Revista Visão Acadêmica

Transcrição

Revista Visão Acadêmica
Universidade Estadual de Goiás
UnU - Goiás
Revista Visão Acadêmica
Revista Eletrônica
Ano 2 - nº 5
Novembro de 2012
ISSN 2177 7276
Revista Visão Acadêmica; Universidade Estadual de Goiás;
Novembro de 2012; ISSN 21777276; Cidade de Goiás; www.coracoralina.ueg.br
Dados da Publicação
Revista Visão Acadêmica
Ano 2 - nº 5 - Novembro de 2012
Revista Eletrônica - Periodicidade Semestral
ISSN 2177 7276
Contato e Acesso
Principal: [email protected]
Alternativo: [email protected]
Acesso via sítio
http//:www.coracoralina.ueg.br
Expediente
Universidade Estadual de Goiás ( UEG)
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Av. Deusdete Ferreira de Moura S/N Centro
Cidade de Goiás- GO - CEP 76.600
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Carla Rosane Mendanha da Cunha (FMB - GO)
Célia Sebastiana Silva (UFG - Goiânia)
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Ebe Maria de Lima Siqueira (UFG - Goiânia /UEG)
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Robson Rodrigues Gomes Filho (UEG - Unidade de Morrinhos)
Paula Roberta Chagas (UEG - Unidade de Morrinhos)
Administração
Alair Di Silva Peres (UEG - cidade de Goiás)
Correção Gramatical e Ortográfica Pelos Graduandos
Lívia Rodrigues Barbosa (UEG - Letras - cidade de Goiás)
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Juliana de Fátima Ananias de Jesus (UEG - Letras - cidade de Goiás)
Formatação e Diagramação
Guido de Oliveira Carvalho (UEG - cidade de Goiás).
Itelvides José de Morais (UEG - cidade de Goiás)
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Informações Gerais
A revista é especializada na publicação de artigos científicos escritos com participação direta de
graduandos. Sendo que as referências de autoria são da época em que o artigo foi enviado para
apreciação.
O conteúdo dos artigos não necessariamente representa os pontos de vista dos organizadores do
periódico
Editorial
Meio de divulgação da produção científica de graduandos dos diferentes ramos é o principal motivo
da organização da Revista Visão Acadêmica. De fato não faltam revistas científicas dispostas a abrir
algum espaço para publicações de graduandos. Porém, frente ao volume das produções este espaço
é aquém do necessário e nem sempre trabalhos de boa qualidade escritos por graduandos
conseguem ser divulgados com rapidez. Por isso é intenção da Visão Acadêmica se voltar
principalmente para este segmento de pesquisadores. Contribuindo para que as universidades
continuem a ser local de formação e divulgação de ideias de pensadores com senso crítico. Crítico
em relação às suas próprias crenças e as dos demais membros das sociedades.
Cidade de Goiás, Novembro de 2012, Conselho Editorial
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A Paleografia e os registros de batismo de Morrinhos Goiás, de 1876 a 1881 ... 6
Wesley Ribeiro Alves
Gabriela Alves Toledo
Maria Luíza Cruvinel de Menêzes
A Função do pedagógico-moralista da literatura em o “Demônio Familiar” de José de
Alencar ... 19
Renato Garcia Cardoso
Educação ambiental como instrumento para preservação e proteção do meio ambiente:
aspectos pedagógicos e jurídicos ... 32
Willian Flügge Carvalho
A Matemática e o currículo integrado no Curso Técnico em Agropecuária ... 43
Thais Aparecida Pacheco
Josislei de Passos Vieira
Paula Reis de Miranda
Práticas escolares no ensino de Língua materna: um olhar sobre a metodologia do
professor ... 55
André Fernandes Maia de Medeiros
Incluso pela Lei: analisando as políticas públicas Na/Para/Sobre a educação inclusiva ... 63
Addan Tritty Rezende de Souza
A Música Independente no Brasil: Constituição, Festivais e Expressões ... 86
Isabella Cecília do Nascimento
Riscos ocupacionais de uma amostra dos profissionais da beleza do município de GoiâniaGO ... 102
Karla Alaíde Pereira Garcia
Cleonice Fernandes Bento
Kleber França Costa
A Imigração italiana, séculos XIX-XX, em Nova Veneza-GO: contribuições para a cultura ...
116
Iraci Garbim de Souza
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A Paleografia e os registros de batismo de Morrinhos Goiás, de 1876 a 1881
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Wesley Ribeiro Alves
Gabriela Alves Toledo
Maria Luíza Cruvinel de Menêzes
Resumo A Paleografia é uma ciência que surgiu na Idade Moderna, durante a Guerra dos
Trinta Anos (1618-1648), em que a Europa estava imersa numa profunda crise relativa às
propriedades privadas, sendo esta ferramenta usada como forma de se comprovar a
autenticidade dos documentos que comprovavam tais propriedades. No Brasil, a partir de
1950, encontramos a Paleografia sendo ministrada como disciplina do curso de História, na
USP, evidenciando o fato de que em nosso país, a Paleografia é, basicamente, uma atividade
própria da Ciência Histórica. Este artigo discute a relação da História com os documentos
escritos, discutindo a importância do documento escrito e da Paleografia para as Ciências
Humanas e Sociais na atualidade, apontando os desafios e as possibilidades desta linha de
pesquisa. Em seguida, analisamos o Livro 01 de Batismo da Paróquia Nossa Senhora do
Carmo, com assentamentos de 1876 a 1881 que trazem informações acerca da dinâmica
populacional de Morrinhos no final do Século XIX. Para tanto, descrevemos o processo de
reconhecimento, escolha, digitalização e transcrição do Livro de Batismo da Paróquia Nossa
Senhora do Carmo, discutindo sobre as dificuldades encontradas neste processo.
Palavras Chave: Paleografia. Transcrição. Morrinhos. Livro de Batismo.
Introdução
Surgida na Idade Moderna, a Paleografia é uma ciência que tem ajudado, de maneira
especial, as Ciências Humanas e Sociais a produzirem conhecimento, sobretudo,
possibilitando que estas acessem tempos mais remotos, uma vez que os documentos
escritos constituem uma importante fonte de informação, ao lado das descobertas
arqueológicas e da História Cultural.
Localizada no Sul de Goiás, Morrinhos é uma das mais antigas cidades da região,
sendo uma das primeiras a serem povoadas na região e exercendo no início do Século XX
grande influência na política e cultura do Estado de Goiás.
Este artigo, por sua vez, visa apontar as características dos documentos manuscritos
de Morrinhos, do final do século XIX. Especificamente, analisa o Livro 01 de Batismo da
Paróquia Nossa Senhora do Carmo, que traz assentamentos de 1876 a 1881. Para tanto,
digitalizamos o referido livro e o transcrevemos, com o auxílio de uma planilha eletrônica.
1
Wesley Ribeiro Alves, Gabriela Alves Toledo e Maria Luíza Cruvinel de Menêzes são graduandos do curso de
História da UEG na Unidade de Morrinhos. A indicação para a publicação deste artigo assim como as
orientações para sua confecção, são do professor Mestre Robson Rodrigues Gomes Filho e professora
doutoranda Paula Roberta Chagas da UEG, Unidade de Morrinhos.
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O Documento escrito e a produção do conhecimento
Vários fatores influenciam o historiador na escolha dos métodos de pesquisa que
adotará, dos documentos históricos que analisará, das etapas a serem empreendidas para
apreensão das fontes de pesquisa. Neste sentido, o posicionamento teórico do pesquisador
é muito importante, bem como o próprio objeto de pesquisa e os problemas que ele suscita
são pontos importantes que influenciam seu trabalho.
As Ciências Sociais também valorizam o documento escrito na produção do
conhecimento:
[...] o documento escrito constitui uma fonte extremamente preciosa para todo
pesquisador nas ciências sociais. Ele é, evidentemente, insubstituível em qualquer
reconstituição referente a um passado relativamente distante, pois não é raro que
ele represente a quase totalidade dos vestígios da atividade humana em
determinadas épocas. Além disso, muito frequentemente, ele permanece como o
único testemunho de atividades particulares ocorridas num passado recente
(CELLARD apud SÁ-SILVA, et al. 2009: 02).
Assim, quanto mais antigo é o objeto de pesquisa em Ciências Sociais, tanto mais
importante será o documento escrito na produção do conhecimento. E mesmo nas
pesquisas com objetos mais recentes o documento escrito tem sua importância consagrada
neste ramo do saber, o que no entanto não simplifica a tarefa de classificar o trabalho com
documentos escritos:
Não é uma categoria distinta e bem reconhecida, como a pesquisa survey e a
observação participante. Dificilmente pode ser considerada como considerada
como constituindo um método, uma vez que dizer que se utilizará documentos é
não dizer nada sobre como eles serão utilizados (SÁ-SILVA, et al. 2009: 03).
Apesar da dificuldade narrada por alguns pesquisadores em nomear esta forma de
lidar com os documentos escritos, o termo Pesquisa Documental parece ser o mais utilizado
na definição desta forma de produção do conhecimento.
Desta forma, entendemos que o documento escrito ainda tem papel forte na
produção do conhecimento das Ciências Sociais, seja por seu uso quase obrigatório para
tempos mais remotos. Seja porque a cada dia uma maior quantidade de documentos fica
disponível a inúmeros pesquisadores, diante do avanço da internet e de outros meios de
comunicação.
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Por sua vez, Samara e Tupy (2007) se dedicam a analisar o uso do documento escrito
na Ciência Histórica. Segundo elas, durante a primeira metade do século XX o conhecimento
histórico era dependente do documento escrito, a ponto de alguns historiadores afirmarem:
A História se faz com documentos. Documentos são os traços que deixaram os
pensamentos e os atos dos homens do passado. Entre os pensamentos e os atos
dos homens, poucos há que deixam traços visíveis... [...] Por falta de documentos, a
História de enormes períodos do passado da humanidade ficará sempre
desconhecida. Porque nada supre os documentos: onde não há documentos não
há História (LANGLOIS; SEIGNOBOS apud SAMARA; TUPY, 2007: 17).
Assim, durante anos a produção do conhecimento histórico esteve atrelada aos
documentos escritos, sendo estes condição indispensável para o conhecimento das
sociedades antigas. Samara e Tupy (2007) entendem que tal perspectiva começou a mudar a
partir do momento no qual se percebeu que não apenas a História busca a explicação dos
fatos sociais, o que levou os historiadores a valorizarem a interdisciplinaridade, os métodos
e técnicas de outras áreas, como forma de apreensão do passado. Assim, a noção de
documento histórico foi transformada, incluindo outras fontes como as arqueológicas,
objetos e materiais, e mais recentemente, a própria memória dos indivíduos (através de
linhas de pesquisa, como a História Oral) tem sido passível de análise histórica.
No entanto, o documento escrito sempre teve um papel importante na História:
Independentemente de seu propósito original, do sentido essencial de sua
elaboração, os documentos impressos e/ou manuscritos vinham sendo
considerados, por excelência, as fontes principais de estudos e de pesquisas
históricas. Sujeitos à identificação e à análise de diferentes olhares, sob diversas
abordagens, em temporalidades distintas, permitiam aos historiadores uma
ininterrupta reinvenção do passado, o constante refazer da busca de sentido para o
mundo em que viviam. Como origem fundamental da narrativa histórica, os
documentos deviam ser apreendidos como resultado de um trabalho humano que,
ao registrar mensagens emitidas por quem o criava, podia traduzir, embora de
modo fragmentado, uma aproximação parcial – os vestígios – de um fato, de um
acontecimento, de uma experiência vivida, de objetos ou, até mesmo, de
impressões e de sensações (SAMARA; TUPY, 2007: 18).
Desta forma, os documentos escritos (como toda forma de documento histórico) são
registros do passado, no entanto, por si só não traz muitas informações sobre o passado, a
menos que o historiador saiba fazer as perguntas corretas e utilizar os métodos apropriados
no desenvolvimento de sua pesquisa. Neste sentido, a Paleografia e a Diplomática se
revelam ferramentas importantes para o desenvolvimento do conhecimento histórico:
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Uma ênfase maior foi dada à Paleografia e à Diplomática cujas metodologias e
técnicas científicas garantiram a busca, a coleta e a recuperação de registros
manuscritos, pois a leitura, a decifração de seu conteúdo e a autenticidade dos
documentos constituiria, a primeira tarefa do historiador. [...] A primeira delas – a
Paleografia – pode ser associada à leitura, à transcrição e à interpretação de
formas gráficas antigas; e a segunda – a Diplomática – detém-se, por sua vez, na
veracidade e na autenticidade de um manuscrito, analisando onde o mesmo foi
produzido, quais os indivíduos que o redigiram e em que momento isso ocorreu
(SAMARA, TUPY, 2007: 25).
Assim, a História pode se valer dos métodos da Paleografia e da Diplomática para
transcrever, garantir a autenticidade dos documentos analisados, e assim produzir o
conhecimento histórico. Portanto, o documento escrito tem um papel inestimável na
História, sendo uma das principais fontes de informações do passado.
A Edição de manuscritos no Brasil
Segundo Cambraia (apud TONIAZZO et al. 2009), há diversas formas de tornar
acessível ao público um texto, sendo importante, para tanto, a escolha do tipo adequado de
edição a ser utilizado, pois cada um tem características próprias, desde a edição fac-similar,
em que o grau de intervenção do editor é nulo, até a interpretativa, marcada por forte
intervenção deste.
Editando um manuscrito de 1885 e outro de 1895, do Arquivo Público Municipal de
Cáceres-MT, Toniazzo et al. (2009) optam pelo método fac-similar e
pelo método
semidiplomática. A edição fac-similar ou foto-mecânica é entendida como a fotografia do
texto, reproduzindo com fidelidade as características do texto original, uma vez que a
semidiplomática representa uma tentativa de melhoramento do texto, com a divisão das
palavras, o desdobramento das abreviaturas, buscando eliminar as dificuldades de natureza
paleográfica suscitadas pela escritura.
Toniazzo et al. (2009) aponta algumas orientações para a edição semidiplomática de
documentos: manter-se a ortografia, a acentuação, as maiúsculas e as minúsculas devem ser
mantidas conforme grafados no original, as abreviaturas devem ser desdobradas e as letras
omitidas marcadas em itálico. Eles ainda afirmam que a análise paleográfica, minuciosa por
natureza, requer dedicação e muitas horas de trabalho, por parte do pesquisador, exigindo
um olhar atento para cada palavra do texto.
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A tarefa da paleografia se inicia com a coleta de documento, tarefa que requer
paciência, uma vez que devem ser consultados bibliotecas, mosteiros, paróquias,
observando cada característica das letras e da forma de escrita.
Historicamente, Toniazzo et al. (2009) situam a consolidação da Paleografia como
fruto da necessidade criada pela Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), durante a qual
começou a surgir uma série de dúvidas acerca da propriedade de terras e castelos. Os juízes
para se livrarem dos documentos falsos, passaram a analisar minuciosamente os
documentos de propriedade. Assim, a Paleografia surge com o objetivo de determinar o
auto, o tempo e o lugar em que dado documento foi escrito, fornecendo ao perito as
ferramentas indispensáveis para se distinguir os documentos verdadeiros e autênticos, dos
falsos, deturpados, apócrifos. Como cátedra, a Paleografia surge primeiro na Alemanha, nas
escolas de Filosofia e Letras. No Brasil, os estudos paleográficos surgiram no final do século
XIX e início do XX, os estudos paleográficos desenvolveram-se inicialmente graças à iniciativa
particular dos historiadores. Apenas em 1952, na Universidade de São Paulo – USP, a
Paleografia surge como disciplina do curso de História. Segundo Blanco (apud TONIAZZO,
2009), são finalidades da Paleografia:
Ensinar a ler corretamente e sem erros todo tipo de documento, tanto antigo, quanto
moderno;
Dar a conhecer a evolução da escrita através dos tempos, das nações e dos indivíduos;
Determinar o autor, o tempo e o lugar em que o documento foi escrito;
Fornecer ao perito os conhecimentos indispensáveis para saber distinguir os
documentos verdadeiros e autênticos dos falsos, deturpados, adulterados, etc.;
Descrever as letras (forma, traçado, ângulo, módulo, peso);
Descrever os sinais braquigráficos (abreviaturas) atribuindo-lhes significado exato e
completo;
Descrever os sinais etigmológicos (pontuação).
Atualmente, o Arquivo Público de São Paulo é um dos principais divulgadores da
paleografia, bem como uma das instituições que mais busca coletar e organizar documentos
escritos no Brasil.
Em geral, a maior parte dos locais que possuem documentos passíveis de análise
paleográfica tem ligação com Igrejas ou aos órgãos da Justiça, como fóruns. A maior parte
destes lugares não oferece condições mínimas de conservação dos documentos históricos,
além de carecerem de maior sistematização e organização.
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A Questão das Abreviaturas na Paleografia Brasileira
Uma das maiores preocupações dos paleógrafos diz respeito à questão das
abreviaturas. Flexor (2010), afirma que em sua experiência de contato com manuscritos dos
séculos XVI a XIX, as abreviaturas se mostraram uma grande dificuldade para quem se
dispõe a ler e extrair dados para suas pesquisas.
Neste sentido, a pesquisadora, empreendeu, em parceria com outros pesquisadores,
um trabalho com vistas a elaborar uma lista das abreviaturas mais comumente usadas nos
documentos históricos do Brasil, num projeto iniciado em 1963.
Em 1990, esta lista já contava com cerca de 20 mil abreviaturas simples, além de um
grande número de expressões abreviadas, como aquelas constantes nos protocolos de
saudações nomes de instituições, expressões jurídicas, cargos públicos, civis, militares ou
eclesiásticos.
Em 2004, uma terceira edição da lista de abreviaturas contava com 25 mil
abreviaturas, sem contar as expressões de endereçamento, subscrição, topônimos, entre
outros. Tanto a segunda como a terceira edição são frutos de consultas aos arquivos
públicos do Arquivo do Estado de São Paulo, Arquivo da Prefeitura Municipal de São Paulo,
Arquivo Público do Estado da Bahia, Divisão de Arquivo da Prefeitura Municipal do Salvador
(Fundação Gregório de Mattos), Arquivo da cidade de Cachoeira/Bahia e Instituto Histórico e
Geográfico de Sergipe, Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Biblioteca e Arquivo
Nacional, do Rio de Janeiro, Arquivo da Santa Casa da Misericórdia, Instituto Geográfico e
Histórico da Bahia, Arquivo Público do Estado e Casa da Memória de Curitiba, do Paraná,
documentação manuscrita de propriedade da Universidade Católica de Goiás, Instituto de
Estudos Brasileiros, da USP, diversos arquivos de instituições religiosas de Salvador, etc.,
segundo Flexor (2010).
Basicamente, existem três tipos de abreviaturas, segundo Flexor (2010): as siglas
simples (quando indicadas apenas por letras como, por exemplo, ONU – Organização das
Nações Unidas, CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), siglas reduplicadas ( nas
quais a letra é repetida para significar o plural das palavras representadas, ou quando, na
palavra, a letra é encontrada pelo menos duas vezes – como em SS – santíssimo, RR –
reverendíssimo), além de siglas compostas (quando são formadas pelas duas ou três
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primeiras letras da palavra, por palavras dominantes do vocábulo ou expressão, como
exemplo MOBRAL – Movimento Brasileiro de Alfabetização e PETROBRAS – Petróleo do
Brasil, cujo uso é mais recente).
O Livro de Batismo da Paróquia Nossa Senhora do Carmo de Morrinhos
Sérgio Nadalin (2004) entende que a Igreja Católica Romana, seguida posteriormente
pelas denominações protestantes, anunciou precocemente uma das características da
modernidade. Desde o Concílio de Trento (1545-1563) instituiu formas de controle da sua
população, definindo normas para padronizar os registros dos principais sacramentos que
marcam os momentos da vida dos católicos.
Dessa maneira, os padres foram ensinados como registrar os Batismos (e mais
tarde a Crisma), os Matrimônios e os Sepultamentos. Tais normas foram
completadas no século XVIII, por ocasião da instituição do Rituale Romanum que,
além de definir como fazer tais assentamentos, ensinava a fazer contagens
periódicas dos paroquianos (NADALIN, 2004: 40).
Desta forma, a Igreja tinha a preocupação de garantir que os registros da vida de seus
fiéis seguissem um mesmo padrão. No Brasil - colônia, a Arquidiocese de Salvador da Bahia
exercia a jurisdição sobre toda a Igreja da América portuguesa, definindo as regras a serem
adotadas nos assentamentos paroquiais.
O sacramento do batismo esteve ligado à saúde do corpo e da alma dos fiéis, por
isso, a preocupação de se batizar o mais rápido possível as crianças, de preferência até o
oitavo dia. O batismo devia ser ministrado na igreja, ainda que o batismo em casa fosse
permitido, em caso de “necessidade” segundo Nadalin (2004). Passado o risco de morte da
criança, a mesma deveria ser levada para a igreja, a fim de receber os Santos Óleos.
Assim, o batismo é uma etapa importante da vida dos indivíduos católicos e durante
o Brasil - colônia e o Brasil Império, a Igreja Católica era a religião oficial e a única instituição
a realizar os registros de nascimento, matrimônio e falecimento dos brasileiros.
Localizada na cidade de Morrinhos, na região Sul de Goiás, a Paróquia Nossa Senhora
do Carmo foi fundada em 30 de julho de 1845, sendo este o ano em que se comemora a
fundação da cidade de Morrinhos (no entanto, celebra-se a data em 16 de julho, dia da
Padroeira da cidade, Nossa Senhora do Carmo).
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No Arquivo Paroquial, encontram-se documentos de casamento mais antigos a partir
de 1836, e de Batismo a partir de 1876. O livro Tombo mais antigo da Paróquia traz
informações a partir de 1916.
Escolhemos analisar o Livro 1 de Batismo, com documentos de 1876 a 1881, por este
ser o livro mais antigo que encontramos no arquivo paroquial. Optamos por fotografar as
páginas do referido livro e por transcrever as informações nele contidas com o auxílio de um
software de planilha eletrônica, uma vez que se trata de uma documentação seriada com
diversas informações, como o nome da pessoa que foi batizada, nome dos pais e padrinhos,
data da celebração, o padre que ministrou este sacramento, em alguns casos, a igreja, a data
e local de nascimento do batizando, bem como o nome dos avôs.
O livro traz assentamentos de batismo realizados por dois padres, Pe. Antonio
Francisco do Nascimento, nos registros que vão de 1876 a 25 de agosto de 1878, e do
Cônego José Olyntho da Silva, a partir de 15 de fevereiro de 1880. Ao todo, foram transcritos
os 396 assentamentos de batismo contidos nas 71 folhas do Livro de Batismo analisado.
Características dos Assentamentos do Pe. Antonio Francisco do Nascimento
Para exemplificar, transcrevemos o assentamento de batismo de Pedro, realizado em
20 de agosto de 1876:
Aos vinte dias do mez de Agosto de mil e oitocentos e setenta e seis, Baptizei
solemnemente e puz os santos olios ao inocente Pedro, filho legitimo de Alexandre
Antonio de Oliveira e Francisca Maria de Menezes, neto pela parte paterna de
Francisco Antonio de Olveira e Maria Perpetua de Santa Ritta, e pela parte materna
de Luis Antonio de Castilho, Maria Luiza de Menezes, foram padrinhos, Francisco
Luis de Castilho e Anna Maria da Conceição. Doque para constar mandei fazer este
assento.
o
O Vig Col. P. Antonio Francisco do Nascimento (F007-V).
Normalmente, o padre Antonio Francisco do Nascimento, descreve o nome dos pais,
dos padrinhos, e em alguns casos informa o nome dos avós dos catecúmenos. Os
assentamentos informam se o catecúmeno é filho de pais casados, se filho apenas da mãe
(filiação maternal) ou se filho de casais que não contraíram matrimônio (filiação natural).
Enquanto os assentamentos são grafados com tinta escura, a assinatura do Pe.
Antonio Francisco do Nascimento é feita com tinta mais clara e as letras maiúsculas são
menos desenhadas que as usadas no corpo do assentamento.
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Durante o processo de transcrição, apenas três nomes de batizados foram marcados
como ilegíveis, porque uma vez que a grafia utilizada pelo padre estava com alguns borrões,
ao passo que em dez nomes ficamos com dúvidas acerca da grafia correta dos nomes.
Características dos assentados do Conêgo José Olyntho da Silva
Segue a transcrição de um dos assentamentos de Batismo do Conêgo José O. Silva:
Aos vinte e nove dias do mez d’Agosto, do anno do Senhor de mil oitocentos e
oitenta, baptizei e pûs os Santos Olios a inocente Francisca, filha legitima de Lazaro
Gonsalves da Roza e de sua mulher Delfina Roza de São José, nascida á nove de
julho deste anno, na fazenda da Santa Roza, desta Freguesia de Morrinhos, foram
padrinhos Jaú Luiz de Souza e Roza Anna Silveira da Conceição e para constar fiz
este assento.
Conego José Olyntho da Silva (F059-F).
Ao contrário do Pe. Antônio Francisco do Nascimento, o Cônego José Olyntho da Silva
preocupa-se com dados mais detalhados do catecúmeno, como o local e a data de
nascimento.
No entanto, apenas nos primeiros registros do ano de 1881 é que o cônego José
Olyntho deixa explícito no Livro que os batizados ocorreram na Igreja Matriz de Nossa
Senhora do Carmo, ficando a maior parte dos registros sem tal informação (ao contrário dos
registros do Pe. Antônio Francisco, em que esta informação está presente na maior parte
dos registros).
Além disso, o cônego José Olyntho não faz menções a nomes dos avós dos
catecúmenos, prática comum (apesar de não estar presente em todos os registros) nos
documentos do Pe. Antônio Francisco.
A mesma tinta usada na escrita do assentamento é usada na assinatura, bem como a
mesma inclinação e traçados das letras, o que nos leva a imaginar que, enquanto Pe.
Antônio Francisco escrevia todos os termos e só então os assinava, o Cônego José Olyntho
pareceu escrever cada termo e assiná-los logo em seguida.
A Transcrição do Livro de Batismo da Paróquia Nossa Senhora do Carmo
No dia 15 de agosto de 2012 visitamos a Paróquia Nossa Senhora do Carmo a fim de
conhecermos o arquivo paroquial. Na oportunidade, foi-nos apresentado o mesmo e nos
deram livre acesso à documentação. O arquivo paroquial fica no andar superior do Escritório
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Paroquial, num armário de aço. A documentação a partir de 1900 está bem organizada e
conservada, todos organizados em seus respectivos livros, ao passo que a documentação
mais antiga ainda carece de organização mais sistêmica, e muitos documentos apresentam
sinais de corrosão e da ação do tempo, tornando sua análise extremamente complicada.
Nesta primeira visita tomamos conhecimento do Livro que está sendo analisado e
traçamos a partir dali nosso plano de trabalho. Uma semana depois, no dia 22 de agosto de
2012, munidos de uma câmera digital de 14 megapixels, de máscaras e luvas cirúrgicas para
a proteção dos documentos e dos pesquisadores, retornamos aos arquivos paroquiais, onde
fotografamos as páginas do Livro 1 de Batismo.
Em seguida, como dito, com o auxílio de um software de edição de planilhas
eletrônicas, transcrevemos os dados dos assentamentos de batismo, perfazendo um total de
396 linhas e 21 colunas.
Á medida que nos acostumamos com a grafia dos padres, a transcrição foi se
tornando mais fácil, motivo pelo qual após uma primeira transcrição, realizamos uma revisão
geral na planilha, a fim de identificarmos palavras que no primeiro momento foram
consideradas dúbias ou de grafia ilegível.
As primeiras páginas do livro encontram-se muito corroídas, ao passo que a capa do
livro é uma pasta de adição bem posterior à redação dos assentamentos, não sendo, no
entanto, possível determinar em que ano ela foi anexada às páginas do livro. Nesta capa
improvisada, encontra-se coladas, na parte interna, folhas do jornal da arquidiocese de
Goiás, do ano de 1940, o que talvez indique a pasta que serve como capa deste livro tenha
sido afixada após este ano.
A primeira página manuscrita (que fala do encerramento do livro), no entanto traz
uma informação contraditória em relação à natureza do livro:
Autorizado pelo Exmo. e Revmo. Snr. Bispo Diocesano, encerro este livro que
servira para o registro dos casamentos d’esta frequezia de Nossa Senhora das
Dores de Caldas Novas. Contem 200 folhas por mim numeradas e rubricadas com o
sobre nome que uso “P. Calzada”.
Caldas Novas 6 de Maio de 1907
O Vigario P. Julião Calzada (F001-F)
Assim, o livro que analisamos traz uma parte que pertence a um livro de casamento
da Paróquia Nossa Senhora das Dores, do município vizinho a Morrinhos, Caldas Novas e que
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fizera até o ano de 1911, parte do município de Morrinhos. Uma posterior pesquisa nos
demais livros e folhas do arquivo pode nos ajudar a entender o motivo desta página
intrigante estar neste livro de batismo.
Outra página, esta sim, escrita pelo Padre Antônio Francisco do Nascimento parece
ser a primeira página do livro de Batismos:
Livro de Assentamentos de Batizados
Parochia de N. Sra do Carmo de 1876-1880 (F003-F).
Esta inscrição, por sua vez, nos leva a crer que o livro de batismo, da maneira como
chegou às nossas mãos é, como já nos sugere a capa, uma montagem feita, ao menos,
sessenta anos depois dos assentamentos.
Dificuldades na Transcrição do Livro de Batismos
A primeira dificuldade que notamos no processo de transcrição do livro de Batismo
foi nos adaptar à ortografia da época em que o documento foi escrito, uma vez que há em
nós uma tendência natural a grafarmos os nomes e expressões de acordo com as normas
gramaticais atualmente vigentes.
Neste sentido, incorríamos no risco de transcrevermos “Ana”, tal qual escrevemos
hoje, e não “Anna”, como era grafada no final do século XIX no Brasil. Neste mesmo sentido,
palavras que atualmente têm acento gráfico e que antigamente não o tinham também
mereceram especial cuidado, como o nome Antônio, que nos vem grafado “Antonio”.
Ambos os padres não usam muitas abreviações, o que facilitou nossa tarefa de
transcrever o Livro de Batismos. Além das abreviações para vigário (Vigº), padre (P.), a
abreviatura para dona (D.) também foi usada nos assentamentos de batismo.
Quanto à transcrição de nomes, não houve grandes dificuldades, uma vez que a
maioria dos nomes é de uso recorrente ainda hoje. O nome que mais nos chamou a atenção,
no entanto, foi Messias, que aparece em registros de 01 de abril de 1877 (F017-F), 02 de
outubro de 1877 (F031-F) e em 06 de janeiro de 1881 (F065-F) em ambos os casos usados
como nome feminino. O nome Messias ainda aparece num assentamento de 16 de maio de
1878 (F040-F), no entanto como nome masculino. A existência deste nome nos mostrou que
Messias é um nome feminino de uso comum na região de Goiás, neste período.
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Algumas páginas do Livro de Batismo encontravam-se com a tinta mais fraca, como é
o caso das páginas F041-F, F041-V, F044-F, o que também dificultou nosso trabalho de
transcrição. O uso da letra “y” em palavras como Olyntho, também exigiu de nós uma maior
atenção no processo de transcrição.
Em paralelo, a existência de alguns sobrenomes de uso muito difundido em
Morrinhos, como os sobrenomes do Carmo, de Jesus, das Dores, Ritta, facilitou não somente
o processo de transcrição, como também a identificação de outras letras e palavras
similares.
Conclusão
Através da experiência da transcrição do Livro de Batismos da Paróquia Nossa
Senhora do Carmo, referente aos anos de 1876 a 1881 nós percebemos que a paleografia é
uma arte de difícil e exigente, que no entanto, nos oferece preciosas informações acerca da
sociedade e da cultura em que o documento foi produzido.
Se por um lado, o advento da datilografia e, mais recentemente, da informática
diminuíram a importância dos documentos manuscritos, por outro lado, estes são uma
importante ferramenta que tem ajudado os pesquisadores a melhor sistematizar e
compartilhar informações e arquivos de diferentes períodos e regiões, assim como já o faz o
Arquivo Público de São Paulo.
Nossa experiência com os documentos de batismo da Paróquia de Nossa Senhora do
Carmo nos fez evidenciar a importância do estabelecimento, com urgência, de um Centro de
Documentação que trate os documentos desta que é uma das mais antigas e importantes
cidades do Sul do Estado de Goiás. Garantindo à ciência histórica a possibilidade de analisar
documentos nunca antes analisados, preservando o patrimônio histórico-cultural de
Morrinhos, bem como contribuindo para a preservação da memória morrinhense.
Referências
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Nacional de Arquivologia, 2010.
NADALIN, S. História e Demografia – Elementos para um Diálogo. Campinas: Associação
Brasileira de Estudos Populacionais – ABEP, 2004.
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SÁ-SILVA, J; ALMEIDA, C; GUINDANI, J. Pesquisa documental: pistas teóricas e
metodológicas. Revista Brasileira de História & Ciências Sociais. Ano I, Número I – Julho de
2009.
SAMARA, E; TUPY, I. História & Documento e metodologia de pesquisa. Belo Horizonte:
Autêntica, 2007.
TONIAZZO, C; ANDRADE, E; KRAUSE, M. Edição de Manuscritos: Características
Paleográficas. Cuiabá: Polifonia, Nº 19, 2009, p. 43-58.
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A Função do pedagógico-moralista da literatura em o “Demônio Familiar” de José de
Alencar
Renato Garcia Cardoso
2
Palavra puxa palavra, uma ideia traz outra, e assim se faz um
livro, um governo, ou uma revolução.
Machado de Assis
Resumo No sentido de que: Silva (1973) aponta à literatura diversas funcionalidades, como a
pedagógico-moralista, que tem o intuito de “moldar” o caráter do leitor e defende ainda que
o drama seja uma arte de comunicação; o Romantismo manifesta um ideal de reforma social
e tem como grande representante José de Alencar; analisamos sua peça teatral O demônio
familiar, por meio de pesquisa bibliográfica e aplicação na obra, investigando a presença da
função pedagógico-moralista da literatura na mesma. E uma vez que fica evidente a intenção
ética do escritor ao redigir a comédia, pudemos verificar que essa função se faz autêntica na
narrativa.
Palavras-chave: José de Alencar. Pedagógico-moralista.
Literatura – conceito polêmico
A tarefa de definir literatura é complexa, várias têm sido as tentativas por diversos
estudiosos, sem chegar ao consenso. Portanto, o presente trabalho, apresenta um breve
esboço sobre o estudo da definição da Literatura, e sobre as funções literárias, com foco na
função pedagógico-moralista.
Eagleton (2006) salienta que muitas são as tentativas em definir literatura, cita a
possibilidade de defini-la como escrita “imaginativa”, no sentido de ficção, porém se
refletirmos acerca de toda literatura, veremos que tal definição não procede.
A distinção entre fato e ficção, portanto, não é muito suficiente. Os romances e as
notícias não eram claramente factuais, nem claramente fictícios, a distinção feita a elas não
se aplica. Lembra o Gênese obra lida como fato por alguns e como ficção por outros, que a
literatura inclui muito da leitura fatual, e as histórias em quadrinhos e os romances são
obras fictícias, porém nem sempre consideradas como literárias.
De acordo com Eagleton (2006), podemos pensar na literatura menos como uma
qualidade inerente, ou como um conjunto de qualidades evidenciadas por certos tipos de
escritos. Não existe uma “essência” da literatura. Qualquer fragmento de escrita pode ser
lido “não - pragmaticamente”.
2
Renato Garcia Cardoso é acadêmico do Curso de Licenciatura em Letras da Universidade Estadual de Goiás,
Unidade de Goiás. Professora indicadora do artigo Doutora Maria Eugênia Curado, do curso de Letras da UEG,
UnU cidade de Goiás.
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Eagleton (2006) defende que se não é possível ver a literatura como uma categoria
“objetiva”, descritiva, também não é possível dizer que a literatura é apenas aquilo que,
caprichosamente, queremos chamar de literatura. Isso porque não há nada de caprichoso
nesses tipos de juízos de valor: eles têm suas raízes em estrutura mais profundas de crenças,
tão evidentes e inabaláveis quanto o edifício do Empire State. Portanto, o que descobrimos
até agora não é apenas que a literatura não existe da mesma maneira que os insetos, e que
os juízos de valor que a constituem são historicamente variáveis, mas que esses juízos têm,
eles próprios, uma estreita relação com as ideologias sociais.
Souza (2007) salienta que se a pergunta: “o que é literatura?” for feita a uma pessoa
que, mesmo que seja interessada por livros e não seja da área de Letras, causará embaraço
ao destinatário da pergunta. A resposta será no sentido de que a literatura é uma obra
escrita, um romance, livros de poesias, livros de contos e outros.
A mesma pergunta, se feita aos que se ocupam profissionalmente com a literatura,
também seria embaraçosa. Não por ser impertinente ou sem sentido, nem porque sua
resposta seja óbvia; ao contrário, a perturbação do interrogado derivará de sua familiaridade
com o caráter complexo da questão proposta.
As Funções da Literatura: função Pedagógico-Moralista
Silva (1973) confere à literatura função político-social, a literatura com a função
pedagógico-moralista, aquela que “molda” quem lê. Seriam por exemplo, as fábulas. Critica
a literatura entendida segundo critérios de valor de Sartre.
Destaca a Literatura Comprometida, em defesa de determinados valores morais,
políticos e sociais, nasce de uma decisão livre do escritor; a Literatura Planificada ou Dirigida,
os valores a defender são impostos; Platão, em seu moralismo estético busca em Sócrates
suas reflexões. Sócrates reduz o conceito de beleza à utilidade. As coisas belas se identificam
com as coisas de boa utilidade. Neste sentido, a literatura se direciona em algo pedagógico.
O estudioso defende que o problema das relações da literatura com a moral insere-se
logicamente no quadro mais amplo das relações da literatura com a utilidade, conclui pela
impossibilidade de associar os valores literários a valores morais. Gautier, citado por Silva
(1973) observa que este afã moralizante não possui qualquer dimensão universalista.
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Os românticos tinham oposto, às exigências moralizantes de recorte tradicionalista,
uma moral baseada na intensidade da paixão e dos sentimentos e nos direitos e deveres daí
decorrentes: os defensores da arte pela arte adotam antes uma atitude de cabal
amoralismo.
No movimento literário que na segunda metade do século XVI se desenvolveu em
torno da Poética, encontramos duas representações da catarse: uma interpretação moralista
e uma interpretação mitridática.
Gêneros Literários: drama e romantismo
Silva (1973) salienta que a lírica, com efeito, não representa o mundo exterior o
objetivo, nem a interação do homem e deste mesmo mundo, assim se distinguindo
fundamentalmente da narrativa e do drama.
A poesia lírica não nasce do anseio ou da necessidade de descrever o real que se
estende perante o eu, nem do desejo de criar sujeitos independentes do eu do poeta lírico.
A lírica enraíza-se na revelação e no aprofundamento do próprio eu, na imposição do ritmo,
da tonalidade, das dimensões, enfim, desse mesmo eu, a toda a realidade.
Tanto o romance como o drama apresentam personagens situadas num determinado
contexto, em certo lugar e em certa época, mantendo entre si mútuas relações de harmonia,
de conflito, etc. Estas personagens revelam-se através de uma série de acontecimentos,
podendo contar-se a “história” de um romance ou de um drama, mas nunca de um poema
lírico.
O drama, por sua vez, procura representar também a totalidade da vida, mas através
de ações humanas que se opõem, de forma que o fulcro daquela totalidade reside na colisão
dramática. A verdadeira unidade de sentido dramática não pode derivar senão do
movimento total, o que significa que o conflito deve encontrar a sua explicação exaustiva
nas circunstâncias em que se produz.
Deste modo, a profusão de figuras, de incidentes e de coisas que caracterizam o
romance, não existe no drama, onde tudo se subordina às exigências da dinâmica do
conflito, a atmosfera do drama é rarefeita, as figuras supérfluas são eliminadas, os episódios
laterais abolidos, defrontando-se as personagens necessárias e desenvolvendo-se entre elas
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uma ação que conduz sem desvios ao conflito. O gênero dramático que se manifesta através
do trágico e do cômico, representa o conflito do homem em seu mundo.
Segundo Aristóteles citado por Moura (2009), a comédia é a imitação de maus
costumes, não, contudo de toda sorte de vícios, mas só daquela parte do ignominioso que é
o ridículo. O riso é a sua energia e deve ser combinado com a intriga ou com a observação
moral.
Romantismo
O Romantismo se originou na Alemanha e Inglaterra em fins do século XVIII e se
desenvolveu no Brasil no século XIX, constituindo o verdadeiro período de nossa literatura, a
poesia enriqueceu-se admiravelmente, criaram-se o romance e o teatro nacionais e formouse pela primeira vez, um razoável público leitor.
A marca principal da poesia romântica é a expressão plena dos sentimentos pessoais,
com autores voltados para seu mundo interior e fazendo da literatura um meio de desabafo
e confissão. Essa ânsia de libertação, que nasce no interior do poeta, em determinado
momento alcança também o nível social, com o artista romântico colocando-se como portavoz dos oprimidos e usando seu talento para protestar contra as injustiças sociais, ao
mesmo tempo em que valoriza a pátria.
De acordo com Abdala Júnior (1986), o projeto nacional do Romantismo incluía a
criação de um teatro brasileiro. O autor destaca as principais peças do teatro romântico:
Antônio José ou o poeta e a Inquisição, primeira tragédia de assunto nacional, de Gonçalves
de Magalhães; O juiz de paz da roça, O Judas em sábado de Aleluia, O Noviço, de Martins
Pena; Camões e o jau, de Casimiro de Abreu; Leonor de Mendonça, de Gonçalves Dias,
escrita na juventude do escritor; e O demônio familiar, de José de Alencar.
José de Alencar
José Martiniano de Alencar nasce a 1º de março de 1829, em Mecejana, Ceará. Filho de
José Martiniano de Alencar (ex-padre) e Ana Josefina. O pai, por amor de sua mãe,
abandonou o sacerdócio quando conheceu sua prima para se casarem.
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Em 1832, o pai é eleito senador, e, dois anos depois, em 1834, torna-se presidente da
província do Ceará, cargo que deixa em 1837, dirigindo-se no ano seguinte, em 1838, ao Rio
de Janeiro. Alencar viaja com o pai.
Em 1840, Alencar completa sua instrução primária, e em 1844, aos 15 anos, inscrevese nos cursos preparatórios à Faculdade de Direito de São Paulo. Datam de seus anos de
faculdade as primeiras publicações de Alencar. Com outros primeiranistas da faculdade
funda uma revista semanal Ensaios Literários.
Em 1848, aos 18 anos, transfere-se para a Faculdade de Direito de Olinda. Nessa
época começa a redigir dois romances históricos: A Alma de Lázaro e O Ermitão da Glória.
Em fins deste mesmo ano, manifestam-se os primeiros sinais de tuberculose que acabariam
por matá-lo. É obrigado a voltar a São Paulo, onde se forma em 1850.
Em 1851, aos 22 anos, Alencar inicia-se na profissão de advogado, que exercerá até o
fim da vida, com raras interrupções. Instalado no Rio de Janeiro, Alencar é convidado por seu
ex-colega de faculdade, Francisco Otaviano, a colaborar no jornal Correio Mercantil.
Alencar estréia como jornalista aos 25 anos, em 1854, e faz muito sucesso. Tanto,
que no ano seguinte, é gerente e redator-chefe de outro jornal, O Diário do Rio de Janeiro,
onde publica folhetins sobre fatos variados e uma série de críticas ao poema sob o
pseudônimo de Ig. Várias.
Em 1857, o sucesso de O Guarani leva Alencar a tentar o mesmo sucesso no teatro.
Escreve uma opereta, Noite de São João e duas comédias, Verso e Reverso e O demônio
familiar.
Em 1860, estréia o drama Mãe. A seguir, Alencar viaja para o Ceará, candidata-se a
deputado pelo Partido Conservador e é eleito. Começa então a carreira política. Em 1861,
estreia na tribuna parlamentar. Em 1862, escreve Lucíola e o primeiro volume de As Minas
de Prata.
Em 1864, casa-se com Ana Cochrane, filha de um médico homeopata inglês, da
mesma família do Almirante Cochrane, herói da luta pela Independência.
Em 1868, aos 39 anos, Alencar torna-se Ministro da Justiça. No ano seguinte,
candidata-se ao Senado e obtém o primeiro lugar. Deixa o Ministério e volta à Câmara em
oposição ao Imperador, que veta seu nome ao Senado. O veto do Imperador encerra sua
carreira política e desencantado, se volta para a literatura.
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Em 1877, Alencar viaja à Europa em tratamento de saúde, mas não consegue se
recuperar. Volta ao Rio, onde morre a 12 de setembro do mesmo ano, aos 48 anos.
Relembrando Alencar, escreve Machado de Assis: “Tinha-lhe afeto, conhecia-o desde o
tempo em que ele ria, não me podia acostumar à ideia de que a trivialidade da morte
houvesse desfeito esse artista fadado para distribuir a vida”.
Beraldo (1980) destaca a literatura e sua função social, os escritores daquele tempo
sentiam-se no dever de exaltar a terra e conscientizar os leitores da realidade em que
viviam. Ora, Alencar, como nenhum outro, tinha consciência desse papel da literatura.
Alencar idealizou a realidade, embora em menor grau. As personagens principais dos
romances históricos, indianistas e regionalistas, têm um porte heróico: são personagens
inteiriças, sem vacilação ou hesitação, possuem todas as características dos heróis;
encarnam todas as virtudes físicas e morais; o mal não os atinge.
Abdala Júnior (1986) destaca José de Alencar como maior ficcionista romântico
brasileiro, que pretendia formar uma literatura autenticamente brasileira, e de certa forma,
conseguiu realizar seu objetivo, uma vez que seu conjunto de obras de ficção constitui o
panorama histórico do Brasil.
Ressalta que o escritor destacou-se entre os intelectuais de seu tempo, acreditou na
função literária como criadora de uma consciência. Não só teve muito presente essa
função, como trabalhou no sentido de revelá-la.
Abdala Júnior (1986) cita que sua vasta obra, composta de 21 romances e mais 8
peças teatrais, alguns ensaios crítico-literários e escritos políticos,
atesta um escritor
esforçado em retratar o país, ou ainda compreendê-lo em sua diversidade. Como romântico,
Alencar não poderia deixar de visitar a História e dela haurir temas para sua obra.
Segundo Tufano (1983), José de Alencar é o mais importante prosador do
Romantismo, tendo inclusive lutado pela criação de uma língua literária mais próxima do
falar brasileiro.
Salienta que sua obra romanesca é vasta, abrangendo todas as tendências
desenvolvidas na época. Em seu conjunto de obras, merecem destaque os romances sociais,
em que o autor faz uma representação bastante crítica das relações humanas na sociedade
carioca da época.
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E apesar dos ingredientes sentimentais e dos arranjos para que tudo termine com um
final feliz, Alencar põe a nu a hipocrisia e a corrupção das classes altas, que se mostram
preocupadas apenas com a ostentação do luxo e a manutenção de seus privilégios.
O Demônio familiar
O demônio familiar é uma peça teatral do escritor brasileiro José de Alencar escrita
em 1857, uma comédia em quatro atos, é um drama de costumes leve. O moleque escravo
doméstico Pedro tece uma série de armações sem medir consequências, a fim de casar seus
patrões com pessoas abastadas e realizar seu sonho de ser cocheiro de um rico senhor.
Segundo Bosi (1994) caberia a José de Alencar insistir na dose de “brasilidade” que
esse drama de costumes deveria conter. Para tanto, compôs Verso e Reverso, peça ligeira de
ambientação carioca, e O demônio familiar, comédia em que os vaivens da intriga são obra
de um escravo, moleque enredador e ambicioso.
Embora o mau caráter de Pedro, o “demônio familiar”, seja o pivô dos embaraços de
uma família “de bem”, não se pode, na análise desta comédia, forçar a nota do preconceito,
ao menos enquanto consciente.
No último ato, o moleque é alforriado para que, fora da irresponsabilidade em que
vivera como escravo possa escolher honradamente seu caminho:
Toma: é a tua carta de liberdade, ela será a tua punição de hoje em diante, porque
as tuas faltas recairão unicamente sobre ti; porque a moral e a lei te pedirão uma
conta severa de tuas ações. Livre, sentirás a necessidade do trabalho honesto e
apreciarás os nobres sentimentos que hoje não compreendes. (PEDRO beija-lhe a
mão.). (ALENCAR, 2003, p. 90-91)
Para Bosi (1994), essa, naturalmente, é a intenção ética de Alencar ao redigir a
comédia. O que ficou, porém, foi a figura do moleque irrecuperável: Pedro apenas mudará
de senhor, realizando seu sonho dourado – ser cocheiro de um rico major, função que
permitirá zombar com desprezo os cocheiros de aluguel. Ficou o estereótipo, vivo na cultura
escravocrata brasileira, do negrinho maroto, astuto, no fundo cínico por incapacidade de
coerência moral: imagem que deixa entrever um preconceito mais tenaz, porque latente.
De acordo com Beraldo (1980) é nos romances urbanos que Alencar consegue criar
os seus melhores personagens, extremamente complexas, em que o bem e o mal se
entrelaçam. E destaca a peça O demônio familiar, o “demônio” é Pedro, moleque escravo
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que provoca os acontecimentos da história, enreda os brancos. Ao final, Pedro é alforriado,
e a peça termina com o antigo senhor de Pedro falando em liberdade e responsabilidade.
Moura (2009) cita que era costume que as famílias mantivessem em seu seio familiar
um moleque escravo com entrada e saída franqueada em casa. Este moleque geralmente
participava da intimidade familiar, transitava pela casa, alimentava-se das refeições dos
senhores, partilhava das brincadeiras das crianças da casa. No caso da peça de Alencar, este
moleque é Pedro, ambicioso e estrategista. Esta “incapacidade de coerência moral”
transforma Pedro num ser inconsequente que só pensa em seu projeto: ser cocheiro de um
rico senhor:
PEDRO - Oh! Trata muito bem, mas Pedro queria que senhor tivesse muito dinheiro
e comprasse carro bem bonito para...
EDUARDO - Para... Dize!
PEDRO - Para Pedro ser cocheiro de senhor!
EDUARDO - Então a razão única de tudo isto é o desejo que tens de ser cocheiro?
PEDRO - Sim, senhor!
EDUARDO (rindo-se) - Muito bem! Assim, pouco te importava que eu ficasse mal
com uma pessoa que estimava; que me casasse com uma velha ridícula, contanto
que governasses dois cavalos em um carro! Tens razão!... E eu ainda devo dar-me
por muito feliz, que fosse esse o motivo que te obrigasse a trair a minha confiança.
(ALENCAR, 2003, p. 35-36)
Para atingir seu objetivo, Pedro promove uma série de mal-entendidos:
enreda uns contra os outros; troca os versos destinados a Henriqueta com os da viúva e viceversa; tenta aproximar Eduardo e a viúva; induz Carlotinha a mandar uma flor a Alfredo;
mente a Azevedo a respeito de Henriqueta; entre outras.
Para Moura (2009), o autor leva o receptor a refletir sobre valores morais e humanos
daquela sociedade. Com esta intenção, até certo ponto moralizadora, faz Eduardo dar a
carta de Alforria a Pedro:
EDUARDO - Por que, minha irmã? Todos devemos perdoar-nos mutuamente; todos
somos culpados por havermos acreditado ou consentido no fato primeiro, que é a
causa de tudo isto. O único inocente é aquele que não tem imputação, e que fez
apenas uma travessura de criança, levado pelo instinto da amizade. Eu o corrijo,
fazendo do autômato um homem; restituo-o à sociedade, porém expulso-o do seio
de minha família e fecho-lhe para sempre a porta de minha casa. (A PEDRO) Toma:
é a tua carta de liberdade, ela será a tua punição de hoje em diante, porque as tuas
faltas recairão unicamente sobre ti; porque a moral e a lei te pedirão uma conta
severa de tuas ações. Livre, sentirás a necessidade do trabalho honesto e
apreciarás os nobres sentimentos que hoje não compreendes. (PEDRO beija-lhe a
mão.) (ALENCAR, 2003, p. 90-91)
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De acordo Moura (2009) se observarmos mais atentamente a peça O demônio
familiar, poderemos verificar que alguns detalhes se encaixam nas características do teatro
romântico moderno.
Um importante aspecto a ser observado são os valores sociais e humanos que
norteiam a sociedade, em especial uma “família de bem”. Estas mensagens vêm através das
palavras de Eduardo nas várias situações criadas. Por exemplo, quando fala à sua irmã sobre
o papel do irmão no seio familiar, deixa implícita a condição da mulher frágil que necessita
da proteção do homem numa sociedade patriarcal:
EDUARDO - Mais um motivo. Um irmão, Carlotinha, é para sua irmã menos do que
uma mãe, porém mais do que um pai; tem menos ternura do que uma, e inspira
menos respeito do que o outro. Quando Deus o colocou na família a par dessas
almas puras e inocentes como a tua, deu-lhe uma missão bem delicada; ordenoulhe que moderasse para sua irmã a excessiva austeridade de seu pai e a ternura
muitas vezes exagerada de sua mãe; ele é homem e moço,conhece o mundo,
porém também compreende o coração de uma menina, que é sempre um mito
para os velhos já esquecidos de sua mocidade. Portanto, a quem melhor podes
contar um segredo do que a mim?
CARLOTINHA - É verdade, suas palavras me decidem. Você é meu irmão, e o chefe
da nossa família, desde que perdemos nosso pai. Devo dizer-lhe tudo; tem o direito
de repreender-me! (ALENCAR, 2003, p. 38-39)
Moura (2009) salienta que valores morais também são veiculados pelas palavras de
Eduardo quando discute a questão do casamento com Azevedo, que se revela um sujeito
mau caráter:
AZEVEDO - Decerto!... Uma mulher é indispensável, e uma mulher bonita!... É o
meio pelo qual um homem se distingue no grand monde!... Um círculo de
adoradores cerca imediatamente a senhora elegante, espirituosa, que fez a sua
aparição nos salões de uma maneira deslumbrante! Os elogios, a admiração, a
consideração social acompanharão na sua ascensão esse astro luminoso, cuja
cauda é uma crinolina, e cujo brilho vem da casa do Valais ou da Berat, à custa de
alguns contos de réis! Ora, como no matrimônio existe a comunhão de corpo e de
bens, os apaixonados da mulher tornam-se amigos do marido, e vice-versa; o
triunfo que tem a beleza de uma, lança um reflexo sobre a posição do outro. E
assim consegue-se tudo!
EDUARDO - Tu gracejas, Azevedo; não é possível que um homem aceite
dignamente esse papel. A mulher não é, nem deve ser, um objeto de ostentação
que se traga como um alfinete de brilhante ou uma jóia qualquer para chamar a
atenção! (ALENCAR, 2003, p. 23-24)
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Segundo Moura (2009), contata-se durante o desenrolar da trama, que através das
palavras de Eduardo, no papel de bom moço, o autor manda seus “recadinhos” aos
espectadores ou leitores. As falas desta personagem são geralmente longas e recheadas de
“lições”.
Estas lições versam sobre os costumes de então, como a família ser vista com um
templo, “o templo da felicidade doméstica”; a manutenção dos costumes que fazem manter
a família unida, o respeito à palavra dada e escolha dos filhos em relação ao matrimônio; a
confiança no poder da educação oferecida pelos pais aos filhos; a paz estabelecida no seio
familiar. Eduardo é o porta-voz das mensagens do autor, mas com o cuidado de não
melindrar espectadores ou leitores com suas reflexões morais.
Uemori (2004) cita que José de Alencar, abordou o tema da escravidão em sua peça
O demônio familiar. Tentou mostrar a relação de escravos e senhores no âmbito familiar.
Surpreende a presença de um escravo, no caso o menino Pedro, nessa obra, já que os negros
estiveram praticamente ausentes nos outros trabalhos do autor. Quando apareciam eram
personagens secundários, de pouquíssima relevância para a trama. Compreende-se essa
ausência quando se sabe que escravos e escravidão eram termos “proibidos” nos textos
oficiais e nas obras literárias durante o Romantismo.
O estudioso defende que na obra de Alencar a família ocupa um lugar importante,
bem como os que querem desagregá-la. Em O demônio familiar o “inimigo” não é um
invasor, mas está dentro da família e é escravo. O moleque Pedro não é a personagem típica
do escravo fiel e resignado e nem o escravo vingativo e cruel, dois estereótipos da época;
nem é o serviçal autômato cumpridor de ordens. Ele é malandro, intrigueiro, alcoviteiro,
egoísta, interesseiro, mentiroso que manipula o seu senhor (Eduardo) e as outras
personagens brancas.
Eduardo, cansado das diabruras do moleque, aplica-lhe um castigo: liberta-o. Visava,
mediante esse ato, estabelecer a hierarquia e expulsar o demônio familiar; portanto, não é a
palmatória que corrigirá Pedro. A alforria tinha dois objetivos: punir e educar. A expulsão
salva a família e transforma Pedro de escravo em cidadão. A mudança na ordem jurídica o
obrigará a ser responsável pelos seus atos, “dando-lhe o sentido de obrigação moral”.
De acordo com Uemori (2004), na obra literária de Alencar existem vários
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“demônios” ameaçando a família e o caráter nacional brasileiro. O casamento por interesse,
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a influência estrangeira e a corrupção moral introduzida pelos escravos. Alencar queria
salvar a família patriarcal pela alforria.
O Demônio Familiar: uma análise Pedagógico-Moralista
Uma breve análise se faz pertinente no sentido de estabelecer um diálogo entre o
estudo da obra e das teorias mencionadas. Destacaremos algumas ideias importantes:
Silva (1973) confere à literatura função político-social, a literatura com a função
pedagógica moralista, que molda quem lê. Seriam por exemplo, as fábulas. Critica a
literatura entendida segundo critérios de valor de Sartre. Salienta a Literatura
Comprometida, em defesa de determinados valores morais, políticos e sociais, nasce de uma
decisão livre do escritor; Literatura Planificada ou Dirigida, os valores a defender são
impostos; Platão, em seu moralismo estético busca em Sócrates suas reflexões. Sócrates
reduz o conceito de beleza à utilidade. As coisas belas se identificam com as coisas de boa
utilidade.
Romantismo, movimento que expressa um forte engajamento na reforma social e ao
qual José de Alencar se destaca como representante. Neste sentido, Tufano (1983) salienta
que sua obra romanesca é vasta, abrangendo diferentes tendências desenvolvidas na época.
Em seu conjunto de obras, merecem destaque os romances sociais, em que o autor faz uma
representação bastante crítica das relações humanas na sociedade carioca da época. Apesar
dos ingredientes sentimentais e dos arranjos para que tudo termine com um final feliz,
Alencar põe a nu a hipocrisia e a corrupção das classes altas, que se mostram preocupadas
apenas com a ostentação do luxo e a manutenção de seus privilégios.
De acordo Moura (2009), contata-se durante o desenrolar da trama, que através das
palavras de Eduardo, no papel de bom moço, José de Alencar manda seus “recadinhos” aos
espectadores ou leitores. As falas desta personagem são geralmente longas e recheadas de
“lições”.
Uemori (2004) defende que na obra de Alencar a família ocupa um lugar importante,
bem como os que querem desagregá-la. Em O demônio familiar o “inimigo” não é um
invasor, mas está dentro da família e é escravo.
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Bosi (1994) destaca no último ato, o momento em que o moleque é alforriado para
que, fora da irresponsabilidade em que vivera como escravo possa escolher honradamente
seu caminho:
Toma: é a tua carta de liberdade, ela será a tua punição de hoje em diante, porque
as tuas faltas recairão unicamente sobre ti; porque a moral e a lei te pedirão uma
conta severa de tuas ações. Livre, sentirás a necessidade do trabalho honesto e
apreciarás os nobres sentimentos que hoje não compreendes. (PEDRO beija-lhe a
mão.). (ALENCAR, 2003, p. 90-91)
Defende que essa, naturalmente, era a intenção ética de Alencar ao redigir a
comédia.
E Para Uemori (2004), a alforria tinha dois objetivos: punir e educar. A expulsão salva
a família e transforma Pedro de escravo em cidadão. A mudança na ordem jurídica o
obrigará a ser responsável pelos seus atos, dando-lhe o sentido de obrigação moral.
Conclusão
Na perspectiva de que o resultado deste estudo possa contribuir para ampliação e
aprofundamento aos estudos literários. Analisamos a peça teatral “O demônio familiar”,
uma das obras do grande representante do Romantismo, José de Alencar. Investigando a
presença de uma das funções da literatura apontadas por Silva (1973), esta, a função
pedagógico-moralista.
O estudo da obra em questão foi desenvolvido de forma gradativa, a realização desta
pesquisa é de caráter teórico, por meio de pesquisa bibliográfica, com cotejamento da teoria
e aplicação na obra em questão.
Neste sentido, uma vez que, segundo Silva (1973), as coisas belas se identificam com as
coisas de boa utilidade, a literatura se direciona em algo pedagógico. Confere à literatura
função político-social, a literatura com a função pedagógico-moralista, aquela que “molda”
quem lê.
Moura (2009) defende que na trama, através das palavras de Eduardo, no papel de
bom moço, o autor manda seus “recadinhos” aos espectadores ou leitores. As falas desta
personagem são geralmente longas e recheadas de “lições”.
Para Uemori (2004), a alforria tinha dois objetivos: punir e educar. A expulsão salva a
família e transforma Pedro de escravo em cidadão. A mudança na ordem jurídica o obrigará
a ser responsável pelos seus atos, “dando-lhe o sentido de obrigação moral”.
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E Bosi (1994) destaca no último ato, o momento em que o moleque é alforriado para
que, fora da irresponsabilidade em que vivera como escravo possa escolher honradamente
seu caminho:
Toma: é a tua carta de liberdade, ela será a tua punição de hoje em diante, porque
as tuas faltas recairão unicamente sobre ti; porque a moral e a lei te pedirão uma
conta severa de tuas ações. Livre, sentirás a necessidade do trabalho honesto e
apreciarás os nobres sentimentos que hoje não compreendes. (PEDRO beija-lhe a
mão.). (ALENCAR, 2003, p. 90-91)
Defendendo que essa, naturalmente, era a intenção ética de José de Alencar ao
redigir a comédia.
Assim, com esta pesquisa, através do cotejamento teórico e aplicação na obra,
embasados nas teorias mencionadas, podemos verificar que a função pedagógico-moralista
da literatura se faz autêntica em “O demônio familiar”, de José de Alencar.
Referências
ABDALA JUNIOR, B. Tempos da literatura brasileira. 2. ed. Ática, 1986.
ALENCAR, J. O demônio familiar. 2. ed. Campinas, SP: Pontes, Editora Kelps, 2003.
BERALDO, J. Literatura comentada. São Paulo: Educação Abril, 1980.
BOSI, A. História Concisa da Literatura Brasileira. 32. ed. São Paulo: Cultrix, 1994.
CALDIN, C. A leitura como função pedagógica: o literário na escola. Rev. ACB:
Biblioteconomia em Santa Catarina, v. 7, n. 1, p. 22-33, 2002.
EAGLETON, T. Teoria da Literatura. Uma introdução. Trad. Waltensir Dutra. 6. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 2006.
PLATÃO. A República: [ou sobre a justiça, diálogo político]. Tradução Anna Lia Amaral de
Almeida Prado. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
SILVA, V. Teoria da Literatura. 3. ed. Coimbra: Livraria Almeida, 1973.
SOUZA, R. Teoria da Literatura. 10. ed. São Paulo, Ática: 2007.
TUFANO, D. Estudos de literatura brasileira. 3. ed. Moderna, 1983.
UEMORI, C. Escravidão, nacionalidade e “mestiços políticos”. Lutas Sociais, n. 11/12, p. 8597, 2004.
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Educação ambiental como instrumento para preservação e proteção do meio ambiente:
aspectos pedagógicos e jurídicos
Willian Flügge Carvalho
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Resumo O presente trabalho tem por objetivo demonstrar a relevância da educação
ambiental como instrumento positivo e eficaz para a preservação e proteção do meio
ambiente. Através de pesquisas bibliográficas apresentam-se alguns dos principais pontos
que auxiliam para o estudo e compreensão do tema, tais como: movimentos internacionais
propulsores da tutela ambiental no mundo, a legislação nacional como mecanismo para se
difundir e inserir a educação ambiental no âmbito escolar, os Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs) exibindo o meio ambiente como tema transversal para a educação pátria, a
interdisciplinaridade integrando diversos saberes e melhorando o entendimento sobre a
problemática das questões ambientais e, a educação ambiental como utensílio para a tutela
natural. No mais, sublinha-se a essencialidade da educação voltada aos temas ecológicos
como pilar para educar e conscientizar cidadãos sobre a imprescindibilidade do meio
ambiente.
Palavras-chave: Educação Ambiental. Meio Ambiente. Tutela. Escola.
Introdução
Fora pela realização de movimentos internacionais relacionados ao meio ambiente
que se percebeu, face à difusividade planetária que obtiveram, a necessidade de um método
que, antes de tudo, conscientizasse e oferecesse aos indivíduos informações sobre
problemas ambientais. Haja vista estarem as atividades antrópicas em um contexto global
ocasionando desde priscas eras o extermínio de recursos naturais em diversas regiões do
planeta.
Nessa senda, elaboram-se continuamente inúmeros mecanismos de tutela ao meio
ecológico visando frear o processo de degradação do meio ambiente. Dentre os
instrumentos criados para preservar e proteger o referido meio, encontra-se a educação
ambiental, que progressivamente tem ganhando força e espaço no Brasil com a edição de
leis e outras regras governamentais ao âmbito educacional.
Nesse palco, a educação ambiental insere-se como tipo de “educação política, no
sentido de que ela reivindica e prepara os cidadãos para exigir justiça social, cidadania
nacional e planetária, autogestão e ética nas relações sociais e com a natureza” (REIGOTA,
1996, p. 10).
3
Willian Flügge Carvalho é graduando do 10º período do curso de Direito da Faculdade de Jussara – FAJ, da
cidade de Jussara, Goiás. Professor indicador doutor Clovis Carvalho Britto, Universidade de Brasília –
UNB/UEG.
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A maioria destes trabalhos aponta primordialmente fatos externos, notadamente
intergovernamentais realizados pelas Nações Unidas que cooperaram para a construção da
educação em comento, derribando a ideia de uma educação ambiental nacional destituída
de influências alienígenas. No mais, enfatiza-se o avanço legislativo vernáculo, bem como as
políticas públicas em geral relevantes à formação e inserção desse tipo de educação nas
escolas e no meio social. Também, observa-se que a educação ambiental deve ligar-se à
transversalidade e interdisciplinaridade, levando em conta serem diretrizes adotadas pelo
sistema de ensino que a permitem disseminar e ser aplicada à sociedade em geral. Salientase ainda que a efetividade da citada educação se sujeita à participação de diversos atores
sociais, como escola e comunidade, o que promove o roto paulatino do arcaico modelo
formal de ensino.
Desta feita, é com o propósito de elucidar o tema educação ambiental e expor a
proeminência da questão face aos problemas ambientais vividos pelo mundo,
particularmente por nosso país, que este trabalho direciona-se ao esclarecimento da
temática, a fim de propiciar estudo e conhecimento.
Educação ambiental: alguns passos para a universalidade
Os movimentos ecologistas estrearam no mundo em épocas que não muito se distam
dessa. Tiveram “origem em um momento da história recente em que a utopia e as energias
para transformação da sociedade estavam em alta” (CARVALHO, 2011, p. 46). Na Europa,
especialmente em Paris – França, e nos Estados Unidos, nos anos de 1960, clamava-se por
“um planeta mais azul” (CASCINO, 1999, p. 31). As manifestações ideológicas e as
reivindicações por direitos diferenciados no continente europeu e americano cooperaram
para a edificação de uma preocupação ambiental que logo se ramificaria pelo mundo. No
Brasil, não muito diferente, até a segunda metade do período novecentista (1960),
prevalecia “a convicção de que seriam infinitas as fontes de recursos naturais e de que o
livre mercado maximizaria o bem-estar social” (TACHIZAWA, 2006, p. 44).
Hodiernamente, com a disseminação de pesquisas e estudos científicos cada vez mais
acessíveis às pessoas de todo mundo, a mentalidade arcaica alimentada até 1960 vem sendo
dirimida, e, por consequência, instituindo-se gradativamente um novo modelo de
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conscientização. Os movimentos internacionais realizados pela Organização das Nações
Unidas – ONU em beneplácito do meio ambiente constituem mecanismos importantes que
contribuem para o influxo de novos métodos de tutela ao meio natural.
Em 1972, em Estocolmo – Suécia realizou-se o primeiro grande movimento
internacional em prol do meio ambiente. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio
Ambiente Humano, conhecida como Conferência de Estocolmo, “contribuiu de maneira
importante para gerar um novo entendimento sobre os problemas ambientais e a maneira
como a sociedade prevê sua subsistência” (CAMPOS; NETO; SHIGUNOV, 2009, p. 60).
Destaca-se, entretanto, que durante a constância de Estocolmo, elaborou-se o documento
intitulado: Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano, o qual trouxe
expressamente 26 (vinte e seis) princípios. Enquanto o princípio 19 (dezenove) do citado
documento fomentou a necessidade da inserção da educação ambiental como instrumento
a incentivar e fortalecer a proteção do meio ambiente, devendo ser exercida por todos os
integrantes da sociedade.
Em 1975, a United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization –
UNESCO, órgão da ONU incumbido de promover e divulgar questões educacionais através de
reuniões e seminários internacionais, organizou na Iugoslávia, em Belgrado, “a reunião de
especialistas em educação, biologia, geografia e história, e entre outros” (REIGOTA, 1996, p.
16), com o intuito de se definir pressupostos norteadores para a educação ambiental no
mundo. Através da “Carta de Belgrado” (CASCINO, 1999, p. 55), fixaram-se alguns objetivos
que colocaram a educação ambiental como meio de conhecimento e solução para diversos
problemas ambientais.
Em 1982, “a partir da avaliação dos dez anos pós-Estocolmo, orientada pelo PNUMA,
foi constituída, em Nairóbi, no Quênia, a Comissão Mundial de Meio Ambiente e
Desenvolvimento *...+” (MASCARENHAS, 2008, p. 25), a qual foi implementada no ano
seguinte pela ONU e teve como meta estabelecer discussões e metas entre os Estados para a
proteção climática, enaltecendo a preocupação com o meio ambiente e com estudos à sua
tutela em todo planeta. Anote-se que em 1987, como fator categórico de sua realização,
fora criado o Relatório Brundtland, alcunhado como Nosso Futuro Comum, publicado em
1988 para propagar o entendimento do “*...+ desenvolvimento sustentável como o que
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realiza as necessidades do presente sem comprometer a habilidade das futuras gerações de
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as satisfazerem, prioriza as camadas mais pobres da população e estabelece condições
básicas para o desenvolvimento e a conservação dos ecossistemas” (MASCARENHAS, 2008,
p. 26).
No ano de 1992, a Assembleia Geral da ONU realizou no Rio de Janeiro – Brasil, a
Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD),
conhecida também como Rio-92, ECO-92 ou Cúpula da Terra. Pelo encontro dos Estados,
houve a criação de “*...+ importantes documentos como a Agenda 21 [...+” (MASCARENHAS,
2008, p. 29). A Agenda 21 traçou estratégias e metas globais para a criação de mecanismos
de desenvolvimento sustentável e ao estabelecimento de políticas para sua efetivação.
Sobreleva mencionar, entretanto, que apesar da paulatina pulverização de iniciativas
em prol do meio ambiente ocorridas mundialmente desde a década de 1960, a Educação
Ambiental (EA) somente ganhou prestígio e começou a efetivamente propagar-se e se tornar
mecanismo hábil à proteção ecológica no estrado interno dos Estados, com o advento da
Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental em 1977, realizada em Tbilisi,
Geórgia (ex-URSS).
[...] inicia-se um amplo processo em nível global orientado para criar as condições
que formem uma nova consciência sobre o valor da natureza e para reorientar a
produção de conhecimento baseada nos métodos da interdisciplinaridade e nos
princípios da complexidade. Esse campo educativo tem sido fertilizado
transversalmente, e isso tem possibilitado a realização de experiências concretas
de educação ambiental de forma criativa e inovadora por diversos segmentos da
população e em diversos níveis de formação (JACOBI, 2003, p. 190).
De fato, as bases da educação ambiental encontram-se nos eventos internacionais
produzidos pela Organização das Nações Unidas, especialmente pelos movimentos
supramencionados, os quais criaram inúmeras diretrizes para a construção de um modelo
social que levasse em conta o bem-estar humano, alcançando “uma situação ideal de justiça
social, para a humanidade, na qual o desenvolvimento sócio-econômico, em bases
eqüitativas, estaria em harmonia com os sistemas de suporte da vida na Terra” (CORDANI,
1995, p. 14). Inobstante, as normas decorrentes dos eventos serviram para a mundialização
da proteção e preservação ambiental, já que muitos Estados, como o Brasil, tornaram-se
pactuantes dos tratados instituídos pelas ações intergovernamentais.
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Legislação brasileira e diretrizes governamentais para a inserção da educação ambiental
nas escolas
No âmbito nacional, a influência dos movimentos externos, como os já mencionados,
contribuíram para a produção de políticas públicas e eventos não governamentais sobre
educação ambiental. A legislação pátria, grande modelo da inserção de parâmetros
internacionais no ordenamento interno, vem se desenvolvendo concomitante aos novos
paradigmas da educação, criando mecanismos para a implementação da educação
ambiental nas escolas.
Em 1981, a Lei n° 6.938 – Política Nacional do Meio Ambiente –, de maneira inédita,
através de seu artigo 2°, inciso X, incluiu a educação ambiental em todos os níveis de ensino,
compreendendo também a comunidade na participação ativa para a defesa do meio
ambiente. Todavia, foi com a promulgação da Lex Magna em 1988 que a educação
ambiental ganhou relevância e alicerce constitucional para se desenvolver nacionalmente.
A Constituição vigente buscou “trazer a consciência ecológica ao povo, titular do
direito ao meio ambiente, permitindo a efetivação do princípio da participação na
salvaguarda desse direito” (FIORILLO, 2011, p. 126). Por meio do artigo 225, parágrafo §1°, e
inciso VI, do referido diploma, admitiu-se que a educação ambiental fosse utilizada como
instrumento de tutela ao meio natural. Ademais, a nova ordem de leis superiores fundou o
Estado Democrático de Direito baseado na cidadania e dignidade da pessoa humana (artigo
1°, incisos II e III, da CF), por onde a educação tornou-se meio indispensável para resguardálas e promovê-las, visto ser um direito de todos e dever do Estado e da família, conforme
preconiza o artigo 205, da Carta da República, in verbis:
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e
incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da
pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho (BRASIL, 1988).
Desse modo, com o vigor da Carta Política de 1988 inúmeros projetos, eventos e leis
multiplicaram-se pelo país, unindo preservação e proteção ambiental à necessidade de uma
educação que considerasse o meio ecológico parte intrínseca para a formação de indivíduos,
ou seja, um tipo de ensino que alimentasse o ideal “de sujeito ecológico *...+, contribuindo
para uma cidadania ambientalmente sustentável” (CARVALHO, 2011, p. 69 e 106).
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Em 1992, por exemplo, durante a realização da ECO-92, surgiu com objetivos
específicos o evento não governamental conhecido como Fórum Global, o qual reuniu
diversas Organizações não Governamentais – ONGs, e vários movimentos sociais ligados ao
meio ambiente. Como fruto significativo do evento, elaborou-se o Tratado de Educação
Ambiental para Sociedades Sustentáveis, “o qual pretendeu abarcar os princípios
estabelecidos em Tbilisi – 1977” (CASCINO, 1999, p. 45). Em verdade, o documento causou
efeitos positivos no campo educacional e pedagógico brasileiro. Sobre o assunto, Carvalho
(2011) aponta o seguinte:
Esse tratado está na base da formação da Rede Brasileira de Educação Ambiental,
bem como das diversas redes estaduais, que formam grande articulação de
entidades não governamentais, escolas, universidades, e pessoas que querem
fortalecer as diferentes ações, atividades, programas e políticas em EA. Essa aposta
na formação de novas atitudes e posturas ambientais como algo que deveria
integrar a educação de todos os cidadãos passou a fazer parte do campo
educacional propriamente dito e das preocupações das políticas públicas. Essa
compreensão foi ratificada pela Política Nacional da Educação Ambiental [...]
(CARVALHO, 2011, p. 54).
A Política Nacional da Educação Ambiental – Lei n° 9.795/99 –, regulamentada pelo
Decreto 4.281/02, veio reforçar e estabelecer metas concretas à educação ambiental no
Brasil. Tal lei foi “instituída como obrigatória em todos os níveis de ensino e considerada
componente urgente e essencial no Ensino Fundamental” (BOER; MORAES, 2006, p. 293).
Definida como o conjunto de “processos pelos quais o indivíduo e a coletividade constroem
valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes contemporâneas voltadas para a
conservação do meio ambiente, bem de uso comum do povo” (FIORILLO, 2011, p. 127).
Transversalidade e interdisciplinaridade como meio de se efetivar a educação ambiental
Vede que o legislador nacional, algumas entidades do terceiro setor como as ONGs, e
ainda a população civil em geral, encontram-se trabalhando para introduzir valores e
atitudes lastreados pela ética, cidadania e dignidade no plano estudantil brasileiro.
Entrementes, para colocar a educação ambiental de maneira efetiva e propícia para gerar
resultados nas escolas, especialmente nos graus fundamentais e médios, mais do que
políticas públicas ou eventos desprovidos de qualquer vínculo político devem ser obrados.
Nessa direção, Boer e Moraes (2006) apontam a transversalidade e a interdisciplinaridade
como métodos primordiais para se erguer uma educação ambiental eficiente.
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A transversalidade da educação brasileira opera-se com a inserção de questões
sociais relevantes no plano escolar. Desde a elaboração dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCNs), pelo Governo Federal, os denominados Temas Transversais tem moldado
a educação pátria. De acordo com Peres (2008), os Temas Transversais escolhidos pelo
poder público no Brasil foram divididos em seis grupos, fazendo referência à: “Ética, Meio
Ambiente, Pluralidade Cultural, Saúde, Orientação Sexual, Trabalho e Consumo” (PERES,
2008, p. 39).
Em 1997, a Secretaria de Educação Fundamental publicou uma cartilha contendo a
versão definitiva dos PCNs para as primeiras séries do ensino básico, da 1ª à 4ª séries. Em
1998, o mesmo órgão apresentou a versão definitiva dos PCNs para a 5ª e 8ª séries. Do
documento de 1997, acentua-se o seguinte trecho sobre o tema meio ambiente:
O trabalho de Educação ambiental deve ser desenvolvido a fim de ajudar os alunos
a construírem uma consciência global das questões relativas ao meio para que
possam assumir posições afinadas com os valores referentes à sua proteção e
melhoria. [...] Os conteúdos de Meio Ambiente serão integrados ao currículo
através da transversalidade, pois serão tratados nas diversas áreas do
conhecimento, de modo a impregnar toda a prática educativa e, ao mesmo tempo,
criar uma visão global e abrangente da questão ambiental (SECRETARIA DE
EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL, 1997, p. 35-36).
Assim, os “PCNs apresentam o meio ambiente como um dos Temas Transversais,
cujos conteúdos devem ser trabalhados pela Educação Ambiental, de forma sistemática,
abrangente, interdisciplinar e transversal nas disciplinas” (BOER; MORAES, 2006, p. 293).
A interdisciplinaridade, por sua vez, nasce com a missão de relacionar diferentes
áreas do conhecimento à complexidade das questões ambientais; carregando o objetivo de
gerar um melhor entendimento sobre as realidades difíceis e delicadas àqueles envolvidos
no circuito escolar e também fora dele.
É sabido que o meio ambiente é tudo que nos envolve e com o que interagimos, por
isso, a educação comprometida com temas ecológicos deve instigar novos métodos de
ensino e aprendizagem, cingindo diversos campos do conhecimento, levando em conta a
grandiosidade do objeto de estudo. Frise-se que a interdisciplinaridade não busca “unificar
as disciplinas, mas estabelecer conexões entre elas, na construção de novos referenciais
conceituais e metodológicos consensuais, promovendo a troca entre os conhecimentos
disciplinares” (CARVALHO, 2011, p. 121).
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Normalmente, o método interdisciplinar “é empregado quando professores de
diferentes disciplinas realizam atividades comuns, sobre um mesmo tema” (REIGOTA, 1996,
p. 39). No entanto, esse modelo que se orienta por um nexo entre distintos saberes não
deve limitar-se ao entrecruzamento de matérias afins. Posicionar a educação ambiental sob
o molde interdisciplinar é também “construir um conhecimento dialógico, ouvir os
diferentes saberes, tantos os científicos quanto os outros saberes sociais (locais, tradicionais,
das gerações, artísticos, poéticos, etc.)” (CARVALHO, 2011, p. 130).
Os professores, nesse cenário, conscientes “de seu importante papel na formação
das futuras gerações, assumem a tarefa de rever sua educação, em um rico diálogo [...]
consigo próprio, no sentido de reeducar-se” (CASCINO, 1999, p. 95), adaptando-se as novas
práticas pedagógicas nesse volúvel palco socioeducativo.
Assim, claro está que a transversalidade e a interdisciplinaridade devem integrar a
educação ambiental como requisitos básicos para efetivá-la e vinculá-la ao ensino
educacional nacional. Contudo, deve-se aluminar que, para que a educação ambiental esteja
apta a promover a proteção e preservação natural, escola e comunidade devem trabalhar
em conjunto.
Práticas para a efetividade da educação ambiental fora da escola
A informalidade da educação ambiental, isto é, as práticas educacionais exercidas
fora dos muros escolares por diversas pessoas da comunidade, são tão relevantes quanto as
realizadas intramuros.
Enquanto internalizadas, as atividades voltadas à educação ambiental comumente
limitam-se a um grupo de indivíduos, com idades aproximadas, conhecimentos parecidos e,
muitas vezes, orientados por um mesmo processo cognitivo. Se externas, “incluem não só
crianças e jovens, mas também adultos, agentes locais, moradores e líderes comunitários”
(CARVALHO, 2011, p. 157).
Logo, os efeitos e resultados da educação ambiental à benevolência do meio
ecológico somente podem ser concretos e positivos se, antes de tudo, este desafio for
vencido, o qual sumariamente consiste em “formular uma educação ambiental que seja
crítica e inovadora, em dois níveis: formal e não formal” (JACOBI, 2003, p. 196). Portanto,
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pode-se dizer que “as instituições de ensino estão comprometidas com a educação
ambiental tanto no ensino formal como não formal” (FIORILLO, 2011, p. 128).
Chegando aqui, é forçoso explicar que “a educação ambiental por si só não resolverá
os complexos problemas ambientais planetários” (REIGOTA, 1996, p. 12), ou seja, ela jamais
pode ser vista como único meio para combater o gradativo falecimento do meio ecológico,
cujas causas ligam-se diretamente às atividades do homem na natureza em um contexto
mundial. A educação ambiental deve ser usada como um utensílio para tutelar o meio
ambiente, sendo, entanto, questão primordial na formação do caráter e atitudes de todos os
cidadãos. Deve estar presente em todos os graus de formação, oferecendo aos indivíduos
informações sobre seus direitos e deveres, além de levá-los à consciência dos problemas
ambientais, orientando-os às práticas para combatê-los e/ou minimizá-los, ou até
interrompê-los.
Considerações finais
O mundo capitalista, envolto pelo materialismo exacerbado, requer dia a dia soluções
efetivas para os problemas socais e naturais que ocorrem pelo esgotamento dos recursos
naturais. Nessa direção, vimos que a educação ambiental tem se tornado objeto propício
para promover a educação social quanto ao meio ecológico. Ao atuar através do ensino nas
escolas e por práticas individuais e coletivas, pode gerar bons resultados locais e globais. No
caminho comum, se agir como formadora e reformadora de opinião, pode auxiliar na
conscientização sobre a importância do meio finito que estamos condenados a depender ou
sucumbir sem sua utilização, leia-se: meio ambiente. Assim, observamos que a introdução
de questões de sustentabilidade no âmbito escolar é meio direito de proteção e preservação
ambiental, além de enaltecer a cidadania e os valores éticos e humanos.
Igualmente, as políticas públicas nacionais e internacionais seguidamente realizam
papel importante e de prestígio para o processo de implementação da educação ambiental
no mundo inteiro. No Brasil, a legislação, por exemplo, é medida necessária para a difusão
da educação ambiental nas escolas e na comunidade, já que valora, protege e dissemina os
temas ecológicos nesses meios.
Destarte, ante a necessidade da proteção e preservação do meio ambiente,
necessário se torna primeiramente educar e reeducar a população em geral, utilizando-se
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diversos instrumentos, dentre eles, a educação ambiental inserida nas escolas, nas políticas
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A Matemática e o currículo integrado no Curso Técnico em Agropecuária
Thais Aparecida Pacheco
Josislei de Passos Vieira
Paula Reis de Miranda
4
Resumo Este trabalho faz parte da Pesquisa do Programa Institucional de Iniciação Científica e
Inovação Tecnológica do IF Sudeste de Minas – campus Rio Pomba intitulada “A Matemática na
formação do técnico em agropecuária: a efetivação do currículo integrado” que tem como objetivo
elaborar um material didático interdisciplinar para o ensino da Matemática no Curso Técnico em
Agropecuária integrado ao Ensino Médio do IF do Sudeste de Minas - Campus Rio Pomba. Neste
recorte apresentam-se as visões do coordenador, dos docentes, dos discentes e do ex – aluno do
curso Técnico em Agropecuária sobre a Matemática na formação do profissional e do cidadão
envolvido nesse curso. Nesse sentido são destacadas orientações para os professores de
Matemática, quanto a seu papel na formação do educando e o currículo que contribuirá para o
mundo que o cerca e a importância da Matemática nessa formação.
Palavras chave: Currículo.
Interdisciplinaridade.
Matemática.
Curso
Técnico
em
Agropecuária.
Educação profissional técnica integrada ao Ensino Médio
Os cursos técnicos regularmente oferecidos pelos IF podem ser de articulação
concomitante, subsequente ou integrado. A articulação no formato concomitante é
oferecida a quem já concluiu o Ensino Fundamental ou esteja cursando o Ensino Médio,
permitindo ao estudante ter duas matrículas distintas: uma no Ensino Médio regular e outra
no Ensino Técnico. Já o curso subsequente, destina-se apenas a quem já tenha concluído o
Ensino Médio, pois concede ao estudante a matrícula e a certificação no curso técnico.
A partir do Decreto 5.154/04 (BRASIL, 2004) as instituições de educação profissional e
tecnológicas retomaram ampliaram a oferta na modalidade integrada. O curso técnico
integrado ao ensino médio, por sua vez, é oferecido a quem já tenha concluído o Ensino
Fundamental, contando com uma matrícula única para o aluno que obterá, ao final do
mesmo, a habilitação profissional técnica de nível médio emitida pela instituição federal e a
certificação de nível médio.
4
Thais Aparecida Pacheco e Josislei de Passos Vieira são graduandas do curso de Licenciatura em Matemática
pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais- Campus Rio Pomba e
bolsistas de Iniciação à Docência. Paula Reis de Miranda é doutoranda da Faculdade de Educação da UFMG e
professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais - Campus Rio
Pomba.
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Mas quando se fala em integração curricular não se trata exclusivamente da
modalidade integrada e sim da manifestação da integração. O princípio da integração tem
que ser observado em qualquer modalidade. Defende-se a integração pelo princípio, e
reconhecem-se demandas e pertinências sociais das outras modalidades. O princípio da
educação integrada é o trabalho que, como tal, deve nortear a educação profissional e o
ensino médio.
Nesse sentido, ressalta-se a definição de integração de Frigotto, Ciavatta e Ramos
(2005), quando afirmam que:
Remetemos o termo [integrar] ao seu sentido de completude, de compreensão das
partes no seu todo ou da unidade no diverso, de tratar a educação como uma
totalidade social, isto é, nas múltiplas mediações históricas que concretizam os
processos educativos [...]. Significa que buscamos enfocar o trabalho como
princípio educativo, no sentido de superar a dicotomia trabalho manual/trabalho
intelectual, de incorporar a dimensão intelectual ao trabalho produtivo, de formar
trabalhadores capazes de atuar como dirigentes e cidadãos.
(Frigotto, Ciavatta e Ramos, 2005, P.117).
De acordo com Moura (2006), a característica marcante dos cursos integrados é a
capacidade de proporcionar um vínculo estreito entre a formação básica e a formação
profissional.
O Caminho da pesquisa
No Ensino Médio, etapa final da escolaridade básica, como mostra (BRASIL, 2002) a
Matemática deve ser compreendida como uma parcela do conhecimento humano essencial
para a formação de todos os jovens, contribuindo na construção da “visão de mundo”, na
interpretação da realidade e no desenvolvimento das capacidades exigidas ao longo da vida
social e profissional.
A questão proposta neste artigo é: Quais relações podem ser estabelecidas entre a
Matemática e o curso Técnico em Agropecuária integrado ao Ensino Médio?
Consequentemente, amplia-se olhar desta questão para uma ação concreta: é possível
elaborar um material didático interdisciplinar para o ensino de Matemática no Curso Técnico
em Agropecuária?
Como forma de identificar as relações entre a Matemática e a Agropecuária foi
realizado um estudo da matriz curricular do curso e dos documentos que o regem.
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Para a elaboração do material didático, primeiramente seria necessária a organização
dos conteúdos matemáticos e dos temas diretamente relacionados à vida social, política e
profissional do aluno do curso, tendo em vista a construção de um material contextualizado
e interdisciplinar.
Para esta organização foram executadas três entrevistas com sujeitos diretamente
relacionados com o curso Técnico em Agropecuária: a primeira com o coordenador, a
segunda com seis alunos e a terceira com um ex-aluno que atua como Técnico em
Agropecuária. As colocações do coordenador, dos alunos e do ex-aluno do curso foram
gravadas em áudio, sendo posteriormente transcritas e analisadas.
Também foi realizada a aplicação de um questionário aos professores da área técnica
na perspectiva de explanar saberes e conteúdos matemáticos importantes para a formação
profissional de um Técnico em Agropecuária e para sua atuação em qualquer região.
Após a realização das entrevistas e a aplicação do questionário, percebemos a
necessidade de analisarmos as gravações e o detalhamento das respostas obtidas. Para
facilitar a compreensão das respostas, mantivemos a colocação dos professores, do
coordenador de curso, e dos alunos e ex-alunos que atuam como técnicos em agropecuária.
A Matriz Curricular e a matemática existente neste currículo
Ao investigar a estrutura curricular do curso Técnico em Agropecuária do IF Sudeste
de Minas-Campus Rio Pomba encontramos uma matriz curricular condizente com o Catálogo
Nacional
dos
Cursos
Técnicos
(BRASIL,
2011)
e
a
LDB
9394/96
(BRASIL, 1996), tendo carga horária total de 4090 horas, referente à carga horária das
disciplinas da Base Nacional Comum (2603h e 20 min), disciplinas da Formação específica
(1246h e 40 min) e Estágio (240 h), divididos em três anos.
Segundo o Projeto Político Pedagógico do curso, o processo educativo é desenvolvido
sob orientação de coordenação pedagógica, professores e técnicos, por meio de atividades
teóricas e práticas. A área experimental de manejo de culturas e criações funciona como
uma grande área de pesquisa experimental, sendo a prática pedagógica complementada nos
demais laboratórios e espaços de convivência. Ademais, a participação do corpo discente em
congressos, seminários, workshops, visitas técnicas, atividades em equipe, defesa de estágio,
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dentre outros, contribui para a formação cidadã dos discentes. Como complementação do
curso, os alunos devem cumprir, 80 horas de atividades complementares e o estágio.
Foram procuradas nos documentos do Ministério da Educação (MEC) informações a
respeito do campo de atuação do Técnico em Agropecuária, a fim de estabelecer ligação
entre a matemática a ser ensinada e aprendida em sala de aula àquela vivenciada no
ambiente de trabalho dos estudantes.
Segundo o Catálogo Nacional de Cursos Técnicos (BRASIL, 2011),O curso Técnico em
Agropecuária planeja, executa, acompanha e fiscaliza todas as fases dos projetos
agropecuários; administra propriedades rurais, elabora, aplica e monitora programas
preventivos de sanitização na produção animal, vegetal e agroindustrial; fiscalizam produtos
de origem vegetal, animal e agroindustrial; realiza medição, demarcação e levantamentos
topográficos rurais; atua em programas de assistência técnica, extensão rural e pesquisa.
Após esta análise inicial, voltou-se para a análise da disciplina de Matemática
desenvolvida durante o curso. Com relação à matriz curricular, observa-se que a Matemática
é estudada em todos os semestres do curso e possui uma carga horária de 440 horas,
distribuídas igualmente pelos três anos (4 aulas semanais).
Visão do coordenador do Curso Técnico em Agropecuária
No primeiro momento da entrevista o coordenador do curso articulou sobre os níveis
de oferta e a reformulação da matriz curricular do curso Técnico em Agropecuária. Ele
afirmou que o aluno do técnico agropecuário está fazendo o curso técnico integrado ao
ensino médio, por sua vez, é oferecido a quem já tenha concluído o Ensino Fundamental. O
curso conta com uma matrícula única para o aluno que obterá, ao final do mesmo, a
habilitação profissional técnica de nível médio emitida pela instituição federal. A articulação
no formato concomitante é oferecida a quem já concluiu o Ensino Fundamental ou esteja
cursando o Ensino Médio, permitindo ao estudante ter duas matrículas distintas: uma no
Ensino Médio regular e outra no Ensino Técnico. Já o curso subsequente, destina-se apenas a
quem já tenha concluído o Ensino Médio, pois concede ao estudante a matrícula e a
certificação no curso técnico. Na instituição, a partir de do ano de 2008, o curso Técnico em
Agropecuária é ofertado apenas na modalidade integrada.
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Em um segundo momento o coordenador foi questionado sobre o perfil do aluno e a
presença da interdisciplinaridade no curso Técnico em Agropecuária.
O coordenador
destacou que o curso Técnico em Agropecuária está passando por um processo de
reformulação da matriz curricular, por que: “há uma diretriz, uma solicitação da reitoria do
campus para que haja uma padronização mínima de70% das matrizes de todos os cursos
técnicos entre os Campus do instituto, Muriaé, Juiz de Fora, São João Del Rei, Barbacena,
Santos Dumont e Rio Pomba, sendo o curso Técnico em Agropecuária ofertado apenas no
campus Rio Pomba e Barbacena.”
Foi inquirido ao coordenador sobre o perfil do aluno do curso Técnico em
Agropecuária. A esse respeito ele respondeu que o perfil socioeconômico é quase
homogêneo: “a maioria dos alunos do curso Técnico em Agropecuária vem do meio rural e
por consequência eles acabam não tendo acesso a escola de melhor desenvolvimento, acaba
estudando pelo meio rural e quando muito o ensino fundamental. Acabam tendo que ajudar
na lida em casa e vai somando uma série de motivos que faz com que ele não tenha aquele
fundamento de português, matemática que deveriam ter para a idade, e por isso quando
chegam ao ensino médio apresentam grande dificuldade. Por consequência da escolaridade
e a grande dificuldade que esses alunos chegam ao ensino médio o que irá acontecer é que
boa parte deles não vão querer ou de alguma forma não vão ter base suficiente para
ingressar no ensino superior”.
Inicialmente, ao analisar de forma isolada esta afirmação podemos pensar que as
expectativas do coordenador de curso não estão de acordo com os objetivos que direcionam
os Institutos Federais. De acordo com a Lei Nº 11.882, de 29 de dezembro de 2008 que cria
os Institutos Federais de Educação podemos observar no Artigo 7º que um dos principais
objetivos dos institutos Federais é: “Ministrar educação profissional técnica de nível médio,
prioritariamente na forma de cursos integrados, para os concluintes do ensino fundamental
e para o público da educação de jovens e adultos” (BRASIL, 2008, p.4).
Porém, em sua fala seguinte ele explicita sua real expectativa para os alunos do curso
Técnico em Agropecuária: “Então o que queremos que esses meninos façam?.... (silêncio)...
Que eles estudem, mas de acordo com o perfil socioeconômico o fato de ele fazer o curso
técnico integrado de agropecuária no caso abre uma possibilidade dele trabalhar, na
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iniciativa privada ou em fazer um concurso para a iniciativa pública como técnico, quantos
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concursos não tem por aí em prefeituras, EMATER, EPAMIG, EMBRAPA, IEF, etc. Quando falo
do perfil para o mercado de trabalho essa são as possibilidades que eu vejo: a iniciativa
privada, os concursos pra essas instituições públicas ou ele (o aluno) vai tentar avançar na
escolaridade.”
Posteriormente foi questionado ao coordenador sobre a interdisciplinaridade no
curso: “Hoje na prática o que está acontecendo nessa integração de ensino médio e técnico é
simplesmente um embaralhamento das disciplinas nos setores. Inclusive propositalmente
pela Coordenação Geral do Ensino Técnico (CGET) no sentido de que haja o envolvimento de
professores da área do ensino médio nos setores, então propositalmente marca-se as aulas
de algumas disciplinas do ensino médio no setor, então vem o professor de português ou
eventualmente um de geografia aqui e nós também do ensino técnico exatamente acabamos
por ir lá ao prédio central. O maior desafio hoje, se é que agente pensa em um ensino
integrado seria de alguma forma fazer que haja um envolvimento nosso (de nós docentes) e
por que não dos técnicos administrativos na questão da educação de forma integrada. A
interdisciplinaridade e a prática são fundamentais no curso técnico, quando você consegue
juntar a teoria com a prática é muito proveitoso para o aluno, por que ele sabe fazer e sabe o
porquê ele está fazendo, não faz só por fazer. Também só estudar teoria fica muito distante
da realidade que vai ser enfrentada pelo aluno. O ideal é que se distribuam os conteúdos
teóricos e práticos de forma bem equitativa pra que o aluno faça ação, reflexão e ação – ele
faz, discute e pensa o que ele está fazendo na teoria, volta a fazer – resultando na
solidificação do conhecimento”.
Analisando a fala acima podemos verificar um desconhecimento sobre a definição de
interdisciplinaridade, visto que ele remete interdisciplinaridade à teoria e a prática. Nesse
sentido, destacamos a necessidade de conhecimento voltado para a interdisciplinaridade:
“A interdisciplinaridade pode ser tomada numa concepção bem ampla, entendida
como qualquer forma de combinação entre duas ou mais disciplinas com vista à
compreensão de um objeto a partir da confluência de pontos de vista diferentes e
tendo como objetivo comum.” POMBO (1994, p.13) apud TOMAZ e DAVID (2008,
p.17).
Outro ponto a ser destacado é a preocupação do coordenador em relação à teoria e
a prática utilizando a metodologia investigativa: ação reflexão ação. Segundo Ponte (2003)
investigar pressupõe, sobretudo uma atitude, uma vontade de perceber, uma capacidade
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para interrogar, uma disponibilidade para ver as coisas de outro modo e para pôr em causa
aquilo que pareça certo. Investigar, envolve sobre tudo três atividades: estudar, conversar e
escrever. Nesse sentido e segundo o mesmo autor, cada situação a teoria e a prática, foram
uma condição fundamental para a compreensão dos problemas e um passo essencial para a
sua resolução. Isso se consegue muito melhor no plano coletivo do que no plano individual,
ressaltamos aqui a importância do trabalho e do planejamento coletivo no curso técnico em
agropecuária.
As falas do coordenador do curso e a análise desta entrevista apontaram para a
preocupação e o envolvimento na efetivação de um currículo integrado, porém
apresentando carências de material, de formação pedagógica e interdisciplinaridade.
Consequentemente essas percepções impulsionaram os objetivos desta pesquisa: elaborar
um caderno de atividades interdisciplinares com foco na formação matemática de um
técnico em agropecuária. Podendo assim selecionar tópicos mais próximos à formação e
articulá-los com os conteúdos de formação técnica, permitindo assim a interdisciplinaridade
e a formação integral do sujeito, bem como o oferecimento de um material paradidático
interdisciplinar para o professor.
A Matemática sob a visão dos alunos do Curso Técnico em Agropecuária
Nesta etapa da pesquisa, foi realizada uma entrevista com seis alunos do curso Técnico
em Agropecuária, sendo dois alunos de cada série do ensino médio integrado.
Como primeira pergunta, questionamos aos estudantes quais seriam os conteúdos
matemáticos mais importantes na formação de um Técnico em Agropecuária. Os alunos
responderam: razão e proporção, operações básicas, áreas e geometria espacial. A partir
desta resposta, foi solicitado que eles comentassem sobre os conteúdos citados, dando
exemplo dessa aplicação.
Aluno I: “Cálculo de ração, de área de instalações rurais, calculo na mecanização: a
gente calcula o tanto de semente que a gente vai utilizar por hectares e muita coisa que a
gente usa”.
Aluno II: “Principalmente quando se pega a área de trigonometria que geralmente a
gente trabalha com cálculo de área que a gente mais usa para determinar uma área de uma
propriedade, propriedades rurais no dia-a-dia”.
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Os alunos apontaram também que os conteúdos Matemática aparecem em várias
disciplinas da área técnica, como por exemplo: Instalações rurais, Irrigação, Agricultura e
Mecanização Rural. A partir desta resposta, surgiu a possibilidade de coletar dados com os
professores das disciplinas de formação técnica por meio da aplicação de um questionário, a
ser apresentada em outra seção deste artigo.
Ao serem abordados sobre as aulas de Matemática, eles afirmam que há professores
que utilizam alguns problemas que desenvolvem a matemática escolar em situações do
cotidiano dos alunos. Mas ao mesmo tempo há professores que não desenvolvem nenhum
tipo de atividade interdisciplinar ou contextualizada resultando em uma aula de matemática
focada na transmissão de conteúdos, como se pode verificar por meio da seguinte diálogo:
Pesquisadores: O que vocês acham das aulas de matemática? Os professores trazem
problemas relacionados ao cotidiano do técnico em agropecuária? Quando é ensinado um
conteúdo o professor dá exemplos voltados para sua área?
Aluno I: “Ano passado trazia mais, o professor dava muita coisa que a gente
comparava, a gente ia precisar lá com a matemática. Certo que o professor desse ano é bom
mais ele não compara, ele só passa a matemática do ensino médio”.
Aluno II: “Eu também acho que o professor traz bastante comparação com o que está
acontecendo dentro de sala de aula com o campo que envolve a aula”.
Aluno III: “Eu acho, tem algumas coisas que ele fala que talvez a gente está até
fazendo em outra matéria articulada”.
Aluno IV: “Eu não acho não, o professor é bem retórico, só traz os conteúdos do
ensino médio”.
As afirmações sobre a preocupação do professor com a matemática do ensino médio
pode estar diretamente ligada com a abordagem dos livros didáticos utilizados nas
instituições de educação profissional tecnológica. Então, uma possível solução para uma
abordagem interdisciplinar seria a utilização de um material didático que trabalhasse a
matemática e à área técnica e ao cotidiano dos alunos que estão cursando o Técnico em
Agropecuária, contendo uma orientação pedagógica para o professor, pois este não está
adaptado às diversas situações do cotidiano dos alunos, situações que estão diretamente
ligadas à matemática.
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A Matemática sob a visão do Técnico em Agropecuária
Nesta etapa da pesquisa, foi realizada uma entrevista com um técnico em
agropecuária, ex-aluno da instituição, que atua como técnico no CPT cursos presenciais que
faz parte do grupo CPT da cidade de Viçosa e também tem como sede a fazenda CPT em São
Geraldo em Minas Gerais.
A primeira pergunta se voltou para os conteúdos matemáticos mais importantes na
formação de um Técnico em Agropecuária. O Técnico respondeu: operações básicas, áreas,
razão e proporção e volume. A partir desta resposta ele comentou sua relação com a
Matemática nos dias atuais: “Hoje nós temos muita relação com a matemática
principalmente nos cálculos de 5volumosos, dieta para formulação de rações para os
animais. A gente trabalha o 6escore corporal do animal, a preparação do animal pra ele
entrar com um bom escore corporal no início das águas. Temos trabalhado muito com a
questão de volume, área, espaço geográfico, temos usado isso muito na instituição, tempo
também tem sido muito calculado para fazer o máximo em menor tempo. A irrigação é uma
das áreas que mais a gente tem trabalhado e que depende muito de cálculo. A gente tem
tido muitos profissionais que atuam nessa área, também na área de produção animal em
questão de produção de volumosos, produção de rações agente tem trabalhado muito com
essa área também”.
Como último questionamento, foi perguntado se o currículo integrado entre o ensino
médio e a matemática é importante na formação do técnico em agropecuária, ele afirmou
que: “Sim, totalmente eu acho isso porque tem muitos profissionais hoje tem baseado no
curso técnico isolado e o curso técnico não é separado, você depende muito do ensino médio,
nós temos hoje o maior problema de pessoas que saíram sem cursar corretamente o ensino
médio que hoje não são bons profissionais”.
A Matemática sob a visão dos docentes da área técnica
Nesta última etapa foi realizada a aplicação de questionário aos dez professores da
área técnica que atuam no curso, obtendo o retorno de seis professores questionários, na
5
Volumosos: Alimentação do rebanho em confinamento.
Escore corporal: é uma maneira de o produtor avaliar sua criação e definir se seus planos de
engorda/reprodução estão com seu resultado definitivo. (Fonte: www.infoescola.com/zootecnia)
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perspectiva de explanar saberes e conteúdos matemáticos importantes para a formação
profissional de um Técnico em Agropecuária.
Ao serem questionados se para o desenvolvimento satisfatório da sua disciplina é
importante que o estudante desenvolva competências e habilidades matemáticas, os
professores afirmaram que sim, e podemos observar pelas seguintes respostas:
Professor I: “Sim, pois é necessário para o desenvolvimento das habilidades e competências
da disciplina, a utilização de cálculos e raciocínios matemático.
Professor II: “Sim, pois o mesmo necessita desenvolver vários cálculos e relações
matemáticas”.
Professor III: “Sim, pois no desenvolvimento dos conteúdos exige operações matemáticas
básicas para que ele possa desenvolver e construir o conhecimento na disciplina”.
A pergunta seguinte se voltou para as principais competências e habilidades
matemáticas fundamentais à formação deste profissional. As respostas dos professores, dos
alunos e do técnico em agropecuária foram semelhantes e, portanto, a partir dessas
respostas, foi possível a organização de uma listagem de conteúdos matemáticos
fundamentais ao trabalho do Técnico em Agropecuária, como pode ser visualizado na tabela
a seguir:
Conteúdos matemáticos essenciais à formação do técnico em agropecuária segundo os
professores, alunos e ex-alunos inseridos no mercado de trabalho.
Professores de área técnica
Operações básicas
Áreas
Razão e Proporção
Volume
Porcentagem
Potenciação
Leitura e interpretação de gráficos
Regra de três
Função
Alunos
Operações Básicas
Áreas
Razão e Proporção
Geometria espacial
Técnico em Agropecuária
Operações básicas
Áreas
Razão e Proporção
Volume
Fonte: Acervo dos pesquisadores
Analisando a tabela, podemos perceber que os dois, dos três grupos destacaram a
essencialidade dos conteúdos de: operações básicas, cálculo de áreas e volume e razão e
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proporção. No entanto, os professores destacaram a necessidade de outros conhecimentos:
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de porcentagem, potenciação, leitura e interpretação de gráficos, regra de três e função. Os
professores relataram que os conteúdos citados estão diretamente relacionados ao
dimensionamento e manejo na irrigação, nos cálculos de adubação de culturas, de calagem
em solos, estimativas de custos de produção agrícolas, espaçamento entre plantas, do
volume de substrato a ser utilizado na produção de mudas e cálculo de calibragem de
pulverizador agrícola.
Também questionamos se os alunos possuem dificuldades quando relaciona a Matemática
com a disciplina, os professores contestaram que sim e podemos observar pelas seguintes
respostas:
Professor I: “Sim, muitos têm dificuldades com as operações básicas e não sabem montar
uma regra de três”.
Professor II: “Sim, boa parte apresenta dificuldade em diferentes graus, com relação ao uso
da matemática aplicada, simplesmente não conseguem responder exercícios ou questões de
prova por não saberem utilizar estas operações”.
Professor III: “Sim, observa-se em alguns casos a falta de fundamentos matemáticos”.
Professor IV: “Sim, como por exemplo, dificuldades de raciocinar quando ocorre modificação
no enunciado das questões”.
A partir dessas análises pretende-se elaborar atividades de caráter interdisciplinar
que possam contribuir para a formação integral do técnico em agropecuária.
Resultados parciais
Os dados coletados confirmam as possibilidades de integração entre a Matemática e
as disciplinas da área de formação técnica do profissional da agropecuária. Pela análise da
entrevista com o coordenador e dos questionários aos professores, vê-se a necessidade de
uma formação pedagógica com os professores dos cursos integrados sobre os conceitos e
possibilidades da interdisciplinaridade e do currículo integrado para a consolidação deste
modelo de ensino.
É evidenciada, na fala dos alunos, a importância dada à disciplina de Matemática,
valorizando, mais uma vez, a formação do profissional e, acima de tudo, do cidadão em
formação pelo curso técnico integrado. Consequentemente, essa valorização continua após
a certificação, pois na atuação do técnico em agropecuária foi ressaltada pelo ex-aluno a
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relevância dos conteúdos, habilidades e competências matemáticas. Sendo assim as
entrevistas com o coordenador do curso, os alunos, ex-aluno que atua como técnico em
agropecuária e o questionário com os professores, diante do divulgado, indicaram
possibilidades e perspectivas para a construção de um material contextualizado para o curso
Técnico em Agropecuária.
Portanto, a partir destas análises, pensamos em material didático com formato
interdisciplinar para o curso, pois, como indicam Tomaz e David (2008), Essa abordagem
ajudaria a construir novos instrumentos cognitivos e novos significados, constituindo novos
saberes escolares pela interação das disciplinas.
Referências
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comentários e reflexões. Natal: IFRN, 2009a.
BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. LDB. Lei 9394/96 – Lei de Diretrizes e Bases
da Educação Nacional. Brasília: 20 de dezembro de 1996.
BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Média e Tecnológica.
Decreto nº 5.154, de 23 de julho de 2004. Regulamente o§ 2º do Art. 36 e os arts. 39 a 41 da
Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1196, que estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional. Brasília, DF: 23 de julho de 2004b.
BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Média e Tecnológica.
Catálogo Nacional de Cursos Técnicos. Brasília: MEC/SETEC, julho de 2008a. Disponível em:
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Tecnológica. - Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Profissional
Tecnológica. 2007. 380p.: il.
FRIGOTTO, G; CIAVATTA, M; Marise, N. (Org). Ensino Médio Integrado: concepções e
contradições. São Paulo: Cortez, 2005.
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Futuro/Boletim 16. TV Escola, 2006.
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TOMAZ, V. e DAVID, M. Interdisciplinaridade e aprendizagem matemática em sala de aula.
Belo Horizonte: Autêntica, 2008.
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Práticas escolares no ensino de Língua materna: um olhar sobre a metodologia do
professor
André Fernandes Maia de Medeiros
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Resumo O trabalho que ora apresentamos tem como objetivo propor uma reflexão acerca
das práticas escolares do ensino de língua materna. Para tanto, observamos algumas aulas
de língua portuguesa, realizadas em uma escola particular no município de Caraúbas, para
identificarmos, entre outras questões, que concepção de linguagem pode ser identificada
nesse processo de ensino/aprendizagem da língua materna. Com isso, buscamos
compreender de que maneira o professor, na condição de indivíduo detentor de suas ações
e como parte fundamental do fazer ensinar/aprender, posiciona-se diante do processo de
ensino/aprendizagem de Língua Portuguesa em sala de aula. À luz dos estudos de alguns
autores, como Possenti (2002), Gomes (2009), Marcuschi (2010) e outros que versaram
sobre o ensino de língua materna, procuramos produzir uma discussão que contextualize
aspectos do cenário que situa este tema na atualidade. Neste sentido, entendemos que se
trata de um tema complexo, pois todo e qualquer ensino de língua ultrapassa os limites da
sala de aula e dialoga com a diversidade social que envolve alunos e professores.
Palavras-chave: Ensino. Língua Materna. Práticas Escolares.
Introdução
O estudo e o acompanhamento da evolução do ensino de língua materna têm se
mostrado em constante processo de transformação no meio social. Desse modo, a escola,
como um espaço de transformação das mudanças ocasionadas pela sociedade, aparece
nesse cenário com a proposta de revisar certas realidades linguísticas interligadas ao
contexto do ensino e da aprendizagem em sala de aula. Nesse sentido, para refletir sobre
que concepções de linguagem são trabalhadas em sala de aula, observamos cinco aulas de
língua portuguesa, ministradas no 7° Ano do Ensino Fundamental de uma escola particular,
no município de Caraúbas – RN.
Sabemos que existe um conjunto de fatores que ainda precisam se concatenar e
servir de auxílio para o alcance de alguns dos objetivos traçados pela escola quanto ao
ensino de língua materna. Há uma realidade que se apresenta ainda resistente a alguns
métodos trabalhados. Possenti (2002, p. 16) exemplifica essa realidade dizendo que
[...] frequentemente, pesquisadores são chamados para falar a professores, na
esperança de que aqueles apresentem a estes um programa de ensino que
funcione. Em certas circunstâncias, espera-se que tal programa funcione sem
qualquer outra mudança na escola e nos professores. Espera-se que os
especialistas tragam propostas “práticas”. Em geral, um pesquisador não fornece
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Graduando do 3° ano do curso de Letras da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN).
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tais programas. Nem adiantaria fazê-lo. É que, para que o ensino mude, não basta
remendar alguns aspectos. É necessária uma revolução. No caso específico do
ensino de português, nada será resolvido se não mudar a concepção de língua na
escola (o que já acontece em muitos lugares, embora ás vezes haja discursos novos
e uma prática antiga).
Quando nos vemos diante do dever de ensinar aquilo que julgamos ser importante
para os nossos alunos, diversas dúvidas relacionadas à prática de sala de aula vêm colocar
em pauta a postura do professor perante a disciplina que ele leciona. Uma dessas dúvidas,
talvez a principal de todas elas, seria, por exemplo, se os quesitos que correspondem à
escrita, oralidade e leitura de textos estão sendo contemplados igualmente nas aulas de
Língua Portuguesa. E, se sim, de que maneira, pois uma vez vendo o professor de Língua
Portuguesa como agente das ações que acompanham as transformações sociais da língua, é
justo e necessário saber se o conhecimento da disciplina está sendo construído de forma
satisfatória e plena.
Assim, conforme dissemos inicialmente, realizarmos esse estudo, optando por
observar cinco aulas de Língua Portuguesa de um professor formado em Letras, com
habilitação em Língua Espanhola e em Língua Portuguesa, de uma escola de ensino
fundamental da rede privada, na perspectiva de observarmos algumas considerações
teóricas que estão na base dessa discussão, principalmente no que concerne à concepção de
linguagem trabalhada pelo professor em sala de aula.
Os bancos escolares e o ensino de língua materna: teorização das práticas escolares
quanto ao ensino de língua materna e de língua padrão
Alguns dos direcionamentos atribuídos ao ensino de língua materna advêm de alguns
dos objetivos contemplados pelos PCN (Parâmetros Curriculares Nacional). Desse modo, no
que diz respeito às aulas de Língua Portuguesa, o ensino fundamental é visto como um dos
espaços propícios para o desenvolvimento educacional e linguístico do aluno. É nesse
espaço, onde ele manterá contato com os gêneros textuais e conseguirá desenvolver melhor
suas habilidades comunicativas, sejam elas no âmbito da escrita, da leitura, da interpretação
de textos, da oralidade ou do censo crítico. Gomes (2009, p. 95), citando os PCN, considera
que
[...] no processo de ensino-aprendizagem dos diferentes ciclos do ensino
fundamental, espera-se que o aluno amplie o domínio ativo do discurso nas
diversas situações comunicativas, sobretudo nas instâncias públicas de uso da
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linguagem, de modo a possibilitar sua interação efetiva no mundo da escrita,
ampliando suas possibilidades de participação social no exercício da cidadania.
A partir dessa preocupação de como formar bons interlocutores no meio social, Silva
e Martins (2010, p. 28) apresentam algumas concepções de ensino e de linguagem dizendo
que o texto é a porta de entrada para muitas das vertentes que englobam a leitura e a
estruturação da língua. Segundo os autores,
[...] é preciso garantir um tipo de trabalho que requer grande esforço: o exercício
do silêncio (uma primeira leitura para nos aproximarmos dos núcleos conceituais
presentes no texto), o convite à curiosidade (as perguntas iniciais que fazemos ao
texto desconhecido), a possibilidade de levantar hipóteses (as noções primeiras
para as quais o texto nos move), a prática da reflexão (a tentativa de recuperarmos
as marcas, as âncoras que estão impressas no texto e que não nos permitem
devaneios absolutos), o exercício de transformação (a necessidade de
submetermos as ideias do texto à instância da experiência, dos acervos criados
pelos sujeitos leitores). (SILVA e MARTINS, 2010, p. 28).
Tais métodos de trabalho e de constituição da linguagem têm por base a aquisição da
norma padrão. Nesse sentido, não caberia compreender a língua como um conjunto de
signos linguísticos estanques e de caráter descritivo, pois o mesmo se permanece em
constante processo de transformação. Desse modo, no que tange as considerações do
ensino de língua materna em relação ao ensino de gramática, não seria pertinente
compreender o estudo da língua como sendo descritivo e tampouco funcional do ambiente
social pelo qual o aluno faz parte.
Ao propor uma discussão sobre essa temática, Geraldi (2010, p. 183) assinala que
[...] apesar desta crença ser tão difundida entre nós, sabemos que a proficiência em
língua resulta muito mais do convívio com o padrão – na leitura, na escuta, na
produção – do que do conhecimento de normas. E entenda-se: o padrão é mutável
e nem sempre é desejável, e por isso quando se fala no ensino da língua padrão,
não se está definindo um padrão específico, fixo, estabilizado. Ao contrário, pensar
o padrão de uma língua é pensar sua vitalidade e movimento. Para muitos, o
padrão pode ser precisamente aquele que os guardiões da língua destacam.
Neste embate, pelo qual a língua tem passado, constantes transformações em volta
dessa temática, como o ressurgimento e a revisão de alguns dos parâmetros sobre o ensino
de língua, reforçam um redirecionamento sobre o comportamento linguístico social dos seus
usuários. O esclarecimento e a reformulação, por parte de alguns estudiosos, sobre o ensino
de língua materna e os conhecimentos pertinentes à construção da disciplina de língua
portuguesa pautaram três concepções de linguagem, que são: a linguagem é a expressão do
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pensamento, a linguagem é um instrumento de comunicação e a linguagem é um processo
de interação.
No caso, não optamos por valorizar uma concepção de linguagem do que a outra,
mas sim de esclarecer que os estudos de uma servem de complemento para os estudos da
outra. Da mesma forma, Geraldi (2000, p. 46) afirma que
para o ensino de primeiro grau, as atividades devem girar em torno do ensino da
língua e apenas subsidiariamente se deverá apelar para a metalinguagem, quando
a descrição da língua se impõe como meio para alcançar o objetivo final de domínio
da língua, em sua variedade padrão.
Nesse sentido, é preciso contemplar o estudo da linguagem enquanto processo de
interação entre os sujeitos. É, a partir dessa concepção, que podemos compreender que
ensinar a língua, pura e simplesmente, com uma explanação metalinguística, ou seja, a
língua pela língua, o código pelo código, as regras pelas regras, limitaria, de alguma forma, a
aprendizagem da língua materna como um processo de interação entre os sujeitos e o seu
mundo, entre os sujeitos e o cotidiano diversificado da sociedade como um todo. É pela
inovação que essa concepção sugere que buscamos entender as práticas de sala de aula
observadas neste estudo.
Observação das aulas: uma análise de dados
Para levantarmos os dados a serem analisados neste trabalho, observamos cinco
aulas de português, ministradas por uma professora de Língua Portuguesa, que
denominaremos aqui de Professora “A”, no 7° ano do Ensino Fundamental de uma escola
particular do município de Caraúbas. As observações das aulas da professora “A” e das
atividades desenvolvidas por ela tiveram início no dia 16 de fevereiro até o dia 23 do
referido mês.
No primeiro dia de observação, algumas das atividades que foram trabalhadas na
semana anterior, pela professora, foram retomadas na aula. No caso, a professora “A” tinha
selecionado dez contos para dez duplas da sala e pediu aos alunos que montassem uma
pequena peça teatral baseada no conto que ela própria tinha repassado. Já no momento da
apresentação, uma semana depois, alguns alunos, talvez, por se sentirem “inibidos” ou
“nervosos” na hora de falar, apresentaram dificuldades de se expressar ou de explicar o
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contexto da trama que envolvia suas histórias, pois a apresentação, o conteúdo e as
características da narrativa não fluíram, nem ficaram claros.
No total, apenas três grupos, na visão da professora, não obtiveram êxito em suas
apresentações. Isso, talvez, se deva ao fato de alguns alunos não terem se preparado ou
estudado o suficiente para a realização deste exercício. Em seguida, a aula continuou com a
correção de algumas questões de interpretação de texto do livro didático de Língua
Portuguesa. Essas questões tinham sido repassadas também como “dever de casa”, sendo
que, as explicações destas foram feitas com a utilização de Data Show, pois a professora quis
mostrar, além do livro didático, os conceitos pertinentes aos gêneros textuais e ressaltar a
funcionalidade desses contos populares para cultura local dos alunos. Como resposta, todos
os alunos, na visão da professora “A” conseguiram atingir um percentual de satisfação nas
apresentações dos contos e das respostas escritas nas questões do livro de língua
portuguesa.
Encerrado esse primeiro momento, a professora “A”, ainda passou como dever para
casa uma atividade que consistia na pesquisa de três a quatro dizeres populares. Os alunos
tinham que transformar estes em dizeres padronizados pela norma culta da Língua
Portuguesa. Para tal atividade, ela advertiu que seria necessária a utilização do dicionário
para fazer as substituições das palavras comumente utilizadas no sentido popular para o
sentido literal.
Encerrada a aula, os alunos tiveram vários dias para responder essa atividade, pois o
período que interligava a resolução desta para sua entrega correspondeu justamente ao
recesso do carnaval. Desse modo, acreditou-se que todos responderiam a essa questão para
a aula seguinte. Entretanto, quando chegado o dia, o que se percebeu no resultado das
respostas dos alunos foi justamente a falta de compreensão “total” da proposta dessa
atividade. Enquanto muitos só tinham feito a pesquisa, outros nem se ocuparam em fazê-la.
A principal reclamação que surgiu no momento da aula foi que não souberam
transformar ou construir um novo dizer para os ditados populares. Assim, a professora “A”
sugeriu que todos acompanhassem novamente a explicação, sendo que, no momento dessa
explicação, ela oportunizou a classificação morfológica das palavras que compuseram um
ditado colocado no quadro. Assim, ela sorteou entre os alunos as significações dessas
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palavras no dicionário, foi quando, numa espécie de “jogo de perguntas e respostas”, que
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“A”, ao construir um novo dizer, com outras palavras mais adequadas à norma padrão da
língua, conseguiu com que os alunos entendessem a proposta da atividade.
Após todos terem entendido o modo de fazer o exercício, a professora disse que
tentassem novamente fazê-la em casa. Depois, em uma pequena pausa feita por “A”, uma
dinâmica foi realizada em sala de aula com os alunos. A brincadeira constituía em dar
respostas “criativas” a perguntas intrigantes de um questionário. Dependendo da
criatividade da resposta dos alunos, é que eles poderiam ir acertando ou errando as
perguntas. Infelizmente, devido à complexidade das questões, quase todos não souberam
responder, porém, todos se divertiram e conseguiram aprender mais uma brincadeira a ser
aplicada em momentos de descontração.
Após esse momento de recreação, um retroprojetor foi montado na sala de aula para
dar continuidade aos assuntos que estavam sendo ministrados. O nome do assunto era
“linguagem falada e escrita”, e este, por sua vez, deu continuação às explicações dos temas e
atividades trabalhados até aqui. O material confeccionado pela professora disponibilizava
uma variedade de fatores que exemplificavam as influências e as transformações da
linguagem no campo do discurso e das interações humanas. Com isso, ela pode oportunizar,
no momento de sua aula, a participação dos alunos quanto ao compartilhamento de
exemplos.
Desse modo, quando chegada a conclusão da aula e das observações, ela, a
professora “A”, passou como atividade para casa, além da outra repassada antes do
carnaval, um exercício sobre linguagem falada e escrita. As questões chamavam a atenção
para a interpretação de alguns dos textos colocados em aula ou para a reformulação de
algumas sentenças, do linguajar coloquial para a norma culta. Infelizmente, por questões de
tempo e oportunidade não podemos obter os resultados dessa atividade. Porém,
acreditamos que seus resultados devem ter se firmado positivamente nas expectativas
montadas pela professora “A”.
Diante de todo o contexto de aula observado, dos métodos trabalhados pela
professora “A”, das atividades realizadas, entre problemas quanto à compreensão dessas
atividades ou soluções quanto ao seu entendimento, precisamos considerar o dinamismo
com que a professora trabalhou com o estudo da linguagem em sala de aula. O trabalho em
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dupla, as representações dos contos na forma de peça teatral, o envolvimento dos alunos
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com os conteúdos ministrados traduziram, de certo modo, uma concepção interacionista no
trabalho com o ensino de língua materna. Todas as atividades observadas envolveram,
predominantemente, muitos aspectos da concepção de linguagem enquanto processo de
interação. Interação que se realizou entre os alunos e a professora, entre eles e o conteúdo
e, principalmente, entre os alunos e o seu conhecimento de mundo.
Considerações finais
Sabemos que a formação do professor vai além da aprendizagem durante o período
de tempo do curso de licenciatura, uma vez que não podemos pensar que o aluno está
pronto, pois soube o que deveria saber para desempenhar a profissão de ser professor. Na
verdade, neste tempo, muitos estão legalmente e institucionalmente habilitados para
lecionar. Porém, nem sempre essa questão se faz eminente no atual contexto escolar, pois
distanciam ou deslocamentos necessários para formação contínua e crítica do professor.
No que corresponde à introdução deste trabalho, ao respaldo teórico e à análise das
aulas, optamos por desenvolver uma discussão sobre a temática das práticas escolares do
ensino de língua materna e das questões de ensino-aprendizagem dos alunos. Isso, em
termos práticos, significa dizer que teríamos uma materialidade a ser analisada, um exemplo
a ser observado e interpretado no universo do ensino de língua materna em sala de aula.
Assim, compreendemos, ao final de nossas considerações, que a professora “A” se
manteve flexível na proposta e na resolução das atividades em sala de aula, pois conseguiu
contextualizar o ensino de gêneros textuais com o estudo de gramática, e este, por sua vez,
foi trabalhado a partir de exemplos extraídos de textos e de recapitulações de outros
assuntos estudados pelos alunos, como, por exemplo: substantivo, verbo, adjetivo, estrutura
de alguns gêneros textuais, figuras de linguagem etc.
No que diz respeito ao referencial teórico, vários autores, com visões que se
complementam, foram basilares a nossa discussão e na comprobação dos dados analisados.
Silva e Martins (2010) observam que é preciso considerar os movimentos da língua, tendo
como base a maneira de se interagir com o meio social, o que traz a lume a essência do que
se deve trabalhar e enaltecer na disciplina de Língua Portuguesa.
[...] O que e por que razão deveríamos ler na escola? Leríamos na escola, espaço de
produção cultural, para ocuparmos o lugar de sujeitos, para questionarmos os
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sentidos colhidos nas configurações textuais e propor-lhes outros sentidos. Nunca
para nos acharmos diante dos textos partidos, às previsíveis respostas. Como,
então, deveríamos ler na escola? Leríamos estabelecendo relações com as
experiências herdadas da vida em sociedade, arriscando alcançar além do nosso
conhecimento de mundo. E, por ultimo, para quem deveríamos ler senão para
interlocutores atentos, curiosos, capazes de contrapor suas ideias àquelas
sugeridas pelo tecido de palavras, pelo trabalho prévio exercido por um
determinado autor? (SILVA e MARTINS, 2010, p. 29).
Tais questões nos possibilitam refletir sobre o que envolve todo o processo de
ensino-aprendizagem de língua materna. É preciso considerar o aluno enquanto sujeito
socialmente situado em um contexto que, antes de qualquer conteúdo, antes de qualquer
método aplicado, o tem como cidadão que interage com uma realidade que antecede a
escola. Essa reflexão sobre o ensino de língua materna provoca-nos a valorizar o trabalho
com a linguagem de modo a considerar o lado social e funcional da língua, pois, com ele,
além de se respeitar as possíveis diferenças entre usuários de um mesmo sistema linguístico,
conseguiríamos aprimorar nosso conhecimento de mundo em relação ao outro.
Referências
GERALDI, W. A aula como acontecimento. São Carlos, SP: Pedro e João Editores, 2010.
GOMES, M. Metodologia do ensino de língua portuguesa. São Paulo: Saraiva, 2009.
MARCUSCHI, B. Escrevendo na escola para a vida. In: RANGEL, E; ROJO, R. (Orgs.). Língua
Portuguesa: ensino fundamental. V. 19. Coleção Explorando o Ensino. Brasília, DF: Ministério
da Educação, 2010. p. 65-84.
POSSENTI, S. Por que (não) ensinar gramática na escola. 8. ed. Campinas, SP: Mercado de
Letras, 2002.
SILVA, M; MARTINS, M. Experiências de leitura no contexto escolar. In: PAIVA, A; MACIEL, F;
COSSON, R. (Orgs.). Literatura: ensino fundamental. V. 20. Coleção Explorando o Ensino.
Brasília, DF: Ministério da Educação, 2010. p. 23-40.
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Incluso pela Lei: analisando as políticas públicas Na/Para/Sobre a educação inclusiva
Addan Tritty Rezende de Souza
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Ao falarmos de política educacional referimo-nos prioritariamente ao conjunto de
medidas afetas à área da educação [...] queremos significar não só as relações da
escola com o Estado – mantenedor, mas a existência e às evidências de uma
política que se expressa em relação a determinadas relações educacionais.
(MACHADO E LABEGALINI, 2007, p.10)
Resumo Este trabalho faz parte de uma Trilogia de artigos a ser publicada na Revista Visão
Acadêmica. Nessa segunda parte dessa trilogia se fará um apanhado das legislações que se
voltam para a educação inclusiva. Legislações que em teoria procuram atender a maioria das
questões relacionadas ao tema. Porém, apesar desse intento, conclui-se que há excessivo
distanciamento entre legislação e práticas da educação inclusiva. Sendo que na próxima
edição da Revista, no terceiro e último artigo dessa série de publicações, além do
fechamento de questões ligadas aos três artigos e não passíveis de fechamento antes do
término do trabalho, também será apresentado um método alternativo de ensino voltado
para a chamada educação inclusiva.
Palavras-chave: Educação Inclusiva. Políticas públicas. Inclusão. Ensino. Escola.
Introdução
Sendo enquanto agente transformador de sua realidade o homem conforme o
primeiro artigo alterou a sociedade de cada época em que viveu, reivindicando não somente
respeito, mas visando garantir direitos plenos e legais através de planos e ações tomados ao
longo do tempo, objetivando a transformação da ideologia social sobre a inclusão.
A análise acerca da esfera legal da educação aqui desenrolada tem ligação com as
observações de Lima (2006), Machado e Labegalini (2007), além de um rol de decretos, leis,
e emendas constitucionais, além de vultosas declarações de âmbito nacional e internacional,
desenvolvendo em seus conteúdos os misteres da educação inclusiva desde o início do
século XX até os dias correntes do XXI. Iniciamos a análise em uma escala hierárquica desde
a Carta Magna às leis complementares, conforme preconizam Machado e Labegalini (2007).
A inclusão e o direito, prevendo a equidade entre os cidadãos, advieram de três
séculos atrás com a Revolução na França, em 1789. A Declaração dos Direitos Humanos
(FRANÇA, 1789) admite em seu artigo III que Todos os homens são iguais por natureza e
diante da lei. Visto que doravante a esta data a sociedade transmutou-se às luzes da Inclusão
8
À época do envio do artigo, Addan Tritty era aluno do quarto ano do curso de Matemática da UEG na Unidade
da cidade de Goiás. Sendo este artigo o segundo de uma série de três artigos que serão publicados pela revista,
com o intento de demonstrar uma “nova possibilidade” de se pensar o ensino para portadores de necessidades
especiais.
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Social, surgiram diversas leis preconizando os direitos e deveres desta temática até mesmo
garantir o crescimento das escolas especiais e das políticas públicas de educação nacional,
voltadas para as pessoas cegas. Passados os séculos do Iluminismo, a Constituição Federal
Brasileira de 1934 (BRASIL, 1934) sutilmente em seu texto, delimitava o registro acerca da
educação para todos. Afirmava a Carta Magna da terceira década do XX que
... a educação é direito de todos e deve ser ministrada, pela família e pelos Poderes
Públicos, cumprindo a estes proporcioná-la a brasileiros e a estrangeiros
domiciliados no País, de modo que possibilite eficientes fatores da vida moral e
econômica da Nação, e desenvolva num espírito brasileiro a consciência da
solidariedade humana
(BRASIL – C.F., art. 149. 1934)
Essa forma de pensar é presente até a promulgação da Constituição de 1988.
Analisando agora as ações mais significativas, remontemos ao Brasil dos anos 50,
precisamente em 1958, onde encabeçada pelo Instituto Benjamin Constant é enviada ao
governo federal a proposta de uma Campanha Nacional de Educação e Reabilitação dos
Deficientes Visuais, sendo aprovada mediante o Decreto nº 44.236 (BRASIL, 1958).
Campanha cujo objetivo era permitir a melhor integração dos deficientes visuais de ambos
os sexos, em idade pré-escolar, infantil e adulta, de modo a lhes assegurar condições físicas,
psicológicas, morais e éticas para a integração sócio-educativa e o pleno desempenho das
atividades educativas cabíveis para a cegueira e para os portadores de baixa-visão. Além
disso, essa campanha pública nacional propunha legalmente a realização de outras medidas
importantes, tais como
O cadastro individual dos cegos e amblíopes necessitados de assistência e
tratamentos;
A alfabetização geral dos cegos e amblíopes em estabelecimentos escolares. Nos
domicílios e por correspondência;
A integração de Cegos e amblíopes em atividades comerciais, industriais,
científicas, artísticas e educativas tanto em entidades oficiais como em firmas,
organizações, empresas ou entidades privadas
(BRASIL- 1958, p. 33)
Em 1959, aos 20 dias de novembro, a ONU assina a Declaração Universal dos Direitos
da Criança (ONU, 1959), que conta com apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância
(UNICEF); toda essa política com atenção voltada à infância conta com pleno apoio social e
faz com que no ano de 1960 haja no Brasil uma Segunda Campanha Nacional de Educação e
Reabilitação dos Deficientes Visuais, similar à primeira, todavia com mais exigências e maior
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divulgação pela mídia. Um fato deve ser levado: a evolução do sistema legal no Brasil se deu
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a passos lentos, tal como o interesse público pelo avanço de uma educação gratuita de
qualidade. Diversas foram as propostas levantadas e discutidas por décadas a fio, desde o
Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, bandeira erguida na década de 30 para defender
os interesses públicos educacionais e criar uma lei que garanta que a educação pública
nacional ocorra de maneira segura, gratuita, até a década de 80. Xavier apud Filho (2006)
complementa esta perspectiva ao afirmar que os assinantes do manifesto defendiam a ideia
de que para o Brasil alçar os níveis esperados de progresso já alcançados pela Europa e EUA
deveria solidificar seu sistema educacional, além de reformar as estruturas educacionais
brasileiras. Entendiam eles que a educação era uma ferramenta para a melhor estruturação
da sociedade, quebrando assim seu atraso econômico, político e social. Era mister a
concepção coletiva acerca construção de um novo sistema de educação nacional.
Naquela época, diversas foram as iniciativas das instituições públicas para que a
educação especial viesse à tona e mesmo estando em sintonia com a garantia “geral” de
direitos na educação havia a necessidade de expressar em texto uma lei que “focasse” os
deficientes. Não poderia se afirmar que uma mesma lei “para todos” abrangeria condições
como atendimento educacional especializado a alunos deficientes, regulamentação e
fiscalização de materiais didáticos (no caso dos cegos o método Braille para escrita e leitura)
tal como a fomentação a produção dos mesmos, apoio pedagógico e psicológico, etc.
Afirmam Silva, Burnier e Ferreira (2001) que havia uma necessidade de a escola rever o seu
papel frente aos novos desafios da educação para alunos deficientes, pois ela não poderia
mais se restringir às tentativas de consolidar uma educação para cegos que não fosse
resguardada legal e psicopedagogicamente. É nesse contexto que surge formalmente a
expressão “educação especial”, pois como foi reiterado, haveria a necessidade de uma
educação especial para deficientes.
O Brasil em 60, não tinha condições para dar continuidade às expectativas geradas
pelas campanhas dos anos derradeiros da década de 50 e a educação se mostrava com uma
defasagem imensa em relação ao contexto inclusivo. Com o golpe militar deflagrado em
1964, havia urgência nas modificações fundamentais do sistema educacional de modo geral.
Era necessário realizar uma substituição dos aspectos políticos educacionais em vigor até
então. Além de modificar a educação a partir das propostas educacionais enviadas ao
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governo, desde a formação de profissionais à alfabetização. Ocorriam intensas discussões
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entre a parcela da população interessada nas mudanças e os blocos políticos antagônicos a
ela. Essa movimentação propiciou a formação de uma consciência nacional sobre a
educação, que em suma era a de garantir não só uma escolarização regular de qualidade,
mas uma modernização e uma adequação de profissionais e unidades escolares para
atender as exigências sociais cada vez mais crescentes.
Em 20 de dezembro de 1961 é promulgada a Lei nº. 4.024 (BRASIL, 1961) que
preconiza as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN/61), cujas propostas não são
nem um pouco parecidas com o documento original entregue ao governo e elaborado por
professores e afins desde o Manifesto de 1932. Aos 30 de novembro de 1965, uma
assembleia internacional preocupada com a grande pobreza e com a situação educacional
na Ásia cria a Southeast Asian Ministers of Education Organization – SEAMEO (Organização
das Secretarias de Educação do Sudeste Asiático), visando discutir medidas de inclusão para
aqueles países; 1967 se inicia, e neste ano no Brasil é votada, aprovada e promulgada uma
nova Constituição Federal (BRASIL, 1967). Nessa edição, segundo afirmam Silva, Burnier e
Ferreira (2001, p. 12), fica clara a ideia da educação inclusiva, uma vez que a nova
constituição “contempla a educação das crianças e adolescentes com necessidades
especiais, no artigo 168, quando diz que a educação ‘é um direito de todos, assegurando-se
a igualdade de oportunidades’”. Os autores continuam:
A Emenda Constitucional de 1969, que foi considerada um ‘enorme remendo’ na
Constituição, retira a igualdade de oportunidades, conforme se vê no Art. 176 ‘A
educação, inspirada no princípio de unidade nacional e nos ideais de liberdade e
solidariedade humana, é direito de todos e dever do Estado e será dada no lar e na
escola”, mas evidencia a responsabilidade com a Educação Especial determinando
que lei específica definiria, entre outros aspectos, a assistência educacional dos
‘excepcionais’’. *...+ No entanto foi a primeira vez que se viu o registro da Educação
Especial numa Constituição Brasileira. (SILVA, BURNIER E FERREIRA 2001, p. 12)
Apesar das leis e decretos, o que está previsto na lei e o que se vê na prática implica
em diferenças estruturais consideráveis. Com o início dos anos 70, começa uma série de
medidas em escala global pertinentes a discutir a inclusão. Mendes (2006) apresenta
algumas, como, por exemplo, as medidas políticas nos Estados Unidos em 1977, devido a
aprovação de leis que asseguram uma educação pública apropriada para todas as crianças
com deficiências, instituindo oficialmente, em âmbito nacional, o processo de
mainstreaming, que no Brasil entende-se como integração. Com similar posicionamento, a
Europa também inicia seu processo de integração mediante aos deficientes, no Reino Unido.
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Alí, é encaminhado ao parlamento o Relatório Warnock documento elaborado por um
comitê presidido por Mary Warnock, filósofa, educadora e escritora britânica, que propunha
uma série de revisões acerca do atendimento aos indivíduos deficientes na Inglaterra, País
de Gales e Escócia; tal relatório foi um documento clássico na área da inclusão, afirma
Mendes (2006, p. 390), destacando dentre outras questões, por ter introduzido o conceito
de “necessidades educacionais especiais”, que seria verdadeiramente compreendido por
poucos e utilizado por muitos para promoção política.
Enquanto isso, no início dos anos 70, o Brasil aprova outra LDBEN em 1971 (BRASIL,
1971), que inclui os deficientes em seu texto e expõe em seu Capítulo I - Art. IX, que trata do
Ensino de 1º e 2º graus, que
os alunos que apresentem deficiências físicas ou mentais, os que se encontrem em
atraso considerável quanto à idade regular de matrícula e os superdotados deverão
receber tratamento especial, de acordo com as normas fixadas pelos competentes
Conselhos de Educação. (BRASIL, LDBEN - Art. 9, 1971)
Conforme aborda Nunes (2010), logo após a promulgação da 2ª LDBEN, veio a criação
do Centro Nacional de Educação Especial (CENESP), órgão responsável pela educação
especial no país tal como o estimulo a atividades voltadas a portadores de deficiência e
pessoas superdotadas. Jannuzzi apud Nunes (2010), todavia, chama a atenção para tais
medidas federais, que
assumiam muito mais caráter de campanhas assistenciais e poucas iniciativas do
governo. A criação deste órgão tem como intuito a definição de metas
governamentais especificas para a educação especial, oficializando, uma ação
política efetiva, que pudesse organizar o que estava sendo realizado de forma
precária: escolas, instituições para ensino especializado, formação profissional
integrado a educação regular.(JANNUZZI apud NUNES, 2010)
Sassaki (2004) comenta que a década de 80 torna-se internacionalmente a década
em que os meios legais voltados à educação inclusiva ganham impulso; os Estados Unidos,
segundo Mendes (2006), iniciam em 1980 uma reforma que visa a excelência das escolas e
os tópicos de discussão remetiam à inclusão, em razão do grande número de deficientes no
país e a preocupação quanto à manutenção do status americano como potência educativa.
Sailor, Gee e Karasoff apud Mendes (2006, p. 392) apontam que
alguns elementos-chave dessa reforma, tais como a revisão curricular, a avaliação
baseada no desempenho, a descentralização da instrução, a autonomia
organizacional da escola, a gestão e o financiamento centrados na escola, a tomada
de decisão compartilhada, a fusão e coordenação dos recursos educacionais e o
envolvimento da comunidade, trouxeram implicações para a educação das crianças
com necessidades educacionais especiais, na medida em que tais mudanças
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resultaram em maior flexibilidade para as escolas, que puderam, a partir de então,
romper com as práticas tradicionais e aceitar novos desafios.
Mendes (2006) ressalta que expressões formais tais como “educação regular”
“processo inclusivo”, “integração”, “necessidades educacionais especiais” ganharam força e
corpo nesse período das reformas americanas, deixaram de ser simplesmente clichês das
reuniões, simpósios e conferencias e passaram do papel à ação. Em 1981, a Assembleia das
Nações Unidas reunida em Málaga, na Espanha, realizava a Conferência Mundial sobre
Ações e Estratégias para Educação, Prevenção e Integração como uma das propostas
interventivas para a rápida e emergente transformação educacional inclusiva. No tocante à
educação inclusiva é proclamada a Declaração de Sundberg (ONU, 1981), em homenagem a
Nils-Ivar Sundberg, educador de renome internacional, responsável pelo Programa da
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) para
educação especial, entre 1968 e 1981. Nesse documento, a UNESCO e a ONU empenham-se
em promover uma campanha internacional apelativa onde propõem que
“Artigo 4º - Os programas educacionais, culturais e econômicos, nos quais as
pessoas com deficiência irão participar, devem ser concebidos e implementados
dentro de uma estrutura global de educação permanente. Neste sentido, mais
atenção deve ser dada aos aspectos educacionais da reabilitação profissional e do
treinamento profissional.
[...]
Artigo 9º - Os educadores e outros profissionais responsáveis pelos programas
educacionais, culturais e informacionais devem também ser qualificados para lidar
com as situações e necessidades específicas das pessoas com deficiência. O
treinamento destes profissionais deve, em conseqüência, levar estes requisitos em
consideração e ser regularmente atualizados.
[...]
Artigo 16º - Os governos são responsáveis pela implementação da presente
Declaração; para este fim, eles devem tomar todas as medidas legislativas, técnicas
e fiscais possíveis e assegurar que as pessoas com deficiência, suas associações e as
organizações não-governamentais especializadas participem na elaboração de tais
medidas.
(ONU, 1981, pp. 1 – 10)
1983 chega trazendo a implementação da Política de Ação Mundial para as Políticas
Públicas voltadas aos deficientes, instituindo inclusive a Década das Nações Unidas para os
Portadores de Deficiências em vigor até o término de 1992. O que podemos perceber é que
houve inúmeros momentos de discussão e neste quadro um país se mostrou como o foco
destas reuniões, a Espanha. Os educadores espanhóis, preocupados com a situação de seu
país perante outros europeus como a Suécia, França, Reino Unido, motivaram-se no campo
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inclusivo e cederam à ONU suas cidades para sediarem essas discussões. A educação
inclusiva, nesse momento, nos termos da lei brasileira, era uma questão que estava em um
gradativo e lento desenrolar, todavia a aceitação legal, pública e a cobrança social
começaram a acelerar, em consequência das intervenções políticas internacionais. Em 1986,
já de volta a democracia no Brasil, é criada a Coordenadoria para a Integração da Pessoa
Portadora de Deficiência (CORDE). Sá (2002) elenca outras ações de âmbito nacional na
educação especial, como a Portaria nº 69/86, fruto da parceria do CENESP e do MEC, que
estabelecia normas para a prestação de apoio técnico e financeiro a instituições públicas e
privadas. Em 1988, um dos marcos maiores da conquista democrática ocorre: é promulgada
a oitava Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, C.F. ,1988). No texto, ao que
se refere à educação e ao desporto mostra que a partir daquela data fica estabelecido que
Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será
promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
[...]
Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:
[...]
III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência,
preferencialmente na rede regular de ensino;
[...]
V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística,
segundo a capacidade de cada um;
(BRASIL, C.F. art. 205, art. 208 §3º e §5º - 1988)
§ 1º O Estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança, do
adolescente e do jovem, admitida a participação de entidades não governamentais,
mediante políticas específicas e obedecendo aos seguintes preceitos:
[...]
II - criação de programas de prevenção e atendimento especializado para as
pessoas portadoras de deficiência física, sensorial ou mental, bem como de
integração social do adolescente e do jovem portador de deficiência, mediante o
treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação do acesso aos bens e
serviços coletivos, com a eliminação de obstáculos arquitetônicos e de todas as
formas de discriminação.
(BRASIL, C.F. art. 227 §1º - 1988)
A Lei nº 7.853 (BRASIL, LEI º 7.853,1989), publicada em Diário Oficial de 24 de
outubro de 1989, declara a obrigatoriedade da inclusão de questões específicas sobre a
população portadora de deficiências na realização de censos nacionais. O seu texto também
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dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua perfeita integração social e
atribui responsabilidades ao instituir a tutela jurisdicional sobre interesses coletivos ou
difusos dessas pessoas, tais como a disciplina e a atuação do Ministério Público sobre as
mesmas, ao definir crimes e outras providências legais correlacionadas penalmente. Essa
política especial começa a ser tratada como condição de extrema importância para se tomar
conhecimento da realidade brasileira em questões especiais e torna-se também
indispensável para sustentar a definição de políticas públicas coerentes com a necessidade
de portadores de deficiência no país. Pela primeira vez, com base nessa lei, o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) integra ao Censo Demográfico Brasileiro de 1991,
dois anos depois, questões referentes à população especial. Os dados do instituto atestam a
presença de 2.198.988 deficientes, o que representa 1,49% numa população total de 146.
815. 750 habitantes. Nesse censo, o Estado de Goiás apresenta, conforme dados abaixo,
grande número de portadores de cegueira.
TABELA 01 – Números dos cegos no Estado de Goiás Censo Demográfico do Brasil de 1991
Faixas Etárias
HOMENS(% do total) MULHERES(% do total)
0-1
5
(0,01)
8 (0,02)
2-4
----- (------)
11 (0,02)
5-9
59 (0,12)
20 (0,04)
10-14
58 (0,12)
43 (0,09)
15-17
58 (0,11)
47 (0,09)
18-24
143 (0,29)
64 (0,13)
25-29
92 (0,18)
46 (0,09)
30-39
175 (0,35)
69 (0,14)
40-49
211 (0,42)
143(0,28)
50-59
190 (0,38)
140(0,28)
> 60
591 (1,18 )
631(1,26)
TOTAL
1.582(3,15)
1.222(2,44)
AUTOR: IBGE – 1991
A década de 90 chega e é a que mais se preocupa com a temática da inclusão e com a
educação em si. O Brasil vive momentos de crise na esfera federal e o mundo se transforma
ideologicamente, mergulhado desde a década de 80 na ideologia da globalização e da
tecnologia. A terceira revolução industrial, a chamada Revolução Técnico-Científica, revela
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um boom de novas ideologias de mercado e sociais. A dissolução da União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS), a queda do Muro de Berlim e a expansão das tecnologias
trazem a preocupação com o futuro, com a educação e com a juventude.
Essa década apresenta um panorama diferente para a educação inclusiva. Até o
momento, os resultados apresentados após as reuniões realizadas na década de 80
mostraram alterações no cenário educacional e significativa mudança para a execução de
ações inclusivas. No entanto, a ONU e a UNESCO pedem mais. Muito ainda há que ser feito e
ambas articulam políticas diplomáticas para que mais países participem das reuniões. No
tocante a essa temática Lima (2006), Machado e Labegalini (2007) e Batista Júnior (2011)
relatam sobre os acontecimentos da década de 90, analisando os pontos principais, os
princípios que norteiam cada acontecimento e sua repercussão no cenário mundial. O Brasil,
como signatário das declarações culminantes de cada reunião é influenciado diretamente
com os princípios resultantes. É baseado nos autores acima que analisamos os anos 90.
As iniciativas começam, nessa década, com a Conferência Mundial sobre Educação
para Todos, realizada em março de 1990, em Jomtien, Tailândia, onde é assinada a
Declaração Mundial sobre Educação para Todos – Satisfação das Necessidades Básicas de
Aprendizagem (UNESCO, 1990). Documento que é muito importante para a educação
inclusiva mundial, pois apontou diretrizes para a educação especial e estabeleceu metas que
iam do aumento do número de crianças deficientes frequentando as escolas regulares ao
compromisso em torno do desenvolvimento de políticas contextualizadas. Propôs medidas
que providenciassem e assegurassem a permanência das crianças na escola por um período
longo, possibilitando assim o real beneficio da escolarização. Impôs uma adaptação
curricular que correspondesse às necessidades dos alunos, dos pais e das comunidades.
Machado e Labegalini (2007, p. 37) assinalam que o encontro de 1990 apontou “três grandes
níveis de ação internacional conjunta, que seriam a ação direta em cada país, a cooperação
entre grupos de países que compartilham certas características e interesses e a cooperação
multilateral e bilateral na comunidade mundial”. Esses níveis deveriam compreender desde
as ações inclusivas de cada país até o apoio às ações em outros países.
Em 1991, o Equador sedia um seminário, promovido pela ONU, que discute as novas
tendências na educação especial e também os novos rumos para as campanhas de incentivo
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internacional, prevendo o término da década da inclusão dentro de um ano. Dentre as
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recomendações resultantes desse seminário destacam-se: a ideologia de que as pessoas
deficientes não podem ser transformadas nem consideradas impedimentos sociais em
decorrência de sua condição. Não deve ser negada atenção à sua circunstância ou apelo,
pois serão passíveis de responsabilidade criminal os crimes por negligencia. Também foi
discutida a melhoria da qualidade dos serviços oferecidos por meio de capacitação de
recursos humanos e avaliação dos planos educacionais. Em comemoração ao término da
década da pessoa com deficiência, a 37ª Sessão Plenária Especial sobre Deficiência da
Assembleia Geral da ONU, em 14 de outubro de 1992, por meio da resolução A/RES/47/3
(ONU, 1992), adota o dia 3 de dezembro como o Dia Internacional das Pessoas com
Deficiência. O dia escolhido coincide com o mesmo dia em que, há dez anos, foi promulgada
a ideia da Década da Inclusão. Por meio desse ato, a ONU conclui que ainda falta muito para
se resolver os problemas dos deficientes e que isso não pode ser deixado de lado pelos
países membros das Nações Unidas.
Junho de 1993, o Chile sedia a V Reunião do Comitê Regional Intergovernamental do
Projeto Principal de Educação na América Latina e Caribe, promovido pela UNESCO e que
teve como tema principal a universalização da educação básica. Nesse evento foram
propostas a elevação da qualidade da aprendizagem dos alunos especiais e a fomentação de
ações para a redução das desigualdades, de acordo com o critério da discriminação,
diminuindo a educação dualista no mundo. O Brasil, nessa ocasião, enviou representantes
do MEC para adequar sua política pública às novas propostas internacionais de educação
especial; o ano seguinte, 1994, tornar-se-ia o ano apoteótico da educação inclusiva.
Salamanca, cidade de província espanhola homônima, sedia em junho daquele ano,
um dos mais importantes eventos da educação especial; representantes de 88 países e de 25
organizações internacionais reafirmam o compromisso assumido em 1990 com a Declaração
da Educação para Todos e redigem o que seria denominado “Regra Padrão sobre e
Equalização de Oportunidades para pessoas com Deficiências”, no qual declaram que
reconhecendo a necessidade e urgência do providenciamento de educação para as
crianças, jovens e adultos com necessidades educacionais especiais dentro do
sistema regular de ensino e reendossamos a Estrutura de Ação em Educação
Especial, em que, pelo espírito de cujas provisões e recomendações governo e
organizações sejam guiados.
[...]
Proclamamos que:
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- toda criança tem direito fundamental à educação, e deve ser dada a oportunidade
de atingir e manter o nível adequado de aprendizagem,
[...]
- aqueles com necessidades educacionais especiais devem ter acesso à escola
regular, que deveria acomodá-los dentro de uma Pedagogia centrada na criança,
capaz de satisfazer a tais necessidades,
- escolas regulares que possuam tal orientação inclusiva constituem os meios mais
eficazes de combater atitudes discriminatórias criando-se comunidades
acolhedoras, construindo uma sociedade inclusiva e alcançando educação para
todos; além disso, tais escolas provêem uma educação efetiva à maioria das
crianças e aprimora a eficiência e, em última instância, o custo da eficácia de todo o
sistema educacional.
(UNESCO, 1994, p. 1)
Marco para as políticas públicas inclusivas, Salamanca mobiliza o mundo, até então
engessado sob um calhamaço de declarações desprovidas de ações que iam ao encontro
com suas preconizações, afirmação esta corroborada por Lima (2006), Mendes (2006),
Machado e Labegalini (2007), Batista Júnior (2011). Grosso modo Salamanca é uma profilaxia
à praga da procrastinação que vigorava às diversas ações destinadas a educação inclusiva
mundial supracitadas. Na Ásia, de acordo com os dados da SEAMEO (2003), é criado em
Brunei Darassulam a Unidade de Ensino Especial que prestará assistência à educação
especial de crianças no país e que contará com psicólogos e professores especializados para
o referido ensino.
A partir da década de 80 foi possível perceber o quanto fervilharam e proliferaram
reuniões e estudos sobre inclusão, porém muitos deles não saíam do papel e muitas ações,
não condiziam com a realidade. O Brasil, por exemplo, na década de 90, muda seu plano
econômico e a educação sofre uma alteração no cenário político. A “nova LBDEN”, a Lei nº
9.394/96 (BRASIL, 1996) é promulgada e traz “boas novas” ao citar em seu texto disposições
específicas sobre a educação especial, tratadas no Capítulo V – Da Educação Especial:
Art. 58. Entende-se por educação especial, para os efeitos desta Lei, a modalidade
de educação escolar, oferecida preferencialmente na rede regular de ensino, para
educandos portadores de necessidades especiais.
§ 1º Haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular,
para atender às peculiaridades da clientela de educação especial.
§ 2º O atendimento educacional será feito em classes, escolas ou serviços
especializados, sempre que, em função das condições específicas dos alunos, não
for possível a sua integração nas classes comuns de ensino regular
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[...]
Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades
especiais:
I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos,
para atender às suas necessidades;
[...]
III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para
atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados
para a integração desses educandos nas classes comuns;
[...]
V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares
disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.
(BRASIL, LDBEN, 1996)
Com base em Mendes (2006), afirmamos que Salamanca fez com que a educação
inclusiva ganhasse terreno e influenciasse inúmeras ações inclusivas mundo afora. A
sociedade, porém não se acostuma facilmente com a integração de deficientes na rede
regular de ensino, a partir dessa situação, surgem preocupações dos profissionais quanto ao
andamento das aulas e com a qualidade do ensino, além do preconceito visível na sociedade
brasileira. Em 1999, redigiu-se no Reino Unido a “Carta para o Terceiro Milênio”, documento
que apelava em nome dos direitos humanos à luta pelos direitos dos deficientes e uma
convocação a nível global para que esse movimento se estenda pelos anos vindouros do
novo século.
Nós entramos no Terceiro Milênio determinados a que os direitos humanos de
cada pessoa em qualquer sociedade devam ser reconhecidos e protegidos. [..].
Cada pessoa com deficiência e cada família que tenha uma pessoa deficiente
devem receber os serviços de reabilitação necessários à otimização do seu bemestar mental, físico e funcional, assim assegurando a capacidade dessas pessoas
para administrarem sua vida com independência, como o fazem quaisquer outros
cidadãos. Pessoas com deficiência devem ter um papel central no planejamento de
programas de apoio à sua reabilitação; e as organizações de pessoas com
deficiência devem ser empoderadas com os recursos necessários para compartilhar
a responsabilidade no planejamento nacional voltado à reabilitação e à vida
independente.”
(CARTA PARA O TERCEIRO MILÊNIO, 1999)
Século XXI. O mundo se mobiliza, desde a Ásia às Américas. No ano 2000 é realizado
o novo Censo Demográfico pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em que
constam dados importantes;
“O Censo 2000 revelou que 14,5% da população brasileira era portadora de, pelo
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menos, uma das deficiências investigadas pela pesquisa. A maior proporção se
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encontrava no Nordeste (16,8%) e a menor, no Sudeste (13,1%). A nova publicação
traz o número absoluto de cegos e surdos no País. Em 2000, existiam 148 mil
pessoas cegas e 2,4 milhões com grande dificuldade de enxergar. Do total de cegos,
77.900 eram mulheres e 70.100, homens. A região Nordeste, apesar de ter
população inferior ao Sudeste, concentrava o maior número de pessoas cegas:
57.400 cegos no Nordeste contra 54.600 no Sudeste.
(IBGE, 2000, p. 01)
Com base no aumento da população com deficiência, cresce a preocupação com a
educação. É promulgada a Resolução CNE/CEB n°2/20019 que dispõe das Diretrizes
Nacionais para Educação Especial na Educação Básica, porém elas acabam se voltando com
maior força para o atendimento educacional especializado, a ser tratado posteriormente, e
não abordam uma política de educação inclusiva no ensino regular. O Plano Nacional de
Educação (PNE), elaborado no mesmo ano, expõe em seu texto uma preocupação em se
trabalhar com a diversidade humana no âmbito escolar sob a perspectiva de inclusão,
atendendo aos alunos com deficiência. Aponta também o déficit referente à oferta de
matrículas de deficientes nas classes do ensino regular, questiona o descaso com a formação
dos docentes e trata da acessibilidade ao atendimento educacional especializado. Enquanto
isto, na Ásia, segundo os dados expostos por Nakata (2002, p.1), em 2001, no Japão, há uma
elevação do número de escolas que admitem alunos cegos, “71 escolas, totalizando 1.168
alunos” devidamente matriculados.
No Brasil, a Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE/ CP nº. 1/2002)
estabelece as Diretrizes Curriculares Nacionais para formação de professores da educação
básica e também define que as instituições de ensino superior devem prever em sua
organização curricular formação docente voltada para a atenção à diversidade e ao
conhecimento sobre as especificidades dos alunos com necessidades educacionais especiais,
pois deve haver profissionais preparados para lidar com esses alunos em sala de aula. Na
prática ocorre uma contradição, pois em muitas unidades universitárias que possuem
Licenciatura em Matemática, somente vieram a oferecer uma instrução na Língua Brasileira
de Sinais (LIBRAS) cerca de oito anos após a sua deliberação.
9
Texto alterado pela Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010. Cf. (BRASIL, CNE/CEB 4/2010)
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Uma preocupação muito grande, segundo Nunes (2010), é que haja definitivo acesso
e permanência desses alunos nas escolas. Outro ponto primordial é o acesso à comunicação
e por isso a Portaria n°2678/02 garantiu a difusão do método Braille e a produção de
materiais didáticos nessa linguagem, uma vez que o Braille é o sistema padrão internacional
adotado para a leitura de textos pelos cegos, garantindo de forma legal a comunicação
desses alunos. Em 18 de outubro de 2002, mais de 3.000 pessoas, em sua maioria
deficientes, representantes de mais de 109 países, reúnem-se em Sapporo, no Japão, para a
Sexta Assembléia da Organização Mundial das Pessoas com Deficiência (Disabled People’
International – DPI), que discute temáticas e propõe no seu texto temas como diversidade
interna, direitos humanos, bioética, educação inclusiva, desenvolvimento internacional, paz,
conscientização do público, conhecimento e empoderamento.
Em 2003, o MEC cria o Programa Educação Inclusiva, que visava a implementação de
propostas inclusivas nas escolas públicas, propostas estas que iam desde a adequação dos
espaços físicos, formação continuada de gestores e professores, salas de Atendimento
Educacional Especializado, materiais didáticos adequados, etc. Todas garantindo assim não
somente a Integração, mas a Inclusão dos alunos deficientes, sendo responsável igualmente
pela organização do AEE e a promoção da acessibilidade. Este momento do século XXI passa
a ser uma nova era na educação que, segundo Nunes (2010), começou com o Plano Nacional
e foi se concretizando com essas últimas medidas. A autora afirma que essas medidas legais
citadas “ainda preveem que as instituições escolares terão que se adequar às pessoas com
deficiência, dando-lhes acesso e fazendo com as mesmas permaneçam, neste caso, no
ambiente escolar de forma igualitária”. Em 2004, o Programa de Educação e Inovação para o
Desenvolvimento da Ásia e do Pacífico (APEID) e o Instituto Nacional de Educação Especial
(NISE) organizam o Primeiro Seminário sobre Educação Especial, discutem os rumos que os
países asiáticos e do Pacífico devem tomar, que medidas devem adotar relacionadas à
educação especial e mostram estudos e pesquisas sobre o tema. Dentre os estudos
discutidos destaca-se a palestra do Dr. Nicholas Jude, especialista em Neuropsicologia
Clínica, que apresentou seus estudos sobre “surdocegueira”, em parceria com o Centro de
Recursos vinculados à Universidade Haukeland da Noruega, além de apresentar ainda
pesquisa sobre as reações emocionais e cognitivas para o aprendizado frente a esta
deficiência.
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Sabe-se que são inúmeras as instituições que oferecem apoio aos deficientes, porém,
segundo estudos como o de Nunes (2010), uma das possibilidades é investir com bastante
convicção em estudos os quais garantam a capacitação dos profissionais, para que possam
lidar com a deficiência, e nesse caso em especial, o cego. Investir também, conforme
recomendação da Carta para o Terceiro Milênio, em pesquisas sobre materiais didáticos
adequados para cada tipo de deficiência, pois há necessidade de estudos sobre a didática
adequada para lidar com o aluno deficiente nas várias situações em sala de aula. Não se
pode esquecer, como já foi citado, dos cursos de preparação e formação de professores. As
leis apoiam cada um destes alunos, porém o professor deve sim estar apto para o exercício
da educação inclusiva, auxiliando o aluno com cegueira na aprendizagem de sua língua (que
é oficialmente o código Braille), lidando com materiais didáticos ou dinâmicas que facilitem
seu aprendizado. Numerosas foram, e são até hoje, as Campanhas que promovem a
equidade da sociedade frente à temática inclusiva10, incentivada pelas Nações Unidas desde
meados desta primeira década do século XXI.
Em 2005, Coreia do Sul, China, Japão e Malásia se reúnem no Seminário sobre
Educação Especial e fundam a Revista de Educação Especial da Ásia e do Pacífico11, onde,
ano após ano, os quatro países se revezam em publicações de estudos destinados aos
portadores de deficiência. Enquanto isso, no Brasil, o Congresso Nacional traz um grande
auxílio aos cegos e portadores de baixa-visão. Através da aprovação da Lei nº 11. 126 de 27
de junho daquele ano (BRASIL, 2005), fica estabelecido o direito dos deficientes visuais de
ingressarem e permanecerem em ambientes de uso coletivo e vias públicas na companhia
de cães-guias. Segundo a lei
o
Art. 1 É assegurado à pessoa portadora de deficiência visual usuária de cão-guia o
direito de ingressar e permanecer com o animal nos veículos e nos
estabelecimentos públicos e privados de uso coletivo, desde que observadas as
condições impostas por esta Lei.
o
§ 1 A deficiência visual referida no caput deste artigo restringe-se à cegueira e à
baixa visão.
o
§ 2 O disposto no caput deste artigo aplica-se a todas as modalidades de
transporte interestadual e internacional com origem no território brasileiro.
[...]
10
11
V.R: PERRI (2009)
Disponível em: http://www.nise.go.jp/en/journal_of_spec.html
77
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o
Art. 3 Constitui ato de discriminação, a ser apenado com interdição e multa,
qualquer tentativa voltada a impedir ou dificultar o gozo do direito previsto no art.
o
1 desta Lei.
(BRASIL. Lei nº 11.126, 2005)
Essa medida incentiva os cegos à mobilidade em público, tal como segurança aos que
frequentam escolas do ensino regulares, principalmente depois de campanha em cadeia
nacional para a adoção de cães-guias por cegos.
O ano de 2006 foi de intensa movimentação na esfera legal e político-social. Foi
lançado o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, em parceria com a UNESCO,
com o MEC e com o Ministério da Justiça, que tinham por objetivo a elaboração de um
currículo para a educação básica que fosse ao encontro às temáticas referentes às pessoas
deficientes e possibilitasse o desenvolvimento de ações de inclusão, acesso e permanência
no ensino superior. Em 2006, também foi lançado pela segunda vez em cadeia mundial uma
Campanha em prol das pessoas com deficiência, em reunião da Organização dos Estados
Americanos (OEA) na República Dominicana. Segundo a OEA (2006), o decênio 2006 – 2016,
foi eleito como o Decênio das Américas para as Pessoas com Deficiência, proposta aprovada
mediante a resolução CP/RES. 926 (1625/08) de 23 de janeiro de 2008, constante na
Declaração da Década das Américas pelos Direitos e pela Dignidade das Pessoas Deficientes
2006 – 2016, cujas principais propostas ao longo destes dez anos se referem à sensibilização
social, saúde, educação, emprego, acessibilidade, participação política, participação em
atividades culturais, artísticas, esportivas e recreativas, bem-estar e assistência social, e
cooperação internacional
No ano de 2007 foi lançado o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Ele vem
apenas reafirmar a inclusão das pessoas com deficiências na educação, tendo com eixo
central a acessibilidade e as alterações arquitetônicas nos prédios escolares, além da
implementação de salas de recursos e da formação docente para o atendimento educacional
especializado, inclusive citando os professores de apoio. O que se pode constatar é o avanço
em relação ao que está na legislação nesse século XXI, por causa da pressão internacional e
da população brasileira, pois o país passa por um momento em que as leis internacionais e
decretos saem do papel para a ação, indo ao encontro da integração das pessoas
deficientes. A instituição da Década Americana voltada aos deficientes colaborou muito para
78
esse avanço significativo, antes influenciado apenas por Salamanca e pela Carta para o
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Terceiro Milênio. Em seguida pode-se afirmar, com base nos dados e observações do
Ministério da Cultura (MEC, 2007), que a inclusão fora estabelecida de forma legal,
mostrando com isso uma preocupação do país com os aspectos constitucionais, seguindo
assim modelos já adotados por países norte-americanos e europeus.
Ainda em 2007, segundo Batista Júnior (2011)
O decreto nº 6.571 dispõe sobre o Atendimento Educacional Especializado (AEE),
bem como estabelece que os estudantes público alvo da educação especial serão
contabilizados duplamente no FUNDEB, quando tiverem a matrícula em classe
comum de ensino regular da rede pública e matrícula no AEE.
O Atendimento Educacional Especializado (AEE) é uma oferta da educação especial,
complementar à formação do ensino regular, destinado aos alunos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades e/ou superdotação, levando em
conta suas NEE, a participação e a interação nas atividades escolares. O AEE perpassa todas
as modalidades e níveis de ensino, sendo um direito de todas as crianças e jovens especiais e
é realizado sempre no contra – turno do horário de aula regular do aluno.
No ano de 2008, o Japão realiza a segunda edição do Seminário para Educação
Especial. Baseando-se em pesquisas e levantamento de dados mostra estudos que mapeiam
a cegueira na região da Ásia e do Pacífico, onde se constata que havia “71 escolas
especializadas em cegos, que contavam com um total de 3.882 alunos e em formação, nos
12 países representantes presentes, 34.429 professores para o atendimento de pessoas
cegas” (UNESCO, 2008, p. 2).
Já em 2009, a CORDE, por meio da Lei 11.958, aprovada em 26 de junho de 2009
e pelo Decreto nº 6.980 promulgado em 13 de outubro de 2009, passa a se chamar
Subsecretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Pessoa com Deficiência (SNPD) e a
partir dessa data passa a ser um órgão da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da
República (SDH/PR). E cabe a ela a responsabilidade acerca da articulação e coordenação das
políticas públicas voltadas para as pessoas com deficiência. A nova subsecretaria galgou
degraus no cenário político nacional e internacional no momento em que o Brasil ratificou a
Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência e concordou com os termos de seu
Protocolo Facultativo, ambos assinados na sede da ONU, em Nova York em março de 2007.
O documento citado ganhou status de Emenda Constitucional ao ser aprovado pelo
79
Congresso Nacional no Decreto Legislativo nº 186, de 9 de julho de 2008, igualmente
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legalizado com base no Decreto nº 6.949 de 25 de agosto de 2009. Hoje, com base nessas
leis específicas, a emenda dá suporte à política nacional para a inclusão da pessoa com
deficiência.
A SNPD também tem como sua responsabilidade coordenar e supervisionar o
Programa Nacional de Acessibilidade e o Programa de Promoção e Defesa dos Direitos da
Pessoa com Deficiência. Ambos os programas têm o objetivo de estimular todos os setores,
públicos e privados, para que as políticas públicas e programas que contemplem a
promoção, a proteção e a defesa dos direitos da pessoa com deficiência sejam de fato
realizados. Cabe à Subsecretaria a emissão de pareceres técnicos sobre projetos de lei
pertinentes a essa área, quer estejam em tramitação nas casas do Congresso ou não.
Também é de sua responsabilidade realizar audiências, consultas públicas técnicas,
envolvendo as pessoas com deficiência diretamente e indiretamente nos assuntos que as
dizem respeito; também a realização de campanhas de conscientização pública, em busca de
respeito pela autonomia, igualdade de oportunidades e em prol da inclusão social da pessoa
com deficiência. No cenário internacional, deve a subsecretaria promover a iniciativa de
projetos e de acordos de cooperação com organismos internacionais no que tange à área da
deficiência.
Em 05 de maio de 2010, o Decreto de nº 7.166, institui a criação do Comitê
Organizador para a alteração nacional do Registro de Identificação Civil e adoção de novo
sistema de registro do cidadão brasileiro, alterando o antigo Registro Geral (RG). O novo
modelo passa a conter além do identificador eletrônico as informações cadastrais da pessoa,
desde o número do Cadastro de Pessoa Física (CPF) até a alteração de nome em razões
matrimoniais. O projeto de substituição dos registros antigos pelos atuais, cuja estimativa é
de 150 milhões de cartões munidos de chips e certificação digital, está orçado em 800
milhões de dólares, a serem gastos ao longo de nove anos, segundo informações do
secretário-executivo do Comitê Gestor do RIC do Ministério da Justiça, Paulo Airan.
Em 15 de dezembro de 2010 foi apresentada ao Senado Federal a proposta da
Deputada Maria do Rosário, do Estado do Rio Grande do Sul, em regime de tramitação
prioritária da Lei nº 8.016, que dispõe sobre a cédula de identidade para deficientes visuais,
uma vez que está em vigor a proposta de alteração da cédula de identidade em todo o país.
80
A ementa propõe um modelo de Registro de Identidade Civil do deficiente visual que
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conterá informações sobre a sua deficiência e trará as informações em Braille. A proposta
está sujeita à apreciação do plenário em regime de tramitação desde 05 de janeiro de 2011,
conforme citação do Senado Federal. A proposta ressalta ainda em seu texto que
para que esses deficientes possam exercer seus direitos plenamente, é necessário
que se garanta o documento de identificação com validade nacional, contendo os
dados relativos à deficiência e as informações também em Braille. Desse modo, a
fim de garantir que tais pessoas possam usufruir dos direitos garantidos pela
legislação relativa às pessoas portadoras de deficiência, devemos fornecer os
instrumentos legais necessários para a execução desses preceitos legais. O Registro
de Identidade Civil é o documento com validade nacional hábil à identificação dos
cidadãos. Assim, se, neste documento, forem inseridas as informações relativas à
deficiência visual de seu portador, inclusive em braile, permitiremos que o
exercício dos direitos seja garantido nacionalmente, por um documento de caráter
permanente.
(BRASIL, Proposta de Lei 8.016, 2010)
Em 2011 foi realizado em todas as unidades escolares, o Censo Escolar, mas com um
diferencial, continha um informativo detalhado sobre tipo de turmas, atividades
complementares, detalhes sobre o Atendimento Educacional Especializado, como horário de
início e término do mesmo, modalidade, etapa, detalhes sobre laudos, acompanhamentos
pedagógicos, entre outros. Uma ação que permitirá que as esferas legislativas e executivas,
além dos próprios professores, tomem conhecimento da realidade das escolas públicas
brasileiras.
A realização do Censo Escolar (MEC, 2011) tem por objetivo fazer um amplo
levantamento sobre as escolas de educação básica no país, cuja assessoria foi realizada pela
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, por meio da
Diretoria de Política de Educação Especial (SECADI/ DPEE). As unidades escolares são
orientadas pelo MEC a informarem qual o atendimento realizado para cada tipo de
deficiência, cujas opções primárias são Surdez, Cegueira, Baixa-visão, Deficiência Física,
Deficiência Intelectual, Surdocegueira, Transtornos Globais do Desenvolvimento, Altas
Habilidades/Superdotação. No tocante à cegueira é necessário informar, por exemplo, se o
aluno possui conhecimento
do Sistema Braille; orientação e mobilidade no contexto escolar; o uso de
tecnologias de informação e comunicação acessíveis; disponibilização de materiais
didáticos e pedagógicos acessíveis: áudio-livro, livro digital acessível, textos em
formato digital e materiais táteis; o ensino da técnica de Soroban; a transcrição de
material em tinta para o Braille, entre outros. (MEC, 2011, p. 01)
81
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Além das especificações de atendimento acima citadas, os estudantes podem ser
caracterizados, quando apresentam laudos específicos, como tendo Atraso no
Desenvolvimento Neuropsicomotor (ADNPM), Transtorno Invasivo do Desenvolvimento
(TID), Déficit no Pensamento Auditivo Central (DPAC) ou mesmo Déficit Intelectual,
Hidrocefalia, ou Déficit Cognitivo, Transtorno Funcionais subdivididos em Transtorno de
Déficit de Atenção (TDA), Transtorno de Déficit de Atenção – Hiperatividade (TDAH),
Dislexia, etc.
Enfim, para concluir este apanhado acerca da legislação especial desde seus
primórdios, ressaltamos que ela sempre foi cercada de textos muito bem elaborados,
iniciativas em cenários tanto nacionais quanto internacionais, com diretrizes bem focadas
que resguardam os diretos dos alunos da educação inclusiva. Percebemos, porém, através
da intensidade e da periodicidade das reuniões, que não há total cumprimento dessas
medidas no plano da realidade. A política e a educação são foram influenciadas por
circunstâncias sócio-educativas e quando esbarram em uma lacuna necessitam que novas
medidas, declaradas com base em acordos e reuniões, surjam para incentivar ações que
ajudem a preencher tais lacunas. Tema que será abordado no próximo dessa trilogia de
artigos, e que será publicado na próxima edição da Revista.
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Novembro de 2012; ISSN 21777276; Cidade de Goiás; www.coracoralina.ueg.br
A Música Independente no Brasil: Constituição, Festivais e Expressões
Isabella Cecília do Nascimento
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Resumo: Há poucas produções científicas que se voltam para os cenários musicais
independentes no Brasil com enfoque na rede de organização, planejamento, processos de
identificação, economia solidária, e é dentro desses movimentos que nascem os festivais. A
cena independente tanto de redes locais como nacionais são pouco conhecidas pelo grande
público e pela comunidade acadêmica, mesmo havendo movimentação cultural em todos os
estados brasileiros com recursos simbólicos e materiais muitos significativos. São os festivais
que constituem a forma principal de disseminação dessas dinâmicas nas cenas
independentes. Este trabalho investigou o festival ‘Grito do Rock’, um grande evento
integrado que ocorre em todo Brasil e em países da América Latina, organizado pela rede
Fora do Eixo.
Palavras Chave: Música Independente, Festivais, Movimentação Cultural.
Introdução
Geração coca-cola
(Legião Urbana)
Composição: Dados Villa Lobos, Renato Russo
“Quando nascemos fomos programados
A receber o que vocês
Nos empurraram com os enlatados
Dos U.S.A., de nove as seis.
Desde pequenos nós comemos lixo
Comercial e industrial
Mas agora chegou nossa vez
Vamos cuspir de volta o lixo em cima de vocês
Somos os filhos da revolução
Somos burgueses sem religião
Somos o futuro da nação
Geração Coca-Cola
Depois de 20 anos na escola
Não é difícil aprender
Todas as manhas do seu jogo sujo
Não é assim que tem que ser
Vamos fazer nosso dever de casa
E aí então vocês vão ver
12
Isabela Cecília do Nascimento é graduanda do quarto ano do curso de Ciências Sociais da Universidade
Federal de Goiás, da cidade de Catalão. Professor indicador Doutor Rubens de Freitas Benevides do curso de
Ciências Sociais da Universidade Federal de Goiás Campus de Catalão
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Suas crianças derrubando reis
Fazer comédia no cinema com as suas leis
Somos os filhos da revolução
Somos burgueses sem religião
Somos o futuro da nação
Geração Coca-Cola
Geração Coca-Cola
Geração Coca-Cola
Geração Coca-Cola [...]
1
Essa música da banda Legião Urbana escrita nos anos 80 é um crítica ao modelo de
vida americano que era exaltada pelos jovens do mundo todo, de roupas a tipos de
comportamento e principalmente do consumismo exacerbado dos Estados Unidos, e a
marca ‘Coca-Cola’ é o símbolo mais famoso do capitalismo americano, é o produto mais
consumido no mundo e que está presente nos quatro cantos do planeta, por isso a
referência (de Luciano Martins) ‘geração Coca-Cola’. Isso nos faz refletir como o sistema
capitalista possui mecanismos de controle como a opressão, exploração e através da
constante produção nas fábricas ele mantêm sua força. O consumir é a energia motriz desse
sistema capitalista, é um dos responsáveis pela sua manutenção. O consumismo é uma
constante na vida humana, algo que se tornou naturalizado, já que criou novas necessidades
para a “sobrevivência” no mundo globalizado (necessidades que antes não existiam). Com a
economia globalizada, o acesso a produtos tornou-se cada vez mais fácil e rápida, milhares
de opções criadas pelas indústrias para conquistar consumidores. É intenso o ciclo
fabricação - venda - compra, e é neste meio que surgem as formas de pagamento: crediário,
cheque, cartão de credito, empréstimo, financiamento etc.
A mercadoria tem que ser vendida de qualquer maneira, e as corporações manejam
as sociedades para isso, através do que Marx define como fetichismo da mercadoria¹. As
estratégias de marketing inteligente conhecem e estudam os gostos e desejos dos
consumidores, utilizam publicidades cada vez mais atraentes que predominam na decisão de
escolha de algum produto. A mídia exerce forte influência sobre as pessoas; são símbolos,
cores, ícones de beleza, músicas que motivam emocionalmente o consumo de determinada
marca, é o feitichismo presente nos produtos que lhes proporciona um caráter de ‘vida
própria’, culminando uma necessidade constante de obtê-lo e o quão é útil na sua vida.
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Levando muitas vezes ao endividamento e ocultando uma de suas essências, a exploração do
trabalho. As intensificações dos meios de produção geram sociedades voltadas ao consumo,
e isso é consequência das relações comerciais do sistema capitalista, que simbolicamente
atendem as necessidades dos indivíduos através das mercadorias. E mais do que isso, elas
reproduzem a desigualdade social, ou seja, o fetichismo é uma relação social entre as
pessoas e os bens que elas adquirem.
Habermas (1968) faz a análise da difusão do modo de produção e das ideologias
através do desenvolvimento científico-tecnológico da sociedade moderna (que gira em torno
do capitalismo). A técnica e a ciência transformaram as antigas legitimações dos setores
institucionais da sociedade, com uma racionalidade progressiva, ou seja, para que houvesse
o desenvolvimento técnico e científico foi necessário derrubar antigos mecanismos sociais
de funcionamento para instaurar um novo modelo de sociedade que funciona agilmente
com as técnicas desenvolvidas para as indústrias. Logo, as relações sociais se modificam a
favor desse progresso e, por conseguinte, o Estado se apropria deste novo modelo
econômico, criando novos instrumentos de dominação política, por meio de uma nova
racionalidade instituída. Isso acontece porque ela se desenvolve de acordo com o uso que se
faz da ciência e da técnica na sociedade, é o resultado desse progresso técnico-científico,
que cria novas necessidades na vida das pessoas (o fetichismo da mercadoria) produzindo o
consumo em massa que atende as necessidades da população. Isso ocorre na medida em
que as pessoas se deixaram controlar/aceitar/instituir por essa nova racionalidade manejada
pela produtividade do desenvolvimento técnico-científico.
Boaventura de Souza Santos (2011) nos faz refletir que o processo de
desenvolvimento da ciência culminou cada vez mais rápido da dominação da natureza pelo
homem. Isso legitimou a regulação da hegemonia burguesa sobre a sociedade. Esse princípio
de regulação parte da necessidade de controle dessa camada da sociedade sobre as demais
classes legitimando a ordem através de mecanismos desenvolvidos pelo progresso científico.
O progresso levou a competitividade entre os indivíduos uma relação instituída pelo sistema
que se tornou naturalizada. O consumismo faz com que o objeto ganhe o caráter de sujeito,
por exemplo, o uso do celular, computador, comida enlatada e congelada passam a ter um
lugar central na vida das pessoas, em um ponto que não se vive mais sem esses objetos e é
ai que eles adquirem esse novo sentido.
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A ciência é a forma de conhecimento dominante na modernidade, e ao mesmo
tempo é a força do desenvolvimento econômico, que se iniciou desde o século XVIII para o
progresso tecnológico que, por conseguinte tinha como princípio eliminar a miséria com
todo esse desenvolvimento. Mas não foi e não é assim, a transição da modernidade para a
pós-modernidade está ligada a crise da ciência, foi absorvida pelo mercado e por isso se
tornou inviável acabar com a miséria através do progresso tecno-científico.
Ernest Mendel elaborou um conceito acerca do desenvolvimento capitalista que está
dividido em três fases, a última delas o “capitalismo tardio” na qual estamos vivendo, é a
globalização dos mercados, crescimento de empresas multinacionais, intensificação do
trabalho, consumo de massa e a intensificação do capital. Tudo isso aliada ao
desenvolvimento tecnológico que cada vez mais inova em técnicas ágeis para aumentar a
produção e gerar mais capital para a economia mundial. Essa fase seria a crise da
intensificação dos meios de produção (aumento do consumo) que é desproporcional a
sustentabilidade dos recursos naturais, que estão se esgotando cada dia mais com a
exploração contínua.
Nesse sentido pensar a pós-modernidade é importante. O termo foi utilizado pela
primeira vez em 1950, e se refere além da literatura e cultura, a condição sociocultural que
predomina no capitalismo. A arte (em todas as suas formas) é um dos seus contrastes mais
fortes. O campo de produção cultural analisada por Bourdieu enfatiza que há um elemento
cultural na produção das desigualdades sociais. O sistema capitalista gera diferenças
econômicas e também culturais, isso se dá pela origem social, escolaridade e o caráter
formativo da cultura que o indivíduo vive. No campo de produção cultural há duas divisões:
o campo de produção erudita (que é a alta cultura, literatura), onde os artistas têm
autonomia no campo artístico, já que sua origem social é da classe dominante e isso
posiciona o artista nesse meio, de modo que as instâncias de consagração tornem suas obras
renomadas. Nesse tipo de produção os próprios intelectuais são consumidores de produtos
produzidos por outros intelectuais.
O outro campo é da indústria cultural, que ressignifica as obras, dotando-as de um
caráter de mercadoria, que tem um grande público, e a produção é em massa e tem que
atender aos gostos deste público alvo. A indústria então estipula padrões de produção que
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geram lucro e assim retira da obra sua originalidade. A tendência é a arte ser remodelada e
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dotar-se de um aspecto mercadológico, sendo produzida/reproduzida como um mero objeto
essencialmente igual aos outros, para ser vendido em grande escala e atingir novos públicos.
A produção erudita é restrita e consagra apenas os artistas e obras que fazem parte
deste ciclo. A hierarquia desse campo é feita por eles próprios e através de críticas é
atribuído valor simbólico ao artefato cultural em questão. Segundo Bourdieu (2005), é a
singularidade da obra pronta das características específicas como gênero, estilo que o artista
se apropria para produzir sua obra.
O campo erudito exige um conhecimento de regras e técnicas artísticas, um
refinamento para apontar estilo, gênero, época, estética da obra, que possui características
específicas criadas pelo autor que legitima sua arte pela singularidade e por meio das
instituições consagradas. A lei cultural dessa hierarquia de produção cultural (entre indústria
cultural e erudita) é que no campo erudito, os próprios autores são das classes dominantes.
Os cursos universitários de arte têm como público a elite, é a técnica de arte refinada
passada de classe dominante para classe dominante. Sua produção é direcionada a um
público restrito, onde muitos desses grupos estão nas instâncias de consagração.
O caráter singular da arte perde espaço para o caráter de mercadoria e isso retira a
legitimidade do artefato cultural em sua essência original, já que tem que agradar o público
e ser reproduzida massivamente. A questão do gosto seja ele qual for não é um elemento
natural, pois depende da posição que ocupamos no sistema de produção de bens simbólicos
disponíveis para nós. A hierarquia cultural acentua a distinção entre o que é erudito e
popular. As instituições de ensino têm um papel de grande influência nessa hierarquia, elas
praticam uma violência simbólica reforçando as distinções sociais.
Vivência na Casa Fora do Eixo São Paulo
No mês de Julho de 2011, o grupo de pesquisa fez uma imersão na Casa Fora do Eixo
SP em São Paulo (eixo matriz do circuito), foram três dias de intensas atividades para
conhecer a dinamicidade do funcionamento do circuito na rede e como a casa é um ponto
de encontro entre produtores, artistas, gestores culturais, parceiros, estudiosos e
colaboradores.
Existem outras casas Fora do Eixo no país, que representam as regiões (ex.: Casa Fora
do Eixo Nordeste). As Casas surgem com uma tecnologia denominada Fora do Eixo 2.0 que
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são zonas autônomas, e rotativas em relação as pessoas que circulam nessas casas, é um
fluxo temporário.
O programa de imersões e vivência na casa é chamado de Universidade Fora do Eixo,
onde coletivos, estudiosos e pessoas que estejam interessadas no Fora do Eixo possam
conhecer e ter contato com suas ações, através do agendamento de reuniões com as
equipes gestoras (música, cinema, palco, planejamento, FDE Letras, teatro, multimídia entre
outras) que as moldam de acordo com as demandas de quem chega na casa. É uma troca
constante de experiências trazidas das diversas localidades e vice-versa.
São várias turmas de trabalho, de extensões, refeições, organizações que organizam
o funcionamento da casa. Nessa época, Julho de 2011, esse espaço onde a casa ficava, era
recente, estava com seis meses de ocupação (que fica na Rua Scuvero, n°282, Liberdade).
Tudo é muito dinâmico, com muitas pessoas chegando, passando, e ao mesmo tempo em
que é casa, já se torna um ambiente de trabalho, reuniões. Os custos de alimentação para
quem visita a casa são de cinco reais por dia (incluindo todas as refeições) em média, mas
podem ser feitas de forma livre, como por exemplo, utilizar o card (moeda solidária que
circula na rede) ou com a força de trabalho, executando tarefas domésticas (como lavar e
secar a louça) para fazer a manutenção do espaço.
5
São em escritórios montados em vários cômodos da casa, os ambientes de
concentração e reuniões constantes. Os moradores da Casa FDE estão à frente de gestões
(planejamento da equipe de comunicação FDE; centro multimídia FDE; Universidade FDE;
Pcult; Nós Ambiente (equipe de planejamento socioambiental FDE); Linguagens FDE (poesia,
cinema, música, poéticas visuais, letras, palco e hip-hop); Banco FDE (moedas do circuito, o
card); Hospedagem Solidária), que são mutáveis, de tempo em tempo, eles vão trocando
para que todos passem por outras frentes de trabalho, em um processo de adaptação, de
acordo com as demandas da casa. A rede possui oitenta pontos espalhados pelo país (com
espaços fixos), e há a possibilidade de migrar para esses diferentes pontos, através de editais
de vivência, chamado de Universidade de Vivência Fora do Eixo - UNIVFDE, onde se passa
um determinado período fazendo intercâmbio de conhecimento e de tecnologias. Tudo isso
é transmitido online para que todos possam participar, possibilitando uma organicidade
maior entre as pessoas, tanto das que fazem parte dos coletivos do circuito, como das que
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não fazem. Isso atinge vários tipos de público e mais pessoas se interessam em conhecer e
até de participar do circuito, através desses laboratórios socioculturais.
Há também o setor de coberturas colaborativas, que incentiva o compartilhamento
de fotos, vídeos e dados dos eventos e festivais, o compartilhar é a chave-mestra mais
extensa e influente dentro do programa de cobertura colaborativa, que é uma ação
construtiva onde o público compartilha sua própria produção, para ser tornar um cidadão
multimídia. Nesse processo de compartilhamento, existem colaboradores que vem de
diversas regiões do país, fotógrafos que vão registrando, por exemplo, o festival 'Grito do
Rock', eles recebem 'card' para utilizar no circuito e ganham uma credencial que os identifica
nos eventos como a equipe de transmissão. Que após a cobertura já descarregam as
fotos/vídeos, que vão sendo disponibilizadas na internet. Esse processo motiva o projeto de
mídias integradas, que nasceu em Cuiabá, dentro do laboratório de mídias integradas
Cuiabana e também em Minas Gerais, na cidade de Uberlândia. As mídias integradas
uberlandenses e em Bauru chamam-se “Incoleve”, iniciativas que experimentam
comunicação colaborativa criando para a cidade um sistema de mídia independente. O
objetivo é agrupar esse veículo alternativo para criar uma rede de circulação de
informações, através da produção colaborativa com conteúdos diversos. A partir disso são
feitas ações conjuntas, por exemplo, um site divulgando a ação do outro, é uma troca
constante via web, que tem a participação colaborativa de várias pessoas do circuito.
As imersões são a principal ferramenta de sustentabilidade econômica do circuito,
pois produzem muito estimulo através de reuniões, atividades elaboradas para que os
coletivos trabalharem em suas localidades, com mais ideias, planejamento. Em suma, é um
espaço de condução política, cultural, social, ambiental dentro do circuito FDE.
Uma das primeiras coisas a se compreender quando se entra na rede é o que eles
chamam de ‘contaminar’, que é um lastro no qual você utiliza o seu poder de contaminação
na rede. Quem chega não tem conhecimento total do processo, e influenciar a rede ainda é
difícil, para que isso aconteça é necessário fazer essa influência de maneira humilde,
compreendendo o processo, colaborando dentro das frentes de trabalho, se informando
sobre o que já foi pensado, fortificando e ir conquistando seu lastro, seu poder de
contaminação para conseguir imprimir a sua digital na rede.
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Trabalhar a questão dos valores é essencial, é uma ação diária, quase que o tempo
todo. Fala-se muito do lastro, um conceito básico criado pelo FDE para mostrar que não há
hierarquia e sim um lastro, o qual se liga a outros, em um fluxo vertical, que a pessoa vai
conquistando na rede através do poder de contaminação, que conforme vai aumentando,
faz crescer também o seu lastro dentro da rede. Com o tempo, seu contato poderá estar nas
mais variadas listas de discussões, concentrando responsabilidades maiores na rede, sem
deixar que isso suba à cabeça, algo que eles não almejam. Por isso é importante ter muita
pré-disposição, e respeito, para crescer junto com todo mundo da rede através das ações
conjuntas.
O circuito Fora do Eixo conforme vai se expandindo, têm o intuito de ir conquistando
os setores da sociedade, conquistar o setor da cultura e promover mudanças, depois partem
para o cinema e do cinema para o palco, do palco para o esporte, do esporte para a
educação e assim sucessivamente, para causar um impacto de fato na sociedade. Mas essa
ação é gradual, vai se constituir com o tempo, de acordo com a dinâmica e o empenho de
todos os componentes da rede.
IV Congresso Fora do Eixo
O IV Congresso Fora do Eixo ocorreu de 11 a 18 de Dezembro de 2011 em São Paulo
– SP. Cerca de duas mil pessoas de várias regiões do país e de outros países da América
Latina participaram do evento que agregou discussões intensas na área da cultura
independente, com convidados de diferentes segmentos sociais e culturais, que
contribuíram com os debates e conferências, que ocorreram de maneira livre onde todos os
participantes puderam fazer perguntas e questionar a temática em questão.
A programação contou com plenárias, de onde saíram propostas e encaminhamentos
do circuito Fora do Eixo. Foram abordados: centro multimídia FDE; planejamento da equipe
de comunicação FDE; Universidade FDE; Nós Ambiente (equipe de planejamento
socioambiental FDE); Banco FDE (moedas do circuito, o card); Linguagens FDE (poesia,
cinema, música, poéticas visuais, letras, palco e hip-hop) e as regionais com os coletivos FDE.
Fui a uma conferência (dia 13/12) sobre “Captação de Recursos” na qual foram
abordados os seguintes pontos:
Como atrair a atenção do segundo setor?
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- Interconexão com pensamento coletivo, micro revoluções cotidianas para transformar sua
realidade;
- Conscientização é a ação da vez;
- Sonhos ligados a sua realidade, influenciando e mobilizando sua comunidade através de
projetos;
- Sempre pensar em rede, uma pessoa influencia a outra;
- É uma troca entre ação coletiva e a empresa (a empresa pergunta o que ela ganha com
esse patrocínio);
- É preciso saber o pensamento/discurso da empresa (o que eles têm interesse em investir).
Através do discurso atrai-se clientes;
- Estudar a marca é fundamental;
- Exemplo de empresa: Vale – extração de minérios = a destruição ambiental da sociedade
na qual está instalada. Ela é uma empresa grande, afastada das pessoas. Ser uma grande
empresa é a imagem a ser construída
- Ligar os discursos da empresa privada com as leis de incentivo;
- Para vender a ideia para a empresa é preciso mostrar números (estatística, ex.: IBGE)
Houve também feiras com exposição, distribuição, troca e comercialização de
produtos culturais. Sessões de cinema e vídeos foram exibidas a partir da indicação dos
próprios participantes. Além disso, reuniões livres com temáticas diversas e sem mediador; e
também vivências na cidade de São Paulo.
Participei de uma vivência no Capão Redondo, comunidade da periferia de São Paulo,
onde conhecemos um projeto de economia solidária implantado pelos próprios moradores,
o ‘Banco Comunitário União Sampaio’ que é um empréstimo de crédito de consumo que
oferece serviços bancários e financeiros com uma taxa de juros de 0% a comunidade, e
também faz acompanhamento a empreendedores e gerenciamento de fundos populares.
Para ter acesso ao crédito é necessário fazer solicitação no banco que após faz uma visita
residencial para o preenchimento de um formulário socioeconômico para analise de crédito.
O banco comunitário é uma forte ferramenta popular na constituição de uma economia
equilibrada, pois é uma alternativa econômica que faz crescer o comércio local e ajuda os
moradores com dificuldades financeiras.
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O seminário da música ocorreu durante três dias do congresso e contou com uma
porção de temas que foram sugeridos de maneira colaborativa pelos participantes. Temas
nos quais nortearam as discussões com os convidados que promoveram o debate sobre o
que é a música brasileira atualmente; os rumos da gestão cultural no Brasil; análise do
circuito independente; a importância dos festivais na circulação de bandas; mostraram que a
captação de recursos junto ao poder público é essencial; o que vem a ser de fato o Fora do
Eixo entre uma série de outros temas. Os debatedores presentes eram gestores culturais,
estudiosos, cantores, jornalistas, colaboradores, tais como: Emicida, Miranda; Alex Antunes;
Talles Lopes; Gaby Amarantos; Ale Youssef; Lala Dehzelein (Entusiasmo Cultural); Felipe
Altenfelder (FDE); Tata Aeroplano (Cérebro Eletrônico); Pedro Alexandre Sanches (Farofafa);
Cláudio Jorge (Petrobras); Ganjaman (Instituto); Fabrício Nobre (A Construtora); Pena
Schidmit (Auditório Ibirapuera); Lu Araújo (MIMO); George Yudice (Universidade de Miami);
Marcelo Damaso (Se Rasgum), Atílio Alencar (FDE); Diana Glusberg (Niceto Club); Fioti
(Laboratório Fantasma); Eduardo Nuomura (Farofafa).
A ida do grupo de pesquisa ao IV Congresso Fora do Eixo contribuiu bastante com a
pesquisa em questão, pois tivemos contato com pessoas de coletivos de diversas regiões do
país que debateram conosco como a cena independente se constitui no circuito, se é efetivo
ou não a forma como é estruturada; também se teve contato com bandas que estavam
presentes no evento, onde dialogamos sobre a importância dos festivais para a circulação
das mesmas; através da vivência, seminários e conferencias compreendemos mais
claramente como essa rede é extensa e agrega tantas ações conjuntas; com as entrevistas
direcionadas (cada um com o seu foco da pesquisa) coletamos dados para a produção de
artigos.
Grito do Rock
No início de 2011 foi feito uma inserção em um dos principais festivais do circuito
independente Fora do Eixo, o ‘Grito do Rock’, iniciativa que partiu do Instituto Espaço Cubo
em 2003 (e que se efetivou em 2006 na região cuiabana, e em 2007 nacionalmente) um
grupo de articulação multicultural cuiabano, que idealizou o festival com autogestão, e o
intuito de revelar novos talentos artísticos. Fazendo circular a cena independente de vários
municípios por meio de um circuito de shows interligados.
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É um festival integrado que aconteceu em todos os estados do país e atualmente em
países da América Latina (Bolívia, Chile, Argentina, Venezuela, Costa Rica, Honduras,
Panamá, El Salvador e Nova Iorque) promovidos por essa rede que tem coletivos culturais
espalhados nessas localidades. 2011 foi a sua nona edição sendo realizado em 132 cidades
desse circuito, chegando a um crescimento de 65% em relação à edição anterior. Fomos ao
Grito do Rock de Uberlândia – MG que ocorreu no mês de Março, lá foram feitas
observações, analisando o ambiente, a estrutura utilizada nos dias do evento, a circulação de
bandas, ponto de distribuição de produtos, o estilo das pessoas que frequentam o circuito,
além de conversar com os produtores, artistas e o público presente.
Esse festival é o meu foco no projeto e desta inserção foi feito um artigo científico
que foi apresentando em um evento de porte nacional, no III Simpósio de Ciências Sociais da
UFG/CAC e outro evento de porte internacional, no XXVIII ALAS ( Associação LatinoAmericana de Sociologia).
O Grito do Rock é a ação mais extensa da rede Fora do Eixo, porque foi a primeira a
ser feita em todo o circuito (acontece desde 2007), e associada a organizações culturais
como a Associação Brasileira dos Festivais Independentes - ABRAFIN, que reúne em seu
calendário anual, 32 festivais de todo Brasil fazendo circular mais de 600 bandas nacionais e
internacionais por ano, garantem o sucesso do Grito do Rock. E é por meio da produção
desse festival que se treina pessoas para trabalhar nos moldes do circuito FDE, com as suas
ferramentas/tecnologias desenvolvidas (centro multimídia FDE, Universidade FDE, Nós
Ambiente, Banco FDE, Linguagens FDE). Geralmente é por esse festival que se faz o primeiro
contato do ano com toda a rede.
Levy nos mostra, que nas sociedades contemporâneas, a cibercultura é um
movimento crescente e de impacto constante no dia a dia das pessoas, pois são
influenciadas pelas novas tecnologias que se desenvolvem a todo o momento para tornar a
vida mais prática e rápida, através de uma comunicação cada vez mais ágil que atinja o
maior número de pessoas possíveis. Nesse sentido, a internet, ganha seu papel de destaque,
ela é um exemplo de inteligência coletiva, já que conecta usuários de diversas localidades
em um mesmo espaço, desenvolve cooperativamente programas que prestam serviços a
comunidade virtual e incentivam a criação de iniciativas locais (com projetos de cunho
social/cultural/econômico/político) e o Grito do Rock é fruto disso.
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Essa agilidade comunicacional, onde tudo está conectado a tudo (informações e
entretenimentos enviados e recebidos em frações de segundos) estão dentro do
ciberespaço, que de acordo com Pierre Levy:
[...] permite a combinação de vários modos de comunicação. Encontramos em
graus de complexidade crescente: o correio eletrônico, as conferências eletrônicas,
o hiperdocumento compartilhado, os sistemas avançados de aprendizagem ou de
trabalho cooperativo e, enfim, os mundos virtuais multiusuários [...] (LEVY, 1999,
pág. 107.
O Grito do Rock é a primeira ação que se trabalha em rede na rede, coletivamente, e
é por meio dessa ação que se apresenta uma série de ferramentas disponíveis. Para isso
acontecer, é fundamental trabalhar a comunicação em rede que é a responsável por
apresentar e disponibilizar o acesso as tecnologias do circuito. Em todos esses locais se tem
arquivos de comunicação externa para mediar a comunicação entre todos os produtores do
evento.
O Grito do Rock é o festival primordial do circuito, ele é realizado em todos os mais
de 72 pontos da rede espalhados pelo Brasil e em alguns países da América Latina, em uma
grande ação coletiva. É realizado durante o carnaval, em um período estabelecido, e todos
os coletivos FDE o realizam seguindo um regulamento bem básico, que consiste em: receber
banda de outras cidades; ter um ponto de distribuição (de CDs, camisetas, adesivos, revistas
produzidos no circuito) ter um ponto de mídia (filmagem, fotografia, rádio web, divulgação
etc.); sistematizar alguns dados e compartilhar com a produção nacional. O conceito chave é
a campanha dentro do Grito Rock que é a democratização em laboratório dos trabalhos da
rede.
Uma das diretrizes dessa comunicação é a produção da campanha local do festival
Grito do Rock, que tem o papel de formação de agentes culturais, principalmente para quem
é novo na rede FDE. Há uma lista de discussão específica do festival no G-Talk (ferramenta
de bate-papo do Google), em que todos os integrantes de coletivos FDE e colaboradores têm
acesso, é uma troca constante de experiências e de aprendizagem, e para quem é recémchegado é ensinado passo a passo às atividades a serem executadas colaborativamente.
Dentro da comunicação do festival há vários tipos de campanhas. Uma delas é a campanha
de rádio, um tutorial que ensina o usuário a transmitir rádio, por meio de um kit composto
de instruções de transmissão, links dos programas para se fazer isso e as atualizações de
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agendamento da rádio dentro da web e da Rádio Fora do Eixo que é o canal oficial de acesso
a essas transmissões, que divulgam e compartilham informações.
Outra campanha é a de hospedagem solidária, um tutorial voltado para o necessário
para ter hospedagem solidária, o que precisa cuidar e como motivar as pessoas a utilizarem
o card, receberem os artistas em circulação e como esses artistas devem programar suas
viagens. Para se inscrever como hospedagem solidária em sua localidade, é necessário
responder um formulário do circuito para sistematizar e se tornar um ponto de hospedagem
cadastrado.
Além dessas, há a campanha da identidade visual do festival, que é a primeira a ser
convocada no ano. São chamados designers por meio de um edital de participação, que
inscritos, elaboram marcas que são lançadas na rede FDE para eleição, ao ser selecionada a
campeã, ela se torna a logo oficial do festival. Após isso, tem a campanha de aplicação da
marca no maior número de mídias possíveis, cada coletivo que realiza o evento utiliza a
mesma marca, sejam em redes sociais, camisetas, rádios, adesivos, banners, outdoors entre
outros.
Outra campanha é a de cobertura colaborativa, onde as pessoas (tanto as que
organizam como as que participam do evento) registram o festival, através de fotografias,
vídeos, reportagens, entrevistas que são divulgadas em redes sociais, blogs, sites.
A captação de recursos para a realização do festival é feita com a busca de patrocínio
dos produtores locais, através do poder público local ou empresas privadas. Para estabelecer
os valores, são feitas planilhas de gasto, com orçamentos diferentes, contendo, por
exemplo, o preço de palco, luz, som, local, publicidade impressa, transporte entre outros. O
acesso ao festival no geral é gratuito, sem cobrar entrada, já que depende do patrocínio
estabelecido, mas quando é cobrado ingresso é um preço bem acessível.
Observei um aspecto marcante nas pessoas que vão aos festivais, a camiseta, que o
público utilizava. As estampas são em sua maioria desenhos cômicos e de cunho crítico a
sociedade, figuras com elementos culturais nos quais se identificam e o xadrez muito
utilizado para compor os estilos. A moda é um forte fator de identificação dos que
frequentam os festivais. Segundo Diana Crane (2006), o vestuário além de ser uma maneira
de consumo, é também um fator de construção social da identidade. Ela evidencia status
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social e de gênero, e determina como as pessoas de diferentes épocas viam sua posição na
estratificação social.
O vestuário indica uma das principais formas das pessoas se identificarem no espaço
público, expressando comportamentos, ideologias, culturas. As diversificações do como se
vestir variam de acordo com a sociedade em que se vive, a posição social dentro da mesma e
em grupos culturais. As roupas exercem influência no comportamento, pois se afirma
através delas atitudes sociais de identidade.
A camiseta é uma peça de forte significação, e começou a ser decorada com
desenhos e dizeres impressos na década de 40. No final da década de 40 começam a colocar
outros tipos de informações, propagandas de cunho político com slogans e rostos
estampados, e na década de 60 propagandas comerciais e desenhos. Os elementos
impressos nas camisetas representam como o usuário se identifica com algum grupo social,
organização, movimentos, ideologias. E há também muitas pessoas que se incorporam a
propagandas mercadológicas gratuitas para ser associada a alguma marca, como uma forma
de ganhar status social.
As camisetas também são um forte meio de expressar resistência em relação ao
governo, ao sistema capitalista, a cultura dominante, violência, preconceitos sociais e raciais
entre outros. É um instrumento de declarações no meio público que expressam os
sentimentos, anseios, opiniões de quem as utilizam.
O festival Grito do Rock é um meio de divulgar a música independente elaborada
pelos próprios integrantes das bandas alternativas, que buscam recursos próprios para
gravar e produzir CD’S, que serão vendidos a preço acessível e também para serem
distribuídos em algumas ocasiões na qual se divulga o trabalho. O cenário musical
independente produz a si mesmo enquanto arte e se articula de forma coletiva com grupos
de diversas regiões do país, e por isso não tem tanta visibilidade como as bandas que estão
na mídia nacional que são produzidas pelas grandes gravadoras (majors). Mas mesmo não
sendo tão valorizada como as bandas de mídia nacional pelo grande público, há um grande
prestígio por aqueles que gostam e vivenciam a música independente.
O objetivo de se realizar um festival desse porte é o de fomentar cultura nas cidades
de uma forma descentralizada, garantindo o acesso da comunidade, fazendo circular de
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maneira plural as aspirações artísticas locais, regionais e nacionais em um só lugar. O Grito
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do Rock não promove apenas música, há também atividades culturais paralelas como teatro,
poesia, cinema e debates, atraindo vários tipos de público. O festival é um exemplo de como
a cibercultura ativa a diversidade de forma expansiva e dinâmica em um curto espaço de
tempo, com práticas bem elaboradas e resultados efetivos. A internet atua eficazmente na
rede de trabalho cooperativo Fora do Eixo, pois viabiliza a produção de festivais de
qualidade como o Grito do Rock que articula bandas independentes em turnês pelo Brasil e
América Latina sem estarem ligadas as grandes gravadoras. Um intercâmbio cultural entre
artistas, produtores, público e formando novos gestores culturais através de tutoriais de
aprendizado criados pelo FDE para expandir a ação do circuito em cada vez mais cidades.
O Fora do Eixo é uma rede de trabalho recente, mas já se tornou representativa na
área de produção de festivais, por essa forma diferenciada de fazer cultura e de possuir
coletivos culturais em diferentes regiões do Brasil, mas não é a única organização que se
dedica a música independente no país. Em 2012, o festival Grito do Rock chega a 200
13
cidades, um aumento de 55% em relação à edição anterior, mostrando que os festivais são
meios de impacto consideráveis na disseminação e integração no circuito nacional de música
independente.
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iluminismo como mistificação das massas. São Paulo: Ed. Paz e Terra S/A, 2009.
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Riscos ocupacionais de uma amostra dos profissionais da beleza do município de Goiânia
Karla Alaíde Pereira Garcia
Cleonice Fernandes Bento
Kleber França Costa
13
Resumo O profissional da Beleza é um especialista em cuidados corporais. Recentemente,
tem se observado um aumento da demanda de serviços prestados por esse profissional. O
objetivo do presente pretendeu desenvolver uma pesquisa sobre os riscos ocupacionais dos
profissionais da Beleza do município de Goiânia. Foram entrevistados cabeleireiros,
esteticistas, manicures, podólogos e tintureiros. Foi realizada uma pesquisa social com cento
e seis participantes. Foram obtidos resultados significativos. Por exemplo, quanto à origem
dos instrumentos profissionais utilizados - tesouras para corte de cabelo e pelos, aparelhos
de barbear e de depilação, pentes, escovas-, cerca de 100% de cabeleireiros entrevistados
afirmaram que utilizam material próprio. Por outro lado, somente 60% de Manicures e
podólogos responderam afirmativamente. O restante relatou que utiliza material não
descartável de clientes, o que se constitui um importante risco, visto que esses utensílios
costumam não serem esterilizados. E, ainda, cerca de 63% dos cabeleireiros e tinturistas
entrevistados apontaram que realizam substituição de material descartável e não
descartável. Somente 46% deles afirmaram que realizam assepsia regular e frequente das
mãos. Em torno de seis por cento dessa mesma categoria realizam esterilização dos
instrumentos utilizados. Na categoria de manicures e podólogos entrevistados, os dados
obtidos chamaram a atenção: somente cerca de 27% dos entrevistados relataram que
substituem material descartável e não descartável, e apenas 20%, aproximadamente, fazem
procedimentos adequados de esterilização dos instrumentos de trabalho. Esses dados
mostram o elevado risco potencial de doenças infecciosas (Hepatites, AIDS, Influenzas,
Micoses, Escabiose, Pediculose) a que estão expostos e que expõem seus clientes. Esses
dados mostram que muito há o que ser feito na área da Beleza para que haja o devido
cumprimento legal da profissão, quanto às normas de saúde pública.
Palavras-chave: Beleza. Riscos Ocupacionais. Goiânia.
Introdução
O aumento da renda, vivenciado nos últimos anos por parcela significativa da
população brasileira, tem fomentado os indivíduos a se preocuparem com a qualidade de
vida, sobretudo, quanto aos cuidados com o corpo. Isto faz com que homens e mulheres
dediquem mais tempo, recursos e esforços para melhorar aparência ao longo de sua vida.
Concomitantemente, nos últimos anos tem sido observado o crescimento do quantitativo de
profissionais que possam atender essa necessidade do mercado. Apesar disso, esse
13
Karla Alaíde e Cleonice Fernandes são acadêmicas de Tecnologia da Gestão da Beleza, UEG- Laranjeiras,
Goiânia (GO). Kleber França Costa é Professor do Curso de Tecnologia da Gestão da Beleza, e do Curso de
Tecnologia em Estética e Cosmética, UEG-Laranjeiras, Goiânia (GO), e mestre em Ecologia e Conservação da
Biodiversidade.
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crescimento não tem sido acompanhado da devida qualificação profissional, o que expõe o
trabalhador e a clientela atendida por ele (GERSON, 2011; HALAL, 2011).
Os principais riscos ocupacionais a que os profissionais da Beleza estão submetidos
incluem: as doenças infectocontagiosas e as doenças degenerativas. Nas primeiras estão
viroses como a Hepatite B, a AIDS, além das micoses oportunísticas. Dentre às degenerativas
estão os carcinomas (ALAM et al., 2010; KEDE e SABATOVICH, 2009; MURRAY et al., 2009).
Conforme Murray et al. (2009), as doenças infectocontagiosas podem ser
classificadas em transmissíveis com tendência declinante, transmissíveis com quadro de
persistência, emergentes e reemergentes. Dentre as primeiras, poderia supor que por está
em tendência de diminuição é de que ela não seja importante. Isto, porém, é uma idéia
equivocada. O tétano, por exemplo, ter sido reduzido bastante nos últimos anos, ainda é
tem levado milhares de pessoas a óbito. Quanto às doenças transmissíveis com persistência
destacam-se: Hepatites virais do tipo B e C, em função das altas prevalências, da ampla
distribuição geográfica e do potencial evolutivo para doenças graves com risco de óbito.
Além da implantação da vacinação contra a Hepatite B, são necessárias outras medidas que
visem à prevenção da doença. Segundo estimativas da OMS (2008), cerca de 50% da
população mundial já foi contaminada pelo vírus da hepatite B, existem cerca de 350
milhões de portadores crônicos e surgem 50 milhões de novos casos a cada ano. Estimativas
do Ministério da Saúde (2008), no Brasil, 15% da população já foi contaminada e um por
cento é portadora crônica (ANVISA, 2012; BRASIL, 2004).
Esses portadores crônicos de hepatite B apresentam um risco maior de morte, devido
à possibilidade de desenvolvimento de outras doenças: cirrose hepática e carcinoma
hepatocelular. A hepatite B é causada pelo vírus DNA, transmitido por sangue, transfusões
sanguíneas inadequadas, uso de agulhas contaminadas, intercursos sexuais desprotegidos,
instrumentos perfuro-cortantes, inclusive aqueles utilizados pelos profissionais da Beleza. O
vírus da hepatite B é resistente, podendo sobreviver até sete dias no ambiente externo em
condições normais e com o risco de infectar uma pessoa saudável, caso ela entre em contato
com o vírus através de picada de agulha, corte ou ferimentos (KEDE e SABATOVICH, 2009;
MURRAY et al., 2009).
Outro tipo de doenças transmissíveis são as denominadas emergentes – pode-se citar
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a Síndrome de Imunodeficiência Adquirida (AIDS). Desde a detecção inicial dos primeiros
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casos da AIDS em 1980, observou-se um crescimento acelerado da doença até os dias atuais.
Conquanto haja disponibilidade de novas drogas que propiciam um aumento na sobrevida
para os soropositivos do HIV, sabe-se que é uma patologia incurável e cuja disseminação
ainda continua com índices muito preocupantes. Por isso, medidas que visem promover a
Educação para obtenção da Saúde e procedimentos de prevenção são importantes para o
controle da doença (MURRAY et al., 2009).
Além dessas, pode-se destacar uma das de doenças que ameaçam os profissionais da
estética são as micoses oportunísticas. As micoses podem ser classificadas em superficiais ou
profundas. As superficiais podem ser as: tineas, onicomicoses, pitiríases, dentre outras. As
Tineas são infecções causadas por fungos que atingem a pele e os cabelos. A onicomicoses
são aquelas infecções das unhas. Os agentes etiológicos das micoses, frequentemente,
sobrevivem sobre a epiderme, nutrindo-se da queratina, quando há condições favoráveis
para a proliferação e infecção: temperatura e umidades adequada, baixa imunidade, etc.
(KEDE e SABATOVICH, 2009; ALAM et al. 2010).
Justificativa
O profissional da Beleza é um especialista nos cuidados corporais - em especial o
cabelo, o rosto e o corpo, visando à manutenção da saúde, da beleza e do bem estar.
Através do uso de cosméticos e procedimentos adequados, esse profissional promove o
melhoramento do aspecto da pele e de suas estruturas anexas. Dentre esses procedimentos
destaca-se: a depilação, os cortes capilares, o tingimento de cabelos e de pelos, a aplicação
de cosméticos, as massagens corporais, os processos esfoliativos de pele, a maquiagem,
dentre outros. Seus principais locais de trabalho incluem clínicas estéticas, salões de beleza,
hospitais, hotéis, domicílios, etc. Não obstante, a demanda por esses serviços não tem sido
acompanhado com a devida qualificação profissional. Desse modo, o profissional da Beleza
fica exposto e pode expor clientes a diferentes tipos de riscos quanto ao uso inadequado de
cosméticos e procedimentos não recomendados pelos órgãos regulamentadores da
profissão da Estética e de Saúde Pública (GERSON, 2011; GOMES & DAMAZIO, 2009; HALAL,
2011).
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Objetivos
O objetivo geral do presente trabalho foi desenvolver uma pesquisa sobre os riscos
ocupacionais dos profissionais da Beleza de uma amostra populacional desse grupo do
município de Goiânia. Os entrevistados foram: cabeleireiros, tinturistas, esteticistas,
manicures e podólogos. Tal ação se mostrou de fundamental relevância, visto que no estado
de Goiás há mais de 35.000 profissionais cadastrados, alguns deles sem a adequada
formação e qualificação. Os principais objetivos específicos foram: Conhecer os principais
riscos ocupacionais dos profissionais da área da Beleza, a partir de amostra populacional de
Goiânia; Analisar e tentar compreender a dinâmica que envolve esses riscos ocupacionais, a
fim de propor ações que permitam a qualificação profissional, se necessário, bem como a
realização de atividades que contribuam com a prevenção de patologias e a promoção da
saúde dos profissionais e de sua clientela; Divulgar em eventos científicos e em eventos
específicos da área, assim como junto às entidades representativas da classe, como o
Sindicato dos Proprietários de Barbearias, Institutos de Beleza e Afins do Estado de Goiás
(SINDIBELEZA), os principais riscos ocupacionais detectados bem como ações diminuir esses
perigos.
Metodologia
O presente trabalho foi desenvolvido através da aplicação de questionário social a
fim de obter informações sobre os principais riscos ocupacionais da área da Beleza, dos
profissionais
cabeleireiros,
tinturistas,
manicures,
esteticistas,
podólogos.
Foram
entrevistados cento e seis profissionais. O questionário conteve questões abertas e fechadas
a fim de obter dados fidedignos sobre o exercício profissional e seus riscos patológicos
associados. Os resultados obtidos foram organizados e discutidos conforme literatura
específica sobre o assunto, bem como de acordo com as orientações das normas de
vigilância sanitária, em especial da Agência Nacional de Vigilância Sanitária – a ANVISA.
Resultados e discussão
Do grupo de profissionais cabeleireiros e tinturistas entrevistados, aproximadamente
36% deles possuem mais de 10 anos de profissão e 30% entre 5 e 10 anos de exercício
profissional. Quarenta por cento de manicures e podólogos entrevistados afirmaram que
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possuem entre cinco e 10 anos de tempo de exercício profissional e cerca de 33% com mais
de 10 anos de profissão. Dos esteticistas, quase todos eles possuem até 5 anos de profissão.
Portanto, a maioria dos profissionais entrevistados já está no mercado de trabalho,
exercendo a sua profissão com a habilidade e o conhecimento consolidado que possuem
(Figura 1).
Percentual de tempo de exercício por experiência profissional
Percentual dos entrevistados em relação ao seu
tempo de exercício profissional
60%
50%
40%
30%
Cabeleireiro - Tinturista
Manicure - Podólogo
20%
Esteticista
10%
0%
Até 1 ano
Entre 1 a 5
anos
Entre 5 a 10
anos
Acima de 10
anos
Figura 1. Tempo de exercício profissional dos entrevistados
Quanto ao nível de instrução educacional dos entrevistados, 20% dos cabeleireiros
afirmaram terem o ensino fundamental escolar, 61% possuem o nível médio e
aproximadamente 19% têm o nível superior de ensino. Na categoria de manicures e
podólogos, os dados obtidos foram: 30% nível fundamental, 60% nível médio e 10% têm
nível superior. (Figura 2). Na categoria de Esteticistas, os resultados foram: cerca de 17% dos
entrevistados que possuem o nível médio e aproximadamente 83% possuem o nível superior
completo. Tal fato é relevante, visto que a profissão foi regulamentada recentemente pela
Lei 12.792 de 2012 e não há a obrigatoriedade dos níveis superior, médio ou fundamental.
Porém, há exigência que os profissionais obedeçam “às normas sanitárias específicas
determinadas pela legislação específicas envolvendo a Saúde Humana”. Portanto, projetos,
cursos, palestras educativas contribuem para orientar e contribuir com a qualificação dos
profissionais da Beleza, quanto à observância da determinação legal.
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Escolaridade dos profissionais entrevistados por categoria profissional
90%
Nível de escolaridade dos entrevistados
80%
70%
60%
50%
40%
Fundamental
30%
Médio ou Técnico
Superior
20%
10%
0%
Cabeleireiro Tinturista
Manicure - Podólogo
Esteticista
Figura 2. Nível de instrução educacional dos entrevistados por categoria profissional.
Sobre a origem dos instrumentos profissionais utilizados - tesouras para corte de
cabelo e pelos, aparelhos de barbear e de depilação, pentes, escovas -, 100% de
cabeleireiros e tinturistas afirmaram que utiliza material próprio. Por outro lado, na
categoria de manicures e podólogos, o índice de profissionais que afirmaram utilizar
material próprio foi de 60%, enquanto 40% desses profissionais utilizam instrumento de
clientes.
Quanto aos esteticistas entrevistados, 83% deles só utilizavam material próprio
(conforme dados da Figura 3). Porém, o fato de utilizar material próprio não garante o
cumprimento de todas as determinações e orientações da Agência de Vigilância Sanitária.
Pois embora a maioria dos entrevistados tenha afirmado que utilize material próprio, é
imprescindível que os profissionais possuam instrumentos e utensílios em quantidades
suficientes e proporcionais à sua clientela, conforme determinação da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária.
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Origem de instrumentos de trabalho utilizados por categoria
profissional
Percentual das respostas positivas
por categoria profissional
120%
100%
80%
60%
Próprio
40%
De Clientes
20%
0%
Cabeleireiro - Manicure - Podólogo Esteticista
Tinturista
Figura 3. Origem dos instrumentos profissionais utilizados.
Sobre os procedimentos de biossegurança e proteção individual adotados no
exercício profissional, cerca de 63% dos cabeleireiros e tinturistas entrevistados apontaram
que realizam substituição de material descartável e não descartável. De acordo com a figura
quatro, cerca de 46% deles afirmaram que realizam assepsia frequente das mãos; 29%,
aproximadamente, fazem higienização do ambiente de trabalho e um número próximo a seis
por cento deles afirmou realizar com frequência e de maneira adequada a esterilização dos
instrumentos utilizados.
Ainda conforme essa mesma figura, 70% de manicures e podólogos entrevistados
afirmaram que no exercício profissional realizam assepsia regular das mãos. Por outro lado,
somente cerca de 27% dos entrevistados relataram que substituem material descartável e
não descartável, e apenas 20% fazem procedimentos adequados de esterilização dos
instrumentos de trabalho. Todos os esteticistas entrevistados afirmaram que fazem assepsia
regular das mãos, porém apenas cerca de 67% deles afirmaram que substituem, de modo
regular e frequente, material descartável e não descartável, além de fazerem esterilização
de instrumentos de trabalho.
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Principais procedimentos de proteção individual e de Biossegurança
adotados por categoria profissional
120%
Percentual das respostas positivas
por categoria profissional
100%
Assepsia das mãos
80%
60%
Substituição de material
descartável
40%
Substituição de material não
descartável
Esterilização de utensílios
20%
Higienização do ambiente de
trabalho
0%
Cabeleireiro Tinturista
Manicure Podólogo
Esteticista
Figura 4. Principais cuidados profissionais utilizados, segundo opinião dos entrevistados.
Assim, os resultados obtidos e apresentados na figura 4 apontam para o risco
elevado de obtenção de patologias oriundas do exercício laboral. Além disso, aponta para a
probabilidade acentuada à exposição de clientes. Conforme determinação da Lei 12.792 de
2012 (que regulamenta a profissão da área da Beleza), os agentes devem obedecer “às
normas sanitárias, efetuando a esterilização de materiais e utensílios utilizados no
atendimento a seus clientes”. Conforme a ANVISA, deve-se entender por esterilização a
eliminação de qualquer forma de microorganismos (vírus, bactérias, esporos, protozoários,
fungos) de instrumentos de trabalho, pela via Calor Seco (em estufa, com temperatura a
170ºC por uma hora) ou pela via Calor úmido (em autoclave, com temperatura de 121ºC a
140 ºC, durante 15 a 30 minutos). Em ambos os procedimentos é necessária à formação de
kits, para uso individual por cliente, de alicates, tesouras, pinças, lâminas e similares perfurocortantes. Além disso, é recomendável o uso de materiais protetores plásticos descartáveis
em bacias de manicures e pedicures, sendo que essas devem ser higienizadas com o uso de
água, sabão e solução de hipoclorito de sódio a um por cento. E ainda é imprescindível o uso
de coletores especiais para resíduos de materiais perfuro-cortantes. As espátulas de
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madeiras, bem como as lixas para pés e unhas são de uso individual descartável (BRASIL,
1999; BRASIL, 2005).
Além disso, considerando que esses dados refletem uma amostra populacional, eles
permitem inferir que há a necessidade de orientação sobre os procedimentos que possam
colaborar quanto ao cumprimento de normas vigentes da ANVISA e de legislação específicas.
Os procedimentos recomendáveis para cabeleireiros e tinturistas é a remoção de pelos e fios
de cabelos após cada uso de escovas, pentes e pinceis, com assepsia utilizando água e
detergente, para a remoção de impurezas grosseiras, como sangue ou ainda secreções.
E, ainda, para a desinfecção o recomendável pelos órgãos competentes é a
desinfecção como um modo de redução de taxas de microorganismos nesses materiais, bem
como do ambiente (bancadas, macas, cadeiras, etc.) com o uso de soluções de álcool
saneante a 70% ou solução de Hipoclorito de sódio a um por cento com os instrumentos em
imersão por tempo superior a trinta minutos.
Quanto ao uso de toalhas elas estão no grupo dos materiais de uso individual, não
descartáveis e reaproveitáveis, desde que devidamente lavadas com água e sabão, e imersas
em solução de hipoclorito de sódio a um por cento. Apesar disso, conforme informações
obtidas no presente trabalho, a maioria das atividades laborais exercidas não segue essas
orientações e determinações, ocorrência que sugere a necessidade de elaboração de
projetos que visem contribuir com a qualificação continuada dos profissionais da área da
Beleza, para que estes se tornem conscientes da necessidade dessa ação.
Conforme a figura 5, 80% dos cabeleireiros e tinturistas entrevistados afirmaram que
utilizam luvas e jaleco regularmente. Somente 30% dessa categoria relataram que fazem uso
frequente de máscaras. Tal fato se explica pela baixa frequência de procedimentos de
tratamento químicos realizados diariamente. Na categoria de manicures e podólogos, 40%
afirmaram que fazem uso regular de máscaras e 70% relataram que fazem uso frequente de
jaleco e luvas. Isso é um dado alarmante, porquanto 30% dos profissionais ainda resistem
em não utilizarem luvas. Para eles, a possibilidade de contágio de patologias pelo contato
direto com fluidos corporais se torna eminente.
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Equipamentos de Proteção Individual utilizados por categoria
profissional
120%
Percentual das respostas positivas
por categoria profissional
100%
80%
60%
Jaleco
Luva
40%
Máscara
20%
0%
Cabeleireiro/Tinturista
Manicure/podólogo
Esteticista
Figura 5. Principais equipamentos de proteção individual citados pelos entrevistados.
De acordo com a figura 6, os profissionais cabeleireiros entrevistados afirmaram que
as principais patologias a que estão expostos compreendem: Micoses de cabelo e
Onicomicoses (cerca de 53% dos entrevistados afirmaram positivamente que estão
expostos), Micoses de pele (cerca de 46%), Hepatite (46%, aproximadamente), AIDS (cerca
de 46%), Gripe (30%), Hanseníase (27%), Escabiose (27%), Pediculose (27%). Na categoria de
manicures e podólogos, as principais patologias apontadas foram: Hepatite (80% dos
entrevistados), AIDS (70%), Micoses de unha (90%), Micoses superficiais de pele (60%), Gripe
(60%), Escabiose (20%) e Pediculose (20%). Quando foi perguntado aos profissionais
Esteticistas, quais as principais patologias apontadas como de risco ocupacional, estes
mostraram preocupação com: Hepatite (cerca de 67% deles afirmaram positivamente), AIDS
(cerca de 67%), Escabiose (50%), Pediculose (50%), Onicomicoses (33%), dentre outras.
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Principais patologias apontadas como de risco pelo exercício
profissional
Percentual das respostas positivas
por categoria profissional
100%
90%
80%
70%
60%
50%
40%
30%
Cabeleireiro - Tinturista
20%
Manicure - Podólogo
10%
Esteticista
0%
Figura 6. Percentual das principais patologias apontadas pelos entrevistados quanto ao risco de
contágio pelo exercício profissional.
No exercício laboral desses profissionais, de fato, compreendem riscos ocupacionais,
visto que as micoses podem ser transmitidas pelo uso de toalhas, de lenços, de protetores
de cadeira e de macas, bem como outros instrumentos. A Hepatite viral é causada pelos
Hepatitis vírus e provocam danos no fígado, podendo levar até 30 anos para se manifestar,
podendo levar a disfunções hepáticas irreversíveis. Sabe-se que esses vírus podem estar sob
a forma infectante em até 72 horas em materiais com sangue ou secreções corpóreas
contaminados (BRASIL, 2005; CDC, 2010; FERREIRA, 2000). Outra patologia que oferece risco
ocupacional dos profissionais da Beleza é a AIDS, causada pelo HIV e transmitidas por
instrumentos perfuro-cortantes, embora a contaminação pelo exercício profissional em
salões de beleza seja pouco frequente. Apesar disso, também deve ser considerada por se
tratar de uma patologia incurável. E ainda outro risco a ser considerado é o tétano, causado
pela bactéria Clostridium tetani, que é extremamente resistente sob a forma de esporo no
ambiente e que pode ser transmitido por instrumentos perfuro-cortantes como os alicates e
as tesouras contaminadas. Portanto, é recomendável que os cabeleireiros que ao fazerem
uso de instrumentos perfuro-cortantes utilizem também luvas descartáveis, bem como
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substituam lâminas cortantes descartáveis e esterilizem outros tipos de instrumentais
importantes. Além disso, que utilizem recipiente próprio e adequado para descarte de
lâminas utilizadas. E ainda recomenda-se a higienização adequada das mãos e de cada
material de trabalho necessário (SILVA, 2010).
Outras patologias a que os cabeleireiros estão expostos, pode-se citar a escabiose e a
pediculose. A primeira é conhecida popularmente como sarna é causa por uma espécie de
ácaro Sarcoptes scabei. É considerada altamente infecciosa e transmissível. Costuma
provocar lesões cutâneas. A pediculose é causa pelo Pediculus humanus capitis. Ambas as
patologias podem ser transmitidas pelo uso compartilhado de toalhas, de lençóis, de
protetores de cadeiras e de macas que não foram devidamente higienizados ou então que
não foram substituídos. Vale ressaltar ainda que essas patologias constituem riscos não só
para os profissionais da Beleza, mas também para a sua clientela atendida, além de outros
indivíduos.
Percentual das respostas positivas por categoria profissional
Vacinas recebidas recentemente pelos
entrevistados
50%
45%
40%
35%
30%
Vacina Hepatite B (Grupos
vulneráveis)
25%
Vacina Tétano
20%
Vacina Influenza H1N1
15%
10%
Vacina Rubéola
5%
0%
Cabeleireiro Tinturista
Manicure Podólogo
Esteticista
Figura 7. Principais vacinas recebidas recentemente pelos entrevistados.
Conforme a figura 7 pode-se perceber que menos da metade dos profissionais
entrevistados receberam vacinas contra Hepatite B, Tétano, Influenza e Rubéola. A
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antitetânica é um tipo de vacina que deve ser aplicada, no mínimo, a cada dez anos;
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antigripais são necessárias anualmente, em especial pelos recentes surtos de Gripe H1N1,
não raro, letais. A vacina para Hepatite B deveria ser utilizada por todos os profissionais da
área da Beleza, em virtude do elevado de transmissão da patologia, devido ao contato com
fluídos corporais de clientes. Desse modo, essas são patologias graves e que podem ser
prevenidas com o uso de vacinas, que deveriam estar acessíveis e disponíveis para os
profissionais da área da beleza.
Conclusões
No presente trabalho, percebeu-se que os profissionais da área da Beleza estão
expostos a relevantes riscos patológicos à sua saúde. Isso também se estende a sua clientela
atendida. As principais doenças a que podem estar expostos incluem Hepatites virais,
Micoses superficiais, Influenza,
AIDS, Pediculose. A infecção a tais patologias está
relacionada com a falta de utilização ou com a utilização insuficiente e indevida de
equipamentos de proteção individual (EPI). E ainda, verificou-se que o uso de procedimentos
de desinfecção ou esterilização tem sido pouco e mal empregado. Além disso, vale destacar
a falta de orientação adequada quanto à necessidade de utilização de vacinas, como meio de
prevenção de graves doenças relacionadas à exposição no exercício profissional. Desse
modo, vale ressaltar a necessidade urgente de ações de qualificação, quanto aos aspectos de
saúde coletiva, dos profissionais envolvidos. Ainda há muito a ser feito. Espera-se que as
autoridades competentes possam colaborar na prevenção dessas doenças, em especial em
ações que visem à vacinação dos mesmos, sobretudo, em eventos científicos e profissionais.
Referências:
ALAM, M; GLADSTONE, H. & TUNG, R. Dermatologia Cosmética – Requisitos em
Dermatologia. Rio de janeiro: Elsevier, 2010.
ANVISA - Associação Nacional de Vigilância Sanitária. Listagem dos cosméticos aprovados
formulados no Brasil e outras informações importantes sobre segurança e sobre a qualidade
dos produtos cosméticos. Disponível em http:www.anvisa.gov.br/cosmeticos/inci.htm,
acesso em 15 de abril de 2012.
BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Resolução nº. 481, de
23 de setembro de 1999. Estabelece os parâmetros de controle microbiológico para os
produtos de higiene pessoal, cosméticos e perfumes conforme o anexo desta resolução,
Brasília, 1999.
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BRASIL. Ministério da Saúde – Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância
Epidemiológica. Doenças infecciosas e parasitárias. 4ª ed., Brasília: Ministério da Saúde,
2004.
BRASIL, Ministério da Saúde. Boletim Informativo do Ministério da Saúde. Programa de
Controle de Infecção Hospitalar. Lavar as mãos: Informações para profissionais de saúde.
Brasília, 2005.
BRASIL. Ministério da Saúde – Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância
Epidemiológica. Hepatites virais. 2ª ed., Brasília: Ministério da Saúde, 2005.
CDC - Centers for Disease Control and Prevention. Department of Health & Human Services. Division
of Viral Hepatitis. Publication No. 21-1073. New York, 2010.
FERREIRA, M. Diagnóstico e tratamento da Hepatite B. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina
Tropical 33 (4):389-400, jul-ago, 2000.
GERSON, J. Fundamentos de Estética - Ciências da Pele. 10ª ed., São Paulo: Cengage Learning, 2011.
GERSON, J. Fundamentos de Estética – Estética. 10ª ed., São Paulo: Cengage Learning, 2011.
GOMES, R. & DAMAZIO, M. Cosmetologia – Descomplicando os principais ativos. 3ª ed., São Paulo:
LMP Editora, 2009.
HALAL, J. Tricologia e a Química Cosmética Capilar. 5ª ed., São Paulo: Cengage Learning, 2011.
KEDE, M. & SABATOVICH, O. Dermatologia Estética. 2ª ed., São Paulo: Atheneu, 2009.
MURRAY, P; ROSENTHAL, K. & PFALLER, M. Microbiologia Médica. 6ª ed., Rio de Janeiro: Elsevier,
2009.
SILVA, A. Manual de Vigilância Epidemiológica e Sanitária. 1ª ed., Goiânia: AB Editora, 2010.
Agradecimentos
Agradecemos a Universidade Estadual de Goiás, em especial a Pró-reitoria de Pesquisa da
UEG pelo financiamento e a Unidade Universitária de Goiânia Laranjeiras pela viabilização
para realização da presente pesquisa científica. Agradecemos também aos profissionais
entrevistados. Agradecemos ao Corpo Editorial da Revista Visão Acadêmica pela
oportunidade concedida.
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A Imigração italiana, séculos XIX-XX, em Nova Veneza-GO: contribuições para a cultura
Iraci Garbim de Souza14
Resumo Com o fim da mão-de-obra escrava no Brasil veio à necessidade de supri-la por
outra melhor e superior à existente devido à chegada do sistema capitalista no país. O Brasil
então passa a necessitar de mão-de-obra para a lavoura de café, iniciando assim a
introdução do imigrante para substituir a mão-de-obra escrava, e para colonizar as extensas
terras devolutas existentes. Para o Governo, era também a oportunidade de povoar o país
por pessoas brancas, portanto, iniciam-se as políticas públicas para trazer os imigrantes
europeus, voltando à atenção para um país: a Itália. Foi ele quem mais se destacou em
quantidade de pessoas que imigraram para o Brasil, devido a problemas políticos e
financeiros que a Itália vinha atravessando. Diversos grupos imigraram para o Brasil,
especialmente para as regiões Sul e Sudeste e posteriormente um pequeno grupo chegou à
região Centro-Oeste do país. Esse pequeno grupo ajudou na construção do Estado de Goiás,
fundando a cidade de Nova Veneza, no contingente de pessoas, que irá marcar
profundamente a formação social e cultural regional, com repercussão nacional, sendo esta
cidade, hoje, conhecida como um pedaço da Itália em Goiás, com a criação do Festival
Italiano Gastronômico Cultural, realizado anualmente na cidade.
Palavras-chave: Imigração Italiana. Processo imigratório. A fundação de Nova Veneza.
Movimento Cultural.
Introdução
Esta pesquisa versa sobre um grupo de italianos que imigraram para Nova Veneza no
estado de Goiás, em 1912. Serão analisados os motivos pelo qual houve, por parte dos
políticos e das políticas públicas brasileiras, o incentivo da imigração para o Brasil. Com
destaque para a imigração europeia.
Destina-se a buscar elementos que auxiliem na compreensão das contribuições dos
imigrantes italianos, em torno da colonização do Brasil, sua participação nas transformações
ocorridas no país e principalmente no Estado de Goiás nesse período e na
contemporaneidade. Desde a agricultura cafeeira até o crescimento econômico social e
cultural com a mão-de-obra assalariada no nosso sistema capitalista agrário. Sendo o
processo de unificação da Itália, um processo relativamente tardio quando comparado a boa
parcela dos países da Europa um dos fatores que nos auxiliará a compreender este processo
de imigração. Sobre a unificação da Itália, um dos fatores a dificultá-la foi a força das
regionalidades dentro do que hoje se denomina Itália, que por séculos foi uma região
dividida em territórios autônomos conforme se verá no mapa a seguir.
14
Iraci Garbim de Souza é graduanda do quarto ano do curso de História da UEG, UnU cidade de Goiás.
Professor indicador do trabalho: Luiz Antônio Lopes Gomes, do curso de História da UnU cidade de Goiás.
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Figura
1
A
Península
Itálica
antes
http://sandrabergantini.com/portuguese/curiosidades.php
da
unificação.
Fonte:
Na figura 1.2, observe que os territórios estão unidos, formando a nação Italiana.
Figura 2 Mapa da Itália após a unificação. Fonte:
http://1.bp.blogspot.com /mapa_italia.jpeg.gif.
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Um dos elementos que demonstram a relativa fragilidade da noção de
pertencimento à nação Itália por parte da população das classes menos abastadas é o pouco
interesse e pouca participação efetiva desses segmentos no processo de unificação da Itália.
Estes não se sentiam italianos, mas sim Toscanos, Vênetos e Sicilianos. Segundo Bertonha
um número inferior a quatro por cento dos habitantes do novo território falavam italiano,
portanto, o idioma não era falado no dia-a-dia nem mesmo pela maioria das pessoas dos
segmentos com rendimentos mais substanciais.
Todos os outros falavam dialeto Napolitano, Vêneto, Piemontês e outros e tão
incompreensíveis entre si que alguns professores piemonteses, enviados à escola
da Sicília em fins do Século XIX, foram tomados por ingleses pela população local.
(BERTONHA, 2008, p. 56)
Segundo Bertazzo (1992), os camponeses Sicilianos que assistiram ao Exército de
Garibaldi invadir a ilha aos gritos “Viva Garibaldi! Viva a Itália! ˝ perguntaram aos vizinhos se
Itália seria a sua esposa, pois tão distante era para eles a ideia de Itália, que em pleno século
XIX, era mais adequado falar em várias Itálias, dependendo da região e aos grupos sociais
aos quais se fazia referência.
˝Fizemos a Itália, agora precisamos fazer o italiano˝ (D’AZEGLIO, 1866 apud
BERTONHA, 2008, p. 56). Assim, nos anos seguintes surgia à necessidade de construir ou
criar uma Nação, uma língua, uma cultura e uma história, com uma nova padronização, uma
Nação italiana reformulada. Um dos locais em que esta diferença se mostraria seria na
relação entre Norte e Sul da Itália
Causas do êxodo Italiano
As causas da saída dos italianos de seu país de origem se deram pelas razões já
apresentadas mostrando que uma das principais causas são o fator econômico e
crescimento vegetativo da população na Europa. As pessoas que saiam estavam à procura
do mínimo necessário para a sobrevivência (B7ertazzo, 1992).
Para Bertonha (2008) o crescimento rápido da população trouxe dificuldades, pois se
tornou difícil conseguir trabalho. Muitas pessoas ficaram sem opção de emprego, e para não
morrerem de fome, o jeito foi trabalhar nas fábricas como operários, ou saírem para tentar a
vida em outros lugares, e foi isso que a maioria das pessoas preferiu.
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Principais Países de emigração e imigração - 1846 a 1932
Países de emigração (em milhões de emigrantes)
Escandinávia
2,1
Polônia e Império Russo
2,9
Alemanha
4,9
Império Austro – húngaro
6,2
Espanha e Portugal
6,5
Itália
11,1
Grã - Bretanha e Irlanda
16,0
Países de Imigração (em milhões de imigrantes)
Estados Unidos
32,4
Argentina e Uruguai
7,1
Canadá
5,2
Brasil
4,4
Austrália e Nova Zelândia
3,5
Fonte: Bertonha, 2008, p.83.
Italianos no Brasil
A imigração italiana no Brasil teve o seu auge entre 1880 e 1930. Esses dados são da
embaixada italiana no Brasil. Cerca de 25 milhões de descendentes de imigrantes italianos
vivem no país, conhecidos como ítalo-brasileiros, e estão espalhados por todo o país, sendo
predominantes em algumas regiões, tais como: região sul e sudeste, em grande quantidade
em São Paulo.
A maioria dessas pessoas que deixaram esta região da Itália era camponesa e
passavam por um período de dificuldade financeira em seus locais de origem. Com isso,
vieram tentar a sorte no Brasil, viajando ao lado de artesãos e pequenos comerciantes que
se dirigiram para o chamado Novo Mundo.
“Na Europa, muitos aliciadores ainda davam sua colaboração, prometendo condições
paradisíacas na Nova Terra”. (CAMILO; BARBOSA; SANTOS, 2001, p. 11).
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Figura 3 Panfleto usado para chamar atenção dos italianos. Fonte:
http://www.projetoimigrante.com.br
Os motivos foram variados, mas o Novo Mundo atraía muitas pessoas com
propagandas de políticas públicas. Este povo embarcava em navios com o sonho de
conseguirem fazer fortuna no Brasil. Os governos sul-americanos, o brasileiro e a classe
dominante, sejam os políticos, os grandes latifundiários e/ou os barões do café estimularam
a imigração porque seria um bom negócio.
“O sistema de imigração contava quase sempre com a preferência dos grandes
proprietários de São Paulo, que necessitavam de braços para a lavoura cafeeira”. (BRITO,
1992, p. 20).
Portanto, os imigrados tinham muita esperança de melhorar de vida, mesmo que
muitos não conseguissem isso na proporção desejada. Porém, mesmo com dificuldades, os
imigrantes conseguiram um lugar de destaque no mercado de trabalho rural, pois eram os
preferidos pelos brasileiros, ao invés dos caboclos, mulatos e negros que tinham intenção de
permanecer como mão-de-obra temporária. A situação dos trabalhadores rurais imigrados
chegou a ser objeto de decisão judicial dos governos estrangeiros, em especial da Itália,
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chegando a registrar a criação de instituições de proteção, os “Instituti di Patronato”, e
também outro órgão, o “Patronato Agrícola”, que tinham a finalidade de observar a
aplicação das leis regulamentadoras dos acordos de trabalho e favorecer a fiscalização e as
atividades das cooperativas dos imigrantes e dos trabalhadores agrícolas: os socorros
médico e farmacêutico, assistência educacional e também promover o auxilio jurídico, de
graça, aos colonos. Mesmo com os agraves, o Governo de São Paulo incentivava na Europa,
em especial por meio de propagandas, a divulgação da condição dos imigrantes aqui já
alojados e as condições oferecidas aos novos, de maneira a beneficiar a continuidade da
corrente imigratória europeia, e em especial a italiana.
A consolidação do trabalho livre, assalariado, decorrente da imigração fortaleceu o
mercado interno brasileiro, criando condições para a posterior expansão industrial
do país. O governo de São Paulo começou a financiar suas passagens destes a
construção da hospedaria do Brás (1888), que conseguia abrigar até quatro mil
pessoas de uma vez. Assim o imigrante chegava ao Brasil sem dever a ninguém,
instalavam-se na hospedaria até que se conseguisse uma fazenda para trabalhar.
(CAMILO; BARBOSA; SANTOS, 2001, p. 13).
A Hospedaria dos Imigrantes, hoje Memorial dos Imigrantes, tem arquivos em que
constam os dados de todos os imigrantes, conforme Anexos um e dois.
Figura 4 Memorial do Imigrante,
http://www.projetoimigrante.com.br
antiga
Hospedaria
do
Imigrante.
Fonte:
121
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Assim, os imigrantes conseguiram chamar a atenção, tanto do Governo Imperial
quanto dos cafeicultores, sobre sua importância como mão-de-obra livre assalariada.
Embora ainda não seja como o Governo Imperial prometeu, por meio das propagandas que
estimularam o italiano a deixar seu país, aos poucos eles vão se destacando.
A Imigração em Goiás
Em Goiás, segundo os professores e historiadores, Adaguimar Antônia Pacheco
Camilo, Elizabeth Fernandes Silva Barbosa, Marcondes Rodrigues dos Santos (2001), o
grande estimulador da imigração foi o governador Jerônimo Coimbra Bueno, que notava a
ignorância do lavrador quanto à necessidade da implantação e uso de novas técnicas na
agricultura e a dispersão das pessoas em diversas direções pelos campos, e logo viu na
imigração uma alternativa para resolver esses problemas. Goiás era um Estado pobre e
estava com dívidas, não podendo tomar sozinho a iniciativa de uma imigração. Portanto,
recebeu o apoio de Eurico Gaspar Dutra, que era Presidente da República, e do Conselho de
imigração e da colonização, o que equivaleria falar com certeza de dinheiro federal.
O governo federal exerceu importante papel no movimento de interiorização nas
décadas de 1940 e 1950 com a marcha para o oeste, no Estado de Goiás. O
desenvolvimento do Estado não pode ser analisado somente pelo prisma da
estrada de ferro e sim como a conjugação de vários fatores estratégicos, políticos e
econômicos criados pela ascensão do capitalismo em expansão (CAMILO;
BARBOSA; SANTOS, 2001, p. 17).
Segundo Brito (1992), enquanto passava da integração parcial ao Comércio
Econômico Internacional, o Estado de Goiás, localizado no centro do Brasil, longe das regiões
litorâneas pouco foi atingido pelos acontecimentos que vieram do exterior, entretanto, o
Estado que se localizava no subúrbio deste sistema agrário exportador, não ficou alheio à
causa imigratória. Em Goiás houve a inquietação com a importação da mão-de-obra
estrangeira e estabelecida devido dificuldades internas do desenvolvimento na agricultura
da região.
Em síntese, a agricultura goiana mostrava a seguinte aparência nessa época: tinha
uma pequena produção para a própria despesa interna; não existia motivação para o
trabalho agrícola; tinha também a falta de gêneros alimentícios nesta localidade, e os
políticos já estavam preocupados com esta situação.
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Para a autora, a caída da mineração e o não aparecimento de outra atividade
lucrativa, bem como a localização geográfica de Goiás, foram os motivos da falta de
imigrantes em Goiás, no início de sua chegada ao Brasil, em 1808.
Com tudo isso, mesmo antes da libertação dos escravos, muitas vozes se ergueram
em Goiás defendendo a vinda de imigrantes para resolver o problema do fornecimento
interno, que era frágil desde a época colonial. Porém, a política estimulante da imigração
estrangeira no Brasil foi intensificada em 1870, em consequência da expansão cafeeira, mas
em Goiás, apenas em 1871 é que foram divulgadas duas propostas. A primeira tratava do
modelo dos contratos para introdução dos imigrantes europeus nas fazendas agrícolas de
São Paulo, e como seria a divulgação dos proveitos que o governo central oferecia aos
fazendeiros, agricultores e suas propriedades. A segunda era um recado enviado para o
presidente da província fazendo conhecer a existência em Portugal de uma pessoa
responsável pelo Serviço de Imigração Europeia exclusiva para os Portugueses.
Indicando, portanto, aos imigrantes portugueses que viessem para a Região CentroOeste, que nada lhes seria exigido. As propostas foram publicadas pelo Correio Oficial, mas
não despertaram interesse.
Com a libertação dos escravos, em 1888, surge um despertar pela causa imigratória
devido à falta de braços para a lavoura e isso teria como consequência a crise na agricultura.
Mesmo assim, a causa não estava defendida. Iniciou-se a crise com a escassez de quase
todos os gêneros de alimentação pela falta de trabalhadores nas lavouras, mas surgiram
algumas formas para solucionar o problema da introdução de trabalhadores estrangeiros
nas lavouras, aumentando o controle produtivo da terra com a cultura científica e a
diminuição do homem nas lavouras. Substituindo-os pelas máquinas, melhorando as linhas
de comunicação existentes e organizando outras melhorias, como a criação de bancos para o
povo, pequenas associações de créditos, que proporcionariam aos lavradores o dinheiro
necessário para os mantimentos de suas fazendas, e a implantação de institutos e escolas de
agronomia que orientassem na exploração científica da terra.
Contudo, ainda no final do século, não havia nenhum movimento imigratório
chegando ao Estado de Goiás. Era visível nesse período o problema da falta da mão-de-obra
na região central e a vontade dos produtores em adquirir braços estrangeiros para as suas
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lavouras. O exemplo desta espera estava o senhor Joaquim de Araújo, proprietário de uma
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boa plantação de café, porém, com a abolição dos escravos, o dono batalhava com muito
ardor por não haver mão-de-obra disponível, e dizia não poder contar com os braços
estrangeiros no Estado de Goiás. Os resultados e reflexos da política imigratória nacional
chegaram ao Estado de Goiás, com suas ofertas concretas, somente na segunda metade do
século XIX. Porém, o Estado encontrava-se com a situação econômica desfavorável em
relação às regiões litorâneas do país.
Devido ao tipo de agricultura, Goiás não despertou demanda de mão-de-obra, como
nas lavouras cafeeiras. Conclui-se que devido à falta de vias de comunicação, e também de
linhas férreas ou fluviais, o tráfego tornava-se difícil, dificultando a integração e a
comercialização com outros lugares.
Em relação aos demais estados, Goiás permanecia atrasado devido à baixa
densidade populacional e aos baixos índices de produtividade da terra, a ausência
de meios de transporte e comunicação modernos e no inexpressivo
desenvolvimento urbano. (CAMILO; BARBOSA; SANTOS, 2001, p. 16).
Os fluxos imigratórios que se dirigiram para o Estado de Goiás cooperaram para que
fossem fundados os núcleos dos estrangeiros na região goiana, e alguns conseguiram
crescer, chegando a prosperar, levados pelas ajudas oferecidas e também devido às ótimas
qualidades do solo e pelo êxito do cultivo do café. O número de habitantes estrangeiros em
Goiás até o ano de 1920 era uma quantidade insignificante. Os dados estatísticos evidenciam
a pouca influência dos estrangeiros na formação populacional de Goiás.
“A integração do Estado à economia nacional aconteceu a partir de 1915, quando o
conflito mundial fez aumentar a demanda de produtos agropecuários nas áreas
cafeicultoras”. (CAMILO; BARBOSA; SANTOS, 2001, p. 16).
A Chegada em Goiás
Em Goiás, os primeiros grupos de italianos eram constituídos por sete famílias todas
consangüíneas ou formadas por matrimônio. Ao desembarcarem, um proprietário de terras
empregava as famílias, falava que havia uma casa e tudo o que necessitassem. Ao chegar à
propriedade, colocava-os em um depósito ou paiol de café, sentindo justo fazer-se aceitar
tal hospedagem. O manifesto dos recém-chegados foi pegar suas malas e seus pertences e
sair da fazenda. O proprietário chamou a polícia, que saiu a procura dos imigrantes, estes
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foram presos e ficaram na delegacia até o representante do consulado italiano tirá-los de lá.
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Acontecimento como esse era contínuo, chegando a tal ponto da amizade entre a Itália
oficial e o Brasil se irritar, tanto que o governo italiano baixou o chamado “Decreto Prinetti”
que impedia a passagem de graça dos italianos para o Brasil, desta forma faria perder o
estímulo às viagens.
Figura 5 “Decreto Prinetti” Fonte: http://www.projetoimigrante.com.br
Essas famílias que vieram não permitiram que se afastassem pelo novo meio social e
pela nova situação. O novo imigrante inseriu-se, se adaptaram - um período de acomodação
e esperança – à nova vida em Goiás. “As sete famílias que labutavam juntas, na realidade
formavam uma só família, uma grande e única família, ou uma “família extensa”. Saindo da
Itália, os filhos trouxeram consigo também os velhos pais, Santo e Elena”. (BERTAZZO, 1992,
p. 67).
Já de idade e sem a clareza, o velho Santo Stival, repentinamente colocava-se em pé
e começava a caminhar em direção a porta, dizendo ele determinado: “vago in Itália; ciapo
sta strada e vago in Itália”. Antes de viajar para o Brasil, ele já tinha vindo à América Latina,
fiscalizado o Uruguai, a Argentina e o Brasil.
Veio a mando na dianteira para investigar e tomar conhecimento das condições e
ver as possibilidades de mudar com a família. De volta à Itália, casou-se com dona Pásqua
Fachin e trouxe a família. Mesmo sendo analfabeto - um fato comum naquele tempo na
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Itália - seu João Stival, andou o mundo e gostava de aproximar-se das pessoas. É recordado
como uma pessoa falante, desembaraçada de muitas iniciativas e ousada, diferente do
irmão Césare que era visto como uma pessoa controlada, mas muito laboriosa e não tinha as
efusões que as características lhes concederam, com tamanha bondade a todos os Italianos.
Portanto, era normal que João tivesse amplo poder do grupo, cumprido as obrigações
jurídicas, usando o seu nome e sua pessoa, então quem adquiria as terras era o ofertante da
área na qual se construiu a cidade de Nova Veneza. Após ele, porém, existia todo o centro
familiar.
Em Goiás, em Nova Veneza, as condições de estabilização foram diferentes, das quais
foram introduzidas na região Sul do Brasil, em que os imigrantes foram colocados no meio
da selva. Para o autor, era de regra que eles criassem de novo o ambiente que deixara na
Itália. Já em São Paulo, o imigrante submeteu-se a uma organização social e econômica
autoritária, e aos fazendeiros cafeicultores. Portanto, as organizações brasileiras
prosseguiram a dominar, mesmo com as grandes contribuições que os imigrantes
adicionaram à cultura e aos costumes paulistas.
Ao chegarem a Goiás, o principal objetivo dos imigrantes era arrumar acomodações,
e de início foram tomadas as providências para a construção de uma casa grande, com
muitos cômodos para que todos pudessem se acomodar. Já instalados, nos primeiros dias na
lavoura, plantaram o básico para o sustento diário se preocupando com o arroz, o feijão, a
mandioca e com a horta. Em suas mesas a verdura não podia faltar, a mesma recordava os
tempos de jejum de alimentos na Itália, e bons italianos que eram diante da esquivança dos
goianos que se orgulhavam de “não comer mato”.
Conforme a situação foi se ajeitando, a prioridade foi para as lavouras de comércio e
depois para a lavoura de sustento, um lugar que não desse para o alimento, seria
inconcebível, com o mundo cultural de quem já tinha visto lugares e situações adversas.
Viajar tanto, para ficar na mesma situação, não era justo. “A primeira devastação de mata
colocou aos chãos cinco alqueires de mata”, recordava o senhor Tite. “Está doido?” falavam
as pessoas do local, deslumbrado e cético. Não se via naqueles lugares tantas roças de uma
só vez.
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Costumes e Tradições
Para os filhos, a vida era aqui e para os pais a vida prosseguia pela metade lá. A mesa
com fartura de comida que todos comiam e sobrava, era indício de sonhos concretizados.
Alimentar-se muito era um orgulho. Em dias de comemorações havia até disputa para ver
quem comia mais. Essa grande quantidade dos sobejos e até o esbanjamento parecia quase
uma desforra contra o passado de carência, miséria e de privação do necessário. Segundo
Bertazzo (1992), sem hesitação, é da fome “psíquica” que falava o senhor Antônio Cândido,
esta era a “vontade permanente de associações queridas”, unido ao desejo de fartura,
depois de um tempo de fome, escassez de víveres; mesa farta depois da penúria. Os pratos
quase sempre com carne de porco e frango, já assados no jeito bem apresentados para
serem comidos. O senhor Tite afirmava que “os velhos falavam que o estado de Goiás era o
Jardim do mundo”. O senhor Augusto Peixoto fala com exatidão que os velhos consideravam
aqui um “paraíso”. No íntimo do coração, sinônimos do “paese dela cuccagna”, deram forma
aos sonhos dos pobres para os quais certamente, “pátria é onde se come” declara um
provérbio Vêneto.
Esta propensão para festa percebe-se claramente numa prática usual própria de
Nova Veneza: a treição. O nome é uma corruptela lugar da palavra traição, para simbolizar o
inesperado, a estranheza, o espanto de alguém que, de repente, é surpreendido no meio da
noite por um grupo de violeiros e sanfoneiros, e por cantorias que os chamavam, os
intimava a ir para o trabalho. Preparava-se tudo com muito cuidado, pois era uma forma de
levar socorro a quem estava com os trabalhos da lavoura atrasados, e para evitar uma
situação pior, sem medir a precisão de quem necessitava ou estava em dificuldade.
Outro fator que contribuiu para o enraizamento dos italianos em Goiás foi o
catolicismo. O imigrante trouxe em sua bagagem ferramentas, sementes e pouquíssimos
objetos que o permitiria começar a sua vida, não faltando na bagagem os livros com suas
rezas, quando sabiam ler, e as estátuas dos santos padroeiros de sua igreja de devoção.
Na falta de padres para a celebração das cerimônias litúrgicas e das devoções,
alguém mais capacitado era escolhido para presidir as rezas e as reuniões e benzer
os doentes e os mortos. Em alguns lugares era chamado de “padre do mato”.
(BERTAZZO, 1992, p. 107).
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Segundo Bertazzo (1992), quem conhece as regiões mais afastadas do Brasil onde
existiam os grandes proprietários de terras, sabe que o “coronel”, além de proprietário da
terra, tomava posse dos trabalhos, dos votos políticos e até das decisões religiosas dos
funcionários. Portanto, a igreja da propriedade ficava aos cuidados da mulher do coronel, e
era o principal local religioso, onde o vigário era chamado, acomodava-se na casa do
fazendeiro, e era uma grande ajuda na imposição das ideias do fazendeiro. A proteção
exagerada aos subordinados fazia com que o coronel fosse o padrinho de batismo dos filhos,
concluindo as relações entre os dois, somadas à proteção, o fazendeiro unia os laços de
humildade e fidelidade toda ao dependente.
Figura 6 Atual Igreja Nossa Senhora do Carmo. Fonte: Iraci Garbim de Souza (2011)
No dia 16 de junho havia as comemorações da santa padroeira Nossa Senhora do
Carmo, trazida da Itália em 1912, que neste próximo ano (2012) estará completando cem
(100) anos da sua chegada à cidade Nova Veneza. As festividades tradicionais de
comemorações, onde a língua, os costumes, as comidas típicas, e as tradições religiosas,
estão presentes, mostra um forte sentimento à terra natal.
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“Os italianos que chegaram a Goiás tinham uma trajetória um pouco diferente da dos
imigrantes que se estabeleceram no Sul brasileiro, embora conservassem características
parecidas e comungassem da mesma cultura”. (BERTAZZO, 1992, p. 107)
Segundo Bertonha (2004), os laços entre os italianos e brasileiros eram unidos em
vários costumes dos imigrantes por serem feitos como seus pelos brasileiros, exclusivamente
em São Paulo e no Sul. No começo do século XX, por exemplo, ouvia-se nas avenidas de São
Paulo e, em particular, nos bairros populares italianos como Brás, Bexiga e Barra Funda, mais
dialetos italianos que o português. Muitas das pessoas que visitaram São Paulo, nesses anos,
impressionaram-se com o grau de influência da cultura, da culinária e do estilo de vida
italiano na cidade. Com o passar do tempo iniciou-se outra cultura, a mistura brasileira com
a italiana, ou seja, a mais adequada: ítalo-brasileira. Portanto, esta nova cultura, não só com
costumes, músicas e características peculiares, mas também com um dialeto próprio
construído pela junção do português e do italiano, bem desempenhada pela música de
Adoniran Barbosa, descendente de italiano. Essa cultura ítalo-brasileira, com o passar do
tempo, se tornou pouca ativa em São Paulo, mas ainda se mantém presente em
comemorações de San Genaro, na Mooca, e de Nossa Senhora Acheropita, no bairro da
Bexiga.
Ao chegar à cidade, o primeiro impulso do italiano era tentar reconstituir a
comunidade rural de origem; recompor um ambiente familiar no qual a língua, os
conterrâneos e os alimentos conhecidos lhe devolvessem os sentimentos de
segurança e de unidade que haviam ficado para trás, além do Atlântico.
(MACHADO, 1993, p. 07)
Para os imigrantes e seus descendentes, os encontros funcionavam como um
conforto para as suas saudades, vindo posteriormente a fazer parte também da cultura do
Brasil, logicamente passando por modificações e aculturações, que foram muito bem
condicionadas pelos descendentes de ambas as regiões. Tanto no Sul como no Centro-Oeste
em Goiás, em Nova Veneza não foi diferente, vindo a dar início ao Festival Italiano
Gastronômico e Cultural.
Para que este festival acontecesse foi preciso unir forças e culturas entre o Sul e
Goiás, abrir mão do individualismo e olhar para o bem que eles estariam fazendo com essa
união. Foi como se a Itália, e a Europa de alguma forma se aproximassem de Goiás a ponto
de permitir que as diferenças assumissem características positivas. O Festival Italiano
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Gastronômico é um festival inspirado na Itália, mas com características da região na qual os
descendentes dos imigrantes agora estão. O curioso é que a partir das inovações trazidas
para o festival, pode ser que este seja mais um festival Italiano-Brasileiro de gastronomia do
que um festival essencialmente voltado para as tradições ainda presentes ou algum dia
presentes na Itália.
Figura 7 Caravana de Nova Veneza de GO, em Nova Veneza, Santa Catarina no RS.
Fonte:http://www.festivalitaliano.net/2009/index.php?option=com_content&view=category&layout=blog&i
d=48&Itemid=75
Assim, essa herança se tornou realidade, sem perder a essência, mantendo os
traços deixados pelos seus pioneiros. Ao mesmo tempo foram acrescentadas, mas também
preservadas as características dos alimentos, das rezas e danças.
Como normalmente
acontece no encontro de culturas, houve conflitos, assimilações e doações. Sendo que no
caso dos imigrantes italianos aqui analisados, as assimilações e doações foram fortes o
bastante para reduzir a força dos conflitos, permitindo que Nova Veneza e os imigrantes de
certa forma se sentissem em casa em Goiás. Não mais como italianos, mas como brasileiros
que de alguma forma tem suas raízes reconhecidas não apenas pelos descendentes das
famílias dos imigrantes, mas também por boa parte das pessoas já anteriormente residentes
em Goiás.
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Figura 8 Baile de máscaras. Fonte: Iraci Garbim de Souza (2011)
Em meio a essas riquezas, é possível degustar durante os dias de festa: lombo de
porco, macarronadas, pizzas, carnes cozidas conservadas em latas, queijos, frutas e outras
iguarias da cozinha italiana. Os descendentes italianos de Nova Veneza, juntamente com os
amigos da região Sul, mantêm intercâmbios durante as comemorações das duas localidades.
Figura 9 Ponte demonstrando a continuidade da tradição Italiana
Fonte:http://www.google.com.br/imgres?imgurl=http://mw2.google.com/mw
Nova Veneza, buscando manter as tradições da cultura italiana, e buscando resgatar
as tradições culinárias dos fundadores, em 2003, iniciou este festival. Sua primeira edição,
contou com o apoio do prefeito: Osvaldo Stival, filho de João Stival, um dos fundadores da
cidade. O evento tem superado as expectativas em público, como na última edição.
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Figura 10 Dança típica italiana Fonte:
http://www.festivalitaliano.net/2009/index.php?option=com_content&view
&id=70&Itemid=82
=article
A cidade se veste de vermelho, verde e branco para recordar a velha pátria, com
várias atrações que vão desde o baile dos mascarados, como outros eventos na praça central
onde sua ornamentação e arquitetura também lembram a Itália. O público é recebido em
volta dela, tendo tendas com mesas e cadeiras, onde são vendidos os pratos típicos e as
bebidas da Itália. Nova Veneza também adotou a língua italiana nas escolas de iniciação
infantil, assim, as crianças aprendem desde pequenas a falar italiano.
Figura 11 Coral infantil apresentando músicas Italianas. Fonte: Iraci Garbim de Souza (2011)
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O Festival Gastronômico, atualmente, vem ocupando grande destaque durante sua
realização, tendo espaço na mídia e nos jornais devido ao grande número de visitantes, de
diferentes lugares. Um dos fatos que chama a atenção dos visitantes e turistas é o público,
juntamente com o ambiente que é todo voltado para a família, pois como bons italianos
prezam pela união familiar.
A organização, a preparação dos alimentos e a limpeza deixam um ar de asseio.
Outro fator presente é o sistema de policiamento dando segurança aos visitantes, todos
esses detalhes são cuidadosamente tomados para que realmente cada Festival Italiano
Gastronômico Cultural, seja uma festa para ficar na história da preservação dos costumes e
tradições trazidos pelos patriarcas da Itália. Parabéns aos idealizadores e administradores
deste evento, pela preocupação e o selo em manter viva essa rica cultura, que muito
contribui para a construção do conhecimento e respeito às diferenças culturais.
Figura 12 Festival Gastronômico de Nova Veneza. Fonte: Iraci Garbim de Souza
Na confecção deste trabalho destaco as dificuldades encontradas devido à carência
bibliográfica do assunto. Espero então, que este possa vir auxiliar futuros acadêmicos que
desejem fazer suas pesquisas nesta linha.
PARABÉNS AOS 100 ANOS DE IMIGRAÇÃO 1912-2012!
Referências
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Fonte:http://www.festivalitaliano.net/2009/index.php?option=com_content&view=article&id=6
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ANEXOS
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