Justificação Inferencial e Probabilidade epistêmica
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Justificação Inferencial e Probabilidade epistêmica
830 Justificação Inferencial e Probabilidade epistêmica Kátia Martins Etcheverry, Cláudio G. de Almeida (orientador) Programa de Pós-Graduação em Filosofia, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, PUCRS, Resumo Introdução Consideremos, dentro da perspectiva do Fundacionismo Epistêmico, o seguinte princípio de justificação inferencial (PJI), proposto por Fumerton (1995, p. 36): “Para que se esteja justificado em crer em uma proposição P com base em E, é preciso que se esteja (1) justificado em crer que E e (2) justificado em crer que E torna provável P”. De acordo com a cláusula (1) de (PJI), para que o sujeito esteja justificado em crer em uma dada proposição P, com base em outra proposição, digamos E1, deve também estar justificado em crer que E1. Mas, para isso ele precisa inferir, de modo legítimo E1, de alguma outra proposição, digamos E2, na qual também deve estar justificado em crer, devendo inferila de E3, e assim ad infinitum. Este é o regresso infinito alegado no conhecido argumento cético de Agripa. A resposta oferecida pelas teorias fundacionistas a esse argumento assume que nem toda justificação seja inferencial, de maneira que o regresso na cadeia de razões é interrompido pela existência, em seu ponto final, de crenças básicas, que são justificadas de modo não-inferencial, constituindo o alicerce da estrutura de crenças. A simplicidade dessa tese fundacionista é apenas aparente. De fato, mostrar que tipo de crenças estão assim qualificadas tem se configurado em importante desafio ao fundacionismo, pois, para que possam servir de suporte justificacional para as demais crenças da estrutura, as crenças básicas devem ser de natureza tal que possuam alguma qualidade intrínseca que garanta (em um grau epistemicamente interessante) sua verdade. Apesar da respeitabilidade do problema envolvendo a tese fundacionista sobre a existência de crenças justificadas não-inferencialmente, o presente trabalho se ocupará, basicamente, da outra tese IV Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2009 831 do fundacionismo: a de que existem crenças justificadas inferencialmente, formando o edifício de crenças, apoiadas nas crenças fundacionais. A cláusula (2) de (PJI) torna a situação, do ponto de vista do movimento regressivo da justificação, ainda mais complexa. Por isso, enquanto a primeira cláusula é aceita por todos os tipos de fundacionismo, a segunda é objeto de controvérsia1 por parte de defensores de posições externalistas, sob a acusação de que ela conduziria a um regresso infinito de razões, induzindo ao ceticismo. Evitar o regresso vicioso alegado pelo ceticismo exige, portanto, que nossas crenças se relacionem de modo a formar uma estrutura organizada higidamente do ponto de vista epistêmico. Isto é, toda crença justificada deve estar devidamente apoiada em outra crença justificada, seja ele fundacional ou não. Através de “bom raciocínio”, reconhecidamente, obtém-se crenças bem-fundadas. A lógica dedutiva fornece bom raciocínio de forma perfeita, mas, como Descartes ensinou, ela não pode ser de grande auxílio quando se trata de justificar crenças sobre o mundo exterior. Assim, parece sensato fazer uso de uma lógica “não-dedutiva”, que se qualifique como “bom raciocínio”. Argumentos cujas premissas tornam provável, em medida epistemicamente satisfatória, a verdade da conclusão parecem ser exemplos de “bom raciocínio”, ou pelo menos assim tem sido considerado por um número expressivo de epistemólogos. Para o internalismo inferencial, defendido por Fumerton, a noção de “justificação inferencial” só é viável se forem respeitadas ambas as cláusulas de (PJI). Ou seja, quando uma crença é invocada como suporte de outra, deve-se não só estar justificado em aceitar a crença de apoio como verdadeira, mas também estar justificado em crer que a verdade da crença de apoio torna provável verdade da crença que é apoiada. Já o fundacionismo externalista considera que, para a justificação inferencial de uma dada crença P, basta que se esteja justificado em crer que P com base em E ( por exemplo, que a crença P tenha sido formada através de um processo que produz, normalmente, mais crenças verdadeiras do que falsas). A sugestão de Fumerton (1995, p. 198), em linhas gerais, é a de que a relação de “tornar provável”, que existe entre E e P, para ser relevante epistemicamente, deve ser entendida à semelhança das relações da lógica dedutiva, como a de acarretamento. Adota, assim, uma concepção keynesiana de probabilidade, segundo a qual dizer que existem regras permitindo a passagem, de modo legítimo, da crença E para a crença P, em alguma medida, não seria diferente de dizer que existe uma conexão apropriada, lógica ou probabilística, entre 1 A cláusula (2) de (PJI) encontra alguns críticos, entre os quais, Huemer (2002) e Greco (1999), com respostas em Fumerton (2004 e 2006). IV Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2009 832 E e P, a qual seria necessária e a priori. Dessa maneira, Fumerton pretende poder alegar que podemos ter uma relação de familiaridade com algumas proposições do tipo “E torna provável P”, as quais podem, assim, ser justificadas não-inferencialmente. A dificuldade que se apresenta aqui é justamente quanto a inferências indutivas. Ou seja, a questão colocada ao defensor do internalismo inferencial envolve a capacidade (ou incapacidade) de seres racionais, como nós, de termos uma relação de familiaridade com (pelo menos algumas) proposições do tipo “E torna provável P”, de modo a crer nelas com justificação nãoinferencial. Metodologia Utilizou-se como metodologia a análise crítico-descritiva envolvendo, basicamente, a pesquisa bibliográfica especializada, visando uma apropriação adequada dos conceitos pertinentes à questão. Conclusão Fumerton se vale da idéia de “familiaridade”, no esforço duplo de evitar as questões regularmente apresentadas em argumentos céticos, e, também , estabelecer que a partir da relação de “tornar provável”, construída como uma verdade sintética a priori, crenças justificadas não-inferecialmente acerca de, pelo menos algumas, proposições do tipo “E torna provável P” são viáveis. Mas, o próprio Fumerton se coloca de modo pessimista quanto à possibilidade de defesa da interpretação keynesiana de probabilidade. O que lhe põe diante das seguintes alternativas: ou bem desistir do internalismo inferencial, assumindo a alternativa externalista de justificação inferencial, ou insistir em tentar mostrar que pode contar com a análise keynesiana de probabilidade. Referências FUMERTON, R. Metaepistemology and Skepticism. London: Rowman & Littlefield Publishers, 1995. 234 p. ________. Epistemic Probability. Philosophical Issues, v. 14, p.149-164, 2004. ________. Epistemology. Malden: Blackwell Publishing, 2006. 145 p. GRECO, J. Agent Reliabilism. In: TOMBERLIN, J. E. (ed.). Philosophical Perspectives, v. 13. Malden: Blackwell Publishers, p. 273-296, 1999. HUEMER, M. Fumerton’s Principle of Inferential Justification. Journal of Philosophical Research, v. 27, p. 329-339, 2002. IV Mostra de Pesquisa da Pós-Graduação – PUCRS, 2009
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