O potêncial eólico português

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O potêncial eólico português
Artigo Economia Pura – Outubro 2003
O potencial eólico português
O sector da produção de energia eléctrica a partir de fontes eólicas
mostra um crescimento anual de cerca de 30%, tornando-o num dos mais
atractivos no actual panorama económico mundial. Como poderá a
indústria portuguesa aproveitar estes “bons ventos”?
1. Forte crescimento mundial
A assinatura do protocolo de Kyoto em 1997, passando para a escala nacional as
preocupações relativas à redução das emissões dos gases responsáveis pelo efeito de estufa,
traduz a consciencialização cada vez maior da urgência do combate às alterações climáticas e
vem aumentar significativamente o interesse e expansão da indústria eólica a nível mundial.
De acordo com dados da European Wind Energy Association – EWEA, a taxa de crescimento
mundial verificada entre 1997 e 2001 ao nível da instalação de turbinas eólicas situou-se perto
dos 40%. O crescimento verificado em 2002 ao nível da capacidade de geração de energia
eólica instalada, situou-se nos 28% representando, só neste ano, um acréscimo de 6.868 MW
e um investimento na ordem dos 6.800 M€.
A nível mundial, a capacidade global instalada ultrapassou no final de 2002, os 31.000 MW,
enquanto o número de postos de trabalho directos e indirectos desta nova industria rondava os
70.000. Estimativas efectuadas pela EWEA apontam para que em 2012 a capacidade eólica
instalada se situe nos 352.000 MW.
O sector da energia eólica é pois um mercado em franco crescimento, ainda longe da
maturidade, cujo potencial significativo se situa a vários níveis: exploração comercial de
energia, produção de equipamentos, manutenção e serviços e investigação e desenvolvimento.
Trata-se, por outro lado, de um sector de domínio claramente europeu como demonstram os
23.000 MW instalados até 2002 na União Europeia, do total de 31.000 MW instalados em todo
o mundo. A Alemanha, Espanha e Dinamarca dominam o panorama europeu com,
respectivamente, 12.001, 4.830 e 2.880 MW instalados (ver Tabela 1).
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Artigo Economia Pura – Outubro 2003
Tabela 1: Evolução da potência eólica instalada em países europeus
País
Rank
EU
Alemanha
Espanha
Dinamarca
Itália
Grécia
Portugal
Irlanda
1º
2º
3º
4º
8º
9º
12º
MW no final MW no final MW no final
de 2000
de 2001
de 2002
6113
2235
2300
427
189
100
118
8754
3337
2417
697
272
125
125
12001
4830
2880
785
276
194
137
Fonte: EWEA
Como reflexo do domínio europeu desta indústria, os principais produtores de equipamentos
situam-se igualmente na Europa, com uma única excepção entre os 6 primeiros do ranking, a
GE WIND que ocupa a 4ª posição (ver Gráfico 1).
Gráfico 1: Principais Produtores de Aerogeradores
GE W ind Energy;
12,3%
Gam esa;
9,3%
Bonus;
8,5%
Neg Micon;
12,5%
Nordex;6,6%
Other;
13,7%
Made;2,7%
Mitsubishi;2,5%
RE Power;1,9%
Enercon;
14,1%
Vestas;
23,3%
Fonte: BTM Consult
2. O potencial de um novo sector eólico em Portugal
O desenvolvimento do sector da produção de energia de origem eólica deve ser considerado
pelo potencial da criação de uma fileira industrial nacional com impacto significativo ao nível do
emprego, exportações e desenvolvimento tecnológico, como já o fizeram outros países (ver
caixa – O crescimento espanhol).
De acordo com a resolução do Conselho de Ministros nº63/2003 de 28 de Abril, até ao ano de
2010 deve ser instalada, em Portugal, uma potência eólica de 3750 MW, revelando um
crescimento de 3556 MW relativamente aos valores actuais instalados de 194 MW. A este
crescimento estará associado um total de investimento necessário na ordem dos 3.911 M€
(considerando um investimento médio de 1.100.000 € por MW instalado) excluindo as
adaptações na rede eléctrica nacional e pontos de interligação.
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Artigo Economia Pura – Outubro 2003
Importa assim equacionar as possibilidades de utilizar um importante recurso endógeno na
promoção e desenvolvimento de competências industriais que permitam o aparecimento de
uma industria nacional ligada ao fabrico e fornecimento de equipamentos e desenvolvimento de
empresas de serviços associadas ao sector da energia eólica.
O desenvolvimento das industrias nacionais poderá efectuar-se, numa fase inicial, apoiado na
satisfação do mercado nacional com o fornecimento dos equipamentos necessários à
instalação da potência estabelecida como objectivo para 2010. Esta situação deve servir para o
desenvolvimento das competências e capacidades das empresas nacionais, potenciando a sua
entrada no fornecimento de componentes e aerogeradores para o mercado europeu e mundial,
integrando-se assim num sector onde é expectável a continuação de um forte crescimento.
Considerando uma potência média de 1 MW por cada novo gerador eólico, será necessário
instalar 3556 novos geradores nos próximos 6 anos (cerca de 593 novos geradores em média
por ano). De acordo com alguns especialistas (Juan Ramón Jiménez – GAMESA EÓLICA) as
economias de escala no processo produtivo são importantes, tornando-se num factor de
competitividade a produção de 250 a 300 geradores por ano. Desta forma, os valores
esperados para o mercado nacional afiguram-se muito atractivos para qualquer empresa
internacional do sector, constituindo-se igualmente como uma oportunidade para as empresas
ou grupos económicos nacionais se inserirem nas cadeias de fornecimento do sector através
do desenvolvimento em Portugal de uma fileira industrial orientada para a produção de
componentes e/ ou aerogeradores.
Tomando o preço médio de venda de 80€ por MWh, 2.200 horas de produção anual, 10% das
vendas como custos variáveis, e um período de amortização do investimento de 20 anos,
obtém-se uma estimativa de cerca de 310 M€ como resultado operacional (EBIT) para o total
dos 3.750 MW a instalar até 2010, relevando desta forma a atractibilidade do sector ao nível da
exploração comercial da energia produzida.
Os principais actores nacionais no sector eólico são, actualmente, a EDP (através da
Enernova), a Enersis, Energiekontor e a Eólica da Cabreira (participada da EDF através da
SIIF Energies), a Generg e a Gamesa, Reflectindo-se a importância relativa de cada uma
destas empresas no sector, não só ao nível dos parques já instalados mas, e principalmente,
ao nível das potências atribuídas.
Quanto aos aerogeradores instalados nos parques eólicos nacionais, os mesmos são
produzidos, maioritariamente, pela Enercon, Vestas e Nordex.
A falta de uma actuação concertada no sector em Portugal, quer ao nível dos principais
investidores quer do estabelecimento de políticas públicas para o seu desenvolvimento, não
tem permitido a participação das empresas portuguesas no desenvolvimento e fabrico de
aerogeradores e componentes, salvo algumas excepções, entre as quais se destaca a Tegopi,
que detém já alguma notoriedade na construção de torres junto dos grandes construtores de
aerogeradores.
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A actuação de Portugal no sector resume-se assim, quase em exclusivo, á exploração
comercial da energia produzida por esta via, sendo a maioria dos equipamentos, e em
particular os aerogeradores instalados no nosso país, totalmente fabricados no estrangeiro sem
qualquer intervenção a nível nacional. Destaca-se a já referida excepção do fabrico de torres e
a montagem no local, ainda assim, coordenada por estrangeiros.
A situação encontrada em países como a Dinamarca, Alemanha ou Espanha, revela um plano
sustentado para incorporação de valor acrescentado nacional nestes avultados investimentos.
Estes exemplos podem ser seguidos por Portugal, começando por trazer para o nosso país
unidades de fabrico e montagem de aerogeradores e componentes, que permitam criar um
campo fértil para a inovação e desenvolvimento, por exemplo ao nível de produtos alternativos
para as características de vento do nosso país.
3. As competências nacionais
Existem actualmente planos e propostas de alguns construtores de aerogeradores para instalar
em Portugal unidades de montagem final. No entanto, grande parte destas propostas visa
apenas a montagem de componentes importados e o apoio à instalação local da potência
determinada pelo Estado português enquanto objectivo nacional para 2010.
Uma das formas de acelerar a integração de empresas portuguesas neste sector seria o
fabrico sob licença de aerogeradores e componentes em território nacional através, por
exemplo, da constituição de parcerias ou consórcios entre empresas portuguesas e as
estrangeiras detentoras de know how.
Existem competências e áreas tecnológicas em Portugal, em particular nas empresas
nacionais, que podem ser aplicadas para o desenvolvimento e fabrico de componentes para
aerogeradores e promover uma entrada rápida das mesmas neste negócio, assim exista
vontade e investidores dispostos a arriscar num sector com um crescimento anual de mais de
30%.
Entre as empresas e áreas tecnológicas mais bem preparadas para esta abordagem, e que
serão por certo alvo das equipas de procurement dos construtores, podem referir-se, a título de
exemplo, a Ogma e a Vidropol, na área de compósitos, a Efacec, Siemens portuguesa ou ABB,
nas áreas da electromecânica e electrónica, a Manuel Conceição Graça, Lisnave ou Estaleiros
Navais de Viana do Castelo na áreas da metalomecânica, entre outros.
4. O necessário estímulo à indústria nacional
O desenvolvimento da indústria eólica em Portugal, e em particular a criação de uma fileira
industrial no sector, podem ser estimulados por um conjunto de incentivos e políticas públicas
que actuem quer no lado da oferta quer da procura, á semelhança do ocorrido nos países
europeus em que a taxa de crescimento desta industria foi, e ainda é, mais significativa.
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Países como a Alemanha e Espanha (líderes de mercado), Itália, Holanda e Irlanda, adoptaram
agressivas políticas de incentivos e de estímulo à utilização de energias renováveis tendo,
como resultado, alcançado crescimentos muito acentuados no investimento e produção de
energia a partir de fontes renováveis, em particular, eólica.
O conjunto de medidas implementadas naqueles países é variado, conduzindo aos resultados
acima mencionados quando adoptadas concertadamente, agindo sobre o estímulo ao
investimento bem como sobre a procura, por forma a sustentar, no médio e longo prazos, os
investimentos efectuados. De entre as medidas mais utilizadas podem destacar-se:
•
Desenvolvimento de planos, quer nacionais quer a nível local, para a produção e
utilização da energia eólica;
•
Obrigatoriedade de aquisição da energia eólica produzida a um preço fixo por parte
das companhias eléctricas de distribuição, por um período de tempo suficiente para
a amortização dos investimentos;
•
Fixação do preço de aquisição de energia, sendo este, em geral, fixado em torno
dos 80 a 90% dos preços de venda a retalho, sendo estes preços estáveis num
período temporal significativo. A este propósito pode dar-se como exemplo a Itália
que fixou, para os primeiros 10 anos de exploração de instalações de produção de
energia a partir de fontes renováveis, o valor de 0,104 €/ Kwh e para os restantes
anos de exploração 0,052 €/ Kwh;
•
Criação, conjuntamente com a banca privada, de um sistema que permita o
recurso a empréstimos a taxas mais favoráveis para implementação de unidades
produtivas e para desenvolvimento de parques eólicos.
Na generalidade dos países de forte crescimento neste sector, é possível aceder a
financiamentos cuja taxa de juro é, em média, inferior entre 1 a 2% em relação a
um financiamento bancário normal. No caso da Holanda, o acordo feito entre o
Estado e o sector bancário prevê a isenção de impostos relativamente aos juros
cobrados na concessão destes empréstimos. No caso da Alemanha, o valor do
financiamento pode chegar aos 100% do projecto, considerando um período de
amortização de 10 anos podendo incluir períodos de carência que chegam a atingir
os 5 anos;
Em países como a Alemanha e a Holanda foram desenvolvidos os chamados
Green Funds geridos pelos respectivos bancos centrais, destinados ao
financiamento de unidades de produção de energia eólica e outras renováveis,
sendo a remuneração destes fundos isenta para efeitos fiscais;
•
Em alguns países é pago aos produtores de energia a partir de fontes renováveis
um incentivo por Kwh produzido, adicional ao valor pago pelas distribuidoras. Na
Alemanha este incentivo chega aos 4,6 cêntimos/ Kwh, sendo igualmente muito
significativo em Espanha;
5
Artigo Economia Pura – Outubro 2003
•
Desenvolvimento de sistemas de incentivos à instalação de unidades de produção
no país, à semelhança do ocorrido em Espanha, e que provocou o forte interesse
de grandes grupos europeus, como a VESTAS, a criar unidades em joint venture
com empresas espanholas, processo esse que possibilitou o crescimento da
GAMESA Eólica, que se assume hoje como uma das maiores empresas no
mercado da venda de aerogeradores;
•
Possibilitar aos investidores em unidades de produção de energia, a partir de
fontes renováveis, amortizações aceleradas dos seus investimentos. Em alguns
países como a Alemanha e a Índia é permitida a amortização acelerada que pode
atingir os 100% no primeiro ano.
•
Do lado dos consumidores, são aplicados sistemas de incentivos à utilização de
energias renováveis através, por exemplo, de mecanismos de dedução fiscal.
Tratando-se de um projecto cujo desenvolvimento se estabelece a médio prazo, podem e
devem equacionar-se outras formas de intervenção que permitam uma mais rápida integração
de empresas nacionais nas cadeias de fornecimento dos produtores de aerogeradores, bem
como a criação de condições favoráveis ao estabelecimento em território nacional de unidades
de produção e montagem de equipamentos (aerogeradores e pás), com forte incorporação
nacional.
Entre essas formas de intervenção devem equacionar-se os projectos de contrapartidas,
designadamente os associados às grandes aquisições militares, utilizando-os no sentido de
promover parcerias com entidades internacionais, nomeadamente, na forma de produção sob
licença ou Investimento Directo Estrangeiro (IDE) privilegiando fornecedores de componentes
nacionais, que permitam o desenvolvimento de competências internas que coloquem Portugal
como um país produtor de tecnologias no sector da energia eólica a nível internacional.
Deverá igualmente ser aproveitada a oportunidade resultante da abertura do concurso para
atribuição de novos pontos de recepção, no sentido de criar condições para o estabelecimento
em Portugal de unidades de desenvolvimento, produção e montagem de equipamentos e
dinamizar a incorporação de fornecedores nacionais nas cadeias logísticas dos fabricantes de
aerogerdaores.
5. Os mercados a explorar
A necessidade crescente de energia e, em particular, de energia “limpa”, barata e com
fornecimento estável e previsível, tem provocado uma rápida evolução global do sector, sendo
este um dos principais factores para a actual corrida aos parques eólicos off-shore, com
aerogeradores de grande potência e dimensão, beneficiando dos ventos mais fortes e
constantes existentes naquelas zonas.
No entanto, existem vastas áreas do globo com lacunas no abastecimento energético e onde
as condições de vento impossibilitam o seu aproveitamento utilizando os actuais
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aerogeradores. Esta pode tornar-se uma área de negócio a ser desenvolvida por países que só
agora entram em competição com os grandes fabricantes.
Por outro lado, Portugal e as empresas portuguesas promotoras e produtoras de energia
eléctrica detêm importantes investimentos em países como o Brasil, onde existe um grande
potencial eólico por explorar que começa agora a despontar.
Sendo o factor escala determinante para o sucesso nesta indústria, se for conseguida uma
ligação estreita e profícua entre construtores e promotores nacionais, poderá ser possível o
desenvolvimento deste sector em Portugal, dirigido fundamentalmente aos dois mercados
anteriormente descritos, tendo como suporte inicial uma base de mercado nacional ainda por
explorar, e o potencial existente associado aos investimentos de empresas nacionais noutros
países.
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Artigo Economia Pura – Outubro 2003
6. Caixa: Licenciamento, um processo a optimizar
Apesar do esforço crescente, o ritmo a que os promotores nacionais têm vindo a efectuar
instalações de Parques Eólicos em território nacional, poderá revelar-se demasiado lento para
o cumprimento das metas estabelecidas para 2010. Uma das principais dificuldades referidas
pelos promotores portugueses, enquanto entrave à rápida instalação de parques eólicos, é o
processo burocrático de licenciamento.
Esta situação pode ser evidenciada pelos trâmites necessários à obtenção de uma licença de
obra que implica: a submissão de um pedido de informação prévio, aprovação do projecto de
arquitectura dos edifícios de comando e subestação, projectos das especialidades,
licenciamento de arruamentos e drenagens de águas pluviais, projecto de estabilidade do
aerogerador, seguros vários, alvarás dos empreiteiros, etc.
A ilustração do processo necessário à obtenção da licença de estabelecimento é igualmente
esclarecedora implicando: obtenção do prévio pedido de informação camarário, ter um ponto
de recepção atribuído, licenciamento do projecto pela DGE, a licença ambiental, a realização
do concurso público para grandes empreitadas, etc. Trata-se de um processo moroso (mínimo
de 290 dias úteis – ver gráfico) e burocrático que poderá e deverá ser optimizado mantendo
todas as garantias necessárias à exploração de um recurso público.
Acção
Pedido de informação prévia
Entrada e verificação do processo de AIA
Resp.
Duração prevista / Prazo legal
50
Município dias
DGE
Processo de AIA
MCOTA
Declaração de conformidade
MCOTA
Discussão Pública
MCOTA
DIA favorável condicionada
MCOTA
Aprovação dos projectos de execução
MCOTA
Duração
indefinida
20 dias
15
dias
50
dias
35
dias
Duração
indefinida
RECAPE - Rel. De Conformidade Ambiental do
Proj. Execução
MCOTA
Reconhecimento de Interesse Público (caso
REN ou RAN ou Rflorestal)
Licença de Estabelecimento
Licença de Obra
Duração Total Mínima Prevista pelos
Promotores
45
dias
40
dias
MCOTA
DGE
5 dias
Duração
indefinida
Município
290 dias úteis
Fonte: IIR (2003)
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7. CAIXA: O caso espanhol – um exemplo a seguir
O progresso da energia eólica em Espanha reflecte-se na evolução da capacidade instalada,
de 75 MW em 1994, até aos 4.830 MW em 2002.
Suportando
o
crescimento
verificado
encontram-se
os
programas
governamentais
desenvolvidos no sentido da promoção da produção de energia eléctrica a partir de fontes
renováveis, complementados, desde 1980, com decretos regulamentares decisivos.
O primeiro, com o objectivo de reduzir a dependência energética do exterior, data de 1980, e
estipula como meta a satisfação de 12% do consumo de energia em Espanha a partir de fontes
renováveis.
Em 1994, é instituído o pagamento pela energia “verde” de um preço fixo garantido a cinco
anos, num sistema semelhante aos incentivos alemães.
Em 1998 é reforçado o objectivo fixado em 1980 estipulando-se a data limite de 2010 para sua
execução. Os preços e regulamentos deste tipo de energia são nesta data ajustados aos
objectivos da União Europeia, sendo estabelecida uma remuneração ao produtor em 80 a 90%
do preço de venda ao consumidor final. Em 2003 o governo espanhol fixa o preço em 6.2
cêntimos por kWh.
A prossecução dos objectivos nacionais não viria, no entanto, a limitar-se aos referidos
decretos, beneficiando de uma complementaridade reflectida nos incentivos à produção,
instalação e exploração de parques eólicos, e num clima de estabilidade propício à iniciativa
privada e ao investimento directo estrangeiro e nacional.
O forte compromisso por parte dos governos regionais na implantação de parques eólicos, viria
a constituir-se como o segundo factor determinante na evolução da indústria eólica em
Espanha. A região da Galiza destaca-se com 1.315 MW instalados no fim de 2002, e com o
objectivo alcançar os 4.000 MW em 2010 (a meta para Portugal é de possuir 3.750 MW
instalados para na mesma data).
Assim, criou-se um dos maiores mercados mundiais do sector, com um crescimento anual de
24% na década de 1990, e que superou os 30% em 2002. Este crescimento chamou a atenção
dos principais fabricantes, tendo no entanto as autoridades nacionais e regionais adoptado
medidas que promoveram a produção sob licença de aerogeradores e o desenvolvimento de
uma indústria espanhola ligada ao sector.
O resultado foi o florescimento da indústria espanhola, nomeadamente através do
estabelecimento de parcerias que privilegiavam a transferência de tecnologia, como a
estabelecida entre a Gamesa e a dinamarquesa Vestas (líder mundial) e entre a Izar e a
dinamarquesa Bonus. A Gamesa, entretanto autonomizada da Vestas, é hoje o quarto maior
fabricante mundial, tendo mesmo acompanhado o movimento de consolidação empresarial
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através da aquisição da espanhola Made, um dos dez maiores construtores mundiais. Assim,
cerca de 85% da capacidade instalada em Espanha foi fornecida por empresas espanholas
com tecnologia própria, que desenvolveram entretanto aerogeradores com potências
superiores a 1 MW, acompanhando a tendência do mercado.
As empresas de produção eléctrica estiveram desde cedo associadas às empresas
construtoras de aerogeradores, promovendo o desenvolvimento industrial espanhol. Entre os
exemplos mais significativos, pode apontar-se a participação da Endesa na Made, e as
parcerias entre a EHN (Empresa Hidroeléctrica de Navarra), a Iberdrola e a Gamesa. Outro
exemplo é o da formação da Noi Navarra, uma joint venture entre a alemã Noi e a empresa
pública espanhola Sodena, para o fabrico de pás para aerogeradores.
O desenvolvimento industrial espanhol deu origem a uma cadeia de mais de 350 empresas
fornecedoras de equipamentos, componentes e serviços. Um estudo recente da EHN revela
que a instalação de 265 MW na província de Navarra, criou cerca de 2.043 postos de trabalho
nas áreas dos estudos de recursos eólicos, planeamento, fabrico de turbinas, construção,
operação e manutenção de parques eólicos, e a criação de 1.315 postos de trabalho
adicionais,
relacionados
com
a
produção
de
componentes
e
equipamentos
para
aerogeradores. No ano 2000 estimavam-se em 5.000 os postos de trabalho directos e 8.000 os
indirectos, neste sector em Espanha, existindo estimativas que apontam para 2011, o alcance
de 13.000 MW instalados e 20.000 postos de trabalho relacionados com o sector.
Em 2002, de acordo com a Asociación de Productores de Energías Renovables (APPA) a
produção do parques eólicos espanhóis situou-se nos 9.120 GWh, e um volume de vendas de
695 M€, demonstrando um crescimento de 57% face a 2001, e um investimento, neste ano, de
1.466 M€ para instalação de 1.535 MW, revelando a dinâmica deste sector em Espanha.
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