pastagens forragens - Pastagens e Forragens
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pastagens e forragens Sociedade Portuguesa de Pastagens e Forragens 19 PASTAGENS E FORRAGENS Revista da Sociedade Portuguesa de Pastagens e Forragens VOLUME 19 Este número foi subsidiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia Elvas 1998 AVALIADORES CONVIDADOS PARA ESTE VOLUME David Gomes Crespo J. M. Abreu J. M. Neves Martins J. Quelhas dos Santos M. M. Tavares de Sousa Nuno Moreira Valdemar P. Carnide DIRECTOR M. M. Tavares de Sousa CORPO DE REDACÇÃO Noémia Farinha Eulália Garcez M. M. Tavares de Sousa EDIÇÃO, REDACÇÃO E ADMINISTRAÇÃO Sociedade Portuguesa de Pastagens e Forragens A/c ENMP Apartado 6 7350-951 ELVAS ISSN 0870-6263 Dep. Legal n.º 12 350/86 Tiragem: 725 exemplares PREÇO DESTE VOLUME 2.250$00 As teorias expostas no presente volume são da inteira responsabilidade dos seus autores. Esta revista é distribuída gratuitamente aos sócios da SPPF, devendo todos os pedidos de aquisição ser feitos directamente para o Editor. Igualmente será objecto de permuta com outras publicações periódicas, nacionais ou estrangeiras, de interesse para esta Sociedade. Pastagens e Forragens VOLUME 19 1998 S U M Á R I O Páginas Homenagem ao Eng.º Agrónomo David Gomes Crespo 1-3 Influência da altitude em caracteres agronómicos em germoplasma de Dactylis. Violeta Lopes, Aida Reis 5-17 Eficiência da adubação e da repartição do azoto na produção e composição química do milho (Zea mays l.) silagem no Entre Douro e Minho. António Fernandes, João Costa, Nuno Moreira 19-30 Novas potencialidades para a produção forrageira na Beira Interior. L. Gusmão, E. Bettencourt, L. Gerson, J. Lavado, F. Matos-Soares, A. Marques, M.ª João Frazão, L. Pombal, A. Antunes 31-35 Utilização conjunta de lamas celulósicas e águas residuais urbanas na cultura do sorgo. Efeito sobre a produção e composição mineral das plantas. S. T. Campos; M. C. Horta-Monteiro; João Paulo Carneiro 37-49 O melhoramento das pastagens de montanha. Nuno Moreira 51-60 A utilização de pastagens e forragens e a conservação do solo. Exemplos da erosão verificada num Solo Litólico Não Húmico de xisto mosqueado na região de Castelo Branco. P. M. S. Lopes, J. N. P. Goulão, N. R. S. Cortez 61-71 Zonas de distribuição de cultivares de trevo subterrâneo em Portugal. Uma nova abordagem. Noémia Farinha, Francisco Mondragão-Rodrigues, Gonçalo Barradas, J. M. Abreu 73-80 Aplicações dos sistemas de informação geográfica em estudos sobre pastagens e forragens. Francisco Mondragão-Rodrigues, Noémia Farinha, Gonçalo Barradas, J. M. Abreu 81-85 Influência da silagem de Triticale em duas fases de corte, com dois níveis de concentrado, na engorda de novilhos Mertolengos. J. M. Arranja, D. Almeida, F. Engeitado, J. Efe Serrano 87-97 Fluxos de azoto em explorações de bovinicultura leiteira intensiva no Noroeste de Portugal. Henrique Trindade, João Coutinho, Nuno Moreira 99-112 Valor de pastoreio das comunidades arbustivas da reserva natural da serra da malcata. Francisco Castro Rego, Paula Cristina Cardoso Gonçalves, Sofia Castelbranco da Silveira 113-119 Caracterização técnico-económica da produção da vitela tradicional do montado. Sónia Isabel Simões Calção, Maria Raquel Ventura Lucas 121-134 XIX Reunião de Primavera da SPPF. Castelo Branco, 5 a 8 de Maio de 1998. A produção de pastagens e forragens na Beira Interior – das serras à campina. Conclusões 135-136 Perspectivas de eleição das primeiras cultivares portuguesas de trevo subterrâneo. Noémia Farinha, M. M. Tavares de Sousa, A. M. Romano 137-144 As saponinas das forragens. Notas gerais sobre estes compostos. M. Alexandra Oliveira, J. M. Abreu 145-157 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 1–3. HOMENAGEM AO ENG.º AGRÓNOMO DAVID GOMES CRESPO O Homem que homenageamos, recentemente desligado da função púlica, começou a sua actividade profissional na Beira Litoral, num trabalho sobre vinhos, que serviu de relatório de fim de curso, no qual obteve a classificação de 17 valores. Passou depois pela Junta de Colonização Interna onde trabalhou em solos. Pouco mais tarde, em 1959, ingressou na Estação de Melhoramento de Plantas, onde se fixou após concurso documental para admissão de Engenheiros Agrónomos, tendo ficado em 1.º lugar. Depois de passar pela Estatística e pelo Departamento de Melhoramento de Cereais é colocado a seu pedido no Departamento de Forragens e Pastagens. Já a trabalhar neste Departamento, é-lhe concedida uma bolsa, do British Council e do Instituto de Alta Cultura, para realizar um estágio, na Grã-Bretanha, sobre melhoramento e experimentação de plantas forrageiras. Neste estágio, verificou quão pobre era a investigação portuguesa quando comparada com a inglesa. Deve ter-se sentido feliz por poder aprender em instituições, de tal grandeza e com pena de não poder desenvolver todos esses conhecimentos em Portugal, com tão pouco pessoal e condicionalismos de toda a espécie. Mas a força de vencer é tal que jamais para! Consegue boas colecções, bons ensaios, o obtém resultados de tal modo credíveis que dignificam a Instituição e o País. Entre o material trabalhado contam-se cerca de seis mil entradas, provenientes de introduções de vinte e três países e de material espontâneo da flora de Portugal. Também consegue estabelecer prados e colecções, um pouco por todo o País, num total de 1200 ha aproximadamente. Mais tarde, estabeleceu ensaios de pastoreio, quer em sequeiro, quer em regadio. Embora contra a opinião de muitos notáveis, os campos de ensaios, denominados pelos críticos como os campos de concentração, são mantidos durante vários anos, até à obtenção final dos resultados. Os ensaios foram de tal modo bem conduzidos e produziram tantos e importantes resultados, que foram considerados por muitos especialistas como um modelo de investigação. 1 Simultaneamente, são criadas todas as condições para o funcionamento do Departamento de Forragens e Pastagens, desde a construção de estufas e bancadas de cultura, aquisição de secadores, máquinas e outro equipamento, ampliação das instalações, etc. Pela primeira vez se fez em Portugal a produção industrial e aplicação de inoculantes em algumas espécies de leguminosas pratenses, nomeadamente trevo subterrâneo e luzernas. Investigador principal em 1978 é pouco depois Assessor do Secretário de Estado da Produção Agrícola e em 1985 vai em comissão de serviço para a FAO, onde em 1991 atinge o nível P5 (categoria máxima), tendo aí participado em 83 missões, repartidas por 41 países. Em Portugal participou e colaborou na organização de inúmeros colóquios e simposia, tendo coordenado um Programa Nacional de Investigação e Desenvolvimento do Sector de Forragens e Pastagens, em colaboração com os Serviços Regionais de Agricultura. Participou e dirigiu diversas reuniões, congressos e outras actividades científicas, em Portugal e no estrangeiro. Durante a sua vida profissional, elaborou mais de quarenta trabalhos, científicos e técnicos, que foram publicados em revistas nacionais e estrangeiras. Dada a importância destas publicações, a sua consulta é de aconselhar a todas as pessoas ligadas ao sector agro-pecuário. Deu aulas no Instituto Superior de Agronomia, na Universidade de Évora, na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro e na Universidade dos Açores. Proferiu variadas palestras e conferências dirigidas a técnicos e agricultores. Em 1978/79 organiza, dirige e lecciona um curso de 12 semanas, distribuídas por 14 meses, destinado a formar 22 engenheiros agrónomos, originários das diversas Regiões Agrárias do País, na temática de pastagens e forragens. Durante este período de tempo foi-se desenvolvendo a ideia da criação da Sociedade Portuguesa de Pastagens e Forragens, o que aconteceu em 1979, no fim do curso, com a realização da escritura pública no Cartório Notarial de Elvas, em 24 de Maio de 1979, após a elaboração e discussão dos estatutos. Assim, o Eng.º Crespo foi o arquitecto da nossa Sociedade e é o Sócio Fundador n.º 1. Perante um curriculum tão grandioso, a pergunta que se formula é esta: – Como é possível fazer tanto em tão pouco tempo? Na verdade, tal só foi possível graças ao empenhamento e elevado espí- 2 PASTAGENS E FORRAGENS 19 rito de missão com que o Eng.º David Crespo concretizava os planos de trabalho, o que lhe acarretava, por vezes, grandes sacrifícios pessoais. A tudo isto só tenho a acrescentar que foi sempre correcto no trato e nunca deixou de esclarecer as pessoas que o solicitavam. A homenagem que aqui prestamos ao Eng.º Crespo é apenas um acto simbólico, porquanto este Homem devia ter uma homenagem a nível Nacional, pois foi sem dúvida a pessoa que mais lutou para que o Sector das Forragens e Pastagens fosse um dos motores de Desenvolvimento do País. Pelo que fez e pelo que nos legou jamais será esquecido, porquanto a história nunca esquece os Homens que directa ou indirectamente contribuem para o engrandecimento e prestígio do seu País. Vaiamonte, 13 de Abril de 1999 António Machado Romano PASTAGENS E FORRAGENS 19 3 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 5–17. INFLUÊNCIA DA ALTITUDE EM CARACTERES AGRONÓMICOS EM GERMOPLASMA DE DACTYLIS* Violeta Lopes, Aida Reis Estação Regional de Culturas Arvenses – Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho – Quinta de S. José – S. Pedro de Merelim – 4700 BRAGA RESUMO A espécie Dactylis glomerata L. é uma gramínea vivaz de grande expressão nos pastos naturais por todo o País. Embora tenha grande adaptação às nossas condições ambientais e apresente um bom valor agronómico e alimentar para os animais, há pouca tradição na sua utilização em prados semeados. A Estação Regional de Culturas Arvenses (ERCA) possui uma pequena colecção de germoplasma do género Dactylis, com tipos diplóides e tetraplóides, que está em avaliação e caracterização desde 1994. Um total de 16 amostras estão a ser estudadas em microensaio com sementeira a lanço e segundo um delineamento estatístico de blocos casualizados de quatro repetições. Os parâmetros analisados foram a produção de matéria verde (MV) e de matéria seca (MS). Os resultados foram sujeitos à análise de variância e à análise multivariada (componentes principais e UPGMA). Foram, igualmente, estabelecidas regressões lineares entre a altitude e a produção de MV e a de MS. Embora com apenas dois anos de ciclo de produção, há indicações de que há variabilidade genética interpopulações para a capacidade produtiva e de que o factor altitude é determinante para a expressão dessa variabilidade (a menores cotas correspondem maiores produções de matéria verde e seca). Para estabelecer estratégias de prospecção da máxima biodiversidade e variabilidade genética do género Dactylis, no caso do Entre Douro e Minho, parece ser importante atender à altitude. PALAVRAS-CHAVES: Dactylis glomerata; Germoplasma; Potencial produtivo; Variabilidade genética. ABSTRACT Relationships between agronomic traits (yield (forage, dry matter), 1000-grain weight and persistence) of 16 natural populations from Northwest of Portugal and altitude of their original sites were studied. The objectives were to study the altitude influence in * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF. Castelo Branco, Abril de 1998. Este trabalho foi elaborado no âmbito do Projecto PAMAF 1013 – “Colheita, avaliação, conservação e utilização do germoplasma das espécies herbáceas da Região Norte”, 1995-1999. 5 the yield potential and improve the model of prospecting the genetic variability. An analysis of variance and the linear regression between yield and altitude were done. To classify the germplasm, an analysis of principal components (ACP) and a hierarchical clustering (UPGMA) method were applied. Populations from lowest altitude showed better potential productive (dry matter, persistence) and great variability interpopulations. KEY WORDS: Dactylis glomerata; Genetic variability; Germplasm; Yield potential. 1 – INTRODUÇÃO Desde os anos trinta que o género Dactylis tem estado sob a atenção de um grande número de investigadores (1, 5, 7, 12, 13). Os estudos contemplaram vários domínios do conhecimento, distribuindo-se pela citogenética, evolução e recursos genéticos, melhoramento e agronomia. Lumaret (7) classifica o género Dactylis como um complexo poliplóide natural intraespecífico. A distribuição primária de Dactylis glomerata compreende 15 subespécies diplóides e 3 subespécies tetraplóides. Os citotipos tetraplóides (glomerata, hispanica, marina) têm uma larga distribuição geográfica, estendendo-se desde o litoral até às zonas montanhosas e estão associados, respectivamente, aos climas temperados, mediterrânicos e subtropicais. As formas diplóides são menos abundantes e existem em regiões precisas, muitas vezes em "simpatia" com os tetraplóides. Segundo os critérios morfogeográficos existem dois grupos de diplóides: o grupo Euroásio, com 6 subespécies e o grupo Mediterrâneo com 9 subespécies. Vários autores (1, 2, 3, 6, 10, 13) indicam que em Portugal, atendendo à distribuição primária das subespécies de Dactylis glomerata, se regista a existência de formas tetraplóides (glomerata, hispanica, marina, smithii e hylodes, as duas últimas apenas na Ilha da Madeira) e de diplódes (tipo galician e lusitanica). Mousset, nas várias expedições que realizou em Portugal, encontrou na região de Entre Douro e Minho (EDM) sobretudo a subespécie galician e a subespécie glomerata (4, 10). No EDM, esta espécie é a principal gramínea, com valor forrageiro, da maioria dos prados naturais. Este facto indica a grande adaptação da espécie às condições ecológicas do EDM. Estudos sobre a biodiversidade desta espécie deverão ser feitos com vista à sua potencial integração em programas de melhoramento de plantas. Enquadrado no Projecto PAMAF 1013, pretendeu-se estudar a influência da 6 PASTAGENS E FORRAGENS 19 altitude de colheita na expressão do potencial agronómico. Considera-se que os resultados proporcionarão indicações com interesse em futuras estratégias de prospecção da biodiversidade na região minhota. 2 – MATERIAL E MÉTODOS Foram avaliadas dezasseis populações de Dactylis glomerata L.(panasco) utilizando-se a cultivar Currie como testemunha. O estudo teve início em 1995 (instalação em Novembro) com o fim previsto para 1998. Os resultados apresentados referem-se até ao fim do ciclo de exploração do ano 1997. O delineamento estatístico seguido foi o de blocos casualizados com quatro repetições, em microensaio (talhões não contíguos de 1 m2). A dose de sementeira foi de 7 kg/ha. O regime de aproveitamento foi o corte em verde, simulando o pastoreio, ao longo do ciclo de produção em que o último corte correspondeu ao estado de floração (quadro 1). Após cada corte aplicaram-se 40 unidades de azoto por hectare. QUADRO 1 – Datas de corte e respectiva fase do ciclo vegetativo. CICLOS DE PRODUÇÃO 1.º CICLO 2.º CICLO DATAS RITMO DE EXPLORAÇÃO DE CORTE FASE DO CICLO VEGETATIVO Produção no ano de instalação (A0) 13/6/96 30/8/96 início do espigamento início da floração Produção de Outono Produção de Inverno Produção ao início da Primavera Produção de Primavera Produção no final da Primavera Produção estival 14/11/96 5/2/97 14/3/97 estado vegetativo estado vegetativo recrescimento vegetativo 24/4/97 23/5/97 recrescimento vegetativo estado vegetativo/início do espigamento início da floração 11/7/97 Os parâmetros registados foram as produções de matéria verde (MV) e seca (MS). Estas variáveis foram sujeitas à análise de variância com o programa MSTAT v. 3.0 (1982). Realizou-se a matriz de correlações entre os parâmetros MV, MS, número de plantas após dois ciclos de produção (indicador da persistência do material) e alguns dados de passaporte (% de germinação da amostra à colheita, peso de 1000 grãos da amostra e altitude de colheita) (quadro 2). Estas variáveis foram sujeitas à análise em componentes principais (ACP) e hierarquização pelo método UPGMA (average) recorrendo ao programa JMP Statistics and Graphics Guide v. 3.0 (1993). PASTAGENS E FORRAGENS 19 7 QUADRO 2 – Dados de passaporte. Nº de Colecção População 00220 00219 00158 00228 00221 00210 00231 00215 00230 00125 00217 00213 00130 00216 00226 00223 30/95 29/95 18/94 36/95 31/95 22/95 39/95 25/95b 38/95 10/92 27/95 24/95 15/92 26/95 34/95 32/95 Local de origem Peso de 1000 % de grãos (g) germinação S. Eugénia - Braga/Barcelos S. Vicente Bico - Sequeiros - Braga A. Valdevez Correlhã - P. Lima Barqueiros - Barcelos/P. Varzim Valdozende - S. M. Bouro/T. Bouro Oleiros - Braga/P. Lima Leonte - PNPG Monte de Friastelos - S. Julião Freixo S, Peneda - Melgaço Vilar - T. Bouro Caldas Gerês - PNPG Cabreiro - A. Vald. Campo Gerês - PNPG Amorosa - V. Castelo Apúlia 0,636 0,767 0,692 0,492 0,716 0,694 0,816 0,750 0,740 0,637 0,631 0,514 0,774 0,630 76,5 74,5 92,0 ? 80,0 74,0 80,0 ? 78,0 79,3 74,5 61,0 94,4 58,5 72,5 77,0 Altitude (m) 79 120 160 40 50 195 90 690 220 625 260 325 60 550 39 30 3 – RESULTADOS 3.1 – Capacidade produtiva O germoplasma em avaliação tem variabilidade interpopulações quanto à capacidade produtiva tanto de matéria verde como de matéria seca (quadro 3, figura 1). Aparentemente a persistência (ou n.º médio de plantas por população ao fim de 8 cortes) não afectou a produção, mas este factor será analisado do ponto de vista das componentes principais. Os resultados obtidos mostram que na região do Entre Douro e Minho o germoplasma de Dactylis tem interesse sob o ponto de vista produtivo, tendo potencial de produção ao nível do esperado para este género (9) e superior à testemunha. Na figura 2 apresenta-se a evolução da produção de matéria seca por hectare comparando germoplasma colhido em diferentes altitudes* (entre 39 m e 79 m as populações 30, 31, 34; entre 220 m e 325 m as populações 38, 27, 24; entre 550 m e 690 m as populações 26, 10, 25). Pode-se observar que o germoplasma em estudo mostra capacidade de produzir regularmente, embora os picos de produção ocorram no Outono (corte 3 realizado no mês de Novem- * 8 Conforme quadro 2. PASTAGENS E FORRAGENS 19 bro de 1996) e ao início do espigamento (corte 7 em Maio/97). O germoplasma colhido em baixas e médias altitudes é precoce na Primavera (cortes 4 e 5 em 1997). A produção estival é significativa (corte 2 no mês de Agosto de 1996, corte 8 efectuado em Julho/97). O material oriundo de zonas situadas em maiores cotas é o menos produtivo ao longo dos ciclos de exploração. QUADRO 3 – Produção de matéria verde (kg/ha), de matéria seca (kg/ha) e persistência (n.º médio de plantas/m2) após dois ciclos de produção (8 cortes). População 30/95 29/95 18/94 36/95 31/95 22/95 39/95 25/95b 38/95 10/92 27/95 24/95 15/92 26/95 34/95 currie 32/95 (1) Prod. mat. verde (kg/ha) 19 883 ab (1) 17 832 ae 16 228 de 17 393 ae 20 099 a 18 980 ad 18 830 ad 15 373 ef 18 063 ae 11 999 g 18 784 ad 17 278 be 17 117 ce 12 708 fg 19 282 ac 8 962 h 18 160 ad Prod. mat. seca (kg/ha) Persistência (Fev. 1998) 4 038 a 3 676 ad 3 363 cd 3 512 bd 4 018 ab 3 896 ab 3 834 ac 3 200 de 3 650 ad 2 597 f 3 902 ab 3 696 ad 3 605 ad 2 751 ef 3 865 ac 1 958 g 3 677 ad 33 29 30 28 28 24 25 28 28 18 29 23 25 21 21 8 26 Diferença significativa mínima para probabilidade <0,05. FIGURA 1 – Produção média de matéria verde e de matéria seca de populações de D. glomerata spp. da região de Entre Douro e Minho. PASTAGENS E FORRAGENS 19 9 FIGURA 2 – Evolução da produção de matéria seca (kg/ha) ao longo de dois ciclos produtivos. O material estudado apresenta características de rendimento, anual e de regularidade, e de flexibilidade de exploração que poderão ser utilizadas na criação varietal, à semelhança do que se procurou em França. Segundo Mousset (10), as populações do NW de Portugal mostraram características interessantes para a selecção, destacando-se a maior duração do período vegetativo (dormência invernal reduzida) e flexibilidade na exploração de Primavera. 10 PASTAGENS E FORRAGENS 19 3.2 – Relação entre os dados de passaporte e o potencial produtivo A matriz de correlação (quadro 4) mostra que a capacidade produtiva está relacionada com a altitude de colheita (negativamente) e com o peso de mil grãos (positivamente). A percentagem de germinação está correlacionada com o peso de 1000 grãos, mas estes dados de passaporte não estão correlacionados significativamente com a altitude de colheita, embora se verifique uma relação negativa. QUADRO 4 – Coeficientes de correlação de Pearson. Matriz de correlações MV MV MS Povoamento Altitute Germinação Peso 1000g *** significãncia 1,0 0,984 *** 0,381 -0,719 *** 0,264 0,575 *** MS Povoamento 1,000 0,361 -0,650 *** 0,285 0,580 *** 1,000 -0,373 0,263 0,094 Altitude Germinação 1,000 -0,332 -0,290 1,000 0,562 *** Peso 1000 grãos 1,0 a 0,1% MV/ha (kg/ha) = 0,179 – 0,55 ALTITUDE (m) + 0,244 PESO DE MIL GRÃOS (g) R2 = 66,3% (Equação 1) A influência da altitude e do peso de mil grãos na produção de matéria verde são opostos, embora o R 2 (coeficiente de regressão) não seja muito significativo (66,3%, equação 1). A altitude tem uma influência negativa mas as amostras com superiores pesos de mil grãos têm maiores produções de MS. As regressões lineares da matéria verde (figura 3) e da matéria seca (figura 4) com a altitude mostram existir uma relação entre este factor e ambos os parâmetros (R 2 = 78% e R2 = 76% respectivamente). As rectas obtidas foram: Prod. mat. verde (kg/ha) = 15 664,2 – 7,134 77 altitude (m) Prod. mat. seca (kg/ha) = 3 170,57 – 1,246 82 altitude (m) PASTAGENS E FORRAGENS 19 11 Nota: Média do ensaio 14 toneladas de MV por hectare. FIGURA 3 – Comportamento do material colhido em várias altitudes – produção de matéria verde (recta inclinada) de Dactylis glomerata spp. do EDM. Nota: Média do ensaio abaixo das 3 toneladas por hectare. FIGURA 4 – Resposta da produção de matéria seca (recta inclinada) em Dactylis glomerata spp. do EDM oriundas de várias altitudes. 12 PASTAGENS E FORRAGENS 19 3.3 – Análise e classificação Para a análise e classificação da variabilidade genética para o potencial produtivo utilizou-se o programa JMP 3.0 e os métodos de análise em componentes principais (ACP) e de classificação. Para agrupamento do material em função do grau de similitude optou-se pelo método UPGMA "average". Dado ter-se interesse pelas variáveis altitude e grau de persistência do material, decidiu-se apresentar os resultados para a distribuição da variabilidade da capacidade de produção, quando são consideradas aquelas variáveis. Da análise em ACP (quadro 5) conclui-se que 96,59% da variabilidade são explicados pelas duas componentes principais. A primeira componente é definida pela produção de matéria seca e a segunda pela persistência (povoamento). QUADRO 5 – Análise das principais componentes. Componentes principais Valores próprios Percentagem Percentagem acumulada Vectores próprios MS/ha Povoamento Altitude 1 2,25 – 75,089 2 0,64 – 21,506 0,638 -0,481 -0,601 -0,202 0,857 0,472 Da observação da figura 5, relativa à projecção das variáveis e das populações, verifica-se como o material de maiores altitudes (8, 10 e 14) se define pelo menor potencial produtivo e que a persistência deste germoplasma, sob o ritmo de exploração preconizado, está mais associada a altitudes intermédias. Na figura 6 apresenta-se o fenograma obtido para as variáveis já mencionadas em que os números 1, 4, 5, 7, 13, 15 e 17 se referem a altitudes menores, os n.ºs 2, 3, 6, 9, 11 e 12 são das populações de cotas intermédias e os n.ºs 8, 10 e 14 indicam as populações de altitudes acima de 550 metros. Ressalta a dissemelhança entre o material de cotas acima de 550 m e o restante, formando-se dois grupos principais. No grupo que inclui germoplasma de cotas baixas a médias há variabilidade interpopulações. PASTAGENS E FORRAGENS 19 13 FIGURA 5 – Projecção das variáveis e das amostras nos 2 primeiros eixos. FIGURA 6 – Fenograma relativo à classificação do germoplasma de Dactylis glomerata spp. do EDM, para as variáveis MS/ha, altitude de colheita e persistência. 4 – DISCUSSÃO E CONCLUSÃO Esta apreciação sobre a biodiversidade do germoplasma, para o potencial produtivo de Dactylis glomerata spp. do EDM, é preliminar, conforme se conclui por comparação com outros trabalhos realizados sobre este género. 14 PASTAGENS E FORRAGENS 19 Devem completar esta apreciação outros parâmetros que são elementos fundamentais para futuras utilizações em programas de melhoramento, como sejam a resistência a doenças, o teor de açúcares solúveis (este género caracterizase pelo alto teor de proteína mas baixo teor de açúcares solúveis), a tolerância ao frio e encharcamento, a data de espigamento, alternatividade, morfologia da folha, altura do material no momento do aproveitamento (em Abril e ao espigamento), cor das folhas e estudos citogenéticos ( 14). Além do mencionado, o estudo baseou-se em dados obtidos apenas em Braga, sendo preferível as avaliações multilocal, mais se tratando de populações naturais que poderão ter menor grau de adaptação quando colocadas fora do meio de origem. As populações com origem em maiores altitudes poderão estar nesta situação. As condições climáticas em Braga, durante o período a que se referem estes resultados, não estimularam o aparecimento de doenças, impedindo a apreciação da tolerância às doenças. O mesmo ocorreu relativamente ao encharcamento. Sobre a resposta do material ao frio, os efeitos fizeram-se sentir pontualmente e de modo reversível. O germoplasma em avaliação apresentou-se homogéneo quanto à data de espigamento, tornando possível a realização do corte em verde na mesma data para todas as populações. O propósito deste estudo foi obter informação que orientasse futuras prospecções. Dado a contagem de cromossomas não ter sido feita, nada se pode acrescentar sobre a influência da plóidia nos resultados e se se trata das subespécie galician, lusitanica ou da glomerata. Mousset (4, 8, 10) observou que o material colhido na Península Ibérica é mais tardio quando oriundo de áreas de menor influência continental, é ligeiramente mais sensível às ferrugens, sobretudo o de zonas não costeiras, e tem flexibilidade de exploração na Primavera e boa repartição do rendimento anual. Os citotipos diplóides, relativamente aos tetraplóides, são mais tardios, têm menor crescimento e rendimento, são menos alternativos e são mais resistentes ao frio e à mastigosporiose. O germoplasma do Norte de Portugal destaca-se pelo superior grau de alternatividade e por as formas diplóides terem forte afilhamento. Atendendo às considerações de Mousset (4, 8, 12 ), estes resultados indicam que o material avaliado mostra um certo crescimento invernal, que há diversidade interpopulações na repartição do rendimento anual e que a variabilidade para a aptidão agronómica é interessante sob o ponto de vista de criação varietal. As populações avaliadas colhidas no interior montanhoso (com maior influência continental) apresentaram-se com menor flexibilidade de exploração. PASTAGENS E FORRAGENS 19 15 À semelhança de outros trabalhos (1, 5, 12, 13), também esta avaliação preliminar sugere que as variáveis ecogeográficas têm efeito na distribuição da biodiversidade. Na região do EDM, embora não se tenham dados relativos ao efeito das variações climáticas sobre este germoplasma e a avaliação feita deva ser considerada preliminar, há indício de que ocorre uma distribuição da aptidão agronómica favorável em menores altitudes. Como este género apresenta, em Portugal, segundo Mousset, uma biodiversidade indicadora da existência de fluxo genético entre diplóides e tetraplóides e entre tetraplóides diferentes, considera-se que as análises da diversidade genética ao nível intersubespecífico e intrasubespecífico devem constituir objectivo de estudo para melhor avaliar o interesse deste material e melhorar a gestão dos recursos fitogenéticos nacionais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 – BORRILL, M. – Dactylis marina Borril, sp., nov., a natural group of related tetraploid forms. "J. Linn. Soc.", (Bot.), 56 (368) 1961, p. 431-439. 2 – BORRILL, M. – Evolution and genetic resources in cocksfoot. "Annual Report", Aberystwyth, Wales, Welsh Plant Breeding Station (WPBS), 1977, p. 190-209. 3 – BORRIL, M.; CARROLL, C. P. – A chromosome atlas of the genus Dactylis. Part two. "Cytologia", vol. 33, 1967, p. 15-17. 4 – CHOSSON, J. 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PASTAGENS E FORRAGENS 19 17 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 19–30. EFICIÊNCIA DA ADUBAÇÃO E DA REPARTIÇÃO DO AZOTO NA PRODUÇÃO E COMPOSIÇÃO QUÍMICA DO MILHO (ZEA MAYS L.) SILAGEM NO ENTRE DOURO E MINHO* António Fernandes, João Costa♦, Nuno Moreira♦ Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho – Estação Regional de Culturas Arvenses – Qta. S. José – S. Pedro Merelim – 4700 BRAGA ♦ Departamento de Fitotecnia – Universidade Trás-os-Montes e Alto Douro – – Apartado 202 – 5001 VILA REAL CODEX RESUMO O incremento da produção leiteira, ocorrido no Noroeste litoral nestas últimas três décadas, está associado ao sucesso do milho (Zea mays L.) para silagem sendo este a base dos regimes alimentares das vacas leiteiras. No entanto, o elevado consumo de factores de produção que está associado à cultura, nomeadamente de fertilizantes azotados, tem conduzido a grandes perdas de azoto para fora do sistema solo-planta, originando graves problemas de poluição, insustentáveis numa agricultura moderna, em que o respeito pelo meio ambiente e a diminuição dos custos de produção são objectivos a atingir. Neste contexto, instalou-se um ensaio para avaliar a eficiência da cultura a diferentes níveis de azoto (0, 50, 100, 150, 200, 250 e 300 kg N.ha-1), e três formas de aplicação do adubo: 1) todo em fundo; 2) 1/2 em fundo e 1/2 às 6 a 8 folhas (joelheiro); 3) aplicado 1/3 em fundo, 1/3 joelheiro e 1/3 na pré-ântese, num total de 19 tratamentos. O adubo na forma de ureia (46 % N) foi incorporado no solo através da água de rega. As características estudadas foram a produção de matéria seca (MS), proteína bruta (PB), teores de cálcio (Ca), magnésio (Mg), fósforo (P) e potássio (K). Os resultados obtidos apresentaram-se significativos com os níveis de N aplicado. A produção de MS variou entre 19,2 e 25,8 t.ha-1, a proteína bruta entre 1,29 e 1,85 t.ha-1 e os teores em Ca, P, Mg e K apresentaram valores na matéria seca (%) entre 0,15 e 0,23, 0,23 e 0,32, 0,12 e 0,15, e 1,10 e 1,37, respectivamente, dentro dos níveis em estudo (0 e 300 kg N.ha-1). A taxa de N recuperado pela cultura variou entre os 60 no nível de 50 kg N.ha-1 e 28% na dose de 300 kg N.ha-1, tendo sido influenciada pelas quantidades aplicadas, matéria seca produzida e perdas de N. A repartição da fertilização azotada não melhorou de forma significativa a eficiência da cultura. PALAVRAS-CHAVES: Adubação azotada; Eficiência de utilização do azoto; Milho silagem. * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF, Castelo Branco, Abril de 1998. 19 ABSTRACT The implementation of milk production that has been taking place along the Portuguese Littoral Northwest during the last three decades, is directly linked to the success of maize (Zea mays L.) silage, as the basic milking cattle feed. However, the high yielding levels generally associated with this crop, namelly due to the high-nitrogen fertilisation, have led to big nitrogen losses leaving out of the soil-plant system. This situation causes severe pollution problems that must be considered intolerable in a modern agriculture where not only the lowering of production costs should be achieved, but also an increasingly attention to the environmental protection should be paid. Within this reasoning framework, a yield trial complex was implanted in order to evaluate the crop efficiency at diferent nitrogen levels (0, 50, 100,150, 200, 250 and 300 kg N.ha-1) combined with three distinct forms of nitrogen application: 1) all at ploughing; 2) 1/2 at ploughing and the other 1/2 at 6-8 leaves stage (knees high); 3) 1/3 at ploughing, 1/3 at knees high and 1/3 at pre-anthesis stage in a total of 19 treatments. The nitrogen was applied in the urea form through the irrigation system. The following traits were studied: dry matter (DM), crude protein (CP) and levels of calcium (Ca), magnesium (Mg), phosphorus (P) and potassium (K) Our data show that significant differences were obtained for different levels of nitrogen application. Moreover, the dry matter (DM) production ranged from 19,2 to 25.8 t.ha-1, the crude protein (CP) varied from 1.29 to 1.85 (t.ha-1), and the levels of Ca, P, Mg and K once related to dry matter reached respectively 0.15-0.23, 0.23-0.32, 0.120.15 and 1.10-1.37, for either 0 or 300 kg of N application. The level of nitrogen recovered by the crop ranged from 60 to 28% according to the applied doses in our study (50-300 kg.ha-1), having been influenced by the applied quantities, the dry matter produced and N losses. The partitioning of nitrogen application did not show to be significant in the cropping yield efficiency. KEY WORDS: Nitrogen fertilization; Nitrogen use efficiency; Maize silage. 1 – INTRODUÇÃO Nas últimas décadas o desenvolvimento da produção leiteira no Entre Douro e Minho foi feito com base no milho silagem, dando lugar a um sistema de cultivo muito intensivo, nomeadamente com o recurso a uma elevada fertilização azotada (23). As perdas de azoto mais importantes nos ecossistemas agrícolas são a volatilização, a desnitrificação e a lixiviação. Em muitas culturas estas perdas podem ser minimizadas pelo fraccionamento da aplicação dos fertilizantes, sincronizando-a com o período de maior absorção do N, para aumentar a eficiência da sua utilização. A fertirrigação, ou mesmo a incorporação de N na rega, geralmente na forma de ureia, em culturas de regadio, é uma prática 20 PASTAGENS E FORRAGENS 19 que reduz consideravelmente a magnitude das perdas ao veicular o N para camadas do solo mais profundas, diminuindo a possibilidade das perdas por volatilização sob a forma de amoníaco (1). Segundo Trindade ( 23), a incorporação pela água de rega de fertilizantes sólidos à base de ureia distribuída à superfície do solo é um método eficaz, dada a mobilidade da ureia ser idêntica à do ião nitrato e a sua hidrólise pela urease mostrar uma fase "lag" de um ou dois dias. Assim, ao agricultor apresentam-se duas opções: aplicar o azoto pelo processo convencional e os riscos de lixiviação aumentarem; fazer a fertirrigação e o azoto residual no final do ciclo poder ser elevado, sobretudo quando se sobrestimam as quantidades a aplicar nas fases finais dos ciclos culturais (3). A melhoria da absorção do azoto pelas plantas traduz-se também em produções geralmente mais ricas em compostos azotados mas pode desequilibrar a proporção dos vários constituintes na planta. Por outro lado, é reconhecido que a composição mineral da forragem varia, não só com o tipo de planta (género, espécie e cultivar) e o momento de desenvolvimento, mas também com factores como o solo, clima e aplicação de fertilizantes azotados (7,13). Com aplicações de azoto nítrico (N-NO3) como fonte de N na cultura do milho, os níveis de Ca e Mg são mais elevados, ao contrário do azoto aplicado na forma amoniacal (N-NH4), em que são favorecidos os teores de P e S, podendo, neste caso, levar a carências nos elementos Mg e Ca ( 16). Motivados pela necessidade de melhorar a eficiência de utilização do azoto pela cultura do milho silagem, num conceito de agricultura sustentável, instalou-se um ensaio de campo que permitisse avaliar a eficiência da resposta da cultura de milho a diferentes níveis de azoto e à sua repartição, bem como a sua influência nos parâmetros da produção e composição química. 2 – MATERIAL E MÉTODOS 2.1 – Localização e condições edafoclimáticas O ensaio realizou-se no ano agrícola de 1997, na Estação Regional de Culturas Arvenses (ERCA), unidade orgânica da Direcção Regional de Agricultura de Entre Douro e Minho, situada em S. Pedro de Merelim, Braga. Os resultados da análise de terra, efectuadas antes da implantação do ensaio, apresentam-se no quadro 1. PASTAGENS E FORRAGENS 19 21 QUADRO 1 – Resultados da análise sumária do solo. Textura Franco-arenosa Prof. (cm) MO (%) P2O5 (ppm) K2O (ppm) PH (H2O) Precedente cultural 0 - 20 3,0 40 200 6,2 Azevém Na figura 1 podem comparar-se as precipitações e os somatórios de temperaturas (base 6 ºC) ocorridas durante o ensaio e as médias de 1984 a 1996. Constata-se que as precipitações durante o mês de Maio foram consideravelmente superiores às médias dos últimos doze anos. No que respeita às temperaturas, estas foram mais baixas, principalmente a partir de finais de Julho (15). FIGURA 1 – Comparação das precipitações e somatórios de temperaturas ocorridas durante o ensaio com as médias 1984-1996, por decêndios. 2.2 – Instalação e condução do ensaio A preparação do terreno consistiu numa lavoura a cerca de 30 cm de profundidade, seguida de duas gradagens cruzadas feitas com grade de dentes. A sementeira foi efectuada manualmente, deixando em cada linha sementes suficientes de modo a assegurar o povoamento pretendido de 95 000 plantas/ha, utilizando, para isso, uma largura da entrelinha de 0,7 m e 33 plantas em cada 5 m de linha. A data de sementeira foi 15 de Maio, tendo-se cultivado o híbrido simples Capitan, ciclo FAO 400. Foi aplicada uma fertilização de fundo de 135 hg.ha-1 de P2O5, não havendo necessidade da aplicação de K2O, segundo a análise de terra (quadro 1). O fertilizante azotado na forma de ureia (46% N) foi aplicado segundo o delineamento previamente definido. O controlo de infestantes foi assegurado pela aplicação do herbicida à base das substâncias activas Alacloro+Atrazina em sementeira e na fase de "milho joelheiro" da Atrazina + Bentazona. 22 PASTAGENS E FORRAGENS 19 A colheita realizou-se manualmente, 122 dias após a data de sementeira. 2.3 – Determinações analíticas Após a colheita foi registada a massa verde produzida por tratamento e recolhida uma amostra de duas plantas, que foram recortadas em pequenos troços, para determinação dos teores de matéria seca em estufa com circulação forçada de ar a 65 ºC durante 36 horas. As amostras secas foram moídas em moinho eléctrico, com crivo de malha de 0,8 mm de diâmetro. As determinações analíticas foram executadas na Divisão de Laboratórios da DRAEDM, tendo sido determinados os parâmetros proteína bruta (PB = = N × 6,25), Ca, P, Mg e K. Para quantificar a eficiência da utilização do N (EUN) pela cultura recorreu-se ao método das diferenças, usando a expressão (Ni-No)/Nf × 100, onde Ni e No representam, respectivamente, o azoto exportado pela cultura nas modalidades fertilizadas e a testemunha e o Nf representa o azoto aplicado como fertilizante. 2.4 – Delineamento experimental e análise estatística O ensaio foi instalado segundo combinações factoriais de níveis de azoto com repartição da aplicação do fertilizante, utilizando-se sete níveis – 0, 50, 100, 150, 200, 250, 300 kg N.ha-1 – e três formas de repartição do azoto: 1) todo em fundo; 2) 1/2 em fundo e 1/2 no estado de 6-8 folhas (joelheiro); 3) 1/3 em fundo, 1/3 joelheiro e 1/3 na pré-ântese, obtendo-se no total 19 tratamentos. O desenho experimental utilizado consistiu em blocos casualizados em talhões com 4 linhas de 5 m cada, com duas linhas de bordadura, separadas entre si por 0,70 m, perfazendo uma área total de 14 m2 e uma área útil de 7 m2. Foram instaladas três repetições, separadas entre si por ruas com 1,5 m, sendo a área total do ensaio de 780 m2. O efeito dos tratamentos foi estimado através da análise de variância. A significância dos valores de F calculados foi estabelecida para probabilidades inferiores a 0,05, 0,01 e 0,001. As respostas aos tratamentos de adubação em ensaio em termos das produções de matéria seca, proteína bruta, teores de cálcio, fósforo, magnésio e potássio foram analisadas individualmente. O programa estatístico utilizado para análise de variância foi o Systat 5 para Windows. PASTAGENS E FORRAGENS 19 23 3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 – Repartição da fertilização azotada A análise de variância revelou que o efeito da repartição da adubação azotada não foi estatisticamente significativo nas características em estudo (quadro 2). QUADRO 2 – Efeito da repartição da adubação azotada na produção e composição química do milho silagem. MS % MS (t.ha-1) PB (% na MS) PB (t.ha-1) 50 50 (1/2) 50 (1/3) 32,10 32,70 32,40 19,3 20,6 20,6 7,47 7,92 7,29 1,49 1,55 1,51 0,15 0,15 0,14 0,13 0,12 0,11 1,19 1,10 1,14 0,29 0,18 0,24 100 100 (1/2) 100 (1/3) 33,00 31,30 32,10 21,6 21,7 20,8 7,46 7,50 7,28 1,51 1,47 1,34 0,14 0,16 0,14 0,30 0,12 0,13 1,23 1,21 1,10 0,28 0,23 0,26 150 150 (1/2) 150 (1/3) 33,20 32,00 32,20 23,0 23,5 21,9 6,95 8,23 6,84 1,60 1,65 1,59 0,17 0,27 0,24 0,12 0,13 0,13 1,31 1,45 1,35 0,21 0,24 0,26 200 200 (1/2) 200 (1/3) 32,70 33,60 31,60 24,4 24,4 21,6 7,16 7,11 7,12 1,64 1,62 1,54 0,27 0,18 0,17 0,16 0,14 0,13 1,51 1,36 1,33 0,23 0,25 0,30 250 250 (1/2) 250 (1/3) 31,80 32,10 32,00 25,4 25,1 23,9 7,45 6,93 7,48 1,92 1,74 1,88 0,16 0,16 0,17 0,12 0,13 0,13 1,13 1,24 1,30 0,26 0,25 0,28 300 300 (1/2) 300 (1/3) 31,50 31,70 31,60 26,6 24,7 26,1 7,18 7,13 7,10 1,59 1,76 1,86 0,15 0,15 0,15 0,12 0,12 0,12 1,32 1,30 1,32 0,33 0,31 0,33 F (0,05) ns ns ns ns ns ns ns ns Tratamentos Ca Mg K P (% na MS) (% na MS) (% na MS) (% na MS) 3.2 – Influência dos níveis de adubação azotada na produção e teor de matéria seca Na figura 2 apresentam-se os valores médios da produção e teor de MS para os níveis de adubação azotada em ensaio. Observa-se que as produções de matéria seca variaram entre 19,2 e 25,8 t.ha -1 nos tratamentos 0 e 300 kg N.ha -1, respectivamente. Constatou-se uma resposta regular da produção aos níveis crescentes de N e um decréscimo dos teores de MS acima dos 200 kg N.ha -1 . 24 PASTAGENS E FORRAGENS 19 Nas mesmas condições edafoclimáticas em ensaios de variedades de milho silagem com aplicações de 190 kg N.ha-1 foram obtidas produções médias de 22 t MS.ha-1 (15). Já anteriormente se haviam registado produções de 20 t MS.ha-1 para a cultura com 250 kg N.ha-1 (17) e de 22 t.ha–1, com aplicações de 160 a 180 kg N.ha-1 (4). Todavia, Durieux e colaboradores verificaram que aumentando as aplicações de azoto de 112 para 168 kg.ha -1 e de 123 para 168 kg N.ha-1, nas condições de Vermont (EUA), obtiveram acréscimos na absorção do azoto pela cultura, sem no entanto beneficiar a produção de matéria seca( 6). FIGURA 2 – Efeito do azoto na produção e teor de MS do milho silagem 3.3 – Influência da adubação azotada na produção e teor de proteína bruta O efeito clássico do aumento de proteína das forragens com a aplicação de N ( 5, 13) também foi registado neste ensaio, com as produções a variarem de uma forma estatisticamente significativa (P<0,001), entre 1,23 t PB.ha-1 no tratamento 0 kg N.ha-1 (0N) e 1,83 t no tratamento 300 N, embora a produção mais elevada de 1,85 t PB.ha -1 tinha sido obtida no tratamento 250 N (figura 3). O teor de PB variou de 6,6 a 7,6% com o mínimo no tratamento 0 N e o máximo no tratamento 100 N. Estes valores do teor azotado estão de acordo com os referidos por Demarquilly (5), sendo inferiores aos de outros trabalhos (2). O decréscimo dos teores em PB a partir do nível de adubação 100 N poderá estar associado a um efeito de diluição, devido à continuada resposta da produção de MS da cultura aos níveis mais elevados de fertilização. No entanto, Humphreys (11) refere que a relação negativa entre a proteína e a PASTAGENS E FORRAGENS 19 25 matéria seca é principalmente evidente para baixos níveis de fertilização azotada, reflectindo-se essa variação na eficiência do uso do N na matéria seca produzida. Efeitos deste tipo são referidos por outros autores em diferentes gramíneas (5, 13, 21). FIGURA 3 – Efeito do azoto na produção e teor de PB do milho silagem. 3.4 – Influência da adubação azotada nos teores de Ca, P, K e Mg Constatou-se que os teores de Ca, P, K e Mg variaram significativamente com o nível de azoto (figura 4). Assim, no que diz respeito ao teor de Ca, este atingiu valores mais elevados nas doses de 150 e 200 N com 0,23 e 0,21, respectivamente. Ficou, no entanto, aquém dos 0,52 % considerados mínimos para satisfazer as necessidades de conservação dos ruminantes ( 8). Segundo Nelson (14), os baixos teores de Ca verificados no milho estão relacionados com os menores teores de N na forma de nitratos disponíveis no substracto. Os teores de fósforo na forragem variaram significativamente com o azoto, tendo sido favorecidos no tratamento 300 N com 0,32 % e atingido os valores mais baixos com aplicações de 150 N. Todavia, de uma forma geral, estes valores são susceptíveis de não satisfazer as necessidades alimentares dos ruminantes (8), o que pode estar relacionado com a influência que as condições de solo exercem na sua concentração, especialmente a reacção do solo ácida (7, 13). Os valores de Mg foram significativamente influenciados pela adubação azotada, constatando-se o seu decréscimo com aplicações superiores a 200 kg.ha -1. Porém, os valores do ensaio ficaram aquém do s níveis críticos de 0,20 (10) e de 0,15% ( 12) considerados, respectivamente, para o gado leiteiro e de engorda. Santos ( 20) refere que o Mg no milho decresce com a fertilização azotada, embora acompanhado de um au- 26 PASTAGENS E FORRAGENS 19 mento do K. Apesar do milho ter uma capacidade de troca catiónica radicular já relativamente elevada, o antagonismo K/Mg dever-se-á manifestar a favor da absorção do potássio (19 ). Também Nelson (14) refere que a elevada assimilação de potássio diminui a absorção de cálcio e magnésio, mesmo em solos com teores elevados em carbonato de cálcio e magnésio. Os teores de K no ensaio foram sempre muito superiores a 0,7%, valor considerado máximo para não ocorrer um desequilíbrio na relação K/Ca+Mg (18). As doses de azoto influenciaram significativamente os teores de K, na forragem com o valor mais elevado no tratamento 150 N com 1,37 e o mais baixo no tratamento 50 N com 1,1%. FIGURA 4 – Efeito da adubação azotada nos teores de Ca, P, Mg e K do milho silagem. 3.5 – Eficiência de utilização do azoto (EUN) A eficiência da cultura para o azoto (EUN) variou entre 60 e 28%, com taxas de utilização mais baixas nas doses de azoto acima de 100 kg N.ha-1 (figura 5). Walters e Malzer (24), em estudos semelhantes, durante dois anos, obtiveram taxas de absorção significativamente diferentes com aplicações de 90 e 180 kg N.ha -1 na forma de ureia, com valores de EUN de 90 e 55% no primeiro ano e 67 e 48% no segundo, respectivamente. Por outro lado, Staley e Perry (22), em ensaios conduzidos na Virgínia (EUA), referem taxas de recuperação para o milho de 57, 57 e 48 % para as doses de 56, 112 e 224 kg N.ha-1, respectivamente. Por seu turno, Guillard e colaboradores (9) referem que o risco de perdas de N na cultura do milho aumenta potencialmente para quantidades de azoto superiores a 112 kg.ha-1. PASTAGENS E FORRAGENS 19 27 Os resultados obtidos no presente ensaio apontam também para a possibilidade de maiores perdas de N nos níveis mais elevados de adubação. FIGURA 5 – Eficiência de utilização (%) aparente do N aplicado pela cultura. 4 – CONCLUSÕES Dos resultados obtidos no ensaio conclui-se o efeito significativo das doses crescentes de azoto (0 a 300 hg N.ha-1) nos parâmetros produção de matéria seca e proteína bruta. As aplicações superiores a 200 kg N.ha-1 conduziram ao abaixamento dos teores de proteína e de matéria seca. A repartição da adubação azotada não conduziu neste ensaio a resultados significativos. Em relação à composição química, verificaram-se respostas significativas à adubação N, tendo-se observado os valores mais elevados de Ca, Mg e K para os níveis de adubação 150-200 kg N.ha-1, enquanto que para o P tal se verificou com o tratamento mais elevado (300 N). A eficiência de utilização aparente do N pela cultura, para além de não ter beneficiado com a repartição do adubo, diminuiu com as quantidades crescentes de N, revelando-se baixa para valores acima de 100 kg N.ha-1. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 – AL-KANANI, T.; MACKENZIE, F.; BLENKHORN, H. – The influence of formula modifications and additives on ammonia losses from surface-applied urea-ammonium nitrate solutions. "Fertilizer Research", vol. 22, 1990, p. 49-59. 2 – BARRIERE, Y. – Le maïs ensilage de demain, um maïs spécifique pour nourrir les ruminants. "Fourrages", vol. 150, 1997, p. 171-189. 3 – CARRANCA, C. – Avaliação de Alguns Processos do Ciclo do Azoto em Solos Portugueses, designadamente através do Marcador 15 N. Tese de Doutoramento. Lisboa, Instituto Superior de Agronomia, 1996. 28 PASTAGENS E FORRAGENS 19 4 – COX, J. et al. – Growth yield, and quality of forage maize under different nitrogen management practices. 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Vila Real, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, 1986. 14 – NELSON, B. – The mineral nutrition of corn as related to its growth and culture. "Advances in Agronomy", vol. 8, 1956, p. 321-371. 15 – NOGUEIRA, A. – Boletim Regional de Variedades de Milho. Suplemento da revista. "O Minho a Terra e o Homem", Braga, DRAEDM, 1998. 16 – NOLLER, H.; RHYKERD, L. – Relationship of nitrogen fertilization and chemical composition of forage to animal health and performance. In: "MAYS, D. A. (ed.) – Forage Fertilization". Madison, Wisconsin, American Society of Agronomy, 1974, p. 363-394. 17 – OSÓRIO, F. et al. – Ensaio Comparativo de Rotações de Pastagens. Relatório de Trabalho. Braga, DRAEDM, 1992. 18 – REID, R.; STRACHAN, H. – The effects of a wide of nitrogen rates on some chemical constituints of herbage from perennial ryegrass swards with and without white clover. 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I – Yield and fertilizer use efficiency. "Soil Science Society of America Journal", vol. 54, 1990, p. 115-122. 30 PASTAGENS E FORRAGENS 19 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 31–35. NOVAS POTENCIALIDADES PARA A PRODUÇÃO FORRAGEIRA NA BEIRA INTERIOR* L. Gusmão, E. Bettencourt, L. Gerson, J. Lavado♦; F. Matos-Soares♦; A. Marques♦; M.ª João Frazão♦; L. Pombal♦, A. Antunes♦ Estação Agronómica Nacional – 2780 OEIRAS ♦ Direcção Regional de Agricultura da Beira Interior – 6000 CASTELO BRANCO RESUMO A existência de culturas alternativas para inclusão em sistemas produtivos de carácter extensivo para a generalidade das áreas agrícolas, e em particular para as áreas de menor aptidão produtiva (bastante representativas da região), é da maior relevância. Tratando-se de culturas proteaginosas, concorrentes com a produção cerealífera (forrageira ou não), a cultura de novas espécies de Lupinus, para além do incremento da agro-biodiversidade, poderá vir a constituir um subsídio relevante para o restabelecimento do equilíbrio económico da produção agro-pecuária extensiva na região (como suporte particularmente relevante para a ovinicultura e caprinicultura), constituindo, por outro lado, uma alternativa altamente vantajosa para o "set aside", dado o seu potencial para a indústria dos alcalóides. O ensaio foi realizado na Herdade dos Lamaçais, num coluviossolo de textura ligeira. Os genótipos utilizados foram escolhidos entre material melhorado na região de Salamanca (por forma a garantir uma boa adaptação, face à proximidade edáfica e climática com a área raiana da Beira), utilizando-se, ainda, a cultivar australiana do L. angustifolius e uma linha do L. luteus melhorada na EAN. Os resultados (preliminares, por se referirem a um único campo, num único ano) apontam para: a) competitividade do L. angustifolius, face ao L. luteus; b) maiores potencialidades para o material melhorado sob condições climáticas idênticas; c) maior potencialidade produtiva das linhas 6080 (Esp.), para o L. angustifolius e 670 (Esp.), para o L. luteus. PALAVRAS-CHAVES: Lupinus angustifolius; Lupinus luteus; Lupinus hispanicus; Adaptação; Biodiversidade agrícola; Agricultura sustentável. ABSTRACT The existence of alternative crops for extensive agricultural systems, particularly in low fertility areas (which are highly representative of the region of "Beira Interior") is of the utmost importance. * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF. Castelo Branco, Maio de 1998. 31 The introduction into culture of new food legume crops, concurrent with cereals, as is the case of the indigenous wild species of the genus Lupinus, well adapted to a large spectrum of climatic situations prevailing along the country, will contribute to the implementation of sustainable crop production and can be considered for the "set aside", due to its potential for alkaloid production. Through its recognised action on reduction of fertilisers and pesticides use, in extensive "Australian ley farming" systems, the considered species will contribute to the environment sustainability, without a compromise of the primary sector income, for the great majority of the farms within the region. Trials were performed at "Herdade dos Lamaçais" on a coluvial soil, with light texture. Genotypes selected were chosen between material bred at the region of Salamanca (in order to assure a good adaptation, in view of the climatic and edaphic analogy of this region with Beira Interior). A well adapted cultivar of L. angustifolius (originated in Australia) and an advanced line of L. luteus bred at EAN were chosen for standards. Results (although preliminary, since they refer to only one field, during a single year) pointed to: a) competitiveness of L. angustifolius, face to L. luteus; b) better potential of material bred under identical climatic conditions; c) greater yield potential for line 6080 (Esp.), to L. angustifolius and 670 (Esp.), to L. luteus. KEY WORDS: Lupinus angustifolius; Lupinus luteus; Lupinus hispanicus; Adaptation; Agrobiodiversity; Sustainable agriculture. 1 – INTRODUÇÃO A existência de culturas alternativas para inclusão em sistemas produtivos de carácter extensivo para a generalidade das áreas agrícolas, e em particular para as áreas de menor aptidão produtiva (bastante representativas da região), é da maior relevância. Tratando-se de culturas proteaginosas concorrentes com a produção cerealífera (forrageira ou não), a cultura de novas espécies de Lupinus poderá vir a constituir um subsídio relevante para o restabelecimento do equilíbrio económico da produção agro-pecuária extensiva na região (como suporte particularmente relevante para a ovinicultura e caprinicultura), constituindo, por outro lado, uma alternativa altamente vantajosa para o "set aside", dado o seu potencial para a indústria dos alcalóides. Pela acção, que se lhe reconhece, na redução da utilização de adubos e fitofármacos em sistemas produtivos extensivos, do tipo "Australian ley farming", as culturas em estudo perspectivam-se, sem compromisso da tributação da actividade do sector primário, para um adequado equilíbrio ambiental, na grande maioria das explorações agrícolas da Beira Interior. 32 PASTAGENS E FORRAGENS 19 O ensaio que se relata neste trabalho constitui um dos elementos de um projecto PAMAF, que se harmoniza, em particular, com os programas comunitários, visando salvaguardar o equilíbrio ecológico sem quebra da actual potencialidade produtiva. 2 – MATERIAL E MÉTODOS O ensaio foi realizado na Herdade dos Lamaçais, num coluviossolo de textura ligeira. Os genótipos utilizados foram escolhidos entre material melhorado na região de Salamanca (por forma a garantir uma boa adaptação, face à proximidade edáfica e climática com a área raiana da Beira), utilizando-se, ainda, a cultivar australiana do L. angustifolius e uma linha do L. luteus melhorada na EAN (ver quadro 1). O ensaio foi delineado em 4 blocos completos, com casualização restrita. QUADRO 1 - Genótipos ensaiados. L. Luteus L. Angustifolius 670 (Esp.) – Salamanca* RM102B – EAN, Oeiras cv. Lazarillo** – STAG, JCL, Salamanca 6080 (Esp.) – STAG, JCL, Salamanca cv. yandy – Australiana 6064 (Esp.) – STAG, JCL, Salamanca * Departamento de Pastos y Forrajes, SIA, Junta de Castilla y León. ** Cultivar resultante da segregação para o fenótipo luteus de um cruzamento de L luteus com L angustifolius. 3 – RESULTADOS As produções unitárias nas diferentes parcelas e as médias por genótipo e por espécie apresentam-se, em síntese, no quadro 2. QUADRO 2 – Produções unitárias de grão (kg ha-1). Repetições (kg ha-1) Espécie Lupinus luteus Lupinus angustifolius Genótipo 670 (Esp.) RM102B cv. Lazarillo 6080 (Esp.) cv. yandy 6064 (Esp.) I 1 043 759 776 1 130 660 905 II 832 612 441 1 187 866 773 III 847 946 744 1 212 1 081 1 144 Média (kg ha-1) IV 1 003 849 939 814 871 Genótipo 931 792 725 1 148 855 923 Espécie 816 975* * + 19,5 % PASTAGENS E FORRAGENS 19 33 Um aumento médio de cerca de 20%, para o L. angustifolius, não sendo conclusivo é, no entanto, sintomático da potencialidade desta espécie, desde que se utilizem genótipos bem adaptados. A presença de interacção "cv. × bloco", que se evidencia na figura 1, propõe um modelo II de ANOVA, o qual se resume no quadro 3. FIGURA 1 – Gráfico da interacção cultivar × repetição. 34 PASTAGENS E FORRAGENS 19 QUADRO 3 – ANOVA. Fonte de variação g.l. Valor de F Valor de P 5 18 3,829 0,0154 Genótipos Residual g.l. – grau de liberdade, F – teste de Snedcor, P – probabilidade. A significância das diferenças entre modalidades, pelo teste de Fischer, apenas se verificou para as comparações com a linha 6080 (Esp.), da espécie L. angustifolius, tal como se pode ver no quadro 4. QUADRO 4 – Teste de Fischer para as diferenças entre o genótipo 6080 (Esp.) e os restantes genótipos (diferença crítica de 222,302 kg ha-1). Comparação Diferença média 6080 (Esp.) vs cv. yandy 6080 (Esp.) vs 6064 (Esp.) 6080 (Esp.) vs 670 (Esp.) 6080 (Esp.) vs RM102B 6080 (Esp.) vs cv. Lazarillo -292,500 -224,500 216,500 -356,250 -422,750 Valor de P 0,012 0,048 0,055 0,003 0,000 8* 0* 6 ns 4 ** 8 *** 4 – CONCLUSÕES Face aos resultados, é possível concluir: · Competitividade do L. angustifolius, face ao L. luteus. · Maiores potencialidades para o material melhorado sob condições climáticas idênticas. · Maior potencialidade produtiva das linhas: · 6080 (Esp.), para o L. angustifolius, · 670 (Esp.), para o L. luteus. PASTAGENS E FORRAGENS 19 35 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 37–49. UTILIZAÇÃO CONJUNTA DE LAMAS CELULÓSICAS E ÁGUAS RESIDUAIS URBANAS NA CULTURA DO SORGO EFEITO SOBRE A PRODUÇÃO E COMPOSIÇÃO MINERAL DAS PLANTAS* S. T. Campos, M. C. Horta-Monteiro, João Paulo Carneiro Escola Superior Agrária – Quinta da Srª de Mércules – 6000 CASTELO BRANCO RESUMO Com o objectivo de avaliar a influência da aplicação de diferentes níveis de lamas celulósicas e/ou água residual, com e sem cloragem, foi efectuado, num solo Pg (pardo litólico não húmico de granito) ácido e pobre em matéria orgânica, um ensaio em vasos com a cultura do sorgo (Sorghum vulgare var. sudanense piper Hitsh), que decorreu na Escola Superior Agrária de Castelo Branco (ESACB) entre 26 de Junho e 30 de Setembro de 1996. Verificou-se que a água residual conduziu a aumentos significativos de produção, enquanto que a aplicação de lamas, para qualquer nível ensaiado (0, 30, 60 t ha-1), não apresentou diferenças significativas. Relativamente à cloragem, verifica-se um efeito depressivo que, provavelmente, se deve ao aumento de absorção de sódio e cloretos, em detrimento de outros nutrientes essenciais às plantas. Parece, no entanto, que o tratamento referido tende a favorecer a absorção de ferro, cobre e zinco. PALAVRAS-CHAVES: Água residual; Cloragem; Fertilidade do solo; Irrigação; Lamas celulósicas; Poluição; Sorgo (Sorghum vulgare var. sudanense piper Hitsh). ABSTRACT With the aim of evaluating the influence of the application of different levels of pulp mill sludge and/or wastewater, with and without chlorination, into an acid and poor in organic matter soil (cambisoil), one trial in pots was carried out, at Escola Superior Agrária de Castelo Branco, from the 26th of June until the 30th of September 1996, using sorghum (Sorghum vulgare var. sudanense piper Hitsh). * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF. Castelo Branco, Maio de 1998. 37 It was found that the wastewater lead to significant increases of production, while the application of pulp mill sludge, for any assayed level (0, 30 and 60 t.ha-1), did not present significant differences. Relatively to the chorination, a depressive significant effects was found, probably due to the increase of sodium absorption and chlorides, in detriment of other essential nutrients to the plants. However, seemed increased the iron, copper and zinc absorption. The application of these residues improvised the nutritional value of the plants: wastewaters increased nitrogen, phosphorous, magnesium, sodium, zinc and chlorides levels, while pulp mill sludge increased calcium and, in some cuts, iron, copper and zinc levels. KEYWORDS: Chlorination; Irrigation; Pulp mill sludge; Pollution; Soil fertility; Sorghum vulgare var. sudanense piper Hitsh; Wastewater. 1 – INTRODUÇÃO Os problemas inerentes às questões ambientais têm sido motivo de grandes debates a nível mundial, com a finalidade de encontrar soluções compatíveis com a necessidade de proteger os recursos naturais, garantindo simultaneamente uma qualidade de vida das populações. A utilização de água residual pelo homem em irrigação desde há muito que é praticada, possibilitando um aproveitamento de um recurso, cada vez mais escasso, como factor de produção em agricultura, evitando-se deste modo a degradação dos meios hídricos naturais, tradicionalmente utilizados como receptores. Também a produção de resíduos no sector da pasta de papel teve um crescimento acentuado, nomeadamente com a adopção de sistemas de tratamento de efluentes por partes das empresas produtoras, podendo o destino de tais resíduos passar igualmente pela sua utilização como fertilizante na agricultura. Na verdade, apresentando o nosso País solos predominantemente ácidos e pobres em matéria orgânica, a incorporação de lamas celulósicas ao solo será vantajosa, na medida em que se trata de um resíduo rico em matéria orgânica e cálcio, em combinações químicas de carácter básico. É neste contexto que surge o presente trabalho, o qual tem como principal objectivo o estudo do efeito decorrente da utilização de lamas celulósicas como fertilizante e/ou águas residuais urbanas tratadas como água de rega sobre a produção e composição mineral da forragem (sorgo) produzida num solo litólico não húmico de granito. 38 PASTAGENS E FORRAGENS 19 2 – MATERIAIS E MÉTODOS Foi efectuado um ensaio em vasos com sorgo (Sorghum vulgare var. sudanense piper Hitsh), cultivado num solo litólico não húmico de granito, cujas características físico-químicas principais se apresentam na tabela 1. TABELA 1 – Principais características do solo. Características Solo Textura CE (1:10 H2O, mS cm-1) MO (%) pH (1:2,5 H2O) pH (1:2,5 KCl) P2O5 (mg kg-1) K2O (mg kg-1) Ca2+ [cmol(+) kg-1] Mg2+ [cmol(+) kg-1] K+ [cmol(+) kg-1] Na+ [cmol(+) kg-1] CTC [cmol(+) kg-1] V (%) S [cmol(+) kg-1] Cu [mg kg-1] Fe [mg kg-1] Zn (%) Cl (mg 100g-1) franco-arenosa 50,3 0,72 5,2 4,0 50 150 0,27 0,19 0,08 0,0003 2,8 19,42 0,54 7,74 1,93 0,016 504,1 Dos valores apresentados verifica-se, em linhas gerais, que o solo utilizado no ensaio é ácido, tem um teor baixo em matéria orgânica (MO) e em fósforo "assimilável" e alto em potássio "assimilável"; apresenta uma capacidade de troca catiónica baixa e um grau de saturação em bases também baixo. As lamas celulósicas utilizadas no ensaio são lamas obtidas pelo processo de tratamento primário instalado na unidade fabril de Portucel – Vila Velha de Ródão. Os resultados analíticos desta lama encontram-se na tabela 2. A água residual utilizada na rega foi água residual urbana sujeita a um tratamento de nível secundário pelo processo das lamas activadas e proveniente da Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) de Castelo Branco. A caracterização analítica desta água apresenta-se na tabela 3. PASTAGENS E FORRAGENS 19 39 TABELA 2 – Principais características das lamas celulósicas. Valores Características Humidade (105ºC, %) C.E. (1:10 H2O, mS cm-1) pH (1:2,5 H2O) MO (%) N- NH4+ (%) N-NKjeldhal (%MS) P (%) C/N Obtidos 66,98 0,21 7,9 74 0,05 0,21 vest. 200 a) K (%) Ca (%) Mg (%) Na (%) Cu (mg kg-1) Fe (%) Zn (mg kg-1) Cl (mg 100g-1) Máximos 0,26 5,86 0,24 0,16 14,00 0,34 91,60 74,55 b) 0,20 2,45 0,14 0,09 9,34 3,58 77,44 1000c) 2500c) a) Estes valores foram obtidos através de espectrofotometria de absorção atómica em chama, após mineralização das cinzas com HCl a 5 % (INRA- Bordeaux ). b) Estes valores foram obtidos através de espectrofotometria de absorção atómica em chama, pelo método de solubilização em água régia com sistema fechado (3), indicado pela Portaria n.º 177/96 (6). c) Fonte: Portaria n.º 176/96 (5). Atendendo às características do solo (tabela 1), das lamas celulósicas (tabela 2) e da água residual (tabela 3), assim como a resultados de ensaios anteriormente realizados, foram definidas doze modalidades, distribuídas por blocos casualizados com três repetições, em que L60, L30 e L0 correspondem à incorporação de sessenta, trinta e zero toneladas de lamas celulósicas por hectare, e A, AD, AR, ARD correspondem, respectivamente, a água da rede pública, água da rede pública desinfectada, água residual e água residual desinfectada. A desinfecção da água foi efectuada com o objectivo de colocar a água residual com uma qualidade microbiológica adequada à rega de culturas sem restrição (7), e foi efectuada com hipoclorito de sódio de forma a obter-se, após 30 minutos de contacto, um teor de cloro residual livre de 3 mg l-1. Os vasos foram cheios com 6 kg de terra que foi seca ao ar e crivada por um crivo de malha de 5 mm. Com base nos dados analíticos do solo e da lama e, de forma a evitar, logo à partida, a ocorrência de factores limitantes ao normal desenvolvimento das plantas, efectuou-se uma adubação de fundo com 0,8 g de P2O5 e 0,5 g 40 PASTAGENS E FORRAGENS 19 de K2O por vaso, sob a forma de dihidrogenofosfato de potássio. Imediatamente após a sementeira, efectuou-se uma adubação com 0,75 g de N por vaso, sob a forma de uma solução de nitrato de amónio. Também após a realização do primeiro corte se aplicou 0,36 g de N por vaso; como a resposta a esta fertilização não foi a esperada, procedeu-se a uma nova adubação de cobertura com 0,45 g de N. TABELA 3 – Principais características da água residual. Parâmetros n Média ST (g l-1) SVT (g l-1) SST (g l-1) CQO a) BOD5 a) CE (mS cm-1) pH Sulfatos a) Bicarb. (meq l-1) N- Org a) N- NH4+ a) N- NO3-+ NO2- a) N- totala) P a) Ca a) Mg a) K a) Na a) Fe a) Cu a) Zn a) Cl a) Adj RNa 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 9 0,54 0,15 0,03 152 11 1,22 7,7 37,20 5,52 1,17 25,8 1,15 28,12 0,19 59,24 4,65 16,78 116 0,52 – 2,48 199,12 5,68 s 0,070 0,048 0,001 75,76 2,77 0,22 0,14 5,55 1,54 0,87 11,73 0,21 11,97 0,0081 29,82 1,04 4,62 14,91 0,024 – 2,14 89,26 1,39 Xmáx. 0,62 0,26 0,05 275 15 1,55 7,9 44,8 9,7 3,56 45,92 1,4 47,88 0,21 105,61 6,53 25,5 140 0,55 0,65 5,62 295,8 8,32 Xmin. 0,4 0,1 0,02 50 7 0,83 7,4 28,4 4,5 0,56 7,84 0,84 9,8 0,18 25,39 3,41 10,5 90 Vest. Vest. Vest. 94,85 3,86 n – número de amostras colhidas ao longo do ensaio; s – desvio-padrão; xmáx. – valor máximo obtido; xmín. – valor mínimo obtido. a) valores expressos em mg l-1. A sementeira realizou-se no dia 26 de Junho de 1996. Foi efectuada manualmente, tendo-se colocado 6 sementes vaso-1, dispostas em linha com uma distância aproximada entre elas de 3 cm e a uma profundidade de 1 cm. Foram feitos três cortes às plantas, a 30 de Julho, a 27 de Agosto e o último corte a 30 de Setembro de 1996, quando estas apresentavam uma altura próxima dos 50 cm. A humidade do solo foi controlada através de um medidor de humidade do solo tipo "Bouyoucos", e a dotação de rega baseada nestas medições de forma a manter os vasos a 80% da capacidade de campo. A rega com água residual iniciouse a 12 de Julho. PASTAGENS E FORRAGENS 19 41 As determinações analíticas efectuadas ao solo, às águas residuais e às lamas celulósicas foram feitas de acordo com os métodos usados no Laboratório de Solos e Fertilidade da Escola Superior Agrária de Castelo Branco. A análise estatística dos resultados foi efectuada no programa estatístico Statgraphics, versão 6.0, utilizando a análise múltipla de variância (ANOVA), seguida do teste LSD (Least Significant Difference) com um intervalo de confiança de 95%. 3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 – Produção de forragem De acordo com a tabela 4, constata-se que as modalidades regadas com água residual apresentam uma produção significativamente superior, resultado que vem reforçar a ideia já existente sobre o bom valor fertilizante da água residual. TABELA 4 – Valores médios da matéria seca (g) obtidos em cada corte e produção total de matéria seca (g). 1º corte 2º corte 3º corte MS total Lamas (L) L60 t ha-1 L30 t ha-1 L0 t ha-1 Significância Modalidades 4,03 b 4,81ab 5,23a ** 16,83 16,48 16,14 ns 8,49 8,66 9,00 ns 29,36 29,94 30,38 ns Água (A) Residual Rede Significância 4,61 4,78 ns 17,75a 15,22 b *** 11,75a 5,68 b *** 34,11a 25,68 b *** Cloragem (C) Desinfectada Não desinfectada significância 4,55 4,83 ns 15,38 b 17,58a ** 7,94 b 9,49a ** 27,88 31,91 *** interacções/signif. L×A L×C A×C L×A×C ns ns ns ns ns ns * ns ** ns *** ns * ns *** ns Nota: ns – P>0,05; * P 0,05; ** P 0,01; *** P 0.001; valores seguidos da mesma letra não diferem significativamente entre si pelo teste de LSD de comparação de médias. Em relação à evolução da matéria seca ao longo do ensaio, pode observar-se, pela mesma tabela, que, no primeiro corte, houve uma redução significativa da produção provocada pela aplicação ao solo de níveis crescentes de 42 PASTAGENS E FORRAGENS 19 lamas. Este resultado poder-se-á atribuir à elevada razão C/N que estas lamas apresentam, a qual poderá ser responsável por um abaixamento na disponibilidade em azoto para as plantas. As modalidades regadas com água residual apresentam acréscimos de produção altamente significativos no segundo e terceiro cortes, facto que se atribui aos elementos nutritivos fornecidos à cultura. No segundo e terceiro cortes as modalidades onde se efectuou desinfecção apresentam produções de matéria (MS) seca significativamente mais baixas. 3.2 – Composição mineral da forragem 3.2.1 – Azoto Através da tabela 5, observa-se que as plantas das modalidades regadas com água residual apresentam teores em azoto significativamente superiores, nos três cortes, comparativamente às modalidades regadas com água da rede. Tal resultado seria já esperado, uma vez que as águas residuais são ricas neste elemento. TABELA 5 – Teores médios de azoto Kjeldhal (%), fósforo (%) e potássio (%) obtidos na análise de plantas, em cada corte. Azoto Kjeldhal Fósforo Modalidades 1ºcorte 2ºcorte 3ºcorte 1ºcorte Lamas (L) L60 t ha-1 L30 t ha-1 L0 t ha-1 Significância 2,43 2,34 2,51 ns 1,51ab 1,46 b 1,57a * 1,05a 0,99ab 0,90 b * 0,218 0,266 0,253 ns Água (A) Residual Rede Significância 2,55a 2,31 b ** 1,75a 1,28 b *** Cloragem (C) Desinfectada 2,48 Não desinfectada 2,38 Significância ns Interacções/signif. L×A ns L×C ns A×C ns L×A×C ns Potássio 2ºcorte 3ºcorte 1ºcorte 2ºcorte 3ºcorte 0,230 b 0,197 c 0,273a *** 0,269ab 0,272a 0,259 b * 2,85 b 2,92 b 3,42a *** 2,63a 2,32 b 2,37 b *** 2,01 b 2,26a 1,98 b *** 1,08a 0,88 b *** 0,281a 0,262a 0,294a 3,16a 0,210 b 0,204 b 0,239 b 2,97 b * *** *** *** 2,34 b 2,54a *** 2,03 b 2,14a * 1,55a 1,48 b * 1,01 0,95 ns 0,251 0,240 ns 0,234 0,231 ns 0,262 b 2,98 b 0,271a 3,14a * *** 2,37 b 2,51a *** 2,01 b 2.16a ** ns ns * ns ns ns ns ns ns ns ns ns ns ns * ns ns ns *** ns *** ns *** ns ns ns *** ns ns ** ns * Nota: ns – P>0,05; * P 0,05; ** P 0,01; *** P 0,001; valores seguidos da mesma letra não diferem significativamente entre si pelo teste de LSD de comparação de médias. PASTAGENS E FORRAGENS 19 43 Relativamente ao efeito das lamas celulósicas, pode-se verificar, na tabela 5, que se observaram diferenças no segundo e terceiro cortes, verificando-se uma tendência para um aumento do teor em azoto das plantas, com a aplicação de níveis crescentes do resíduo. Ainda de acordo com a mesma tabela, pode-se constatar que, em relação ao terceiro corte, se está a obter um teor de azoto menos elevado nas modalidades onde a produção foi maior, facto que poderá dever-se a uma certa diluição do elemento em causa. Por outro lado, e como justificação do aumento do teor de azoto com o aumento do nível de lamas aplicado, nesta altura do ciclo das plantas não se poderá excluir, de todo, a possibilidade de ter já ocorrido alguma mineralização da matéria orgânica das lamas. 3.2.2 – Fósforo Considerando ainda a tabela 5, observa-se que as plantas das modalidades regadas com água residual apresentam teores em fósforo significativamente superiores, nos três cortes, comparativamente às modalidades regadas com água da rede. Tal resultado era já esperado, atendendo à composição da água residual. Os resultados apresentados (produção e teor em fósforo das plantas) mostram que a absorção de P pelas plantas diminui com o aumento do nível de lamas aplicado, sobretudo nos primeiros cortes, o que poderá ser devido à elevada razão C/P inicial deste resíduo. 3.2.3 – Potássio Verificou-se, no primeiro corte, que nas modalidades em que se incorporaram lamas as plantas apresentaram teores mais baixos de potássio, provavelmente por nesta fase ter ocorrido algum antagonismo cálcio/potássio, consequência da maior riqueza das lamas no primeiro nutriente, o que terá originado uma menor absorção de potássio. No segundo e terceiro cortes, as modalidades regadas com água residual apresentaram, igualmente, teores significativamente mais baixos. Admite-se que este facto se deva, fundamentalmente, ao efeito cumulativo do sódio no solo e, consequentemente, à sua absorção preferencial pelas plantas em relação ao elemento em causa, facto que também justificará os resultados apresentados relativamente à cloragem. 3.2.4 – Cálcio Através da tabela 6 verifica-se que as plantas das modalidades onde se incorporaram lamas apresentam teores significativamente superiores de cálcio, relativamente às plantas das modalidades onde não se incorporou esse resí- 44 PASTAGENS E FORRAGENS 19 duo, facto que certamente estará relacionado com a sua composição. Na verdade, verifica-se que, nos três cortes, as modalidades L60 e L30, apresentaram teores em cálcio superiores à L0. Destinando-se a cultura em estudo à alimentação animal e, proporcionando a incorporação de lamas celulósicas no solo um aumento do teor de cálcio nas plantas, poder-se-á considerar estar perante um resíduo susceptível de contribuir, de forma eficaz, para evitar o aparecimento da doença designada por hipocalcemia. TABELA 6 – Teores médios de cálcio (%), magnésio (%) e sódio (mg kg-1) obtidos na análise de plantas, em cada corte. Cálcio Modalidades 1ºcorte 2ºcorte 3ºcorte 1ºcorte Magnésio Sódio 2ºcorte 3ºcorte 1ºcorte 2ºcorte 3ºcorte Lamas (L) L60 t ha -1 L30 t ha-1 L0 t ha-1 significância 0,77a 0,72a 0,50 b *** 0,56a 0,53 b 0,45 c *** Água (A) Residual Rede significância 0,67 0,67 n.s. 0,48 b 0,53 b 0,25a 0,30a 0,55a 0,76a 0,23 b 0,25 b *** *** *** *** 0,26a 236,74a 1 896,81a 5 054,63a 0,25 b 56,30 b 38,60 b 52,05 b ** *** *** *** Cloragem (C) Desinfectada 0,67 Não desinfectada 0,67 significância ns 0,53a 0,49 b *** 0,65 0,64 ns 0,23 b 0,25a *** 0,27 0,28 ns 0,25 b 188,14a 1 458,46a 3 971,68a 0,26a 104,89 b 476,94 b 1 134,99 b * *** *** ** interacções/signif. L×A L×C A×C L×A×C ns ns ns ns ns ns ** ns ** * ns * ** ns ** * *** ns *** ns ns ns ns * 0,74a 0,64 b 0,56 c *** 0,25a 0,28 b 0,24a 0,30a 0,23 b 0,25 c *** *** 0,25 b 181,45a 716,44 b 2 835,53a 0,26a 133,63 b 890,94 b 2 115,44 b 0,25 b 124,48 b 1 295,73a 2 709,04a ** *** *** ** ns ** *** *** *** * *** * *** ** *** ** Nota: ns – P>0,05; * P 0,05; ** P 0,01; *** P 0,001; valores seguidos da mesma letra não diferem significativamente entre si pelo teste de LSD de comparação de médias. As modalidades regadas com água residual apresentaram, no segundo e terceiros cortes, teores de cálcio significativamente inferiores relativamente às modalidades regadas com água da rede, provavelmente devido à absorção preferencial de sódio, em detrimento de cálcio, por parte das plantas. PASTAGENS E FORRAGENS 19 45 3.2.5 – Magnésio A incorporação de lamas, no primeiro corte, teve um efeito positivo na absorção de magnésio. Já em relação ao segundo e terceiro cortes, observou-se que tal efeito se foi esbatendo, devido, provavelmente, à maior disponibilidade de cálcio que as lamas terão proporcionado. Verifica-se, também, que as plantas das modalidades regadas com água residual apresentaram teores de magnésio significativamente superiores, possivelmente devido à composição destas águas. O teor em magnésio da forragem assume particular interesse devido às necessidades que os animais têm neste elemento, podendo em situações de carência ocasionar a doença conhecida como "tetania dos pastos". Os teores apresentados pela forragem não serão susceptíveis de ocasionar essa carência nos animais. 3.2.6 – Sódio A rega com água residual conduziu a um aumento do teor em sódio nas plantas, em todos os cortes. Visto as águas residuais serem ricas neste nutriente e, sendo a planta ensaiada uma gramínea, a qual tenderá, preferencialmente, a absorver iões monovalentes, como o sódio, tal resultado não será de surpreender. Verifica-se ainda, através dos resultados apresentados na tabela 6, que as modalidades em que se efectuou cloragem apresentaram, nos três cortes, teores de sódio significativamente superiores às modalidades em que não se efectuou tal tratamento. Admite-se que este aumento se deve à composição do desinfectante utilizado (hipoclorito de sódio, NaClO). 3.2.7 – Ferro Pode observar-se na tabela 7 que tanto as lamas celulósicas como as águas residuais contribuiram, no primeiro e segundo cortes, para um aumento do teor de ferro na planta, tendo acontecido o inverso no terceiro corte. Em relação à cloragem, parece que a desinfecção tende a elevar os níveis de ferro na planta, à medida que se vão sucedendo os diversos cortes. 3.2.8 – Cobre Em relação ao teor de cobre na planta, verificou-se uma tendência para a sua diminuição ao longo do ensaio, devendo-se tal facto, provavelmente, à ocorrência da formação de quelatos altamente estáveis com subs- 46 PASTAGENS E FORRAGENS 19 tâncias húmicas, que terão resultado da humificação das lamas celulósicas que possa ter já ocorrido até essa fase do ensaio. A cloragem foi responsável por diferenças significativas no segundo e terceiro cortes, tendo o acréscimo do teor em cobre na planta sido favorecido pela utilização de água desinfectada. TABELA 7 – Teores médios de ferro (mg kg-1), cobre (mg kg-1) e zinco (%) obtidos na análise de plantas, em cada corte. Modalidades 1ºcorte Ferro Cobre Zinco 2ºcorte 3ºcorte 1ºcorte 2ºcorte 3ºcorte 1ºcorte 2ºcorte 3ºcorte Lamas (L) L60 t ha-1 110,43a 123,51a L30 t ha-1 108,79a 104,98 b 84,54 b 1,99 b L0 t ha-1 significância 74,56 c 2,89a 1,61ab 1,30 b 38,05 b 31,92a 30,58 b 1,70a 1,40 b 41,17 b 30,03 b 37,44a 32,40a 29,90 b 91,14 b 109,66 b 110,19a 1,22 c 1,49 b 2,37a 58,71a *** *** *** ns *** *** 107,23a 122,37a 1,97a 1,79 49,60a 34,92a 35,03a *** * *** Água (A) Residual Rede significância 74,74 b 1,82 b 99,67 b 103,06 b 104,79a 2,25a 1,23 b 1,58 42,35 b 27,98 b 30,25 b *** *** *** *** *** ns *** *** *** 102,42 118,61a 99,16a 1,95 1,72a 1,97a 49,88a 1,48 b 1,41 b 42,08 b ** ** Cloragem (C) Desinfectada Não desinfectada 104,49 Significância 106,82 b 80,37 b 2,12 ns *** 31,52 32,00 31,38 33,27 ns ns ns *** *** L×A * *** *** ** * ns ns * *** L×C *** ns * *** *** ** ns ns ns A×C ns ** ns * ns ns *** ns ns L×A×C ns *** ** ** *** * ** ** ns Interacções/signif. Nota: ns – P>0,05; * P 0,05; ** P 0,01; *** P 0.001; valores seguidos da mesma letra não diferem significativamente entre si pelo teste de LSD de comparação de médias. 3.2.9 – Zinco Com a utilização de água residual, verificou-se que as plantas apresentaram teores de zinco significativamente superiores, nos três cortes, relativamente às modalidades regadas com água da rede. Pensa-se que este resultado se deve à composição da água residual, uma vez que, dentro dos microelementos analisados, o zinco é mais representativo. PASTAGENS E FORRAGENS 19 47 3.2.10 – Cloretos Através da tabela 8, pode observar-se que não se verificaram diferenças significativas no teor de cloretos nas plantas, devido à utilização de lamas celulósicas. A rega com água residual conduziu a um aumento, altamente significativo, do teor em cloretos nas plantas, em todos os cortes, relativamente às modalidades regadas com água da rede, resultado que poderá ser atribuído à sua composição. Como já foi referido, a desinfecção da água residual foi efectuada com hipoclorito de sódio, tendo-se, por isso, nas modalidades em que se considerou este tratamento, incorporado maior nível de cloretos. Deste modo, não será de estranhar ter-se verificado que a cloragem tenha provocado, no segundo e terceiro cortes, a obtenção de cloretos nas plantas correspondentes às modalidades em que não se considerou tal tratamento. TABELA 8 – Teores médios de cloretos (mg 100g-1) obtidos na análise de plantas, em cada corte. Modalidades 1ºcorte 2ºcorte 3ºcorte Lamas (L) L60 tha-1 L30 tha-1 L0 tha-1 significância 176,55 171,70 175,73 ns 323,29 309,68 305,18 ns 150,17 140,34 147,92 ns Água (A) Residual Rede Significância 194,86a 154,46 b *** 405,49a 219,94 b *** 189,96a 102,32 b *** Cloragem (C) Desinfectada Não desinfectada Significância 167,88 b 181,44a * 347,90a 277,53 b *** 181,92a 110,37 b *** interacções/signif. L×A L×C A×C L×A×C ns ns ns ns ns ns ** ns ns ** *** ns Nota: ns – P>0,05; * P 0,05; ** P 0.01; *** P 0,001; valores seguidos da mesma letra não diferem significativamente entre si pelo teste de LSD de comparação de médias. 48 PASTAGENS E FORRAGENS 19 4 – CONCLUSÕES Verificou-se que a água residual conduziu a aumentos significativos da produção, enquanto que a aplicação de lamas, para qualquer nível ensaiado, não originou diferenças significativas. Relativamente à cloragem, observou-se um efeito depressivo que, provavelmente, se terá ficado a dever ao aumento de absorção de sódio e cloretos, em detrimento de outros nutrientes. Parece, no entanto, que a cloragem tende a favorecer a absorção de ferro, cobre e zinco. A aplicação destes resíduos melhorou o valor nutritivo das plantas: – as águas residuais aumentaram os teores em azoto, fósforo, magnésio, sódio, zinco e cloretos; – as lamas celulósicas aumentaram os teores em cálcio e, em alguns cortes, os teores de ferro, cobre e zinco, sem que estes micronutrientes apresentassem teores restritivos para a alimentação animal. BIBLIOGRAFIA 1 – CAMPOS, S. T. – Utilização Conjunta de Lamas Celulósicas e Águas Residuais Urbanas na Cultura do Sorgo (Sorghum vulgare var. sudanense piper Hitsh). Relatório do Trabalho de Fim de Curso em Engenharia de Produção Agrícola. Castelo Branco, Escola Superior Agrária, 1998. 2 – CARNEIRO, J. P. B. – Interesse Fertilizante da Aplicação Simultânea de Lamas Celulósicas e Estrume de Aviário. Tese de Mestrado em Nutrição Vegetal, Fertilidade do Solo e Fertilização. Lisboa, Instituto Superior de Agronomia, 1994. 3 – DIN 38 414, Deutch, Norm part 7, 1983 – Standard methods for the examination of water, wastewater, sludge and sediments (Group 5). Digestion using Aqua Regia for subsequent determination of the acid-soluble portion of metals. 4 – MONTEIRO, M. C. Horta – Utilização de Água Residual Urbana na Cultura de Azevém (Lolium multiflorum Lam.). Tese de Mestrado em Nutrição Vegetal, Fertilidade do Solo e Fertilização. Lisboa, Instituro Superior Agronomia, 1994. 5 – Portaria n.º 176/96 – D.R., II Série, n.º 230 (96-10-03). 6 – Portaria n.º 177/96 – D.R., II Série, n.º 230 (96-10-03). 7 – WORLD HEALTH ORGANISATION – Health guidelines for the use of wastewater in agriculture and aquaculture. Geneve, Switzerland, WHO, 1989. (Report of WHO Scientific Group, World Techni 778). PASTAGENS E FORRAGENS 19 49 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 51–60. O MELHORAMENTO DAS PASTAGENS DE MONTANHA Nuno Moreira Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro – Apartado 202 – 5001-911 VILA REAL RESUMO Em face da importância das pastagens de montanha na agricultura das regiões de Trás-os-Montes e Beira Interior começa-se por referir um conjunto de ensaios e estudos de melhoramento destas pastagens realizados e publicados no País ao longo das últimas décadas. Em seguida, apresentam-se exemplos de resultados de ensaios de longa duração em pastagens de montanha, conduzidos no Reino Unido, nos quais foi testado o efeito de diferentes combinações e intensidades técnicas de melhoramento, sublinhando-se a possibilidade de adoptar diferentes estratégias. Em face da importância actual das relações agricultura/ambiente, refere-se o elevado valor ambiental e paisagístico das pastagens de montanha, e revê-se criticamente as técnicas de melhoramento com efeitos ambientais mais desvaforáveis. Finalmente, analisa-se o apoio concedido entre nós no âmbito das medidas agro-ambientais, em comparação com as ajudas concedidas no Reino Unido a este tipo de pastagens nas zonas ambientalmente sensíveis, concluindo-se pela necessidade de reforço do apoio à preservação dos nossos lameiros de montanha. PALAVRAS-CHAVES: Lameiros; Pastagens de montanha; Melhoramento de pastagens; Maneio de pastagens; Protecção do ambiente. ABSTRACT Hill pastures are an important resource for farmland activities in North and Central East of Portugal. This paper begins with a brief literature review of the experiments and studies conducted in recent decades in Portugal on the hill pasture improvement. Results of long-term effects of improvement methods on hill pastures, namely in Scotland and Wales, are presented to show the different possibilities of intensification and the need for a strategy. * Conferência proferida na XIX Reunião de Primavera da SPPF. Castelo Branco, Abril de 1998. 51 Considering the present importance of taking into account nature conservation in farming activities, and the high ecological and landscape value of seminatural hill meadows, an appreciation of environmental risks of the different improvement techniques is then provided. Finally an analysis of the agri-environmental regulations and incentives for hill grasslands in Portugal is undertaken, and a comparison with the environmentally sensitive area schemes and incentives for grassland management in the UK. The paper concludes by stressing the need both to increase the level of incentive, while applying further and more-demanding guidelines for grassland mangement and nature conservation, initiatives that will be essential for hill meadows preservation in Portugal. KEY WORDS: Hill pastures; Hay meadows; Pasture improvement; Grassland management; Nature conservation. 1 – INTRODUÇÃO As pastagens de montanha, entre nós designadas também por lameiros de montanha (26), constituem comunidades vegetais predominantemente herbáceas, com uma pressão de cultivo e utilização (pastoreio ou corte + pastoreio) que as condiciona, para além das condições ambientais a que estão sujeitas. Estas pastagens constituem o principal recurso forrageiro para a pecuária das zonas de montanha de Trás-os-Montes (20) e têm também grande importância na região da Beira Interior, em especial no maciço da Serra da Estrela, a par das áreas baldias ou incultas, em que a vegetação arbustiva tem uma maior representação, e de pequenas áreas das explorações dedicadas a culturas forrageiras anuais, em especial na estação fria (nomeadamente ferrejos e azevéns). No seu estudo geográfico sobre Trás-os-Montes Virgílio Taborda escreveu que "não é por mero acaso que os lameiros ocupam quase sempre os solos mais férteis e são de todas as terras as mais estimadas e as de maior preço", o que atesta bem a importância, de há muitos anos predominante, deste recurso para a agricultura das áreas de montanha. O facto de constituirem a base de suporte da alimentação de raças autóctones de bovinos, como a Barrosã, a Maronesa e a Mirandesa, assim como a sua contribuição para o sistema de produção do "queijo da Serra", confere-lhes também um papel importante hoje em dia na preservação desta diversidade e especificidade de produções animais. O melhoramento destas pastagens tem sido uma preocupação de diferentes regiões de montanha da Europa ao longo de algumas décadas, nomeadamente na Suíça ( 4) e na Escócia (18), e também entre nós. 52 PASTAGENS E FORRAGENS 19 2 – ESTUDO DO MELHORAMENTO DAS PASTAGENS DE MONTANHA EM PORTUGAL Entre nós, na década que se seguiu ao fim da II Guerra Mundial, as pastagens de altitude da Serra da Estrela mereceram especial atenção e estudo, a começar pelas excursões geobotânicas de Braun-Blanquet e colaboradores portugueses (3) no final dos anos quarenta, os quais se referem às "magras pastagens de gramíneas". Em 1955, Malato Beliz aborda a fitossociologia e o melhoramento das pastagens de cervum nos "covões, naves e corrais da Serra" e sugere um plano de estudo envolvendo o inventário, o maneio, a aplicação de adubos e correctivos, o ensaio de adaptação de espécies melhoradas (dos géneros Lotus, Trifolium, Agrostis, Festuca e Poa) e as análises económicas destas técnicas e dos seus resultados (2). Pereira publicou, em 1957 ( 19), resultados pormenorizados sobre a evolução da composição ao longo do ciclo de crescimento das pastagens de cervum da Serra da Estrela, a 1500 m de altitude, concluindo nomeadamente a sua baixa produtividade, a dominância em mais de 90% pelo Nardus stricta e a elevada quebra do valor nutritivo com o avançar da estação de crescimento, em particular do valor proteico. Na década de sessenta, Dantas Barreto conduziu ensaios de fertilização NPK e Ca em pastagens semeadas na Serra de Arga (Minho – 770 m de altitude), obtendo respostas muito acentuadas, sobretudo do fósforo, elemento do qual o solo de ensaio apenas apresentava vestígios ( 1). Nesta mesma década, Teles conduziu o seu valioso trabalho de caracterização fitossociológica e química dos lameiros de Trás-os-Montes (26) onde, além da cuidada caracterização e classificação fitossociológica destas pastagens, sugere a possibilidade do seu melhoramento, em particular através da fertilização dos que apresentam uma melhor composição, da ressementeira no caso dos que são dominados por espécies de reduzido valor forrageiro e através da drenagem dos que, pelo excesso de água, sofrem grande invasão de juncos. Na década de oitenta voltam a ser publicados resultados de ensaios de fertilização, conduzidos por Mascarenhas Ferreira e colaboradores (8), em que a fertilização NPK e Ca permitiu aumentar substancialmente as produções do corte de feno (em cerca de 50%), embora com reduzidos efeitos no valor nutritivo. Ainda nesta década, ensaios conduzidos por Raposo e colaboradores (22, 23 ) permitiram obter respostas significativas da produção à aplicação de fósforo e azoto, o mesmo não se verificando com a correcção calcária. Esta, PASTAGENS E FORRAGENS 19 53 porém, permitiu uma dinâmica de vegetação favorável às leguminosas, as quais são, por outro lado, prejudicadas pela acentuada resposta das gramíneas à adubação azotada e mesmo à adubação fosfospotássica, quando os solos apresentam valores baixos destes elementos (21). Mais recentemente, foi reconhecido o elevado valor e diversidade biológica da flora destes lameiros de montanha (12). De referir ainda a publicação de duas análises e revisões sobre este tema, uma dirigida às técnicas e estratégias de melhoramento das pastagens de montanha (17) e outra sobre a importância actual e as perspectivas futuras dos lameiros, justificando a necessidade da sua preservação ( 20). 3 – TÉCNICAS DE MELHORAMENTO DAS PASTAGENS DE MONTANHA O melhoramento das pastagens de montanha deve adaptar-se a uma estratégia global para a exploração agrícola ou para a região em causa (17). É possível adoptar toda uma gama de técnicas ou suas combinações, com diferentes graus de intensidade, custos e resultados, como pôde ser observado com ovinos em ensaios de longa duração conduzidos no País de Gales e na Escócia (quadros 1, 2 e 3). QUADRO 1 – Resultados de diferentes técnicas de melhoramento em ensaio de longa duração (18 anos) numa pastagem de montanha no País de Gales [adaptado de (7)]. Tratamento em ensaio Produção média (kg MS ha-1ano-1) Digestibilidade média anual "D" in vitro (%) 1 – Não utilização 1,1(1) 36,9(1) 2 – Pastoreio controlado 2,3 51,9 3 – 2 + 2,5 t/ha de fosfato Tomás cada 5 anos 2,8 58,2 4 – 3 + 5 t/ha de calcário 3,3 60,7 5 – 4 + alta pressão pastoreio 2,1 63,5 6 – 4 + 75 kg N/ha/ano 4,5 63,9 7 – 4 + 290 kg N/ha/ano 6,3 67,1 8 – 6 + corte vegetação + sementeira 5,5 70,5 9 – 6 + paraquato + sementeira 5,3 70,1 10 – 6 + lavoura + sementeira azevém perene S23 6,2 68,1 11 – 7 + lavoura + sementeira azevém perene S23 9,0 71,3 (1) 54 Produção só do 1.º ano de ensaio. PASTAGENS E FORRAGENS 19 QUADRO 2 – Resultados de diferentes técnicas de melhoramento em ensaio de longa duração (médias de 15 anos em 3 locais) em pastagens de montanha na Escócia [adaptado de (5 e 6)]. Produção kg MS ha-1 N.º de dias de pastoreio(1) Ganhos de peso vivo (g ov-1 d-1) 1 – Pastoreio controlado 3 860 2 250 - 18 2 – 1 + calagem 4 160 2530 26 3 – 2 + fosfato 4 220 2 530 21 4 – 3 + sobressementeira de trevo branco 4 590 3 030 61 5 – 4 + sobressementeira de azevém perene 5 170 3 640 82 Tratamentos em ensaio (1) Número de dias de pastoreio ovelha/ha/ano. QUADRO 3 – Evolução dos efeitos a longo prazo (2º e 13º anos de ensaio) na produção animal de diferentes técnicas de melhoramento de pastagens de montanha na Escócia [adaptado de (6)]. Parâmetros Tratamentos Anos 1 Ingestão MO (g ov-1dia-1) 2 3 4 5 2º 13º 1 400 1 300 1 380 1 610 1 320 1 610 1 410 1 590 1 460 1 490 Digestibilidade MO (%) 2º 13º 66 62 66 63 65 64 67 67 69 70 Ganhos peso (g ov-1dia-1) 2º 13º 56 -70 52 3 76 13 128 46 139 46 Nº de dias de pastoreio (ov ha-1) 2º 13º 2 120 1 830 2 330 2 300 2 160 2 330 2 480 3 260 3 010 3 780 Tratamentos: 1 – pastoreio controlado; 2 – 1 + calagem; 3 – 2 + P; 4 – 3 + trevo; 5 – 4 + azevém. A primeira etapa, comum a todas as estratégias, é assegurar uma mais eficiente utilização da produção, pois de outra forma de nada servem as restantes técnicas, já que a insuficiente utilização da erva que cresce conduz inevitavelmente a um ciclo de degradação (figura 1). Esta garantia de uma utilização eficiente e equilibrada da erva que cresce pode ser assegurada pelo manejo do pastoreio com cercas, muros ou sebes e pela alternância do corte e pastoreio (16), tal como se verifica nos tradicionais lameiros de feno de Trás-os-Montes (20). PASTAGENS E FORRAGENS 19 55 Consumo insuficiente da vegetação (subpastoreio) Menor valor alimentar da pastagem Menor produção animal Menor produção de erva (< fotossíntese) Acumulação de material vegetal morto Menor reciclagem de nutrientes FIGURA 1 – Esquema do ciclo de degradação da pastagem devido a insuficiente utilização (subpastoreio). 4 – PASTAGENS DE MONTANHA E OS NOVOS DESAFIOS – PROTECÇÃO DO AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE SOCIOECONÓMICA Hoje em dia já não é possível encarar o melhoramento das pastagens de montanha apenas numa perspectiva agro-pecuária e do exclusivo interesse da exploração. Há que ter em conta as crescentes preocupações de preservação do ambiente e as novas medidas de política agrícola, nomeadamente as restrições e/ou ajudas relativamente à protecção do ambiente. No caso das pastagens de montanha tem particular importância, do ponto de vista ambiental, a sua diversidade biológica, quer em termos da sua flora (12), quer em termos de habitat para diferentes espécies de invertebrados, pássaros e pequenos mamíferos (13). Há técnicas de melhoramento que são consideradas como tendo efeitos negativos apreciáveis, do ponto de vista ambiental, sem que os seus resultados, do ponto de vista da produção, sejam substanciais. Wilkins e Harvey (27) consideram nessa situação a aplicação de herbicidas e pesticidas, a drenagem e a ressementeira. Estas últimas têm perdido adeptos na medida em 56 PASTAGENS E FORRAGENS 19 que ensaios recentes de fertilização têm permitido obter muito boas respostas de produção de pastagens de vegetação espontânea muito diversa e em condições de solos com deficiente drenagem ( 10, 11). O mesmo defenderam Pires e colaboradores na sua análise sobre as perspectivas dos lameiros de Trás-os-Montes (20). Efeitos negativos sensíveis na diversidade biológica são também atribuídos à antecipação ou adiamento sensível das datas de corte do feno ( 9, 24) e à supressão do pastoreio em alternância com o corte (24, 25 ). A fertilização, que pode ter efeitos negativos a partir de valores moderados (p. ex. 80N, 40P, 40K) (25), é, porém, uma técnica indispensável à obtenção de boas produções (28 ), pelo que Wilkins e Harvey (27) defendem como melhor solução a existência em cada região de uma diversidade de situações em que algumas pastagens são sujeitas a maior intensificação, enquanto que outras, beneficiando de maiores apoios para isso, obedecerão a regras de maneio mais restritivas e extensivas. Está neste caso o esquema de apoio estabelecido no Reino Unido para agricultores das zonas delimitadas como ambientalmente sensíveis (ESA's), cujas principais regras de gestão (28) são as seguintes: – levantar o gado pelo menos 7 semanas antes do corte de feno; – não fazer o corte de feno (ou silagem) antes de 8 de Julho e fazê-lo pelo menos uma vez de 5 em 5 anos já em Agosto; – o recrescimento deve ser pastoreado; – se o corte for para ensilagem deve ser pré-fenado; – a fertilização (em uma só aplicação, orgânica ou mineral) não deve exceder 25 N, 12,5 P2O5 e 12,5 K2O ha-1 ano-1; – não aplicar chorume ou estrumes de aviário; – não usar insecticidas ou fungicidas; – só é permitido usar herbicidas para controlo de algumas infestantes como por exemplo os fetos (uso localizado); – não aplicar calcário ou outros correctivos da acidez; – não sobrepastorear, subpastorear ou fazer pastoreio em condições de atascamento; – não instalar novas drenagens. Trata-se de um conjunto de restrições apreciáveis, recompensado pela atribuição de um prémio de 140 libras inglesas por hectare. PASTAGENS E FORRAGENS 19 57 Entre nós, as medidas agro-ambientais estabelecem ajudas para os lameiros, que se comparam desfavoravelmente com os montantes atribuídos a outros sistemas forrageiros ou policulturais extensivos de menor valor ambiental e paisagístico (14, 15). Particular gravidade tem, quanto a nós, o facto de os prémios de perda de rendimento atribuídos às superfícies agrícolas florestadas terem valores substancialmente mais elevados, o que tem conduzido à destruição de lameiros tradicionais com vista à sua florestação, em particular no Planalto de Miranda. Crê-se que, a exemplo do que sucede no Reino Unido, se poderia estabelecer uma classe de compromissos mais exigentes quanto à gestão destas pastagens, atribuindo-lhes para o efeito uma ajuda mais elevada que recompensasse a sua preservação e assegurasse os seus efeitos ambientais e paisagísticos. Para além destes riscos de florestação, o abandono destas pastagens pelos agricultores, transformando-as em incultos, conduz a uma rápida invasão pela vegetação arbustiva, com riscos acrescidos de ocorrência e propagação de fogos e com um rápido declínio do seu valor para a fauna e diminuição da diversidade florística (27). Este risco de abandono é crescente com a tendência de despovoamento das regiões de montanha, pelo que as medidas de apoio agroambiental se deverão conjugar com medidas de desenvolvimento rural que tenham em conta a sustentabilidade socioeconómica destes sistemas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 – BARRETO, R. R. Dantas – Primeiros Resultados de Ensaios de Fertilização Mineral de Fundo em Pastagens Artificiais de Montanha. "Revista Agronómica", 51 (1/2) 1968, p. 163-177. 2 – BELIZ, J. Malato – As Pastagens de servum (Nardus stricta L.) da Serra da Estrela – Fitossociologia e Melhoramento. "Melhoramento", vol. 8, 1955, p. 23-59. 3 – BRAUN-BLANQUET, J. et al. – Résultats de deux excursions géobotaniques a travers le Portugal septentrional et moyen. I – Une incursion dans la Serra da Estrela. "Agronomia Lusitana", 14 (4) 1952, p. 303-323. 4 – CAPUTA, J. – Les herbages de montagne et la nécessité de leur amélioration. "Fourrages", vol. 13, 1963, p. 5-22. 5 – COMMON, T. G. et al. – The long-term effects of a range of pasture treatments applied to three semi-natural hill grassland communities. I – Pasture production and botanical composition. "Grass and Forage Science", vol. 46, 1991, p. 239-251. 6 – COMMON, T G. et al. – The long-term effects of a range of pasture treatments applied to three semi-natural hill grassland communities. 2 – Animal performance. "Grass and Forage Science", vol. 46, 1991, p. 253-263. 58 PASTAGENS E FORRAGENS 19 7– DAVIES, D. A. – Long-term effects of improvement methods on Molinia caerulea dominant rough grazing on wet land. 1 – Pasture production, quality and botanical composition. "J. agric. Sci.", Camb., vol. 109, 1987, p. 231-241. 8 – FERREIRA, A. M. et al. – Os Fenos no Nordeste de Portugal. Valor Energético e Azotado. "Pastagens e Forragens", vol. 2, 1981, p. 67-77. 9 – KIRKHAM, F. W.; TALLOWIN, J. R. – The influence of cutting date and previous fertilizer treatment on the productivity and botanical composition of species-rich hay meadows on the Somerset Levels. "Grass and Forage Science", vol. 50, 1995, p. 365-377. 10 – KIRKHAM, F. W.; WILKINS, R. J. – The productivity and response to inorganic fertilizers of species-rich wetland hay meadows on the Somerset Moors: the effect of nitrogen, phosphorus and potassium on herbage production. "Grass and Forage Science", vol. 49, 1994, p. 163-175. 11 – KIRKHAM, F. W.; WILKINS, R. J. – The productivity and response to inorganic fertilizers of species-rich wetland hay meadows on the Somerset Moors: nitrogen response under hay cutting and aftermath grazing. "Grass and Forage Science", vol. 49, 1994, p. 152-162. 12 – MARTINS, V. P.; SEQUEIRA, M. M. – Os Lameiros de Montanha de Lamas de Olo. Contribuição para a Caracterização da Sua Utilização, Composição Florística e Ecológica. "Pastagens e Forragens", vol. 17, 1996, p. 49-59. 13 – MILNE, J. A. – Grassland management and biodiversity. In: "SHELDRICK, R. D. (ed.) – Grassland management in environmentally sensitive areas". [Reading], British Grassland Societey (BGS), 1997. (Occasional Symposium n.º 32), p. 25-32. 14 – MINISTÉRIO DA AGRICULTURA – Medidas Agro-Ambientais. Lisboa, Instituto de Estruturas Agrárias e Desenvolvimento Rural, [1994]. 15 – MINISTÉRIO DA AGRICULTURA DO DESENVOLVIMENTO RURAL E DAS PESCAS – Medidas Agro-Ambientais. Novo Programa de Aplicação em Portugal Continental – Épocas de 1998 e 1999. Lisboa, Direcção-Geral de Desenvolvimento Rural, 1998. 16 – MOREIRA, N. – Pastoreio. Interacções Animal-Pastagem e Seus Reflexos no Maneio e na Produção. Vila Real, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, 1995. (Série Didáctica – Ciências Aplicadas, n.º 44). 17 – MOREIRA, N. T. – O Melhoramento das Pastagens de Montanha. Vila Real, Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, 1986. 18 – NEWBOLD, P. – The improvement of hill pastures for agriculture. A review. Part 1. "J. Br. Grassld. Soc.", vol. 29, 1974, p. 241-247. 19 – PEREIRA, A. – As Pastagens de Cervum da Serra da Estrela. Composição Química ao longo do Seu Ciclo Vegetativo. "Agronomia Lusitana", 19 (4) 1957, p. 307-328. 20 – PIRES, J. M.; PINTO, P. A.; MOREIRA, N. T. – Lameiros de Trás-os-Montes. Perspectivas de Futuro para Estas Pastagens de Montanha. Bragança, Instituto Politécnico, 1994. (Série Estudos n.º 29). PASTAGENS E FORRAGENS 19 59 21 – PIRES, J. M. et al. – Efeito da Fertilização na Composição Florística de Lameiros. "Pastagens e Forragens", 11 (2) 1990, p. 69-86. 22 – RAPOSO, J. A. et al. – Efeito da Fertilização na Produção de Lameiros. 1 – Região Planáltica de Bragança. "Pastagens e Forragens", 11 (2) 1990, p. 41-53. 23 – RAPOSO, J. A. et al. – Efeito da Fertilização na Produção de Lameiros. 2 – Região da Serra da Falperra. "Pastagens e Forragens", 11 (2) 1990, p. 55-67. 24 – SMITH, R. S. – Effects of fertilisers on plant species composition and conservation interest of UK grassland. In: "HAGGAR, R. J.; PEEL, S. (ed.) – Grassland management and nature conservation". [Reading], BGS, 1994. (Occasional Symposium n.º 28), p. 64-73. 25 – SMITH, R. S. et al. – The conservation management of mesotrophic (meadow) grassland in Northern England. 1 – Effects of grazing, cutting date and fertilizer on the vegetation of a traditionally managed sward. "Grass and Forage Science", vol. 51, 1996, p. 278-291. 26 – TELES, A. N. – Os Lameiros de Montanha do Norte de Portugal. Subsídios para a Sua Caracterização Fitossociológica e Química. "Agronomia Lusitana", 31 (1/2) 1970, p. 5-130. 27 – WILKINS, R. J.; HARVEY, H. J. – Management options to achieve agricultural and nature conservation objectives. In: "HAGGAR, R. J.; PEEL, S. (ed.) – Grassland Management and nature conservation". [Reading], BGS, 1994. (Occasional Symposium nº. 28), p. 86-94. 28 – YOUNGER, A.; SMITH, R. S. – Hay meadow management in the Pennine Dales, Northern England. In: "HAGGAR, R. J.; PEEL, S. (ed.) – Grassland management and nature conservation". [Reading], BGS, 1994. (Occasional Symposium n.º. 28), p. 137-143. 60 PASTAGENS E FORRAGENS 19 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 61–71. A UTILIZAÇÃO DE PASTAGENS E FORRAGENS E A CONSERVAÇÃO DO SOLO EXEMPLOS DA EROSÃO VERIFICADA NUM SOLO LITÓLICO NÃO HÚMICO DE XISTO MOSQUEADO NA REGIÃO DE CASTELO BRANCO* P. M. S. Lopes, J. N. P. Goulão♦, N. R. S. Cortez♣ Unidade Departamental de Engenharia Rural, ♦Unidade Departamental de Fitotecnia – Escola Superior Agrária de Castelo Branco – Apartado 19 – 6001 CASTELO BRANCO CODEX ♣ Departamento de Ciências do Ambiente – Instituto Superior de Agronomia – – Tapada da Ajuda – 1399 LISBOA CODEX RESUMO A erosão acelerada é um processo preocupante de degradação do solo, a nível nacional e mundial, sendo responsável pela desertificação de extensas áreas. Neste trabalho são apresentados os valores de escoamento e de perda de solo por erosão hídrica, na estação experimental de erosão da Escola Superior Agrária de Castelo Branco (ensaio em Solos Litólicos Não Húmicos de xistos mosqueados), ao longo dos anos hidrológicos 1991-1992 a 1996-1997. Este campo de ensaio é constituído por 18 talhões experimentais, com 6 modalidades e 3 repetições, em que se pretende comparar os efeitos de uma monocultura cerealífera com uma rotação predominantemente forrageira (trianual), ambas tradicionais na região, comparando-as ainda com um prado permanente de sequeiro e com uma modalidade de solo mantido permanentemente nu através de mobilizações realizadas segundo o maior declive. Tem-se vindo a verificar que nos talhões onde a vegetação é mais densa e permanente as perdas de solo são substancialmente menores que com outro tipo de modalidade de utilzação PALAVRAS-CHAVES: Erosão do solo; Escoamento; Perda de solo; Solos de xistos. ABSTRACT Accelerated soil erosion is a concerned soil degradation process, both at national and international level, which is responsible for the desertification of large areas. In this work are presented values of runoff and soil loss by water erosion in the experimental soil erosion field plots in the High School of Agriculture of Castelo * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF. Castelo Branco, Maio de 1998. 61 Branco (ESACB) (Portugal) – experimental field plots on soil schist – through the hydrological years from 1991-1992 to 1996-1997. This experimental field is composed by 18 experimental field plots, with 6 treatments and 3 repetitions, in which is intended to compare the effects of a cereal monoculture with a three years rotation (mainly forage crops), both traditional in the area. These treatment will be composed with a permanent grassland under rainfed conditions and a permanent bare soil, mobilized though the higher slope. It has been concluded that in permanent grassland plots soil losses are considerably lower than with any other kind of soil use. KEYWORDS: Soil erosion; Runoff; Soil loss; Schist soil. 1 – INTRODUÇÃO A erosão do solo consiste numa perda gradual do material que constitui o solo, através de um processo de destacamento e transporte de partículas (6, 7, 9). Os processos erosivos apresentam um impacto negativo que resulta numa degradação progressiva do solo. Trata-se normalmente de um processo relativamente lento, embora seja as mais das vezes acelerado pelo homem, mas recorrente, e irreversível a curto ou médio prazo (2, 7). Deste modo, é usual distinguir entre "erosão natural" ou "erosão geológica", a que resulta apenas da acção de factores naturais, e a "erosão acelerada" ou "erosão antrópica", que é a que resulta da actividade humana e cuja velocidade excede consideravelmente a capacidade de regeneração do solo através do processo de pedogénese (6). Nas regiões de clima mediterrânico, caracterizadas por um regime de pluviosidade irregularmente distribuída ao longo do ano e concentrada sobretudo durante o Inverno, são particularmente importantes e indissociáveis as preocupações de conservação quer do solo, quer da água (2). Foi, assim, objectivo deste trabalho comparar os escoamentos superficiais originados pela água da precipitação não infiltrada no solo, bem como os carrejos a eles associados (e as consequentes perdas de solo), para três sistemas agrícolas distintos: a monocultura cerealífera (aqui representada pela aveia), uma rotação forrageira (tremocilha-tremocilha-aveia) e um prado permanente de sequeiro. 2 – CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL DE ESTUDO O presente estudo foi desenvolvido no âmbito do projecto de "Estudo da Erosão Hídrica de Dois Solos na Região da Beira Baixa", o qual se desenrola na estação experimental para o estudo da erosão hídrica de solos, instalada na Quinta da Senhora de Mércules, na Escola Superior Agrária de Castelo Branco (ESACB). 62 PASTAGENS E FORRAGENS 19 Esta estação, em funcionamento desde 1990, é constituída por dois conjuntos de 18 talhões, localizados sobre Solos Litólicos Não Húmicos derivados, respectivamente, de granitos e de xistos mosqueados, e tem tido por objectivo a quantificação das perdas de solo por escoamento superficial, por forma a permitir obter valores atribuíveis aos parâmetros R, K, C e P do modelo USLE (Universal Soil Loss Equation) de previsão de perda de solo (12), que possibilitem a sua aplicação ao nosso País. O presente trabalho refere-se aos dados obtidos durante seis anos hidrológicos, de 1991-92 a 1996-97, nos 18 talhões instalados sobre o solo derivado de xistos. Este solo poderá ser caracterizado por possuir um perfil do tipo Ap-Bw-C, apresentando o solum* uma espessura média de 50 cm. A textura é franco-arenosa, em toda essa espessura, e a estrutura é anisoforme subangulosa, média e fina, fraca, condicionada certamente pelo reduzido teor de matéria orgânica (quadro 1), correspondendo, na sua maior parte, a solos pertencentes à série 54 (mancha 810) da Carta de Solos da Quinta da Senhora de Mércules (8). QUADRO 1 – Proporções de matéria orgânica, areia grossa, areia fina, limo e argila em amostras representativas de um dos solos da estação experimental de estudo de erosão da ESACB (Solo Litólico Não Húmico de xisto mosqueado). Horizonte Matéria orgânica Areia grossa Areia fina Limo Argila Ap Bw 1,72% 36,58% 39,90% 11,08% 12,76% 0,50% 36,59% 32,60% 15,63% 15,62% Segundo a Classificação Racional de Thornthwaite, o clima da região de Castelo Branco poderá ser caracterizado como sub-húmido chuvoso, com grande deficiência de água no Verão, mesotérmico e com moderada concentração estival da eficiência térmica ( 5). De acordo com a classificação de Köpen, trata-se de um clima do tipo Csa, que se caracteriza como sendo temperado e seco no Verão, em que 77% da precipitação anual se verificam no período Outono-Invernal. No período de 1951-1980, a precipitação média anual foi de * Por solum entende-se o conjunto dos horizontes A e B. PASTAGENS E FORRAGENS 19 63 821,4 mm. Durante os anos a que se refere o presente estudo foram observados valores de precipitação anual bastante inferiores a essa média em 1991-92, 1992-93 e 1994-95, mas também um valor muito mais elevado (1233 mm) em 1995-96 (quadro 2). QUADRO 2 – Precipitação total, número de chuvadas erosivas, precipitação em chuvadas erosivas e respectiva percentagem em relação ao total, nos anos hidrológicos de 1991-92 a 1996-97. Ano hidrológico 1991-92 1992-93 1993-94 1994-95 1995-96 1996-97 Precipitação total(mm) 389,0 434,9 900,8 468,8 1 233,0 873,0 Número de chuvadas erosivas 13 14 27 16 35 28 Precipitação em chuvadas erosivas (mm) 294,2 295,8 744,2 309,4 1 005,6 719,0 % de precipitação em chuvadas erosivas 75,63 68,02 82,62 66,00 81,56 82,36 Fonte: Dados recolhidos no pluviógrafo do campo de erosão. O número de chuvadas consideradas erosivas (chuvadas com uma precipitação total igual ou superior a 12 mm ou em que se verificou uma precipitação igual ou superior a 4 mm num período de 10 minutos) foi, naturalmente, superior nos anos de maior precipitação, tendo atingido o valor máximo de 35 em 1995-96 (quadro 2). Nos anos mais secos o número de chuvadas erosivas foi inferior a metade desse valor máximo e a quantidade de precipitação nessas chuvadas correspondeu a menores proporções relativamente aos totais anuais. 3 – MATERIAL E MÉTODOS Os talhões experimentais foram delimitados por bordaduras de chapa, possuindo, cada um, um comprimento de 22,1 m e uma largura de 1,9 m (delimitando uma área de 42 m²), com um declive de, aproximadamente, 9%, correspondendo assim ao talhão-padrão definido por Wischmeier e Smith (12). Os 18 talhões a que se refere o presente estudo foram ocupados, de forma aleatória, pelas seguintes 4 modalidades (distribuídas pelos talhões conforme o quadro 3): Testemunha, solo mantido limpo de vegetação, através de mobilizações realizadas na direcção do maior declive (3 talhões). Monocultura de Aveia (3 talhões). 64 PASTAGENS E FORRAGENS 19 Prado permanente de sequeiro, constituído por uma consociação de trevo subterrâneo, serradela e azevém bastardo (3 talhões). Rotação trienal: Tremocilha-Tremocilha-Aveia, em que o segundo ano de tremocilha é de ressementeira natural (ocupando, no total, 9 talhões). QUADRO 3 – Distribuição das modalidades pelos talhões nos diferentes anos agrícolas. Talhão Designação 1991-92 1992-93 1993-94 1994-95 1995-96 1996-97 X1 X2 X3 X4 X5 X6 X7 X8 X9 X 10 X 11 X 12 X 13 X 14 X 15 X 16 X 17 X 18 Rotação A Pr. seq. Rotação B Testemunha Rotação C Av. mon. Testemunha Testemunha Av. mon. Rotação A Rotação A Rotação B Rotação C Rotação B Av. mon. Rotação C Pr. seq. Pr. seq. R2 Pr. seq. R3 Testemunha R1 Av. mon. Testemunha Testemunha Av. mon. R2 R2 R3 R1 R3 Av. mon. R1 Pr. seq. Pr. seq. R3 Pr. seq. R1 Testemunha R2 Av. mon. Testemunha Testemunha Av. mon. R3 R3 R1 R2 R1 Av. mon. R2 Pr. seq. Pr. seq. R1 Pr. seq. R2 Testemunha R3 Av. mon. Testemunha Testemunha Av. mon. R1 R1 R2 R3 R2 Av. mon. R3 Pr. seq. Pr. seq. R2 Pr. seq. R3 Testemunha R1 Av. mon. Testemunha Testemunha Av. mon. R2 R2 R3 R1 R3 Av. mon. R1 Pr. seq. Pr. seq. R3 Pr. seq. R1 Testemunha R2 Av. mon. Testemunha Testemunha Av. mon. R3 R3 R1 R2 R1 Av. mon. R2 Pr. seq. Pr. seq. R1 Pr. seq. R2 Testemunha R3 Av. mon. Testemunha Testemunha Av. mon. R1 R1 R2 R3 R2 Av. mon. R3 Pr. seq. Pr. seq. Av. mon. – Aveia monocultura. Pr. seq. – Prado de sequeiro. R1 – Rotação, 1.º ano: Aveia. R2 – Rotação, 2.º ano: Tremocilha. R3 – Rotação 3.º ano: Tremocilha; ressementeira natural. Na parte inferior de cada talhão foram colocados um colector e uma caleira metálicos, para recolher e transportar a escorrência superficial e os materiais sólidos para um depósito. Para a eventualidade deste depósito encher, foi instalado um partidor de 9 fendas e uma caleira que transportava 1/9 da água e materiais em suspensão para um segundo depósito, tal como é usual em dispositivos deste tipo (1). As dimensões dos depósitos eram, respectivamente, 0,69 m × 0,69 m × 0,56 m e 0,78 m × 0,78 m × 1,00 m, perfazendo as capacidades de 0,267 e 0,608 m³. Os depósitos encontravam-se cobertos com tampas e as caleiras cobertas com telhas, para evitar a entrada directa da chuva. PASTAGENS E FORRAGENS 19 65 As precipitações foram quantificadas através de um pluviógrafo de báscula de 0,2 mm (Raingauge type RG1), que estava ligado a um registador de dados (Delta Logger), ambos da marca Delta-T Devices Ltd., registando a precipitação ocorrida em cada período de 10 minutos. Os dados armazenados neste dispositivo foram periodicamente (quinzenalmente) transferidos para um computador portátil. No início de cada ano agrícola fez-se a preparação da cama de sementeira dos cereais e da tremocilha do primeiro ano e a mobilização dos talhões-testemunha. Periodicamente procedeu-se à destruição, por mobilização manual, de toda a vegetação espontânea nos talhões-testemunha. Os volumes acumulados da água de escorrência superficial foram medidos no final de cada chuvada ou conjunto de chuvadas (sempre que a quantidade de precipitação verificada o tenha justificado), tendo-se procedido, nessas alturas, à recolha de amostras de água com o material em suspensão e sedimentos. As amostras recolhidas foram subdivididas em duas alíquotas, uma para secagem e determinação da quantidade total de solo arrastado pela erosão, e outra para análise granulométrica (análises executadas no laboratório de solos da ESACB) em que a areia grossa foi determinada por crivagem, a areia fina por sedimentação e decantação, e o limo e a argila por pipetagem, tendo sido as sedimentações controladas através da aplicação da lei de Stokes e a pipetagem realizada com uma pipeta de Robinson (10). 4 – RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 – Escoamento superficial Os valores medidos de escoamento superficial nos anos hidrológicos de 1991-92 a 1996-97 corresponderam, em todas as modalidades, a proporções relativamente baixas (entre 1 e 8%) da precipitação total ocorrida no local durante o mesmo período (quadro 4). Estes valores foram, de facto, bastante mais baixos do que os referidos por Hudson (6) relativamente a solos de textura franco-arenosa com 5 a 10% de declive (16% para pastagens e 40% para culturas anuais). Esta diferença poderá estar relacionada com dois aspectos distintos, pois, por um lado os valores referidos correspondem à média de 6 anos, englobando um grande número de chuvadas em que o escoamento foi nulo e, por outro lado, em grande parte dos casos as chuvadas erosivas 66 PASTAGENS E FORRAGENS 19 ocorridas durante o período de estudo foram intercaladas por períodos secos e não corresponderam a acontecimentos pluviométricos sequenciados, pelo que, nessas condições, tenderão a infiltrar-se maiores quantidades de água, reduzindo-se, naturalmente, as proporções de escoamento superficial, tal como é referido por Morgan ( 7) e também por Schwab et al. (11). QUADRO 4 – Percentagem de escoamento superficial de água em relação à precipitação ocorrida nos anos hidrológicos de 1991-92 a 1996-97 em função da modalidade. Modalidade Média da modalidade (%) Desvio-padrão (%) Testemunha Monocultura de aveia Prado de sequeiro Rotação: Aveia Tremocilha 1º ano Tremocilha 2º ano 7,70 4,49 1,15 3,23 3,32 1,06 2,49 1,47 0,42 1,91 0,43 0,15 No que se refere às diferenças entre as modalidades estudadas, verificou-se que a percentagem de escoamento superficial foi mais elevada nos talhões-testemunha (7,70%), enquanto que as proporções mais baixas foram registadas no prado permanente de sequeiro (1,15%) e no 2.º ano da tremocilha incluída na rotação (1,06%). Este comportamento parece lógico, uma vez que estas modalidades corresponderam a situações de cobertura permanente do solo pela vegetação, o que terá permitido a existência de valores mais elevados de evapotranspiração e também de infiltração de água, com a consequente diminuição do escoamento superficial. 4.2 – Perda de solo por hectare Verificou-se que os talhões onde ocorreu a maior perda de solo foram os talhões-testemunha, com uma perda média anual de 1 097 kg ha -1, enquanto nos talhões de prado essa perda não foi além dos 15,6 kg ha-1 e nos de tremocilha de 2.º ano ficou pelos 29,2 kg ha -1 (quadro 5). De notar que estas perdas de solo corresponderam apenas a, respectivamente, 1,4 e 2,7% da que se verificou no talhão-testemunha. A modalidade monocultura de aveia foi, a seguir à testemunha, aquela em que se verificou uma maior perda de solo (média anual de 215,5 kg ha-1), correspondendo a cerca de 20% da que se verificou nos talhões testemunha. Aliás, as perdas de solo verificadas na monocultura de aveia, na tremocilha do 1.º ano e na aveia inserida na rotação não foram significativamente diferentes. PASTAGENS E FORRAGENS 19 67 QUADRO 5 – Perdas de solo médias (kg/ha) nos anos hidrológicos de 1991-92 a 1996-97. Modalidade Testemunha Monocultura de Aveia Prado de sequeiro Rotação: Aveia Tremocilha 1º ano Tremocilha 2º ano Perda de solo média anual (kg/ha) Percentagem do talhão-testemunhas 1 097,51 215,57 15,56 159,70 174,14 29,22 100,00 19,64 1,42 14,55 15,87 2,66 As perdas médias anuais registadas estiveram bastante relacionadas com os escoamentos superficiais (r2 = 0,86, para p = 0,007), o que não deixa de ser natural, uma vez que a maiores volumes de escoamento tendem geralmente a corresponder maiores quantidades de carrejos, como aliás tem sido registado também por diversos outros autores ( 6, 7). Concluiu-se, assim, que as maiores perdas de solo foram as registadas nos talhões-testemunha, isto é, naqueles em que se procedeu a um maior número de mobilizações do solo, de forma a mantê-lo sem qualquer tipo de vegetação durante todo o ano; em segundo lugar, e com perdas de solo semelhantes entre si, mas já bastante inferiores à testemunha, estiveram a monocultura de aveia, a aveia inserida na rotação e a tremocilha de 1.º ano, as quais, embora correspondendo a diferentes índices de cobertura do solo, apresentaram em comum o facto de todas terem implicado apenas a realização de uma mobilização prévia do solo, antes das sementeiras; e, finalmente, foram os talhões ocupados por prado permanente e por tremocilha de 2.º ano (de ressementeira natural) os que apresentaram os menores valores de perda de solo, o que nos parece indicar que, pelo menos nesta situação, a ausência de mobilizações do solo poderá assumir um papel particularmente importante na sua conservação. Esta possibilidade já tem sido, aliás, referida por outros autores para condições ambientais bastante diferentes (3, 4, 7). 4.3 – Perda de solo por fracção granulométrica A granulometria dos materiais carreados foi predominantemente fina (figura 1), com maiores percentagens de limo e argila, coincidindo com o que tem sido verificado por outros autores, com diferentes tipos de solos (3), não tendo sido registadas diferenças significativas entre modalidades no que se refere às proporções de areia grossa (1,25% a 1,62%) e de areia fina (8,04% a 11,31%). 68 PASTAGENS E FORRAGENS 19 FIGURA 1 – Percentagem de perda de solo por fracção granulométrica em função da modalidade. As diferenças entre modalidades apenas foram significativas nos casos do talhão testemunha e do prado de sequeiro relativamente às restantes, tendo-se verificado no primeiro caso maiores percentagens de limo (49%) enquanto no segundo predominou a argila (72%). Estas diferenças poderão estar relacionadas com as quantidades totais de material carreado, na medida em que a proporção de argila é maior nas modalidade de prado permanente e de tremocilha de 2º ano, nas quais as perdas de solo total foram menores, enquanto a proporção de limo foi máxima na modalidade testemunha, em que as perdas de solo também atingiram os valores mais elevados. 5 – CONCLUSÕES Verificou-se, a partir deste estudo, que a protecção do solo proporcionada pela cobertura vegetal, em particular com a utilização de culturas pratenses e forrageiras, foi bastante eficaz na protecção do solo contra a erosão hídrica, nomeadamente no caso de prados permanentes ou de espécies forrageiras de ressementeira natural, que não impliquem a realização de intensas mobilizações do solo. PASTAGENS E FORRAGENS 19 69 Verificou-se igualmente, nesses casos, um menor escoamento de água, o que significa que houve uma maior taxa de infiltração. Assim, nos solos cobertos com culturas forrageiras, as disponibilidades hídricas serão maiores, e o caudal que escorre para os cursos de água será menor, o que conjugado com a menor produção de sedimentos irá diminuir os problemas de assoreamento de cursos de água e de barragens e a gravidade e frequência das cheias. No entanto, as conclusões agora apresentadas dizem respeito a um período de tempo que se considera relativamente limitado. Torna-se assim necessária a manutenção destes campos de ensaio por um período de tempo mais prolongado, bem como a realização de estudos análogos de erosão do solo, noutros tipos de solo, com outras culturas e noutras regiões do País. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 – ARAÚJO, E. B. de – Relatório da Missão Realizada em 1951/52 no United States Department of Agriculture, Subordinada ao Tema "Soil Conservation". (Não publicado). 2 – CORTEZ, N. R. S. – Erosão Hídrica do Solo: A Equação Universal de Perda de Solo e Outros Modelos de Previsão. Trabalho de síntese a que se refere a alínea b) do n.º 2 do artº. 58 do Estatuto da Carreira Docente Universitária. Lisboa, Instituto Superior de Agronomia, 1987. 3 – FOSTER, G. R. et al. – Processes of soil erosion by water. In: "FOLLET, R. F.; STEWART, B. A. (ed.) – Soil erosion and crop productivity". Madisson, USA, American Society of Agronomy, Crop Science Society of America, Soil Science Society of America, 1985, p.137-162. 4 – FRYE, W. W.; BENNETT, O. L.; BUNTLEY, G. J. – Restoration of crop productivity on eroded or degraded soils. In: "FOLLET, R. F.; STEWART, B. A. (ed.) – Soil Erosion and Crop Productivity". Madison, USA, American Society of Agronomy, Crop Science Society of America, Soil Science Society of America, 1985, p. 336-356. 5 – HORTA, M. C. M.; GOMES, M. F. N. – Caracterização Climatérica de Castelo Branco. Escola Superior Agrária de Castelo Branco, 1984. 6 – HUDSON, N. – Soil Conservation. Fully Revised and Updated Third Edition. London, B. T. 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ZONAS DE DISTRIBUIÇÃO DE CULTIVARES DE TREVO SUBTERRÂNEO EM PORTUGAL UMA NOVA ABORDAGEM* Noémia Farinha, Francisco Mondragão-Rodrigues, Gonçalo Barradas, J. M. Abreu♦ Escola Superior Agrária de Elvas – Apartado 254 – 7350 ELVAS ♦ Instituto Superior de Agronomia – Tapada da Ajuda – 1399 LISBOA CODEX RESUMO As pastagens semeadas à base de trevo subterrâneo (Trifolium subterraneum L. sensu latu) têm revelado boa adaptação a muitas das condições agro-ecológicas de Portugal continental, sendo esta a espécie que lidera a venda de sementes de leguminosas pratenses no País. A escolha das cultivares a utilizar em cada situação deve fazer-se com base nas características que apresentam, tendo em atenção as condições de solo e de clima do local a que se destinam. Mas, dada a falta de informação sistematizada, a escolha das cultivares tem-se feito recorrendo, essencialmente, ao contributo dos especialistas. Com o objectivo de facilitar, e de alguma forma sistematizar, a escolha das variedades mais adequadas a cada região, referem-se e ilustram-se, através de casos concretos de aplicação, as potencialidades de um sistema quantitativo e com elevada capacidade de integração de informação (Sistemas de Informação Geográfica - SIG). Estes sistemas permitem delimitar zonas de potencial utilização de cultivares de trevo subterrâneo, com base nas exigências edafoclimáticas. Consideram-se as cultivares Nungarin, Geraldton, Daliak, Dalkeith, Seaton Park, Rosedale e Clare. PALAVRAS-CHAVES: Trevo subterrâneo; Cultivar; Adaptação; SIG. ABSTRACT Sown pastures based on subterranean clover (Trifolium subterraneum L. sensu latu) have shown to be well adapted to some Portuguese agro-ecological conditions. This species is the leader on the seed market of pasture legume crops in this country. The appropriated cultivars for each situation must be chosen with consideration of both, soil and climate characteristics, and the choice is often done with the help of those who have been working in this subject for long. To help, and to some extent to rationalize the choice, a quantitative and opened system, able to integrate ample * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera de SPPF. Castelo Branco, Abril de 1998. 73 amounts of information, is presented. These geographical information systems (GIS) take in consideration the soil and climate requirements assigned to each cultivar (Nungarin, Geraldton, Daliak, Dalkeith, Seaton Park, Rosedale e Clare), and return the corresponding utilization areas. KEYWORDS: Subterranean clover; Cultivar; Adaptation; GIS. 1 – INTRODUÇÃO Portugal está inserido na zona de ocorrência espontânea do trevo subterrâneo, pelo que esta espécie está naturalmente bem adaptada a muitas das suas condições edafoclimáticas. Assim, as estimativas da potencialidade da expansão das pastagens de sequeiro, onde o trevo subterrâneo terá um importante papel a desempenhar, são francamente optimistas (2). As condições climáticas requeridas pelo trevo subterrâneo são, segundo Muslera Pardo e Ratera Garcia (9), Pires ( 12) e Crespo*, aproximadamente as seguintes : precipitação superior a 350 mm (limite árido), temperatura média das mínimas do mês mais frio superior a 4 oC (limite frio), isotérmica de 12,5 oC para o mês mais frio (limite quente), sendo a precipitação importante factor de produtividade, pelo menos até ao limite de 750 mm. Quanto à adaptação edáfica das suas subespécies (ssp.), pode-se referir, de acordo com diversos autores ( 4, 6, 7, 8, 11, 16 ), o seguinte: a) a ssp. subterraneum (S) prefere solos de textura ligeira a média (para facilitarem o enterramento da semente) e ácidos (pH 5,5 a 7)*, não suporta quantidades elevadas de carbonatos (<15%), sendo mais frequente a Norte do Tejo; b) a ssp. brachycalycinum (B) prefere solos moderadamente ácidos a alcalinos, com pH entre 6 e 8*, de textura mais fina (franco-argilosos a argilosos), preferencialmente com argila de tipo montmorilonite, que fendilhe no Verão, ou solos pedregosos, para formarem a semente nas fendas; teor em carbonatos até 30% e é mais frequente a Sul do Tejo; c) a ssp. yanninicum (Y) está adaptada a solos ácidos com pH entre 5,5 e 7 e condições de má drenagem. O trevo subterrâneo é uma espécie de domesticação recente, pelo que as zonas de adaptação da cultura não estão tão bem delimitadas como as de outras espécies tradicionalmente utilizadas em agricultura. * David Crespo, comunicação pessoal (1998). 74 PASTAGENS E FORRAGENS 19 Se se considerarem as condições gerais de adaptação, esta espécie pode ocorrer em quase todo o nosso País. Contudo, quando se pensa no estabelecimento de uma pastagem, tem que atender-se a critérios como produtividade e persistência, ou seja, às condições que influenciam o bom desenvolvimento das plantas. A integração e sistematização da informação existente sobre a adaptação das cultivares de trevo subterrâneo mais utilizadas em Portugal será útil, não só para agricultores, técnicos e empresas de sementes, mas também para quem tem a responsabilidade de definir estratégias a nível da produção agrícola nacional. O objectivo deste trabalho é delimitar, com base em exigências edafoclimáticas, as áreas geográficas onde as cultivares de trevo subterrâneo mais utilizadas em Portugal terão melhores condições de adaptação. Atender-se-á sobretudo às exigências de clima e de solo, aqui representadas apenas por queda pluviométrica anual, pH e tipo de solo. 2 – METODOLOGIA UTILIZADA Procedeu-se a uma recolha de informação sobre as exigências ecológicas das cultivares de trevo subterrâneo mais utilizadas em Portugal ( 14 ) com base na bibliografia e nas informações de especialistas (quadro 1). Adicionalmente às condições referidas no quadro 1, restringiu-se a utilização a zonas com altitude inferior a 900 m*. Os valores utilizados (quadro 1) resultam de um compromisso entre a bibliografia citada e a informação de base disponível em formato digital. Assim, por exemplo, para a cultivar Clare, a bibliografia indica que ela prefere solos com pH entre 6 e 8. Porém, como não existia este intervalo na carta de solos, considerou-se o mais próximo aí existente (pH entre 5,6 e 7,3), pelo que foi este o adoptado no quadro 1. A informação compilada foi tratada usando um Sistema de Informação Geográfia (SIG) da AUTODESK, o AutoCAD MAP e, como fonte de informação de base, as seguintes cartas, à escala 1/1 000 000, do "Atlas do Ambiente": carta de solos, segundo o esquema da FAO ( 1 ), carta de precipitação, valores médios anuais ( 15 ) e carta de acidez e alcalinidade dos solos ( 5 ). * David Crespo, comunicação pessoal (1998). PASTAGENS E FORRAGENS 19 75 QUADRO 1 – Condições edafoclimáticas consideradas para simular a distribuição das principais cultivares de trevo subterrâneo em Portugal Cultivar e subespécie(S ou B) Precipitação (mm) Limites de pH Tipos de solo excluídos Fonte de informação Nungarin (S) Geraldton (S) < 500mm 5,6-7,3 regossolos, podzois e vertissolos Crespo*, Oram (10) Daliak(S) Dalkeith (S) 400-600 5,6-7,3 regossolos, podzois e vertissolos Muslera Pardo e Ratera Garcia (9) Oram (10) Seaton Park (S) 500 - 800 5,6-7,3 regossolos, podzois, e vertissolos Francis (3), Muslera Pardo e Ratera Garcia (9), Quinlivan (13) Rosedale (B) 400 - 600 5,6-7,3 regossolos, podzois, litossolos e planossolos Oram (10), Stanley et al.(16) 500-800 5,6-7,3 regossolos, podzois, litossolos e planossolos Muslera Pardo e Ratera Garcia (9), Oram (10), Stanley et al.(16) Clare (B) * David Crespo, comunicação pessoal (1998). 3 – RESULTADOS As duas subespécies de trevo subterrâneo mais utilizadas são a ssp. subterraneum (S) e a ssp. brachycalycinum (B). A subespécie yanninicum está bem adaptada a condições de solo ácido com pH entre 5,5 e 7 e má drenagem ( 4, 7), sendo pouco utilizada em Portugal, pelo que não foi incluída neste trabalho. Segundo os dados de Sampaio (14), as cultivares de trevo subterrâneo mais utilizadas no nosso País são as seguintes: Seaton Park, Nungarin, Clare, Dalkeith, Rosedale, Geraldton e Daliak. Por esta razão, apesar de já existirem novas cultivares (como York, Gosse, Junnee Goulburn, Danemark, etc.) foi sobre aquelas que se baseou este trabalho. Na figura 1 pode-se observar que a cultivar Nungarin está melhor adaptada às zonas de menor precipitação de Trás-os-Montes, interior Alentejano e Algarve. Esta distribuição está relaccionada com o facto de ser a cultivar mais precoce de trevo subterrâneo, pelo que se adapta a condições de reduzida pluviosidade. Para condições de pluviosidade mais elevada, cultivares mais tardias com maior potencial produtivo serão mais adequadas. Nesta região a utilização das cultivares Nungarin e Geraldton terá uma importância não só 76 PASTAGENS E FORRAGENS 19 agronómica, mas também ambiental, na protecção do solo, por haver poucas espécies e cultivares com capacidade de adaptação para se estabelecerem nestas condições. 1a – Distribuição de Nungarin e Geraldton (S) 1b – Distribuição de Daliak e Dalkeith (S) 1d – Distribuição de Rosedale (B). 1c – Distribuição de Seaton Park (S). 1e – Distribuição de Clare (B) FIGURA 1 – Zonagem das principais cultivares de trevo subterrâneo, efectuada com base em exigências edafoclimáticas e recorrendo à utilização de um SIG. As cultivares Daliak e Dalkeith são mais tardias que as Nungarin e Geraldton e mais precoces do que a Seaton Park (10), pelo que a sua distribuição se sobrepõe, em parte, à das duas primeiras (as mais precoces) e à da S. Park (mais tardia). PASTAGENS E FORRAGENS 19 77 Atendendo à irregularidade das condições climáticas, as cultivares mais precoces, embora naturalmente menos produtivas, justificam-se tanto mais, quanto maior for a probabilidade de ocorrência de precipitações limitadas. A cultivar Seaton Park é a que tem menores restrições, à que correponde maior área de distribuição simulada, sendo também a mais utilizada em Portugal (14). Oran (10), referindo-se à Austrália, indica que a cultivar Seaton Park está bem adaptada a zonas com precicpitação entre 580 e 760 mm; segundo Muslera Pardo e Ratera Garcia (9), em Espanha, a mesma cultivar está bem adaptado a zonas com precipitação de 425 a 500 mm. Como esta é a cultivar mais utilizada em Portugal, deveria haver trabalhos que dessem indicações semelhantes para este País. As cultivares da ssp. brachycalycinum estão melhor adaptadas a solos de textura pesada, neutros a ligeiramente alcalinos. A sua distribuição predomina no Sul e, como a cultivar Rosedale é mais precoce do que a Clare, está melhor adaptada a condições de menor precipitação. Desta forma, as duas cultivares são complementares em algumas áreas. Não esquecer, porém, a influência do tipo de solo nas suas disponibilidades hídricas, o que naturalmente influencia o comportamento das variedades. Esta conjugação de factores; devido às limitações de informação digitalizada disponível, não pode ser considerada na análise efectuada neste trabalho, tal como outras características (produção de semente ou teor de sementes duras) inerentes à própria cultivar e que influenciam a sua persistência. Atendendo ao quadro de utilização agrícola que se pretende para estas cultivares, considerou-se como restrição o limite superior de 800 mm de precipitação, dado que acima deste valor existem espécies pratenses mais interessantes. 4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS As zonas de distribuição simuladas pela utilização do SIG dão-nos uma boa indicação das áreas potenciais para as cultivares referidas, o que poderá ser confirmado recorrendo a ensaios de adaptação ou a prospecção em pastagens já implantadas. Existem populações de trevo subterrâneo espontâneas em regiões não demarcadas nesta simulação, pelo que se deveria estimular a prospecção destas populações naturais de modo a preservá-las enquanto recursos genéticos e a poder incluí-las em programas de melhoramento, de onde se poderão obter cultivares capazes de proporcionar maior amplitude de combinações quanto à adaptação. 78 PASTAGENS E FORRAGENS 19 As principais dificuldades encontradas na realização deste trabalho têm essencialmente a ver com a exiguidade da informação disponível em formato digital. Por outro lado, as exigências edafoclimáticas e as tolerâncias a alguns factores de risco também não se encontram perfeitamente esclarecidas, pelo que, neste contexto, se torna difícil precisar, com fiabilidade, os limites das possibilidades de adaptação, às nossas condições, das cultivares consideradas. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao Eng.º David Gomes Crespo e ao Eng.º Téc.º Agr.º Francisco José Abreu as informações pessoais que lhes facultaram sobre a capacidade de adaptaçao das cultivares de trevo subterrâneo ao nosso País. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 – CARDOSO, J. C.; BESSA, M. M. T.; MARADO, M. B. – Carta de Solos – Unidades Pedológicas. Ed. digital. Lisboa, Direcção-Geral do Ambiente, 1971. 2 – CRESPO, D. G. – O Melhoramento de Pastagens e Forragens em Portugal. Perspectivas face à Integração Económica Europeia. "Melhoramento", 33 (1) 1994, p. 199-216. 3 – FRANCIS, C. – Report on legume collection tour of Portugal, South West Spain and Madeira. South Perth, Western Australian Department of Agriculture, 1979. 4 – FRANCIS, C. M.; KATZNELSON, J. S. – Observations on the distribution and ecology of subterranean clover, some other clovers, and medics in Greece and Crete. "Aust. Pl. Introd. Rev.", vol. 12, 1977, p. 17-25. 5 – FREITAS, F. 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Lisboa, Direcção-Geral do Ambiente, 1974. 16 – STANLEY, M.; BEALE, P.; COOPER, J. – Rosedale sub clover. South Australia, Department of Agriculture, 1989. (Fact Sheet FS 1/88). 80 PASTAGENS E FORRAGENS 19 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 81–85. APLICAÇÕES DOS SISTEMAS DE INFORMAÇÃO GEOGRÁFICA EM ESTUDOS SOBRE PASTAGENS E FORRAGENS * Francisco Mondragão-Rodrigues, Noémia Farinha, Gonçalo Barradas, J. M. Abreu♦ Escola Superior Agrária de Elvas – Apartado 254 – 7350-903 ELVAS ♦ Instituto Superior de Agronomia – Tapada da Ajuda – 1399 LISBOA CODEX RESUMO Os sistemas de informação geográfica (SIG) são instrumentos, englobados nas novas tecnologias informáticas, que possibilitam a análise, organização e utilização de informação geo-referenciada de natureza diversa. Sobre essa informação permitem executar operações de pesquisa, análise e visualização gráfica. A aplicação desta tecnologia em estudos sobre pastagens e forragens abre um vasto campo de trabalho para responder a inúmeras questões que possam surgir. No campo das pastagens e forragens é possível, por exemplo, com um SIG e informação de base adequada, antecipar possíveis áreas de distribuição de determinadas espécies, com o fim de planear e orientar expedições de recolha de germoplasma ou ainda delimitar as zonas do País mais favoráveis à introdução de uma nova espécie forrageira. No presente trabalho apresenta-se, como exemplo da aplicação dos SIG em estudos sobre pastagens e forragens, a delimitação, no território continental português, das áreas de distribuição do trevo subterrâneo e de luzernas anuais, tendo em atenção as exigências edafoclimáticas que se lhe atribuem. Abordam-se também os aspectos relacionados com os cuidados a ter na escolha e tratamento da informação de base e na interpretação dos resultados. PALAVRAS-CHAVES: SIG; Trevo subterrâneo; Luzernas anuais. ABSTRACT Geographical information systems (GIS), as a part of the new information technologies, are a tool used to organize, treat and utilize a different kind of geographical data. GIS data can be searched, analyzed and graphically displayed. The application of GIS to pasture and forage studies is promising, as it can be used, for example, to choose the best areas to collect germ plasm, or to introduce a certain species or cultivar. Here, we present a particular application of the later type, the application of GIS to select the best areas in Portugal for subterranean clover and * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF Castelo Branco, Maio de 1998. 81 annual medics, as a function of the soil and climate requirements that are assigned to them. Some cares that are necessary in the choice and treatment of information, and also in the interpretation of the output, are also discussed. KEY WORDS: GIS; Subterranean clover; Annual medics. 1 – INTRODUÇÃO Os sistemas de informação geográfica (SIG) são aplicações informáticas extremamente úteis, cada vez mais utilizadas em diversos campos da Ciência, que permitem integrar informação gráfica e alfanumérica que, depois de armazenada, tratada e organizada, é susceptível de operações de pesquisa, análise e visualização dos resultados sob a forma de mapas. No campo das pastagens e forragens, a informação susceptível de ser utilizada é muito diversificada, podendo integrar parâmetros como, por exemplo, tipo de solo, pH, pedregosidade, declive do terreno, altitude, precipitação, temperatura, ocorrência de geadas, presença de coberto arbóreo, tamanho da parcela, entre muitos outros possíveis. Em cada estudo, a utilização de dados de vários parâmetros permite ao SIG efectuar um cruzamento de informação, questionando simultaneamente as diversas variáveis em análise, e fornecer resultados mais ou menos elaborados, consoante a quantidade e qualidade da informação de base introduzida. Esta ferramenta poderá ser utilizada, por exemplo, na localização de possíveis áreas de distribuição de espécies silvestres, o que permitirá programar e orientar colheitas de germoplasma; também poderá possibilitar a delimitação das áreas mais favoráveis para determinada cultivar de uma dada espécie ou ainda perspectivar as possíveis zonas de expansão de uma praga ou doença de uma certa espécie pratense ou forrageira. Neste trabalho apresenta-se, como exemplo de aplicação dos SIG, em estudos sobre pastagens e forragens, a delimitação, no território continental português, das possíveis áreas de distribuição do trevo subterrâneo e de luzernas anuais, tendo em atenção apenas duas condicionantes de natureza edafoclimática (pH do solo e queda pluviométrica anual). 2 – MATERIAL E MÉTODOS O sistema de informação geográfica (SIG) utilizado foi o AutoCAD MAP (versão 1.0) da AUTODESK. A fonte da informação de base foi a colecção de cartas à escala 1/1 000 000 do "Atlas do Ambiente". Neste trabalho apenas se utilizaram dois níveis de informação para efectuar a análise: a precipitação média 82 PASTAGENS E FORRAGENS 19 anual e o pH do solo. Os valores de ambos os parâmetros foram retirados da página do Ministério do Ambiente presente na Internet, tendo sido utilizadas as cartas em formato digital designadas por "Precipitação" (quantidade total – valores médios anuais, em mm, para o período 1931-1960) e "Acidez e alcalinidade dos solos" (classes de pH em água). De referir que no caso do pH, as classes dominantes definidas nas cartas digitais são as seguintes: inferior ou igual a 4,5; de 4,6 a 5,5; de 5,6 a 6,5; de 6,6 a 7,3; de 7,4 a 8,5. Este facto condiciona fortemente a escolha dos valores a utilizar. Os limites ecológicos para a distribuição do trevo subterrâneo e das luzernas anuais, utilizados a título exemplificativo, para a análise efectuada, correspondem aos valores médios da precipitação anual e do pH do solo mais frequentemente referidos na bibliografia, condicionados pelas classes préestabelecidas nas cartas digitais utilizadas como informação de base. Assim sendo, utilizaram-se os seguintes valores: • trevo subterrâneo: precipitação entre 400 e 800 mm e pH do solo entre 5,6 e 7,3; • luzernas anuais: precipitação inferior a 800 mm e pH do solo entre 6,6 e 8,5. 3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO As figuras 1 e 2 apresentam as possíveis áreas de implantação do trevo subterrâneo (Trifolium subterraneum L.), bem como das cultivares disponíveis de luzernas anuais (Medicago sp.) para utilização no nosso País. F I G U R A 1 – Possível área de implantação, no continente português, das cvs. disponíveis de trevo subterrâneo. PASTAGENS E FORRAGENS 19 F I G U R A 2 – Possível àrea de implantação, no continente português, das cvs. disponíveis de luzernas anuais. 83 Da observação da figura 1, respeitante à possível área de implantação do trevo subterrâneo, ressalta que a área delimitada se aproxima bastante daquela que seria de esperar. São indicadas como zonas mais favoráveis à espécie, as zonas mais secas do interior de Trás-os-Montes (Terra Quente, Planalto Mirandês, parte oriental do vale do Douro), do Sul da Beira Baixa e do Vale do Tejo, bem como quase todo o Alentejo e o Algarve, à excepção de algumas manchas de solos de pH mais ácido ou mais alcalino que o imposto na análise (de 5,6 a 7,3). Os resultados de numerosos estudos realizados no nosso País deixam entender que a distribuição aqui apresentada para esta espécie se pode considerar aceitável. No entanto, sabendo que algumas cultivares, como por exemplo a "Clare" e a "Rosedale", podem crescer em solos com pH igual a 8, e sabendo ainda que, conforme referem Francis (1) e Morley e Katznelson (2), o trevo subterrâneo se pode desenvolver em regiões onde a precipitação atinge os 1000 mm anuais, é de aceitar que a área atribuível à espécie seja ligeiramente superior à apresentada na figura 1, podendo abarcar zonas montanhosas (até aos 900-1000 m) do Norte e Centro do País. No que respeita à possível área de distribuição das luzernas anuais, apresentada na figura 2, parece demasiado restrita, circunscrevendo-se apenas a algumas pequenas manchas de solos de pH neutro a alcalino do Sul do País. Este resultado é fruto do limite inferior de pH considerado, demasiado elevado (pH = 6,6) para as condições do nosso País, mas ao qual se recorre por ser o que vem referido na bibliografia da especialidade para as cultivares actualmente disponíveis. A alternativa seria incluir a classe de pH entre 5,6 e 6,5, por corresponder a zonas de pH onde, como é sabido, se desenvolvem em Portugal formas espontâneas de luzernas anuais. Ficaram assim por assinalar extensas áreas do Alentejo, do litoral centro e do interior das Beiras e de Trás-os-Montes. Portanto, será de admitir que a figura 2 não corresponde exactamente à totalidade das possíveis áreas atribuíveis às luzernas anuais em Portugal continental. 4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS O exemplo escolhido ilustra perfeitamente as potencialidades e, simultaneamente, as limitações dos SIG. Como é sabido, a qualidade e a fiabilidade dos resultados depende da exactidão da informação utilizada, da escala da carta de base e dos critérios (limites) utilizados na análise. Foi este último factor que pesou na qualidade dos resultados apresentados no exemplo em questão. 84 PASTAGENS E FORRAGENS 19 No caso do trevo subterrâneo, uma vez que os limites "rígidos" presentes na carta de pH utilizada como base se ajustavam razoavelmente aos limites naturais de pH da espécie, o resultado obtido foi satisfatório. No caso das luzernas anuais esse ajustamento já não foi tão bom e, por isso, o conhecedor destas espécies, mas não o das cultivares consideradas, tem imediatamente a percepção de que a possível área de distribuição apresentada é, para aquelas, substancialmente inferior à real. Ficou assim patente que os resultados produzidos por um SIG, em estudos sobre pastagens e forragens, devem ser sempre analisados e interpretados com cautela. Estas ferramentas serão muito úteis em estudos nesta área do conhecimento mas, tal como em outros campos, a qualidade dos resultados dependerá grandemente da qualidade e fiabilidade dos dados introduzidos no SIG, da forma como este os trata, e numa correcta apreciação dos resultados que ele fornece. REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS 1 – FRANCIS, C. – Report on legume collection tour of Portugal, South West Spain and Madeira. South Perth, Western Australian Department of Agriculture, 1979. 2 – MORLEY, F.H.W.; KATZNELSON, J. – Colonization in Australia by Trifolium subterraneum L. In: "The genetics of colonizing species". New York, Academic Press, 1965, p. 269-285. PASTAGENS E FORRAGENS 19 85 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 87–97. INFLUÊNCIA DA SILAGEM DE TRITICALE EM DUAS FASES DE CORTE, COM DOIS NÍVEIS DE CONCENTRADO, NA ENGORDA DE NOVILHOS MERTOLENGOS* J. M. Arranja, D. Almeida, F. Engeitado, J. Efe Serrano Universidade de Évora – Departamento de Fitotecnia – Apartado 94 – 7001 ÉVORA RESUMO Neste trabalho compararam-se silagens de triticale, variedade Borba, cortado na fase de grão leitoso/pastoso (silagem A) e na fase de grão duro (silagem B) como base de dietas de engorda de novilhos de raça Mertolenga. O estudo incidiu em dietas com baixa concentração energética [1% do peso vivo (PV) de concentrado na dieta] e com alta concentração energética (2% do PV). Determinaram-se os parâmetros químicos e nutritivos dos alimentos utilizados nas dietas, bem como os níveis de ingestão e de crescimento apresentados pelos novilhos. A silagem A mostrou maior teor de proteina bruta (PB) e de matéria seca digestível (MSD) que a silagem B, de corte mais tardio, apresentando-se ambas bem conservadas, já que os teores de MS das forragens eram altos (32,15% para a A e 48,86% para a B). O teor de ácido láctico foi de 7,01% e 6,87% para a A e B, respectivamente. Não se notaram diferenças significativas no ganho médio diário (GMD) dos animais para o efeito tipo de silagem, mas verificou-se (P<0,05) para o nível de concentrado na dieta. A silagem B, de corte na fase de grão pastoso/duro, em dieta com 2% do PV de concentrado, originou as maiores performances animais (1500 g/dia de ganho de peso), concluindo-se que o corte desta forragem em fase mais tardia, apesar da menor digestibilidade revelada, não só não afectou os crescimentos dos animais, como melhorou mesmo o GMD, devido certamente ao efeito do grão que esta forragem já continha no momento do corte. PALAVRAS-CHAVES: Triticale; Silagem de cereal imaturo; Bovinos mertolengos; Crescimento. ABSTRACT The aim of this work was to compare normal triticale forage ensiling in the milk stage of the grain (silage A) with the same cereal ensiling in the hardness stage (whole crop silage B). After 10 months of conservation, each silage was included in two diets * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF. Castelo Branco, Abril de 1998. 87 with low [1% live weight (LW)] and high (2% LW) concentrate levels, in a total of 4 diets: A1, A2, B1 and B2). Each diet was offered to a lot of 4 "Mertolengo" steers, along 43 days, with intake and live wheight gain (LWG) controlled weekly. Silage A had lower dry matter (DM) (30.45%) and higher crude protein (CP) (8.07%) and digestible dry matter (DMD) (53.79%) than silage B (45.48%, 7.66% and 50.55%, respectively). The effect of the silage quality in the LWG was not significant, but the level of concentrate in the diet does it. The diet B2 (whole triticale silage + 2% of concentrate) resulted in the best animal performances, allowed LWG of 1,500 g day-1. In spite of the lower DMD in the silage B, the effect of the immature grains was determinant for the higher animal performance in this diets. KEYWORDS: Triticale; Whole crop cereals; Triticale silage; "Mertolengo" steers. 1 – INTRODUÇÃO A silagem de cereal imaturo, ou a "whole crop cereal silage", em língua inglesa, é uma silagem baseada na ensilagem integral de um cereal (trigo, cevada, triticale, etc.) num avançado estado de maturação do grão (pastoso/ duro). As técnicas de conservação são relativamente seguras, com a vantagem de não haver efluentes, devido ao avançado estado de maturação da cultura e ao consequente elevado teor de matéria seca (MS) na altura da ensilagem (14). Embora relativamente recente, este tipo de silagem tem cativado cada vez mais o interesse dos agricultores, já que, utilizando os mesmos meios técnicos da ensilagem comum já existentes na exploração agrícola, pode aproveitar culturas cerealíferas sem qualidade para grão ou sem valor económico que justifique a sua debulha (9). O triticale é uma cultura que, pelos maiores rendimentos apresentados em condições marginais (clima mediterrânico), face a outros cereais como o trigo, centeio, aveia e cevada (5 ) (8 ) (13), se torna cada vez mais uma opção na alimentação animal, como grão ou forragem, sendo esta utilizada em verde, fenada ou ensilada (3) (5) ( 13). Embora o Triticale já tenha sido objecto de estudo, química e nutritivamente ( 2 ) ( 4 ) ( 11 ), a sua utilização como cereal forrageiro necessita de mais investigação, nomeadamente a nível do estudo de dietas baseadas nesta forragem quando em sistemas produtivos. Face ao rápido decréscimo do valor nutritivo da planta completa na Primavera, devido principalmente à grande quebra na razão folhas/caule, será importante avaliar o papel que o grão poderá ter no atenuar desse abaixamento de qualidade, nomeadamente no decréscimo da digestibilidade. Foi esse o principal objectivo deste trabalho. 88 PASTAGENS E FORRAGENS 19 2– METODOLOGIA A forragem utilizada foi triticale da variedade Borba, semeado no Outono de 1995 e cortado em 1996, em duas datas distintas: 13 de Maio (fase de grão leitoso) e 6 de Junho (fase de grão pastoso/duro). O material verde, fraccionado em partículas de 5 a 15 cm, foi ensilado, sem qualquer aditivo, em dois silos horizontais de madeira, cobertos com plástico e alguma terra, tendo sido previamente bem calcados com a ajuda de tractor. Após cerca de 10 meses de conservação procedeu-se à abertura dos silos e ao início do ensaio. Os dois tipos de silagens resultantes foram assim denominados: A – silagem de triticale cortado no estado de grão leitoso, B – silagem de triticale cortado no estado de grão pastoso/duro. Os animais utilizados foram 16 novilhos de raça Mertolenga, com um peso vivo médio de 260 kg, divididos em quatro lotes de quatro novilhos cada, de maneira que os pesos médios iniciais dos lotes fossem sensivelmente iguais. Para alcançar este objectivo e havendo grande disparidade de pesos entre os animais, cada lote foi composto por um novilho com peso corporal superior à média, por outro inferior à média e por dois com pesos próximos da média. Com as duas silagens e um concentrado comercial de engorda de novilhos compuseram-se 4 dietas, destinadas a cada um dos 4 lotes de animais. A cada lote correspondeu uma dieta diferente: A1 [silagem A + 1% do peso vivo (PV) de concentrado diário], A2 ( silagem A + 2% do PV), B1 ( silagem B + 1% do PV) e B2 ( silagem B + 2% do PV). Para um correcto controlo alimentar os animais foram instalados em boxes individuais onde, diariamente, se controlaram os alimentos distribuídos, bem como as sobras e refugos do dia anterior. A pesagem dos animais fez-se semanalmente, sensivelmente à mesma hora e pelo mesmo operador, para que o erro de leitura da balança (balança mecânica) fosse minimizado. Após cada pesagem procedeu-se ao ajuste na quantidade de concentrado a administrar durante a semana seguinte. Nas primeiras três semanas os novilhos tiveram um período de habituação alimentar, seguido de um período de controlo de 6 semanas, correspondente ao esgotamento dos silos. Recolheram-se amostras de triticale verde na altura da ensilagem, de silagem de triticale no período de controlo e de concentrado comercial de diferentes sacos ao acaso. PASTAGENS E FORRAGENS 19 89 Para cada amostra procedeu-se à determinação da matéria seca (MS) por secagem a 60 ºC, até peso constante, seguida de moenda em moinho de facas com crivo de 1 mm. Numa segunda fase determinaram-se os seguintes parâmetros: MS residual por secagem em estufa a 105 ºC, cinzas totais por incineração em mufla a 550 ºC, fibra insolúvel em detergente neutro (NDF) pelo método de Goering e Van Soest, proteína bruta (PB) pelo método de Kjeldhal ( 1) (2 ) (7 ), digestibilidade da MS in vitro (MSD) pelo método de Tilley e Terry ( 12 ). Para as silagens determinaram-se ainda, em amostras frescas, os parâmetros fermentativos azoto amoniacal (N-NH 3) por destilação da amostra sem mineralização prévia (2 ), ácido láctico segundo Harper e Randolph modificado por Parker (6) (10 ) e pH em solução aquosa isotónica com potenciómetro analógico. Estatísticamente compararam-se os valores médios das duas épocas de corte do triticale, como forragem verde e como silagem, procedendo-se a uma análise de variância simples para o factor "época de corte". A análise estatística da ingestão e das características produtivas de cada grupo de novilhos foi do tipo factorial 2 × 2, tendo em conta os efeitos "tipo de silagem" e "nível de concentrado". A curva de regressão do crescimento de cada grupo de novilhos foi determinada pelo método da curva mais ajustada, utilizando-se os valores médios de cada grupo para cada pesagem. Todo o tratamento estatístico foi feito utilizando o programa SPSS for Windows, versão 7.5. 3 – APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS Como se pode ver no quadro 1, com o avanço na maturação da cultura houve um aumento significativo no valor da MS e um decréscimo significativo da PB. A MSD também baixou devido, certamente, a uma maior lenhificação do caule à medida que aumentou o estado de maturação do triticale. O valor do NDF do triticale no estado de grão pastoso/duro não diferiu significativamente do do estado de grão leitoso, o que não seria de esperar face ao decréscimo verificado na MSD. A explicação estará na heterogeneidade das amostras que originaram valores médios com desvios-padrão um pouco elevados. A maior ou menor fracção do grão nas silagens B influiu decisivamente na qualidade analítica das amostras. A MO permaneceu praticamente igual nos dois estados de maturação. 90 PASTAGENS E FORRAGENS 19 QUADRO 1 – Valores químicos e digestivos da forragem de triticale nas duas épocas de corte. Data de corte MS (%) MO (% da MS) PB (% da MS) NDF (% da MS) MSD (% da MS) Triticale A 13 de Maio 32,15 94,33 7,62 64,57 46,73 Triticale B 7 de Junho 48,86 94,23 6,44 65,97 40,24 P 0,000 0,708 0,008 0,075 0,000 *** ns ** ns *** ** para p < 0,01, *** para p < 0,001, ns para não significativo. Analisando seguidamente o quadro 2 sobre a qualidade das silagens resultantes, após cerca de 10 meses de conservação, vê-se que a silagem B apresenta obviamente um teor de MS bem mais elevado que a silagem A, pois corresponde a um estado mais avançado de maturação. Os valores de PB e MSD das duas silagens, tal como nas forragens verdes respectivas, continuam a diferir estatisticamente, reflectindo as diferenças de datas de corte. Os mais altos valores de PB encontrados nas silagens face aos das forragens verdes não têm aparentemente uma explicação biológica nem fermentativa plausível. A não ser em amostras de silagem bastante inoculadas por bolores, não haverá motivos para que o azoto bruto suba durante a ensilagem. A razão mais provável terá sido a falta de homogeneidade entre amostras verdes e amostras de silagem, com diferentes proporções de folhas, caules e espigas. QUADRO 2 – Valores químicos e fermentativos da silagem de triticale nas duas épocas de corte. Silagem A MS (%) MO (% da MS) PB (% da MS) NDF (% da MS) MSD (% da MS) Ácido láctico (% da MS) NH3 (% do Nt) pH 30,45 91,23 8,07 62,38 53,79 7,01 11,73 3,83 Silagem B 45,48 93,17 7,66 64,56 50,55 6,87 8,95 3,99 P 0,002 ** 0,010 * 0,019 * 0,157 ns 0,002 ** 0,822 ns 0,000 *** 0,019 * * para p < 0,05, ** para p < 0,01, *** para p < 0,001, ns para não significativo. A razão entre as percentagens de MSD e de PB é geralmente apontada como um bom indicador do equilíbrio nutritivo em alimentos fibrosos, considerando-se uma forragem equilibrada quando essa razão se situa próximo de 5,00. No presente caso, a silagem A apresentou um valor de 6,67 contra PASTAGENS E FORRAGENS 19 91 6,60 para a silagem B, tendendo então esta silagem a ser um alimento um pouco mais equilibrado, não sendo, no entanto, nenhuma das silagens suficientemente equilibrada para ser administrada como alimento único devido, principalmente, ao baixo teor proteico. O teor em NDF foi mais elevado para a silagem B, como se previu, não havendo, contudo, diferenças significativas entre ambas. Em termos fermentativos as duas silagens resultaram bem acidificadas, com valores de pH inferiores a 4,0, apresentando-se a silagem A significativamente mais ácida que a B, dado o seu menor teor de MS. Contudo, para estes valores de MS, era de esperar que as silagens fossem menos ácidas. A produção de ácido láctico foi moderada nas duas silagens, para os 10 meses de conservação, não diferindo significativamente entre si. Admite-se que a produção inicial de ácido láctico tenha sido bastante mais elevada, reflectindo-se na acidez total das silagens e que, posteriormente, se tenha reconvertido, por fermentações secundárias, em ácidos gordos voláteis não analisados. A percentagem de N-NH3 no Ntotal foi pequena nas duas silagens, sendo no entanto significativamente mais baixa na silagem B, talvez devido ao seu maior teor em MS, restringindo mais a degradação da proteína por parte do Clostridium. O concentrado utilizado, do tipo comercial para engorda de novilhos, apresentou os valores constantes do quadro 3, obedecendo aos padrões nutritivos usuais neste tipo de concentrado. Pela análise do quadro 4 verifica-se que a ingestão de MS fibrosa foi influenciada somente pelo nível de concentrado, não se manifestando diferenças significativas ligadas ao efeito "tipo de silagem". Assim, o grupo com maior ingestão de MS foi o B1 (76,63), seguido dos grupos A1 (74,23) e B2 (56,63), sendo o A2 (50,68) aquele que apresentou a menor ingestão de MS. Algo semelhante se verificou na ingestão de PB e MSD das silagens, para os quatro grupos. As diferenças notadas são só influenciadas pelo nível de concentrado, não havendo diferenças estatisticamente significativas entre as duas silagens. Só quanto à ingestão de NDF se notaram diferenças significativas, quer pelo efeito nível de concentrado, quer pelo factor tipo de silagem. Assim, o grupo que apresentou o maior valor de ingestão foi o B1 (52,65), seguido dos grupos A 1 (47,78) e B2 (39,15), sendo o A2 (32,45) aquele que apresentou a menor ingestão de NDF. Analisar estatisticamente a ingestão de concentrado neste caso não faz sentido, visto que a quantidade à disposição dos animais lhes foi imposta. Assim, a única conclusão que se pode tirar é que o tipo de silagem não 92 PASTAGENS E FORRAGENS 19 influenciou a ingestão de concentrado, visto que, ao longo do ensaio, não se registaram quaisquer sobras de concentrado. QUADRO 3 – Características químicas do concentrado. MS (%) MO (% da MS) MSD (% da MS PB (% da MS) Média Dp 89,74 88,81 85,77 15,72 0,378 0,176 2,211 0,311 Dp: Desvio-padrão. QUADRO 4 – Ingestão média diária de MS, PB, NDF e MSD só de alimento silagem nas duas dietas. Grupo MS (g/kg PV 0,75) PB (g/kg PV 0,75) NDF (g/kg PV 0,75) MSD (g/kg PV 0,75) A1 A2 B1 B2 74,23 6,18 47,78 41,18 50,68 4,18 32,45 28,00 76,63 6,25 52,65 41,25 56,63 4,65 39,15 30,68 Nivel de significância Silagem ns ns ** ns Concentrado *** *** *** *** ** para p<0,01, *** para p<0,001, ns para não significativo. Não houve interacção entre os efeitos "nivel de concentrado" e "tipo de silagem". MS – matéria seca, PB – proteina bruta, NDF – fibra neutro detergente, MSD – matéria seca digestivel in vitro. Quando se analisam as taxas de ingestão da dieta total (silagem + concentrado) verifica-se que os valores de ingestão de MS, PB e MSD (quadro 5) só foram diferentes significativamente entre os dois níveis de concentrado, não havendo igualmente diferenças influenciadas pelo tipo de silagem. Assim, observou-se que houve um aumento nas quantidades totais de MS, PB e MSD ingeridas, quando o nível de concentrado era mais elevado. Estes valores de ingestão foram determinar os valores de ganho médio diário (GMD) dos novilhos, como era de esperar. QUADRO 5 – Ingestão média diária de MS, PB e MSD totais (silagem + concentrado). Grupo MS (g/kg PV0,75) PB (g/kg PV0,75) MSD (g/kg PV0,75) A1 107,70 11,45 70,03 A2 117,10 14,65 85,18 B1 110,38 11,55 70,25 B2 123,53 15,20 88,23 Nivel de significância Silagem ns ns ns Concentrado ** *** *** ** para p<0,01, *** para p<0,001, ns para não significativo. Não houve interacção entre os efeitos "nivel de concentrado" e "tipo de silagem". MS – matéria seca, PB – proteina bruta, MSD – matéria seca digestível in vitro. PASTAGENS E FORRAGENS 19 93 Analisando os valores do quadro 6 constata-se que o valor do peso inicial médio de cada grupo não foi igual, como seria desejável, mas tal era biologicamente difícil de conseguir. QUADRO 6 – Crescimento médio dos novilhos mertolengos, no período de controlo. Grupo Peso inicial (kg) Peso final (kg) Variação de peso (kg) GMD (kg/dia) A1 266,25 314,75 48,50 1,128 A2 B1 B2 265,25 325,00 59,75 1,390 272,50 320,75 48,25 1,122 270,50 335,00 65,50 1,500 Nivel de significância Silagem ns ns ns ns Concentrado ns * * * * para p<0,05, ns para não significativo. Não houve interacção entre os efeitos "nivel de concentrado" e "tipo de silagem". GMD – Ganho médio diário de peso vivo. O peso final médio, embora sem diferenças estatísticas entre o tipo de silagens, foi logicamente mais elevado nos grupos com maior nível de concentrado (335,00 kg e 325,00 kg, contra 320,75 kg e 314,75 kg, respectivamente). A principal razão para a não significância estatística entre as silagens reside no leque de pesos individuais que formavam cada média considerada. Em termos de ganho médio diário (GMD), o parâmetro economicamente mais importante, verificou-se também diferença significativa somente para o nível de concentrado, continuando a não se verificarem diferenças para os tipos de silagem, sendo no entanto manifesto que a silagem B apresentou melhores resultados que a silagem A quando o nível de concentrado foi mais elevado, sendo os valores de crescimento praticamente iguais para o nível de concentrado mais baixo. O grupo com maior GMD foi o B2 (1,500 kg), seguido do A2 (1,390 kg), vindo finalmente os grupos A1 (1,128 kg) e B1 (1,122 kg) com valores praticamente idênticos. O gráfico 1 mostra as curvas reais de crescimento dos novilhos, que dão a evolução do peso vivo médio de cada grupo ao longo do ensaio. Na fase de habituação à dieta, os novilhos apresentaram uma esperada evolução irregular no peso vivo, notando-se por vezes decréscimos entre pesagens, nas primeiras duas semanas. Há que referir, no entanto, que todos os grupos entraram em período de controlo alimentar já com evoluções constantes no seu peso vivo, notando-se, já então, maiores acréscimos para a silagem B. Para uma mais fácil comparação entre os vários grupos, ajustaram-se rectas de regressão linear aos valores de crescimento de cada grupo de animais (quadro 7). 94 PASTAGENS E FORRAGENS 19 GRÁFICO 1 – Evolução do peso vivo dos quatro grupos de novilhos ao longo do ensaio. QUADRO 7 – Equação de regressão mais ajustada para os valores médios de peso vivo de cada grupo ao longo do período de controlo alimentar. Grupo A1 A2 B1 B2 Equação y= a + b.x a 258,93 255,21 262,96 260,00 b r r2 8,366 10,268 8,366 10,839 0,9928 0,9980 0,9983 0,9987 0,9856 0,9960 0,9967 0,9975 Tendo em conta o declive de cada regressão, verificou-se que só houve diferença estatística entre o nível de concentrado, sem que se registasse diferença significativa entre as duas silagens. O grupo que apresentou o maior índice de crescimento foi o B2 (10,839), seguido do A2 (10,268), vindo por fim os grupos A1 e B1 (8,3661) com valores iguais. PASTAGENS E FORRAGENS 19 95 126 PASTAGENS E FORRAGENS 19 QUADRO 1 – Indicadores técnicos das explorações. Isto vem confirmar as diferenças nos valores de GMD entre os lotes, mostrando crescimentos significativamente mais elevados nos grupos que ingeriram 2% do peso vivo de concentrado, exibindo uma supremacia da silagem B em relação à silagem A para este nível de suplementação. No entanto, com um nível mais baixo de concentrado não houve supremacia de um tipo de silagem em relação à outra. Pode-se ainda constatar que não houve um efeito do nível de concentrado na dieta proporcional ao crescimento dos novilhos, visto que quando se aumentou a quantidade administrada de concentrado em 100%, ou seja, de 1% para 2% do peso vivo, houve somente um aumento no GMD de 25,20% na dieta B e de 18,85% na A. Isto, que poderia ser uma surpresa económica não é nenhuma surpresa biológica, ou, mais concretamente, nutritiva. Mesmo para animais desta idade, as respostas produtivas estão longe de serem lineares face a incrementos de concentração energética nas dietas. 4 – CONCLUSÕES Pode-se concluir que o triticale tem uma boa ensilabilidade para ambas as fases de corte, sem riscos de efluentes, visto ser ensilado com um teor de MS acima de 30%. Em ambas as fases de corte notou-se que as silagens resultantes eram alimentos pouco equilibrados nutritivamente, devido aos baixos teores de PB, necessitando pois de suplementação. Cortando mais tarde, na fase de grão pastoso/duro, obtém-se uma maior quantidade de MS produzida. O efeito do grão de triticale na silagem B fez-se sentir, atenuando a menor digestibilidade da fibra nesta silagem, correspondente ao estado de maturação mais avançado da cultura (pastoso/duro). A silagem B, com baixo teor energético, igualou os valores de crescimento animal apresentados pela silagem A, mas quando em dieta com mais energia originou melhores performances nos animais. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 – ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTS, – Official methods of analysis. Washington, AOAC, 1985. 2 – DENTINHO, M. T. et al. – Valor Alimentar do Triticale Forrageiro, "Pastagens e Forragens", vol. 14/15, 1994, p. 189-198. 96 PASTAGENS E FORRAGENS 19 3 – DIAS, J. C. S. – O Triticale como Cultura Forrageira no Campo Albicastrense, "Pastagens e Forragens", Elvas, 8 (1) 1987, p. 147-160. 4 – GOERING, H. K.; VAN SOEST, P. J. – Forage fiber analysis. Washington DC, U.S. Dep. Agri., 1970. (Agricultural handbook n.º 379). 5 – KRISTENSEN, V. F. – The prodution and feeding of whole-crop cereals and legumes in Denmark. In: "Whole-crop cereals". 2nd ed. Kingston, Kent, UK, Chalcombe Publications, 1992, p. 21-38. 6 – PARKER, R. B. – Methodology for determining quality of silage. Fermentation of silage – a review. Rosendale, Lancashire, UK, National Feed Ingredients Association, 1978. 7 – QUEIROGA, M. R.; SERRANO, J. M.; LOURENÇO, M. E. – The triticale as compared to oats for forage. In: "Grassland Science in Europe, Ecological Aspects of Grassland Management". 17th European Grassland Federation Meeting, 1988, p. 855-858. 8 – ROYO, C. – El Triticale; bases para el cultivo y aprovechamiento. Madrid, MundiPrensa, 1992. 9 – ROYO, C. et al. – Triticale and other small grain cereals for forage and grain in Mediterranean conditions. "Grass and Forage Science", vol. 48, 1993, p. 11-17. 10 – TETLOW, R. M. – A decade of research into whole-crop cereals at Hurley. In: "Whole-crop cereals". 2nd ed. Kingston, Kent, UK, Chalcombe Publications, 1992, p. 1-20. 11 – TETLOW, R.; WILKINSON, J. M. – Whole-crop cereals for beef cattle. In: "Whole-crop cereals". 2nd. ed. Kingston, Kent UK, Chalcombe Publications, 1992, p. 73-84. 12 – TILLEY, J. A.; TERRY, R. – A two-stage technique for the in vitro digestion of forage crops. "Journal of the British Grassland Society", vol. 18, 1963, p. 104-111. 13 – VARUGHESE, G.; BARKER T.; SAARI, E. – Triticale. Mexico, CIMMYT, 1987. 14 – WELLER, R. F. – The National whole-crop cereals. In: "Whole Crop Cereals". 2nd ed. Kingston, Kent, UK, Chalcombe Publication, 1992, p. 137-156. PASTAGENS E FORRAGENS 19 97 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 99–112. FLUXOS DE AZOTO EM EXPLORAÇÕES DE BOVINICULTURA LEITEIRA INTENSIVA NO NOROESTE DE PORTUGAL* Henrique Trindade, João Coutinho♦, Nuno Moreira Departamento de Fitotecnia e Eng.ª Rural, ♦Departamento de Edafologia Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro – Apartado 202 – 5001-911 VILA REAL Resumo A intensificação da produção vegetal e animal verificada nas explorações forrageiras de bovinicultura leiteira causa, tal como acontece em outros sistemas agrícolas muito intensivos, efeitos prejudiciais sobre o meio ambiente envolvente devido, entre outros factores, à utilização de elevadas doses de fertilizantes. Neste trabalho apresentam-se os resultados referentes à avaliação, em duas explorações do Entre Douro e Minho, durante vários anos, das entradas e saídas de azoto (N) consideradas ao nível global da exploração e dos subsistemas animal e vegetal As entradas anuais de N nas explorações através da aquisição de alimentos concentrados para animais e de adubos atingiram os 625 kg N por hectare de SAU, sendo até 50 % daquele valor devidos à utilização de alimentos concentrados. As saídas de azoto através de produtos pecuários (maioritariamente leite) atingiram os 150 kg N ha-1, valor correspondente a cerca de 20 % do N ingerido pelos animais. Embora a aplicação de chorume, efectuada aquando da instalação das culturas, permita a reciclagem de parte do azoto excretado pelos animais, quantidades importantes deste nutriente (≈ 210 kg N ha-1) são perdidas nos estábulos e durante o armazenamento, principalmente por volatilização de amoníaco. A determinação das entradas e saídas de N do solo durante dois anos (Junho/1994 a Maio/1996) em duas parcelas sujeitas ao sistema cultural caracterizado revelou que, para além do N proveniente do chorume (≈ 360 kg N ha-1), as culturas receberam através da adubação até mais 300 kg N ha-1, tendo cerca de 75 % dessa quantidade sido aplicada à cultura do milho. A exportação de N das parcelas através da produção de forragens apresentou valores entre 340 e 400 kg N ha-1 ano-1. A principal perda de azoto do solo ocorreu através da lixiviação de ião nitrato, em média 245 kg N ha-1 ano-1, tendo uma das parcelas alcançado o valor de 350 kg N ha-1. Estas perdas ocorreram maioritariamente nos meses de Outubro a Dezembro. As perdas por volatilização de amoníaco após a distribuição de chorume nas parcelas foram mais reduzidas, apresentando o valor máximo de 50 kg N ha-1 ano-1. Relevante é o facto de 50 a 85 % das perdas por emissão de amoníaco ocorrerem nas 10 horas seguintes à aplicação do chorume ao solo sem incorporação. * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF. Castelo Branco, Maio de 1998. Trabalho financiado pelo projecto de investigação STRIDE B 170/92. 99 Com base nos resultados obtidos, referem-se algumas medidas que possibilitam a redução das perdas no sistema solo-planta destas explorações, cujo estudo prossegue. PALAVRAS-CHAVES: Azoto; Explorações leiteiras; Chorume; Lixiviação nitratos; volatilização amoníaco; Desnitrificação; Balanço N. Abstract In recent decades a very intensive dairy farming system has been developed in the Northwest region of Portugal based on two forage crops per year, maize silage and a winter crop, and heavy nitrogen inputs through slurry and mineral fertilizers. The risk of environmental damage associated with such an intensive system is very high. This work shows results of a study conducted to assess the inputs and outputs of N at the farm, field and animal system level. Farm annual inputs of N by concentrate feeding and mineral fertilizers reached 625 kg per hectare of cultivated land with 50% of this value being due to the concentrate feeding. N output by animal products (mainly milk) reached 150 kg N ha-1, value that represents 20 % of the N ingested by animals. Although slurry application to the soil allows the recycling of part of excreted N, important amounts (≈ 210 kg N ha-1) were lost on the stables and storage, mainly by ammonia volatilization. Data on inputs, flows and N outputs from the soil were gathered at plots in two representative farms over a two-year period (from June 1994 to May 1996). In addition to the N supplied by the slurry (≈ 360 kg N ha-1) crops received mineral fertilizer till more 300 kg N ha-1, with c.75 % of this value being applied to the maize crop. The amounts of N removed by the crops reached values between 340 and 400 kg N ha-1 year-1. The main loss of N from soil occurred by nitrate leaching, averaging 245 kg N ha-1 year-1 with a maximum measured loss of 350 kg N ha-1 at a location in one year. Those losses occurred mainly between October and December. Losses by ammonia volatilization after slurry spreading to the soil without incorporation were smaller, showing a maximum value of 50 kg N ha-1 year-1 and with 50 to 85 % of the total ammonia emission occurring in the first 10 hours after slurry application. Based on the results obtained a group of integrated measures for reducing the losses and improving efficiency of N use in this intensive system were proposed and discussed. KEY WORDS: Nitrogen; Dairy Farming; Nitrate leaching; Ammonia volatilization; Cattle slurry; Denitrification; Nitrogen balance. 1 – INTRODUÇÃO Nas últimas décadas desenvolveu-se, no Noroeste de Portugal, um sistema agropecuário muito intensivo, com base em duas culturas forrageiras anuais: o milho silagem e uma cultura intercalar de Inverno constituída por uma ferrã, mistura de cereais praganosos e azevém, ou azevém estreme. Este sistema caracteriza-se (8) essencialmente por: 100 PASTAGENS E FORRAGENS 19 • o efectivo pecuário ser constituído principalmente por bovinos leiteiros mantidos em estabulação permanente com encabeçamentos muito elevados, entre as 4 e as 7 cabeças normais (CN), por hectare; • o consumo de alimentos concentrados adquiridos ser de 0,3 a 0,4 kg por litro de leite, a produção média por estábulo ser em geral de 5 a 7 mil litros de leite por vaca e por ano e em diversas explorações ultrapassar os 30 mil litros ha-1 ano-1; • as produções forrageiras unitárias serem muito elevadas, frequentemente superiores às 30 t MS ha-1 ano-1 e sendo a forragem preferencialmente destinada a ensilar. A importância económica a nível regional, ou mesmo nacional, deste sistema agro-pecuário é muito significativa. Segundo Rolo ( 10), no limiar dos anos 90, nas regiões de Entre Douro e Minho (EDM) e da Beira Litoral (BL), o Valor Acrescentado Bruto a preços de mercado (VABpm) gerado pela actividade de produção de leite de bovino atingiu os 26 milhões de contos, valor correspondente a 67% do VABpm da actividade em Portugal continental e representando 7,4% do VABpm total da agricultura. Ao nível regional, a produção de leite bovino naquele período representou cerca de 29 e 17% do VABpm total da agricultura, respectivamente na região de EDM e da BL. As culturas forrageiras em que assenta o sistema de bovinicultura leiteira intensiva, além da adubação mineral azotada que atinge valores compreendidos entre 200 e 300 kg N ha-1 ano-1, beneficiam ainda do azoto proveniente da aplicação de chorume, via por que são maioritariamente aproveitadas as dejecções animais. Em geral, a distribuição de chorume nas parcelas é efectuada aquando da instalação das culturas, podendo representar uma aplicação adicional de 400 kg N ha-1 ano-1. A intensificação da produção vegetal e animal verificada neste sistema agro-pecuário causa certamente efeitos prejudiciais ao meio ambiente envolvente. O impacto ambiental da actividade será muito acentuado, em particular no que se refere ao elemento azoto, devido às elevadas quantidades deste nutriente utilizadas e ao seu comportamento nos solos agrícolas (4). Atendendo à necessidade de avaliar os riscos ambientais procedeu-se à realização de um trabalho com o objectivo de quantificar as entradas, as saídas e os fluxos de azoto ao nível global de duas explorações do EDM e dos seus subsistemas animal e vegetal. PASTAGENS E FORRAGENS 19 101 2 – MATERIAL E MÉTODOS 2.1 – Determinação das entradas e saídas de azoto das explorações através de produtos adquiridos e vendidos As explorações onde foi realizado o trabalho experimental localizavam-se uma em Paços de Ferreira (Estação Experimental de Leite e Lacticínios, DRAEDM) e outra em Vila Cova no concelho de Barcelos (Exploração Agro-Pecuária Casa do Rego). Nestas explorações procedeu-se à avaliação de todas as entradas e saídas de azoto decorrentes da aquisição e venda de produtos. Essa informação, compilada a partir de registos e da contabilidade das empresas, foi obtida para os anos civis de 1992 a 1995 (4 anos) em Paços de Ferreira e 1994 e 1995 (2 anos) em Vila Cova. As entradas de azoto através de alimentos concentrados para animais (ACA) foram calculadas utilizando a concentração de proteína inscrita nos rótulos das embalagens dos produtos. As saídas de azoto das explorações através de produtos pecuários foram determinadas considerando o valor de 17,2% de proteína bruta (PB) para a carne e a % PB do contraste leiteiro ou, nos anos em que este não existia, o valor de 3,3% PB. Para a conversão em quantidades de N dividiram-se os valores de proteína bruta pelo factor 6,25, no caso da carne e ACA, e 6,38, no caso do leite. 2.2 – Determinação das entradas e saídas de azoto em parcelas cultivadas Nos dois locais de ensaio e durante dois anos, de Junho/94 a Maio/96, efectuou-se a medição dos fluxos internos de N na exploração e numa parcela sujeita ao sistema cultural caracterizado. A dimensão da parcela utilizada foi de 50×50 m em Paços de Ferreira e de 50×40 m em Vila Cova. Nessas parcelas, sujeitas há vários anos ao sistema cultural caracterizado e, portanto, onde se considera que os fluxos de N se encontram em equilíbrio, efectuaram-se as seguintes determinações: – Taxa de mineralização de N orgânico e teor de N mineral no solo ao longo do ano. A taxa de mineralização de N orgânico foi medida para a camada mais superficial de solo (0-10 cm) recorrendo ao método de incubação in situ de cilindros de solo com acetileno, descrito por Ryden et al. (12). A duração das incubações e o intervalo entre amostragens foi de 15 dias. Este método permitiu ainda 102 PASTAGENS E FORRAGENS 19 estimar as perdas por desnitrificação, utilizando para tal a variação dos teores de nitrato do solo durante a incubação. O teor de N mineral foi determinado até 3 0 cm de profundidade. – Adições de N ao solo através de deposição atmosférica e água de rega. Para tal foram recolhidas amostras de água de precipitação e de rega, nas quais se procedeu à determinação da concentração de N. As quantidades de N adicionadas ao solo por estas vias foram estimadas, utilizando os valores das dotações de rega e da precipitação, com base em registos efectuados nos dois locais. – Adição de N ao solo através de adubos e da aplicação de chorumes. As quantidades de adubos minerais e de chorumes aplicadas a cada parcela foram registadas. Nos chorumes procedeu-se ainda à analise laboratorial do seu teor em azoto orgânico e mineral. – Perdas de azoto por volatilização de amoníaco após a distribuição do chorume nas parcelas. A medição destas perdas foi efectuada utilizando o método de balanço de massa micrometeorológico descrito por Ryden e McNeil ( 11 ). A distribuição de chorume nas parcelas foi efectuada à instalação do milho e da cultura de Inverno e a medição das perdas por volatilização prolongou-se por um período de 3 a 6 dias após a aplicação. – Perdas de N por lixiviação de nitratos. Os valores foram obtidos mediante o cálculo da quantidade de água drenada pelo solo das parcelas e da medição da concentração de ião nitrato na água. O último parâmetro foi determinado recorrendo à instalação de 24 cápsulas de cerâmica a 1 m de profundidade em cada local, as quais permitiram a amostragem regular da solução do solo. Os volumes de água drenada foram calculados diariamente através do balanço hídrico do solo realizado com base em dados meteorológicos recolhidos em estações colocadas junto às parcelas. – Produções vegetais e exportação de N pelas forragens. Estes dados foram obtidos pela amostragem das culturas na altura dos cortes e pela determinação laboratorial do teor de azoto da forragem. Para verificar a representatividade das parcelas em estudo foram também amostradas as outras parcelas da exploração. A cultura da época estival foi, em ambos os locais, o milho. A cultura intercalar de Inverno foi constituída, em Paços de Ferreira, por uma mistura de aveia e azevém anual, semeada respectiva- PASTAGENS E FORRAGENS 19 103 mente às densidades de 100 e 15 kg ha -1 e em Vila Cova por uma mistura de aveia, cevada e azevém anual semeada respectivamente às densidades de 65, 100 e 15 kg ha -1. Em Paços de Ferreira foi ainda amostrada regularmente a cultura de luzerna, que ocupava uma área significativa da exploração. Dado esta cultura não beneficiar da aplicação de chorume a forragem produzida foi considerada como sendo adquirida ao exterior. A descrição pormenorizada das metodologias utilizadas na medição dos fluxos e das técnicas laboratoriais de análise de azoto nas amostras de solo, chorume, forragens, água de rega e precipitação e água do solo pode ser consultada em Trindade ( 13 ). 3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO 3.1 – Fluxos de azoto nas explorações No quadro 1 caracterizam-se sumariamente a estrutura e a actividade das explorações agrícolas onde decorreu o trabalho. Apresentam-se os valores médios dos anos de 1994 e 1995, uma vez que para a mesma exploração e entre os anos em estudo não foram observadas variações importantes nos parâmetros avaliados. No entanto, entre si as duas explorações revelaram pequenas diferenças. Em Vila Cova, os valores de consumo de adubos azotados pelas culturas forrageiras e de encabeçamento animal foram superiores e os de produção de leite por vaca inferiores aos valores verificados em Paços de Ferreira. Estas observações parecem indicar diferenças relativamente ao nível da produção de forragens e da produção animal, estando a primeira actividade mais intensificada em Vila Cova e a segunda em Paços de Ferreira. A adubação mineral das culturas adicionou ao solo 195 e 300 kg N ha-1 ano respectivamente em Paços de Ferreira e em Vila Cova, tendo sido cerca de 75 % do adubo aplicado à cultura de milho. Os bens pecuários produzidos pelas explorações foram maioritariamente o leite, embora na exploração de Vila Cova tenha sido efectuada com significado apreciável a recria de animais para carne. -1 Na figura 1 apresentam-se os fluxos médios de azoto em cada exploração, expressos em kg N por hectare de SAU e por ano, elaborados com base nas medições dos vários processos do ciclo do N efectuadas nas parcelas experimentais e nas características e quantidades de bens adquiridos e vendi- 104 PASTAGENS E FORRAGENS 19 dos. Em Paços de Ferreira, uma parte considerável da SAU (≈ 50 %) encontrava-se ocupada com luzerna. Os cálculos foram efectuados excluindo esta cultura e considerando a forragem por ela produzida como exterior à exploração. Portanto, os fluxos apresentados para esta exploração apenas consideram as parcelas cultivadas com milho e cultura intercalar de Inverno. As entradas de N nas explorações através de alimentos concentrados para animais e de adubos atingiram 565 e 625 kg N ha-1 ano-1, respectivamente em Paços de Ferreira e em Vila Cova, incluindo no primeiro local a entrada de N através da luzerna. Os ACA são responsáveis por cerca de 50 % das entradas de azoto nas explorações. QUADRO 1 – Caracterização da estrutura e actividade das explorações agro-pecuárias em estudo. SAU (ha) Número de parcelas Repartição da SAU (ha): Milho silagem/cultura de Inverno Luzerna Paços de Ferreira 14,3 8 7,3 7,0 Adubação azotada das forragens anuais (kg N ha-1): Milho silagem Cultura de Inverno Efectivos bovinos (CN): Vacas leiteiras Novilhos(as) Vitelos(as) Encabeçamento (CN ha-1)* Produção de leite (l vaca-1 ano-1) Alimentos adquiridos ao exterior (kg): Leite substituição (22,5 %PB) Concentrado para vacas (22,0 %PB) Concentrado para novilhos(as) (15,0 %PB) Concentrado para vitelos(as) (16,5 %PB) Luzerna (21,5 %PB) "Drêche" de cevada ( ≈ 4,9 %PB) Feno Produtos animais exportados: Leite (l) Carne Vila Cova 10,2 9 10,2 – 145 50 220 80 47 14 8 30 29 8 4,3 5,8 7 360 5 660 500 000 000 000 000 – – 880 44 000 18 000 21 000 – 80 000 12 500 100 10 3 115 346 000 15 vacas 170 000 8 vacas 30 novilhos** *Excluídos vitelos **Animais com 400 kg PV. PASTAGENS E FORRAGENS 19 105 * valor estimado por diferença; ** a mineralização líquida de N orgânico foi determinada apenas para a camada de solo até 10 cm de profundidade, pelo que os valores reais de mineralização anual são superiores aos apresentados. FIGURA 1 – Fluxos médios anuais de azoto (Junho/94 a Maio/96, expressos em kg N ha-1) observados na exploração agro-pecuária de Paços de Ferreira (em cima) e na exploração agro-pecuária de Vila Cova (em baixo). As saídas de azoto através de produtos pecuários correspondem, em média, apenas a cerca de 20 % do N ingerido pelos animais, pelo que quantidades apreciáveis deste elemento são recicladas internamente na exploração, através da aplicação de chorume nas parcelas (360-390 kg N ha-1 ano-1), 106 PASTAGENS E FORRAGENS 19 ou são perdidas nos estábulos e/ou durante o armazenamento (210-215 kg N ha -1 ano-1). A eficiência de utilização de N pelos animais situou-se dentro dos valores apresentados para vacas leiteiras (3 ). O facto do valor observado para este parâmetro em Paços de Ferreira ser ligeiramente superior ao de Vila Cova pode dever-se à existência nesta última de animais de recria, menos eficientes na utilização dos nutrientes da dieta ( 3), ou ainda à menor produtividade das vacas leiteiras. O aumento da produtividade dos animais é mesmo apontado como uma medida que permite aumentar a eficiência de utilização e reduzir os excessos de N e o seu impacto ambiental, uma vez que nesta situação se verifica uma redução da proporção do N total ingerido que é utilizado para satisfação das necessidades de conservação dos animais (6). O total de azoto adicionado anualmente ao solo em Paços de Ferreira e em Vila Cova calculou-se ter sido, respectivamente, de 593 e 689 kg N ha-1. A remoção através da forragem atingiu valores da ordem dos 360-390 kg N ha -1 ano-1. A produção de matéria seca das forragens foi muito elevada, com valores entre 18 e 24 t MS ha-1 na cultura de milho e entre 7 e 11 t MS ha-1 na cultura de Inverno. Embora grande parte do azoto fornecido através do chorume tenha sido na forma orgânica (entre 70 e 85 %), estas adições em conjunto com outros resíduos e matéria orgânica do solo permitiram a manutenção de taxas de mineralização elevadas e regulares ao longo do ano. Apenas na camada de solo até 10 cm de profundidade foram disponibilizados, em média, durante o período de ocupação do solo pela cultura de milho e pela cultura de Inverno, respectivamente, 60 e 100 kg N ha-1 em Paços de Ferreira e 105 e 125 kg N ha -1 em Vila Cova. Considerando que, nestes solos, as adições de materiais orgânicos e o processo de decomposição se encontram em equilíbrio, então a mineralização terá ocorrido até profundidades do solo mais elevadas do que os 10 cm considerados neste trabalho. Weier e MacRae (14 ) verificaram que o processo de mineralização em solos aráveis pode ocorrer com taxas significativas até profundidades superiores a 60 cm. Será portanto de esperar que as quantidades de azoto disponibilizadas para as culturas por esta via tenham sido mais elevadas. Em relação às concentrações de N mineral no solo verificou-se que predominou a forma nítrica. A concentração desta forma azotada apresentou grandes variações ao longo do ano, ocorrendo os valores mais elevados durante a cultura de milho. As concentrações de azoto nítrico no solo, no período em que a cultura de milho apresentava 20 a 30 cm de altura, atingiram 37 a 53 mg N-NO3- kg-1, respectivamente em Paços de Ferreira e em PASTAGENS E FORRAGENS 19 107 Vila Cova, valores superiores aos 25 mg N-NO3- kg-1 que Magdoff et al. (5 ) referem como suficientes na camada arável (0-30 cm) para a máxima produção da cultura de milho. 3.2 – Perdas de azoto do solo Em ambos os locais, a perda de N do solo ocorreu principalmente através da lixiviação de nitratos, atingindo em média anualmente o valor de 153 kg N ha-1 em Paços de Ferreira e de 338 kg N ha -1 em Vila Cova. A textura franco-arenosa dos solos e as condições climáticas da região, com mais de 600 mm de água drenada entre Outubro e Março, tendem a promover a lixiviação da totalidade do azoto nítrico existente no solo após a cultura do milho, e ainda de algum do N disponibilizado por mineralização durante a estação fria. Os valores muito mais elevados observados em Vila Cova estão de acordo com a maior adição de N ao solo nesta localização, o que conduz a concentrações superiores de N residual após a cultura de milho. Embora as quantidades de azoto exportadas pela cultura de Inverno sejam importantes (83 a 118 kg N ha-1), devido à sua instalação muito tardia no Outono esta cultura não se revelou eficiente na absorção do N deixado no solo pela cultura de milho. A quantidade de azoto absorvido pela cultura intercalar antes deste ser lixiviado das camadas superiores do solo depende principalmente da data de sementeira. Por exemplo, Brinsfield e Staver (2) verificaram que uma cultura de centeio semeada no fim de Setembro ou um mês mais tarde, em meados de Dezembro tinha assimilado respectivamente 130 e 30 kg N ha. As perdas por volatilização de amoníaco após a distribuição de chorume ao solo variaram entre 1,6 e 48,4 % do total de N amoniacal aplicado, valores que correspondem, em termos absolutos, a perdas, após cada distribuição, compreendidas entre 0,3 e 31,5 kg N ha-1. Entre 50 e 82 % das emissões totais de amoníaco verificaram-se nas 10 horas que se seguiram à aplicação. Esta cinética de evolução das perdas por volatilização foi observada por outros autores (9 ), que referem a importância da injecção do chorume no solo ou da sua incorporação imediata como medidas de redução efectiva das perdas. As perdas por desnitrificação estimaram-se em 15 e 25 kg N ha-1 ano -1, respectivamente em Paços de Ferreira e em Vila Cova. As condições que favorecem a desnitrificação são principalmente a existência de substratos orgânicos facilmente degradáveis, elevadas concentrações de nitratos e humidade no solo (1). Estas condições ocorrem essencialmente durante a cultura de 108 PASTAGENS E FORRAGENS 19 milho, em momentos esporádicos após a prática da rega e de fertilizações de cobertura, pelo que devem ter originado taxas de desnitrificação elevadas mas durante curtos intervalos de tempo. Durante a estação chuvosa, em consequência da lixiviação, as concentrações de nitrato no solo apresentaram sempre valores baixos, pelo que as perdas por desnitrificação neste período devem ser reduzidas. Para a redução do impacto ambiental deste sistema de exploração e aumento da eficiência de utilização do azoto sugerem-se as seguintes medidas: – Redução das adubações azotadas às culturas. As importantes quantidades de N que entram no sistema através dos concentrados e que são transferidas pelo chorume para o solo são praticamente suficientes para a obtenção de elevadas produções forrageiras. As adubações azotadas devem servir apenas de complemento e a sua necessidade determinada em função do balanço de nutrientes, atendendo ao valor fertilizante do chorume, ou então utilizando métodos de campo expeditos para o cálculo racional da adubação. – A aplicação de chorume à sementeira da cultura de Inverno deve ser evitada para não aumentar a disponibilidade de N no solo numa época em que os riscos de lixiviação são máximos. Esta aplicação poderia ser atrasada até aos fins do Inverno, período em que a cultura intercalar é muito mais eficiente na absorção do azoto disponível no solo. – Efectuar a sementeira da cultura de Inverno o mais cedo possível, por forma a permitir que as plantas absorvam o máximo de azoto residual após a cultura de milho. Esta prática pode levar à necessidade de aproveitamento, mais cedo no Inverno, da produção desta cultura, originando dificuldades na gestão da alimentação das vacas e a necessidade de equacionar as espécies vegetais utilizadas neste cultivo. – As perdas por volatilização de amoníaco após a distribuição de chorume, embora não se tenham revelado muito importantes, podem ser reduzidas caso se adoptem técnicas de aplicação que reduzam o contacto do chorume com o ar, como sejam a distribuição em bandas localizadas à superfície do solo ou a incorporação mecânica (p. ex. por gradagem) imediatamente após a sua distribuição (15). Uma vez que o tipo de exploração considerada se situa geralmente em regiões densamente habitadas, o uso destas técnicas, além de possibi- PASTAGENS E FORRAGENS 19 109 litar uma acentuada redução da emissão de amoníaco, permitiria também a redução dos maus odores, facto que minimiza os potenciais conflitos entre a actividade pecuária e as populações. – Introdução de soluções técnicas nas instalações pecuárias que permitam a redução das perdas nos estábulos. Essas soluções abrangem o desenho e construção do pavimento e sistema de remoção das dejecções, tipo de fossa de armazenamento do chorume, utilização de substâncias químicas na lavagem do pavimento e/ou sua adição ao chorume e o controle das dietas animais (7). 4 – CONCLUSÕES Os resultados obtidos revelam que as entradas de azoto nas explorações de bovinicultura leiteira intensiva do Noroeste do País atingem valores muito importantes (≈ 650 kg N ha-1), permitindo uma elevada produtividade vegetal e animal, mas conduzindo igualmente a perdas para o meio ambiente muito acentuadas, em especial através da lixiviação de nitratos (em média 245 kg N ha-1 ano-1). A aplicação de chorume às culturas permite a reciclagem de parte do azoto excretado pelos animais, embora quantidades importantes do elemento sejam perdidas nos estábulos ou durante o armazenamento (≈ 210 kg N ha-1 ano-1). Para a redução das perdas e aumento da eficiência de utilização do N nestas explorações é necessária a adopção integrada de medidas, nomeadamente: a) redução das fertilizações azotadas das culturas, b) substituição da aplicação de chorume à instalação da cultura intercalar pela aplicação em fins de Inverno, c) sementeira da cultura intercalar o mais cedo possível, d) utilização de técnicas que reduz, a emissão de amoníaco aquando da aplicação de chorume ao solo, e) utilização de técnicas que reduza a emissão de amoníaco nas instalações pecuárias. As possibilidades e efeitos de algumas destas medidas encontram-se presentemente a ser investigadas no âmbito de um projecto PAMAF (n.º 3005). AGRADECIMENTOS Os autores agradecem a todos os funcionários da Estação Experimental de Leite e Lacticínios da DRAEDM, em especial ao seu Director, e ao responsável pela Exploração Agro-Pecuária Casa do Rego, Sr. José Maria Gonçalves Vila Chã, todo o apoio e facilidades concedidas na realização do trabalho experimental. 110 PASTAGENS E FORRAGENS 19 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 – AULAKH, M. S.; DORAN, J. W.; MOSIER, A. R. – Soil denitrification - Significance, measurement, and effects of management. "Advances in Soil Science", vol. 18, 1992, p. 1-57. 2 – BRINSFIELD, R. B.; STAVER, K. W. – Use of cereal grain cover crops for reducing groundwater nitrate contamination in the Chesapeake Bay region. In: "Cover Crops for Clean Water". Proceedings of an International Conference, West Tennessee Experiment Station, 9 - 11 April 1991, p. 79-82. 3 – JARVIS, S. C.; HATCH, D. J.; ROBERTS, D. 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J. – Research on housing systems and manure treatment to reduce ammonia emission in dairy husbandry. In: "Proceedings of the Symposium Applied Research for Sustainable Dairy Farming", Wageningen, The Netherlands, 31 May-2 June 1995, p. 36-39. 8 – MOREIRA, Nuno – Situação e Perspectivas da Produção Forrageira Intensiva no Entre Douro e Minho. "Pastagens e Forragens", vol 14/15, 1993/1994, p. 31-40. 9 – PAIN, B. F. et al. – Anglo-Dutch experiments on odour and ammonia Emissions following the spreading of piggery wastes on arable land. In: "Report 91-9", Wageningen, The Netherlands, Institute of Agricultural Engineering, 1991. 10 – ROLO, J. A. C.– Produção Final, Consumo Intermédio e Valor Acrescentado Bruto por Actividade da Agricultura e da Silvicultura em "1990": Ensaio de Regionalização para o Continente Português. Lisboa, Instituto Nacional de Investigação Agrária, 1995. 11 – RYDEN, J. C.; MCNEIL, J. E. – Application of the micrometeorological mass balance method to the determination of ammonia loss from a grazed sward. "Journal of the Science of Food and Agriculture", vol. 35, 1984, p. 1297-1310. 12 –RYDEN, J. C.; SKINNER, J. H.; NIXON, D. J. – Soil core incubation system for the field measurement of denitrification using acetylene-inhibition. "Soil Biology and Biochemistry", vol. 19, 1987, p. 753-757. PASTAGENS E FORRAGENS 19 111 13 –TRINDADE, H. – Fluxos e Perdas de Azoto em Explorações Forrageiras Intensivas de Bovinicultura Leiteira no Noroeste de Portugal. Tese de Doutoramento. Vila Real, UTAD, 1997. 14 –WEIER, K. L.; MACRAE, I. C. – Net mineralization, net nitrification and potentially available nitrogen in the subsoil beneath a cultivated crop and a permanent pasture. "Journal of Soil Science", vol. 44, 1993, p. 451-458. 15 –WOUTERS, A. P. – New application techniques make slurry again a valuable nutrient. In: "Proceedings of the Symposium Applied Research for Sustainable Dairy Farming", Wageningen, The Netherlands, 31 May-2 June 1995, p. 13-18. 112 PASTAGENS E FORRAGENS 19 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 113–119. VALOR DE PASTOREIO DAS COMUNIDADES ARBUSTIVAS DA RESERVA NATURAL DA SERRA DA MALCATA* Francisco Castro Rego, Paula Cristina Cardoso Gonçalves♦, Sofia Castelbranco da Silveira♦ Instituto Superior de Agronomia – Tapada da Ajuda – 1399 LISBOA CODEX ♦ Reserva Natural da Serra da Malcata – Rua dos Bombeiros – 6090 PENAMACOR RESUMO A exploração e gestão dos matos como complemento da alimentação dos herbívoros domésticos e o seu tradicional aproveitamento para a cama dos mesmos tem desempenhado um papel fundamental na economia das populações rurais. Apesar do gradual abandono a que a Reserva Natural da Serra da Malcata tem sido votada nas últimas décadas, a pastorícia extensiva continua a ser praticada especialmente nas partes setentrional e ocidental. O presente trabalho tem como objectivo caracterizar as diferentes formações arbustivas desta Área Protegida e quantificar a sua potencial importância na alimentação do gado através da determinação do valor de pastoreio de cada comunidade. PALAVRAS-CHAVES: Comunidade arbustiva; Reserva Natural da Serra da Malcata, Valor de pastoreio. ABSTRACT The use of shrubs as a complement of the diet for domestic herbivores and their traditional use in the pens of these farm animals have played a fundamental role in the economy of the rural populations. Despite the gradual abandonment that Serra da Malcata Nature Reserve has experienced over the last decades, extensive grazing is still active in the Northern and Western parts. This paper aims to characterise the different shrub formations of the Conservation Area and quantify their potential importance in livestock feed by calculating the grazing value of each community. KEY WORDS: Shrub community; Serra da Malcata Nature Reserve; Grazing value. * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF. Castelo Branco, Maio de 1998. Este trabalho foi parcialmente financiado pelo projecto PAMAF 8178 intitulado "O Pastoreio e o Mel nas Serras da Estrela e da Malcata. Bases Ecológicas para a Valorização Integrada e Sustentada dos Recursos da Beira Interior". 113 1 – INTRODUÇÃO Portugal é, por excelência, o país das "landes" (1). É disso exemplo a Reserva Natural da Serra da Malcata, onde a profunda e milenar influência humana deixou sinais bem marcados na vegetação, encontrando-se cerca de 50% da sua área dominados por comunidades arbustivas (2, 9 ). Estas apresentam aspectos distintos conforme aparecem em exposição setentrional ou meridional, em maior ou menor altitude ou consoante a composição florística das formações climácicas que as originaram (7). Segundo Catarino (3), a pastorícia e o fogo, o derrube e o arroteamento para os cereais foram as principais causas do desaparecimento do coberto arbóreo – sobretudo dos cimos e das encostas menos declivosas – restringindo-o ao fundo dos barrancos e zonas menos acessíveis. A exploração e gestão dos matos como complemento da alimentação de ovinos, bovinos e caprinos e o seu tradicional aproveitamento para a cama dos mesmos têm desempenhado um papel fundamental na economia das populações rurais desta região. Apesar do gradual abandono a que esta Área Protegida tem sido votada nas últimas décadas, a pastorícia extensiva continua a ser praticada especialmente nas partes setentrional e ocidental. O presente trabalho tem como objectivo caracterizar as diferentes formações arbustivas da Reserva e quantificar a sua potencial importância na alimentação do gado através da determinação do valor de pastoreio de cada comunidade. Este conceito, inicialmente proposto por De Vries em 1937 (6, 10), tem-se revelado uma abordagem interessante no estudo da dinâmica da vegetação importante na alimentação dos herbívoros domésticos. 2 – ÁREA EM ESTUDO A Reserva Natural da Serra da Malcata é constituída por um conjunto de cumes de forma suave, orientados essencialmente na direcção nordeste-sudoeste. Distribuída pelas principais bacias hidrográficas portuguesas (Douro e Tejo), encontra-se limitada a norte pelo rio Côa e entrecortada no centro e sul pela ribeira da Meimoa, e rio Bazágueda, respectivamente. O relevo da zona centro-sul caracteriza-se por diferenças de cota acentuadas – de 425 a 1078 metros – e fortes pendentes virados maioritariamente a 114 PASTAGENS E FORRAGENS 19 sul e a oeste; a norte a altitude varia entre 760 e 1078 metros e apresenta em geral vertentes expostas a norte e este, de declive menos acentuado (5). O clima classifica-se como sendo de natureza mediterrânica com nítida continentalidade, diversificando entre o mesomediterrânico das áreas localizadas no concelho de Penamacor e o supramediterrânico típico da região do Sabugal ( 12). A conjugação destas variáveis reflecte-se na vegetação climácica encontrada: a norte, mais frio e húmido, bosques supramediterrânicos de Quercus pyrenaica (carvalho negral ou carvalho pardo das Beiras); a sul, mais quente e seco, bosques mesomediterrânicos de Quercus rotundifolia (azinheira) e Quercus suber (sobreiro); no centro, com características climáticas intermédias, bosques mesomediterrânicos de Quercus pyrenaica (4, 8). 3 – METODOLOGIA Utilizaram-se os dados de 15 transectos rectangulares de 10 m2, instalados em 1991 para o projecto "Dinâmica Natural da Vegetação", nomeadamente em: • Comunidades dominadas por Cistus ladanifer (C1) – características das zonas mais baixas e declivosas, de solo esquelético, das bacias do rio Bazágueda e da ribeira da Meimoa – fortemente influenciadas pelo clima mediterrânico – representam a etapa mais degradada do azinhal e do sobreiral característicos desta região (4, 8). • Comunidades dominadas por Erica umbellata (C2) – urzais de baixo porte, concentram-se nas meias encostas soalheiras do concelho de Penamacor, sobre solos degradados e pouco profundos, constituindo um estado de avançada degradação dos sobreirais e carvalhais mesomediterrânicos de Quercus pyrenaica ( 4, 8). • Comunidades dominadas por Chamaespartium tridentatum (C3) – encontradas pontualmente nas altitudes mais elevadas da faixa central da Reserva, resultam geralmente da degradação de matos dominados por Erica australis e, pontualmente, Cytisus striatus ( 4, 8). • Comunidades dominadas por Erica australis (C4) – etapas de substituição dos bosques mesomediterrânicos de Querçus pyrenaica, são as comunidades arbustivas mais representativas desta Área Protegida, concentrando-se preferencialmente nas cotas superiores das partes centro e Sul (4, 8). PASTAGENS E FORRAGENS 19 115 • Comunidades dominadas por Cytisus multiflorus (C5) – giestais bastante abertos que se distribuem pelas vertentes viradas ao rio Côa, domínio da floresta supramediterrânica de Quercus pyrenaica, representam uma etapa primocolorizadora dos giestais de Cytisus striatus ( 4, 8 ). • Comunidades dominadas por Cytisus striatus (C6) – restringidas aos solos mais desenvolvidos da parte setentrional da Reserva, podem atingir portes superiores a dois metros. Segundo Lousã et al.( 8 ), correspondem, em certas condições, à primeira etapa de degradação dos carvalhais supramediterrânicos de Quercus pyrenaica. • Comunidades dominadas por Halimium alyssoides e Halimium ocymoides (C7) – comunidades primocolonizadoras de distribuição pontual, resultam, em grande parte dos casos, da degradação de matos de Erica australis, Cistus ladanifer e Erica australis e mesmo Erica umbellata ( 4 ). • Comunidades dominadas por Cistus ladanifer e Erica australis (C8) – surgem, nas altitudes mais elevadas das zonas centro e Sul, por degradação do solo e/ou como resultado do contacto entre as áreas de distribuição geográfica de Quercus rotundifolia e Quercus suber com Quercus pyrenaica ( 4, 8 ). 1 – Para a caracterização das formações arbustivas determinou-se o valor médio da percentagem de cobertura das espécies lenhosas e do solo nu, e da altura da espécie dominante. 2 – Para a determinação do valor de pastoreio das espécies arbustivas efectuou-se uma recolha bibliográfica do valor de pastoreio (grazing value) dos rebentos e folhas utilizados por ovinos e caprinos ( 6, 10 ), complementada por observações dos autores e comunicação pessoal de Papanastasis*. O valor do pastoreio é calculado a partir da velocidade de crescimento, valor nutritivo, palatabilidade e digestabilidade de cada espécie e apresenta-se geralmente sob a forma de uma escala que varia de 0 a 5 ( 10 ). Os valores coligidos resumem-se no quadro 1. * PAPANASTASIS, V. – Comunicação pessoal no âmbito do projecto "Modelling Vegetation Dynamics and Degradation in Mediterranean Ecosystems (ModMED)". 116 PASTAGENS E FORRAGENS 19 QUADRO 1 – Valor de pastoreio das espécies arbustivas. Espécie Valor de pastoreio da espécie Arbutus unedo (medronheiro) Calluna vulgaris (torga ordinária) Chamaespartium tridentatum (carqueja) Cistus ladanifer (esteva) Cistus psilosepalus Cistus salvifolius (sargaço) Cytisus multiflorus (giesteira branca) Cytisus striatus (giesteira das serras) Daphne gnidium (trovisco fêmea) Erica australis (urze vermelha) Erica umbellata (queiró) Genista triacanthos (ranha lobo, tojo nudar) Halimium alyssoides Halimium ocymoides Helichrysum stoechas (perpétua das areias) Lavandula luisieri (rosmaninho) Lavandula pedunculata (rosmaninho maior) Phillyrea angustifolia (lentisco bastardo) Quercus pyrenaica (carvalho negral, carvalho pardo das Beiras) Quercus rotundifolia (azinheira) 1 2 4 1 1 1 4 4 0 2 2 1 1 1 0 0 0 3 3 3 3 – Calculou-se, de seguida, o valor de pastoreio de cada inventário através do somatório dos produtos do valor de pastoreio da espécie pela área de cobertura correspondente. 4 – O valor de pastoreio de cada comunidade corresponde à média dos resultados da alínea anterior. 4 – RESULTADOS E DISCUSSÃO Da análise do quadro 2 salienta-se: • A Comunidade 1, dominada por Cistus ladanifer e com muito solo nu, é a que apresenta o valor de pastoreio mais baixo, seguida da Comunidade 8 em que dominam Cistus ladanifer e Erica australis. • Valores baixos observam-se também em situações em que a espécie dominante tem baixo valor (Comunidade 2, com Erica umbellata) ou em que o coberto vegetal é reduzido (Comunidade 5 com Cytisus multiflorus). • Valores mais elevados obtêm-se com percentagens de solo nu mais reduzidas (Comunidade 6 com Cytisus striatus) e com espécies de maior valor (Chamaespartium tridentatum e Halimium spp. nas Comunidades 3, 4 ou 7). PASTAGENS E FORRAGENS 19 117 QUADRO 2 – Valor médio da percentagem de cobertura das espécies lenhosas e do solo nu, e da altura da espécie dominante em metros e o valor de pastoreio da Comunidade (Ha - Halimium alyssoides; Ho - Halimium ocymoides; Cl Cistus ladanifer; Ea - Erica australis). Cistus ladanifer Phillyrea angustifolia Quercus rotundifolia Lavandula luisieri Genista triacanthos Lavandula pedunculata Daphne gnidium Calluna vulgaris Erica umbellata Chamaespartium tridentatum Halimium alyssoides Halimium ocymoides Erica australis Arbutus unedo Cytisus multiflorus Cistus psilosepalus Quercus pyrenaica Cytisus striatus Cistus salvifolius Helichrysum stoechas Solo Nu Altura da(s) Espécies Dominante (s) Valor de Pastoreio da comunidade C1 C2 40,39 3,67 0,23 2,65 2,18 0,75 0,04 3,84 0,22 1,55 8,43 C3 C4 C5 C6 0,20 0,26 C7 C8 0,79 2,68 37,33 0,06 7,11 59,18 0,98 2,53 6,45 7,29 0,01 60,10 16,40 1,32 0,96 2,94 4,07 25,24 12,99 2,24 60,87 0,16 3,50 5,99 40,15 0,48 7,07 3,22 5,26 1,93 10,91 0,98 34,80 37,28 10,43 6,46 0,65 51,07 0,36 54,50 39,34 9,43 21,18 6,93 44,68 26,23 0,85 0,47 0,48 0,88 0,61 1,06 8,89 18,73 28,44 25,74 18,90 23,81 0,26 0,01 1,81 3,24 Ha:0,36 Cl:0,88 Ho:0,42 Ea:0,76 24,14 17,47 5 – CONCLUSÕES A quantificação do valor de pastoreio dos diferentes tipos de formações arbustivas permitiu, por um lado, confirmar e, por outro, hierarquizar a importância desta vegetação na alimentação do gado. As comunidades com maior valor de pastoreio, localizadas a cotas mais elevadas (4, 8 ), são as que apresentam maior interesse, justificando a especial incidência de pastoreio nas zonas centro e Norte da Reserva Natural da Serra da Malcata. As comunidades de porte mais baixo – Erica umbellata, Chamaespartium tridentatum, Halimium alyssoides e Halimium ocymoides e Cytisus multiflorus – correspondentes a etapas pioneiras da sucessão, parecem atingir valores de pastoreio mais elevados em menos tempo. 118 PASTAGENS E FORRAGENS 19 Destaca-se entre estas a comunidade de Chamaespartium tridentatum, primeira etapa arbustiva de recuperação após o corte ou fogo ( 4), com o valor mais elevado; simultaneamente, é a que parece atingir mais rapidamente a fase de degeneração, razão pela qual a sua manutenção necessita, obrigatoriamente, de intervenções frequentes no tempo. BIBLIOGRAFIA 1 – BLANQUET, J. Braun; SILVA, A. R. 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Coimbra, Escola Superior Agrária, 1996. 10 – POISSONET, J.; POISSONET, P.; THIAULT, M. – Development of Flora, Vegetation and Grazing Value in Experimental Plots of a Quercus coccifera Garrigue. "Vegetatio", vol. 46, 1981, p. 93-104. 11 – REGO, F.; GONÇALVES, P.; SILVEIRA, S. – Estudo da Dinâmica da Vegetação através de Transectos Permanentes. "Anais do Instituto Superior de Agronomia", 44 (2) 1994, p. 531-547. 12 – SILVEIRA, S. – Análise Ecológica das Comunidades Vegetais da Reserva Natural da Serra da Malcata. Relatório de Estágio do Curso de Engenheiro Agrónomo. Lisboa, Instituto Superior de Agronomia, 1990. PASTAGENS E FORRAGENS 19 119 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 121–134. CARACTERIZAÇÃO TÉCNICO-ECONÓMICA DA PRODUÇÃO DA VITELA TRADICIONAL DO MONTADO* Sónia Isabel Simões Calção, Maria Raquel Ventura Lucas Departamento de Gestão de Empresas – Universidade de Évora – – Apartado 94 – 7000-083 ÉVORA CODEX RESUMO A valorização comercial dos produtos agro-alimentares tradicionais, que se distinguem dos produtos similares no mercado pelo seu modo de produção particular, proporciona uma mais-valia aos respectivos produtores e salvaguarda a genuinidade de um recurso importante das regiões desfavorecidas e da produção extensiva aí praticada. Com base em inquéritos realizados a treze produtores de bovinos de carne com explorações no Alentejo, este artigo tem como objectivo caracterizar técnica e economicamente a produção de carne de "vitela tradicional do montado" e avaliar globalmente os proveitos e custos das explorações. Os resultados indicam que, na estrutura de custos de cada uma das explorações, são fundamentalmente os custos com a alimentação dos animais e com os juros de capital, aqueles que têm maior peso. Quanto aos proveitos das explorações, estes variam bastante com a idade com que os animais são vendidos e com o valor dos subsídios a que cada uma das explorações tem direito. Pode-se contudo concluir que a generalidade dos produtores de "vitela tradicional do montado" está dependente das ajudas comunitárias e das ajudas nacionais para viabilizar a sua produção. PALAVRAS-CHAVES: Vitela tradicional do montado; Alentejo; Sistema de produção; Custos e proveitos. ABSTRACT The commercial valuation of the traditional agro-alimentary products, which may be distinguished from other similar products existing in the market by the particular way produced, provides an increment on the producer`s profits and it * Comunicação apresentada na XIX Reunião de Primavera da SPPF, Castelo Branco, Maio de 1998. 121 safeguards the genuineness of an important resource of poor regions as well as the extensive production practised there. Based on inquiries made to thirteen bovine meat producers owning herds in Alentejo, this article´s main purpose is the characterization of the "traditional veal of montado´s" production and the global evaluation of the profits and costs concerning herds. The results denote that the costs with the animal feeding and with the capital interests are, fundamentally, those which have a higher influence upon the costs' structure of each one of the herds. Herds' profits vary a lot with the age of each animal when sold and with the level of the subsidies that each herd is entitled to. One can conclude that the generality of the "traditional veal of montado's" producers is dependent on the communitary and governmental helps to viable his prodution. KEY WORDS: Tradicional veal of montado; Alentejo region; Livestock system; Costs and profits. 1 – INTRODUÇÃO No âmbito da reorientação da política agrícola comum procura-se incentivar a diversificação da produção agrícola e a promoção de produtos específicos. Apoiar a valorização comercial dos produtos tradicionais, através da sua certificação e acreditação junto do consumidor, pelo reconhecimento e protecção legal, ao nível nacional e comunitário, constitui um objectivo essencial da política para o sector agrícola nacional. Para cada um dos produtos certificados é reconhecido um agrupamento de produtores, que formula as regras de produção e comercialização e propõe o Organismo Privado de Controlo e Certificação (OPC). O Agrupamento de Produtores de Montemor-o-Novo, S.A. (ACOMOR), para valorizar a carne de bovinos criados em sistema extensivo, segundo um modo de produção tradicional, requereu o certificado comunitário de especificidade para a "carne de bovino tradicional do montado", a qual agrupa os nomes específicos de: "vitela tradicional do montado" (VTM), "novilho tradicional do montado" e "vaca tradicional do montado" ( 1, 2, 3, 4 ). Este certificado – reconhecimento da especificidade do produto pela Comunidade – assegura e comprova a especialidade tradicional garantida (ETG) dos produtos. Neste artigo, descreve-se o processo de produção da VTM de acordo com o definido no respectivo caderno de especificações e obrigações (1), 122 PASTAGENS E FORRAGENS 19 caracteriza-se tecnicamente a produção extensiva de bovinos de carne no Alentejo e avaliam-se economicamente os seus proveitos e custos globais. Para além da introdução, o artigo está organizado em mais 5 partes. Na primeira definem-se as especificações e obrigações da produção da VTM. Na segunda parte é feita a caracterização técnica da produção extensiva de bovinos de carne no Alentejo, nas explorações com potencialidades para a produção da VTM. Na terceira apresenta-se a metodologia utilizada para a caracterização económica. Por último, na quarta e quinta partes expõem-se, respectivamente, os resultados obtidos e as principais conclusões relativas aos objectivos do estudo. 2 – PRODUÇÃO DA VITELA TRADICIONAL DO MONTADO A VTM é um produto que tem a sua origem no sistema de produção extensiva de bovinos no Alentejo. A designação VTM foi a forma que a ACOMOR encontrou para diferenciar este produto no mercado, tendo em conta que existem outros produtos oriundos deste sistema. O tipo de produção da VTM está legislado e definido no caderno das especificações e obrigações. Neste caderno especifica-se que: • A carne de VTM provém da desmancha de vitelas criadas segundo os moldes tradicionais da exploração pecuária característica do montado e abatidas entre os 6 e os 12 meses de idade. O sistema de produção extensivo baseia-se no aproveitamento do montado de sobro e azinho, das pastagens espontâneas e vegetação de características xerófitas associadas a estes povoamentos arbóreos. • O desmame das vitelas nunca ocorre antes dos 6 meses, podendo ser fornecida ao animal, a partir dos 4 meses, uma alimentação complementar tradicional composta por erva, bolota, fenos e alimentos concentrados. Desde o desmame até à idade do abate as vitelas são alimentadas com pastagens existentes nos montados e, quando necessário, são complementadas com forragens, agostadouros (restolhos de culturas cerealíferas), bolota (fruto da azinheira), lande (fruto do sobreiro) e rama proveniente da esgalha do montado. Só é permitida a administração de concentrados energéticos e proteicos, exclusivamente vegetais, durante as fases críticas. Estes alimentos devem, tanto quanto possível, ser produzidos na própria exploração agrícola e, normalmente, são cereais (trigo, aveia, cevada, milho), proteagino- PASTAGENS E FORRAGENS 19 123 sas (tremocilha e tremoço doce), bagaços de oleaginosas (soja e girassol), luzerna desidratada, polpa de citrino e destilados de milho. A preparação e formulação destes alimentos concentrados são obrigatoriamente sujeitas a controlo do OPC. Neste caso, o OPC indigitado é a APORMOR – Associação de Produtores de Bovinos, Ovinos e Caprinos da região de Montemor-o-Novo. • A utilização de substâncias interditas é absolutamente proibida, quer seja aplicada directamente aos animais, quer seja administrada através da alimentação. • Em relação à condução do gado, esta segue as práticas e os moldes tradicionais deste modo de produção, sendo o encabeçamento máximo permitido de 0,5 cabeças normais (CN) por hectare e obrigatória a existência de uma relação mínima de 10 árvores por cada CN nas áreas forrageiras destinadas à alimentação do gado. • Todas as vitelas provêm de animais de raças de aptidão cárnica, explorados em linha pura ou cruzados entre si, sendo proibida a utilização de cruzamentos com animais de aptidão leiteira. As VTM têm de nascer e ser criadas em explorações inseridas na zona de montado, encontrando-se as respectivas mães na região há pelo menos 3 anos. • As explorações têm de estar classificadas num estatuto indemne ou oficialmente indemne de qualquer doença abrangida por Planos de Controlo e Erradicação (Brucelose, Tuberculose, Leucose, Peripneumonia Contagiosa dos Bovinos). É indispensável que todos os animais se encontrem saneados pelo Agrupamento de Defesa Sanitária (ADS), relativo à zona da exploração, e possuam o Boletim Sanitário Individual devidamente actualizado. 3 – CARACTERIZAÇÃO TÉCNICA Para caracterizar técnica e economicamente a produção da VTM realizaram-se inquéritos a treze produtores de bovinos de carne, com explorações potencialmente produtoras desta ETG, localizadas no Alentejo, que serão identificadas de 1 a 13 para manter o respectivo anonimato. Os efectivos de cada exploração são definidos por indicadores técnicos, produtivos e reprodutivos, expressos no quadro 1. Estes indicadores incluem fertilidade, mortalidade (adultos e jovens), substituição de machos e fêmeas, 124 PASTAGENS E FORRAGENS 19 relação macho/fêmeas, idade ao desmame, idade à 1ª cobrição e idade de refugo das fêmeas e machos. O quadro 1 inclui ainda as principais épocas de cobrição e o período de tempo que decorre entre a parição e a nova cobrição das vacas. Constatou-se que a maioria dos produtores escolhe como época principal de cobrição o período de Outubro a Março. Deste modo, o desmame dos vitelos dá-se na Primavera, altura em que a produção de pastagem é abundante (alimentação mais barata). Por outro lado, o final da época de partos coincide com a existência de bolota, um importante suplemento alimentar para as vacas, desde que acompanhado de matéria verde em quantidade. Contudo, três dos produtores inquiridos preferem como época principal os meses de Março a Maio. O período de tempo que decorre entre a parição e a nova cobrição é normalmente de 3 meses. O número de vitelos desmamados, produto principal das explorações, depende da eficiência reprodutiva das fêmeas, das taxas de mortalidade dos jovens e dos adultos. A eficiência reprodutiva, por sua vez, é afectada pela taxa de fertilidade (relação entre o número de vacas paridas e o número de vacas presentes à cobrição), cujos valores rondam os 90% e são idênticos em todas as explorações. A taxa de mortalidade dos adultos varia entre 1 e 6%. No entanto, a dos vitelos, desmamados com 6 a 8 meses na quase totalidade das explorações, é mais elevada e pode atingir os 10%. A relação média macho/fêmeas é de 1 para 46. Por ano são substituídos 7 a 33% dos machos e 8 a 12% das fêmeas, embora vários produtores não efectuem uma substituição anual do efectivo. A idade de refugo dos machos vai dos 5 aos 8 anos, e a das fêmeas dos 8 aos 15 anos. A idade das fêmeas à 1.ª cobrição varia entre os 18 e os 36 meses, enquanto que a idade dos machos varia entre os 15 e os 36 meses. A técnica reprodutiva da inseminação artificial apenas é utilizada em duas explorações. O método de identificação dos animais a que mais produtores recorrem é o brinco, embora em quatro explorações utilizem igualmente a tatuagem. O maneio higio-sanitário, semelhante em todas as explorações, consiste em desparasitações internas e externas, vacinações periódicas e eventuais intervenções terapêuticas, de acordo com os Agrupamentos de Defesa Sanitária relativos à zona das explorações. PASTAGENS E FORRAGENS 19 125 4 – CARACTERIZAÇÃO ECONÓMICA A metodologia utilizada foi o método dos orçamentos, tendo sido elaborados orçamentos parciais para as actividades vegetais e pecuárias e orçamentos gerais para cada uma das explorações. Os valores utilizados basearam-se nos inquéritos aos produtores. Os preços, dos produtos e dos factores, e as ajudas consideradas referem-se ao ano agrícola 1996/97. Nesses orçamentos dividiram-se as receitas e os custos. Constituem receitas das explorações as vendas dos produtos, principal e secundário, e os subsídios. As vendas do produto principal correspondem aos animais, descendentes do efectivo reprodutor das explorações, vendidos para carne. Ao número total de vitelos desmamados são descontadas as crias das fêmeas do polvilhal e os animais mantidos para substituição do efectivo adulto. As vendas do produto secundário referem-se aos animais (vacas e touros) de refugo. Os subsídios de que beneficia o sistema de produção extensiva de bovinos de carne incluem o prémio às vacas aleitantes, aos bovinos machos e as indemnizações compensatórias. Uma das explorações em estudo tem direito, como criadores de bovinos mertolengos, ao prémio à linha pura. Dentro das medidas agro-ambientais do IFADAP (Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas), existe um prémio para os sistemas forrageiros extensivos. Os custos, incluídos nos vários orçamentos, foram divididos em custos que constituem por um lado encargos reais e por outro encargos atribuídos. Os custos com encargos reais são os que realmente ocorrem, em consequência da produção da VTM. Estes custos foram divididos em custos com: mão-de-obra, tracção, alimentação, assistência veterinária, energia, seguros, conservações e reparações, amortizações, gastos gerais e reserva para riscos não seguráveis As contas da actividade pecuária apenas indicam a mão-de-obra directamente envolvida na actividade pecuária dos bovinos, uma vez que a mão-de-obra indirecta, isto é, relacionada com as actividades intermédias, está contabilizada no custo unitário dos alimentos auto-utilizados. Os custos com a mão-de-obra, permanente ou eventual, incluem três componentes: o salário mensal, os encargos sociais e o seguro de pessoal. A tracção diz respeito ao número de horas necessárias para transportar os alimentos conservados não pastoreados (feno, silagem, palha, concentrado, etc.) e água ao local de alimentação dos animais. Para diferenciar os alimentos, estes foram divididos em auto-utilizados (produzidos na exploração) e comprados ao exterior. Dentro dos alimentos auto- PASTAGENS E FORRAGENS 19 127 -utilizados existem os alimentos principais (fenos, silagens, pastagens) e os secundários (palhas e restolhos). Os alimentos principais são valorizados ao custo de produção, obtido através das contas de cultura para cada um dos alimentos, enquanto que as palhas, os restolhos e outros alimentos secundários valorizam-se ao preço de mercado. A quantidade de feno e de silagem é expressa em quilogramas de matéria verde, obtida pela multiplicação do número de hectares pela produção de matéria verde por hectare. Para as pastagens (natural, natural melhorada, de regadio e semeada) expressa-se a quantidade em hectares, sendo o preço unitário resultado da multiplicação entre o custo de produção por quilograma de matéria verde e a produção de matéria verde por hectare. Os alimentos comprados são igualmente valorizados ao preço de mercado. Os custos com a assistência veterinária são calculados de acordo com a quota anual paga pelos produtores de bovinos ao Agrupamento de Defesa Sanitária (ADS) ao qual estão associados. O custo da energia tem duas componentes: a energia necessária para retirar água dos depósitos (poços, furos, etc.) para os animais e a energia gasta com a iluminação. Relativamente aos seguros apenas foram levados em conta os seguros obrigatórios: Responsabilidade Civil (tractores) e Seguro Genérico Agrícola (seguro de pessoal). Este último está integrado no custo unitário da mão-de-obra. Os custos com as conservações e reparações das construções, dos melhoramentos fundiários e dos equipamentos são calculados multiplicando o valor dos capitais, obtido ao custo de substituição, por uma taxa convencionada em 2,5% para o capital fundiário e 3,5% para o capital de exploração (15). O custo de substituição dos capitais, obtido ao preço de mercado do ano de 1996, é o valor de aquisição dos bens em estado novo. As amortizações constituem a depreciação anual do montante de investimento efectuado baseada no valor de substituição dos capitais, tendo em conta a sua vida útil. Os custos com os gastos gerais representam uma majoração para possíveis erros efectuados no cálculo das despesas das explorações. Essa majoração traduz-se pela aplicação de uma taxa de 3% sobre o valor dos custos que originam pagamentos (15). A reserva para riscos não seguráveis corresponde a uma provisão para riscos não seguráveis, fixada em 3,5% do valor total dos encargos reais (15). Os custos com encargos atribuídos representam custos de oportunidade e de retribuição dos factores considerados próprios. Estes custos foram dividi- 128 PASTAGENS E FORRAGENS 19 dos em custos com: juros do capital próprio do empresário e remuneração do empresário. Os juros correspondem ao incremento que um determinado capital sofre quando é aplicado durante um dado intervalo de tempo. A remuneração do empresário equivale à retribuição do trabalho directivo do empresário. Este custo é calculado a partir da aplicação de uma taxa convencionada em 5% sobre o valor total dos custos que originam pagamentos ( 15). 5 – RESULTADOS A estrutura de custos das explorações, obtida a partir dos resultados das contas da actividade pecuária, está apresentada no gráfico 1 e no quadro 2. Após uma análise detalhada da estrutura de custos constatou-se que os maiores encargos, suportados pelos produtores de bovinos de carne em sistema extensivo, são os custos relacionados com a alimentação dos animais, em que os alimentos auto-utilizados representam 38% dos custos totais das explorações e os alimentos comprados 10,92%, e com os juros de capital (14,96% dos custos totais). As amortizações dos reprodutores e o trabalho especializado constituem, por sua vez, uma parcela significativa dos custos, sendo de 10, 12% e 6,61%, respectivamente. Por outro lado, as amortizações das plantações e das construções, os seguros e a assistência veterinária representam os custos menos significativos totalizando apenas 1% dos encargos totais das explorações. GRÁFICO 1 – Esturura dos custos médios das explorações. PASTAGENS E FORRAGENS 19 129 130 PASTAGENS E FORRAGENS 19 QUADRO 2 – Estrutura de custos das explorações. PASTAGENS E FORRAGENS 19 131 QUADRO 2 – Estrutura de custos das explorações (continuação). Os proveitos das explorações, representados no gráfico 2, variam bastante com a idade com que os animais são vendidos e com o valor dos subsídios a que cada uma das explorações tem direito. As vendas do produto principal constituem 66,7% da receita total das explorações, enquanto que as vendas do produto secundário representam somente 3,92%. O peso dos subsídios nos proveitos totais das explorações é de 29,4%. GRÁFICO 2 – Proveitos das explorações. No gráfico 3 apresentam-se os resultados globais (margens líquida e bruta) das 13 explorações. Verifica-se que 5 explorações têm margem líquida negativa, isto é, não pagam a totalidade dos encargos fixos, constituídos por amortizações, remuneração do empresário, juros de capital e reserva para riscos não seguráveis. Constatou-se que nestas explorações é significativamente maior a diferença entre o número de vacas aleitantes existentes na exploração e o número de quotas, isto é, o número de vacas elegíveis ao prémio à vaca aleitante. Por outro lado, muitos dos produtores possuem estruturas de produção sobredimensionadas (parques de máquinas exagerados, excesso de construções e barragens). Numa destas explorações a margem bruta é igualmente negativa, ou seja, as receitas nem chegam para cobrir os encargos variáveis relativos à produção da VTM. 132 PASTAGENS E FORRAGENS 19 GRÁFICO 3 – Margens líquida e bruta das explorações. 6 – CONCLUSÕES A carne de VTM, como produto que se pretende diferenciar no mercado e característico das regiões desfavorecidas que utiliza tecnologias de produção não intensivas, enquadra-se perfeitamente nas novas linhas de política adoptadas pela União Europeia, nomeadamente, a protecção do ambiente/ extensificação e a preservação da biodiversidade e do espaço rural. Tecnicamente não se verificam diferenças importantes ao nível dos indicadores produtivos e reprodutivos nas várias explorações. As receitas dependem essencialmente do número de vitelos vendidos que, por sua vez, varia com as taxas dos vários indicadores técnicos. Economicamente os resultados das explorações indicam que a generalidade dos produtores de bovinos está bastante dependente das ajudas comunitárias e ajudas nacionais, visto que o peso dos subsídios nas receitas totais das explorações atinge cerca de 30%. Os resultados indicam que os encargos mais representativos se relacionam com a alimentação dos animais e com os juros de capital, enquanto que as receitas provêm quase exclusivamente das vendas dos animais para carne e dos subsídios. PASTAGENS E FORRAGENS 19 133 Para terminar deve salientar-se que a certificação da carne de VTM é uma forma singular e eficaz de conseguir uma mais valia para quem produz e um produto de qualidade certificada para quem compra. Contudo, é notória a necessidade de melhorias na eficiência produtiva de algumas explorações. BIBLIOGRAFIA: 1 – AGRUPAMENTO DE PRODUTORES DE MONTEMOR-O-NOVO – Caderno de Especificações e Obrigações da Carne de Bovino Tradicional do Montado. Motemor-o-Novo, ACOMOR, 1996. 2 – COMISSÃO ECONÓMICA EUROPEIA. CONSELHO – Regulamento n.º 2082/92, de 14 de Julho, relativo aos certificados de especificidade dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios. 3 – "Diário da República", Despacho Normativo nº 293/93, de 1 de Outubro. 4 – "Diário da República", Despacho Normativo nº 138/96, de 30 de Dezembro. 5 – "Diário da República", Portaria nº 151/96, de 14 de Maio. 6 – EDWARDS, R. A.; GREENHALGH, J. F. D., MCDONALD, P. – Animal Nutrition. 4th ed. New York, Longman Scientific & Technical, 1988. 7 – GÓIS, João Paulo – Análise Técnico-Económica dos Sistemas de Produção de Ovinos de Carne no Alentejo. Trabalho de fim de Curso de Engenharia Zootécnica. Évora, Universidade de Évora, 1993. 8 – I.E.A.D.R. – Tabelas de Análise dos Encargos com a Utilização das Máquinas Agrícolas para o Ano de 1995. 9 – INSTITUTO DE FINANCIAMENTO E APOIO AO DESENVOLVIMENTO DA AGRICULTURA E PESCAS (IFADAP). Linha Azul. 10 – INSTITUTO NACIONAL DE GARANTIA AGRÍCOLA – Ajudas Comunitárias, Regras e Informações Básicas 1996. Lisboa, INGA, 1996. 11 – JARRIGE, R – Alimentação dos Bovinos, Ovinos e Caprinos, Lisboa, Europa-América, 1988. 12 – MARTINS, José Manuel; SERRANO, J. Efe – A ensilagem. Évora, Universidade de Évora, 1994. 13 – MINISTÉRIO DA AGRICULTURA – Tabelas de Preços de Factores de Produção Agrícola para o Ano de 1994/95. Lisboa, MA, [199-]. 14 – RALO, J. A. C. – Aspectos Essenciais na Produção de Bovinos de Carne, "Vida Rural", n.º 1586, 1994, p. 24-25. 15 – RICA – Contas da Actividade Pecuária. Bovinos de carne. Lisboa, MAPA-RICA, 1990. 16 – SOLTNER, Dominique – Besoins des animaux et valeur des aliments. 20ème éd. Angers, D. Soltner, [199-]. (Collection Sciences et Techniques Agricoles). 134 PASTAGENS E FORRAGENS 19 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 135–136. XIX REUNIÃO DE PRIMAVERA DA SPPF CASTELO BRANCO, 5 A 8 DE MAIO DE 1998 A PRODUÇÃO DE PASTAGENS E FORRAGENS NA BEIRA INTERIOR – DAS SERRAS À CAMPINA CONCLUSÕES • As pastagens e forragens são a garantia da manutenção do equilíbrio ecológico, em particular nas zonas com fragilidades edafoclimáticas, de que são exemplo as zonas de montanha. • O melhoramento das plantas forrageiras e pratenses contribuiu notavelmente, nos últimos anos, para o aumento da biodiversidade, sendo imprescindível que esta seja posta à disposição da agricultura, para melhorar o rendimento dos agricultores; em consequência, há necessidade de prosseguir e incrementar os apoios à experimentação, com vista a estudar o comportamento de novas espécies e cultivares. • Demonstrou-se que o material vegetal autóctone tem enorme importância não só para manutenção e valorização dos recursos genéticos, mas também por permitir a obtenção de novas cultivares mais produtivas e/ou melhor adaptadas a diferentes factores bióticos e abióticos. • A melhoria da produtividade dos sistemas agro-pecuários continua a ser um dos grandes objectivos nacionais. É necessário desenvolver estudos de fertilização e correcção do solo, sobretudo no sentido de assegurar às plantas um bom nível nutricional, e investigar também os efeitos da utilização de subprodutos agrícolas e industriais na fertilização e correcção do solo com vista à conservação do ambiente. • Embora os efeitos poluentes provocados pelos sistemas de produção agrícola e pecuária não sejam ainda preocupantes, há toda a necessidade de sensibilizar os agricultores, muito em especial os que utilizam sistemas mais intensivos, para a racionalização do uso dos fertilizantes azotados, por apresentarem grande risco de poluição. 135 • Uma vez mais foi reconhecida a necessidade de adequar as medidas da PAC à realidade específica do nosso País de modo a não criar distorções que conduzam à degradação dos nossos sistemas de produção agro-pecuários. • Foi realçada a conveniência de estabelecer medidas políticas, de modo a criar alternativas à utilização de culturas forrageiras para fins industriais, à semelhança do que acontece com a colza noutros países da Comunidade. • Verificou-se a necessidade de privilegiar sistemas de produção mais ecológicos, que poderão evitar alguns dos problemas sanitários que retraem o consumo alimentar e que têm reflexos na economia nacional. • Finalmente, foi evidenciado que as pastagens têm cada vez maiores potencialidades para a obtenção de elevadas produtividades dos ruminantes, pelo que devem ser cada vez mais valorizadas. 136 PASTAGENS E FORRAGENS 19 "Pastagens e Forragens", vol. 19, 1998, p. 137–144. PERSPECTIVAS DE ELEIÇÃO DAS PRIMEIRAS CULTIVARES PORTUGUESAS DE TREVO SUBTERRÂNEO* Noémia Farinha, M.M. Tavares de Sousa♦, A.M. Romano♦ Escola Superior Agrária de Elvas – Apartado 254 – 7350 ELVAS ♦ Estação Nacional de Melhoramento de Plantas – Apartado 6 – 7350 ELVAS RESUMO Com o objectivo de obter as primeiras cultivares portuguesas de trevo subterrâneo, foi efectuada, na Estação Nacional de Melhoramento de Plantas, a selecção de genótipos a partir de populações com elevado potencial produtivo quanto a matéria seca. Os genótipos em fase avançada de selecção, e que são objecto deste trabalho, provêm das populações Penacova (genótipo 46), Crato (356 e 395), D. Sancho (493), Vinhais (559) e D. Dinis (616 e 627). Utilizaram-se como testemunhas as cultivares Seaton Park e Clare. Após dois anos de ensaio em povoamento denso, observou-se que na produção de matéria seca se destacaram a cv. Clare e os genótipos da ENMP: 356, 493, 559, 616 e 627. Relativamente à produção de semente, os melhores genótipos foram: 395, 616, 559 e 627 da ENMP. O teor de sementes duras foi mais elevado no genótipo 616 e na cv. Seaton Park, observando-se os valores mais baixos na cv. Clare. A regeneração, após o primeiro ano de produção, foi superior na cv. Seaton Park e no genótipo 46, seguidos de Clare e 616. Os resultados obtidos permitem distinguir, de entre os materiais da ENMP, o genótipo 616 que, apesar de ter produtividade em matéria seca inferior à cv. Clare, poderá ter maior interesse devido à maior produção de semente e ao maior teor de sementes duras, essenciais para a persistência da pastagem nas nossas condições. Estas características poderão conduzir à superioridade deste genótipo nos anos seguintes. Pela produção de matéria seca e pela elevada homogeneidade e estabilidade de características, o genótipo 493 parece também interessante. Com base nestes resultados e nos ensaios efetuados em anos anteriores, foi proposta em 1993 a candidatura dos genótipos 616 e 493 ao Catálogo Nacional de Variedades. PALAVRAS-CHAVES: Trevo subterrâneo; Selecção; Caracteres agronómicos; Cultivares. * Comunicação apresentada na XV Reunião de Primavera da SPPF. Santarém, Abril de 1994. 137 ABSTRACT Aiming to obtain the first Portuguese varieties of subterranean clover, was carried out, in the ENMP, the selection of genotypes from adapted populations identified as high yielding in dry matter. The genotypes in advanced phase of selection were originated from the following ecotypes: Penacova (genotype 46), Crato (356 and 395), D. Sancho (493), Vinhais (559) and D. Dinis (616 and 627) populations. They had been compared with the Australian cultivars Seaton Park and Clare. After two years trials in dense stand, it was observed that the production of dry matter, Clare and the genotypes of the ENMP: 356, 493, 559, 616 and 627 were the best. Concerning seed production, the best genotypes have been: 395, 616, 559, and 627 of the ENMP. The content of hard seeds was higher in genotype 616 and cultivar Seaton Park, and the lowest values in Clare. Regeneration, after the first year production, was upper in Seaton Park and genotype 46, followed by Clare and 616. The results allow us to distinguish from the materials of ENMP the genotype 616 that, although having lowest dry matter yield than Clare, will have greater interest due to bigger seed production and higher hard seed content, essential for the persistence of pastures in our conditions. These features will be able to lead to the superiority of this genotype in the following years. For the production of dry matter and the raised homogeneity of features and stability, genotype 493 also seems to be interesting. Based in these results and the essays done in previous years, the genotypes 616 and 493 were proposed to the National Catalogue of Varieties in 1993. KEY WORDS: Subterranean clover; Selection; Agronomic traits; Cultivars. 1 – INTRODUÇÃO A contribuição do trevo subterrâneo (T. subterraneum L.) para a melhoria dos sistemas agrícolas é muito diversificada. Esta espécie tem sido considerada de grande interesse para a recuperação de solos degradados pela monocultura dos cereais, para prevenir a erosão e aumentar a fertilidade do solo e a disponibilidade de alimento para os animais. Em França, em particular, tem sido dada grande ênfase à sua utilização para a prevenção de incêndios florestais, devido ao efeito de pára-fogos (6, 8, 9, 10). Na Austrália Ocidental, o trevo subterrâneo tem sido utilizado para aumentar a produção de cereais devido à fixação de azoto (5). O trevo subterrâneo é originário da região mediterrânica (11), contudo, a quase totalidade das cultivares disponíveis nesta região são provenientes do continente australiano, onde a espécie se naturalizou devido à introdução, inicialmente acidental, de germoplasma proveniente da costa atlântica da Europa Ocidental e do Mediterrâneo (5). Estudos de carácter agronómico, efectuados na Estação Nacional de Melhoramento de Plantas (ENMP), revelaram existir, na coleção de germoplasma, populações com elevado potencial produtivo e boa adaptação ( 1, 2 ). 138 PASTAGENS E FORRAGENS 19 Estes resultados foram a motivação para se iniciar um processo de selecção genealógica para algumas destas populações, de forma a obter linhas puras que serão testadas com o objectivo de selecionar novas cultivares de trevo subterrâneo. 2 – MATERIAL E MÉTODOS Este trabalho tem por base cinco populações de T. subterraneum L. existentes numa colecção de germoplasma da ENMP (Penacova, Crato, D. Sancho, Vinhais e D. Dinis), que mostraram ter elevado potencial produtivo em estudos anteriormente efectuados. Utilizou-se um esquema de selecção de planta única, tendo-se seleccionado vários genótipos das cinco populações eleitas. Os genótipos em estudo estão em fase avançada de selecção e provêm da população Penacova (genótipo 46), Crato (356 e 395), D. Sancho (493), Vinhais (559) e D. Dinis (616 e 627). Utilizaram-se como testemunhas as cvs. Seaton Park e Clare. A primeira população e a primeira cultivar pertencem à ssp. subterraneum, as restantes à ssp. brachycalycinum. Serão referidos dois ensaios, com base nos quais se avalia o valor agronómico. Num dos ensaios, consideraram-se parcelas de 4 m 2 dispostas em blocos casualizados com quatro repetições. A densidade de sementeira foi de 500 sementes/m 2 (30-40 kg/ha). Efectuou-se uma simulação do pastoreio por corte, com intervalos de um mês, desde finais de Fevereiro até à floração. No final do ciclo, avaliou-se a matéria seca acumulada após a floração. Estas parcelas irão permanecer no mesmo local durante pelo menos três anos, para observar a persistência dos genótipos em estudo. No outro ensaio, cada genótipo foi instalado numa linha de 5 m, com as plantas espaçadas de 0,25 m na linha e l m na entrelinha. O delineamento foi em blocos casualizados com quatro repetições. Além da caracterização morfológica foi avaliada a percentagem de sementes duras três meses após a maturação. Durante este tempo, as sementes foram mantidas ao ar livre em sacos de papel. 3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO Analisando a distribuição da matéria seca produzida, a avaliação efectuada em finais de Fevereiro mostra que a cv. Clare teve uma produção significativamente superior à dos restantes genótipos, durante o período de baixas temperaturas, seguindo-se os genótipos da ENMP 356, 493, 616, 627 e 559 PASTAGENS E FORRAGENS 19 139 (figura 1). Outros autores confirmam que aquela cultivar tem elevada produção invernal (7, 10, 12 ), o que a torna interessante do ponto de vista da produção de matéria seca, mas possui o inconveniente do baixo teor de sementes duras. Os genótipos aqui apresentados foram testados num ensaio anterior, onde alguns deles mostraram um comportamento semelhante ou ligeiramente superior em relação à cv. Clare (3). Quanto à produção total de matéria seca, o genótipo 627 foi o mais produtivo, seguido do 493, 559, 356, Clare e 616. A produção de matéria seca no Inverno tem contudo maior importância em termos de selecção, por se tratar de uma época de reduzida disponibilidade de alimento para os animais. FIGURA 1 – Produção de matéria seca no Inverno e produção de matéria seca total. Quanto à produção de semente, os genótipos mais produtivos foram 395, 616 e 559, da ENMP (figura 2). Este é um dos critérios chave na selecção de trevo subterrâneo, dado que a quantidade de plântulas que regeneram a pastagem em cada ano depende grandemente da quantidade de semente produzida no(s) ano(s) anterior(es). O teor de sementes duras foi mais elevado no genótipo 616 e na cv. Seaton Park, cujos valores são significativamente superiores aos dos restantes genótipos (excepto em relação à 627 em que as diferenças são não significativas). Os valores mais baixos observaram-se na cv. Clare, em que a percentagem de sementes duras é praticamente nula. Este é outro dos critérios-chaves na selecção de trevo subterrâneo, porque se é importante uma elevada produção de semente, é imprescindível que uma parte desta permaneça viável no início de cada ano. O objectivo é garantir a regeneração da pastagem, 140 PASTAGENS E FORRAGENS 19 mesmo que entretanto tenham ocorrido alguns acidentes, como seja reduzida produção de semente devida a factores externos, ou perda de semente por germinação antecipada devida à ocorrência de chuva durante o Verão. Estes acontecimentos não são raros entre nós, pelo que a utilização de cultivares com baixo teor de sementes duras pode comprometer a persistência da pastagem, sobretudo se se pretende uma pastagem de tipo permanente. A baixa dureza da semente é o principal inconveniente da cv. Clare nas nossas condições ( 4). De salientar que, devido ao facto de neste estudo as sementes terem sido mantidas ao ar livre e não em condições controladas, a intensidade de quebra da dureza variará consoante os anos, porque depende da amplitude da temperatura ambiente. FIGURA 2 – Produção de semente e teor de sementes duras. Para se ter uma medida da persistência da pastagem, determinou-se a densidade de plântulas que emergiram após o primeiro ano de produção (figura 3). A melhor persistência foi observada na cv. Seaton Park e no genótipo 46 (com quase 6000 plântulas/m 2), seguidos por Clare e 616. A baixa densidade de plântulas observada em alguns genótipos pode ser devida ao seu maior teor em sementes duras, que terão ficado no solo a constituir reserva para o ano seguinte, ou à menor produção de semente. Outros factores poderão ter influência, como a morte precoce das plântulas ou o ataque por formigas que transportam a semente para outros locais. Os resultados obtidos permitem distinguir, de entre os materiais da ENMP, o genótipo 616 que, apesar de ter produtividade inferior à da cv. Clare, poderá ter maior interesse devido à maior produção de semente e ao maior teor de sementes PASTAGENS E FORRAGENS 19 141 duras, essenciais para a persistência da pastagem nas nossas condições. A floração do genótipo 616 é ligeiramente mais tardia (mais 7 a 10 dias) do que a da cv. Clare, sendo aquele o comportamento médio do germoplasma nacional, observado por Crespo e Romano (2 ). Este genótipo possui ainda um baixo teor de estrogéneos (praticamente isento de formonetina). Estas características poderão conduzir à superioridade do genótipo 616 nos anos seguintes ao da instalação, o que já se começa a observar. FIGURA 3 – Número de plântulas após o primeiro ano de produção O genótipo 493 tem elevada produção de matéria seca em povoamento denso, elevada homogeneidade e estabilidade das características morfológicas. Quanto ao genótipo 627, apesar de ter um bom comportamento agronómico, foi considerado mais prudente mantê-lo no programa de selecção para testar a homogeneidade das suas características morfológicas. Com base nestes resultados e nos ensaios efectuados nos anos anteriores, foi proposta, em 1993, a candidatura dos genótipos 616 e 493 ao Catálogo Nacional de Variedades (CNV). 4 – CONCLUSÕES Foram avaliados sete genótipos de trevo subterrâneo, em fase avançada de selecção, obtidos por selecção genealógica a partir de populações com elevado potencial produtivo. Verificou-se que quanto à produção de matéria seca, a cv. Clare é a que tem maior produtividade invernal, enquanto que o genótipo 627 tem a maior produção total. 142 PASTAGENS E FORRAGENS 19 Quanto ao teor de sementes duras destacam-se o genótipo 616 e a cv. Seaton Park, apresentando a cv. Clare um valor praticamente nulo. Aquele genótipo apresenta também elevada produção de semente, ainda que a do 356 seja superior. Estes são dois dos critérios mais importantes na selecção de trevo subterrâneo. O 616 é, dos genótipos ensaiados da ssp. brachyca1ycinum, o que apresenta maior densidade de plântulas após o primeiro ano de produção. Em termos absolutos são contudo, a cv. Seaton Park, o genótipo 46 e a cv. Clare que apresentam os valores superiores. O genótipo 616, apesar de não ser o que teve produção de matéria seca mais elevada, tem um adequado ciclo de floração, elevada produção de semente e elevado teor de sementes duras em relação à cultivar Clare, o que lhe confere vantagem adaptativa. O genótipo 493 tem uma elevada produção de matéria seca, elevada homogeneidade e estabilidade. Estas características, em conjunto com outras observações já efectuadas em anos anteriores, conduziram a propor a candidatura ao CNV dos genótipos 616 (com o nome de Davel) e 493 (Romel). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 – CRESPO, D. G. – Some agronomic aspects of selecting subterranean clover (Trifolium subterraneum L.) from Portuguese ecotypes. In: "Proceedings of the XI International Grassland Congress". St. Lucia, Australia, University of Queensland Press, 1970, p. 207-210. 2 – CRESPO, D. G.; ROMANO, A. 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No segundo, porém, haverá que desenvolver estratégias de atenuação ou de defesa dos seus efeitos. Neste trabalho abordam-se aspectos relacionados com a estrutura química das saponinas, os factores que as afectam, os seus efeitos nas plantas e as consequências da sua ingestão por animais. Quando pertinente, também se referem algumas consequências da sua ingestão por humanos. Conclui-se pela necessidade de continuar os estudos, de modo a esclarecer os mecanismos de acção destes compostos para o seu controlo e potencial utilização. PALAVRAS-CHAVES: Saponinas; Forragens; Nutrição animal; Ruminantes; Monogástricos. ABSTRACT Saponins are steroidal or triterpenoid glycosides present in many plants, having diverse biological activities, that can be advantageous or disadvantageous, when consumed by animals. In the first case, the molecules involved may be used, not only in domestic animals, ruminants or nonruminants, but also in men. In the second case, however, there is a need to develop strategies to overcome their effects or to protect animals from them. In this work are discussed some aspects related with the chemical structure of saponins, the factors that affect them, their effects on plants and their consequences when ingested by animals. Some information is also given on the saponin effects in humans. There is still, however, a need to carry out research in order to better understand the mechanisms of action of saponins, so as to benefit from their advantages while avoiding their problems. KEY WORDS: Saponins; Forages; Animal nutrition; Ruminants; Nonruminants. 145 1 – INTRODUÇÃO Uma produção animal rendível exige uma utilização eficaz das dietas. Na produção animal utiliza-se uma grande variedade de alimentos com diferentes origens. Muitos factores podem afectar, favorável ou desfavoravelmente, a eficiência com que eles são utilizados para satisfazer as necessidades dos animais. A presença de factores antinutricionais, por exemplo, diminui a eficiência de utilização dos nutrientes e a produtividade animal (21). Dentre os factores antinutricionais, os que se encontram mais difundidos nas partes vegetativas das plantas são os taninos e as saponinas (21), sendo estes últimos o objecto da presente revisão. As saponinas são substâncias referidas, desde há muito, na bibliografia da especialidade. A natureza complexa das mesmas e a capacidade para se ligarem fortemente a outros constituintes da planta, bem como a sua susceptibilidade à hidrólise (em particular durante os processos de isolamento e purificação), têm dificultado os avanços no conhecimento sobre as propriedades físicas, químicas e biológicas deste grupo de compostos. O desenvolvimento de novas técnicas para fraccionamento, separação, purificação e identificação de constituintes vegetais solúveis em água, tem contribuído para o conhecimento da estrutura molecular destas substâncias e para os avanços da investigação nesta área. As propriedades fisiológicas e farmacológicas evidenciadas por saponinas isoladas sugerem a possibilidade de utilizar estas substâncias como produtos dietéticos, farmacêuticos, medicinais e outros fins. Porém, são ainda muito fragmentados os conhecimentos sobre a natureza, a quantidade e os efeito das saponinas em alimentação animal e humana. 2 – ESTRUTURA QUÍMICA As saponinas contêm uma aglicona (sapogenol, sapogenina, ...) ligada a uma ou mais unidades de oligossacáridos (podendo assim ser mono, di ou tridesmosídicas). É usual classificar estas substâncias em dois grandes grupos, dependendo do tipo de aglicona presente (triterpenóide ou esteroidal). Nas plantas mais utilizadas em alimentação animal as triterpenóides são as predominantes. A complexidade das saponinas e, por isso, a diversidade dos seus efeitos biológicos, resulta não só da variabilidade da estrutura da aglicona e da posição da unidade glucosídica, mas também da natureza desta última. As agliconas estão geralmente ligadas a D-galactose, L-arabinose, L-ramnose, 146 PASTAGENS E FORRAGENS 19 D-glucose, D-xilose, D-manose e ácido D-glucorónico, alguns dos quais podem ser acetilados; comprimentos de cadeia de 2-5 unidades de sacarídeos são muito frequentes. As cadeias oligossacarídeas são geralmente lineares, embora também ocorram sob a forma ramificada ( 4). No caso da luzerna, as agliconas mais comuns são as de ácido medicagénico, hederagenina, sapogenóis do tipo soja e ácido zânico. A presença ou ausência de ácido medicagénico parece explicar a maioria das diferenças na actividade biológica das fracções de saponinas de diferentes variedades de luzerna, mas é de esperar que os tridesmósidos de ácido zânico tenham aqui também um papel significativo ( 21). O ácido zânico não inibe o crescimento do Trichoderma viride tendo, por isso, sido ignorado até há relativamente pouco tempo, embora em provas organolépticas ele tenha sido designado como o mais amargo e o mais irritante das mucosas. Esta falta de actividade biológica deve-se à ausência total de grupos COOH livres. No entanto, a conversão da saponina em sapogenina, por hidrólise, leva ao desbloqueio dos grupos COOH, gerando um composto com grande actividade biológica ( 18). As figuras 1 e 2 mostram as estruturas das saponinas típicas de luzerna (Medicago sativa) e da quinoa (Chenopodium quinoa), respectivamente; em cada caso as saponinas diferem umas das outras na natureza dos radicais (R, R 1, ...) ligados ao núcleo representado. FIGURA 1 – Estrutura química das saponinas típicas de luzerna (Medicago sativa) FIGURA 2 – Estrutura química das saponinas típicas de quinoa (Chenopodium quinoa). 3 – FACTORES QUE AFECTAM O TEOR DE SAPONINAS Tem-se observado que o teor de saponinas das forragens é afectado por diversos factores, embora, muito frequentemente, diferenças devidas aos métodos analíticos empregados dificultem as comparações. Assim, além da espécie vege- PASTAGENS E FORRAGENS 19 147 tal, a parte da planta considerada, a idade fisiológica e o estado de desenvolvimento são também factores importantes, tal como o são os factores ambientais e agronómicos, de que depende o crescimento, e os tratamentos pós colheita, como a armazenagem e o processamento. Foi demonstrado, por exemplo, que a fermentação reduz os níveis de saponinas na soja* e na luzerna (8), De acordo com Iijima et al.**, as características de gosto indesejável (amargo e adstringente) das saponinas da soja diminuem consideravelmente após hidrólise ácida. Na luzerna, os teores em saponinas podem ser inferiores a 0,3% da matéria seca (MS), nas variedades designadas doces, ou superiores a 1,5% da MS, nas linhas ricas em saponinas (2% da MS na variedade Lahontan e superior a 3% da MS na variedade DuPuits) (4). A parte da planta, como foi referido, também condiciona de forma importante o teor em saponinas. Nowacka e Oleszek (16) analisaram uma variedade de luzerna (Boja), utilizando HPLC, e encontraram valores de saponinas da ordem dos 2,4% e 1,49% da MS nas raízes e nas partes aéreas, respectivamente, sendo o teor de saponinas das folhas praticamente duplo do dos caules. No caso da quinoa (Chenopodium quinoa), por exemplo, também é possível distinguir variedades doces, semi-doces e amargas, em função do teor em saponinas (desde menos de 0,3 a mais de 2% da MS dos grãos), conforme resultados compilados por Fenwick et al. (4). A selecção para a característica doce levou à produção, por exemplo, de novas variedades de luzerna com boas produções de matéria seca e com conteúdo reduzido em saponinas. A selecção para genótipos de baixo teor em saponinas foi conduzida recorrendo a testes de efeitos biológicos, como o do fungo Trichoderma viride, do insecto Tenebrio molitor, do peixe Lebistes reticulatus e o da actividade hemolítica. Com estes testes foi possível obter cultivares de qualidade superior, para alimentação animal, mantendo as características agronómicas anteriores. O melhor valor nutritivo das novas variedades é normalmente atribuído à redução da fracção biologicamente activa das saponinas totais***. 4 – EFEITOS NAS PLANTAS 4.1 – Alelopatia A alelopatia é um efeito prejudicial, directo ou indirecto, causado numa planta por um composto produzido por uma planta dadora (3). * Kitagawa et al. (1984) citados por Fenwick et al. (4). ** Iijima et al. (1987) citados por Fenwick et al. (4). *** Vários autores citados por Tava et al. (23). 148 PASTAGENS E FORRAGENS 19 Oleszek e Jurzysta ( 17 ) estudaram o efeito alelopático das saponinas das raízes de luzerna (Medicago media Pers.) e do trevo violeta (Trifolium pratense L.) no desenvolvimento das plântulas de trigo e o destino destes compostos no ambiente do solo. A germinação das sementes e o crescimento das plântulas e de fungos foi suprimido por extractos aquosos e alcoólicos de raízes de luzerna, indicando que os glicósidos de ácido medicagénico são o inibidor. Raízes de luzerna em pó, adicionadas a areia, também inibiram o crescimento do trigo. Em concentrações tão baixas como 0,25% (m/m) o sistema radicular foi completamente destruído, enquanto que os caules das plântulas sofreram poucos danos. As raízes de trevo violeta causaram alguma inibição no crescimento do trigo quando incorporadas na areia, mas o seu efeito foi muito menor do que o verificado com as raízes de luzerna ( 17 ). A textura do solo teve uma influência importante no efeito inibidor das raízes. A diminuição da toxicidade das raízes de luzerna, em relação ao Trichoderma viride e às plântulas de trigo, ocorre mais rapidamente em solos argilosos (maior adsorção dos inibidores) do que em solos arenosos, devido à hidrólise parcial da cadeia de açúcar da aglicona, pelos microrganismos, nos primeiros ( 17). 4.2 – Resistência a doenças A toxicidade das saponinas para os insectos sugere que elas protegem as plantas da predação por estes organismos. Tava e Odoardi* utilizaram misturas de saponinas parcialmente purificadas de folhas de luzerna para estudar a actividade insecticida. Verificaram que o aumento do nível de saponinas, adicionadas a uma dieta artificial da Lobesia botrana (Den e Schiff), causou um aumento da mortalidade larvar. Pensou-se que a toxicidade das saponinas seria exercida pela capacidade de formarem complexos com o colesterol, o que tinha sido verificado pelo facto de a adição de colesterol a uma dieta artificial ter reduzido a mortalidade das larvas. Observou-se o mesmo tipo de efeito com outros insectos, tais como o Adoxophyes orana (F.v.R.), o Ostrinia nubilaris (Hb.), o Tenebrio molitor e o Spodoptera littoralis. A exploração destes resultados pode levar ao desenvolvimento de insecticidas naturais para a protecção de culturas**. * A. Tava e M. Odoardi (1996) citados por Sen et al. (21). ** Puszker et al. (1994) citados por Sen et al. (21). PASTAGENS E FORRAGENS 19 149 Vários ensaios utilizando ácido medicagénico e os seus glicósidos provaram que a actividade das saponinas está muito dependente dos grupos COOH e OH livres. Foi também concluído que a funcionalidade dos grupos hidróxilo livres na posição C3 é essencial para a actividade antimicótica contra o Sclerotium rolfsii, Fusarium oxysporum lycopersici, Rhizoctonia solani e Aspergillus niger. Além disso a natureza da porção aglicona da saponina é também importante na actividade contra o T. viride*. 5 – EFEITOS SOBRE OS ANIMAIS 5.1 – Ruminantes 5.1.1 – Timpanismo O trabalho de Lindahl et al.** estabeleceu uma ligação entre as saponinas e o timpanismo em ruminantes. Foram observados dois mecanismos: um efeito na contractilidade do rúmen e uma redução na tensão superficial do seu conteúdo. Em alguns casos, os sintomas de timpanismo em carneiros resultaram da actividade fisiológica das saponinas de luzerna, enquanto que em outros, as propriedades de tensão superficial foram a causa directa do fenómeno. Tanto as saponinas de suco de luzerna, como as de outras leguminosas, reduziram a motilidade ruminal, contribuindo para dificultar a evacuação do ingesta pela cárdia. Os resultados de Klita et al.( 9 ), apresentados na figura 3, ilustram esse tipo de situação. A redução na tensão superficial, que causa a formação de espuma, interfere com a eructação, contribuindo também para a acumulação excessiva de gás no rúmen e a eventual morte do animal por asfixia (compressão do diafragma). Verificou-se que por administração intravenosa as saponinas de luzerna são 50 a 60 vezes mais tóxicas que administradas por via oral**. Resultados mais recentes mostram, porém, que as saponina s constituem apenas um dos muitos factores implicados na patogénese do timpanismo em pastagens***, havendo mesmo autores que contestam o grau de importância atribuída às saponinas na etiologia do fenómeno ( 11 ). * W. Oleszek (1996) citados por Sen et al. (10). ** Lindahl et al. (1957) citados por Milgate e Roberts (14). *** Oakenfull e Sidhu citados por Milgate e Roberts (14). 150 PASTAGENS E FORRAGENS 19 FIGURA 3 – Registos, com intervalos de 2 minutos, das contracções reticulares e ruminais em carneiros: antes, 0,5 e 3 horas depois da administração de 1600 (a) e 800 (b) mg de saponinas/kg de peso vivo. [Adaptado de Klita et al. (9)] 5.1.2 – Fermentação ruminal Lu e Jorgensen (10) mostraram que as saponinas da luzerna, parcialmente hidrolisadas e administradas no rúmen, reduzem temporariamente o número de protozoários, a síntese de proteína microbiana, a fermentação e a digestão dos alimentos. Observaram, também, que não havia proporcionalidade entre a concentração de saponinas e os efeitos microbianos. Outros factores, para além das saponinas, interferem no fenómeno, como foi demonstrado em experiências com carneiros. Em rúmen artificial as saponinas também reduziram a síntese de ácidos gordos de cadeia curta e de proteína microbiana. Também Klita et al. (9) verificaram que de início as saponinas causaram uma diminuição na população de protozoários ruminais, com aumento do afluxo de azoto ao duodeno e diminuição da digestibilidade dos alimentos. Esta inibição do crescimento dos protozoários, referida por diversos autores, poderá ser benéfica em ruminantes, uma vez que reduz a predação das bactérias pelos protozoários, aumentando, em consequência, o fluxo duodenal de proteína*. No entanto, Newbold et al. (15) verificaram que o número de protozoários é recuperado ao fim de pouco tempo, como se pode ver na figura 4. Estes mesmos autores opinam que não são os protozoários que se tornam resistentes mas sim, provavelmente, as bactérias que se adaptam e são capazes de * Lindsay e Hogan (1972) e Williams e Coleman (1992) citados por Newbold et al. (15). PASTAGENS E FORRAGENS 19 151 degradar o agente antiprotozoário. Este aspecto está de acordo com os resultados de Makkar e Becker (12) que sugerem que as saponinas de Quillaja saponaria são degradadas pelos microrganismos do rúmen e que esta degradação é de natureza enzimática. FIGURA 4 – Efeito da administração de Sesbania sesban a carneiros, no número total de bactérias viáveis no rúmen e na degradação da Selenomonas ruminantium, em suco de rúmen, in vitro. As barras verticais representam os desvios-padrão da média de três carneiros. [Adaptado de Newbold et al. (15)] Baseado na hipótese anteriormente apresentada por Freeland et al. (5) em 1985, de que a presença simultânea de vários factores antinutricionais, biologicamente activos, pode atenuar os efeitos adversos individuais, Makkar et al. (13) realizaram um estudo em que ensaiaram combinações de ácido tânico, taninos de Shinopsis sp. e saponinas de Quillaja saponaria. Concluíram que a redução da digestão e da digestibilidade verdadeira era aditiva quando estavam presentes ácido tânico e saponinas. Resultados semelhantes foram obtidos quando o ácido tânico foi substituído por taninos de Shinopsis sp., embora os efeitos, para a mesma concentração, tenham sido mais marcados. Assim, estes autores não confirmam a hipótese anterior, mas referem que os resultados podem, eventualmente, ser diferentes se forem utilizados outros tipos de taninos e saponinas, uma vez que as suas actividades biológicas estão dependentes das suas estruturas químicas. Verificou-se, também, que a eficiência da síntese de proteína microbiana foi maior quando estavam presentes taninos e saponinas. 152 PASTAGENS E FORRAGENS 19 5.2 – Monogástricos 5.2.1 – Depressão do crescimento Foi observada, por exemplo, diminuição do crescimento em animais domésticos e de laboratório com saponinas de luzerna, provavelmente devido às características sensoriais, amargas e adstringentes, dos produtos processados. Um mecanismo que pode explicar os efeitos depressores do crescimento pelas saponinas é a diminuição da ingestão de alimento devido a má palatibilidade ( 1, 21). Além disso, as saponinas podem inibir a actividade dos músculos lisos. Não há certezas sobre o significado fisiológico, mas provavelmente é reduzido. Teoricamente, as saponinas podem reduzir o peristaltismo e, reduzindo a taxa de passagem, contribuir para a redução da ingestão de alimento. Além disso, as saponinas podem inibir um grande número de enzimas celulares. Outros autores verificaram que as saponinas da soja inibiam a actividade da quimotripsina e da tripsina*. A depressão do crescimento pode também estar relacionada com a ligação das saponinas a minerais essenciais (ver ponto 5.2.4). 5.2.2 – Interacções com membranas biológicas Sabe-se, desde há muito, que as saponinas causam a lise dos eritrócitos in vitro. A primeira acção das saponinas membranolíticas sobre as células é o aumento da permeabilidade da membrana plasmática, o que leva à perda do gradiente electroquímico essencial e à destruição inevitável da célula. Apesar das muitas evidências de que esta propriedade resulta da afinidade das saponinas com os esteróis das membranas, os detalhes desta interacção são ainda pouco conhecidos. Existe uma grande variação quer na actividade hemolítica das saponinas individuais quer na susceptibilidade dos animais (4). O efeito das saponinas sobre a mucosa intestinal foi também estudado. As saponinas têm sido utilizadas como adjuvantes orais, de forma a melhorar a absorção intestinal de material antigenicamente activo. A presença das saponinas aumenta a permeabilidade das células da mucosa intestinal in vitro através da formação de complexos saponinas-colesterol das membranas. Verificou-se que as saponinas provocam danos nas células intestinais de ratos. O resultante aumento da taxa de renovação celular tem sido proposto como * Vários autores citados por Atuahene et al. (1), PASTAGENS E FORRAGENS 19 153 mais um mecanismo pelo qual as saponinas baixam os níveis plasmáticos de colesterol; o aumento do "turnover" celular produz um aumento das perdas de colesterol das membranas celulares. Continua por determinar se este aumento do "turnover" celular ocorre em humanos (12). Pensa-se que muitas saponinas se combinam com o colesterol e os ácidos biliares no lúmen intestinal, limitando assim a sua absorção e modificando o metabolismo do colesterol*. É possível que este mecanismo também proteja as membranas da mucosa dos efeitos membranolíticos observados in vitro. 5.2.3 – Colesterol Embora continue a haver alguma controvérsia, surgiram duas teorias para o efeito das saponinas: 1) uma ligação directa do colesterol no intestino e redução na absorção, afectando assim exogenamente a produção hipercolesterolémica; 2) uma ligação dos ácidos biliares no intestino que, diminuindo a circulação enterohepática de ácidos biliares, resulta numa redução da hipercolesterolémia endógena. Os resultados de ensaios com humanos são, no entanto, controversos. Há que ter em conta, também, que saponinas de diferentes espécies de plantas diferem em estrutura e podem diferir na sua capacidade para se ligarem aos esteróis ou nos seus efeitos biológicos quando adicionadas a uma dieta (2). Contudo, os trabalhos feitos em relação ao efeito hipocolesterolémico das saponinas confirmam a actividade antihipercolesterolémica, pelo menos em animais, mas não exclui outros factores. As comparações entre ensaios são difíceis, devido ao uso de diferentes tipos e fontes alimentares de saponinas, o que pode ter um profundo efeito nos resultados produzidos. 5.2.4 – Minerais e amoníaco As saponinas podem formar complexos com os minerais, o que, em doses elevadas, pode ter um efeito negativo. A depressão de crescimento produzida pelas raízes de luzerna pode envolver a ligação a minerais essenciais, tornando-os indisponíveis para absorção. In vitro, as saponinas das raízes * Malinaw (1985) citado por Gee e Johnson (6). 154 PASTAGENS E FORRAGENS 19 de luzerna ligam-se ao zinco e ao ferro (24 ). Porcos alimentados com dietas à base de luzerna apresentam níveis plasmáticos reduzidos de zinco e cálcio*, e em ratos alimentados com saponinas de gipsofila a absorção de ferro é reduzida ( 22). Estas interacções dos minerais com as saponinas podem também contribuir para o efeito hipocolesterolémico observado, pelo menos, em animais. O colesterol plasmático total não é alterado quando o fornecimento de zinco pela dieta é adequado, e os aumentos observados com ingestões elevadas de zinco parecem estar relacionados com a indução da deficiência em cobre. De forma inversa, as concentrações plasmáticas de zinco podem ser alteradas pelo colesterol da dieta e pela gordura saturada, e as interacções com o cobre podem ser exacerbadas pela gordura saturada. Foi demonstrado que estes dois minerais podem contribuir para o efeito hipocolesterolémico ao reduzirem a actividade de duas enzimas envolvidas no metabolismo lipoproteico: a lipase lipoproteica (LPL) e a lecitina colesterol acil transferase (LCAT). Assim, em dietas deficientes em zinco estas enzimas apresentam uma actividade reduzida (19, 20). A adição de saponinas à dieta mostrou também ter efeitos benéficos ao reduzir os níveis de amónia do rúmen (7) e ao aliviar os problemas postos pela formação microbiana de amónia no intestino grosso e nos excrementos, sendo ambos os efeitos considerados como devidos à ligação das saponinas à amónia**. Saponinas de Yucca shidigera são já comercializada como aditivo, em dietas de monogástricos, para fixação do amoníaco, tanto ao nível intestinal, como dos dejectos no solo. CONCLUSÃO Apesar do muito trabalho realizado e das convicções firmes de vários investigadores neste campo, ainda não é possível chegar a uma conclusão segura quanto à utilidade e importância das saponinas em nutrição animal. A maioria das actuais incertezas parece ser devida ao facto das misturas de saponinas terem frequentemente sido tratadas como substâncias únicas, bem definidas. Nos estudos nutricionais, o termo saponina é frequentemente utilizado como uma definição operacional aplicada a misturas de substâncias de pureza e estrutura química desconhecida (21). * Pond e Yen citados por Southon et al. (22). ** Cheeke (1996) citado por Makkar e Becker (13). PASTAGENS E FORRAGENS 19 155 É frequente encontrar, em artigos mais recentes, referências à necessidade de se efectuarem mais estudos com saponinas puras ou extractos purificados, de forma a que seja possível a comparação de resultados e, assim, a serem esclarecidas muitas das incertezas que ainda existem no que se refere aos efeitos e aos mecanismos de acção destes compostos. Um maior e melhor conhecimento destes aspectos poderá levar à utilização segura das propriedades benéficas das saponinas, não só em animais mas também em humanos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1 – ATUAHERE, C. C.; DONKOH, A..; ASANTE, F. – Value of peanut cake as a dietary ingredient for broiler chickens. 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