CESNORS ANÁLISE DE MUDANÇAS EDITORIAIS NA REVISTA BIZZ

Transcrição

CESNORS ANÁLISE DE MUDANÇAS EDITORIAIS NA REVISTA BIZZ
TCC I – Trabalho de Conclusão de Curso I
Universidade Federal de Santa Maria
Centro de Educação Superior Norte – RS
CESNORS
Centro de Educação Superior Norte
RS
Departamento de Ciências da Comunicação
Curso de Comunicação Social – Jornalismo
08 de outubro a 19 de outubro de 2012
ANÁLISE DE MUDANÇAS EDITORIAIS NA REVISTA
BIZZ
MARTHA STEFFENS
Artigo científico apresentado ao Curso de Comunicação Social – Jornalismo como
requisito para aprovação na Disciplina de TCC I, sob orientação do Prof. Luis Fernando
Rabello Borges e avaliação dos seguintes docentes:
_______________________________________________
Prof. Me. Luis Fernando Rabello Borges
Universidade Federal de Santa Maria
Orientador
________________________________________________
Prof. Dr. Luciano Kreuzburg Miranda
Universidade Federal de Santa Maria
_________________________________________________
Prof. Me. José Antonio Meira da Rocha
Universidade Federal de Santa Maria
_________________________________________________
Profª. Me. Caroline Casali
Universidade Federal de Santa Maria
(suplente)
Frederico Westphalen, outubro de 2012.
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Análise de mudanças editoriais na revista Bizz
RESUMO
Neste artigo, é apresentada uma análise da revista Bizz, de forma a possibilitar
apontamentos sobre mudanças editoriais vivenciadas pela publicação entre 1985 e 2001.
Para tanto, foi realizada uma análise de conteúdo da revista, através do contato com as
192 edições disponibilizadas em sete CD-ROM. Tomando por base alguns indicativos
em termos de variação gráfica, foram observadas quatro fases. Dentre estas, a mais
significativa se deu a partir de outubro de 1995, quando a revista passou a se chamar
Showbizz e mudou totalmente a abordagem das matérias, diminuindo o espaço
destinado a textos em prol da ênfase na diagramação.
PALAVRAS-CHAVE
Revista Bizz; Jornalismo de Revista; Rock; Música; Jornalismo Cultural
INTRODUÇÃO
A revista Bizz foi lançada em agosto de 1985. O primeiro projeto editorial surgiu
através de uma pesquisa feita com o público do Rock in Rio, ocorrido em janeiro
daquele mesmo ano. Naquela época muitas bandas de rock estavam surgindo no Brasil,
o que fez a revista abordar o fenômeno e virar um sinônimo de música no nosso país. O
primeiro projeto editorial da revista abordava além de música, também cinema, moda,
vídeo, quadrinhos e tecnologia.
O contexto histórico do país naquela época ajudou para que a revista já fizesse
as suas primeiras mudanças. Com o público brasileiro consumindo mais, a revista
resolveu fazer edições especiais, onde estampavam ídolos do rock e pôsteres de bandas.
Dois anos após o lançamento da revista, houve novas mudanças decorrentes do
surgimento de uma nova revista. Set foi lançada e gerenciada por boa parte da redação
da Bizz. Em consequência do lançamento dessa publicação sobre cinema, a revista Bizz
ficou focada apenas na música e sua redação reformulada para atender à demanda de
duas revistas.
Durante os cerca de vinte anos em que a revista foi lançada mensalmente, houve
muitas mudanças na linha editorial. Nos anos 80 a revista manteve a linha editorial
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informativa, para no começo dos anos 90 ter uma linha editorial mais opinativa, mas
sempre com ênfase no rock’n’roll. Nos anos 2000 a revista saiu da linha rock e abriu
foco para a música eletrônica e raridades do pop nacional.
O objetivo desse artigo é analisar e fazer alguns apontamentos sobre algumas
dessas várias mudanças da linha editorial da revista Bizz, alinhar com a cultura vivida
ao longo desses vinte anos de existência da revista e observando variações gráfica s e
transformações de gêneros musicais.
O problema de pesquisa será identificar: quais foram as características de
algumas das fases pelas quais passou a revista Bizz, e qual a colaboração do contexto
cultural da época nessas mudanças?
Analisarei algumas fases mais importantes e as quais deu para perceber mais
acentuadamente essas reformulações, observando algumas revistas da década de 80, as
da primeira metade e outras do fim da década de 90 e as últimas, quando a revista já
estava se despedindo, já nos anos 2000. Ao longo do artigo, farei alguns apontamentos
referentes a essas fases e mudanças na Bizz.
REFERENCIAL TEÓRICO
Jornalismo de revista
A história das revistas no Brasil tem uma ligação com o contexto histórico,
econômico e industrial do país. As revistas chegaram ao Brasil no início do século XIX
junto com a corte portuguesa, ou seja, chegaram junto com o assunto tratado e com os
meios em que seriam feitas. Antes disso, Portugal havia proibido a imprensa no Brasil.
A primeira revista publicada no país foi As Variedades em 1812, na cidade de Salvador.
No século XX, do início da década de 50 até meados da de 60, algumas revistas
sobre cultura foram criadas para reunir intelectuais e reagir contra a Ditadura Militar
instalada no Brasil em 1964. Também durante este período, as revistas ficaram
conhecidas como bons veículos de comunicação para a publicidade, além de
acompanhar de perto o desenvolvimento das indústrias. Várias coisas diferenciam a
revista dos outros veículos de comunicação. Uma das principais é a maneira como a
revista trata o seu leitor, com o uso de termos como “você”, falando com ele
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diretamente e às vezes até com certa intimidade. A revista faz questão de ouvir o leitor
de alguma forma.
São várias as maneiras de escutar o que o leitor quer e tem a nos dizer. Seja
por intermédios de pesquisas, qualitativas e quantitativas, ou mesmo por
meio de telefonemas, cartas e e-mails enviados à redação. Para quem trabalha
numa publicação que depende muito da sintonia fina com seu público, esse
contato é essencial (SCALZO, 2006, p.37).
Além desse contato com o leitor, outro aspecto que diferencia a revista dos
outros veículos de comunicação é o seu formato. A revista tem um formato impresso
fácil de carregar, guardar em algum lugar, levar na mochila etc. Um dos formatos mais
comuns é o de 20,2x26,6 cm, que, por exemplo, é o tamanho das revistas Time e Veja. A
periodicidade das revistas (geralmente semanais, quinzenais ou mensais) também a
diferencia dos outros veículos de comunicação. As notícias acontecem todos os dias, a
todo momento, e veículos de comunicação como rádio, Internet e televisão podem
veicular essas notícias em tempo real. Já as revistas não irão apenas publicar uma edição
semanalmente com notícias que resumem toda a semana. Segundo Scalzo, “é sempre
necessário explorar novos ângulos, buscar notícias exclusivas, ajustar o foco para aquilo
que se deseja saber, e entender o leitor de cada publicação” (2006, p.41).
Como também ocorre com o resto da imprensa, o mercado das revistas também
passa por alguma crise nos últimos anos. Além disso, a disputa pelos anúncios
publicitários está mais concorrida. Contudo, as revistas sabem de alguma forma que não
devem depender tanto da receita publicitária. Ao longo dessa história das revistas,
aprende-se que deve haver uma necessidade de cada publicação ter um foco. Os tipos de
segmentações mais comuns são por gênero (masculino e feminino), por idade (infantil,
adulta, adolescente), geográfica (cidade ou região) e por tema (cinema, música,
esportes, ciência...).
Jornalismo cultural
Não há uma data certa do surgimento do jornalismo cultural, mas o marco desse
surgimento foi em 1711, quando os ingleses Richard Steele e Joseph Addison fundaram
uma revista diária chamada The Spectator. A revista falava de muitas coisas, como
livros, óperas, costumes, festivais de música e teatro, política, entre outros e isso tudo
em uma conversa culta, sem ser formal. A Spectator era voltada ao homem da cidade,
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“moderno”, ou seja, ligado em modas, novidades para o corpo e a mente, além de
política – a revista mostrava que o conhecimento poderia ser divertido.
Pode-se dizer que o jornalismo cultural é um produto de uma era que inicia a
partir do Renascimento, sendo dedicado à avaliação de ideias, valores e artes. As
revistas desempenharam um papel muito grande no jornalismo cultural, pois no século
XX havia uma agitação cultural e artística muito grande nas cidades e nesse contexto
havia a presença de muitas revistas, em forma de resenhas, ensaios, críticas, perfis e
entrevistas. O jornalismo cultural moderno está tendo crises de identidade com uma
certa frequência, com maior acentuação a partir da metade do século XX. Apesar disso,
as revistas culturais se multiplicaram a partir dos anos 20 e as seções culturais da grande
imprensa se tornaram obrigatórias a partir dos anos 50. Pode-se dizer então que o
jornalismo cultural acompanhou a evolução da “indústria cultural”.
Uma questão que Daniel Piza (2007) propõe discutir é o fato de pessoas menos
instruídas terem um certo medo da cultura, apesar que de certo ponto seja positivo essas
pessoas terem medo, pois leva a pensarem que é algo que deve ser alcançado, que exija
dedicação e leitura. Só que às vezes acontece a desistência, aquilo de que “eu nunca vou
chegar lá”, só que o problema nem sempre é o chegar lá.
Cada publicação da imprensa tem um público-alvo e deve se concentrar em
falar com ele, sem abrir mão de tentar contribuir com sua formação, com a
melhora de seu repertório. (...) Agora, quando se fala a um público mais
qualificado, há a vantagem do efeito multiplicador. Embora a TV ganhe fácil
em instantaneidade e impacto, ela ainda continua a se pautar muito pela
imprensa escrita (PIZA, 2007, p.47).
E em meio a isso tudo, uma perda para o jornalismo cultural é sua submissão ao
cronograma de eventos. Lê-se muito sobre discos, livros, filmes e outros produtos logo
que chegam ao mercado; no entanto, depois de um certo tempo, quando esses produtos
já tiveram uma “carreira”, raramente lemos sobre eles. Isso faz com que pensemos o que
realmente eles significam para o público. O jornalista tem o papel de informar a
sociedade não só sobre assuntos “sérios” e corriqueiros, mas também assuntos que
podem fornecer formação cultural (além de entreter) à sociedade de alguma forma,
como música, teatro, literatura, cinema, entre outros. O jornalista cultural tem algumas
particularidades em relação aos jornalistas das outras editorias. Enquanto esses são mais
objetivos e estão sempre em busca das atualidades, o jornalista cultural tende a ser mais
flexível.
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A forma de expressão mais característica do jornalista cultural é o texto
opinativo, na forma de crítica. Um texto que, além de informar, expõe a opinião de
quem está escrevendo. Além dos textos opinativos, os jornalistas culturais utilizam
textos em forma de notas e reportagens. A reportagem junto com o texto opinativo é um
dos tipos de textos mais utilizados pelo jornalista cultural. Não tão aprofundados como
os textos opinativos e as reportagens, as notas são usadas por esses jornalistas, junto
com roteiros e agendas culturais. Mas, apesar desses tipos de textos no jornalismo
cultural serem bastante usados, algumas vezes as imagens são mais valorizadas e os
tamanhos estampados nas páginas de revistas e jornais são maiores do que o próprio
texto.
Rock de revista
A partir dos anos 60, o jornalismo inevitavelmente passou a olhar para o novo
público rock’n roll, que havia surgido na década anterior. Essas mudanças aconteceram
na pauta, já que houve essa mudança de interesse e também na redação, pois o público
de rock não se interessava por aquele jornalismo clássico, que era cheio de formalismos.
Nos EUA temos, como exemplo de revistas especializadas em rock, a Rolling Stone. Já
no Brasil essa linguagem tomou forma nos anos 80, com a revista Bizz e mais tarde com
a revista Trip!.
Na década de 60, quando surgiu o jornalismo de rock, o público ainda não era
muito definido, pois o adolescente era um segmento novo no mercado. A primeira
revista de rock surgida no Brasil foi, como o próprio nome já diz, Revista do Rock,
surgida em 1960. Essa revista definiu a linguagem usada por esses tipos de revistas até o
fim da década de 60. A revista trazia fofocas, fotos dos artistas, pequenas biografias,
letras das músicas e fornecia um espaço para o fã entrar em contato. Outra revista que
surgiu nessa década foi Os Reis do Iê-Iê-Iê.
Já na década de 70, o marco de revistas sobre rock no país foi a chegada da
edição nacional da estadunidense Rolling Stone. Ela abordava rock estrangeiro, com
matérias e colunas traduzidas da versão americana. Quando a Rolling Stone chegou ao
Brasil, a geração já estava mais familiarizada com o rock, além da revista trazer uma
visão crítica do rock, enquanto arte e forma de expressão. A Rolling Stone durou apenas
36 edições em sua primeira versão no Brasil, mas trouxe sua contribuição ao abrir
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espaço a uma geração de novos jornalistas musicais e por apresentar uma outra
alternativa da linguagem usada pelas revistas dos anos 60.
A revista considerada como mais importante publicação musical a circular no
país na década de 80 foi a revista Bizz. Ela foi sucesso de vendagem desde o começo e
terminou a década como a principal publicação de música pop do país. Já no início da
década de 90, surgiu uma segunda leva de revistas segmentadas, e essas revistas
merecem destaque por terem ficado atentas a uma mudança importante do rock
mundial, o surgimento do estilo grunge, até antes mesmo da MTV Brasil mostrar esse
tipo de música em seu canal. Isso levou a Bizz, que naquele momento liderava o
mercado nacional, a fazer mudanças em sua linha editorial, dando uma maior atenção às
novidades daquele período. Essa mudança deu certo e ajudou a Bizz a continuar líder do
mercado de publicações musicais, apesar das vendas terem diminuído em todo o
mercado editorial. Segundo Rafael Saldanha, “a Bizz foi um sucesso de vendagem
desde o princípio, e terminou a década como a principal publicação de música pop do
país. Através de suas páginas a juventude brasileira teve acesso às principais novidades
do mercado fonográfico mundial” (2005, p.30).
A imprensa musical tem vários formatos: revistas especializadas em um ou
vários gêneros musicais, revistas voltadas para músicos sobre instrumentos e
aparelhagem técnica, fanzines, literatura acadêmica, matérias em revistas semanais,
além de cadernos de cultura ou suplemento de jornais diários (GAIARSA, 2008). Para
qualquer músico, é importante ver sua foto estampada em um jornal ou revista,
principalmente se o seu disco estiver sendo avaliado.
No começo do século XXI, a Internet já havia se estabelecido com alguma
intensidade, e assim começou a competir com as revistas a partir de sites especializados
em música. A vantagem da Internet é que tornava o acesso mais barato e de alguma
forma mais democrático, pois não era mais preciso gastar com uma gráfica, era apenas
necessário juntar umas pessoas e criar um site ou blog. Assim, algumas revistas
sentiram necessidade de digitalizar-se, como foi o exemplo da revista Bizz, que em 2007
abandonou de vez a versão impressa e ficou apenas com a versão on-line.
Revista Bizz e a crítica musical
Houve uma aceleração no processo de segmentação da mídia a partir dos anos
80, e nas revistas esse processo de segmentação acabou sendo mais intenso do que nos
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outros meios de comunicação. Surgiram várias editoras, como a Editora Azul, em 1986.
A editora seguia a lógica das revistas segmentadas, com menor tiragem (cerca de 100
mil exemplares), públicos específicos e mercado instável. Essa segmentação temática
presente em todas as revistas visava captar o gosto de públicos particulares, com
diferentes faixas etárias, sexo, classe socioeconômica e preferências pessoais. Nesse
contexto surgiu a revista Bizz, uma revista voltada para a música e seu público jovem.
A revista surgiu em 1985, logo após o efeito causado pelo festival Rock in Rio e
sua especialidade era a música nacional e internacional e todo o seu universo visual,
como videoclipes, cinema e comportamento. A revista tinha jornalistas correspondentes
em Londres, Nova York e Paris, além de ter um contrato com o canal de música
estadunidense MTV, em parceria através da qual a Bizz recebia clipes dos EUA apenas
dois dias após o seu lançamento. Em 1990, a própria editora da Bizz, a Abril, lançou a
MTV no Brasil. A faixa etária do público da Bizz situava-se entre os 15 e 29 anos
(MIRA, 2001) e, além de haver outras revistas mais segmentadas sobre a música pop, a
revista Bizz liderava o setor, pois tinha uma produção mais sofisticada e não abrangia só
o pop, e sim também o rock nacional e internacional, além de outras tendências jovens.
Há uma inconstância muito grande no público jovem. Junto com a construção de
sua identidade, acabam muitas vezes mudando o grupo de amigos, assim como a sua
“tribo”, ou seja, acabam mudando também os gostos musicais, roupas, adesivos,
equipamentos, dieta alimentar e corporal etc.
Maria Celeste Mira explica como as revistas acabam se situando nessas
mudanças:
As estratégias de mercado procuram ir ao encontro dessa inconstância dos
jovens, diversificando a oferta de produtos e fazendo com que eles, com mais
opções, saibam cada vez menos quem são. Essa relação entre a construção da
identidade e consumo já observada no universo feminino se acentua no caso
dos adolescentes e se torna mais veloz. Por sua vez, impõe ao mercado uma
exigência constante de mudanças, de busca de novos estilos, de
aprimoramento técnico, visual etc. No caso das revistas, as reformas gráficas
são feitas a cada dois ou três anos (MIRA, 2001, p.159).
A revista Bizz procurou fazer essas mudanças sempre que achasse necessário,
mudando sua linha editorial muitas vezes. Não só da faixa etária de 15 a 29 anos era
característica dos leitores dessa revista de música, mas também era composta
praticamente pelo gênero masculino, principalmente em 1994, onde 70% dos leitores
eram homens. Isso porque a relação dos garotos com a música era mais direta, enquanto
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que, com as garotas, ela era intermediada pelo cantor. As mulheres compram menos
produtos da indústria musical do que os homens, e assim a revista vai se guiando
conforme seus leitores.
Logo que surgiu a revista, a sua linha editorial não seguia a linha do jornalismo
opinativo. Ricardo Alexandre, um dos ex-editores da revista, diz que “Havia muito
medo por parte da direção no que se referia a um projeto segmentado. Havia medo de
ofender os artistas, ofender as gravadoras (...)” (2002, p.217). À medida que
aumentavam suas edições, as críticas ganharam bastante importância nas páginas da
revista, sobretudo no início dos anos 90, deixando muitos artistas e grupos de rock
desconfortáveis com o que falavam de seus discos.
Diferentemente de outras revistas do gênero, a equipe da Bizz ao longo da sua
existência era formada basicamente por músicos ligados ao jornalismo, fazendo com
que as matérias e críticas tivessem um caráter mais subjetivo, ou seja, partindo da
convicção do autor de cada matéria. Lembrando que o texto crítico tem muita
importância na formação do público consumidor.
A revista possuía como seções fixas Showbizz, Air Mail, Ao Vivo, Porão, Parada
Bizz, Lançamentos, Discoteca Básica e Cartas. Por exemplo, a seção Showbizz, em
forma de notas, informava sobre bandas e artistas solo que estavam lançando novos
discos pelas gravadoras. A seção Ao Vivo acompanhava os shows por todo o país. A
Porão falava sobre o que estava acontecendo na cena underground brasileira e
internacional e, na seção Lançamentos, os jornalistas da Bizz faziam críticas aos discos
lançados no mundo.
Nessa última seção citada, muitos dos jornalistas da Bizz que faziam as críticas
eram ligados a bandas de rock e faziam críticas fortes até contra bandas de amigos. A
crítica de Bizz também acompanhou as mudanças no mercado fonográfico brasileiro,
consequência da mudança no mercado mundial, e não deixou de lado ao abordar e fazer
críticas a outros gêneros, como a MPB e o forró. A crítica assumia também um papel
comparativo, onde vai comparar o produto (disco) com aquilo que já foi feito no gênero,
além do que o jornalista crítico deve saber com qual público ele estará lidando e saber
se estará agradando ou não aos leitores (GAIARSA, 2008).
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Para a maioria dos críticos de rock, portanto, a questão no final é não apenas
apresentar a música ao público, mas criar uma comunidade, organizando a
união entre músicos seletos e uma parte do público igualmente seleta –
selecionados por serem mais exigentes do que o consumidor comum de
música pop. O crítico é, assim, um fã com a missão de preservar a qualidade
dos sons, salvar os músicos deles mesmos, e definir a experiência ideal para
os ouvintes (FRITH, 1998, p.67).
Análise de conteúdo
A análise de conteúdo é um método de grande utilidade em pesquisas
jornalísticas. É utilizada para detectar tendências e modelos na análise de critérios de
noticiabilidade, enquadramentos e agendamentos. Serve também para descrever e
classificar produtos, gêneros e formatos jornalísticos. A análise de conteúdo da mídia
serve para nos ajudar a entender um pouco mais sobre quem produz e quem recebe a
notícia.
A análise de conteúdo é feita bastante na forma quantitativa, mas pode ser feita
também na forma qualitativa.
A análise qualitativa de textos (qualquer mensagem escrita ou
gravada) é melhor descrita e categorizada pela análise retórica ou de
discurso, embora acredite que, com alguns ajustes, se possa fazer
análise de conteúdo qualitativa. (NEUENDORF, 2007, p. 125).
Os pesquisadores que utilizam a análise de conteúdo são considerados como
detetives em busca de pistas que desvendem os significados aparentes ou implícitos
dentro de narrativas jornalísticas, expondo tendências, conflitos, interesses ou
ideologias presentes nos materiais examinados. Um bom investigador sempre começa
por uma boa pergunta (interrogação) ou hipótese (afirmação) que fará a ligação entre a
teoria e a “investigação”.
As perguntas são consideradas mais fáceis de se trabalhar do que com as
hipóteses. A hipótese além de afirmar algo, tem que ser feita com intensidade,
frequência ou direção. É uma proposição temporária, que deve ser comprovada ou
descartada.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
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Para perceber mudanças na linha editorial da Bizz, e poder posteriormente fazer
alguns apontamentos a respeito, fiz uma leitura geral das edições da revista, pois tive
acesso a todas as edições. A partir de um conhecimento geral sobre o conteúdo da
revista, comecei a analisar as mudanças gráficas ao longo do tempo, principalmente em
seu slogan. As mudanças na linha editorial puderam ser percebidas a partir dessas
variações no slogan, pois toda vez que ele mudava, dava para perceber mudanças no
conteúdo, abordagem das matérias e nas imagens, às vezes mudanças mais simples e
outras vezes mais importantes.
A partir desse conhecimento prévio, resolvi analisar quatro fases da revista por
achar essas mudanças mais fortes e notáveis. Na primeira fase, final dos anos 80,
escolhi cinco edições: edição 32 (março de 1988), edição 36 (julho de 1988), edição 37
(agosto de 1988), edição 38 (setembro de 1988) e edição 40 (novembro de 1989). Na
segunda fase, começo dos anos 90, escolhi quatro edições: edição 94 (maio de 1993),
edição 95 (junho de 1993), edição 96 (julho de 1993) e edição 98 (setembro de 1993).
Na terceira fase, metade dos anos 90, escolhi três edições: edição 123 (outubro de
1995), edição 124 (novembro de 1995) e edição 125 (dezembro de 1995). Na quarta
fase, final dos anos 90, escolhi três edições: edição 154 (maio de 1998), edição 157
(agosto de 1998) e edição 160 (outubro de 1998). Todas essas edições foram as
primeiras de cada fase de mudança de linha editorial.
Em cada edição analisei a capa, algumas seções mais importantes, reportagens
especiais e matérias em geral. Cuidei a mudança de conteúdo, abordagem das matérias,
estilo da capa e algumas outras mudanças explícitas.
ANÁLISE: MUDANÇAS NA LINHA EDITORIAL
A revista Bizz surgiu em uma época em que o país estava emergindo de uma
Ditadura Militar e passando por toda uma mudança política e social. Segundo Alex
Antunes (2010), editor-chefe da Bizz no final dos anos 1980, ela surgiu dentro de um
contexto onde a circulação de informação era precária, não havia internet e os jornais
não tinham impressão em cores, por isso esse formato de revista era importante
principalmente para divulgação da imagem das bandas.
A primeira edição da revista chegou às bancas em agosto de 1985, logo após a
primeira edição do Rock In Rio. Muitas bandas nacionais fizeram os seus primeiros
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shows de grande porte no festival e isso fortaleceu a revista a mostrar essas bandas
através de suas matérias. A primeira edição procurou apresentar algumas bandas até
então ainda não tão familiares ao grande público brasileiro, a exemplo dos Smiths,
como podemos notar no título de uma das matérias da revista: “Como? Você Nunca
Ouviu Falar dos Smiths?” (Bizz, edição 01, pág. 34), além de estampar grandes matérias
falando sobre bandas e cantores conhecidos, como é o caso da matéria de capa sobre
Bruce Springsteen. Ao longo dos anos, a revista passou por várias mudanças na sua
linha editorial e, a partir disso, irei analisar quatro fases dessas mudanças na revista, e
fazer alguns apontamentos sobre cada uma.
Primeira fase: segunda metade dos anos 80
Nessa primeira fase, a revista ficou conhecida por estampar matérias com
bastante informação, através de uma linguagem mais simples, mas sem ser uma
linguagem pobre. A partir de 1987, a revista começa a focar mais na música, apesar de
ainda ter em suas edições matérias sobre quadrinhos e cinema, e não falar só sobre
bandas mundialmente conhecidas e sim sobre cantores e bandas com um caráter mais
alternativo. Havia também reportagens que acompanhavam artistas em turnês e
relatavam um show inteiro de determinada banda.
Um exemplo dessa fase foi em agosto de 1988, em que o jornalista inglês Ted
Mico acompanhou Sineàd O’Connor em sua turnê entre San Francisco e Los Angeles, e
fez um diário de bordo/entrevista traduzido especialmente para a Bizz. Ele relata e
descreve esses momentos, “São agora 9h15 da noite e Sineàd está atacando o último
refrão de ‘Just Like U Said it Would B’. Emoções em ponto de fervura e uma
aniquilação gélida se entrelaçam para tirar a respiração da platéia de San Francisco”
(Bizz, edição 37, 1988, p.32). A revista também acompanhou a turnê de uma banda
brasileira que estava no auge do sucesso, o Paralamas do Sucesso: “BIZZ acompanhou
tetê-a-tête uma dessas viagens – do embarque ao café da manhã, após mais um
memorável show dos Paralamas em Salvador” (Bizz, edição 40, 1988, p.44).
Outra característica dessa fase é que a revista contava como surgiram e a história
de bandas mais antigas. Essas matérias/reportagens geralmente eram divididas em duas
partes, cada parte em uma edição, como podemos ver na edição 37 a primeira parte da
reportagem sobre o surgimento do Sex Pistols e do The Clash. No começo da
reportagem, já podemos ver que seria uma história relatada. “Por mais estranho que
pareça, nossa história remonta ao longínquo ano de 1947. Foi nessa data que, em
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Londres, uma mulher judia deu à luz a um menino chamado Malcolm. Quase trinta anos
mais tarde, ele seria o responsável por catalisar e, até certo ponto, gerir o movimento
punk” (Bizz, edição 37, 1988, p.52). A segunda parte da reportagem saiu na edição 38 e
conta mais um pouco de duas bandas que fizeram história dentro do gênero punk, como
é relatado no fim dela. “Hoje, a herança do punk pode ser avaliada pelos milhares de
jovens em todo o mundo que, a partir de 76, iniciaram-se na música sem levar em conta
possíveis obstáculos como a falta de dinheiro e a formação técnica (...) tanto o Sex
Pistols como o Clash estimularam artistas e público a manter constante questionamento
e vigilância sobre a cena do rock e suas vicissitudes” (Bizz, edição 38, 1988, p.60).
Nessa época, as capas eram mais simples e mostravam a força da revista, que
não precisava de uma grande publicidade para ser vendida. Um exemplo é a edição 32,
de março de 88: a capa não tem quase nada de colorido e conta com apenas três
chamadas de matérias, ou seja, uma capa bem simples e nem um pouco chamativa.
Nessa fase, a revista ainda abordava temas que não eram apenas relacionados à música,
como quadrinhos e cinema. Isso se dava tanto em matérias intituladas “Os Quadrinhos
Caem na Real” (BIZZ, edição 37, 1988, p.72), “Os Heróis Que Matam” (Bizz, edição
38, 1988, p.68) quanto em seções da revista, como Vídeo, Cinema e Em Cartaz.
A revista nessa época dava bastante espaço a bandas nacionais que estavam
surgindo nesse cenário. Na edição 36, de setembro de 1988, há uma reportagem sobre a
banda gaúcha Engenheiros do Hawaii, bastante informativa e que dá espaço para o
grupo, cheia de citações de integrantes do grupo. A reportagem parecia mais um batebola entre a Bizz e os gaúchos, no qual até há um espaço para a banda deixar uma
mensagem ao público, “A mensagem dos Engenheiros do Hawaii? A gente não tem voz
bonita, não somos bons instrumentistas e não mascaramos isso nas gravações. A banda
que eu queria montar sempre foi uma coisa anônima, de três caras anônimos (...) o que a
gente não admite é ser porta-voz de alguma coisa (...) em suma, falta um pouco de
heroísmo de nossa parte” (Bizz, edição 38, 1988, p.40).
Segunda fase: começo dos anos 90
No começo dos anos 90 surgiu a MTV Brasil, que mostrava basicamente artistas
de pop rock internacional. Nessa época, também foi realizada a segunda edição do Rock
in Rio, em 1991, trazendo outros vários artistas internacionais. Depois desse começo de
década, em que a Bizz acabou se adequando com essa leva de artistas internacionais se
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apresentando no Brasil, estampando então essas bandas em suas páginas, acabou
redirecionando em 1993 sua linha editorial para artistas nacionais.
Podemos ver exatamente essa mudança em maio de 1993, na sua 94ª edição. A
capa estampava vários nomes que estavam surgindo no cenário brasileiro e o título
dizia: “A Nova Cara da Música Pop Brasileira”, em alusão à MPB (Música Popular
Brasileira). Na capa ainda eram mostrados alguns rostos da música pop brasileira, como
Edu K. (do DeFalla), Carlinhos Brown, Samuel Rosa (Skank) e Cherry (Okotô).
A reportagem de capa já mostra no início a expansão da música nacional nos
últimos meses daquela época. “Os números falam – e falarão alto – mas para começar
basta um bombástico: entre janeiro de 92 e abril de 93, contabilizamos 182 lançamentos
de artistas emergentes/iniciantes/francamente desconhecidos” (Bizz, edição 94, 1993, p.
28). A reportagem relata também que as gravadoras estavam novamente se interessando
por artistas nacionais. “Acreditando no reaquecimento do mercado e sobretudo no poder
de compra do consumidor jovem, as majors (ou pelo menos aquelas em melhor situação
financeira) já começam a abrir as comportas e aplacar a seca que quase sepultou o rock
nacional durante a década de 90” (Bizz, edição 94, 1993, p.28).
Na edição seguinte, de junho de 1993, o foco na música nacional continuou. A
capa estampava a banda Titãs, e a chamada mostrava que a reportagem seria sobre o
novo CD da banda. Na reportagem, Carlos Eduardo Miranda acompanhou algumas
gravações do grupo e ainda fez uma entrevista, na qual falou sobre vários assuntos com
os integrantes. Nessa reportagem, dá pra perceber um caráter opinativo: “Nunca fui fã
dos Titãs. O único disco deles que já tive – Tudo ao Mesmo Tempo Agora – ficou
comigo apenas algumas horas, já que dei ele para o Mike Patton, num encontro na casa
do Max Cavalera” (Bizz, edição 95, 1993, p.24). Depois, Miranda acaba confessando
que gostou do disco novo. “Volto para a redação, conto que gostei do disco e ouço a
frase esperada: ‘É só o Miranda ficar amigo de uma banda que já começa a gostar do
som’. Mentira. Sou amigo do Dinho, do Fê, do Loro e do Flávio, mas não consigo ouvir
Capital Inicial” (Bizz, edição 95, 1993, p.25).
Nessa mesma edição, temos outra matéria que mostra essa fase em que a revista
tem maior abordagem na música nacional. Em “Os 20 Homens Mais Poderosos da
Música Brasileira” (Bizz, edição 95, 1993, p.39), a matéria fala sobre nomes
importantes para as bandas brasileiras, como os grandes empresários das gravadoras,
gente de rádio, diretores musicais, entre outros. Já na edição 98, a capa estampava uma
banda brasileira e novamente a matéria falaria tudo sobre o novo CD de uma banda, e
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dessa vez seria o Sepultura. Na edição 94, Miranda passou uns dias no estúdio de
gravação com os Titãs, onde havia uma geladeira forrada de comida e bebida, segundo
ele. Agora temos outra reportagem do estilo: Anamaria de Lemos passou um fim de
semana comendo churrasco com o Sepultura e falou sobre o novo CD deles, em matéria
que trazia também uma conversa na íntegra com os 4 membros da banda.
O caráter opinativo nessa fase era explícito nas páginas da revista. Muitos fazem
a lista de melhores discos, a Bizz fez a lista dos piores discos do mundo. Na matéria,
eles perguntaram para 20 críticos brasileiros quais foram os piores discos já gravados. A
matéria já começa explicando sobre o critério de escolha dos discos: “Para que o
resultado fosse algo sério, científico, criamos critérios rigorosos. Não bastou ser muito
ruim para entrar nesta lista. Tinha que ser um daqueles discos que dão raiva, por terem
tocado muito durante muito tempo ou por terem exercido influência especialmente
nefasta” (Bizz, edição 95, 1993, p.33). Na seção Discos, Álvaro Pereira Jr. critica a
banda gaúcha Athaualpa Y Us Panquis, cuja formação faziam parte um colaborador da
revista, Jimi Joe, e um repórter conhecido da Bizz, Carlos Eduardo Miranda. Neste
exemplo, podemos perceber que a liberdade de expressão adotada pela revista já
começava na própria redação da Bizz. Álvaro faz uma grande crítica ao CD Agradeça
ao Senhor: “É o que Marisa Monte estaria fazendo se gostasse de rock. É
provincianismo burro, é mediocridade em estado bruto. É ruim demais” (Bizz, edição
95, 1993, p.47). Já na seção Showbizz, Pepe Escobar critica os programas de TV para
jovens e explica o porquê destes programas serem tão vazios quanto seus
telespectadores: “Os ‘programas jovens’ provocam unanimidade. Politicamente corretos
até a medula espinhal, não colocam nada do que interessa em juízo, ou seja, as
fundações (ou ausência de) desse sistema” (Bizz, edição 95, 1993, p.08). Além de
perceber o caráter opinativo nessa matéria da seção Showbizz, podemos ver a abertura
do leque em que a revista estava se submetendo, falando sobre outros assuntos, além de
música, como programa de TV para jovens.
Nos fim dos anos 80, a revista começou a focar mais na música e
esporadicamente falava sobre cinema e quadrinhos. Nessa fase, em 1993, a revista
começou a falar sobre diversos assuntos, mas de alguma forma ligando os assuntos à
música. Na edição 96, há uma matéria em que a Bizz defende os discos piratas. “Antes
‘coisa de marginal’, o mercado de discos piratas ganha bases legais, edições de
qualidade e conquista seu público” (Bizz, edição 96, 1993, p.45). Na edição de setembro
de 1993, há uma matéria que liga moda à música. Ela fala que a moda dança conforme a
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música, no caso, que o estilo da pessoa pode estar diretamente ligado ao que ela ouve.
“Hoje, mais do que nunca as pessoas podem, através da roupa, exteriorizar aquilo que
são, pensam e, é claro, ouvem” (Bizz, edição 98, 1993, p.47). Os assuntos são tão
variados que até aborto a revista abordou: na matéria “Direito de Escolha” (Bizz, edição
94, 1993, p.08), alguns integrantes de bandas dão a opinião e dizem se são a favor ou
contra o aborto.
Terceira fase: metade dos anos 90
Em outubro de 1995, a revista passou por mais uma mudança na linha editorial e
o nome passou a se chamar Showbizz. Falando jornalisticamente, essa foi a fase mais
crítica da revista, pois a Showbizz passou a priorizar mais as imagens e menos os textos.
Sua linguagem direcionou-se também ao público juvenil, resultando em um aumento de
público, que por sua vez resultou em um aumento da publicidade e consequentemente
das vendagens.
Já nessa primeira edição de outubro de 1995 podemos perceber essas mudanças.
A capa, que estampa Carlinhos Brown, mostra chamadas que parecem ser direcionadas
a um público mais adolescente, como “Morra de rir com os Mamonas Assassinas” e
“Você pode ser filho de Bob Marley”. As cinco primeiras páginas da revista estampam
propagandas. Na seção Bizzes, é percebida essa linguagem em algumas notas, como
“Em 1989, no frescor da adolescência, a depilada mais famosa do país treinava seus
dotes vocais no quarteto Meia Soquete” (Bizz, edição 123, 1995, p.27), que fala a
respeito de Adriane Galisteu, e em outra sobre os Mamonas Assassinas, “Você conhece
a piada do pintinho que não tinha ânus? Os Mamonas conhecem. Soltam uma média de
34 gracinhas por minuto. Soltam gases também, com o nobre intuito de aromatizar a
carona para o repórter da Showbizz. Eles são bobos, mas que você ri, ah, isso ri (...) P.S.
A quem interessar possa: o pintinho da piada foi peidar e explodiu...” (Bizz, edição 123,
1995, p.29).
A reportagem de capa sobre Carlinhos Brown não fica muito longe dessa
linguagem. Ela não é tão informativa jornalisticamente e musicalmente e percebe-se
uma abordagem maior sobre sua vida pessoal. “Separado de Rachel Hitchett, cantora
que foi morar em Los Angeles, Carlinhos Brown morre de saudades da filha Nina, de
cinco anos” (Bizz, edição 123, 1995, p.37), “Brown começa a enumerar o patrimônio
por bacurinhas e timbaus. Logo chega em seu ‘jipezinho importado’” (Bizz, edição 123,
1995, p.29), “Pergunta, olhando para a namorada Helena Buarque de Hollanda (...) o
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casal se conheceu há três carnavais. Discorda se namora há dois anos e meio ou mais.
‘Cê quer falar disso, mamã?’ ‘Cê que ta dando a entrevista!’, responde ela, sem a menor
vontade de falar disso” (Bizz, edição 123, 1995, p.29). A valorização das imagens
também pode ser percebida na primeira parte de uma reportagem sobre o futuro de
alguns ídolos da música nacional: sem texto algum, só com imagens, parecendo mais
um ensaio fotográfico. Também dá para perceber que a revista apelou para ensaios
sensuais, como aconteceu nessa mesma edição com a filha do compositor Carlinhos
Vergueiro, Dora Vergueiro. Na matéria, há uma foto dela com os seios à mostra, e outra
maior, com o corpo seminu em uma festa no morro da Mangueira.
Na edição de novembro de 1995, na seção Bizzes, há uma nota sobre a
sexualidade de Morten Harket, vocalista do A-ha. “Calma, meninas, Morten Harket é
macho e o A-ha não acabou” (Bizz, edição 124, 1995, p.23) – o vocativo “meninas”
mostra que o título remete ao público jovem, nesse caso o feminino. Logo abaixo, há
uma nota falando que Michael Stipe será pai e essa linguagem mais uma vez é notada,
“Michael Stipe foi brincar de médico e olha no que deu: contribuiu para uma produção
independente. Vai ser papai. A mamãe é a jornalista Jane Pratt” (Bizz, edição 124, 1995,
p.23). Nessa mesma edição há uma matéria sobre o carnaval de Ibiza, cheia de imagens
de pessoas seminuas e com seios de fora e o título “Todo mundo nu! Todo mundo
doidão” (Bizz, edição 124, 1995, p.36-37). Há também a segunda parte da matéria só de
imagens sobre o futuro dos ídolos da música nacional, e mais uma matéria com imagens
sensuais, dessa vez com Clara Moreno, filha da cantora, violonista e compositora Joyce
e do baterista Tuti Moreno.
Na edição 125, pode ser notado novamente que a ênfase no jornalismo não
estava em alta na revista. Em uma reportagem, o repórter da Showbizz conversou com o
camareiro do quarto de hotel em que Madonna estava hospedada, conseguindo saber
sobre intimidades da cantora. Através de notinhas, o camareiro conta sobre o que
Madonna comia: “Só come frutas e toma champanhe o dia inteiro. A fruta predileta é
papaya, mas pede melão também. De manhã, sempre duas fatias de pão integral e três
latas de V8” (Bizz, edição 125, 1995, p.39). Não ficaram de fora a suíte em que ela
estava hospedada, a academia que havia dentro dela, objetos pessoais e roupas
espalhadas no lugar. Nessa mesma edição, há uma matéria sobre Luana Piovani, com
fotos sensuais: “Você quer convidar Luana Piovani para um programa irrecusável? ‘É só
me chamar para dançar’, entrega, com os olhos brilhando” (Bizz, edição 125, 1995,
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p.64). A revista, assim, acentuava essa apelação a fotos sensuais dentro da revista e
aumentava suas vendagens.
Quarta fase: final dos anos 90 e começo dos anos 2000
No final dos anos 90, em 1998, a revista volta a investir no texto jornalístico e
retira de sua linha editorial as fotos de ensaios sensuais, além de novamente dar um foco
maior à música nacional. Já podemos perceber isso na edição 154, de maio de 1998. A
capa estampada por Marcelo Bonfá, ex-integrante da Legião Urbana, traz várias
chamadas das matérias que iriam estampar a revista e já não há mais tantas propagandas
em suas primeiras páginas.
Aquela linguagem mais voltada ao público adolescente, notada principalmente
na seção Bizzes, já não se fazia mais presente. Em uma nota sobre o Skank nessa seção,
podemos ver que ela é mais informativa musicalmente. “Ele e seus colegas encerram as
gravações do novo disco em maio e depois mixam em Abbey Road, lendário estúdio de
Londres de onde saíram Sgt. Pepper’s, dos Beatles, e The Dark Side of The Moon, do
Pink Floyd” (Bizz, edição 154, 1998, p.14).
Nessa mesma edição, dá para perceber que o foco na música nacional estava em
alta. A reportagem de capa sobre Marcelo Bonfá, ex-baterista da Legião Urbana, é bem
informativa, trazendo várias informações e detalhes sobre o artista. A reportagem
abordava assuntos pessoais, mas sem perder o foco na informação jornalística. “Hoje,
mais maduro, está tendo aula de música e de canto. Isso para soltar a voz no seu futuro
disco (...) quando estiver no ponto, Marcelo pretende entrar em estúdio para que o
rascunho que gravou em sua casa se transforme, enfim, em arte final” (Bizz, edição 154,
1998, p.28).
Além de falar sobre MPB e o rock nacional, nessa fase, a revista também
abordou outros gêneros musicais brasileiros, como o forró e o samba. Na edição de
agosto de 1998, há uma reportagem falando sobre o forró nordestino nas noites do
sudeste brasileiro. “Na capital paulista, de terça a domingo, esse povo bate coxa em sete
casas diferentes. Elas cobram até 20 reais de entrada e recebem um público jovem bem
diferente dos migrantes nordestinos habitualmente apaixonados pelo ritmo” (Bizz,
edição 157, 1998, p.26). Já na edição 160, a revista fala sobre os anônimos que fazem os
sambas de Bezerra da Silva. A reportagem mostra pessoas que trabalham em diversos
empregos e compõem as músicas do artista. “Poucos artistas possuem repertório com
tamanha unidade estilística e temática. O espantoso, no caso, é que José Bezerra da
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Silva é, acima de tudo, um intérprete que serve-se do trabalho de inúmeros
compositores” (Bizz, edição 160, 1998, p.28).
Do final dos anos 90 até começo dos anos 2000 não houve grandes mudanças na
linha editorial, mas dá para perceber que em 2001 a revista fazia basicamente
reportagens especiais, como dá para perceber na edição de fevereiro de 2001. Na
reportagem especial sobre o Rock In Rio daquele ano no Brasil, a revista exibiu em 22
páginas a cobertura do festival e mostrou a importância que a revista dava para esse
grande festival de música. Outras reportagens especiais desse começo dos anos 2000
foram sobre o CD ao vivo da banda Legião Urbana, mostrando várias coisas que
aconteceram nos bastidores (Bizz, edição 189, 2001) e a cobertura completa dos
festivais que aconteceram no Brasil em 2001 (Bizz, edição 191, 2001). Nessa mesma
fase a revista já estava abordando sobre diversos gêneros musicais, como a música
eletrônica e o pop.
CONCLUSÃO
Com a finalização da análise e do artigo, pude perceber que, ao longo desses
anos de existência da revista, houve bastante mudanças em sua linha editorial, mas
algumas mudanças foram mais acentuadas e acabaram tendo mais importância no rumo
da revista. As reportagens e matérias em geral geralmente eram bastante informativas e
descritivas, o que pude perceber principalmente nessa primeira fase analisada. A
valorização da revista a bandas locais também sempre foi bem acentuada.
Pude perceber também que o contexto histórico e a cultura da época
influenciaram em algumas mudanças da linha editorial. Por exemplo, as duas primeiras
edições do festival Rock In Rio (1985 e 1991), que trouxeram várias bandas importantes
ao Brasil, e o surgimento da MTV no começo dos anos 90. A revista sempre procurava
se adaptar a novos fenômenos e mudanças surgidas na cultura do país.
Uma mudança de linha editorial muito importante foi a que se deu logo após a
febre da MTV no Brasil, onde a revista abordava basicamente artistas internacionais.
Essa mudança para valorizar mais artistas nacionais foi bastante acentuada em 1993,
com a capa “A Nova Cara da Música Pop Brasileira”, fazendo uma alusão à sigla MPB
– Música Popular Brasileira. Nessa mesma fase, percebi que a revista acentuou ainda
mais em sua linha editorial o seu caráter opinativo, típico de revistas de rock e outros
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produtos jornalísticos culturais, e a liberdade de expressão de seus jornalistas era
bastante notada, a ponto de criticarem até mesmo bandas dos próprios colegas de
redação.
Acredito que a mudança mais radical foi a de outubro de 1995, em que a revista
Bizz passou a se chamar Showbizz e mudou o foco de seus leitores, passando de um
público mais adulto para um público mais jovem, usando uma linguagem adolescente.
Essa, a meu ver, foi a fase mais crítica da revista e ao mesmo tempo a mais lucrativa,
pois passou a ganhar muito com publicidade ao usar capaz grandes e coloridas, usar
várias páginas para publicidade e imagens de ensaios sensuais, usando pessoas
seminuas. A linguagem adolescente, fazendo piadinhas e matérias baseadas na vida
pessoal dos artistas, e pouca informação musical, eram uma das suas características
mais importantes.
No fim dos anos 90, a revista voltou com os textos mais informativos e retirou
de suas páginas os ensaios sensuais. Voltou a dar mais atenção a bandas nacionais e não
teve mais a linguagem direcionada ao público adolescente. Com o surgimento e
destaque de novos gêneros no país, a revista começou a dar atenção a esses novos
gêneros e não ficou específica ao gênero rock. Acredito que todas essas mudanças na
revista tiveram sua importância, nem que fosse para proporcionar uma certa diversidade
para um mesmo produto ao longo de cerca de duas décadas de duração.
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