INVESTIGAÇÃO DA SUPERFÍCIE DE AÇOS INOXIDÁVEIS

Transcrição

INVESTIGAÇÃO DA SUPERFÍCIE DE AÇOS INOXIDÁVEIS
Encontro e Exposição Brasileira de tratamento de superficie
III INTERFINISH Latino Americano
INVESTIGAÇÃO DA SUPERFÍCIE DE AÇOS INOXIDÁVEIS AISI 348 CONTENDO GRAVAÇÃO
POR LASER
A. B. Oliveira, M. G. Pedroni, J. R. Berretta
Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo – CTMSP
Av. Prof. Lineu Prestes, 2468 – São Paulo/SP – CEP: 05508-000
RESUMO
No setor nuclear há especificações de que todos os componentes utilizados em uma usina devem ser
identificados. Com o objetivo de facilitar a leitura e consequentemente a rastreabilidade, pretende-se identificálos com um código de barras, gravado a laser. A gravação a laser em metais pode ser gerada de duas maneiras
por usinagem ou tratamento térmico superficial. Na gravação por usinagem ocorre remoção de material. A
gravação por tratamento térmico é gerada por recozimento superficial que produz cor intensa na superfície dos
aços inoxidáveis. Os estudos foram iniciados pela identificação do melhor método de gravação com laser, para
que a leitura do código de barras ocorra com facilidade. Obtidos os melhores parâmetros de gravação a laser, foi
investigada a influência de seus efeitos nas propriedades do material e se estas alterações afetaram a integridade
do revestimento da vareta combustível. Assim, foi conduzido um estudo de deterioração de tubos em aço AISI
348 identificados por gravação a laser, isto é, ensaios de suscetibilidade a ataque intergranular e a corrosão sob
tensão. Além disso, investigou-se a microestrutura do material para se caracterizar as fases presentes, zona de
fusão (ZF), zona termicamente afetada (ZTA) e material de base (MB).
1.
INTRODUÇÃO
No setor nuclear há especificações de que todos os componentes utilizados em uma usina devem ser
identificados. A gravação é um processo para fazer uma marca em um produto com o propósito de identificar o
mesmo. Existem muitos métodos de marcação: com tinta, mecânica, eletroquímica e a laser [1] [2].
Regoushevsky [3] vem estudando nos últimos 10 anos a melhor maneira de identificar componentes para a área
nuclear, e chegou à conclusão que a gravação a laser é um dos melhores métodos. Há muitas vantagens na
marcação a laser em comparação com métodos convencionais de marcação, como por exemplo, não ocorre
desgaste de ferramentas, o contraste e homogeneidade na gravação, precisão e nitidez nos contornos, precisão de
posicionamento e durabilidade da marca [4].
Assim, existe o interesse de se identificar os componentes com um código de barras, gravado a laser, para
melhorar a rastreabilidade de seu histórico, desde sua fabricação até a armazenagem após uso. Pois, esta
metodologia de identificação facilita a leitura e o registro do componente em cada operação da fabricação.
A gravação a laser em metais pode ser gerada de duas maneiras: usinagem ou tratamento térmico superficial [4].
Na gravação por usinagem ocorre remoção de material. A gravação por tratamento térmico é gerada por
recozimento superficial que é feita através do aquecimento das áreas selecionadas da amostra a uma temperatura
especifica usando o feixe de laser. O processo de aquecimento produz uma película de óxido sobre a superfície
da amostra a espessura do filme determina a coloração. Este processo não remove material e deixa sua superfície
perfeitamente lisa, esta é uma vantagem que faz a gravação a laser ideal para este tipo de aplicação [4]. Porém,
estes métodos de gravação aplicados no metal poderão alterar as propriedades mecânicas. Como este material
será empregado em locais considerados de condições agressivas, tais como, ambientes corrosivos, de altos
esforços mecânicos, altos gradientes térmicos, etc. [5], é importante avaliar se a gravação a laser influenciará em
alguma das propriedades mecânicas do material, que comprometerá a referida aplicação.
Esse estudo foi iniciado pela identificação do melhor método de gravação a laser e seus melhores parâmetros de
gravação para que a leitura do código de barras ocorra com facilidade. Identificada a faixa de operação do
equipamento de gravação, passou-se a investigar a influência da gravação laser nas propriedades do material e se
estas alterações afetaram a integridade do revestimento da vareta combustível. Desta maneira foi conduzido um
66
Encontro e Exposição Brasileira de tratamento de superficie
III INTERFINISH Latino Americano
estudo de deterioração em tubos de aço inoxidável AISI 348 identificados por gravação a laser, isto é, ensaios de
suscetibilidade a ataque intergranular e de corrosão sob tensão. Além disso, investigou-se a microestrutura do
material para se caracterizar as fases presentes, zona de fusão (ZF), zona termicamente afetada (ZTA) e material
de base (MB).
2.
PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL
Amostras de tubo de aço AISI 348 foram preparadas com comprimento de 70 mm e espessura de parede de
0,6 mm, com composição química nominal [6] em % peso de: 0,08 % (max) C; 2,0 % (max) Mn; 1,0 % Si;
17,0/19,0% Cr; 9,0/13,0% Ni; 0,045% P; 0,03% S; 0,2% Co; 10 x % C (min) Nb; 0,10% Ta.
Os ensaios de gravação foram executados na empresa Trumpf do Brasil, em um equipamento modelo Laser
TruMark 3130. Foram eleitos sete parâmetros de gravação, descritos na tabela 1, alterando foco do feixe e
frequência.
Tabela 1. Parâmetros de gravação a laser
Parâmetro
A0E19
A5B5
A7E19
A10A1
A10D19
B4B0
C2C0
Velocidade
do feixe
[mm/s]
1,5x10-3
1,5x10-3
1,5x10-3
1,5x10-3
1,5x10-3
1,5x10-3
1,5x10-3
Foco do
feixe
[mm]
4
5
5
6
6
5
4
Frequência
[KHz]
30
35
45
40
40
30
40
Após a gravação das amostras foram feitos os testes de leitura do código de barras. As amostras que tiveram boa
resolução na leitura foram submetidas a ensaios químicos e metalúrgicos, que foram comparados com os
resultados das análises da amostra como recebido (sem a gravação).
A investigação iniciou-se pela análise metalográfica, com o seguinte procedimento: as amostras foram lixadas
(lixas de 220 a 1200) e polidas (pasta de diamante: 6, 3 e 1 μm). A estrutura cristalina da seção transversal do
material foi revelada pela imersão da amostra em uma solução de V2A (50 mL de H2O; 50 mL HCl e 5 mL
HNO3) a temperatura de 55°C pelo tempo de 40 segundos.
O próximo passo foi à análise de deterioração do material, pelos de suscetibilidade a ataque intergranular e
ensaios de corrosão sob tensão (CST).
O ensaio de suscetibilidade a ataque intergranular, primeiramente, as amostras precisam ser submetidas a um
tratamento térmico de sensitização. Este método compreende em submeter à amostra a uma temperatura entre
450°C e 850°C por um período de tempo, como consequência o material fica susceptível a corrosão
intergranular, devido regiões com deficiência em cromo nos contornos de grão formado durante a precipitação
de carbonetos ocasionadas pela grande diferença nas velocidades de difusão do cromo e carbono na austenita.
Neste trabalho, as amostras foram submetidas a um ciclo de tratamento térmico a temperatura de 670oC pelo
período de 1 hora [7].
Após o tratamento térmico, o ensaio de suscetibilidade a ataque intergranular foi executado com base na prática
A e prática E da norma ASTM 262. A prática A compreende em submeter à amostra a um ataque eletroquímico
em solução de ácido oxálico com uma corrente de 1 A/mm² por 1,5 min, e observar o resultado em microscópio
óptico com aumento de 200x. Já o procedimento da Prática E, consiste em submeter à amostra a uma solução de
67
Encontro e Exposição Brasileira de tratamento de superficie
III INTERFINISH Latino Americano
sulfato de cobre com ácido sulfúrico 16% em sua temperatura de ebulição durante 24 horas, após esse processo a
amostra é submetida a um dobramento e observada em microscópio óptico com aumento entre 20 e 50 vezes.
Nos dois procedimentos, os critérios de aprovação são indicados por fotos apresentadas na norma [7].
Para o ensaio de CST foi preparado um corpo de prova (CP) do tipo C-Ring (Figuras 1), como especificado na
norma ASTM-G38 [8]. Este CP foi submetido a tensões de tração de 140 MPa e introduzido em uma solução de
cloreto de magnésio (MgCl2) a uma temperatura de 155 oC. A amostra é considerada aprovada após permanecer
168 horas na solução, conforme a norma ASTM-G36 [9]
Figura 1. Corpo de prova tipo C-Ring
3.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
3.1 Teste de leitura das gravações
Nas amostras gravadas, com os parâmetros da tabela 1, foram executados os testes de leitura e os resultados
obtidos estão apresentados na tabela 2.
Nota-se que os parâmetros, como o foco de feixe entre 5 e 6 mm e taxa de repetição de pulsos com frequência
entre 30 e 40 KHz para produzir as amostras gravadas, foram os que tiveram os melhores resultados no teste de
leitura, indicadas em azul na tabela 2.
Tabela 2. Teste de Leitura do código de Barra.
Amostras
A0E19
A5B5
A7E19
A10A1
A10D19
B4B0
C2C0
Material
AISI 348
AISI 348
AISI 348
AISI 348
AISI 348
AISI 348
AISI 348
Ótimo
68
Bom
Regular
Ruim
Sem leitura
Encontro e Exposição Brasileira de tratamento de superficie
III INTERFINISH Latino Americano
3.2 Análise Micrográfica
Na observação da seção transversal das amostras em estudo, verifica-se a estrutura cristalina típica de material
submetido a tratamento térmico de recozimento (Figura 2). Nas amostras submetidas à gravação laser nota-se
que não ocorreram alterações na estrutura cristalina visíveis em microscopia óptica, embora o processo de
gravação a laser ser baseado em princípios térmicos, (figuras 3,4 e 5). Observa-se somente uma variação na
rugosidade da superfície indicada pela seta.
Figura 2. Estrutura cristalina da amostra sem gravação
a laser.
Figura 3. Estrutura cristalina da amostra gravada a
laser com o parâmetro A5B5
Figura 4. Estrutura cristalina da amostra gravada a
laser com o parâmetro A10D19
Figura 5. Estrutura cristalina da amostra gravada a
laser com o parâmetro B4B0
3.3 Análises de suscetibilidade a ataque intergranular
3.3.1 Prática A
Na análise de suscetibilidade a ataque intergranular, podemos verificar que o material em estudo possui alta
resistência a este tipo de deterioração (Figura 6). Nas amostras que foram gravadas a laser pode-se notar que a
resistência a deterioração intergranular não foi comprometida, embora a superfície tenha sido aquecida para
gerar a coloração na amostra. Este fato não influenciou para a ocorrência de regiões com deficiência em cromo
nos contornos de grão, que são geradas pela precipitação de carbonetos que podem ocorrer quando o material
está em altas temperaturas [7] (Figuras 7,8 e 9).
69
Encontro e Exposição Brasileira de tratamento de superficie
III INTERFINISH Latino Americano
Figura 6. Prática A da amostra sem gravação a laser
Figura 7. Prática A da amostra gravada com o
parâmetro A5B5
Figura 8. Prática A da amostra gravada com o
parâmetro A10D19
Figura 9. Prática A da amostra gravada com o
parâmetro B4B0
3.3.2 Prática E
Na prática E da analise a suscetibilidade a ataque intergranular pode-se observar que após o dobramento das
amostras não surgiram microtrincas ou fissuras intergranulares, este comportamento significa que no material
analisado não há evidencia de suscetibilidade (Figura 10). Nas amostras gravadas também não houve evidencia
de suscetibilidade, embora a gravação seja uma espécie de tratamento térmico e tenha a possibilidade de
incentivar a precipitação do cromo em forma de carbonetos. A única modificação que ocorreu, neste ensaio, foi a
remoção da coloração gerada pela gravação laser devido à exposição ao ácido (Figuras 11, 12 e 13).
70
Encontro e Exposição Brasileira de tratamento de superficie
III INTERFINISH Latino Americano
Figura 10. Prática E após o dobramento da amostra
sem a gravação
Figura 11. Prática E após o dobramento da amostra
gravada com o parâmetro A5B5
Figura 12. Prática E após o dobramento da amostra
gravada com o parâmetro A10D19
Figura 13. Prática E após o dobramento da amostra
gravada com o parâmetro B4B0
3.4 Ensaios de corrosão sob tensão
No ensaio de corrosão sob tensão observa-se que a amostra de aço AISI 348 sem a gravação resistiu 66 horas,
após este tempo exposto ao meio corrosivo ocorreu o surgimento de uma trinca (Figura 14). As amostras
marcadas resistiram mais tempo de ensaio, 72 horas (Figuras 15 e 16). Este fato pode ter ocorrido devido à
gravação a laser gerar uma película de óxido na superfície do material, gerando um aumento de sua camada
apassivadora, desta maneira, aumentando sua resistência a este tipo de deterioração.
71
Encontro e Exposição Brasileira de tratamento de superficie
III INTERFINISH Latino Americano
Figura 14. Ensaio de corrosão sob
tensão da amostra sem gravação
após 66 horas
4.
Figura 15. Ensaio de corrosão sob
tensão da amostra A0E19 após 72
horas
Figura 16. Ensaio de corrosão sob
tensão da amostra C2C0 após 72
horas
CONCLUSÃO
A melhor leitura do código de barras gravado a laser foi nas amostras marcadas com parâmetros que possuíam o
foco de feixe entre 5 e 6 mm e taxa de repetição de pulsos com frequência entre 30 e 40 KHz.
A gravação laser não gerou alterações na estrutura cristalina, como mostra a análise metalográfica, típica de
material submetido a tratamento térmico de recozimento, embora o processo de gravação a laser ser baseado em
princípios térmicos.
O material em estudo possui alta resistência a suscetibilidade a ataque intergranular, nas amostras marcadas esta
propriedade não foi comprometida, mesmo após a superfície ser aquecida para reproduzir a gravação.
A gravação a laser aparentemente aumentou a resistência do material no ensaio de corrosão sob tensão.
Provavelmente pelo aumento da espessura da camada passivada.
Com base nesses dados podemos afirmar que a técnica de gravação a laser para identificação de componentes
para o setor nuclear é promissor.
5.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao CNPq pelo apoio financeiro em forma de bolsas, ao CTMSP por disponibilizar a
infraestrutura de laboratórios, a INB pelo ensaio de leitura dos códigos de barra e a Trumpf do Brasil pela
gravação a laser das amostras.
6.
REFERÊNCIAS
[1] Ullmaier, H. & Schilling, W. Radiation damage in metallic reactor materials. In: INTERNATIONAL
ATOMIC ENERGY AGENCY. Nuclear fusion research: proceedings of the seminars...held in Vienna, 1-2
February, 1980. vol. 1, Vienna, 1980, p. 301-97.
[2] H. Jundt, J. Junghans, Microscopic material interactions by laser engraving, Proc. SPIE 744 (1987) 147–155.
[3] Regoushevsky, V.I; Tambovtsev, SD.; et al.; Implementing New Methods of Laser Marking of Items in the
Nuclear Material Control and Accountability System at SSC RF-IPPE: An Automated Laser Marking System.
72
Encontro e Exposição Brasileira de tratamento de superficie
III INTERFINISH Latino Americano
Proceedings of INMM – 50th Annual Meeting of the Institute of Nuclear Materials Management 2009. Tucson,
Arizona, USA. July 2009.
[4] Buchfink, G. The laser as tools, 1 ed., Vogel Buchverlag, Würzburg. 2007.
[5] Sedriks, A J. –Corrosion of stainless steels. John Wiley & Sons Inc. New York.1996.pp.231-233.
[6] ASM International Handbook Committee, Metals Handbook.v.1, 10 ed. ASM. 1993.
[7] ASTM – 262 Detecting Susceptibility to Intergranular Attack in Austenitic Stainless Steels
[8] ASTM – G38 Marking and Using C-Ring Stress-Corrosion Test Specimens.
[9] ASTM – G36- Evaluating Stress-corrosion Cracking Resistance of Metals and Alloys in a Boiling
Magnesium Chloride Solution.
7.
AUTORES
Almir Brandão de Oliveira – Bolsista de Iniciação Científica no Centro
Tecnológico da Marinha em São Paulo, posição que ocupa desde de 2011. Estudante
de Ciências dos Materiais na Faculdade de Tecnologia de São Paulo.
Mário Guilherme Pedroni – Técnico no Centro Tecnológico da Marinha em São
Paulo, posição que ocupa desde 2011. Estudante de Engenharia Metalúrgica na
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
José Roberto Berretta – Tecnologista no Centro Tecnológico da Marinha em São
Paulo, posição que ocupa desde 2010. Doutor em Tecnologia Nuclear pela
Universidade de São Paulo.
73

Documentos relacionados