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Caderno2 SALVADOR, DOMINGO, 27/7/2008 DIVULGAÇÃO EDITORCOORDENADOR Adalberto Meireles EDITOR Eduardo Bastos CINEMA ❙ O filme Amar... Não Tem Preço traz no elenco a atriz francesa Audrey Tautou, a doce protagonista de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain. Agora, ela vive uma oportunista numa trama bem-humorada que mistura romance e malícia | 5 | LÚCIO TÁVORA | AG. A TARDE [email protected] ALEX PINHEIRO | DIVULGAÇÃO | 6| JOÃO SERENO FAZ SHOW NO MERCADO DO RIO VERMELHO MÚSICA ❙ Chega às lojas amanhã o CD Roberto Carlos En Vivo, com registros dos shows que o cantor fez em maio do ano passado em Miami. São 17 canções, a maioria com versões em espanhol de sucessos antigos do Rei, além do tango El Dia Que Me Quieras | 8 | MÚSICA ❚ Erudito, popular, universal. A tradição em torno do mais democrático instrumento se mantém em tempo de alta tecnologia Todos os sons do violão REPRODUÇÕES DO LIVRO VIOLÕES DO BRASIL, DE MYRIAM TAUBKIM Nas oficinas brasileiras, violões, assinados por luthiers de prestígio, são cobiçados por grandes violonistas LAURA DANTAS [email protected] É fácil dizer, sem medo de errar, que o violão é o mais democrático e difundido dos instrumentos utilizados na música brasileira. Difícil é descobrir o que há de tão enigmático por trás do som que ele produz e que atrai gente das mais diversas formações e sensibilidade musical. Há exemplos em que a paixão pelo violão, aliada a uma profunda dedicação, se converte em preciosos trabalhos de pesquisa. É o caso do professor e violonista Thales Guimarães, que está entre os poucos, no Brasil, dedicados à produção sistematizada de um vasto material em áudio sobre o assunto. Até o momento, ele já gravou, editou e disponibilizou para download cerca de 80 programas em mp3 sobre a trajetória do violão, contada de forma cronológica a partir da história de seus ícones, entre compositores e intérpretes. “Como gosto muito de história e gosto muito de violão, percebi que o que acontece no universo do violão é muito grande e eu não sabia nada. Não sabia quem era Francisco Tárrega, Julian Arcas, David Russell, Gaspar Sanz. Tocava as partituras, mas, e aí? Quem é aquele compositor, em que contexto histórico e cultural ele viveu, qual foi a sua contribuição para o violão?”, explica Thales que, depois de maturar a idéia, resolveu lançar, em 2006, o site www.mundoviolao.hpg.com.br. COMPLEXIDADE – Popular e acessível, o violão é também reconhecido como um dos mais complexos para a execução. De múltiplas funções (harmônicas, melódicas e percussivas) e incapaz de afinar perfeitamen- ❛ “Escola pode ser a maneira de se tocar. Tárrega não deixou nada escrito, mas descobriu novos sons no instrumento, deu uma contribuição importantíssima“ Thales Guimarães, violonista ❚ te – os intervalos são ajustados a partir de um sistema de temperamento de notas –, é o instrumento que, em linguagem erudita ou popular, traduz a personalidade de quem o toca. Num piano, por exemplo, a nota é extraída diretamente por uma espécie de martelo que é ativado através do teclado. No violão, são os dedos que cumprem essa função. “É você que faz o som. Sua unha vai interferir, o modo como você pega, a força”, declara a violonista e compositora Badi Assad ao livro Violões do Brasil, reeditado, em 2007, pelo Sesc-Senac de São Paulo. “Produzir som no violão é uma ciência extremamente complicada (...). Você tem a freqüência do vibrato, você tem a mão direita que é um enigma”, reitera Turíbio Santos na mesma publicação | Continua na página 3 SALVADOR, DOMINGO, 27/7/2008 | CADERNO 2 3 | CONTINUAÇÃO DA CAPA ❚ Apenas o Brasil usa a palavra violão – em inglês, chamado guitar – para denominar o instrumento Uma viola grande LAURA DANTAS [email protected] Apesar de a palavra violão ter sido cunhada pelos portugueses, somente os brasileiros usam o termo para designar o instrumento que, em outras lugares, é conhecido como guitarra ou guitar (inglês), guitare (francês) e chitarra (italiano). “Os portugueses, quando invadiram o Brasil, trouxeram a viola, intrumento parecido com a guitarra espanhola e equivalente à viola caipira brasileira. Quando os espanhóis entraram aqui e os portugueses viram a guitarra a denominaram de violão, ou seja, uma viola grande”, explica Thales, que discorda da teoria de que a palavra ‘guitarra’ tem origem grega. “Existe a idéia de que o nome é descendente da khitara grega, mas não tem nada a ver. É muito parecido, mas a khitara é um instrumento que veio do Oriente Médio, foi introduzido na Europa através dos romanos, foi para a Península Ibérica e se derivou em vários instrumentos como a cítara, a mandola, a guitarra latina. O alaúde se derivou na Península Ibérica em guitarra mourisca, mas não conseguiu sobreviver, e a guitarra latina se transformou no que está aí”, diz. Mesmo entre musicólogos, não há muita clareza quanto ao assunto. Mário de Andrade, por exemplo, escreveu no seu Dicionário Musical Brasileiro que a origem do violão é mozárabe. Já outros historiadores acreditam que o violão descende da vihuela espanhola, que floresceu no período renascentista e que remonta à Grécia Antiga. É consenso, no entanto, que instrumentos gregos e árabes coexistiram na região desde a época medieval. EXPOENTES – Brasil e Espanha, como disse o violonista Turíbio Santos, “são dois casos espetaculares” de países em que a tradição do violão vem sendo, respectivamente, criada e transformada. Neles estão concentrados compositores e intérpretes que revolucionaram e continuam a mudar a história do instrumento. De acordo com a organização cronológica apresentada no site do professor Thales, o primeiro vihuelista catalogado vem exatamente da Espanha, Luiz Milan (1500-1561). E mesmo que o primeiro alaudista (Vincenzo Capirola, 1474-1548) e o primeiro guitarrista (Francesco Corbetta, 1615-1681) listados sejam italianos, sem dúvida os espanhóis, a partir de Julian Arcas (18321882), predominam na cena violonística. Entre eles, Francisco Tárrega (1852-1909), que criou métodos revolucionários de execução, entre eles o de usar a ponta dos dedos, em vez de unhas, para tocar o instrumento. Na América do Sul, nomes como Augustin Barrios (Paraguai, 1885-1944) e João Pernambuco (Brasil, 1883-1947) deixaram obras memoráveis. Sobre as partituras deste último, a propósito, Heitor Villa-Lobos (1887-1959) chegou a afirmar que Bach não teria vergonha de assiná-las. Autor de clássicos como Sons de Carrilhões, presente em quase todos os repertórios eruditos ou populares de violão, Pernambuco era admirado por Villa-Lobos, que, por sua vez, se tornou um referencial obrigatório no século XX. Os 12 estudos para violão, escritos por ele e dedicados a Andres Segovia, são um marco e uma contribuição definitiva para o repertório do instrumento. PADRÃO – A maioria dos estudiosos do violão, quando perguntados se é possível se falar de um grande violonista, não demoram em afirmar que não há o melhor violonista. “Não temos como dizer isso porque tem uns que são muito rápidos e limpos, tem outros muito rápidos e mais musicais, outros que são melhores na música latina, então tecnicamente falando, existem grandes violonistas no mundo todo, mas eu concordo com David Russell, que é um grande violonista, quando ele diz que está tudo muito nivelado. Depois de Segovia, não houve mais um grande gênio, e seria uma injustiça falar de um grande violonista, há grandes violonistas”, diz Thales. O compositor Guinga, prestigiado também como instrumen- ❛ “Acho muito pesado falar em ‘erudito’. Acho importante a criatividade, seja ela clássica ou popular – clássica no sentido de perdurar pelos anos. Carinhoso é um clássico. Então, pra mim, não interessa se é popular ou erudita, importa se é bonita e bem-elaborada” EM PARTES BRAÇO Barra de madeira resistente à tração O violão: trajetória, uso e especificidades TARRAXAS (ou cravelhas) Parafusos que servem para retesar e afinar as cordas TRASTES (ou trastos) Filetes de metal colocados ao longo do braço para dividi-lo em série de casas, indicando a localização das notas musicais. Cada casa equivale a um semitom CORDAS Feitas de nylon ou aço. Pressionadas, produzem os acordes do instrumento. O jogo mais tradicional, de baixo para cima: Mi, Si, Sol, Ré, Lá, Mi CORPO (faixas laterais, fundo e tampo) Diferentes madeiras se combinam para resultar numa determinada sonoridade ABERTURA (boca) É a saída por onde se propaga o som do instrumento RASTILHO Firma a afinação e o timbre das notas NOMES – Para o vice-diretor do Instituto de Música da Católica Josmar Assis, regente da Orquestra de Violões da Bahia, é impossível citar apenas um nome. “Aqui na Bahia, nós temos o Mario Ulloa, que é um espetáculo, temos o Chenot, que é muito bom também e faz uma coisa muito completa entre o popular e o clássico. Todos são bons, só que cada um no seu estilo”. A Orquestra de Violões, fundada por Josmar em setembro de 1996, possui hoje 16 violonistas. “A princípio criei um quarteto com alunos, depois mais quatro e achei que poderia crescer. Escutei uma orquestra de bandolins da Alemanha e me entusiasmei e disse, posso fazer isso com violão também”, conta, ao explicar que, no grupo, os violões soam com a função de quarteto de cordas. Segundo Assis, hoje, os matriculados no curso livre de violão do Instituto de Música da Católica são na proporção de 100% para 30% de alunos de piano. “Houve uma evolução muito grande do violão e eu já falei em determinada ocasião que o violão superaria o piano, não em beleza, mas em recursos porque, com o crescimento vertical das moradias, com a lei do silêncio e com o custo de um instrumento, todos esses fatores vieram favorecer o violão. O violão você carrega, mas ninguém carrega um piano”, considera. ONDE ESTUDAR | ESCOLA DE MÚSICA DA UFBA(3283-7885) | Rua Basílio Gama, s/n, Canela | Inscrições para o curso livre até o dia 29/7 | R$ 10 (taxa de inscrição) + R$ 330 (semestralidade) | Período mínimo: 6 meses | Instituto de Música da UCSal (3329-8100) | Rua Carlos Gomes, 400, Centro | Inscrições para o curso livre a partir de 1º/8 | R$ 70 (mensalidade) | Período mínimo: 6 meses CAVALETE (ponte) suporte em geral de madeira. Prende as cordas ao corpo do violão TEXTO Laura Dantas EDITORIA DE ARTE / A TARDE STUDIOS LAFE Origem | Não se pode afirmar com certeza a proveniência do formato atual do instrumento. As teorias mais recorrentes remontam às culturas grega e árabe ❚ Nomenclatura | A palavra violão só é conhecida na língua portuguesa e, somente no Brasil, ela é usada para designar o instrumento que, no resto do mundo, é conhecido como guitarra ❚ Estilo | Grandes violonistas estão concentrados no Brasil e na Espanha, tanto no erudito quanto no popular ❚ Josmar Assis, violonista ❚ tista, confessa em depoimento ao livro Violões do Brasil: “Às vezes, não consigo tocar direito aquilo que imagino”. Para Thales, não há atualmente grandes gênios do instrumento. “Henrique Pinto, grande pedagogo e violonista de São Paulo, quando esteve aqui na Ufba, disse que hoje parece tudo feito em série, cheio de violonista fazendo concerto, todo mundo toca as mesmas músicas igualzinho, tudo bonitinho, as notinhas exatamente como o compositor indicou, mas não há mais um Segovia, não há mais um Julian Brean”, diz. EM RESUMO DAVID ZING | DIVULGAÇÃO MICHAEL WEINTROB | DIVULGAÇÃO Três importantes escolas do violão brasileiro: Dilermando Reis, Baden Powell e João Gilberto FERNANDO VIVAS | AG. A TARDE | 21.11.2007 Um retrato da presença do violão brasileiro A segunda edição revista e ampliada do livro Violões do Brasil, organizado por Myriam Taubkin e lançado pelo Sesc-Senac São Paulo, traça um panorama bastante abrangente da presença do violão na música brasileira. Em edição de luxo, conta com belas fotografias de oficinas de luteria e detalhes do instrumento, como a capa que traz a rosácea de um violão de seresta Silva, de 1935. Instrumento que pertence hoje ao músico Paulo Bellinati. Dividida em quatro capítulos, a publicação traz como anexo informações e contatos de violonistas e luthiers em atividade no Brasil inteiro, num trabalho de pesquisa assinado por Morris Picciotto, Rodrigo Campos e Eloisa Elena. Myrian elegeu 19 mestres do instrumento, a exemplo de Canhoto da Paraíba, Garoto, Luiz Bonfá, Baden Powell, Dilermando Reis, Dino 7 Cordas e Rosinha de Valença, para traçar um perfil que engloba ainda a discografia de cada um deles. Em outra sessão, Turíbio Santos discorre sobre Villa-Lobos, enquanto o violonista Mauricio Carrilho escreve sobre o solista e acompanhador pernambucano Jaime Thomás Florence, o Meira, que foi professor de nomes como Baden Powell e Raphael Rabello. O capítulo 4 é dedicado a depoimentos de violonistas vindos de várias escolas e representantes do que se faz de mais significativo atualmente na área. Entre as declarações, destacam-se as de personagens praticamente desconhecidos hoje fora do círculo de compositores ou intérpretes do instrumento, como, por exemplo, Sérgio Abreu. Nos anos 80, ele trocou a carreira de concertista internacional ao lado do irmão Eduardo, no Duo Abreu, pela de luthier e se transformou, no Brasil, em dos mais importantes construtores de violão do mundo. “Fazer um bom violão é o mesmo mistério de qualquer coisa que se faça bem. Você tem que saber o que está fazendo, ter uma noção do todo e dos detalhes. É um organismo em que cada elemento tem uma função e que começa nas madeiras. A madeira dá potencial ao instrumento (...). Se a madeira é pobre, o instrumento, por mais bem feito que seja, é limitado. E, se a madeira for muito boa, ainda assim, se não for bem trabalhada, pode ser desperdiçada”, afirma. Sobre o violão econômico de João Gilberto – escola brasileira das mais difundidas no mundo, principalmente em países como o Japão –, comenta Turíbio Santos: “Ele tem uma precisão rítmica que é quase à beira da anormalidade. O que vou dizer não é pejorativo, estou dizendo em termos de excepcionalidade”. O livro ainda acompanha documentário em DVD. V iolões do Brasil Myrian Taubkin (org.) Editora Senac-SP 240 p. | R$ 85 editorasenac.com.br O violonista Thales Guimarães já gravou, editou e disponibilizou mais de 80 programas em mp3