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BOLETIM DO CONSÓRCIO ISPOR PARA A AMÉRICA LATINA
Política da saúde
Gasto do próprio bolso na América Latina: Implicações políticas e econômicas
VOL 3 N 4, DEZEMBRO 2015
Autor:
A magnitude do gasto do próprio bolso nos sistemas de saúde
está diretamente relacionada ao grau de desamparo
confrontado pelos cidadãos. À medida que aumenta a porção
do gasto direto feito pelas famílias, é possível inferir-se o
efeito perverso das contingências de saúde na
sustentabilidade financeira.i
Marino J. González
Reyes, MD, MSc, PhD,
Professor Titular e
Investigador, Unidade
de Políticas Públicas,
Universidad Simón
Bolívar, Caracas,
Venezuela
Isto é especialmente mais desfavorável nos casos de famílias que se encontram em situação de pobreza. Partindo-se disso,
as políticas de saúde devem visar justamente a diminuição do gasto do próprio bolso através do aumento do
financiamento público, especificamente através dos mecanismos fiscais.ii
O gasto do próprio bolso também tem efeito sobre a capacidade de designar adequadamente os recursos através da
avaliação econômica. Quando os recursos públicos são altamente significativos no total dos recursos de sistema de saúde,
é mais frequente o desenvolvimento dos mecanismos institucionais para que se realize a melhor designação possível. A
partir daí, nesses países existem instâncias para revisar as evidências de efetividade e qualidade, levando-as em
consideração na distribuição dos recursos. Ao contrário, quando a maior parte das decisões sobre a compra de serviços
baseia-se diretamente nas pessoas e famílias, porque estas só têm os recursos do seu próprio bolso, tais decisões são
tomadas sem maiores referências sobre os critérios de efetividade e qualidade que deveriam estar envolvidos. Então, não
é estranho que os países com altas proporções de gasto do próprio bolso, sejam aqueles que têm justamente menor
capacidade institucional para realizar avaliações econômicas e utilizar os resultados na designação dos recursos gerais, no
sistema de saúde.
Nos últimos quinze anos, a grande maioria dos países da América Latina realizaram avanços significativos no ordenamento
das suas economias. Em muitos deles, são mantidas taxas de crescimento significativas com baixa inflação. O aumento do
ingresso per capita real é também evidente; o que não parece tão satisfatório, é a redução das desigualdades no
financiamento de serviços de saúde.
Tabla
Países com as economias más grandes de América Latina
Percentagem de gasto de próprio bolso em relação ao
gasto total em saúde, 2011
Argentina
21
Bolívia
26
Brasil
31
Chile
33
Colômbia
16
Costa Rica
23
R. Dominicana
40
Equador
55
Guatemala
53
México
46
Panamá
27
Paraguai
56
Peru
38
Uruguai
14
Venezuela
61
Fonte: Cálculos próprios basados em WHO 2014
Consideremos, por exemplo, os quinze países com as
maiores economias na região (ver Tabela). De acordo
com os dados publicados pela Organização Mundial de
Saúde (OMS)iii, e estimativas do percentual de gasto do
próprio bolso sobre o gasto total em 2011, a perspectiva
resultante é muito desigual. Somente dois países
(Colômbia e Uruguai) têm uma proporção de gasto do
próprio bolso, que é menor que 20% em relação ao gasto
total em saúde. Oito países (Argentina, Costa Rica, Bolívia,
Panamá, Brasil, Chile, Peru e República Dominicana) têm
uma proporção de gasto do próprio bolso, que está entre
20% e 40% sobre o gasto total em saúde. Cinco países
(México, Guatemala, Equador, Paraguai e Venezuela)
mantêm uma proporção de gasto do próprio bolso, que é
superior a 40%. Nos últimos quatro países, este indicador
é superior a 50%.
De acordo com estes dados, é claro que a desigualdade
no financiamento da saúde em muitos países da região é
um dos principais problemas. Se este indicador é uma
expressão do conjunto da população, é também evidente
que os setores com ingressos mais baixos têm uma
proporção ainda maior de gasto proveniente do próprio
bolso. O impacto desta situação, em termos das
condições de saúde e no acesso à qualidade dos serviços,
é muito significativo. De tal maneira, que a redução desta
proporção tão alta de gasto do próprio bolso deve ser
considerada como uma das principais exigências das
políticas de saúde, no contexto da região.
Assim, é importante examinar as opções a considerar nestes sistemas de saúde. Nos países com menor proporção de gasto
do próprio bolso (isto é, Uruguai e Colômbia), a magnitude do gasto per capita proveniente de fontes públicas é superior à
média da região. No caso da Colômbia, a proporção de recursos destinados à saúde (sobre o Produto Interno Bruto (PIB)
total) é 6,5%, ao passo que no Uruguai atinge 8,5%. De maneira que o aumento dos recursos deve sempre ser examinado à
luz das considerações econômicas gerais. Estes dois países, no entanto, podem lograr maiores rendimentos da inversão
pública, com a utilização mais extensa de modalidades de avaliação econômica, tal como estão realizando na atualidade.
Do ponto de vista dos cidadãos, também é previsível que exista uma tendência crescente a exigir a diminuição dos gastos
do próprio bolso.
Os países com maior proporção de gasto do próprio bolso, por sua vez, se dividem em dois grupos. No primeiro grupo,
estão os países que atualmente designam menos de 7% dos seus recursos ao sistema de saúde, com relação ao Produto
Interno Bruto (atual cifra média do PIB). Este grupo compreende os seguintes países: Venezuela, Peru, Bolívia, República
Dominicana, México, Guatemala e Equador. Nestes países, é possível aumentar a proporção de gastos em saúde,
especialmente nos primeiros da lista, de maneira a incorporar modalidades de financiamento público aos grupos de
população. Ao mesmo tempo, os mecanismos de designação de recursos devem ser implementados ou melhorados,
especialmente com a incorporação da avaliação econômica.
No segundo grupo, estão os países nos quais o investimento em saúde já representa uma fração de recursos superior a 7%
do PIB. Neste grupo, encontram-se: Chile, Argentina, Panamá, Brasil, Paraguai e Costa Rica. Nestes países, a possibilidade
de diminuir a proporção de gasto do próprio bolso deve estar vinculada, preferivelmente, à otimização dos recursos, e não
ao aumento do investimento de recursos em relação ao PIB. Isto significa uma maior utilização de modalidades de
redesignação de gastos, para as quais a avaliação econômica representa um mecanismo de especial importância.
É evidente que as situações não são comparáveis em todos os países deste último grupo. São notórios, por exemplo, os
casos da Costa Rica e Paraguai. No primeiro país, a proporção de gasto do próprio bolso é de 23%, muito próxima ao limite
de 20%, no qual se encontram Uruguai e Colômbia. No Paraguai, as complicações são maiores, já que este país tem quase
9% do PIB designado aos gastos de saúde e uma fração de 56% de gasto do próprio bolso.
Todos os sistemas de saúde da região enfrentarão nos próximos anos, as demandas de cobertura universal num contexto
de aumento da expectativa de vida e restrições ao aumento dos recursos aplicados no setor. Atenção especial deverá ser
concentrada na redução do gasto do próprio bolso, pelas consequências adversas disto sobre a equidade. Na
implementação dessas mudanças, será cada dia mais crítica a utilização das opções de designação de recursos que são
derivadas da aplicação da avaliação econômica. Trata-se de uma excelente oportunidade para vincular a adoção de
políticas considerando-se o conhecimento já acumulado nestes temas na América Latina.
POLÍTICA DA SAÚDE Recursos do Consórcio ISPOR para a América Latina
Science Policy Brief: El Análisis del Impacto Presupuestario: Nuevas Normas
HTA Health Policy Series: apresentado por “News Across Latin America”
i
Moreno-Serra, Rodrigo, Sarah Thomson, Ke Hu. 2013. Measuring and Comparing Financial Protection. En Irene Papanicolas y Peter
C. Smith. Health System Performance Comparison: An Agenda for Policy, Information and Research. Open University Press. Capítulo
8.
ii
No seguinte trabalho, são examinadas as evidências em sete países de ingressos baixos e médios para o aumento do financiamento
público: McIntyre et al. Health Research Policy and Systems 2013, 11:36
http://www.health-policy-systems.com/content/11/1/36
iii
Ver: WHO. 2014. World Health Statistics 2014.

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