produção guhn ray

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produção guhn ray
Entrevista: Primeiro-ministro de Hessen em Moçambique para fortalecer cooperação económica
Sexta-feira, 20 de Março de 2015 | Nº 284 | Directora de Informação: Olívia Massango | Director do Jornal: Boaventura Mucipo
Este suplemento pertence ao jornal “O País” e não deve ser vendido em separado
Os desafios da
Agro-indústria:
da subsistência à
sustentabilidade
Ao longo de dois dias, o Fórum MOZEFO promoveu uma discussão aberta e
produtiva sobre o sector agrícola nacional. Nesta edição, trazemos uma síntese
dos principais desafios que foram identificados e algumas propostas de solução.
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O País Económico // Sexta-feira 13 de Março de 2015
Painel 1
Acesso aos mercados
O excesso de excedentes, a falta de mercado e de políticas
actuantes, a fraca especialização dos produtores com
estímulos deficitários, a vulnerabilidade da produção
local face à estrangeira e o difícil acesso a insumos foram
alguns dos desafios apontados pelo primeiro painel.
Desafios
Fraca produtividade
Segundo Hélder Muteia, um dos factores que
condiciona o acesso aos mercados agrícolas em
Moçambique prende-se com a própria produção
e produtividade. “Esta é uma questão que temos
que abordar com frontalidade e procurar resolver,
porque existe baixa produtividade e uma concentração em alguns produtos que, ao mesmo tempo, são produtos de baixo valor por unidade de
peso. Isso cria problemas no acesso ao mercado
de forma sustentável do ponto de vista económico. Também são produtos com uma alta sazonalidade, os agricultores competem na mesma altura
pelos mercados escassos e são produtos de baixo
valor acrescentado”.
Difícil acesso ao crédito
“Em Moçambique, a agricultura é desenvolvida por
pessoas que não estão especializadas. Temos poucos
que a desenvolvem com instruções próprias. Então,
vou começar por vincar o papel da extensão rural. Ela
deve chegar cada vez mais perto das pessoas que praticam a agricultura. Esse é o primeiro ponto. O segundo
ponto é que não há condições financeiras suficientes
para praticarmos a agricultura como se desejaria. Por
isso, o acesso ao crédito deve ser prioritário. O acesso ao crédito não pode ser nos moldes como tem sido
praticado no nosso país, em que, por um lado, temos
gestores de crédito que não querem sair dos gabinetes.
Eles aprovam o crédito mas não querem fazer o seu
acompanhamento. É isso o que, no processo da produção, tem gerado algumas desconfianças” – Cassimo
Givá, produtor e comerciante.
Infra-estrutura deficitária
O painel foi unânime em identificar a falta de infra-estruturas como um dos principais desafios. “Temos problemas de infra-estruturas inadequadas e,
nalguns casos, inexistentes (particularmente de armazenagem e transporte), da mesma forma que há a
necessidade de políticas públicas actuantes. É através
das políticas públicas que os governos intervêm. É
importante abordar a problemática dos altos custos
de transacção nos meios rurais que afectam o acesso aos mercados e o baixo controlo de qualidade: o
que produz bem e o que produz com baixa qualidade
são misturados na mesma saca. Isso faz com que o
valor médio seja nivelado por baixo. Temos falta de
indústria processadora. Em Moçambique, temos altas vantagens comparativas, mas as nossas vantagens
competitivas são diminutas”.
Baixa competitividade
“Não quero impedir que se façam as importações,
mas, quando estamos fora de Moçambique, percebemos que os produtos importados nesse país têm alguma qualidade de diferenciação – o que não acontece
no nosso país. Assistimos a importações de produtos
sobre os quais, se não informarmos o consumidor
que este produto não é nacional, ele não o distingue –
compra-o nas mesmas circunstâncias em que adquire o produto nacional. Esse problema deixa o nosso
produtor desprotegido.
Conhecemos alguns protocolos da SADC na área da
importação. Se eu como agricultor quero exportar o
meu produto para a África do Sul, à partida serei, entre outras, exigido o controlo sanitário. Mas, do outro
lado, vemos produtos a entrar aqui em avalancha sem
nenhum controlo sanitário” – Cassimo Givá, produtor e comerciante.
Falta de concertação
“Um dos elementos fundamentais para a produção é a qualidade da semente. Sem uma boa semente, de facto, não podemos ter um produto de
boa qualidade para colocar, quer seja na mesa,
quer seja na indústria. Por exemplo, se falarmos da
produção das hortícolas, percebemos que, muitas
vezes, quando chega a época da colheita – todos
os produtores colhem o mesmo produto para vender no mesmo mercado. E o grande mercado para
o distrito de Chókwè é a cidade de Maputo.
O nosso país não produz grande parte de insumos
para o sector agrário. Temos que pensar nisso. Já
produzimos fertilizantes no passado” – Higino
Marrule, engenheiro agrónomo e investigador.
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Soluções
Organização da produção
“É preciso pensar na forma de conservação do volume do
produto que sai das zonas de produção, para as zonas de
consumo. Como é que vai ser conservado? Quando e em que
condições deve ser colocado no mercado? Para que tipo de
consumidores deve ser disponibilizado? Vejo que uma das
questões chaves é a organização dos produtores. É preciso pensar numa cooperativa para prestar serviços aos seus
membros. Muitas vezes, as cooperativas são formadas para
solicitar apoio e não concretamente para prestar serviços em
primeira mão. Se a cooperativa for capaz de identificar um
mercado, um produto e saber com que regularidade deve colocá-lo de modo a manter uma estabilidade nos preços, eventualmente os produtores e os consumidores sairão a ganhar,
porque não estarão sujeitos a grandes flutuações de preços”
– Higino Marrule, engenheiro agrónomo e investigador.
Escalonar a produção
“Os agricultores, repensando a forma da produção,
eventualmente podem ver algumas soluções. Algumas
das superfícies, em Moçambique, já produzem algumas
hortícolas, mas infelizmente sem o rótulo moçambicano.
O que é que está a acontecer? Um grupo de produtores,
conhecedor do mercado, aliado a uma empresa, produz
de forma escalonada. Nem todos produzem na mesma altura. Cada um deles sabe quando deve produzir e quando
deve colher para entregar ao seu mercado. Essa pode ser
a solução. Já está acontecer. A dispersão dos produtores,
em Chókwè, pode ser uma das causas que faz com que
todos produzam o mesmo produto ao mesmo tempo,
colocando-o no mercado na mesma altura. Por essa razão, há vezes que temos descida de preço na ordem de
mais de 200%” – Higino Marrule, engenheiro agrónomo
e investigador.
Fortalecer o mercado
local
Políticas adequadas e
liderança forte
Estratégia integrada e
intersectorial
“Nós não podemos ter um mercado moderno sem
uma agricultura moderna. E o conhecimento é fundamental. Por isso, neste esquema, estão incluídas as
instituições de formação e de extensão e os promotores (Governo e parceiros).
A minha principal recomendação é que nós comecemos com o fortalecimento do mercado local. Não
podemos ambicionar o mercado internacional se não
tivermos o local forte, sólido e que sirva de base, sob
pena de faltarem os alicerces ao processo. É preciso
estimular o consumo nacional promovendo variedades locais. As políticas públicas são fundamentais. É
através das políticas públicas que o Governo e os fazedores de política intervêm. Os mercados grossistas
e feiras de negócio são fundamentais. Questões estruturais e de infra-estruturas são medidas concretas
que devem ser tomadas” – Hélder Muteia, representante da FAO.
“A nossa abordagem tem que ser sistemática, coordenada, colaborativa, cooperativa e, acima de tudo, deve
ser progressiva. É preciso respeitar as etapas.
O Estado tem um papel. Os mercados não resolvem
todos os problemas. O Estado deve ter liderança no
processo. Quando falo de liderança não me refiro
àquilo que muitas vezes aparece nos compêndios.
Refiro-me ao que na língua inglesa se chama champion, a pessoa que pega o touro pelos cornos e lava-o
até ao destino. É importante que tenhamos esse tipo
de liderança.
É importante que trabalhemos num ambiente institucional. Criar políticas públicas e uma legislação que
favoreça o desenvolvimento dos mercados. Temos de
ter investimento em infra-estruturas e investigação,
formação e capacitação, acordos regionais, globais e
de comercialização” – Hélder Muteia, representante
da FAO.
“As associações têm o seu papel, mas o que nós estamos a falar tem que ser mais vasto. Precisamos de ter
todos os intervenientes da nossa sociedade em sintonia, para podermos chegar aonde queremos chegar.
Organizar este número todo de produtores é uma tarefa a longo prazo. Não é só organizar os agricultores.
É também potenciar tudo o resto que está na sociedade: os serviços do Estado e agrários, até facilitar o negócio em Moçambique” – Carlos Henriques, ACIS.
“Temos que começar a pensar como transformar a
indústria de gás a favor da nossa agricultura. Ligado a
isso, o Governo tem uma iniciativa de construção de
silos para o armazenamento. Mas aí também entram
outros factores – a questão do financiamento. Quem
e como vai financiar?” – Higino Marrule, engenheiro agrónomo e investigador.
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Painel 2
Produção e Produtividade
O segundo painel trouxe a debate vários ângulos de vista sobre o sector
agrícola nacional, desde os relacionados com as estratégias de política até
aos que dizem respeito à insuficiência de meios financeiros, tecnológicos
e de conhecimentos. Unanimemente, os participantes sugerem medidas
mais consistentes, mas diferentes das que se vem tomando até aqui, para
que a terra possa assegurar auto-suficiência alimentar, vista como possível
pelas condições que o país oferece.
Problemas
Baixa produtividade
de mão-de-obra
Legislação pouco
actuante
Em Moçambique, um dos grandes problemas é a baixa produtividade da força de trabalho. A educação
é um dos pilares do conhecimento, mas está a faltar
atenção a este aspecto.
Outra questão que leva a falhas na agricultura moçambicana são as falhas de políticas agrárias, por
ausência de princípios fundamentais, sistemáticos,
sincronizados e dialécticos.
Esta observação, do economista agrário e docente universitário, Firmino Mucavele, acabou por ser
denominador comum entre os painelistas, a par de
outros problemas como a necessidade de definir um
quadro legal mais eficaz para o sector.
Há cinco coisas de que não falamos e que são factores
que fazem com que a produtividade não aumente no
país. Por exemplo, falta o desdobramento de objectivos em acções concretas relativamente à questão da
Declaração de Maputo, de 2003, que recomenda a
alocação de 10% do Orçamento dos Estados africanos na agricultura; segundo, não se sabe como é que
se faz a integração dos recursos para a agricultura,
quem faz, onde, como e quando; terceiro, ninguém
sabe como estão organizados os produtores, comerciantes e consumidores; quarto, falta uma direcção da
agricultura que possa assegurar liderança, motivação,
comunicação e orientação; quinto, falta o controlo
das estratégias que já existem.
Sector privado
fraco
Adopção de
políticas erráticas
País com grandes
necessidades alimentares
O grande problema não é a actividade agrícola ser
financiável ou não porque, dizer que os bancos não
financiam, é atirar-lhes as culpas incorrectamente.
A questão é: temos gente bancável? Temos negócios
bancáveis? Portanto, a primeira questão que foi debatida nesse sentido há cerca de 25 anos foi criar uma
instituição para promover os empresários nacionais,
o empreendedorismo, e foi essa a decisão do Conselho de Ministros, criador da instituição, que até hoje
existe.
O grande problema é a fragilidade do nosso sector
privado.
Esta é a visão de António Souto, presidente do GAPI-SI.
“Olhando para os 40 anos da história da agricultura,
duvido que haja país com políticas tão erráticas como
o nosso. Nossa política agrícola tem sido de mudanças de 180 graus. Sai-se de uma estratégia de aliança ‘operário-camponesa’ para a privatização total
sem bases para isso. A seguir, salta-se para o Estado
a substituir o sector privado e a oferecer tractores,
moageiras, etc. Portanto, as políticas erráticas do
nosso Governo, ao longo dos 40 anos, impedem que
algumas das recomendações feitas sejam implementadas”.
António Souto posicionou-se desta forma referindo-se à incapacidade de levar avante, na prática, os projectos aprovados para melhorar o desempenho da
agricultura.
Michelle Adelman, líder de uma empresa agrária no
Botswana, que usa uma tecnologia que ajudou a melhorar a produção e produtividade dos seus campos
agrícolas, chama atenção para o facto de o país poder
transformar-se num “palco fértil” para investidores
externos, que podem ofuscar e retirar oportunidades
a investidores nacionais, exportando alimentos para
os seus países e depois reexportar a produção para
Moçambique a preços mais elevados.
Então, há que procurar uma forma de gestão que não
afugente os investidores, mas assegurar-lhes títulos
de propriedade sobre a terra para assegurar projectos
da agricultura. Observou que Moçambique é conhecido como um dos países com necessidades alimentares sérias.
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Soluções
Criação de boas condições
agro-ecológicas
O ponto de partida para se ter uma boa agricultura é
ter boa preparação de solos, boa lavoura, boa semente e bom sistema de regadio, e deve haver serviços
que apoiam todas essas actividades.
Moçambique também pode optar por um sistema
de mecanização simples e adequada às nossas condições. Temos 10 regiões agro-ecológicas, onde é
possível aumentar a produtividade por simples datas
de sementeira, melhor forma de fazer a lavoura, reduzir as perdas pós-colheitas devido a pragas e outras
doenças. Para isso, há uma série de tecnologias que
poderiam ser adoptadas.
Aproveitamento da
terra não cultivada
Há que pensar nas estratégias para aproveitar melhor
a demanda global por alimentos. A solução deveria
incluir a adopção de sementes geneticamente modificadas, sistemas de irrigação, acesso aos mercados e,
quanto dinheiro, poderemos ganhar com o aumento da procura de alimentos no mundo. Mas o mais
importante é tentar aproveitar a terra não cultivada.
Moçambique tem muita terra arável, mas é preciso
saber quem vai fazer isso. Na Austrália, por exemplo,
as leis de terra tentam prevenir a venda de fazendas.
Moçambique tem o potencial de se transformar num
celeiro do mundo.
Grandes empresas
na cadeia de valor
Estratégia tem de envolver
todos os sectores
Estabelecimento de
uma cadeia sólida
É preciso planificar a agricultura, priorizando os 80%
que trabalham para a subsistência, sem meios tecnológicos, sem formação nem capital, e que dispõem
apenas da força de trabalho e da terra. Também temos de pensar no envolvimento das Micro, Pequenas e Médias Empresas agrícolas que exploram de 10
a 50 hectares e formam associações e cooperativas,
que não temos. Precisamos, igualmente, das grandes
empresas que podem dinamizar a agro-indústria e
responder ao grande sector de desenvolvimento dos
Recursos Minerais, Turismo, etc. A agricultura deve
ser feita pelas pessoas e não pelo Estado. Este deve
servir como intermediário. Deve criar condições para
que o privado vá comprar adequado e que funcione
de modo a transformar a agricultura no negócio.
Não se pode entender a agricultura como a base para
fornecer matérias-primas aos outros sectores. Os temos de troca, geralmente são favoráveis ao sector da
agricultura. A agricultura é, em si, o sector estratégico
mais transversal e os directores, ministros, vice-ministros da agricultura, não podem ser responsabilizados pelos erros da agricultura. Não devem ser responsabilizados pelos custos dos transportes, inexistência
de electricidade, entre outros factores. Portanto, a
agricultura não tem de ser vista como se fosse só para
matar a fome. Pela abrangência que tem a agricultura,
é o factor estratégico de equidade e de estabilidade
política nacional. Ela precisa de uma estratégia que
envolve todos os sectores e não deve ser pensada nos
gabinetes, mas tem de ser consenso nacional.
Há algumas ideias de fundo que procuramos seguir,
ao definir os três tipos de produtores (pequenos,
médio e grande) para os quais não vale uma solução
única, uma vez que cada um destes tipos de produtores tem desafios específicos. Há que entender que a
transformação que se vai fazer é estrutural, portanto,
não se vai fazer de um dia para o outro. Pode levar
20 anos. A ideia é estabelecer as ligações do pequeno
produtor ao médio, e deste ao grande; ligar estes produtores aos fornecedores de insumos e serviços; fazer
com que as tecnologias mais desenvolvidas pelas médias empresas sejam transferidas para os pequenos
produtores. A proposta que tentamos prosseguir é a
produção, por contrato, que já está a resultar numa
série de culturas como a soja, algodão, etc.
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Painel 3
Caminhos a seguir rumo à ind
Na última sessão da primeira conferência deste ano, discutiu-se o cerne temático
da iniciativa: Da Subsistência à Sustentabilidade. A sessão realizou-se no campus
da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), onde o reitor se congratulou
com o evento e mostrou disponibilidade para levar a instituição a colaborar na
estruturação da pesquisa dos outros temas que serão debatidos neste fórum
económico e social. Veja a seguir os pontos principais do debate.
Desafios
Dependência
alimentar
Falta de incentivos
correctos
A dependência alimentar é mais alta em Moçambique
que noutros países da África Austral, conclui um investigador da Universidade de Michigan, David Tschirley,
dos EUA. Posição justificada pelo facto de haver um
alto crescimento da população que não é acompanhado pelo nível de produção agrária. Como consequência, a população moçambicana compra uma grande
parte de produtos noutros países para se alimentar. O
economista João Mosca diz que tal acontece porque
os agricultores nacionais usam técnicas antigas, apontando a redução das áreas de produção por família nos
últimos anos e as dificuldades de acesso ao crédito e o
fraco acompanhamento ao agricultor pelos extensionistas como outros factores que agravam a situação.
O investigador do Observatório do Meio Rural, Rafael
Uaiene, defende que o Governo deve criar condições
para que as pessoas se sintam convidadas a investir na
agro-indústria. A falta de incentivos correctos, ou seja,
de infra-estruturas e meios de produção acessíveis são
alguns dos problemas identificados pelo investigador
no sector agrícola nacional. “É preciso que o Governo
crie condições para que isso aconteça, estou a falar de
infra-estruturas rodoviárias, electricidade e sabemos
que grande parte das pessoas tem dificuldades de acesso de água, para transformar a agricultura“, avançou.
Para o investigador, os incentivos não se traduzem
apenas em dinheiro, mas em bons serviços de extensão
e investigação agrária.
Lei da agricultura
em falta
Faltam acções
concretas
Sector familiar quer
investimentos
O director nacional de serviços agrários, Mahomed
Valá, disse ser urgente a aprovação da Lei da Agricultura pela Assembleia da República, para pressionar o
aumento do orçamento direccionado ao sector. Valá
afirmou que tem vindo a explicar isso ao ministro da
Agricultura e Segurança Alimentar, José Pacheco, nos
últimos tempos. “Nós não temos para além de 7.2%
do Orçamento de Estado no sector agrário, incluindo
os sete milhões e outros adventos de desenvolvimento local e de pequenas e médias empresas. Estou a defender, actualmente, e tenho dito à sua Excelência o
ministro da Agricultura e posso falar isso em todos os
fóruns, que Moçambique precisa de uma Lei de Agricultura. E esta lei tem que dizer que o Governo deve
dar 10% ou mais dos recursos financeiros ao sector”.
O docente universitário, Gildo Lucas, diz que faltam acções concretas de motivação aos praticantes
da agricultura. Diz ainda que é preciso aproveitar as
infra-estruturas já existentes no país e não estragá-las. “É preciso aproveitar o que existe ao em vez de
escangalharmos, para depois recomeçarmos, porque
este país já teve sistemas de regadios que estão a ser
feitos agora, eu cresci a ver. Parece que fica claro que
se nós queremos definir o que é a segurança alimentar cabe a nós dizer o que é, não adianta explicar ao
agricultor, porque não vai perceber, pois sabe apenas
aquilo que ele precisa para a sua segurança alimentar”,
declarou Gildo Lucas, acrescentando que o produtor
só vai produzir se tiver garantias de que vai vender,
sendo essas as condições que o Estado deve criar.
O investigador da Universidade de Michigan, dos
Estados Unidos da América, David Tschirley, defende que é preciso ampliar os investimentos no sector
agrícola familiar, sendo preciso, para tal, prestar atenção ao tipo de investimentos a realizar. “O tipo de investimento é fundamental. E nisso é preciso aprender
lições de todo o mundo, principalmente dos países
vizinhos”, avançou. Já outros participantes do debate
questionam o nível de eficiência do uso de fertilizantes como forma de incrementar os níveis de produtividade. Os mesmos dizem ainda que o Governo já
tem estratégias para o sucesso do sector agrícola, mas
falta a sua execução ou cumprimento, dependendo
de decisões políticas, que tardam a ser tomadas, defendem os participantes.
Sexta-feira 20 de Março de 2015 // O País Económico
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ndustrialização agrária
Soluções
Papel da academia
na agro-indústria
O antigo ministro da Agricultura, Hélder Muteia, diz
que a academia deve transmitir conhecimentos sobre
a cadeia de valores do sector agrícola para que tanto as
famílias, empresas e o sector público tomem decisões
com base nessas informações. “A academia tem a responsabilidade de falar de dados muito concretos sobre as possibilidades, oportunidades e riscos, porque
os fazedores de políticas não têm o monopólio de conhecimento”, disse Muteia. A segunda sessão do Mozefo foi realizada no campus da Universidade Eduardo
Mondlane, de modo a incluir os académicos no debate.
Criar cadeias de
valor
O director de economia do Ministério da Agricultura
e Segurança Alimentar, Raimundo Matule, defende
que é preciso criar cadeia de valor entre as diversas
áreas para desenvolver algumas culturas rumo à industrialização. “Conseguimos sair da cultura de mandioca que há cinco ou 10 anos era de consumo, de
subsistência, para hoje termos um produto que abastece uma indústria que já produz cerveja. Mas começou por essa ligação entre os serviços de investigação,
de extensão, a cadeia de valores de processamento”,
disse Matule.
Membros do painel da última sessão da Conferência Mozefo realizada quinta-feira
Investir em
políticas certas
Criar centros de
serviços agrários
Transferir técnicas
aos produtores
O investigador norte-americano da Universidade de
Michigan, David Tschirley, defende que, para acabar
com a dependência que obriga a população moçambicana a comprar produtos noutros países para se alimentar, é preciso que o Governo desenhe políticas de
acesso aos fertilizantes em coordenação com o sector
privado, para que os subsídios do Governo aumentem a capacidade do sector privado de disponibilizar
meios de produção a preços acessíveis ao camponês.
Isto ajudaria a reduzir os gastos do Estado. Já o economista João Mosca sugere um aumento do Orçamento de Estado direccionado ao sector agrário, dos
actuais 7% para mais de 10%, de modo a aumentar-se
os serviços de extensão nas zonas rurais e a investigação agrária, e sugere que os problemas dos camponeses comecem a ser debatidos no Parlamento.
O director nacional de serviços agrários, Mahomed
Valá, diz estar consciente que é preciso fazer alguns
investimentos mais sérios no país, para que o sector
agrícola familiar dê um salto para a industrialização.
O Ministério da Agricultura tem planos estratégicos
de investimentos em centros de prestação de serviços
agrários, que aguardam pela execução, à semelhança
de outros planos. “É a implantação e institucionalização de centros de serviços onde há sementes, preparação, o crédito, entre outros. Não sei quantos anos
vamos levar, mas vamos começar de forma muito
corajosa“, referiu. Este mecanismo que se pretende
colocar em prática através de parcerias com o sector
privado poderá reduzir o tempo e aumentar a produtividade. Só que há um desafio que tem que ser
levantado por causa da distância entre os campos de
cultivo que são longas.
A investigadora da Universidade Eduardo Mondlane,
Olívia Pedro, defende que a formação, investigação e
extensão são elementos indispensáveis no processo
da industrialização agrícola. Mas é preciso começar
o processo, desenvolvendo técnicas já conhecidas pelos agricultores e que não sejam onerosas. “Através da
transferência de tecnologias, podemos melhorar as
sementes para a produção. Esse trabalho é feito por
um investigador que depois transfere as técnicas aos
agricultores, de modo a reduzir os seus encargos“,
disse a investigadora da UEM. Este processo é feito
na presença do agricultor, para que este transmita,
posteriormente, os conhecimentos adquiridos aos
seus pares nas associações agrícolas, cooperativas,
entre outros, assegurou a investigadora da Universidade Eduardo Mondlane.
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Sexta - feira, 20 de Março de 2015
Plataforma MOZEFO em imagens
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Entrevista | 9
Sexta-feira 20 de Março de 2015 // O País Económico
Primeiro-ministro de Hessen em Moçambique
para fortalecer cooperação económica
Acompanhado por uma delegação de empresários e representantes do sector científico-académico, o presidente do Bundesrat
(Conselho Federal Alemão) e primeiro-ministro do Estado alemão de Hessen está de
visita a Moçambique desde ontem, quinta-feira. Além de manter encontros com a
Presidente da Assembleia da República
e membros do Governo, Volker Bouffier
vai visitar vários projectos, com destaque
para as obras da Ponte Maputo- KaTembe. Acompanhe a entrevista que concedeu
ao “O País Económico” sobre o estágio das
relações entre Moçambique e Alemanhã e
as perspectivas de cooperação económica e
científica que o centro financeiro de Hessen
tem para o país.
Qual é a tendência, nos últimos anos, de
apoio directo ao Orçamento de Estado
por parte da Alemanha? O que se pode
esperar nos próximos tempos?
Mesmo se o Parlamento alemão decidir
cessar o apoio geral ao orçamento, o total
dos meios financeiros do nosso engajamento em Moçambique mantém-se a um nível
idêntico. Quer dizer, continuamos a apoiar
Moçambique anualmente com 60 milhões
de euros. As três prioridades da nossa cooperação são a educação, incluindo o ensino profissional (que continuamos a apoiar
com 15 milhões de euros anuais), a descentralização e o desenvolvimento económico sustentável. Queremos apoiar a criar e
fortalecer um sector privado competitivo e
uma administração descentralizada eficiente e orientada a um melhor serviço.
Além disso, estamos a trabalhar para fortalecer o intercâmbio económico e ligar o
compromisso da nossa cooperação com
os objectivos da promoção de negócios.
Com este objectivo, fundamos em Maputo o Gabinete para o Fomento Económico
Moçambique-Alemanha no ano passado.
Este ano, a Alemanha participará novamente com um pavilhão oficial na FACIM.
Outras delegações económicas anunciaram a sua visita. Estamos a trabalhar com
sucesso para convencer empresas alemãs
a entrarem no mercado moçambicano: só
nos últimos dois anos, oito empresas alemãs estabeleceram sucursais ou gabinetes
de representação em Moçambique.
Porquê a escolha de Moçambique para a
visita?
Moçambique é um país em movimento,
com a oportunidade de desenvolver o seu
potencial económico nos próximos anos.
O objectivo da minha visita a Moçambique é de enfatizar o nosso desejo de uma
maior cooperação com o novo governo de
Moçambique e com o parlamento moçambicano, para o benefício dos povos dos dois
países. O respeito pelos valores democráticos e a pretensão de boa governação continuam sendo a base da nossa cooperação.
Como avalia o estado das relações político-económicas entre os dois países?
A parceria entre os nossos países é baseada num fundamento sólido de relações estreitas e amistosas. Um dos pontos focais
da nossa colaboração é a cooperação para
o desenvolvimento: cada ano, apoiamos o
desenvolvimento económico e social de
Moçambique com cerca de 60 milhões de
euros.
Porém, o comércio e o investimento também têm importância crescente. Queremos oferecer o nosso apoio para que Moçambique possa aproveitar a oportunidade
que a sua riqueza em recursos minerais
oferece, com a meta de alcançar um crescimento económico mais amplo, sustentável
e inclusivo.
Eis a razão por que venho, nesta visita,
acompanhado de uma delegação de empresários e académicos.
Quais são as áreas de interesse dos empresários alemães que o acompanham?
O interesse das empresas que me acompanham vai para além das áreas de energia e
de recursos minerais, passando também
por saber qual é a posição actual de Moçambique no seu caminho de se tornar
produtor e exportador de gás e de outros
recursos minerais. Gostaríamos de aproveitar as oportunidades que se oferecem
naquele sector. Mas Moçambique é igualmente interessante para outros sectores:
por exemplo, as áreas da infra-estrutura,
agricultura e turismo abrangem um grande potencial, bem como o transporte aéreo, saúde e serviços. Na delegação que me
acompanha, estão representados empresários destes últimos três sectores.
Mesmo se o
Parlamento alemão
decidir cessar o apoio
geral ao orçamento,
o total dos meios
financeiros do
nosso engajamento
em Moçambique
mantém-se a um
nível idêntico.
No quadro da minha visita, será assinada
uma declaração de intenção para a cooperação na área do ensino técnico-profissional. A Câmara de Artes e Ofícios do Estado federal de Hessen apoiará uma iniciativa
privada moçambicana-alemã nos seus esforços de estabelecer um campus de ensino
profissional na Matola. Isso encaixa-se no
nosso compromisso de longo prazo para o
benefício do sector da educação em Moçambique.
Além disso, a delegação académico-científica que me acompanha estudará a possibilidades de uma cooperação ainda mais
estreita com universidades moçambicanas.
Uma intensificação do intercâmbio cientí-
fico moçambicano-alemão é outro pilar de
uma colaboração bem-sucedida nos próximos anos.
Até que ponto a Alemanha pode ser útil
para Moçambique, tendo em conta o
contexto da exploração dos recursos minerais?
Um foco particular é, sem dúvida, o sector
da energia e de recursos minerais. Com a
qualidade dos seus produtos e suas soluções tecnológicas inovadoras, as empresas
alemãs são parceiros interessantes para
qualquer projecto nestes domínios.
Já desde 2013, especialistas alemães prestam assessoria ao Ministério dos Recursos
Minerais e Energia no desenvolvimento de
capacidades de gestão. A Alemanha e Moçambique também cooperam na formação
de engenheiros de minas.
Como já mencionei, é preciso olhar mais
para além dos sectores da energia e de recursos minerais de modo a identificarmos
as oportunidades existentes para a construção de uma economia diversificada e de um
sector privado eficiente, que cria empregos e oportunidades de rendimento. Nesta
área, Moçambique também conta com o
apoio da Alemanha: o nosso programa de
desenvolvimento económico sustentável,
com especial destaque à criação de um clima propício ao investimento para as empresas privadas e o engajamento das empresas alemãs, andam de mãos dadas.
É também primeiro-ministro do Estado
Federal de Hessen, que podemos considerar um dos principais, senão o principal, motores económicos da Alemanha.
Prevê assumir alguns compromissos
com o governo moçambicano na qualidade de primeiro-ministro do Estado de
Hessen?
O Estado de Hessen, com o Aeroporto de
Frankfurt e os seus centros de logística afiliados, o centro bancário de Frankfurt e as
suas diversas empresas inovadoras, é de
facto um dos motores da economia alemã.
A empresa farmacêutica Merck, radicada
na cidade de Darmstadt, no Estado de Hessen, já está activa em Moçambique e, como
primeira empresa farmacêutica de renome
internacional, estabeleceu em 2013 um
gabinete de representação aqui. Eu ficaria
muito satisfeito se outras empresas de Hessen aproveitassem a oportunidade que lhes
proporciona esta viagem para se engajar
em Moçambique.
É óbvio que, na minha qualidade de primeiro-ministro de Hessen, seguirei de perto o
evoluir, por exemplo, da cooperação da Câmara de Artes e Ofícios de Hessen com a
iniciativa moçambicana-alemã na criação
de uma escola profissional. É igualmente importante dar vida às parcerias entre
universidades, que gostaria que fossem
lançadas no contexto desta visita. De maneira geral, vejo um grande potencial para
intensificar ainda mais as relações entre os
nossos dois países.n
10 | Economia Nacional
O País Económico // Sexta-feira 20 de Março de 2015
Investimentos a meio gás em Cabo
Parte das multinacionais envolvidas nos projectos de gás natural na bacia do Rovuma, província
de Cabo Delgado, informaram às autoridades do
Governo que pretendem adiar o arranque da fase
de construção das refinarias de Gás Natural Liquefeito (GNL), que se previa iniciar no presente ano,
de modo que entre 2018 e 2019 tivesse lugar a liquefacção do gás para posterior exportação a diferentes
mercados.
Neste momento, as companhias petrolíferas, em
particular a Anadarko, estão em conversações com
o Governo para os acertos finais que vão ditar o arranque da construção das plataformas de transformação do gás a ser explorado. Agora, o problema
reside no facto de, enquanto não tiver uma decisão
de avanço para as fases subsequentes, as multinacionais estarem a desfazer-se de colaboradores que
terminaram os trabalhos anteriores, criando um
vazio nos investimentos realizados a contar com o
efeito multiplicador dos projectos de gás natural.
“Recentemente, tivemos uma reunião com a Anadarko no gabinete de Sua Excelência o governador
(da província de Cabo Delgado), durante a qual a
empresa apresentou algumas preocupações que
vão ditar o atraso na implementação da refinaria de
GNL. Quando avançar o projecto de refinaria, teremos a necessidade de acomodar cerca de 10 mil
pessoas (que virão trabalhar) e, obviamente, com
o emprego de 10 mil pessoas, será necessário que
o sector imobiliário se preparasse para responder
à acomodação das mesmas”, revelou a delegada do
Centro de Promoção de Investimentos (CPI) na
província de Cabo Delgado, Victória Paulo.
A delegada explicou que enquanto decorrem as
negociações com o Governo, o contrato com uma
parte de trabalhadores vai cessar- que estão a voltar
à sua terra de origem- e isso cria um vazio naqueles
projectos residenciais motivados por essa demanda.
“Falo de algumas estâncias turísticas que beneficiavam da presença dos trabalhadores da Anadarko e
que alguns deles estão a ser devolvidos à sua terra de
origem”, ressaltou a delegada.
EMPRESÁRIOS CONFIRMAM CERTA
FRUSTRAÇÃO
“O País Económico” pôde confirmar que os investimentos em Pemba, capital de Cabo-Delgado, estão
congelados face ao arrefecimento dos projectos de
gás natural em curso na bacia do Rovuma. Empresários locais revelaram ao nosso jornal que foi alimentada muita expectativa em torno dos projectos
ligados aos recursos minerais, que terá incentivado
muitos a apostar suas poupanças no sector imobiliário, mas, pelas circunstâncias de hoje, alguns receiam ter investido em vão.
Previa-se que, a estas alturas, houvesse cerca de dez
mil pessoas ligadas aos projectos de recursos minerais, sobretudo de gás, à procura por alojamento, apenas em Pemba. E, contra as expectativas e a
especulação imobiliária, a capital de Cabo Delgado
regista uma demanda por alojamento aquém dos
números, segundo o governo e empresários locais.
A questão de fundo é que o preço de gás natural
no mercado internacional caiu vertiginosamente
e, por esta via, as multinacionais tiveram que rever
os volumes de investimentos e os calendários dos
projectos de produção, deixando de ganhar receitas
inicialmente previstas com os actuais preços de gás
natural.
“Temos um projecto de construção de apartamentos, denominado Kauri Vilage, que seria para
responder em grande medida à procura que se
avisou que existiria em Pemba. Mas, pelo estado de
coisas, não temos como avançar, porque seria um
investimento para acumularmos prejuízos”, revelou Mohsin Abdulcarimo, director-geral do grupo
Kauri, cujos investimentos vão do turismo ao sector
imobiliário. A Kauri Resorts, localizada ao longo da
praia do Wimbi, é um exemplo do efeito (des)multiplicador dos projectos de gás natural na bacia do
Rovuma, na medida em que, em 2012, teve de duplicar a sua capacidade de alojamento para cerca de
60 quartos e hoje as ocupações não chegam a 70%.
“Olha, se hoje estamos praticamente vazios havendo ainda projectos em curso de construção de
apartamentos e estâncias turísticas para acomodar
mais gente, o que será de nós amanhã nesta situação? Penso que está a haver investimento a mais no
sector de acomodação, porque não há gente para
ocupar tanta infra-estrutura”, avisou Abdulcarimo.
Entretanto, mesmo afirmando que o mercado em
Pemba “está em recessão”, o economista e empresário Assif Osman mantém firme um investimento
imobiliário de 20 milhões de dólares, composto por
um hotel, um condomínio habitacional e um complexo residencial na irresistível praia do Wimbi.
“Nós estamos com os pés no chão. Os investimentos que estamos a fazer não contam muito com os
progressos no gás natural, porque seria um mau cálculo da nossa parte, ignorar as adversidades em volta deste tipo de iniciativas”, avançou Assif Osman.
Os empresários ouvidos pelo “O País Económico”
foram tomados por certo desânimo, estando, muitos deles, a gerir os investimentos que fizeram no
âmbito do gás natural como forma de garantir um
possível retorno das suas poupanças. “Sabe, quando um pequeno empresário local investe num determinado projecto em resposta a uma expectativa
que foi criada, qualquer situação adversa é bastante,
para levá-lo à falência, porque levou todos os seus
recursos e até se endividou para realizar o investimento”, apontou Osman.
Outro empresário que, mesmo se apercebendo da
situação pouco favorável não pára de investir, é o
moçambicano Júlio Cety, ligado ao sector de construção civil. Cety tem a única pedreira da província
de Cabo Delgado, onde injectou cinco milhões de
dólares para o seu funcionamento e está a negociar
uma parceria com empresários sul-africanos que
poderá triplicar o investimento e a capacidade de
produção.
“Estamos a pensar nas necessidades que os projectos de gás e outros relacionados terão de pedras,
nos próximos anos, na província de Cabo Delgado, tendo em conta que é um material que durante
muito tempo só era possível obter comprando fora”,
avançou Cety.
O empresário Cety, que possui interesses também
num areeiro, numa unidade de fabrico de betão e
numa instalação de produção de blocos de construção e de estruturas pré-fabricadas, não escondeu o
seu receio no futuro dos projectos de gás tendo em
conta a conjuntura internacional. “O sucesso das
nossas parcerias com empresários estrangeiros vai
depender do que as multinacionais envolvidas no
gás decidirão, porque ninguém está disposto a investir para perder dinheiro”, colocou.
Entre vários empresários ouvidos pelo “O País Económico”, nenhum se mostrou tão pessimista quanto
Abubacar Varinda. Trata-se de um empreendedor
com mais de 40 anos de experiência e interesses nos
sectores dos transportes e imobiliários. “Tenho uma
casa aqui em Pemba que tinha sido ocupada por
uma das companhias ligadas ao gás e, subitamente,
informaram-me que tínhamos de terminar o contrato, porque o colaborador deles, que estava lá, já
se ia embora. Olha, estes projectos de petróleo e gás
só vão beneficiar os que estão ligados directamente
a eles. A população no geral não terá benefícios nenhuns”, desabafou Varinda.
Grande parte dos empresários de Pemba que tam-
bém tem investimentos em Palma e Mocímboa da
Praia revelou que a situação de arrefecimento nos
projectos se verifica também nestes dois pontos da
província de Cabo Delgado, porque já não há certezas do que acontecerá nos próximos tempos. Esta
situação é comprovada pelo facto de, até Março corrente, ainda não ter sido aprovado nenhum projecto
de investimento em Cabo Delgado, estando apenas
em análise seis iniciativas ligadas a diferentes sectores, depois de um ano (2014) em que foram provados 37 projectos de investimento naquele ponto do
país. A nossa equipa de reportagem tentou entrar
em contacto com a Anadarko, mas atºe ao fecho
desta edição, responsáveis daquela multinacional
ainda não tinham respondido ao nosso email.
CPI CONFIANTE NA MELHORIA DAS
CONDIÇÕES DE INVESTIMENTO
Ainda assim, Victória Paulo avançou que a desaceleração actual é uma “fase passageira” e, logo que as
empresas ligadas aos projectos de gás retomarem
normalmente as actividades, os empresários que
investiram no imobiliário deverão reaver as suas
apostas. “Penso que isto é uma questão de tempo
porque, uma vez sanadas estas situações relacionadas com o cronograma de investimentos das
empresas, a situação será favorável e o sector mobiliário vai dar-se por feliz, porque receberá esse volume de pessoas (cerca de dez mil), que precisarão de
acomodação, realçou. Por outro lado, Victória Paulo disse que é preciso ter em conta que muitos dos
projectos que estão a acontecer em Cabo Delgado
não estão só para responder às necessidades da produção de hidrocarbonetos, na medida em que há
uma necessidade da população e de outros sectores
de actividade que deve ser satisfeita.
Nestes termos, a responsável acredita que muitos
destes projectos de investimentos vão acontecer
“com ou sem os empreendimentos ligados aos hi-
Sexta-feira 20 de Março de 2015 // O País Económico
Delgado
data pré-determinada e usado com
frequência por investidores) na New
York Merchantile Exchange (NYMEX)
caiu de 4.2 dólares por 10,000 milhões
de British Thermal Units (BTUs) em
Maio de 2014, para 2.82 dólares em
Março, uma queda de mais de 30%.
O Banco Mundial, em seu mais recente
relatório World Energy Outlook, afirma que o preço do gás natural negociado no Japão deve manter-se estável
até pelo menos 2020, passando a subir
ligeiramente depois disso.
Enquanto isso, Moçambique sente as
consequências do arrefecimento dos
investimentos em gás natural, uma realidade de abrangência mundial entre as
petrolíferas – várias delas já anunciaram cortes nos investimentos este ano,
exemplo da própria Anadarko, que
informou ter diminuído o orçamento
deste ano para a faixa de dólares 5.4
biliões a 5.8 biliões de dólares, cerca de
um terço menor que em 2014.
A GlobalData, uma firma de análise
sediada em Londres, afirmou esta semana que a quinta rodada de licenciamento de Moçambique pode ser prejudicada pela queda mundial nos preços
do petróleo e do gás. Mesmo assim, o
relatório da firma destaca que as novas
leis de petróleo e fiscal para operações
petrolíferas, juntamente com a renego-
drocarbonetos” avançarem, porque há
necessidades de satisfazer outras áreas
ligadas a outros recursos minerais que
ocorrem na província, como é o caso
de grafite e de pedras preciosas, para
além do sector de turismo que tem estado a crescer.
GÁS E PETRÓLEO EM MAU
MOMENTO
A verdade é que o preço do gás natural
– a par de outras commodities como
o petróleo - está a enfrentar um mau
momento no mercado internacional,
provocando graves consequências aos
países produtores e agitando as multinacionais com projectos no sector.
O preço do contrato futuro do gás
natural (ou seja, com entrega numa
ciação dos termos fiscais das áreas 1 e
4 da bacia do Rovuma, podem ter um
efeito positivo.
A quinta rodada de licitação foi lançada simultaneamente em Maputo
e Londres em 23 de Outubro, e deve
ser encerrada em 30 de Abril. Quinze
blocos estão em oferta neste concurso,
cobrindo uma área total de 76.800 quilómetros quadrados. Três dos blocos
no novo concurso estão na bacia do
Rovuma, onde a empresa norte-americana, Anadarko, e ENI, da Itália, descobriram enormes reservas (cerca de
200 trilhões de pés cúbicos até agora)
de gás natural ao largo da costa norte
da província de Cabo Delgado.
n Orlando Macuácua em Pemba
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FECHO: Ministério da Economia e Finanças encerra hoje 21° Seminário Nacional de Despesa Pública
CHEIAS PREJUDICAM EXPLORAÇÃO TURÍSTICA
As cheias e a erosão na faixa costeira têm estado a
complicar, consideravelmente, a exploração turística, criando, deste modo, um défice na economia
turística nacional, disse o presidente da Assembleia
geral da Associação dos Agentes de Viagens e
Operadores Turísticos de Moçambique (AVITUM),
Valige Tuabo.
BAD FINANCIA PME MOÇAMBICANAS
O Banco Africano de Desenvolvimento (BAD), através da sua
janela do sector privado, aprovou recentemente 50 milhões de
dólares americanos em linhas de crédito para a “ABC Holdings
Ltd” e suas subsidiárias em Moçambique, Botswana e Zimbabwe. O fundo simboliza um prémio atribuído ao Banco ABC
considerado uma das melhores Pequenas e Médias Empresas
(PME) através da ABC Holdings Ltd.
Ficha Técnica
PCA: Daniel David
Directora de Informação: Olívia Massango
Director do jornal: Boaventura Mucipo
Orlando Macuácua, Celso Chambisso, Clemêncio Fijamo, Cleófas
Viagem (Jornalistas). Fotografia: Sérgio Manjate; Roberto Paquete e
Lucas Meneses. Projecto Gráfico: RAY GUN | Advertising, Design &
Communication. Criação e Arte: António Xerinda (chefe). Paginação
e Infografia: Saide umburla. Revisão: Adamo Rungo. Impressão:
S-Graphics, Lda. Tiragem: 30.000 exemplares.
Receitas do Estado superaram metas em 2014
Principais bolsas
Acções das principais bolsas na
quinta-feira, 18 de Março de 2015
DOW JONES
Moeda: Dólar
Preço
Potencial
17,892.04 1.46% Indicador seguido desde 1928
NIKKEI (TÓQUIO)
Moeda: Iene
Preço
Potencial
18,991.11 1.43% DAX (FRANKFURT)
Moeda: Euro
Preço
Potencial
11,799.39 -0.06%
Tem 30 membros
IBOVESPA (SÃO PAULO)
A execução do Orçamento do Estado
permite constatar que, em 2014, as receitas do Estado se situaram em 156.243,6
milhões de meticais, o que representa
102.1 por cento da meta, e a despesa total
do Estado cifrou-se em 249.093,8 milhões
de meticais.
Segundo os dados preliminares, o valor da
despesa equivale a 83.2 por cento, o que
reflecte a redução da componente externa
no financiamento, enquanto o défice situou-se nos 92.850,2 milhões de meticais.
A informação foi avançada pelo ministro
da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, que falava ontem, em Maputo, na sessão de abertura do 21° Seminário Nacional
de Despesa Pública que vai, nos próximos
dois dias, avaliar a execução do Orçamento do Estado relativa ao exercício económico de 2014 e delinear as perspectivas
para o ano em curso.
156.243,6
milhões Mt
É o valor das receitas do Estado no
ano passado, e que superou a meta
em 102.1%
Segundo Maleiane, o exercício económico de 2014 foi de um ano atípico pela sua
coincidência com o final de um ciclo governativo de cinco anos, e a realização das
5as eleições presidenciais, legislativas e das
assembleias provinciais.
“A avaliação preliminar do desempenho
destes indicadores aponta para uma inflação média anual de 2.56 por cento em
2014, e um crescimento do PIB de 7 por
cento no quarto trimestre do mesmo ano”,
disse o ministro.
Segundo o titular da pasta da Economia,
os pressupostos macroeconómicos assumidos no Orçamento do Estado de 2014
apontavam para um crescimento real do
Produto Interno Bruto (PIB) na ordem de
8.0 por cento, uma taxa de inflação média
anual de 5.6 por cento e uma política cambial que estimulasse a competitividade das
exportações.
Desta feita, os resultados obtidos na execução do Orçamento no ano transacto foram, em parte, influenciados pela permanente actividade de monitoria e inspecção,
não obstante haver ainda a necessidade de
melhorar os mecanismos de controlo interno instituídos.n
Moeda: Real
Preço
Potencial
48,817.91 -0.18%
Tem 64 membros
FTSE 100 (LONDRES)
Moeda: Libra
Preço
6,761.07 Potencial
0.59%
S&P 500 (EUA)
Moeda: Dólar
Preço
2,061.90
Potencial
1.06%