Implicação da antitrombina III na doença hipertensiva especifica da

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Implicação da antitrombina III na doença hipertensiva especifica da
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Implicação da antitrombina III na doença hipertensiva especifica da gestação
ARTÍCULO ORIGINAL
Implicação da antitrombina III na doença hipertensiva
especifica da gestação
Implication of antithrombin III in specific hypertensive disease of pregnancy
*Dr. Soubhi Kahhale
RESUMO
Realizouse estudo seqüencial em 72 gestantes primigestas, com a finalidade de observar o comportamento
da atividade de antitrombina III e da concentragaodos
produtosde degradagaodafibrina/fibrinogenio maternos naquelas que desenvolviam a doenga hipertensiva específica da gestagao. Esse diagnóstico foi feito
com base na presenga dee hipertensao arterial, edema
e/ou proteinúria, conforme conceituagao do Colégio
Americano de Obstetras e Ginecologistas. Entre as
gestantes estudadas, 12 desenvolveram pré-eclampsiae, comparadas ás gestantes normáis, apresentaram
diminuigao da atividade de antitrombina lile aumento
da concentragao dos produtos de degradagao da fibrina/ fibrinogenio. Os resultados sugerem que, napréeclampsia, ocorre urna ativagao do processo de coagulagao sangüínea.
PALABRAS CLAVE: Doença hipertensiva da gestacao; antitrombina III em gestacao.
INTRODUÇÃO
A doença hipertensiva específica da gestação (DHEG)
constitui-se num dos enigmas ainda não decifrado
pela Obstetrícia moderna. E causa importante de morbidade e mortalidade materna e perinatal e está associada à vasoespasmo arteriolar generalizado, lesões
vasculares são alterações na coagulação sanguínea. A
pesar das diversas alterações hematológicas evidenciarem a ativação da coagulação sanguínea, diversos
estudos revelam dados conflitantes em relação à formação de trombina e fibrina. (7, 13, 14). Tais controvérsias decorrem do emprego de diferentes metodologias e, principalmente, devido à adoção de critérios
imprecisos para estabelecer o diagnóstico de DHEG.
Este estudo teve como objetivo tentar esclarecer estes
aspectos através de uma avaliação sequencial da antitrombina III (ATIII) e dos produtos de degradação da
fibrina e fibrinogênio (PDF), estabelecendo critérios
rígidos para o diagnóstico da DHEG.
ABSTRACT
A sequential study on 72 women in their first pregnancy, was carried out, with the purpose of observing
the behavior of the maternal antithrombin III activity and serum fibrin/fibrinogen degradation products.
The diagnosis of pregnancy induced hypertension
was based on the presence of high blood pressure,
edema and/ or proteinuria, according to the recommendations of the American College of Obstetricians
y gynecologists. Among the studied women, 12 developed pre-eclampsia, and compared to a normal
pregnant women, showed reduction of antithrombin
III activity and increase of serum fibrin/fibrinogen
degradation products. These results suggest that, in
pre-eclampsia, an activation of the blood coagulation
process takes place.
KEYWORDS: Hypertensive disorder during gestation; Antitrombina III on pregnancy.
MÉTODO
Durante o período compreendido entre junho de 1985
e dezembro de 1989 foi realizado, na Clínica Obstétrica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, um estudo prospectivo com 72 gestantes cujo objetivo foi observar
o comportamento da ATIII e PDF matemos naquelas
que desenvolviam a DHEG (3) Com o intuito de caracterizar melhor o diagnóstico de DH EG foram escolhidas apenas primigestas. As provas laboratoriais
foram iniciadas a partir da 20a semana de gestação,
calculada a partir da data da última menstruação, e
confirmada pela ultrassonografia, sendo repetidas
mensalmente, até o termo da gestação. Nas pacientes
que desenvolveram a DHEG, esses exames foram repetidos em 48 e 72 horas e 15 dias após o parto. No
inicio do estudo todas as pacientes foram submetidas
á anamnese detalhada, exame físico e exames com-
Clínica Obstétrica Hospital das Clínicas
Faculdade de Medicina da Universidade Sao Paulo
Sao Paulo. Brazil
Rev. Latin. Perinat. 16 (4) 2013
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FIGURA 1
ACTIVIDADE DE ANTITROMBINA
III NA GESTAÇĀO NORMAL E NA DHEG.
ANTITROMBINA III (%)
------------------------------------------------------------------------
DHEG
(DHEG)
(PÓS-PARTO)
------------------------------------------------------------------------
------------------------------------------------------------------------
NORMAL
------------------------------------------------------------
200
---------------------------------- -------------------------
160
120
---------------------------------- -------------------------
80
---------------------------------- -------------------------
40
0
---------------------------------- -------------------------
FIGURA 2
ACTIVIDADE
DE ANTITROMBINA III EM FUCĀO
DA IDADE GESTACIONAL NA GESTACĀO
NORMAL E NA DHEG.
ANTITROMBINA III (%)
68
55
------------------------------------- --------------------------------------
81
------------------------------------ ---------------------------------------
94
------------------------------------ ---------------------------------------
107
------------------------------------ ---------------------------------------
120
RESULTADOS
Das 72 gestantes consideradas nesse estudo, 12
(16,66%) desenvolveram a DHEG e 60 (83,33%)
permaneceram normotensas. Houve 11 casos de préeclampsia leve e um caso de pré-eclampsia grave.
As figuras 1 e 2 ilustram que a distribuição dos valores de atividade de AT III foram inferiores nos grupos de DHEG anteparto em relação ao grupo normal.
Tal diferença foi observada a partir da 27a semana e
tornou-se altamente significante (p<0,01) a partir da
30a semana, sendo que entre a 36a e a 37a semana
os valores atingiram o limite inferior da normalidade, cuja recuperação ocorreu no período pós-parto.
Igualmente, houve diferenças significativas (p<0,05)
entre as médias dos grupos DH EG anteparto normal,
(Figura 1 y 2).
Las Figuras 3 e 4 demonstram que os valores médios
de PDF mantiveram-se próximos até a 27a semana de
gravidez, quando então, o grupo DH EG apresentou
aumento continuo. Após o parto, os valores médios
diminuíram e aproximaram-se aos do grupo normal.
As diferenças médias dos grupos DHEG anteparto
---------------------------------- ------------------------------------------------------------------------------------------------
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------------------------------------------------------------------------
plementares, com a finalidade de excluir patologias
clínicas, em especial as síndromes hipertensivas e as
discrasias sanguíneas. Foram excluídas deste estudo
as gestantes tabagistas e as que fazem uso de drogas
ou medicamentos que pudessem ser responsabilizados por alterações das provas de coagulação e, as pertencentes à amostragem, foram orientadas para que
não utilizassem qualquer medicamento sem consulta
previa.
Com o objetivo de avaliar a atividade de AT III utilizuo-se a técnica de 2 estágios, ou seja, após a extração
do fibrinogênio do plasma, acrescentava-se trombina,
que era neutralizada pela AT III. Para avaharos PDF
utilizou-se método fundamentado na reação de inibição da hemoaglutinação.
O diagnóstico clínico de DHEG obedeceu ao conceito emitido pelo Comitê de Terminologia do Colégio
Americano de Obstetras e Ginecologistas, ou seja:
presença de hipertensão arterial, edema e/ou proteinúria significantes, a partir da 20a semana de gestação.
A confirmação do diagnóstico de DHEG foi feita através do encontro de endoteliose glomerular obtido por
biópsia renal realizada entre o segundo e o sétimo dia
de puerpério. Na analise dos dados utilizou-se o programa estatístico computadorizado Statgraphics e os
procedimentos estatísticos empregados foram à análise descritiva e inferencial, com o teste t de Student
para amostras dependentes e independentes.
34
41
---------------------------------- ---------------------------NORMAL
---------------------------------- ----------------------------
DHEG
---------------------------------- ---------------------------PÓSPARTO
---------------------------------- ----------------------------
---------------------------------- ----------------------------
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27
IDADE GESTACIONAL (SEM.)
e normal significantes (p<0,05) após a 30a semana.
Entretanto, não houve diferença significativa entre os
valores médios dos grupos DHEG anteparto e pósparto.Os valores de PDF apresentaram boa correlação
(-0,456) com a atividade de AT III. (Figura. 3,4).
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FIGURA 3
PRODUCTOS
DE DEGRADAÇĀ DA FIBRINA/FIBRINOGENIO
NA GESTAÇĀO NORMAL E NA DHEG.
PDF (ug/ml)
0
NORMAL
DHEG
--------------------------------------------------------------
3
-------------------------------------------------------------
6
----------------------------------------------------------
9
-----------------------------------------------------------
12
---------------------------------- -------------------------
--------------------------------------------------------------
15
------------------------------------------------------------
------------------------------------------------------------
------------------------------------------------------------
------------------------------------------------------------
(DHEG)
(PÓS-PARTO)
FIGURA 4
PRODUCTOS
DE DEGRADAÇĀO DA FIBRINA/
FIBRINOGENIO EM FUNÇĀO DA IDADE
GESTACIONAL NA GESTAÇĀO NORMAL
E NA DHEG.
PDF (ug/ml)
4
2
0
---------------------------------------------------------------------------
6
---------------------------------------------------------------------------
8
----------------------------------------------------------------------------
10
------------------------------------ ---------------------------------------
12
34
41
---------------------------------------------------------------
----------------------------------------------------------------
---------------------------------------------------------------
--------------------------------------------------------------DHEG
PÓSPARTO
---------------------------------------------------------------
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NORMAL
IDADE GESTACIONAL (SEM.)
DISCUSSÃO
A maioria dos estudos, referentes à AT III na préeclampsia, revelaram diminuição de sua atividade
(1, 5, 8,14-18). Tais autores sugerem que da AT III
na DHEG pode ser decorrente de seu consumo em
função da ativação do sistema de coagulação.
Os resultados do nosso trabalho confirmam os estu-
dos anteriores e foi possível observar queda significantemente maior da atividade de AT III, no grupo
DHEG, a partir da 27a semana, com recuperação dos
valores no período pós-parto. (3)
A pesar de Weiner & Brandt (16) terem observado,
queda importante da atividade de AT III em 30% dos
casos, antes do diagnóstico de DHEG, tal achado não
foi verificado por nós, uma vez que a queda abaixo
do limite da normalidade só ocorreu nos casos com o
quadro clínico de DHEG já estabelecido.
Em relação às gestantes normais, nosso estudo demonstrou discreta queda da atividade de AT III, entre
a 27a e a 32a semana de gestação, mantendo-se estável após esta fase.
O aumento do concentrado dos PDF na DHGE, já foi
documentado por diversos estudos (2, 4, 6, 9,12).
Nosso estudo, igualmente, demonstrou a elevação dos
valores médios de PDF no grupo DHEG em relação
ao normal, a partir da 27a semana de gestação, tornando-se significativo a partir da 30a semana. Além
disso, os valores de PDF apresentaram boa correlato
com a atividade de AT III, sugerindo a ativação do
sistema de coagulação com consequente produto de
fibrina. Após o parto, apesar da queda dos valores de
PDF, esta não foi significativa. A persistência de níveis eleva¬dos pode ser decorrente do aumento que
normalmente se verifica durante o trabalho de parto
(4,10,11). Entretanto, há trabalhos como os de Pritchard et al (13) e Dunlop et al (7) que não encontraram diferenças significativas nas concentrações de
PDF na DHEG.
Na gestação normal não encontramos aumento dos
valores de PDF, o que está de acordo com as opiniões
de Bonnar et al (4) e Pritchard et al (13). Entretanto,
outros autores como Weiner (19) encontraram aumento dos valores de PDF, ao longo da gestação. Tais
autores explicaram essa elevação como decorrência
do estado de hipercoagulabilidade presente, também
na gestação normal, com maior produção de fibrina e
consequente elevação de PD.
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Dirección del Autor
Dr. Soubhi Kahhale
Clínica Obstétrica Hospital das Clínicas
Faculdade de Medicina da Univ. Sao Paulo
Sao Paulo. Brazil
Rev. Latin. Perinat. 16 (4) 2013

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