cultura afro - Página das Equipes Multidisciplinares

Transcrição

cultura afro - Página das Equipes Multidisciplinares
cultura afro
Secretaria de Estado da Educação - SEED
Superintendência da Educação - SUED
Departamento de Ensino Fundamental - DEF
CADERNOS TEMÁTICOS
LEI Nº 10.639/03
CURITIBA - SETEMBRO 2005
cultura afro
A INSERÇÃO DOS CONTEÚDOS DE HISTÓRIA
E CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA NOS
CURRÍCULOS ESCOLARES
Depósito legal na Fundação Biblioteca Nacional, conforme Decreto Federal n.1825/
1907, de 20 de dezembro de 1907.
É permitida a reprodução total ou parcial desta obra, desde que seja citada a fonte.
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
SUPERINTENDÊNCIA DE EDUCAÇÃO
DEPARTAMENTO DE ENSINO FUNDAMENTAL
Avenida Água Verde, 2140
Telefone: (0XX)41 33401712 FAX (0XX)41 32430415
80240-900 CURITIBA - PARANÁ
Catalogação no Centro de Documentação e Informação Técnica da SEED Pr.
Paraná. Secretaria de Estado da Educação. Superintendência de
Educação. Departamento de Ensino Fundamental.
Cadernos temáticos: inserção dos conteúdos de história e cultura afrobrasileira e africana / Paraná. Secretaria de Estado da Educação.
Superintendência de Educação. Departamento de Ensino Fundamental. –
Curitiba : SEED - Pr., 2005.
43 p.
ISBN
1. Cultura africana. 2. Cultura afro-brasileira. 3. Negros. 4. Quilombos. 5. Turvo,
Pr. 6. Currículo escolar. 7. Educação paranaense. 8. Legislação educacional. 9.
Lei n.10.639/03. I. Grupo de Trabalho SEED/APP. II. Título.
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CDU37+572(=96)(816.2)
IMPRESSO NO BRASIL
Roberto Requião
Governador do Estado do Paraná
Mauricio Requião de Mello e Silva
Secretário de Estado da Educação
Ricardo Fernandes Bezerra
Diretor Geral
Yvelise Freitas de Souza Arco-Verde
Superintendente da Educação
Fátima Ikiko Yokohama
Chefe do Departamento de Ensino Fundamental
Mary Lane Hutner
Chefe do Departamento de Ensino Médio
Maria Aparecida Zanetti
Chefe do Departamento de Educação de Jovens e Adultos
Elaborado pelo Grupo de Trabalho SEED/APP-Sindicato
Wanusa Helena Ferreira - SEED/DEF
João Augusto Reque - SEED/DEF
Lilian Ianke Leite - SEED/DEF
Rosangela Gonçalves de Oliveira - SEED/DEJA
Viviane Paduim - SEED/DEM
Maria José Teixeira - SEED/DEM
Clemilda Santiago Neto - SEED/CAC
Luiz Carlos Paixão da Rocha - APP-Sindicato
Marlei Fernandes de Carvalho - APP-Sindicato
Janislei Aparecida Albuquerque - APP-Sindicato
Adriana Custódio Moreira - APP-Sindicato
Joana Darc de Farias - APP-Sindicato
Edmundo da Silva Novaes - APP/Sindicato
Romeu Gomes de Miranda - APP/Sindicato
Arte
Melissa de Melo Wakim - SEED/DEF
Caciara Aparecida Xavier - SEED/DEF
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Colaboradores
Cristina Cremoneze - SEED/DEF
Marcelo Fronza - SEED/DEM
Maria Alice de Oliveira Collere - SEED/DEF
Sandro Cavalieri Savoia - SEED/DEF
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Secretaria de Estado da Educação do Paraná oferece este Caderno Temático, como parte de uma série, produzido para subsidiar a
prática educacional prioritariamente no âmbito das escolas da Rede
Pública de Ensino. Mais amplamente, os temas propostos no conjunto dos Cadernos buscam oferecer informações sistematizadas, análises críticas e indicações bibliográficas para dar sustentação teórica
ao professor das escolas estaduais. Esta iniciativa atende ao desejo
da comunidade escolar de atualização e de aprofundamento de conceitos formulados em diferentes campos do conhecimento.
Ao propor a série de estudos e de debates de perspectivas
educacional, mostramos disposição para enfrentar o desafio de dar
continuidade a um processo que leve ao aperfeiçoamento das atividades desenvolvidas na escola, nos Núcleos Regionais de Educação e
no interior dos Departamentos de Ensino da Secretaria de Estado da
Educação. Buscamos criar um instrumento que comporte as contribuições teóricas dos educadores paranaenses, com o intuito de fortalecer o debate das idéias em torno de campos específicos da educação. Nosso objetivo é fortalecer um movimento coletivo de reflexão,
que auxilie o professor na construção de parâmetros e o oriente em
sua prática educativa, consolidada pelo estudo e atualização permanentes.
Este Caderno Temático marca o compromisso de nossa gestão
com a melhoria contínua da qualidade da educação, com a necessária
reflexão sobre o processo educacional e a relação do professor com o
conhecimento e com os valores da cultura e, sobretudo, com a autonomia intelectual dos educadores.
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Mauricio Requião de Mello e Silva
Secretário de Estado da Educação
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momento que vivemos da realidade brasileira, com certeza vai marcar a história desse novo século, onde as minorias passam a ser ouvidas e suas vozes ecoam nos diferentes segmentos clamando por transformações sociais.
As mudanças de rumos nas políticas públicas que estão sendo efetivadas pelos organismos governamentais, trazem no seu bojo
propostas de ação afirmativa para o seio de uma sociedade que, até
então, se não ignorava, pelo menos não instigava a polêmica da nossa
formação cultural, racial, religiosa e étnica.
Trabalhar com as diversidades culturais explorando as diferenças etno-raciais que estão postas, tanto na sala de aula como na
sociedade, é possibilitar a reflexão crítica, o pensar do aluno a partir de
seu lugar, de suas experiências de vida, de suas lutas diárias. Propor
ações afirmativas e trazer à tona a diversidade, não é, de imediato, uma
atitude de pacifismo pedagógico ou de resoluções da contradição
posta na sociedade. Ao contrário, é inserir o conflito no seio da vida
real, da escola, e enfrentá-lo, explicitando as diferenças, trabalhando
com clareza as contradições.
Expostas as diferenças, aparecem as feridas da diversidade e
as dificuldades de aceitá-las. Surgem os fatos, as alegrias, os sentimentos, os medos, os traumas, os enfrentamentos e, com eles e a partir
deles é possível trabalhar em busca do novo, do conhecimento
reelaborado e, aí sim, no caminho em busca da cultura da paz.
Os profissionais da Educação, comprometidos com a luta pela
transformação social, buscam continuamente estratégias que ressaltem o cotidiano dos alunos para, a partir da realidade constatada,
construir os saberes escolares que são necessários para a formação
do homem, do cidadão e do trabalhador. É neste sentido que temos
apontado nosso trabalho, valorizando o professor, dando-lhe a formação continuada tão necessária para, de fato, efetivarmos uma prática
educacional transformadora.
Este caderno temático ruma para esse objetivo. Traz a necessária fundamentação aos profissionais da educação e comunidade em
geral, para que estes possam ter instrumentos adequados ao
enfrentamento da diversidade e consigam transformar a hipocrisia do
preconceito na construção de uma sociedade mais justa.
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prefácioafro
Profa. Dra. Yvelise Freitas de Souza Arco-Verde
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO .................................................................................................................................................... 3
INSERÇÃO DOS CONTEÚDOS DE CULTURAAFRO-BRASILEIRA E AFRICANA NOS CURRÍCUL
OS ESCOLARES: ...................................................................................................................................................... 5
O CNE E AS DCE: CONHEÇA O PARECER .............................................................................................................. 7
POR QUE A LEI? ALGUMAS REFLEXÕES ............................................................................................................ 25
COMO TRABALHAR A LEI Nº10639/03 E AS DIRETRIZES CURRICULARES ..................................................... 26
RELATOS DE ALGUMAS EXPERIÊNCIAS DESENVOLVIDAS NAS ESCOLAS DO PARANÁ ........................... 30
RELATO 01
A COMUNIDADE REMANESCENTE DE QUILOMBO DO MUNICÍPIO DE TURVO - PR .................................... 30
RELATO 02
DESCONSTRUINDO PADRÕES DE BELEZA ........................................................................................................ 32
RELATO 03
NEGRO E CIDADANIA .......................................................................................................................................... 34
ONDE PESQUISAR ?
INDICAÇÕES DE LEITURA ................................................................................................................................... 39
FILMES ................................................................................................................................................................... 41
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SÍTIOS .................................................................................................................................................................... 45
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APRESENTAÇÃO
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A Secretaria de Estado da Educação tem como um dos princípios da atual gestão o respeito à diversidade,
e neste sentido, a aprovação da Lei 10.639/2003 e a aprovação das Diretrizes Curriculares para a Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, foram imediatamente incorporadas às discussões das equipes pedagógicas dos Departamentos que compõem a Superintendência de Educação.
Estas discussões foram enriquecidas, a partir de uma parceria entre a APP- Sindicato e SEED, com a criação
de um Grupo de Trabalho para acompanhar o processo de implementação da referida Lei nas escolas da rede pública
estadual. As ações do GT têm sido pautadas pela realização de grupo de estudos, elaboração e acompanhamento de
propostas que favoreçam a inserção da temática nos currículos escolares.
Dentre as ações já realizadas, a partir da organização do GT, destaca-se o Seminário de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana, promovido pela SEED em novembro de 2003, para 500 professores da rede pública
estadual, no qual foi possível identificar o compromisso dos professores com a temática, bem como a necessidade de
propiciar subsídios teórico-metodológicos que favorecessem a implementação dos conteúdos propostos nas escolas.
Em 2004, com a aprovação das Diretrizes Curriculares para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para
o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a SEED organizou a I Reunião Técnica com representantes
dos 32 Núcleos Regionais de Educação, com o objetivo de divulgar o documento e realizar estudos e discussões
relativas à temática.
Como desdobramento desta ação, as equipes dos NREs assumiram o compromisso de realizar atividades
que favorecessem a divulgação das Diretrizes aos diretores, professores e equipes pedagógicas das escolas sob sua
jurisdição. Além disso, foram orientados a identificar professores interessados em divulgar trabalhos no I Simpósio
de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, para o qual foram inscritos 54 propostas.
O I Simpósio foi realizado no período de 04 a 07 de novembro, em Faxinal do Céu, contando com oficinas
pedagógicas de Capoeira, Cultura Africana e Jogos, Laboratório de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana,
Grupo de Estudos, comunicação de trabalhos pelos professores, mesa redonda e atividades culturais.
Nos Seminários de Disseminação das Políticas de Gestão Escolar para Diretores da Rede Pública Estadual,
promovidos pela Superintendência da Educação, a temática tem sido apresentada, na medida em que se reconhece a
importância do envolvimento destes profissionais para a efetiva inserção dos referidos conteúdos, bem como a
necessidade de mobilizar o coletivo da escola na realização de ações educativas que favoreçam o reconhecimento,
valorização e respeito à diversidade. Nestas ocasiões tem se destacado também, o papel dos órgãos colegiados na
formalização de medidas educativas a serem aplicadas em situações de discriminação que possam vir a ocorrer na
escola.
Tendo em vista a necessidade de implementação da lei 10639/03 em todas as escolas da rede pública
estadual, o GT organizou este Caderno de Sugestões de Atividades. O Caderno é composto dos preceitos legais
relativos à inserção dos conteúdos de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e de atividades que poderão ser
realizadas pelos professores das diversas áreas do conhecimento de forma interdisciplinar, permitindo que alunos,
professores e comunidade tenham a oportunidade de reconhecer e valorizar as contribuições desta cultura para a
sociedade brasileira.
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INSERÇÃO DOS CONTEÚDOS DE HISTÓRIA E CULTURA
AFRO-BRASILEIRA NOS CURRÍCULOS ESCOLARES:
O QUE DIZ A LEI
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI N.º 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003
Mensagem de veto
Altera a Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade
da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras
providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º A Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 26-A, 79-A e 79 - B:
“Art. 26- A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se
obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.
§ 1º O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o estudo da História da África
e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da
sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política
pertinentes à História do Brasil.
§ 2º Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de todo o
currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
§ 3º (VETADO)”
“Art. 79 -A. (VETADO)”
“Art. 79 -B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia Nacional da Consciência
Negra’ .”
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
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Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182º da Independência e 115º da República.
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O CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO E AS DIRETRIZES
CURRICULARES PARA A EDUCAÇÃO DAS RELAÇÃOES ÉTNICO-RACIAIS E PARA O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA
AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA: CONHEÇA O PARECER
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
INTERESSADO: Conselho Nacional de Educação
UF: DF
ASSUNTO: Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
CONSELHEIROS: Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (Relatora), Carlos Roberto Jamil Cury, Francisca
Novantino Pinto de Ângelo e Marília Ancona-Lopez
PROCESSO N.º: 23001.000215/2002-96
PARECER N.º: CNE/CP 003/2004
COLEGIADO: CP
APROVADO EM:
10/03/2004
I – RELATÓRIO
Este parecer visa a atender os propósitos expressos na Indicação CNE/CP 6/2002, bem como regulamentar a
alteração trazida à Lei 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, pela Lei 10.639/2003, que estabelece a
obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na Educação Básica. Desta forma, busca
cumprir o estabelecido na Constituição Federal nos seus Art. 5º, I, Art. 210, Art. 206, I, § 1° do Art.242,Art. 215 e Art.
216, bem como nos Art. 26, 26 A e 79 B na Lei 9.394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que asseguram o
direito à igualdade de condições de vida e de cidadania, assim como garantem igual direito às histórias e culturas que
compõem a nação brasileira, além do direito de acesso às diferentes fontes da cultura nacional a todos brasileiros.
Juntam-se a preceitos analógicos os Art. 26 e 26 A da LDB, como os das Constituições Estaduais da Bahia
(Art. 275, IV e 288), do Rio de Janeiro (Art. 306), de Alagoas (Art. 253),assim como de Leis Orgânicas, tais como a de
Recife (Art. 138), de Belo Horizonte (Art. 182,VI), a do Rio de Janeiro (Art. 321, VIII), além de leis ordinárias, como lei
Municipal nº 7.685,de 17 de janeiro de 1994, de Belém, a Lei Municipal nº 2.251, de 30 de novembro de 1994, de Aracaju
relações étnico-raciais positivas, a que tais conteúdos devem conduzir.
Destina-se, o parecer, aos administradores dos sistemas de ensino, de mantenedoras de estabelecimentos
de ensino, aos estabelecimentos de ensino, seus professores e a todos implicados na elaboração, execução, avaliação de programas de interesse educacional, de planos institucionais, pedagógicos e de ensino. Destina-se, também,
às famílias dos estudantes, a eles próprios e a todos os cidadãos comprometidos com a educação dos brasileiros, para
1
) Belém – Lei Municipal nº 7.6985, de 17 de janeiro de 1994, que “Dispõe sobre a inclusão, no currículo escolar da Rede
Municipal de Ensino, na disciplina História, de conteúdo relativo ao estudo da Raça Negra na formação sócio-cultural
brasileira e dá outras providências” Aracaju – Lei Municipal nº 2.251, de 30 de novembro de 1994, que “Dispõe sobre a
inclusão, no currículo escolar da rede municipal de ensino de 1º e 2ºgraus, conteúdos programáticos relativos ao estudo da Raça
Negra na formação sócio-cultural brasileira e dá outras providências São Paulo – Lei Municipal nº 11.973, de 4 de janeiro de
1996, que “Dispõe sobre a introdução nos currículos dasescolas municipais de 1º e 2º graus de estudos contra a discriminação”
Petronilha 0215/SPS
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e a Lei Municipal nº 11.973, de 4 de janeiro de 1996, de São Paulo.1
Junta-se, também, ao disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.096, de 13 de junho de 1990), bem como
no Plano Nacional de Educação (Lei 10.172, de 9 de janeiro de 2001).
Todos estes dispositivos legais, bem como reivindicações e propostas do Movimento Negro ao longo do
século XX, apontam para a necessidade de diretrizes que orientem a formulação de projetos empenhados na valorização da história e cultura dos afro-brasileiros e dos africanos, assim como comprometidos com a de educação de
nele buscarem orientações, quando pretenderem dialogar com os sistemas de ensino, escolas e educadores, no que
diz respeito às relações étnico-raciais, ao reconhecimento e valorização da história e cultura dos afro-brasileiros, à
diversidade da nação brasileira, ao igual direito à educação de qualidade, isto é, não apenas direito ao estudo, mas
também à formação para a cidadania responsável pela construção de uma sociedade justa e democrática.
Em vista disso, foi feita consulta sobre as questões objeto deste parecer, por meio de
questionário encaminhado a grupos do Movimento Negro, a militantes individualmente, aos Conselhos Estaduais e
Municipais de Educação, a professores que vêm desenvolvendo trabalhos que abordam a questão racial, a pais de
alunos, enfim a cidadãos empenhados com a construção de uma sociedade justa, independentemente de seu
pertencimento racial.
Encaminharam-se em torno de mil questionários e o responderam individualmente ou em grupo 250 mulheres
e homens, entre crianças e adultos, com diferentes níveis de escolarização. Suas respostas mostraram a importância
de se tratarem problemas, dificuldades, dúvidas, antes mesmo de o parecer traçar orientações, indicações, normas.
Questões introdutórias
O parecer procura oferecer uma resposta, entre outras, na área da educação, à demanda da população
afrodescendente, no sentido de políticas de ações afirmativas, isto é, de políticas de reparações, e de reconhecimento
e valorização de sua história, cultura, identidade. Trata, ele, de política curricular, fundada em dimensões históricas,
sociais, antropológicas oriundas da realidade brasileira, e busca combater o racismo e as discriminações que atingem
particularmente os negros. Nesta perspectiva, propõe à divulgação e produção de conhecimentos, a formação de
atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnico-racial - descendentes de
africanos, povos indígenas, descendentes de europeus, de asiáticos – para interagirem na construção de uma nação
democrática, em que todos, igualmente, tenham seus direitos garantidos e sua identidade valorizada.
É importante salientar que tais políticas têm como meta o direito dos negros se reconhecerem na cultura
nacional, expressarem visões de mundo próprias, manifestarem com autonomia, individual e coletiva, seus pensamentos. É necessário sublinhar que tais políticas têm, também, como meta o direito dos negros, assim como de todos
cidadãos brasileiros, cursarem cada um dos níveis de ensino, em escolas devidamente instaladas e equipadas,
orientados por professores qualificados para o ensino das diferentes áreas de conhecimentos; com formação para
lidar com as tensas relações produzidas pelo racismo e discriminações, sensíveis e capazes de conduzir a reeducação
das relações entre diferentes grupos étnicoraciais, ou seja, entre descendentes de africanos, de europeus, de asiáticos, e povos indígenas. Estas condições materiais das escolas e de formação de professores são indispensáveis para
uma educação de qualidade, para todos, assim como o é o reconhecimento e valorização da história, cultura e
identidade dos descendentes de africanos.
Políticas de Reparações, de Reconhecimento e Valorização, de Ações Afirmativas
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A demanda por reparações visa a que o Estado e a sociedade tomem medidas para ressarcir os descendentes
de africanos negros, dos danos psicológicos, materiais, sociais, políticos e educacionais sofridos sob o regime
escravista, bem como em virtude das política explícitas ou tácitas de branqueamento da população, de manutenção de
privilégios exclusivos para grupos com poder de governar e de influir na formulação de políticas, no pós-abolição.
Visa também a que tais medidas se concretizem em iniciativas de combate ao racismo e a toda sorte de discriminações.
Cabe ao Estado promover e incentivar políticas de reparações, no que cumpre ao disposto na Constituição
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Federal, Art. 205, que assinala o dever do Estado de garantir indistintamente, por meio da educação, iguais direitos
para o pleno desenvolvimento de todos e de cada um, enquanto pessoa, cidadão ou profissional. Sem a intervenção
do Estado, os postos à margem, entre eles os afro-brasileiros, dificilmente, e as estatísticas o mostram sem deixar
dúvidas, romperão o sistema meritocrático que agrava desigualdades e gera injustiça, ao reger-se por critérios de
exclusão, fundados em preconceitos e manutenção de privilégios para os sempre privilegiados.
Políticas de reparações voltadas para a educação dos negros devem oferecer garantias a essa população de
ingresso, permanência e sucesso na educação escolar, de valorização do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro,
de aquisição das competências e dos conhecimentos tidos como indispensáveis para continuidade nos estudos, de
condições para alcançar todos os requisitos tendo em vista a conclusão de cada um dos níveis de ensino, bem como
para atuar como cidadãos responsáveis e participantes, além de desempenharem com qualificação uma profissão.
A demanda da comunidade afro-brasileira por reconhecimento, valorização e afirmação de direitos, no que diz respeito à educação, passou a ser particularmente apoiada com a promulgação da Lei 10639/2003, que alterou a Lei 9394/
1996, estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de história e cultura afro-brasileiras e africanas.
Reconhecimento implica justiça e iguais direitos sociais, civis, culturais e econômicos, bem como valorização da diversidade daquilo que distingue os negros dos outros grupos que compõem a população brasileira. E isto
requer mudança nos discursos, raciocínios, lógicas, gestos, posturas, modo de tratar as pessoas negras. Requer
também que se conheça a sua história e cultura apresentadas, explicadas, buscando-se especificamente desconstruir
o mito da democracia racial na sociedade brasileira; mito este que difunde a crença de que, se os negros não atingem
os mesmos patamares que os não negros, é por falta de competência ou de interesse, desconsiderando as desigualdades seculares que a estrutura social hierárquica cria com prejuízos para os negros.
Reconhecimento requer a adoção de políticas educacionais e de estratégias pedagógicas de valorização da diversidade, a fim de superar a desigualdade étnico-racial presente na educação escolar brasileira, nos diferentes níveis de
ensino.
Reconhecer exige que se questionem relações étnico-raciais baseadas em preconceitos que desqualificam
os negros e salientam estereótipos depreciativos, palavras e atitudes que, velada ou explicitamente violentas, expressam sentimentos de superioridade em relação aos negros, próprios de uma sociedade hierárquica e desigual.
Reconhecer é também valorizar, divulgar e respeitar os processos históricos de resistência negra desencadeados
pelos africanos escravizados no Brasil e por seus descendentes na contemporaneidade, desde as formas individuais
até as coletivas.
Reconhecer exige a valorização e respeito às pessoas negras, à sua descendência africana, sua cultura e
história. Significa buscar, compreender seus valores e lutas, ser sensível ao sofrimento causado por tantas formas de
desqualificação: apelidos depreciativos, brincadeiras, piadas de mau gosto sugerindo incapacidade, ridicularizando
dos de ensino, comprometidos com a educação de negros e brancos, no sentido de que venham a relacionar-se com
respeito, sendo capazes de corrigir posturas, atitudes e palavras que impliquem desrespeito e discriminação.
Políticas de reparações e de reconhecimento formarão programas de ações afirmativas, isto é, conjuntos de
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seus traços físicos, a textura de seus cabelos, fazendo pouco das religiões de raiz africana. Implica criar condições
para que os estudantes negros não sejam rejeitados em virtude da cor da sua pele, menosprezados em virtude de seus
antepassados terem sido explorados como escravos, não sejam desencorajados de prosseguir estudos, de estudar
questões que dizem respeito à comunidade negra.
Reconhecer exige que os estabelecimentos de ensino, freqüentados em sua maioria por população negra,
contem com instalações e equipamentos sólidos, atualizados, com professores competentes no domínio dos conteú-
ações políticas dirigidas à correção de desigualdades raciais e sociais, orientadas para oferta de tratamento diferenciado com vistas a corrigir desvantagens e marginalização criadas e mantidas por estrutura social excludente e
discriminatória. Ações afirmativas atendem ao determinado pelo Programa Nacional de Direitos Humanos2 , bem
como a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, com o objetivo de combate ao racismo e a discriminações, tais como: a Convenção da UNESCO de 1960, direcionada ao combate ao racismo em todas as formas de ensino,
bem como a Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Discriminações
Correlatas de 2001.
Assim sendo, sistemas de ensino e estabelecimentos de diferentes níveis converterão as demandas dos
afro-brasileiros em políticas públicas de Estado ou institucionais, ao tomarem decisões e iniciativas com vistas a
reparações, reconhecimento e valorização da história e cultura dos afro-brasileiros, à constituição de programas de
ações afirmativas, medidas estas coerentes com um projeto de escola, de educação, de formação de cidadãos que
explicitamente se esbocem nas relações pedagógicas cotidianas. Medidas que, convém, sejam compartilhadas pelos
sistemas de ensino, estabelecimentos, processos de formação de professores, comunidade, professores, alunos e
seus pais.
Medidas que repudiam, como prevê a Constituição Federal em seu Art.3º, IV, o “preconceito de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” e reconhecem que todos são portadores de singularidade
irredutível e que a formação escolar tem de estar atenta para o desenvolvimento de suas personalidades (Art.208, IV).
Educação das relações étnico-raciais
O sucesso das políticas públicas de Estado, institucionais e pedagógicas, visando a reparações, reconhecimento e valorização da identidade, da cultura e da história dos negros brasileiros depende necessariamente de
condições físicas, materiais, intelectuais e afetivas favoráveis para o ensino e para aprendizagens; em outras palavras, todos os alunos negros e não negros, bem como seus professores, precisam sentir-se valorizados e apoiados.
Depende também, de maneira decisiva, da reeducação das relações entre negros e brancos, o que aqui estamos
designando como relações étnico-raciais. Depende, ainda, de trabalho conjunto, de articulação entre processos
educativos escolares, políticas públicas, movimentos sociais, visto que as mudanças éticas, culturais, pedagógicas
e políticas nas relações étnico-raciais não se limitam à escola.
É importante destacar que se entende por raça a construção social forjada nas tensas relações entre brancos
e negros, muitas vezes simuladas como harmoniosas, nada tendo a ver com o conceito biológico de raça cunhado no
século XVIII e hoje sobejamente superado. Cabe esclarecer que o termo raça é utilizado com freqüência nas relações
sociais brasileiras, para informar como determinadas características físicas, como cor de pele, tipo de cabelo, entre
outras, influenciam, interferem e até mesmo determinam o destino e o lugar social dos sujeitos no interior da socieda-
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de brasileira.
Contudo, o termo foi ressignificado pelo Movimento Negro que, em várias situações, o utiliza com um
sentido político e de valorização do legado deixado pelos africanos. É importante, também, explicar que o emprego do
termo étnico, na expressão étnico-racial, serve para marcar que essas relações tensas devidas a diferenças na cor da
pele e traços fisionômicos o são também devido à raiz cultural plantada na ancestralidade africana, que difere em visão
de mundo, valores e princípios das de origem indígena, européia e asiática.
Convivem, no Brasil, de maneira tensa, a cultura e o padrão estético negro e africano e um padrão estético e
cultural branco europeu. Porém, a presença da cultura negra e o fato de 45% da população brasileira ser composta de
2
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Ministério da Justiça. Programa Nacional de Direitos Humanos. Brasília, 1996
negros (de acordo com o censo do IBGE) não têm sido suficientes para eliminar ideologias, desigualdades e estereótipos racistas. Ainda persiste em nosso país um imaginário étnico-racial que privilegia a brancura e valoriza principalmente as raízes européias da sua cultura, ignorando ou pouco valorizando as outras, que são a indígena, a
africana, a asiática.
Os diferentes grupos, em sua diversidade, que constituem o Movimento Negro brasileiro, têm comprovado o
quanto é dura a experiência dos negros de ter julgados negativamente seu comportamento, idéias e intenções antes
mesmo de abrirem a boca ou tomarem qualquer iniciativa. Têm, eles, insistido no quanto é alienante a experiência de fingir
ser o que não é para ser reconhecido, de quão dolorosa pode ser a experiência de deixar-se assimilar por uma visão de
mundo que pretende impor-se como superior e, por isso, universal e que os obriga a negarem a tradição do seu povo.
Se não é fácil ser descendente de seres humanos escravizados e forçados à condição de objetos utilitários
ou a semoventes, também é difícil descobrir-se descendente dos escravizadores, temer, embora veladamente, revanche
dos que, por cinco séculos, têm sido desprezados e massacrados.
Para reeducar as relações étnico-raciais, no Brasil, é necessário fazer emergir as dores e medos que têm sido
gerados. É preciso entender que o sucesso de uns tem o preço da marginalização e da desigualdade impostas a
outros. E então decidir que sociedade queremos construir daqui para frente.
Como bem salientou Frantz Fanon3 3, os descendentes dos mercadores de escravosdos senhores de ontem,
não têm, hoje, de assumir culpa pelas desumanidades provocadas por seus antepassados. No entanto, têm eles a
responsabilidade moral e política de combater o racismo, as discriminações e, juntamente com os que vêm sendo
mantidos à margem, os negros, construir relações raciais e sociais sadias, em que todos cresçam e se realizem
enquanto seres humanos e cidadãos. Não fossem por estas razões, eles a teriam de assumir, pelo fato de usufruírem
do muito que o trabalho escravo possibilitou ao país.
Assim sendo, a educação das relações étnico-raciais impõe aprendizagens entre brancos e negros, trocas de
conhecimentos, quebra de desconfianças, projeto conjunto para construção de uma sociedade justa, igual, equânime.
Combater o racismo, trabalhar pelo fim da desigualdade social e racial, empreender reeducação das relações
étnico-raciais não são tarefas exclusivas da escola. As formas de discriminação de qualquer natureza não têm o seu
nascedouro na escola, porém o racismo, as desigualdades e discriminações correntes na sociedade perpassam por ali.
Para que as instituições de ensino desempenhem a contento o papel de educar, é necessário que se constituam em
espaço democrático de produção e divulgação de conhecimentos e de posturas que visam a uma sociedade justa. A
escola tem papel preponderante para eliminação das discriminações e para emancipação dos grupos discriminados,
ao proporcionar acesso aos conhecimentos científicos, a registros culturais diferenciados, à conquista de racionalidade
que rege as relações sociais e raciais, a conhecimentos avançados, indispensáveis para consolidação e concerto das
nações como espaços democráticos e igualitários.
Para obter êxito, a escola e seus professores não podem improvisar. Têm que desfazer mentalidade racista e
díveis para que se vençam discrepâncias entre o que se sabe e a realidade, se compreendam concepções e ações, uns
dos outros, se elabore projeto comum de combate ao racismo e a discriminações.
3
FRANTZ, Fanon. Os Condenados da Terra. 2.ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1979.
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discriminadora secular, superando o etnocentrismo europeu, reestruturando relações étnico-raciais e sociais,
desalienando processos pedagógicos. Isto não pode ficar reduzido a palavras e a raciocínios desvinculados da
experiência de ser inferiorizados vivida pelos negros, tampouco das baixas classificações que lhe são atribuídas nas
escalas de desigualdades sociais, econômicas, educativas e políticas
Diálogo com estudiosos que analisam, criticam estas realidades e fazem propostas, bem como com grupos
do Movimento Negro, presentes nas diferentes regiões e estados, assim como em inúmeras cidades, são imprescin-
Temos, pois, pedagogias de combate ao racismo e a discriminações por criar. É claro que há experiências de
professores e de algumas escolas, ainda isoladas, que muito vão ajudar.
Para empreender a construção dessas pedagogias, é fundamental que se desfaçam alguns equívocos. Um deles diz
respeito à preocupação de professores no sentido de designar ou não seus alunos negros como negros ou como
pretos, sem ofensas.
Em primeiro lugar, é importante esclarecer que ser negro no Brasil não se limita às características físicas.
Trata-se, também, de uma escolha política. Por isso, o é quem assim se define. Em segundo lugar, cabe lembrar que
preto é um dos quesitos utilizados pelo IBGE para classificar, ao lado dos outros – branco, pardo, indígena - a cor da
população brasileira. Pesquisadores de diferentes áreas, inclusive da educação, para fins de seus estudos, agregam
dados relativos a pretos e pardos sob a categoria negros, já que ambos reúnem, conforme alerta o Movimento Negro,
aqueles que reconhecem sua ascendência africana.
É importante tomar conhecimento da complexidade que envolve o processo de construção da identidade
negra em nosso país. Processo esse, marcado por uma sociedade que, para discriminar os negros, utiliza-se tanto da
desvalorização da cultura de matriz africana como dos aspectos físicos herdados pelos descendentes de africanos.
Nesse processo complexo, é possível, no Brasil, que algumas pessoas de tez clara e traços físicos europeus, em
virtude de o pai ou a mãe ser negro(a), se designarem negros; que outros, com traços físicos africanos, se digam
brancos. É preciso lembrar que o termo negro começou a ser usado pelos senhores para designar pejorativamente os
escravizados e este sentido negativo da palavra se estende até hoje. Contudo, o Movimento Negro ressignificou
esse termo dando-lhe um sentido político e positivo. Lembremos os motes muito utilizados no final dos anos 1970 e
no decorrer dos anos 1980, 1990: Negro é lindo! Negra, cor da raça brasileira! Negro que te quero negro! 100% Negro!
Não deixe sua cor passar em branco! Este último utilizado na campanha do censo de 1990.
Outro equívoco a enfrentar é a afirmação de que os negros se discriminam entre si e que são racistas também.
Esta constatação tem de ser analisada no quadro da ideologia do branqueamento que divulga a idéia e o sentimento
de que as pessoas brancas seriam mais humanas, teriam inteligência superior e, por isso, teriam o direito de comandar
e de dizer o que é bom para todos. Cabe lembrar que, no pós-abolição, foram formuladas políticas que visavam ao
branqueamento da população pela eliminação simbólica e material da presença dos negros. Nesse sentido, é possível
que pessoas negras sejam influenciadas pela ideologia do branqueamento e, assim, tendam a reproduzir o preconceito do qual são vítimas. O racismo imprime marcas negativas na subjetividade dos negros e também na dos que os
discriminam.
Mais um equívoco a superar é a crença de que a discussão sobre a questão racial se limita ao Movimento
Negro e a estudiosos do tema e não à escola. A escola, enquanto instituição social responsável por assegurar o
direito da educação a todo e qualquer cidadão, deverá se posicionar politicamente, como já vimos, contra toda e
qualquer forma de discriminação. A luta pela superação do racismo e da discriminação racial é, pois, tarefa de todo e
cultura afro
qualquer educador, independentemente do seu pertencimento étnico-racial, crença religiosa ou posição política. O
racismo, segundo o Artigo 5º da Constituição Brasileira, é crime inafiançável e isso se aplica a todos os cidadãos e
instituições, inclusive, à escola.
Outro equívoco a esclarecer é de que o racismo, o mito da democracia racial e a ideologia do branqueamento
só atingem os negros. Enquanto processos estruturantes e constituintes da formação histórica e social brasileira,
estes estão arraigados no imaginário social e atingem negros, brancos e outros grupos étnico-raciais. As formas, os
níveis e os resultados desses processos incidem de maneira diferente sobre os diversos sujeitos e interpõem diferentes dificuldades nas suas trajetórias de vida escolar e social. Por isso, a construção de estratégias educacionais que
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visem ao combate do racismo é uma tarefa de todos os educadores, independentemente do seu pertencimento étnicoracial.
Pedagogias de combate ao racismo e a discriminações elaboradas com o objetivo de educação das relações
étnico/raciais positivas têm como objetivo fortalecer entre os negros e despertar entre os brancos a consciência
negra. Entre os negros, poderão oferecer conhecimentos e segurança para orgulharem-se da sua origem africana;
para os brancos, poderão permitir que identifiquem as influências, a contribuição, a participação e a importância da
história e da cultura dos negros no seu jeito de ser, viver, de se relacionar com as outras pessoas, notadamente as
negras. Também farão parte de um processo de reconhecimento, por parte do Estado, da sociedade e da escola, da
dívida social que têm em relação ao segmento negro da população, possibilitando uma tomada de posição explícita
contra o racismo e a discriminação racial e a construção de ações afirmativas nos diferentes níveis de ensino da
educação brasileira.
Tais pedagogias precisam estar atentas para que todos, negros e não negros, além de ter acesso a conhecimentos básicos tidos como fundamentais para a vida integrada à sociedade, exercício profissional competente,
recebam formação que os capacite para forjar novas relações étnico-raciais. Para tanto, há necessidade, como já
vimos, de professores qualificados para o ensino das diferentes áreas de conhecimentos e, além disso, sensíveis e
capazes de direcionar positivamente as relações entre pessoas de diferentes pertencimento étnico-racial, no sentido
do respeito e da correção de posturas, atitudes, palavras preconceituosas. Daí a necessidade de se insistir e investir
para que os professores, além de sólida formação na área específica de atuação, recebam formação que os capacite
não só a compreender a importância das questões relacionadas à diversidade étnico-racial, mas a lidar positivamente
com elas e, sobretudo criar estratégias pedagógicas que possam auxiliar a reeducá-las.
Até aqui apresentaram-se orientações que justificam e fundamentam as determinações de caráter normativo
que seguem.
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana – Determinações
A obrigatoriedade de inclusão de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana nos currículos da Educação
Básica trata-se de decisão política, com fortes repercussões pedagógicas, inclusive na formação de professores. Com
esta medida, reconhece-se que, além de garantir vagas para negros nos bancos escolares, é preciso valorizar devidamente a história e cultura de seu povo, buscando reparar danos, que se repetem há cinco séculos, à sua identidade e
a seus direitos. A relevância do estudo de temas decorrentes da história e cultura afro-brasileira e africana não se
restringe à população negra, ao contrário, dizem respeito a todos os brasileiros, uma vez que devem educar-se
enquanto cidadãos atuantes no seio de uma sociedade multicultural e pluriétnica, capazes de construir uma nação
democrática.
de ensino, condições oferecidas para aprendizagem, objetivos tácitos e explícitos da educação oferecida pelas
escolas.
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É importante destacar que não se trata de mudar um foco etnocêntrico marcadamente de raiz européia por um
africano, mas de ampliar o foco dos currículos escolares para a diversidade cultural, racial, social e econômica
brasileira. Nesta perspectiva, cabe às escolas incluir no contexto dos estudos e atividades, que proporciona diariamente, também as contribuições histórico-culturais dos povos indígenas e dos descendentes de asiáticos, além das
de raiz africana e européia. É preciso ter clareza que o Art. 26A acrescido à Lei 9.394/1996 provoca bem mais do que
inclusão de novos conteúdos, exige que se repensem relações étnico-raciais, sociais, pedagógicas, procedimentos
A autonomia dos estabelecimentos de ensino para compor os projetos pedagógicos, no cumprimento do
exigido pelo Art. 26A da Lei 9394/1996, permite que se valham da colaboração das comunidades a que a escola serve,
do apoio direto ou indireto de estudiosos e do Movimento Negro, com os quais estabelecerão canais de comunicação, encontrarão formas próprias de incluir nas vivências promovidas pela escola, inclusive em conteúdos de disciplinas, as temáticas em questão. Caberá, aos sistemas de ensino, às mantenedoras, à coordenação pedagógica dos
estabelecimentos de ensino e aos professores, com base neste parecer, estabelecer conteúdos de ensino, unidades
de estudos, projetos e programas, abrangendo os diferentes componentes curriculares. Caberá, aos administradores
dos sistemas de ensino e das mantenedoras prover as escolas, seus professores e alunos de material bibliográfico e
de outros materiais didáticos, além de acompanhar os trabalhos desenvolvidos, a fim de evitar que questões tão
complexas, muito pouco tratadas, tanto na formação inicial como continuada de professores, sejam abordadas de
maneira resumida, incompleta, com erros.
Em outras palavras, aos estabelecimentos de ensino está sendo atribuída responsabilidade de acabar com o
modo falso e reduzido de tratar a contribuição dos africanos escravizados e de seus descendentes para a construção
da nação brasileira; de fiscalizar para que, no seu interior, os alunos negros deixem de sofrer os primeiros e continuados atos de racismo de que são vítimas. Sem dúvida, assumir estas responsabilidades implica compromisso com o
entorno sociocultural da escola, da comunidade onde esta se encontra e a que serve, compromisso com a formação
de cidadãos atuantes e democráticos, capazes de compreender as relações sociais e étnico-raciais de que participam
e ajudam a manter e/ou a reelaborar, capazes de decodificar palavras, fatos e situações a partir de diferentes perspectivas, de desempenhar-se em áreas de competências que lhes permitam continuar e aprofundar estudos em diferentes
níveis de formação.
Precisa, o Brasil, país multi-étnico e pluricultural, de organizações escolares em que todos se vejam incluídos, em que lhes seja garantido o direito de aprender e de ampliar conhecimentos, sem ser obrigados a negar a si
mesmos, ao grupo étnico/racial a que pertencem e a adotar costumes, idéias e comportamentos que lhes são adversos. E estes, certamente, serão indicadores da qualidade da educação que estará sendo oferecida pelos estabelecimentos de ensino de diferentes níveis.
Para conduzir suas ações, os sistemas de ensino, os estabelecimentos e os professores terão como referência, entre outros pertinentes às bases filosóficas e pedagógicas que assumem, os princípios a seguir explicitados.
CONSCIÊNCIA POLÍTICA E HISTÓRICA DA DIVERSIDADE
Este princípio deve conduzir:
- à igualdade básica de pessoa humana como sujeito de direitos;
- à compreensão de que a sociedade é formada por pessoas que pertencem a grupos étnico raciais distintos, que
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possuem cultura e história próprias, igualmente valiosas e que em conjunto constroem, na nação brasileira, sua
história;
- ao conhecimento e à valorização da história dos povos africanos e da cultura afrobrasileira na construção histórica
e cultural brasileira;
- à superação da indiferença, injustiça e desqualificação com que os negros, os povos indígenas e também as classes
populares às quais os negros, no geral, pertencem, são comumente tratados;
- à desconstrução, por meio de questionamentos e análises críticas, objetivando eliminar conceitos, idéias, comportamentos veiculados pela ideologia do branqueamento, pelo mito da democracia racial, que tanto mal fazem a negros
e brancos;
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- à busca, da parte de pessoas, em particular de professores não familiarizados com a análise das relações étnicoraciais e sociais com o estudo de história e cultura afrobrasileira e africana, de informações e subsídios que lhes
permitam formular concepções não baseadas em preconceitos e construir ações respeitosas;
- ao diálogo, via fundamental para entendimento entre diferentes, com a finalidade de negociações, tendo em vista
objetivos comuns; visando a uma sociedade justa.
FORTALECIMENTO DE IDENTIDADES E DE DIREITOS
O princípio deve orientar para:
- o desencadeamento de processo de afirmação de identidades, de historicidade negada ou distorcida;
- o rompimento com imagens negativas forjadas por diferentes meios de comunicação, contra os negros e os povos
indígenas;
- o esclarecimentos a respeito de equívocos quanto a uma identidade humana universal;
- o combate à privação e violação de direitos;
- a ampliação do acesso a informações sobre a diversidade da nação brasileira e sobre a recriação das identidades,
provocada por relações étnico-raciais;
- as excelentes condições de formação e de instrução que precisam ser oferecidas, nos diferentes níveis e modalidades de ensino, em todos os estabelecimentos, inclusive os localizados nas chamadas periferias urbanas e nas zonas
rurais.
AÇÕES EDUCATIVAS DE COMBATE AO RACISMO E A DISCRIMINAÇÕES
O princípio encaminha para:
- a conexão dos objetivos, estratégias de ensino e atividades com a experiência de vida dos alunos e professores,
valorizando aprendizagens vinculadas às suas relações com pessoas negras, brancas, mestiças, assim como as
vinculadas às relações entre negros, indígenas e brancos no conjunto da sociedade;
- a crítica pelos coordenadores pedagógicos, orientadores educacionais, professores, das representações dos negros e de outras minorias nos textos, materiais didáticos, bem como providências para corrigi-las;
- condições para professores e alunos pensarem, decidirem, agirem, assumindo responsabilidade por relações étnicoraciais positivas, enfrentando e superando discordâncias, conflitos, contestações, valorizando os contrastes das
diferenças;
- valorização da oralidade, da corporeidade e da arte, por exemplo, como a dança, marcas da cultura de raiz africana, ao
lado da escrita e da leitura;
insere a escola, sob a coordenação dos professores, na elaboração de projetos político-pedagógicos que contemplem a diversidade étnico-racial.
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- educação patrimonial, aprendizado a partir do patrimônio cultural afro-brasileiro, visando a preservá-lo e a difundilo;
- o cuidado para que se dê um sentido construtivo à participação dos diferentes grupos sociais, étnico-raciais na
construção da nação brasileira, aos elos culturais e históricos entre diferentes grupos étnico-raciais, às alianças
sociais;
- participação de grupos do Movimento Negro, e de grupos culturais negros, bem como da comunidade em que se
Estes princípios e seus desdobramentos mostram exigências de mudança de mentalidade, de maneiras de
pensar e agir dos indivíduos em particular, assim como das instituições e de suas tradições culturais. É neste sentido
que se fazem as seguintes determinações:
- O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, evitando-se distorções, envolverá articulação entre
passado, presente e futuro no âmbito de experiências, construções e pensamentos produzidos em diferentes circunstâncias e realidades do povo negro. É um meio privilegiado para a educação das relações étnico-raciais e tem por
objetivos o reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afrobrasileiros, garantia de seus
direitos de cidadãos, reconhecimento e igual valorização das raízes africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas, européias, asiáticas.
- O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana se fará por diferentes meios, em atividades curriculares ou
não, em que: - se explicitem, busquem compreender e interpretar, na perspectiva de quem o formule, diferentes
formas de expressão e de organização de raciocínios e pensamentos de raiz da cultura africana; - promovam-se
oportunidades de diálogo em que se conheçam, se ponham em comunicação diferentes sistemas simbólicos e
estruturas conceituais, bem como se busquem formas de convivência respeitosa, além da construção de projeto de
sociedade em que todos se sintam encorajados a expor, defender sua especificidade étnico-racial e a buscar garantias para que todos o façam; - sejam incentivadas atividades em que pessoas – estudantes, professores, servidores,
integrantes da comunidade externa aos estabelecimentos de ensino – de diferentes culturas interatuem e se interpretem reciprocamente, respeitando os valores, visões de mundo, raciocínios e pensamentos de cada um.
- O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a educação das relações étnico-raciais, tal como explicita
o presente parecer, se desenvolverão no cotidiano das escolas, nos diferentes níveis e modalidades de ensino,
como conteúdo de disciplinas,3 particularmente, Educação Artística, Literatura e História do Brasil, sem prejuízo das
demais4 , em atividades curriculares ou não, trabalhos em salas de aula, nos 3 laboratórios de ciências e de informática,
na utilização de sala de leitura, biblioteca, brinquedoteca, áreas de recreação, quadra de esportes e outros ambientes
escolares.
- O ensino de História Afro-Brasileira abrangerá, entre outros conteúdos, iniciativas e organizações negras, incluindo
a história dos quilombos, a começar pelo de Palmares, e de remanescentes de quilombos, que têm contribuído para
o desenvolvimento de comunidades, bairros, localidades, municípios, regiões (exemplos: associações negras recreativas, culturais, educativas, artísticas, de assistência, de pesquisa, irmandades religiosas, grupos do Movimento
Negro). Será dado destaque a acontecimentos e realizações próprios de cada região e localidade.
- Datas significativas para cada região e localidade serão devidamente assinaladas. O 13 de maio, Dia Nacional de
Denúncia contra o Racismo, será tratado como o dia de denúncia das repercussões das políticas de eliminação física
e simbólica da população afro-brasileira no pós-abolição, e de divulgação dos significados da Lei áurea para os
negros. No 20 de novembro será celebrado o Dia Nacional da Consciência Negra, entendendo-se consciência negra
nos termos explicitados anteriormente neste parecer. Entre outras datas de significado histórico e político deverá ser
assinalado o 21 de março, Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.
- Em História da África, tratada em perspectiva positiva, não só de denúncia da miséria e discriminações que atingem
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o continente, nos tópicos pertinentes se fará articuladamente com a história dos afrodescendentes no Brasil e serão
abordados temas relativos: - ao papel dos anciãos e dos griots como guardiãos da memória histórica; - à história da
ancestralidade e religiosidade africana; - aos núbios e aos egípcios, como civilizações que contribuíram decisiva3
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§ 2°, Art 26 A, Lei 9394-1996: Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de
todo
o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História Brasileiras.
4
Neste sentido, ver obra que pode ser solicitada ao MEC: MUNANGA, Kabengele, org.. Superando o
Racismo na Escola. Brasília, Ministário da Educação, 2001.
mente para o desenvolvimento da humanidade; - às civilizações e organizações políticas pré-coloniais, como os
reinos do Mali, do Congo e do Zimbabwe; - ao tráfico e à escravidão do ponto de vista dos escravizados; - ao
papel de europeus, de asiáticos e também de africanos no tráfico; - à ocupação colonial na perspectiva dos
africanos; - às lutas pela independência política dos países africanos; - às ações em prol da união africana em
nossos dias, bem como o papel da União Africana, para tanto; - às relações entre as culturas e as histórias dos
povos do continente africano e os da diáspora; - à formação compulsória da diáspora, vida e existência cultural
e histórica dos africanos e seus descendentes fora da África; - à diversidade da diáspora, hoje, nas Américas,
Caribe, Europa, Ásia; - aos acordos políticos, econômicos, educacionais e culturais entre África, Brasil e outros
países da diáspora.
- O ensino de Cultura Afro-Brasileira destacará o jeito próprio de ser, viver e pensa rmanifestado tanto no dia a dia,
quanto em celebrações como congadas, moçambiques, ensaios, maracatus, rodas de samba, entre outras.
- O ensino de Cultura Africana abrangerá: - as contribuições do Egito para a ciência e filosofia ocidentais; - as
universidades africanas Timbuktu, Gao, Djene que floresciam no século XVI; - as tecnologias de agricultura, de
beneficiamento de cultivos, de mineração e de edificações trazidas pelos escravizados, bem como a produção
científica, artística (artes plásticas, literatura, música, dança, teatro) política, na atualidade.
- O ensino de História e de Cultura Afro-Brasileira, se fará por diferentes meios, inclusive, a realização de projetos
de diferentes naturezas, no decorrer do ano letivo, com vistas à divulgação e estudo da participação dos africanos e de seus descendentes em episódios da história do Brasil, na construção econômica, social e cultural da
nação, destacando-se a atuação de negros em diferentes áreas do conhecimento, de atuação profissional, de
criação tecnológica e artística, de luta social (tais como: Zumbi, Luiza Nahim, Aleijadinho, Padre Maurício, Luiz
Gama, Cruz e Souza, João Cândido, André Rebouças, Teodoro Sampaio, José Correia Leite, Solano Trindade,
Antonieta de Barros, Edison Carneiro, Lélia Gonzáles, Beatriz Nascimento, Milton Santos, Guerreiro Ramos,
Clóvis Moura, Abdias do Nascimento, Henrique Antunes Cunha, Tereza Santos, Emmanuel Araújo, Cuti, Alzira
Rufino, Inaicyra Falcão dos Santos, entre outros).
- O ensino de História e Cultura Africana se fará por diferentes meios, inclusive a realização de projetos de diferente
natureza, no decorrer do ano letivo, com vistas à divulgação e estudo da participação dos africanos e de seus
descendentes na diáspora, em episódios da história mundial, na construção econômica, social e cultural das
nações do continente africano e da diáspora, destacando-se a atuação de negros em diferentes áreas do conhecimento, de atuação profissional, de criação tecnológica e artística, de luta social (entre outros: rainha Nzinga,
Toussaint-L’Ouverture, Martin Luther King, Malcom X, Marcus Garvey, Aimé Cesaire, Léopold Senghor, Mariama
Bâ, Amílcar Cabral, Cheik Anta Diop, Steve Biko, Nelson Mandela, Aminata Traoré, Christiane Taubira).
Para tanto, os sistemas de ensino e os estabelecimentos de Educação Básica, nos níveis de Educação
Infantil, Educação Fundamental, Educação Média, Educação de Jovens e Adultos, Educação Superior, precisarão
providenciar:
- Registro da história não contada dos negros brasileiros, tais como em remanescentes de quilombos, comunida- Apoio sistemático aos professores para elaboração de planos, projetos, seleção de conteúdos e métodos de
ensino, cujo foco seja História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e a Educação das Relações Étnico-Raciais.
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des e territórios negros urbanos e rurais.
cultura afro
- Mapeamento e divulgação de experiências pedagógicas de escolas, estabelecimentos de ensino superior, secretarias de educação, assim como levantamento das principais dúvidas e dificuldades dos professores em relação
ao trabalho com a questão racial na escola e encaminhamento de medidas para resolvê-las, feitos pela administração dos sistemas de ensino e por Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros.
- Articulação entre os sistemas de ensino, estabelecimentos de ensino superior, centros de pesquisa, Núcleos de
Estudos Afro-Brasileiros, escolas, comunidade e movimentos sociais, visando à formação de professores para a
diversidade étnico-racial.
- Instalação, nos diferentes sistemas de ensino, de grupo de trabalho para discutir e coordenar planejamento e
execução da formação de professores para atender ao disposto neste parecer quanto à Educação das Relações
Étnico-Raciais e ao determinado nos Art. 26 e 26A da Lei 9394/1996, com o apoio do Sistema Nacional de
Formação Continuada e Certificação de Professores do MEC.
- Introdução, nos cursos de formação de professores e de outros profissionais da educação: de análises das
relações sociais e raciais no Brasil; de conceitos e de suas bases teóricas, tais como racismo, discriminações,
intolerância, preconceito, estereótipo, raça, etnia, cultura, classe social, diversidade, diferença, multiculturalismo;
de práticas pedagógicas, de materiais e de textos didáticos, na perspectiva da reeducação das relações étnicoraciais e do ensino e aprendizagem da História e cultura dos Afro-brasileiros e dos Africanos.
- Inclusão de discussão da questão racial como parte integrante da matriz curricular, tanto dos cursos de licenciatura para Educação Infantil, os anos iniciais e finais da Educação Fundamental, Educação Média, Educação de
Jovens e Adultos, como de processos de formação continuada de professores, inclusive de docentes no Ensino
Superior.
- Inclusão, respeitada a autonomia dos estabelecimentos do Ensino Superior, nos conteúdos de disciplinas e em
atividades curriculares dos cursos que ministra, de Educação das Relações Étnico-Raciais, de conhecimentos de
matriz africana e/ou que dizem respeito à população negra. Por exemplo: em Medicina, entre outras questões,
estudo da anemia falciforme, da problemática da pressão alta; em Matemática, contribuições de raiz africana,
identificadas e descritas pela Etno-Matemática; em Filosofia, estudo da filosofia tradicional africana e de contribuições de filósofos africanos e afrodescendentes da atualidade.
- Inclusão de bibliografia relativa à história e cultura afro-brasileira e africana às relações étnico-raciais, aos
problemas desencadeados pelo racismo e por outras discriminações, à pedagogia anti-racista nos programas de
concursos públicos para admissão de professores.
- Inclusão, em documentos normativos e de planejamento dos estabelecimentos de ensino de todos os níveis estatutos, regimentos, planos pedagógicos, planos de ensino
- de objetivos explícitos, assim como de procedimentos para sua consecução, visando ao combate do racismo, das
discriminações, e ao reconhecimento, valorização e ao respeito das histórias e culturas afro-brasileira e africana.
- Previsão, nos fins, responsabilidades e tarefas dos conselhos escolares e de outros órgãos colegiados, do exame
e encaminhamento de solução para situações de racismo e de discriminações, buscando-se criar situações
educativas em que as vítimas recebam apoio requerido para superar o sofrimento e os agressores, orientação
para que compreendam a dimensão do que praticaram e ambos, educação para o reconhecimento, valorização e
respeito mútuos.
- Inclusão de personagens negros, assim como de outros grupos étnico-raciais, em cartazes e outras ilustrações
sobre qualquer tema abordado na escola, a não ser quando tratar de manifestações culturais próprias, ainda que
não exclusivas, de um determinado grupo étnico-racial.
- Organização de centros de documentação, bibliotecas, midiotecas, museus, exposições em que se divulguem
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valores, pensamentos, jeitos de ser e viver dos diferentes grupos étnico raciais brasileiros, particularmentedos
afrodescendentes.
- Identificação, com o apoio dos Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, de fontes de conhecimentos de origem africana, a fim de selecionarem-se conteúdos e procedimentos de ensino e de aprendizagens;
- Incentivo, pelos sistemas de ensino, a pesquisas sobre processos educativos orientados por valores, visões de
mundo, conhecimentos afro-brasileiros e indígenas, com o objetivo de ampliação e fortalecimento de bases teóricas
para a educação brasileira.
- Identificação, coleta, compilação de informações sobre a população negra, com vistas à formulação de políticas
públicas de Estado, comunitárias e institucionais.
- Edição de livros e de materiais didáticos, para diferentes níveis e modalidades de ensino, que atendam ao disposto
neste parecer, em cumprimento ao disposto no Art. 26A da LDB, e, para tanto, abordem a pluralidade cultural e a
diversidade étnico-racial da nação brasileira, corrijam distorções e equívocos em obras já publicadas sobre a
história, a cultura, a identidade dos afrodescendentes, sob o incentivo e supervisão dos programas de difusão de
livros educacionais do MEC – Programa Nacional do Livro Didático e Programa Nacional de Bibliotecas Escolares
(PNBE).
- Divulgação, pelos sistemas de ensino e mantenedoras, com o apoio dos Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, de
uma bibliografia afro-brasileira e de outros materiais como mapas da diáspora, da África, de quilombos brasileiros,
fotografias de territórios negros urbanos e rurais, reprodução de obras de arte afro-brasileira e africana a serem
distribuídos nas escolas da rede, com vistas à formação de professores e alunos para o combate à discriminação e
ao racismo.
- Oferta de Educação Fundamental em áreas de remanescentes de quilombos, contando as escolas com professores
e pessoal administrativo que se disponham a conhecer física e culturalmente, a comunidade e a formar-se para
trabalhar com suas especificidades.
- Garantia, pelos sistemas de ensino e entidades mantenedoras, de condições humanas, materiais e financeiras para
execução de projetos com o objetivo de Educação das Relações Étnico-raciais e estudo de História e Cultura AfroBrasileira e Africana, assim como organização de serviços e atividades que controlem, avaliem e redimensionem sua
consecução, que exerçam fiscalização das políticas adotadas e providenciem correção de distorções.
- Realização, pelos sistemas de ensino federal, estadual e municipal, de atividades periódicas, com a participação das
redes das escolas públicas e privadas, de exposição, avaliação e divulgação dos êxitos e dificuldades do ensino e
aprendizagem de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e da Educação das Relações Étnico-Raciais; assim
como comunicação detalhada dos resultados obtidos ao Ministério da Educação, à Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, ao Conselho Nacional de Educação, e aos respectivos conselhos Estaduais e Municipais
de Educação, para que encaminhem providências, quando for o caso.
- Adequação dos mecanismos de avaliação das condições de funcionamento dos estabelecimentos de ensino, tanto
da educação básica quanto superior, ao disposto neste Parecer; inclusive com a inclusão nos formulários, preenchidos pelas comissões de avaliação, nos itens relativos a currículo, atendimento aos alunos, projeto pedagógico,
plano institucional, de quesitos que contemplem as orientações e exigências aqui formuladas.
ensino de diferentes disciplinas e atividades educacionais, assim como para outros profissionais interessados a fim
de que possam estudar, interpretar as orientações, enriquecer, executar as determinações aqui feitas e avaliar seu
próprio trabalho e resultados obtidos por seus alunos, considerando princípios e critérios apontados.
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cultura afro
- Disponibilização deste parecer, na sua íntegra, para os professores de todos os níveis de ensino, responsáveis pelo
Obrigatoriedade do Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras, Educação das
Relações Étnico-Raciais e os Conselhos de Educação
Diretrizes são dimensões normativas, reguladoras de caminhos, embora não fechadas a que historicamente
possam, a partir das determinações iniciais, tomar novos rumos. Diretrizes não visam a desencadear ações uniformes,
todavia, objetivam oferecer referências e critérios para que se implantem ações, as avaliem e reformulem no que e
quando necessário.
Estas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico Raciais e para o Ensino de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, na medida em que procedem de ditames constitucionais e de marcos
legais nacionais, na medida em que se referem ao resgate de uma comunidade que povoou e construiu a nação
brasileira, atingem o âmago do pacto federativo. Nessa medida, cabe aos conselhos de Educação dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios aclimatar tais diretrizes, dentro do regime de colaboração e da autonomia de entes
federativos, a seus respectivos sistemas, dando ênfase à importância de os planejamentos valorizarem, sem omitir
outras regiões, a participação dos afrodescendentes, do período escravista aos nossos dias, na sociedade, economia, política, cultura da região e da localidade; definindo medidas urgentes para formação de professores; incentivando o desenvolvimento de pesquisas bem como envolvimento comunitário.
A esses órgãos normativos cabe, pois, a tarefa de adequar o proposto neste parecer à realidade de cada
sistema de ensino. E, a partir daí, deverá ser competência dos órgãos executores - administrações de cada sistema de
ensino, das escolas - definir estratégias que, quando postas em ação, viabilizarão o cumprimento efetivo da Lei de
Diretrizes e Bases que estabelece a formação básica comum, o respeito aos valores culturais, como princípios constitucionais da educação tanto quanto da dignidade da pessoa humana (inciso III do art. 1), garantindo-se a promoção
do bem de todos, sem preconceitos (inciso IV do Art. 3) a prevalência dos direitos humanos (inciso II do art. 4°) e
repúdio ao racismo (inciso VIII do art. 4°).
Cumprir a Lei é, pois, responsabilidade de todos e não apenas do professor em sala de aula. Exige-se, assim,
um comprometimento solidário dos vários elos do sistema de ensino brasileiro, tendo-se como ponto de partida o
presente parecer, que junto com outras diretrizes e pareceres e resoluções, têm o papel articulador e coordenador da
organização da educação nacional.
II – VOTO DA COMISSÃO
cultura afro
Face ao exposto e diante de direitos desrespeitados, tais como:
. o de não sofrer discriminações por ser descendente de africanos;
. o de ter reconhecida a decisiva participação de seus antepassados e da sua própria na construção da nação
brasileira;
. o de ter reconhecida sua cultura nas diferentes matrizes de raiz africana;
- diante da exclusão secular da população negra dos bancos escolares, notadamente em nossos dias, no ensino
superior;
- diante da necessidade de crianças, jovens e adultos estudantes sentirem-se contemplados e respeitados, em suas
peculiaridades, inclusive as étnico-raciais, nos programas e projetos educacionais;
- diante da importância de reeducação das relações étnico/raciais no Brasil;
- diante da ignorância que diferentes grupos étnico-raciais têm uns dos outros, bem como da necessidade de superar
20
esta ignorância para que se construa uma sociedade democrática;
- diante, também, da violência explícita ou simbólica, gerada por toda sorte de racismos e discriminações, que sofrem
os negros descendentes de africanos;
- diante de humilhações e ultrajes sofridos por estudantes negros, em todos os níveis de ensino, em conseqüência de
posturas, atitudes, textos e materiais de ensino com conteúdos racistas;
- diante de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em convenções, entre outro os da Convenção da
UNESCO, de 1960, relativo ao combate ao racismo em todas as formas de ensino, bem como os da Conferência
Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Discriminações Correlatas, 2001;
- diante da Constituição Federal de 1988, em seu Art. 3º, inciso IV, que garante a promoção do bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação; do inciso 42 do Artigo 5º
que trata da prática do racismo como crime inafiançável e imprescritível; do § 1º do Art. 215 que trata da proteção das
manifestações culturais;
- diante do Decreto 1.904/1996, relativo ao Programa Nacional de Direitos Humanas que assegura a presença histórica
das lutas dos negros na constituição do país;
- diante do Decreto 4.228, de 13 de maio de 2002, que institui, no âmbito da Administração Pública Federal, o Programa
Nacional de Ações Afirmativas;
- diante das Leis 7.716/1999, 8.081/1990 e 9.459/1997 que regulam os crimes resultantes de preconceito de raça e de cor
e estabelecem as penas aplicáveis aos atos discriminatórios e preconceituosos, entre outros, de raça, cor, religião,
etnia ou procedência nacional;
- diante do inciso I da Lei 9.394/1996, relativo ao respeito à igualdade de condições para o acesso e permanência na
escola; diante dos Arts 26, 26 A e 79 B da Lei 9.394/1996, estes últimos introduzidos por força da Lei 10.639/2003,
proponho ao Conselho Pleno:
a) instituir as Diretrizes explicitadas neste parecer e no projeto de Resolução em anexo, para serem executadas pelos
estabelecimentos de ensino de diferentes níveis e modalidades, cabendo aos sistemas de ensino, no âmbito de sua
jurisdição, orientá-los, promover a formação dos professores para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana, e para Educação das Relações Ético-Raciais, assim como supervisionar o cumprimento das diretrizes;
b) recomendar que este Parecer seja amplamente divulgado, ficando disponível no site do Conselho Nacional de
Educação, para consulta dos professores e de outros interessados.
III – DECISÃO DO CONSELHO PLENO
O Conselho Pleno aprova por unanimidade o voto da Relatora.
Sala das Sessões, 10 em março de 2004.
Conselheiro José Carlos Almeida da Silva – Presidente
21
cultura afro
Brasília-DF, 10 de março de 2004.
Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva – Relatora
Carlos Roberto Jamil Cury – Membro
Francisca Novantino Pinto de Ângelo – Membro
Marília Ancona-Lopez – Membro
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO/CONSELHO PLENO/DF
RESOLUÇÃO Nº 1, DE 17 DE JUNHO DE 2004.1
Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico- Raciais e para o Ensino de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
O Presidente do Conselho Nacional de Educação, tendo em vista o disposto no art. 9º, § 2º, alínea “c”, da Lei nº 9.131,
publicada em 25 de novembro de 1995, e com fundamentação no Parecer CNE/CP 3/2004, de 10 de março de 2004,
homologado pelo Ministro da Educação em 19 de maio de 2004, e que a este se integra, resolve:
Art. 1° A presente Resolução institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afro Brasileira e Africana, a serem observadas pelas Instituições de
ensino, que atuam nos níveis e modalidades da Educação Brasileira e, em especial, por Instituições que desenvolvem
programas de formação inicial e continuada de professores.
§ 1° As Instituições de Ensino Superior incluirão nos conteúdos de disciplinas atividades curriculares dos
cursos que ministram, a Educação das Relações Étnico-Raciais, bem como o tratamento de questões e temáticas que
dizem respeito aos afrodescendentes, nos termos explicitados no Parecer CNE/CP 3/2004.
§ 2° O cumprimento das referidas Diretrizes Curriculares, por parte das instituições de ensino, será considerado na avaliação das condições de funcionamento do estabelecimento. Art. 2° As Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação das Relações Étnico- Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africanas
constituem-se de orientações, princípios e fundamentos para o planejamento, execução e avaliação da Educação, e
têm por meta, promover a educação de cidadãos atuantes e conscientes no seio da sociedade multicultural e pluriétnica
do Brasil, buscando relações étnico-sociais positivas, rumo à construção de nação democrática.
§ 1° A Educação das Relações Étnico-Raciais tem por objetivo a divulgação e produção de conhecimentos,
bem como de atitudes, posturas e valores que eduquem cidadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os
capazes de interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito aos direitos legais e valorização
de identidade, na busca da consolidação da democracia brasileira.
§ 2º O Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana tem por objetivo o reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afro-brasileiros, bem como a garantia de reconhecimento e igualdade de
valorização das raízes africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas, européias, asiáticas.
§ 3º Caberá aos conselhos de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios desenvolver as
Diretrizes Curriculares Nacionais instituídas por esta Resolução, dentro do regime de colaboração e da autonomia de
cultura afro
entes federativos e seus respectivos sistemas.
Art. 3° A Educação das Relações Étnico-Raciais e o estudo de História e Cultura Afro- Brasileira, e História
e Cultura Africana será desenvolvida por meio de conteúdos, competências, atitudes e valores, a serem estabelecidos
pelas Instituições de ensino e seus professores, com o apoio e supervisão dos sistemas de ensino, entidades
mantenedoras e coordenações pedagógicas, atendidas as indicações, recomendações e diretrizes explicitadas no
Parecer CNE/CP 003/2004.
§ 1° Os sistemas de ensino e as entidades mantenedoras incentivarão e criarão condições materiais e
financeiras, assim como proverão as escolas, professores e alunos, de material bibliográfico e de outros materiais
didáticos necessários para a educação tratada no “caput” deste artigo.
1
22
CNE/CP Resolução 1/2004. Diário Oficial da União, Brasília, 22 de junho de 2004, Seção 1, p.11.
§ 2° As coordenações pedagógicas promoverão o aprofundamento de estudos, para que os professores
concebam e desenvolvam unidades de estudos, projetos e programas, abrangendo os diferentes componentes
curriculares.
§ 3° O ensino sistemático de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na Educação Básica, nos termos da
Lei 10639/2003, refere-se, em especial, aos componentes curriculares de Educação Artística, Literatura e História do
Brasil.
§ 4° Os sistemas de ensino incentivarão pesquisas sobre processos educativos orientados por valores,
visões de mundo, conhecimentos afro-brasileiros, ao lado de pesquisas de mesma natureza junto aos povos indígenas, com o objetivo de ampliação e fortalecimento de bases teóricas para a educação brasileira.
Art. 4° Os sistemas e os estabelecimentos de ensino poderão estabelecer canais de comunicação com
grupos do Movimento Negro, grupos culturais negros, instituições formadoras de professores, núcleos de estudos
e pesquisas, como os Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, com a finalidade de buscar subsídios e trocar experiências
para planos institucionais, planos pedagógicos e projetos de ensino.
Art. 5º Os sistemas de ensino tomarão providências no sentido de garantir o direito de alunos afrodescendentes
de freqüentarem estabelecimentos de ensino de qualidade, que contenham instalações e equipamentos sólidos e
atualizados, em cursos ministrados por professores competentes no domínio de conteúdos de ensino e comprometidos com a educação de negros e não negros, sendo capazes de corrigir posturas, atitudes, palavras que impliquem
desrespeito e discriminação.
Art. 6° Os órgãos colegiados dos estabelecimentos de ensino, em suas finalidades, responsabilidades e
tarefas, incluirão o previsto o exame e encaminhamento de solução para situações de discriminação, buscando-se
criar situações educativas para o reconhecimento, valorização e respeito da diversidade.
§ Único: Os casos que caracterizem racismo serão tratados como crimes imprescritíveis e inafiançáveis,
conforme prevê o Art. 5º, XLII da Constituição Federal de 1988.
Art. 7º Os sistemas de ensino orientarão e supervisionarão a elaboração e edição de livros e outros materiais
didáticos, em atendimento ao disposto no Parecer CNE/CP 003/2004.
Art. 8º Os sistemas de ensino promoverão ampla divulgação do Parecer CNE/CP 003/2004 e dessa Resolução, em atividades periódicas, com a participação das redes das escolas públicas e privadas, de exposição, avaliação
e divulgação dos êxitos e dificuldades do ensino e aprendizagens de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e da
Educação das Relações Étnico-Raciais.
§ 1° Os resultados obtidos com as atividades mencionadas no caput deste artigo serão comunicados de
forma detalhada ao Ministério da Educação, à Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, ao Conselho
Nacional de Educação e aos respectivos Conselhos Estaduais e Municipais de Educação, para que encaminhem
providências, que forem requeridas.
Art. 9º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.
23
cultura afro
Roberto Cláudio Frota Bezerra
Presidente do Conselho Nacional de Educação
POR QUE A LEI?
ALGUMAS REFLEXÕES
A resposta não cabe em uma só oração mas se alguém tivesse que responder à questão de pronto, em uma
só frase, poderia responder: do jeito que está, é injusto demais.
É injusto com uma população que carregou nas costas toda a economia do Brasil Colônia e abolida a
escravidão, foi da senzala para a favela. Além do mais, não é possível construir-se uma nação impossibilitando o
acesso aos bens culturais e materiais à metade da sua população.
Pode depreender-se então que uma lei viria a distribuir justiça à mão cheia? Também não. A lei veio estabelecer um marco legal onde todos aqueles que compreendam a injustiça desse sistema, possam apoiar-se para lutar
pelo respeito e ascensão da comunidade negra no Brasil. A lei por si só não garantirá nada. Sem o calor da luta, será,
em pouco tempo, letra morta. Só a organização, a força, a intenção e o gesto, coesão e movimento transformarão a lei
em realidade concreta. A lei dá legalidade e legitimidade à organização e à luta.
Um dos aspectos valiosos da lei é que ela escancara, impõe a questão da diversidade cultural e racial para
quem negou-se até agora a ver que os afro-brasileiros existem, foram e são sujeitos na construção da sociedade
brasileira, têm história, têm cultura, têm memória, têm valores que precisam ganhar amplitude e status de conhecimento também dentro da escola, no fazer cotidiano da sala de aula. Assim a lei, ao determinar a inclusão de História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana nos currículos da Educação Básica, busca valorizar devidamente a história e cultura
do povo negro, na perspectiva de não só elevar a auto-estima e compreensão de sua etnia, mas de todas as etnias, na
perspectiva da afirmação de uma sociedade multicultural e pluriétnica.
É preciso que os professores, principalmente, compreendam que não se trata de substituir um modo de
enfoque de um currículo por outro, substituir o enfoque eurocêntrico por um africano, mas “de ampliar o foco dos
cultura afro
currículos escolares para a diversidade cultural, racial social e econômica brasileira” (Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva.)
25
COMO TRABALHAR A LEI Nº 10.639/2003 E AS DIRETRIZES CURRICULARES PARA A EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E HISTÓRIA E CULTURA
AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA NA ESCOLA?
Temos a lei. E agora? Agora trata-se de avançarmos na articulação da lei e seus princípios norteadores com
a prática cotidiana das escolas. Como vencer as resistências dentro e fora do contexto escolar? Que abordagens
fazer? Tudo isso a conselheira Petronilha aborda com propriedade e riqueza de detalhes no Parecer do Conselho
Nacional de Educação que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para as Relações Étnico-Raciais e para o
Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
Apresentamos aqui algumas sugestões. Estes são frutos de atividades já desenvolvidas por
vários educadores de escolas públicas do Paraná.
Sugestões de atividades para as escolas:
•
•
•
realização de atividades que propiciem o contato com a cultura africana e afro-descendente, culminando em
desfiles, exposições, mostras de tetro e dança nas quais sejam apresentados penteados, vestimentas, adereços,
utensílios, objetos e rituais resultantes desse processo;
valorizar a diversidade étnica brasileira, a partir de discussões e atividades que tenham como foco a criança e o
jovem negro, a sua família em diferentes contextos sociais e profissionais;
elaboração de pesquisas e debates sobre o espaço dos afrodescendentes e de sua cultura nos meios de comunicação de massa (em especial na TV).
•
•
•
•
•
•
•
•
Realizar com os alunos estudos e pesquisas de países que falam a língua portuguesa. o que os une? Quais as
razões? Atualmente como estão estes países? Qual a composição étnica? Diferenças do Português falado e
escrito entre eles. Exemplos: Na alimentação: vatapá, acarajé, caruru, canjica, etc. Na música: os instrumentos
musicais, maracá, cuíca, atabaque, reco-reco, agogô. Na religião: umbanda e candomblé.
Após debates em sala, a partir de textos trabalhados com os alunos, solicitar que produzam textos sobre temas
como: o racismo no Brasil, a presença do negro na mídia, políticas afirmativas, cotas, mercado de trabalho, etc.
Trabalhar com as implicações da carga pejorativa atribuída ao termo negro e outras expressões do vocabulário.
Realizar com os alunos estudos de obras literárias de escritores negros como Cruz e Souza; Lima Barreto.
Machado de Assis; Solano Trindade, etc. destacando a contribuição do povo negro à cultura nacional.
Incluir os conteúdos de literatura, o estudo do Teatro Experimental de negro iniciado no Rio de Janeiro em 1944
e a pesquisa sobre a Imprensa negra brasileira no início da década de 20. Alguns jornais produzidos por afrodescendentes que circularam semanalmente durante até mais de 50 anos.
Utilizar pesquisas e revistas produzidas pela comunidade afrodescendente do seu município.
Trabalhar a leitura e interpretação de letras de músicas relacionadas à questão racial.
Trabalhar com os gêneros musicais do samba e rap.
26
cultura afro
Língua Portuguesa e Literatura
•
•
•
Poesias que podem ser feitas pelas próprias crianças relacionadas ao povo afrodescendente e sua cultura. A
partir dessa literatura a criança afrodescendente constrói uma imagem da realidade social que não a inclui.
Realizar estudos de obras brasileiras que discutam, abordem questões relacionadas a cultura afro-brasileira:
Macunaíma, Mário de Andrade; Casa Grande e Senzala, Gilberto Freyre; O Escravo, Castro Alves; Sermões do Pe.
Antonio Vieira; A Cidade de Deus, Paulo Lins; O Mulato, Aluísio Azevedo; O Bom Crioulo, Adolfo Caminha.
Na pintura, leitura e interpretação de obras de Di Cavalcanti, Lazar Segall e Cândido Portinari que retratam a figura
do negro.
História
O professor de História precisa construir um novo olhar sobre a história nacional e regional/local, ressaltando a
contribuição dos africanos e afrodescendentes na constituição da nação brasileira.
Algumas visões equivocadas sobre o negro e o continente africano devem ser desmitificadas, entre elas:
• a do negro visto como escravo: não se pode naturalizar a situação do negro como escravo. Os negros não eram
escravos, foram escravizados. A África não é uma terra de escravos. Os povos africanos eram portadores de
história, de saberes, conhecimentos, na maioria das vezes transmitidos pela oralidade;
• a da África como um continente primitivo: a imagem de que o continente africano é povoado por tribos primitivas em imensas florestas está presente no imaginário da maioria das pessoas. Imagem construída pelos meios de
comunicação e pelos próprios livros didáticos. Na África tivemos grandes nações e impérios (como por exemplo
o Egito Antigo). Muito das tecnologias utilizadas no Brasil, no cultivo da cana-de-açúcar e na mineração, foram
trazidos pelos negros oriundos da África;
• a de que o negro foi escravizado porque era mais dócil, menos rebelde que os indígenas: Esta idéia está presente
em boa parte dos livros didáticos. Omite-se que a história dos africanos escravizados está inserida num contexto
de acumulação de bens de capital, ocorrida entre os séculos XVI e XIX, envolvendo África, Europa e Américas.
No Brasil há uma história de organização e resistência, desde as vindas nos navios negreiros, as fugas individuais e coletivas para os quilombos, a organização em irmandades, a resistência da cultura nas manifestações
religiosas dos batuques e terreiros, até as formas de negociação para a conquista da liberdade;
• a da democracia racial: que se forjou na sociedade brasileira, mascarando o tratamento desigual destinado aos
afrodescendentes.
cultura afro
Sugere-se para a disciplina de História, entre outros, o trabalho com os seguintes temas:
Estudo...
• dos grandes reinos africanos, as organizações culturais, políticas e sociais de Mali, do Congo, do Zimbabwe, do
Egito, entre outros;
• dos povos escravizados trazidos para o Brasil pelo tráfico negreiro e as conseqüências da Diáspora Africana;
• das resistências do povo negro (Quilombos, Revolta dos Malês, Canudos, Revolta da Chibata e todas as formas
de negociação e conflito);
• da promulgação da Lei de Terras e do fim do tráfico negreiro(1850) e o impacto das ideologias de branqueamento
(darwinismo social) sobre o processo de imigração européia;
• dos remanescentes de quilombos, sua cultura material e imaterial;
• da Frente Negra Brasileira, no início dos anos 30, criada em São Paulo;
• do significado da data 20 de novembro, repensando o 13 de maio.
27
Geografia
Sendo a Geografia a ciência cujo objeto é o espaço geográfico e suas inter-relações, caberá ao professor desta
disciplina tratar dos seguintes contextos:
•
População brasileira: miscigenação de povos;
•
Distribuição espacial da população afrodescendente no Brasil;
•
A contribuição do negro na construção da nação brasileira;
•
O movimento do povo africano no tempo e no espaço;
•
Questões relativas ao trabalho e renda;
•
A colonização da África pelos europeus;
•
A origem dos grupos étnicos que foram trazidos para o Brasil ( a rota da escravidão);
•
A política de imigração e a teoria do embranquecimento no mundo;
•
Localizar no mapa e pesquisar sobre a atualidade de alguns países ( como vivem, população, idioma, economia,
cultura, história, música, religião);
•
Estudo da organização espacial das aldeias africanas ( questões urbanísticas);
•
Estudo de como o continente africano se configurou espacialmente: as (re)divisões territoriais;
•
Análise de dados do IBGE sobre a composição da população brasileira por cor, renda e escolaridade no país e no
município em uma perspectiva geográfica.
•
Discussões a respeito de práticas de segregação racial, como as acontecidas, por exemplo na África do Sul , e
nos Estados Unidos da América..
Ensino Religioso
•
•
•
Estudar a influência das celebrações religiosas das tradições afros na cultura do Brasil;
Pesquisa sobre as religiões africanas presentes no Brasil;
Estudo dos orixás.
•
•
•
•
•
A presença de elementos e rituais das culturas de matriz africana nas manifestações populares brasileiras:
Puxada de rede, Macululê, Capoeira, Congada, Maracatu, Tambor de crioulo, Samba de roda, Umbigada, Carimbó,
Côco e etc;
Danças de natureza:
Religiosa: candomblé
Lúdica: brincadeira de roda
Funerárias: Axexê
Guerreira: Congada
Dramáticas: Maracatu
Profanas: Jongo;
A contribuição artística da cultura africana na formação da Música Popular Brasileira: origem do Batuque, do
Lundu e do Samba, entre outros;
Poética musical envolvendo a temática do negro;
Nossos cantores e compositores negros: A Cultura Africana e Afro-brasileira e as Artes Plásticas: máscaras,
esculturas (argila, madeira, metal); ornamentos; tapeçaria; tecelagem; pintura corporal; estamparia;
28
cultura afro
Educação Artística/Arte
•
•
Artistas plásticos como Mestre Didi (Bahia- Brasil) e a presença/influência da arte africana nas obras de artistas
contemporâneos;
Proposta interdisciplinar: explorar os conteúdos sobre a estrutura de Fractais (física e matemática) presentes na
arte africana (penteado, arquitetura, música, estamparia, objetos decorativos, etc).
As sugestões devem ultrapassar a condição de conteúdos, para que possam ser analisados e recontextualizados
pela ótica das artes e serem avaliadas esteticamente através dos elementos do movimento, do som, dos elementos plásticos: da cor, da forma, etc.
Biologia/Ciências
Sugere-se aqui algumas temáticas possíveis, a serem desenvolvidas no ensino de Ciências e Biologia, que
contemplam as Relações Étnico-Raciais e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana:
• Estudo sobre as teorias antropológicas;
• Desmistificação das teorias racistas, destituindo de significado a pseudo “superioridade” racial;
• Estudo das características biológicas (biotipo) dos diversos povos;
• Contribuições dos povos africanos e de seus descendentes para os avanços da Ciência e da Tecnologia;
• Análise e Reflexão sobre o panorama da saúde dos africanos, in loco. Essa análise deve considerar os aspectos
políticos, econômicos, ambientais, culturais e sociais intrínsecos à referida situação. Neste sentido, o professor
de Ciências e Biologia pode abordar os conflitos entre epidemias/endemias e o atendimento à saúde, entre as
doenças e as condições de higiene proporcionadas a população bem como o índice de desenvolvimento humano (IDH).
Educação Física
•
•
•
•
•
•
Atividades que podem ser desenvolvidas nas aulas de Educação Física:
Estudo das práticas corporais da cultura negra, em diferentes momentos históricos;
As danças e suas manifestações corporais na cultura Afro-Brasileira;
Os brinquedos e brincadeiras na cultura africana e sua ressignificação nas práticas corporais afro-brasileiras;
Os jogos praticados no Brasil pelos afro-descendentes e africanos numa perspectiva histórica;
As manifestações corporais expressas no folclore brasileiro;
A capoeira, seus significados e sentidos no contexto histórico-social, como elemento da cultura corporal.
Através da capoeira é possível resgatar toda historicidade do negro, desde o momento em que foi retirado do
continente africano. São exemplos significativos as suas danças de guerra, caça, festas, como a da puberdade e
as grandes caminhadas pelas florestas. Tais elementos representam subsídios na construção de propostas para
o trabalho pedagógico nas escolas.
Matemática
cultura afro
•
•
•
Análise dos dados do IBGE sobre a composição da população brasileira e por cor, renda e escolaridade no país
e no município.
Analisar pesquisas relacionadas ao negro e mercado de trabalho no país.
Realizar com os alunos pesquisas de dados no município com relação à população negra.
29
RELATO DE ALGUMAS EXPERIÊNCIAS DESENVOLVIDAS
NAS ESCOLAS DO PARANÁ
RELATO 01
Colégio Estadual Barbosa Ferraz – Ivaiporã
Professora: Adriana Custódio Moreira
A COMUNIDADE REMANESCENTE DE QUILOMBO DO MUNICÍPIO DE
TURVO- PR
Resumo: Este texto tem como finalidade apresentar os resultados e ações realizadas através do Projeto desenvolvido
com alunos do Colégio Estadual Barbosa Ferraz – Ensino Médio e Normal, do Município de Ivaiporã, e pretende
mostrar como a prática docente pode ser instrumento mediador diante da problemática de incluir o negro no processo
sócio-político-cultural, resgatando sua história e, por conseguinte, sua valorização humana.
Tomando como base a comunidade Campina dos Morenos/Turvo-Pr, foi realizada uma ação educacional de
amplo alcance e de importância para a reestruturação e recuperação cultural da História do Paraná, através de relatos
orais, criando neste estabelecimento de ensino, um programa de pesquisa de acesso à história dos negros que vivem
neste município.
O grupo é formado pelas professoras: coordenadora Adriana C. Moreira (área diversificada do Normal),
Sigelinda Maria Zanoni (História), Ilma Siqueira Machado (História), Simone Aparecida da Silva (Geografia), Maria de
Fátima Silva Costa (Matemática) e Silvana Aparecida de Oliveira (Língua Portuguesa). Iniciou-se um estudo de caso
com a Comunidade Campina dos Morenos, localizada em local de difícil acesso, aproximadamente a 40 km da periferia
do referido município.
Esta comunidade apresenta características peculiares, como: ausência de energia elétrica no povoado, a
prática religiosa a partir do catolicismo e uma escolinha multi-seriada desativada há muito tempo, pois devido à
distância, os professores desistiram de lecionar. Percebe-se um considerável índice de analfabetismo e a perca da
história de seu passado.
Estas peculiaridades despertaram a curiosidade pela diversidade sócio-cultural desta comunidade e as
contribuições deste projeto para valorização como porta voz da história de resistência do povo negro.
A inclusão da comunidade de Campina dos Morenos nas narrativas e ações pedagógicas do Colégio Barbosa Ferraz
revela a diversidade existente em seu espaço sócio-cultural.
tos da sociedade; exposição de fotos; projeção de documentário realizado pelos alunos das visitas “in loco” e filmes
que abordam questões raciais para debates; apresentações artísticas da cultura- Afro; palestras e intercâmbio feitos
pelos alunos com os integrantes da Comunidade Campina dos Morenos; encenação teatral; excursões; passeatas de
30
cultura afro
Para atingir esse objetivo os professores fizeram adequações curriculares em cada programa das disciplinas.
Com seus alunos realizaram pesquisas bibliográficas para resgatar a história e as temáticas da comunidade, bem como
fundamentar uma prática docente para efetivar sua práxis; entrevistas orais e escritas da comunidade em estudo, da
população do município de Turvo, para verificar os entraves na visão da comunidade em geral e nos documentos
oficiais (idosos/mulheres/ documentos oficiais); acompanhamento dos grupos de alunos e acadêmicos (Pedagogia)
em suas visitas, com atividades direcionadas ao campo de pesquisa; estruturação das várias produções orais e
escritas de seus alunos (paródias, poesias...); produção e publicação de artigos jornalísticos, pesquisa com segmen-
protesto em parceria com o Projeto Cultural da Paz.
Ao fim da realização dos objetivos propostos, concluiu-se que a interação da referida cultura de forma
diferenciada contribui para que os alunos, ou melhor, toda uma comunidade.
A história oral desta comunidade rural negra demonstrou a necessidade de uma ação que resgate a veracidade dos fatos.
Os dados obtidos em vários momentos apresentaram dualidade histórica. Através das várias visitas, houve
a expressão de um processo de exclusão social deste grupo, desconsiderando suas habilidades e conhecimentos.
Ainda há muito a ser feito para que, de fato, se atinja o objetivo proposto e seja provado o resgate histórico
oral, que a região de Turvo propaga há todo momento.
HISTÓRIA DE CAMPINA DOS MORENOS
cultura afro
A senhora Maria Rosa Marques conta que os primeiros moradores que chegaram aqui foram seus avós: o
senhor Antonio Rodrigues e sua esposa, senhora Maria Francisca Rodrigues; seus pais: o senhor Manoel Luís
Rodrigues e sua esposa, senhora Margarida Rodrigues; seus tios: o senhor Cesarino Ricardo de Melo e sua esposa
Adelaide de Melo, pais da senhora Eva de Melo; senhor Crispim Rodrigues e sua esposa Alzira Rodrigues, e também
a senhora Vergília, a senhora Madalena e a senhora Maria.
Essas pessoas viviam na condição de escravos em Impiranga, na África, de onde foram trazidos por portugueses para o Brasil para continuarem seus trabalhos como escravos. Para se livrar da escravidão resolveram fugir de
onde trabalhavam.
Certo dia, eles fugiram cedo com os cavalos que levavam para ajudar no trabalho, algumas ferramentas e
alimentos. Depois de meses de caminhada chegaram a uma grande floresta, onde derrubaram algumas árvores e
fabricaram suas casas de coivara coberta de capim.
Esconderam os animais na mata e para não relincharem, fabricaram pequenos cestos de taquara que colocavam na cabeça de cada animal. Enquanto uns cuidavam dos animais outros faziam suas plantações. Plantavam milho,
feijão, batata-doce, mandioca e cana-de-açúcar. Fabricavam monjolos em queda d’água para fazer farinha, quirera e
canjica. A mandioca era transformada em farinha e polvilho, a cana era transformada em açúcar. Faziam cestos, balaios
e peneiras.
Além dos produtos que plantavam, caçavam e pescavam para se alimentar. Para comprar o que não possuíam, eles se deslocavam até Palmeirinha e efetuavam a troca por produtos que plantavam. Essa troca era feita em dois
armazéns que existiam ali.
Depois que os escravos foram libertados, essas famílias tomaram posse dessa terra. Faziam a Festa de São
João Batista com procissão e dança de quadrilha na casa do seu Manoel Luís Rodrigues. Depois que seu Manoel
morreu, seu filho José Luís passou a fazer a festa de São João.
A primeira professora que chegou para dar aulas na comunidade foi a senhora Oracélia de Souza. A escola
era na casa do senhor José Luís Rodrigues. Depois vieram as professoras Maria Chagas Lima e a professora Maria
Tereza Carneiro que começaram a dar aulas na escola Padre Chagas Lima, depois dela vieram também Leonora
Resende, Soeli Carneiro de Campos e Eunice Machado Rocha. A atual professora, a senhorita Rosilene Rodrigues é
filha do senhor João Maria Rodrigues e neta do saudoso senhor José Luís Rodrigues.
Depois que foi construída a escola, o lugar mudou o nome de Campina dos Morenos para Ilhas Curitibinha.
As duas pessoas que ajudaram a reconstituir os fatos relatados pela senhora Maria Rosa Marques foram a Dona
Maria Rosa Marques, que está com 72 anos, e Dona Eva de Melo, com 104. Todas integrantes da referida comunidade.
Entrevistas realizadas por Rosilene Rodrigues - Ilhas Curitibinha
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RELATO 02
Colégio Estadual Tancredo de Almeida Neves - Colombo
Professor Cassius Marcelus Cruz
DESCONSTRUINDO PADRÕES DE BELEZA
O relato que se segue é sobre a paisagem de um trabalho realizado em sala de aula com seis turmas de sexta
série, quatro primeiros anos do ensino médio, três segundos anos do ensino médio e quatro terceiros anos do ensino
médio durante os anos 2003 e 2004.
Várias são as possibilidades de introduzir a temática afro-brasileira em sala de aula. Algumas mais, outras
menos polêmicas. No caso desse trabalho o objetivo foi abordar a questão da discriminação racial a partir da
visualização do padrão de beleza construído em nossa sociedade. Vejam bem, utilizei o termo construído, pois
acredito que padrão de beleza é uma construção cultural. Trata-se então de demonstrar aos educandos por que meios
se dá essa construção e de que maneira o perfil negro é excluído desse padrão.
Toda dinâmica que pretende descortinar o não explicitado das práticas cotidianas inicia-se por uma
problematização indireta. Nesse caso, para tentar identificar o padrão de beleza dos jovens com os quais estava
trabalhando, foi proposta a seguinte atividade:
§
A partir de revistas, escolha a figura de uma pessoa que você levaria para uma ilha deserta e justifique o motivo
de sua escolha.
No caso das sextas séries, foi proposto ainda que se escolhesse figuras de pessoas que o educando não
levaria para uma ilha deserta.
Após a escolha as gravuras foram expostas no quadro. Um dos primeiros pontos percebidos coletivamente na
exposição era que, majoritariamente, a escolha tinha se dada pelo critério beleza. A partir disso, passamos para um
segundo questionamento:
§
Que características eram comuns a todas as pessoas escolhidas pelo critério beleza?
As respostas indicaram como “todas são saradas”, “bem de vida”, famosas (a figura que mais apareceu no
trabalho foi a modelo Gisele Bünchem), até chegar à característica da cor da pele. Em algumas turmas eram compara-
um garoto negro durante o momento em que estava escolhendo, e disse “eu vou escolher esse”, então suas amigas
começaram a rir de sua escolha.
32
cultura afro
das as pessoas consideradas belas com as consideradas feias. Ao chegar à característica da cor, várias eram as
reações. “Professor, todas as bonitas são brancas, mas eu não sou racista”.
Em uma das turmas onde a maioria das pessoas consideradas feias eram negras, uma educanda respondeu:
“as feias são negras”, ao passo que uma colega rebate: “racista, a gente não deve chamar de negro”.
No ensino médio logo se chegava a conclusão que existiam poucas pessoas negras nas revistas, ou ainda
“Não tinham negros bonitos na revista, por isso, não escolhi”. Em uma das escolas uma menina mostrou a figura de
A partir dessas colocações partirmos para os seguintes questionamentos:
§
A beleza é um dado definido naturalmente ou culturalmente? A partir do que se constrói o padrão de beleza da
nossa sociedade?
Após o debate concluía-se que o padrão de beleza é construído culturalmente através dos meios de comunicação, em propagandas, novelas, em revistas de beleza. Em um dos casos uma menina me ofereceu duas revistas de
venda de produtos de beleza. Em uma delas, depois de folheadas 82 páginas, percebia-se a inexistência de pessoas
negras. Na outra havia duas figuras da mesma modelo negra com cabelos alisados. Diante da ausência de uma
estética negra naquelas revistas, ficava evidente que o padrão de beleza propalado por elas excluía o perfil de pessoas
negras.
Ao constatar isso partimos para a seguinte afirmação:
De certa forma somos todas racistas, pois o racismo não é uma opção individual.
Essa afirmativa, que gerou bastante discussão em sala, nos levou a refletir sobre as condicionantes estruturais do preconceito em nossa sociedade. Tal reflexão levou-nos a considerar o racismo institucional e cultural e a
necessidade de começarmos a admitir sua existência como condição para iniciarmos a construção de uma sociedade
baseada no respeito às culturas até então marginalizadas.
Dando continuidade à discussão ainda seria possível levantar outros pontos como o fato do pouco espaço
cultura afro
ocupado por negros no meios de comunicação; o preconceito que há na afirmação “o Brasil é o país dos santos e da
mulata”, que dá ao termo mulata, uma conotação ligada à sexualidade/sensualidade, ou ainda atribuindo à mulher
negra sempre atividades como a de empregada doméstica, criando assim este estereótipo já enraizado em nossa
sociedade e contra a qual devemos nos posicionar.
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RELATO 03
Colégio Estadual Tânia Varella Ferreira – Maringá
Professoras Aracy Adorno Reis e Dulcelina Telles
Coreógrafa: Marai das Dores Tavares
NEGRO E CIDADANIA
“Começar é preciso. Porque crescer é criar um mundo
sem racismo e demais
discriminações também é preciso.
E a escola é sem dúvida o melhor ponto de partida”.
(Jurema Werneck)
O projeto “Negritude e Cidadania”, teve início no Colégio Estadual Tânia Varella Ferreira, no conjunto
Requião, no ano de 1997, quando as professoras Aracy Adorno Reis (profª Matemática), Dulcelina Telles (profª
História) e demais professores, notaram a dificuldade de relacionamento que havia entre alunos(as) negros(as) e não
negros(as). Os primeiros constantemente sofriam discriminações através de “piadinhas”. Iniciou-se então, por parte
dos professores, um trabalho de valorização da cultura negra, sob a coordenação das professoras Aracy Adorno Reis
e Dulcelina Telles.
No ano de 2001, muitos alunos do colégio já faziam parte do projeto e já havia um grupo de dança formado
que constantemente era convidado para fazer alguma apresentação na cidade de Maringá. Ainda neste ano, na
comemoração do dia 20 de novembro, foi realizada uma grande festa no Colégio e nasceu o Grupo Acotirene, um
núcleo da Associação União e Consciência Negra de Maringá, dentro do Colégio Estadual Tânia Varella Ferreira.
No ano de 2002, o projeto foi inscrito no prêmio “Educar para a Igualdade Racial”, um concurso promovido
pelo CEERT - Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdade uma organização não governamental do
Estado de São Paulo que, desde 1990, produz diagnósticos sobre relações raciais e de gênero e elabora políticas e
programas institucionais destinados à promoção da igualdade de oportunidade e tratamento, visando eliminar todas
as formas de discriminações. Ficou então classificado entre os dez melhores trabalhos que trataram de experiências de
promoção da igualdade racial/étnica no ambiente escolar, na categoria ensino fundamental.
projeto tem sido promover a igualdade na diversidade.
O objeto do presente trabalho é a quebra da invisibilidade do negro(a) dentro da sociedade desmantelando
o mito da “democracia racial brasileira”, tendo como motivador a música, a dança, as artes de rua, o folclore e o
artesanato.
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cultura afro
No ano de 2003, o projeto foi um dos beneficiados pela Lei de Incentivo Cultural de Maringá/PR. Neste ano,
embora continuasse sendo realizado no Colégio Estadual Tânia Varella Ferreira, o projeto foi estendido a todos os
jovens do Conjunto Habitacional Requião. Os encontros aconteciam todos os sábados pela manhã, para que assistissem a palestras, a filmes, debates, e oficinas de música e dança.
No dia 22 de outubro de 2003, foi realizado um grande espetáculo no teatro Calil Haddad, com apresentação
de danças e músicas pelos integrantes do projeto e alguns convidados da comunidade maringaense. O lema do
Justifica-se a escolha do presente tema, Negritude e Cidadania, e do público alvo, crianças e adolescentes
residentes no Conjunto Requião, por entendermos que através da música, dança etc. haverá um olhar sobre a
diversidade cultural, resgate à cultura Afro-descendente, valorizando sua participação na construção da sociedade,
uma vez que são maioria neste Conjunto e que por pertencerem a famílias de baixa renda. A sociedade, de maneira
geral, ignora o preconceito velado que existe contra os descendentes africanos que tiveram uma significativa importância na construção do nosso país. Entretanto, a nossa Lei Maior (Constituição Federal de 1988) democratizou
plenamente as relações sociais, determinando que: Constitui objetivo fundamental da República promover o bem de
todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (CF/88, art. 3º,
inciso IV). Todavia, apenas a lei considerada abstratamente não é suficiente para construção de uma sociedade mais
justa e fraterna, sendo imprescindível a participação de todos no processo de combate à discriminação. Assim sendo,
se o acesso à cultura representa um direito de todos os cidadãos, as crianças e adolescentes devem estar inseridos
neste contexto, principalmente em um bairro de maioria negra.
A ausência da temática racial nos diversos segmentos de nossa sociedade impede a promoção de boas
relações entre os que integram a comunidade. O projeto Negritude e Cidadania propõe mudanças que possibilitem a
inserção social no desenvolvimento igualitário dos indivíduos. Visa contribuir para desenvolver nos participantes
um pensamento comprometido com a visão dicotômica de inferioridade/superioridade dos grupos étnicos. O silêncio
e a invisibilidade que envolvem essa temática na sociedade favorecem para que as diferenças sejam entendidas como
desigualdade e o negro(a) como sinônimo de desigual e inferior.
No nosso cotidiano , são muitos os profissionais que não percebem os conflitos raciais existentes , e
também não compreendem em quais momentos ocorrem atitudes e práticas discriminatórias e preconceituosas que
impedem a realização de uma sociedade democrática. O problema racial não pode ser posto de lado e esperar por si
mesmo uma solução. É imprescindível identificá-lo. É necessário que todos digam não ao racismo e que juntos
promovam o respeito mútuo, o respeito ao outro e a possibilidade de se falar sobre as diferenças sem medo, sem
receio e sem preconceito. Ainda há que se observar que a Lei 10.639/03, art. 26, inclui a obrigatoriedade da história da
África, da luta dos negros(as) no Brasil, da cultura negra brasileira e da participação do negro(a) na formação da
sociedade nacional no currículo oficial da Rede de Ensino. O objetivo é resgatar a contribuição do povo negro nas
áreas social, econômica e política na história do Brasil.
Entretanto, embora tal lei exista, há uma boa parte de nossos educadores, que não percebem quando o
preconceito se manifesta, ou percebe, mas não muda sua forma de trabalhar, porque não se sente bem, ou mesmo
porque não acha importante tal assunto. Diante de tal fato, o resultado está aí, crianças discriminadas, adultos
desvalorizados, e outros tantos alienados que ainda hoje afirmam que: vivemos numa democracia racial. Se realmente
pensarmos assim, o tema não é significativo e não há o que ser trabalhado. Não podemos nos esquecer que em um
momento em que o governo federal, através da criação de cotas, afirma que é chegado o momento de pagarmos nossa
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dívida com a população negra do nosso país, a sociedade deve fazer a sua parte para realizar tal desejo.
Vale a pena lembrar que, nos últimos anos, cresceu na sociedade brasileira a consciência das desigualdades raciais,
do papel desempenhado pela escola na reprodução e perpetuação destas desigualdades. Por outro lado, cresceram
também as potencialidades e responsabilidades inerentes ao sistema educacional em reverter este quadro. Portanto
o projeto Negritude e Cidadania é um exemplo real, que saiu da escola Estadual Tânia Varella Ferreira e passou a
abranger todos os jovens negros(as) e não negros(as) do Conjunto Requião.
Sendo imprescindível a continuidade deste trabalho verdadeiramente comprovado, muitas vezes solitário e
heróico, há que se lembrar que a questão das desigualdades não configura um problema dos e para os negros(as),
mas um desafio para a democracia brasileira .
35
Objetivos
§
§
§
§
Trabalhar a auto-estima do educando(a) possibilitando o convívio pacífico dos diferentes grupos étnicosraciais;
Propiciar reflexões que favoreçam a formação integral do cidadão (cidadã) reflexivo, ativo e responsável tendo
em vista a construção de um mundo mais humano;
Denunciar atitudes de discriminação;
Possibilitar a existência de cartazes, livros, revistas e músicas que contemplem os indivíduos negros de forma
positiva, para serem utilizados nas atividades escolares.
Conteúdos Curriculares desenvolvidos no Colégio Tânia Varella
LÍNGUA INGLESA:
Durante o desenvolvimento do projeto, nas aulas de Língua Inglesa, foi apresentado aos alunos o gênero
musical “BLUES”, sem dúvida o mais complexo e apaixonante, pois nasceu na África, mas começou a florescer na
América, às portas do século XX.
Além de trabalhar os textos e as músicas, houve apresentação de músicos que trabalham o “BLUES”. Tudo
isso com o objetivo de mostrar a influência dos negros na cultura dos norte-americanos e consequentemente em
nossas práticas culturais.
MATEMÁTICA:
Foi estimulada a prática de leituras, análise e produção de gráficos, abordando questões raciais e problemas
matemáticos.
Exemplo :
Análise de dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) sobre educação e trabalho que
mostra que a população negra apresenta os índices mais baixos de escolaridade e renda. Esses dados revelam ainda
que os piores trabalhos, de menos prestígio social, são reservados aos negros.
HISTÓRIA:
Nas aulas de História os alunos(as) foram levados a questionar a história e não estudá-la passivamente. Foi
mostrado como estava o continente africano, dentro do contexto histórico, do início da escravidão no Brasil, permitindo assim que os alunos(as) negros(as) conheçam suas origens, contribuindo positivamente para a construção de
sua identidade, reforçando a auto-estima. Tudo com o objetivo primordial de desconstruir o mito da democracia racial,
que é a condição necessária para se alterar a produção e o ensino da história do negro(a).
lecendo e reconhecendo novas perspectivas educacionais para uma compreensão do papel do tráfico, da escravidão
e da diáspora africana como elementos formadores da configuração do mundo contemporâneo, constituindo pressupostos básicos para traçar um novo perfil do papel das culturas negras na formação do Brasil, respeitando e valori
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cultura afro
GEOGRAFIA:
No ensino da Geografia, o aluno teve a oportunidade de resgatar sua identidade permitindo um avanço de
muitos questionamentos, propondo um novo perfil do papel das culturas afro-brasileira na formação do país, estabe-
zando suas diferenças culturais e étnicas. Visando resgatar os valores do negro brasileiro do povo africano e das
comunidades afro-descendentes construindo uma auto-imagem positiva como agentes ativos da forma.
METODOLOGIAS E PROCEDIMENTOS ADOTADOS NO
DESENVOLVIMENTO DO PROJETO
Num primeiro momento destacou-se a importância do negro(a) na construção da sociedade brasileira, resgatando a auto-estima que foi abalada pela cultura escravocrata.
Nesses debates em sala sobre o tema, discutiu-se com os alunos a diversidade racial da sociedade brasileira,
levando-os a entender o processo escravista e a atual situação do negro(a) na sociedade brasileira.
Foram organizadas palestras sobre o tema do projeto, com a presença de profissionais negros (palestrantes
e demais profissionais liberais), ressaltando a diversidade racial existente na escola, auto-estima, invisibilidade e a
garantia dos direitos iguais. Para tanto, foram usados nestas palestras, bonecos de diversas etnias. Observou-se
então, um convívio mais pacífico dos diferentes grupos étnicos-raciais dentro de Colégio, que se viram retratados
nos bonecos usados nas palestras.
Os alunos também assistiram a um documentário cedido pela Associação União e Consciência Negra de
Maringá, onde é retratado a discriminação e meios de combatê-la. Neste documentário são demonstrados alguns
depoimentos de cidadãs e cidadãos negros, que vêm contribuir para a construção da identidade do aluno(a) negro(a)
através de uma auto-identificação positiva, já que nos relatos constam fatos e incentivos à quebra da invisibilidade
e a busca da verdadeira história dos afro-descendentes. Além de incentivar o aluno(a) a combater todas as formas
de discriminação, especialmente de gênero, idade, raça e cor, garantindo o respeito à diversidade e visando à
promoção da igualdade de oportunidades.
Foi muito interessante observar após a projeção do vídeo a elevação da auto-estima da criança negra e o
despertar que houve nas crianças brancas em relação ao respeito dos direitos da criança negra.
Foram realizadas oficinas de fantoches, onde os alunos confeccionaram bonecos representando diferentes
etnias, contemplando todo tipo de beleza, não só a branca como é comum encontrarmos na cultura brasileira.
Estes bonecos foram utilizados para a realização de peças teatrais escritas e apresentadas pelos alunos com
o tema “Negritude e Cidadania”.
Houve uma grande interação e participação por parte dos alunos(as) que demonstraram satisfação e
criatividade em confeccionar os fantoches, posteriormente utilizados nos teatros.
Os alunos realizaram entrevistas com os componentes da Associação União e Consciência Negra de
Maringá ( Dr.Alaor Gregório de Oliveira, Maria Auxiliadora Barros de Oliveira, Valdeir Gomes de Souza, Cleuza Souza
Theodoro, Valter Praxedes, Rosângela Praxedes, Jairo de Carvalho). Nesse trabalho buscaram conhecer um pouco
cultura afro
mais da Associação, principalmente acerca dos trabalhos que são desenvolvidos por eles, além de obterem outras
informações relacionadas com a luta do negro(a) em busca de igualdade perante a sociedade (mercado de trabalho,
cotas em universidades, etc.). Após terem adquirido estas informações, as repassaram aos demais, com o intuito de
chamar a atenção dos colegas quanto a desvalorização da pessoa negra que não se vê em folhetos de propagandas,
cartazes, bonecos, outdoor, mercado de trabalho.
Foram realizadas oficinas de dança pelos alunos(as) interessados em resgatar o legado dos ancestrais
africanos.
Os ensaios aconteciam semanalmente e fizeram apresentações sempre que solicitadas pela escola ou em
acontecimentos (como por exemplo, no III Festival do Folclore, na Rua da Cultura e nas Comemorações da Consci-
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O Projeto “Negritude e Cidadania” é a bandeira erguida por nós professoras, em defesa da igualdade e
contra a discriminação que impera em nossa sociedade já que os próprios alunos, pais e comunidade ressaltam a
importância do trabalho realizado. Trabalho este que continuaremos a realizar durante todo o tempo que nos resta
como educadoras e como cidadãs, uma vez que o resultado tem sido positivo. Vemos hoje nossas crianças integradas, com outro olhar, acreditando na igualdade, na diversidade, acreditando que “ um novo mundo é possível , sem
racismo, sem preconceito e sem discriminação”.
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cultura afro
ência Negra). Os alunos também participaram de eventos culturais. No dia 24 de setembro, a convite do SESC de
Maringá, levamos alguns alunos para assistirem ao grupo cultural Jongo da Serrinha, do Rio de Janeiro, que
apresentou o espetáculo “Visungos, Jongos e Lunduns”. Foram organizados painéis, objetivando atingir a formação
integral do cidadão (cidadã) reflexivo, ativo e responsável, tendo em vista a construção de um mundo mais humano.
Nas aulas de matemática, foram confeccionados vários cartazes utilizando dados estatísticos acerca da situação da
população negra no Brasil, como por exemplo: mercado de trabalho. Após o estudo com esses dados os alunos
produziram gráficos estatísticos mostrando as diferenças salariais quanto ao gênero e raça.
Ainda foram confeccionados painéis com a “Declaração dos Direitos Essenciais da Criança Negra na
Escola”, utilizando o texto de Rosa Margarida de Carvalho Rocha, afim de que não se perpetue o que eles visualizaram
nos gráficos.
Objetivando ressaltar a diversidade étnica cultural do espaço escolar, garantindo a visibilidade de negros(as)
nas festas comemorativas, foi realizado no Colégio um desfile de trajes afro-descendentes, mostrando roupas africanas. Os alunos desfilaram carregando o nome de personalidades negras famosas, a “Declaração dos Direitos Essenciais da Criança Negra na Escola”, o mapa do Brasil mostrando a diversidade étnica do país, assim como demais faixas.
O desfile, assim como o “Blues” e o Teatro de Fantoches que foram novamente apresentados, fizeram parte da
programação da Associação União e Consciência Negra de Maringá, em homenagem ao Dia Nacional da Consciência
Negra. O que foi uma grande satisfação para nós, e nossos alunos (as), pois o dia “Z”, dia de Zumbi, foi festejado em
nosso Colégio, contando com a participação de representantes da Prefeitura, Associação União e Consciência Negra
de Maringá, Núcleo Regional de Educação, pais de alunos e pessoas da comunidade.
O projeto continua a ser desenvolvido todos os sábados pela manhã, no Colégio Tânia Varella Ferreira e se
estendeu a outros jovens do bairro, com atividades culturais (dança, música, palestras, filmes) e pesquisas.
Esperávamos que após a realização das atividades (teatros, danças, painéis, desfiles, palestras, músicas,
etc), que estavam carregadas de informações, integração e socialização, os alunos(as) negros(as) deste colégio
pudessem construir positivamente sua identidade e orgulhar-se dela.
Para nós já teríamos atingido o objetivo do projeto se mudássemos os relacionamentos entre as diversas
etnias que estudam no colégio e que os alunos(as) negros(as) conseguissem se sentir integrados e com novo olhar
e perspectivas de um país onde a cidadania seja sinônimo de dignidade e política social. Portanto, mensurável é
constatar que houve uma integração dos alunos negros nesta comunidade escolar, vez que este trabalho não é
realizado por outras instituições.
Desta forma, o que realmente procuramos é oferecer um ensino crítico da diversidade cultural brasileira, no
qual a educação apresente novos significados para o negro(a), de sua história e cultura.
No processo de avaliação procurou-se observar:
- a capacidade de contextualização dos conteúdos com a vida prática;
- trabalho em grupo;
- capacidade de articular conhecimentos;
- os cartazes das datas comemorativas passaram a contemplar todas as etnias;
- os alunos negros estiveram integrados nas atividades desenvolvidas;
- os alunos(as) do Colégio Tânia Varella, entenderam que visamos o combate ao racismo e o resgate da cidadania
dos afro-descendentes e que mais do que a rejeição da cor da pele de um povo, o racismo se constitui na negação
da história desse povo.
ONDE PESQUISAR?
INDICAÇÕES DE LEITURA, FILMES E SÍTIOS
LEITURAS
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FILMES
SUGESTÕES DE FILMES
A COR PÚRPURA - Georgia, 1909. Em uma pequena cidade Celie (Whoopi Goldberg), uma jovem com apenas 14 anos
que foi violentada pelo pai, se torna mãe de duas crianças. Além de perder a capacidade de procriar, Celie imediata-
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mente é separada dos filhos e da única pessoa no mundo que a ama, sua irmã, e é doada a “Mister” (Danny Glover),
que a trata simultaneamente como escrava e companheira. Grande parte da brutalidade de Mister provêm por alimentar uma forte paixão por Shug Avery (Margaret Avery), uma sensual cantora de blues. Celie fica muito solitária e
compartilha sua tristeza em cartas (a única forma de manter a sanidade em um mundo onde poucos a ouvem),
primeiramente com Deus e depois com a irmã Nettie (Akosua Busia), missionária na África. Mas quando Shug, aliada
à forte Sofia (Oprah Winfrey), esposa de Harpo (Willard E. Pugh), filho de Mister, entram na sua vida, Celie revela seu
espírito brilhante, ganhando consciência do seu valor e das possibilidades que o mundo lhe oferece.
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ADIVINHE QUEM VEM PARA JANTAR - Direção: Stanley Kramer.Jovem de San Francisco marca um jantar para
apresentar aos pais seu noivo, um negro. O casal, conservador, não consegue esconder a surpresa, mas o jovem não
pretende desistir. Primeira produção hollywoodiana a tratar de forma explícita a questão racial no casamento. Não vai
muito a fundo no problema, embora seu humor elegante e o extremo charme do elenco (Houghton é sobrinha de
Hepburn) se encarreguem de proporcionar momentos divertidos e mordazes. Último trabalho de Tracy (1900- 1967),
valeu o Oscar a Hepburn e ao roteirista Wiliam Rose. 108 minutos. Comédia.
A ENCRUZILHADA (Crossroads) - Direção de Walter Hill, 1986. Jovem viaja pelo Sul dos Estados Unidos, em
companhia de um velho músico, para buscar as origens do som negro. Trilha musical de Ry Cooder, ideal para quem
gosta de blues.
A HORA DO SHOW - Um programa de TV que denuncia o preconceito e o estereótipo dos negros na televisão
americana causa polêmica e faz sucesso entre os telespectadores. Com direção de Spike Lee (Malcolm X) e Damon
Wayans no elenco.
AMISTAD Direção: Steven Spielberg. Costa de Cuba, 1839. Dezenas de escravos negros se libertam das correntes e
assumem o comando do navio negreiro La Amistad. Eles sonham retornar para a África, mas desconhecem navegação
e se vêem obrigados a confiar em dois tripulantes sobreviventes, que os enganam e fazem com que, após dois meses,
sejam capturados por um navio americano, quando desordenadamente navegaram até a costa de Connecticut. Os
africanos são inicialmente julgados pelo assassinato da tripulação, mas o caso toma vulto e o presidente americano
Martin Van Buren (Nigel Hawthorn), que sonha ser reeleito, tenta a condenação dos escravos, pois agradaria aos
estados do sul e também fortaleceria os laços com a Espanha, pois a jovem Rainha Isabella II (Anna Paquin) alega que
tanto os escravos quanto o navio são seus e devem ser devolvidos. Mas os abolicionistas vencem, e no entanto o
governo apela e a causa chega a Suprema Corte Americana. Este quadro faz o ex-presidente John Quincy Adams
(Anthony Hopkins), um abolicionista não-assumido, sair da sua aposentadoria voluntária, para defender os africanos. Duração: 154 minutos. Drama.
A NEGAÇÃO DO BRASIL Direção: Joel Zito Araújo. O documentário é uma viagem na história da telenovela no
Brasil e particularmente uma análise do papel nelas atribuído aos atores negros, que sempre representam personagens mais estereotipados e negativos. Baseado em suas memórias e em fortes evidências de pesquisas, o diretor
aponta as influências das telenovelas nos processos de identidade étnica dos afro-brasileiros e faz um manifesto pela
incorporação positiva do negro nas imagens televisivas do país.
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cultura afro
DISTRAÍDA PARA MORTE Direção Jeferson De. Três adolescentes negros caminham na metrópole. O que pensam?
Sem destino, “distraídos”, perambulam por vielas, ruas e grandes avenidas. Os dois meninos riem de suas próprias
piadas racistas, enquanto a moça os observa calada. Três experiências, três formas distintas de perceber o mundo,
unidas por uma brincadeira de vida ou morte. Quem se aventura a atravessar a rua, a transgredir os limites, a transpor
a calmaria aparentemente segura? Há quem prefira arriscar tudo ( ou seu nada) em busca de sentido. Distraída para a
morte é um filme sobre a força que provém da fragilidade. Do amor que nasce das tragédias cotidianas. 2001.
HOTEL RUANDA - Em meio a um conflito que matou quase um milhão de pessoas em menos de 4 meses, um homem
abre o hotel que gerencia para abrigar a maior quantidade possível de pessoas. Com Don Cheadle, Joaquin Phoenix
e Nick Nolte. Recebeu 3 indicações ao Oscar.
MALCOLM X - Direção: Spike Lee. Trajetória do líder americano Malcolm X, que provocou paixões e ódios na polícia
mundial dos anos 50 e 60. A criatividade da direção de Lee não deixa o ritmo do filme cair, mesmo com mais de três
horas de duração. O roteiro trabalha com flashbacks e reviravoltas, a reconstituição de época é perfeita e Washington
é muito convincente no papel principal. Em duas fitas. 201 minutos. Drama
MEU MESTRE, MINHA VIDA - Direção: John G. Avildsen.Professor de métodos poucos ortodoxos retorna à escola
de Nova Jersey, da qual fora demitido há vinte anos, para salvá-la de um bando de alunos violentos e viciados em
crack. Relato contundente e moralista inspirado em fato real. Simplista e esquemático, o filme tem um trunfo: o
impecável Freeman. 109 minutos. Drama.
MISSISSIPI EM CHAMAS - Direção: Alan Parker. Em Kenosha, pequena cidade do Mississipi, nos anos 60, dois
agentes do FBI, um, veterano e cético; o outro, jovem idealista, envestigam o assassinato de três jovens ligados ao
movimento de defesa dos direitos civis. baseado em fatos reais, é um tenso retrato de um vilarejo conservador preso
a valores reacionários, uma brilhante denúncia do racismo e da intolerância no sul dos EUA.
“NARCISO RAP” Direção: Jeferson De. Conta a história de um menino negro que encontra uma lâmpada mágica. O
problema aparece quando ele busca a igualdade, remodelando sua personalidade a partir do ponto de vista das
pessoas. 13 minutos.
NO BALANÇO DO AMOR Direção: Thomas Carter. Sara Johnson (Julia Stiles) é uma garota de 17 anos que sempre
sonhou em ser uma bailarina profissional. Porém, seus planos vão por água abaixo quando sua mãe morre em um
acidente de carro e ela é obrigada a viver com seu pai em Chicago. Intimidada pela sua nova vida, ela busca refúgio
nos clubes locais onde conhece um jovem. Sean Patrick Thomas) que compartilha com ela o mesmo amor pela dança.
Porém, eles logo descobrem que a pressão existente entre os dois irá se tornar uma barreira maior do que a diferença
de cor ou de classe para que eles possam iniciar um romance. 112 minutos. Drama.
O PODER DE UM JOVEM - Direção: John G. Avildsen. Na África do Sul dos anos 30, filho de ingleses cria fama como
exímio boxeador e nota o crescente separatismo racial. ùltimo filme do diretor e montador Avildsen ( Oscar por Rocky
e diretor dos três A Hora da Verdade), é a adaptação de romance de Bryce Courtenay. Com bom elenco e um roteiro que
apela para a emoção sem pieguice, é um drama sobre o preconceito étnico, com cenas de grande carga dramática,
construído em meio a um filme de boxe, gênero que o diretor sabia filmar como poucos. 125 minutos. Drama
cultura afro
QUILOMBO - Direção: Cacá Diegues. No século XVIII, escravos fogem, organizam comunidade clandestina e
enfrentam os portugueses. Épico malsucedido sobre o Quilombo dos Palmares, funciona mais no vídeo do que na tela
grande. Destaque para música e cenário. 119 minutos. Aventura.
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RAY - Em 1932 Ray Charles (Jamie Foxx) nasce em Albany, uma pequena e pobre cidade do estado da Georgia. Ray fica
cego aos 7 anos, logo após testemunhar a morte acidental de seu irmão mais novo. Inspirado por uma dedicada mãe
independente, que insiste que ele deve fazer seu próprio caminho no mundo, Ray encontrou seu dom em um teclado
de piano. Fazendo um circuito através do sudeste, ele ganha reputação. Sua fama explode mundialmente quando,
pioneiramente, incorpora o gospel , country e jazz, gerando um estilo inimitável. Ao revolucionar o modo como as
pessoas apreciam música, ele simultaneamente luta conta a segregação racial em casas noturnas que o lançaram como
artista. Mas sua vida não está marcada só por conquistas, pois sua vida pessoal e profissional é afetada ao se tornar
um viciado em heroína.
SARAFINA Direção: Darrel James Roudt. Professora é ponto de referência para seus alunos, por sua coragem,
coerência e ação política. Tem como uma de suas alunas Sarafina, vinda da África do Sul e que busca encontrar o
equilíbrio entre os ideais de Nelson Mandela e sua professora, os desesperados atos terroristas de seus companheiros estudantes e a odiosa tortura feita pelo branco dominador. 96 minutos.
UMA HISTÓRIA AMERICANA - Direção: Richard Pearce. Na década de 50, no sul dos EUA, empregada doméstica
negra abala as convicções de sua rica patroa branca ao aderir ao boicote aos transportes locais; a comunidade negra
reivindica o direito de se sentar nos ônibus onde bem quisesse. Filme sensível, marcado sobretudo pela forte
presença de Goldberg ( Mudança de Hábito), longe do seu desempenho cômico habitual, e pela já comprovada carga
dramática de Spacek ( Missing - O desaparecido). Excelente reconstituição de época. 96 minutos. Drama.
UM GRITO DE LIBERDADE Direção: Richard Attenborough. A história real de Steve Biko, jovem líder negro em luta
contra o apartheid na África do Sul, vista sob a ótica de um jornalista branco que se conscientiza aos poucos da
situação e também é perseguido. Drama biográfico inspirador e imponente de Attenborough ( Gandhi), é um épico
grandiloqüente, bem ao gosto do diretor, sobre racismo e a violência. Baseado em dois livros do jornalista Donald
Woods. 157 minutos. Drama.
UM SONHO DE LIBERDADE Direção: Frank Darabont. Condenado a uma pena dupla de prisão perpétua pelo
assassinato de sua mulher e do amante dela, jovem banqueiro é enviado à prisão de máxima segurança e faz amizade
com um dos presidiários veteranos. Estréia auspiciosa na direção do roteirista Darabont (Velocidade Máxima). Embora seja um drama de presídio, não é uma história triste e pesada; apesar de partir de um conto de Stephen king, a trama
nada tem de sobrenatural. Muito pelo contrário, trata-se de uma bela ode à amizade e à esperança. apoiado em
magnífico elenco masculino, o filme foi injustamente ignorado no Oscar 95, para o qual recebeu sete indicações
(inclusive melhor filme) e nada levou. Seu único defeito é o fato de ser extenso e por vezes disperso. Mesmo assim,
obrigatório. 142 minutos. Drama.
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cultura afro
VISTA A MINHA PELE Direção: Joel Zito Araújo. Curta-metragem que aborda as discriminações raciais, cotidianas,
na vida de adolescentes.
SÍTIOS
http://www.portalafro.com.br
http://www.mundonegro.com.br
http://www.casadeculturadamulhernegra.org.br
http://www.geledes.org.br
http://www.nen.org.br
http://www.app.com.br
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http://www.diaadiaeducacao.pr.gov.br
http://www.gper.com.br (ensino religioso)
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