biografias de anarcofeministas - Coletivo Anarquista Bandeira Negra

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biografias de anarcofeministas - Coletivo Anarquista Bandeira Negra
 BIOGRAFIAS DE ANARCOFEMINISTAS
“Que cada sujeito sujo, maltrapilho e pobre
se arme com um revólver ou uma faca, e estão à espreita nas escadarias
dos palácios dos ricos, esfaqueie ou atire nos donos quando saírem. Vamos
matá-los sem piedade, e que seja uma guerra de extermínio.”
LUCY PARSONS
Lucy Eldine Gonzalez Parsons, por quase 70 anos, lutou pelos direitos dos
trabalhadores e trabalhadoras – principalmente mulheres –, num momento histórico de
aumento da opressão do sistema capitalista. Oradora de praças públicas e escritora
que desafiou, no seio do capitalismo, uma promessa de mudança. Sempre defendeu
que o capitalismo era a base material de todas as desigualdades, dedicando-se, pelo
resto de sua vida, ao sindicalismo revolucionário. Como mulher negra e de origem
mexicana enfrentou o desafio de lutar por questões como o racismo, xenofobia e o
machismo.
Era afrodescendente, criada por indígenas, nascida escrava em 1853 em Wacco,
Texas – um dos estados mais racistas dos EUA –, em meio à Guerra Civil. Em 1870 e
1871, Lucy conheceu e casou-se ilegalmente com Albert Parsons, já que leis proibiam
o casamento interraciais. Foram forçados a fugir do Texas para Chicago por ameaças
de morte. Lá tornaram-se figuras ativas em organizações libertárias, no movimento
operário e, Lucy mais precisamente, em favor de presos políticos, de
afrodescendentes, pessoas desabrigadas e mulheres.
Albert Parsons, em pouco tempo, foi condenado junto com mais sete anarquistas por
supostamente jogarem a bomba na revolta de Haymarket, que deu origem ao 1º de
maio, na luta em favor da jornada laboral diária de oito horas.
Lucy escrevia para o periódico O Socialista, Para os Vagabundos e O Alarme, jornal
da Associação Internacional dos Trabalhadores. Em 1892, publicando Liberdade,
quase acabou presa pelo teor de seus discursos em espaços públicos e por distribuir
literatura anarquista. Era considerada pela direita, os patrões e a polícia, como “mais
perigosa do que mil rebeldes". Lucy continuou organizando sozinha movimentos
operários, e escrevendo em jornais sindicalistas. Participou das mobilizações de 1890
que levaram à comemoração do 1o de maio pela primeira vez nos Estados Unidos.
Em 1907, Lucy organizou uma marcha de 10 mil pessoas, tendo à frente mulheres
desempregadas. Foi presa muitas vezes defendendo suas ideias. Morreu no dia 07 de
março de 1942, aos 89 anos de idade, em decorrência de um incêndio em sua casa,
em Chicago. Seu companheiro na época, George Markstall, morreu no dia seguinte
devido aos ferimentos sofridos ao tentar salvá-la. Após a sua morte, a polícia de
Chicago apreendeu em sua biblioteca mais de 1.500 livros escritos e todos os seus
documentos pessoais. Material que foi simplesmente apagado da história, justamente
por ter sido ela uma das mais importantes agitadoras e revolucionárias
estadunidenses.
Lucy Parsons foi uma mulher de ação e de palavras fortes. O regime burguês tentou
reprimir sua voz, no entanto, o legado de seus 70 anos de luta contra a opressão e a
exploração capitalista permanecem como inspiração das nossas lutas até hoje.
Fontes:
http://www.waste.org/~roadrunner/ScarletLetterArchives/LucyParsons/FuryForJustice.h
tm
http://lucyparsons.org/biography-iww.php
http://lucyparsons.org/biography-freesociety.php
Citação: “Quanto aqueles massacres locais, periódicos, malditos a qual todos vocês
estão sempre vulneráveis, vocês precisam se vingar deles do seu próprio jeito. [...]
Esse é o começo do respeito! [...] Vocês não são, de forma alguma, indefesos. Pois a
tocha do incendiário, que se sabe ser capaz de mostrar a assassinos e tiranos a linha
do perigo, a qual eles não podem atravessar com impunidade, não pode ser tirada de
vocês.” (Trecho de artigo onde Lucy Parsons incentiva a ação direta violenta de
desempregados e trabalhadores)
“Em todos esses anos de labuta, você não sabe que produziu milhares e milhares de
dólares que nunca recebeu, continua sem receber e, ao menos que HAJA, nunca mais
irá receber qualquer parte? Você não vê que “bom patrão” e “mau patrão” não faz
sentido? Que vocês são a presa de caça de ambos, e que a missão deles é apenas o
roubo? Você não vê que é o sistema industrial e não “o patrão” que precisa ser
mudado?”
Foto: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/6/64/Lucy_Parsons.1920.jpg
Amparo Poch y Gascón
Amparo Poch y Gascón nasceu em Zaragoza, na Espanha, em 1902. Estudou
Medicina na década de 20, em um período onde o acesso a esse curso era quase
exclusividade de homens (e foi número um de sua turma), além de ter estudado para o
magistério. Quando começa a trabalhar como médica, se vincula à central sindical de
orientação anarquista CNT e se foca no atendimento às mulheres trabalhadoras,
particularmente com temas de educação sexual, métodos contraceptivos, doenças de
transmissão sexual e maternidade.
Também se envolveu em questões acerca da emancipação das mulheres,
participando das lutas sociais e no enfrentamento dos preconceitos e do
conservadorismo que mantinham a cultura de opressão de gênero. Foi uma das
fundadoras da revista e do grupo Mujeres Libres, organização de mulheres que
chegou a reunir 20 mil revolucionárias durante a Guerra Civil Espanhola (1936-1939).
Amparo Poch escreveu e participou de cursos e espaços de educação sobre
maternidade responsável, muito comuns no período anterior e durante a Revolução na
Espanha. Ela foi fundadora do “Grupo Ogino”, que educava sobre métodos
contraceptivos para as mulheres.
Quando Amparo tomou parte no Ministério da Saúde durante a época da revolução,
incentivou os “liberatórios da prostituição” das Mujeres Libres, locais de apoio e
formação para quem queria abandonar a prostituição. Outra atividade que apoiou e
desenvolveu foram as “colônias para crianças”, que substituíam os orfanatos
(considerados como prisões), que também cuidavam das crianças cujas famílias
tinham ido ao front de batalha ou que precisavam ir para o exílio. Por fim, Amparo
Poch dirigiu a “Casa da Mulher Trabalhadora” em Barcelona até a data de seu exílio,
em 1939. Durante todo esse tempo, trabalhou como médica, atendendo e auxiliando
principalmente as mulheres da classe trabalhadora e as crianças.
A trajetória da anarquista revela uma preocupação tanto com a organização e luta do
processo revolucionário na Espanha, como a contínua luta pela participação das
mulheres e a superação da cultura patriarcal. Defendeu em muitos escritos a liberdade
da mulher ao casamento, defendendo o amor livre e a livre expressão da sexualidade
de maneira saudável e segura, com o direito ao prazer sexual das mulheres,
rompendo com a visão unicamente biológica da reprodução.
Sua atitude insubmissa, rebelde, contestatória, revolucionária... se manifesta desde
seus primeiros escritos na imprensa e também nas suas conferências; era uma
excelente oradora. Uma mulher vitalista, amante da liberdade, inimiga da guerra, ainda
que tenha tido que sofrer com a barbárie militar, lutou por outra sociedade onde
estivessem erradicadas as armas e que o protagonismo fosse da palavra, da cultura,
da solidariedade... Seu sentido comum da igualdade humana, sem preconceitos, a
leva a escrever textos de forte contestação, enfrentando as convenções da época. Até
hoje, Amparo Poch dá nome a centros de saúde, ruas e outros espaços públicos na
Espanha e, em particular na sua cidade, Zaragoza.
A organização Mujeres Libres, que ajudou a criar, continua sendo um referencial e
estímulo na luta das mulheres trabalhadoras, contra o capitalismo e também contra o
patriarcado.
http://sociedadandaluzadebioetica.es/debatica/index.php/journal/article/view/9
http://fal.cnt.es/sites/all/documentos/bicel/Bicel14/9.htm
Citação: “A moral burguesa infiltra também no matrimônio o conceito de propriedade, e
faz com que os homens digam “minha mulher” e as mulheres se digam esposas “de”
fulano, tendo o homem um sentido claro de seus numerosos direitos sobre a esposa”.
(Amparo Poch)
Foto: http://www.estelnegre.org/documents/poch/poch01.jpg
Emma Goldman
Emma Goldman foi uma célebre anarquista, muito conhecida por seus escritos e seus
manifestos libertários e feministas, uma das pioneiras na luta pela emancipação das
mulheres.
Nasceu em 1869, no seio de uma família judia de Kaunas, na Lituânia, que regia um
pequeno hotel. Sofreu com uma infância violenta, tendo sido estuprada quando tinha
apenas 12 anos. Durante o período de repressão política que seguiu-se ao
assassinato de Alexandre II, quando tinha 13 anos, mudou-se com a família para São
Petersburgo.
Emigrou aos Estados Unidos com uma irmã depois de um enfrentamento com seu pai,
que pretendia casá-la aos 15 anos. Passou a trabalhar como operária têxtil. O
enforcamento de anarquistas depois do motim de Haymarket, em Chicago, animou a
jovem Emma Goldman a unir-se ao movimento anarquista e converter-se, aos 20
anos, em uma grande revolucionária. Nessa época casou com um emigrante russo,
mas o casamento durou apenas 10 meses. Emma separou-se e foi para Nova Iorque,
mas continuou legalmente casada para conservar sua cidadania estadunidense.
Foi presa em 1893, na penitenciária das ilhas Blackwell, por instigar o operariado à
greve: “Peçais trabalho, se não dai-vos, peçais pão, e se não dai-vos nem pão nem
trabalho, tomem o pão”. Voltairine de Cleyre saiu em defesa de Emma Goldman em
uma conferência dada depois de sua prisão. Enquanto permaneceu na prisão, Emma
desenvolveu um profundo interesse pela educação das crianças, para o que iria
dedicar-se anos mais tarde.
Entre 1906 e 1917 publica a revista anarquista mensal “Mãe Terra”. Em 1910 escreve
“Anarquismo e outros ensaios”. Em 11 de fevereiro de 1916 é detida e presa de novo
pela distribuição de um manifesto em favor do aborto. Em suas publicações, escreveu
sobre uma variedade de temas: o capitalismo, as prisões, liberdade de expressão,
aborto e contracepção, militarismo, casamento, amor livre, educação e
homossexualidade. Durante muitos anos, e cada vez que dava uma conferência,
esperava ser detida, por isso sempre carregava um bom livro.
Em 1917 é encarcerada junto com Alexander Berkman, por conspirar contra a lei que
obrigava ao serviço militar nos Estados Unidos. Fez públicas as suas críticas à
Primeira Guerra Mundial e seu caráter imperialista. Em 1919 foi expulsa dos EUA e
deportada para a Rússia. Durante a audiência que tratava de sua expulsão, o
presidente da sessão qualificou Emma como “uma das mulheres mais perigosas da
América”.
Residiu na URSS com A. Berkman entre 1920 e 1922, onde havia inicialmente
apoiado a Revolução, mas seu entusiasmo gradualmente se dissipou ao ver a
supresão da liberdade de expressão e o autoritarismo do partido bolchevique. Após a
repressão violenta à revolta de Kronstadt em 1921, que Berkman relatou em seu livro,
sua posição sobre os rumos da URSS eram inequívocos. Seus escritos “Minha
desilusão com Rússia” (1923) e “Minha posterior desilusão com Rússia” (1924) foram
alguns dos primeiros trabalhos a apresentar ao Ocidente as táticas autoritárias
impostas pós-revolução. Após esse período, instalou-se definitivamente no Canadá.
Em 1931 escreveu sua autobiografia: “Vivendo minha vida”. Morreu em Toronto em
1940 e seu corpo encontra-se enterrado em Chicago.
Filme sobre a vida de Emma Goldman, com legendas em português:
https://www.youtube.com/watch?v=PLBeZ2-IV2M
Citação: “Eu exigo a independência das mulheres, seu direito de se manter, de viver
por conta própria, de amar quem ela quiser, ou quantas pessoas ela quiser. [...]
Liberdade para os dois sexos, liberdade de ação, liberdade no amor, liberdade na
maternidade.”
Citação 2: “O maior baluarte da autoridade é a uniformidade; a menor divergência a
ela já é o maior crime”
Citação 3: “Nada é mais falso do que crer que os objetivos e as intenções são uma
coisa, os métodos e as táticas outra coisa”
Foto: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/0/03/Emma_Goldman_seated.jpg
Maria Lacerda de Moura
Nascida em 16 de maio de 1887, em Minas Gerais, Maria Lacerda de Moura foi uma
figura polêmica. Desde cedo teve interesse pelas idéias sociais e anticlericais e
defendia uma postura libertária para as mulheres. Incitava as mães de soldados que
estavam indo participar da Segunda Guerra Mundial, no combate às tropas nazistas,
para que não deixassem que seus filhos se alistassem no exército; dizia que o voto
não significava nenhuma emancipação para as mulheres e defendia a maternidade
como uma livre opção, e não uma imposição.
Foi professora primária, em Barbacena/MG, e acreditava na educação como um
instrumento de transformação social, tendo adotado a pedagogia libertária de Ferrer i
Guàrdia. Como educadora aderiu às campanhas de alfabetização de pessoas adultas
e fundou a Liga Contra o Analfabetismo. Teve um trabalho com as mulheres da região,
incentivando mutirões de construção de casas para a população carente da cidade.
Ao se mudar para trabalhar em São Paulo, em 1921, começou a dar aulas particulares
e posicionou-se contra as iniciativas oficiais no ensino, buscando alternativas
educacionais ligadas a movimentos sociais. Partindo de suas leituras e reflexões sobre
a condição feminina, no trabalho e na educação, passou a combater outras formas de
autoritarismo na esfera privada e do pequeno grupo, como combateu na esfera pública
com relação ao poder político e econômico.
Participou do teatro social e colaborou com a imprensa operária e anarquista, tendo
fundado em 1923 a revista Renascença. No jornal A Plebe, escrevia principalmente
sobre pedagogia e educação. Denunciava as práticas pelas quais exploradores
mantinham o saber e o poder sobre mulheres e crianças, adotando assim o discurso e
a prática pedagógica anarquista. Considerava o espaço formal escolar um microcosmo
onde se reproduziam as relações de domínio da sociedade mais ampla.
Entre 1926 e 1935, viveu em uma comunidade em Guararema, que pretendeu viver
em liberdade, sem hierarquias. Esta pereceu diante da repressão do governo de
Getúlio Vargas, fazendo com que Maria Lacerda de Moura voltasse para Barbacena.
Tinha posturas que se aproximavam dos movimentos anarquista e feminista, mas
sentia-se livre para tecer críticas a ambos, ou a outros movimentos político-sociais,
pois via erros neles e não conseguia deixar que isso passasse "em branco", sem que
se posicionasse.
Considerava-se individualista e dizem que por isso ganhou antipatias de feministas
que não davam respaldo aos seus livros publicados e palestras, até porque Maria
Lacerda criticava os propósitos de feministas que acreditavam que o voto e a mulher
no poder mudariam a situação de submissão das mulheres. Durante algum tempo foi
presidenta da Federação Internacional Feminina e tentou articular mulheres de Santos
e São Paulo num movimento que ultrapassasse os objetivos eleitorais do movimento
sufragista de Bertha Lutz.
Os embates com o movimento anarquista estavam relacionados aos elogios à obra
educacional do ministro soviético (em 1922), numa época em que a perseguição e
repressão a anarquistas por parte da URSS era latente. E também com a polêmica
declaração – durante a publicação de um livro antifascista, em 1935 – ao mencionar
que além de Jesus Cristo não conhecia outros anarquistas.
Maria Lacerda de Moura faleceu no Rio de Janeiro, em 20 de março de 1945.
Citação: “Não será com algumas mulheres no poder que esqueceremos as milhares
escravizadas na cozinha, no tanque e na cama!”
Foto: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/upload/T_500px_1380206642.jpg
Fonte: Livro Mulheres Anarquistas: o resgate de uma história pouco contada.
Disponível em: http://anarcopunk.org/biblioteca/wpcontent/uploads/2009/01/mulheres-anarquistas-o-resgate-de-uma-historia-poucocontada.pdf
Voltairine de Cleyre
Nascida em Michigan, nos EUA, em 1886, Voltairine viveu uma vida de miséria e
problemas de saúde, tendo falecido com apenas 45 anos em 1912. Sua curta vida é
considerada a razão por ela não ter adquirido a fama de outras anarquistas que
viveram nos EUA, apesar de seus escritos terem sido influentes e marcantes. Emma
Goldman, com quem manteve uma boa relação, apesar de muitas discordâncias,
escreveu que ela era “a mais talentosa e brilhante escritora anarquista que a América
já produziu”.
Forçada a estudar em um convento católico desde nova, Voltairine desenvolveu desde
muito cedo uma rejeição ao autoritarismo representado pelo catolicismo. Inclusive,
tentou escapar do convento nadando pelo Rio Michigan e escalando uma longa
cadeia de montanhas, mas sua tentativa foi frustrada. Voltairine sai da escola uma
convencida ateísta e se aproxima de ambientes e publicações de livres-pensadores,
onde começa a publicar textos seus.
Um evento marcante na sua vida foi a condenação e o enforcamento dos mártires de
Haymarket, após o qual ela relata que “não pôde mais acreditar na justiça da Lei
americana e dos tribunais” – é quando ela se torna anarquista.
Após 1888, Voltairine começa a proferir muitas palestras e publicar textos, entre os
quais ensaios, poemas e histórias. Porém, sua condição de vida é difícil, motivo pelo
qual ela precisa dedicar muitas horas ao trabalho. Além disso, ela passou por diversos
infortúnios, como uma tentativa de assassinato por um ex-aluno e romances mal
sucedidos. Durante sua vida, ela cometeu algumas tentativas de suicídio, tendo sofrido
por diversas vezes de depressão. Sua situação de saúde sempre foi complicada, pois
sofria constantemente de dores e doenças que impediam seu trabalho e, por fim, a
levaram à morte.
Voltairine primeiro se aproxima das ideias anarquistas individualistas de Benjamin
Tucker, mas ao longo da vida passa por diferentes correntes, como o mutualismo, se
identificando ao fim apenas como anarquista, sem outros adjetivos, apesar de suas
ideias se aproximarem das anarco-comunistas, defendendo o fim da propriedade
privada e a produção coletiva entre os trabalhadores, sem o intermédio de dinheiro.
Também escreveu extensamente sobre a situação das mulheres, condenando os
padrões de beleza impostos, a socialização das crianças que criava papéis sociais, e
particularmente as leis do casamento, que permitiam aos homens estuprarem “suas”
mulheres impunemente. Voltairine creditava esse poder coercitivo tanto à ideia de
Deus, através da Igreja, quanto ao Estado e quem legislava através dele, que juntos
causavam o que ela chamava de “Escravidão do Sexo” [Feminino]. Em relação ao
amor, ela escreveu: “Para mim, qualquer dependência [...] corresponde à escravidão,
e destrói a espontaneidade pura do amor”.
Fonte: http://voltairine.org/biography.php
Citações:
“Os trabalhadores têm que aprender que seu poder não está na força de seu voto,
mas na sua habilidade de parar a produção.”
“Veja como são criadas as crianças. São ensinadas desde a mais tenra infância a
conter suas inclinações – restringidas o tempo todo! Garotinhas não devem ser
masculinas, não podem andar descalças, escalar árvores, aprender a nadar [...], nada
considerado “impróprio”. Garotinhos são ridicularizados como afeminados se querem
costurar ou brincar com bonecas. Então, quando eles crescem, “veja, homens não
cuidam da casa ou das crianças como as mulheres!”. Por que eles deveriam, quando o
esforço deliberado foi de esmagar essa natureza deles?”
“Não existe refúgio na Terra para o sexo escravizado. Bem onde estamos, aqui é onde
devemos cavar nossas trincheiras, e vencer ou morrer.”
Foto: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/5/5a/VoltairinedeCleyre.jpg
Matilde Magrassi
Anticlerical e anarquista, Matilde Magrassi foi, sem dúvida, uma militante ativa,
consciente, integral, das primeiras mulheres e defender a igualdade “homem-mulher”
na imprensa libertária.
Matilde veio da Itália, junto com seu companheiro Luigi Magrassi, para continuar no
Brasil as atividades anarquistas que já realizava em sua terra. Integrou os primeiros
grupos libertários e de teatro social, fundados por anarquistas no Rio de Janeiro.
Morou no Rio de Janeiro e em São Paulo na última década do século XIX e na
primeira do século XX. Ajudou a editar o jornal Novos Rumos, lançado em maio de
1905, e colaborou, entre outros, com O Amigo do Povo, A terra livre e O Chapeleiro,
publicados em São Paulo, em italiano e português. Matilde fez intensa propaganda
anticlerical e participou de diversas assembléias.
Para o 1º de Maio de 1904 ela escreveu o texto "Emancipatevi!", que o jornal O
Chapeleiro inseriu em italiano na sua terceira página. Neste texto, Matilde lança um
grito de alerta às mulheres trabalhadoras para que se libertem do estigma de serem
apenas donas de casa. Ela destacava a importância do papel da mãe junto a filhas e
filhos, concluindo que não basta que só algumas pessoas conquistem direitos iguais,
mas que todas consigam, existindo então a libertação do gênero humano.
Anos depois, Matilde Magrassi viajou com seu companheiro para a Argentina,
começando por lá uma nova adaptação. Luigi Magrassi entrou para a redação de La
Protesta, jornal para o qual ela também colaborava.
Assim como outras professoras, escritoras e jornalistas que participavam da imprensa
anarquista na primeira metade do século XX, Matilde Magrassi também criticava a
ordem burguesa e propunha ideias sobre a formação de uma nova família,
condenando o casamento indissolúvel. Colocava também que a luta das mulheres
operárias não deveria ficar restrita às fábricas, à reivindicação de melhores condições
de trabalho e melhores salários. Deveria ser uma luta contra a sociedade de classes,
contra a exploração do capital e contra o Estado. E, nesse sentido, a educação da
mulher trabalhadora, seria instrumento de luta importantíssimo. Essa educação
proporcionaria à operária a desmistificação dos modelos de mulher.
Fonte: Livro Mulheres Anarquistas: o resgate de uma história pouco contada.
Disponível em:
http://anarcopunk.org/biblioteca/wp-content/uploads/2009/01/mulheres-anarquistas-oresgate-de-uma-historia-pouco-contada.pdf
Citações:
“Compreendereis que é inteiramente inútil que confieis aos padres as nossas dores.
Aconselhando-vos a resignação, o que ele faz é impedir-vos de reagir contra quem
vos oprime”.
“É já tempo que a mulher operária faça também nesta cidade o que vai fazendo em
tantas outras cidades civilizadas [...] Uni-vos, formai sociedades de resistência,
procurai conquistar bem-estar, despertai do longo letargo no qual tendes estado
adormecida até hoje”.
Espertirina Martins
Natural de Lajeado/RS, Espertirina era a mais jovem das irmãs Martins, nascida em
1902. Foi aluna da Escola Moderna de Malvina Tavares e, com apenas quinze anos,
em 1917, carregava a bomba que iniciou a batalha campal travada na Várzea (hoje
Avenida João Pessoa), em Porto Alegre, entre anarquistas e brigadianos, em janeiro
deste ano.
As condições de trabalho no início do século passado eram as piores possíveis. As
fábricas não tinham janelas, as pessoas trabalhavam mais de 14 horas por dia, em 6
dias da semana, os salários eram miseráveis. Aconteciam muitos acidentes de
trabalho, mas não havia indenização. Não existia o direito à aposentadoria. Grande
parte da força de trabalho era constituída por crianças de cinco ou menos anos de
idade. As crianças eram freqüentemente espancadas por seus “patrões”. Em 1920,
metade de quem trabalhava nas fábricas de tecidos do país eram mulheres e crianças,
com menos de 14 anos de idade. Grande parte de quem trabalhava na cidade eram
imigrantes vindos da Europa, em especial da Itália.
O ano de 1917 foi tomado por grandes greves em todo o país. A vida estava cara
demais, a fome era grande mesmo entre quem tinha trabalho, as condições eram
péssimas, e a exploração do trabalho infantil e feminino começaram a revoltar o
operariado.
O operariado, organizado em seus sindicatos, fez então uma pauta de reivindicações
para lutar até conquistar seus direitos. Nela, exigiam: medidas para diminuição dos
preços dos alimentos e artigos de primeira necessidade, da água, aluguel e bondes;
aumento dos salários, jornada de 8 horas de trabalho e de 6 horas para mulheres,
além da proibição do trabalho infantil.
No ano de 1917, a vida urbana foi completamente alterada. Participaram da greve
quem trabalhava nas mais diversas categorias. Começava a Guerra dos Braços
Cruzados, que levou este nome por ter sido realmente uma guerra do povo contra as
elites para conquistar seus direitos. Ocorriam piquetes, manifestações,
apedrejamentos, barricadas, motins e ocupações de fábricas todos os dias.
Nesta luta toda, em Porto Alegre a brigada matou um operário. O operariado, em
greve, organizou então o enterro do companheiro assassinado, que foi também um
protesto por sua morte. Milhares de pessoas vinculadas à classe trabalhadora
(inclusive crianças) acompanharam o enterro em procissão pela Avenida. Na frente
estava Espertirina Martins, carregando um buquê de flores. Ao lado contrário da
Avenida, vinha a carga de cavalaria da Brigada Militar para reprimir a procissão.
Quando os dois grupos se encontraram, Espertirina com seu buquê de flores se
aproximou dos brigadianos, que estavam prontos para atacar, e jogou seu buquê no
meio de onde estavam. O buquê explodiu, matando metade da tropa e assustando os
cavalos. Começou então uma verdadeira batalha campal, da qual o povo saiu em
vantagem, por conta de seu preparo. Graças a toda a batalha, foram conquistadas as
8 horas de trabalho, o fim do trabalho infantil, a aposentadoria, a licença-maternidade,
o direito à assistência médica e a indenização no caso de acidente de trabalho.
Espertirina Martins pertencia a uma família de militantes anarquistas (que participou
ativamente da Guerra dos Braços Cruzados), pessoas lutadoras que tiveram muita
importância nas lutas operárias daquela época, na capital e no interior. Ainda em Porto
Alegre, ela tornou-se uma feminista convicta. Em 1925, foi residir com Eulina e Zenon
em Campos/RJ, ligando-se novamente aos grupos anarquistas, promovendo reuniões
e pronunciando conferências. Depois foi residir no Rio, na Ilha do Governador, ligandose a Edgar Leuenroth, junto a quem prosseguiu nas atividades revolucionárias, até
voltarem para Porto Alegre, onde Espertirina veio a falecer em 22 de dezembro de
1942, em virtude das complicações de um parto prematuro e apendicite.
Fontes: Os anarquistas do Rio Grande do Sul – João Batista Marçal;
http://www.mncr.org.br/box_4/formacao-e-conjuntura/martires-da-luta/espertirinamartins
Citação: “Manifestações, motins, ocupações, por mais respeito, melhores condições.
Redução da carga de trabalho que era hostil, proibição total do trabalho infantil. Atos
que foram logo, claro, declarados: atentados ao poder soberano do Estado. Se
quisessem tudo poderia ter sido evitado, amordaçar o povo é fabricar exaltados. [...] O
final desse encontro, você nem imagina. Descubra o que foi o buquê de Espertirina”
(Rapper GOG - Buquê de Espertirina)
Foto:
http://www.mncr.org.br/imagens/imgnoticias/espertirina_martins.jpg/image_preview
Margarita Ortega
Como outros grupos revolucionários – zapatistas, villistas e etc – o movimento
anarquista do México, encabeçado pelo Partido Liberal Mexicano, havia se lançado às
armas contra a brutal ditadura do general Porfirio Díaz. Com a luta e sob terrível
repressão, a influência das idéias anarquistas de Ricardo Flores Magón e pessoas
ligadas a ele (chamadas de magonistas) estendia-se cada vez com maior força no seio
das sociedades camponesa e operária do norte do México e Baixa Califórnia, do
mesmo modo que no sul acontecia a rebelião zapatista.
No inicio de 1911, uma das pessoas encarregadas do contato entre combatentes do
campo libertário magonistas era Margarita Ortega. Sua arriscada tarefa consistia em
atravessar as linhas inimigas guiando os grupos que transportavam as armas, víveres
e medicamentos, até as agrupações que viviam escondidas nas montanhas ou
misturadas nas cidades e vilas. Sua valentia em combate e sua habilidade como
amazona – que lhe permitiram escapar de várias emboscadas – era muito exaltada
entre as pessoas ativas na guerrilha.
À medida que chegava o fim da sangrenta ditadura, a luta tornava-se mais dura. Em
princípios de 1911, alguns meses antes da queda do ditador, Margarita – segundo o
próprio Magón – propôs ao marido de irem combater na guerrilha: “Eu te amo” – ela
disse –, mas amo também a todos que sofrem e pelos quais luto e arrisco minha vida.
Não quero ver mais homens e mulheres dando sua força, saúde, inteligência, seu
futuro para enriquecer os burgueses; não quero que por mais tempo haja homens
mandando em outros homens.” O marido negou-se. Sua filha Rosaura, porém, não
exitou em segui-la e ambas ingressaram como combatentes nos grupos armados.
Quando cai Porfirio Díaz, em 1911, uma explosão de alegria sacode todo o México. O
povo saiu para a rua acreditando que a liberdade e o fim da miséria estavam ao
alcance das mãos. Também Margarita Ortega e sua filha regressaram à cidade e
compartilharam com sua gente a ingênua ilusão de que o fim da exploração estava
próximo.
Entretanto, pouco durou a alegria e a esperança. Uma vez que foi nomeado
presidente, Madero nega ao povo tudo aquilo por que havia lutado. Não acontece a
reforma agrária, nem a devolução das terras comunais, continuam as jornadas
abusivas e salários infames, etc. Em poucos meses, as prisões se enchem
novamente. Os fuzilamentos e execuções sumárias se sucedem por todo o país e
muitos revolucionários e revolucionárias têm que retornar às montanhas (como Zapata
e Magón).
Margarita e sua filha foram capturadas e o general Rodolfo Gallegos ordenou que se
levasse as duas mulheres até o deserto e as colocasse em marcha sobre o imenso
areal, com a advertência de que seriam mortas se voltassem ao povoado. Durante
vários dias, mãe e filha arrastaram-se pela fronteira com os Estados Unidos. A sede e
a fome foram minando a resistência de ambas. Rosaura foi a primeira a cair, exausta.
Sua mãe acreditou que tudo havia terminado e estava decidida pelo suicídio quando,
por fim, conseguiram alcançar as cercanias do povoado de Yuma, já nos EUA.
Na imigração estadunidense, as duas mulheres foram presas e seriam deportadas
para o México, a uma morte certa. Afortunadamente, em Yuma havia uma importante
seção do movimento anarquista de Flores Magón que, em seguida, organizou a fuga.
Margarita e sua filha foram transferidas por compatriotas magonistas para Phoenix,
Arizona. No entanto, Rosaura não pode se salvar, falecendo logo que chegou. Ainda
assim, Margarita continuou a luta que havia iniciado com a sua querida filha. Com o
companheiro Natividad Cortés – conta Flores Magón – empreendeu a tarefa de
organizar o movimento revolucionário no norte de Sonora, tendo como base de
operações o vilarejo de Sonoyta, do dito estado.
Ao fim, porém, foi novamente capturada com seu companheiro, que foi logo fuzilado.
Margarita foi entregue às tropas do ditador Huerta e submetida a tortura para que
delatasse companheiras e companheiros. Diante de seu obstinado silêncio, na manhã
de 24 de novembro de 1913, foi jogada no deserto e ali a fuzilaram, deixando seu
cadáver estirado.
A história daquela extraordinária mulher, que aparecia em canções populares, era bem
conhecida e admirada entre revolucionários/as. Ainda que filha de uma família
estabelecida, desde muito cedo preocupou-se com o destino do operariado e, como
ela dizia, “dos deserdados, vítimas da injustiça social”. Tornou-se, assim, símbolo e
lenda da Revolução Mexicana, uma das rebeliões de massa que tiveram maior
influência anarquista na história.
Fontes: https://libcom.org/history/ortega-margarita-1914
http://www.nodo50.org/insurgentes/textos/mulher/04margaritaortega.htm
Citação:
"Uma bala deixou essa nobre mulher sem vida, livre; sua existência e exemplo são
para lembrar aos despossuídos que redobrem seus esforços contra a exploração e a
tirania” (Do jornal Regeneración, veículo do Partido Liberal Mexicano, de orientação
anarquista).
Foto: http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/4/4f/Margarita_Ortega.png
Louise Michel
Louise Michel é de origem francesa, precisamente da cidade de Vrouncourt. Tinha um
grande talento literário e se correspondia com o escritor do romance Os Miseráveis,
Victor Hugo, que a apoiava bastante. Professora primária do ensino particular, só não
trabalhou no ensino público por que se recusou a prestar juramento ao imperador
Napoleão III, e, em 1856, começou a lecionar em Paris, num colégio feminino. Era filha
de servente, e foi criadora do grupo “O direito da mulher”, formado por socialistas e
feministas, e das milícias, onde comandou batalhões de mulheres à frente das
barricadas na Comuna.
No cerco prussiano de 1870 na França, ela participou da União das Mulheres para
Defesa de Paris e Auxílio aos Feridos, organizando ambulâncias e cantinas populares
e, já como militante anarquista, começa a se expressar em reuniões públicas e
participa das jornadas insurrecionais parisienses.
Louise Michel esteve presente nos acontecimentos da Comuna de Paris, quando o
povo parisiense derrubou o poder e declarou sua cidade livre, participando da luta
armada e apelo à resistência ao cerco de Versalhes. Louise levava a frente um
destacamento feminino, na barreira de Chauseé de Cignancourt, nas barricadas do
Cemitério de Montmatre e na Place Pigalle. Quando a Comuna foi derrotada, as tropas
de Versailles massacraram gente durante 8 dias seguidos. Dizem que o batalhão
feminino de Louise Michel “peleou como demônio”. Os soldados assassinaram a
maioria delas a sangue frio quando já estavam desarmadas. Em geral, foram
assassinadas mais de 20 mil pessoas, outras 43 mil foram presas e 5 mil deportadas.
Louise Michel escapou, mas se entregou porque a chantagearam com a detenção de
sua mãe. Compareceu ante o Quarto Conselho de Guerra e, perante o tribunal,
coberta com um véu negro, não renegou nenhuma das acusações que lhe foram
dirigidas, e disse: “Já que ao que parece todo coração que late pela liberdade só tem
direito a receber uma pequena porção de chumbo, solicito a parte que me toca. Se me
deixarem viva, não deixarei de clamar pela vingança e denunciarei os assassinos…”
Lá, assiste ao fuzilamento do communard Theophile Ferre.
É então condenada à deportação e passa pela prisão central de Auberive. É nas
prisões que escreverá mais poemas, entre eles, "Os cravos vermelhos", "A revolução
vencida" e "Aos meus irmãos". Em 24 de agosto de 1873 é exilada para o arquipélago
de Nova Caledônia. Lá faz amizade entre Canacas, população indígena do
arquipélago, e entre os Cabilas da Argentina e defende a independência da colônia
francesa. Volta para a França em novembro de 1880, após anistia completa e
definitiva, pois recusou os perdões individuais.
Louise Michel deixou uma vasta e variada obra literária: discursos, memórias, poesias,
romance, dramas e literatura infantil. Em “Memórias da Comuna”, de 1898, Louise
Michel defendia o feminismo libertário e classista, vindo a conhecer na década de
1890, Malatesta, Emma Goldmam, Kropotkin e Pietro Gori. Em 1905, ano das
primeiras experiências federalistas na Rússia, é enterrada envolta pelo estandarte da
Comuna de Paris.
Citação: “Não se pode matar a ideia a tiros de canhão, nem tampouco acorrentá-la”
“Cuidado com as mulheres quando se sentem afastadas de tudo que as rodeia e se
sublevam contra o velho mundo. Nesse dia nascerá o mundo novo”
“Aqui o inverno não tem onde amarrar-se,
Aqui as fragas sempre são verdes […]
Aqui, em cadeias expira:
O presídio é pior que a morte.
Nos nossos corações sobrevive a esperança,
E se vemos a França novamente,
será para seguir combatendo! […]
No ar paira a Liberdade!
A batalha nos chama
O clamor do deserdado!…
… A alvorada caçou a sombra espessa,
E o mundo novo se ergue”
Fontes: http://www.cabn.libertar.org/?p=907
Livro Mulheres Anarquistas: o resgate de uma história pouco contada. Disponível
em:
http://anarcopunk.org/biblioteca/wp-content/uploads/2009/01/mulheresanarquistas-o-resgate-de-uma-historia-pouco-contada.pdf
Foto:
http://www.radiotimes.com/namedimage/Paul_Mason_on_Louise_Michel.jpg?quality=8
5&mode=crop&width=580&height=327&404=radio&url=/remote/ichef.bbci.co.uk/progra
mmeimages/episode/b039ctgh_640_360.jpg
Elena Quinteros
Nascida no ano de 1945 em Montevidéu, Uruguai, Elena Quinteros estudou Magistério
no Instituto de Professores Artigas, onde inicia sua militância no grêmio estudantil. Em
1966 aos 21 anos de idade, obtêm seu título como professora e começa a trabalhar
em uma escola de Pando, Canelones. Nessa época se integra à Federação
Anarquista Uruguaia (FAU) e também à Resistência Operária Estudantil (ROE),
agrupamento de tendência revolucionário da qual foi ativa militante. Atuou no meio
sindical e integrou as Missões Sociopedagógicas, uma iniciativa do professorado do
Instituto Cooperativo de Educação Rural.
Por conta de sua militância, em 16 de novembro de 1967, foi detida pela primeira vez.
Era uma época de conflitos sociais e mobilizações no Uruguai, com crescente
influência dos militares no governo. Em outubro de 1969, foi detida, processada e
enviada à prisão, onde permaneceu até outubro de 1970. Em 1975 é destituída de seu
cargo pelo governo ditatorial civil-militar, que havia assumido o poder em 1973. No
mesmo ano, Elena participa ativamente da criação do Partido por la Victoria del
Pueblo, que conta inicialmente com referênciais anarquistas, assim como do
guevarismo. Nessa época, já há uma forte onda de repressão no Uruguai.
Em 26 de junho de 1976 é seqüestrada pela ditadura uruguaia e mantida sob forte
custódia, para que não estabelecesse contato algum com sua organização. Com o
pretexto de encontrar um companheiro para que também fosse capturado, consegue
ser levada às proximidades dos jardins da Embaixada da Venezuela. Enquanto é
escoltada, salta de improviso o muro da Embaixada, grita seu nome e pede asilo; o
pessoal da embaixada busca socorrê-la, mas a escolta consegue frustrar o auxílio e
fuga. Após um enfrentamento entre o pessoal da embaixada e os efetivos militares,
eles terminam por arrastar Quinteros para um carro. Na tentativa de se esquivar, ela
tem a perna quebrada. É então levada de volta ao Batalhão n° 13, onde funciona um
centro de tortura da ditadura uruguaia. Desde aí, não se teve mais notícias do que
houve com Quinteros.
O embaixador da Venezuela no Uruguai, Júlio Ramos, se comunica por telefone com o
Ministério de Relações Exteriores Uruguaio e denuncia o fato ao subsecretário Guido
Michelín Salomón, posto que o Ministro Juan Carlos Blanco não se encontrava na
sede ministerial. Esta situação se converte em um incidente diplomático de
envergadura, que culmina com a ruptura de relações diplomáticas por parte da
Venezuela.
O caso de Elena Quinteros ganhou notoriedade e se tornou emblemático sobre a
crescente repressão e crueldade que estava tomando a ditadura no Uruguai. Até hoje,
seu corpo nunca foi encontrado. Em 2002, o ex-chanceler Juan Carlos Blanco é
considerado responsável pelo desaparecimento de Elena e processado sob a
acusação de “privação de liberdade”. Em 2008, o Senado uruguaio renomeia uma
escola em Montevideo como “Maestra Elena Quinteros”.
De Elena, assim se recordam seus companheiros e companheiras da FAU: “Dizia
como era persistente. E persistente classista. Detestava o ascensionismo, o
reformismo, o eleitoralismo… Lutava por uma revolução do povo, um protagonismo do
povo, uma justiça do povo [...] Nunca pelas soluções autoritárias e exploradoras
largamente experimentadas e tão largamente desastrosas para os trabalhadores.” […]
“Sem falar de sua moral política impecável. Sua fraternidade, sua generosidade que
também formam parte desta companheira que sempre formará parte de nós.”
Foto:
http://1.bp.blogspot.com/k0Cug28s7P8/T1DWAHP6FYI/AAAAAAAAHL4/IHE3xZggHD
A/s1600/1.jpg Fonte: http://elenaquinterospresente.blogspot.hu/2008/08/biografia.html
Elvira Boni
Filha de imigrantes italianos, nasceu em 1889 no Espírito Santo do Pinhal, estado de
São Paulo, aproximou-se da esquerda ainda criança, com suas irmãs e irmãos,
assistindo a palestras na Sociedade Dante Alighieri. Seu pai era socialista e por isso
encaminhava as crianças nessa direção.
Depois veio a morar no bairro de Cordovil, Rio de Janeiro. Começou a trabalhar aos
12 anos de idade, como aprendiz de costureira, na rua Uruguaiana. Inicialmente não
recebia salário e depois de um tempo passou a receber 10 mil réis por mês. Já
conhecia a Liga Anti-Clerical, com sede na Av. Marechal Floriano. Por essa época
(1911-12), a jornada de trabalho começava às 8 horas e terminava à 19 horas e
quando o serviço apertava, prolongava-se até entre 20 e 22 horas.
Aos poucos Elvira forma-se profissionalmente e também começa a alargar seus
horizontes revolucionários lendo os jornais operários e anarquistas. Impulsionada pelo
anarco-sindicalismo, em maio de 1919, com 50 companheiras de profissão, forma a
“União das Costureiras, Chapeleiras e Classes Anexas”, passando a funcionar na
sede da “União dos Alfaiates do Rio de Janeiro”. Coube a Elvira Boni a tarefa de ler o
discurso de inauguração, publicado depois no Jornal do Brasil.
A primeira iniciativa da associação das operárias costureiras, ainda em 1919, foi
deflagrar greve pelas 8 horas de trabalho. Muitas grevistas foram punidas com a
demissão sumária. Não obstante as medidas repressivas, as mulheres trabalhadoras
continuaram sua luta, publicando manifestos e, no 3º Congresso Operário Brasileiro,
Elvira Boni e Noêmia Lopes representaram as costureiras e, por extensão, as
mulheres. Elvira presidiu a sessão final do Congresso, que ocorreu em 1920.
Tomou parte também na representação de peças anarquistas e anti-clericais de
grande importância para a propaganda libertária, levadas à cena por grupos amadores
nos palcos dos salões das associações operárias do Rio de Janeiro.
Participou da revista Renovação, dirigida por Marques da Costa, emprestando-lhe seu
nome como responsável (o diretor era estrangeiro, o que não era permitido). Num dos
seus artigos, intitulado A Festa da Penha, depois de mostrar o lado hilariante e triste
dos pagadores de promessas, subindo a Escadaria da Penha de joelhos, Elvira Boni
termina com a seguinte mensagem: "E tu, mulher, que és indispensável ao êxito de
qualquer iniciativa, deves impor-te abandonando todas essas manifestações de vício e
depravação; deves conjugar todos os teus esforços, buscando a instrução como
principal fator para uma vitória consciente, e ao lado dos homens, formar no batalhão
de uma sociedade onde a cadeia seja substituída pela Escola e não exista o ódio no
lugar do amor".
Com as divergências entre fundadores/as do PCB e anarquistas, Elvira Boni afastouse do movimento. Conforme relatou para Edgar Rodrigues, em 1978: "Depois da
fundação do PC não havia mais assembléia dos Sindicatos que não acabasse em
discussão estéril e muitas vezes violência…”
Por essa época, muitos militantes já haviam sido expulsos pelos governos Epitácio
Pessoa e Artur Bernardes, quando desencadeou-se a divergência interna que haveria
de durar anos e desorientar trabalhadoras e trabalhadores menos preparados,
enfraquecendo consideravelmente a resistência operária. Foram dois acontecimentos
com objetivos diferentes que acabaram convergindo para o mesmo alvo, contribuindo
um e outro para enfraquecer brutalmente o movimento anarco-sindicalista, aplainando,
desta forma, consciente ou inconscientemente, o caminho para o nascimento dos
sindicatos fascistas comandados pelo Estado Novo, a partir de 1930 .
Foto: http://anarquista.net//wp-content/uploads/2013/07/Elvira-Boni.png
Fontes: "Companheiros" e "Alvorada Operária" de Edgar Rodrigues
Livro Mulheres Anarquistas: o resgate de uma história pouco contada. Disponível
em:
http://anarcopunk.org/biblioteca/wp-content/uploads/2009/01/mulheresanarquistas-o-resgate-de-uma-historia-pouco-contada.pdf
A Livraria Libertária Lucy Parsons disponibiliza estas e outras biografias pelo seu site
(livrarialibertarialucyparsons.wordpress.com) na tentativa de fazer um resgate e dar
visibilidade de histórias de lutas de anarcofeministas socialmente e historicamente
esquecidas, desde sempre, desde agora. Nestes painéis refletem todo este acúmulo
gravado e impresso na memória do movimento anarquista, no Brasil e no mundo, no
protagonismo das diversas lutas. Em memória delas e muitas outras que infelizmente
não estão aqui, reverenciamos este dia e a data de amanhã que são para nós,
anarquistas, inspiração permanente para nossas lutas no dia-a-dia.
Arriba las que luchan!
Lutar Criar Poder Popular!
Coletivo Anarquista Bandeira Negra