte
de
seu
valor
institucional
e
coincidentemente, no momento em que aumentou a criminalidade na sociedade
brasileira. Os teóricos psicanalistas, de maneira geral, acreditam que os psicopatas
sentem conflitos inconscientes que os impedem de se identificar com o pai e
incorporar padrões morais.
Posição diferente é a dos behavioristas que, segundo Davidoff (2006, p.
583) estabelecem parâmetros como, “pais de psicopatas são freqüentemente antisociais, a observação e a imitação de um pai explorador poderiam estar envolvidas”.
Atribuem também a pouca disciplina ou a disciplina inconsistente dada pelos pais,
posto que “ambas as práticas de criação teriam probabilidade de produzir crianças
sem idéias claras e sobre o certo e o errado” (DAVIDOFF, 2006, p. 583).
Embora muitos psicopatas procedam de famílias divididas e pobres e
tenham sido vitimas de alguma forma de abandono e de rechaço paternos,
uma das circunstancias mais determinantes das psicopatias dos adultos,
parece ser a de terem tido um pai psicopata, alcoólatra ou anti-social. Vários
cientistas pensam que o psicopata é patologicamente incapaz de interpretar
um papel e que suas experiências infantis o levaram a adquirir uma fachada
social. (BRAGHIROLLI; BISI; NICOLETTO, 2009, p. 225)
Por fim, os fatores socioculturais atuam também como causa dos
transtornos da personalidade anti-social, conforme lição de D‟Andrea (1990, p. 173),
a partir das excessivas demandas da sociedade industrial, excesso de estímulo ao
prazer e a impossibilidade de satisfação, desníveis sociais, alienação, competição.
Fonseca (1997, p. 475) adverte que há grande incidência deste tipo de
anomalia em sociedades que evoluem de regimes autoritários para democracia, por
exemplo. “O período de grande instabilidade social que se seguiu a ultima grande
guerra provocou um aumento acelerado dessas manifestações delinqüênciais.”
(FONSECA, 1997, p. 518)
32
Nestes termos, ainda segundo este autor, muitos teoricos atribuem uma
associação de fatores biopsicológicos e socioculturais que seriam responsáveis pela
incapacidade do psicopata para estabelecer relações interpessoais satisfatórias e
estáveis.
Um estudo recente de tendências criminosas entre jovens dinamarqueses
ilustra a utilidade da perspectiva biopsicossocial. Uma equipe de pesquisa
liderada por Adrian Raine (1996) verificou os registros criminosos de quase
400 homens nas idades de 20 a 22 anos, sabendo que todos haviam
experimentado fatores de risco biológicos ao nascimento, como parto
prematuro, ou vinham de antecedentes familiares marcados pela pobreza e
pela instabilidade familiar. Com o risco de crime dobrado, em comparação
com qualquer desses dois grupos, estavam aqueles num grupo “biossocial”
cujas vidas apresentavam tanto os fatores de risco biológicos quanto os
sociais. (MYERS, 1999, p. 339)
2.2. 3 Características do Distúrbio da Personalidade Psicopática
França (2004, p. 424), ensina sobre a classificação que Kraepelin
estabeleceu para as psicopatias, dividindo-as em entidades psicopáticas irritáveis,
instáveis, instintivas, tocadas, mentirosas, e fraudadoras, anti-sociais, disputadoras.
E que, Myra y Lopes dividiu-as em: psicopatas astênicos, explosivos, irritáveis,
histéricos, ciclóides, sensitivo-paranóides, perversos, esquizóides, hipocondríacos e
homossexuais.
Alguns
especialistas,
porém,
segundo
(BRAGHIROLLI;
BISI;
NICOLETTO, 2009, p. 224) dividem os psicopatas em apenas dois tipos, agressivos
predadores e os passivos parasitários. Os primeiros satisfazem suas conveniências
com acentuada agressividade e com uma atuação fria e insensível, apropriando-se
33
de quanto desejam. Os segundos obtêm o que querem praticando sobre os demais
uma espécie de “sangria” parasitária aparentando desamparo e necessidade de
ajuda.
França (2004, p. 423) propõe que a personalidade psicopática é marcada
por estado psíquico capaz de determinar profundas modificações do caráter e do
afeto e que seu traço mais marcante é a perturbação da afetividade e do caráter. Já
a inteligência, segundo este autor, mantém-se normal ou acima do normal. No
mesmo entendimento, Rodrigues e Gonçalves (2004, p. 133) estabelecem como
características a perversão mórbida dos sentimentos, afetos, temperamento,
hábitos, disposição moral sem haver qualquer distúrbio ou defeito no intelecto ou no
conhecimento e raciocínio; não há particularmente ilusão ou alucinação.
As duas principais características da personalidade psicopática são a
incapacidade de amar e a falta de sentimento de culpabilidade. (BRAGHIROLLI;
BISI; NICOLETTO, 2009, p. 225). Segundo o professor Gauer (Revista Psique,
2007, p. 33), os portadores de personalidade anti-social são totalmente insensíveis,
indiferentes e imaturos emocionalmente, com pouca ou quase nenhuma empatia
pelas outras pessoas; além de possuírem um forte egocentrismo.
O DSM apresenta uma definição, neste sentido, segundo a qual, os
indivíduos portadores de psicopatia são incapazes de uma lealdade significativa com
outros indivíduos, grupos ou valores sociais; são bastante egoístas, insensíveis,
irresponsáveis, impulsivos e incapazes de aprender com castigo e de se sentir em
culpados. (MOLINA; GOMES, 2008, p. 273 apud DSM, 1968, p. 41)
Confirmam Glassam e Hadad (2008, p. 405), que é um padrão deste
transtorno exibir violência e desrespeito para com as outras pessoas, sem a
presença de culpa. Além disso, são manipuladores, mentem com convicção, mesmo
34
sem necessidade, como ensinam Molina e Gomes (2008, p. 274).
Os psicopatas não se importam em passar por cima de tudo e de todos para
alcançar seus objetivos. Mentem, manipulam e não sentem remorso, muito
menos culpa. Ao mesmo tempo, são charmosos e simpáticos. Se algo ou
alguém ameaça seus planos, tornam-se agressivos. São mestres em
inverter o jogo, colocando-se no papel de vítimas. E estão conscientes de
todos os seus atos (não entram em delírio, como em outras doenças
mentais. (Revista Istoé, 2009, p. 82)
Segundo Glassman e Hadad (2008, p. 405), o portador de personalidade
psicopática “viola as normas da sociedade de maneiras muito significativas”. Aduz a
esse entendimento D‟Andrea (1990, p.860), que se refere a uma incapacidade de se
adaptar às normas sociais que regem vários aspectos do comportamento do
individuo.
O anti-social desenvolve, muitas vezes, notável habilidade para identificar
pessoas que se ajustam ao seu estilo, servindo aos seus propósitos, sendo por elas
admirado. Não se estranhe que arrebanhe apóstolos fiéis – encontra campo fértil na
política ou religião, onde se torna líder insinuante, dono de grande poder sobre os
liderados, cuja fidelidade não hesita em comprar da melhor maneira que encontra.
(FIORELLI; FIORELLI; MALHADAS JÚNIOR, 2008. p. 193)
Válido ressaltar sobre a inteligência e a capacidade de raciocinar de um
portador da personalidade anti-social, posto que, é um fator essencial para o seu
enquadramento como responsável ou não penalmente, no ordenamento brasileiro. A
racionalidade deles é tamanha que não são pegos, por exemplo, em detectores de
mentira; sabem exatamente o que fazem e mentem com naturalidade; psicoterapia e
psicanálise podem até ensiná-los a manipular com ainda mais maestria, uma vez
que aprendem detalhes sobre o comportamento humano. (Revista Istoé, 2009, p.
84)
35
A perturbação é incapacitante, resultando na falência de autonomia e autosuficiência, com muitos anos de institucionalização, geralmente do tipo
penal. De referir que alguns indivíduos com formas mais atenuadas desta
perturbação obtêm êxito em atividades econômicas e políticas, faltando
nestes, no entanto, o início precoce na infância que interfere com aquisições
educacionais. (RODRIGUES; GONÇALVES, 2004, p. 131)
Ademais, é de suma importância também para o enquadramento da
responsabilidade dos psicopatas a sua capacidade de determinação que se
encontra reduzida ou abolida em conseqüência dos distúrbios da conação. Estes
distúrbios podem resultar de anormalidade quantitativa do tono volitivo por
exageração (eversão) ou diminuição (adversão) ou, ainda, por sua alteração
(distúrbio qualitativo), a chamada perversão. (CHALUB, 1982, p. 107)
Enquadram-se nos estados de perversão aqueles quadros clínicos, na
lição de Chalub (1981, p. 109), caracterizados por desvio funcional da volição, no
sentido de alteração do caráter, anomalia de objetivo, modificação de componentes
habituais da pessoa. Tais condições mentais são encontradas em algumas formas
clinicas de neurose e mais freqüentemente nas psicopatias.
Para este autor, o estado de normalidade da determinação, que esta
presente nos psicopatas, pode ser avaliado a partir da noção de antijuridicidade, de
dano, potencial ou efetivo, e de perigo de lesão ou lesão a um bem ou interesse
juridicamente tutelado; da percepção de relação causal entre ação ou omissão e
efeito, conseqüências ou resultados; da consciência de perturbação da ordem social,
violação de norma ou dever jurídico; consciência de culpabilidade, imputabilidade e
responsabilidade; noção de imoralidade e de lesão antiética da conduta; entre outros
aspectos (CHALUB, 1981, p. 110).
Em síntese, a Revista Istoé apresenta uma relação de casos
36
contemporâneos de psicopatas no cenário criminal brasileiro e suas principais
características. Suzane Von Richthofen, por exemplo, apresentou egoísmo
exacerbado para alcançar seus objetivos “em novembro de 2002, ela abriu a porta
de sua casa para que o namorado, Daniel, e o irmão dele, Cristian, matassem seus
pais, Marísia e Albert, com pancadas de barras de ferro” (REVISTA ISTOÉ, 2009, p.
82). Depois disso, ainda sem remorso ou culpa foi para um motel e também após o
enterro, fez uma reunião com amigos na piscina de casa.
Também desafiadora é a compreensão das características de
personalidade de Daniel Cravinhos, líder do grupo responsável pelo
assassinato a pauladas dos pais da jovem Suzane Richtoffen. “Daniel
demonstra características marcantemente narcísicas, que o convidam a
exibir sua superioridade perante o mundo; porém, combinadas com o
absoluto desprezo pelas pessoas sobre as quais pretende demonstrar seu
brilho invulgar – não hesitando em valer-se de métodos anti-sociais para
atingir seus desígnios. (FIORELLI; FIORELLI; MALHADAS JÚNIOR, 2008,
p. 194)
Da mesma forma, com ausência de sentimento de culpa, a empresária
Sílvia Calabrese, presa por maltratar e torturar uma menina de 12 anos com quem
morava, alegou que a estava educando e não demonstrou nenhum arrependimento.
“A garota foi encontrada em seu apartamento com os braços acorrentados em uma
escada, uma mordaça embebida em pimenta, dedos e dentes quebrados, unhas
arrancadas, marcas de ferro quente pelo corpo.” (Revista Istoé, 2009, p. 83)
O ator Guilherme de Pádua é outro exemplo citado pela Revista Istoé,
pois o mesmo não dispensou frieza ao matar a atriz Daniella Perez com golpes de
punhal, em dezembro de 1992. O mesmo foi ao velório prestar solidariedade a mãe
e marido da vítima. “Durante o interrogatório, depois de se entregar, estava calmo e
relatou o assassinato sem esboçar reação alguma.” (Revista Istoé, 2009, p. 84).
Além de frios, os psicopatas também demonstram que são sedutores e
37
prestativos, adulam a vítima até que esta não se mostre contrária às suas ações.
Assim comportava-se Kelly dos Santos; “Kelly se passava por rica e cativava com
sua simpatia e desenvoltura para depois furtar jóias, dinheiro, cartões de crédito e
talões de cheque. Quando não convencia, era arrogante, fazia escândalo e
detratava as pessoas.” (Revista Istoé, 2009, p. 84). A mesma, aos 19 anos de idade,
foi presa em agosto de 2007, em São Paulo, acusada de estelionato, furto e
falsidade ideológica.
Ainda com base no artigo da Revista Istoé, para psiquiatra Ana Beatriz
há indícios que apontam Lindemberg como um psicopata pela premeditação do seu
crime, que envolveu a adolescente e sua namorada Eloá. “Ele falou para os amigos
„vocês vão ouvir falar de mim esta semana‟, lembra Ana Beatriz“ (Revista Istoé,
2009, p. 81). Ela vê também traços de egocentrismo no rapaz quando ele repetia no
cativeiro, enquanto mantinha a garota como refém, ser o “príncipe do gueto” (Revista
Istoé, 2009, p. 83).
Nestes Termos, conclui-se, segundo os ensinamentos de Molina e Gomes
(2008, p. 274), que o portador de psicopatia apresenta traços e atributos pessoais
que o desligam de seu componente humano, ou seja, tratar bondosamente e
vincular-se às outras pessoas, sentir pena ou arrependimento. Possuem um estilo
de vida anti-social e agressivo, apenas por capricho ou para alcançar seus objetivos.
Mas são assim não por eclosão de doença mental, mas sim por tratar-se de um caso
extremo de distúrbio do caráter e que corrompe sua personalidade.
38
3 IMPLICAÇÕES JURÍDICAS AO PSICOPATA
3.1 Inimputabilidade e Semi-imputabilidade do Psicopata
Os crimes cometidos por psicopatas são, de maneira geral, violentos e
cruéis, nos quais também se verifica o simples desejo de humilhar e causar dor
excessiva à vítima; são na maioria das vezes crimes seriais. Grande indagação é se
as personalidades psicopáticas são ou não penalmente responsáveis e se são, se
deve ser considerado que há um grau de responsabilidade diminuído. Sabe-se,
primordialmente, que o agente deve ter condições físicas, psicológicas, morais e
mentais de saber que esta realizando um ilícito penal (CAPEZ, 2008, p. 307).
Na lição de Fiorelli e Mangini (2010, p. 113), “a imputabilidade penal
implica que a pessoa entenda a ação praticada como algo ilícito, ou seja, contrário a
ordem pública e que possa agir de acordo com esse entendimento“. Esta
compreensão, segundo estes autores, poderá, no entanto, estar prejudicada em
função das psicopatologias ou de deficiências cognitivas. Nestes termos, portanto,
para as pessoas portadoras de algum sofrimento mental, como é o caso dos
portadores de personalidade psicopática, dever-se-á aquilatar a intensidade e a
qualidade do transtorno para que se possa aferir a possibilidade ou não de
responsabilizá-la.
39
3.1.1 Imputabilidade e Responsabilidade Penal
Correntes de pensamento jurídico ou escolas penais propõem-se a
explicar o homem delinqüente e a sua responsabilidade. Postula a escola Clássica
que “o crime é a infração da lei do Estado promulgada para proteger a segurança
dos cidadãos, resultante de um ato externo do homem, positivo ou negativo,
moralmente imputável e politicamente danoso.” (PIEDADE JÚNIOR, 1982, p. 38).
Sustentaram os seguidores desta escola, como aduz Piedade Júnior (1982, p. 39)
que a responsabilidade penal do homem baseava-se na responsabilidade moral,
segundo o seu livre-arbítrio.
Outra é a escola Positiva, a qual se fundou no determinismo da época e
entendendo “uma vontade coagida por uma cadeia de motivos” (PIEDADE JÚNIOR,
1982, p. 39), contrapondo-se ao livre arbítrio defendido pelos classicistas. Para os
positivistas, os homens não são moralmente responsáveis por suas ações, a
responsabilidade seria puramente social; então não haveria uma distinção entre
imputável ou inimputável, a ao invés de punir, deveria criar mecanismos para se
defender (PIEDADE JÚNIOR, 1982, p. 40).
A teoria finalista postulada por Hans Wiesel e adotada pelo ordenamento
jurídico brasileiro estabelece a composição da culpabilidade em três elementos
(GRECO, 2009, p. 395). A imputabilidade, baseada nas condições psíquicas de o
agente estruturar sua consciência e vontade; potencial consciência sobre a ilicitude
do fato, ou seja, se havia condições de o agente compreender a ilicitude de sua
conduta; e a exigibilidade de conduta diversa, se era possível no momento da
prática do crime, uma conduta diferente da adotada pelo agente.
40
A imputabilidade penal, segundo Nucci (2008, p. 287), é o conjunto de
condições, qualidades pessoais que envolvem inteligência e vontade do agente,
capaz de permiti-lo ter entendimento ou não do caráter ilícito do fato. É, portanto, o
elemento ou pressuposto de culpabilidade, aptidão para ser culpável. Para Brandão
(2002, p. 163), sem a imputabilidade não há culpabilidade, pois a capacidade de
culpabilidade é a própria imputabilidade.
A imputabilidade, isto é, uma determinada situação mental, que permite ao
agente o exato conhecimento do fato e do seu sentido contrário ao dever e
a determinação da vontade de acordo com esse entendimento, dando-lhes,
assim, capacidade para sofrer a imputação jurídica do fato. (ANIBAL
BRUNO, 1984, p.416 apud ROTHENBERG, 1997, p. 185)
Imputar, na lição de Eça (2002, p. 89) “vem de imputare, atribuir a alguém
a responsabilidade de...”. Não se pode, entretanto, confundir imputabilidade com
responsabilidade, pois esta, como ensina Bittencourt (2009, p. 378), é o princípio
segundo o qual a pessoa dotada de capacidade de culpabilidade, ou seja, imputável,
deve responder por seus atos. Para Odilon (2008, p. 238) a imputabilidade é
atribuição pericial, através de diagnóstico ou prognóstico de uma conclusão médicolegal, enquanto que a responsabilidade penal é um fato de competência judicial que
será analisado em conformidade com outros dados processuais.
A imputabilidade caracteriza uma capacidade de compreensão e uma
vontade de agir. É a condição de quem é capaz de realizar um ato com
pleno discernimento. É um fato subjetivo, psíquico e abstrato. Ao cometer
uma infração, o individuo transforma essa capacidade num fato concreto.
Denomina-se isso de imputação. Já a responsabilidade é conseqüência de
quem tinha pleno entendimento e deverá pagar por isso. (FRANÇA, 2004, p.
408)
Há um binômio necessário para a formação das condições pessoais do
agente imputável, que segundo Nucci (2008, p. 287) são a saúde mental e a
41
maturidade. Assim, o agente que não possui aptidão para entender a diferença entre
o certo e o errado, que não seja “capaz de alcançar a exata representação de sua
conduta e agir com plena liberdade de entendimento e vontade” ( (BRANDÃO, 2002, p.
163), estará propício a praticar fato típico e antijurídico sem que possa por isso ser
censurado, ou seja, sofrer juízo de culpabilidade.
Dessa forma, como afirma Bittencourt (2009, p. 378), de uma forma
genérica, está presente a imputabilidade sob ótica do Direito Penal Brasileiro,
sempre que o agente apresentar condições de normalidade e maturidade psíquicas.
Odilon (2008, p. 237) fala em situação mental, ao se referir à imputabilidade e
vínculo psíquico, ao se referir a culpabilidade; este, pois, capaz de prender o agente
imputável ao fato por ele praticado.
3.1.2 Inimputabilidade e Semi-imputabilidade
Aduz Bitencourt (2009, p. 379) que o nosso Código Penal não define
imputabilidade penal, apenas estabelece as causas que a afasta, definindo, em
outros termos, as causas de inimputabilidade. Exclui-se, assim, da culpabilidade a
menoridade, estabelecida em dezoito anos, como previsto no artigo 27, ficando os
menores infratores sujeitos às normas da legislação especial. Também, a
embriaguez completa por caso fortuito ou força maior capaz de provocar
incapacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com
esse entendimento ao tempo da ação ou da omissão, como previsto no artigo 28,
parágrafo 1º.
42
Ademais, exclui-se ainda a culpabilidade, do portador de doença mental
e o desenvolvimento mental incompleto ou retardado, como previsto no artigo 26.
Neste caso, quando à época do fato, o agente for totalmente incapaz de entender e,
ou determinar-se com entendimento da ilicitude da sua ação. Na lição de Nucci
(2008, p. 288), há três critérios para determinar a inimputabilidade quanto à higidez
mental, o biológico, o psicológico e o biopsicológico.
O biológico, em que se observa única e exclusivamente a saúde mental
do agente, ficando o juiz dependente do laudo pericial; o psicológico, que leva em
consideração a capacidade que o agente possui para apreciar o caráter ilícito do fato
ou de comportar-se com esse entendimento, poderá nesse caso apreciar o juiz com
arbítrio; e o biopsicológico, o qual abrange os dois critérios e é o adotado pelo
Código Penal em seu artigo 26.
Para Amorim, em seu artigo intitulado “Inimputabilidade e direitos
humanos: uma reconstrução da doença mental e sua superveniência à sentença
penal
condenatória”,
dentre
as
alterações
mórbidas
estão
a
oligrofenia,
desenvolvimento mental incompleto de natureza congênita; a idiotia, caracterizada
por um estado mórbido oriundo de um vício congênito do encéfalo e que consiste na
ausência completa de desenvolvimento intelectual e afetivo; imbecilidade, bastante
propensa à violência. Além destas, a debilidade mental, epilepsia, esquizofrenia,
neurose.
Nestes termos, apresentando uma doença mental, um desenvolvimento
mental que ainda não se concluiu ou anomalia que impede a compreensão e o
entendimento, no momento em que se pratica o fato, não será culpável o
delinqüente. Já no tocante às personalidades psicopáticas são poucos os casos,
apenas enquadrados como inimputáveis pela sua periculosidade e não por constituir
43
doença mental.
No entanto, os agentes perversos, frios de ânimo, desalmados, imorais,
destituídos de remorso, pena, compaixão, etc., portadores de transtornos de
personalidade, o que corresponde às personalidades psicopáticas, não são
doentes mentais, psicóticos, são psicopatas, sociopatas, conduto patas.
Esses são desprovidos de um código interior moral e social, e são avessos
ao código exterior de conduta e convivência. Correspondem aos abjetos
“loucos morais”, insensíveis, com comportamento e reações primitivas e
grosseiras. A eles não se aplica o artigo 26, caput, pois não são
inimputáveis... A grande minoria dos casos que são levados a apreciação
dos peritos, apresentam alguma chance de se encaixar nos requisitos do
artigo 26. (FERREIRA, 2003)
Aduz Farah de Sousa Malcher, Advogada e Jornalista, especialista em
Direito Penal e Processual Penal, que os psicopatas, embora desprovidos de
doença mental de origem orgânica, são fruto do meio social hostil em que vivem.
Estes acabam desenvolvendo a personalidade desajustada por conta de traumas
sofridos e em decorrência de anomalias do caráter e do afeto. E embora providos de
inteligência e capacidade de entendimento, são incapazes de controlar seus
impulsos
e
de
autogovernar-se,
portanto,
incapacidade
de
determinar-se.
(MALCHER, 2009)
São pessoas anti-sociais com elevado grau de periculosidade e que
deveriam ser inclusos ao lado dos portadores de doença mental e de
desenvolvimento mental incompleto ou retardado, os indivíduos portadores de
transtornos de personalidade anti-social. Até porque, atualmente, a distinção entre
doença e perturbação mental não é inflexível, sendo, pois o conceito jurídico de
doença mental abrangente. (MALCHER, 2009)
Já a semi-imputabilidade, segundo o entendimento de Brandão (2002, p.
170), é a chamada imputabilidade diminuída. Odilon (2008, p. 237-238) define semiimputabilidade como o entendimento e, ou determinação parcial de acordo com o
44
caráter criminoso de sua ação à época do fato.
Leciona Capez (2008, p. 321) que pode também ser denominada de
responsabilidade diminuída e alcança os indivíduos em que as perturbações
psíquicas tornam menor o poder de autodeterminação e mais fraca a resistência
interior em relação à prática do crime. Segundo este autor, os requisitos são os
mesmos da inimputabilidade, salvo quanto a intensidade no requisito cronológico,
que no caso da semi-imputabilidade é o tempo da ação ou omissão.
Situação diversa é a do chamado semi-imputável que pratica um fato
típico, ilícito e culpável. Contudo, em virtude de não ter pleno
conhecimento do caráter ilícito do fato, sua pena deverá ser reduzida.
Quando a lei, no parágrafo único do art. 26 do código penal, diz que “a
pena pode ser reduzida de um a dois terços”, referindo-se ao semiimputável, quer dizer que a ele será aplicada a pena relativa à infração
penal por ele cometida, devendo-se, contudo, fazer incidir o percentual de
redução previsto pelo mencionado parágrafo. Ou seja, condena-se o semiimputável, mas reduz-se lhe a pena imposta, razão pela qual deverá estar
consignado na peça inicial de acusação o pedido de condenação, ao
contrário da situação anterior correspondente ao inimputável. (GRECO,
2009, p. 401)
Já a definição de Bittencourt (2009, p. 385) estabelece que, os semiimputáveis situam-se na faixa intermediária entre imputáveis e inimputáveis, são os
chamados fronteiriços e que apresentam situações atenuadas ou residuais de
psicose, de oligofrenias e, grande parte das chamadas personalidade psicopáticas
ou mesmo transtornos mentais transitórios.
O Código Penal Brasileiro tratou da semi-imputabilidade no parágrafo
único do artigo 26, prevendo que poderia reduzir-se a pena aplicada de um indivíduo
comprovadamente portador de perturbação de saúde mental ou apresentando
desenvolvimento mental incompleto ou retardado; também sendo comprovado que
não possuía capacidade de entendimento do caráter ilícito do fato e determinação
de acordo com o entendimento, no momento de praticar o crime.
45
Analisa-se primeiramente que a lei prevê a perturbação da saúde mental
e não a doença mental como pressuposto para que a capacidade parcial de
entendimento e determinação dos semi-imputáveis. Alves (1998, p. 66-67)
parafraseia Roque de Brito Alves afirmando que toda doença mental implica
perturbação mental, mas que a recíproca não é verdadeira. Segundo Alves, as
personalidades psicopáticas apresentam, por exemplo, sinais de perturbação de
saúde mental, mas não atinge o grau de doença.
Deve haver bastante cautela, portanto, tanto do perito como do juiz para
averiguar essas situações consideradas limítrofes, segundo Nucci (2008, p. 291), as
quais não se constituem normalidade, mas também não se caracterizam como
anormalidade. Por isso, a lei abrange nesse caso, a perturbação da saúde mental e
não a doença mental; “a perturbação da saúde mental não deixa de ser também
uma forma de doença mental, embora não retirando do agente, completamente, a
sua inteligência ou a sua vontade.” (NUCCI, 2008, p. 292). Entende-se, portanto,
que há a perturbação, mas que não elimina a possibilidade de compreensão, motivo
pelo qual a lei também utiliza o termo “desenvolvimento mental incompleto ou
retardado”.
Em segundo lugar, a lei refere-se aos que apresentam desenvolvimento
mental incompleto, como o silvícola desde que demonstrada sua inaptidão à vida no
meio civilizado. Como descreve Brandão (2002, p. 170) trata-se esta adaptação, à
vida social de nosso nível, às normas complexas que a regulam e aos critérios de
valores de nossos julgamentos. Engloba também o desenvolvimento mental
incompleto, o oligofrênico, ainda segundo Brandão, desde que se encontrando em
nível de debilidade mental limítrofe oriunda de questões culturais ou orgânicas, e
também os surdos-mudos, dependendo da capacidade de entendimento e de
46
autodeterminação.
Cabe ao magistrado avaliar a personalidade do agente e as provas
periciais reduzidas, conforme fulcro do artigo 182 do código de processo penal que
prevê que “O juiz não ficará adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no
todo ou em parte.” Há dúvidas, entretanto, justamente no sentido de enquadrar o
que é normal, o que é patológico e o que é fronteiriço. Segundo Eça (2002, p. 22)
"Para a psiquiatria forense, a alienação mental termina quando se percebe que a
razão e o livre arbítrio se fazem totalmente presentes no psiquismo do indivíduo.
Quanto às personalidades anti-sociais, frisa Nucci (2008, p. 290), que não
é fácil detectá-las com segurança e diferenciá-las quanto doenças mentais e
perturbações de saúde mental. Ainda segundo este autor, não se extingue destas a
culpabilidade, por não afetar a inteligência e a vontade. Já para Eça (2002, p. 28)
"Só será semi-imputável, se apresentar personalidade psicopática, influindo esta nas
emoções".
Antes, no advento do sistema duplo-binário, considerávamos as
personalidades psicopáticas como inimputáveis, pelo equívoco de se
imporem primeiro a pena e depois o tratamento em casa de custódia. Hoje
sob a vigência do sistema vicariante ou unitário, defendemos que elas
sejam consideradas semi-imputáveis, ficando sujeitas a medida de
segurança por tempo determinado e a tratamento médico-psiquiátrico,
resguardando-se, assim, os interesses da defesa social e dando
oportunidade de uma readaptação de convivência com a sociedade.
(FRANÇA, 2004, p. 425)
Há,
entretanto,
divergências
a
cerca da
denominação
utilizada.
Doutrinadores atentam para a questão literal das expressões: “semi-imputabilidade”,
“semi-responsabilidade”, “responsabilidade diminuída” ou ainda, “imputabilidade
diminuída”. No entendimento de Damásio (2009, pp. 498-499) há diminuição da
responsabilidade, pois a pena é diminuída, e não a imputabilidade. Assim, pode-se
47
falar em responsabilidade diminuída e não em imputabilidade diminuída.
3.2 O psicopata como causa de inimputabilidade e semi-imputabilidade na
jurisprudência
Jurisprudências infra alencadas ilustram a presença de casos de
personalidade psicopata no sistema jurídico brasileiro. Muitas vezes as alegações de
psicopatia não são verdadeiras, há apenas o intuito de amenizar a pena do
delinqüente ou atribuí-lo alguma regalia.
Válido apresentar jurisprudência na qual o psicopata pretendia livramento
condicional, o qual, de forma correta, foi indeferido.
Ementa - LIVRAMENTO CONDICIONAL. TRACOS DE PERSONALIDADE
PSICOPATICA QUE NÃO RECOMENDAM A LIBERAÇÃO ANTECIPADA
DO CONDENADO. INDEFERIMENTO DO BENEFICIO PELO ACÓRDÃO
IMPUGNADO. HC INDEFERIDO PELO S.T.F. (HABEAS CORPUS. HC nº
66437 / PR - PARANÁ. Relator: Min. SYDNEY SANCHES. Julgamento:
02/08/1988. Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA)
Poderá também o condenado a pena privativa de liberdade, considerado
semi-imputável, pretender progressão do seu regime de cumprimento de pena.
Obtendo, entretanto, obstáculo por conta da anomalia que possui. Com o caso a
seguir exposto:
EXECUCAO PENAL. PROGRESSAO DE REGIME DE CUMPRIMENTO DE
PENA. POSSUINDO O REU PERSONALIDADE PSICOPATICA E
OBTENDO PARECER DESFAVORAVEL DO CENTRO DE OBSERVACAO
CRIMINOLOGICA, INCABIVEL A PROGRESSAO DE REGIME DE
CUMPRIMENTO DE PENA, APESAR DO PARECER FAVORAVEL DA
48
COMISSAO TECNICA DE CLASSIFICACAO. (RESUMO) (Recurso de
Agravo nº 693028813, Câmara de Férias Criminal, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Érico Barone Pires, Julgado em 29/07/1993)
Outra decisão proferida em 2ª câmara de Direito criminal do Estado de
São Paulo indeferiu a progressão de regime por se tratar de réu portador de
personalidade anti-social, apresentando características de um psicopata, como
ausência de arrependimento e empatia. Então, segundo o exame criminológico
efetuado, ao mesmo não poderia ser concedida a progressão de regime pretendida.
Embora o cativo ostente bom comportamento carcerário, o exame
criminológico indica que ele não está em condições, ainda, de vivenciar
regime mais brando. Os peritos consignaram que o Agravante relatava ser
sua "terceira passagem pela cadeia", onde passou a maior parte da vida
adulta, relacionando tal fato ao consumo de drogas. E concluem se tratar de
indivíduo prolixo, egocêntrico e articulado. E também que está: "Adaptado
ao meio carcerário, sua estória pregressa sugere a existência de um
transtorno de personalidade - a personalidade anti-social - onde sobressai a
indisciplina, a ausência de arrependimento e empatid\ embora com
agressividade pouco acentuada. Acrescentaram que "o pouco de censura
que possui é banido pela ação desinibidora das drogas". Ao final, opinaram
desfavoravelmente à progressão. (Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo
de Execução Penal nº 990093182920. Relator: Francisco Orlando Comarca:
Caraguatatuba. Órgão julgador: 2ª Câmara de Direito Criminal. Data do
julgamento: 13/09/2010)
Ao réu portador de personalidade psicopática, nestes termos, poderá ser
determinada pena privativa de liberdade, tratando-se o mesmo de semi-imputável,
com diminuição da pena.
Observa-se abaixo, em sede de Apelação perante o Tribunal de Justiça
de São Paulo, entendimento sobre a desnecessidade de conversão de pena
privativa de liberdade em medida de segurança ao réu portador de personalidade
anti-social.
PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE conversão em medida de segurança,
com internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico.
49
INADMISSIBILIDADE, NESTE CASO. Agente considerado SEMIIMPUTÁVEL, de acordo com a perícia específica realizada. Inexistência de
qualquer evidência de doença mental; tem sim um defeito na formulação da
personalidade (personalidade anti-social grave). Não era, ao tempo da
ação, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou
retardado, inteiramente incapaz de entender o caráter criminoso do fato ou
de determinar-se de acordo com esse entendimento (cf. laudo pericial).
Convencimento judicial, portanto, em optar pela aplicação da pena reduzida
ao condenado (artigo 98 do CP). (Tribunal de Justiça de São Paulo. Agravo
de Execução Penal nº 990093182920. Relator: Francisco Orlando Comarca:
Caraguatatuba. Órgão julgador: 2ª Câmara de Direito Criminal. Data do
julgamento: 13/09/2010)
Por outro lado, em alguns casos, aos psicopatas será determinada
medida de segurança por conta de sua alta periculosidade. “O PACIENTE
OBRIGADO A CUMPRIR MEDIDA DE SEGURANÇA POR TER PERSONALIDADE
PSICOPATICA PERIGOSA, NÃO PODE OBTER LIBERDADE VIGIADA.” (HABEAS
CORPUS. HC nº 42063. Relator: Min. CÂNDIDO MOTTA. Julgamento: 24/03/1965.
Órgão Julgador: TRIBUNAL PLENO).
PSICOPATA.
TOXICOMANOS.
INTOXICADOS
HABITUAIS.
POSSIBILIDADE DE INTERNAMENTO EM INSTITUICAO ADEQUADA DO
ESTADO EM CUMPRIMENTO DE LEGISLACAO FEDERAL. "IN CASU",
RECEBIDA DENUNCIA CONTRA O PACIENTE, O OBICE INVOCADO
DEIXOU DE EXISTIR. O INTERNAMENTO DO PACIENTE OBJETIVA A
SUA PROTECAO E, ASSIM, RECONHECIDO O SEU ESTADO DE
SAUDE, A IMPETRACAO ATE SERIA INADMISSIVEL. (Habeas Corpus nº
586033938, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
José Barison, Julgado em 05/11/1986).
3.3 Sanções penais aplicáveis aos psicopatas
Comprovada a inimputabilidade do agente, a este é então absolvido e
impõe-se a medida de segurança. Por outro lado, comprovada a semiimputabilidade, é obrigatória a imposição de uma pena reduzida; ensina Nucci
50
(2008, p. 385 e 386), que se necessário, para estes fronteiriços, em um segundo
momento, substitui-se a pena privativa de liberdade pela medida de segurança.
Montaigne conceitua sanção penal como “resposta repressiva e
ressocializadora do Estado ao autor de uma conduta delituosa que desrespeitou
normas que tutelam bens ou direitos.”. Faccini apud Jesus (1995, p. 475) frisa que
“as penas e medidas de segurança constituem as duas formas de sanção penal”.
Antes, no advento do sistema duplo-binário, consideravam-se as personalidades
psicopáticas apenas como inimputáveis, impondo primeiro a pena e depois o
tratamento em casa de custódia. Esta cumulação da pena e medida de segurança,
entretanto, apresentou iniqüidade e disfuncionalidade (FRANÇA, 2002, p. 425).
Atualmente, no advento do sistema vicariante ou unitário, ou é aplicada
somente a pena ou somente a medida de segurança. Até aos semi-imputáveis não
poderão ser aplicadas sucessivamente uma pena e uma medida de segurança
(PIEDADE JÚNIOR, 1982, p. 211). O que poderá ocorrer, frisa-se, é que o juiz
deverá optar pela substituição da pena por medida de segurança para que o infrator
seja assistido em um tratamento específico em casos de alta periculosidade.
3.3.1 Penas Privativas de Liberdade
A pena é sanção penal imposta pelo estado, que atua segundo seu jus
puniendi, quando alguém comete um fato típico, ilícito e culpável. (GRECO, 2009, p.
485). Existem diversas teorias que se propõem a justificar o fim para que a pena se
presta, uma delas é a teoria absoluta ou da retribuição, a qual entende que a
51
finalidade da pena é simplesmente o castigo pelo mal praticado, com isso havendo a
reparação moral.
Outra teoria é a relativa que vê na pena cunho exclusivamente preventivo,
valendo a segregação como forma de proteção da sociedade, além de oportunidade
para ressocializar o criminoso; ela não tem alicerce na justiça e na culpabilidade. Já
para a teoria mista ou unificadora, a sanção penal por sua própria natureza é
castigar o infrator pelo mal praticado, porém, tem a finalidade também de prevenir
educando e corrigindo-o (KARAM, 1993, pp. 173-174).
Esta teoria unificadora foi adotada no Código Penal de 1940 e perpetuouse na reforma de 1984, a partir do artigo 59 do Código Penal, que prevê aplicação
da pena estabelecendo-a com o fim de reprovação e prevenção do crime. E também
a partir do artigo 1º da Lei de execuções penais, o qual prevê o objetivo da execução
penal baseado em “efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e
proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do
internado.”
Portanto, a execução penal, como bem ensina Marcão (2009, p. 1), deve
objetivar a integração social do condenado ou do internado, já que se adota a teoria
mista, pois a natureza retributiva da pena não busca apenas a prevenção, mas
também a humanização. Objetiva-se, por meio da execução, punir e também
humanizar o delinqüente. A concepção de pena em sentido punitivo, desta forma, vai
sendo aos poucos substituída pela concepção de tratamento, readaptação ou
reforma do delinqüente, de acordo com o entendimento de Rauter (2003, p. 70).
A criminologia entende que sua legitimidade não mais consiste em
considerações estritamente jurídicas, mas sim cientificas (RAUTER, 2003, p. 28). Na
lição de Piedade Júnior (1982, p. 55), a pena privativa de liberdade tem realmente
52
como finalidade a punição retributiva do mal causado pelo delinqüente; prevenção
de novas infrações; e a regeneração do preso, no sentido de transformá-lo.
O fim da pena, pois, é apenas o de impedir que o réu cause novos danos
aos seus concidadãos e demover os outros a agir desse modo. È, pois,
necessário selecionar quais penas e quais os modos de aplicá-las, de tal
modo que, conservadas as proporções, causem impressão mais eficaz e
mais duradoura no espírito dos homens, e a menos tormentosa no corpo do
réu. (BECCARIA, 1997, p. 52)
Em contrapartida, afirma também Piedade Júnior (1982, p. 71) que, o
sistema tradicional da pena privativa de liberdade tem sido um fracasso, numa visão
de emenda, de ressocialização do delinqüente, de reajustamento social às normas
de comportamento. Seus métodos não possuem caráter cientifico e constitui um
castigo ao mal causado, em contradição aos objetivos a que se propõem.
Rauter (2003, p. 29), quanto aos efeitos que as penas deveriam produzir
com relação aos portadores de personalidade psicopática, demonstra que a prisão é
incapaz de recuperar esse criminoso, em razão de sua anormalidade. Isto, devido ao
fato de que estes não sejam intimidáveis ou capaz de recuperação por meio de
punição. Entretanto, segundo Rauter (2003, p. 73), criminólogos reconhecem que
mesmo as prisões não sendo reformadoras, ou sendo em alguns pontos, são
preferíveis aos hospitais como remédio para tal anomalia.
A psiquiatria... estabeleceu a existência de pessoas cujas reações emotivas
são discordantes ou desproporcionais, fazendo com que sofram ou faça
sofrer a sociedade. Junto as neuroses, constituem os casos de
responsabilidade restrita... A efetividade modificada dos psicopatas não
permite... reconhecer a justiça da pena... julgam-se vítimas... nestes casos,
seria preciso uma pena mais severa que as normais. (I conferencia
Brasileira de criminologia, in revista de direito penal. Vol. XV, 1936, p.58
apud RAUTER, 2003, p. 48)
Outro ponto alerta para o fato de que não poderia a prisão cumprir a
53
função de reeducação, de recuperação e devolver o psicopata à sociedade com a
certeza de que ele não cometesse outro crime, posto ser o mesmo portador de um
distúrbio por muitos estudiosos considerado incurável. Ou seja, seria inadequado à
recuperação e ressocialização do semi-imputável portador de personalidade anormal
através da pena privativa de liberdade.
Inquestionável, por outro lado, é o pensamento no sentido de considerar a
prisão como fator criminógeno, como bem leciona Piedade Júnior (1982, p. 57). Isto
ocorre porque contribui o cárcere para a formação do tipo perigoso e a conseqüente
reincidência. Evidencia-se, segundo este autor, que há a deformação psicológica,
pois sente o encarcerado a falta de liberdade na forma e na extensão de como a
pena é aplicada e despertando neles reações indevidas.
Se ao individuo normal, a pena privativa de liberdade, já se reconheceu
nociva e contra prudente e até considerada “fator criminógeno por
excelência”, como considerá-la admissível àquele indivíduo, cuja perícia
psiquiátrica reconhece, por vezes, não possuir “a necessária capacidade
de inibição ou autodeterminação” ou que volta a “repetir os mesmos delitos,
as mesmas faltas, porque a isso o conduz a sua natureza?” (PIEDADE
JÚNIOR, 1982, p. 73)
Parafraseando Ney Fayet de Souza, entende Piedade Júnior (1982, p. 67)
que “A melhor prisão é causa de doenças e vícios; representa sistemas de fraudes e
violências; é fabrica de criminosos passionais e sexuais”. Já Lins e Silva (1991, p.
40) apud Karam (1993, pp.185-186), também entende no mesmo sentido que “Para
recuperar,
para
ressocializar,
como
sonharam
os
nossos
antepassados?
Positivamente, jamais se viu alguém sair de um cárcere melhor do que quando
entrou.”
A pena privativa ou restritiva de liberdade é medida coagente, espécie de
pena, que segundo Farias Júnior (2006, p. 366) é reclamada pelo interesse social. A
54
lei prevê dois tipos, a reclusão e a detenção e é aplicada aos delinqüentes
imputáveis e também aos semi-imputáveis.
Referente à imposição de pena privativa de liberdade aos semiimputáveis previstos no artigo 26, tem-se uma divergência jurisprudencial importante
a ser analisada. Entendimentos atribuem ser a redução da pena facultada ao Juiz,
“É facultativa e não obrigatória a redução da pena autorizada pelo art. 22, parágrafo
único do CP (atual art. 26, parágrafo único)” (TJRJ – Apelação Criminal – Relator
Raphael Cirigliano Filho – EJTRJ 7/312).
Ementa PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. INSTAURAÇÃO DE
INCIDENTE DE INSANIDADE. INDEFERIMENTO FUNDAMENTADO NO
CONJUNTO
FÁTICO-PROBATÓRIO
PRODUZIDO
NA
FASE
INSTRUTÓRIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. REDUÇÃO
FACULTATIVA DA PENA DECORRENTE DE SEMI-IMPUTABILIDADE.
ORDEM DENEGADA. 1. A existência de laudo pericial produzido em outro
processo atestando a semi-imputabilidade do agente não vincula o Juízo
processante. 2. Não caracteriza constrangimento ilegal o indeferimento do
pedido de instauração de incidente de insanidade fundamentado no
conjunto fático-probatório produzido na fase instrutória, indicando não ter a
suposta dependência química atingido a profundidade necessária para a
redução da capacidade mental do agente. 3. Ademais, conforme está
expresso no parágrafo único do art. 26 do Código Penal, a redução da pena
decorrente da semi-imputabilidade do agente é faculdade do Juízo
sentenciante. Precedente do STJ. 4. Ordem denegada. (STJ - HABEAS
CORPUS: HC nº 44831, SP 2005/0096695-8)
Outros, entretanto, atribuem a sua obrigatoriedade. “Forte corrente
jurisprudencial inclina-se no sentido de que, uma vez comprovada a semiimputabilidade, a redução da pena se torna indeclinável. Uma faculdade-dever,
como é de vezo expressar-se” (TJSP – Apelação Criminal – Relator Camargo
Sampaio – RT 514/313).
Observa-se também em uma decisão de Habeas Corpus do tribunal de
justiça de São Paulo que a diminuição da pena é obrigatória uma vez reconhecida a
semi-imputabilidade do réu. “Ementa: PENA - SEMI-IMPUTABILIDADE - CAUSA DE
55
DIMINUIÇÃO OBRIGATÓRIA -INOBSERVÂNCIA PELA R. SENTENÇA DE
PRIMEIRO GRAU -ART. 26, PARÁGRAFO ÚNICO DO CP”
(STJ - HABEAS
CORPUS: HC nº 19916 SP 2001/0194893-7).
3.3.2 Medida de Segurança
Aos portadores de sofrimento psíquico que praticam ilícitos penais sem
discernimento sobre o ato praticado caberá em lugar de pena, medida de segurança
na modalidade de internação ou tratamento (FIORELLI E MANGINI, 2010, p.113).
Analisa Bruno de Morais Ribeiro, sobre a evolução histórica da situação dos
delinqüentes mentalmente doentes no Código Criminal brasileiro:
No Brasil, o código criminal do Império dispunha que os loucos que
houvessem “cometido crimes” haveriam de ser recolhidos às casas a eles
destinadas, ou então entregues às respectivas famílias; já no código de
1940, anteriormente à reforma de 1984, estipulava um sistema muito
semelhante ao do código italiano de 1930 prevendo a possibilidade de
verificação pessoal da periculosidade do réu pelo juiz. (RIBEIRO, 1998, p.
12)
Esta opção por medida de segurança só poderá ser feita, se o laudo de
insanidade mental indicá-la como recomendável. Tem a medida de segurança
natureza preventiva e baseia-se na periculosidade do sujeito (FIORELLI E MANGINI,
2010, p. 114). Ou seja, uma medida que impede a pessoa perigosa de prejudicar ou
prejudicar mais e que cessa apenas quando desaparece o juízo de periculosidade.
O Código Penal brasileiro prevê duas espécies de medida de segurança,
ambas com prazo de duração indeterminado, perdurando enquanto não cessar a
56
periculosidade, a Internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico e a
sujeição a tratamento ambulatorial.
A Internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico, medida
preventiva, é o primeiro caso, previsto Código Penal em seu artigo 97, caput, em
caso de o agente ser inimputável e o juiz determinar sua internação; e em seu artigo
98 aplicada aos semi-imputáveis, cuja pena é for de reclusão. Já a sujeição a
tratamento ambulatorial, medida restritiva, esta prevista no artigo 97, caput, aplicada
aos inimputáveis cuja pena for de detenção e seguindo as regras do parágrafo 1º do
mesmo artigo.
A substituição da pena diminuída imposta pelo artigo 26 do Código Penal
pela Medida de segurança tem fulcro no artigo 98 supracitado do Código Penal e
conforme o entendimento de Nucci (2008, p. 293) “caso a perturbação da saúde
mental seja intensa o suficiente, de modo a justificar um especial tratamento
curativo.”
É importante observar que a medida de segurança substitutiva da pena
privativa de liberdade não pode ultrapassar o lapso temporal determinado para
cumprimento da sanção corporal, segundo decisão do Supremo Tribunal Federal.
Publicada no Informativo nº. 441 do STJ, esta decisão determina que “Com o início
do cumprimento da medida de segurança, há a interrupção do prazo prescricional. E
o tempo de duração dela, conforme precedente, não deve ultrapassar o limite
máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado.” (HC 143.315-RS, Rel.
Min. Og. Fernandes, julgado em 5/8/2010).
Sabe-se que o tempo da pena privativa de liberdade esta prevista no
artigo 75 Código Penal que estabelece “O tempo de cumprimento das penas
privativas de liberdade não pode ser superior a 30 (trinta) anos”. Com fundamento
57
no principio da humanização das sanções e da dignidade da pessoa humana, o STF
também se posiciona não tolerando que a medida de segurança ultrapasse esse
tempo da pena. (SILVA, 2008).
DECISÃO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E PENAL.
MEDIDA DE SEGURANÇA. NATUREZA PUNITIVA. DURAÇÃO MÁXIMA
DE 30 ANOS. VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL ÀS PENAS PERPÉTUAS.
JULGADO RECORRIDO EM DESARMONIA COM A JURISPRUDÊNCIA
DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RECURSO PROVIDO. (Supremo
Tribunal Federal, RE / 628646 - RECURSO EXTRAORDINÁRIO, Relator
Min. Cármen Lúcia)
No entanto, nem mesmo o STJ é pacífico nesse entendimento, havendo
decisões favoráveis a indeterminação do prazo de cumprimento da medida de
segurança. O parágrafo 1º do artigo 97 do Código Penal prevê que o tempo para a
internação ou tratamento ambulatorial é indeterminado, devendo ser mantida a
medida de segurança enquanto não for constatado o desaparecimento da
periculosidade. “Esta Corte Superior firmou entendimento de que a medida de
segurança é aplicável ao inimputável e tem prazo indeterminado, perdurando
enquanto não for averiguada a cessação da periculosidade (Precedentes STJ).”
(Superior Tribunal de Justiça. HABEAS CORPUS nº 2008/0168087-3, Relator
Ministro JORGE MUSSI, Data do Julgamento 17/06/2010).
Segundo o artigo 682 do Código de Processo Penal, o sentenciado que
ainda apresentar doença mental, diagnosticada através de perícia médica, deverá
ser internado em manicômio judiciário; em caso de urgência, em face também da
perícia médica, o juiz ratificará ou revogará a medida. Poderá ainda, ser
determinada a internação pelo juízo cível, com fulcro no parágrafo 2º deste artigo, o
qual estabelece que o indivíduo poderá ter um destino aconselhado pela sua
58
enfermidade, feita a devida comunicação ao juiz de incapazes.
Nesse caso ou ele volta à sociedade sob a responsabilidade da família,
ou continua em Hospital Psiquiátrico para continuar o tratamento cabível. Mesmo
saindo e ficando sob responsabilidade da família, os indivíduos necessitarão de
ajuda e acompanhamento, por isso atualmente já existe o Programa de Prestação
Continuada e uma bolsa assistencial de R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais),
segundo afirmou, em palestra, o diretor do Hospital de Custódia do estado de
Sergipe, Thiago Rodrigues.
Segundo Rauter (2003, p. 71), a medida de segurança incorpora ao
direito penal um critério de julgamento relativo à personalidade do criminoso e ao
seu tipo de anormalidade, a sua periculosidade, e não mais o julgamento do delito
praticado. A periculosidade trata-se de um estado subjetivo, mais ou menos
duradouro, de anti-sociabilidade ou, se funda no perigo da reincidência para a
prática de um crime.
A periculosidade, no entanto, é característica bastante controvérsia nos
meios jurídicos, médicos e psicológicos. Esta deverá ser interpretada não só com
relação ao sujeito, mas também o contexto em que vive (FIORELLI; MANGINI, 2010,
p. 114). Há a periculosidade presumida, nas condições do artigo 26 e 97 do Código
Penal e nesse caso, a medida de segurança é obrigatória; e a periculosidade real,
também dita judicial, quando se tratar de agente semi-imputável, previsto no
parágrafo único do artigo 26.
Segundo Damásio (2009, p. 543), “Cuida-se de periculosidade presumida
nos casos em que a lei a presume, independentemente de periculosidade real do
sujeito” e “Fala-se em periculosidade real quando ela deve ser verificada pelo juiz.”
Esta, não presumida por lei, baseia-se na personalidade e antecedentes que
59
supostamente levarão o indivíduo a delinqüir.
A periculosidade constituía assim, nessa nova concepção, o critério básico
para a adaptação legal, judicial e executiva da sanção penal à pessoa do
delinqüente. Cabe frisar ainda que, ao lado do conceito de periculosidade,
idéia de “responsabilidade social”, por meio da qual se contestava o livrearbítrio como fundamento da imputabilidade, também representava um
marco dentro da concepção de Direito Penal defendida pelos adeptos do
positivismo criminológico. (RIBEIRO, 1998, p. 16-17)
Ao não considerar a personalidade psicopática como um “fenômeno
mórbido”, Kurt Schneider, como preceitua Fiorelli e Mangini (2010, p. 115), remeteu
este individuo ao campo não-psiquiátrico; ele seria considerado anormal, mas nãodoente. Além disso, mudam dificilmente seu comportamento por influências externas
e segundo Schneider é considerado transtorno incurável em sua maioria (FIORELLI;
MANGINI, 2010, p. 118).
Seguindo este raciocínio, também não seria justificável a aplicação da
medida de segurança para os portadores de personalidade psicopática, embora
psiquiatras entendam ser necessário o tratamento destes indivíduos em hospitais.
Não há tratamento para tal anomalia, posto ser incurável e, além disso, não constitui
uma doença. No entanto, muitos são submetidos a este tipo de sanção por tratar-se
de delinqüentes de altíssima periculosidade.
3.3.3 Castração Química
Em países como Estados Unidos, Dinamarca Suécia, Alemanha,
República Tcheca, a Castração Química é um tratamento utilizado como modalidade
60
de pena aplicável aos crimes sexuais, muitas vezes os cometidos em série.
Segundo BANHA (2008), em seu artigo publicado na revista Âmbito Jurídico em
artigo intitulado como “A resposta do Estado aos crimes cometidos por psicopatas” a
castração química consiste na aplicação de hormônios femininos com a finalidade
de diminuir o nível de testosterona nos testículos, o que resultará na diminuição
drástica da libido sexual, da ereção masculina e também da agressividade.
Uma nova linha de realização da Castração Química surgiu na França,
pensada por seu atual presidente, onde para a realização desta, haveria um
centro de acompanhamento médico-psicológico para os apenados, local
este em que receberiam todo apoio necessário, e passariam por avaliações
constantes. Outro ponto fundamental trazido pelo projeto do presidente
Nicholas Sarkozy advém do fato de que esse método seria utilizado apenas
para os reincidentes em crimes sexuais graves, que cumprissem uma parte
de sua pena, e que posteriormente optassem por ser submetidos
voluntariamente ao tratamento. (BANHA, 2008)
Conforme consta ainda no artigo, o Brasil não é adepto a este tratamento,
porém, vale salientar que há dois projetos de lei em trâmite, sendo um da Câmara
dos Deputados, sob o número 7.021/02 e outro do Senado, sob o número 552/07
para que o país possa aderir a esta forma de punição. Há críticas, no entanto, a
estes projetos de lei com fulcro nos direitos e garantias fundamentais, como no caso
do art. 5º incisos III, XLVII e LVIII; além de fundamentar-se na violação dos
princípios da Dignidade da Pessoa Humana, Direito a Saúde, Incapacitação do
Ofensor, Primazia da Constituição. (BANHA, 2008)
Segundo o psiquiatra Lúcio Malagoni em entrevista ao jornal O popular
(2010), a Castração química involuntária poderá ser realizada no Brasil somente se
por ato de vontade do indivíduo portador da anomalia que pretende evitar-se. É
difícil o portador de transtorno de personalidade anti-social, por sua própria vontade,
aderir a este tratamento, posto que, o mesmo nunca pretende mudar o seu
61
comportamento.
3.4 Casos Concretos de Psicopatas no Brasil
Dentre os maiores criminosos da história do país estão dois indivíduos
portadores de psicopatia popularmente conhecidos como Chico Picadinho e
Maníaco do Parque. Estes assombraram durante anos a população brasileira com
seus crimes cruéis, perversos e que atingiram vítimas inocentes das quais eles se
aproximavam com a melhor das intenções.
Francisco da Costa Rocha, conhecido como “Chico Picadinho” foi
condenado pela primeira vez a trinta anos de prisão preventiva por assassinato e
esquartejamento de uma mulher, em 1966. Após dez anos, tendo cumprido um terço
de sua pena foi solto e retornou a delinqüir; o mesmo assassinou e esquartejou
outra mulher da mesma forma que a primeira. (WAGNER, 2007)
Chico Picadinho foi condenado e preso mais uma vez, mas ao contrário
da primeira não foi solto quando finda sua pena, e sim internado na Casa de
Custódia e Tratamento de Taubaté em São Paulo. Isto porque foi detectado que ele
possuía um desvio de personalidade ou psicopatia e não mais poderia retornar ao
convívio social sem que voltasse a delinqüir. (WAGNER, 2007).
O psicopata em questão trata-se de um homem educado, inteligente, QI
acima da média, conhecedor de grandes filósofos e bons livros e não consegue
controlar seu instinto assassino. A escritora do primeiro livro sobre Serial Killers
brasileiros, Ilana Casoy, realizou uma entrevista com o mesmo e concluiu que “Chico
62
Picadinho é extremamente culto, sedutor. Ele discutiu comigo Crime e Castigo, do
Dostoievski, fala de Hermann Hesse e termina a entrevista citando Sartre”. Durante
esta mesma entrevista, ele confessou ter tentado estrangular outras várias mulheres
e que comete os crimes pelas suas vítimas, pois é o melhor que pode fazer por elas.
(CARDOSO, 2004).
Francisco de Assis Pereira, o “Maníaco do Parque” é outro grande
criminoso portador de psicopatia. Conforme afirma Wagner (2007), ele foi
condenado pelo assassinato de cerca de onze mulheres de forma fria e cruel. Ele
atraía suas vítimas pela vaidade, as quais ele enganava com uma proposta de
realizar sessão fotográfica em um Parque na zona sul da capital de São Paulo; no
parque ele tentava estuprá-las e as matava.
O Maníaco do parque preso em 04 de agosto de 1998 confessou seus
crimes e sempre alegava que estaria sob possessão demoníaca quando na prática
dos crimes. Mas, mesmo tendo sido internado por algum tempo na Casa de
Tratamento e Custódia de Taubaté em São Paulo, o Ministério Publico nunca
duvidou da sua sanidade mental. O mesmo passou por Instauração de Incidente de
Insanidade Mental e foi condenado por júri popular a 271 anos por nove homicídios.
A pena deste psicopata esta sendo cumprida em penitenciária comum o
que representa uma questão preocupante. Isto devido a sua personalidade
perturbada, sua conturbada história pregressa desde criança quando fora seduzido
por uma tia e a mesma o obrigou a morder seus seios, por exemplo. (WAGNER,
2007).
Isto posto, conclui-se que o portador de personalidade psicopática poderá
ser considerado semi-imputável ou inimputável, cumprirá sua pena reduzida em
prisão preventiva ou medida de segurança, a depender das circunstancias que
63
envolvem o crime, sua anomalia, o nível da capacidade de entendimento e a sua
periculosidade.
Entretanto, válido salientar que a proporção de psicopatas criminosos é
muito pequena. Segundo o psiquiatra forense Talvane de Moraes, "No Rio de
Janeiro, o sistema penitenciário tem cerca de treze mil presos. Nos hospitais de
custódia ou manicômios judiciários, os criminosos não chegam a 600. A mesma
proporção vale para o resto do Brasil" (Revista Psique, 2007).
64
4 O PSICOPATA E O DELINQUENTE COMUM
4.1 O Delinqüente como objeto de Estudo da criminologia
A criminologia é uma ciência que se originou em meados da segunda
metade do século XIX, tendo como marco principal a publicação da obra, em 1871,
L„Uomo delinqüente (RAUTER, 2003, p. 30). Na lição de Fernandes e Fernandes
(1995, p.25) estuda, pois, a Criminologia, o fenômeno criminal, a pessoa da vítima, a
pessoa e a conduta do delinqüente, os fatores endógenos e exógenos, que isolada
ou cumulativamente o influenciaram e os meios responsáveis pela sua reintegração
a sociedade.
Os elementos da criminologia são desta forma, a pessoa do infrator, a
vítima e as instituições de exclusão que atuam no processo de controle social do
comportamento delitivo (FIORELLI; MANGINI, 2010, p. 323). O crime é um
fenômeno social dito inerente a própria história do homem e por isso não há que se
analisá-lo ou analisar a pena se não levar-se em consideração o criminoso, em seu
aspecto biosociopsicológico.
Por este motivo, como aduz Molina e Gomes (2008, p. 251), a
criminologia se ocupa da pessoa do infrator, seja ela portadora de uma anomalia
psíquica ou não. E para que este seja devidamente estudado é importante auferir a
natureza de sua personalidade e os fatores criminógenos que a modificam. Carvalho
(1973, p. 12) entende que o homem é o agente do ato anti-social, mas várias
65
causas, muitas ainda desconhecidas, modificarão seu caráter essencialmente
humano ou antropológico.
4.1.1 Evolução Histórica
Seguindo os pressupostos da Escola Clássica o delinqüente era
entendido como um componente indistinto na sociedade, na lição de Farias Júnior
(2006, p. 31), igual a qualquer ser humano, não havendo que se falar em diferença
de caráter. Conforme as concepções mágicas e primitivas, o delinqüente era
considerado um sujeito “endemoniado”, um ser anormal e maldito. Seria, pois,
dotado de livre arbítrio e não havia que se cogitar das causas ou fatores
criminógenos ou de influxos exógenos ou endógenos influenciadores do seu
comportamento criminoso.
Procurou Carrara encontrar a fórmula de uma verdade fundamental, mas a
personalidade do delinqüente não foi objeto direto de suas preocupações e
de seus seguidores. Julgam o delito como um simples episódio na vida de
seu autor, não havendo razão para o estudo de sua personalidade.
(COSTA, 1982, p. 208)
A criminologia apresentou quatro períodos durante a sua evolução. No
primeiro, o período da Antiguidade aos precursores da Antropologia Criminal,
possuindo como suporte a Escola Clássica, destacou-se o estudo de Aristóteles
referente ao caráter dos delinqüentes; o mesmo observou as atenuantes para
reincidência criminal concluindo que “as paixões humanas eram mais importantes
que as razões econômicas na etiologia delinquencial” (FERNANDES; FERNANDES,
66
1995, p. 57).
O segundo período, Antropológico-criminal, foi fundado pelo italiano
Cesare Lombroso, que conferiu caracteres morfológicos ao homem delinqüente,
conforme aduzem Fernandes e Fernandes (1995, p. 73). Ainda segundo estes
autores, Lombroso entendia que o verdadeiro criminoso é nato, ou seja, nasce como
tal; e somente a partir de motivos e oportunidades sociais que este criminoso era
capaz de manifestar sua disposição criminosa.
Ao identificar estigmas particulares em autores de atos anti-sociais,
Lombroso teria de ser levado a admitir que, em um dado individuo, esses
estigmas se poderiam caracterizar de tal forma que o delinqüente já teria
nascido com eles e seria, então, o criminoso nato. (CARVALHO, p. 68)
Segundo Rauter (2003, p. 32), Lombroso estabelecia características
físicas como a cor negra dos cabelos, insensibilidade a dor, entre outras, para
determinar a anormalidade do criminoso. Entretanto, a tendência lombrosiana de
considerar a criminologia uma ciência fundamentalmente antropológica era
defeituosa. Defende Carvalho (1973, p. 12) que “não será a criminologia uma ciência
exclusivamente da pessoa humana”; segundo este doutrinador fatores que
ultrapassam os limites da antropologia influenciam o homem a praticar ações
criminosas.
O terceiro período da criminologia, sociológico-criminal, combate a teoria
Lombrosiana sustentando que os fatores exógenos e não os endógenos eram os
causadores da criminalidade. Como ensinam Fernandes e Fernandes (1995, p. 49),
“Desta ou daquela maneira, é incontestável que o crime emana, primordialmente, de
fatores sociais e, como tal, adquire a imagem de uma fenomenologia individual e
coletiva”. No quarto período, da política criminal, ainda segundo estes autores, é que
67
se buscou estabelecer um consenso entre as correntes anteriores que eram
divergentes, atribuindo importância tanto dos fatores endógenos, como dos
exógenos na formação do caráter criminoso.
Estes três últimos períodos, no entanto, foram influenciados pela Escola
Positiva que entendia que há variedades de tipologias de delinqüentes e que estes
são diversificados por seus estados psíquicos e biológicos e considerados anormais.
O homem para esta escola é voltado ao crime, impelido por fatores geradores do
comportamento criminoso, não tem vontade e a inteligência livres ou autônomas
para escolher entre o bem e o mal. São influenciados por fatores internos ou
externos que determinam o crime. (FARIAS JÚNIOR, 2006, p. 31)
O positivismo criminológico foi o responsável pela substituição da teoria
da “loucura mental” pela da “personalidade criminal”. O êxito desta teoria reside na
coerência de dois de seus postulados: o princípio da diversidade do delinqüente,
posto ser este distinto, sob o ponto de vista qualitativo, do homem normal que
cumpre as leis; e a necessidade de isolar, mensurar e quantificar os fatores
patológicos que incidem no indivíduo e que determinam o delito (MOLINA; GOMES,
2008, p. 252).
Válido ressaltar sobre a fase de Pinel que abordou a mente humana e os
conhecimentos da índole psicológica e psiquiátrica, muito diferente do determinismo
biológico estabelecido pela Escola Lombrosiana (CARVALHO, 1973, pp. 73-75).
Sabe-se que os psicanalistas, por exemplo, incluíram no estudo sobre o homem
delinqüente, seguindo este entendimento, a incapacidade para a formação do
superego ou o defeito neste, além do reconhecimento de uma constituição perversa.
Seguindo o entendimento da Escola positiva, observam-se duas ordens
de fatores criminógenos, os externos ou exógenos como os sócio-econômicos,
68
sócio-ambientais e os internos ou endógenos. A partir do século XVIII, passou-se a
desenvolver estudos sobre estes fatores internos, através da Frenelogia,
relacionando sintomas da personalidade. Destes estudos, segundo Farias Júnior
(2006, p.29) que surgiram as noções de criminosos por ímpeto, loucura moral, entre
outras.
Já vimos que Ferri apresenta os fatores criminógenos em três categorias:
Antropológicos, Físicos e Sociais. Os Antropológicos são biológicos ou
inerentes à personalidade da pessoa do criminoso, e dividem-se em três
subclasses: A Constituição Orgânica do Criminoso; Sua Constituição
Psíquica e seus Caracteres Pessoais. (FARIAS JÚNIOR, 2006, p. 57)
Do ponto de vista biológico, salienta também este autor, os fatores de
ordem interna ou endógenos, chamados de mesoendógenos, os quais geram
anomalias como psicopatias ou neuroses, em que seus portadores estão incidentes
no crime.
4.1.2 O Comportamento delitivo do delinqüente
Há uma classificação proposta pelo professor Hilário Veiga de Carvalho,
que segundo Fiorelli e Mangini (2010, p. 324) associa-se a origem do
comportamento criminoso às forças do meio e intrapsíquicas. Desta forma, tem-se o
mesocriminoso,
o
mesocriminoso
preponderante,
o
mesobiocriminoso,
o
biocriminoso preponderante e o biocriminoso puro.
O mesocriminoso possui atuação anti-social oriunda de forças do meio
exterior como se o individuo fosse mero agente passivo, falta-lhe o animus
69
delinquendi. O mesocriminoso preponderante possui predominância de influências
ambientais, sua correção é esperada e sua reincidência é excepcional. O
mesobiocriminoso possui influências tanto ambientais como biológicas, sua correção
é dita possível e sua reincidência dita ocasional. (FIORELLI; MANGINI, 2010, pp.
324-325).
Já o biocriminoso preponderante, ainda segundo estes autores, é
considerado como portador de alguma anomalia biológica insuficiente para
influenciá-lo à prática do crime, mas que o torna vulnerável a uma situação exterior;
este possui difícil correção e sua reincidência é potencial. O biocriminoso puro
possui influencia de incitações endógenas, como ocorre em algumas perturbações
mentais; este, portanto, possui ausência de imputação penal.
Com relação aos elementos sociais que influenciam o comportamento
delitivo, os mais comuns podem ser a identificação com modelos ou pessoas
significativas,
influencia
de
um
grupo
condicionamento
que
reflete
um
comportamento estereotipado inadequado. Além de emoções extremas que geram
descontrole e foge do seu domínio inconsciente ou a influência de valores, crenças,
como leciona Fiorelli e Mangini (2010, p. 325).
Atribui-se a prática criminosa também a um transtorno mental ou a uma
doença mental, a delinqüência psicótica ou a delinqüência neurótica, por exemplo.
Diversas
psicopatologias
poderão,
portanto,
conduzir um
indivíduo
a
um
comportamento delitivo; aquelas deverão ser diagnosticadas por especialistas e
deverão estar inerentes ao delinqüente a época da prática delituosa (FIORELLI;
MANGINI, 2010, pp. 338-339)
Ademais, segundo Carvalho, há outras formas de classificar o delinqüente
portador do comportamento delitivo. Parmelee, por exemplo, dividiu os criminosos
70
em dementes ou débeis mentais, psicopáticos, profissionais, ocasionais, evolutivos
(CARVALHO, 1996, p. 111). Outra classificação proposta por Ottolenghi separa os
criminosos em normais ocasionais e anormais; estes podendo ser permanentes
congênitos,
permanentes
adquiridos,
ocasionais
habituados
ao
delito
ou
temporários.
Conclui-se, por fim, que há uma diversidade de tipos de delinqüentes,
mas que principalmente, existem aqueles portadores de alguma doença mental ou
transtorno mental e neste insere-se o portador de psicopatia; como também, existem
aqueles delinqüentes comuns, que não possuem nenhuma anomalia inerente a
função psíquica.
4.2 A Importância do Exame Criminológico
O Exame criminológico compreende um estudo multidisciplinar da
personalidade do delinqüente com base em disciplinas da criminologia clínica,
conforme alude Albergaria (1996, p. 273). Além disto, aufere a capacidade do
indivíduo para o delito, a medida de sua periculosidade, sua sensibilidade à pena e
respectiva probabilidade de correção. Fernandes e Fernandes (1995, p. 22) referese a necessidade de realização de um exame morfológico, funcional, psicológico,
psiquiátrico, moral, social e histórico para o conhecimento da personalidade.
A natureza médica do Exame pericial tem por finalidade avaliar as
condições de imputabilidade do agente, já para o de natureza psicólogica, apurar as
condições das capacidades psicológicas de entendimento e de autodeterminação.
71
Caberá ainda a psicologia forense determinar as condições de periculosidade,
através do exame de cessão de periculosidade. (CAIRES, 2003, pp. 122-123)
O diagnostico tanto das constituições psicopáticas como dos não
psicopatas, desta maneira, dar-se-á através de um estudo completo do paciente, o
qual poderá ser classificado. Do ponto de vista criminológico, saber-se-á, então, por
exemplo, se existe ou não a possibilidade de existir convívio entre eles, quais as
implicações que isto implicará se ocorrer ou se necessitam de tratamentos diferentes
segundo suas características individuais.
4.2.1 O Estudo da Personalidade do Delinqüente
Em princípio, considera-se que todos os atos são regidos pela vontade do
indivíduo integrados à sua personalidade (EÇA, 2002, p. 89). Desde longínquos
tempos os teóricos e os práticos do direito começaram a levar em consideração não
apenas o crime em si, o dano ou perigo, mas também a personalidade do criminoso,
segundo afirma Oliveira (1987, p. 40).
No fim do período republicano de Roma, por exemplo, passa-se a
distinguir a culpa objetiva, resultante de mera imputação física do fato ao agente, da
culpa subjetiva, que exigia uma imputação física psíquica e que levavam em conta
as causas pessoais de exclusão da culpa. É importante, portanto, o estudo da
personalidade, pois sem o conhecimento da personalidade do delinqüente, o direito
penal jamais determinará com justa coerência o grau de imputabilidade. (OLIVEIRA,
1987, p. 143).
72
O autor do crime é o protagonista na justiça penal prática e é também a ele
que de modo indireto e genérico se dirige a ameaça legal e, de modo direto
e concreto, a sua aplicação com a sentença, torna-se evidente que a
avaliação jurídica do crime e dos motivos determinantes se desenvolve se
completa e se caracteriza na personalidade do delinqüente. (FERRI, 1931,
p. 313 apud COSTA, 1997, p. 59).
Ademais, o estudo da personalidade da pessoa do infrator também é
importante para que a ele possa ser dado o suporte necessário para sua reabilitação
e principalmente, impedir que esta personalidade seja corrompida ou deteriorada ao
invés de melhorada de acordo com o senso comum. Na lição de Molina e Gomes
(2008, p. 253), o direito penal, entretanto, apresenta uma imagem bastante escassa
da psique humana e desta forma, pouco poderá contribuir.
Do ponto de vista psicopatológico não se devem esquecer algumas
funções psíquicas e dimensões bastante complexas do íntimo psíquico humano e
que são de complexo entendimento, mas que merecem atenção redobrada.
Segundo Molina e Gomes (2008, p. 254), os Oligofrênicos e os Psicopatas são, por
exemplo, grupos que se enquadram neste contexto e com freqüência estão em
conflito com o ordenamento penal.
O estudo da personalidade é importante também, como bem ensina
Costa (1997, pp. 27-29), tanto para o estudo dos fatores que determinam a
periculosidade social do réu como para a aplicação e individualização da pena.
Costa (1997, p. 62) salienta ainda, que a personalidade humana também é fator
preponderante para a fixação do regime prisional.
A periculosidade do autor do fato típico fica ao arbítrio do juiz, mas a
investigação consiste em um exame da sua personalidade, sem esquecer todos os
fatores, principalmente os exógenos. Deste mesmo modo, a aplicação e
individualização da pena não mais supõem apenas a averiguação da culpa do autor.
73
Leciona Costa (1997, p. 52) que no tocante a individualização da pena e do regime
prisional é necessária estar presente, essencialmente, a investigação sobre o tipo
criminológico do autor do fato punível.
No tocante à análise de fatores psicológicos do ato delitivo, observa-se
que o ato exige duas situações, as condições solicitadoras e a condição de
personalidade do agente. Já com relação
a dinâmica psicológica do criminoso
identificam-se fatores individuais e sociais que juntos passam por uma “triagem
psíquica”, a qual será responsável ou não pela prática do ato. (FERNANDES;
FERNANDES, 1995, p. 290)
A personalidade cujo processo de formação se inicia desde a mais tenra
infância, tem a estruturá-la, fatores constitucionais e evolutivos de natureza,
indubitavelmente polimorfa: uns são biológicos, outros psicológicos, e
alguns sociais; fatores esses, que por participarem numa primeira fase da
estruturação da personalidade são chamados de primários. (FERNANDES
E FERNANDES, 1995, p. 291)
Salienta Fernandes e Fernandes (1995, p. 292) que a personalidade
influencia quando for mórbida na prática de um ato delituoso, o qual será
denominado sintomático, fruto da perturbação. Também influenciará quando a
personalidade for defeituosa, fruto da má formação, como é o caso das
personalidades psicopáticas, o que poderá originar um ato delituoso como
expressão do caráter.
Relevante o que frisa Costa (1982, p. 404) sobre o delito do ponto de
vista psicanalítico, o qual supõe que a parte ancestral da personalidade anímica
passou por um fenômeno de inadaptação social. Desta forma, observa este autor
que, assim como as circunstancias do crime e a sua gravidade, os motivos
determinantes da conduta do autor, ao lado das condições pessoais e sociais devem
74
ser analisados. (COSTA, 1997, p. 314).
O Exame de personalidade é gênero da espécie Exame criminológico e
representa um exame médico-psicológico-social com a finalidade de auferir a maior
quantidade de dados possíveis sobre a pessoa do delinqüente (MIRABETE, 2008, p.
51). Ademais, na lição de Mirabete, segundo as diretrizes traçadas pelo ciclo de
estudos europeus sobre este exame organizado pela ONU, em Bruxelas, em 1951, o
mesmo deverá conter um exame biológico, um psicológico, um psiquiátrico e um
social.
O exame biológico será físico em geral, como o exame físico
complementar feito por um neurologista, o de patologia, o eletroencefalográfico. O
exame psicológico permitirá medir as faculdades, as aptidões e realizações mentais
e descrever as características da personalidade do individuo.
Já o exame
psiquiátrico tem por fim aclarar os matizes da personalidade e do comportamento do
mesmo. E por fim, o exame social, realizado por um assistente social, que buscará
informações sobre a vida social do individuo, participar de sua integração e contribuir
para o seu tratamento (MIRABETE, 2008, p. 52).
Importante salientar que o exame de personalidade e o exame de
antecedentes deverão ser obrigatórios para todos condenados a pena privativa de
liberdade. E destinar-se-á a classificação, necessária para manter o controle dos
diferentes tipos de personalidade inseridos nos estabelecimentos penitenciários;
além de determinar do tratamento penitenciário a ser seguido. Poderão ocorrer
novas avaliações no decorrer da execução da pena posto não ser a personalidade
um instituto permanente e constante.
75
4.2.2 Principais Aspectos do Exame Criminológico
Historicamente a necessidade da organização de um exame médicopsicológico-social dos delinqüentes foi delineada pela primeira vez por Lombroso em
1890, como afirma Costa (1997, p. 87). O exame criminológico, segundo este autor,
constitui o princípio básico da criminologia clínica e os métodos utilizados para
constituição do mesmo variam não somente segundo a sua natureza médica,
psiquiátrica, psicológica ou social, mas também pelo grau de profundidade que
consigam prever (COSTA, 1997, p. 89).
O juiz penal da cognição passará a ter por obrigação, na função judicante, a
investigação da constituição biológica do autor do fato típico, suas reações
psicológicas e seu condicionamento social, os quais só poderão abortar
através do exame criminológico, que proporcionará a aplicação de medidas
concernentes à sua personalidade, resguardando-se o princípio da
legalidade e da dignidade da pessoa humana. (COSTA, 1997, p. 9)
Na lição de Albergaria (1996, p. 273), o Exame criminológico, portanto,
compreende um estudo multidisciplinar da personalidade do delinqüente, com base
em várias disciplinas criminológicas, de que se vale a criminologia clínica. O homem
a partir do exame criminológico é estudado em todos os aspectos a fim de se
explorar sua personalidade. Salienta ainda Albergaria (1996, p.33-34), que o
resultado do diagnóstico da personalidade do criminoso determinará as conclusões
quanto à probabilidade de reincidência do indivíduo e à possibilidade de sua
reeducação.
Como leciona Farias Júnior (2006, p. 136) o exame criminológico permite
a aplicação da justiça conhecendo o homem. Sua finalidade é, portanto, resguardar
76
a defesa social além de aferir o estado de temibilidade do delinqüente, questões
referentes à sua conduta antijurídica, anti-social e seu possível retorno à sociedade.
O exame criminológico constitui a base do tratamento reeducativo e ensina
Albergaria (1996, p. 273) que o Código Penal, o prevê com a denominação de
“exame criminológico de classificação”.
O objetivo do exame criminológico é coligir junto à personalidade do
delinqüente e seu mundo circundante tudo o que for necessário à
programação de sua reeducação e reinserção social. Em outros termos, o
diagnóstico da personalidade do delinqüente e a prognose de sua conduta
futura destinam-se à planificação de sua ressocialização. (ALBERGARIA,
1996, p. 273)
Aduz Mirabete (2008, p. 52) que a LEP prevê o exame criminológico
obrigatoriamente para os condenados que cumprem pena privativa de liberdade em
regime fechado e, facultativamente para os que cumprem em regime semi-aberto.
“As regras mínimas prevêem o exame criminológico para o regime aberto.
Igualmente, pode o regime em meio livre ser precedido do exame da personalidade
do delinqüente.” (ALBERGARIA, 1996, p. 273)
No tocante a este momento da realização do exame criminológico, há
certa divergência posto que a lei apenas prevê sua realização para os indivíduos já
condenados. E contrário a este entendimento da legislação pátria o doutrinador
Everardo da Cunha Luna, citado por Mirabete (2008, p. 53) entende haver
necessidade de um exame antecedente a aplicação da pena ou da medida de
segurança, com o fim de verificação da personalidade e periculosidade do individuo.
O exame criminológico tem por objetivo, ainda segundo Mirabete a
adequada classificação do condenado e a individualização da execução. A avaliação
criminológica é elemento instituído pela Lei de Execução Penal, LEP, para
77
individualização administrativa da pena após a individualização judicial que se dá
com a aplicação da sanção pelo juiz. (GONÇALVES; BRANDÃO, 2005, p. 141). O
artigo 5º da LEP, portanto, prevê que os condenados serão classificados, segundo
os seus antecedentes e levando em consideração a sua personalidade, para a
individualização da execução penal.
Pode ser ela determinada no plano legislativo, quando se estabelecem e
disciplinam-se as sanções cabíveis nas várias espécies delituosas
(individualização in abstracto), no plano judicial, consagrado no emprego do
prudente arbítrio e discrição do juiz, e no momento executório, processada
no período de cumprimento da pena e que abrange medidas judiciais e
administrativas, ligadas ao regime penitenciário, à suspensão da pena, ao
livramento condicional etc. (FERREIRA, pp. 13-17 apud MIRABETE, 2008,
p. 48)
Como leciona Mirabete (2008, p. 48), a individualização constitui, pois, um
postulado básico da justiça. Isto porque a execução penal não pode ser igual para
todos uma vez que nem todos os indivíduos são iguais; como nem todo encarcerado
é igual, posto que as penitenciárias abrigam todo tipo de individuo, com
personalidades diferentes. Torna-se indispensável, desta maneira, a classificação
dos condenados para que os mesmos sejam destinados aos tratamentos mais
adequados, segundo a sua situação pessoal.
O exame criminológico também se destinava a aferição de mérito, ou
seja, aptidão psicológica, para a progressão de regime. Os diferentes tipos de
regimes são responsáveis pela “valorização do processo do tratamento reeducativo
do condenado até a fase final da reinserção social. As diferentes fases do
desenvolvimento da execução penal correspondem às mobilidades do tratamento
criminológico“ (ALBERGARIA, 1996, p. 275). Estas mobilidades a que se referia o
doutrinador Albergaria são a observação, a classificação, o tratamento em meio
78
fechado, semi-aberto e em meio livre.
O dispositivo revogado da LEP, em seu artigo 112, parágrafo único,
dispunha que para a transferência progressiva do apenado para um regime menos
rigoroso fazia-se necessário por determinação do juiz, além do cumprimento de no
mínimo 1/6 da pena no regime anterior, a motivação com embasamento de um
parecer auferido por Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico,
se necessário.
Para a progressão de regime, salienta Eça (2002, p. 113), havia a
possibilidade de ser solicitado um laudo criminológico. O mesmo subscrito por vários
peritos, dois psiquiatras, um psicólogo, um assistente social, um responsável do
presídio em que se encontra e um parecer final do diretor do estabelecimento;
diferindo, pois de um laudo criminal, realizado normalmente por dois peritos, e de um
laudo civil, por apenas um.
O regime fechado é o cumprido em estabelecimento de segurança
máxima ou média se caracteriza pela vida em comum dos três grupos de
condenados, os dificilmente recuperáveis, os duvidosos e os recuperáveis. Estes, na
própria instituição serão submetidos às atividades de reeducação. Já no regime
semi-aberto a vida dos grupos e as atividades do processo de ressocialização se
desenvolvem na instituição havendo contato com o mundo exterior.
A nova letra do artigo 112 da Lei de Execução Penal não dispõe mais
sobre a atuação da CTC ou da possível necessidade de utilização do exame
criminológico para a progressão de regime seja concedida. Basta como novo
requisito a ostentação de bom comportamento carcerário do apenado.
O exame criminológico, portanto, tornou-se requisito não exigido com as
mudanças ocorridas na lei de execução penal, a partir da lei nº 10.792/2003. Esta foi
79
fundamentada em vários argumentos dentre os quais o mais importante relaciona-se
a incapacidade de desvendar mínima e rigorosamente a subjetividade do
sentenciado através dos saberes psicológicos (NETTO; FRASSETO, 2010, pp. 0708); além disso, de prever do comportamento futuro dos mesmos.
Outro argumento é que a culpabilidade tem como objeto o fato delitivo e
não o sujeito delinqüente. Por isso, no processo de execução criminal na lição de
Netto e Frasseto (2010, pp. 07-08), o que interessa não são os fatores que
contribuíram para a formação da personalidade e sua característica que integrante
ao autor, mas como o condenado cumprirá sua pena. O que é um erro absoluto.
Com efeito, estamos definitivamente convencidos de que, embora até possa
determinar a realização de exame criminológico, não é lícito ao juiz da
execução negar progressão de regime com base em informações ou
interpretações que possa extrair do laudo respectivo. É que em razão das
mudanças impostas com a lei n. 10.792/2003, o art. 112 da Lei de
Execução Penal exige apenas o cumprimento de um sexto da pena, como
requisito objetivo para progressão, e a apresentação de atestado de boa
conduta carcerária firmado pelo diretor do estabelecimento prisional, como
requisito subjetivo. É o que basta para a progressão. (MARCÃO, 2009, p.
14)
A individualização sempre privilegiou um aspecto subjetivo baseado no
exame criminológico, em que o juiz seguindo sua convicção, determinava a
elaboração de laudo criminológico, quando acreditar ser necessário, ou exigia da
Comissão Técnica de classificação um parecer específico. A aptidão subjetiva, então
é auferida agora apenas com base na comprovação do bom comportamento
carcerário, o que se constitui uma falha.
A 1ª turma do STF, conforme decisão supra, já decidiu pelo entendimento
no sentido de considerar necessária a aplicação do exame criminológico:
STF, HC 86.631/PR, 1ª T., rel. Min. Ricardo Lewandowski, j. em 5-9-2006,
80
m.v., informativo do STF, n 439 (Brasília, 4 a 8 de setembro de 2006). No
mesmo sentido: “É certo que a novel redação do art. 112 da Lei de
Execuções Penais (LEP), dada pela Lei n. 10.792/2003, não mais determina
a submissão do apenado ao exame criminológico para fins de progressão
prisional. Porém, isso não é empeço para que o juízo da execução, em
decisão fundamentada, determine sua realização se entender necessário à
formação de seu convencimento” (STJ, HC 94.426-RS, rela. Mina. Jane
Silva, Desembargadora convocada do TJMG, j. em 19-2-2008, informativo
do STJ, n. 345).
A comissão técnica de Classificação (CTC), conforme leciona Albergaria
(1996, p.269) provém historicamente dos laboratórios de antropologia criminal e
constituiu-se em uma primeira tentativa de expandir a contribuição da criminologia
penitenciária. A mesma poderá entrevistar pessoas, realizar diligências necessárias,
para obter as informações sobre a personalidade do indivíduo.
(GONÇALVES;
BRANDÃO, 2005, p. 141).
A CTC ainda possui fulcro no artigo 6º da LEP que prevê para a
classificação elaboração de um programa individualizador da pena privativa de
liberdade adequada ao condenado ou preso provisório por uma Comissão Técnica
de Classificação. É previsto, nestes termos, que a CTC além da classificação
também será responsável pela elaboração do programa individualizador da
execução da pena do preso “com vistas a sua reinserção terapêutica” (MIRABETE,
2008, p. 55)
O Código Penal ainda prevê no parágrafo único do seu artigo 83 um
Corpo Criminológico (COC) que realizará prognósticos de não-delinqüência. Como
afirma Gonçalves e Brandão (2005, p. 142), este é um dos requisitos subjetivos para
concessão do livramento condicional, a etapa na qual o condenado readquire sua
liberdade submetendo-se a um controle por parte das agências judiciais e
penitenciárias.
Para Eça (2002, p. 113), o exame de sanidade mental, ao qual são
81
submetidos todos os pacientes, deverá ter elaborada uma observação psiquiátrica,
que pode ser uma observação clinica, no caso de internados em hospitais de
custódia e tratamento. Também deverá conter o exame de sanidade mental, um
laudo de sanidade mental do indivíduo, que instrui o processo; além de um parecer
de verificações de condições mentais.
Este último, o parecer que determinará em que grau de condição mental
esta o indivíduo, é necessário apenas no caso do mesmo ser réu que eclodiu uma
doença mental enquanto cumpria pena, no caso de portadores de patologia mental
que estejam sob medida de segurança a fim de verificar a cessação de sua
periculosidade, ou ainda, no caso de réus em cumprimento de pena que pretendem
se beneficiar com a progressão de regime.
É de bastante importância, na área criminal da psiquiatria forense, além
disso, a elaboração de pareceres de verificação da cessação da periculosidade. O
parecer determinará se há a possibilidade de soltar ou não um autor de crime que
“seja possuidor de doença mental ou anormalidades que, em função delas mesmas,
poderá novamente apresentar quadro psiquiátrico que o torne perigoso para o
convívio social.” (EÇA, 2002, p. 140). Entende ainda este autor que o parecer
poderá ser criminológico ou de verificação de periculosidade propriamente dito.
Há a necessidade nestes exames, tanto de sanidade mental como no de
cessação de periculosidade de uma penetração na história prévia, no ciclo de vida,
no mapa pessoal, nas etapas de desenvolvimento do indivíduo. Isto porque o
homem “é uma resultante multifatorial” segundo Caíres (2003, p. 139) e os fatores
endógenos, exógenos, dinâmicos, os quais lhe compõe, permitem estabelecer suas
atitudes e seu desenvolvimento psicológico.
Ademais, a história prévia é composta por elementos relacionados às
82
condições de gestação, parto e desenvolvimento neuropsicomotor; à vida escolar,
suas fraquezas na aprendizagem, seu comportamento na sala de aula e no pátio,
por exemplo. Deve-se também abranger o desenvolvimento sócio-afetivo, com
relação à família e outras pessoas; o desenvolvimento afetivo-sexual. Além de
verificar como o mesmo e as outras pessoas o viam e pensavam sobre ele;
pesquisar sua vida labor ativa e também a vida médica. (Caíres, 2003, p. 138)
O exame criminológico é considerado, pois, após analisadas todas as
suas áreas de atuação, um instrumento fundamental que determina não só as
minúcias da vida anterior e as causas que originou a prática delituosa, inerente a
personalidade, a fatores externos, mas também determina seus passos e
expectativas futuras, após inserção no sistema penal.
4.3 Convívio entre Encarcerados Psicopatas e Encarcerados Comuns
Embora
o Exame Criminológico
possa oferecer um estudo
da
personalidade do delinqüente, determinar a sua classificação e instituição penal
adequada para cada caso, assim como as medidas terapêuticas para sua
reeducação, o ineficaz sistema penal brasileiro permite o convívio dentro dos
presídios
entre
encarcerados
portadores
de
personalidade
psicopática
e
encarcerados com ausência de personalidade patológica.
Não há a preocupação, segundo Morana (2010), como ocorre em países
que possuem um sistema jurídico e penal mais evoluído e efetivo que o Brasil, em
estabelecer medidas de separação dos presos de acordo com a diferenciação dos
83
perfis psicológicos. No Brasil, as penitenciárias abrigam tanto presos de menor
potencial de periculosidade como de alta periculosidade juntos, convivendo uns com
os outros.
A questão é observar que, os psicopatas influenciam os presos comuns
de forma negativa, comprometendo a sua reabilitação e dominam o ambiente
penitenciário com sua forte liderança e manipulação, podendo originar rebeliões e
facções criminosas dentro dos presídios.
4.3.1 O Comportamento do Psicopata dentro dos Presídios
É importante perceber que existem diferenças significativas entre os
presos considerados psicopatas e os presos comuns. Conforme estudos da maior
especialista brasileira em psicopatia, a doutora em psiquiatria forense Hilda Morana,
não há diferenças apenas com relação a personalidade patológica, mas
principalmente com relação a sua periculosidade, a ausência de sentimentos, a falta
de juízo de culpabilidade, características inerentes aos psicopatas e que muitas
vezes não estão presentes na índole de um encarcerado comum.
A manifestação comportamental teatral de sentimentos que os psicopatas
exibem, por exemplo, é uma das características comportamentais, que faz com eles
sejam os melhores presos, pois os permite dissimular perfeitamente um charme e
bom comportamento, manipular e intimidar as pessoas a seu favor. Afirma Ana
Beatriz Barbosa, "Normalmente, eles têm as penas atenuadas por bom
comportamento". (MORANA, 2010).
84
Isto se deve, sobretudo, como já mencionado, quando tratado das
características dos psicopatas, ao fato de que os mesmos não medem esforços para
alcançar aquilo que se quer. Como afirma novamente Ana Beatriz Barbosa, "Eles
são tão dissimulados que se comportam como cordeiros na prisão. Virou moda
forjarem uma conversão ao protestantismo." (MORANA, 2010)
A
presença
de
um
psicopata
na
prisão
não
se
passa
despercebida. Segundo afirma França (2002), os psicopatas apresentam
um perfil e um comportamento adequado para se transformarem em
chefões da penitenciária, assim como também líderes de rebeliões. A
entrada de psicopatas no sistema prisional cumulada ao convívio destes com outros
presos comuns é, portanto, uma das causas de rebeliões em presídios.
Pode-se responsabilizar o espírito de liderança, característica bastante
acentuada nos psicopatas, no tocante a transformação de presos comuns em
fantoches. Sobre um líder afirma Fiorelli e Mangini (2010, p.213), que o mesmo
obtém cooperação entre as pessoas ao criar, manter e desenvolver uma idéia aceita
por todos, promovendo a união de interesses e objetivos.
"A liderança é a
capacidade de exercer influencia sobre pessoas" (VERGARA, p. 173 apud
FIORELLI; MANGINI, 2010, p. 213).
Só que até depois de presos psicopatas causam mais dores de cabeça que
a média dos criminosos. Na cadeia, tendem a se transformar em líderes e
agir no comando de rebeliões, por exemplo. “Mas nunca aparecem. Eles
sabem como manter suas fichas limpas e acabam saindo da prisão mais
cedo”, diz Antônio de Pádua Serafim. (NARLOCH, Revista Super
Interessante, 2006)
Válido apresentar dois casos de encarcerados que se encaixam nestas
definições de liderança.
85
Iaías do Borel liderou ao lado de outros criminosos o Comando Vermelho,
era considerado o "presidente da facção" quando já se encontrava preso no presídio
Bangu 1; Isaías foi o responsável por atentados em fevereiro de 2003 no Rio de
Janeiro, quando 34 veículos foram incendiados e 16 pessoas ficaram feridas e
também
pelo assassinato da uma ex-diretora da penitenciária. (Revista Mundo
Estranho, 2006)
Já Marcola é um condenado a 44 anos de prisão preventiva por assaltos
a bancos e que se tornou líder do PCC, facção criminosa que atuava em São Paulo.
Em maio de 2006 comandou rebeliões em 82 presídios e impôs terror nas cidades
paulistas, com o assassinato de policiais e ataques a ônibus, estações de metrô e
agências bancárias; todas estas terríveis ações, vale frisa, de dentro do próprio
presídio. (Revista Mundo Estranho, 2006)
Outra característica do psicopata, que conduz a problemática em relação
ao seu convívio com presos comuns, é a periculosidade. Aduz Farias Júnior (2006,
p. 295), que a periculosidade apresenta como pressupostos a habitualidade ou
reincidência, personalidade corrompida e personalidade perversa. Estão todos estes
claramente presentes na pessoa do portador de psicopatia, demonstrando, portanto,
o quanto perigoso um psicopata pode ser.
A personalidade corrompida é reconhecida, por exemplo, ainda segundo
Farias Júnior, através dos antecedentes, da história da vida pregressa, do convívio
familiar, do local onde nasceu e onde cresceu as pessoas com as quais conviveu, a
sua insensibilidade moral, até chegar ao motivo determinante do crime ou crimes
que tenham sido praticados. Já a personalidade perversa, é revelada pela índole
torpe, malvada, impiedosa, cruel, ou desumana e inferida pelos motivos, meios ou
modos de execução do crime ou dos crimes.
86
O impreciso termo periculosidade, presente na legislação, é fonte de
controvérsias nos meios jurídicos, médicos, psicológicos. Oriundo do século
XIX, sofre mutação com o tempo e, atualmente, deve ser interpretado tendo
como ícone não apenas o sujeito, mas também o contexto em que vive,
contempladas a diversidade e a desigualdade social. (FIORELLI; MANGINI,
2010, p. 114)
Nestes termos, a periculosidade dos portadores de personalidade
psicopática é um ameaça dentro das penitenciárias, pois o mesmo poderá fazer uso
da violência tanto com um preso comum como qualquer outro funcionário do
estabelecimento. “A razão é que devido a alteração grave do caráter o sujeito
psicopata vai, através do medo, da coação e da violência dominar o ambiente
levando os outros de menor potencial agressivo a agir segundo seus ditames cruéis”
(MORANA, 2010).
As penitenciárias brasileiras, portanto, acolhem dois tipos de presos,
segundo pesquisas, sobre as quais retratou Morana (2010), os presos que são
bandidos comuns e presos psicopatas. Nestes bandidos comuns evidencia-se um
propósito para prática do crime, seja o de ambição, vingança, poder, ganho fácil; já
nos psicopatas constata-se um comportamento cruel e fortuito, uma violência
gratuita e desnecessária.
Nesse sentido, o psicopata apresenta uma característica de alto grau de
periculosidade que poderá afetar, não apenas a vida dos presos comuns, mas
também suas chances de reabilitação. Isto se deve ao fato de que o preso comum
transforma seu comportamento sob a influência do comportamento do psicopata,
podendo até ter corrompida sua personalidade.
Como ressalta ainda Morana, o preso comum perde ou diminui sua
razoável possibilidade de recuperação social, que existia antes de seu convívio com
presos psicopatas. Ao contrário, ele adquire uma habilidade maior para a prática
87
criminal, passa a trabalhar as características que os psicopatas apresentam
empatia, falta de sentimento pelos outros, crueldade, falta de sentimento de culpa,
entre outras.
Nesta linha de raciocínio afirma a psiquiatra forense Hilda Morana sobre o
comportamento prejudicial dos psicopatas dentro das penitenciárias, "Além de
recriarem o inferno na cadeia, atrapalham a ressocialização dos detentos que
podem ser recuperáveis". Hilda encarregou-se, em seu doutorado no Instituto de
Psiquiatria da Universidade de São Paulo, de traduzir e validar o método de Hare no
Brasil, que consiste em uma escala denominada PCL. R (Psychopathy Checklist
Revised), cuja autoria é de Robert D. Hare. (FRANÇA, 2002)
A etapa final deste seu trabalho inclui a aplicação do teste de Hare em
dez unidades penitenciárias do Estado. O resultado desta avaliação, segundo a
psiquiatra, será de suma importância por possibilitar que cuidados sejam
direcionados aos 80% de detentos que ficam expostos destes estabelecimentos à
perversidade e influência dos presos psicopatas. (FRANÇA, 2002)
4.3.2 O Ideário do Projeto de Lei referente aos Psicopatas
Como instrumento capaz de solucionar a problemática apresentada, há
em tramite no Congresso Nacional um Projeto de Lei de autoria do deputado Federal
Marcelo Itagiba. Mas no que diz respeito ao delinqüente portador de psicopatia,
válido afirmar que existem no Brasil dois importantes dispositivos, o Decreto nº
24.559 de 3 de julho de 1934 e a Lei nº 10.216 de 6 de abril de 2001.
88
O primeiro dispositivo dispõe sobre a assistência e proteção à pessoa e
aos bens dos psicopatas e também atribui a figura do psicopata uma questão de
ordem pública, em razão do seu potencial de periculosidade. O artigo 1º, por
exemplo, diz respeito a proporcionar aos psicopatas um tratamento e proteção legal,
dando-lhe amparo médico e social e realizando a higiene psíquica em geral e
profilaxia das psicopatias; o artigo 10, por outro lado, refere-se a internação dos
psicopatas em hospital psiquiátrico para observação, caso venha a atentar contra a
própria vida ou a de outrem, atentar contra ordem ou ofender a moral pública.
Já o segundo dispositivo dispõe sobre a proteção e os direitos das
pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em
saúde mental. Este acrescentou à política voltada ao portador de transtornos
mentais um processo de desinstitucionalização, uma política anti-manicomial, a qual
também abrange os psicopatas, aqueles que por algum motivo estão internados em
um manicômio judicial.
Tem-se em Minas Gerais, o Programa de Atenção Integral ao paciente
judiciário (PAIPJ) e em Goiás, o Programa de Atenção Integral ao louco
Infrator (PAILI), programas de atenção que prescindem de instituições
manicomiais. Eles envolvem os sujeitos em programas de atenção integral à
saúde, em que a execução da medida de segurança é condicionada a
critérios clinicos e psicossociais, em detrimento do conceito de
periculosidade. (FIORELLI; MANGINI, 2010, p. 114)
De acordo com o Diretor do Hospital de Custódia do estado de Sergipe,
Tiago Rodrigues, já ocorreram Conferências em Belo Horizonte, em 95, Porto
Alegre, em 97, Alagoas, em 99, todas em prol da luta anti-manicomial. Há um
interesse em desmistificar a idéia de que os portadores de doença mental são
mantidos em depósitos para que apenas sejam afastados do convívio social. Neste
estado, por exemplo, o projeto de ressocialização dos internos engloba parcerias
89
com a EMURB, Secretaria da Cultura, para que sejam realizados trabalhos com os
internos; há organização de gincanas dentro do estabelecimento e até de passeios
fora dele.
No entanto, foi apenas em 2004, que a psiquiatra Hilda Morana
apresentou aos deputados em Brasília a idéia capaz de solucionar um dos
problemas de maior gravidade e urgência relacionado aos psicopatas, ao qual não
se tem dado tanta atenção nos últimos anos. Esta idéia consistia em criar prisões
especiais para psicopatas, pois sempre houve a necessidade de separação dos
detentos em presídios diferenciados. (NARLOCH, Revista Super Interessante, 2006)
A idéia resultou em um Projeto de Lei - 6858/ 2010 apresentado em 24 de
fevereiro do corrente ano, por Marcelo Itagiba, deputado federal, PSDB do Rio de
Janeiro (em anexo), que prevê para o condenado ou preso provisório classificado
como psicopata o cumprimento de sua pena em seção distinta daquela reservada
aos demais presos.
Além disso, o Projeto de Lei prevê a alteração da Lei de Execuções
Penais para que seja obrigatório o exame criminológico ao condenado, quando este
entrar na prisão, para qualquer melhoria de sua pena, quando pretender passar para
um regime menos rigoroso, ou livramento condicional, indulto ou ainda comutação
de penas. Visa-se com isso, um programa de invidualização da pena privativa de
liberdade do condenado ou preso provisório classificado como psicopata, para o seu
devido restabelecimento, sem descuidar da recuperação dos demais presos.
O Exame deverá ser feito por uma comissão técnica independente da
administração prisional, uma Comissão Técnica de Classificação composta por
especialistas da saúde mental e da psicologia criminal. Este exame criminológico
será o alicerce que definirá como a pena será dirigida para cada condenado preso.
90
Ademais, o deputado justifica o projeto dizendo que não há no sistema penal
brasileiro um tratamento diferenciado para os psicopatas, o que leva muitas vezes
de maneira errada, a soltar estas pessoas ou levá-las a um regime melhor sem um
exame prévio sobre suas qualidades psicológicas e psiquiátricas.
Observa-se, nestes termos, a necessidade suprema do estabelecimento
não só de políticas de proteção aos direitos dos psicopatas, mas também de
restabelecimento dos mesmos dentro dos estabelecimentos de cumprimento de sua
pena. Com a ressalva de não se descuidar da recuperação dos outros criminosos,
os quais se apresentam como indivíduos vulneráveis a presença de psicopatas em
seu ambiente social.
91
5 CONCLUSÃO
A partir dos aspectos ora examinados, conclui-se que não se tem dado a
atenção necessária à tão complexa personalidade psicopática. Não se trata apenas
de melhor organizar o sistema prisional, estabelecer políticas que disciplinem o
espaço das prisões; ou também, ser capaz de tornar possível a reeducação dos
encarcerados, seja ele psicopata ou não, promovendo um aprendizado de
obediência e moralidade, evitando dar vazão as potencialidades criminais e
possíveis alianças entre os encarcerados, que poderão culminar em rebeliões.
Mas trata-se também de voltar-se ao estudo da personalidade
psicopática, tanto com relação às formas que originam o distúrbio, como às
características que traçam seu perfil, aprimoramento a aplicação no âmbito jurídico
da psiquiatria e da psicologia. Estas disciplinas podem contribuir significativamente
no que diz respeito ao estudo do comportamento do criminoso e a análise de todo
seu percurso de vida que originou a criminalidade.
Dessa maneira, poder-se-á então identificar a base do problema,
descobrindo desordens mentais que possam existir, com o intuito de chegar a uma
solução e aplicar uma pena justa. É neste sentido que também reside a importância
do exame criminológico, pois sem ele, ora não é possível o diagnóstico sobre a
personalidade de um delinqüente, ora não se poderá classificá-lo corretamente e
ditar os seus passos dentro do sistema prisional.
Através dos estudos e teorias da psiquiatria e psicologia é possível ter-se
conhecimento acerca dos motivos que geram o distúrbio psicológico da
92
personalidade, sejam os fatores genéticos, biológicos, psicológicos, socioculturais.
Fatores estes relacionados desde as lesões cerebrais, como a problemas de origem
familiar que contribuíram na infância, negativamente a formação do indivíduo
moralmente. Os mesmos provocam alterações na personalidade e no caráter dos
psicopatas, que apresentarão um comportamento caracterizado pela insensibilidade,
frieza, perversão, ausência de sentimento de culpa, dissimulação, manipulação.
Frisa-se, a partir da análise psiquiátrica e psicológica destes indivíduos,
que os mesmos não se constituem como doentes mentais, mas sim como
portadores de uma perturbação psicológica. Diferente de um enfermo mental, os
psicopatas possuem consciência dos atos delituosos que cometem e apresentam
condição parcial, na maioria das vezes, para determinar-se segundo essa
consciência. Muitos, é verdade, estão incapacitados de determinar-se, pois a
anomalia limita o seu superego impossibilitando que o indivíduo atue de maneira
considerada correta.
É nesse sentido que um psicopata tanto poderá ser considerado
inimputável como semi-imputável pelo direito penal brasileiro. A imputabilidade
caracteriza-se pela capacidade de compreensão e vontade de agir, ou seja, a
capacidade de realizar o fato atípico com pleno discernimento. Os portadores de
sofrimento psíquico, por exemplo, cujo distúrbio lhe impeça de ter discernimento de
um ato ilícito praticado, será isento de pena e deverá cumprir medida de segurança.
A medida de segurança é uma espécie de sanção penal, cujo fundamento
é a periculosidade do delinqüente, sua finalidade é a prevenção e tratamento; há a
periculosidade presumida, prevista no Código Penal e a periculosidade real ou
judicial, baseada na personalidade e antecedentes do agente. É questionável, no
entanto, a eficácia que esta sanção penal proporcionaria aos psicopatas, posto que
93
não há tratamento para a psicopatia, a medida de segurança não seria capaz de
ressocializar o psicopata, torná-lo não mais perigoso à sociedade.
A medida de segurança deve ser aplicada, conforme a lei, por tempo
indeterminado até que se comprove a cessação da periculosidade do agente,
embora divergências jurisprudenciais apontem para a ilicitude deste prazo ilimitado.
Defende-se a duração da medida de segurança até o tempo máximo da pena que o
condenado teria se a cumprisse em estabelecimento penitenciário, sendo, portanto
possível um máximo de 30 anos.
Outra opção de sanção penal para os psicopatas é a pena privativa de
liberdade com a sua redução em até dois terços, enquadrando-se assim o psicopata
como um agente semi-imputável. Só será, porém, considerado semi-responsável ou
limítrofe caso a psicopatia influencie nas suas emoções, influenciando parcialmente
na sua capacidade de entendimento no momento da prática do ilícito penal.
Há divergência, no que tange a possibilidade ou obrigatoriedade do juiz
em determinar esta redução da pena. Caberá ao magistrado avaliar a personalidade
do agente e as provas periciais, podendo o mesmo aceitar o diagnostico ou rejeitálo. Muito embora, acredite-se também que a prisão preventiva não é uma opção
eficaz para o psicopata, pois o mesmo não se sensibiliza com a punição, voltaria a
delinqüir no primeiro momento em que saísse da prisão.
Ademais, como tratado, o caráter repressivo e punitivo penal mediante
pena privativa de liberdade aplicada aos psicopatas revelar-se-á maléfico a
ressocialização dos presos não portadores desta perturbação, dando vazão às suas
potencialidades
criminais,
podendo
alterar
sua
personalidade
e
o
seu
comportamento.
O fim da pena, pois, é apenas o de impedir que o réu cause novos danos
94
aos seus semelhantes, além de ressocializá-lo, reeducá-lo para que retorne ao
convívio com as outras pessoas e não cometa mais transgressões. É, pois,
necessário selecionar quais penas devem ser direcionadas àquele determinado
delinqüente e quais os modos de aplicá-las, a fim de que proporcione impressão
mais eficaz e mais duradoura no espírito dos homens, seja menos tormentosa no
corpo do réu e o recupere devidamente.
O autor do crime é o verdadeiro protagonista na justiça penal; é evidente
sem dúvidas, que a avaliação jurídica do crime e dos seus motivos determinantes se
entrelaça com as características de sua personalidade. Portanto, há extrema
necessidade, que o exame criminológico ocorra para que a personalidade do
delinqüente seja então delineada e proporcione a classificação eficaz dos mesmos.
Determine, nestes termos a instituição penal adequada para cada caso, assim como
as medidas terapêuticas para sua reeducação.
Somente a partir de perícia e exames pode ser diagnosticado o desvio
psíquico na personalidade de um delinqüente. No que se refere aos distúrbios
psicológicos da personalidade psicopática torna-se mais complexo este diagnóstico,
uma vez que a anomalia interfere na afetividade, sentimentos, instintos, caráter e
até, em alguns casos, em sua autodeterminação.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 é taxativa ao determinar a
individualização da pena, a classificação é requisito fundamental, posto que
demarca o início da execução das penas privativas de liberdade e também da
medida de segurança e visa assegurar os princípios da personalidade e da
proporcionalidade da pena, que são direitos e garantias constitucionais. Adequada a
classificação, cada sentenciado terá conhecida sua personalidade recebendo o
tratamento penitenciário adequado.
95
A não efetuação de exame prévio de sanidade mental, entretanto,
comprometerá a classificação do criminoso podendo então acarretar problemas no
sistema prisional, para onde criminosos de alta periculosidade são encaminhados de
modo incorreto, sendo misturados a criminosos considerados não perigosos ou
pouco perigosos.
Por fim, conclui-se que a melhor forma de solucionar a questão do
encarceramento incorreto de psicopatas e presos comuns em um mesmo
estabelecimento prisional seja a alteração na Lei de Execuções Penais, conforme
apresentado no projeto de Lei 6858/ 2010. Este, além de prever em seu artigo 84,
parágrafo 3º a separação por seções, onde presos psicopatas cumprirão sua pena
privativa de liberdade fora do convívio com presos comuns, ainda atribui importância
significativa a atuação do exame criminológico, instrumento básico que também
evitará tal problema.
96
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104
ANEXO
105
PROJETO DE LEI Nº 6858, de 2010.
(Do Sr. Dr. Marcelo Itagiba)
Altera a Lei nº 7.210, de 1984, Lei de Execução Penal,
para criar comissão técnica independente da
administração prisional e a execução da pena do
condenado psicopata, estabelecendo a realização de
exame criminológico do condenado à pena privativa de
liberdade, nas hipóteses que especifica.
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º Esta Lei tem por finalidade alterar a Lei nº 7.210, de 1984, para
estabelecer que a realização de exame criminológico do condenado à pena privativa
de liberdade, no momento em que entrar no estabelecimento prisional e em cada
progressão de regime a que tiver direito, seja feita por comissão técnica
independente da administração prisional.
Art. 2º A Lei nº 7.210, de 1984, Lei de Execução Penal, passa a vigorar
acrescida das seguintes disposições:
“Art. 6º A classificação será feita por Comissão Técnica de Classificação
que elaborará o programa individualizador da pena privativa de liberdade
adequada ao condenado ou preso provisório, levando em consideração o
resultado de exame criminológico.” (NR)
.....................................................................................................
“Art. 8º A Sem prejuízo do disposto nos artigos 6º, 7º e 8º, para a obtenção
dos elementos necessários a uma adequada classificação e com vistas à
individualização da execução, o condenado ao cumprimento de pena
privativa de liberdade, em regime fechado, será submetido a exame
criminológico realizado também por comissão técnica independente.
§1º A comissão técnica de que trata este artigo deverá identificar os presos
portadores de psicopatia para orientar a individualização da execução penal
de que trata o art. 5º.
§2º A comissão será composta de profissionais da área de saúde mental e
de psicologia criminal especialmente designados para a função, presidida
por especialista de notório saber, com mandato de dois anos, permitida
recondução.”
106
“Art. 84...................................................................................................
§3º. O condenado ou preso provisório classificado como psicopata cumprirá
pena em seção distinta daquela reservada aos demais presos.” (NR)
Art. 112..................................................................................................
§ 3º A transferência para regime menos rigoroso, a concessão de livramento
condicional, o indulto e a comutação de penas do condenado classificado
como psicopata depende de laudo permissivo emitido pela comissão técnica
de que trata o art. 8º-A.
Art. 3º Esta lei entrará em vigor 60 dias após a sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
Já apresentei nesta Casa, o Projeto de Lei nº 6.285, de 2009, que “Altera
a Lei nº 7.210, de 1984, Lei de Execução Penal, para exigir exame criminológico do
condenado no cumprimento da pena privativa de liberdade em regime semi-aberto e
aberto”.
Agora,
em
complementação
àquela
medida,
apresento
proposta
legislativa com o fim de garantir a realização obrigatória de exame criminológico do
agente condenado à pena restritiva de liberdade, quando de sua entrada no
estabelecimento prisional em que cumprirá a pena, e quando das progressões de
regime a que tiver direito, por uma comissão técnica independente.
Importa a complementação legislativa, na medida em que promoverá a
manifestação obrigatória de uma comissão técnica de fora da estrutura formal das
penitenciárias, com a capacitação profissional indispensável à avaliação das
condições psico-sociais do preso quando este, por decisão da Justiça, puder estar
em contato com a sociedade.
Vale dizer, o projeto vem sanar aquilo que tem sido objeto de muitas
críticas, mormente a de que o exame é um ponto frágil do sistema por promover
falhas importantes no que concerne a segurança de decisões judiciais que autorizam
107
a saída do condenado do sistema prisional. Com a determinação legal de que a
Comissão Técnica que realizará o exame criminológico não estará ligada ou
subordinada aos diretores ou responsáveis pelos presídios, a isenção da
qualificação adotada para o preso estará, a nosso ver, garantida. Com este
propósito o projeto modifica o artigo 6º e cria o 8º-A, na LEP.
Além disso, outra alteração se faz necessária, no mesmo diapasão das
primeiras, a fim de prever a execução da pena do psicopata separadamente da dos
presos comuns.
A questão da psicopatia ainda é um tanto controversa, já que há tempos
existe a discussão se tal patologia, enquanto perturbação da personalidade deve ser
considerada como uma categoria diagnóstica nas classificações internacionais ou se
os transtornos de personalidade já catalogados dão conta de identificar os sujeitos
que apresentam tais distúrbios de conduta (Psico-USF, v. 11, n. 2, p. 265-266, jul./dez.
2006).
Atualmente,
é
usada
a
denominação
transtorno
antissocial
da
personalidade, mas estudos recentes mostram a necessidade de se diferenciar dois
subtipos dentro dessa classificação, a saber, transtorno parcial da personalidade,
menos grave e que geralmente caracteriza os ditos criminosos comuns, e transtorno
global da personalidade, que se aproxima do conceito de psicopatia de Hare (op.
cit.):
“Nesse sentido, a escala PCL. R (Psychopathy Checklist Revised), de
autoria de Robert D. Hare, foi tema da tese de doutorado da psiquiatra Hilda
Morana, defendido na Faculdade de Medicina da Universidade de São
Paulo. No trabalho, a autora buscou identificar o ponto de corte da versão
brasileira, ou seja, a partir de que pontuação um sujeito pode ser
considerado psicopata, tornando a escala apta para utilização em contexto
nacional, sendo sua venda recentemente permitida pelo Conselho Federal
de Psicologia (CFP). O PCL. R, que é o primeiro exame padronizado
exclusivo para o uso no sistema penal do Brasil, pretende avaliar a
108
personalidade do preso e prever a reincidência criminal, buscando separar
os bandidos comuns dos psicopatas. A autora defende em sua tese que
não é o tipo de crime que define a probabilidade de reincidência, e sim a
personalidade de quem o comete. Assim, os estudos visando à adaptação e
validação desse instrumento para a população forense brasileira, bem como
sua comercialização para os profissionais da área, há muito urgiam ser
viabilizados no Brasil. (...) A psicopatia é entendida atualmente no meio
forense como um grupo de traços ou alterações de conduta em sujeitos
com tendência ativa do comportamento, tais como avidez por estímulos,
delinqüência juvenil, descontroles comportamentais, reincidência criminal,
entre outros. É considerada como a mais grave alteração de personalidade,
uma vez que os indivíduos caracterizados por essa patologia são
responsáveis pela maioria dos crimes violentos, cometem vários tipos de
crime com maior freqüência do que os não-psicopatas e, ainda, têm os
maiores índices de reincidência apresentados. Assim, o que o PCL. R
pretende diferenciar são os psicopatas dos nãopsicopatas, segundo a
proposta de Hare. Um dos principais objetivos da escala é identificar os
sujeitos com maior probabilidade de reincidência criminal, sendo assim,
além de um instrumento diagnóstico importante para tomada de decisão
acerca do trâmite do condenado no sistema penal, uma ferramenta para
separar os que apresentam tal condição daqueles que não a apresentam,
com vistas a não prejudicar a reabilitação dos chamados criminosos
comuns.” (op. cit).
No sistema carcerário brasileiro não existe um procedimento de
diagnóstico para a psicopatia quando há solicitação de benefícios, redução de penas
ou para julgar se o preso está apto a cumprir sua pena em um regime semi-aberto
(Ana Beatriz Barbosa Silva in “Mentes Perigosas: o psicopata mora ao lado”,
Fontana, 2008):
“Se tais procedimentos fossem utilizados dentro dos presídios brasileiros,
certamente os psicopatas ficariam presos por muito mais tempo e as taxas
de reincidência de crimes violentos diminuiriam significativamente. Nos
países onde a escala Hare (PCL) foi aplicada com essa finalidade,
constatou-se uma redução de dois terços das taxas de reincidência nos
crimes mais graves e violentos. Atitudes como essas acabam por reduzir a
violência na sociedade como um todo.” (op. cit.).
Assim é que, acredito, a LEP deve ser alterada para que o programa
individualizador da pena privativa de liberdade do condenado ou preso provisório
classificado como psicopata vise ao restabelecimento do portador da psicopatia,
sem descurar da recuperação dos demais presos. Para isso é preciso
instrumentalizar o Estado com este fim, razão pela qual proponho a inclusão de §3º
109
ao art. 84, para que o condenado ou preso provisório classificado como psicopata
cumpra sua pena em seção distinta daquela reservada aos demais presos.
De outro lado, é preciso também que a concessão de livramento
condicional, o indulto e a comutação de penas do preso classificado como psicopata,
bem como a sua transferência para regime menos rigoroso, dependa de laudo
permissivo emitido por quem tenha condição técnica de fazê-lo, com a devida
segurança, para que não aconteça fatos como o relatado por Ana Beatriz Barbosa
Silva (op. cit):
“Um caso que exemplifica a importância de medidas com as descritas
acima é o de Francisco Costa Rocha, mais conhecido como “Chico
Picadinho”, autor de dois dos crimes de maior repercussão da história
policial brasileira. Em 1966, Francisco, que até então parecia ser uma
pessoa normal, matou e esquartejou a bailarina Margareth Suida em seu
apartamento no centro de São Paulo. Chico foi condenado a 18 anos de
reclusão por homicídio qualificado e mais dois anos e seis meses de prisão
por destruição de cadáver. Em junho de 1974, oito anos depois de ter
cometido o primeiro crime, Francisco foi libertado por bom comportamento.
No parecer para concessão de liberdade condicional feito pelo então
Instituto de Biotipologia Criminal constava que Francisco tinha
“personalidade com distúrbio profundamente neurótico”, excluindo o
diagnóstico de personalidade psicopática. No dia 15 de outubro de 1976,
Francisco matou Ângela de Souza da Silva com os mesmos requintes de
crueldade e sadismo do seu crime anterior. Chico foi condenado a trinta
anos de reclusão e permanece preso até hoje.”
Isto posto, conto com o apoio dos Pares para a aprovação de mais este
projeto de lei que, certamente, consistirá em avanço da execução penal brasileira,
na medida em que redundará em muito menos reincidência criminal, em relação aos
índices da atualidade.
Sala das Sessões, de 24 de fevereiro de 2010.
MARCELO ITAGIBA
Deputado Federal/PSDB-RJ

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