ASPECTOS LINGUÍSTICOS DA FALA ITAJUBENSE: O

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ASPECTOS LINGUÍSTICOS DA FALA ITAJUBENSE: O
ASPECTOS LINGUÍSTICOS DA FALA ITAJUBENSE: O FENÔMENO DO
ROTACISMO SOB UMA PERSPECITVA VARIACIONISTA
Cecília de Godoi Fonseca
(1)
;Valter Pereira Romano
(2)
(1)
Aluna do 6º Período do curso de Letras do Centro Universitário de Itajubá.
(2)
[email protected]; Mestre em Estudos da Linguagem pela Universidade Estadual de
Londrina.
Professor
do
curso
de
Letras
do
Centro
Universitário
de
Itajubá.
[email protected]
RESUMO
Este trabalho apresenta aspectos teóricos e metodológicos de um projeto de
pesquisa em andamento cujo corpus refere-se a dados orais coletados junto a
informantes naturais do município de Itajubá-MG. A pesquisa fundamenta-se nos
pressupostos teóricos e metodológicos da Sociolinguística Variacionista (LABOV,
1966), objetivando a descrição e a análise do fenômeno fonético-fonológico
conhecido como rotacismo, ou seja, troca da consoante lateral alveolar /l/ pela
vibrante /r/ em contexto de encontro consonantal, como em pLanta > pRanta e coda
silábica: sol > SoR. A partir deste trabalho, espera-se compreender melhor o
fenômeno em pauta correlacionando variáveis linguísticas e extralinguísticas que o
condicionam.
Palavras- chave: Rotacismo. Pesquisa sociolinguística. Itajubá-MG.
INTRODUÇÃO
A Sociolinguística é uma área que estuda a língua em seu uso real, levando
em consideração as relações entre a estrutura linguística e os aspectos sociais e
culturais da produção linguística (CEZARIO, 2013). Essa disciplina pauta-se em
dados reais da fala de indivíduos inseridos numa comunidade de fala que partilham,
com os membros dessa comunidade, uma série de experiências e atividades. O
presente trabalho pauta-se nos aspectos teóricos metodológicos da Sociolinguística
variacionista (LABOV, 1966) com vistas a descrever e analisar o rotacismo, ou seja,
“fenômeno fonológico relacionado com a realização fonética de um som rótico em
substituição a um som lateral e vice-versa” (SILVA, 2011), que, no português, ocorre
“quando há substituição da líquida lateral [l] pela vibrante simples ou tepe [r]”
(SILVA, 2011), ocasionando a neutralização de uma líquida lateral por uma líquida
vibrante em sílabas do tipo CCV (consoante, consoante e vogal) como, por exemplo,
em “probLema” por “probRema” ou em contexto de coda silábica em posição final ou
medial, como em “saL” / “saR”, “caLça” / “caRça”, respectivamente.
1
Estudiosos como Coutinho (1976) comprovam que a origem desse fenômeno
tem suas motivações históricas, uma vez que remonta à língua latina, refletindo-se
até hoje na fala espontânea de brasileiros. Para Teyssier (1994), ao se retornar à
‘língua-mãe’, o latim vulgar,
a categoria de palavras pertencentes a uma série menos popular, os
grupos iniciais pl-, cl- e fl- deram em português pr-, cr- e fr-; ex.:
placere > prazer; clavu > cravo, flaccu > fraco, evolução idêntica à de
bl- > br-; ex.: blandu > brando.” (TEYSSIER, 1994).
Ainda segundo o estudioso, o português moderno possui “um grande número
de palavras eruditas em que os grupos iniciais pl-- cl- e fl-, assim como bl- foram
conservados sem modificação; ex.: pleno, clima, flauta, bloco” (TEYSSIER, 1994).
Por outro lado, sabe-se que variedades linguísticas em que ocorre o
rotacismo costumam ser associadas a comunidades rurais e são estigmatizadas. De
acordo com Bagno (2007), este desprestígio que é atribuído ao fenômeno deve-se à
“crença de que só existe, uma única língua portuguesa digna deste nome e que
seria a língua ensinada nas escolas, explicadas nas gramáticas e catalogadas nos
dicionários” (BAGNO, 2007), tratando-se, portanto, as formas que não condizem
com os instrumentos normativos, de expressões inadequadas e de grande
discriminação.
Entretanto, as pesquisas acadêmicas têm comprovado a presença inconteste
do fenômeno na história da língua portuguesa e explicado fatores condicionantes
para a realização do rotacismo. A título de exemplo, encontram-se pesquisas como
a de Cox (2001), Lebrão (2004), Costa (2006), Romano; Silva (2010), Tem (2010),
Reis (2010), Romano (2012) entre outros, que, de um modo geral, evidenciam a
presença do rotacismo em diferentes comunidades de fala.
Em decorrência de fatores extralinguísticos como: faixa etária, escolaridade,
sexo, e também linguísticos como sonoridade do segmento precedente na coda
silábica, item lexical e extensão do vocábulo, observa-se que o fenômeno não ocorre
aleatoriamente e pode ser explicado sob uma forma científica. Todavia, uma
consulta à literatura da área revela que a língua falada na cidade Itajubá-MG carece
de estudos sistemáticos com abordagens sociolinguísticas, sobretudo, no que se
refere ao rotacismo. Desse modo, este trabalho poderá revelar quais fatores são
condicionantes para realização do rotacismo na fala dos itajubenses de nível de
2
escolaridade superior e fundamental, considerando-se também o sexo dos
informantes.
MATERIAL E MÉTODOS
Para constituição do corpus, foram realizadas entrevistas com informantes
naturais do município de Itajubá de dois níveis de escolaridades: Ensino
Fundamental e Ensino Superior e de ambos os sexos (masculino e feminino),
totalizando 24 informantes, distribuídos, equitativamente, por duas faixas etárias –
18 a 30 anos e 50 a 65 anos.
O instrumento de coleta de dados versa sobre 50 perguntas cujas respostas
podem apresentar o fenômeno em pauta, além de três temas para discursos
semidirigidos. Com a finalidade de evitar que informantes mais perspicazes
identificassem os vocábulos que potencialmente apresentam o fenômeno, foram
intercaladas, entre as 50 questões, outras questões, porém, de caráter lexical.
A coleta de dados ocorreu somente na área urbana, principalmente, em
bairros mais carentes para confirmar as hipóteses do estudo sobre a influência de
variáveis sociais na realização do fenômeno.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dado o fato de a pesquisa estar em andamento, ainda não há resultados de
análise do corpus coletado. Todavia, as etapas já realizadas do projeto refere-se à
(i) organização dos informantes a partir de grupos de fatores externos (nível
socioeconômico, sexo/gênero, faixa etária, escolaridade, localidade); (ii) estudo
prévio sobre a comunidade de fala selecionada considerando aspectos históricos,
sociais e demográficos; (iii) constituição do instrumento de coleta de dados; (iv)
revisão da literatura acerca do estudo do fenômeno.
As entrevistas foram realizadas de maio a agosto de 2014 com auxílio de
gravador digital, todavia, buscando-se minimizar o “paradoxo do observador”
(LABOV, 1966) a partir da criação de situações naturais de fala. Concomitantemente
à coleta de dados, foram realizadas as transcrições grafemáticas e fonéticas dos
inquéritos. Os passos seguintes do projeto serão a codificação dos dados para
tratamento estatístico no programa GoldVarb 2001 (ROBINSON; LAWRENCE;
3
TAGLIAMONTE, 2001), elaboração de artigos científicos e comunicações em
congressos da área e, por fim, redação do relatório final da pesquisa.
CONCLUSÕES
Com este projeto de Iniciação Científica, pode-se verificar a importância da
compreensão da língua sob a perspectiva do uso, uma vez que o seu funcionamento
é dinâmico e está atrelado a fatores de ondem linguística e extralinguística. Desse
modo, ao final deste projeto, espera-se constatar que variáveis extralinguísticas e
linguísticas interfiram na realização do fenômeno, pois pesquisas têm apontado para
esta direção, contribuindo, de certa forma, aos estudos sociolinguísticos e
dialetológicos do português brasileiro, sobretudo, no que se refere à língua falada no
estado de Minas Gerais.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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4
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TEYSSIER, P. História da língua portuguesa. Trad. Celso Cunha. 6. Ed. Lisboa:
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