Uma nova abordagem da reforma do serviço público

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Uma nova abordagem da reforma do serviço público
Uma nova abordagem da
reforma do serviço público
A reforma do serviço público é uma parte cada vez mais importante na carteira de setor público do
Banco. No entanto, essa reforma não gera, com freqüência, melhorias sustentáveis no
desempenho do governo. Repensar a maneira de atuação do Banco poderia levar a intervenções
mais amplas e mais adequadas às demandas e condições dos países.
Ao reconhecer a importância da capacidade do governo de atingir os objetivos econômicos e sociais, o
Banco Mundial investiu significativamente na reforma do funcionalismo nos últimos dez anos. Poucos
observadores duvidam da importância do desempenho da administração pública para a agenda de
desenvolvimento, mas alguns questionam a eficácia dos programas anteriores quanto ao fortalecimento
do serviço público nos países tomadores de empréstimo. As intervenções do Banco contribuíram para
que os governos trabalhassem de modo mais eficiente? Não obstante algum progresso, a resposta é,
“provavelmente não”. Por isso, é necessário reavaliar a abordagem atual da reforma do funcionalismo
público.
O que é a reforma do serviço público?
O Banco atuou de várias maneiras em prol da reforma do serviço público. O objetivo principal foi e
continua sendo o tratamento das questões fiscais de modo a equilibrar a balança de pagamentos do
governo com as práticas de oferta de emprego. Porém, a reforma também abrange a renovação das
estruturas organizacionais e funcionais do governo, a melhoria das políticas de recursos humanos nos
governos central, local e setorial, a revisão do quadro regulatório e jurídico da administração pública,
fornecendo apoio institucional à descentralização do governo e gerenciando o processo pelo qual essas
mudanças são implementadas.
A carteira de reformas do serviço público do Banco foi ampla: aproximadamente 169 operações em 80
países entre 1987 (quando foram iniciados os empréstimos para o aperfeiçoamento do funcionalismo
público) e 1998. A África Subsaariana recebeu em torno de dois terços do financiamento para o serviço
público (Figura 1). Durante esse período, mais da metade dos empréstimos foi utilizado em programas
de ajuste estrutural, embora outros instrumentos – como as doações para a assistência técnica e
desenvolvimento institucional – se tornassem mais importantes nos últimos anos.
Essa estratégia funcionou?
É difícil afirmar, na prática, se os esforços do Banco em relação à reforma do funcionalismo público
foram bem sucedidos. As avaliações internas do Banco contam uma história incompleta. Os índices
fornecidos pelo Departamento de Avaliação de Operações para os projetos concluídos entre 1987 e 1998
sugerem que os projetos de reforma do serviço público – com índices insatisfatórios de 38% – abaixo do
desempenho geral da carteira de projetos do Banco - que apresentou um índice insatisfatório de 30% no
mesmo período.
Análises anteriores também constataram que, com freqüência, a reforma do serviço público não alcançou
seus principais objetivos fiscais. Até o início dos anos 90, menos da metade das operações de reforma do
Banco reduziram as folhas de pagamento ou comprimiram os salários. As reduções na oferta de
empregos do governo foram modestas, entre 5 e 10 por cento, e sujeitas a reversões. As economias
fiscais a partir desses cortes raramente foram suficientes para financiar aumentos de salário para equipes
de nível superior (Nunberg e Nellis, 1995).
Por que não?
Persistem os críticos causticantes aos esforços para reformar o serviço público, declarando que essas
intervenções não promoveram eficiência e nem efetividade. O perfil do problema é bastante claro: as
reformas de emprego e salário para o funcionalismo público têm apresentado um alcance muito limitado
– tendo ocorrido dificuldades de fiscalização e responsabilidade governamental - especialmente na
África. Ao mesmo tempo, uma agenda emergente para a reforma do governo inclui o salário e a
administração de funcionários padrão, as reformas no emprego e, além disso, tenta também vincular
essas atividades às tarefas fundamentais da transformação do Estado.
O principal problema da abordagem convencional do Banco à reforma do funcionalismo público deveuse à tentativa de utilizar medidas paliativas para resolver problemas que requerem um tratamento mais
profundo. Correções técnicas administrativas foram aplicadas às questões fundamentais da economia
política. E mesmo quanto à parte técnica o enfoque foi reduzido, ignorando vínculos cruciais com as
outras partes de um sistema mais amplo. A superação dos limites dessa abordagem irá requerer uma
estrutura mais completa e realista para a reforma, bem como novos instrumentos de apoio.
Elementos de uma nova abordagem
Uma nova abordagem incluiria reformas de emprego e de salário mais profundas e lentas, a vinculação
da reforma do funcionalismo público a outras reformas institucionais, passar de projetos a programas e
seguir os passos das revoluções administrativas inteligentes de outros países.
Adoção de reformas de emprego e salário mais profundas e lentas
Muitas operações de reforma do serviço público se detiveram na reestruturação das políticas de emprego
e salário. Os objetivos eram a redução da folha de pagamento agregada, a dinamização do funcionalismo
público e a racionalização das estruturas de remuneração (ver Lindauer, 1994).
Alguns observadores poderiam argumentar que essas reformas foram orientadas por determinantes
fiscais estreitos, foram politicamente difíceis, causaram um impacto fiscal mínimo, ou melhor; tiveram
um baixo desempenho. Por isso, eles afirmam que as reformas de emprego e salário deveriam ser
abandonadas. Mas, de fato, essas medidas precisam ser aprofundadas, ampliadas e prolongadas.
As reformas de emprego e salário são, com freqüência, necessárias à restauração da balança fiscal,
uma condição essencial, mas insuficiente, ao aprimoramento do desempenho e da capacitação
profissional. Porém, essas reformas têm sido, em geral, muito modestas para atingir a balança fiscal. A
maioria dos programas de redução de funcionários conseguiu diminuições de 5 a 15%, mas são
necessários cortes maiores para que o governo disponha de recursos.
Esses programas não se mostraram politicamente desestabilizadores. Mesmo não apresentando
esquemas elaborados para os trabalhadores excedentes, as indenizações (quando houver) e os empregos
alternativos auxiliaram na transição dos trabalhadores deslocados, além disso, os setores informais e
agrícolas foram capazes de absorver mais trabalhadores do que o esperado. Por conseguinte, em
determinadas circunstâncias, as reformas nos setores públicos poderão ser estendidas também aos setores
políticos.
Porém, as reformas de emprego e salário apoiadas pelo Banco continuaram a enfocar objetivos de curto
prazo, como, por exemplo, cortes de emprego únicos e radicais, em vez de se aterem ao tamanho das
atividades e à melhoria do desempenho. Assim, mesmo onde os serviços públicos despediram
funcionários como resultado de operações de ajuste, as equipes foram, algumas vezes, readmitidas.
Vinculação da reforma do serviço público a outras reformas institucionais
Como o enfoque sobre emprego e salário revelou-se ineficiente para a efetivação das mudanças
institucionais necessárias, a ênfase foi ampliada de modo a incluir as questões de gerenciamento de
recursos humanos. Contudo, é necessário adotar um ponto de vista ainda mais amplo, porém altamente
seletivo, que abranja as questões de primeira ordem sobre o papel do estado, com importantes
implicações sobre as funções, a estrutura, organização e o processo de governo.
O segundo aspecto trata da extensa reforma administrativa que ocorre nos países mutuários nos níveis
descentralizados e subnacionais do governo. As decisões sobre transferência e desconcentração de
equipes, funções e recursos devem estar ligadas a políticas de desenvolvimento do serviço público
central.
Três outros aspectos relacionados à reorientação governamental precisam ser considerados neste modelo
de reforma mais integrado. O primeiro é a conexão amplamente reconhecida entre a administração do
serviço público e a estrutura dos controles e incentivos incorporados aos sistemas de gerenciamento
financeiro dos governos. São essenciais vínculos fortes entre as funções orçamentárias e de pessoal para
equilibrar a administração governamental.
O segundo aspecto trata da extensa reforma administrativa que ocorre nos países mutuários nos níveis
descentralizados e subnacionais do governo. As decisões sobre transferência e desconcentração de
equipes, funções e recursos devem estar ligadas a políticas de desenvolvimento do serviço público
central.
O terceiro aspecto é o vínculo entre a reforma do funcionalismo público do governo central e as
reformas institucionais em setores individuais – em especial saúde e educação, normalmente os maiores
empregadores do governo. Essas ligações sistemáticas são necessárias para garantir a consistência e
coerência dos programas de reformas.
Neste novo modelo, alguns princípios básicos devem estar claros. Um deles se constitui em uma
abordagem mais integrada das reformas governamentais, que deve evitar a sobrecarga dos já excessivos
requisitos dos governos para a reforma. Um outro é que a orientação do projeto e a implementação de
reformas, cuidadosamente seqüenciadas, não podem ser fornecidas através de um esquema universal.
Essas reformas devem se ajustar às circunstâncias nacionais e regionais.
Evolução de um projeto para uma abordagem programática
A nova agenda da reforma administrativa e do serviço público necessita de recursos flexíveis para as
respostas do Banco –incluindo não apenas a habilidade de intervir rapidamente mas também de manter o
curso através dos redirecionamentos freqüentes, necessários às reformas institucionais. Além disso, os
vínculos entre as diferentes iniciativas de reforma sob a proteção mais ampla de transformação do estado
irão requerer mecanismos de apoio com limites mais permeáveis.
A abordagem convencional de projetos do Banco não está bem ajustada a esta nova política de
reorientação governamental. Os projetos se baseiam em um modelo de planejamento que enfatiza
períodos curtos de execução e dão menos importância às variáveis humanas. A reforma institucional
requer adaptabilidade e o compromisso dos participantes com os objetivos da reforma. Essa reforma está
sujeita a uma infinidade de variáveis imprevisíveis, tornando os planejamentos, no mínimo, inexatos.
De alguma forma, o trabalho do Banco para a reforma do serviço público vem distanciando-se do
enfoque sobre projetos. Várias operações de alto impacto, que não são de empréstimo, e uma nova gama
de instrumentos operacionais contribuem para uma abordagem da reforma mais flexível e orientada para
o país.
Além disso, pensa-se em novos tipos de empréstimos para programas, que poderiam desenvolver uma
abordagem programática mais sistemática. Esses empréstimos poderiam apoiar reformas de médio prazo
dentro de uma estrutura política ampla acordada pelo Banco, governo e sociedade civil. O
estabelecimento de critérios programáticos gerais e mecanismos de governo para o processo de reforma,
condicionados ao desenvolvimento de pacotes de reformas orientados para o resultado, é o ponto
principal para o sucesso do programa.
Esse modelo permite um período de execução realista e mais ajustado para que os governos possam
preparar e dar continuidade às atividades, seguindo um planejamento determinado internamente. Não se
trata de uma abordagem que se adapte a todas as situações. Apenas alguns países têm suficiente
capacidade institucional para ocupar-se com esse modelo mais autônomo; outros precisariam distanciarse da abordagem de projeto de modo mais gradual.
Emulação de exemplos de governo inteligente
Nos últimos 10 anos ocorreram mudanças dramáticas nas práticas administrativas, nos países
industrializados. Os governos transformaram burocracias hierárquicas e rígidas em organizações
descentralizadas e flexíveis, responsivas ao cidadão. Reformas se alastraram em alguns países,
representando transformações sistêmicas e radicais, com base em novas reformas da administração
pública, que enfatizaram a redução das funções e estruturas governamentais, demandas por custobenefício e enfoque nos resultados. Outros países perseguiram melhorias ainda maiores na administração
dos serviços civis mantendo, ao mesmo tempo, estruturas e práticas administrativas básicas.
As opções de novas abordagens e modelos disponíveis aos países mutuários podem ser mais
surpreendentes. Além disso, a maioria das inovações nos países industrializados só agora está sendo
testada. O debate é crescente em relação a essas reformas e ainda não se tem uma resposta definitiva
com respeito a alguns dos elementos mais controversos da nova administração pública – incluindo a
utilização de mecanismos de mercado (como o pagamento por desempenho ou emprego contratual em
larga escala) nos principais serviços públicos. Devido a três razões, a adaptação de elementos de
modelos administrativos competitivos ao contexto de países mutuários será complexa.
Em primeiro lugar, os países devem estar aptos a escolher mecanismos adequados às suas circunstâncias,
selecionando em um menu de opções que demonstre de modo neutro os prós e contras de cada opção.
No meio de uma advocacia contundente exercida por verdadeiros defensores de uma ou de outra
abordagem, o Banco pode ter um papel objetivo junto aos mutuários interessados em avaliar, através de
experiência, elementos da reforma governamental, em vez de importar um método pronto.
Em segundo lugar, esta apresentação neutra das opções deve ser equilibrada com as necessidades que
asseguram aos governos empreendedores de reformas a não instalação de sistemas obsoletos que, em vez
de colocar o Estado na linha de frente das tendências modernizadoras do século XXI, prejudicam os
esforços dos governos em direção à liderança do desenvolvimento administrativo.
Finalmente, os países deveriam tomar um curso direcionado ao governo inteligente. Mais do que
simplesmente incentivar slogans da nova administração pública, governo inteligente significa descobrir a
melhor estratégia para realizar tarefas essenciais alavancando recursos escassos – possivelmente através
de aplicações tecnológicas criativas ou soluções administrativas inventivas. As novas abordagens
poderiam resultar em uma “terceira via” para os mutuários que não apenas contornem as abordagens
administrativas tradicionais mas também avancem em direção aos novos modelos de administração
pública.
Bibliografia adicional
Nunberg, Barbara. 1997. “Re-thinking Civil Service Reform: An Agenda for Smart Government.”
Poverty and Social Pol- icy working paper. World Bank, Wash- ington, D.C.
Nunberg, Barbara, and John Nellis. 1995. Civil Service Reform and the World Bank. World Bank
Discussion Paper 161. Wash- ington, D.C.
Lindauer, David. 1994. “Government Pay and Employment Policies and Economic Performance.” In
David Lindauer and Barbara Nunberg, eds., Rehabilitating Gov- ernment. A Regional and Sectoral
Study. Washington, D.C.: World Bank.
Esta nota foi escrita por Barbara Nunberg (Especialista-chefe em Setor Público, Unidade PREM,
Região do Leste Asiático).
Se você tiver interesse em tópicos semelhantes, considere a possibilidade de participar do Grupo
Temático para Reforma Administrativa e do Serviço Público. Entre em contato com Barbara Nunberg,
x37487 ou Nick Manning, x31202, ou clique em Thematics Groups, na Rede PREM.
Page 1
Banco Mundial
PREM
Outubro 1999
número 31
Setor Público
Vice-presidência para economia do desenvolvimento e rede de redução da pobreza e gestão econômica
Page 1 – Figure 1
Figura 1 Distribuição regional das operações para reforma do funcionalismo público,
1987-98
Leste Asiático e Pacífico
7%
Sul da Ásia
2%
Europa e Ásia Central
7%
Oriente Médio e Norte da África
3%
América Latina e Caribe
20%
Page 2 – Margin text
Com freqüência, o Banco tentou medidas paliativas para resolver
problemas que necessitavam de uma intervenção maior
Page 2
Nota PREM 31
Outubro 1999
Page 3 – Margin text
As reformas devem se ajustar às circunstâncias nacionais e regionais
Page 3
Outubro 1999
Nota PREM 31
Page 4 – Margin text
O Banco pode atuar de modo objetivo junto aos mutuários
interessados em avaliar através de experiência os elementos da
reforma governamental
Page 4
Esta série de notas destina-se a resumir as recomendações sobre práticas corretas e as principais políticas sobre os
tópicos relacionados à PREM. As Notas PREM são distribuídas para toda a equipe do Banco Mundial e também
estão disponíveis no site da rede PREM na Web, (http://prem). Se você tiver interesse em escrever uma Nota
PREM, envie a sua idéia por correio eletrônico para Sarah Nedolast. Para obter cópias adicionais desta nota, entre
em contato com o PREM Advisory Service, no telefone x87736.
Preparado para a equipe do Banco Mundial

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