Petróleo, doenças e direitos humanos

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Petróleo, doenças e direitos humanos
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Petróleo, doenças
e direitos humanos
Neste capítulo:
Página
Petróleo e saúde comunitária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 500
História: Comunidades afectadas pelo petróleo organizam
um estudo sobre saúde . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 500
O petróleo causa problemas de saúde graves . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 506
Cada parte da produção petrolífera é perigosa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 508
Chamas de gás . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 511
História: As chamas podem ser paradas! . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 512
Refinarias de petróleo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 513
Derrames de petróleo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 514
Actividade: O óleo e a água misturam-se? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 514
Limpar os derrames de petróleo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 516
História: Limpeza de derrame de petróleo torna os
trabalhadores doentes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 516
Fazer um plano de segurança para emergências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 518
Restaurar terra danificada pelo petróleo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 519
História: Uma nova forma de limpar petróleo derramado? . . . . . . . . . 520
Justiça ambiental . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 521
História: Mulheres protestam contra a exploração petrolífera . . . . . . . 521
O petróleo e a lei . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 522
História: O caso contra a Texaco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 523
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Petróleo, doenças
e direitos humanos
O petróleo faz parte de muitos produtos usados todos os dias, como por
exemplo a gasolina, o propano, o querosene, o óleo para aquecimento e o
asfalto, além de fazer parte de muitos plásticos, tintas, pesticidas, solventes
e cosméticos. Até mesmo algumas roupas e medicamentos são feitos com
petróleo. Mas o petróleo é tóxico e tem efeitos perigosos sobre a nossa saúde
e o meio ambiente, a começar pelos métodos usados para o encontrar,
transportar e refinar, bem como as formas sob as quais depois é usado.
As pessoas das áreas ricas em petróleo esperam que ele lhes vá trazer
riqueza. Mas, na maior parte dos casos, a riqueza vai para as empresas
petrolíferas, enquanto as pessoas das comunidades são deixadas na pobreza,
e sózinhas com a poluição, as doenças e a violência que parecem alastrar-se
nos locais onde o petróleo é encontrado. Como a economia mundial depende
do petróleo, a indústria do petróleo tem suficiente poder para influenciar
governos e políticas internacionais. Isto leva a que muitas vezes as pessoas
pobres das comunidades ricas em petróleo tenham de lutar para se
protegerem a si próprias e à sua terra, enquanto as pessoas das comunidades
ricas ou em desenvolvimento lutam contra a poluição do ar.
O petróleo, o carvão e o gás natural são combustíveis fósseis. Eles são
feitos de restos de plantas e animais que morreram há milhões de anos, e só
existem em quantidade limitada. Nos últimos 100 anos, o petróleo tornou-se
na principal fonte de energia para a maior parte do mundo. Agora, a maior
parte dos recursos petrolíferos do mundo foi usada. Queimar tanto petróleo
ou outros combustíveis fósseis deu origem ao aquecimento global (ver página
33), um dos maiores problemas ambientais que o mundo hoje enfrenta. Cada
vez mais, as pessoas em todo o mundo estão a exigir o fim da economia
do petróleo e o desenvolvimento de formas de energia mais limpas e mais
sustentáveis (ver Capítulo 23).
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PE T R Ó L E O, D O EN Ç A S E D I R EI TOS
Petróleo e saúde comunitária
Nos lugares onde o petróleo é descoberto, a economia desenvolve-se
rapidamente, mas é uma economia de miséria. Campos petrolíferos mal
construídos são estabelecidos na paisagem e trazem com eles muitos
problemas sociais, como deslocações forçadas, alcoolismo, infecções
sexualmente transmitidas e HIV (ver também página 474). Muitas vezes, as
empresas petrolíferas e os governos não querem saber das comunidades mais
prejudicadas pelo desenvolvimento petrolífero. Estas comunidades são muitas
vezes entregues a si próprias para tentarem perceber quantos e que tipo de
danos o petróleo causou e para investigarem formas de restaurar a saúde das
suas comunidades.
O gás natural também causa problemas de saúde
Queimar gás natural produz menos dióxido de carbono (uma causa do
aquecimento global) e outros poluentes do que queimar petróleo. Mas as
perfurações para procurar gás natural são parecidas com as perfurações para
procurar petróleo e criam muitos dos mesmos problemas sociais. Quase tudo o que
é verdade sobre o petróleo neste capítulo também é verdade para o gás natural.
Comunidades afectadas pelo petróleo organizam um
estudo sobre saúde
Em 1992, um grupo de promotores de saúde na selva amazónica do Equador
estudou a forma como a perfuração para procurar petróleo estava a afectar as
comunidades locais. Eles sabiam que as empresas petrolíferas estavam a destruir
a sua terra, mas havia pouca compreensão sobre a forma como o petróleo
afectava a saúde das pessoas. Por isso, os promotores de saúde começaram a
recolher informação nas suas vilas e aldeias.
O estudo sobre saúde implicou muito trabalho e muito tempo. Quando
começaram, os promotores de saúde não sabiam o que iam aprender. Eles
contam a sua história, pelas suas próprias palavras, ao longo deste capítulo.
Vivemos numa área que
é rica em petróleo. Mas
aqui ninguém é rico.
Durante milhares de anos esta região foi a casa dos povos indígenas. Na nossa
parte da selva amazónica vivem muitas pessoas diferentes: os Shuar-Achuar, os
Runa, os Quichua, os Huaorani, os Siona-Secoya e os Cofan. Cada uma destas
culturas tem a sua própria língua e arte e a sua própria visão da realidade.
Antes dos tempos modernos, todas estas tribos viviam
em harmonia com a natureza. Depois,
Em 1492,
esta harmonia foi quebrada. Se quisermos
chegaram aqui
compreender o que nos está a acontecer,
pessoas da
temos que olhar para a nossa história.
Europa…
PE T R Ó L E O E SAÚ D E CO MU N I TÁ R IA
Isto foi o princípio da quebra do equilíbrio entre os nossos antepassados e a
natureza. Primeiro, os Espanhóis percorreram as nossas terras à procura de
ouro e prata. Os nossos antepassados foram forçados a trabalhar como escravos,
retirando ouro e prata da terra. Depois, vieram os Ingleses. Em vez de ouro, eles
queriam borracha. Fizeram de nós escravos para tirar a borracha das nossas
terras. Depois disto, vieram as empresas petrolíferas. Elas fizeram a mesma
coisa.
Sabemos que as empresas petrolíferas estão a destruir a nossa saúde. É
por isso que os nossos promotores de saúde decidiram estudar a poluição e a
forma como ela nos afecta. Queremos trabalhar em conjunto por uma situação
económica, política e cultural melhores.
Os promotores de saúde ficaram a saber que as pessoas das comunidades
poluídas pelo petróleo têm mais doenças do que as das comunidades
não poluídas. As mulheres destas comunidades sofrem mais de abortos
espontâneos. As crianças sofrem de malnutrição e muitas vezes morrem
quando ainda são pequenas. Muitas pessoas têm doenças de pele que não
desaparecem (para aprender mais sobre os problemas de saúde causados
pelo petróleo, ver páginas 506 a 507).
Isto é só um pouco do que eles aprenderam. Depois do seu estudo, os
promotores de saúde escreveram um livro chamado Culturas Banhadas em
Petróleo, para que outras pessoas pudessem aprender com o trabalho que eles
tinham feito.
Primeiro formámos
uma equipa, juntando
pessoas que tinham
conhecimentos
técnicos e médicos
com pessoas das
nossas organizações
comunitárias.
A nossa equipa foi constituída
por 6 pessoas: 3 promotores de
saúde (2 que trabalhavam em
comunidades e 1 que trabalhava
num laboratório de saúde) e 3
técnicos de saúde (um médico,
um bioquímico e um técnico de
medicina).
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Aqui estão os passos que seguimos para o nosso estudo, para que
você possa fazer a mesma coisa:
1. Recolhemos informação
Recolhemos informação sobre o tipo de
exploração petrolífera na nossa área, os
produtos químicos usados e os efeitos desses
químicos na saúde. Aprendemos que os
químicos eram conhecidos por causar abortos
espontâneos, defeitos de nascença, cancro
e outras doenças. Também ficámos a saber
que as pessoas apanham estas doenças por
beberem a água poluída com estes produtos químicos.
2. Escolhemos quais as comunidades que iríamos estudar
Escolhemos 7 comunidades que tinham água poluída por causa do
desenvolvimento e extracção petrolífera. Escolher os lugares poluídos foi
fácil, porque quase todas as comunidades na nossa área estão poluídas
pelos poços de petróleo, tanques de resíduos ou estações de bombagem.
Também escolhemos 3 comunidades que não tinham actividade petrolífera,
mas que eram parecidas com as primeiras 7 comunidades em todos os
outros aspectos.
3. Recolhemos as histórias médicas das pessoas dessas comunidades
Recolhemos informação dos últimos 4 anos para ver que doenças eram mais
comuns de um ano para o seguinte. Aprendemos que muitas, muitas pessoas
tiveram acidentes e doenças. Até termos recolhido toda esta informação,
não sabíamos que tantos de nós estavam
doentes!
Posto de sa
úde
4. Contactámos cientistas para nos
ajudarem... mas eles não nos queriam
Ninguém nos queria
ajudar
ajudar a fazer o
Fomos a um centro local de
estudo. Por isso,
estudos sobre saúde e pedimos uma
decidimos fazê-lo nós
aula sobre métodos de pesquisa
mesmos.
popular. No princípio, eles estavam
interessados, mas no fim não queriam
ajudar-nos. Depois, pedimos ajuda à escola de medicina que ficava perto de
nós e eles também não nos queriam ajudar.
Os alunos da escola recomendaram-nos que estudássemos os químicos
na nossa água de beber. Uma vez que isto era caro, eles sugeriram que
tentássemos recolher dinheiro noutros países.
PE T R Ó L E O E SAÚ D E CO MU N I TÁ R IA
5. Organizámos uma reunião de todas as comunidades na nossa área
Explicámos porque é que queríamos fazer este estudo e perguntámos se
as comunidades estavam preparadas para ajudar. No final da reunião,
todas as pessoas votaram para que o estudo se fizesse. Organizámos um
comité para realizar o estudo e analisar os resultados. O comité incluía
os promotores de saúde, pessoas de diferentes comunidades e pessoas com
conhecimentos sobre como é que os produtos químicos afectam as pessoas
e o meio ambiente.
Os
p
do r o b l e
Pe m a
t ró s
le o
6. Fizemos um plano de trabalho
Planeámos levar 5 meses a fazer o estudo. Havíamos de ir a uma
comunidade diferente de 15 em 15 dias e ficar 3 ou 4 dias em cada lugar.
Íamos avaliar a comunidade e recolher amostras de sangue, urina e fezes
para testagem. Quando tivéssemos os resultados dos testes do laboratório
da cidade, iríamos voltar à comunidade para partilhar os resultados. Isto
foi muito importante, porque nos permitiu tomar decisões em conjunto.
Também planeámos ter uma reunião de 2 em 2 meses, em que o comité
coordenador e os representantes da comunidade poderiam falar sobre como
é que o estudo estava a decorrer.
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7. Procurámos financiamento para o nosso trabalho e para os custos do
laboratório
Formámos uma comissão para procurar o dinheiro necessário. Depois de
muitos contactos, conseguimos dinheiro para o estudo através de um grupo
de médicos em Espanha.
8. Fizemos mapas das comunidades
As pessoas de cada uma das comunidades fizeram mapas que mostravam
os poços de petróleo, a água poluída e as localizações das aldeias e áreas
agrícolas. Ao mesmo tempo, fizemos uma lista de todas as pessoas que
vivem em cada comunidade (um recenseamento). A lista incluía o nome e
idade de cada pessoa e se era homem ou mulher.
9. Começámos a visitar as comunidades e a fazer o
estudo
Em vez de enviar as amostras para a cidade,
criámos um laboratório na escola comunitária,
onde testámos o sangue, a urina e as fezes
das pessoas (você precisa de equipamento de
laboratório e de alguma formação sobre como
fazer estes testes, por isso não vamos explicar
aqui estas questões). Nas manhãs, íamos de casa em casa a recolher as
amostras. Depois disso, outro grupo ia a cada casa fazer exames para
recolher informação e os promotores de saúde faziam uma verificação
médica de cada pessoa.
10. Depois de termos acabado de recolher toda a informação, organizámo-la
Depois comparámos a informação das comunidades poluídas e das
comunidades que não estavam poluídas. Comparámos muitas coisas – a
situação económica, a situação política, a cultura local e, acima de tudo,
a saúde das pessoas.
11. O último passo foi escrever tudo isto e discuti-lo em conjunto
Isto ajudou todas as comunidades envolvidas a decidirem como tomar
medidas para melhorar a nossa saúde.
No nosso último dia, em cada vila ou
aldeia, fizemos outra reunião com
a comunidade sobre o que é que
íamos fazer a seguir e o que é que
esperávamos aprender ainda mais.
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O estudo sobre a saúde levou à tomada de medidas
comunitárias
O trabalho dos promotores de saúde mostrou às pessoas que muitos dos seus
problemas de saúde eram causados pela poluição petrolífera. Os químicos
tóxicos provenientes do petróleo foram encontrados na água, no solo, no
sangue, urina e fezes das pessoas. Saber isto ajudou-as a começarem a
trabalhar para encontrarem uma solução. Elas sabiam que, desde que a
contaminação continuasse, seria
difícil ter água mais segura, comida
saudável ou ar limpo.
Foi formado um grupo, que
se chamou a si próprio Comité
de Pessoas Afectadas, que
pediu ajuda ao governo. E a
organização de promotores
de saúde continuou a apoiar
a saúde das pessoas e a
mostrar-lhes como é que
os seus problemas de saúde
eram causados pelo petróleo.
Os promotores de saúde e outras pessoas da
comunidade aperceberam-se de que o seu estudo era
só o princípio da sua luta pela saúde e pela justiça.
Outra organização,
a Frente de Defesa do
Amazonas, iniciou uma acção em tribunal para processar a empresa
petrolífera pelos danos que ela tinha causado (para aprender mais sobre esta
acção em tribunal, ver página 523). Enormes áreas da floresta tropical tinham
sido destruídas e as leis ambientais sobre como é que os danos tinham que ser
reparados foram ignoradas. A empresa petrolífera estrangeira só pegou no seu
lucro e foi-se embora.
O estudo comunitário e a acção em tribunal inspiraram outras
organizações a envolverem-se na luta para salvarem a floresta tropical e as
suas pessoas. Universidades e escolas de medicina do Equador, Inglaterra e
Estados Unidos realizaram mais estudos para apoiar a acção em tribunal
conta a empresa petrolífera e mostrar que o petróleo causava terríveis
problemas. Estes estudos também ajudaram os autores deste livro a saberem
mais sobre os efeitos do petróleo na saúde.
Mas o trabalho principal foi feito pelos promotores de saúde. Ao
estudarem por si próprios os efeitos do petróleo na saúde, eles trabalharam
localmente sobre uma questão de importância global. Ao mostrar como é
que a saúde dos seus vizinhos estava a ser devastada pela destruição da
floresta tropical pelas empresas petrolíferas multinacionais, eles trouxeram
as questões locais para a arena internacional. Eles foram uma fonte de
inspiração para nós, à medida que escrevíamos este livro.
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O petróleo causa problemas de saúde graves
Tal como acontece com outros químicos tóxicos, os problemas de saúde
causados pelo petróleo podem ser difíceis de provar, porque levam muito tempo
a afectar as pessoas. Mas a maior parte das pessoas que vivem e trabalham
perto de refinarias e locais de perfuração para procurar petróleo conhecem
a poluição do ar e da água causada pelo petróleo. Perfurar o solo à procura
de petróleo, refiná-lo e queimar o petróleo como combustível traz muitos
problemas de saúde graves, como os que são apresentados na lista que se segue
e os que são discutidos, com mais pormenor, nas páginas que se seguem:
• Visão desfocada e outros
problemas dos olhos;
• Dores de cabeça, alucinações,
euforia (sensações repentinas de
felicidade), cansaço, fala pouco
clara, danos no cérebro, coma;
• Convulsões e mortes pouco
habituais;
• Feridas no nariz e sangramento do
nariz;
• Infecções nos ouvidos;
• Asma, bronquite, pneumonia e
outras doenças respiratórias;
• Cancros e infecções do pulmão e
da garganta;
• Maior risco de tuberculose;
• Ataques de coração;
• Problemas digestivos, incluindo
vómitos, úlceras e cancro do
estômago;
• Danos no fígado, rins e medula
óssea;
• Problemas menstruais, abortos
espontâneos, nados-mortos e
defeitos de nascença;
• Erupções da pele, fungos e cancros.
Nalguns lugares, as pessoas inalam os fumos da gasolina para terem
efeitos parecidos com os da droga. Isto é muito perigoso. Para algumas
pessoas, inalar gasolina com força, mesmo que seja só uma vez, pode
causar morte súbita.
O PE T R Ó L E O C AUSA PR O B L E M A S D E SAÚ D E G R AV E S
Efeitos na saúde a longo prazo
O petróleo causa problemas de saúde reprodutiva
Respirar os fumos ou engolir alimentos ou líquidos contaminados pelo petróleo
e pelo gás causa problemas de saúde reprodutiva, como por exemplo ciclos
menstruais irregulares, abortos espontâneos, nascimento de filhos mortos e
defeitos de nascença. Estes problemas podem ter sinais de aviso antecipados,
como dores abdominais ou sangramento irregular (ver Capítulo 16 para mais
informação).
O petróleo causa cancro
O contacto regular com o petróleo e o gás causa cancro. As crianças que
vivem perto de refinarias de petróleo têm muito mais probabilidade de ter
cancro do sangue (leucemia) do que as que vivem longe. As pessoas que
vivem em áreas onde o petróleo é extraído têm muito mais probabilidade
de desenvolver cancros do estômago, bexiga e pulmões do que as pessoas
que vivem noutros lugares. Os trabalhadores das refinarias de petróleo têm
um risco elevado de cancro dos lábios, estômago, fígado, pâncreas, tecido
conjuntivo, próstata, olhos, cérebro e sangue (para mais informação sobre o
cancro, ver Capítulo 16).
Quando a empresa Texaco começou a extrair petróleo no Equador, o cancro
não era conhecido na região. Quarenta anos mais tarde, o cancro é um dos
maiores problemas de saúde da região. Em duas das regiões petrolíferas mais
exploradas do Amazonas, os trabalhadores comunitários de saúde fizeram
um inquérito em 80 comunidades e encontraram taxas elevadas de cancro,
especialmente da boca, estômago e bexiga.
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Cada parte da produção petrolífera
é perigosa
Compreender os danos causados tanto à saúde como ao meio ambiente,
durante cada fase da produção de petróleo,
pode ajudá-lo a reagir.
Exploração
Quando as empresas começam por procurar
petróleo, as florestas são abatidas e as casas
são destruídas. São construídas
estradas e os rios e ribeiros
são obstruídos. Muitas vezes,
a procura de petróleo envolve
uma série de explosões criadas
para ajudar as empresas
petrolíferas a saberem o que
é que está debaixo do solo. A
isto chama-se testagem sísmica. A
testagem sísmica estraga as casas, a vida
animal selvagem e a terra.
Antes de as empresas começarem a procurar
petróleo, os grupos comunitários podem visitar os representantes do governo
para tentarem parar a invasão das suas terras, aprender com a experiência
das ONGs e das comunidades afectadas pelo petróleo e educar todas as
pessoas sobre a ameaça para a saúde da comunidade. A empresa petrolífera
deve realizar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA) (ver Apêndice B). Se o
EIA mostrar que o projecto vai ser destrutivo, a comunidade pode exigir que
ele seja parado. A empresa petrolífera deve incluir no EIA um plano para
eliminar os resíduos, para proteger a água superficial e subterrânea, e para
alertar e evacuar as comunidades vizinhas em caso de acidentes.
Perfuração
Os poços de petróleo são perfurados
para trazer petróleo para fora do solo.
A perfuração pode causar incêndios,
explosões e outros acidentes que põem em
perigo os trabalhadores e a comunidade.
Quando o petróleo se derrama, ele polui
a água subterrânea e os cursos de água,
prejudica as plantas e os animais e destrói
recursos ligados às actividades da caça, pesca e
agricultura.
C A DA PA R T E DA PR O D U Ç ÃO PE T R O L Í FER A É PER I G OSA
As comunidades podem usar máquinas fotográficas, vídeos, anúncios de
rádio, relatórios escritos e até mesmo desenhos de crianças para documentar
os danos provocados pela perfuração. Esta documentação pode ser usada
como prova quando a comunidade fizer alguma exigência no sentido de se
parar a perfuração e a destruição ambiental, fazendo cumprir as normas
definidas pelo Estudo de Impacto Ambiental ou para realizar acções legais
contra a empresa petrolífera.
Separação
O petróleo sai do solo misturado com gás, metais pesados e água tóxica. O
petróleo precisa de ser separado destes outros materiais.
Deitar fora a água tóxica é muitas vezes a principal causa de poluição.
As leis sobre a perfuração nos países ricos requerem que a água tóxica seja
posta de volta no solo, em vez de ser deitada à superfície. Esta prática deve
ser seguida em todo o lado.
Os outros resíduos são separados
e deitados fora em tanques de
contenção. Muitas vezes, as empresas
petrolíferas não fazem mais do que
cavar um buraco e
deitar lá para dentro
o crude (petróleo em
bruto), os resíduos
da perfuração, a
água tóxica e outros
resíduos. Estes tanques
têm muitas vezes fugas
para a água subterrânea
ou transbordam,
contaminando a água
subterrânea e a terra.
Os tanques de contenção devem ser revestidos com
betão. Os tanques precisam de ser monitorizados para ver se têm fugas e
derrames, e precisam de ser limpos antes de acabar a operação petrolífera.
Chamas de gás
Os gases encontrados juntamente com o petróleo são muitas vezes separados
através da sua queima. As chamas de gás (ver páginas 511 a 512) expõem os
trabalhadores, as comunidades e os animais selvagens à poluição que causa
cancro, doenças da pele, asma, bronquite e outros problemas de saúde. As
chamas de gás poluem as nuvens, causando a “chuva negra” que envenena os
pontos de água.
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Transporte e armazenamento
O petróleo é muitas vezes derramado durante
o seu transporte através de oleodutos,
camiões e barcos. O petróleo também pode
vazar dos tanques onde é armazenado.
Estes derrames podem causar danos no
solo, na água subterrânea, nos animais e nas
pessoas, danos esses que duram anos. As empresas
petrolíferas devem avisar as comunidades quando há
um derrame, devem conter o derrame e limpá-lo imediatamente
(para reduzir os danos dos derrames de petróleo e para saber mais sobre a
limpeza de derrames de petróleo, ver páginas 514 a 519).
Os Estudos de Impacto Ambiental para as operações petrolíferas devem
incluir planos para construção e uso de oleodutos. Você pode conseguir apoio
regional organizando as comunidades ao longo do oleoduto para que estas se
oponham às práticas pouco seguras das empresas petrolíferas.
Refinação
As refinarias são fábricas onde o petróleo é
transformado em produtos como gasolina,
gasóleo e combustíveis para aquecimento,
asfalto, óleos lubrificantes e plásticos. As
refinarias libertam resíduos tóxicos para a
água, o solo e o ar. A poluição das refinarias
dá origem à asma, bronquite, cancro,
problemas reprodutivos e desenvolvimento
anormal do cérebro e do sistema nervoso das
crianças. Esta poluição também contribui para
o aquecimento global (para mais informação
sobre como é que as comunidades podem
prevenir e reduzir os danos das refinarias, ver
páginas 455 a 458 e página 513).
Queimar petróleo como combustível
Queimar petróleo e gás nas fábricas e nos automóveis
cria diferentes tipos de poluição do ar. Um gás
libertado é o dióxido de carbono, que retém o calor no
ar. Esta é uma das principais causas do aquecimento
global, causando desastres como cheias, tempestades,
secas e subida da água do mar. Também afecta as
culturas, os animais e os insectos, permitindo que
doenças como a malária se propaguem para novas
áreas. Nas bombas de gasolina e em cidades cheias de
gente, as pessoas estão expostas a fumos tóxicos que
podem causar cancro e muitas outras doenças.
CHA M A S D E G Á S
Chamas de gás
Quando o petróleo é encontrado em conjunto com o gás natural, as empresas
petrolíferas podem queimar o gás para o separar do petróleo. Queimar gás
cria chamas gigantes que iluminam o céu e fazem um barulho muito grande e
terrível. As chamas de gás são perigosas, devastadoras e muito poluentes.
As empresas petrolíferas podem vender o gás em vez de o queimar. Mas
isto é mais caro e difícil, porque o gás tem que ser guardado sob pressão,
aumentando o risco de incêndios e explosões. Por isso, as empresas queimam
o gás simplesmente porque é mais barato, mesmo que isso aumente os danos
causados às pessoas e ao meio ambiente.
Saúde e segurança em torno das
chamas de gás
Todas as chamas de gás poluem o ar e
podem causar problemas de saúde. Mas
algumas chamas de gás são piores do
que outras.
Chamas de gás que
são mais altas do
que uma pessoa são
menos perigosas.
O gás pode ser queimado
ocasionalmente como medida
de segurança para prevenir
explosões (chama-se a isto
chamas seguras) ou todos
os dias como parte das
operações petrolíferas
(chama-se a isto chamas
de rotina). Cada tipo
de chama requer uma
resposta diferente.
Chamas de gás que estão à altura da pessoa ou chamas
que estão na horizontal são muito perigosas.
Chamas de segurança
As refinarias usam as chamas de segurança para aliviar a pressão quando há
demasiado gás nos tubos. Mesmo que isto não aconteça todas as vezes, ainda
assim é muito perigoso! Se houver chamas de segurança na sua comunidade,
exija uma informação antecipada por parte da empresa sobre quando é que as
chamas vão ocorrer. A empresa deve sempre avisar as comunidades vizinhas
24 horas antes de as chamas acontecerem.
Quando há uma chama, todas as pessoas devem ficar tão longe quanto
possível. Fique dentro de casa com as portas e janelas fechadas (para saber o
que fazer numa emergência, ver página 457).
Chamas de rotina
Nalguns lugares, o gás é queimado todos os dias, simplesmente porque isso é
mais barato para a empresa. Para as pessoas que vivem perto do lugar onde
ocorrem chamas de rotina, é muito difícil tomar precauções todas as vezes. A
única maneira de estar seguro em relação às chamas de rotina é que elas não
aconteçam mais.
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PE T R Ó L E O, D O EN Ç A S E D I R EI TOS
As chamas podem ser paradas!
As piores chamas de gás de rotina no mundo ocorreram durante muitos
anos no Delta do Níger, na Nigéria. A queima de gás pelas empresas
petrolíferas internacionais na Nigéria custou muitas vidas. E os venenos
libertados pelas chamas de gás nigeriano contribuíram mais para as
mudanças climáticas e para o aquecimento global do que todas as fontes
juntas na África subsariana.
O camarada Che Ibegwura, um homem do estado de Rivers, na Nigéria,
disse: “Durante anos, vivemos com as chamas contínuas de gás. As nossas
terras agrícolas foram poluídas. Trabalhamos muito para plantar, mas
o resultado é pouco. Os nossos telhados estão corroídos. O nosso ar está
poluído. As nossas crianças estão doentes. Até a água da chuva que bebemos
está contaminada com fuligem preta que vem das chamas de gás. Não
podemos continuar com este sofrimento.”
Em 2005, depois de muitos anos a protestar e lutar, as chamas de gás
de rotina foram proibidas no Delta do Níger. Um juiz decidiu que todas as
empresas petrolíferas na Nigéria deviam parar imediatamente as chamas de
gás, por causa dos problemas de saúde que elas causam e porque isso viola o
direito humano a ter um ambiente saudável.
Se houver queima de gás de rotina perto de si:
• Discuta os perigos das chamas de gás e
forme um comité para se queixar junto da
empresa e dos representantes do governo.
Fale também com trabalhadores de saúde,
jornalistas e ONGs.
A empresa recusa-se a falar
connosco sobre as chamas.
Com quem é que podemos
de novo tentar falar?
• Mantenha um registo da
sua campanha. Incentive
as pessoas a marcarem os
dias e as horas das chamas
e os problemas que elas
causaram.
• Organize reuniões para
partilhar estes registos
com outras comunidades,
jornalistas e representantes
do governo. Mantenha
registos das suas conversas
com eles. Tomar nota ou
filmar o que os representantes dizem também vai mostrar que você está
a falar a sério. Mais importante do que tudo, não desista!
Estas acções podem não parar as chamas imediatamente. Mas o objectivo
comum de parar as chamas pode unir a comunidade e criar forças para
proteger a saúde de todos a longo prazo.
R EFI NA R IA S D E PE T R Ó L E O
Refinarias de petróleo
As refinarias de petróleo são fábricas onde o petróleo é transformado em gasolina
e outros combustíveis, e em materiais como o asfalto e o plástico. As refinarias
de petróleo são uma grande fonte de poluição do ar para as pessoas que vivem
perto delas ou trabalham nelas. Os produtos químicos dentro e à volta das
refinarias causam cancro, danos reprodutivos, problemas de respiração como
asma e enfisema, e defeitos de nascimento, bem como outros problemas de saúde
como dores de cabeça, enjoos, tonturas e ansiedade. As refinarias também são
uma grande fonte de gases que causam aquecimento global.
Tornar as refinarias mais seguras
As refinarias não têm que causar estes problemas de saúde terríveis. A poluição
podia ser prevenida se as empresas petrolíferas fizessem tudo o que podem
para prevenir acidentes e conter os gases e líquidos tóxicos em todas as fases
do processo de refinação. Se você e a sua comunidade estão a trabalhar para
tornar uma refinaria mais segura, a vossa campanha pode concentrar-se
nalgumas destas ideias:
Monitorar a poluição do ar pode identificar problemas e neutralizarfaze er com
que situações de emergência antes de elas se tornarem
graves. As empresas devem monitorar o ar e responder
imediatamente aos problemas. Se elas não
monitorizarem a poluição, as comunidades
podem fazê-lo (ver páginas 455 a 457).
As chamas de gás podem ser substituídas por
métodos mais seguros, como por exemplo
recuperar os gases para reutilização (ver
página 511).
Os tanques usados para armazenar o crude, a
gasolina e outras substâncias libertam por vezes fumos tóxicos quando são
enchidos, esvaziados ou limpos. Estes fumos podem ser contidos com melhor
equipamento e procedimentos. Tanques e válvulas devem ser inspeccionados
e reparados regularmente para prevenir fugas para o ar e para a água
subterrânea.
Os navios petroleiros e as barcas cheios com petróleo e gasolina libertam
fumos para o ar e vazam líquidos para a água. Devem ser usados sistemas
mais seguros em todas as situações para prevenir derrames e fumos tóxicos.
Os navios petroleiros devem ter cascos com duplo ou triplo revestimento para
prevenir derrames.
As águas residuais que contêm químicos tóxicos muitas vezes derramam-se
ou vazam para a água subterrânea. Ao construir e manter sistemas de águas
residuais, estes problemas podem ser evitados.
O crude sujo cria mais resíduos e polui o ar e a água, sobretudo se uma refinaria
for construída para processar formas de petróleo mais limpas e leves. Refinar
petróleo mais limpo resulta em menos poluição.
513
514
PE T R Ó L E O, D O EN Ç A S E D I R EI TOS
Derrames de petróleo
Onde quer que haja petróleo, há derrames de petróleo. Os barcos e camiões
têm acidentes e os oleodutos têm fugas. É responsabilidade das empresas
petrolíferas prevenir os derrames e limpá-los quando eles acontecem.
Há um ditado que diz: “O óleo e a água não se misturam”. Mas quando o
petróleo se derrama para a água, os químicos tóxicos do petróleo misturam
-se com a água e ficam aí durante muito tempo. A parte mais espessa do
petróleo espalha-se pela superfície e impede o ar de entrar na água. Os
peixes, os animais e a as plantas que vivem na água não são capazes de
respirar. Quando o petróleo se derrama para a água, os químicos deixados
para trás podem tornar a água pouco segura para beber, mesmo depois de
ser removido o petróleo que podermos ver.
Quando o petróleo se derrama para a terra, ele destrói o solo, abafando
o ar e matando os seres vivos que tornam o solo saudável. Algo de parecido
acontece quando o petróleo entra na nossa pele ou na pele dos animais. O
petróleo cobre a pele e impede o ar de entrar. As toxinas do petróleo também
entram no corpo através da pele, causando doenças.
Obcnbxncb
óleo e a água misturam-se?
Esta actividade pode ajudar as pessoas a perceberem os efeitos de um
derrame de petróleo na água.
Tempo: 1,5 horas
Materiais: frasco de vidro transparente, água, óleo de cozinha
➊
➋
Encher o frasco com água. Juntar 2 colheres cheias de óleo. Abanar o frasco
para misturar o óleo com a água. Deixar estar o frasco durante uma hora.
Voltar ao frasco. Você vai ver que a maior parte do óleo está em cima. O
óleo de cozinha não faz mal, mas tente imaginar que o frasco é um rio com
um derrame de petróleo.
Começar uma discussão em grupo sobre os efeitos que isso possa ter.
Imaginar os peixes a tentarem sobreviver neste rio com uma camada
de petróleo a bloquear o ar e a luz do sol. Imaginar o que acontece aos
pássaros que tentam caçar os peixes no rio.
➌
Usar uma colher para tentar tirar o óleo da superfície.
Depois de ter tirado tanto óleo quanto possível, ver
se algumas bolhas de óleo permanecem dentro da
água. Isto é óleo que mergulha para dentro da água.
Ter em consideração o ditado: O óleo e a água não
se misturam . Discutir com o grupo o que acontece
quando o petróleo e a água se misturam.
D ER R A M E S D E PE T R Ó L E O
515
Poluição da água causada pelo petróleo
É muito perigoso beber água que tenha petróleo. A água que vem do solo
quando o petróleo é extraído também é muito tóxica.
Os filtros que limpam o petróleo e os químicos tóxicos da água são muito
caros. Ferver a água, usar desinfecção solar e acrescentar cloro à água (ver
páginas 92 a 99) mata os micróbios mas não consegue eliminar a poluição do
petróleo.
Na realidade, acrescentar cloro torna pior a poluição do petróleo, porque
ele se combina com alguns dos químicos chamados “fenóis” para formar um
produto químico ainda mais tóxico chamado “clorofenol”.
Se um derrame de petróleo foi limpo, mesmo que você não veja petróleo
na água, é provável que a água ainda não seja segura. Muitas das toxinas do
petróleo assentam na água e ficam aí durante muito tempo. A única forma de
garantir que a água é segura é fazer com que ela seja testada.
Como manter-se seguro depois de um derrame de petróleo
• Evitar o contacto com o petróleo. Manter as crianças e os
animais longe do derrame. Se possível, pôr uma vedação
à volta da área e pôr um sinal de aviso.
• Usar uma fonte de água a montante do derrame.
Vamos mas é
buscar água ao
terreno do teu tio.
Mesmo que você tenha que caminhar durante
muito tempo, vale a pena, para prevenir
problemas de saúde. No lugar onde o petróleo
se derramou, a água da chuva pode ser a
única água segura para beber.
• Evitar comer animais que vivem na
água, como caranguejos, camarões e
caracóis, perto do derrame e nas
áreas a jusante dele.
• Evitar tomar banho com a
água afectada. Se alguém
cair na água, deve lavarse imediatamente com
sabão forte e água limpa.
• Informar os vizinhos,
os representantes do
governo, a imprensa e
as ONGs que lidam com
questões de saúde e do
meio ambiente
• Ensinar as pessoas nas escolas e reuniões comunitárias sobre os perigos
do petróleo.
516
PE T R Ó L E O, D O EN Ç A S E D I R EI TOS
Limpar derrames de petróleo
A empresa diz que
Limpar derrames é responsabilidade da empresa
este oleo é bom
petrolífera. As empresas alegam que podem limpar
qualquer derrame. Mas a verdade é que, mesmo com para as plantas
o melhor equipamento, os derrames de
Não serás capaz
petróleo e as limpezas de derrames de
de comer nada que
petróleo são muito perigosos e
difíceis. Na maior parte dos
cresça aqui, nem
casos, as pessoas afectadas
daqui a um milhão
por derrames não têm
de anos.
equipamento de protecção.
A empresa petrolífera deve
começar a limpar assim que
o derrame acontece. Como as
toxinas do petróleo assentam na água e no solo, retirar
a lama preta da superfície nem
Sempre que há derrames, na água ou na terra,
sempre retira a fonte dos danos
os produtos químicos no petróleo envenenam
(ver página 514).
pessoas, animais, plantas, terra e água.
Limpeza de derrame de petróleo torna
os trabalhadores doentes
Quando um navio petroleiro chamado Exxon Valdez encalhou ao largo da costa
do Alasca em 1989, derramou milhões de litros de petróleo na água. O derrame
matou inúmeros animais e pássaros e destruiu a indústria pesqueira local. O
petróleo causou danos que continuam até hoje.
A empresa Exxon contratou 10.000 trabalhadores para limpar o petróleo e
salvar os animais. Usando o melhor equipamento, eles trabalharam 12 a 16 horas
por dia durante muitos meses a limpar o derrame e a tentar prevenir o petróleo
de se espalhar. Eles usaram roupas de protecção para manter o petróleo longe da
sua pele e usaram máscaras para os impedir de respirarem os fumos tóxicos.
No fim de cada dia, os trabalhadores retiravam as suas capas de chuva,
botas e luvas. Os fatos e os próprios trabalhadores eram limpos com solventes
químicos. No dia seguinte, eles punham de volta os fatos e regressavam ao
trabalho. Mas, apesar do equipamento de protecção, muitos trabalhadores
queixaram-se de tosse, dores de cabeça, tonturas e pingar do nariz. “À noite, na
cama, todos estavam a tossir. Parecia uma enfermaria de tuberculosos”, disse
um trabalhador. Dez anos mais tarde, muitos trabalhadores tinham desenvolvido
perda de memória, danos nos pulmões e cancro. Centenas de trabalhadores
morreram.
A Exxon foi processada para pagar pelos danos. Mas, passados todos estes
anos, ainda não pagou nada.
D ER R A M E S D E PE T R Ó L E O
517
O que fazer em caso de derrame de petróleo
Quando o petróleo se derrama ou vaza de um tanque de
armazenamento, ele deve ser contido e absorvido. Assim
que tiver sido absorvido, o petróleo e qualquer material
usado para o absorver deve ser retirado e eliminado
com segurança, por exemplo num fosso revestido
com cimento, para que não vá poluir a água
subterrânea.
Os derrames de petróleo na água também
podem ser contidos e absorvidos, mas isto é
Alguns materiais para absorver petróleo
difícil se não se tiver um equipamento especial.
são palha, serradura, maçarocas de milho
Qualquer pessoa que entra na água para limpar
moídas, penas, barro, lã e areia.
petróleo derramado pode ficar muito doente.
Tentar retirar petróleo da água apanhando-o em baldes é perigoso e não
funciona muito bem. Com equipamento e formação adequados, é assim que os
derrames de petróleo na água são limpos:
➊
O petróleo é mantido no lugar com uma baliza,
uma espécie de vedação flutuante segura por
âncoras ou atada a barcos ou a coisas na costa.
A baliza impede que a maior parte do petróleo
flutue para longe.
➌
O petróleo que permanece na água é
absorvido com materiais como serradura,
turfa, penas ou barro.
➋
Uma máquina chamada coadeira tira o
petróleo da superfície da água e suga-o,
através de uma mangueira, para dentro de
um tanque de armazenamento.
➍
Depois de a maior parte do petróleo ter sido
coada da superfície, embebida e retirada, o que
sobra é queimado. Queimar petróleo cria fumo
tóxico, mas pode ser melhor do que deixar o
petróleo na água.
518
PE T R Ó L E O, D O EN Ç A S E D I R EI TOS
Se você limpar um derrame de petróleo, proteja-se!
Se você, ou a sua comunidade, tiverem que limpar um derrame de petróleo por
si mesmos ou se forem pagos por uma empresa petrolífera para limpar um
derrame de petróleo, você deve saber:
• O petróleo é sempre tóxico. Tocar nele ou respirá-lo pode trazer
problemas de saúde graves (ver página 506).
• Os solventes usados para limpar o petróleo também são tóxicos e podem
trazer problemas de saúde graves (ver página 516).
• As mangueiras de alta pressão habitualmente usadas para pulverizar o
petróleo para fora das rochas fazem com que o petróleo se vaporize (se
transforme num gás) e tornam o petróleo mais fácil de inalar. Isto pode
trazer problemas da garganta e dos pulmões.
• A empresa responsável pelo derrame e pela limpeza deve disponibilizar
-lhe roupa de protecção, incluindo um fato para o corpo, luvas, botas,
respiradouro, óculos de protecção e cobertura para a cabeça (ver
Apêndice A).
• Trabalhar longas horas em água contaminada com petróleo ou ficar
exposto a solventes pode causar problemas de saúde graves. É melhor
trabalhar menos horas e descansar longe dos fumos tóxicos, entre os
turnos de trabalho.
Fazer um plano de segurança para emergências
Se você vive num lugar onde há extracção ou refinarias de petróleo, trabalhe
com a sua comunidade para fazer um plano de segurança para proteger
a saúde de todos em caso de emergências, como por exemplo chamas ou
derrames (para aprender mais sobre o que um plano de segurança inclui, ver
página 545).
Mapear a sua comunidade
Um plano de segurança deve procurar saber onde é que os problemas podem
surgir e onde estão os recursos para prevenir e recuperar de uma situação de
emergência. Mapear a comunidade pode ser uma ajuda.
Em conjunto com outras pessoas da comunidade, desenhe um mapa do
lugar onde você vive. Inclua poços de petróleo,
locais de perfuração, oleodutos, fossos de
resíduos, refinarias e outras fontes de
poluição. Inclua também lugares onde você
obtém água, cultiva ou recolhe alimentos e
mantém animais, bem como os recursos
comunitários.
Fale sobre onde é que houve derrames,
acidentes ou poluição no passado. Qual foi
o impacto? Marque o mapa onde você viu
os efeitos dos derrames de petróleo. Depois,
faça uma lista dos seus recursos disponíveis
e faça um plano sobre como usá-los em caso
de emergência.
D ER R A M E S D E PE T R Ó L E O
Restaurar terra danificada pelo petróleo
PRECISAMOS DE
RESPONSÁVEL
• Uma fonte de água a montante ou um
tanque de água comunitário
• José
• Mudar a água armazenada a cada 6 a
12 meses.
• Sala, Naisha, Njuma
• Camiões ou outros veículos para levar
as pessoas para longe com segurança.
• Táxi do Ahmed,
Quantos de nós
temos telefones
celulares que
podemos
usar numa
emergência?
Camião do Kwame
• Escolher 1 ou mais pessoas para
alertarem as comunidades vizinhas,
os representantes e os meios de
comunicação social numa emergência.
• Uma escola, igreja ou outros locais de
encontro.
• Telefone ou rádio para pedir ajuda e
alertar os representantes e os meios
de comunicação social.
• Números de telefone de hospitais,
postos de saúde e trabalhadores de
saúde.
Os derrames de petróleo causam danos prolongados graves à terra. Se o
petróleo for limpo e a terra for deixada para recuperar durante muitos anos,
pode ser possível restaurar a terra para a tornar fértil outra vez. Mas isso
vai levar muito, muito tempo (para mais informação sobre como restaurar a
terra, ver Capítulo 11 e página 496).
519
520
PE T R Ó L E O, D O EN Ç A S E D I R EI TOS
Uma nova forma de limpar petróleo derramado?
Depois de um derrame de combustível para fazer gasóleo nos EUA, foi pedido
a diferentes empresas que vissem o que podiam fazer para o limpar. O solo
onde o petróleo se derramou foi acumulado em montes e cada empresa recebeu
um monte sobre o qual trabalhar.
Uma das empresas era um pequeno negócio dedicado a criar e a vender
cogumelos comestíveis. O homem que geria o negócio tinha visto os cogumelos
crescerem depois de incêndios florestais e outros desastres naturais. Ele
acreditava que os cogumelos tinham o poder de restaurar a terra danificada.
A sua equipa foi trabalhar enchendo o seu monte cheio de petróleo com fibras
das raízes dos cogumelos ostra. Depois, taparam o monte e esperaram.
Quando destaparam o monte 6 semanas mais tarde, o que viram
era extraordinário. O solo estava coberto de enormes cogumelos, alguns
chegando a ter 30 cm de largura. Eles levaram os cogumelos e o solo para um
laboratório e testaram-nos. Os cogumelos não tinham qualquer vestígio de
petróleo ou quaisquer químicos tóxicos que o petróleo contém. Os cogumelos
tinham limpo totalmente o solo!
A parte excitante desta história foi o que aconteceu a seguir. Depois de
os cogumelos terem amadurecido, as moscas vieram e puseram ovos neles.
Apareceram larvas, os pássaros voaram para aqui e outros animais pequenos
começaram a comer os cogumelos e as larvas. Os pássaros e os animais
transportaram sementes e as plantas começaram a crescer. O monte de lixo
poluído foi transformado num rico jardim com vida.
Este método funcionou na experiência, mas ninguém sabe ainda se ele
também vai funcionar em todas as condições e em todos os lugares. Mais
trabalho precisa de ser feito para descobrir se os cogumelos ou outros
“remédios naturais” podem limpar derrames de petróleo.
J US T I Ç A A M B I EN TA L
Justiça ambiental
Uma das únicas formas de as pessoas protegerem a sua saúde em áreas ricas
em petróleo é garantir que quem quer que controla os recursos petrolíferos
trabalha de maneira a proteger as pessoas dos riscos para a saúde e que lhes
dá alguns benefícios. Porque o petróleo é tão valioso, eles têm muita riqueza
para poderem gastar com quem trabalha.
Chega
de
ão!
Destruiç
Ch e
v
Tex ronmen aco
t iu !
Água
limpa
agora!
Parem
a
violência!
Sa
De lvem
l
Nígta doo
er!
Mulheres
do Delta do
Níger pela
justiça
Mulheres protestam contra exploração petrolífera
O Delta do Rio Níger, na Nigéria, foi em tempos uma terra fértil com muito peixe,
animais selvagens e áreas agrícolas saudáveis. Quando as empresas petrolíferas
começaram a chegar à região, elas prometeram benefícios económicos para
todas as pessoas. Mas, passados mais de 30 anos de desenvolvimento petrolífero,
as empresas ainda não cumpriram o que tinham prometido. Tal como explicou
uma mulher nigeriana: “Estamos zangados. Desde 1970, quando a empresa veio
para aqui, eles têm-nos negado tudo. Não temos nada para mostrar, a não ser a
poluição dos nossos rios e enseadas, a destruição das nossas florestas e zonas de
mangue, e o barulho terrível das chamas de gás. Não temos esperança, enquanto
eles estão a fazer milhões com as nossas dádivas de Deus. Eles não se preocupam
nem querem ouvir o nosso choro.”
(história continua na página seguinte)
521
522
PE T R Ó L E O, D O EN Ç A S E D I R EI TOS
As mulheres nigerianas começaram uma campanha de protesto pacífico
envolvendo pessoas de cada tribo da região. As mulheres exigiram que a
Chevron-Texaco, umas das principais empresas petrolíferas a trabalhar
na região, desse empregos, recursos para a educação, água, electricidade e
desenvolvimento comunitário. E elas exigiram uma compensação por todos os
danos que a empresa petrolífera tinha causado.
A Chevron-Texaco pediu ao governo que reagisse com mão de ferro. A
polícia e os militares atiraram gás lacrimogéneo e atacaram as mulheres,
batendo-lhes e torturando-as. Muitas ficaram feridas e algumas foram mortas.
Mas as mulheres reagiram com determinação e criatividade. Algumas fizeram
piquetes na sede da empresa petrolífera, outras ocuparam o principal terminal
de exportação e centenas delas ocuparam 4 estações no rio Níger para impedir
que as empresas enviassem o petróleo para fora por barco. A Chevron-Texaco
perdeu mais de $100.000 dólares por cada dia que as mulheres ocuparam o
terminal e as estações de embarque!
Finalmente, os representantes da empresa petrolífera cederam. A
Chevron-Texaco concordou em criar empregos e estabelecer um programa de
microcrédito para ajudar as mulheres a começarem os seus próprios negócios.
As acções brutais das empresas petrolíferas e dos seus aliados do governo
na Nigéria mostram que eles não vão parar por nada para aumentarem
os seus lucros. As mulheres da Nigéria inspiraram pessoas em todo o
mundo a exigirem uma parte dos benefícios, e não o sofrimento, causados
pelo desenvolvimento petrolífero. Senão, elas vão parar o desenvolvimento
petrolífero na totalidade.
O petróleo e a lei
Muitos países fazem leis para protegerem da poluição as pessoas, a água e
a vida selvagem e para terem condições de trabalho mais seguras. Também
existem leis e acordos regionais e internacionais para responsabilizar as
empresas petrolíferas pelos derrames. Mas as leis só são eficazes se as pessoas
trabalharem em conjunto para garantir que elas se fazem cumprir (para
saber mais sobre leis internacionais, ver Apêndice B).
A empresa petrolífera deve realizar um Estudo de Impacto Ambiental (EIA)
antes de extrair petróleo. O EIA define aquilo pelo qual a empresa é legalmente
responsável em caso de derrame. Discuta como é que a sua comunidade pode
usar o EIA para responsabilizar a empresa numa emergência. Por exemplo, será
que você pode exigir que eles fechem o oleoduto que causou o derrame até que
eles o limpem? Será que a empresa pode fornecer água de beber à comunidade
ou pagar por serviços de saúde e danos à propriedade? (Para aprender mais
sobre EIA, ver Apêndice B).
O PE T R Ó L E O E A L EI
O caso contra a Texaco
Quando a Texaco chegou ao Equador para extrair petróleo, o povo Cofan que aí vivia
não fazia ideia de que uma empresa petrolífera norte-americana ia destruir as suas
vidas. Durante mais de 20 anos, a empresa deitou milhões de litros de petróleo e
águas residuais tóxicas para o meio ambiente.
Os rios que tinham suportado os Cofan durante gerações tornaram-se inúteis
como fontes de alimento. As pessoas passavam muitas horas de cada dia a procurar
água para beber e a caçar animais. Muitas pessoas fugiram da área devido à
destruição. Os líderes Cofan disseram que a Texaco tinha destruído a sua forma de
vida tradicional e causado doenças a milhares de pessoas. O povo Cofan reduziu de
15.000 pessoas para apenas 500. As vítimas da contaminação da Texaco formaram
uma Frente para a Defesa do Amazonas. Eles organizaram cuidados médicos para
os que sofriam de doenças graves. Ajudaram a organizar estudos sobre os efeitos das
operações petrolíferas da Texaco na saúde. Falaram com activistas do ambiente da
capital, Quito, e advogados dos Estados Unidos. Em conjunto, criaram um plano. Os
líderes e activistas viajaram a pé, de canoa e de avião para a cidade de Nova Iorque
para pôr um processo em
tribunal de milhares de
milhões de dólares contra
a Texaco.
A Texaco tentou que
Defendam
A extracção
o
de petróleo
Amazonas!
o caso fosse rejeitado. A
mata!
empresa alegava que o
caso devia ser julgado
A Tóxica tem que
num tribunal do Equador,
ir embora!
porque a poluição tinha
acontecido nesse país. Os
activistas tinham medo
que fosse difícil conseguir
justiça no Equador. Eles
explicaram ao juiz que as
decisões de poluir o Amazonas
tinham sido feitas nos Estados
Unidos. O juiz aceitou ouvi-los. Foi a
primeira vez que um caso internacional foi aceite num tribunal americano! Os líderes
Cofan estavam muito contentes.
Durante 10 anos, a Texaco lutou para que o caso fosse rejeitado. Um novo juiz
decidiu que o caso devia ser julgado no Equador, mas, se não houvesse um resultado
justo, o caso seria novamente julgado em Nova Iorque. O processo legal ainda não
acabou. As pessoas continuam a sofrer de problemas de saúde à medida que o
petróleo é bombeado para fora da floresta tropical.
A sua persistência em procurar justiça por parte da empresa Texaco ensinou
muitas pessoas sobre os danos feitos pelo petróleo e forçou a Texaco e outras
empresas petrolíferas a usarem métodos mais seguros para extraírem petróleo.
523

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