Entrada messiânica em Jerusalém – Mt 21,1-17

Transcrição

Entrada messiânica em Jerusalém – Mt 21,1-17
Entrada messiânica em Jerusalém – Mt 21,1-17; Mc 11,1-11; Lc 19,28-38; Jo 12,12-16
1. Jerusalém, Jerusalém! / Seu rei está chegando! / Hosana, Jesus, hosana!
2. O rei tão esperado / que vem num jumentinho. / Hosana, Jesus, hosana!
3. O rei que traz justiça / a paz e alegria. / Hosana, Jesus, hosana!
4. Ó vai ao seu encontro / com ramos de palmeiras. / Hosana, Jesus, hosana!
5. O povo maravilhado / estende suas capas. / Hosana, Jesus, hosana!
6. Crianças com ramos / alegres vão cantando: / Hosana, Jesus, hosana!
7. Os fariseus irados / queixando vão ao Cristo. / Hosana, Jesus, hosana!
8. Não ouve as crianças? / Ó mande-as embora! / Hosana, Jesus, hosana!
9. Ó fariseus, não sabem / o que está escrito? / Hosana, Jesus, hosana!
10. Da boca das crianças / Deus quer ouvir sua glória! / Hosana, Jesus, hosana!
Cantemos ….. n° 1287
Os filhos dos Hebreus / com ramos de palmeira / correram ao encontro / de Jesus nosso
Senhor [:cantando e gritando: „Hosana, ó Salvador!“:]
1. O mundo / e tudo que tem nele é de Deus / a terra e os que aí vivem, todos seus! / Foi
Deus / que a terra construiu por sobre os mares / no fundo do oceano, seus pilares!
2. Quem vai / morar no templo de sua Cidade? …/ Quem pensa e vive longe das
vaidades! / Pois Deus / o Salvador o abençoará / no julgamento o defenderá!
3. Assim / são todos os que prestam culto a Deus / que adoram o Senhor, Deus dos
Hebreus! / Portões / antigos, se escancarem, vai chegar / alerta! O Rei da glória vai
entrar!
4. Quem é / quem é, então quem é o Rei da glória? .. / O Deus, forte Senhor da nossa
história! / Portões / antigos, se escancarem, vai chegar / alerta! O Rei da gloria vai
entrar!
5. Quem é / quem é então, quem é o Rei da glória? … / O Deus que tudo pode, é o Rei da
glória! / Aos Três / ao Pai, ao Filho e ao Confortador / da Igreja que caminha o louvor.
Cantemos ….. n° 180
São Cirilo de Jerusalém (313-350), bispo de Jerusalém e doutor da Igreja.
Catequese baptismal, 15,
Os dois adventos de Cristo
Anunciamos o advento de Cristo. Não, porém, um só, mas também o segundo, muito mais
glorioso que o primeiro. Aquele revestiu um aspecto de sofrimento; este trará consigo o
diadema do reino divino. No seu primeiro advento, foi envolvido em faixas e deitado num
presépio; no segundo, será revestido com um manto de luz. No primeiro, suportou a cruz, sem
recusar a sua ignomínia; no segundo aparecerá glorioso, escoltado pela multidão dos Anjos.
Não nos detemos, portanto, a meditar só no primeiro advento, mas vivemos na esperança do
segundo. Assim como aclamamos no primeiro: «Bendito O que vem em nome do Senhor»
(Mt 21,9), exclamaremos também no segundo, saindo ao encontro do Senhor juntamente com
os Anjos, em atitude de adoração: «Bendito O que vem em nome do Senhor». Virá o
Salvador, não para ser novamente julgado, mas para chamar a juízo aqueles que O julgaram.
Naquele tempo, veio para cumprir o desígnio de amor misericordioso, ensinando e
persuadindo os homens com suavidade; no fim dos tempos, queiram ou não, todos se hão-de
submeter ao seu reinado.
Beato Guerric de Igny (cerca de 1080-1157), abade cisterciense
Sermão sobre os Ramos
"Bendito seja o que vem em nome do Senhor"
É sob dois aspectos bem diferentes que a festa de hoje apresenta aos filhos dos homens
Aquele que a nossa alma deseja (Is 26,9), “o mais belo dos filhos dos homens” (Sl 44,3). Ele
atrai o nosso olhar sob esses dois aspectos; amamo-lo sob um e sob o outro, porque num e
noutro Ele é o Salvador dos homens...
Se considerarmos ao mesmo tempo a procissão de hoje e a Paixão, vemos Jesus, por um lado
sublime e glorioso, por outro humilhado e doloroso. Porque, na procissão, Ele recebe as
honras reais e, na Paixão, vemo-lo castigado como um malfeitor. Aqui cercam-no a glória e a
honra; além, “não tem aparência nem beleza” (is 53,2). Aqui, temos a alegria dos homens e o
orgulho do povo; além, temos “a vergonha dos homens e o desprezo do povo” (Sl 21,7). Aqui,
aclamam-no: “Hossana ao Filho de David. Bendito seja o rei de Israel que vem!” Além,
vociferam que merece a morte e escarnecem dele porque se fez rei de Israel. Aqui, correm
para Ele com palmas; além, flagelam-lhe o rosto com as mesmas palmas e batem-lhe na
cabeça com uma cana.. Aqui, cumulam-no de elogios; além, afogam-no em injúrias. Aqui,
disputam-se para juncar-lhe o caminho com as vestes dos outros; além, despojam-no das suas
próprias vestes. Aqui, recebem-no em Jerusalém como o rei justo e o Salvador; além, é
expulso de Jerusalém como um criminoso e um impostor. Aqui, montam-no sobre um burro,
rodeado de homenagens; além, é pendurado da cruz, rasgado pelos chicotes, trespassado de
chagas e abandonado pelos seus...
Senhor Jeus, quer o Teu rosto apareça glorioso quer humilhado, sempre nele vemos brilhar a
sabedoria. Do Teu rosto irradia o fulgor da luz eterna (Sb 7,26). Que brilhe sempre sobre nós,
Senhor, a luz do Teu rosto (Sl 4,7) nas tristezas como nas alegrias... Tu és a alegria e a
salvação de todos, quer te vejam montado sobre o burro, quer suspenso do madeiro da cruz.
Santo António (c. 1195-1231), franciscano, Doutor da Igreja
Sermões para o domingo e as festas dos santos
“Eis o teu Rei”
“Eis o teu Rei” (Za 9, 9), acerca do qual Jeremias nos fala nos seguintes termos: “Ninguém há
semelhante a Vós, Senhor! Vós sois grande! Grande e poderoso é o Vosso nome. Quem Vos
não temerá, Rei dos povos?” (Jer 10, 6-7). Deste Rei diz-nos o Apocalipse: “Sobre o Seu
manto e sobre a Sua coxa, um nome está escrito: Rei dos reis e Senhor dos senhores” (Ap 19,
16). O Seu manto são as faixas; a Sua coxa é a carne. Em Nazaré, onde tomou carne, foi
coroado como que com um diadema; em Belém, foi envolvido em faixas como que de
púrpura real. Tais foram as primeiras insígnias da Sua realeza. E foi contra estas insígnias que
se encarniçaram os Seus inimigos, para assinalar a vontade que tinham de Lhe retirar a
realeza; no decurso da Paixão, despojaram-No das Suas vestes, a Sua carne foi trespassada
com pregos. Ou melhor, foi nessa altura que Lhe foi dado o complemento das Suas insígnias
reais: já tinha a coroa e a púrpura, recebeu o ceptro quando, “carregando às costas a cruz, saiu
para o lugar chamado Crânio” (Jo 19, 17). Então, nas palavras de Isaías, teve “a soberania
sobre os seus ombros” (9, 5); e diz a Carta aos Hebreus: “Vemos, porém, coroado de honra e
glória aquele Jesus que por um pouco tempo foi feito inferior aos anjos, em virtude de ter
padecido a morte” (Heb 2, 9).
Eis, pois, o teu rei, que vem a ti, para te dar a felicidade. Vem na mansidão, para Se fazer
amar, e não no poder, para Se fazer temer. Vem sentado num burrinho. […] As virtudes
próprias dos reis são a justiça e a bondade. Assim, o teu Rei é justo: “Retribuirá a cada um
conforme o seu procedimento” (Mt 16, 27). É manso; é “o teu Redentor” (Is 54, 5). E também
é pobre; como diz o Apóstolo Paulo, “despojou-Se a Si mesmo, tomando a condição de servo”
(Fil 2, 7).
No paraíso terrestre, Adão recusou-se a servir o Senhor; então, o Senhor tomou a forma de
escravo, fez-Se servo do escravo, a fim de que o escravo já não corasse por servir o Senhor.
Fez-Se igual aos homens; “tornando-Se semelhante aos homens” (Fil 2, 7). […] É pobre, Ele
que “não tem onde reclinar a cabeça” (Mt 8, 20), até ao momento em que, “inclinando a
cabeça” na cruz, “rendeu o espírito” (Jo, 19, 30).
Mateus 21,12-22: Jesus expulsa os profanadores do templo– cf.par. Mc 11,15-18; Lc 19,
45-48
Evangelho segundo S. Mateus 21,23-27. – cf.par. Mc 11,27-33; Lc 20,1-8
Em seguida, entrou no templo. Quando estava a ensinar, foram ter com Ele os sumos
sacerdotes e os anciãos do povo e disseram-lhe: «Com que autoridade fazes isto? E quem te
deu tal poder?» Jesus respondeu-lhes: «Também Eu vou fazer vos uma pergunta. Se me
responderdes, digo-vos com que autoridade faço isto. De onde provinha o baptismo de João:
do Céu ou dos homens?» Mas eles começaram a pensar entre si: «Se respondermos: 'Do Céu’,
vai dizer-nos: 'Porque não lhe destes crédito?’ E, se respondermos: 'Dos homens’, ficamos
com receio da multidão, pois todos têm João por um profeta.» E responderam a Jesus: «Não
sabemos.» Disse-lhes Ele, por seu turno: «Também Eu vos não digo com que autoridade faço
isto.»
S. Cirilo de Jerusalém (313-350), bispo de Jerusalém e doutor da Igreja
Catequese baptismal 12
«Porquê, então, não crestes na Sua palavra?»
Os profetas foram enviados com Moisés para curar o seu povo. Mas eles actuavam
penosamente, não chegando a dominar o mal, como um deles disse: «Para minha infelicidade,
os homens fiéis desapareceram da terra» (Mq 7,2)...
Quão grande era a chaga da humanidade; dos pés à cabeça, nem um espaço são, nem um lugar
para pôr ligadura, nem óleo, nem penso (Is 1,6). Os profetas, esgotadas pelas lágrimas,
diziam: «Quem trará de Sião o remédio salvador?» (Sl 13,7)... E um outro profeta suplica
nestes termos: «Senhor, baixa dos céus e desce (Sl 143,5). As feridas da humanidade
ultrapassam os nossos remédios. Eles levaram os profetas à morte e arruinaram os teus altares
(1R 19, 10). A nossa miséria não pode ser salva por nós; É de Ti que precisamos para nos
levantarmos.
O Senhor escutou a prece dos profetas. O Pai não desprezou a nossa raça magoada; Ele
enviou do céu o Seu próprio Filho como médico .«Vai chegar o Senhor que buscais e vai vir
em breve», diz um profeta. Onde? «No Seu Templ o» (Ml 3,1), lá onde apedrejastes o seu
profeta (2Cr 24,21)... O próprio Deus disse ainda: «Eis que chego e habitarei no meio de ti, e
numerosos povos se refugiarão perto do Senhor» (Sl 17,10)... Agora venho congregar todos os
povos de todas as línguas, pois «Ele chegou a sua casa e os seus não o receberam» (Jo 1,11).
São Beda, o Venerável (c. 673-735), monge, doutor da Igreja
Sermão n°1; CCL 122, 2 (trad. cf. Solesmes, Leccionário, I, p. 161)
«Todos consideram João um profeta»
Se tentarmos perceber porque é que João baptizava, uma vez que o seu baptismo não
podia remir os pecados, a razão torna-se clara: é que, para se manter fiel ao seu ministério de
percursor, tinha de baptizar antes do Senhor, tal como nasceu, pregou e morreu antes Dele. Ao
mesmo tempo, impedia que a querela invejosa dos Fariseus se prendesse com o Seu
ministério, o que aconteceria caso Ele tivesse feito o primeiro baptismo aos homens. «De
onde provinha o baptismo de João: do Céu ou dos homens?» Como não ousaram negar que
vinha do Céu, foram obrigados a reconhecer que as obras Daquele que João anunciava eram,
também elas, levadas a cabo por um poder que vinha do Céu. Embora o baptismo de João não
remisse os pecados, não era infrutífero para os que o recebiam. [...] Era um sinal de fé e de
arrependimento, quer dizer, recordava que todos se deviam abster do pecado, dar esmola,
acreditar em Cristo e apressar-se a receber o Seu baptismo logo que Ele aparecesse, de modo
a serem purificados pela remissão dos pecados.
Blaise Pascal (1623-1662), sábio, escritor
Opúsculos
" - Não sabemos..." " - Também Eu não vos digo..."
Há tão poucas passoas a quem Deus apareça de forma extraordinária, através de milagres, que
temos de aproveitar essas ocasiões, uma vez que Ele não sai do segredo que O cobre senão
para estimular a nossa fé a servi-Lo com tanto mais ardor quanto O passamos a conhecer com
maior certeza.
Se Deus se revelasse continuamente aos homens, não haveria mérito em acreditar n'Ele mas,
se Ele nunca se revelasse, haveria pouca fé. Normalmente, Ele esconde-se e só raramente se
revela aos que quer comprometer no Seu serviço. Este estranho segredo, em que Deus se
retira, se torna impenetrável à vista dos homens, é uma grande lição para nos conduzir à
solidão, longe também da vista dos homens. Ele ficou escondido, sob o véu da natureza que
nos cobre, até ao momento da Encarnação; quando foi necessário que aparecesse, escondeu-se
ainda mais, cobrindo-se de humanidade. Era mais fácil reconhecê-lO quando estava invisível
do que... quando se tornou visível. Finalmente, quando quis cumprir a promessa que tinha
feito aos apóstolos de ficar com os homens até à Sua segunda vinda, escolheu fazê-lo no mais
estranho e impenetrável de todos os segredos, sob as espécies da Eucaristia. É a este
sacramento que S. João chama no Apocalipse um maná secreto (2,17); e eu creio que Isaías o
via nesse e stado quando disse, em espírito de profecia: "Verdadeiramente, Tu és um Deus
escondido" (45,15).
Evangelho segundo S. Mateus 21,28-32.
«Que vos parece? Um homem tinha dois filhos. Dirigindo-se ao primeiro, disse-lhe: 'Filho,
vai hoje trabalhar na vinha.’ Mas ele respondeu: 'Não quero.’ Mais tarde, porém, arrependeuse e foi. Dirigindo-se ao segundo, falou-lhe do mesmo modo e ele respondeu: 'Vou sim,
senhor.’ Mas não foi. Qual dos dois fez a vontade ao pai?» Responderam eles: «O primeiro.»
Jesus disse-lhes: «Em verdade vos digo: Os cobradores de impostos e as meretrizes vão
preceder vos no Reino de Deus. João veio até vós, ensinando-vos o caminho da justiça, e não
acreditastes nele; mas os cobradores de impostos e as meretrizes acreditaram nele. E vós, nem
depois de verdes isto, vos arrependestes para acreditar nele.»
Clemente de Alexandria (150 - c.215), teólogo
Homilia «Que rico será salvo?», 39-40
«Os cobradores de impostos e as meretrizes vão preceder-vos no Reino de Deus»
As portas estão abertas a todo aquele que, em sinceridade, com o coração, se voltar para Deus,
e o Pai recebe com alegria um filho que verdadeiramente se arrependa. Qual é o sinal do
arrependimento verdadeiro? Não voltar a cair em velhos erros e arrancar do coração, pela raiz,
os pecados que nos punham em perigo de morte. Quando estes estiverem apagados, Deus virá
habitar-nos. Porque, como diz a Escritura, um pecador que se converte e se arrepende
encontrará no Pai e nos anjos do céu uma imensa e incomparável alegria (Lc 15,10). Eis por
que o Senhor disse : «Eu quero a misericórdia e não os sacrifícios » (Os 6, 6; Mt 9,13); « Não
tenho prazer na morte do ímpio, mas sim na sua conversão » (Ez 33,11). «Mesmo que os
vossos pecados sejam como escarlate, tornar-se-ão brancos como a neve. Mesmo que sejam
vermelhos como a púrpura, ficarão brancos como a lã.» (Is 1, 18).
Só Deus, de facto, pode remir os pecados e não imputar erros, ainda que o Senhor Jesus nos
exorte a perdoar, em cada dia, aos irmãos que se arrependem. E se nós, que somos maus,
sabemos dar coisas boas aos outros (Mt 7,11), quanto não será capaz de dar «o Pai das
misericórdias» (2 Cor 1,3)? O Pai de toda a consolação, que é bom, cheio de compaixão, de
misericórdia e de paciência por natureza, espera os que se convertem. E a verdadeira
conversão supõe que deixemos de pecar e que não olhemos mais para trás [...]. Lamentemos
amargamente, pois, os erros cometidos e peçamos ao Pai que os esqueça. Ele pode, na sua
misericórdia, desfazer o que foi feito e, com o orvalho do Espírito, apagar as nossas faltas
passadas.
Bem aventurado Gueric d’Igny (cerca 1080-1157), abade cisterciense
Sermão 1 para S. João Baptista
“João deu testemunho da verdade…; ele era a lâmpada que ardia e brilhava” (Jo 5,35)
Esta lâmpada destinada a iluminar o mundo traz-me uma alegre notícia, porque é graças a ela
que eu reconheço a verdadeira Luz que brilha nas trevas, mas que as trevas não receberam (Jo
1,5)… Podemos admirar-te, João, tu, o maior de todos os santos; mas imitar a tua santidade,
isso é-nos impossivel. Dado que tu apressas em preparar um povo perfeito para o Senhor com
os publicanos e os pecadores, é urgente que lhes fales de modo a trazê-los pelo testemunho da
tua vida. Propões-lhes um modo de perfeição que não é senão a tua maneira de viver, mas
adaptado à fraqueza das forças humanas.
“Produzi, diz ele, dignos frutos de penitência” (Mt 3,8). Mas nós, irmãos, nós gloriamo-nos
em falar melhor do que vivemos. João, ele, cuja vida é mais sublime do que os homens podem
compreender, põe no entanto a sua linguagem ao serviço da sua inteligência: “Fazei, diz ele,
dignos frutos de penitência!” “Falo-vos de maneira humana, em função da fraqueza da carne.
Se não podeis ainda fazer o bem em plenitude, que ao menos se encontre em vós uma
verdadeira aversão pelo que é mal. Se não podeis ainda produzir os frutos de uma justiça
perfeita, que de momento a vossa perfeição consista em produzir dignos frutos de penitência”.
Isaac de l'Étoile (?- c. 1171), monge cisterciense
1º Sermão para o 2º domingo da Quaresma (trad. cf. SC 207, p. 225s)
Arrepender-se a acreditar na palavra de Deus
Irmãos, este é o momento de sair, cada um de nós por si, das vias do pecado. Saiamos da
nossa Babilónia para nos reencontrarmos com Deus, nosso Salvador, como nos advertia o
Profeta: «Prepara-te para comparecer diante do teu Deus, ó Israel!» (Am 4,12). Abandonemos
o abismo do nosso pecado e aceitemos partir em direcção ao Senhor que assumiu «uma carne
idêntica à do pecado» (Rm 8,3). Libertemo-nos do desejo do mal e façamos penitência pelos
nossos erros. Assim, encontraremos Cristo, Ele que expiou o pecado que não tinha, de forma
nenhuma, cometido. Então, Aquele que salva os arrependidos dar-nos-á a salvação: «Ele é
misericordioso para com aqueles que se convertem» (Si 12,3 Vulg).
Dir-me-ão: «Quem pode então, por si mesmo, sair do pecado?» Sim, na verdade, o maior
pecado é o amor que lhe temos, o desejo de o cometer. Por isso, despoja-te do teu desejo [...],
odeia o mal e assim conseguirás desapegar-te dele. Se odiares o pecado encontrarás a Cristo,
em seu lugar. Cristo perdoa as faltas dos que odeiam o pecado e espera que arranquemos os
maus hábitos pela raiz.
Mas vós dizeis que, mesmo isso é demasiado para vós e que, sem a graça de Deus, é
impossível ao homem odiar o seu pecado, desejar a justiça e querer arrepender-se: «Dêem
graças ao Senhor, pelo seu amor e pelas suas maravilhas em favor dos homens.» (Sl 106, 8)
[...] Senhor, salva--me da tibieza do espírito e da tempestade [...] Ó Senhor de mão firme,
Jesus todo-poderoso, tu, que libertaste a minha mente do demónio da ignorância e arrancaste a
minha vontade enfraquecida da doença das suas cobiças, liberta agora a minha capacidade de
agir de modo que, com os santos anjos [...], possa, também eu: «cumprir as Vossas ordens,
sempre dócil à Vossa palavra» (Sl 102, 20).
Isaac de l´Étoile (? - cerca de 1171), monge de Cister
Sermão de Quaresma
“Sair do pecado e entrar no Reino de Deus”
Irmãos, é o momento de sair, cada um de nós, da escravidão do pecado. Deixemos a nossa
Babilónia para encontrar Deus nosso Salvador, como nos adverte o profeta: “prepara-te para o
encontro com o teu Deus, ó Israel!” (Am 4,12). Deixemos o abismo do nosso pecado e
aceitemos partir ao encontro do Senhor que assumiu “uma carne idêntica à do pecado” (Rm
8,3). Deixemos voluntariamente o pecado e façamos penitência. Então, encontraremos Cristo:
ele próprio expiou o pecado que não tinha cometido. Então, aquele que salva os penitentes nos
concederá a salvação: “Ele foi misericordioso para com os que se converteram”.
Dir-me-ás: ”Quem por si próprio pode sair do pecado?”. Sim, na verdade o maior pecado é o
amor ao pecado, o desejo de pecar. Sai pois deste desejo... Detesta o pecado e ver-te-ás fora
do pecado. Se tu detesta o pecado, tu encontraste Cristo onde ele se encontra. A quem detesta
o pecado... Cristo perdoa a falta esperando cortar pela raiz os nossos maus hábitos.
Mas vós dizeis que mesmo isso é muito para vós e que sem a graça de Deus é
impossível ao homem detestar o seu pecado e desejar a justiça: “louvai o
Senhor pelas suas misericórdias, pelas suas maravilhas a favor dos homens!”
(Sl 106,8)...
Senhor de mão poderosa, Jesus todo-poderoso, vem libertar a minha razão
cativa do demónio da ignorância e arrancar a minha vontade doente da peste
da sua cobiça.
Liberta as minhas capacidades a fim de que eu possa agir com força, como
desejo de todo o coração.
Pregador do Papa: O Evangelho, anúncio de resgate para todos
Padre Raniero Cantalamessa comenta o Evangelho do próximo domingo
ROMA, sexta-feira, 23 de setembro de 2005 (ZENIT.org).- Publicamos o comentário do padre
Raniero Cantalamessa OFM Cap --pregador da Casa Pontifícia-- ao Evangelho do próximo
domingo (Mt 21, 28-32).
***
XXVI do tempo comum (ano A)
Mateus (21, 28-32).
Naquele tempo, disse Jesus aos sumos sacerdotes e aos anciãos do povo: «Que vos parece?
Um homem tinha dois filhos. Chegando ao primeiro, disse-lhe: “Filho, vai hoje trabalhar na
vinha”. E ele respondeu: “Não quero”, mas depois se arrependeu e foi. Chegando ao
segundo, disse-lhe o mesmo. E ele respondeu: “Vou, Senhor”, e não foi. Qual dos dois fez a
vontade do pai?». «O primeiro», dizem-lhe. Disse Jesus: «Em verdade vos digo que os
publicanos e as prostitutas chegam antes que vós ao Reino de Deus. Porque veio João a vós
por caminho de justiça e não crestes nele, enquanto que os publicanos e as prostitutas creram
nele. E vós nem o vendo vos arrependestes depois para crer nele».
As prostitutas no Reino
Na parábola, o filho que diz sim e não obedece representa aqueles que conheciam a Deus e
seguiam sua Lei, mas depois, na prática, quando se tratou de acolher a Cristo que era «o fim
da Lei», deixaram para trás. O filho que diz não e obedece representa os que em um tempo
viviam fora da Lei e da vontade de Deus, mas depois, ante Jesus, arrependeram-se e
acolheram o Evangelho. Lida hoje, a parábola dos dois filhos diz que para Deus as palavras e
as promessas contam pouco se não se seguem das obras.
Contudo, explicando o conteúdo central da parábola, é necessário esclarecer a estranha
conclusão que Jesus tira dela: «Os publicanos e as prostitutas chegam antes que vós ao Reino
de Deus». De nenhuma expressão de Cristo se abusou mais que desta. Acabou-se por criar, às
vezes, uma espécie de aura evangélica em torno à categoria das prostitutas, idealizando-as e
opondo-as aos chamados preconceituosos, que seriam todos, indistintamente, escribas e
fariseus hipócritas. A literatura está cheia de prostitutas «boas». Basta pensar na Traviata de
Verdi, ou na aprazível Sonia de “Crime e Castigo”, de Dostoievski! Mas há um terrível malentendido. Jesus põe um caso limite, como para dizer: «Até as prostitutas --que o diz tudo-vos precederão no Reino de Deus». Não nos damos conta, também, de que idealizando a
categoria das prostitutas se chega a idealizar também a dos publicanos que sempre a
acompanha no Evangelho, isto é, a dos agiotas.
Jesus tinha demasiado respeito pela mulher como para não sofrer, ele primeiro, vendo-a
reduzida a prostituta. Se a aprecia não é por sua maneira de viver, mas por sua capacidade de
mudar e de pôr ao serviço do bem a própria capacidade de amar. O Evangelho não impulsiona
pois campanhas moralistas contra as prostitutas, mas tampouco impulsiona a brincar com o
fenômeno, como se fosse coisa de nada.
Hoje, entre outras coisas, a prostituição se apresenta sob uma forma nova que consegue fazer
dinheiro a mãos cheias, sem os riscos que sempre correram as pobres mulheres na rua. Esta
forma consiste em ver o próprio corpo com a tranqüilidade de estar atrás de uma máquina
fotográfica ou uma câmera de vídeo. O que a mulher faz --ou é obrigada a fazer-- quando se
presta à pornografia e a certos excessos da publicidade é vender o próprio corpo. É uma forma
de prostituição pior, em certo sentido, que a tradicional, porque não respeita a liberdade e os
sentimentos do povo, impondo-se com freqüência publicamente, sem que possamos nos
defender disso.
Fenômenos assim suscitarão hoje em Cristo a mesma cólera que mostrava pelos hipócritas de
seu tempo. Porque se trata precisamente de hipocrisia. Fingir que tudo está em seu lugar, que
é inócuo, que não existe transgressão alguma, nem perigo para ninguém, dando-se até um
certo --estudado-- ar de inocência e ingenuidade ao largar o próprio corpo ao pasto da
concupiscência de outros.
Mas trairia o espírito do Evangelho se não tirasse à luz a esperança que essa parábola de
Cristo oferece às mulheres que pelas circunstâncias mais diversas (freqüentemente por
desespero) se viram nas ruas, vítimas na maioria das vezes de exploradores sem escrúpulos. O
Evangelho é «evangelho», isto é, boa notícia, anúncio de resgate, de esperança, também para
as prostitutas. E mais, talvez antes que nada para elas. Jesus quis que fosse assim.
[Traduzido por Zenit, original italiano publicado por «Famiglia Cristiana»]
ZP05092303
Pregador do Papa: «Não se deve banalizar a tragédia da prostituição»
Comentário do Pe. Cantalamessa sobre a Liturgia do próximo domingo
ROMA, sexta-feira, 26 de setembro de 2008 (ZENIT.org).- Publicamos o comentário do Pe.
Raniero Cantalamessa, OFM Cap. – pregador da Casa Pontifícia – sobre a Liturgia da Palavra
do próximo domingo, 28 de setembro.
XXVI Domingo do Tempo Comum
Ezequiel 18, 25-28; Filipenses 2, 1-11; Mateus 21, 28-32
«As prostitutas vos precederão no Reino dos céus»
«Um homem tinha dois filhos. Dirigindo-se ao primeiro, disse-lhe: - Meu filho, vai trabalhar
hoje na vinha. Respondeu ele: - Não quero. Mas, em seguida, tocado de arrependimento,
foi. Dirigindo-se depois ao outro, disse-lhe a mesma coisa. O filho respondeu: - Sim, pai! Mas
não foi. Qual dos dois fez a vontade do pai? O primeiro, responderam-lhe.».
O filho da parábola que diz «sim» mas não faz representa aqueles que conheciam Deus e
seguiam sua lei, mas depois, em sua atuação prática, quando se tratava de acolher Cristo, que
era «o fim da lei», deram um passo atrás. O filho que diz «não» e faz representa aqueles que
antes viviam fora da lei e da vontade de Deus, mas depois, com Jesus, se arrependeram e
acolheram o Evangelho. Daqui a conclusão que Jesus põe diante «dos príncipes dos
sacerdotes e dos anciãos do povo»: «Em verdade vos digo que os publicanos e as prostitutas
vos precederão no Reino de Deus».
Nenhuma frase de Cristo foi mais manipulada que esta. Acabaram criando às vezes uma
espécie de aura evangélica em torno da categoria das prostitutas, idealizando-as e opondo-as a
todos os demais, indistintamente, escribas e fariseus hipócritas. A literatura está cheia de
prostitutas «boas». Basta pensar na Traviata, de Verdi, ou na humilde Sonia de Crime e
castigo, de Dostoiévski!
Mas isso é um terrível mal-entendido. Jesus apresenta um caso limite, como se estivesse
dizendo: «inclusive as prostitutas – e é muito dizer – vos precederão no Reino de Deus». A
prostituição é vista com toda sua seriedade, e tomada como termo de comparação para
estabelecer a gravidade do pecado de quem rejeita obstinadamente a verdade.
É preciso perceber também que idealizando a categoria das prostitutas se costuma idealizar
também a dos publicanos, que sempre a acompanha no Evangelho. Se Jesus aproxima estas
duas categorias não é sem um motivo: ambos puseram o dinheiro acima de tudo na vida.
Seria trágico se esta palavra do Evangelho fizesse que os cristãos perdessem o empenho por
combater o fenômeno degradante da prostituição, que assumiu hoje proporções alarmantes em
nossas cidades. Jesus sentia muito respeito pela mulher para não sofrer, ele em primeiro lugar,
pelo que esta chega a ser quando se reduz a esta situação. É por isso que ele valoriza a
prostituição não por sua forma de viver, mas por sua capacidade de mudar e de pôr ao serviço
do bem sua própria capacidade de amar. Como Madalena que, após converter-se, seguiu
Cristo até a cruz e se converteu na primeira testemunha da ressurreição (supondo que foi uma
delas).
O que Jesus queria dizer com essa palavra aparece claramente no final: os publicanos e as
prostitutas se converteram com a pregação de João o Batista; os príncipes dos sacerdotes e dos
anciãos não. O Evangelho não nos impulsiona portanto a promover campanhas moralizadoras
contra as prostitutas, mas tampouco a não levar a sério este fenômeno, como se não tivesse
importância.
Hoje, por outro lado, a prostituição se apresenta sob uma forma nova, pois consegue produzir
muito dinheiro sem nem sequer correr os tremendos riscos que sempre correram as pobres
mulheres condenadas à rua. Esta forma consiste em vender o próprio corpo, ficando
tranqüilamente na frente de uma máquina fotográfica ou uma câmera de vídeo, sob a luz dos
refletores. O que a mulher faz quando se submete à pornografia e a certos excessos da
publicidade é vender seu próprio corpo aos olhares. É prostituição pura e dura, e pior que a
tradicional, porque se impõe publicamente e não respeita a liberdade nem os sentimentos das
pessoas.
Mas feita esta necessária denúncia, trairíamos o espírito do Evangelho se não destacássemos
também a esperança que esta palavra de Cristo oferece às mulheres que, por diversas
circunstâncias da vida (com freqüência por desespero), se encontram na rua, a maioria das
vezes, vítimas de exploradores sem escrúpulos. O Evangelho é «evangelho», ou seja, boa
notícia, notícia de resgate, de esperança, também para as prostitutas. E mais, antes de tudo
para elas. Jesus quis que fosse assim.
[Tradução: Élison Santos; Revisão: Aline Banchieri]
Evangelho segundo S. Mateus 21,33-43.45-46. – cf.par. Mc 12,1-12; Lc 20,9-10
«Escutai outra parábola: Um chefe de família plantou uma vinha, cercou-a com uma sebe,
cavou nela um lagar, construiu uma torre, arrendou-a a uns vinhateiros e ausentou-se para
longe. Quando chegou a época das vindimas, enviou os seus servos aos vinhateiros, para
receberem os frutos que lhe pertenciam. Os vinhateiros, porém, apoderaram-se dos servos,
bateram num, mataram outro e apedrejaram o terceiro. Tornou a mandar outros servos, mais
numerosos do que os primeiros, e trataram-nos da mesma forma. Finalmente, enviou-lhes o
seu próprio filho, dizendo: 'Hão-de respeitar o meu filho.’ Mas os vinhateiros, vendo o filho,
disseram entre si: 'Este é o herdeiro. Matemo-lo e ficaremos com a sua herança.’ E,
agarrando-o, lançaram-no fora da vinha e mataram-no. Ora bem, quando vier o dono da vinha,
que fará àqueles vinhateiros?» Eles responderam-lhe: «Dará morte afrontosa aos malvados e
arrendará a vinha a outros vinhateiros que lhe entregarão os frutos na altura devida.» Jesus
disse-lhes: «Nunca lestes nas Escrituras: A pedra que os construtores rejeitaram transformouse em pedra angular? Isto é obra do Senhor e é admirável aos nossos olhos? Por isso vos digo:
O Reino de Deus ser-vos-á tirado e será confiado a um povo que produzirá os seus frutos. Os
sumos sacerdotes e os fariseus, ao ouvirem as suas parábolas, compreenderam que eram eles
os visados. Embora procurassem meio de o prender, temeram o povo, que o considerava
profeta.
São Basílio (c. 330-379), monge e bispo de Cesareia, na Capadócia, doutor da Igreja
Homilia 5 sobre o Hexâmeron, 6
Dar fruto
O Senhor está permanentemente a comparar a alma humana com uma vinha: «O meu amigo
possuía uma vinha numa colina fértil» (Is 5, 1), «Plantou uma vinha, cercou-a com uma sebe»
(Mt, 21, 33). É, evidentemente, à alma humana que Jesus chama a Sua vinha, foi a ela que
cercou, como se fosse uma sebe, com a segurança que proporcionam os Seus mandamentos e
a protecção dos Seus anjos, porque «o anjo do Senhor assenta os seus arraiais em redor dos
que O temem» (Sl 33, 8). Em seguida, ergueu em nosso redor uma paliçada, estabelecendo na
Igreja «primeiro, apóstolos, segundo, profetas, terceiro, doutores» (1 Cor 12, 28). Por outro
lado, através dos exemplos dos homens santos de outrora, eleva-nos os pensamentos, não os
deixando cair por terra, aonde mereciam ser pisados. Deseja que os abraços da caridade, quais
sarmentos de uma vinha, nos liguem ao nosso próximo e nos levem a repousar Nele. Assim,
mantendo permanentemente o impulso em direcção aos céus, elevar-nos-emos como vinhas
trepadeiras, até aos mais altos cumes.
O Senhor pede-nos também que consintamos em ser podados. Ora, uma alma é podada
quando afasta para longe de si os cuidados do mundo, que são um fardo para o nosso coração.
Assim, aquele que afasta de si mesmo o amor carnal e a ligação às riquezas, ou que tem por
detestável e desprezível a paixão pela miserável vanglória, foi, por assim dizer, podado, e
voltou a respirar, liberto do fardo inútil das preocupações deste mundo.
Mas – e mantendo ainda a linha da parábola – não podemos produzir apenas lenha, ou seja,
viver com ostentação, ou procurar os louvores dos de fora. Temos de dar fruto, reservando as
nossas obras para as mostrarmos ao verdadeiro agricultor (Jo 15, 1).
„Havia um proprietário que plantou uma vinha, cercou- a com uma sebe, abriu nela
um lagar e construiu uma torre …“ – Mt 21, 33-44
1. Um homem plantou uma vinha com amor; / partindo em viagem; sua vinha arrendou. /
Mandou empregados sua parte buscar; / mataram seu filho, sem nada entregar. / Irado
este pai rejeitou seus rivais / buscando outros homens que rendam bem mais.
2. Ao fim da parábola, Cristo lhes diz: / „Serei rejeitado, a Escritura o prediz. / A pedra a
que os homens não deram valor / será a principal para Deus construtor“. / Eu não
morrerei, viverei para os meus / e assim narrarei todas obras de Deus.
Cantemos ….. n° 855
S. Máximo de Turim (? - cerca de 420), bispo
Sermão para a festa de S. Cipriano
Produzir fruto
A vinha do Senhor dos Exércitos, diz o profeta, é a casa de Israel (Is 5,7). Ora esta casa,
somos nós... e, uma vez que somos Israel, somos a vinha. Tomemos então cuidado para que,
dos nossos sarmentos, em vez da uva da doçura não nasça a da cólera (Ap 14,19), para que
não digam de nós: "Esperava belos frutos; ela deu uvas selvagens" (Is 5,4). Que terra ingrata!
Aquela que deveria ter oferecido ao seu dono os frutos da doçura trespassou-o com espinhos
agudos. Foi por isso que os seus inimigos, que deviam ter acolhido o Salvador com toda a
devoção da sua fé, o coroaram com os espinhos da Paixão.. Para eles, aquela coroa significava
bem o ultrage e a injúria mas, aos olhos do Senhor, era a coroa das virtudes...
Tende cuidado, irmãos, para que não digam a vosso respeito: "Ele esperava belas uvas e ela só
lhe deu espinhos selvagens" (Is 5,2)... Tenhamos cuidado para que as nossas más acções não
firam a cabeça do Senhor como silvas. Há espinhos do coração que feriram mesmo a palavra
de Deus, como diz o Senhor no evangelho ao contar que o grão do semeador caíu no meio dos
espinhos, que cresceram e abafaram o que tinha sido semeado (Mt 13,7)... Vigiai pois para
que a vossa vinha não dê espinhos em vez de uvas; que a vossa vindima não produza vinagre
em vez de vinho. Todo aquele que vindima sem distribuir parte aos pobres recolhe vinagre em
vez de vinho; e aquele que armazena as suas colheitas sem distribuir parte aos indigentes não
guarda o fruto da esmola mas os cardos da avareza.
Santo Ireneu de Lyon (cerca de 130 – cerca de 208), bispo, teólogo e mártir
Contra as heresias
A vinha de Deus
Deus plantou a vinha do género humano quando moldou Adão e elegeu os patriarcas. Depois,
confiou-a a vinhateiros pelo dom da Lei transmitida por Moisés. Rodeou-a de uma sebe, quer
dizer, delimitou a terra que eles deveriam cultivar. Construiu uma torre, isto é, escolheu
Jerusalém. Enviou-lhes profetas antes do exílio da Babilónia, e mais outros depois do exílio,
em maior número do que os primeiros, para reclamar os frutos e dizer-lhes: “Endireitai os
vossos caminhos e o vosso modo de vida” (Jr 7,3); “Julgai com justiça, praticai a piedade e a
misericórdia cada um para com o seu irmão; não oprimais a viúva nem o órfão, o estrangeiro
ou o pobre; que ninguém entre vós conserve no coração a lembrança da maldade de seu
irmão” (Za 7,19) …; “Retirai a malícia dos vossos corações… aprendei a fazer o bem.
Procurai a justiça; salvai o que sofre de injustiça” (Is 1,16) …
Eis com que pregações os profetas reclamavam o fruto da justiça. Mas como aquela gente
permanecia incrédula, Deus envi ou-lhes finalmente o seu Filho, nosso Senhor Jesus Cristo,
que aqueles maus vinhateiros mataram e lançaram fora da vinha. Por isso, Deus a confiou – já
não delimitada mas alargada ao mundo inteiro – a outros vinhateiros para que lhes dêem os
frutos a seu tempo… A torre da eleição ergue-se em toda a parte com o seu brilho, porque em
toda a parte resplandece a Igreja; em toda a parte também foi esmagado o lagar porque estão
em toda a parte os que recebem a unção do Espírito de Deus…
Por isso o Senhor dizia aos discípulos, para azer de nós bons operários: “Tende cuidado
convosco e velai constantemente para que os vossos corações não se tornem pesados com a
devassidão e com as preocupações materiais” (Lc 21,34). “Que os vossos rins estejam
cingudos eas vossas lâmpadas acesas. E sede como homens que esperam o seu senhor” (Lc
12,35).
Santo Ambrósio (cerca de 340 - 397), bispo de Milão e doutor da Igreja
Tratado sobre o Evangelho de S. Lucas
A parábola da vinha
A videira é a nossa imagem, porque o povo de Deus, enraizado na cepa da vinha eterna, se
eleva acima da terra. Fruto de um solo ingrato, ora de enche de botões e floresce, ora se
reveste de verdura, ora se assemelha ao madeira amoroso da cruz, quando cresce e os seus
braços estendidos formam os sarmentos de uma vinha fecunda... Há assim razão para chamar
vinha ao povo de Deus, seja porque ele marca a sua fronte com o sinal da cruz (Ez 9,4), seja
porque os seus frutos são colhidos na última estação do ano, seja porque, tal como nas fiadas
de uma vinha, todos, pobres e ricos, humildes e poderosos, servos e senhores, são de uma
igualdade perfeita no seio da Igreja...
Quando se prende uma videira, ela ergue-se; quando se poda, não é para a diminuir mas para a
fazer crescer. O mesmo acontece com o povo santo: se o prendem, ele liberta-se; se o
humilham, ele ergue-se; se o talham, estão a coroá-lo. Melhor ainda: tal como o rebento
cortado de uma velha árvore pode ser enxertado noutra raiz, também este povo santo se
desenvolve, alimentado na árvore da cruz. E o Espírito Santo, como que espalhado pelos
sulcos de um terreno, derrama-se no nosso corpo, lavando tudo o que é imundo e erguendo os
nossos membros para os dirigir ao céu.
O vinhateiro tem o hábito de mondar, de amarrar, de podar esta vinha (Jo 15,2)... Umas vezes
queima com o sol os segredos do nosso corpo, outras vezes rega-os com a chuva. Gosta de
mondar o seu terreno, para que os espinhos não firam os botões; vela para que as folhas não
façam demasiada sombra, não privem de luz as nossas virtudes nem impeçam a maturação
dos nossos frutos.
Pregador do Papa: que destino reservamos a Cristo em nossa vida?
Comentário do Pe. Cantalamessa sobre a liturgia do próximo domingo
ROMA, sexta-feira, 3 de outubro de 2008 (ZENIT.org).- Publicamos o comentário do Pe.
Raniero Cantalamessa, OFM Cap., pregador da Casa Pontifícia, sobre a liturgia do próximo
domingo, 3 de outubro, 27º do Tempo Comum.
***
XXVII Domingo do Tempo Comum
Isaías 5, 1-7; Filipenses 4, 6-9; Mateus 21, 33-43
O Reino de Deus vos será tirado
O contexto imediato da parábola dos vinhateiros homicidas se refere à relação entre Deus e o
Povo de Israel. É para ele que historicamente Deus enviou primeiro os profetas e depois seu
próprio Filho. Mas como todas as parábolas de Jesus, esta é uma «história aberta». Na relação
Deus-Israel se traça a relação entre Deus e a humanidade inteira.
Jesus retoma e continua o lamento de Deus em Isaías da primeira leitura. É aí onde se deve
buscar a chave de leitura e o tom da parábola. Por que Deus «plantou a vinha» e quais são os
frutos que espera e que virá buscar? Aqui a parábola se afasta da realidade. Os vinhateiros
humanos não plantam uma vinha nem lhe dão seus cuidados por amor à vinha, mas por seu
benefício. Deus não é assim. Ele cria o homem, entra em aliança com ele, não por seu
interesse, mas para favorecer o homem, por puro amor. Os frutos que espera do homem são o
amor a Ele e a justiça com os oprimidos: coisas que servem para o bem do homem, não o de
Deus.
Esta parábola de Jesus é terrivelmente atual aplicada à nossa Europa e, em geral, ao mundo
cristão. Também neste caso deve-se dizer que Jesus foi «lançado fora da vinha», expulso por
uma cultura que se proclama pós-cristã, ou inclusive anticristã. As palavras dos vinhateiros
ressoam, se não nas palavras, pelo menos nos fatos de nossa sociedade secularizada: «Vamos
matá-lo e tomar posse da sua herança!».
Já não se quer ouvir falar mais de raízes cristãs da Europa, de patrimônio cristão; o homem
secularizado quer ser o herdeiro, o dono. Sartre pôs na boca de um personagem seu estas
terríveis declarações: «Já não há nada no céu, nem Bem, nem Mal, nem pessoa alguma que
possa dar-me ordens. (...) Sou um homem, e cada homem deve inventar seu próprio
caminho».
Esta que indiquei é uma aplicação, por assim dizer, de «amplo alcance», da parábola. Mas,
quase sempre, as parábolas de Cristo têm também uma explicação de curto alcance, ou no
nível individual: aplicam-se a cada pessoa, não só à humanidade ou à cristandade em geral.
Somos convidados a perguntar-nos: que destino eu reservei para Cristo em minha vida? Como
correspondo ao incompreensível amor de Deus por mim? Por acaso não o joguei para fora da
minha casa, da minha vida... ou seja, eu o esqueci, ignorei?
Lembro que um dia eu estava escutando esta parábola durante uma Missa, enquanto estava
bastante distraído. Chegado ao ponto em que se ouve o dono da vinha dizer para si: «Ao meu
filho eles vão respeitar», tive um sobressalto. Entendi que aquelas palavras estavam dirigidas
a mim, naquele momento. Agora o Pai celeste estava a ponto de mandar-me seu Filho no
sacramento de seu Corpo e de seu Sangue; será que eu havia compreendido a grandeza do
momento? Estava preparado para acolhê-lo com respeito, como o Pai esperava? Aquelas
palavras me tiraram bruscamente dos meus pensamentos...
Na parábola dos vinhateiros homicidas há um sentido de amargura, de desilusão. Certamente
não se trata de uma história com final feliz! Mas ao lê-la em profundidade, percebemos que
ela fala do amor incrível de Deus por seu povo e por cada uma de suas criaturas. Um amor
que no final, inclusive através dos diversos episódios de extravio e retorno, sairá sempre
vitorioso e terá a última palavra.
As rejeições de Deus nunca são definitivas, são abandonos pedagógicos. Também a rejeição
de Israel que ressoa veladamente nas palavras de Cristo, «o Reino de Deus vos será tirado e
será entregue a um povo que produza frutos», pertence a este gênero, como o descrito por
Isaías na primeira leitura. Vimos, por outro lado, que este perigo afeta também a cristandade,
ou pelo menos muitas partes dela.
São Paulo escreve na Carta aos Romanos: «Pergunto, então: Acaso rejeitou Deus o seu povo?
De maneira alguma. Pois eu mesmo sou israelita, descendente de Abraão, da tribo de
Benjamim. Deus não repeliu o seu povo, que ele de antemão distinguiu! Desconheceis o que
narra a Escritura, no episódio de Elias, quando este se queixava de Israel a Deus: Senhor,
mataram vossos profetas, destruíram vossos altares. Fiquei apenas eu, e ainda procuram tirarme a vida?».
Na semana passada, em 29 de setembro, os irmãos judeus celebraram sua festa mais
importante, o Fim de Ano, chamado por eles de Rosh Ha-shanà. Quero aproveitar esta
ocasião para fazer-lhes chegar meu augúrio de paz e de prosperidade. Com o apóstolo Paulo,
eu também grito: «Que haja paz em todo o Israel de Deus».
[Tradução: Élison Santos. Revisão: Aline Banchieri]