Leia o artigo de Hélio Duque na integra

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Leia o artigo de Hélio Duque na integra
Reestruturação econômica em perigo
Hélio Duque
De modo geral, a sociedade brasileira, mesmo áreas bem
informadas, e a grande maioria da classe política, despreza e ignora os
fundamentos da macroeconomia. Ainda agora, quando o Brasil se vê
mergulhado em uma das maiores crises da economia mundial, demonstram
não ter dimensão real da sua profundidade. Pelo lado político o tradicional
fisiologismo emerge com chantagens e ameaças de variadas gradações. O
afastamento constitucional de um governo irresponsável, gerador de crise
devastadora, gerou uma realidade original: o que era “péssimo” evoluiu para
o “ruim”, com esperança de alcançar o “regular” em tempo determinado. A
confiança relativa e sinalização na economia demonstram ser possível fugir
da hecatombe. Uma equipe competente e qualificada administrando a
política econômica sinaliza a procura de rota segura para, no médio prazo,
retirar o País da devastadora recessão. Sem apoio político e parlamentar
torna-se impossível atingir os objetivos.
Não será fácil o roteiro para imprimir novos e seguros rumos
para o amanhã. Desemprego recorde, acima de 12 milhões, empresas
endividadas, demissões em ritmo crescente, inadimplência das pessoas
físicas e jurídicas crescente, falência de médias e pequenas empresas e
investimentos paralisados, retratam a realidade. A severidade da crise, com
perda acumulada do PIB (Produto Interno Bruto), nos últimos anos, foi
mensurada pela consultoria inglesa Oxford Economics: a renda “per capita”
dos brasileiros que atingiu 14.970 dólares em 2013, demorará 10 anos para
voltar ao mesmo nível. Alimentar otimismo no curto prazo não é uma visão
realista. É imperativo alertar a sociedade que a crise vai se agravar nesse
2016, com perspectivas de mediano crescimento para 2017, possibilitando
crescimento sustentável a partir de 2018.
A recuperação da economia não dependerá unicamente da
ação do governo interino de Michel Temer, mas essencialmente do
Congresso Nacional. Aprovando as medidas convergentes nas áreas fiscal,
administrativa e sociais que retirem o Brasil do dramático buraco construído
por governantes incompetentes. Sem a participação ativa do Legislativo,
aprovando leis e medidas fundamentais, será impossível a retomada de um
caminho seguro para recolocar a sociedade brasileira na senda do
crescimento econômico, igualmente do crescimento social. O fator de risco
para o alcance dessas metas reside no Congresso Nacional.
Paralelamente, observa-se que o transitório governo Temer
deve e tem de operar em duas frentes distintas; semelhante ao bêbado e o
equilibrista: a primeira, sua competente equipe econômica constrói um
caminho seguro com propostas de reformas que exige votação congressual;
a segunda, até a votação final do impeachment será refém dos 54 votos de
senadores para o afastamento definitivo de Dilma Rousseff. O julgamento
previsto para meados de agosto está gerando, pelo que vem sendo
noticiado, realidade de insegurança. Se além dos 22 votos que obteve,
capturar mais seis senadores, ela voltará à Presidência com terríveis
reflexos para a vida nacional. Reimplantaria a situação caótica da economia,
aprofundando a crise e mergulhando o Brasil em um vôo cego.
O fisiologismo na Câmara dos Deputados foi sempre às claras.
No Senado, cultivou-se relativa sofisticação. Agora parece que houve
nivelamento com vários senadores negociando voto nos dois blocos, outros
pregando a abstenção e alguns admitindo a ausência na votação final.
Vários outros pregam novas eleições presidenciais para retirar o Brasil do
atoleiro político. No seu “bunker”, no Palácio Alvorada, a presidente
afastada, procurando garantir os votos dos senadores indecisos, acena com
o compromisso de, voltando ao poder, convocar consulta popular, via
plebiscito. Sonho de verão de uma presidente que não conseguiu 174 votos
na Câmara que impediria o seu afastamento. Conseguiria agora votos
suficientes para aprovar lei garantindo a consulta popular?
Ante esse cenário, a opinião pública deve se mobilizar, com
urgência, para cobrar dos senadores indecisos suas responsabilidades com
o Brasil. Admitir que possa ser possível um programa de transição para o
país, com o retorno de Dilma Rousseff é recolocar a economia nos trilhos de
uma hecatombe social e política. Os senadores indecisos dotados de
responsabilidade e inteligência, não podem dar as costas aos brasileiros. O
governo interino da República se não é o ideal, foi o possível para o
dramático momento da vida nacional. Se na área política vem cometendo
equívocos, na área econômica a prioridade ao equilíbrio financeiro
buscando a aprovação de medidas que recoloque o País nos trilhos do
crescimento, significa adotar política econômica fadada a resposta positiva
no médio prazo. A alternativa para o Senado é clara: ou aprova o
impeachment ou se restabelece o caos.
Helio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade
Estadual Paulista (UNESP). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de
vários livros sobre a economia brasileira.