a alimentação e a natureza
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a alimentação e a natureza
Entendendo (e rentabilizando) a alimentação e a natureza Um guia para jornalistas sobre agroecologia e soberania alimentar “Aqui estão dois fatos que não deveriam ser verdade ao mesmo tempo: Há comida suficiente sendo produzida no mundo a cada ano para alimentar cada ser humano no planeta. Cerca de 800 milhões de pessoas literalmente passam fome todos os dias, com mais de um terço da população da terra -- 2 bilhões de homens e mulheres – de alguma forma subnutridos, de acordo com a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação.” Michael Dorris, Rooms in the House of Stone: The “Thistle” Series of Essays (Quatros na Casa de Pedra: Série de ensaios O Cardo) Por Jeff Rutherford Membro da Rede de Jornalismo da Terra, da Internews Seção 1: A ENCRUZILHADA DA ALIMENTAÇÃO Os custos da agricultura industrial, da pecuária intensiva e da má alimentação estão se tornando cada vez mais aparentes, motivando uma busca por alternativas sustentáveis ao modelo atual (de produção de comida) Seção 2: OLHE POR TRÁS DA PROPAGANDA O que as pessoas não sabem a respeito da comida que está prejudicando nossa saúde e o planeta. Será que tem que ser desse jeito? Seção 3: A COMIDA COMO DE MEIO-AMBIENTE UM JORNALISTA Relatar a verdade sobre nosso sistema de produção de alimentos requer uma compreensão de ecologia e apenas jornalismo bom e sólido Seção 4: PRODUZIR INTEGRADO À NATUREZA... SE PAGA? Uma das características menos comentadas da agroecologia é que pode ser lucrativa Seção 1: A ENCRUZILHADA DA ALIMENTAÇÃO Os custos da agricultura industrial, da pecuária intensiva e da má alimentação estão se tornando cada vez mais aparentes, motivando uma busca por alternativas sustentáveis aos modelo atual (de produção de comida) O mundo da comida está em uma encruzilhada. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação prevê que o mundo vai precisar elevar a produção de alimentos em 70 por cento até 2050 para acompanhar o ritmo do crescimento populacional e os aumento do padrão de vida nos países em rápido desenvolvimento. Não será uma tarefa fácil. Já foram registradas histórias de protestos por comida, disputas por terras, grilagem e o papel das commodities na crise financeira global. Com a a terra agricultável sendo reduzida pela degradação do solo e com a produtividade da terra sendo impactada pelas mudanças climáticas, crescem os conflitos por terra e por recursos hídricos. As opções para aumentar a produção de alimentos parecem ser limitadas, com a agricultura extensiva levando a culpa pelo desmatamento e a produção intensiva sendo responsabilizada pela contaminação química do solo, da água, do ar e dos organismos biológicos – incluindo as pessoas. Enquanto isso, o globo está se dividindo entre obesos que têm muito e desnutridos que quase nada têm, com a classe média do planeta substituindo alimentação tradicional por menus industrializados e por “substâncias que se parecem com comida” sem qualquer valor nutricional, para citar o escritor Michael Pollan, especializado em alimentação. Poucos parecem defender a continuação da expansão agrícola faminta por florestas ou mais contaminação química das terras agricultáveis, embora a prática destas abordagens esteja ainda se espalhando. No século 21, as histórias realmente interessantes estão nos extremos do espectro de abordagens para lidar com as consequências da “revolução verde” que ajudou a trazer a produção agrícola industrial e a contaminação química para o mundo em desenvolvimento. Os extremos são as avançadas pesquisas sobre modificações genéticas, em uma ponta do espectro, e novas descobertas sobre agricultura natural, ou agroecologia, na outra ponta. Mas é claro que a manipulação genética está ganhando muito mais manchetes do que as minhocas. Em geral, é seguro dizer que a alimentação como uma questão política ou ambiental está recebendo mais atenção. Análises científicas internacionais têm demonstrado a crescente pegada global da agricultura, incluindo sua contribuição para as mudanças climáticas (IPCC 2007; Avaliação Ecossistêmica do Milênio, 2005), enquanto organizações não governamentais e cientistas há tempos pedem por mudanças radicais neste setor (União dos Cientistas Preocupados/Union of Concerned Scientists, 1996; Conselho de Ética Alimentar/Food Ethics Council, 2004; Rede do Fórum Social e Científico Europeu/European Science Social Forum Network, 2005). Talvez com mais influência, a Avaliação Internacional do Conhecimento, da Ciência e da Tecnologia no Desenvolvimento Agrícola em 2008 oficialmente recomendou um reorientação da ciência agrícola e da tecnologia na direção de uma abordagem mais holística, depois de um processo de 4 anos que envolveu cerca de 400 especialistas internacionais (IAASTD, 2008). Este painel já foi comparado ao Painel Intergovernamental para as Mudanças Climáticas, ambos pela qualidade de sua governança e pela importância de suas recomendações, que incluíram: “Atingir com sucesso objetivos de desenvolvimento e de sustentabilidade, além de responder a novas prioridades e mudar circunstâncias, necessitaria uma mudança fundamental no conhecimento, na ciência e na tecnologia agrícolas.” Esta é a encruzilhada na qual nos encontramos. Enquanto a IAASTD pede por um maior apoio às abordagens agroecológicas, que ela considera que oferecem um grande potencial para a agricultura no mundo, o papel da engenharia genética foi o grande elemento de controvérsia no painel. Por outro lado, também está recebendo muito mais dinheiro para pesquisa e atenção da mídia. Defensores da engenharia genética afirmam que modificações genéticas podem ajudar lavouras a se desenvolverem em ecossistemas que foram degradados por décadas de agricultura intensiva Defensores da agroecologia propõem um tipo de agricultura baseada em princípios ecológicos, com práticas que ajudem a restaurar ambientes degradados, e não evitando seu uso pelos humanos, mas o oposto: curar a terra através da produção de alimentos. Muitas pessoas em ambos os campos concordariam que o atual modelo de agricultura industrial não é sustentável. A produção industrial de alimentos está desestabilizando os sistemas de suporte à vida na Terra. Ken Wilson do Fundo Christensen afirma: “Cada caloria que a agricultura industrial oferece requer tanto petróleo e gás para ser produzida que nosso sistema agrícola gera quase um terço dos gases de efeito estufa do planeta. E, através do uso massivo de fertilizantes, nós temos, de maneira disruptiva, triplicado os nitratos no ciclo natural do nitrogênio na Terra. A produtividade de quase metade de nosso solo ao redor do mundo está decaindo. Outros 15 por cento não podem mais ser usados para plantio porque seus elementos biológicos foram esgotados.” Os alimentos, em outras palavras, são agora em grande parte uma questão ambiental. Nossos interconectados sistemas globais para produção de comida se tornaram arriscados, destrutivos e caros, e eles não estão alimentando gente suficiente. Ainda por cima, esta história não está sendo noticiada o bastante. Aí está o motivo para este guia de mídia: muitos jornalistas e outros comunicadores podem precisar analisar com cuidado suas premissas sobre as conexões entre alimentos e meio-ambiente, e dar ao assunto mais atenção. Definições Agricultura industrial É o contexto do nosso mundo hoje, um sistema que se espalhou através do globo, conectando os habitats dos orangotangos de Bornéu a um mundo de consumidores através de óleo de palma barato; e conectando perdas de barreiras de corais e estuários, além de florestas e pradarias, com a explosão no consumo mundial de fast food gorduroso e prejudicial às artérias. A agricultura industrial está baseada na maximização da produção da produtividade em larga escala de commodities e de produtos individuais através da mecanização e da motorização, do desenvolvimento de agroquímicos para fertilizar lavouras e controlar ervas daninhas e insetos, e do uso de variedades de plantas de alta produtividade. (Para mais informações, procure a União dos Cientistas Preocupados.) Pecuária intensiva É o processo de criação em confinamento de alta densidade, com animais alimentados basicamente com ração, onde uma fazenda opera como uma fábrica. No Brasil, dois terços dos bovinos confinados se concentram nos três Estados da região Centro-Oeste (MT, GO e MS), segundo a Associação Nacional dos Confinadores (Assocon). Os principais produtos desta indústria são carne, leite e ovos para consumo humano. No entanto, têm havido questionamentos sobre se estas unidades são sustentáveis e éticas. O confinamento de alta densidade é uma parte de um esforço sistemático de produzir o maior resultado ao menor custo utilizando economia de escala, maquinário moderno, biotecnologia e comércio global. Confinamentos de alta densidade requerem antibióticos e pesticidas para evitar que doenças se espalhem, ajudadas pela aglomeração de animais. Além disso, antibióticos são usados para estimular o crescimento dos animais ao matar bactérias intestinais. Estas práticas têm causado o aparecimento de doenças e pragas mais resistentes, criando um círculo vicioso que, por consequência, coloca os seres humanos e nossa oferta de alimentos em perigo. (Veja aqui algumas estatísticas e argumentos contra a pecuária intensiva, e também de apoio à pecuária intensiva.) Engenharia É a modificação deliberada das características de um organismo através da manipulação de seu material genético. A principal tecnologia na qual este processo baseia-se é a transgenia, a partir da descoberta das técnicas de recombinação de DNA em 1973. As aplicações mais conhecidas de engenharia genética na agricultura são as lavouras tolerantes a herbicidas, como a soja, ou o milho BT, resistente a insetos nos EUA. Ambas as tecnologias já são amplamente utilizadas em plantações brasileiras. A estratégia fundamental na engenharia genética é modificar plantas para permitir que elas sejam mais produtivas em condições adversas causadas, por exemplo, por pragas, doenças, seca, ambientes salinos e solos pouco férteis; ou para desenvolver plantas com novos objetivos, como plantas com conteúdo nutricional modificado. genética Agroecologia Emergiu da convergência de conhecimentos tradicionais, economia e agronomia (veja Dalgaard et al., 2003). É a aplicação de ciência ecológica para estudar, projetar e gerenciar sistemas agroecológicos sustentáveis (veja trechos de Altieri aqui e aqui, 1995). A agroecologia integra conhecimento científico sobre como lugares específicos funcionam – sua ecologia -- com o conhecimento de agricultores sobre como tornar a paisagem local útil para os humanos. A agroecologia está focada no valor dos métodos complexos e diversificados de cuidado com a terra e na reintegração entre animais de criação, lavouras, polinizadores, árvores e água, de maneira que trabalhem de maneira resiliente com o ambiente local. A agroecologia é um conceito mais amplo, unindo diferente práticas agrícolas e inovações como controle biológico de pragas ao invés do controle químico plantio de variedades diversificadas ao invés de uma única cultura (monocultura) sistemas agroflorestais técnicas de manejo do habitat – por exemplo, manutenção de faixas de vegetação natural ou faixas de grama ao redor de campos de trigo para procriação de besouros predadores de pragas das lavouras sistemas de agricultura natural na busca de plantas perenes e não culturas anuais rotação de culturas técnicas de melhoria de fertilidade do solo integração lavoura-pecuária associação de culturas numa mesma área de plantio Algumas aplicações envolvem tecnologias de ponta, enquanto outras são práticas antigas, como alguns sistemas tradicionais que oferecem embasamento importante para a agroecologia. (Explicações e exemplos destas técnicas serão detalhadas abaixo.) A agroecologia não é sinônimo de “técnicas antigas” ou tradições indígenas. Ela valoriza e usa informações oferecidas por métodos tradicionais, mas aproveita a moderna ciência da ecologia. Há um grande potencial para diversas formas de fusão entre o antigo e a ecologia, cuja amplitude ainda é desconhecida mas é tentadora. Seu potencial para rejuvenescer um planeta ferido é uma história que começa a aparecer, mas que muitas vezes ainda é mal compreendida no mundo atualmente. Há pessoas construindo suas carreiras contando estas histórias. No entanto, esses conceitos precisam ser integrados ao conhecimento da imprensa e ao que é divulgado. Biodiversidade na Fazenda. O oposto da monocultura é a policultura: produzir mais de uma cultura em um pedaço de terra. Como visto em "Um Futuro Viável para os Alimentos ", os agricultores familiares, no estado indiano de Uttaranchal regularmente atingem uma produção maior e mais confiável com sua terra do que grandes fazendas que praticam a monocultura em ambientes semelhantes. A produtividade total por hectare para fazendas com diversos sistemas de cultivo, neste caso quatro diferentes culturas, foi cerca de 6 por cento maior do que para aqueles com apenas uma cultura. Além disso, pequenos agricultores que cultivam culturas tradicionais que têm mais valor para os consumidores locais têm mais opções de mercado do que aqueles que só plantam uma cultura para exportação. Além disso, as fazendas de monoculturas apresentaram maiores custos de produção porque as lavouras necessitam de fertilizantes químicos e pesticidas. No total, o lucro líquido das fazendas com diversos sistemas de cultivo foi 135 por cento maior do que para as fazendas com apenas umasafra. Críticos da produção agrícola com uso intensivo de químicos afirmam que ela apresenta alta produtividade inicialmente, mas prejudica as bases da produção de alimentos no longo prazo. Em contraste, a agroecologia é a aplicação de conceitos e princípios ecológicos ao projeto e ao gerenciamento de sistemas sustentáveis de alimentos. Seus defensores afirmam que práticas que construam um solo saudável, protejam a biodiversidade, conservem os recursos naturais e limitem a dependência de produtos à base de petróleo, como fertilizantes sintéticos e pesticidas, são a melhor aposta para lidar com os desafios do futuro. Soberania alimentar, No contexto do desenvolvimento internacional, soberania alimentar é o direito da população a alimentos saudáveis e culturalmente apropriados produzidos através de métodos sustentáveis e o seu direito de escolher a própria comida e os próprios sistemas agrícolas. Diferente de políticas e programas de segurança alimentar, soberania alimentar coloca as aspirações, necessidades e meios de vida daqueles que produzem, distribuem e consomem os alimentos no coração dos sistemas e das políticas de alimentação ao invés das necessidades dos mercados e das corporações. Defensores da soberania alimentar podem argumentar que uma agenda de segurança alimentar que simplesmente ofereça um excedente de grãos para pessoas famintas é apenas mais uma forma de dumping (oferta abaixo do preço para eliminar concorrentes locais), facilitando a entrada de corporações estrangeiras, enfraquecendo a produção local de alimentos, e possivelmente levado a uma irreversível contaminação biotecnológica das variedades de plantas nativas, através de variedades patenteadas. A Via Campesina lançou a ideia de “Soberania Alimentar” na Cúpula Mundial da Alimentação em 1996. A ideia agora evoluiu para um movimento mundial de pessoas incluindo setores sociais como pobres urbanos, grupos de ambientalistas e de consumidores, pequenos agricultores, associações de mulheres, pescadores, pecuaristas artesanais e muitos outros. O movimento também é reconhecido por diversas instituições e governos. A PERSPECTIVA DA AGROECOLOGIA NA MÍDIA: Já chega de tristeza e melancolia. Nós sabemos que há algo errado com a alimentação. O que nós não sabemos: não tem que ser assim. As pessoas estão cada vez mais conscientes, embora ainda lamentavelmente mal informadas, de que há algo errado com a forma como a alimentação funciona no nosso mundo. Mas, em vez de provocar ação e empenho em encontrar soluções, esta consciência traz o risco de gerar fatalismo e complacência. Avanços empolgantes na agroecologia ao redor do mundo trazem esperança e espaço para a ação, mas a mensagem precisa chegar mais às pessoas. Alimentos industriais não são apenas ruins para a sua saúde, são ruins por um monte de razões. Escrever sobre comida não é mais apenas falar de receitas e as tendências de saúde. A história da nossa comida abrange todo o globo, desde as guerras sobre os campos de petróleo do Oriente Médio, com a perda de ecossistemas inteiros, até as unidades hospitalares cardíacas. O que as pessoas não sabem sobre a maneira que a humanidade moderna explora o mundo natural, e explora a si mesma, está literalmente, nos matando - e danificando o planeta. Travar uma guerra química contra a natureza a fim de produzir alimentos não é um mal necessário. Avanços na agroecologia em todo o mundo estão mostrando que a dependência de pesticidas sintéticos e fertilizantes não é apenas destrutiva para agricultores, consumidores e ecossistemas, é desnecessária. A questão não é apenas sobre agricultura, é sobre comida. Ajude a conectar os pontos entre o campo e a mesa de jantar. Claro, os agricultores podem ser duros para o meio ambiente, mas estamos pagando para que o façam! Todos nós, cada vez que abrimos a boca para comer, somos cúmplices neste grande drama. Relembre o seu público da relação entre o seu pão / arroz / mingau diário e a destruição da floresta, o esgotamento e a contaminação de águas subterrâneas, as mudanças climáticas e o câncer; mas abra seus olhos para o mundo das alternativas, também. Seção 2: OLHE POR TRÁS DA PROPAGANDA O que o público não sabe que está causando danos à sua saúde e ao planeta. Tem mesmo que ser deste jeito? Assim como muitas coisas no mundo moderno, há muito mais complexidade na questão dos alimentos do que se pode imaginar inicialmente. O mundo da comida está envolto em um manto de mito e incompreensão. As dramáticas (re) descobertas que estão emergindo todos os dias através da integração de conhecimento tradicional e a moderna ciência da ecologia estão frequentemente escondidas ou menosprezadas. As maravilhas da manipulação genética –ou as preocupações geradas por ela—ganham as manchetes. “Entre 1981 e 2008 os arquivos do The New York Times contêm, por exemplo, 2.696 referências a ‘engenharia genética’, contra 3 para ‘agroecologia’, 7 para ‘agrossilvicultura’ e nenhuma para ‘mistura de cultivares’.” —Vanloqueren and Baret; Um mito onipresente no nosso mundo é o da escassez, de acordo com uma nova geração de escritores e pesquisadores. Há muitos de nós e não podemos nos alimentar sem a ajuda da química moderna e do agronegócio. Pesticidas e fertilizantes à base de petróleo são um mal necessário. Mesmo conservacionistas compram esse mito, defendendo a agricultura com uso intensivo de químicos como um antídoto necessário para o corte e a queimada de florestas ou outro uso extensivo da terra. Em poucas palavras, a história é assim: produtos químicos, culturas geneticamente modificadas e alimentos processados são males necessários. Eles são a única forma de alimentar um mundo de 7 bilhões de pessoas. Além disso, é o que o "mercado" exige. É verdade que a agricultura industrial produz um grande volume de commodities. Produtores de milho americanos conseguem transformar meio bushel de semente de milho em mais de 150 bushels por acre, em média. Mas não é verdade que estão alimentando o mundo, certamente não com alimentos nutritivos. Em "Fair Food" (“Comida Justa”, numa tradução livre), Oran Hesterman detalha esta farta produção: de todo o milho para ração colhido nos Estados Unidos, 43 por cento são usados para alimentar gado doméstico, 15 por cento são exportados, principalmente para alimentar gado; 30 por cento são transformados em etanol, e os 12 por cento restantes são transformados em milhares de produtos, boa parte "junk food". “Não se engane: nós criamos uma situação na qual caminhonetes americanas estão competindo com consumidores de grãos na África. E podemos ver quem está ganhando”, escreve Michael Pollan, provavelmente o mais influente autor especializado no setor de alimentos nos EUA. “A questão se resume a isso: as terras agrícolas do mundo são um recurso precioso e limitado; nós deveríamos estar usando elas para cultivar comida para pessoas, não para carros ou gado.” No filme Food Inc., o jornalista investigativo Eric Schlosser disse que se tornou um jornalista porque começou a ver o sistema alimentar industrial como "um mundo deliberadamente escondido de nós". Se isso é verdade, então há um grande trabalho para jornalistas mundo afora. Nas bases, entretanto, inovações estão surgindo rapidamente em todo o mundo. E vozes importantes, incluindo a horta da Casa Branca, estão contando histórias diferentes sobre o que é possível fazer com os alimentos. Em 2010, o relator especial da ONU para o Direito à Alimentação lançou um relatório concluindo que "a agroecologia ... pode dobrar produção de alimentos em regiões inteiras dentro de 10 anos, enquanto mitiga mudanças climáticas e alivia a pobreza rural." Jacques Diouf, então diretor-geral da FAO, declarou em 2011 que "o presente paradigma da produção agrícola intensiva não pode responder aos desafios do novo milênio. "O que o mundo precisa”, escreveu ele, “é uma grande mudança do modelo homogêneo da produção agrícola para sistemas agrícolas intensivos em conhecimento,e muitas vezes específicos para determinada região.” Críticos do sistema de alimentação industrial argumentam que os seus problemas não estão limitados a todos os custos ocultos repassados para as pessoas e ao meio ambiente em termos de saúde e degradação dos recursos. O problema é que o alimento industrial é inerentemente insustentável,argumenta o celebrado filósofo e agricultor orgânico Fred Kirschenmann, que tem doutorado em filosofia pela Universidade de Chicago e foi um pioneiro da agricultura orgânica, transformando a fazenda da família em Dakota do Norte para a certificação orgânica por volta de 1980. Kirschenmann argumenta que o sistema alimentar industrial não pode continuar como está por muito mais tempo. A mudança é inevitável: ou uma mudança sistemática e organizada, ou um colapso do sistema. Ele diz neste artigo que existem quatro principais ameaças à agricultura industrial, que minam a sua capacidade de continuar no futuro, em outras palavras, a sua sustentabilidade. 1-Restrições energéticas A questão que desafia os decisores políticos de hoje é esta: "Que tipo de sistema iremos precisar quando o petróleo custar 300 dólares por barril? Um vez que o modelo da nossa atual agricultura industrial é baseado na energia barata, esta é a sua preocupação número um. Fertilizantes, pesticidas, fabricação e operação de equipamentos, todos dependem de combustíveis fósseis baratos. Quando o custo de combustíveis fósseis subir, os custos da agricultura vão disparar. Em Iowa, a amônia anidra foi de 200 dólares por tonelada para mais de 1.000 dólares por tonelada quase da noite para o dia quando os preços de energia atingiram o pico em 2008. Os agricultores não podem operar de forma lucrativa sob tais condições de altos custos de insumos, e as pessoas que vivem com dificuldade não podem mais arcar com o custo de comprar comida. 2-Disponibilidade de água Nós estamos usando nossas fontes de água num ritmo insustentável. Os dois principais centros populacionais, a China e a Índia, estão usando suas reservas de água rapidamente. A China, que depende de irrigação para 80 por cento de sua produção de grãos, reduz seus aquíferos cerca de três metros por ano e está chegando a uma profundidade de mais de 300 metros, em alguns lugares. A Índia depende de irrigação para 60 por cento de sua produção de grãos e está esgotando seus aquíferos em 6 metros por ano, buscando água a profundidades de mais de 600 metros em alguns lugares. De acordo com Kirschenmann, nos EUA, onde 20 por cento da produção de grãos é dependente de irrigação, o aquífero Ogallala foi esgotado pela metade desde 1960. Ele está sendo reduzido a uma taxa de 4,9 trilhão de litros, mais rapidamente do que pode ser recuperado .3-Mudanças climáticas As conclusões mais recentes são de que as mudanças no clima provavelmente não serão graduais e terão um impacto potencialmente grave sobre os agricultores. Eventos climáticos extremos, mudanças nos padrões climáticos e de pragas, tornam esta profissão imprevisível ainda mais difícil. Fazendas utilizando abordagens industriais e dependentes da monocultura e de solos degradados serão particularmente vulneráveis. 4-Degradação Ecológica Kirschenmann dá atenção especial à destruição da biodiversidade, especialmente em solos anteriormente saudáveis. A agrônoma Australiana Christine Jones afirma que entre 50% e 80% do carbono orgânico que esteve uma vez na superfície do solo foram perdidos para a atmosfera nos últimos cerca de 150 anos, "devido à nossa incapacidade de cuidar da terra como uma coisa viva ". A boa notícia é que as alternativas estão surgindo em todo o mundo. Os agricultores do Quênia, por exemplo, criaram um sistema "empurra e puxa" (push-pull, em inglês) para controlar plantas daninhas e insetos sem inseticidas químicos. O sistema "empurra" (push) pragas para longe com o plantio, entre as culturas de milho, de espécies que repelem os insetos, enquanto "puxam" (pull) pragas para lotes de capim elefante, que produz uma seiva pegajosa que atrai e captura insetos. Os resultados têm sido notáveis. O "empurra e puxa" duplicou a produtividade do milho e do leite e é agora usado em mais de 10 mil fazendas na África Oriental. O relatório global do IAASTD oferece exemplos agroecológicos como alternativas para a trajetória da agricultura industrial, incluindo "melhor gerenciamento do solo e da água para aumentar a retenção de água e diminuir a erosão; (...) um maior uso de medidas de conservação do solo, (...) a modelagem das dinâmicas de espécies e pragas exóticas para reduzir a dependência de produtos químicos para manter a saúde humana e dos ecossistemas ao mesmo tempo em que traz soluções para as crescentes ameaças de pragas provocadas pelas mudanças climáticas. Sistemas integrados de lavouras, árvores, gado e peixes podem ser intensificados e gerenciados como sistemas agrícolas multifuncionais com menos consequências negativas para os ecossistemas ".(Relatório Global, opções de ação, p. 27) Aqui estão alguns agroecológicas: exemplos de práticas Sistemas Agroflorestais Estes são sistemas que combinam árvores comculturas anuais. Em alguns casos, as culturas anuais, como milho, ou perenes de vida curta, como o abacaxi, são plantadas entre as fileiras de árvores jovens. Em outros sistemas,árvores fixadoras de nitrogênio fornecem fertilidade e sombra parcial para culturas de alto valor como cacau, café ou chá. Tais sistemas resultam em maiores rendimentos e mais diversificação de produtos. Integração Lavoura-Pecuária O filósofo agrícola norte-americano Wendell Berry disse que quando os animais foram removidos das fazendas Rotação de Culturas diversidade ao americanas e colocados em confinamento longo do tempo., Agricultores alternam culturas, (ou "fazendas industriais") aquela solução foi por exemplo plantando milho seguido por soja, nitidamente dividida em dois problemas: não havia seguido de alfafa. Ou arroz seguido de alho, mas suficiente fertilizantes (esterco) para as fazendas com um intervalo entre eles, usando plantas e e havia muito fertilizante (leia-se poluição) nos fixadoras de nitrogênio para aumentar a fertilidade confinamentos. Criar animais juntamente com as do solo e quebrar o clico das populações de culturas pode ajudar a elevar fertilidade e controlar pragas ou doenças. pragas, além de diversificar a produção. O agronegócio e seus aliados podem retratar a Plantios mistos em vez de monoculturas. agroecologia como uma visão elitista ou hippie, Insetos podem ser confundidos por um campo mas a agricultura com base em informações da diversificado. A fertilidade do local pode ser natureza está cada vez mais sendo reconhecida melhorada através do plantio de árvores fixadoras como uma alternativa viável ao desenvolvimento de nitrogênio em meio a rentáveis árvores frutíferas da agricultura convencional. Os proponentes da agroecologia afirmam que ela tem o potencial de ou hortaliças. ajudar: Policultura Diversidade no mesmo espaço, Plantas de Cobertura e Cobertura de Solo O solo exposto pode sofrer erosão pela chuva, vento e sol, e/ou ser coberto por ervas daninhas. Plantas de cobertura, como o amendoim ou outras leguminosas, e cobertura morta como folhas ou palha, podem proteger o solo e eliminar ervas daninhas. A fornecer comida boa e nutritiva suficiente para a população mundial, incluindo cidades, através de agricultura urbana A restaurar a biodiversidade, a fertilidade do solo e os recursos hídricos em terras agrícolas degradadas. Reduzir drasticamente a pobreza, melhorar os meios de subsistência e segurança A restaurar a biodiversidade, a fertilidade do solo e os recursos hídricos em terras agrícolas degradadas. Reduzir drasticamente a pobreza, melhorar os meios de subsistência e segurança Manter a agro-biodiversidade, fundamental para a resiliência dos sistemas alimentares Manter os importantes elementos culturais e espirituais dos alimentos e fortalecer a soberania alimentar Mitigar a mudança climática e ajudar a esfriar o planeta Exaltar as virtudes da agroecologia não é minimizar os desafios enfrentados na tarefa de alimentar o mundo, mas é dizer que o discurso dominante de desgraça, escassez e salvação pela engenharia genética não refletem a realidade. Os desafios são reais, mas as alternativas oferecidas pela agroecologia também são. A Avaliação Internacional do Conhecimento, da Ciência e da Tecnologia no Desenvolvimento Agrícola (IAASTD), o estudo mais abrangente já feito sobre ciência e tecnologia agrícolas, chegou a uma conclusão profética em 2008: "Negócios como de costume não são mais uma opção." Pesquisa de alimentos orgânicos na China "Alguns anos atrás, eu propus que a China faça esforços para desenvolver a sua agricultura orgânica, ou setor de ecoagricultura, mas me disseram que as pessoas morreriam de fome como resultado. Especialistas agrícolas continuaram a espalhar essa ideia, e muitos acadêmicos e funcionários têm aceitado sem questionar. Como resultado, os ecologistas têm se esquivado da eco-agricultura, enquanto especialistas de biotecnologia continuam a propagar que as culturas geneticamente modificadas são a única solução possível para as questões de segurança alimentar da China." --Jiang Gaoming é pesquisador-chefe da Academia Chinesa de Ciências, Instituto de Botânica. Os métodos utilizados pelos especialistas da Academia Chinesa de Ciências incluíram: usar a palha normalmente queimada pelos agricultores e processá-la como alimento para as vacas, economizando entre 1.500 yuans e 2.000 yuans (entre 232 e 309 dólares) por cabeça de gado; utilizar parte do esterco das vacas para produzir metano, para ser usado como fonte de energia, e o resto como adubo orgânico de qualidade para os campos; e atacar pragas com "métodos biológicos e físicos", como por exemplo, armadilhas luminosas para insetos que foram usadas durante todo o ano, e frangos que foram mantidos no campo, alimentando-se dos insetos. As ervas daninhas foram recolhidas e usadas como forragem orgânica para os gansos, peixes e criação de gafanhotos; e níveis adequados de irrigação foram utilizados para manter a umidade do solo. Estes métodos permitiram restauração ecológica de terras improdutivas que haviam sido contaminadas com fertilizantes, pesticidas e herbicidas e permitiram aumentar os níveis de produção. Seção 3: VENDO A COMIDA COMO UM JORNALISTA DE MEIO-AMBIENTE Relatar a verdade sobre o nosso sistema alimentar requer uma compreensão da ecologia e a validade das tradições agrícolas. E exige bom jornalismo sólido. O correspondente da BBC Richard Black em um artigo recente sobre um novo avanço na genética de plantas pelo Instituto Internacional de Pesquisas do Arroz (IRRI, na sigla em inglês) fornece um exemplo muito típico de cobertura da grande mídia a respeito da engenharia genética. O artigo exaltou a virtude de uma nova planta de arroz transgênico para a Índia, que pode aumentar a produtividade, ajudando as plantas a melhor absorver o fósforo do solo, um nutriente geralmente pouco encontrado nas tigelas de arroz da Ásia. Em nenhum lugar do artigo Black citou críticas às plantas geneticamente modificadas para alimentação, nem mencionou o debate sobre culturas transgênicas introduzidas anteriormente, como o algodão BT ou a soja Roundup Ready, nem discutiu pesquisas ou métodos alternativos para melhorar a absorção de fósforo. Fertilizantes grátis a partir do ar O nitrogênio é importante para o crescimento das plantas. Felizmente, é o elemento mais abundante no ar. Infelizmente, as plantas não podem acessá-lo por si próprias. Eles precisam da ajuda de bactérias. Certas plantas, a maior parte de membros da família do feijão, têm uma relação especial com estas bactérias e podem fixar o nitrogênio da atmosfera. Estas plantas leguminosas, como acácia, amendoins e muitos outros, se decompõem e tornam o nitrogênio disponível para as lavouras. O nitrogênio sintético a partir de produtos petroquímicos, por outro lado, é a principal fonte de poluição e uma fonte de gases de efeito estufa. Os agricultores que rotacionam leguminosas com seus principais produtos agrícolas - como os produtores de arroz da Tailândia que cultivam uma "cultura de intervalo" com a leguminosa sesbania por 45 dias, no meio de suas duas safras anuais de arroz - obtêm nitrogênio de graça e reduzem as emissões de gases poluentes e de efeito estufa. Agricultores do Quênia que cultivam Faidherbia albida intercaladas em suas lavouras obtêm nitrogênio, têm plantações mais resistentes à seca e forragem para os animais, tudo na mesma barganha. Norman Uphoff, um professor da Universidade Cornell e defensor de um inovador sistema de cultivo conhecido como o Sistema de Intensificação do Arroz, chama esse tipo de pensamento de "genocêntrico", um fenômeno no qual todos os diversos fatores que determinam uma boa colheita são simplificados para um foco único em genética, com lamentáveis consequências. Embora recebendo bem a notícia do avanço científico realizado pelo IRRI, Uphoff advertiu contra a tornar-se "apaixonado ou enganado" pelo pensamento genocêntrico. Tal pensamento "reforça a ideia de que 'os genes são tudo ' e todos os outros aspectos da produção de alimentos são secundários ou subsidiários (ou simplesmente esquecidos). Tal pensamento estreita o âmbito de nossa pesquisa, e outros elementos de melhoramento de culturas são ignorados ou pouco apoiados", disse Uphoff em uma resposta de e-mail para o estudo do IRRI. "Em segundo lugar, reforçam-se nos agricultores tipos infelizes de 'dependência' comercial e psicológica. Os agricultores estão propensos a pensar que eles são impotentes, a menos que tenham variedades novas e melhores, em vez de aprender a usar os seus próprios recursos para melhor resultado. Este tipo de ’imobilização cognitiva’ é muito difundida na Índia nos dias de hoje e considero-a prejudicial. "Precisamos avançar além do pensamento genocêntrico para um modelo mental agroecológico. Deveríamos trabalhar com os agricultores para ajudá-los a entender o quanto eles podem realizar ao gerenciar plantas, solo, água e nutrientes de formas diferentes e melhores, de modo que nós também consigamos obter mais benefícios a partir de organismos do solo em associação com as plantas." O artigo de Black é um exemplo de como o bom jornalismo básico pode ser esquecido quando tratase dos avanços impetuosos em tecnologia. A ideia de maravilhosas novas plantas é mais atraente do que a boa gestão do solo. Mas esse fato não nos exime da nossa responsabilidade de aprofundar as questões da alimentação e da agricultura. As alternativas que analisamos são muitas vezes bastante acentuadas. Ao iluminar as diferenças com exemplos concretos, podemos ajudar nosso público a entender melhor as questões. Considere o exemplo de herbicidas, usados na eliminação de ervas daninhas. Herbicidas podem, teoricamente, ter algum valor prático para agricultores conscientes, por exemplo, para uma aplicação única em um local delimitado para o estabelecimento de uma agro-floresta, ou para atacar uma espécie invasora para permitir que as plantas nativas se restabeleçam. Os melhores praticantes de Manejo Integrado de Pragas (MIP) só usam herbicidas como uma última e até mesmo desesperada alternativa. Por outro lado, considere a realidade dos herbicidas na alimentação industrial: desenvolvidos a partir da tecnologia da guerra química; dependentes do controle e da exploração de petróleo; movimentando uma indústria de bilhões de dólares criada pelo prejudicial mal-entendido de que é uma boa prática usar produtos químicos venenosos como uma das principais ferramentas da agricultura. Agora olhe a partir de um ponto de vista agroecológico: o mal é uma coisa. Mas a principal crítica é que a prática é semelhante à queima de dinheiro. A matéria orgânica é fundamental se você está falando sobre nutrição, fertilidade do solo, ou de poupança de carbono. Mas a agricultura industrial desencoraja tudo isso. É desperdiçada a terra que poderia produzir material para alimentação, ração animal, combustível, adubo e composto, além de ser habitat para insetos e animais benéficos, e assim por diante. Mas em vez disso ela é mantida nua com venenos. Solo fica exposto com diversos impactos negativos. Ou a terra é mal administrada com herbicida e passa a oferecer bom habitat para plantas invasoras ou nocivas. Bilhões de dólares são gastos em uma substância que é prejudicial e um desperdício. O que a genética diz sobre herbicidas? Estão a pesquisa e o desenvolvimento (P&D) e as vendas indo para variedades de grãos que combatem as ervas daninhas ou para propriedades alelopáticas (propriedades químicas naturais que desencorajam a concorrência de outras espécies) em soja com alta fixação de nitrogênio? Não, elas estão indo para as plantas como a soja que pode sobreviver a herbicidas e se manter nos ecossistemas cada vez mais vazios de vida e simplificados que eles criam. (Leia mais aqui sobre a controvérsia sobre a soja Roundup Ready) Dicas para cobrir alimentos e natureza Claramente, se é para o mundo se alimentar de forma sustentável, ele precisa ser mais bem informado sobre as possibilidades que estão disponíveis e as lições aprendidas pelos praticantes da agroecologia. Jornalistas e meios de comunicação locais podem desempenhar um papel fundamental na disseminação de tais lições, ajudando as sociedades a encontrarem um caminho para a soberania alimentar, mas primeiro precisam de uma melhor fundamentação e compreensão das várias abordagens que estão sendo adotadas e das questões em torno delas. Aqui estão algumas dicas para melhorar sua cobertura de questões de agroecologia e segurança alimentar: Use Diferentes ângulos – Usar uma lente "verde" é importante quando se trata de agricultura. Mas não basta abordar estas questões do ponto de vista ambiental. Assuntos de "jornalismo pessoal" como alimentos e refeições são mais populares do que nunca nestes dias, portanto adotar este ângulo para uma história pode ajudar você a atingir públicos maiores e mais diversos. Entretanto, há muitos outros ângulos que você pode escolher: agroecologia e soberania alimentar podem ser abordadas como uma reportagem de negócios ou economia, uma reportagem científica, uma reportagem de saúde, uma história social e cultural, uma reportagem sobre segurança, e assim por diante. Escrever sobre estas questões a partir de diferentes ângulos não só amplia o seu apelo e seu público, mas também torna a tarefa mais divertida. Foco em Soluções, Não Apenas Problemas – Isto pode parecer óbvio, dado Foco Nas Pessoas – Acima de tudo, procure pessoas interessantes que estão trabalhando nestas questões. Histórias centradas em indivíduos, em vez de problemas, são geralmente mais atraentes, e focar no estudo de casos de agricultores, agroecologistas e pesquisadores de campo ajuda o público a ver o que as pessoas são (e o que não são).Além disso, assuntos não apenas têm que ser histórias de sucesso; esforços que fracassaram podem ser tão interessantes e ainda mais esclarecedores. Explore Todos os Lados – Mais amplamente, tente informar sobre todos os lados do tema, dentro do que o espaço permitir. Este guia obviamente se concentra em um conjunto de soluções, mas, a fim de entender por que elas podem ser preferíveis, primeiro você precisa estudar e se informar sobre o atual sistema de agricultura industrial que é utilizado e sobre as tensões que ele criou, assim como as outras soluções propostas, como a engenharia genética. Entrevistar defensores dessas abordagens e começar a entender por que eles acreditam em suas abordagens e quais hipóteses estão usando vai fazer o seu relato sobre agroecologia e soberania alimentar ter mais nuances, contexto e credibilidade. Naturalmente, encontrar tempo e espaço para fazer toda essa pesquisa e reportagem - talvez através de uma série de reportagens - é um desafio, mas ele vai se provar um benefício tanto para sua compreensão e quanto para sua carreira como jornalista. que a agroecologia e a soberania alimentar são essencialmente apresentadas como soluções, mas devido à preferência da mídia (e muitos editores) por destacar problemas e crises, os jornalistas podem ficar tentados a se concentrar mais nos problemas de escassez de alimentos, vazamento de produtos químicos, perdas de qualidade do solo e de agro-biodiversidade, e assim por diante. Certamente, estes são temas dignos de se explorar. Mas melancolia e desgraça em excesso podem gerar apatia, fatalismo, e, finalmente, uma perda de interesse por parte do público. Incluir soluções potenciais - e há outras, naturalmente, além das propostas pela agroecologia - produz uma história com mais equilíbrio. Evite (ou Explique) os Jargões – Como acontece com qualquer tema complicado ou científico, a agroecologia é um tema carregado de jargões - palavras e frases complexas que os especialistas disparam facilmente, mas que o público leigo tem dificuldade para entender. Na verdade, muitos destes termos são usados neste guia! Eles podem gerar desinteresse, portanto tente evitar o jargão sempre que possível, ou se você tiver que usar explique os termos em linguagem simples e fácil de entender. Este Use imagens e gráficos – Uma imagem vale glossário de termos de agroecologia pode ajudar. mais que mil palavras, como diz o ditado, e o mesmo pode ser dito para gráficos e ilustrações mostram os desafios alimentares que Traduza a ciência – Uma consequência natural que enfrentamos e como eles estão sendo enfrentados ao que foi proposto acima é ajudar o público na vida real. A mídia social é, naturalmente, outra a entender a ciência e as questões técnicas ferramenta que repórteres modernos têm utilizado envolvidas. A agroecologia envolve não apenas para a distribuição de histórias a uma audiência pesquisa de ponta, que pode ser bastante técnica mais ampla, para obter feedback e para, de fato, e enigmática, mas também conceitos ecológicos encontrar fontes e informações. e econômicos amplos com os quais o público pode não estar familiarizado. Especialmente ao entrevistar cientistas, economistas e outros Encontre Ganchos Para as Notícias – especialistas, pense em si mesmo como um Editores e produtores que priorizam temas como intérprete que precisa traduzir a linguagem destes política e finanças podem se mostrar relutantes especialistas em termos comuns que todos em apoiar histórias sobre temas que consideram possam entender. enigmáticos, como a agroecologia ou a soberania alimentar. Então, seja criativo para encontrar formas para oferecer suas histórias na redação. Bons ganchos para as reportagens podem incluir datas comemorativas (Dia Mundial da Alimentação, eventos relacionados aos agricultores e até feriados tradicionais, tais como festivais de colheita), ou eventos atuais que se relacionam com os problemas agrícolas e ambientais – fome, aumento dos preços de alimentos, zonas mortas criadas pelo esgotamento agrícola e assim por diante. Se você está tendo problemas com a linha do seu editor, tente abordar editores de outras editorias que publicam histórias sobre alimentos e refeições, ou negócios ou qualquer uma das outras abordagens mencionadas na dica acima. Investigando a sabedoria convencional em alimentos Os jornalistas têm de evitar a armadilha de clichês, ou repetir coisas que as pessoas tendem a tomar por certas ―graças a bilhões de dólares em publicidade corporativa―mas muitas vezes não são verdade. Aqui estão alguns exemplos: 1. 2. 3. 4. 5. Não podemos alimentar o planeta sem a agricultura industrial. Defensores de alimentos naturais ou orgânicos são elitistas que condenarão bilhões de pessoas à fome. O sistema industrial de produção de alimentos tem as suas desvantagens, mas é mais produtivo. A fome global poderia ser resolvida se todos os países tivessem acesso suficiente às tecnologias modernas como fertilizantes nitrogenados, pesticidas e sementes de “alto rendimento”. Agricultura orgânica (ou natural) utiliza mão de obra demais. Vamos examinar o último ponto, e considerar que alguns trabalhos são arriscados e prejudiciais, enquanto outros são inspiradores e engrandecedores. Trabalhar em um ecossistema agro-natural é diferente de um emprego no sistema de alimentação industrial. Uma família cuidando e colhendo sua própria agrofloresta em paz e autossuficiência tem um tipo diferente de "trabalho" daquele de uma família de imigrantes vivendo e trabalhando perto de um matadouro de tamanho industrial. Poder do Pato No Japão e Vietnã, alguns agricultores orgânicos criam patos, e, às vezes, peixes em seus arrozais para controlar pragas e ervas daninhas. Criar patos com o arroz não é um novo sistema, mas a sabedoria desta antiga prática é reconhecida por agroecologistas por sua simbiose (relação mútua) entre os patos e arroz: os patos comem caracóis que são uma praga para mudas de arroz, e comem e eliminam as ervas daninhas que competem com o arroz. O esterco dos patos contribui com a fertilidade do solo, e seu movimento constante e sua alimentação ajudam a reduzir a germinação de plantas daninhas. Naturalmente, os agricultores recebem carne e ovos no negócio. Subprodutos da cultura do arroz (farelo de arroz, arroz quebrado) podem ser usados para alimentar os patos. Os agricultores que praticam este tipo de integração lavoura-pecuária registram rendimentos mais elevados e custos de mão de obra mais baixos. A maior demanda de trabalho da agroecologia em comparação com a agricultura convencional atual pode ser considerada uma vantagem nos lugares onde poucas oportunidades alternativas de emprego existem, ou onde a concentração de terra e a agricultura industrial estão empurrando milhões de agricultores para favelas urbanas superlotadas, como está acontecendo ao redor do mundo. Concentre-se em problemas atuais Há muitas histórias pouco noticiadas sobre o dano que está sendo feito pela agricultura industrial moderna, prejuízos que a agroecologia evitaria e poderia reparar. É importante para os jornalistas lembrar os leitores de certos fatos: subnutrição, novos compostos químicos no meio ambiente, desequilíbrio na distribuição de recursos para microbiologia e para agricultura sustentável. E lembre-os das mensagens opostas com as quais eles são frequentemente bombardeados. Uma das lições da agroecologia é olhar para o mundo dos alimentos de diferentes maneiras, através de lentes diferentes daquelas que têm sido as normais das últimas décadas de alimentação industrial. Isto é verdade tanto se nós olharmos para os solos e os ecossistemas quanto para a questão da fome humana. MS Swaminathan, um dos pais da agricultura moderna na Índia e um defensor empenhado de agroecologia, tem uma mensagem à qual os jornalistas deveriam prestar atenção: "A fome na região Ásia-Pacífico tem três dimensões principais – fome crônica causada pela falta de poder aquisitivo; fome oculta causada por deficiência de micronutrientes e fome transitória causada pelo corte em suprimentos devido a secas, inundações, ciclones, etc. Portanto, qualquer estratégia para a eliminação da fome deve basear-se numa clara compreensão dos fatores causais. Que tipos de fome existem nas áreas onde você trabalha e como eles estão sendo tratados? Em particular, como está sendo atacado o problema da superação da fome oculta?" Seção 4: PRODUZIR INTEGRADO À NATUREZA...SE PAGA? Um das características menos relatadas da agroecologia é que ela pode ser rentável Agro-ecology works, and generates profits, too. Too often, touchy-feely stories romanticize natural A agroecologia funciona e também gera lucro. Demasiadas vezes, histórias melosas romantizam a agricultura natural, mas reportagens que demonstrem o aspecto econômico da agroecologia terão mais influência. Mostre exemplos que comprovem os múltiplos benefícios - conservação da biodiversidade, economias locais mais fortes, crianças saudáveis - mas trabalhe forte nos aspectos econômicos. Se suas investigações mostram que não está funcionando, então conte essa história. Mas não repita o velho ditado sobre como a agricultura integrada à natureza não pode alimentar o mundo. O sistema alimentar industrial atualmente em uso não alimenta o mundo todo, (veja os 1 bilhão de desnutridos), enquanto a agroecologia poderia potencialmente alimentar o mundo muitas vezes mais, ao mesmo tempo em que restauraria a saúde dos sistemas naturais. Um exemplo: o Sistema de Intensificação do Arroz, conhecido como SRI na sigla em inglês, é uma metodologia agroecológica para aumentar a produtividade do arroz irrigado, alterando o manejo de plantas, solo, água e nutrientes. O SRI surgiu em Madagascar na década de 1980 e baseia-se nos princípios de cultivo utilizando menos mudas, mudas mais jovens, solos fertilizados naturalmente e o uso reduzido de água. Os benefícios do SRI têm sido demonstrados em mais de 45 países. Eles incluem: aumento de 50% a 100% ou mais nos rendimentos, redução de até 90% na necessidade de sementes e até 50% de economia de água. Os princípios e práticas do SRI foram adaptados para arroz de sequeiro (que usa chuva ao invés de irrigação), além de outras culturas como trigo, cana-de-açúcar e teff (cereal comum na Etiópia), entre outras, com aumentos de produção e benefícios econômicos associados. O lema do SRI é "mais com menos": mais comida com menos fertilizantes, água e sementes. Sua produtividade não necessita de sementes geneticamente modificadas ou muito do que é produzido pelas empresas do agronegócio. E isso é parte do problema de promover o sistema, é claro. Ele produz mais alimentos e meios de subsistência rurais mais fortes, mas que não produz muito lucro para as empresas multinacionais. "Até mesmo nas mais pobres sociedades os agro-ecossistemas têm potencial, através da agricultura ecológica, ... para igualar ou exceder significativamente os rendimentos produzidos por métodos convencionais, para reduzir a demanda por conversão de terras para a agricultura, para restaurar os serviços do ecossistema (especialmente a água), para reduzir o uso e a necessidade de fertilizantes sintéticos derivados de combustíveis fósseis e para diminuir a utilização de inseticidas fortes", relatou a IAASTD. (Síntese do relatório, p. 64) (Re)Creating sustainable food systems with agro-ecology Os agro-ecossistemas também não estão limitados a áreas rurais. Uma das lições da agroecologia é a importância da alimentação local. Comer alimentos produzidos perto de casa significa alimentos mais nutritivos, mas pode criar empregos, melhorar a vida e reduzir a chamada "quilometragem da comida" e a pegada de carbono de uma refeição. A agricultura urbana está crescendo em todo o mundo, de Detroit a Bangkok até o Rio de Janeiro. "As mulheres em um dos bairros mais pobres de Nova Iguaçu, cidade 40 km ao norte do Rio de Janeiro não têm mais que gastar dinheiro com hortaliças, porque aprenderam a cultivar as suas próprias, com a horticultura orgânica urbana decolando no Brasil", registra o InterPress Service. Levar fazendas para as cidades não é de pouca importância, com a urbanização arrastando mais e mais pessoas para as cidades. Em 2000, 81 por cento dos brasileiros viviam em áreas urbanas, e 10 anos mais tarde, a proporção aumentou para mais de 84 por cento, de acordo com o censo de 2010. Na verdade, existem milhares de iniciativas em todo o mundo com o objetivo de (re)desenvolver economias de alimentos locais. Sistemas de venda direta, como a agricultura sustentada por comunidades (CSA, na sigla em inglês) estão pipocando ao redor do mundo, conectando diretamente os pequenos agricultores com as comunidades. Nos Estados Unidos, dezenas de milhares de famílias se juntaram a CSAs, e em algumas áreas do país há mais procura do que há fazendas CSA disponíveis, relata o site www.localharvest.org. Embora não existam números oficiais sobre esses sistemas, muitas vezes extraoficiais, o banco de dados da Local Harvest inclui mais de 4 mil CSAs em todos os EUA. No início dos anos 1980, não havia nenhuma. Esta reconexão dos agricultores e consumidores de alimentos não é exclusiva dos países desenvolvidos. O agroecologista Miguel Altieri fornece um exemplo do Brasil, onde a soberania alimentar está sendo promovida por uma iniciativa chamada Rede Ecovida, onde agricultores familiares, ONGs de apoio e consumidores, cujo objetivo é promover alternativas ecológicas e mercados locais, "estreitam o vínculo entre os produtores locais e os consumidores, garantindo a segurança alimentar local e que a riqueza gerada permanece na comunidade.” "A Ecovida abrange 180 municípios e cerca de 2.400 famílias de agricultores (cerca de 12 mil pessoas) organizados em 270 grupos, associações e cooperativas. Eles também incluem 30 ONGs e 10 cooperativas de consumidores ecológicos. Todos os tipos de produtos agrícolas são cultivados e vendidos pelos membros da Ecovida, incluindo hortaliças, cereais, frutas, sucos, mel, geleia, leite, ovos e carne, atingindo milhares de consumidores." Iniciativas estão surgindo em todo o mundo, ligando agricultores com escolas, favelas, hospitais,escritórios do governo e outras instituições que podem recompensar os agricultores que praticam a agroecologia e ampliam o sistema para que ele possa alimentar um número crescente de pessoas. Carbono e alimentos Obviamente, a distância que os alimentos precisam viajar de fazenda até os consumidores - nos EUA, a distância média é calculada em mais de 2.400 quilômetros - tem consequência sobre o clima da Terra. Mas o potencial da agricultura para exacerbar, ou reduzir, o aquecimento global, se estende muito além da questão do transporte. No Reino Unido, estima-se que o sistema de alimentação contribua com um quinto das emissões nacionais de gases de efeito estufa. A cadeia alimentar, estendendo-se de fertilizantes e pesticidas à base de petroquímicos até o metano que é emitido pelos lixões, é longa. "Depois de carros, o sistema alimentar usa combustível fóssil mais do que qualquer outro setor da economia - 19 por cento. E enquanto os especialistas discordam sobre o montante exato, a forma como nos alimentamos contribui com mais gases de efeito estufa para a atmosfera do que qualquer outra coisa que fazemos - chegando até 37 por cento, de acordo com um estudo. Sempre que agricultores limpam a terra para o plantio e aram o solo, grandes quantidades de carbono são liberadas no ar", escreve Michael Pollan em um artigo de opinião no New York Times. "Mas a industrialização da agricultura do século 20 aumentou o volume de gases de efeito estufa emitidos pelo sistema de alimentação por uma ordem de magnitude; fertilizantes químicos (feitos a partir de gás natural), pesticidas (feitos do petróleo), máquinas agrícolas, processamento de alimentos e embalagens modernos, e transporte, em conjunto, transformaram um sistema que em 1940 produzia 2,3 calorias de energia alimentar para cada caloria de energia de combustível fóssil usada em um sistema que agora precisa de 10 calorias de energia de combustíveis fósseis para a produção de uma única caloria de comida moderna de supermercado. Dito de outra forma, quando nós comemos a partir do sistema industrial de alimentos, estamos comendo petróleo e expelindo gases de efeito estufa." Esta cadeia de consequências pode ser significativamente reduzida com a agroecologia, através da agricultura orgânica e com compras de produtos locais. Mas é o potencial do solo vivo de aumentar tanto a produtividade e quanto a renda, além de capturar o carbono da atmosfera, que tem as possibilidades mais interessantes para muitos. A promoção, pelo Banco Mundial e outras instituições poderosas, da chamada "agricultura inteligente para o clima" é considerada por alguns defensores da agroecologia, como o Instituto para Políticas Comerciais e Agrícolas, um estratagema ou uma distração, colocando demasiada ênfase em comércio de carbono e não o suficiente em práticas sustentáveis. Entretanto, a história sobre sequestro de carbono no solo que começa a surgir vai muito além disso. A Floresta Subterrânea Agricultores no Níger têm ajudado adiar a desertificação através de um engenhoso, embora simples, sistema que permite que as árvores regenerem-se em seus campos. A prática envolve poda seletiva de brotos de arbustos que lhes permita crescer na forma adequada de árvores. Anteriormente, os agricultores acreditavam que as árvores que crescem em meio a campos produtivos reduziriam seu rendimento. Como árvores nativas tentaram rebrotar a partir de suas raízes, elas foram lavradas e enterradas ou queimadas com resíduos de plantações. Entretanto, através da poda mínima de arbustos de regeneração natural, em alguns anos florestas novas foram crescendo. Agricultores em Níger regeneraram mais de 30 mil quilômetros quadrados, usando esta técnica, que é chamada de Regeneração Natural Gerenciada por Agricultores. Árvores podadas adequadamente e com o espaçamento correto na verdade aumentaram o rendimento das plantações, entre 200 por cento a 300 por cento, ao mesmo tempo quem proporcionaram uma fonte adicional de forragem e lenha. Mesmo em um curto período de tempo, havia resíduo suficiente das árvores podadas para fornecer cobertura morta para os campos -aumentando a retenção de água no solo e reduzindo a evaporação. Depois dos oceanos, o solo é o maior cofre de carbono da Terra, diz a engenheira agrônoma Christine Jones. Através da fotossíntese, as plantas convertem CO2 em açúcares, para impulsionar seu crescimento, liberando oxigênio na atmosfera. As atividades de bactérias simbióticas e de fungos permitem que o carbono absorvido pelas plantas e exalado através das raízes seja combinado com minerais do solo e transformado em húmus estável, o que captura o carbono. "Isso não acontece onde produtos químicos agrícolas matam os essenciais micróbios do solo", diz Jones. "Quando o uso de produtos químicos é adicionado ao cultivo intensivo, que expõe e oxida o húmus já existente no solo, é fácil ver porque na agricultura atual o solo tornou-se um grande emissor ao invés de capturar CO2 atmosférico." Mas recupere o solo com a agroecologia e a equação muda. Por exemplo, em 2009, o governo português introduziu um esquema de compensação de emissões de carbono do solo com base em melhoramento de pastagens. O esquema de pagamento a cerca de 400 agricultores participantes para que estabeleçam pastos perenes, misturando grama e leguminosas nas pastagens (acima de 20 espécies) para aumentar o carbono no solo, a capacidade de retenção de água do solo e a produtividade da pecuária numa área de aproximadamente 42 mil hectares, de acordo com a organização de Jones, a Amazing Carbon (Carbono Incrível, numa tradução livre). Um professor participante, Tiago Domingos, calculou que a área de terras agrícolas em Portugal passíveis de compensação de carbono do solo poderia coletivamente sequestrar mais do que o atual déficit nacional de emissões existente sob o Protocolo de Kyoto. Além dos pagamentos que recebem pelo carbono, registrou-se que os agricultores portugueses participantes "verificaram uma guinada ambiental com maior biodiversidade, maior fertilidade do solo, maiores taxas de infiltração de água, menos erosão, menos desertificação, menos incêndios, menos enchentes, melhoria na qualidade da água, menor dependência de alimentos concentrados para seus rebanhos em períodos de seca prolongados e melhor qualidade do leite e da carne." Tim Wiley, um agente de desenvolvimento do Departamento da Agricultura e Alimentação da Austrália Ocidental, relata que "se todos os solos agrícolas da Austrália Ocidental estivessem sequestrando carbono, seriam absorvidas todas as emissões atuais do estado. Isto teria o potencial de reduzir significativamente as emissões líquidas da Austrália e atender nossas obrigações sob o Protocolo de Kyoto." Acrescente à conta o restante das áreas agrícolas da Austrália - e do mundo - e o impacto sobre os níveis de CO2 globais é evidente. Sérios desafios pela frente, mas também esperança Com os desafios de alimentar a população mundial tornando-se mais complexos e críticos, pensamentos e abordagens novos se tornam necessários. Jornalistas podem fazer uma importante contribuição aos debates sobre alimentação e agricultura, ajudando a informar o público não apenas sobre os desafios, mas também sobre o crescimento da agroecologia e seu potencial para fazer a diferença. Como o escritor especializado em alimentos Michael Pollan diz, comer "é um ato político." A alimentação é uma área onde as pessoas comuns podem fazer a diferença. O trabalho dos jornalistas é o de ajudar as pessoas a entender os desafios, as alternativas e as formas pelas quais eles mesmos podem fazer a diferença. "A pegada ecológica da agricultura industrial já é demasiado grande para ser ignorada, e os aumentos projetados para as futuras mudanças ambientais no planeta podem fazer a pegada ainda maior ... . Recursos naturais, especialmente solo, água, diversidade de plantas e animais, cobertura vegetal, fontes de energia renovável, clima e serviços ambientais são fundamentais para a estrutura e a função dos sistemas agrícolas e para sustentabilidade social e ambiental, em suporte à vida na Terra. Historicamente, o caminho do desenvolvimento agrícola global tem sido concentrado no aumento da produtividade, em vez de uma integração mais holística da gestão dos recursos naturais com a segurança alimentar e nutricional. Uma abordagem holística, ou sistêmica, é preferível, porque pode resolver questões difíceis relacionadas com a complexidade dos sistemas de produção de alimentos e outros em diferentes ecologias, locais e culturas. " -Resumo do Relatório da Avaliação Internacional do Conhecimento, da Ciência e da Tecnologia no Desenvolvimento Agrícola (IAASTD)