Pão de Milho: Caracterização do Produto Tradicional

Transcrição

Pão de Milho: Caracterização do Produto Tradicional
Pão de Milho:
Caracterização do Produto Tradicional
e Melhoramento Tecnológico
João M. Rocha 1,
Alda M. Brás 2,
José J. B. L. Trigueiros 3 e
F. Xavier Malcata 1
1
Escola Superior de Biotecnologia, Universidade Católica Portuguesa (UCP)
Rua Dr. António Bernardino de Almeida, 4200-072 Porto
2
Estação Regional de Culturas Arvorenses,
Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho (DRAEDM)
Quinta de S. José, S. Pedro de Merelim, 4700-859 Braga
3
Instituto para o Desenvolvimento Agrário da Região Norte (IDARN)
Rua da Igreja, 4485-242 Guilhabreu
Pão de Milho:
Caracterização do Produto Tradicional
e Melhoramento Tecnológico
Ficha Técnica
Título:
Pão de Milho: Caracterização do produto tradicional e melhoramento tecnológico
Autores:
João M. Rocha (UCP-ESB)
Alda M. Brás (DRAEDM)
José J. B. L. Trigueiros (IDARN)
F. Xavier Malcata (UCP-ESB)
Edição:
Universidade Católica Portuguesa - Escola Superior de Biotecnologia
Edição Gráfica:
Serviços de Edição da UCP - ESB
Impressão:
Aloma
ISBN:
972-98476-9-X
Apoios:
U N I V E R S I D A D E C AT Ó L I C A P O R T U G U E S A
ESCOLA SUPERIOR DE BIOTECNOLOGIA
A E S B U C - A S S O C I A Ç Ã O PA R A A E S C O L A S U P E R I O R
D E B I O T E C N O L O G I A D A U N I V E R S I D A D E C AT Ó L I C A
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Índice
1. ENQUADRAMENTO
1
1.1. Económico
1
1.2. Social
2
1.3. Regional
2
2. DESCRIÇÃO
2.1. Resenha histórica
4
4
2.1.1. Antiguidade egípcia
5
2.1.2. Antiguidade grega
7
2.1.3. Antiguidade romana
8
2.1.4. Idade média – idade contemporânea
10
2.2. Pão massificado
15
2.3. Pão tradicional
18
2.3.1. Milho
19
2.3.2. Centeio
22
2.3.3. Broa
24
2.4. Fabrico de Broa
3. CARACTERIZAÇÃO
26
31
3.1. Geografia
31
3.2. Microbiologia
32
3.2.1. Contagens
32
3.2.2. Identificação
37
i
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
3.3. Química
40
3.4. Física
54
3.5. Reologia
55
3.6. Organoléptica
60
4. MELHORAMENTO
63
4.1. Química
64
4.2. Organoléptica
66
5. CONCLUSÕES
69
6. BIBLIOGRAFIA
71
ii
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Prefácio
Produzir pão é ainda, mais do que uma ciência, uma verdadeira arte, que data dos
primórdios das civilizações orientais. A textura e o sabor do produto resultante da fermentação
da massa tornaram-se mais atractivos do que a ingestão separada dos componentes da massa,
sendo que a via microbiana conduz a pão organolepticamente mais apelativo do que o resultante
da levedagem estritamente química. Embora vários cereais possam ser utilizados no fabrico de
pão, o trigo, o milho e o centeio têm-se revelado os mais adequados.
O método mais antigo de conservação do fermento microbiano consiste em guardar uma
porção da massa de pão fermentada em local fresco, para ser usada na produção seguinte. Tal
fermentação origina um sabor ácido distinto e um aroma agradável, devidos à presença (e acção)
conjunta de leveduras e bactérias lácticas. Este processo é ainda hoje integralmente seguido na
produção artesanal do pão de milho – ou Broa.
A Broa é, a par de outros alimentos de origem vegetal, um dos componentes da dieta
mediterrânica; tal dieta tem sido considerada como vector de prevenção de doenças
cardiovasculares, havendo, por conseguinte, todo o interesse em ser preservada na vida urbana
moderna – caracterizada por níveis frequentemente duvidosos no que se refere à qualidade de
ingre-dientes e à confecção, a par de agressões crescentes do meio ambiente. Para além do valor
dietético, o pão de milho tem elevadas potencialidades a nível económico, social e regional, as
quais justificam o forte (e crescente) interesse científico-tecnológico pelo mesmo, e os quais
estão igualmente alinhados pelas orientações da Política Agrícola Comum.
A presente brochura visa a disseminação dos resultados mais relevantes de um abrangente
esforço de investigação, desenvolvimento e demonstração levado a cabo pela Escola Superior de
Biotecnologia, em parceria com o Instituto para o Desenvolvimento Agrário da Região Norte e a
Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho. No decorrer deste projecto pluriinstitucional e multidisciplinar, procedeu-se à caracterização exaustiva da microflora existente
nas farinhas e nos fermentos usados para a produção da Broa; quantificaram-se parâmetros
químicos das farinhas, fermentos e broas, assim como parâmetros físicos das farinhas e
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
parâmetros reológicos das broas; finalmente, estudaram-se os efeitos de algumas variáveis
processuais, designadamente o tipo de farinha de milho, o tipo de moagem, a percentagem de
farinha de centeio adicionada e o tipo de fermento nos parâmetros químicos e organolépticos da
Broa.
Espera-se que tais resultados venham a constituir-se como um contributo válido para a
tipificação deste produto alimentar artesanal, com o intuito do eventual estabelecimento de uma
Denominação de Origem Protegida; tal acabaria por conceder à Broa a distinção merecida
enquanto especialidade alimentar tradicional, providenciando doravante o suporte legal para a
manutenção da sua qualidade e tipicidade, segundo padrões técnico-científicos definidos e
exigentes.
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
1. ENQUADRAMENTO
1.1. Económico
Sendo um exemplo de produto artesanal da Região Norte de Portugal, a Broa possui uma
importância económica elevada devido ao número
ECONÓMICO
significativo de pequenos agricultores que a
produzem, e que se dedicam a montante ao cultivo de
Impacto da Broa
milhos regionais. Esta importância está vincada nas
linhas mestras da Política Agrícola Comum, que vê
em tais produtores elementos de protecção do
REGIONAL
SOCIAL
ambiente, tendo por isso sido objecto da atribuição de apoio a projectos de investimento ao
abrigo de Programas Operacionais no âmbito dos Quadros Comunitários de Apoio.
Com efeito, o Programa Operacional da Agricultura e Desenvolvimento Rural (AGRO)
tem contemplado o Norte do país com a maior fatia de investimento, para que seja possível
promover uma agricultura competitiva, em estreita aliança com um desenvolvimento rural
sustentável. Segundo esta nova orientação de política agrícola, serão as regiões mais
desfavorecidas e os agricultores de menores rendimentos aqueles que terão acesso preferencial
aos subsídios.
Finalmente, este produto possui potencial de resposta à tendência generalizada dos
consumidores no sentido de produtos naturais, com o mínimo de aditivos químicos, e que
possuam à partida um conjunto de nutrientes equilibrado, não sendo, por isso, tão susceptíveis às
restrições dietéticas de produtos similares produzidos em larga escala.
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
1.2. Social
Enquanto produto tradicional, a Broa possui uma importante função social, na medida em
que é um bem com carácter público, resultante da evolução empírica ao longo de inúmeras
gerações, e em que assume o estatuto de património cultural, oferecendo aos seus produtores um
nicho de intervenção – e contribuindo, deste modo, para a fixação da população em zonas rurais
mais periféricas.
1.3. Regional
O êxodo rural, e a consequente desertificação das zonas agrícolas do Norte de Portugal, só
poderão ser contrariados se se aumentar o rendimento do agricultor – tal passa, claramente, pela
existência de especialidades regionais, as quais, por serem produzidas por via artesanal, são
únicas e inimitáveis, tendo associados valores acrescentados apreciáveis. Por outro lado, para a
pequena exploração do Norte de Portugal (sobretudo nas zonas de meia encosta e de montanha),
o turismo rural tem vindo a ganhar importância crescente, pelo que a possibilidade de explorar a
Broa tradicional como atractivo local é promissora. Por fim, urge incentivar a produção de
milhos regionais, pois o milho híbrido, apesar da sua resistência e dos seus elevados índices de
produtividade, não é organolepticamente muito rico.
Existe, assim, lugar ao aumento das fontes de rendimento dos agricultores da Região
Norte, sobretudo os das zonas mais pobres de minifúndio, de onde é, regra geral, originária a
Broa. Porém, este aumento de penetração de mercado, em termos absolutos e relativos, irá exigir
uma maior qualidade e uma maior constância da mesma. Esta qualidade só poderá ser assegurada
através da certificação desse produto, a qual deveria decorrer naturalmente da atribuição do
estatuto de Denominação de Origem Protegida (DOP).
Porém, certificar a Broa significa conceder ao produtor um atestado de confiança no seu
processo de fabrico e no seu produto final; tal implica a manutenção de padrões elevados, o que
só é possível se se conhecerem (e se puderem manipular) os factores físico-químicos e
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
microbiológicos que determinam a qualidade. A definição dessa DOP significaria, assim, ser
capaz de tipificar o produto e conhecer as características que o tornam distinto de outros
similares (ou provenientes de outras regiões), por forma a ser possível a despistagem de
falsificações.
Denominação de Origem Protegida
Maior
qualidade
Broa
Manutenção
das
características
Conhecimento exaustivo do produto
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
2. DESCRIÇÃO
2.1. Resenha histórica
O primeiro pão foi provavelmente fabricado a partir de certas gramíneas selvagens
(cevada, centeio, milho e trigo), e até mesmo de bolotas, castanhas e raízes de algumas plantas.
Contudo, sendo o trigo a semente mais rica em glúten, o seu grão foi, desde muito cedo, eleito
para a panificação, muito embora o milho e o centeio sejam ainda alternativas nos dias correntes.
Dados arqueológicos fazem crer que o trigo era já conhecido na China no século XXVIII
a.C. Inicialmente consumido directamente da planta verde, este processo rudimentar de
confecção foi ultrapassado com o advento do fogo, passando-se a assar ou cozer os grãos em
água. As dificuldades de mastigação teriam, entretanto, levado ao início da moagem. O primeiro
objecto indispensável criado pelo Homem pré-histórico para produzir o seu pão teria sido uma
laje de pedra, dotada de uma face superior côncava onde eram colocados os grãos de cereais, os
quais eram esmagados com a ajuda de outra pedra convexa: assim apareceu o primeiro moinho
manual, ou “pedra de moer”, a qual evoluiria pouco até à época romana. À farinha obtida
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
adicionava-se água, formando-se assim papas com as quais se preparavam umas bolachas
achatadas, posteriormente cozidas sob pedras quentes ou sob cinzas – tal como reza a Bíblia, ao
descrever os gestos de Sara (mulher de Abraão) quando esta preparava o pão para os anjos que
Deus enviou a sua casa.
Este pão é, ainda hoje, confeccionado pelos Usbeques e Tadjiques, povos que vivem entre
as altas montanhas do Pamir e o Deserto Vermelho, a oriente do mar de Aral. Tal pão rudimentar
sem fermento, também conhecido por ázimo (do grego azymos, que significa sem fermento)
tornou-se, paulatinamente, num alimento base do Homem neolítico, o qual deixou de depender
em absoluto, para a sua sobrevivência, da caça e da pesca. Igualmente ázimos são os pães
consagrados na Igreja Católica Romana, no seio da qual assumem a designação de hóstias.
Não existe consenso quanto à origem geográfica do trigo – as opiniões mais credenciadas
dividem-se entre a região do rio Eufrates e a Abissínia; mas a origem cronológica foi,
certamente, a Idade da Pedra Polida, entre os milénios VI e V a.C., visto os arqueólogos terem já
encontrado grãos de trigo nos túmulos dessa época.
Obviamente que se desconhece também quando (e onde) o acaso fez descobrir que,
deixando a pasta de pão repousar algumas horas, esta mudava de aspecto e aumentava de
volume; e que, depois de cozinhada, tal pasta se tornava mais agradável ao paladar e mais
facilmente digerível.
2.1.1. Antiguidade egípcia
Embora os antigos egípcios conhecessem o pão desde há vários milhares de anos, os povos
da Europa na mesma altura ainda se alimentavam de papas de farinha de painço ou de cevada,
enquanto outros povos da África e da Ásia só o conheceriam com a chegada dos europeus.
Porém, não se sabe ao certo quando o pão surgiu e se divulgou no Egipto; a descoberta recente
de um forno de pão – aparentemente o mais velho do mundo – veio provar que o pão era já
conhecido na Babilónia em 4000 a.C.
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Os egípcios foram, portanto, o primeiro povo a alimentar-se regularmente de pão de trigo,
tendo ficado conhecidos, com certa carga depreciativa, por artófagos (ou comedores de pão). De
facto, os campos envolventes do rio Nilo, naquilo que convencionou designar-se por Crescente
Fértil, ofereciam as melhores condições para o cultivo deste cereal.
As pinturas nos túmulos egípcios dão uma informação detalhada das sementeiras, dos
trabalhos na terra, da colheita e do fabrico de pão. O trabalho com o arado exigia dois homens;
depois, vinha a sementeira, registada e controlada pelos escribas; de seguida, os animais
trotavam sobre as terras para enterrar as sementes, sendo a colheita feita mais tarde com a ajuda
de pequenas foices; os burros e os bois trotavam em filas cerradas para separar os grãos das
espigas; finalmente, a recolha e a redistribuição cabiam ao Faraó, que para os egípcios era o
símbolo de fonte da vida.
Os egípcios não sabiam explicar os fenómenos que ocorriam durante a
fermentação e a cozedura, pelo que o acto de fazer pão estava intimamente ligado
à magia. O pão detinha, ainda, um lugar sagrado nas cerimónias dos cortejos
fúnebres: os egípcios, crentes na vida após a morte, não concebiam ficar privados
deste alimento precioso. Da mesma forma, os deuses teriam necessidade de uma
alimentação constituída por pão; daí as ofertas destinadas ao casal divino Osíris e
Isis, protectores dos cereais e benfeitores do pão. Não será também difícil
imaginar o estado de surpresa do povo hebreu, aquando da sua chegada ao Egipto,
ao aperceber-se do empenho no cultivo do trigo e da existência de uma variedade de técnicas de
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
produção de pão. Durante os quatrocentos e trinta anos de exílio, os hebreus acostumaram-se
então ao pão egípcio. Em 1645 a.C., repentinamente, Moisés decidiu iniciar a grande caminhada
do deserto rumo à Terra Prometida; na pressa, os judeus não tiveram outra opção senão a de
levar massa não-fermentada – por isso, ficou decidido que se iria comemorar cada aniversário
desse memorável dia consumindo apenas pão ázimo.
2.1.2. Antiguidade grega
Com um sólo muito duro e rochoso, a Grécia antiga era um país pobre e sem autosuficiência alimentar. Marinheiros por excelência, por força da necessidade ou do gosto pelo
negócio, os gregos expandiram-se pela Ásia-Menor, por Creta e pela Sicília, até às margens do
mar Negro. A via marítima passou então a ser a sua principal forma de abastecimento alimentar:
a Grécia importava cerca de dois terços dos cereais consumidos, sendo que o trigo vinha do
Egipto, da Rússia meridional e da Sicília, apesar da mitologia grega ter atribuído o trigo à deusa
Ceres. O seu contacto com o povo egípcio permitiu-lhes aprender as técnicas de moagem e de
fabrico de pão – com efeito, as pedras de moer e os fornos de pão encontrados na Grécia são em
tudo semelhantes aos do antigo Egipto.
Os gregos implementaram grandes melhorias na arte de produzir pão: modificaram
ligeiramente a pedra de moagem, por forma a obter uma farinha mais fina; e prepararam um
novo fermento (zyma em Grego, que terá sido a origem etimológica da palavra enzima), obtido
na altura das vindimas pela mistura de lúpulo e mosto fresco, o qual era guardado em pequenas
ânforas. Os gregos utilizaram, portanto, as primeiras leveduras preparadas que a Humanidade
conheceu no fabrico do pão.
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Mas a reputação dos gregos como excelentes padeiros não ficou por aqui. Um outro
fermento foi igualmente preparado a partir de farelo e de mosto, o qual era deixado a repousar
durante dois ou três dias. De seguida, tal massa era seca e conservada no frio.
O pão fabricado era um bem reservado apenas às famílias ricas, ou preparado em ocasiões
festivas. Assim sendo, a maioria da população continuava a comer papas de farinha e bolachas, a
que juntavam muitas vezes gordura, leite, mel ou vinho, na tentativa de melhorar o sabor; em
contrapartida, as famílias ricas possuíam o seu mageiro (provável origem do termo moageiro),
conhecido como o anfitrião ou mestre da casa, mas que era, na realidade, o padeiro doméstico.
Os mageiros gregos – os primeiros padeiros da História – foram autores de um vasto
conjunto de obras escritas sobre os métodos de produzir pão e de receitas de cozinha, as quais,
todavia, desapareceram com os incêndios que deflagraram na Biblioteca de Alexandria (em 47
a.C. e 391 d.C.). A tradição e a ciência dos mageiros será reencontrada posteriormente em
Roma, resultado da profunda influência grega.
2.1.3. Antiguidade romana
A Roma primitiva era um Estado agrícola, cuja população era alimentada por camponeses
do Lácio à medida que a cidade se expandia. A sua expansão na época imperial no séc. II a.C.
trouxe necessidades alimentares cada vez maiores.
Durante muito tempo, os romanos contentaram-se com as simples pastas de farinha. Pouco
a pouco, o contacto com a experiência de outros povos permitiu introduzir os fornos (imitando
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
os egípcios) e os escravos (que moíam e coziam o pão). No entanto, até ao séc. II a.C. a
produção de pão era uma actividade estritamente doméstica.
Surgiram entretanto os padeiros, responsáveis pelo comércio do pão: eram antigos
escravos, mas existiam igualmente homens livres, que dispunham da ajuda de aprendizes,
escravos, ex-prisioneiros de guerra e estrangeiros, primeiro de toda a República e depois de todo
o Império; os romanos apreciavam particularmente a agilidade de mãos dos operários sírios e
fenícios. Estes padeiros começam a agrupar-se em corporações, as quais constituíram, em certos
momentos históricos de Roma, uma força poderosa, visto deles depender o abastecimento
alimentar da cidade.
Famosos pelo seu sentido prático, os romanos inventaram um novo tipo de moinho, que
pôde ser encontrado, em perfeito estado de conservação, graças à lava vulcânica que cobriu
Pompeia. Tais moinhos são os mais antigos que a Europa conhece.
Na época de Augusto, Roma contava com cerca de um milhão e duzentos mil habitantes:
um terço de nobres, cavaleiros e homens livres; um terço de ex-prisioneiros e escravos,
geralmente artesãos e domésticos; e um último terço constituído por pessoas sem profissão
definida, manobrados pelos poderosos e, por isso, prontos para a revolta. Nesta altura, o poder
distribuía gratuitamente trigo e pão; tanto na República como no Império, o preço e a
distribuição do trigo e do pão foram utilizados como armas políticas.
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
O peso do pão na alimentação deste povo era de tal forma elevado que, em anos de
colheitas deficitárias, a fome e a miséria grassavam, não só nos países produtores mas também
em Roma e nas numerosas partes do Império.
O Império Romano começou a desmoronar-se nos anos 395-400. Nesta altura, os povos
mais desenvolvidos já sabiam cultivar os cereais, moer as sementes e fazer o pão. Os mais ricos
ingeriam mesmo vários tipos de pão, ao passo que o homem comum se contentava com um pão
grosseiro, muitas vezes mal levedado.
Os egípcios inventaram e os gregos melhoraram as técnicas de produzir pão, considerado,
para estas civilizações, como um dom de Deus. Durante a história romana, os produtores de pão
conquistaram a sua identidade profissional; o trigo e o pão permitiram-lhes então entrar na cena
comercial internacional, e no grande jogo político daí derivado.
2.1.4. Idade média – Idade contemporânea
No séc. V, mais de trezentos anos após Roma ter atingido o seu apogeu e quinhentos anos
depois da conquista de todo o litoral do mediterrâneo Norte e do Sul da Península Ibérica, as
estruturas políticas, económicas e sociais sucumbiram à avassaladora chegada dos povos
Bárbaros (de origem germânica) às terras do Império romano – povos semi-nómadas, que
encaravam o vigor físico como uma virtude, e o trabalho manual como desonroso e próprio de
escravos.
O povo invadido abrigou-se na protecção dos chefes militares ou religiosos, nascendo
assim o regime feudal: o senhor, cuja função natural era guerrear; e o servo, que explorava a
terra de forma muita primitiva. O clima de insegurança instaurado originou um grande
isolamento das populações e um retrocesso nos conhecimentos científicos: o desaparecimento
das padarias e o regresso ao fabrico doméstico do pão são disso exemplo. Da herança romana
permaneceria, quase exclusivamente, o moinho de água.
Os povos bárbaros adoptaram os moinhos de água junto aos rios, e nos descampados do
Norte transformaram-nos em moinhos de vento, ideia trazida da Ásia menor pelos Cruzados. A
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
moagem era, então, feita no campo, e o pão fabricado no castelo, na vila ou na cidade. É assim
que a profissão associada ao fabrico do pão se subdividiu em duas mais especializadas: o
moleiro (ou moageiro) e o padeiro.
O séc. V trouxe, portanto, mudanças intensas e rápidas na vida das populações mercê da
chegada dos Bárbaros: o comércio desorganizou-se, as searas foram incendiadas e o gado
pilhado, e os senhores do passado, uma vez despojados, tornam-se nos escravos do presente; os
que se conseguiram refugiar nos bosques formaram bandos de salteadores, enquanto os
pescadores optaram pela lucrativa arte da pirataria. Só com a chegada dos Visigodos à Península
Ibérica, no terceiro quartel do séc. V, se fez sentir uma certa acalmia que permitiu alguma
reorganização, rapidamente quebrada pela chegada dos ferozes guerreiros da Escandinávia, os
Normandos.
No Oriente, a partir do séc. VII, o Império bizantino sofreu invasões em várias frentes: os
Eslavos, a Norte, conquistaram a Dalmácia; os Muçulmanos, a Sul, ganharam domínio sobre
todo o Império persa; e os turcos e vários tribos descendentes dos Mongóis e dos invasores
Hunos, a Levante.
Os Árabes, convertidos ao islamismo, expandiram-se no Norte de África e, em 711, Árabes
e Berberes invadiram a Península Ibérica, aí permanecendo durante quase oito séculos: a nora, a
ceifa e a azenha são exemplos de vocábulos de origem árabe relacionados com panificação.
Começaram, então, a travar-se duras batalhas, que fizeram retroceder os Árabes de Norte para
Sul.
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
O resto da Europa era palco de inúmeras batalhas. Todas estas convulsões conduziram ao
arrasar das terras de cultivo e à destruição de povoações completas, fazendo com isso grassar a
fome.
Nos finais do séc. XVI, a Europa oriental continuava a debater-se com várias guerras, ao
passo que no Ocidente as linhas fronteiriças se aproximavam das que conhecemos hoje. Agora,
foi o mapa terrestre que começou a sofrer grandes transformações; como resultado das epopeias
marítimas dos Portugueses a Oriente e dos Espanhóis a Ocidente, a Terra deixou de ser plana e
desconhecida.
O biscoito (panis nauticus, ou pão do mar), já conhecido na Antiguidade entre os gregos e
os romanos, era o pão consumido a bordo das naus e dos galeões portugueses. Este pão achatado
de trigo, sal e água era cozido no forno duas vezes para se conservar por vários meses. Para
erradicar a escassez de cereais sentida em Portugal nessa época, tentou-se obtê-los do exterior
(p.ex. Ceuta) e introduzi-los nas ilhas recém descobertas de Madeira, Cabo Verde e São Tomé e,
posteriormente, no Brasil. No final do séc. XV, aquele problema havia sido ultrapassado, tendo
os Açores passado a ser o principal fornecedor de trigo (não só para Portugal continental, mas
também para as praças fortes portuguesas no Norte e litoral africano, e ainda para a Madeira).
Este facto, aliado ao casamento em 1536 de Catarina de Médicis com o futuro rei francês,
Henrique II, alteram profundamente os hábitos alimentares europeus. Este casamento permitiu
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
modernizar os hábitos medievais dos gauleses, que, mais tarde, influenciariam todas as cozinhas
europeias até aos nossos dias.
Mas os descobrimentos trouxeram, para além de novas terras e de novas gentes, um sem
número de novos produtos até então desconhecidos na Europa: um importantíssimo bem
alimentar foi o milho, conhecido como milho maíz para o distinguir do milho-miúdo, alvo ou
painço, de menores dimensões e rendimento, tradicional na Europa. De todas as transformações
culinárias resultantes dos descobrimentos, o milho maíz para o pão, assim como o açúcar (agora
existindo em grandes quantidades e a menor preço, após a descoberta do caminho marítimo para
a Índia) para os bolos foram, indubitavelmente, os grandes propulsores do desenvolvimento da
panificação.
Entretanto, no Leste europeu as conquistas pelos Otomanos atingiram o seu auge no limiar
do séc. XVII, tendo a reconstrução da Europa continuado durante o século seguinte. Porém, as
guerras e alguns maus anos agrícolas impediram a erradicação da fome na Europa ocidental,
originando períodos de grandes mínguas.
A Idade média, período de grandes convulsões sociais, não trouxe alterações de relevo aos
utensílios e técnicas usados na produção do pão; mesmo os fornos permaneceram no essencial
idênticos aos da época greco-romana. Durante mais de quinze séculos, o pão continuou a ser o
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
alimento essencial do Homem, mas foi preciso esperar até ao final do séc. XIX e início do séc.
XX para se sentirem mudanças profundas.
O séc. XIX, com a Revolução Industrial, trouxe grandes invenções e descobertas, muitas
das quais revitalizaram também a tecnologia de panificação: as locomotivas agrícolas (tractores,
ceifeiras mecânicas e debulhadoras de grão), a forte instrução agrícola, a selecção de sementes, o
desenvolvimento de compostos orgânicos e de adubos, o cultivo de espécies melhoradas, o uso
de fogões de ferro e, por fim, a electricidade.
Apareceram as grandes companhias moageiras, levando ao aperfeiçoamento das técnicas
de trituração; e descobriram-se as leveduras, passando a compreender-se melhor o fenómeno da
fermentação. Contudo, a prosperidade do século das luzes não ocorreu sem grandes
perturbações: na América, as velhas colónias europeias reivindicaram e conseguiram a
independência; e a Europa foi assolada pelas invasões napoleónicas. Esta instabilidade conduziu
novamente a carências alimentares em alguns pontos da Europa.
No séc. XX, a I Grande Guerra (1914-1918) transformou novamente as bolotas num
alimento corrente. Também a II Grande Guerra (1939-1945), a guerra civil de Espanha (19361939) e a revolução bolchevique (1917-1921) trouxeram de novo a fome e a miséria, pelo que se
voltaram a utilizar as farinhas de leguminosas para o fabrico de papas e de pão.
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Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Conclui-se, portanto, que por ser um produto de primeira necessidade e a base da
alimentação, o pão foi desde há muito tempo um alimento político e estratégico. Por isso,
durante séculos o pão foi protagonista de guerras e discórdias, que condicionaram o rumo da
História.
2.2. Pão massificado
Conforme ficou claro na secção anterior, o pão desempenhou, durante muitos séculos, um
papel fundamental na alimentação humana, sendo considerado um símbolo de bem-estar. Porém,
a Revolução Industrial do séc. XIX desencadeou grandes modificações nos hábitos alimentares,
que incluiram a diminuição da importância do pão.
Na maioria dos países industrializados, o consumo de cereais decresceu gradualmente
durante o séc. XX; hoje em dia, os cereais fornecem menos de 25 % da energia diária na dieta
humana. Contudo, os cereais mantêm o seu status de mais importante fonte alimentar singular.
No início do séc. XX, o consumo anual de pão em Portugal rondava os 146 kg/habitante,
mas em 1990 esse valor era de apenas 62 kg/habitante. A queda da importância do pão sentiu-se
ao longo de todo aquele século, embora tenha sido mais significativa nos anos 60 com a
implementação da produção industrial de alimentos de origem animal, tais como os ovos, o leite
e a carne.
15
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Consumo de pão em 1990
207
Portugal
116
Luxemburgo
Holanda
163
Bélgica
164
170
Grécia
176
França
Espanha
184
Itália
186
208
Alemanha
0
50
100
150
200
250
g de pão / habitante / dia
Na Alemanha, assistiu-se a um aumento do consumo de pão até ao início da década de 90,
ao invés dos restantes países da Comunidade Europeia, cuja tendência foi de estagnação, ou
mesmo decréscimo na década de 80. Neste momento, começa a esboçar-se uma inversão desta
tendência decrescente nos países mais evoluídos da Europa.
Existem várias razões para esta inversão; a de maior impacto será, porventura, decorrente
das acções de marketing no sentido de aumentar o consumo de pão. Tem sido realçada a
importância do pão numa alimentação racional e equilibrada, nomeadamente como fonte de
energia de absorção lenta (ao contrário do que acontece com as gorduras e os açúcares simples) e
como fornecedor de fibras (cada vez mais importantes, principalmente para a população post
meia idade). A adesão às refeições rápidas tornou, também, o pão num alimento quase
indispensável.
Consumo médio recomendado de pão
150
Crianças 4-6
anos
250
Crianças 7-10
anos
300
Adultos
0
50
100
150
200
250
300
g de pão / dia
16
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Tem-se igualmente verificado uma alteração no tipo de pão consumido. O pão branco, bem
alimentar destinado à fracção mais rica da sociedade há algumas décadas atrás, generalizou-se a
toda a população, com o aumento do poder de compra resultante do desenvolvimento
tecnológico. No entanto, este pão não possui o sabor, o aroma e as características nutritivas do
pão tradicional (onde se inclui a Broa), para além do que o seu tempo de conservação é
normalmente menor; tal tem contribuido para a sua perda de notoriedade nos países mais
desenvolvidos.
Por outro lado, as farinhas escuras originam um pão mais rico em proteínas, sais minerais
(sobretudo Ca, Fe e P), vitaminas (sobretudo B1, B2 e PP) e fibras, o que levou a um ganho de
popularidade do pão integral nos últimos anos, por razões de índole sobretudo dietética.
Em Portugal, tal como nos países mais desenvolvidos, espera-se que o consumo aumente
até atingir o patamar de c. 300 g de ingestão diária, o qual é aconselhado pelos dieteticistas para
um regime alimentar correcto. Recorde-se que, na roda dos alimentos, o pão (e cereais)
representam a segunda maior porção (30% da ingestão total diária recomendada), e pertencem ao
grupo de alimentos fornecedores de energia e capazes de prevenir afecções de saúde, tais como
doenças cardiovasculares (p.ex. arteriosclerose) e doenças do tracto gastrointestinal (p.ex. cancro
do cólon, hemorróidas, obstipação e diabetes).
O amido, principal fonte de energia presente nos cereais, é a mais apropriada e benéfica
para o Homem: dificulta a formação de gorduras de reserva e impede as diabetes. Acresce que a
sensação de plenitude gástrica gerada pelo pão ajuda também a prevenir a obesidade, podendo
até ser fundamental nos regimes de emagrecimento.
As proteínas solúveis do pão branco (albuminas e globulinas) e as proteínas insolúveis
(glúten) podem ser facilmente complementadas com as proteínas fornecidas por outros produtos,
tais como o leite, a carne, o peixe e os ovos. Em conjunto, estes alimentos fornecem, por
desdobramento digestivo, os aminoácidos indispensáveis à manutenção e desenvolvimento do
organismo. Em particular, o centeio é rico em lisina, um dos aminoácidos essenciais.
17
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
A celulose e as fibras desempenham importantes funções de regulação no aparelho
digestivo – destacam-se a intervenção na actividade enzimática digestiva, diminuindo a glicemia
pós-prandial e a absorção de colesterol (prevenindo assim a arteriosclerose); e estão igualmente
associadas à baixa incidência de cancro do cólon.
Urge restituir ao pão o lugar merecido na alimentação humana, o que depende muito do
sucesso na luta contra as falsas ideias criadas à sua volta. Com efeito, a força poderosa do
marketing de produtos substitutos do pão, e o facto de o sabor preferido de uma geração ser, de
modo geral, aquele a que a geração anterior a habituou, são fortes entraves ao aumento do
consumo de pão, principalmente o de mistura.
2.3. Pão tradicional
Os principais cereais usados na panificação distribuem-se em Portugal por três áreas
específicas: o trigo na zona mediterrânica, onde as planícies apresentam alguma fertilidade e os
Verões são quentes e secos; o centeio na zona transmontana e montanhosa, onde o cereal se
adapta aos sólos mais pobres, aos Invernos rigorosos e à altitude; e o milho na zona atlântica,
onde o clima temperado e húmido é favorável ao seu desenvolvimento. Na Região Centro, o
trigo e o milho cultivam-se em proporções quase idênticas.
Trigo
Centeio
Milho
18
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
2.3.1. Milho
Tradicionalmente, o milho é um cereal de pequena exploração, que exige cuidados
minuciosos na sementeira, mondas, sachas e regas. Em contrapartida, o centeio foi durante muito
tempo um cereal explorado por comunidades rurais, enquanto o trigo pertence à grande lavoura
extensiva.
Não se conhecem as espécies bravias originais do milho americano, também conhecido por
milho graúdo, milho grosso, milhão, milho de maçaroca ou milho maíz (Zea mays), embora se
lhes atribua uma descendência a partir do Teossinto. Planta natural da América Central e do Sul,
o milho cresce espontaneamente nas cordilheiras do México e da Gautemala, onde teria
hibridado com alguma outra espécie entretanto extinta. Foram encontradas diversas variedades
de grãos de milho em escavações aztecas, com idades superiores a quatro mil anos.
O milho, cereal de Verão ideal em climas caracterizados por Verões quentes e húmidos, é
o único cereal sachado e regado (para além do trigo); o seu ciclo vegetativo é de apenas quatro a
cinco meses, podendo atingir três metros de altura, sendo que cada
espiga, ao produzir um grande número de grãos, o torna num cereal
incomparavelmente rentável. A água é indispensável, principalmente na
fase de formação dos órgãos reprodutores da planta. A colheita do milho
faz-se de Agosto a Outubro. Entre os grandes produtores mundiais
encontram-se os EUA, o México, a Itália, a França, a China, a Argentina
e o Brasil.
Na Idade média, eram cultivados em Portugal, essencialmente no Noroeste, o milho-alvo
ou milho-miúdo (Panicum miliaceum), bem como o painço ou milho painço (Setaria italica); o
trigo e a cevada cultivavam-se do Minho ao Algarve, enquanto o centeio era usual nas zonas
montanhosas.
Quando os Europeus chegaram ao novo Continente, encontraram grãos de milho brancos,
amarelos, azulados, vermelhos e esverdeados, tendo-se optado pelo grão amarelo devido à sua
19
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
alta produtividade e à sua maior semelhança com a farinha de milho-miúdo ou alvo.
Actualmente, existe uma grande variedade de subespécies deste farináceo, obtidas por selecção e
cruzamento, acrescidas de manipulação genética cada vez mais frequente.
Em Portugal, o cultivo do milho foi rapidamente implementado logo após a viagem
pioneira de Cristóvão Colombo, em 1492. A sua cultura iniciou-se no Centro do país, e
sobretudo na faixa litoral Norte – regiões onde não se pode conceber a cozinha sem a Broa de
milho; tal Broa é geralmente preparada também com centeio devido à falta de glúten no milho,
tornando o pão lêvedo e mais leve.
Nos alvores do séc. XIX, o milho substituiu outras culturas menos rentáveis nas regiões do
interior (Trás-os-Montes e Beiras) e nas regiões do Sul (Alentejo e Algarve). Foi igualmente
divulgado através dos vários continentes, acompanhando a expansão marítima: as ilhas do
Atlântico, tais como Madeira, Açores e Cabo Verde; o litoral da África Ocidental, tal como
Angola e Congo; e o Continente asiático, tal como Índia, China e Japão.
Em 1874, o milho ocupava o primeiro lugar entre os cereais cultivados, tendo sido
destronado dessa posição pelo trigo no séc. XX. A importância do milho na alimentação,
sobretudo no Noroeste, e as suas repercussões no plano agrícola, económico, social e cultural,
valeram-lhe a designação de cereal revolucionário: contra a fome e a escassez, o milho apareceu
como planta milagrosa.
No plano agrícola, a implementação do milho transforma a paisagem e o calendário, sendo
suprimido o pousio dos cereais de Inverno (trigo e centeio). Dado a sua época tardia de
20
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
maturação, tornou-se necessário construir eiras de pedra e espigueiros ou canastros, os quais se
tornaram característicos das paisagens do Noroeste de Portugal; a sua produção é
frequentemente associada a outras culturas que também necessitam de regadio (caso do feijão e
da abóbora), originando uma policultura, e as áreas de cultivo e os socalcos estendem-se em prol
do milho em detrimento de outras culturas.
O milho representa também uma vantagem na economia rural: é cultivado em leiras
pequenas, produz todos os anos e suporta outras culturas em consociação; as pequenas porções
de terra conciliam-se, perfeitamente, com o trabalho de sacha no seu cultivo; a cultura em
socalcos quebra-lhes o pendor, aumenta a superfície arável e facilita a rega; e a produtividade
por hectare é três a quatro vezes superior à do trigo.
21
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Sob o ponto de vista social, o nível de vida dos agricultores melhorou significativamente
com o aumento do rendimento das terras trazido pelo cultivo do milho. O regime de minifúndio
alterou o habitat rural: a dispersão das parcelas de milho traduziu-se na disseminação das
habitações, a qual no Minho, não obstante, é anterior à introdução deste cereal.
O impacto a nível cultural é, também, elevado: o pão de milho é um elemento fundamental
na alimentação; e novos rituais e símbolos religiosos, bem como a própria sacralização do milho
e da Broa com ele produzida, enriquecem e singularizam toda uma cultura regional. Acresce que
este cereal passou a ser, juntamente com o vinho, a moeda em que se passaram a pagar as rendas
e a aferir da riqueza agrícola, a par do património florestal.
2.3.2. Centeio
Etimologicamente, o nome deste cereal formou-se a partir do latim centeni, por se crer que
cada grão produz cem. É muitas vezes designado pelo termo latino messis e, no Norte de
Portugal, ainda hoje se utiliza a designação similar de messe ou messes.
22
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
O centeio (Secale cereale) é muito importante enquanto planta industrial, pela sua
tolerância ao frio invernoso e às altas temperaturas estivais, podendo ser cultivado tanto em sólos
graníticos como xistosos. Este cereal é usado não apenas para a produção de pão, mas também
como componente de forragens e na produção de bebidas, tais como a cerveja na Rússia, o
whisky na América do Norte e a aguardente na Holanda.
A sua origem parece residir em algumas variedades bravias (Secale montanum),
espontâneas nas montanhas da orla mediterrânea, sobretudo o Atlas e a Serra Nevada, bem como
nos elevados planaltos do Oriente; foi através de um processo de hibridação que surgiu a espécie
comestível actualmente conhecida. Pensa-se ser um cereal mais recente do que o trigo, pois não
foi encontrado em despojos anteriores à Idade do bronze.
O ciclo vegetativo do centeio é de oito a nove meses, chegando a atingir, no final do ciclo,
1.6 a 1.8 m de altura. A sua colheita faz-se em Julho, um mês depois da do trigo.
Na Europa, o centeio é cultivado sobretudo na Rússia, Polónia e Ucrânia; em Portugal, é
típico do Centro interior e do Norte transmontano. As variedades de centeio são, na sua
composição e valor alimentar, muito semelhantes às do trigo, o que, devido à sua relativa riqueza
em glúten, permite fazer pão exclusivamente de farinhas deste cereal. Contudo, sendo estas
menos elásticas e mais escuras que as do trigo, originam consequentemente um pão mais escuro
e mais denso.
Um estudo científico recente comprovou que as pessoas mais idosas podem reduzir
em 17 % o seu risco de mortalidade por enfarte de miocárdio se consumirem três fatias de pão
de centeio por dia; os investigadores reclamam que as fibras insolúveis têm um efeito redutor
sobre a pressão arterial, e aparentemente também melhoram o metabolismo do açúcar e reduzem
o teor de lípidos no sangue.
23
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
2.3.3. Broa
Como já foi atrás referido, a introdução do milho maíz ou americano (Zea mays) no fabrico
de pão foi uma das mais importantes contribuições dos Descobrimentos para a arte de
panificação em Portugal. A Broa e outros pães de milho já eram confeccionados antes daquela
introdução, embora tal acontecesse a partir de milho-miúdo (Panicum miliaceum), que foi
entretanto (e rapidamente) substituído pelo milho maíz, planta mais robusta e mais rentável.
Trinta anos antes da primeira viagem de Cristóvão Colombo, já se fazia o cultivo de milhomiúdo na Península Ibérica, apesar de se ter praticamente perdido a sua utilização para a
alimentação humana.
A palavra Broa, que se aplica aos pães feitos com milho ou centeio, é usada principalmente
pelas populações do Norte de Portugal, e deriva do céltico bron ou do germânico broth, que
nestas línguas significava pão (confronte as actuais palavras brot, em Alemão, e bread, em
Inglês). No Sul de Portugal, maior consumidor de pão de trigo dada a sua grande influência
romana, adoptou-se o nome que deriva directamente do panis latino.
Os Aztecas, que ensinaram aos invasores europeus a forma de cultivar o milho, consumiam
a sua farinha principalmente sob a forma de bolachas cozidas sobre pedras quentes, tal como as
civilizações antigas o faziam com preparações não-fermentadas de outros cereais. Estas iguarias
continuam a ser bastante apreciadas na América Central. Estas papas, ligeiramente adocicadas
devido ao milho, ainda são confeccionadas pelos povos ocidentais, principalmente em Itália
24
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
(polenta) e em Espanha (gachas) – preferencialmente de trigo, bem como em Portugal, numa
variedade de formas ainda bem vivas na gastronomia popular.
À Broa de milho é adicionado sempre outro cereal: o trigo ou, mais frequentemente, o
centeio, resultando neste último caso um pão mais pesado. A razão desta prática prende-se com a
fraca capacidade de levedação do milho, devido à baixa percentagem de glúten (menos de 8%)
na sua constituição, apesar de ser rico em amido (cerca de 70%). Desta forma, as Broas são
sempre meadas, terçadas ou quartadas, conforme a parte do cereal acessório que lhes cabe.
Pão moreno e fúlvido, a Broa é especialmente apreciada no Norte e litoral Centro de
Portugal, onde o clima propiciou grandes áreas de cultivo do milho. É nestas regiões que se
confecciona a tão típica Boroa ou Broa, segundo receita proveniente da borona de milho painço
referida em documentos portugueses datados do séc. XII.
A designação de Broa aplicou-se primeiro ao pão de painço, o qual, apesar de áspero, era o
alimento quotidiano das gentes do campo. Registos do séc. XIII referem a expressão boroa
mossegada para designar pão de milho, e num documento datado de 1417 o mesmo é descrito
como boroa scarolada. Actualmente, empregam-se os termos Broa, Pão broa, ou Broa de milho
indistintamente, no Minho e no Douro, para designar o pão fabricado com farinha de milho.
Em muitos locais do Minho, há ainda a particularidade de a palavra Broa apenas se referir
às fornadas de pão de milho. Em linguagem corrente, chama-se pão à Broa, e trigo ao pão de
trigo. A expressão Broa pode ainda ser dada aos pães com forma circular e baixa: p.ex., em Trásos-Montes usam-se os termos Broa de centeio, Broa de trigo e Broa de milho. Nas Beiras, são
utilizadas alternadamente as expressões Broa e Pão de milho, enquanto que mais para Sul, no
Ribatejo e Alentejo, e bem assim nos Açores, a palavra Broa não é empregue para designar
especificamente pão de milho.
Uma broaça é uma Broa, e uma mulher baixa e gorda chama-se, em linguagem popular,
broa. Broeira é a tábua, suspensa no tecto, onde se colocam as broas saídas do forno. Broeiro é
25
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
aquele que come muito, ou que tem costumes e aparências rudes. Os habitantes do Porto também
são chamados de broeiros, pois a Broa era o pão comum da gente mais humilde naquela cidade.
Apesar de o pão de trigo ser muito vulgar no Minho e no Douro, o Pão de milho ou Broa
continua a ocupar um espaço importante na alimentação. Este pão de mistura tem diferentes
designações consoante a região e a sua constituição: Boroa centeia, Broa espoada, Broa de
mistura ou Broa misturada, Pão de toda a farinha e Pão coado, entre muitas outras designações.
2.4. Fabrico de Broa
Cada comunidade rural possui as suas regras, as suas práticas e os seus costumes, e tal faz
sentir-se na forma como confeccionam a Broa, no seu conteúdo, na sua forma, no seu volume e
no seu gosto; trata-se, em última análise, da identidade cultural da comunidade. A confecção do
pão cabe à mulher; ao homem apenas cabe, quando muito, a tarefa de aquecer o forno e enfornar
o pão. A Broa é cozida (fornada) uma vez por semana, ou de quinze em quinze dias; no Verão,
pelo calor e pela falta de tempo com o trabalho no campo, a mesma é cozida com menor
frequência.
Os principais passos no fabrico são esquematizados de seguida:
Moer
Peneirar
Água quente/a ferver + sal
Milho
Centeio
BROA
Desenformar
Amassar
Amassar
Fermento
Renovar o isco
Cozer
Enformar
Fermentar
Aquecer e limpar o forno
26
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Descrições mais detalhadas de cada passo são apresentadas abaixo.
Peneirar
Antes de se começar a amassar, peneira-se a farinha. Utilizase para tal uma peneira de arame, de nylon ou de seda para separar
o farelo da farinha. Para facilitar este trabalho custoso usa-se, por
vezes, uma grade por cima da masseira, chamada cernideira ou
urnideira em Trás-os-Montes, e sobre a qual se gira manualmente
a peneira.
Amassar
A amassadura do pão difere consoante o tipo de farinha, os
utensílios utilizados, e os usos e costumes regionais e locais.
Depois de se aquecer a água (até uma temperatura tanto mais
elevada quanto menor o grau de moagem), adiciona-se sal e
coloca-se a farinha de milho a escaldar na masseira ou no
alguidar, amassando-se tudo com uma pá (ou directamente com a
mão, se a temperatura o permitir); mais tarde, adiciona-se o
fermento e a farinha de centeio, e procede-se à amassadura com as
mãos.
As quantidades de cada ingrediente são aquelas que foram
aprendidas da geração anterior por observação: é a transmissão do
saber-fazer. Esta etapa permite a absorção de água por parte do
glúten e a oxigenação da massa, que melhora a sua plasticidade e
capacidade de fermentação, e contribui para a sua descoloração.
A massa pesada e difícil de trabalhar, resultante da mistura
de milho com centeio, torna a amassadura uma tarefa relativamente árdua.
27
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Ritos e Fermentação
A fermentação é uma etapa fundamental na produção do
pão. Para que esta seja bem sucedida, recorre-se a métodos
empíricos e, muitas vezes, a práticas rituais: tapar a massa com
toalhas, mantas, um avental ou uma peça de roupa do marido,
fazer uma cruz na massa, espetar alguns dentes de alho na massa,
ou rezar orações. Quando começam a surgir “fendas” na massa, é
sinal que está lêveda.
Renovar o Isco
Da massa actual, deixa-se sempre uma porção para a
cozedura seguinte. Utiliza-se o gamelo, ou simplesmente o canto
da masseira.
No Minho, ainda se guarda o isco dentro de uma malga
(tigela pequena), e cobre-se com uma folha de couve para não
secar.
Aquecer e Limpar o Forno
Enquanto a massa fermenta, o forno é aquecido a lenha. De
quando em vez, remexe-se para arder melhor e para espalhar as
cinzas e o borralho.
Quando os tijolos do forno estão esbranquiçados, este é,
então, limpo com uma pá de ferro, e varrido com uma vassoura de
giesta, deixando-se algumas brasas na entrada antes de fechar a
porta.
Dar Forma à Massa
Depois de se untar a malga, o gamelo ou o tigelão com
farinha, enche-se com a massa fermentada para lhe dar forma e
tende-se o pão. Esta etapa exige à mulher muito treino e destreza.
28
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Meter a Broa no Forno
Para enfornar a broa, usa-se uma pá de madeira, redonda ou
rectangular, cujo cabo é mais ou menos comprido consoante a
profundidade do forno.
Este trabalho, particularmente fatigante devido à sucessiva e
rápida repetição de movimentos e pelo calor intenso que se faz
sentir junto ao forno, requer duas pessoas: uma para colocar as
broas na pá e outra para enfornar.
Quando cozidas em fornos comunitários, por vezes
pertencentes à igreja, as broas são assinaladas com uma marca
para as distinguir; nalguns locais, são colocadas por cima de uma
folha de couve – para não ficar em contacto directo com a cinza
que eventualmente exista no forno e para não deixar queimar a
parte de baixo das broas). Durante a cozedura, as mulheres têm a
oportunidade de usufruir de alguns momentos de merecido
descanso e descontracção, neste espaço de trabalho exclusi-vamente feminino: conversam entre
elas, e aproveitam para comer qualquer coisa.
Também nesta etapa há, por vezes, certos ritos: fazem uma cruz com a pá na entrada do
forno ou rezam orações. Lança-se, então, um punhado de farinha por cima das Broas para lhes
dar cor; fecha-se o forno com uma laje de granito (ou, mais recentemente, com uma porta de
ferro), e veda-se com barro ou com cinzas e bosta de vaca. A cozedura é a última fase do ciclo
do pão.
Assim como no cultivo do milho, todo o processo de produção tradicional da Broa está
ligado à fecundidade humana: as raparigas começam a aprender a arte na idade da puberdade;
nos dias em que ajudavam na amassadura, dormiam com um pouco de fermento para terem um
corpo bem dotado; quando as raparigas se casam, levam um pedaço de isco, e só então podem
confeccionar sozinhas a Broa; a fermentação é sinónimo de gravidez – quando a massa cresce,
adquire vida, inevitavelmente associada ao homem através do objecto ou da roupa masculina.
29
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Desenfornar o Pão
Com a ajuda da mesma pá que foi usada para enfornar o
pão, retira-se um a um o pão quente do forno.
Pela cor e textura do miolo e pelo som do toque na côdea,
as mulheres ficam logo a saber se a fermentação e a cozedura
correram bem. Por fim, após horas ininterruptas de trabalho, aí
está o pão que alimenta às refeições, mas que também alimenta as
crenças e a religião. A Broa acaba por ser um símbolo de convivialidade, hospitalidade,
generosidade e comunhão!
30
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
3. CARACTERIZAÇÃO
3.1. Geografia
No âmbito do presente esforço, amostras de farinhas de milho e de centeio, de fermentos e
de Broas (assim como águas de fabrico) foram recolhidas de 4 sub-regiões seleccionadas do
Norte de Portugal. De cada sub-região, foram escolhidas 2 zonas diferentes, e de cada zona
foram ainda escolhidos 2 produtores diferentes. Analisaram-se amostras em 2 períodos
diferentes do ano, correspondendo às estações (quente e fria).
Alto Minho
Basto
Valença
Lima
Viana do
Castelo
Porto
Bragança
ega
Tâm
Braga
Guimarães
Avintes
Chaves
Fafe
Vila Real
Douro
Vale do Sousa
4 Sub-Regiões
2 Zonas/Sub-Região
2 Produtores/Zona
Presidiu à recolha a preocupação em seleccionar sub-espaços do Entre Douro e Minho
onde fosse possível maximizar o aproveitamento económico deste produto tradicional. Os
31
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
produtores escolhidos eatavam localizados em Paredes de Coura, Melgaço, Cabeceiras de Basto,
Celorico de Basto, Lousada, Penafiel e Avintes.
3.2. Microbiologia
3.2.1. Contagens
Recorreu-se a uma grande diversidade de meios de cultura selectivos, com o intuito de
criar perfis microbiológicos de referência para esta especialidade alimentar portuguesa.
Apresenta-se, de seguida, as contagens de viáveis totais para dois produtores duma mesma
zona (produtores 1 e 2), no fermento (F), na farinha de milho (M) e na farinha de centeio (C).
Esta amostragem foi feita na época fria. Os resultados são expressos em Unidades Formadoras
de Colónias (UFC), por grama de amostra.
Contagens totais
log(UFC/gamostra)
10
8
6
4
2
0
TSA, VEG, TSA, VEG, TSA, ESP,
30ºC
55ºC
30ºC
TSA, ESP,
55ºC
Meio
F1
F2
M1
M2
C1
C2
O número total de viáveis em Tryptone Soy Agar (TSA) do fermento foi ligeiramente
superior ao das farinhas: a adição de água favorece o crescimento dos microrganismos existentes
nas farinhas, e a adição do isco também aumenta a carga microbiana, como seria de esperar. As
farinhas são igualmente responsáveis por diversas actividades enzimáticas. Os níveis das formas
vegetativas termofílicas (VEG) e esporuladas mesofílicas (ESP) foram no essencial idênticos,
32
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
sempre que houve crescimento a 55 ºC. O número de mesófilos vegetativos foi obviamente
superior aos dos restantes tipos.
No estudo consolidado de todos os resultados obtidos, encontrou-se uma boa correlação
entre as formas esporuladas, incubadas a 30 e 55 ºC em TSA, Bacillus cereus Medium (BCM) e
Trypticase Soy Yeast Extract Starch (TSYES). Contudo, as contagens de esporos em Reinforced
Clostridial Medium (RCM), específico para o género Clostridium, apenas exibiram uma boa
correlação com os restantes nas farinhas de milho. Pode considerar-se que há uma relação
próxima entre os esporos totais e os esporos de Bacillus.
O número de leveduras (LEV) do fermento é manifestamente superior ao das farinhas, ao
passo que o dos bolores (BOL) é praticamente nulo.
Leveduras e Bolores
log(UFC/gamostra)
10
8
6
4
2
0
YEDCA,
LEV
YEDCA,
BOL
RBCAB,
LEV
RBCAB,
BOL
Meio
F1
F2
M1
M2
C1
C2
As contagens de leveduras nos meios de cultura Yeast Extract Dextrose Chroramphenicol
Agar (YEDCA) e Rose Bengal Chloramphenicol Agar Base (RBCAB) apresentaram uma boa
correlação entre si em todas as amostras estudadas; porém, a contagem de bolores, nos mesmos
meios de cultura, só exibiu elevadas correlações nas farinhas mas não nos fermentos.
Os valores das contagens de viáveis no caso de bacilos Gram- foram nitidamente inferiores
aos das leveduras. Verificou-se, também, que os bacilos Gram- aeróbios facultativos, crescidos
nos meios de cultura Pseudomonas Agar Base (PAB), Herellea Agar (HA) e Alcaligenes
Nutrient Agar Yeast Extract Starch (ANAYES), foram, regra geral, predominantes sobre os
anaeróbios estritos do mesmo grupo, detectados em Violet Red Bile Dextrose Agar (VRBDA) e
33
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
MacConkey Agar (MacC). De facto, para a generalidade das amostras em questão, obtiveram-se
contagens elevadas de bacilos Gram- aeróbios facultativos, comparativamente às dos restantes
grupos de microrganismos considerados.
log(UFC/gamostra)
Bacilos Gram9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
VRBDA
PAB
HA
ANAYES
MacC
Meio
F1
F2
M1
M2
C1
C2
Nestes meios de cultura, encontrou-se uma forte correlação entre bacilos Gram- e alguns
grupos de cocos Gram+. No fermento, também se encontraram elevadas correlações entre bacilos
Gram- e formas vegetativas de bacilos Gram+; tal pode ser explicado pelo facto de haver,
frequentemente, o desenvolvimento sinergético entre espécies de bacilos Gram-, bacilos Gram+ e
cocos Gram+.
VEG
RCM,
ESP
RCM,
MRS
TSYES,
ESP
ESP
TSYES,
VEG
BCM,
BCM,
VEG
log(UFC/gamostra)
Bacilos Gram +
10
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
Meio
F1
F2
M1
M2
C1
C2
Ambos os meios de cultura selectivos para Bacillus, i.e. TSYES e BCM (sendo este último
particularmente indicado para Bacillus cereus) apresentaram valores de contagens muito
próximos, tanto para as formas vegetativas como para as esporuladas; de facto, a correlação
34
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
encontrada nas contagens microbiológicas foi elevada para todos os produtos. Em contrapartida,
a correlação destes com Lactobacillus detectados em De Man, Rogosa and Sharpe Agar (MRS)
e RCM nem sempre foi significativa. Por outro lado, existiu uma grande similitude de contagens
nas farinhas e no fermento, enquanto para os Lactobacillus (em MRS) registou-se uma diferença
notória.
No fermento, a ordem de grandeza das contagens em MRS foi idêntica à das obtidas para
leveduras, que constituíram os grupos microbianos predominantes; com efeito, as contagens de
Lactobacillus foram as maiores de entre todos os grupos estudados. O número de leveduras e de
Lactobacillus depende bastante do estágio de fermentação da massa; todos os fermentos foram
recolhidos na mesma fase de produção, ou seja imediatamente antes da sua adição à nova massa.
No entanto, a frequência de produção de Broa varia de produtor para produtor, originando,
assim, fermentos com diferentes estados de maturação e, consequentemente, conduzindo a
produtos distintos. Esta é uma das fortes razões justificativas do quão interessante é padronizar o
método de confecção tradicional da Broa.
No meio de cultura para Clostridium, RCM, obteve-se os valores mais baixos para os
bacilos Gram+ formadores de esporos. A ausência de esporos poderá dever-se a duas razões
distintas: a falta de selectividade do meio, ou a elevada sensibilidade destes microrganismos ao
crescimento em laboratório.
Os micrococos, crescidos em meio Fermentation Medium (FM), são um grupo importante
nas farinhas, assim como o género Leuconostoc (crescido em Mayeux, Sandine and Elliker agar,
MSE). No fermento, os estreptococos (Kenner F. Streptococcus agar, KF) e, em particular, os
lactococos (Lactic Streak Agar, LSA) representam grupos relevantes de microrganismos. Os
Leuconostoc (cocos Gram+) também podem existir em número elevado, dependendo do tempo
de vida do fermento; este género desempenha um papel importante no início da fermentação.
35
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
log(UFC/gamostra)
Cocos Gram+
9
8
7
6
5
4
3
2
1
0
BPM
FM
M17
LSA
KF
KEAA
C1
C2
MSE
Meio
F1
F2
M1
M2
Foi encontrada, em todas as amostras estudadas, uma boa correlação entre contagens dos
vários cocos Gram+ catalase- analisados, mas não entre estes e os vários cocos Gram+ catalase+
(i.e. Staphylococcus, que crescem em Baird-Parker Medium, BPM).
Fazendo uma análise global dos dados gerados, verificou-se que o perfil microbiológico
dos fermentos não apresenta semelhanças nítidas no interior de cada região nem por zona
estudada, muito embora se possam, nalguns casos particulares, observar relações bastante fortes
relativas à microbiologia dos fermentos por região.
No que diz respeito às farinhas de milho e de centeio, concluiu-se que não é possível
diferenciar as amostras dos produtores originários das diferentes regiões consideradas, i.e. as
farinhas exibiram um perfil microbiológico semelhante apesar das diferentes origens geográficas
das amostras. Tal como nos fermentos, também nas farinhas foi possível constatar a
variabilidade apreciável da carga microbiana consoante a estação em que se recolhem as
amostras (estação fria ou estação quente).
Decorrente das observações experimentais, também foi possível registar que as farinhas de
milho e de centeio possuem um perfil microbiológico distinto: as últimas (tal como no pequeno
número de farinhas de trigo analisadas) conduziram, regra geral, a maiores valores de UFC para
bacilos Gram- e para alguns géneros de Micrococcaceae, enquanto que as farinhas de milho
apresentaram valores mais elevados para bolores e algumas formas esporuladas de
microrganismos. Desta forma, embora não tenha sido possível distinguir as farinhas provenientes
dos vários produtores, foi possível distinguir o tipo de farinha pelo seu perfil microbiológico.
36
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Por seu turno, os fermentos possuem uma microflora nativa bem distinta da das farinhas,
tipicamente constituída por leveduras, Lactobacillus, Streptococcus, Lactococcus, Enterococcus
e Leuconostoc e, simultaneamente, um número mais elevado de contagens totais de mesófilos.
Foi possível concluir que, na massa fermentada para a produção de broa, as leveduras,
Lactobacillus, Streptococcus, Lactococcus, Enterococcus e Leuconostoc constituem a microflora
predominante, por serem capazes de interagir sinergeticamente; igualmente se constatou que a
microflora indesejável, p.ex. os bacilos Gram-, existente nas farinhas diminui de importância no
decorrer do processo fermentativo.
Da grande diversidade de variáveis estudadas (i.e. contagens de microrganismos em
diferentes meios de cultura selectivos), depreende-se que algumas possuem elevadas correlações
entre si; por conseguinte, poder-se-á eventualmente reduzir o seu número na tentativa de
caracterização rápida e segura da Broa. Ao mesmo tempo, encontraram-se variáveis fracamente
correlacionadas entre si, que constituem assim os grupos de microrganismos que melhor
distinguem as amostras em função das suas origens distintas.
3.2.2. Identificação
Com este fim, procedeu-se à selecção de um elevado número de colónias, de acordo com
as suas características morfológicas e com a frequência de aparecimento. Foi possível, então,
obter uma referência das estirpes predominantes nas farinhas e fermentos usados no fabrico da
Broa tradicional, conforme se apresenta na tabela seguinte.
37
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Fermento
Farinha de milho
Farinha de centeio
Aerococcus viridians
Aerococcus viridians
Bacillus pumilis
Bacillus cereus
Bacillus cereus
Candida pelliculosa
Bacillus pumilus
Bacillus polymyxa
Enterococcus casseliflavus
Candida pelliculosa
Bacillus pumilis
Enterococcus durans
Lactococcus lactis ssp. lactis
Bacillus subtilis
Lactococcus lactis ssp. lactis
Leuconostoc ssp.
Lactobacillus curvatus
Micrococcus ssp.
Micrococcus ssp.
Lactococcus lactis ssp. lactis
Pseudomonas cepacia
Saccharomyces cerevisiae
Leuconostoc ssp.
Sphingobacterium paucimobilis
Sphingobacterium paucimobilis
Listeria ssp.
Staphylococcus lentus
Staphylococcus lentus
Micrococcus ssp.
Staphylococcus xylosus
Pseudomonas cepacia
Sphingobacterium paucimobilis
Staphylococcus lentus
Staphylococcus xylosus
A identificação exacta das espécies isoladas dos fermentos tradicionais é frequentemente
problemática por se tratar de espécies indígenas, nem sempre com propriedades idênticas às
estirpes de referência originárias de outros nichos ecológicos. Tal facto confere um valor
acrescentado à Broa, porquanto produto único distinto de todos os outros (e por isso inimitável).
Como resultado da ausência de boas condições sanitárias durante o processo de produção
da Broa, foram detectados vários microrganismos directamente implicados em contaminações:
Enterobacteriaceae, coliformes, enterococos e Bacillaceae (em particular Bacillus cereus),
embora a níveis suficientemente abaixo do patamar de relevância em termos de saúde pública.
Os grupos de microrganismos mais importantes são, provavelmente, as Bactérias ÁcidoLácticas (BAL) e as leveduras, dada a sua contribuição, durante o processo fermentativo, para as
características organolépticas do produto final. O seu desenvolvimento no fermento é favorecido
pelas condições existentes durante o armazenamento do isco, i.e. temperatura baixa e humidade
relativa elevada.
38
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
A diminuição do pH é devida principalmente à actividade das BAL; tal diminuição
desempenha um papel importante no controlo da microflora na massa, sendo determinante para o
sabor e textura finais do pão ácido (como é o caso da Broa).
A espécie Lactobacillus plantarum (um lactobacilo homofermentativo) está largamente
distribuída na natureza, e adapta-se melhor a ambientes vegetais, p. ex. milho e centeio, do que a
ambientes animais; Lactobacillus brevis (um lactobacilo heterofermentativo) é uma espécie
potencialmente interessante na fermentação do pão, dada a sua capacidade de produção de
quantidades elevadas de ácido acético quando comparada com outras espécies, p.ex.
Lactobacillus plantarum.
Estudos de leveduras presentes no isco usado para a produção de Broa indicaram que
Saccharomyces cerevisiae (conhecida como levedura de padeiro) é a espécie mais frequente. As
leveduras presentes no fermento são ácido-tolerantes, e formam uma combinação simbiótica
com os lactobacilos; as leveduras produzem aminoácidos, vitaminas e outros factores exigidos
pelo crescimento das BAL, as quais, por sua vez, impedem o crescimento de outros
microrganismos através da sua produção de ácido(s). Contudo, dependendo do género, espécie e
estirpe, e bem assim da proporção na microflora, é possível encontrar associações antagonísticas,
de competição ou de comensalismo entre diversos microrganismos.
As BAL homofermentativas são responsáveis pela obtenção de Broa possuindo boa textura
final; as BAL heterofermentativas e as leveduras melhoram o sabor e promovem o processo de
levedação. As actividades dos lactobacilos, em termos de proteases e amilases, influenciam a
degradação de compostos contendo N e C. Esta co-fermentação proporciona aos microrganismos
a utilização de substratos que, doutra forma, não seriam fermentescíveis, e aumentam a
adaptação microbiana a ecossistemas agressivos.
Portanto, a adição do isco à massa para a produção da Broa demonstra ser de extrema
importância no aumento efectivo da carga microbiana responsável pela fermentação. A
heterogeneidade dessa microflora impede o crescimento de microrganismos contaminantes,
incluindo alguns que estão presentes no fermento – a produção de substâncias anti-microbianas
39
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
contribui, de facto, para a estabilidade dos fermentos; a necessidade de conservantes químicos,
p.ex. ácido sórbico ou ácido propiónico, pode assim ser evitada pelo uso do isco como fermento.
O conhecimento da microflora típica do fermento poderá conduzir à selecção de apenas
algumas espécies para uso, na forma de culturas de arranque para a produção da Broa.
Naturalmente que as espécies seleccionadas serão as detentoras de boas características de
fermentação e rápida acidificação, p.ex. Lactobacillus plantarum e Saccharomyces cerevisiae.
Contudo, esse passo terá de ser dado com precaução, por forma a que a identidade própria deste
pão tradicional não se perca.
3.3. Química
Diversos parâmetros químicos foram analisados no decorrer deste estudo em farinhas de
milho e de centeio, no fermento e na Broa, com o objectivo de estudar o efeito do processo de
fermentação e, posteriormente, o efeito do processo de cozedura.
Nos gráficos seguintes, as notações M, C, F e B referem-se, respectivamente, à farinha de
Milho, à farinha de Centeio, ao Fermento e à Broa de diferentes produtores (1, 2, 3, 4 ou 5); os
seus valores médios estão representados nas últimas colunas dos gráficos (m). Amostras
comerciais de farinhas de Trigo (T) e de Centeio (Ce), assim como de Pão de Trigo (PT), Pão de
Centeio (PC) e Pão de Aveia (PA) foram igualmente analisadas.
% (m/m)
Cinzas
2
1.8
1.6
1.4
1.2
1
0.8
0.6
0.4
0.2
0
T C P P P M C F B M C F B M C F B M C F B M C F B M C F B
e T C A 1 1 1 1 2 2 2 2 3 3 3 3 4 4 4 4 5 5 5 5 m m m m
Amostra
40
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Tal como aconteceu para as análises microbiológicas, foram recolhidas para análises
químicas amostras de farinhas e de Broas de todos os produtores, em duas épocas diferentes do
ano.
No caso de cereais, os componentes das cinzas determináveis laboratorialmente são os
elementos metálicos ou metalóides, nomeadamente o sódio, o potássio, o cálcio, o magnésio e o
ferro, sob a forma de sais inorgânicos (principalmente fosfatos, sulfatos e cloretos) que não
volatilizam no decorrer da combustão a alta temperatura; acrescem os resíduos minerais
incombustíveis, provenientes da decomposição da matéria orgânica.
Como se pode observar, é nas farinhas de centeio que se encontraram os valores mais
elevados de cinzas, os quais estão intimamente associados aos valores mais elevados de proteína
total encontrados no mesmo produto. Pela análise dos dados, não foi possível identificar uma
relação linear entre a composição das cinzas das farinhas, do fermento e da Broa.
O aumento do teor de cinzas aumenta a acidez da massa – a qual é, regra geral, expressa
como Acidez Total Titulável (ATT), bem como a produção de ácido láctico e de ácido acético.
As cinzas das farinhas também influenciam positivamente a quantidade total de voláteis
produzidos. Alguns estudos indicam que, em farinhas com elevados teores de cinzas e ATT, se
registam as maiores concentrações de voláteis produzidos pelas BAL heterofermentativas.
Também o teor em aminoácidos totais aumenta com o teor em cinzas, devido à actividade
proteolítica.
A humidade (ou teor de água) é um dos factores de maior importância na definição da
qualidade de um produto alimentar. Com efeito, uma humidade elevada propicia o
desenvolvimento de microrganismos, os quais podem promover a sua deterioração e levar à
produção de substâncias tóxicas, p.ex. toxinas, assim como promover a oxidação dos lípidos, de
que resulta a rancidificação do produto. Também nos casos de humidades elevadas, os produtos
desidratados e em estado de dormência (como é o caso das sementes) retomam as suas
actividades metabólicas e iniciam o processo de germinação, podendo trazer grandes
inconvenientes à sua utilização enquanto matérias-primas, como acontece no caso das farinhas
41
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
de milho e de centeio para a produção de Broa. Em situação oposta, quando os cereais estão
excessivamente desidratados, os grãos quebram com facilidade durante a sua manipulação e
transporte, originando um rendimento processual menor, ou mesmo a desnaturação irreversível
de enzimas necessárias ao processamento, a precipitação de proteínas e a cristalização de
açúcares. Nas farinhas, a questão da humidade é ainda mais importante, na medida em que se
trata de um produto menos protegido das condições ambientais do que os cereais íntegros, mercê
da moagem prévia. Por outro lado, as farinhas são constituídas por partículas de pequenas
dimensões, pelo que a sua área superficial específica é ordens de grandeza superior à das
sementes intactas, o que favorece as trocas de água.
Humidade
60
50
% (m/m)
40
30
20
10
0
T C P P P M C F B M C F B M C F B M C F
e T C A 1 1 1 1 2 2 2 2 3 3 3 3 4 4 4
B M C F B M C F B
4 5 5 5 5 m m m m
Amostra
Tal como seria expectável, as percentagens de humidade no fermento e na Broa são muito
superiores às das farinhas, devido à adição de água. Comparando os valores de humidade entre
fermentos e Broas, observa-se que o processo de cozedura não provoca grandes perdas de água
presente na massa para a produção de Broa. O pão de trigo apresenta valores de humidade muito
inferiores aos da Broa, o que contribui para tornar este pão singular.
Acidez Total Titulável
7
18
6
14
5
12
10
4
8
3
pH
ml NaOH 0.1/10g
amostra
16
6
2
4
1
2
0
0
T
C
P
P
e
T
C A
P M C
1
1
F
B M C
F
B M C F
B M C
F
B M C
F
B M C F
1
1
2
2
3
4
4
5
5
2
2
3
3
Amostra
3
4
4
5
5
B
m m m m
ATT
pH
42
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
A degradação de produtos alimentares contendo teores apreciáveis de gordura leva à
libertação de ácidos gordos livres, o que faz aumentar a acidez total. Da oxidação de alguns
desses ácidos insaturados, resultam vários tipos de compostos, os quais podem conferir ao
produto odores e aromas desagradáveis (p.ex. ranço). Este tipo de alterações é facilitado por
condições de armazenagem sob temperaturas elevadas e não controladas, bem como por
ambientes húmidos. A acidez é, por isso, um indicador do estado de conservação, da sanidade e
da idade de uma farinha. Comparativamente à farinha de centeio, a farinha de milho possui uma
acidez bastante mais elevada, que coincide também com os seus valores mais elevados de lípidos
totais.
O pH é um parâmetro químico frequentemente utilizado para prever a evolução do
processo fermentativo na produção do pão, designadamente em termos da sua extensão. Por esse
facto, é comum caracterizar os fermentos de acordo com os valores do pH, da ATT e do
quociente de fermentação, QF (i.e. razão molar entre ácido láctico e ácido acético). A ATT dos
fermentos aumenta pouco durante o primeiro período de fermentação, devido à baixa actividade
metabólica das BAL e à elevada actividade das leveduras.
Um valor baixo do pH, resultante de fermentação pelas BAL, promove um aumento de
volume e uma melhor cozedura; restringe, ainda, a actividade enzimática, melhora a elasticidade
e aumenta o tempo de conservação do pão.
Os nossos resultados experimentais revelaram uma relação inversa entre o pH e a ATT,
como seria de esperar. O pH diminuiu durante o processo de fermentação, tendo aumentado
ligeiramente durante a cozedura devido à volatilização dos ácidos produzidos pela actividade
microbiana.
As amostras de pão de centeio analisadas apresentam valores de acidez muito elevados. A
razão para tal prende-se com o facto deste pão ácido ser fermentado com BAL e leveduras
durante 6 a 8 horas. No caso da Broa, o tempo de fermentação usual é de c. 2 horas, nunca sendo
possível, por isso, atingir tais valores de pH e acidez.
43
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Estes resultados evidenciam, também, a disjunção de caracteres entre o pão branco e a
Broa. A farinha de trigo possui um pH idêntico ao das farinhas de centeio e de milho, mas
apresenta a ATT mais baixa de todas as amostras analisadas (farinha e pão). Por sua vez, o pão
de trigo apresenta a menor ATT e um dos valores mais elevados de pH, muito semelhante ao da
própria farinha. A fermentação industrial do pão branco é feita com a adição de leveduras
(cultura de arranque), as quais são determinantes na produção de gás (CO2), contribuindo assim
para o aumento de volume da massa panar; porém, carece da fermentação láctica responsável
pelo sabor típico dos pães ácidos, a qual é promovida pelas BAL.
Mercê do exposto, pode concluir-se que, em termos de acidez e do decurso do processo
fermentativo, a Broa se posiciona entre o pão branco e o pão ácido.
Capaciade Tamponante
6
ml HCl 0.1N/10g
amostra
5
4
3
2
1
0
T C A M C M C M C M C M C M C
e
1 1 2 2 3 3 4 4 5 5 m m
Amostra
A capacidade tamponante das farinhas de milho e de centeio revelou-se muito idêntica,
sendo, regra geral, ligeiramente superior no centeio. A farinha de aveia (A) possui uma
capacidade tamponante singular.
O valor mais baixo da capacidade tamponante foi exibido pela farinha de trigo; tal
confirma que a constância dos valores de acidez e pH no pão de trigo se deve ao tipo de
fermentação usado com esta farinha. Uma elevada capacidade tamponante das farinhas conduz à
obtenção de maiores concentrações de ácidos.
44
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
g
/100g
ácido
amostra
Ácidos Orgânicos
0.9
0.8
0.7
0.6
0.5
0.4
0.3
0.2
0.1
0
P
T
P
C
1
F
1
B
1
F
2
B
2
F
3
B
3
F
4
B
4
F
5
B
5
F
m
B
m
Amostra
Ácido L-láctico
Ácido D-láctico
Ácido acético
Foi notório o decréscimo dos teores de ácidos láctico e acético durante a cozedura,
confirmando os resultados obtidos na determinação da ATT. Também os valores obtidos no pão
branco vieram ao encontro dos resultados anteriores.
A concentração de ácido L-láctico foi ligeiramente superior à do ácido D-láctico. O ácido
acético existe em menor concentração. A produção de ácido acético no fermento, a par do
processo de cozedura a temperatura elevada, protegem o pão de contaminações microbianas. De
referir que as BAL homofermentativas têm um efeito inibidor superior à das heterofermentativas
contra os coliformes.
A levedação da massa panar baseia-se normalmente, na fermentação alcoólica. Pelo
contrário, na Broa a fermentação heteroláctica desempenha igualmente um papel de relevo,
embora a quantidade de CO2 produzida por molécula de glucose seja metade da produzida na
fermentação alcoólica:
Fermentação alcoólica
C6H12O6
→
2 CO2
+
2 CH3CH2OH
Glucose
→
Dióxido de carbono
+
Etanol
Fermentação heterolática
C6H12O6
→
CO2
+
H3CCHOHCOOH
+ CH3COOH ou
CH3CH2OH
Glucose
→
Dióxido de carbono
+
Ácido láctico
+ Acido acético ou
Etanol
45
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
O ácido acético, produzido pelos lactobacilos heterofermentativos do fermento, possui
propriedades fungicidas, inibindo a germinação dos endosporos de Bacillus que conseguem
resistir às temperaturas de cozedura (e que se mostraram frequentes nas matrizes estudadas,
conforme anteriormente relatado).
A possibilidade do fermento resistir a ataques microbianos no pão depende da sua
composição em ácido láctico e, sobretudo, em ácido acético, os quais são produzidos pelas BAL.
O grau daquela possibilidade depende do tipo e da concentração de BAL, da capacidade de
fermentação dos substratos, do pH inicial e da capacidade tamponante.
Quando comparado com o ácido acético, o ácido láctico (o produto final normalmente em
maior concentração quando ocorre fermentação heteroláctica) é mais suave no sabor, mas
conduz a uma forte redução do pH, e a um reforço dos efeitos anti-microbianos.
Apenas o fermento F4 apresentou um valor de quociente de fermentação, QF, dentro do
intervalo considerado como óptimo, a saber 1.5-4.0; os fermentos F2 e F5 estiveram próximos
deste intervalo.
QF
mol ácido láctico/mol ácido acético
25
20
15
10
5
0
P P
T C
1
F B
1 1
F B F
2 2 3
B F B F
3 4 4 5
B F B
5 m m
Amostra
As taxas de produção, e a razão molar entre os ácidos láctico e acético dependem de
muitos factores, p. ex. tipo de farinha, microecologia da massa fermentada, temperatura e tempo
de fermentação. Sabe-se que as estirpes de LAB homofermentativas originam um QF superior ao
das heterofermentativas.
46
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Para além do exposto, outros parâmetros foram alvo do nosso estudo. O cloro é um dos
elementos constituintes da matéria orgânica, aparecendo sob a forma do anião cloreto (Cl-),
contrariamente ao fósforo e ao enxofre, cuja forma predominante é a de iões covalentes
compostos (fosfatos e sulfatos, respectivamente). Os cloretos são os aniões com maior
importância no balanço electrolítico e osmótico do interior das células constituintes dos
organismos; daí o interesse no seu doseamento em alimentos, como é o caso das farinhas e da
Broa.
Cloretos
0.6
0.5
% (m/m)
0.4
0.3
0.2
0.1
0
M
1
C
1
B
1
M
2
C
2
B
2
M
m
C
m
B
m
Amostra
Encontrou-se uma percentagem média de cloretos essencialmente idêntica nos 3 tipos de
produtos analisados, muito embora uma das amostras apresentada apresentasse um valor
bastante invulgar.
Designa-se por “fibra bruta” ou “celulose bruta” o conjunto de compostos que inclui a
celulose, a fracção insolúvel das hemiceluloses e alguma lenhina; tais compostos têm como
propriedades comuns o facto de permanecerem inalteráveis à acção de soluções diluídas de ácido
sulfúrico e de hidróxido de sódio, à temperatura de ebulição, o que implica tratar-se de materiais
praticamente não digeríveis. O seu elevado interesse nutricional deriva da contribuição para o
bom funcionamento do tracto gastrointestinal, conforme já discutido. Os valores médios foram
ligeiramente inferiores no produto final, devido a alguma actividade enzimática adventícia.
47
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Fibra
2.5
% (m/m)
2
1.5
1
0.5
0
M
1
C
1
B
1
M
2
C
2
B
2
M
m
C
m
B
m
Amostra
A determinação do teor em açúcares nos cereais panificáveis conduz a uma medida da
quantidade de amido degradado, a qual correlaciona com a capacidade de hidratação das massas,
para além de permitir inferir sobre a existência de substratos disponíveis para as fermentações
levadas a cabo pelos microrganismos.
Tal como era esperado, encontrou-se uma boa correlação entre concentração de açúcares e
pH: quanto maior a concentração de açúcares totais redutores, maior o pH.
Açúcares totais
7
6
% (m/m)
5
4
3
2
1
0
M
1
C
1
B
1
M
2
C
2
B
2
M
m
C
m
B
m
Amostra
Os açúcares desempenham um papel crucial nos processos fermentativos; durante a
confecção do pão, os açúcares das farinhas são susceptíveis de degradação pelas enzimas e
microrganismos existentes naquele – p. ex. o amido e os polifructosanos são enzimaticamente
degradados em açúcares fermentescíveis, tais como a maltose, a frutose e a glucose.
Os açúcares livres e os oligossacáridos são (potencialmente) fermentados pelas leveduras e
pelas BAL durante a confecção do pão. Participam, igualmente, nas reacções de escurecimento
48
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
do pão durante a cozedura, contribuindo para as suas características organolépticas finais. Os
açúcares aumentam a frescura e melhoram a textura do pão, sendo que as dextrinas de baixo
peso molecular têm um papel importante no seu envelhecimento.
Os pentosanos são usualmente metabolizados pela maioria das BAL heterofermentativas,
embora algumas estirpes sejam pentose-negativas. Muitas leveduras não conseguem assimilar e
fermentar a xilose, mas em contrapartida já o conseguem fazer com o seu isómero xilulose.
Alguns lactobacilos dos fermentos metabolizam a maltose produzindo glucose, a qual será
utilizada como fonte de carbono após a maltose se ter esgotado. Por outro lado, a glucose
controla o crescimento de bactérias e leveduras que competem pela maltose, por mecanismos de
repressão. A actividade da invertase das leveduras, e a capacidade destes microrganismos
fermentarem rapidamente a maltose, a sucrose, a glucose e a frutose contribuem para reduzir a
concentração de açúcares.
Para além dos microrganismos possuidores de enzimas endocelulares, ou excretores de
enzimas exocelulares (enquanto viáveis, ou por lise após morte celular), as enzimas nativas
presentes nas farinhas desempenham também um papel preponderante. Destas, as amilases serão
talvez as mais importantes: tais enzimas têm um efeito indirecto sobre a microflora existente na
massa panar, ao aumentar a concentração de açúcares fermentescíveis obtidos a partir do amido;
tal promove o crescimento e a capacidade de formação de gás pelas leveduras e pelas BAL, o
que melhora as características reológicas da massa. Outras enzimas das farinhas, tais como as
xilanases, as hemicelulases e as pentosanases influenciam também indirectamente a microflora,
pois a sua actividade hidrolítica gera açúcares (i.e. pentoses e hexoses), que por sua vez são
utilizados pelos lactobacilos.
As proteínas que ocorrem na natureza são normalmente constituídas por 20 aminoácidos
diferentes; no caso dos cereais, tal número reduz-se a 18. O conteúdo em proteína depende do
tipo de produto em causa e, no caso dos de origem vegetal, também da sua variedade e das
condições culturais em que se dá o desenvolvimento da planta (p.ex. chuvas abundantes – que
49
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
fazem baixar o teor em proteína, aplicação ou não de adubos azotados, e características dos
sólos).
Proteína total
12
10
% (m/m)
8
6
4
2
0
M
1
C
1
B
1
M
2
C
2
B
2
M
m
C
m
B
m
Amostra
A informação relativa ao teor em proteína de uma determinada matéria-prima é importante
na avaliação do seu valor nutritivo, independentemente daquela ser utilizada directamente na
alimentação animal ou na humana. Também é frequentemente de interesse o conhecimento da
sua composição em determinados aminoácidos essenciais, p.ex. o triptofano e lisina, os quais
não são sintetizados pelos organismos superiores. No caso das farinhas destinadas às indústrias
de panificação, o conteúdo em proteína é um dos principais indicadores da sua qualidade
tecnológica, verificando-se que a “força” de uma farinha (dada pelo valor alveográfico, W)
correlaciona positivamente com o seu teor em proteína; percentagens elevadas de proteína
(designadamente no caso do trigo) produzem efeitos positivos na consistência da massa e na sua
resistência à cozedura, uma vez que a rede proteica impede a saída do amido.
O termo “proteína bruta”, usado em análises químicas de rotina, pressupõe que todo o
azoto existente num determinado produto se encontra na forma de proteína. No entanto, tal não
corresponde exactamente à realidade, na medida em que existe sempre algum azoto sob a forma
de outros compostos, p.ex. amidas, aminoácidos livres, amónia, ureia, alcalóides e vitaminas, o
que introduz um erro por excesso na determinação percentual do teor de proteína. Porém, nos
cereais este erro não é relevante, uma vez que existe pouco azoto não-proteico, contrariamente
ao que acontece p.ex. com os produtos cárneos. Outro pressuposto na determinação da proteína
bruta é o de que as proteínas contêm 16 % (m/m) de azoto, o que também traduz apenas um
valor médio aproximado; é com base nesta percentagem média que se obtém o factor 6.25, pelo
qual se multiplica o teor em azoto, para encontrar a quantidade de proteína presente. Acresce que
50
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
as farinhas com elevados teores de cinzas exibem, geralmente, maiores concentrações de
aminoácidos, o que ajuda a explicar a boa correlação positiva encontrada entre teores de proteína
bruta e de cinzas.
Durante a fermentação despoletada pelo isco, espera-se a acumulação de aminoácidos.
Embora existam enzimas nativas nas farinhas possuindo actividade proteolítica, o incremento no
teor de aminoácidos está sobretudo relacionado com a microflora do fermento, especialmente
com as várias estirpes de BAL. Note-se que a hidrólise dos peptídeos pelas BAL é lenta no
início da fermentação, pois nesta fase as BAL estão em processo de reformulação da sua
maquinaria enzimática, a qual gera um lag time caracterizado por baixa actividade metabólica. A
taxa de proteólise e o perfil de aminoácidos libertados depende do perfil da microflora existente,
da temperatura ambiente, do rendimento da fermentação, e do inventário enzimático das
farinhas, entre outros factores.
Durante a cozedura, formam-se aldeídos a partir dos aminoácidos livres, em especial
alanina, valina, leucina, isoleucina, metionina e fenilalanina. Os produtos metabólicos
nitrogenados, designadamente peptídeos e aminoácidos desempenham um papel essencial no
suprimento das necessidades nutricionais dos microrganismos constituintes do fermento; acresce
que são precursores importantes do sabor no pão, estando também intimamente ligados às suas
características físicas.
Os lípidos representam um grupo de compostos bastante diferenciado, possuindo como
característica comum a sua insolubilidade em água. Um importante grupo dentro dos lípidos é o
dos ésteres de glicerol com ácidos gordos – os acetilgliceróis ou glicéridos (vulgarmente
conhecidos por gorduras se existem no estado sólido à temperatura ambiente, ou por óleos se se
apresentam no estado líquido). O glicerol é um poli-álcool, a cuja molécula se ligam até 3
moléculas de ácidos gordos, formando então os referidos glicéridos (mono-, di- e triglicéridos,
respectivamente). Os ácidos linoleico e linolénico, que se encontram em óleos vegetais, são
essenciais ao Homem e aos animais superiores, mercê da sua incapacidade de os sintetizar. Notese que o milho é, dos produtos analisados, o que apresenta a maior percentagem de lípidos totais,
e a Broa o produto que apresenta a menor.
51
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Lípidos totais
5
4.5
4
% (m/m)
3.5
3
2.5
2
1.5
1
0.5
0
M
1
C
1
B
1
M
2
C
2
B
2
M
m
C
m
B
m
Amostra
Embora presentes a baixos níveis na massa panar, os lípidos contribuem favoravelmente
para o volume do pão, a sua textura e a sua estrutura. As lipases actuam sobre os glicéridos
existentes, libertando ácidos gordos livres de cadeia curta em quantidades apreciáveis, os quais
desempenham um importante papel no sabor final do pão. No entanto, nas massas azedas (como
é o caso da massa para a produção de Broa), a eficiência das lipases é reduzida devido ao baixo
pH, o qual é por sua vez consequência da fermentação láctica. Muitas BAL são capazes de
metabolizar diferentes substratos com eventual produção de ácidos fumárico, málico,
glucorónico, láctico e pirúvico, sendo alguns destes resultantes da sua própria actividade
lipolítica.
Pela análise global dos resultados produzidos, conclui-se da existência de uma
variabilidade apreciável nos resultados da composição química da Broa de cada produtor quando
as amostras são recolhidas em diferentes épocas do ano; não foi igualmente possível diferenciar
as Broas com diferentes origens. Contudo, verificou-se que as características químicas das
farinhas de centeio são distintas das farinhas de milho, designadamente mercê dos maiores
valores médios do teor de cinzas e de açúcares nas farinhas de centeio, e de humidade e de
lípidos totais nas farinhas de milho.
Por seu lado, a Broa exibiu as maiores percentagens de humidade e de açúcares redutores
totais. Dado que na preparação da massa é adicionada uma grande percentagem de água,
justifica-se tal valor médio elevado; a actividade enzimática (das farinhas e dos microrganismos)
poderá explicar o nível ligeiramente superior de açúcares redutores devido à degradação do
amido e, ao mesmo tempo, à curta duração do processo de fermentação. O produto final
52
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
mostrou, também, a menor percentagem de cinzas, proteína e lípidos, podendo tais valores ser
explicados pelas actividades proteolítica e lipolítica prevalecentes (como já foi referido, as
cinzas estão intimamente ligadas aos valores de proteína total). O processo de fermentação
provoca a descida do pH desde as farinhas até à Broa, tal como se esperaria.
A massa destinada ao fabrico da Broa sofre, geralmente, um tempo de fermentação de
apenas duas horas; tal período é muito curto para ser possível atingir valores de pH próximos dos
encontrados após 24 horas de fermentação. Assim, e ao contrário de alguns tipos de pão ácido
típicos doutros países, o carácter ácido da Broa é pouco intenso devido à sua curta fermentação,
sendo desejável o seu prolongamento.
A água é um dos principais ingredientes na produção da Broa, chegando a representar 50 –
55 % do peso das massas panares, e 40 – 45 % do peso do pão. Dada a sua enorme importância
quantitativa, foram recolhidas amostras de água em todos os produtores, em duas épocas
distintas do ano designadas por época fria (Outono/Inverno) e época quente (Primavera/Verão),
tendo sido submetidas a análises químicas e microbiológicas.
Os parâmetros microbiológicos considerados foram: número total de germes (psicrófilos e
mesófilos), Número Mais Provável (NMP) para Coliformes totais, Coliformes fecais,
Escherichia coli e Estreptococos fecais, e Clostrídeos sulfito-redutores. Constatou-se uma
variabilidade apreciável nestes parâmetros, quando considerados na globalidade para diferentes
produtores e diferentes regiões; tal está de acordo com o esperado, na medida em que os diversos
produtores possuem as suas fontes próprias de água.
Os parâmetros químicos analisados foram: pH, dureza, teor em nitritos, teor em nitratos,
teor em cloretos, condutividade eléctrica, teor em sulfatos, resíduo seco, teor em azoto por
Kjeldahl, e teores dos oligoelementos Na, K, B, Ca, Mg, Fe, Al, Cd, Pb, Cu, Cr, Mn, Ni, Zn e P.
Todos estes parâmetros químicos das águas exibem entre si elevados coeficientes de correlação,
à excepção dos cloretos, do fósforo e do pH.
53
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Da análise dos resultados, constatou-se que, do ponto de vista da salubridade, nove das
vinte e seis águas analisadas não puderam ser consideradas próprias para consumo. Por outro
lado, à excepção de um produtor, todas as águas analisadas apresentaram valores de pH
inferiores ao recomendado.
3.4. Física
No âmbito da apreciação das características físicas das farinhas de milho e centeio, foram
quantificados, nas amostras recolhidas junto dos produtores, os seguintes parâmetros: índice de
queda, percentagem de absorção e índice (percentual) do tamanho das partículas (ITP). Os
resultados mais importantes são apresentados de seguida.
Na determinação do índice de queda (ou índice de Hagberg) das farinhas, uma suspensão
aquosa da mesma é rapidamente gelatinizada por imersão em água fervente, medindo-se a
liquefacção resultante da acção do α-amilase (proveniente do amido constituinte). O índice de
queda é definido como o tempo, expresso em segundos, necessário para que um tubo
viscosimétrico atravesse, em queda, uma distância fixa desse gel aquoso de farinha submetida a
liquefacção prévia.
Propriedades Físicas
350
300
250
200
150
100
50
Mm
%Absorção
%ITP
Cm
C2
M2
C1
M1
0
Amostras
%Humidade
Indíce de Queda (s)
As características reológicas das massas, obtidas a partir das farinhas e da água de
absorção, constituem um factor importante na determinação do respectivo valor de panificação.
54
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
A absorção de água numa farinha é definida como o volume de água, por grama de farinha,
necessário para produzir no farinógrafo uma curva com um patamar caracterizado por
determinada altura.
Tendo em conta que o teor médio em humidade relativa nas duas farinhas diverge de
apenas meio ponto, verificou-se ainda assim que as farinhas de milho produzem um maior índice
de queda, enquanto as farinhas de centeio são caracterizadas por uma maior percentagem de
absorção e ITP; tal constatação vem reforçar o papel preponderante da farinha de centeio na
produção da Broa.
Da análise global feita a todas as farinhas, conclui-se novamente da impossibilidade
estatística de diferenciar as amostras por zona geográfica.
3.5. Reologia
O comportamento reológico dos alimentos é naturalmente determinado pela sua
composição química. Por outro lado, qualquer produto alimentar deve reunir um conjunto de
propriedades sensoriais, as quais têm uma tradução em termos reológicos: propriedades tais
como a textura e a consistência são fundamentais para a aceitação do pão por parte do
consumidor, dado estarem intimamente associadas a características organolépticas importantes.
A disparidade de preços entre uma mesma quantidade de milho e de pão é indicativa do elevado
custo de processamento, mas também do valor que os consumidores estão dispostos a pagar por
um alimento com uma textura desejada.
A avaliação sensorial dos alimentos está intrinsecamente associada a problemas de
subjectividade, que introduzem complexidades no tratamento estatístico, para além dos custos
acrescidos com a formação e a manutenção de painéis de provadores. Consequentemente,
recorre-se com frequência a medições instrumentais em substituição da análise sensorial.
55
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Durante a cozedura, muitas das enzimas e microrganismos são destruídos; tal permite a
armazenagem do pão à temperatura ambiente durante um período considerável, apesar da
elevada actividade da água no seu miolo. Porém, com o tempo, o pão acaba por ser atacado por
agentes microbianos (principalmente bolores).
A deterioração dos produtos de panificação pode consubstanciar-se em diversos
fenómenos: rancidez oxidativa, perdas nutricionais, crescimento microbiano, perda de humidade
e endurecimento.
A rancidez oxidativa não constitui, regra geral, um verdadeiro problema, visto o prazo de
consumo do pão expirar antes da oxidação provocar efeitos indesejados. As perdas nutricionais
durante o armazenamento são, também, mínimas, pelo que é na cozedura que ocorre o maior
decaimento nutricional.
Embora o crescimento microbiano possa ser um problema, é a perda de humidade que mais
contribui para a degradação do pão; o recurso a embalagem apropriada diminui drasticamente tal
efeito negativo. Diversos factores influenciam o crescimento de bolores no pão: humidade
atmosférica, valor do pH e quantidade de inibidores fúngicos, entre outros.
O endurecimento do pão é, de longe, a principal causa de deterioração da Broa. As
mudanças nas propriedades físicas causadas pelo endurecimento incluem alterações no sabor e
no aroma, bem como aumento da dureza e opacidade do miolo. Ao nível do consumidor, o
aumento da dureza da côdea não causa tanto desagrado como o do miolo. Note-se que o
endurecimento não é exclusivamente causado pela perda de água, podendo este fenómeno
ocorrer mesmo na ausência de variação significativa no teor de humidade. Vários factores
afectam a velocidade e a extensão do endurecimento: p.ex. os pentosanos diminuem a velocidade
deste fenómeno, enquanto o efeito da temperatura na dureza e firmeza do pão pode ser
esquematicamente resumido da seguinte forma:
56
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Temperatura 1.1 ºC – 43 ºC:
Temperatura
↑, Dureza
↓, Firmeza
↓
Temperatura <1.1 ºC:
Temperatura
↓, Dureza
↓, Firmeza
↓
A temperatura de 1.1 ºC assume-se como um valor crítico, pois corresponde à temperatura
a que a água atinge a sua densidade máxima. Outro facto interessante é o de que a moleza pode
ser recuperada por aquecimento a temperaturas próximas das da cozedura.
Alguns estudos (versando, não obstante, o trigo) indicam que, a temperaturas inferiores a
35 ºC, ocorre uma redistribuição da água do glúten para o amido, a qual pode assim actuar no
endurecimento. Outros estudos indicam que o teor em gordura, ao contrário do que acontece
com o teor em proteínas, não tem qualquer efeito.
Seis Broas provenientes de cada produtor foram armazenadas em condições controladas de
temperatura (20 ºC) e de humidade relativa (80 %), procurando-se assim traduzir condições
adversas de armazenamento do pão. Aos 1º, 7º e 15º dias, uma Broa, do mesmo produtor e do
mesmo fabrico, foi submetida a testes de compressão, tendo de seguida sido determinados o teor
de humidade, assim como a acidez e as contagens de bolores e leveduras viáveis. Alguns
resultados típicos (de dois produtores, B1 e B2, e respectiva média de todos os produtores) são
apresentados de seguida, assim como os seus valores médios.
O pão tem um comportamento intermédio entre o de um fluído e o de um sólido,
designando-se, consequentemente, por corpo viscoelástico. A dureza é uma propriedade física,
usada frequentemente na avaliação da textura, que se pode traduzir em termos reológicos pela
força necessária para a penetração no material de uma sonda cilíndrica. O instrumento utilizado
mediu a força necessária para atingir uma determinada profundidade na Broa (30 mm): quanto
maior a força necessária, mais resistente o material.
57
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Força máxima exercida
0.12
0.10
KN
0.08
0.06
0.04
0.02
0
0
10
5
15
Duração (dia)
B1
B2
Média
Estes testes tiveram como objectivo correlacionar o tempo de prateleira com parâmetros
reológicos. Os perfis encontrados para as diferentes Broas testadas foram, na generalidade,
idênticos.
Como seria de esperar, a dureza da Broa correlaciona-se com o aumento do tempo de
prateleira, sendo aquela medida como a força máxima exercida (a qual aumentou quase
linearmente com o tempo).
Como seria de esperar, o número de bolores e leveduras nas Broas aumentou
significativamente ao longo do tempo. Os resultados das contagens de leveduras e bolores estão
tabeladas de seguida:
Produtor
Período de armazenagem
(d)
Nº viáveis de Bolores
(UFC/g)
Nº viáveis de Leveduras
(UFC/g)
1
1
2 x103
<1 x103
50
<1 x103
6x103
<10
2
<1 x103
>1.5 x105
<1 x102
8.5 x104
<1 x102
1.1 x103
<10
20
<10
3
<1 x103
3.7 x102
<10
-
-
-
-
7
1.03 x10
15
2
1
7
15
2 x10
58
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
As amostras com 15 dias apresentaram, na sua maioria, as percentagens de humidade mais
baixas. Relativamente à acidez, as amostras com 15 dias corresponderam, ora aos maiores
valores ora aos menores valores, comparativamente com os dias de conservação 1 e 7. Não foi
possível encontrar uma correlação estatisticamente significativa entre humidade e acidez.
Humidade
46
% (m/m)
44
42
40
38
36
0
5
10
15
Duração (dia)
B1
B2
Média
As propriedades reológicas da massa e do pão dependem, obviamente, dos seus vários
constituintes. O glúten é tipicamente o principal componente estrutural da massa: se for
deliberadamente removido das farinhas, tal provoca a perda da sua capacidade de formação de
massas viscoelásticas. Quando a farinha é humedecida, a formação do glúten resulta sobretudo
da interacção específica entre duas fracções proteicas – prolamina e glutenina; geralmente, as
propriedades elásticas estão associadas à fracção de glutenina, enquanto as propriedades viscosas
estão associadas à prolamina.
Acidez total
0.30
% (m/m)
0.25
0.20
0.15
0.10
0.05
0
0
10
5
15
Duração (dia)
B1
B2
Média
Porém, não são apenas as proteínas do glúten que afectam a reologia da massa; as
gliadinas, os lípidos e os hidratos de carbono desempenham também um papel estrutural. A
interacção proteína-água é o factor com maior efeito nas propriedades viscoelásticas das massas
59
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
panares, sendo que o tamanho dos grânulos de amido tem grande importância. Desta forma, as
características reológicas da massa podem, em princípio, ser significativamente alteradas desde
que se proceda à manipulação dos perfis de proteínas, amido, lípidos e humidade durante a
confecção do pão.
A resposta reológica das massas depende igualmente de parâmetros processuais, p. ex.
grau de amassadura, e tempo e temperatura de fermentação. Contudo, as principais alterações
nas propriedades mecânicas e reológicas ocorrem durante a cozedura: uma massa essencialmente
viscosa origina um miolo do pão predominantemente elástico. Uma vez que o glúten é o
responsável pela natureza elástica da massa, a sua alteração reológica durante a cozedura conduz
à estrutura típica do pão. Porém, não existe nenhuma relação evidente entre a desnaturação do
glúten e tais alterações reológicas.
Conforme foi já referido, a incorporação do fermento e o aumento do tempo de
fermentação promovem, para além de um pão com melhor aroma, o aumento do seu tempo de
vida, retardando assim o processo de envelhecimento e de desenvolvimento de bolores.
3.6. Organoléptica
A análise sensorial das Broas foi levada a cabo por um painel de provadores, o qual foi
devidamente treinado na avaliação das características sensoriais, tendo por objectivo investigar
como as modificações processuais afectam tais características.
As características sensoriais consideradas foram: aspecto do miolo – cor, farelo,
porosidade e defeitos; textura do miolo ao toque – elasticidade, carácter colante, dureza e
friabilidade; odor – global, ácido, a milho/centeio e outros; sabor do miolo – global, doce, ácido,
amargo, salgado e outros; e textura na boca – friabilidade, carácter colante, húmida e partículas
abrasivas. Apresentam-se de seguida os resultados de dois produtores, assim como a média
global.
60
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Aspecto do miolo
5.0
4.5
4.0
3.5
3.0
2.5
2.0
1.5
B1
B2
Média
1.0
0.5
0.0
Cor
Quantidade Farelo
Tamanho Farelo
Pela análise dos dados produzidos, verifica-se que o aspecto do miolo das Broas varia
consideravelmente de produtor para produtor.
Textura do miolo ao toque
4.0
3.5
3.0
2.5
B1
2.0
B2
Média
1.5
1.0
0.5
0.0
Elasticidade
Caracter
colante
Dureza
Friabilidade
Em relação à cor do miolo, a variabilidade encontrada poderá estar relacionada com as
diferentes quotas de centeio utilizadas no fabrico da Broa. As Broas foram, genericamente,
consideradas como elásticas, embora as apreciações tenham sido muito heterogéneas em relação
aos outros aspectos da textura do miolo.
Odor
5.0
4.5
4.0
3.5
3.0
B1
2.5
2.0
B2
Média
1.5
1.0
0.5
0.0
Global
Ácido
Milho / Centeio
61
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
As Broas são, em termos de odor, ligeiramente ácidas, variando o seu odor a milho e/ou a
centeio em função da sua composição.
Sabor do miolo
4.0
3.5
3.0
2.5
B1
2.0
B2
Média
1.5
1.0
0.5
0.0
Global
Doce
Ácido
Amargo
Salgado
Todas as Broas foram consideradas pouco salgadas, tendo o miolo apresentado sabores de
intensidade variável. Os provadores notaram a presença de partículas abrasivas em quase todas
as Broas (dada a natureza das farinhas usadas), e consideraram-nas, de forma geral, pouco
colantes na boca.
Em relação à friabilidade e textura húmida – características texturais avaliadas na boca, as
Broas apresentaram grande diversidade.
62
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
4. MELHORAMENTO
Na sequência dos estudos descritivos anteriores, foram produzidas Broas experimentais
utilizando-se como variáveis processuais o tipo de farinha de milho, o tipo de moagem (moinho
de água – MA, ou moinho eléctrico – ME), a percentagem de farinha de centeio (15 ou 50 %) e o
tipo de fermento (isco ou levedura comercial). As farinhas de milho utilizadas foram: farinha de
milho branco regional – MR; farinha de milho híbrido branco "dentado" – MHD; farinha de
milho híbrido branco redondo "flint" – MHF; e farinha de milho branco do tipo 175 – F175.
Todas as farinhas utilizadas foram quimicamente caracterizadas em termos de pH, e teores
de Humidade, Açúcares, Proteínas e Lípidos, antes de se proceder aos ensaios tecnológicos.
No que se refere à distribuição das amostras pelo tipo de farinhas, verificou-se que as farinhas MR apresentaram a maior acidez; as farinhas MHD exibiram os menores teores de proteína; as farinhas MHF foram desprovidas de características distintivas; e as farinhas F175
apresentaram características idênticas às das amostras MHD e MHF com moagem eléctrica.
As farinhas procedentes de moagem eléctrica apresentaram, regra geral, os menores
valores de pH, e bem assim de teores de açúcares e lípidos. De facto, o tipo de moagem parece
ser um factor de extrema importância para as características finais das farinhas destinadas à
panificação.
63
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
4.1. Química
Nos testes tecnológicos, foram confeccionadas 28 Broas experimentais distintas,
resultantes de outras tantas combinações abaixo esquematizadas. Em cada teste, foram
fabricadas 5 Broas de cada tipo e, por cada conjunto de testes, foi confeccionada uma Broa
padrão com 50 % de milho tipo 175 e com levedura comercial. As Broas assim obtidas foram
sujeitas a análises químicas e sensoriais.
0
P
Isco
1
Isco
17
Levedura
18
Isco
19
15% centeio
15% centeio
Levedura
2
MHFxMA
MRxMA
Isco
3
50% centeio
50% centeio
Levedura
4
Levedura
20
Isco
5
Isco
21
Levedura
22
Isco
23
15% centeio
15% centeio
Levedura
6
MHFxME
MRxME
Isco
7
50% centeio
50% centeio
Levedura
8
Levedura
24
Isco
9
Isco
25
Levedura
26
Isco
27
Levedura
28
15% centeio
15% centeio
Levedura
10
F175
MHDxMA
Isco
11
50% centeio
50% centeio
Levedura
12
Isco
13
Levedura
14
Isco
15
Levedura
16
15% centeio
MHDxME
50% centeio
64
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Comparando os valores médios globais dos resultados encontrados com os anteriormente
apresentados, verifica-se que nestas Broas a acidez é bastante mais baixa e o teor de cloretos é
bastante mais elevado.
Na tentativa de descortinar alguma tendência nos parâmetros químicos de acordo com o
tipo de Broa produzida, calcularam-se os valores médios dos parâmetros químicos das Broas
experimentais, sempre que tivessem alguma variável comum (p.ex. todas as amostras com
variável levedura como tipo de fermento utilizado). Os resultados encontrados estão tabelados de
seguida:
pH
%Humidade % Cinzas % Acidez % Cloretos % Açúcares
% Fibra
% Proteína % Lípidos
Tipo de milho
MR
5.73
41.25
1.63
0.08
0.47
4.63
1.60
5.30
1.90
MHD
5.90
40.50
1.43
0.05
0.18
4.08
1.88
5.33
1.15
MHF
5.95
41.75
2.05
0.04
0.82
4.85
2.00
5.53
1.35
F175
6.03
41.10
1.90
0.04
0.80
5.05
1.90
5.43
1.75
Tipo de fermento
Isco
5.85
40.90
1.63
0.06
0.54
4.78
1.90
5.30
1.55
Fermento
6.00
41.50
1.90
0.04
0.69
4.33
1.85
5.45
1.30
Quantidade de farinha de centeio
15% centeio 5.90
40.75
1.73
0.05
0.69
4.10
1.93
5.35
2.13
50% centeio 5.95
41.40
1.85
0.04
0.58
4.68
1.88
5.40
1.15
Tipo de moínho
MA
5.90
40.90
1.85
0.05
0.55
4.53
1.85
5.43
1.60
ME
5.90
41.40
1.70
0.05
0.53
4.20
1.90
5.30
1.23
Observa-se, então, que as Broas produzidas com farinha de milho MHF apresentam os
valores mais elevados de teores de cloretos, açúcares, fibras e proteínas. Contudo, as amostras
daquelas farinhas não mostraram possuir valores mais elevados destes parâmetros; aliás, estas
foram as farinhas que possuem menor percentagem de cinzas.
As Broas produzidas com farinha MR apresentaram os valores mais elevados de acidez e
de teor de lípidos; neste caso, as análises das farinhas mostraram tendência similar. As mesmas
65
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Broas apresentaram, simultaneamente, os valores mais baixos de pH (como se esperaria, dado o
valor da acidez), e dos teores de fibras e proteínas (justificáveis pela correlação entre cinzas e
proteínas).
Os pães feitos a partir de farinhas MHD possuem os valores mais baixos num grande
conjunto de parâmetros: teores de humidade, cinzas, cloretos, açúcares e lípidos; e dos mais
baixos em teor de proteínas. Os resultados das farinhas seguiram a mesma tendência. Por fim,
com a farinha F175 registaram-se valores intermédios para todos os parâmetros.
A farinha de milho, como principal componente da Broa, parece ter uma grande
importância nas características do produto final. No caso de MR, observaram-se os valores mais
altos de acidez, o que é vantajoso tendo em vista a posterior conservação da Broa. Contudo, o
seu teor em proteínas e em cinzas foi dos mais baixos.
Distinguindo comparativamente as amostras pelo tipo de fermento, muitas das Broas
fermentadas com isco apresentaram o maior valor médio de acidez, bem como de teores de
açúcares, fibras e lípidos. Seria de esperar que a acidez fosse mais elevada (ou o pH mais baixo)
pela acção da microflora mista já anteriormente caracterizada; portanto, o tipo de fermento tem
aparentemente um forte impacto nas características finais da Broa.
Conclui-se, então, que o tipo de farinha e o tipo de fermento usado na produção das Broas
são, de entre os estudados, os factores processuais mais importantes, embora a percentagem de
centeio adicionado afecte igualmente a qualidade final das Broas (nomeadamente nos parâmetros
teor em cinzas e teor em lípidos).
4.2. Organoléptica
As Broas produzidas em laboratório também foram sujeitas a avaliação sensorial pelo
mesmo painel de provadores. Apresentam-se de seguida os valores médios dos parâmetros
sensoriais estudados.
66
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
A1
A2
A3
B1
B2
C1
C2
C3
C4
D1
D2
D3
E1
E2
E3
E4
E5
F1
F2
F3
F4
MR
2.75
2.44
2.00
2.50
2.31
2.94
1.81
3.19
1.88
3.00
1.60
2.75 3.00 1.94
1.56 2.56
1.63 2.36 2.31
2.32 2.31
MHD
2.73
2.12
1.66
2.85
2.40
3.20
1.59
3.51
2.55
2.95
1.93
2.80 3.14 1.64
1.70 2.07
1.55 2.54 1.57
1.43 2.40
MHF
3.13
2.88
1.94
3.13
2.50
2.81
2.23
3.06
2.00
3.19
1.63
2.81 3.00 2.13
1.54 1.50
1.21 2.19 2.38
2.44 2.44
F175
2.88
2.63
2.13
3.19
2.88
2.94
1.56
3.44
2.13
3.25
1.75
3.31 3.13 1.94
1.38 2.25
1.13 2.56 1.88
1.44 1.63
Tipo de milho
Tipo de fermento
Isco
3.37
2.50
2.00
3.06
3.00
2.53
1.67
3.19
2.05
3.13
1.75
2.75 3.13 1.94
1.74 2.07
1.39 2.36 2.12
2.21 2.31
Levedura
2.63
2.50
1.78
3.05
2.25
3.45
1.72
3.50
2.24
2.95
1.59
2.81 3.00 2.00
1.44 2.06
1.50 2.56 2.00
1.79 2.25
Quantidade de farinha de centeio
15% centeio
1.69
2.44
2.00
2.59
2.33
3.50
0.75
3.69
3.11
2.94
1.54
2.23 3.23 1.88
1.66 2.23
1.54 2.81 1.46
1.40 2.44
50% centeio
4.00
2.56
1.94
3.31
3.00
2.53
2.33
3.06
1.54
3.16
2.00
3.56 3.00 2.13
1.44 1.90
1.39 2.06 2.40
2.33 2.19
Tipo de moínho
MA
ME
Nota:
2.94
2.61
1.78
2.87
2.49
2.81
1.77
3.19
2.03
3.00
1.63
2.69 3.00 2.13
1.40 1.90
1.56 2.50 2.28
2.14 2.79
3.13
2.44
2.00
3.05
2.38
3.00
1.43
3.55
2.24
3.06
1.75
2.81 3.00 1.73
1.73 2.07
1.54 2.46 1.82
1.85 2.00
Para facilidade de representação, os parâmetros sensoriais foram abreviados: Aspecto do miolo – cor (A1), quantidade (A2) e tamanho
do farelo (A3), e quantidade (B1) e tamanho da porosidade (B2); Textura do miolo ao toque – elasticidade (C1), carácter colante (C2),
dureza (C3) e friabilidade (C4); Odor – global (D1), ácido (D2), e a milho/centeio (D3); Sabor do miolo – global (E1), doce (E2), ácido
(E3), amargo (E4) e salgado (E5); e Textura na boca – friabilidade (F1), carácter colante (F2), húmida (F3) e partículas abrasivas (F4).
Subdividindo as amostras por tipo de farinha de milho, não foi possível detectar qualquer
tendência. Contudo, observou-se que as Broas produzidas com farinha MHD apresentaram os
menores valores para o aspecto do miolo e odor; enquanto as produzidas com a farinha F175
registaram os maiores valores de porosidade. Em geral, as Broas de farinha MHD atingiram a
menor pontuação no critério de sabor do miolo.
As Broas produzidas com fermento obtiveram, regra geral, a maior pontuação na textura do
miolo ao toque, e a menor nas restantes.
Quanto maior a percentagem de centeio na Broa, maiores a porosidade e o odor, e menor a
pontuação no sabor do miolo. De facto, tendo em conta as Broas com 15 e 50 % de centeio, foi
possível efectuar uma distinção nítida entre as amostras. Concluiu-se que a composição em
farinha das Broas parece ser o factor de percepção sensorial mais importante.
As Broas produzidas com farinha proveniente de moinhos de água tiveram apenas maior
pontuação para a textura na boca; a pontuação dos restantes parâmetros foi, regra geral, maior
67
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
nas Broas produzidas com farinhas obtidas por moagem eléctrica. Estes últimos resultados
vieram de encontro aos resultados relativos aos parâmetros químicos.
68
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
5. CONCLUSÕES
Da análise geral das experiências realizadas no âmbito deste programa de estudo, concluise que o processo de produção da Broa depende de diversos factores intrínsecos e extrínsecos, a
saber:
Factores intrínsecos
Características das
farinhas
Microflora existente
-
Diversidade
Número
Factores de crescimento
Actividade de fermentação
Actividade enzimática
-
Composição em nutrientes
Composição em minerais
Factores de crescimento
Actividade enzimática
Características reológicas
Factores extrínsecos
-
Grau de peneiração e amassadura
Rendimento da fermentação (gfermento / 100gfarinha)
Temperatura e tempo de fermentação
Oxigenação
Composição e tamanho de inóculo
Composição e quantidades de ingredientes, p.ex: sal, água, farinhas,
adição de starters e de ácido ascórbico
- Tempo de prateleira
Estes factores não actuam separadamente mas sim de forma conjunta, tornando o sistema
complexo: desta forma, os diferentes procedimentos que envolvem a fermentação da massa são
diferentemente afectados por factores tais como o pH, a acidez, a composição em ácidos láctico
e acético, e a produção de compostos voláteis aromáticos.
69
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
A actividade metabólica das BAL e das leveduras determina o desenvolvimento dos
aromas na Broa. Apesar dos precursores estarem presentes nas farinhas e da maior quantidade de
substâncias aromáticas se formar durante a cozedura, a fermentação da massa é essencial para se
obter um sabor aceitável, uma vez que a acidificação química do pão não é tão bem aceite pelo
consumidor.
Esta importância do processo fermentativo nas características finais da Broa deve servir de
incentivo ao desenvolvimento de métodos de controlo da fermentação, por forma a obter-se um
produto de qualidade constante. Uma eventual fermentação da massa da Broa com diferentes
microrganismos comerciais, mesmo que remotamente similares às estirpes nativas no isco
tradicional, poderá conduzir à produção de um pão com um perfil diferente de voláteis.
A informação recolhida, no que diz respeito à análise sensorial das Broas experimentais,
indicia que: (i) a friabilidade está dependente da quantidade de centeio utilizada – as Broas com
menor friabilidade são as que possuem maiores percentagens de centeio; (ii) a cor depende da
quantidade de farinha de centeio presente na mistura – as farinhas com maior percentagem de
centeio conduzem a Broas mais escuras; (iii) as Broas confeccionadas com isco são claramente
mais porosas do que as fabricadas com levedura comercial; (iv) para menores fracções de adição
de centeio, as farinhas obtidas a partir de milho regional dão, aparentemente, origem a Broas
com menor friabilidade; e (v) o carácter colante é influenciado de forma decisiva pelo teor em
centeio das Broas.
A determinação mais pormenorizada do perfil químico ao longo do processo permitirá, por
sua vez, correlacioná-lo com o perfil microbiológico, e assim explicar o comportamento
reológico da Broa. Por conseguinte, fica aberto o campo ao desenvolvimento posterior de
trabalho, cientificamente estruturado e estatisticamente validado, tendo como objectivo último a
tipificação da Broa.
70
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
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75
Pão de Milho: caracterização do produto tradicional e tentativa de melhoramento tecnológico
Dedicatória
Ao Sr. Daniel de Sá Figueiredo, fundador e Borunário-mor da Confraria da Broa de
Avintes, pela dedicação da sua vida ao serviço do pão de milho regional.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao Programa de Apoio à Modernização da Agricultura e Floresta
portuguesas – PAMAF, pelo financiamento concedido através do projecto de I&D nº 1022. No
desenvolvimento experimental do presente estudo, tiveram contribuições relevantes a Escola
Superior de Biotecnologia da Universidade Católica Portuguesa (ESB), a Direcção Regional de
Agricultura de Entre-Douro-e-Minho (DRAEDM) e o Instituto para o Desenvolvimento Agrário
da Região Norte (IDARN).
A Associação para a Escola Superior de Biotecnologia da Universidade Católica
(AESBUC) e a AGROF – Sociedade Promotora de Empreendedorismo, S.A. patrocinaram a
elaboração e disseminação da presente brochura.
Um agradecimento especial aos produtores, pelo seu indispensável contributo ao
fornecerem as amostras para análise, pela sua enorme receptividade e pelo seu excelente
acolhimento à equipa que realizou o trabalho de campo.
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