Baixar este arquivo PDF

Transcrição

Baixar este arquivo PDF
CENTROS DE SERVIÇOS COMPARTILHADOS: UM ESTUDO SOBRE SUA
ADOÇÃO POR MUNICÍPIOS DA REGIÃO SUL DO BRASIL
Rodrigo Machado Corrêa1
Marcos Antonio de Souza2
Resumo
O objetivo deste artigo é identificar o uso da estratégia de gestão organizacional baseada na concentração e no
compartilhamento de serviços (CSC) pela administração pública de municípios da região sul do Brasil. Trata-se
de uma pesquisa de levantamento, com abordagens descritiva e qualitativa, cujos dados foram coletados
mediante questionários respondidos por gestores dos 102 municípios mais populosos da região sul do Brasil no
1º semestre de 2011. Os principais achados mostram que não foram identificados usos de CSC no âmbito da
amostra pesquisada. Contudo, identificou-se forte utilização dos consórcios públicos, como uma forma externa de
compartilhamento intermunicipal de atividades. Apesar da não utilização dos CSC no formato original, o
compartilhamento de atividades via consórcios concentra-se em 58 (56,9%) municípios da amostra, sendo 32
(55,2%) deles concentrados na área da saúde, com o estado do Rio Grande do Sul apresentando maior ocorrência
desse tipo de compartilhamento.
Palavras-chave: Gestão Pública. Centro de Serviços Compartilhados. Consórcios Públicos de Saúde.
SHARED SERVICE CENTERS: A STUDY OF ITS ADOPTION BY MUNICIPALITIES OF
SOUTHERN BRAZIL
Abstract
This paper aims to identify the use of organizational management strategy based on the shared services center
(CSC) by the government of municipalities in southern Brazil. This is a survey research, with descriptive and
quantitative approaches. Data were collected through questionnaires answered by managers of the 102 most
populous cities in southern region of Brazil in the 1st half of 2011. The main findings show that there is no
identified CSC uses by the sample surveyed. However, it was identified a strong use of public consortia as an
external form of concentration and sharing activities. Despite the don´t use of CSC in the original format, sharing
activities via consortia is concentrated in 58 (56,9%) municipalities in the sample, 32 (55.2%) of them
concentrated in health care, with state of Rio Grande do Sul showing higher occurrence of this type of sharing.
Keywords: Public Management. Shared Services Center. Health Public Consortia.
INTRODUÇÃO
A partir da segunda metade da década de 1990, conforme enfatiza Tomkinson (2007),
ganhou força, principalmente nos países desenvolvidos, uma nova estratégia operacional de
1
Mestre em Ciências Contábeis pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS. Professor da
Unilasalle. E-mail: [email protected]
2
Doutor em Controladoria e Contabilidade pela Universidade de São Paulo – FEA/USP. Coordenador e
Professor do PPGCC da Universidade do vale do Rio dos Sinos - UNISINOS
44
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
gestão, baseada na concentração e no compartilhamento de serviços em uma única unidade
física da organização, formando um Centro de Serviços Compartilhados (CSC).
A criação de centros executores dos serviços compartilhados é uma decorrência da
identificação de ineficiências provocadas pela duplicação de estruturas organizacionais
destinadas a executar individualmente atividades que eram comuns às outras unidades
organizacionais e à empresa como um todo (MATTHEW, 2009). Quinn, Cooke e Kris (2000)
afirmam que os CSCs não são apenas sinônimos de redução de custos, pois, com eles, pode-se
chegar à especialização da prestação de serviços, à escala de operações, à experiência em
processos, além da padronização de atividades e tarefas. Com isso, a organização atinge uma
excelência na prestação de serviços aos clientes, independentemente de serem internos e/ou
externos e com menores custos.
Asazu e Abrúcio (1999) explicam que a gestão pública também passou a ser orientada
para a otimização de resultados, incorporando, para tanto, práticas, instrumentos e técnicas de
gestão oriundas do setor privado. Esse novo modo de pensar a gestão governamental
contemporânea decorre do paradigma da New Public Management (NPM), um conjunto de
doutrinas administrativas que, segundo Bresser-Pereira (1998), revolucionou o conceito de
gestão pública em países desenvolvidos, a partir da década de 1970, e em países emergentes,
na década de 1990.
A denominada NPM, de acordo com Broadbent e Laughilin (2003), introduziu novos
conceitos no processo de gerenciamento dos recursos públicos voltados à sua otimização.
Entre os conceitos desse novo modelo de gestão, destacam-se, de acordo com Stewart e
Walsh (1996), os seguintes: (a) foco no cidadão como cliente; (b) realinhamento da missão
estatal; (c) orçamento baseado em resultados; (d) promoção da transparência dos atos
governamentais; (e) avaliação objetiva do gestor público. Depreende-se, portanto, de acordo
com as premissas citadas, derivadas basicamente da gestão de organizações privadas, que as
mudanças propostas pelo gerenciamento da gestão pública direcionam o Estado à otimização
de suas tarefas na busca do combate às ineficiências inerentes ao modelo burocrático até então
presente (BARZELAY, 2001).
Além do aspecto da melhor eficiência, conforme o estudo de Broadbent e Laughlin
(1997), a referida adequação dos serviços públicos tem como objetivo maior o atendimento
das demandas sociais, essencialmente quanto à qualidade do gasto público. Para tanto,
45
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
Janssen e Joha (2007) destacam o compartilhamento de serviços públicos como uma das
formas para otimizar os recursos públicos e melhor atender aos cidadãos.
No âmbito de aplicação dos serviços compartilhados na esfera governamental, os
estudos de Grant et. al. (2006), Redman et. al. (2007), Wang e Wang (2007), Dollery; Hallam
e Wallis (2008), Walsh, Mc Gregor-Lowndes e Newton (2008), Janssen, Joha e Zuurmond
(2009) fazem ampla abordagem dos potenciais benefícios que essa prática pode trazer à
eficiência e à eficácia da gestão pública. Conforme os autores, exemplos de CSCs bem
sucedidos na esfera pública incluem os seguintes: (a) National Business Center (EUA); (b)
National Finance Center (EUA); (c) Ontario Shared Service Center (Canadá); (d) National
Health Service (Reino Unido); (e) Quensland State Government (Austrália).
Dado o contexto apresentado, o objetivo geral do estudo é diagnosticar o uso, por parte
da administração pública municipal da região sul do Brasil, da estratégia de gestão
organizacional baseada na concentração e no compartilhamento de serviços (CSC). Quanto
aos objetivos específicos, destacam-se os seguintes: (a) identificar o atual emprego do CSC
pelos municípios; (b) atividades envolvidas no sistema CSC; (c) motivos da possível não
adoção do CSC; e (d) perspectivas de futura adoção do CSC.
A relevância do estudo é dada pela mudança de paradigmas e perfil da gestão pública,
principalmente no tratamento da gestão de recursos, objetivando maior eficiência e eficácia na
capacidade de atender aos anseios dos cidadãos. A principal contribuição, do lado prático, é
oportunizar a discussão de ações passíveis de incorporação pela gestão governamental como
forma de racionalização dos custos e melhora da qualidade dos serviços prestados; do lado
teórico, a discussão do tema provoca reflexões sobre a adequação e a praticabilidade dos mais
recentes desenvolvimentos teóricos sobre o tema em relação à estrutura da gestão pública até
então adotada.
Além desta introdução, o estudo também contém a apresentação de referencial teórico
relacionado ao tema, os principais procedimentos metodológicos adotados na pesquisa e
evidenciação e análise dos dados. O estudo é finalizado com a conclusão e as referências
utilizadas no seu desenvolvimento.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 NEW PUBLIC MANAGEMENT
46
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
Partindo da concepção de que o Estado é uma entidade econômica e, portanto, necessita
otimizar o uso dos recursos a ele locados, cada vez mais escassos, observa-se que a esfera
governamental está cada vez mais próxima da esfera privada no que tange ao gerenciamento
de suas atividades (ALONSO, 1999). Nesse sentido, tem-se que a New Public Management
(NPM) tornou-se uma filosofia conveniente para um conjunto de doutrinas administrativas
que dominaram a agenda da reforma da administração pública da maioria dos países da
Organization Economic Co-operations and Development (OCDE), a partir do final dos anos
1970 (HOOD, 1991; POLLITT, 1993; RIDLEY, 1996). A NPM, segundo Pollitt e Summa
(1997), pode ser definida como uma visão, uma ideologia ou um conjunto de abordagens e
técnicas de gestão específicas, oriundas do setor privado e aplicáveis às atividades estatais. O
objetivo é procurar alcançar, na gestão pública, a mesma eficiência e eficácia que determina a
continuidade ou não dos negócios na iniciativa privada.
Observa-se que a principal direção da NPM é a administração por resultados, isto é, a
otimização dos recursos públicos no atendimento às demandas sociais, exercida de forma
descentralizada e flexível, objetivando a otimização dos resultados financeiro, econômico e
patrimonial, além do orçamentário. Tem-se ainda, que a operacionalização do gerenciamento
na administração pública depende de processos e indicadores capazes de proporcionar a
avaliação de desempenho do ente público para a posterior responsabilização dos gestores
frente à aplicação dos recursos públicos, utilizando-se para tanto a figura dos centros de
responsabilidade (HOOD, 1991).
Especificamente quanto à aplicação de instrumentos gerenciais para a gestão de
atividades de suporte do Estado, os estudos de Dollery; Hallam e Wallis (2008), Walsh,
McGregor-Lowndes e Newton (2008), Sphoer, Burger e Barrett (2007), e Hyvönen et.al.
(2004), apresentam o CSC como um eficaz instrumento de execução e gerenciamento de
atividades.
Por fim, segundo Vigoda (2002), a evolução do movimento da NPM, ao pressionar o
modelo burocrático com vistas a tornar as organizações públicas mais responsivas para os
cidadãos, consistiu-se em um avanço importante na contemporânea administração pública.
Destaca-se, também, que as atividades de suporte, imprescindíveis à boa consecução das
atividades-fim do Estado, passaram a ser uma preocupação relevante na busca da qualificação
47
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
do gasto público, a exemplo do que tem ocorrido na iniciativa privada quanto à obtenção de
resultados que melhor remuneram os investimentos.
2.2
CENTROS DE SERVIÇOS COMPARTILHADOS: CONCEITOS E ORIGENS
Para Quinn, Cooke e Kris (2000), a origem do termo shared services foi evoluindo ao
longo do tempo. Um dos marcos reconhecido ocorreu em 1986, quando a General Electric
criou nos Estados Unidos um grupo conhecido como “Client Business Service”. Esse grupo
tinha características do que hoje se conhece como serviços compartilhados.
Segundo Ramos (2005), o termo shared services foi cunhado em 1990, quando
conduziu um estudo sobre as melhores práticas para a A. T. Kearney, o qual incluía pesquisa
em empresas como a Ford, Johnson & Johnson, IBM, AT&T, Nynex, Digital, Dupont,
Hewlett-Packard, Alcoa e Shell. Foi observada em comum nesses estudos a operação dos
serviços financeiros de forma compartilhada.
Para Ramos (2005) e Martins e Amaral (2008), o modelo de CSC no Brasil foi
introduzido no final dos anos 1990. Em 1999, o Grupo Camargo Corrêa implantou o CSC
como uma empresa independente, oferecendo serviços em dez áreas, dentre elas:
contabilidade, tecnologia da informação, jurídico, administração geral, suprimentos, saúde e
qualidade de vida. A Telemar em 2000, a Petrobrás em 2001, o Grupo Abril, o Banco
Bradesco e a Ambev em 2002, dentre outros, passaram a adotar os CSCs no processo de
gestão. Quinn, Cooke e Kris (2000) esclarecem que as empresas adotaram o processo de
descentralização das suas atividades como uma estratégia para organizar o seu crescimento,
contudo, tal descentralização acabou por provocar duplicação de atividades comuns e
crescimento dos custos. Foi nesse momento em que o CSC trouxe sua colaboração.
Conforme argumentado por Quinn, Cooke e Kris (2000), o CSCs não são apenas
sinônimos para a redução de custos, porque, com eles, um grupo de profissionais pode
alcançar a especialização nos serviços realizados, a escala de operações e a experiência em
processos, em adição à padronização e melhor qualidade de atividades e tarefas. Desse modo,
a redução de custos provocada pelo CSC é consequência de um conjunto de melhorias
realizadas no processo de trabalho e não apenas uma redução sem causa, arbitrária.
Assim, um CSC é um modelo de organização e realização de processos, pelo qual uma
área da empresa presta serviços a partir de um mesmo ponto de atendimento para várias
48
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
unidades ou departamentos da corporação. Cabe ressaltar, no entanto, que a unidade da
organização destinada aos serviços compartilhados não é uma mera centralização para
realização de atividades de apoio e que atua sem a identificação da real necessidade de cada
uma das áreas envolvidas no compartilhamento. Tampouco é uma simples terceirização de
serviços, que visa apenas transferir a responsabilidade de atividades transacionais a terceiros.
Nesse sentido, a principal característica do CSC é ser uma unidade orientada para as
necessidades de seu cliente interno e/ou externo, buscando qualidade, racionalização e
maximização da utilização de recursos (JANSSEN; JOHA, ZUURMOND, 2009), evitando
atividades repetitivas em várias partes da empresa. Ou seja, o CSC também passa a ser uma
unidade de negócio, com receitas (cobradas dos clientes internos) e custos de execução.
Com a criação de um CSC, as unidades de negócios passam a focar em sua atividadefim enquanto o CSC passa a administrar os recursos e executar as atividades de suporte,
buscando a excelência na prestação de serviços. Ademais, inobstante à recorrente utilização
dos CSCs no setor privado, conforme pesquisa realizada por Bywater (2001) com 200
empresas selecionadas entre as 500 maiores listadas pela revista Fortune, também o setor
público vem fazendo uso desse instrumento de gestão contemporâneo, principalmente nos
países em que a NPM já se encontra incorporada na gestão governamental.
Embora a literatura pesquisada não indique marco temporal no surgimento dos CSCs na
gestão pública, é possível fazer um paralelo entre o início da utilização deles pelos governos e
a evolução dos modelos de administração pública. Tomkinson (2007) refere que a primeira
experiência, ocorrida no Reino Unido, teria começado a partir de 1997, e, conforme já
comentado, a NPM favoreceu a adoção das práticas de serviços compartilhados em âmbito
governamental ao preconizar a incorporação de técnicas e ferramentas oriundas da esfera
privada. Ainda conforme Tomkinson (2007), esse movimento também se verificou em países
como Canadá, Estados Unidos, Austrália, Irlanda, Escócia, Inglaterra, Holanda, Alemanha,
França, Itália, Espanha e África do Sul, que alcançaram a melhoria dos serviços públicos e a
redução dos custos associados.
De acordo com as experiências internacionais de modernização da estrutura
governamental por meio de CSCs, as atividades de BackOffice mais comumente
compartilhadas são: (a) tecnologia da informação; (b) gerenciamento financeiro; (c) assessoria
jurídica; (d) folha de pagamento; (6) recursos humanos; (f) compras; (g) contabilidade e
auditoria; e (h) gerenciamento tributário (MARSHAL, 2009, JANSEN; JOHA, 2006;
49
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
WHITFIELD, 2007). Nesse sentido, importa destacar que a implantação de um CSC no setor
público é mais complexa do que no setor privado, uma vez que o compartilhamento de
serviços, dada a natureza particular da gestão governamental, reveste-se de uma série de
desafios e burocracias específicos. Janssen e Wagenaar (2004) enumeram três limitadores
principais, quais sejam: (a) investimentos iniciais insuficientes, devido a possíveis restrições
orçamentárias; (b) falta de compromisso dos gestores para mudanças de longo prazo,
ocasionadas tanto pela sazonalidade eleitoral quanto pela transferência de agendas políticas; e
(c) pouca adaptabilidade cultural entre ‘serviços sob demanda’, caracterizados pela
negociação de preços, volumes e padrões, inerentes ao compartilhamento de serviços, além da
metodologia de trabalho baseada pelo fornecimento, comumente utilizados na esfera pública.
2.3 EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS DA UTILIZAÇÃO DE CSC NA GESTÃO
PÚBLICA
2.3.1 Alguns aspectos da experiência norte-americana
A utilização de CSC pelo governo federal norte-americano tem suas raízes na interagency cross-servicing e nas iniciativas de consolidação administrativa que ocorreram na
década de 1980, como parte da reforma administrativa promovida pelo então presidente
Ronald Reagan (MARSHAL, 2009). A folha de pagamento foi um dos primeiros alvos de
oportunidade dos CSCs americanos. Preliminarmente, mediante à modernização do
processamento de folhas de pagamento dos Departamentos de Agricultura e do Interior, estes
passaram a oferecer serviços também a clientes externos. Além dos CSCs, afetos às atividades
de folha de pagamento, foram criados centros de serviços financeiros e administrativos em
vários departamentos. Exemplificativamente tem-se o Departamento de Comércio, no qual
quatro centros regionais foram criados por meio da consolidação de funções administrativas
de várias agências (JANSSEN; WAGENAAR, 2004).
Dando continuidade ao processo de implementação de CSCs no governo americano, e
considerando que a utilização de CSCs em âmbito federal tem sido defendida tanto pelas
administrações republicanas quanto pelas democratas, outros esforços foram empreendidos
com vistas ao incremento do compartilhamento de serviços nos EUA. Pode-se citar o
"Reinvented Government", programa liderado pelo vice-presidente Al-Gore, em meados da
década de 1990. Já em 2001, esses esforços foram revigorados com a Bush-43
50
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
Administration’s President’s Management Agenda (PMA), que levou a adoção de serviços
compartilhados por meio da iniciativa de governo eletrônico, e, novamente, em 2004, com o
anúncio do programa Line of Business (Lob’s) (MARSHAL, 2009).
Tais esforços resultaram na proliferação de CSC em todos os níveis de governo nos
EUA. Segundo Whitfield (2007), alguns exemplos incluem o Internal Revenue Service’s
Office of Agency-wide Shared Services, o NASA Shared Service Center e o US Postal Services
Shared Services Organization.
Iniciativas federais de compartilhamento de serviços produziram resultados salutares,
contudo, existem poucos dados fiáveis que permitam uma avaliação fidedigna. O Office of
Management and Budget (OMB) estimou uma redução de custos de mais de US$ 5 bilhões ao
longo de um período de 10 anos (OMB, 2011). O U.S. Postal Service reportou uma redução
de seu custo de financiamento da ordem de 16% a 18% e uma economia anual de US$ 50
milhões em serviços de RH (ACCENTURE, 2006). Já a NASA anunciou uma economia de
US$ 43 milhões no ano de 2008 (NASA, 2009).
2.3.2 Alguns aspectos da experiência australiana
No âmbito da gestão australiana, particularmente no compartilhamento de serviços no
estado de Queensland, em sua capital Brisbane, ressalta-se que ocorre o compartilhamento de
serviços por meio de CCSs em todos os estados australianos, destacando-se os seguintes:
Western Austrália, New South Wales e Vitória.
Especificamente quanto à Queensland, tem-se que, em julho de 2003, o governo do
Estado apresentou uma iniciativa de Serviços Compartilhados como uma resposta aos
desafios da maximização de custo-efetividade, dada a crescente demanda de serviços
públicos. Tal processo decorre da reestruturação administrativa do estado, transferindo
serviços corporativos comuns, tradicionalmente realizados no âmbito de cada órgão do
governo estadual aos prestadores de serviços compartilhados (HYVÖNEN et.al., 2004).
As funções compartilhadas no âmbito dessa iniciativa, conforme Hyvönen et al., (2004),
incluem: (a) Finanças (b); Contratos; (c) Recursos Humanos (incluindo folha de pagamento),
(d) gestão de documentos e registros; (e) gestão de propriedades e instalações; (f) sistemas
corporativos capazes de suportar essas transações. Notam-se aqui muitas semelhanças com os
exemplos dados por Marshal (2009), Jansen e Joha (2006) e Whitfield (2007).
51
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
Os principais benefícios alcançados pelo governo de Queensland remetem a economias
de escala, redução de atividades duplicadas, consolidação e aperfeiçoamento tecnológico.
Para tanto, o governo de Queensland estabeleceu seis prestadores de serviços compartilhados.
O número desses prestadores já foi reduzido a quatro (Shared Services Agency, Queensland
Health Shared Service Partner, Corporate and Professional Services e Corptech). O Governo
do Estado computa, ainda, que as poupanças resultantes de iniciativas de serviços
compartilhados no biênio 2004/2005 foi de AS$ 10 milhões e AS$ 18 milhões
respectivamente, desde o início da iniciativa (JANSSEN, JOHA E ZUURMOND, 2009).
Além dos mencionados CSCs, o Governo de Queensland mantém a Corporate
Administration Agency (CAA), com vistas ao fornecimento de uma gama de serviços de
suporte corporativo para órgãos sociais dentro do portfólio de artes. A CAA foi criada em
1997 e é uma subdivisão do Department of Premier and Cabinet. A base de clientes da CAA
tem se expandido ao longo dos anos e, atualmente, presta serviços para cerca de vinte
agências do governo estadual nas seguintes áreas: (a) serviços financeiros; (b) serviços de RH
/ Folha de Pagamento; e (c) Gestão de informação. Destaca-se, ainda, que o CAA foi
reconhecido pela Shared Services Excellence Awards 2008 como a melhor organização de
serviços compartilhados. O anúncio foi feito em Sydney, em 29-04-2008, por ocasião da 11º
Cúpula Anual de Serviços Compartilhados (CAA, 2012).
Alguns dos principais benefícios, aperfeiçoamentos, ações e resultados alcançados pelo
estabelecimento de CSCs, no estado de Queensland, estão listados na CAA (2012), a saber:
(a) Entrega de significativos retornos financeiros ao governo (mais de AS$ 100 milhões até
2011) e significativas reduções de custos em folha de pagamento, TI e aquisições; (b)
Desenvolvimento do portal de serviços compartilhados com vistas ao fornecimento de
informações on-line acerca de sistemas e estruturas; (c) Redesenho abrangente de gestão de
recursos financeiros e humanos; (d) Implementação de processos para alcançar uma maior
padronização entre os órgãos de Governo, resultando em um mapeamento detalhado de novos
processos e requisitos de negócios; (e) Desenvolvimento de uma metodologia comum de
custos e preços e estabelecimento de taxa de serviço para provedores de serviços
compartilhados; (f) Consolidação de servidores que executam aplicativos de finanças e RH.
Como pode ser observada pelos casos citados, a implantação da sistemática do CSC tem
potencial de contribuir significativamente, também, na gestão pública (ineficiente por
natureza), assim como já contribui para as atividades da iniciativa privada.
52
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
2.3.3 Alguns aspectos da experiência em outros países
Além dos exemplos norte-americanos e australianos apresentados mais detalhadamente,
exemplos também são encontrados em outros países (Nova Zelândia, Reino Unido e Europa),
conforme estudo de Drew (2011).
Ferreira, Bresciani e Mazzali (2010) também fazem referência à ampla aplicação do
CSC em outros países (Escócia, França, Itália, Espanha, África do Sul e Singapura), ao
mesmo tempo em que destaca a ainda incipiente iniciativa desse instrumento na gestão
pública brasileira.
3 PRINCIPAIS ASPECTOS METODOLÓGICOS
3.1
CLASSIFICAÇÃO DA PESQUISA
O desenvolvimento do estudo baseou-se no método indutivo de pesquisa para a busca
de solução do problema enunciado (GIL, 2009). Esse é o método predominantemente adotado
nas pesquisas empíricas, pois, por meio dele, busca-se formar ou validar a teoria (GIL, 2009).
Quanto à sua natureza, é uma pesquisa aplicada, pois visa gerar conhecimentos para aplicação
prática e para solução de problemas específicos (COLLINS; HUSSEY, 2005). Dados os
objetivos, o estudo é exploratório-descritivo, visto que pretende encontrar informações sobre a
questão ou o problema através da descrição (COLLINS; HUSSEY, 2005). Locke et al. (1998)
destacam que o estudo exploratório é uma extensão da pesquisa descritiva usada na
identificação das características de um determinado problema (COLLINS; HUSSEY, 2005).
O presente estudo caracteriza-se pela predominante utilização de abordagens
qualitativas, apesar de alguns indicadores quantitativos. Qualitativa porque se preocupa com a
descrição direta da experiência tal como ela é. E parcialmente quantitativa, dado que o
procedimento de análise e interpretação de dados deu-se mediante uso de dados em
porcentagens, e ranking médio da escala do tipo Likert, sem avançadas técnicas estatísticas.
53
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
3.2
COLETA DE DADOS
Para a consecução dos objetivos da pesquisa, e a partir do referencial teórico, foi
elaborado um instrumento de pesquisa com perguntas fechadas e assertivas fechadas, com
escalas do tipo Likert de cinco posições, em que o respondente manifesta o seu grau de
discordância ou concordância em relação a cada assertiva. A legenda da escala adotada
correspondeu a: (1) discordância plena; (2) discordância parcial; (3) neutralidade; (4)
concordância parcial; e (5) concordância plena. A escala adotada foi utilizada para o cálculo
do ranking médio (RM), com base no método da média ponderada.
Na elaboração do instrumento de pesquisa, as perguntas abertas centralizaram-se no
perfil do respondente e do município. As assertivas fechadas e de múltipla escolha, na forma
de escala, compuseram as questões mais diretamente relacionadas ao tema da pesquisa.
Além da identificação do município, houve a divisão em quatro blocos, quais sejam:
(1) perfil acadêmico e profissional do respondente; (2) práticas de gestão pública; (3)
compartilhamento de serviços; e (4) percepções do respondente quanto ao ambiente
organizacional municipal para uso do compartilhamento de atividades. Para validação do
instrumento realizou-se pré-teste com gestores públicos das áreas de controladorias e
secretarias de planejamento e gestão de três prefeituras não pertencentes à amostra. As
principais alterações sugeridas foram: (a) readequação dos itens que compuseram os blocos
dos questionários; e (b) inclusão, exclusão e mudança de redação de questões, com vistas a
um melhor entendimento.
O Quadro 14 contempla o direcionamento do questionário utilizado no que se refere
ao alcance dos objetivos propostos, bem como elenca as principais obras que forneceram o
suporte conceitual adequado à construção do instrumento de coleta de dados.
Apesar da estrutura montada para uso da plataforma Google docs, apenas três
respondentes retornaram os questionários preenchidos. Considerando esse baixo índice de
retorno, fez-se necessário o contato telefônico com os respondentes, com o intuito de: (a)
apresentar a pesquisa; (b) motivar o gestor para a participação; (c) aplicar o questionário,
nesse caso, um questionário assistido (GROVES; KANH, 1994; FONTANA; FREI, 1997;
RAENTO; OULASVIRTA; EAGLE, 2009). A confiabilidade e a validade da participação
telefônica dos respondentes ocorreram pela confirmação deles mediante resposta de e-mail
endereçado a eles citando dia e horário da participação.
54
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
Quadro 1- Principais aspectos balizadores do questionário de pesquisa
BLOCO
BLOCO
1
Perfil
Respondente
Finalidade e objetivo
–
Caracterizar o perfil
do
do respondente.
Verificar o nível de
conhecimento
dos
BLOCO
2
–
gestores acerca das
Práticas de Gestão
práticas gerenciais de
Pública
gestão,
conforme
preceitua a NPM.
Verificar a existência
do compartilhamento
ou não de atividades
entre municípios; os
BLOCO
3
–
motivos
para
o
Compartilhamento
compartilhamento ou
de Serviços
não; as atividades
compartilhadas; e a
forma
de
compartilhamento.
Verificar o ambiente
BLOCO
4
– organizacional
Percepções
do pesquisado acerca dos
requisitos necessários
Respondente
acerca
do para a implementação
e/ou manutenção de
ambiente
um compartilhamento
organizacional
intermunicipal
de
municipal
atividades.
Utilidades para a pesquisa
Possibilitar o delineamento do
perfil dos respondentes, de
forma
a
assegurar
a
confiabilidade da fonte dos
dados.
Possibilitar a caracterização das
movimentações mais recentes
na formatação de instrumentos e
práticas da gestão pública;
Permitir a identificação dos
possíveis impactos afetos aos
fatores organizacionais, legais e
sociais, na adoção ou não de
compartilhamento de atividades
pelos municípios.
Proporcionar a identificação, no
âmbito da gestão municipal
pesquisada, da ocorrência ou
perspectiva de adoção dos
CSCs;
Proporcionar a identificação das
atividades
suportadas
pelo
compartilhamento de serviços
nos municípios pesquisados;
Possibilitar a identificação das
principais dificuldades para o
compartilhamento de processos
nos entes pesquisados.
Permitir a caracterização das
movimentações mais recentes,
segundo a percepção do
respondente, na formatação de
instrumentos e práticas da
gestão pública;
Proporcionar a identificação dos
possíveis impactos dos fatores
organizacionais, legais e sociais,
segundo a percepção dos
respondentes, na adoção ou não
dos CSCs nas atividades de
gestão
dos
municípios
pesquisados;
Permitir a identificação dos
principais argumentos, segundo
a percepção do respondente, que
justificariam o início do
compartilhamento de atividades.
Obras
embasaram
construção
questões
que
a
das
Ckagnazarof (2002)
Barzelay
(2001);
López (2006); e
Hood (1991)
Grant; McKbight e
Uruthirapathy
(2007); Wang e
Wang
(2007);
Quinn, Cooke, e
Kris
(2000);
e
Janssen; Joha; e
Zuurmond (2009).
Souza
(2002);
Barzelay (2001); e
Deloitte
Touche
Tohmatsu (2013)
Fonte: Dados de pesquisa
55
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
A amostra limitou-se aos municípios dos três estados da região sul do Brasil, cuja
população, considerando a estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística –
IBGE realizada em 2011, fosse superior a 50.000 habitantes, totalizando 102 municípios.
Procurou-se com esse perfil atender aos quesitos de Salles (2010), o qual explica que o CSC
representa um arranjo organizacional específico a grandes corporações. Portanto, dada a
equiparação Estado-empresa, já comentada, selecionou-se os municípios supostamente, com
estruturas e processos mais complexos e que, em princípio, seriam os candidatos naturais à
adoção do CSC.
Já quanto à opção pela análise de municípios pertencentes aos Estados da região Sul do
Brasil, destacam-se: (1) o vínculo institucional dos autores com IES da região; e (2) a análise
de um bloco territorial unido geograficamente, com um perfil socioeconômico e cultural
semelhante, prevenindo possíveis distorções oriundas da análise de amostras heterogêneas.
Apresenta-se, na Tabela 1, uma caracterização resumida da amostra selecionada, sob
os aspectos populacionais e econômicos, segundo os critérios anteriormente descritos.
Tabela 1 - Caracterização da amostra
Caracterização
Número de Municípios
População Total (milhões)
PR
399
10.6
RS
496
10.8
SC
293
6.1
Total
1.188
27.5
PIB total (R$ milhões)
179.3
199.5
123.3
502.1
Municípios acima de 50.000 habitantes
33
43
26
102
População amostral (milhões)
6.3
6.9
3.8
17.0
PIB amostral (R$ milhões)
128.6
135.4
86.3
350.3
Percentual Amostra/População
59,9%
63,2%
63,0%
61,9%
Percentual PIB Amostra/População
Fonte: IBGE (2013)
71,8%
67,9%
70,0%
69,8%
Observa-se, pela caracterização da amostra apresentada na Tabela 1, que ela é
expressivamente representante do conjunto da população que se pretende pesquisar. Nota-se,
também, que todos os municípios com população acima de 50 mil habitantes participam da
pesquisa.
Foi estabelecido o critério populacional como variável de controle na segregação,
optando-se pelos municípios com população igual ou superior a 50.000 habitantes. Ainda
quanto à justificativa da escolha populacional como variável, além dos argumentos de Sales
(2010), tem-se que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) impôs exigências específicas para
56
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
os municípios com essa população. Depreende-se que tais municípios necessitam de
estruturas eficientes no que concerne à entrega de obrigações acessórias aos órgãos de
controle.
3.3
ANÁLISE DOS DADOS
Finda a tabulação dos dados coletados, procedeu-se objetivando uma possível
correlação com as respostas obtidas, a coleta de variáveis ambientais que caracterizassem o
município sob os aspectos populacionais, econômicos e organizacionais. Tais variáveis,
considerando 2012 como o ano-base, foram extraídas do IBGE (2013).
A seguir, finalizadas as tabulações necessárias à organização dos dados coletados,
iniciaram-se os procedimentos de tratamento estatístico e análise dessas informações.
Preliminarmente, efetuou-se uma análise de conteúdo das respostas do questionário. Bardin
(2004) afirma que tal técnica é a expressão mais comumente usada para representar o
tratamento dos dados e das evidências qualitativas. Além disso, considerou-se a necessidade
de interpretação e análise das respostas relacionadas às perguntas de múltipla escolha com
final aberto, devido ao aspecto subjetivo ensejado por essa espécie de questionamento. Da
mesma forma que as perguntas fechadas, tais dados também foram tabulados e estratificados,
em distribuições de frequência. De acordo com Marconi e Lakatos (2002), tal técnica visa
facilitar o trabalho estatístico, permitindo melhor compreensão dos fenômenos.
Assim, para descrever e sumariar as características dos dados que representaram o
conjunto da amostra, procedeu-se uma análise sob a ótica da estatística descritiva, mediante a
quantificação de frequência e da participação relativa expressa em percentual. Tal técnica teve
por objetivo correlacionar entre si as respostas evidenciadas frente aos questionamentos, com
vistas a identificar possíveis relações entre variáveis que representem ou não relações de
causa e efeito.
No que se refere ao bloco 4 do questionário – Percepções do respondente quanto ao
ambiente organizacional municipal, cabe ressaltar que os dados foram analisados em uma
perspectiva quantitativa para estabelecer o Ranking Médio (RM) para a escala do tipo Likert
de cinco pontos, com o intuito de mensurar o grau de concordância dos respondentes frente às
Proposições
propostas
(MALHOTRA,
2001;
DIE
HL;
SOUZA,
2007;
BARBOSA;CAMPANHOL, 2006).
57
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
Não obstante esta pesquisa utilizar-se de medidas estatísticas, a ênfase da abordagem de
análise, dada a natureza do problema de pesquisa, revela-se também como qualitativa.
Conforme esclarece Neves (1996), a falta de exploração de um tema na literatura disponível,
o caráter descritivo da pesquisa que se pretende empreender ou a intenção de compreender um
fenômeno complexo na sua totalidade são elementos que tornam propício o emprego de
métodos qualitativos. Além disso, a opção pelo método qualitativo ou quantitativo, ou ambos,
em qualquer caso, sempre dependerá de clara definição do problema e dos objetivos da
pesquisa.
De posse dos dados decorrentes da aplicação dos 102 questionários procedeu-se a
tabulação das respostas no software Microsoft Excel 2007®. Finda a tabulação dos dados,
procedeu-se, objetivando uma possível correlação com as respostas obtidas, a coleta de
variáveis ambientais que caracterizassem o município sob os aspectos populacionais,
econômicos e organizacionais. A seguir, finalizadas as tabulações necessárias à organização
dos dados coletados, iniciou-se os procedimentos de tratamento estatístico descritivo e análise
dessas informações.
4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS
4.1 ANÁLISE DA UTILIZAÇÃO DE CSCS NA GESTÃO MUNICIPAL
Antes de se iniciar a pesquisa propriamente dita sobre os CSCs, adotou-se como
estratégia explicar, brevemente, aos respondentes, a natureza e o significado do termo Centro
de Serviços Compartilhados. Tal iniciativa objetivou evitar qualquer dúvida sobre a
nomenclatura utilizada ou, até mesmo, desconhecimento. Esse procedimento mostrou-se
muito útil e apropriado, pois 99% dos entrevistados desconheciam a técnica de CSC.
Constatou-se, assim, que apenas dois dos participantes responderam conhecer o conceito do
novo paradigma de gestão pública, fato que também é revelador ao se considerar que
praticamente 80% dos gestores que compuseram a amostra possuem nível de instrução
superior.
Ainda durante essa conversa inicial sobre a pesquisa, pode-se constatar que nenhum dos
respondentes, representantes dos municípios pesquisados, afirmou ter em seu município uma
área de centralização e compartilhamento de atividades de apoio. Isso significa que, logo no
início da pesquisa, verificou-se a inexistência de CSC propriamente dito e no seu formato
58
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
original. Por outro lado, durante a aplicação do questionário assistido, verificou-se expressiva
existência de uma modalidade de compartilhamento intermunicipal de serviços públicos,
formalizado por meio da institucionalização dos consórcios públicos. Para os entrevistados,
esse é o modelo de compartilhamento conhecido e praticado por eles.
4.1.1 Análise quanto ao compartilhamento de atividades por meio de consórcios públicos
Conforme citado na seção anterior, os dados da pesquisa mostram um significativo
número de municípios que participam de consórcios públicos (58 dentre os 102 pesquisados),
e que, na ótica deles, podem se configurar em uma modalidade de centro de
compartilhamento de atividades, possuidores de personalidade jurídica e sede própria. Diante
da predominância dessa realidade, ensejando uma adaptação quanto à análise das respostas ao
instrumento de coleta de dados, qual seja: se um município participa de um consórcio público,
é praticante de uma modalidade de CSC (muda-se o foco de intraesfera para interesferas de
governo).
Tal consideração também é sustentada pelo fato de que os consórcios públicos, assim
como os CSC, são concebidos com vistas ao atendimento de demandas comuns, objetivando
evitar, sobremaneira, a duplicidade de tarefas e maior amplitude e eficiência nos
atendimentos. Desse modo, é possível afirmar que tais instrumentos de política pública (os
consórcios públicos) constituem-se em uma modalidade de CSC, em sua essência, já que
ambos possuem a mesma finalidade e o mesmo modus operandi. Preliminarmente, apresentase a Tabela 2, da qual consta a distribuição dos 58 consórcios públicos constituídos,
elencando-os por unidade federativa da região sul do Brasil.
59
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
Tabela 2 - Distribuição dos consórcios públicos por UF.
UF
Municípios com
Total de municípios consórcio público
Absoluto
%
Rio Grande do Sul 496
Santa Catarina
293
Paraná
399
Total
1.188
Fonte: Dados da Pesquisa
24
14
20
58
4,8
4,8
5,0
4,9
Conforme dados da Tabela 2, há equilíbrio proporcional entre os Estados quanto à
proporcionalidade do número de consórcios públicos instituídos em relação à quantidade de
municípios, alcançando média de cerca de 5%. Contudo, ao se comparar o número total de
consórcios públicos individualmente por Estado, destaca-se que é no RS onde ocorre a
principal concentração absoluta (24) desse instrumento de política pública (41,4% do total de
58), seguido do Paraná (34,5%) e de SC (24,1%). Contudo, como há municípios da amostra
que participam do mesmo consórcio público, faz-se necessário esclarecer que, ao
desconsiderar tais duplicidades, o número de consórcios por estado fica assim distribuído: (a)
17 no Rio Grande do Sul; (b) 14 no Paraná; e (c) 12 em Santa Catarina. Portanto, ainda com
predominância do Rio Grande do Sul.
Importa salientar, também, que os dados apresentados baseiam-se nas respostas dos
respondentes acerca da participação do município em alguma espécie de consórcio. Segundo
informações do IBGE, havia, na amostra pesquisada, isto é, nos municípios da região sul do
Brasil com população superior a 50.000 habitantes, até o final de 2008, 36 consórcios
públicos. Dadas as respostas obtidas, depreende-se um aumento próximo de 20% no número
de consorciamentos, já que atualmente existem 43 institutos constituídos (sem as
duplicidades).
Seguindo a apresentação dos resultados, destaca-se que, dos 102 respondentes, 86
afirmaram serem os municípios mais populosos detentores de atividades mais complexas
(Proposição I), 36 (41,8%) não participam de consórcio público intermunicipal, e destes, 33
manifestaram serem favoráveis à criação desse instituto em seus municípios visando o
aprimoramento de processos. Infere-se, portanto, considerando a opinião da grande maioria
(93,1%) dos gestores inquiridos, que a criação de consórcios públicos como uma modalidade
de CSC pode auxiliar no gerenciamento das atividades municipais.
60
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
Observa-se que o percentual médio de respostas, discordando tanto plenamente quanto
parcialmente da proposição de que nos municípios mais populosos as atividades de gestão são
mais complexas, foi de apenas 5,9% (12 respondentes). Entretanto, 83,3% desses
respondentes acreditam que a criação de um consórcio público pode proporcionar um
incremento no que concerne à otimização de processos e à consequente redução de custos. O
Estado de Santa Catarina apresenta menor índice estadual de concentração dos consórcios
públicos entre os estados da amostra (24,1%). Contudo, constata-se que dentre os 13
entrevistados catarinenses que concordam plenamente com a proposição mencionada
anteriormente (50%), 11 (84,6%) afirmaram ter conhecimento da prática de consorciamento
público.
As principais razões que podem motivar a criação de um CSC entre municípios de uma
mesma região, de acordo com os 11 respondentes que conhecem o instituto dos consórcios
públicos, são a redução de custos, a melhoria de processos e a melhoria nos níveis de serviço,
conforme apresentado na Tabela 3.
Tabela 3- Razões que podem motivar a criação de um
CSC segundo os gestores catarinenses
Razões
Redução de custos
Melhoria dos processos
Melhoria dos níveis de serviços
Aumento dos controles
Melhoria da qualidade da informação para a decisão
Fonte: Dados da Pesquisa
%
100
100
100
54,5
90,9
Nota-se aqui uma semelhança muito grande em relação aos benefícios propiciados pelos
tradicionais CSCs, corroborando a proximidade estrutural entre eles e os consórcios públicos.
Já no que se refere à Proposição II, a qual preconiza que o aumento da complexidade nos
processos de gestão municipal demanda uma nova postura dos gestores quanto à busca de
otimização dos recursos, destaca-se o RS, pois, além de ser a unidade de análise que se
mostrou com maior grau de aderência à referida Proposição, é o estado que apresenta o maior
número de consórcios públicos dentre os três pesquisados.
Assim, pode-se depreender que há congruência entre as respostas obtidas dos
entrevistados gaúchos e as efetivas ações praticadas por estes no que concerne à mudança de
postura dos gerentes públicos. Tal constatação corrobora a inferência de que há uma tendência
61
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
dos municípios pesquisados, mais acentuadamente nos do Rio Grande do Sul, à convergência
global da administração governamental por resultados.
Destaca-se também que, dos 95 entrevistados que manifestaram concordância, plena ou
parcial, acerca da Proposição II, qual seja: a de que o aumento da complexidade nos processos
de gestão municipal demanda uma nova postura dos gestores quanto à busca de otimização do
uso dos recursos, mais da metade destes (55) afirmaram que o município ao qual representam
participam de, pelo menos, um consórcio público. Também é relevante ressaltar que, desses
95 respondentes, 89 são favoráveis à criação de um consórcio público regional
(intermunicipal) visando o aprimoramento de processos e a redução de custos. De outra parte,
dos 55 gestores que afirmaram participar de pelo menos um consórcio público, três enfatizam
que, apesar de seus municípios serem consorciados, não são favoráveis à criação de novos
consórcios públicos em suas regiões. Tais gestores, um de cada Estado, representaram os
municípios de Londrina (PR), Lajeado (RS) e Concórdia (SC).
Dentre os motivos elencados para a não implementação dessa modalidade de
compartilhamento de atividades, destacam-se: (a) o desconhecimento do modo de operação e
a cultura inflexível a mudanças [3 municípios]; (b) os custos do processo de implantação e a
estrutura organizacional excessivamente fragmentada [2 municípios]; (c) a baixa expectativa
de sucesso e barreira tecnológica [1 município] e interesses políticos executivos
Contudo, o Consórcio Intermunicipal de Saúde do Médio Paranapanema (CISMEPAR),
Estado do Paraná, já conta com 16 anos de atuação, e, segundo informações constantes no
sítio da entidade, tem se revelado como um importante instrumento de ação dos 21
municípios que o compõe, objetivando a solução de problemas que lhes são comuns,
mediante o compartilhamento intermunicipal de serviços.
Apesar da origem da ferramenta dos CSC apontar para o compartilhamento de
atividades transacionais e, internamente, de cada município, existe no âmbito da amostra
pesquisada, essencialmente, o compartilhamento de atividades na área da saúde, e entre vários
municípios. Infere-se, considerando os resultados já apresentados, que a grande ocorrência de
consórcios relacionados à área da saúde pode ser decorrente da possibilidade de os
municípios, em conjunto, assumir as responsabilidades pela gestão plena do seu sistema de
saúde, conforme estabelece a NOB SUS 01/96, pouco viável se atuante isoladamente.
Por outro lado, cabe ressaltar que, dos 58 consórcios públicos institucionalizados nos
municípios da região sul do Brasil, apenas 11 referem-se a atividades de suporte, a saber: (a)
62
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
oito na área de planejamento e gestão; (b) dois na área de Tecnologia da Informação e
Comunicação (TIC); (b) um na área de serviços, conforme pode ser observado na Tabela 4.
Tabela 4 - Área de consórcios público municipal
Área
Saúde
Desenvolvimento Sustentável
Planejamento e Gestão
Tecnologia de Informação e Comunicação
Serviços Diversos
Total
Fonte: Dados da Pesquisa
Nº de Consórcios
32
15
8
2
1
58
%
55,2
25,9
13,8
3,4
1,7
100,0
Contudo, ao considerar que as atividades de TI, procedimentos licitatórios, limpeza,
conservação e segurança, e assessoria jurídica se apresentaram como as mais representativas
no que concerne ao compartilhamento futuro de serviços, conforme apresentado na Tabela 5,
observa-se que há, no contexto atual, uma tendência ao compartilhamento de atividades no
âmbito dos governos municipais pesquisados.
Observa-se que, ao compartilhar serviços via constituição de consórcios, os municípios
estão, automaticamente, compartilhando as atividades transacionais que seriam necessárias
caso desenvolvessem essas atividades isoladamente. Novamente, tem-se aqui uma
reafirmação do consórcio como um tipo de CSC cujo modelo é mais viável do que se cada
município, pela estrutura e porte, fosse desenvolvê-lo isoladamente.
Tabela 5 - Atividades que o respondente acredita poderem ser compartilhadas via consórcio.
Resposta
PR %
RS %
SC %
Total %
Tecnologia da Informação
Procedimentos Licitatórios
Limpeza / Conservação / Segurança
Assessoria jurídica
Auditoria
Ouvidoria / Centro de Atendimento ao Contribuinte
Contabilidade / Controladoria
Controles Internos
Recursos humanos / Folha de pagamento
Planejamento e execução Orçamentária
Almoxarifado
Outros
Fonte: Dados da Pesquisa
27
27
28
24
24
23
22
18
17
18
16
7
39
35
31
31
32
28
22
27
23
20
14
9
23
21
22
18
17
17
18
13
15
12
11
3
89
83
81
73
73
68
62
58
55
50
41
19
81,8
81,8
84,8
72,7
72,7
69,7
66,7
54,5
51,5
54,5
48,5
21,2
90,7
81,4
72,1
72,1
74,4
65,1
51,1
62,8
51,5
46,5
32,5
20,9
88,5
80,8
84,6
69,2
65,4
65,4
69,2
50,0
57,7
46,1
42,3
11,5
87,2
81,4
79,4
71,6
71,6
66,7
60,8
56,9
53,9
49,0
40,2
18,6
Percebe-se que a região sul do Brasil, de forma generalizada, ao instituir consórcios
públicos, em sua maioria voltada às atividades-fim do Estado, com predominância na área da
saúde, ainda tem muito a explorar sobre o compartilhamento de processos nas atividades de
63
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
suporte, conforme evidenciam os dados citados. Ao concretizar isso, ter-se-ia, então, um CSC
intermunicipal.
Destaca-se, no que se refere ao compartilhamento de serviços, o Consórcio
Intermunicipal de Serviços do Vale Do Rio Pardo/RS – CISVALE, fundado em 2005 e
composto por 14 municípios da região. A finalidade do consórcio, segundo seu estatuto
(CISVALE 2011), é a realização dos interesses comuns dos entes consorciados na
implementação de suas múltiplas políticas públicas. Também se destaca o consórcio de
Informática na Gestão Pública Municipal – CIGA (2007), instaurado na região sul
catarinense, contando com 58 participantes, como um dos consórcios que compartilham
atividades transacionais no ambiente governamental. A finalidade do CIGA é desenvolver
ferramentas de governança eletrônica, por meio do emprego de TIC (CIGA, 2007).
Por fim, com relação aos gestores dos municípios que se mostraram indiferentes à
Proposição II, destaca-se que não há nenhum município catarinense. Ademais, três dos cinco
municípios, cujos gestores nem concordam nem discordam da assertiva proposta, participam
de consórcios públicos, sendo dois pertencentes ao Estado do Paraná e um município gaúcho,
a saber: Telêmaco Borba (PR), Cianorte (PR) e Novo Hamburgo (RS). Dentre esses, o gestor
representante do município paranaense de Telêmaco Borba foi o único a concordar que a
existência de uma controladoria municipal é fundamental para a implementação e para o
funcionamento dos CSCs, sejam eles mediante a modalidade de consórcio público ou não.
A respeito da proposição III (a existência de uma controladoria municipal é fundamental
para a implementação e para o funcionamento dos CSCs pelas prefeituras), destaca-se que
apesar do Estado do Rio Grande do Sul indicar maior número de consórcios intermunicipais
em termos absolutos, também foi a unidade federativa cujos gestores menos aderiram à
proposição de que as controladorias municipais exerçam papel fundamental no sucesso do
compartilhamento de atividades por meio de CSC, apresentando um ranking médio de 4,25.
Por outro lado, Santa Catarina, apesar de ter apresentado os maiores índices de concordância
plena (73,1%) e posicionar-se com o maior índice no que tange ao ranking médio (4,53), é o
Estado que congrega o menor número de consórcios públicos.
Observa-se que há uma divisão quase que paritária entre os 82 municípios que
corroboram a Proposição III e são partícipes de consórcios públicos: 42 são consorciados e 40
não. Percebe-se, entre os 42 municípios consorciados, que 35 respondentes (83,3%)
afirmaram que o aumento dos controles é uma motivação para a implementação de um órgão
64
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
executor de atividades, enquanto que entre os não consorciados o percentual também se
aproxima dos 80%, uma vez que 33 dentre os 40 também destacaram o aumento da
efetividade dos controles como um fator determinante para o compartilhamento de processos
em âmbito governamental.
Ressalta-se, ainda, que, entre os 40 municípios não consorciados, três pretendem aderir
ao compartilhamento de atividades mediante a institucionalização de consórcios públicos,
mencionando que já há proposta de criação desse instituto nos municípios de Toledo-PR,
Biguaçu-SC e Jaraguá do Sul-SC, nas áreas de licitações, tratamento de resíduos sólidos e
tratamento de água, respectivamente.
Por fim, quanto à Proposição IV – aspectos relacionados à adequada infraestrutura legal,
tecnológica, processual e física são fundamentais para o sucesso na implantação e
continuidade dos CSC – foi a que apresentou o maior nível de aceitação dentre as proposições
apresentadas, já que apresentou o maior ranking médio geral (4,72). Apenas um gestor, da
cidade de Guarapuava-PR, manifestou discordância plena acerca da afirmação proposta,
sendo que nenhum outro manifestou sequer discordância parcial.
No entanto, quando do questionamento aos motivos para a não implementação de um
CSC, tal respondente citou a barreira tecnológica como um dos fatores para a não
implementação de um CSC em seu município. Constatou-se, portanto, que mesmo
discordando que a infraestrutura tecnológica é fundamental para o bom funcionamento do
compartilhamento de atividades, o servidor paranaense elenca a inadequação de TI como um
determinante para a ausência de um CSC na região Centro-Sul Paranaense. Ademais,
considerando que o município de Guarapuava-PR não é consorciado, destaca-se que o
entrevistado manifestou-se como sendo pertinente à participação de seu município em
consórcios públicos.
Pode-se depreender que o estado do Rio Grande do Sul, ao apresentar-se como o
possuidor do maior número de consórcios públicos, é o estado cujos municípios detêm maior
intensidade no uso de compartilhamento de atividades, sejam elas finalísticas, sejam
transacionais, no cumprimento da missão estatal de prover o bem estar social em custo e
qualidade do serviço público. Infere-se que esse seja um dos motivos para o resultado
encontrado no que tange ao fato de que os gestores gaúchos corroboram plenamente a
assertiva de que a adequada infraestrutura legal, tecnológica, processual e física seja
fundamental para a excelência dos CSC, mesmo que na modalidade de consórcio público.
65
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
Tomando por base os índices de respostas apresentados, infere-se que a estrutura
burocratizada do Estado ainda é um entrave no que diz respeito à flexibilização das estruturas
estatais, da descentralização de atividades públicas e da busca de soluções, afetas à crescente
demanda social, apoiada sob o pilar do cooperativismo federalista. Tendo como parâmetro o
fato de a NPM já se destacar como paradigma de gestão, por meio de instituição de práticas
gerenciais, desde meados da década de 1990 em países tais como a Austrália e o Canadá,
observa-se que pode ter sido intempestiva a publicação da lei dos consórcios públicos,
possibilitando o cooperativismo regional, uma vez que, com personalidade jurídica e sedes
próprias, estrutura de gestão autônoma, orçamento e patrimônio próprios, os consórcios
públicos constituem-se, fisicamente, como uma modalidade de centro de compartilhamento de
serviços, o CSC.
Contudo, cumpre destacar que há uma diferença conceitual entre o compartilhamento de
atividades intergovernamentais, isto é, entre municípios de uma mesma região, por exemplo, e
intragovernamentais, nas quais ocorre o compartilhamento interno das atividades de suporte
em um único departamento/secretaria no próprio município, sendo esta última, uma prática
mais comum no âmbito municipal, principalmente nas esferas da medicina.
Assim, diante dos resultados apresentados, pode-se concluir que há o compartilhamento
de atividades mediante a utilização de CSC, por meio de consórcio público, em 58 municípios
da amostra pesquisada. Destaca-se especialmente o CISVALE, uma vez que este é um
consórcio que foi concebido especificamente para o compartilhamento de serviços, finalidade
alvo de um CSC.
Percebe-se, portanto, que aproximadamente 60% dos municípios da região sul do Brasil
com população acima de 50.000 habitantes adotam um tipo de compartilhamento de
atividades. Isso pode se uma consequente otimização dos recursos, tal como ocorre no setor
privado, e uma possível modalidade de CSC.
CONCLUSÃO
Por meio deste estudo buscou-se diagnosticar o uso dos Centros de Serviços
Compartilhados na gestão de municípios da região sul do Brasil, considerando o contexto da
NPM. Para tanto, foram analisados todos os municípios da região sul do Brasil cuja população
superasse 50.000 habitantes, segundo levantamento do IBGE (2008).
66
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
A resposta principal ao problema enunciado na pesquisa remete a considerações
importantes, essencialmente quanto à proposição de que o cooperativismo, materializado no
instrumento dos consórcios públicos, é uma modalidade de CSC, e de que o gestor, mesmo
não reconhecendo tal proposição, manifestou concordância ao fato de que o consorciamento
pode ser uma eficaz ferramenta para uso conjunto dos recursos públicos.
Salienta-se, contudo, que nenhum dos respondentes afirmou compartilhar atividades por
meio de um CSC propriamente dito. No entanto, considerando que há compartilhamento de
atividades gerenciado por um centro, com sede e personalidade jurídica próprias, o consórcio
público pode ser considerado uma modalidade diferenciada de CSC entre municípios.
Apesar da origem da ferramenta dos CSC apontar para o compartilhamento de
atividades transacionais, existe, no âmbito da amostra pesquisada, essencialmente, o
compartilhamento de atividades na área da saúde, seguido do consorciamento relacionado ao
desenvolvimento sustentável. Percebe-se que a região sul do Brasil, de forma generalizada, ao
instituir consórcios públicos, majoritariamente em saúde, ainda tem muito a explorar o uso do
compartilhamento de processos nas atividades de suporte.
Também é importante referendar que os resultados apontaram serem as atividades
transacionais, tais como TI, procedimentos licitatórios, limpeza/conservação/segurança,
assessoria jurídica e auditoria, as principais lacunas a serem preenchidas por meio do
compartilhamento regional, atividades típicas de um CSC tradicional.
Os resultados da pesquisa vão ao encontro do estudo de Ferreira, Bresciani e Mazzali
(2010), para os quais o advento dos consórcios públicos deve estimular a criação de CSC no
Brasil, ainda muito incipiente em relação a outros países.
Considerando os resultados apresentados, no que concerne à significância do número de
municípios que se utilizam dos consórcios públicos como instrumento de gestão na região sul
do Brasil, sugere-se a replicação da pesquisa a outras regiões do país, com vistas à
confirmação ou não da convergência dos municípios brasileiros à NPM.
Recebido em março de 2014.
Aprovado em setembro de 2014.
67
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
REFERÊNCIAS
ACCENTURE. Implementing shared services in the sublic sector: The Pillars of Success.
New York, 2006.
ALONSO, M. Custos no serviço público. Revista Serviço Público, v. 50, n. 1, p. 37-63, 1999.
ASAZU, Cláudia Y; ABRUCIO, Fernando L. A gênese da Lei de Responsabilidade Fiscal
(LRF): a construção de uma agenda. In: Encontro da ANPAD – EnANPAD, 27, 2003.
Atibaia. Anais… Assoc. Nacional dos PPG em Administração – ANPAD, 2003.
BARBOSA, J.P.P.; CAMPANHOL, E.M. A indústria de confecção de Passos/MG e a
capacitação de sua mão-de-obra. Rev Eletr Administração, v. 7, n. 1, p. 1-16, jan./jun. 2006.
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2004.
BARZELAY, M. The new public management: improving research and policy dialogue.
University of California Press: Berkeley, CA, 2001.
BRESSER-PEREIRA, L. C. Gestão do setor público: estratégia e estrutura para um Novo
Estado. Reforma do estado e administração pública gerencial. Rio de Janeiro: FGV, 1998.
BROADBENT, J. LAUGHLIN, R., Control and legitimation in government accountability
process: the private finance initiative in UK. Critical Perspectives on Accounting, v. 14, n. 12, p. 23–48, 2003.
BROADBENT, J.; LAUGHLIN, R. Evaluating the new public management reforms in the
UK: a constitutional possibility? Public Administration, v. 75, n. 3, p. 487-507, 1997.
BYWATER CONSULTING. Realizing the potential of shared services. Stamford, 2001.
CAA - Corporate Administration Agency. About CAA. Disponível em:
http://www.caa.qld.gov.au/about_caa.html. Acesso em: 02 mar. 2011.
CKAGNAZAROFF, Ivan Beck. Reforma gerencial e o papel do gestor público: ator de
mudança ou de resistência? In: VII Congreso Internacional del CLAD sobre la Reforma del
Estado y de la Administración Pública, 7, 2002. Lisboa. Anais... CLAD, 2002.
COLLIS, Jill; HUSSEY, Roger. Pesquisa em administração: um guia prático para alunos de
graduação e pós-graduação. 2. ed. Porto Alegre: Bookman, 2005.
CONSÓRCIO INFORMÁTICA NA GESTÃO PÚBLICA MUNICIPAL – CIGA.
Institucional.
2007.
Disponível
em:
http://www.san.sc.gov.br/index.php?option=com_docman&task=cat_view&gid=36. Acesso
em: 02 jan. 2011.
CONSÓRCIO INTERMUNICIPAL DE SERVIÇOS DO VALE DO RIO PARDO/RS –
CISVALE. Institucional. Disponível em: http://cisvalerp.com.br/ Acesso em: 01 fev. 2011
68
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
DELOITTE CONSULTING LLP. 2013 Global shared services survey results, Deloitte
Development LLC, Feb. 2013.
DIEHL, C. A.; SOUZA, M. A. Publicações sobre o custeio baseado em atividades em
congressos brasileiros de custos: de 1997 a 2006. Contabilidade Vista e Revista, v. 19, n. 4, p.
39-57, 2008.
DOLLERY, B.; HALLAM, G. WALLIS, J. Shared services in Australian local government: a
case study of the Queensland Local Government Association Model. Economic Papers, v. 27,
n. 4, p. 343-354, Dec. 2008.
DREW, Colin. Local Government New Zealand. Wellington: Development Solutions for
Local Government New Zealand, 2011.
FERREIRA, C.; BRESCIANI, P., MAZZALI, L. Centros de serviços compartilhados: da
experiência britânica às perspectivas de inovação na gestão pública brasileira. Revista do
Servidor Público, v. 61, n. 4, p. 387-403, 2010.
FONTANA, A.; FREY, J. The art of science. In: The Handbook of Qualitative Research
edited by N. a. Y. L. Denzin. 1994, p. 361-76
GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
GRANT, G.; MCKNIGHT, S.; URUTHIRAPATHY, A.; BROWN, A. Designing governance
for shared service organizations in the public service. Government Information Quarterly, v.
24, n. 3, p. 522-538, 2007.
GROVES, R. M.; Kahn, R. L. (1979). Survey by telephone: a national comparison with
personal interviews. New York: Academic Press, 1997.
HOOD, C. A public management for all seasons. Public Administr., v. 69, n. 1 p. 3-19, 1991.
HYVÖNEN, T. et al. The rationale of financial shared service centers in local governments.
Frontier of E-Business Research, p. 118-130, 2004.
IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa nacional de saneamento básico
2008.
Disponível
em:
http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/perfilmunic/2008/default.shtm Acesso em:
10 jan. 2011.
JANSSEN, M.; JOHA, A. Motives for establishing shared service centers in public
administrations. International Journal of Information Manag., v. 26, n. 2, p. 102-115, 2006.
JANSSEN, M.; JOHA, A. Understanding IT governance for the operation of shared services
in public service network. International Journal of Networking and Virtual Organizations, v.
4, n. 1, p. 20-34, 2007.
69
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
JANSSEN, M.; JOHA, A.; ZUURMOND, A. Simulation and animation for adopting shared
services: evaluating and comparing alternative arrangements. Government Information
Quarterly, v. 26, n. 1, p. 15-24, 2009.
JANSSEN, M.; WAGENAAR, R. An analysis of a shared services center in E-government.
Proceedings of the 37º Hawaii International Conference on System Sciences, p. 1-10, 2004.
JANSSEN, Marijin.; JOHA, Anton.; ZUURMOND, Arre. Simulation and animation for
adopting shared services: Evaluating and comparing alternative arrangements. Government
Information Quarterly, v. 26, p. 15-24, 2008.
LOCKE, L. F. et al. Reading and understanding research. Thousand Oaks: Sage, 1998.
LÓPEZ, Andréa. La nueva gestión pública: algunas precisiones para su abordaje conceptual.
Instituto Nacional de La Administración Pública – INAP, Buenos Aires, 2006.
MALHOTRA, N.K. Pesquisa de marketing. 3.ed. Porto Alegre: Bookman, 2001.
MARCONI, M. A., LAKATOS, E. M. Técnicas de pesquisa. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2002.
MARSHALL, J. The new administration’s shared services opportunity. The public manager,
July
2009,
11p.
Disponível
em:
http://thepublicmanager.org/articles/docs/sharedservices_opportunity.pdf. Acesso em: 31 ago.
2011.
MARTINS, V.P.; AMARAL, F. P. A consolidação da prática de serviços compartilhados.
2008. Dissertação (Mestrado em Gestão de Negócios). Univ. Católica de Santos. Santos, SP.
MATTHEW, C. Full disclosure: the basics of designing and implementing a shared services
concept. Business credit, v. 111, n. 1, p. 50-53, 2009.
NEVES, Jose Luis. Pesquisa qualitativa – característica, usos e possibilidades. Caderno de
Pesquisas em Administração, São Paulo, v. 1, n° 3, 1996.
ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÓMICO OCDE. Governance in transition: public management reforms in OECD countries. Paris:
OECD, Public Management Committee, 1995.
POLLITT, C. Managerialism and the public services: the Anglo-American experience. 2. ed.
Oxford: Blackwell, 1993.
POLLITT, C.; SUMMA, H. An impeditive administrative culture? The legacy of Australia’s
first auditor-general on the Australian audit. Public Administrat., v. 75, n.2, p. 313-336, 1997.
QUINN, B.; COOKE, R.; KRIS, A. Shared services: mining for corporate gold. New York:
Financial Times-Prentice Hall, 2000.
RAENTO, M.; OULASVIRTA, A.; EAGLE, N. Smartphones an emerging tool for social
scientists. Sociological Methods & Research, v. 37, n. 3, p. 426-454, February 2009.
70
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica
RAMOS, L. J. T. Serviços compartilhados como forma de estruturação organizacional.
Dissertação (Mestrado em Administração). Universidade Federal da Bahia. Salvador, 2005.
REDMAN, T. et al. Evaluating the human resource shared services model: evidence from the
NHS. The International Journal of Human Resource Management, v. 18, n. 8, p. 1486-1506,
August 2007.
RIDLEY, F. The new public management in Europe: comparative perspectives. Public Policy
and Administration, v. 11, n. 1, p. 16-29, 1996.
SALLES, Guilherme Gomes. Investigando o que é insourcing – como geri-lo, quando aplicálo e como implantá-lo – Rio de Janeiro: UFRJ/ Escola Politécnica, 2010.
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS. NOB-SUS 01/96. Norma Operacional Básica do
SUS. Gestão plena com responsabilidade pela saúde do cidadão. 1996. Disponível em:
http://www.esp.rs.gov.br/esp2/img2/NOB%20SUS%2001_96.pdf. Acesso em: 01 fev. 2011.
SOUZA, Eda Castro Lucas. A capacitação administrativa e a formação de gestores
governamentais. REVISTA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – RAP, Rio de Janeiro
36(1): 73-88, 2002.
SPOEHR, J.; BURGER, A.; BARRETT, S. The shared service experience, report 2: lessons
from Australia. The Australian Institute for Social Research, The University of Adelaide,
2007. Disponível em: http://www.european-services-strategy.org.uk/news/2007/sharedservices-britain/psa-shared-services-australia.pdf. Acesso em: 10 mar. 2011.
STEWART, J.; WALSH, K. Change in the management of public services. Public
Administration, v. 70, n. 4, p. 499-518, 1996.
TOMKINSON, R. Shared services in local government: improving service delivery.
Hampshire: Gower Publishing, 2007.
VIGODA, E. From responsiveness to collaboration: governance, citizens, and the next
generation of public administration. Public Administr. Review, v. 62, n. 5, p. 527- 540, 2002.
WALSH, P.; MACGREGOR-LOWNDES, M.; NEWTON, C. Shared services: lessons from
the public and private sectors for the nonprofit sector. The Australian Journal of Public
Administration, v. 67, n. 2, p. 200-212, 2008.
WANG, S.; WANG, H. Shared services beyond sourcing the back offices: organizational
design. Human Systems Management, v. 26, n. 4, p. 281-290, 2007.
WHITFIELD, Dexter. Shared services in Britain: a report for the Australian Institute for
Social Research and the Public Service Association. European Services Strategy Unit, U.K.,
2007. Disponível em: http://www.european-services-strategy.org.uk/news/2007/sharedservices-britain/essu-shared-services.pdf. Acesso em: 14 mar. 2011.
71
Gestão Contemporânea, Porto Alegre, n. 16, jul./dez. 2014
Disponível em: <http://seer4.fapa.com.br/index.php/arquivo>
ISSN 2177-3068 - Versão eletrônica