Versão em português - Seminário Internacional das Comunicações

Transcrição

Versão em português - Seminário Internacional das Comunicações
A Regulação das Comunicações nos Estados Unidos
Palestra de Susan Ness
Pesquisadora da Johns Hopkins University
No Seminário Internacional Comunicações Eletrônicas e Convergência de
Mídias - Brasília, 10 de novembro de 2010.
A tradução se baseia no texto fornecido pela palestrante, que pode ser
diferente da palestra disponível no arquivo audiovisual, pois a palestrante fez
vários improvisos.
Mestre De Cerimônia: A nona palestra do seminário tem como o tema “A
Regulação da Comunicação nos Estados Unidos”. Convidamos ao palco, para
apresentar a palestrante e fazer a moderação, o senhor Venício Lima,
professor da Universidade de Brasília.
Mediador Venício Lima: Boa tarde a todos e todas. É com imenso prazer que
eu convido a senhora Susan Ness, pesquisadora sênior da Johns Hopkins
University, nos Estados Unidos, para a sua palestra.
Susan Ness tem formação em Ciência Política, Relações Internacionais,
pelo Douglas College. Recebeu o J.D. do Boston College Law School e o
M.B.A. em finanças pelo Washington School, da Universidade da Pensilvânia.
Atualmente, compõe o quadro do Centro para Relações Transatlânticas da
Johns Hopkins School of Advanced International Studies. Foi fundadora e CEO
da Greenstone Media(F), que produzia programação dirigida ao público
feminino no rádio e em outras plataformas.
No período de 1994 a 2001, atuou na Federal Communications
Commission, a Comissão Federal de Comunicações dos Estados Unidos, onde
desempenhou papel de liderança na promoção de novas tecnologias, incluindo
PCs, TV digital, satélite e serviços não licenciados.
Na área internacional, foi alta representante da FCC em três
conferências da OIT e participou de diversas negociações bilaterais e
multilaterais sobre normas e comércio do espectro. Freqüentemente, ministra
palestras sobre políticas de comunicação e sobre a liderança das mulheres.
Antes de atuar na FCC, foi vicepresidente de um banco destinado ao
financiamento de empresas de comunicação e conselheira assistente do
Comitê Bancário da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos.
Susan Ness: Gostaria de agradecer ao Ministro Martins pelo convite. Outros
palestrantes que falaram, eram membros de governo, eu não sou. Então, eu
não falarei da FCC ou da administração de Barack Obama. Eu gostaria de
parabenizar o Brasil pelas suas eleições presidenciais recentes. Fizeram uma
coisa que os Estados Unidos nunca conseguiu fazer, que é eleger uma mulher
presidente.
[aplausos]
Como aprendemos, todos os países estão envolvidos no combate para
adaptar os seus sistemas regulatórios para um ecossistema de comunicação
que está mudando muito rapidamente. Os Estados Unidos não são uma
exceção.
Lembro de uma história. Uma vez, tinha uma mulher dentro de um balão
que estava flutuando sobre uma planície. Ela está perdida. Ela vê um homem
que está andando lá embaixo e ela grita para baixo: “Oi, você, eu estou
perdida. Pode me dizer onde eu estou?”. Aí o homem responde: “Você está
dentro de um balão que está a cem metros acima do solo, e o céu está limpo”.
E ela respondeu: “Você deve ser um especialista em comunicação”. Ele disse:
“Você tem razão, mas como é que adivinhou?”. E ela respondeu: “Porque tudo
que o senhor disse é totalmente certo, mas totalmente inútil”. Então, eu espero
que os meus comentários, hoje, enquanto totalmente certos, não acabem
sendo inutilidade.
Eu tive o privilégio de servir como comissária da FCC de 1994 até 2001.
Era muito diferente naquele tempo. Quando eu cheguei na FCC, há 16 anos:
•
•
•
•
•
•
A Internet acabava de mudar de uma rede de pesquisa do governo e de
pesquisa para uma rede comercial, e a World Wide Web tinha acabado
de começar.
Telefone, cabo ainda funcionavam como monopólios naturais.
Serviços de transmissão direta de televisão por satélite ainda não
funcionavam.
Televisão e rádio eram transmitidos por sinais analógicos.
Haviam duas operadores de telefonia celular analógica em cada
mercado. Os telefones celulares pesavam dois quilos e na maior parte
dos casos funcionavam em carros.
Os modems a cabo estavam começando a conectar somente um
punhado de assinantes à Internet. A AOL, América Online, era um
serviço nascente, de conexão discada.
Chegamos longe nesses 16 anos. Nos meus sete anos na FCC:
•
•
•
•
Passamos do analógico para digital para a maioria das comunicações.
Autorizamos um serviço de telefonia móvel digital, adotamos um padrão
digital para a televisão e autorizamos rádio digital por satélite.
Estabelecemos leilões para licenças de espectro.
Introduzimos competição no mercado local de telefonia e televisão a
cabo.
Anunciamos que não iríamos regular a Internet, que estava começando.
Tudo isso preparou o cenário para a convergência digital que temos hoje.
Mas não podíamos imaginar que a tecnologia iria transformar o mercado tão
rapidamente.
Hoje, consumidores estão assistindo vídeos na televisão de sinal aberto,
na televisão a cabo, nos iPads, monitores e smartphones. Estão acessando
conteúdos de uma variedade imensa de fontes. Seus padrões de consumo
estão mudando rapidamente. Já não assistem os programas de televisão ao
vivo, num horário marcado, mas sim em qualquer momento, em qualquer
mídia.
Há uma explosão de novos formatos, incluindo milhões de horas de
conteúdo interativo no YouTube, no Facebook. As aplicações têm expandido e
excedido as fronteiras do conteúdo, publicidade e pesquisas.
Agora, a GoogleTV permite que as pessoas possam assistir de uma
forma contínua todo o tipo de conteúdo, da televisão, da Internet, de
aplicativos, na tela de seus televisores, apenas apertando um botão.
Essas mudanças tecnológicas de caráter tectônico estão causando caos
nos regimes regulatórios que foram desenvolvidos há décadas. Como os
funcionários responsáveis por supervisionar comunicações eletrônicas podem
manterse a par dessas mudanças tão rápidas e continuem salvaguardando a
competição e protegendo os consumidores?
Os Estados Unidos certamente não tem todas as respostas. Mas, juntos,
poderemos aprender com as experiências dos outros, para saber o que
funciona e - talvez tão importante - o que não funciona.
Toda a estrutura de regulação depende de circunstâncias únicas, legais
e políticas e das tradições do país. Não há um padrão para todos os países,
mas eu acho que idéias úteis fluem da experiência dos outros.
Eu vou começar falando sobre o marco nos Estados Unidos, que tem
um regulador único a Comissão Federal de Comunicação - desde a Lei da
Comunicação de 1934. Ao longo do tempo, o Congresso emendou a lei e deu à
FCC a responsabilidade de regular televisão aberta e a cabo, telefonia sem fio,
telefonia e satélites, bem como para distribuir freqüências eletromagnéticas e
distribuir licenças para não governamentais.
Embora os Comissários da FCC tenham uma política bem abrangente,
são forçados a fazer uma regulação com diferentes partes da Lei para cabo,
para telefonia móvel, para televisão de sinal aberto, para telefonia fixa. Na
essência é o mecanismo de distribuição – e não o serviço oferecido - que
define como é regulado.
Há cinco Comissários - no máximo três podem pertencer a um mesmo
partido - que são nomeados pelo presidente e confirmados pelo Senado, para
um mandato de cinco anos. O presidente escolhe um deles para ser o
Presidente. Embora o Presidente estabeleça a agenda e dirija a agência, ele espero que um dia seja ela - é apenas um dos cinco votos e precisa haver a
maioria dos votos para aprovar certas ações.
Eu acredito muito numa comissão bipartidária para supervisionar as
comunicações no meu país. Pode agir de forma mais lenta, você pode às
vezes não conseguir o que deseja, mas sempre resulta em melhores decisões.
A FCC é uma agência independente e não é parte da administração do
Presidente. O Departamento de Comércio abriga a Administração Nacional de
Telecomunicação e Informação (NTIA, na sigla em inglês), que é a voz da
Administração Federal em política de comunicação. A NTIA pode comentar os
regulamentos propostos pela FCC, como qualquer outra parte.
O Departamento de Justiça (DOJ) e a Comissão Federal de Comércio
(FTC) são responsáveis em conjunto por fazer prevalecer a legislação
antitruste. Além da FCC, tanto a FTC ou o DOJ, têm que aprovar propostas de
fusões de companhias de comunicação.
O Congresso mantém a FCC sob constante vigilância, através de
audiências para supervisão, além de aprovar seu orçamento. Estou segura que
com a mudança da liderança na Câmara dos Representantes as audiências de
supervisão serão mais freqüentes.
E, finalmente, não esqueçamos o papel mais amplo do Judiciário norteamericano. Quem não estiver satisfeito com uma decisão do FCC pode apelar
contra a ação da agência junto aos tribunais federais. E o fazem.
Às vezes são necessários anos de disputa para resolver causas
importantes. Durante este período prevalece a incerteza no mercado. Por
exemplo, durante três anos, disputas legais travaram os esforços da FCC para
estimular a competição nos mercados locais. Infelizmente, muitos distribuidores
competentes não têm poder suficiente para alcançar sucesso em ações penais
lentas e custosas, contra poderosos competidores.
A Lei de Comunicação de 1934.
Nos últimos 76 anos, a Lei de Comunicações de 1934 recebeu muitas
emendas para dar conta de novas tecnologias. Em vez de redesenhar todo o
sistema regulatório, o Congresso geralmente adicionava mais uma seção. Por
isso, frequentemente, os comissários da FCC têm que fazer o equivalente ao
“samba” para interpretar as normas e a intenção do Congresso.
Em 1996 o Congresso reconheceu que a lei de 1934 estava mal e
precisava de uma revisão. Intencionalmente ou não, a lei de 1996 foi uma
legislação de transição. Deu mais atenção as indústria tradicionais - difusores
de rádio e televisão, televisão a cabo e por satélite, e provedores de telefonia
locais e de longa distância - que estavam baralhando no Congresso naquele
momento. A nova lei introduziu a competição no cabo e na telefonia e exigiu
que as companhias telefônicas regionais usassem suas redes de telefônicas de
fios de cobre e em troca permitiu que entrassem no mercado de longa
distância, mas era algo ainda muito do século XX.
Muitas seções foram deixadas propositadamente ambíguas, na media
em que o Congresso chutou a bola para a FCC resolver os temas mais
complicados. Infelizmente - ou talvez felizmente - o Congresso perdeu a
oportunidade de reestruturar completamente a regulamentação para a Internet.
Os princípios regulatórios da FCC
Apesar da confusa moldura da Lei de Comunicações, a legislação criou
certos princípios básicos para a ação reguladora da FCC: investimento privado,
competição, serviços universais e regionalismo. Além disso, tentou permanecer
tecnologicamente neutra.
Nossa infraestrutura de comunicação foi construída com investimentos
privados e é de propriedade privada. O governo reconhece a necessidade de
estimular o investimento em infraestrutura.
A competição propele a inovação. Contrariamente, comportamentos
anticompetitivos podem sufocar a inovação. As políticas da FCC são dirigidas
para facilitar a competição, em benefício dos consumidores, para ampliar as
oportunidades de escolha e baixar os preços. Hoje em dia os setores de
telefonia, de televisão a cabo ou por satélite são ferozmente competitivos, cada
um deles oferecendo três tipos de serviço: voz, data e vídeo.
Os serviços universais têm sido historicamente providos pela telefonia
por voz. Mas o Congresso e a FCC reconhecem a necessidade universalizar o
acesso à banda larga, permitindo o acesso à mesma a um custo razoável.
Alguns dos fundos de fomento foram alocados para levar a banda larga para
áreas do país ainda sem cobertura.
O regionalismo é a base da arquitetura do nosso serviço de
radiodifusão. As licenças de rádio e televisão são concedidas para assegurar
que as comunidades em todo o país tenham cobertura. O atual Plano de
Banda Larga da FCC tem como objetivo de garantir para todas as
comunidades o acesso local a notícias e informação na medida em que o
mercado se transforma das mídias tradicionais para as novas.
Finalmente, a FCC tenta se manter tecnologicamente neutra, permitindo
que as tecnologias em competição batalhem no mercado para ver quem
vencerá. Por exemplo, a FCC não dita o padrão a ser adotado pelos serviços
digitais móveis. Isso pode ser frustrante para paises que desejam harmonizar
os padrões para criar mercados em escala mundial e baixar o custo dos
aparelhos. Mas, por outro lado, abastece a inovação.
A FCC continua a regular a televisão de sinal aberto por ondas
eletromagnéticas, a televisão a cabo e por satélite e as emissoras de rádio. Por
exemplo, as emissoras de televisão não pagam ao governo por seus canais de
6Mhz, mas tem obrigações de atender o público vagamente definidas. Existem
limites à propriedade. As emissoras de televisão têm que proporcionar três
horas semanais de programação educacional para crianças. Mas essas regras
não se aplicam à televisão a cabo por assinatura. Os canais de televisão
distribuídos por satélite têm que oferecer programação de produtores
independentes. Evidentemente, as mídias têm liberdade para criar novos
formatos e modelos de negócios no mundo online.
QUESTÕES REGULATÓRIAS
Depois de ter falado em geral sobre o sistema regulatório de comunicação nos
Estados Unidos, vou descrever com mais detalhes alguns temas específicos.
Transmissão digital de TV
Primeiramente, nossa transição para o digital: Uma vez que o Brasil está
nos estágios iniciais de transição do analógico para o digital, penso que falar
um pouco sobre a experiência norte-americana pode ser interessante. Os
Estados Unidos completaram a transição para a televisão digital em junho
último.
Foi um esforço cooperativo entre o governo, conduzido pela NTIA, as
emissoras de televisão de sinal aberto e a indústria do cabo. A NTIA ofereceu
aos consumidores um cupom de desconto no valor de 40 dólares para ser
usado na compra de decodificadores para captar o sinal digital da televisão
aberta. Governo, emissoras e operadores de cabo fizeram anúncios ao público,
com vários meses de antecipação, alertando o público para o corte do sinal
analógico. Grupos comunitários e operadores de call centers foram treinados
para ajudar o público com a instalação dos decodificadores.
A FCC solicitou que dois mercados de testes convertessem o sinal para
o digital, meses antes da Data Nacional de Conversão, e assim pode identificar
e corrigir problemas que normalmente ocorrem. No final das contas, a
conversão correu muito bem.
No lado tecnológico descobrimos que a faixa VHF não garantia um sinal
digital tão potente quanto a faixa UHF. No lado do conteúdo, muitas emissoras
não encontraram um modelo de negócios funcional para usar o sinal de 6 Mhz
inovativamente, embora tivessem flexibilidade para criar subcanais ou mesmo
arrendar uma porção do espectro para serviços privados de dados. A indústria
está agora focada em TV móvel como a próxima aplicação “matadora” e um
meio para capturar as audiências mais jovens.
Espectro
Outra forma pela qual o governo afeta as comunicações econômicas é
através da alocação e designação de espectro. A pesquisa mostra que muitos
países, incluindo os Estados Unidos, estarão enfrentando uma grande carência
de espectro nos próximos anos.
Algumas redes de dados sem fio têm experimentado um crescimento de
5.000% no tráfego móvel de dados apenas nos últimos três anos. Quando
consideramos que um Smartphone produz 30 vezes mais tráfego do que um
telefone tradicional capaz de transmitir dados, e que a maioria das pessoas
abaixo de 30 anos têm Smartphones, fica fácil notar como a capacidade
existente estará limitada. O vídeo é responsável por boa parte deste
crescimento.
O governo precisa tornar viável competitivamente uma quantidade
adequada de espectro para abastecer o crescimento futuro da banda larga fixa
e móvel. Mesmo se feito de forma urgente, pode levar de seis a quinze anos
para realocar, limpar e redesignar o espectro para novos usos. A FCC
(Comissão Federal de Comunicações) defende o uso fixo e móvel flexível do
espectro para permitir às partes se ajustarem a um mercado em constante
mudança. Ela também promoveu mercados secundários para aumentar a
eficiência.
Em junho, o Presidente Obama conclamou o governo a realocar 500
MHz de espectro para acesso à banda larga sem fio até 2020. O espectro viria
tanto de usuários do governo federal quanto de usuários do setor privado. Uma
parte deste espectro seria leiloada para uso licenciado de banda larga móvel. E
uma parte do espectro ficaria disponível para uso livre e não licenciado por
novas empresas de tecnologia e pequenos negócios. Através dos anos,
bandas não licenciadas mostraram ser uma incubadora de inovação,
permitindo novos dispositivos, de telefones sem fio a WiFi e os futuros
dispositivos “White Spaces”.
O Presidente também solicitou mais financiamento para novas
pesquisas de tecnologias para compartilhar o espectro, para a abertura de
maiores bandas para uso conjunto pelo governo e pelo setor privado.
Uma grande porção destes 500 MHz deve vir de alocações de banda larga e
satélite, conforme recomendado pelo Plano de Banda Larga da FCC. As
características de propagação do espectro de banda larga são especialmente
boas para a banda larga móvel.
A FCC gostaria que as emissoras devolvessem voluntariamente parte de
seu espectro. Sob o que a FCC chama de leilões de incentivo, as emissoras
receberiam parte da renda dos leilões por qualquer espectro que liberassem
voluntariamente. O Congresso teria que aprovar a legislação autorizando os
leilões de incentivo. Outras propostas da FCC iriam revisar as regras para
permitir que as emissoras compartilhem um canal.
Sob outra iniciativa em relação ao espectro, a FCC está liberando canais
de TV vagos - ou espaços em branco - para aplicações não licenciadas,
incluindo Super Wi-Fi. Os “white spaces” (espaços brancos) são fatias do
espectro alocadas para radiodifusão, mas não utilizadas em um mercado em
particular para evitar interferência. Recentemente, a FCC estimulou o
desenvolvimento de dispositivos de “espaços brancos” para banda larga sem
fio. Este enfoque regulatório flexível poderia permitir o uso mais eficiente do
espectro sobrecarregado.
Regulamentação de Conteúdo
Os EUA têm uma longa tradição de liberdade de expressão, e o governo
não controla o conteúdo das ondas, e nem de cabo ou satélite. A única
exceção, para radiodifusão apenas, é a proibição de indecência ou
obscenidade. A exceção é devido à necessidade de proteger as crianças que
inadvertidamente estivessem assistindo TV aberta. Serviços por assinatura a
cabo e satélite não estão sujeitos a esta restrição.
Há algumas exigências afirmativas de portabilidade. As empresas de
cabo precisam incluir emissoras locais e devem reservar canais para o governo
local e disponibilizar canais a serem locados por fornecedores independentes
de conteúdo. Os provedores de satélite precisam incluir afiliadas de redes
locais e devem disponibilizar canais para a programação de minorias.
Além das emissoras comerciais, há redes não comerciais educativas de
rádio e televisão - NPR e PBS. A maior parte de sua renda é através de
contribuição de corporações, fundações e telespectadores. Dólares de
impostos federais cobrem apenas uma pequena fatia de seu orçamento. O
Congresso construiu proteções no estatuto que autorizou estes serviços, para
blindá-los contra a pressão política.
Plano Nacional de Banda Larga
No início deste ano, o Presidente da FCC apresentou ao Congresso um
Plano Nacional de Banda Larga que estabelece entre as suas metas de longo
prazo:
1. que pelo menos 100 milhões de lares americanos tenham acesso a
preço acessível de velocidades de download de pelo menos 100 mbps
até 2020;
2. que haja acesso universal a banda larga de preço acessível, com
possibilidades e meios de fazer uma assinatura;
3. que todas as comunidades dos EUA tenham serviço de banda larga de
pelo menos 1 gigabit por segundo disponível para atender a instituições
como hospitais e bibliotecas.
O Plano destacou o valor da banda larga para o monitoramento de energia,
diagnóstico e monitoramento de saúde à distância, melhoria da educação, e
para tornar o governo mais transparente e acessível. Será necessária
legislação específica para implementar partes do Plano.
Política Antitruste e Concorrência
A Lei das Comunicações estabelece limites iniciais no número de
estações que uma emissora pode ter em um mercado, bem como outras
restrições quanto à propriedade. As regras de propriedade de mídia da FCC
têm sido questionadas na justiça. A FCC deve revisar as suas regras de
propriedade de mídia a cada quatro anos para determinar se elas ainda são de
interesse público. A questão é polêmica, e centenas de milhares de pessoas já
enviaram e-mails sobre o assunto. Embora a nova mídia esteja transformando
o mercado, a mídia tradicional ainda é bastante poderosa. Durante as últimas
eleições, mais dinheiro de campanha foi gasto na radiodifusão tradicional e a
cabo do que em qualquer eleição anterior. E fez diferença.
A política antitruste - ou da concorrência - é um componente importante
do sistema regulatório nos EUA. O Departamento de Justiça e a Comissão
Federal de Comércio (FTC) dividem a autoridade antitruste. Eles têm se focado
atualmente na concorrência na arena da alta tecnologia, com investigações
recentes do Google, Intel e outras empresas do Vale do Silício. Estão tentando
determinar se as empresas estão usando sua posição dominante em um
mercado para dificultar a concorrência em outro mercado.
Geralmente suas investigações não resultam em casos processuais. Ao
contrário, as agências estão coletando informações para poderem
compreender melhor o mercado.
Conforme eu notei anteriormente, além da FCC, tanto o Departamento
de Justiça e a Comissão Federal de Comércio precisam aprovar as implicações
de grandes fusões e aquisições para a conformidade com a lei antitruste. Há
cerca de um ano, o Departamento de Justiça e a FCC estão analisando uma
joint-venture entre a NBC-Universal e a Comcast.
A transação envolve a integração vertical de conteúdo e distribuição. A
questão levantada é se uma das maiores empresas de distribuição poderia
utilizar a sua força de mercado na programação da NBC, em detrimento de
outros provedores multicanais, agregadores de conteúdo online e outros
produtores de conteúdo.
O Departamento de Justiça e a FCC estão analisando se a joint-venture
poderia retardar o desenvolvimento de mais programação - ou baseada na
internet - para os consumidores. Os órgãos devem decidir sobre o caso
somente no próximo ano. A sua decisão deve fornecer subsídios úteis na
avaliação de combinações de mídia em um mercado eletrônico rapidamente
convergente.
LIÇÕES APRENDIDAS
Reconhecendo que cada país é diferente, gostaria de dividir nove lições
aprendidas do meu tempo na FCC:
1. Estabeleça objetivos claros para a sua legislação - e verifique-os
periodicamente para verificar se os está atingindo.
2. Honre seus valores básicos - sem isso há o risco de ficar perdido na selva de
interesses especiais, informações conflitantes e demandas competitivas.
3. Concentrar a atenção nos consumidores é um dos valores básicos. É fácil
perder de vista os consumidores quando os atores da indústria estão batendo
em sua porta.
4. Reveja periodicamente a regulamentação para assegurar que ela continue
relevante à luz do mercado convergente. A Lei de 1006 exige que a FCC reveja
sua regulamentação periodicamente, mas que não seja muito freqüentemente.
As mudanças necessitam tempo para funcionarem. Revisões extensivas
devem ocorrer a cada quatro anos para dar tempo de entender o impacto das
alterações anteriores e dar certa segurança para o mercado de capitais.
5. Estimule uma competição vigorosa - não apenas dois competidores, mas um
número maior para haver uma competição vibrante que produza maior
inovação, maiores opções e menores preços. Lembro quando a AT&T era um
provedor monopolista, que por muitos anos não ofereceu acesso em DSL,
porque não queria canibalizar outros produtos.
6. Não escolha os vencedores e perdedores. Você invariavelmente errará.
Tente ser tecnologicamente neutro e produza regras que permitam maior
competição.
7. Seja cuidadoso em usar a regulamentação para antecipar problemas, num
mercado em evolução. Os novos formatos para vídeo evoluíram porque não
eram vistos como televisão tradicional. Em vez de tentar definir essas novas
tecnologias a partir de uma linguagem do passado, deve ser dada grande
liberdade para que o mercado produza a solução. O marco regulatório tem que
dar flexibilidade para que as emissoras de TV, operadoras de cabo e satélite e
outras mídias tradicionais produzam respostas flexíveis. Sem isso, a inovação
pode ser prejudicada.
Um exemplo positivo em que a FCC deixou de estabelecer regulamentação:
em 1995, quando o serviço de acesso à Internet por modem para cabo estava
na sua infância, a FCC estava sob pressão para tratar esta plataforma como
um transportador comum, com toda a regulamentação pesada de quando havia
apenas um provedor por telefone, de caráter monopolista. Não sabíamos como
o mercado de modem para cabo evoluiria. A FCC evitou em regular este setor
como um transportador comum, por constatar que o mercado de acesso à
Internet era nascente e competitivo.
8. O processo decisório é freqüentemente baseado em informações técnicas
incompletas e errôneas. Pode ser útil convocar um grupo de consultoria
formado por engenheiros, que trabalhem sobre as reclamações dos
competidores e proponham soluções. Embora as conclusões possam não vir a
ter força de lei, poderão evitar a criação de regras que congelem a inovação.
9. Abertura e transparência são as marcas principais de um bom governo e são
indispensáveis para o mundo da banda larga convergente. Por exemplo, a FCC
está criando uma agência amigável para os usuários, que fornece muito mais
informação accessível online. As pessoas podem ler e postar comentários
sobre o sistema regulatório de maneira rápida e sem custos, Quanto mais
gente receber informações do seu governo, mais a democracia prospera
INTERNET ABERTA
Eu não pretendo mergulhar no debate caloroso que ocorre nos EUA, baseado
em idiossincrasias da lei americana, e não nas questões fundamentais. Mas,
para resumir, em 2005, a FCC adotou quatro princípios para manter a liberdade
na internet:
• A liberdade de acessar conteúdo legal de escolha do consumidor
• A liberdade de usar todos os programas e aplicativos legais
• A liberdade de conectar dispositivos pessoais que não danifiquem a rede
• A promoção da concorrência entre os provedores de rede, serviços,
conteúdo e aplicações
O Congresso dos EUA está considerando uma emenda na Lei de
Comunicações para codificar estes princípios básicos para que a FCC tenha
força para fiscalizá-los.
CONCLUSÃO
Eu espero ter trazido luz sobre o sistema dos EUA. Conforme eu notei,
inicialmente, cada país tem que levar em conta as suas próprias tradições,
estrutura legal, e política ao designar um marco apropriado para o século XXI.
Quando eu cheguei a Brasília ontem, eu fiquei maravilhada com a sua
impressionante arquitetura. É única e simboliza muito bem a inspiração,
abertura e energia de seu magnífico país e sua gente.
Eu tenho confiança de que, na medida em que se preparem para revisar
as suas leis de forma a atender os desafios do século XXI, vocês possam
construir um marco regulatório que seja um tributo à sua gente.
Obrigada. Eu estou pronta para responder à suas perguntas.