Moda e Sustentabilidade – reuso de jeans para o desenvolvimento

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Moda e Sustentabilidade – reuso de jeans para o desenvolvimento
20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil
Moda e Sustentabilidade – reuso de jeans para o desenvolvimento de produtos
comerciais com valor agregado do Design
Santos Silva, C.M.1
1
Universidade Federal do Piauí – UFPI - Piauí – Brasil – 01534-020 – [email protected]
Resumo
O presente artigo resulta do estudo abordado na disciplina Design de Detalhes e
Acessórios à luz do Desenvolvimento Sustentável. A conscientização dos problemas
ambientais tem levado à orientação para novos comportamentos sociais. É premente a
necessidade de uma nova educação, com posturas dentro da nova ética: a
sustentabilidade. Assim, realizam-se projetos em diferentes âmbitos com o fim de
minimizar o impacto ambiental, e igualmente, na esfera da Moda. Não obstante, ser
paradoxal Moda no cenário da Sustentabilidade, aquela que é atrelada ao consumismo,
tem na sua produção elevadíssimo custo à natureza, como a utilização demasiada de
matérias-primas; elevado gasto energético na produção dos produtos; e a geração de
resíduos químicos e sólidos depositados no meio ambiente, contaminando-o, confirma a
discrepância das duas áreas. Contudo, uma pode favorecer a outra. Moda, enquanto
fenômeno exerce um poder de influência sobre a sociedade, portanto, pode ajudar a
manter a sustentabilidade em toda a sua dimensão e, moda, enquanto produto, necessita
dos alicerces da Sustentabilidade para fabricar produtos ecologicamente corretos,
ajudando dessa forma, uma postura mais consciente. Neste trabalho, o Design bem
projetado no reuso do jeans, vem tornar-se uma ferramenta de sustentabilidade. O Design
é um ‘agente transformador’, posto que tem um papel fundamental na transformação de
materiais em produtos. Do mesmo modo, ele tem o poder de transformar também os
valores de uma sociedade, pois além de determinar funções estéticas, determina também
funções simbólicas, quer seja em produtos, quer seja em serviços ao tratar de novidades
que afetam o modo de vida dos consumidores. Logo, o Design dever contribuir para a
conscientização da sociedade voltada às questões ambientais ao projetar de forma a
minimizar os impactos ao ambiente, o que pode e deve acontecer através de objetos
concebidos com o propósito de tecer uma nova relação entre o homem e a natureza.
Palavras chaves: Design de acessórios, jeans, Moda e Sustentabilidade.
Abstract
This present article results from a study approached in the discipline Details and
Accessories Design enlightened by the Sustainable Development. The awareness on
environmental problems has brought guidance to new social behaviors. It is pressing the
need of a new education, with postures according to the new ethic: the sustainability. This
way, projects are made in different ambits on purpose to minimize the environmental
impact, and also, in the sphere of Fashion. Nevertheless, it is paradoxal Fashion on the
sustainability scenery, the one which is linked to the consumption has on its own
production really high costs on the environment, with the overuse of raw material, high
energetic cost on the products manufacturing; and the generation of chemical residues
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and solids laid up on the environment, infecting it, confirms the discrepancy of both areas.
However, they can be supported by one another. Fashion, as a phenomenon has a great
influential power on society, thus, it can help to keep the sustainability in all of its
dimension and, fashion, as a product, needs the foundation given by Sustainability to
make products in a right ecologically manner, helping to develop a more aware manner. In
this paper, the well-projected Design on the reuse of jeans turns itself in a tool of
sustainability. The Design is a changing agent, once it has a major role on the
transformation of materials into products. On the same way, it also has the power to
transform the values of a society, besides setting aesthetic functions, it also sets
symbolical functions, either on products or on services when it comes to deal with news
that have an effect on the consumers lifestyle. Soon, the Design should contribute on
warning the society about environmental questions on projecting a way to minimize the
impacts on the environment, what can and must happen through the conceived objects on
purpose to create a new relation between men and the nature.
Keywords: Accessories Design, Jeans, Fashion and Sustainability.
Introdução
Moda e Sustentabilidade - tema que, dado o seu caráter paradoxal na relação
desenvolvimento versus meio ambiente, torna-se instigante e faz da pesquisa uma
condição indeclinável na perspectiva do bom equilíbrio desse binômio; exatamente por
ser paradoxal, desafia a busca de convergência entre os campos, no contexto sócioeconômico.
Moda1, tem na sua lógica, a novidade e a obsolescência planejada e o incentivo
ao consumismo. Para produzir moda 2 faz-se necessário retirar da natureza praticamente
toda a matéria-prima para a frabricação de seu produtos, que rapidamente são
descartados e, quando dos processos de manufatura, consome-se elevada quantidade
de energia e descarta-se severas doses de químicos poluindo o meio ambiente. Desse
forma, a moda agride a natureza em todo o seu processo de produção. Portanto,
produzi-la nos moldes atuais é tudo que a sustentabilidade condena. No entanto, a
sustentabilidade deve servir de base com seus fundamentos para ajudar na produção
desses arterfatos de maneira menos danosa, pois o ser humano não vai deixar de
consumir moda3. Aqui, enveredar-se-ia por outras esferas do conhecimento, onde os
campos da Psicologia, Sociologia, Semiótica, dentre outros, trabalham e argurmentam a
1
Grifo nosso - Moda – com eme maiúsculo nos referimos ao fenômeno de comportamento.
Grifo nosso - moda – com eme minúsculo nos referimos aos produtos: artefactos que podem ser vestuário e seus
acessórios (bolsas, sapatos, joias, adornos em geral).
3
Grifo nosso.
2
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‘necessidade’ de Moda/moda para a individuação4 dos sujeitos.
A moda diz respeito a uma questão essencial para nossos
contemporâneos, talvez a mais essencial de todas: a sua identidade.
Sendo assim, interpretar este fenômeno como sinal suplementar do
materialismo do Ocidente apenas leva a torná-lo incompreensível.5
Todavia, esse conteúdo não é o objetivo deste trabalho, mas que pode explicar o
porquê do consumo exagerado de moda.
O
consumo
é essencial à vida. Necessitamos de alimentação, habitação,
saneamento, instrução, energia, dentre outros, para que possamos “gozar de dignidade,
auto-estima, respeito e outros valores fundamentais.” 6 Portanto, o consumo faz parte
crescimento, do progresso de cada ser humano.
O consumo contribui claramente para o desenvolvimento humano, quando
aumenta suas capacidades, sem afetar adversamente o bem-estar
coletivo, quando é tão favorável para as gerações futuras como para as
presentes, quando respeita a capacidade de suporte do planeta e quando
encoraja a emergência de comunidades dinâmicas e criativas .7
A compreensão do consumo na contemporâneidade está longe de ser alcançada.
Existe uma desigualdade muito grande entre as nações, em que, países desenvolvidos
“equivalente a 20% da população mundial, totalizam 86% das despesas de consumo
privado, e os 20% mais pobres, um minúsculo 1,3%%.” 8 Ainda sobre os países, a título
de exemplo, “o quinto mais rico da população consome 45% de toda a carne e peixe (o
quinto mais pobre, 5%). O quinto mais rico […] “tem 74% de todas as linhas telefônicas
(o quinto mais pobre 1,5%)9, […] e “possui 87% da frota de veículos a nível mundial (o
quinto mais pobre, menos de 1%).” 10 Ademais, os efeitos da globalização, com razoável
nível de aceitabilidade, tem contribuido para a:
4
Individuação é o termo que Carl Jung criou para designar o processo de autoconscientização e auto-realização do
indivíduo no sentido do conhecimento do seu verdadeiro eu e da concretização da personalidade total. Individuar-se
significa completar-se, tornar-se uno e inteiro, sem divisões internas, um “indivíduo”, unido em si mesmo e com toda a
humanidade. Um processo holístico por natureza, tão inerente à espécie e tão importante que pode-se dizer que o
futuro da humanidade depende directamente da quantidade de pessoas que conseguirem individuar-se. (SANTOS
SILVA, 2009, p. 3).
5
ERNER, 2005 apud BERLIM, 2010, p. 26.
6
FELDMANN, 2008, apud TRIGUEIRO, 2008, p. 148.
7
Relatório de Desenvolvimento Humano/PNUD, 1999. P.38 apud TRIGUEIRO, 2008, p.148.
8
Ibid., p. 148.
9
Ibid., p. 148.
10
Ibid., p. 148.
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“universalização”11 de estilos de vida, cartacterizada pela fixação de uma
cultura baseada em pesquisa de mercado, que se concretiza através de
objetos como vídeos, músicas, automóveis, jeans, enfim toda uma
parafernália voltada para atender desejos e necessidades criados por uma
sociedade que depende dessa economia para continuar existindo
(FELDMAN, 2008, apud TRIGUEIRO, 2008, p. 148-149).
Isto só evidencia o quão complexo é o consumo na pós-modernidade. Aliás,
complexidade é um termo que pode ser usado também para ajudar na compreensão do
fenômeno Moda e da dimensão de Sustentabilidade. Nessas esferas antagônicas
encontramos algo em comum, o termo complexo, que será abordado mais adiante, sob a
perspectiva do filósofo e sociólogo Edgar Morin.
Na mesma direção de complexidade, podemos incluir um produto que é tão
‘querido’ pelo consumidor contemporâneo: o jeans. Este, é o produto do vestuário de
moda mais hegemônico dos últimos tempos, sua permanência já dura mais de 150 anos.
Sua capacidade de se reiventar vem confirmar esta supremacia de tal maneira que
nenhum outro produto conseguiu sobreviver às diversas mudanças de estilos e
socioculturais. Como infere Catoira (2007), o jeans, é uma roupa que vai além da moda,
“ultrapassa a idade, a religião, a sociedade, a cultura sem perder a função original de
cobrir o corpo.”12 Como artigo de consumo, o jeans, tem grande aceitação no mercado,
visto que veste todos os segmentos – feminino, masculino e infantil, como também,
todas as classes sociais. Sem distinção de classe e de gênero, é considerado um
produto democrático, pois veste da massa à elite e, ainda, vai além das fronteiras do
vestuário visto que a sua matéria-prima, o denim, também é utilizado na fabricação de
acessórios tais quais: bolsas, calçados, joias, como também, na decoração de interiores,
dentre outros.
É importante esclarecer que, jeans13 são peças confecionadas a partir do tecido
denim14. Este, tem o fio urdume na cor azul intenso, tinto com o corante índigo 15 e sua
trama é de algodão na cor natural, o que o caracteriza muito bem, distinguindo o direito
do tecido que é sempre mais escuro do que o avesso. O corante índigo não tem boa
afinidade quando do tingimento dos fios, pois tem baixa solidez quando exposto à luz e
ao atrito, por isto desbota facilmente. Em geral, o padrão do tecido é em sarja, mas
11
Grifo do autor
CATOIRA, 2006, p. 11.
13
Jeans – acredita-se que se trata do sotaque francês para o nome - Genoese ou Genes - calças dos marinheiros
italianos da cidade Genova (SANTOS SILVA, 2009, p. 66).
14
Denim – significa a corruptela de Serge De + Nimes – cidade francesa cujo tecido vestia os marinhos de Gênova .
Ibid., p. 66.
15
Índigo - Corante a partir de plantas orientais – Indigosfera e Isati tinctoris. Sintetizado pela BASF desde 1897. Ibid.,
p. 66.
12
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pode ser fabricado em outras variedades, tela e seus derivados, entre outras
padronagens de tecido plano. Sua gramatura é dada em oz - onças16 . Existem várias
gramaturas, porém a mais comercial é 12oz para calças podendo ir até 14oz. O tecido
em geral é 100% CO, pode também apresentar-se com fibra elastômera – de 1% a 2%,
muito aceito pelo mercado, é possível vir na sua composição fibra de poliéster ou
poliamida, além de fibra de lyocell17 e de seda.
A grande aceitação do jeans, por um público bem diversificado, legitima a
quantidade de metros fabricados pelas indústrias têxteis brasileiras que coloca o “Brasil
como 2º produtor e 3º consumidor”18 no ranking mundial do tecido denim, sua matériaprima. Esse fato se deve a “nossa produção de algodão, que é, em média, de 1,5 milhão
de toneladas anuais.”19 Como nos informa Vera Santiago e Nathália Chanton (2014), da
ADS Comunicação Corporativa, o jeans, é uma peça-chave em qualquer guarda-roupa,
pois permite ínumeras combinações e se faz presente durante todo o ano na tendência
de moda de qualquer estação. As autoras nos informa que o jeans:
É o segmento que mais cresceu dentre todos os artigos de vestuário
produzidos no país, nos últimos anos. De 2008 a 2012 a produção de
jeanswear no Brasil apresentou forte crescimento em volumes de peças
confeccionadas, em ritmo superior a 6% ao ano, o que gerou expansão
acumulada de 27% no período. “A partir desses dados foi possível concluir
que esse crescimento superou a expansão da produção de vestuário em
geral no País, que acumulou, no mesmo período, expansão acumulada de
4,1% em peças, ou 1% ao ano”, afirma Marcelo Prado, diretor do Instituto
de Estudos e Marketing Industrial (IEMI), especializado em pesquisas e
análises do setor têxtil e de vestuário, que acaba de lançar um estudo
inédito sobre o jeanswear intitulado “Estudo do Mercado Potencial de
Jeanswear no Brasil.20
Com efeito, o jeans é um produto perene, transitou por vários segmentos nos
quatro cantos do mundo. Começou sua trajetória pelas minas de ouro estadunidenses,
como roupa de trabalho, em 1853. No século XX, vestiu vaqueiros, ferroviários, dentre
outros trabalhadores. Foi roupa de artistas e intelectuais, foi símbolo de rebeldia vestindo
os manifestantes da contracultura. Tornou-se uniforme da ideologia ‘paz e amor’, vestiu
16
OZ - lê-se onças (do italiano onzas) – peso de medida inglesa equivalente a 28,34 gramas. 1m2 de denim 12 oz =
28,34X12 resulta em 340,08 g. (OLIVEIRA, 2008, p.24).
17
Lyocell – fibra artificial fabricada a partir de madeira reflorestada. Utiliza químico biodegrdável.
18
BERLIM, 2010, p. 28.
Ibid., p.28.
Instituto de Estudos e Marketing Industrial (IEMI).
19
20
http://www.maxpressnet.com.br/Conteudo/1,629183,IEMI_lanca_estudo_com_dados_ineditos_do_segmento_de_je
answear_no_Brasil_,629183,5.htm Acesso 24.10.13.
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várias tribos, as massas, chefes de Estado. Subiu às passarelas, adornou a nobreza e,
inclusive, a realeza.
Mesmo com uma aparência de “uniforme”, o jeans, tem o seu espaço
garantido nos guarda-fatos, pois essa peça de roupa carrega uma
simbologia, é um signo. O jeans, actualmente, é mais que um produto, é
uma cultura, é identidade, é sinónimo de juventude. A sua versatilidade é
incólume, visto que ele está presente em vários ambientes ao vestir as
pessoas em vários estilos. É democrático, veste todas as raças, de todos
os credos. Nasceu na cultura ocidental, mas muitos jovens da cultura
oriental já o adoptaram com a mesma paixão que os ocidentais. Portanto, é
cosmopolita, pois sua “linguagem” é universal (SANTOS SILVA, 2009,
p.68).
Não obstante a grande aceitação pelo mercado consumidor, a fabricação do
produto jeans passa por um grande fluxo produtivo o qual é bastante agressivo ao meio
ambiente, o que justifica a reutilização desse produto.
Problema de Pesquisa e Objetivo
Desde a sua matéria-prima - o tecido denim, os artigos jeans, perfazem um longo
caminho até a sua cormercialização. Segundo Kazaziam (2005, p. 61), cerca de 65 mil
quilômetros21 são percorridos na obtenção dos componentes para a confecção de uma
calça jeans até o dia de sua venda, gerando poluição local em cada uma das etapas de
sua fabricação. “Assim, em Tsumeb, na Namíbia, a extração do cobre que serve à
fabricação dos rebites é realizada em condições tão deploráveis que provoca uma
acidificação por doenças respiratórias.”
Importa informar que tanto a extração de matéria-prima, quanto ao uso da mão de
obra em países em desenvolvimento é feito de forma insustentável - explorando a
natureza de forma injusta, quer seja nos recursos naturais, quer seja na utilização do
capital humano, na qual
se dá de maneira análoga à escrava (BERLIM, 2010;
FLETCHER, 2011; LEE, 2009).
O panorama do trabalho em subcondições no Brasil é dramático. Embora
ainda não figuremos nas pesquisas, vem crescendo a localização de
pequena e médias confecções movidas por trabalhadores emigrantes
(colombianos, chilenos e chineses) trabalhando em subcondições e sem
21
1. Benim - Cultura do algodão para os fios/tecido; 2. Alemanha - fabricação do corante índigo; 3. Irlanda do Norte - fabricação do
fio; 4. Espanha - tintura do fio; 5. Itália - fabricação do tecido; 6. França - produção de fitas em fibras de poliéster para os zíperes; 7.
Japão - material metálico paras os zíperes e fibra de poliéster para o fio; 8. Paquistão - cultura de algodão para os bolsos; 9.Tunísia confecção das calças jeans; 10. Turquia - pedra-pomes vulcânica utilizada nos desbote da cor; 11. Namíbia - cobre para os rebites e
botões; 12. Austrália - zinco para os rebites e botões; 13. Inglaterra - venda dos jeans.
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nenhum contrato legal de trabalho.22
Ante o exposto, o presente trabalho tem como principal objetivo apresentar
produtos de moda estritamente comerciais desenvolvidos a partir do reaproveitamento
de peças jeans obsoletas.
Revisão Bibliográfica
As catástofes ambientais jamais foram tão difundidas. Percebemos que desde o
início do século, o mundo vem passando por um importante processo de reorganização
e, as questões ambientais têm sido o escopo, o foco da atenções. Preocupados com o
caos em que o planeta se encontra, os povos, por meio de algumas ações/medidas
tentam resgatar a relação da sociedade com a natureza. Estamos em plena Era
Planetária – “onde tudo deve contribuir à formação da consciência humanista e ética de
pertencer à humanidade, que deve ser completada pela consciência do caracter de
matriz que tem a Terra para a vida e, por sua vez, daquele que tem a vida para a
humanidade.”23
Entretanto, as inquietações com as questões ambientais vêm de longe. Logo após
a 2ª Grande Guerra, a Humanidade mostrou a preocupação com a sua capacidade
tecno-científica destrutiva ao usar a bomba atômica no ataque às cidades de Hiroshima
(66 mil mortos) e Nagasaki (39 mil mortos).24
De forma crítica, bem enfatizada para a época, as catástrofes ambientais foram
anunciadas ainda na década de 50, onde se deu o processo de tomada de consciência
ecológica com o caso na cidade de Minamata no Japão, que após a instalação da
indústria Chisso Corporation, a baía foi envenenada. “A fábrica continuou poluindo,
matando e deformando gente e animais por mais de dez anos.” 25 O lançamento dos
livros The Limits of the Earth, de autoria de Osbon em 1953 e, Spring Silent, da bióloga
Rachel Carson, em 1962, fazem um alerta sobre “crescimento populacional e
contaminação química da água e do solo,”26 repectivamente. Entre numerosos outros
22
23
24
25
26
BERLIM, 2010, p. 30.
MORIN, 2007, p. 20.
BERNARDES E FERREIRA, 2007 apud CUNHA E GUERRA, 2007, p. 30.
Ibid., p. 30.
CUNHA E GUERRA, 2007 apud SANTOS DA SILVA E SILVA AGUIAR, 2013, p.2.
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casos ocorridos, não menos importante, surgiram várias ações 27 que resultaram em
diversos documentos28 no sentido de alertarem às autoridades/chefes de Estado para a
situação caótica em que a Humanidade estava imergindo. A começar pelo documento do
Clube de Roma:
A preocupação inicial com a questão ambiental dizia a respeito a um
possível esgotamento futuro dos recursos naturais disponíveis para o
crescimento econômico, mas a dinâmica da econômia, que aumentou a
eficiência do uso e na prospecção dos recursos naturais, inclusive
reduzindo o seu preço, dasautorizou previssões pessimistas como as
feitas pelo Clube de Roma (BERSSEMAN, 2008 apud TRIGUEIRO, 2008,
p. 93).
No entanto, foi desde a Revolução Industrial, que a relação do homem com a
natureza, transformou-se em uma relação predatória e de submissão sem precedentes.
Cabe registrar que, mas precisamente, partiu das sociedades ocidentais –“sociedade
capitalista, urbana, financeira, industrial, globalizada – em seu projeto de mundo baseado
em um modelo desenvolvimentista.”29
A natureza que outrora fora respeitada, reverenciada, passou a ser explorada de
forma brutal. E hoje, a Humanidade vê-se na condição de ‘algoz’ da própria existência.
Tudo em nome da ciência, do conhecimento, do poder. Ainda em “1627, no romance
intitulado Nova Atlântida, Francis Bacon, filósofo e chanceler da corte da Inglaterra,
concebe o primeiro manifesto moderno para uma organização e socialização da
ciência”30. O desejo de conhecer os mistérios da natureza, o porque das causas fez o
homem avançar de forma violenta contra àquela que lhe dá sustento, que lhe permite a
vida. Mas, a filosofia da época era investir em busca do saber. O pensamento naquele
tempo era: “a ciência pode e deve ser organizada e aplicada à indústria para melhorar e
transformar as condições de vida”31 e agiam com hostilidade e dominação. Para Bacon,
a “natureza devia ser “perseguida em seus erros”32 e impôs a seguinte meta aos sábios,
estes deveriam: “arrancar dela seus segredos, pela tortura se necessário.” 33
Consequentemente, as sociedade ocidentais investiram em busca de atingir o seu
27
Comissões – Comisão Brundtland, Comissão de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas; Conferências –
Conferência de Estocolmo, Cúpula de Joanesburgo, Comitês e Convenão de Viena, dentre outros.
28
Relatórios, Dossiês que originaram as Agendas – Agenda 21 – Nacional e Local; Agenda Azul, Marron e Verde;
Carta da Terra, dentre outros.
29
GUIMARÃES, 2007 apud SANTOS DA SILVA e SILVA AGUIAR, 2013, p. 6.
30
KAZAZIAN, 2005, p. 12.
31
Ibid., p. 12.
32
Ibid., p. 12.
33
Ibid., p. 12.
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fim. E obtiveram êxitos, muitos inventos, grandes descobertas, mas quase que,
literalmente, estamos chegando ao fim – várias castástrofes assolaram e continuam a
assolar à Terra, com isto, perderam-se muitas vidas humanas e de outras espécies tanto da fauna, quanto da flora; vários recursos naturais entraram em esgotamento,
sabendo-se que alguns já se esgotaram, inclusive, espécies que jamais foram
conhecidas/catalogadas. Assim, uma destruição irreparável do patrimônio natural em
busca de conhecimento e poder sem se dar conta das questões relacionadas ao meio
ambiente - perda da biodiversidade, crescimento econômico desigual nos países do norte
em relação aos países do sul, onde a pobreza extrema é alarmante, muitos sobrevivendo
em condição sub-humana.
Com relação à crise de biodiversidade, a situação ainda é mais grave. O
desaparecimento de espécies nos afeta não só pela perda irreversível de
recursos para a medicina, agricultura, etc., mas, principalmente, porque
ignoramos a profundidade dos desequilíbrios ecológicos que poderão
surgir frente à extinsão em massa de espécies que está em andamento.
Considerando a gravidade da ameaça, é inaceitável a extensão da nossa
ignorância atual. 34
O crescimento/conhecimento e o poder vieram a um preço bastante elevado.
Admitamos que tanto a Ciência, quanto a Tecnologia, sem querer condená-las, foram as
‘ferramentas’35 do capitalismo, mola propulsora para nos colocar na situação atual.
Todavia, com tamanho conhecimendo adquirido, espera-se que seja possível que a
Ciência na busca do conhecimento e, a Tecnologia, na utilização/aplicação dessa
Ciência, ambas, possam juntas ajudar a minimizar os malefícios causados ao planeta.
Atualmente, as duas esferas obtiveram uma evolução sem igual, e hoje, as pesquisa têm
se voltado para a busca de soluções que ajudem o homem tirar proveito da natureza de
forma mais justa, sem explorá-la demasiadamente, Contudo, “controlar a produção daria
também uma nova legitimidade à ciência”36. Como muita propriedade, Ibsen Gusmão
Câmara, vice-almirante reformado, que se dedica aos estudos da natureza desde 1940,
presidente da Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação, entre outras atividades no
Ibama e CNPq voltadas ao meio ambiente, nos informa que:
A Tecnologia não é, em si, boa ou má; depende da utilização que dela se
faz. Tenho dito, com plena razão, que o homem é extremamente capaz de
34
35
36
BRESSERMAN, 2008 apud TRIGUEIRO, 2008, p. 96.
Grifo nosso.
MORIN, 2007, p. 126.
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imaginar e gerar novas tecnologias, mas pouco sábio em sua aplicação.
Esse pensamento sensato explica a existência de múltiplos problemas
ambientais do mundo atual (CÂMARA, 2008 apud TRIGUEIRO, 2008, p.
161).
A despeito de estarmos aprendendo a um custo alto, legado da ação antrópica,
escontramo-nos, hoje, em um processo civilizatório.
É premente o uso de uma
consciência crítica, inteligente, de saber fazer uso da razão e da sensibilidade para tomar
atitudes que minimizem e auxiliem a reverter alguns dos prejuízos causados por tamanha
ambição, porque apesar de ser assustador, é verdadeiro afirmar que as nossas decisões
do dia a dia37, podem estar compromentendo o futuro dos nossos filhos e netos, ao
decidirmos a simples aquisição de produtos, o meio de transporte, o tipo de lazer, umas
férias, dentre outras atividades habituais.
O ponto de inflexão está no fato de que o resultado da ação da
Humanidade, pela primeira vez, ameaça a sua condição de sobrevivância,
e ela se vê obrigada a reconhecer seus próprios limites e a sua
vulnerabilidade diante de uma realidade complexa, em relação à qual
possui uma inegável interdependência (FELDMANN, 2008 apud
TRIGUEIRO, 2008, p.146).
Eis aqui um instante de reflexão: “a crise que vivemos, enquanto Humanidade,
oferece uma oportunidade única de revisão de valores, de atitudes por ela praticados em
todos os momentos, desde os atos mais simples do cotidiano, nos quais o consumo se
insere.”38 Neste contexto, praticamente em todas as áreas de conhecimento, estão sendo
desenvolvidas pesquisas e, tem se usado de esforços com o intuito de buscar a
sustentabilidade do planeta.
Amplamente propagada no mundo – no âmbito acadêmico, institucional e, na
mídia,
a sustentabilidade, nos últimos anos, tem protagonizado diferentes papéis e
servido a interesses diversos. “Por ser um vocábulo polissêmico, tem se prestado a
inspirar discursos políticos e ocupado o centro de debates envolvendo as mais distintas
áreas do conhecimento.”39 Sustentabilidade e Desenvolvimento Sustentável são termos
comumente utilizados nos dias de hoje, e algumas vezes até confundidos. Entretanto, é
oportuno esclarecer que conforme Silva e Mendes (2005) apud Santos Silva e Silva
Aguiar (2013, p. 8) que:
37
Grifo nosso - significa dia após dia. Contudo, poderíamos usar também a expressão hifenizada dia-a-dia que
equivale ao cotidiano, visto que devemos nos preocupar com as atitudes do cotidiano dia após dia.
38
FELDMAN, 2008 apud TRIGUEIRO, 2008, p. 156-157.
39
OMENA, SOUZA, SOARES, 2012 apud BITENCOURT, ALMEIDA E OMENA, 2012, p. 19.
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A relação entre sustentabilidade e desenvolvimento sustentável não é
exatamente sinônima, porém, formada por um processo e um fim, no qual
o primeiro consiste no desenvolvimento sustentável e, o segundo, na
sustentabilidade. Para eles o desenvolvimento diz respeito ao modo como
determinada atividade é realizada, ao meio que será utilizado, de forma a
alcançar um determinado fim ou objetivo, a sustentabilidade.
Nesse sentido,
para se alcançar a sustentabilidade faz-se necessário
desenvolver-se de forma sustentável.
envolve a questão temporal,
No entanto, “o conceito de sustentabilidade
pois a sustentabilidade de um sistema só pode ser
observada a partir da perspectiva futura, de ameaças e oportunidades.” 40
Cabe registrar que o termo sustentabilidade envolve dimensões como “social,
cultural, ecológica, ambiental, territorial, econômica, política (nacional e internacional)” 41
“e institucional, entre outras. A sustentabilidade deve ser vislumbrada sob uma
perspectiva sistêmica e interdependente,”42 conquanto, “poucos de nós tem noção da
interdependência entre os nossos hábitos cotidianos e os recursos planetários.” 43 A
exemplo, entre muitos outros que ocorrem na área da Moda, citamos um evento para
ilustrar essa interdependência e as graves consequências que o desequilíbrio de um
sistema pode acarretar. Trata-se do uso das penas púrpuras da Íbis, uma ave pernalta do
vale do Nilo, ocorrido na Belle Époque:
Para seguir a moda, os chapeleiros se entusiasmam com as penas
púrpuras de reflexos ondulados da Íbis. Naturalmente ignoram que esse
pássaro pertence uma cadeia alimentar que existe há muito tempo: a Íbis
se alimenta de pequenos répteis, cuja a alimentação é composta por
batráquios que, por sua vez, comen gafanhotos. Certamente, eles não
imaginam que querendo satisfazer a mania fulgaz da capital francesa por
essas penas vermelhas, vão acabar provocando fome no Egito. E de fato.
Com a perseguuição da Íbis, cresce a população de répteis. Os répteis
devoram as rãs, deixando os gafanhotos sem predador: os insentos vão
destruir as culturas de cereais e espalhar a miséria entre os camponeses
(KAZAZIAN, 2009, p. 10).
Para compreender a dimensão ecológica, desenvolvimento sustentável e
sustentabilidade, devemos entender que nós somos parte da natureza e que todos os
seres estão interligados como em um grande organismo. É preciso perceber, alcançar
essa dimessão de interdependência, para assim podermos reavaliar nossas atitudes,
nossos valores e estilos de vida e, dessa forma, conseguir interagir em equilíbrio com o
ambiente, pois as questões ambientais são constituídas de realidades complexas.
40
41
42
43
BITTENCOURT, CARVALHO, BISPO, 2012 apud BITENCOURT, ALMEIDA, OMENA, 2012, p. 42.
SACHS, 2008, p. 87.
OMENA, SOUZA, SOARES, 2012 apud BITENCOURT, ALMEIDA, OMENA, 2012, p. 19-20.
FELDMANN, 2008 apud TRIGUEIRO, 2008, p. 152.
20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil
Morin (2007), defendendo a teoria da complexidade, nos ensina que o pensamento
complexo é constituído de interconecções. Este novo paradigma tem a propriedade de
religar partes que pareçam distintas, interliga-las para a compreensão do total, para
“perceber o complexus – o tecido que junta o todo.”44 Segundo o autor, a Ciência criou
uma metodologia fragmentária, decompondo a realidade em campos de estudos e,
assim, fomos educados aprendendo a separar, a isolar as coisas. “A problemática
ambiental tem a particularidade de ser tão ampla, e seus elementos estrarem tão
interconectados, que sua delimitação se torna difícil.”45 Assim, “nada existe fora da
relação. Tudo se relaciona com tudo em todos os pontos.”46 Por conseguinte, o
pensamento complexo defende a interconexão, de forma não linear, mas cíclica homem-sociedade-natureza.
Nesse contexto, em total consonância com o pensamento complexo, o Design,
cujo
campo
trabalha
multidisciplinaridade e
numa
lógica
de:
complexidade,
transversalidade,
interdisciplinaridade, tem competência para atuar de forma
especial/sublime/justa, para contribuir com a sustentabilidade no desenvolvimento de
novos produtos a partir do reaproveitamento de peças jeans.
“Design is when designers design a design for the production of a design.”47 O
Design, enquanto área, pode ser definido com uma atividade projetual na qual planeja e
desenvolve produtos, processos e/ou serviços. Ou seja, determina as propriedades
formais dos objetos, ou sequências de ações operacionais no caso de processos e/ou
serviços. Design é também a configuração do produto, equivale ao resultado do projeto
ainda em nível de instruções, aquilo que é entregue à produção tais quais: desenhos,
modelos e protótipos. “É a própria estrutura, a composição de formas, cores, materiais e
superfícies.”48 Aqui temos as funções estéticas e as simbólicas.”49 E, design também
refere-se ao produto.
“Tanto o design quanto a moda atuam na relação entre as esferas do objetivo e do
subjetivo. Essas esferas contêm níveis diferenciados de complexidade conforme cada
projeto e proposta e compõem a linguagem que constitui esses campos. ”50 Autores como
Barthes (1999), Lobach (2000), Escorel (2004), dentre outros, “que refletem e discutem
44
MORIN, 1997, apud GUIMARÃES, 2007, p. 99.
FOLADORI, 1999 apud GUIMARÃES, 2007, p. 96.
46
BOFF, 2000 apud GUIMARÃES, 2007, p. 88.
47
Design é quando designers projetam (1) um design (2) para a produção de um design (3). Sendo: (1) = Projeto; (2) =
configuração do produto e (3) = produto – resultado da produção (MAGALHÃES, 2000, p17, 18, 19, 21).
48
MAGALHÃES, 2000, p. 19.
49
LOBACH, 2000, p. 64.
50
MOURA e CASTILHO, 2012, p 10-11.
45
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design concordam que este campo se estabelece como linguagem, e seus objetos, sejam
produtos informacionais ou de uso, são produções de linguagem.” 51
Conforme Moura e Castilho (2012, p. 10-11), a linguagem que constitui as áreas Moda e Design são:
1. Conceituais e referenciais: mote ou partido projetual (interferências
criativas); 2. Objetivas, verbo-visuais, formais, estéticas, espaciais; 3.
Funcionais, multifuncionalidade, acessibilidade, customização; 4. Bio
fisiológicas: relação com o corpo, sinestesia entre sujeito e objeto,
ergonomia; 5. Psicológicas: subjetividades, construção de identidades,
emoção; 6. Sociológicas: sistemas políticos, econômicos e simbólicos
(interferências
contextuais);7.Ideológicas:
culturais,
filosóficas
(interferências contextuais); 8.Tecnológicas: sistemas produtivos,
materialidades; 9. Mercadológicas: sistemas de comercialização e
consumo.
Como se verifica, a partir das linguagens supracitadas, “o Design
denota
preocupação com a qualidade de nossas vidas hoje, e amanhã, pois trabalha pensando
no ambiente dos anos futuros”52 e, […] “os produtos resultado do design dão forma a
cultura material e imaterial, influenciam no nosso ambiente e nosso cotidiano.” 53 Portanto,
o Design interliga o objeto, o homem e o ambiente.
Nesse contexto, o Design vem como proposta para agregar valor na reutilização
de peças jeans “pós-consumo”54 que irão para o descarte. “É nessa altura que o designer
se distingue, porque seu papel pode ser transversal, integrador e dinâmico entre ecologia
e concepção de produtos, inovações econômicas e tecnológicas, necessidades e novos
hábitos.”55 Como enfatiza Kotler (2006) apud Santos Silva (2009, p. 65), “a inovação
baseada no design multiplica o público-alvo de um determinado produto ou serviço ao
atrair compradores sensíveis a novos estilos e diferentes posicionamentos”. Isto, pode
ser visto como a mais-valia do Design para o Desenvolvimento Sustentável.
No nosso projeto, o Design foi utilizado para o desenvolvimento de acessórios de
moda de cunho comercial, tais quais: bolsas, calçados, roupas, bijuteirias, dentre outros,
produzidos a partir de peças jeans em desuso.
51
52
53
54
55
Ibid., p. 10.
FIELL, & FIELL, 2005 apud SILVA, 2009. p. 65.
Ibid., p. 65.
Termo usado pelo autores MANZINI E VEZOLLI, 2008, p.94, explicando o Ciclo de Vida do Sistema Produto.
KAZAZIAN, 2005, p.27.
20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil
Metodologia
Inicialmente valeu-se de pesquisa bibliográfica para conhecer e compreender os
problemas da questão ambiental e, dessa forma, poder contribuir com desenvolvimento
sustentável. Posteriormente, definiu-se pela reutilização de peças de jeans fora de uso,
que iriam para o descarte. A escolha pelo jeans se deu por esse produto ser desejado por
um público abrangente, mas que tem na sua fabricação um forte agravante ambiental.
Assim, a reutilização vem aumentar a vida útil do jeans. Colocando-nos na fase de
descarte dentro do Life Cycle Design defendido por Manzini e Vezolli (2008), o designer
é responsável por encontrar solução para tornar cíclico o desenvolvimento de produto.
Na
sequência
utilizamo-nos
da
metodologia
de
Baxter(2000),
para
o
desenvolvimento de projeto. O autor nos ensina que devemos seguir as etapas:
identificação da oportunidade, projeto conceitual, geração de ideias, idealização e
modelo.
Na Identificação da Oportunidade – definimos por desenvolver um produto a partir
do reaproveitamento, mas um produto estritamente comercial com valor agregado do
Design, primando pelo conforto psicológico, ergonômico e tátil. No Projeto Conceitual –
defendemos o design ético, buscando atender a necessidade de um consumidor
consciente preocupado com a questão ambiental. O projeto foi individual, assim, a fase
de Geração de Ideias, demandou mais tempo por ter orientação particular. A partir das
ideias do aluno é que fomos direcionando-o a um caminho de acertos. Foi uma etapa de
muitas descobertas – possibilidades e impossibilidades, o que a tornou muito rica,
prazerosa e de muitas expectativas. Na fase da Idealização definimos então o shape do
produto (após a pesquisa de tendências), em função dos materiais – da quantidade de
jeans e outros tipos de tecidos e aviamentos para agregar valor, tais quais: renda, couro,
miçangas,
metais,
zíperes,
dentre
outros. A etapa
final,
Modelo,
deu-se
à
confecção/fabricação do produto.
É oportuno enfatizar que a criação foi do aluno, mas a fabricação foi feita em
centros de produção56, em função tanto do tipo de produto, sejam eles: bolsas - Fig.1 e
Fig. 2; calçados – Fig.3; bijuterias – Fig.4; acessórios e roupa, quanto do tipo de
matérias-primas,
ambos,
exigem
equipamentos
específicos.
Contudo,
o
aluno
acompanhou todo o processo de fabricação, interveio quando houve necessidade de
tomar alguma decisão e, registrou todas as etapas dessa produção.
56
Grupos de pequenos fabricantes unidos por meio de Associações.
20 a 22 de maio de 2014 – São Paulo - Brasil
Fig.1-Bolsa em jeans estonado bordada com miçangas
Fonte: Acervo Autora
Fig. 3 – Calçado jeans couro e strasses
Fonte: Acervo Autora
Fig. 2 - Bolsa em jeans escuro, renda e couro
Fonte: Acervo Autora
Fig. 4 - Bijuterias jeans com detalhes dourados
Fonte: Acervo Autora
Análise dos Resultados
Discutir o tema sustentabilidade de forma atraente com o nosso aluno, além de
desafiador é também muito interessante, sobretudo, esse aluno que ainda não chegou à
disciplina de Ecodesign, que no nosso curso é ulterior e aborda mais enfaticamente
conteúdos sobre o ambiente.
A nosso favor, no início do semestre, tivemos na universidade uma excelente
exposição intinerante da Fiocruz entitulada Nós no Mundo. Este momento de visita à
exposição ajudou a sensibilizar os alunos acerca do problema ambiental, fazendo com
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que eles manifestassem bastante interesse no nosso projeto. Esboçaram muito
contentamento quando da escolha do jeans como matéria-prima, declarando o título da
futura exposição de seus produtos - We love jeans. O que vem fortalecer o jeans como
produto ‘querido’ e muito bem aceito pela cultura jovem. O jeans foi emblemático nesse
projeto, pois ele fora ícone da cultura hippie nos anos 60/70. E, os hippies eram
verdadeiros amantes da natureza, pregavam paz e amor ao universo.
Quando da apresentação dos projetos, foi unânime o sentimento e os depoimentos
dos alunos de poderem contribuir para o reaproveitamento de materiais alternativos no
desenvolvimento de novos produtos de moda. Houve um misto de emoção e satisfação.
Eles sentiram-se vaidosos e confiantes com a capacidade de criar produtos funcionais,
estéticos, emocionais e simbólicos.
Outro ganho, também muito importante foi a ‘afinação do discurso’ 57 dos alunos
com o grupo de produção. Para que se consiga desenvolver produtos com eficência e
eficácia, faz-se necessária a coesão da equipe. Nos processos de fabricação existem
sempre dificuldades atreladas às técnicas. É preciso ter experiência para tomar a decisão
certa e não inviabilizar a produção. Participando do processo de fabricação, os nossos
alunos puderam vivênciar o chão de fábrica e tomar decisões pontuais; experiência rica
que agregará valor à futura profissão.
Conclusão
No que concerne à Moda, o Brasil, é um país privilegiado em vários aspectos. Em
aproximadamente 200 anos conseguimos possuir um parque industrial têxtil considerado
um dos melhores no ranking mundial. Assim, nos colocamos na posição do quarto maior
parque industrial de confecção têxtil do mundo. No Ocidente, somos o único país que
possui a cadeia têxtil completa e, ainda, somos o segundo produtor e terceiro consumidor
de jeans. É sabido que a indústria têxtil é considerada a terceira indústria, na geração de
emprego e renda, fator de grande relevância econômica. Ademais, temos o maior número
de Escolas de Moda do mundo. Somos um país de dimensão continental, com grande
diversidade cultural. Podemos usufruir de todo esse privilégio desenvolvendo produtos de
forma justa/correta carregados de valores culturais.
Para tanto, faz-se necessário trabalhar a Educação Ambiental de forma mais
enfática nos nossos cursos de Moda. Esta, que tem grande poder de expressão e
57
Grifo nosso.
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difusão, deve contribuir para a ampliação de informação e consciência das pessoas,
na medida em que se coloca no mercado produtos com intensa carga de conteúdos
simbólicos dentro da nova ética: a sustentabilidade. É premente usar a Moda para a
disseminação de novos valores, certamente, ela pode ajudar na expansão da consciência
ambiental.
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