Ricardo da Silva - PPGHIS
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Ricardo da Silva - PPGHIS
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA - UNEB DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – CAMPUS – V PROGRAMA DE MESTRADO EM HISTÓRIA REGIONAL E LOCAL Ricardo da Silva Campos O JOGO POLÍTICO LOCAL: Competição e dinâmica política em Feira de Santana (1948- 1965) Santo Antonio de Jesus/BA 2012 2 Ricardo da Silva Campos O JOGO POLÍTICO LOCAL: Competição e dinâmica política em Feira de Santana (1948 e 1965) Texto apresentado ao Programa de Pós-Graduação em História Regional e Local como requisito para o exame de qualificação. Orientador: Dr. Paulo Santos Silva Santo Antonio de Jesus/BA 2012 3 Folha de Aprovação. Santo Antonio de Jesus, Dezembro, 2012 ______________________________________________ Prof.Dr. Paulo Santos Silva(orientador) Universidade do Estado da Bahia ______________________________________________ Prof. Dr. Eurelino Teixeira Coelho Neto Universidade Estadual de Feira de Santana ______________________________________________ Prof. Dr. Raimundo Nonato Pereira Moreira Universidade do Estado da Bahia 4 AGRADECIMENTOS Ao meu Pai exemplo de honestidade cuja falta de formação acadêmica nunca minimizou o desejo de ver o filho formado. Que incontáveis vezes, me obrigava a ir a escola dizendo: “o menino não pode faltar a escola, não!”. Sua presença nunca esteve tão viva em minha memória. À minha Mãe que desde os sete anos de idade trabalha com um vigor invejável e está vendo o filho seguir os caminhos do magistério, por ela iniciado, mas que determinadas circunstâncias a impossibilitaram. Esta dissertação eu dedico aos meus pais. Aos meus amigos-irmãos João, Thiago e Joserlan que me ensinaram a suportar críticas e a incorpora-las quando elas poderiam surtir efeito. A Rodrigo e Samuel pelos conselhos, apoio e companheirismo. A Lanny minha companheira que suportou irritações e a falta de disponibilidade. Apoiou-me e me deu força para ver esse trabalho concluído. A realização deste trabalho também é tributária da participação de outros feirenses ilustres. A Carlos Mello funcionário do jornal Folha do Norte agradeço por abrir o acervo particular deste periódico para que eu adentrasse numa Feira de Santana dos anos 1940 que ainda não conhecia. Foi a partir de conversas com Mello que ele me disse onde encontrar o jornal Gazeta do Povo pertencente à família Galeão. Agradeço particularmente a Hildete Galeão tanto pelas conversas sobre Feira de Santana quanto por guardar e disponibilizar coleções deste periódico que seu pai, Osvaldo Galeão um dos sócios do jornal, lhe legou. A sensibilidade histórica e a atenção para preservação de documentos sobre nossa cidade agora rende frutos. Ao CEDOC/UEFS onde estive estagiário desde os primeiros meses de 2006 através de Lucilene Reginaldo, Luiz Cleber, Fernanda Vitorino, Mizay, Claudimir, Danilo Fé, Daniel, Francemberg e Márcia. Onde aprendi mais do que catalogar documentos. A experiência em atuar neste centro me permitiu abrir os horizontes sobre a atuação do historiador além de perceber que por trás da poeira que cobrem papeis pode se encontrar tesouros históricos. A Clovis Frederico Ramaiana Oliveira e aos estudantes do curso de História da UNEB/Alagoinhas por permitirem que participasse, como “tirocinista”, alcunha que ele mesmo me colocou, na disciplina História Cultural. 5 Saudosas sextas-feiras nas quais discordâncias teóricas eram mergulhadas em néctares etílicos. A Henrique Senna dos Santos pelo papel fundamental na minha formação como historiador. Seus lúcidos conselhos permearam toda a minha vida acadêmica. Sinto-me agraciado por ser seu amigo. A Kelman Conceição. Uma companheira, no sentido denotativo da palavra. Com ela dividi angustias, satisfações e os perigos de sermos estudantes nas viagens de Feira de Santana a Santo Antonio de Jesus. Além disso as discussões de textos no trajeto e as conversas me motivaram a seguir em frente. À Professora Leila Fernandes de Oliveira que gentilmente me presenteou um de seus livros, intitulado “Os inquilinos da cidadania”. A obra ajudou a traçar os perfis de políticos feirenses. À Professora Ely Souza Estrela que se disponibilizou, nos primeiros momentos a orientar esse trabalho. Os rumos que a dissertação tomou foi resultado das conversas que tivemos. Sinto-me feliz por ter conhecido uma docente séria e comprometida tanto com a História quanto com concepções políticas, combinação cada vez mais rara entre historiadores. Da mesma forma sinto-me triste por não tê-la, fisicamente, entre nós. Ao professor Paulo Santos Silva pela leitura atenta, pelos livros presenteados, emprestados e pelas discussões historiográficas e, por vezes, gramaticais. Sem sua participação esse trabalho não teria os contornos que possui. Agradeço por ter aceito o desafio de orientar o trabalho, num momento difícil para o programa quando da redução do quadro de professores agravado pela perda da Professora Ely Estrela. À Ane Geildes pela eficiência e em muitas vezes pela ajuda em coisas que não eram suas atribuições enquanto funcionária do mestrado. Ela certamente é exemplo de um profissional que alia compromisso profissional com boa disposição. À minha turma de mestrado. Formada por Manuela, Adriana, Amélia Saback e Kelman Conceição. Nós compensamos a parca capacidade quantitativa com disciplina na leitura dos textos e intensos debates. A Raimundo Nonato, Sara Farias, Carlos Zacarias, Ana Maria pelas disciplinas ministradas e pelos debates teóricos e metodológicos. 6 A Eurelino Coelho e ao LABELU/UEFS com quem aprendo que pesquisar rende mais frutos quando seus resultados são compartilhados, vistos e revistos por outros historiadores, independente do grau de “treinamento”. As sementes dessa dissertação foram lançadas e regadas neste laboratório. Aos colegas de trabalho do São Roque do Paratigi, distrito de Rafael Jambeiro. Entender o funcionamento da política nessa cidade me ajudou na compreensão do objeto de estudo desse trabalho. A CAPES que ao subsidiar a pesquisa permitiu certa seguridade financeira. Hoje entendo com mais lucidez o termo “fomento a pesquisa”. 7 RESUMO O objetivo dessa dissertação é analisar como se processaram os conflitos políticos e sociais entre grupos feirenses ligados à União Democrática Nacional (UDN) e ao Partido Social Democrático (PSD) entre 1948 e 1965. A classe dirigente em Feira de Santana desse período foi formada por um conjunto de indivíduos privilegiados economicamente que detinham cargos de direção dentro do aparelho do Estado. A maioria de suas disputas quase nunca incluía a possibilidade de participação popular. A utilização do poder público tinha o intuito de beneficiar o grupo vencedor. Ambos faziam parte do mesmo sistema de dominação. O trabalho fundamenta-se em atas, processos crimes, jornais, entrevistas. A competição pelo poder estava articulada com o Brasil dos anos 1940-1960, tanto do ponto de vista ideológico como no que se refere às articulações entre lideranças feirenses, baianas e as de projeção nacional. Assim, os rumos tomados por Feira de Santana nos anos que se seguiram a 1964 foram resultado de divergências entre esses dois segmentos. Palavras Chaves: Feira de Santana, Política, década de1940 a 1960, UDN, PSD, imprensa. 8 SUMÁRIO AGRADECIMENTOS .................................................................................................................... 4 RESUMO ....................................................................................................................................... 7 LISTA DE ABREVIATURAS UTILIZADAS ................................................................................ 10 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 11 SEÇÃO II – CAPÍTULO I ............................................................................................................ 19 DA “REDEMOCRATIZAÇÃO” ÀS ELEIÇÕES EM FEIRA DE SANTANA, 1947: DEFINIÇÕES IDEOLÓGICAS E POLÍTICAS. ................................................................................................... 19 1. O posicionamento do jornal Folha do Norte: democracia, liberalismo e novos horizontes políticos .................................................................................................................................... 19 2. “O brigadeiro vem aí”: a UDN feirense e as eleições nacionais ..................................... 28 3. Otávio Mangabeira governador em 1946: candidato da unanimidade? ......................... 33 4. Corrida para as eleições municipais, 1947: da conciliação ao embate .......................... 35 5. Janeiro frustrado da UDN: a dupla derrota udenista e as fraudes eleitorais nas eleições de 1948 .................................................................................................................................... 40 SEÇÃO III – CAPÍTULO II .......................................................................................................... 49 A IMPRENSA COMO ESTRATÉGIA ......................................................................................... 49 1. A escassez de votos e o jornal como meio de propaganda ........................................... 49 2. O Folha do Norte na defesa do juracisismo. ................................................................... 52 3. O Trovão: PTB, impresa e disputas internas. ................................................................. 55 4. Os “jornaizinhos” Santanopolis e o Coruja: jornais estudantis e militantâcia política ..... 60 5. De pasquim a jornal: o Gazeta do Povo e a imprensa do PSD. ..................................... 64 SEÇÃO IV – CAPÍTULO III ......................................................................................................... 71 VIOLÊNCIA COMO PRÁTICA.................................................................................................... 71 1. O “self-made-man” contra o “torrador de café” ............................................................... 71 2. A prefeitura para o comércio: o público serve ao privado ............................................... 78 3. “Transfigurou-se o panorama político do município”: PSD-PTB, de aliados a inimigos políticos .................................................................................................................................... 83 4. “Ofensas pessoais” e “divergência político-partidárias”: novos atores, conflitos históricos. ................................................................................................................................. 90 5. Nas escolas, nas ruas, nos currais: o governo do prefeito Francisco Pinto (1962-1964) 98 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................................... 111 LISTAGEM DE FONTES: ......................................................................................................... 113 9 REFERÊNCIAS ......................................................................................................................... 115 APENDICE A – ATIVIDADES PROFISSIONAIS DOS VEREADORES PELA UDN (1948-1962) ................................................................................................................................................... 119 APENDICE B – ATIVIDADES PROFISSIONAIS VEREADORES PSD (1948-1962) ............. 120 APENDICE C - RELAÇÃO DE VEREADORES ELEITOS (1948-1962).................................. 121 APENDICE D - PREFEITOS (1943-1963) ................................................................................ 126 APENDICE E - QUADRO DE CANDIDATOS E ELEITOS PARA PREFEITURA DE FEIRA DE SANTANA (1948-1964) ............................................................................................................ 127 10 LISTA DE ABREVIATURAS UTILIZADAS CEDOC/UEFS Centro de Documentação e Pesquisa da Universidade Estadual de Feira de Santana PSD Partido Social Democrático UDN União Democrática Nacional ARENA Aliança Renovadora Nacional MDB Movimento Democrático Brasileiro DIP Departamento de Imprensa e Propaganda PCB Partido Comunista Brasileiro PTB Partido Trabalhista Brasileiro IBGE Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística 11 INTRODUÇÃO O objetivo dessa dissertação é analisar como se processaram os conflitos políticos entre grupos feirenses ligados principalmente à União Democrática Nacional (UDN) e ao Partido Social Democrático (PSD) entre 1948 e 1965. Os embates visavam controlar o aparelho governamental encarregado da administração direta em Feira de Santana. Embora, compartilhassem a mesma situação econômica, esses grupos se subdividiram em dois agrupamentos partidários: a UDN e o PSD. Constituíam-se de comerciantes, profissionais liberais (advogado, médico, contador, professor) e pecuaristas. A classe dirigente em Feira de Santana foi formada por um conjunto de indivíduos que detinham cargos de direção dentro do governo local. Eles acumulavam funções dentro da sociedade feirense. Havia estreita ligação entre a situação profissional e a atividade política.1 A orientação política e as disputas pelo Estado se apresentaram com cores mais vivas com a reorganização política em 1946. Maria do Carmo Campello de Souza, no seu estudo de 1983, Estados e Partidos Políticos no Brasil (1930-1964), propõe que a estrutura partidária que se seguiu à implantação do Estado Novo, mesmo com o pluripartidarismo e a “redemocratização”, foi marcada pela continuidade das classes dirigentes no Estado. A transição que gestou o novo regime manteve Getúlio Vargas como “interlocutor-chave”, o que lhe facultou a adoção de decisões que visaram à manutenção da máquina política, baseada nas interventorias, lançando bases para as organizações partidárias. Com o objetivo de combater os regionalismos e implementar a nacionalização dos partidos, o Código Eleitoral de 1945 estabeleceu a coleta de assinaturas em todos os estados da federação como critério básico para a efetivação dos registros partidários. Dessa forma, o PSD em 1945, saiu na frente da organização partidária, justamente porque agregou sob suas bases prefeitos e interventores dos estados beneficiados por cargos concedidos por 1 Os apêndices A e B ao final da dissertação dão um perfil mais detalhado das atividades profissionais desses indivíduos. 12 Vargas, conseguindo, assim, afiliação nacional necessária para disputar as eleições. A UDN só conseguiu se adequar aos critérios, quanto ao registro do partido, após se articular com outras facções que tinham em comum a oposição ao Estado Novo, em outubro de 1945.2 A iminência das eleições presidenciais para o final do ano de 1945 fez com que as várias organizações que compunham a UDN se reunissem para apoiar o Brigadeiro Eduardo Gomes. As oligarquias destronadas com a “Revolução de 1930”, os antigos aliados de Vargas, grupos liberais e as esquerdas, conforme Maria Victória de Mesquita Benevides, em A UDN e o Udenismo (1981), fizeram parte, nos momentos iniciais, de uma ampla frente de oposição a Vargas.3 Assim como no resto do país, a UDN na Bahia foi formada por uma frente oposicionista. Paulo Santos Silva, em A Volta do Jogo Democrático, Bahia 1945 (1992), destaca que importantes líderes baianos como Otávio Mangabeira, Nestor Duarte, Juraci Magalhães, Aloísio de Carvalho Filho, Luiz Vianna Filho, entre outros, se aglutinaram na luta contra o Estado Novo. Mesmo tendo sido adversários políticos em determinadas conjunturas da Era Vargas, eles fizeram parte de uma união em prol da “redemocratização” do país que lançou as bases udenistas no estado, através da “Concentração Autonomista da Bahia”. Seus quadros foram formados por bacharéis pertencentes à elite dirigente e conservadora. A militância da UDN em Feira de Santana foi composta principalmente por médicos, bacharéis, comerciantes, pecuaristas e industriais alguns pertencentes às oligarquias que fizeram parte do poder na Primeira República. Assim, o industrial Clovis Amorim, o criador de gado Carlos Rubiños Bahia, nascido em 1906, comerciante João Marinho Falcão (1890-1971), o médico Honorato Bonfim (1890-1949), o advogado Hugo Silva, entre outros, liderados pelo jornalista Arnold Silva (1894-1965), compuseram as hostes udenistas na cidade.4 Embora fossem personalidades influentes nos meios políticos feirenses, eles compartilhavam do antigetulismo certamente por não terem ocupado cargos estratégicos na administração feirense durante o Estado 2 SOUZA, Maria do Carmo Campello de. Estado e partidos políticos no Brasil(1930-1964). São Paulo: Alfa-ômega, 1983.p.115. 3 BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A UDN e o udenismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981. 4 Assinalamos que os políticos cujas datas de nascimento e morte não foram encontradas serão escritas por extenso. Àqueles que estão vivos não aparecerá. 13 Novo.5 Esta condição contribuiu para apoiarem a derrubada do governo de Getúlio Vargas. Arnold Silva, que foi intendente durante a Primeira República, conseguiu consolidar ao longo da Era Vargas o jornal Folha do Norte como um importante veículo de comunicação do interior da Bahia. O processo de transição da década de 1940 e o objetivo de redemocratizar o país definiu o conteúdo ideológico do periódico. Marcado pela defesa do liberalismo, como argumentação que embasava a insatisfação com o Estado Novo, o Folha do Norte agrupou as frentes oposicionistas e antipopulistas feirenses. Diferente foi a formação do Partido Social Democrático (PSD). Lucia Hippolito, em PSD de raposas e reformistas (1985), assinala que esse partido surgiu de “fora para dentro”, composto pelos “interventores nomeados por Vargas”, o que possibilitou a sobrevivência de parcela da elite política no regime subsequente. A autora destaca o papel dessa agremiação como a responsável pela estabilidade do segundo período republicano, “o fiador da democracia”. Seus quadros foram formados por membros da “classe média”, como professores, médicos e muitos elementos ligados à propriedade rural, na condição de latifundiários.6 Na Bahia, coube a Renato Onofre Pinto Aleixo, interventor entre 1942 e 1945, organizar membros do executivo dos municípios baianos para articular o PSD e dinamizar a candidatura de Eurico Gaspar Dutra.7 Em Feira de Santana, os ex-prefeitos Edelvito Campelo de Araújo (1904-1976), Francisco Barbosa Caribé (1914-1984) e Eduardo Fróes da Motta(1891-1988) fundaram as bases desse partido. Os agrupamentos partidários locais foram, portanto, organizados por políticos que tiveram papel relevante na Primeira República ou durante o Estado Novo. Essa experiência política proporcionou a aglutinação de facções em torno de duas lideranças feirenses. Arnold Silva, que foi intendente entre 1924 e 1928, tornou-se um dos chefes locais da UDN e Eduardo Fróes da Motta, prefeito entre 1944 e 1945, consagrou-se como líder do PSD. 5 CONCEIÇÃO, Kelman. Quem manda na Feira? Política, e rearranjos de poder em Feira de Santana-BA na Era Vargas (1930 – 1945). Mestrado (dissertação). UNEB, Santo Antonio de Jesus, 2012. 6 HIPPOLITO, Lúcia. De Raposas e Reformistas: o PSD e a experiência democrática brasileira (1945-64). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. 7 SILVA, Paulo Santos. A volta do jogo democrático. Bahia, 1945. Salvador: Assembleia Legislativa, 1992 14 Ambos eram herdeiros políticos de coronéis. Eduardo Fróes da Motta era filho de Agostinho Fróes da Motta (1856-1922) e Arnold Silva genro de Bernardino Bahia (1871-1931).8 Essas duas figuras, Agostinho e Bernardino, segundo Eul-Sou-Pang, em Coronelismo e Oligarquias, foram dois dos “cinquenta coronéis mais ativos da Bahia, entre 1889 e 1937”.9 Além disso, Eduardo e Arnold nasceram no final do século XIX e fizeram parte de uma geração que assistiu o desenrolar político da única experiência republicana que se teve no Brasil até então. Embora a figura dos coronéis parecesse extinta, seus “descendentes” participaram ativamente dos embates políticos. A primeira eleição municipal, em 1948, marcou o inicio da luta política visando ao cargo do executivo municipal. Duas uniões interpartidárias que buscavam somar forças para concorrer ao pleito lançaram seus candidatos. Em dezembro de 1947, a Coligação Democrática Feirense foi formada pela junção entre o Partido Social Trabalhista, o Partido Socialista Brasileiro e o Partido Republicano que, liderada UDN, apoiou o nome do pecuarista Carlos Rubiños Bahia. No mesmo mês se formou a outra frente composta pelo Partido Social Democrático e pelo Partido Trabalhista Brasileiro, que lançou a candidatura do comerciante Agnaldo Soares Boaventura (1898-1975).10 As eleições eram o clímax das disputas. Elas foram travadas em frentes diversas, processo em que se utilizaram vários instrumentos. A imprensa e o uso de medidas violentas foram recursos adotados na defesa dos interesses de grupos articulados na UDN e no PSD. O personalismo, baseado na fidelidade a determinada liderança, somou-se ao “mandonismo local” que utilizava cargos públicos como objeto de barganha e apoio político. O nepotismo era manifestado através dos benefícios feitos aos familiares, com empregos em instituições públicas. A UDN e o PSD utilizaram os meios disponíveis para o enfrentamento e a conquista do poder para suas respectivas facções. O meio impresso foi um dos responsáveis por explicitar divergências e concepções políticas. A preocupação em fundar periódicos se justificava pela necessidade de um canal de interlocução entre agremiações partidárias e a comunidade feirense. 8 A representatividade política de Agostinho Fróes da Motta foi tamanha que João Marinho Falcão sancionou a lei nº 140/56 que considerou feriado, 4 de maio de 1956, data do centenário de nascimento deste “homem público”. O autor do projeto foi vereador do PSD, na época, Colbert Martins da Silva. 9 PANG, Eul-Soo. Coronelismo e oligarquias 1889-1943. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979.p. 246. 10 Folha do Norte, Feira de Santana, 15/Dez/1947. 15 O Folha do Norte, que tinha como sócio-proprietário Arnold Silva, defendeu os interesses partidários da UDN. Sua parcialidade política associou esse jornal aos udenistas de Feira de Santana que eram responsáveis por divulgarem propostas da legenda. Seus jornalistas foram integrantes do partido e publicaram artigos de crônica política e de crítica à oposição. Embora não expressassem através de editorais, o conteúdo jornalístico evidenciou que este canal estava fechado a grupos políticos que faziam oposição a esse partido. No entanto, outras agremiações políticas abriram frestas no campo informativo. O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) fundou em 1952 o semanário O Trovão, órgão estratégico de propaganda político-partidária de cunho getulista-trabalhista.11 Com intuito semelhante, o PSD consolidou um veículo impresso e em 1959 fundou o Gazeta do Povo. O jornal surgiu com a pretensão de ser o órgão de comunicação vinculado a esse partido. Fundamentou suas ações na crítica ao segundo governo Arnold Silva em Feira de Santana (1958-1962) a partir da criação de colunas como o “A voz do Povo” e a “Voz dos Distritos”. Essas colunas funcionavam como canais de diálogo por meio dos quais se faziam denuncias e solicitações aos poderes públicos de demandas das camadas populares. O que parecia ser um meio de participação democrática acabou convertendo-se em instrumento de propaganda das ações dos políticos pessedistas. Têm-se a imprensa como território de disputa ideológica, tanto para o conflito perante à opinião pública como pela possibilidade de preparar quadros políticos para a luta. Em determinados momentos, a crítica à oposição e propaganda surtiam efeitos, porque desestabilizava a “situação” e abria caminhos em territórios não ocupados. Em outras situações, partia-se para a violência aberta entre membros do PSD e da UDN. A violência resultava da intolerância quanto às críticas, principalmente quando essas fossem direcionadas aos chefes políticos locais, Arnold Silva e Eduardo Motta. Em Feira de Santana, as práticas políticas foram marcadas pelo personalismo que mantinham acesas as chamas da disputa pelo poder entre frações das classes dominantes que compunham a UDN e o PSD. Ela também servia como dispositivo de intimidação tanto para adversários como para setores da população feirense, particularmente, os trabalhadores. 11 O Trovão,03/jan/1952 16 Os conflitos entre 1940 e 1960 foram redirecionados com o golpe civilmilitar de 1964, o que interferiu nos municípios que esboçavam resistência, como Feira de Santana. Dessas intervenções resultaram a deposição do prefeito, na época, Francisco Pinto (PSD). Foi instituído o bipartidarismo, através do AI-2, que acabou com o pluripartidarismo e reconfigurou os partidos em duas agremiações. A Aliança Renovadora Nacional (ARENA) e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB). A imprensa feirense também foi atingida, sendo o Gazeta do Povo empastelado em abril de 1964 por ordem dos militares. A exceção foi o jornal Folha do Norte, que forneceu apoio ao novo governo. A análise aqui proposta acerca das práticas políticas em Feira de Santana entre 1948 e 1965 apoiou-se em fontes de vários tipos. O corpus documental que subsidia a análise é primordialmente o conjunto formado pelos números do jornal Folha do Norte, publicados entre 1945 e 1949. Este conjunto se revelou altamente fecundo tanto no fornecimento de informações das conjunturas históricas específicas quanto no debate sobre democracia, liberdade e imprensa no pós-Estado Novo. No conjunto, os periódicos locais, formam uma série documental de onde tiramos evidencias que nos levaram aos processos crimes. Inquéritos policiais protagonizados por personalidades políticas foram utilizados. Identificaram-se informações sobre lesões corporais, injúria, prevaricação, difamação e tentativa de homicídio. Os aspectos em comum nos delitos foram as motivações políticas e partidárias que incitaram a abertura dos processos. Essa documentação apresentou evidencias sobre o poder e a utilização da violência como dispositivo de ação. As provas anexas aos processos crimes foram de suma importância. Numa delas, encontram-se fotografias e documentos com os nomes dos políticos que fundaram o PSD em Feira de Santana em 1945. Constatamos que o PTB feirense criou os jornais “O combate” e o “Trovão”, em 1952, como “órgão do Partido Trabalhista Brasileiro”.12 O desenrolar do inquérito permitiu a compreensão dos objetivos do impresso, a identificação dos editores e o tempo de circulação. Esses dados nos ajudaram a entender parte da ação política de petebistas em Feira de Santana. 12 Injúria. Processos-crimes, CEDOC/UEFS. E-03;Cx.-85;Doc.-1668. 17 Outro inquérito que nos chamou atenção foi o de prevaricação que envolveu o ex-prefeito Agnaldo Soares Boaventura e seu filho Aristocles Boaventura movido por Mario Mascarenhas em razão de disputa pela posse de terras aforadas pela prefeitura. Ele serviu para analisar casos de nepotismo e para pensar como o aparelho estatal poderia ser instrumento para o fortalecimento econômico e expansão do agrupamento que estivesse no poder, tema do terceiro capítulo. O jornal Folha do Norte foi o mais consultado. Circula desde 1909 e durante o período em estudo não teve interrupções. Além disso, como será demonstrado no capítulo II, partia em defesa da UDN em Feira de Santana, sendo responsável pela propaganda da legenda. Foi um instrumento deste partido. Suas oficinas também foram utilizadas por outros periódicos, desde que simpáticos às suas perspectivas políticas. Dessa forma, os jornais estudantis Santanópolis e O Coruja circularam como semanário entre 1954 e 1957, utilizando as oficinas do Folha do Norte. A análise desses impressos mostrou que, além de defenderem as perspectivas políticas da UDN, editores e jornalistas tinham laços de parentesco com candidatos do partido e com os proprietários do Folha do Norte. O que este dado evidencia é uma rede de sociabilidades que visavam cooptar novos quadros. Surgido como órgão do PSD, o jornal Gazeta do Povo foi outra das fontes consultadas. Depois do Folha do Norte, foi o periódico que teve maior longevidade, circulou entre 1959 e 1964. Apesar de ter sofrido no ano de fundação um atentado em suas instalações por motivos políticos, ele marcou a defesa de proposições de um dos maiores partidos do período. O Dicionário Personativo, Histórico, Geográfico e Institucional da Feira de Santana, escrito pelo padre Oscar Damião de Almeida, foi um importante instrumento para entender o perfil social dos grupos políticos feirenses. O livro tem a pretensão de fornecer informações sobre nomes de personalidades, instituições públicas, bairros e breves históricos dos distritos. A maior parte da obra ocupa-se da listagem de sujeitos que, segundo o autor, exerceram posições de destaque e marcaram a história do município. A obra traz informações sobre nascimento, profissão, filiações, lugares de formação escolar, grau de instrução de “personalidades”. A partir disso e de informações fragmentárias dos jornais e processos crimes foi possível seguir 18 trilhas percorridas por políticos feirenses. O cruzamento de dados revelou uma rede de relações baseadas em compadrios, casamentos e amizades que contribuíam para a solidificação e manutenção do poder dentro de um círculo restrito de indivíduos. No primeiro capítulo, recuperamos o processo eleitoral de meados de 1940. Buscamos entender como frações da classe dirigente feirense, particularmente aquelas ligadas à UDN, entendiam o novo horizonte político instituído a partir de 1946, o que ajuda a compreender articulações políticas e os motivos que levaram à formação de coligações partidárias. A reorganização política (re)definiu as bandeiras de luta e o conteúdo ideológico que será utilizado no embate político. Por isso esse capítulo terá dois momentos: um visa compreender a linha ideológica seguida pelo udenismo feirense, divulgado no Folha do Norte, e o outro analisa como se travaram os embates entre o PSD e a UDN desde as corridas eleitorais para presidência da república até o ápice do conflito local com o pleito para prefeito. O segundo capítulo analisa periódicos constituídos por diferentes grupos políticos de Feira de Santana como parte das estratégias empregadas entre 1948 e 1965. Suas ações visavam criticar adversários e enaltecer correligionários. A imprensa foi utilizada com fins partidários, ocupando papel de relevo no conjunto das táticas políticas utilizadas. Examinamos como os jornais foram construídos em articulação com grupos políticos feirenses analisando, sobretudo, sua funcionalidade partidária. O terceiro capítulo analisa a violência no processo político municipal marcado pelo personalismo. Entendemos que as relações entre adversários políticos foram caracterizadas pelo uso de agressões físicas e verbais. Lançamos mão de vários tipos de processos crimes como prevaricação, injúria, bem como de inquéritos policiais de difamação para mostrar a dinâmica da luta política local. 19 SEÇÃO II – CAPÍTULO I DA “REDEMOCRATIZAÇÃO” ÀS ELEIÇÕES EM FEIRA DE SANTANA, 1947: DEFINIÇÕES IDEOLÓGICAS E POLÍTICAS. Esse capítulo analisa o processo eleitoral de meados de 1940. Visa-se entender como frações da classe dirigente feirense, particularmente aquelas ligadas à UDN, interpretou o novo horizonte político democrático instituído a partir de 1946, aspecto importante para a compreensão das articulações políticas e dos motivos que levaram à formação de coligações partidárias em âmbito local. A reorganização política (re)definiu as forças sociais, bandeiras de luta e o conteúdo ideológico utilizado no embate político. 1. O posicionamento do jornal Folha liberalismo e novos horizontes políticos do Norte: democracia, O mapeamento de 28 artigos de autoria de Joaquim Nabuco, Alcindo Guanabara, Quintino Bocaiúva, Rui Barbosa e Assis Chateaubriand, publicados pelo Folha do Norte no final da década de 1940, permitiu verificar uma engenhosa combinação que aliava uma concepção de democracia e uma perspectiva política de tipo liberal. Os textos ocuparam sempre a primeira página do jornal, destinada às principais noticiais do periódico. Os artigos visavam refletir sobre a democracia e suas vantagens em relação aos regimes autoritários. Esses textos foram retirados de “páginas antigas”, escritos no início do século XX. Eles provavelmente foram resultado de uma seleção constituída de antigas edições do jornal ou extraídos de livros pertencentes às bibliotecas particulares dos editores. 13 Uma parcela dessas publicações retoma aspectos da Primeira República. Sobretudo aspectos como liberdade, a função da imprensa e crítica a formas autoritárias de governo. Autores como Quintino Bocaiuva, Joaquim Nabuco, Rui Barbosa, Alcindo Guanabara possuíam em comum o fato de terem suas histórias ligadas às questões políticas do regime imperial e republicano. 13 A IMPRENSA. Folha do Norte, 16/out./1948,p.1 20 Bocaiuva (1836-1912) participou ativamente do processo de Proclamação da República, atuou como jornalista, político e ministro das relações exteriores (1889 – 1891) no primeiro período republicano; Nabuco (1849-1910), jornalista, diplomata, historiador, jurista, membro fundador da Academia Brasileira de Letras e defensor da Abolição da Escravatura; Guanabara (1865-1918), senador e fez parte da campanha republicana tendo sido deputado (18911893); Rui Barbosa (1849-1923), coautor da constituição de 1891 e, além de advogado, foi deputado, senador e ministro. Com exceção de Alcindo Guanabara, que abandonou a faculdade de Medicina, todos os outros eram formados em Direito. Suas trajetórias políticas foram marcadas pela transição do regime imperial para o republicano, alinhadas com ideais de cunho liberal, fundamentadas na defesa das liberdades individuais do fim de regimes autoritários e da implantação de governos republicanos. Esses autores, além de textos jornalísticos publicavam, nas áreas de direito, história, literatura e poesia. O perfil desses intelectuais se assemelha ao das gerações que se formaram nos idos dos anos 1940, sobretudo na diversificação das atividades, nas quais muitas vezes um mesmo indivíduo acumulava várias funções dentro da sociedade, como jornalista, advogado, escritor, político. Intelectuais feirenses de meados dos anos 1940 tinham em figuras como Rui Barbosa referências tanto profissionais, por ter sido um destacado jurista, como política, como defensor de ideais liberais. “Mestre”, exemplo a ser seguido, cujas ideias norteavam tanto leitores quanto elaboradores do Folha do Norte. Entrar em contato com suas obras, e com as de um grupo de intelectuais que subsidiaram a luta contra a Monarquia, empolgava e servia de inspiração política. A hipótese é que essa seja a razão para a (re)publicação dos artigos.14 Elas voltaram à tona, certamente, por causa do alcance histórico e por esclarecer aspectos da democracia e da liberdade de expressão, questões importantes para entender o processo de transição de regimes autoritários para experiências de maior participação política. Isto é, temáticas abordadas em 14 BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A UDN e o udenismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981. A autora diz: “uma leitura do manifesto mineiro (1943) revela fontes significativas da herança reclamada pelos futuros udenistas. Além das citações nominais aos bravos consagrados – Tavares Bastos, Rui Barbosa, Prudente de Morais, Assis Brasil, entre outros – o documento sugere como modelos para a organização política e administrativa da nação”. 21 uma dada conjuntura histórica serviam como modelo para a ação política na década de 1940. Uma das questões que eram postas contra a ditadura varguista era a liberdade de expressão. Desde a implantação do Estado Novo, em 1937, o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) fazia censura às publicações que questionassem o governo. Vargas também possuía uma política pautada na reciprocidade com elites locais que se beneficiavam com indicações para prefeituras em troca de apoio político. Um dos textos escritos pelo jornalista Assis Chateaubriand, e publicado pelo Folha do Norte, destacou essa característica do governo Vargas. Mesmo em 1945 ano marcado pelo compromisso do governo em realizar eleições, práticas de censura ainda permaneciam. Em “Os farroupilhas”, o jornalista denunciou um decreto de confisco do poder federal que inviabilizou as operações da Rádio Farroupilha, no Rio Grande do Sul. O efeito disso foi o fechamento do órgão de comunicação. A concessão de “crédito gratuito” para o Brigadeiro Eduardo Gomes anunciar sua campanha para presidente, tempos antes da solicitação de apoio feito pelo governo Federal, colocou a Rádio Farroupilha em rota de colisão com o Estado Novo, resultando no seu fechamento. Não fica explícito no artigo o porquê a Radio Farroupilha não apoiou Vargas, no entanto alegou que tinha destinado o horário de propaganda eleitoral ao outro candidato à presidência. 15 A falta de justificativa sobre o motivo da rádio não ter apoiado Vargas evidencia o antigetulismo declarado de Assis Chateaubriand, que nessa época tinha também uma cadeia de jornais.16 Portanto, segundo as informações veiculadas, a falta de apoio à candidatura de Vargas foi o motivo que levou ao fechamento da rádio. Além de denunciar o fechamento da rádio, o artigo “Os farroupilhas de 45” serve para pensar como eventos passados são reapropriados para direcionar lutas de uma dada conjuntura histórica. 1945 foi o ano do centenário da “Revolução Farroupilha”, que encampou uma luta por autonomia políticoadministrativa e contra o fim do centralismo monárquico imposto pela constituição de 1824. A luta contra práticas autoritárias vividas “cem anos atrás” rondava mais uma vez os rio-grandenses naquele momento, 15 OS FARROUPILHAS de 45. Folha do Norte, 14/jul./1945, p.1 LAURENZA, Ana Maria de Abreu. Batalhas em letra de forma: Chatô, Wainer e Lacerda.In.: História da Imprensa no Brasil. MARTINS, Ana Luiza & LUCA, Tânia Regina (orgs). São Paulo: Contexto, 2008.p.179. 16 22 representada no embate contra o Estado Novo onde eles [leia-se Assis Chateaubriand, que teve sua rádio censurada] mesmo “caçados pelo mandonismo” ostentarão “intacta, a mesma têmpera de outros cem anos atrás”.17 Não foi possível mapear a forma como esse texto foi parar no Folha do Norte, mas a opção em publicá-lo definiu o posicionamento político contra a ditadura varguista. Além de demonstrar certo nível de articulação política entre o editorial desse jornal com outros jornais do país. O artigo criticava o governo Vargas, afirmando ser o Brasil uma “ditadura nazista” e Vargas “o chefe sádico desse estado-polícia”. E frisava: “mesmo que a ditadura nos despoje de todas as ferramentas [no caso o fechamento da rádio]” ela continuará exercendo um papel de “educação cívica do povo gaúcho”. Em outro artigo, escrito por Alcindo Guanabara, intitulado “Marechal Floriano”, o autor ressalta o comportamento autoritário do “consolidador da república” “Muito se tem contestado que sobre o seu governo se tinha vivido uma República (...). Mas o fato é que o marechal Floriano não obedece, não sente e não se guia por mais forte intenção senão essa 18 de manter, defender e sustentar a República”. Nesse artigo, Floriano aparece como um “caboclo do norte”, “arguto e sagaz” munido de uma “desconfiança geral (...) contra tudo e contra todos” “essencialmente um militar”. Uma figura que ao mesmo tempo afirma cumprir a lei, tendo por ela “veneração”, por vezes passa por cima desta. De onde se pode compreender que a intenção em publicar o texto era mostrar que o regime republicano não poderia ter características autoritárias e que o governante deveria se submeter ao cumprimento das obrigações legais. Mas, mesmo com o anúncio feito por Vargas prometendo eleições para o final do ano de 1945, políticos feirenses esperaram apreensivos a realização das eleições e a “vitória” da “democracia”. A argumentação central do artigo “Para as urnas, brasileiros!” convergia para a confirmação das eleições, já em agosto. Segundo o autor, elas ocorreriam dentro da normalidade, já que a maior força de apoio a Vargas, as forças armadas, redefinia sua posição frente à nova conjuntura política a favor do compromisso com o fim do Estado Novo: “[...] Para mais uma vez ludibriar o povo, seria preciso que ele dispusesse, 17 18 OS FARROUPILHAS de 45. Folha do Norte, 14/jul./1945, p.1 O MARECHAL Floriano. Folha do Norte, 24/jul./1948, p.1 23 como em 1937, do apoio das classes armadas. Mas esse apoio ele não conta para empresas contrárias ao sentimento popular[...]”.19 De maneira geral, as oposições entendiam que Vargas tinha intenções de continuar no poder, mas naquela conjuntura ele estaria política e militarmente fragilizado, sobretudo por que “fora das forças armadas nada há quem ampare o ditador”. Tendo em vista que “o exército que a criou e sustenta [a ditadura], está obrigado, em defesa da própria honra, a não consentir que ela deixe de cumprir a palavra dada” 20 , isto é, a garantia das eleições no final do ano. As eleições para o final do ano de 1945 estavam confirmadas através da Lei Constitucional nº9 de 28/02/1945. Cabia o enfretamento da ditadura contra a democracia nas urnas e a luta para a construção de uma “democracia real à maneira anglo-saxônica” no Brasil. “Para as urnas, Brasileiros! (...), pois as eleições são inevitáveis”.21 O cerco ao palácio Guanabara e o golpe foi feito em 29 de outubro pela oficialidade da Marinha e do Exército utilizando como pretexto a nomeação do civil Beijamim Vargas para chefia da polícia. Manobra política icentivada pelas forças civis de oposição, que clamavam a intervenção armada para se garantir a democracia. A imagem da democracia que seria construída estava relacionada à garantia das liberdades individuais, sobretudo na capacidade de o indivíduo se expressar livremente. Nas palavras de Bocaiúva, ser cidadão consistia em zelar pelo “direito que tem, (...)[onde] cada indivíduo como membro do Estado, exercia a parte do poder que lhe pertence”. Isso garantiria ao indivíduo liberdade de expressão e o avanço da literatura, do romance e do teatro. O autor salienta que a liberdade deveria ser a base do poder político, único terreno onde poderiam expandir-se livremente. Ao contrário, nos regimes autoritários, nos quais os governos tentam monopolizar todo o poder em suas mãos, há um disfarce da verdade e das opiniões. Existe uma falta do espírito progressista e cerceamento das liberdades.22 Para um periódico como Folha do Norte era necessário destacar a importância da livre manifestação do pensamento, exaltar as liberdades democráticas e criticar a ditadura. Trata disso utilizando um texto, provavelmente, produzido no inicio dos anos XX, de um jornalista que 19 PARA AS URNAS, brasileiros!. Folha do Norte, 11/ ago./1945, p.1 PARA AS URNAS, brasileiros!. Folha do Norte, 11/ ago./1945, p.1 21 PARA AS URNAS, brasileiros!. Folha do Norte, 11/ ago./1945, p.1 22 A LIBERDADE e a literatura. Folha do Norte, 31/jul./1948, p.1 20 24 participou ativamente da Proclamação da República. O peso da militância histórica de Quintino Bocaiuva mostra quais referências eram utilizadas pelos editores, bem como o perfil das pessoas que liam o jornal, cada vez mais atraídas pelas ideias liberais. A argumentação do artigo nos leva à conclusão de que formas autoritárias de governo representam atraso e improdutividade intelectual. “Livre expressão do pensamento” ou, liberdade de expressão, não é compatível com regimes ditatoriais. A forma de governo em que há garantia dessas liberdades individuais é a democracia, asseverava o autor do artigo.23 A julgar pelas críticas feitas ao Estado Novo, certamente leitores do Folha do Norte investiam na formação de uma frente antiestadonovista, que se consolidou na União Democrática Nacional. Sob a bandeira da reconquista das liberdades democráticas, liberdade de imprensa, anistia, eleições livres e sufrágio universal os opositores do regime constituíam-se em um elenco heterogêneo. As oligarquias destronadas com a Revolução de 1930, os antigos aliados de Getúlio, marginalizados depois de 1930 ou em 1937, os que participaram do Estado novo e se afastaram antes de 1945, os grupos liberais com forte identificação regional e as esquerdas integravam o agrupamento antivarguista.24 A UDN formou-se como movimento da sociedade civil, particularmente das camadas médias. Bacharéis, intelectuais de esquerda e de direita, movimentos estudantis (União Nacional dos Estudantes), entidades dos trabalhadores (União de Trabalhadores Intelectuais) e setores da igreja católica (Liga Eleitoral Católica) formavam campanhas ostensivas para a democratização e para a candidatura do Brigadeiro Eduardo Gomes. Essa frente antiestadonovista precisava amadurecer a ideia de democracia e liberdades individuais suprimidas durante a ditadura do Estado Novo. Dentre os intelectuais, Rui Barbosa teve mais textos publicados. Seus trabalhos versavam sobre a função social da imprensa, a importância da liberdade e da democracia. Suspeita-se que os artigos foram escolhidos por Hugo Silva ligado “umbilicalmente” à redação do jornal. A família de Hugo Silva na década de 1930, composta pelos irmãos Dálvaro, Raul e Arnold Silva, conseguiu através de leilão público, comprar o 23 A LIBERDADE e a literatura. Folha do Norte, 31/jul./1948, p.1 BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A UDN e o udenismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981. p. 23-29 24 25 jornal Folha do Norte, que pertenceu ao coronel Tito Ruy Bacelar. Silva, filho de Dálvaro, nasceu em 1929 e, a partir de 1948, publicou artigos de sua autoria no periódico fazendo reflexões de cunho político, como num de seus primeiros artigos, “Absolutismo”, que tratava da Revolução Francesa.25 Supõe-se que, junto com outros jornalistas do Folha do Norte como Dival Pitombo (1915-1989) e Honorato Bonfim Filho (1890-1949), ele selecionou textos de autores da Primeira República e os divulgou. Hugo Silva via na figura de Ruy Barbosa e na sua trajetória um exemplo a ser seguido. O jornalista feirense exerceu múltiplas funções dentro da sociedade. No final da década de 1940, já atuava na imprensa. Por volta de 1956, tornou-se advogado e no início da década de 1960 conseguiu se tornar vereador pela UDN. A admiração é expressa através de artigos biográficos que enaltecem a luta política do jurista ressaltando virtudes, inteligências e a sua qualidade inigualável de ser um “polemista invencível”. Aos “homens de imprensa, homens de letras” cabiam algumas obrigações, propostas por Ruy Barbosa Cada jornalista é, para o comum do povo, ao mesmo tempo, um mestre de primeiras letras e um catedrático de democracia em ação, um advogado e um censor, um familiar e um magistrado. Bebidas com o primeiro pão do dia, as suas lições penetram até o fundo das consciências inexpertas, onde vão elaborar a moral usual, os sentimentos e impulsos, de que dependem a sorte de governos e das 26 nações. Nessa passagem, o jornalista seria aquele que ensina os primeiros passos com lições relacionadas às letras e ao amadurecimento de conceitos como o de democracia. Os escritos publicados fornecem pistas sobre como frações da classe dirigente pensavam a utilidade da imprensa e qual a responsabilidade de quem escreve no jornal. Sua importância é ressaltada na definição de comportamentos, podendo funcionar na elaboração moral do indivíduo e influir nas decisões políticas. Além de pensar sobre o papel da imprensa e dos jornalistas como formadores de opinião, ao jornal Folha do Norte cabia a tarefa de construir a imagem de Rui Barbosa como a de um defensor “natural” da liberdade. A argumentação do texto “Liberdade” centra-se nas lutas do autor pela ampliação das liberdades. Sobretudo “na República saudei a esperança do teu reinado”. 25 26 ABSOLUTISMO. Folha do Norte, 13/Mar/1948, p.1 A IMPRENSA. Folha do Norte,16/out./1948, p.1 26 Mas, mesmo saudando e ajudando na consolidação da República, quando ia de encontro aos princípios liberais, que dizia defender, ele não hesitava e clamava através da tribuna e da imprensa que fosse retomado aos rumos da “liberdade!”.27 Joaquim Nabuco também mereceu destaque. Exemplo de luta por liberdade, conhecido como “O Paladino da Abolição”.28 O texto mostra como Nabuco foi um defensor ferrenho da Abolição da escravatura, tendo na câmara o local da luta contra “o que há de pior na terra”29, a escravidão, através da “palavra”, da “eloquência”. A presença marcante de textos escritos por Ruy Barbosa no Folha do Norte se deve não apenas ao conteúdo liberal, mas por servir de “farol ideológico” de um representante da “inteligência da terra”. Os livros, A vida de Ruy Barbosa, de Luiz Vianna Filho, publicado pela primeira vez em 1941, e a coletânea de artigos Rui: o estadista na República, de 1943, escrito por João Mangabeira, circularam em Feira de Santana e não apenas entre os intelectuais que atuavam em Salvador. 30 Essas obras poderiam ter servido como fontes para informações presentes nos jornais, sobre a vida desse político. Resgatar textos “antigos” e escritores ligados às ideias liberais visavam conectar ideais como liberdade de imprensa e direitos políticos ao regime democrático que se seguiu. Uma democracia, conforme caracterizada pela UDN feirense, extirparia traços autoritários da sociedade brasileira e garantiria liberdades individuais inexistentes durante o Estado Novo. Dessa forma, liberalismo e democracia estariam “naturalmente” associados. O esforço do jornal em qualificar a historicidade do horizonte democrático visava obter ganhos políticos locais. A tática dos políticos feirenses para divulgação de suas ideias seguia tendências da UDN nacional. Desde 1943, com o “Manifesto dos Mineiro”, figuras como Rui Barbosa apareciam como “heróis aclamados” dos “futuros udenistas”. A “herança liberal” embasava ideologicamente discursos de membros do partido em todo país.31 27 LIBERDADE. Folha do Norte, 23/out/1948, p.1 JOAQUIM Nabuco: O Paladino da Abolição. Folha do Norte, 20/ago/1949.p.1 29 JOAQUIM Nabuco: O Paladino da Abolição. Folha do Norte, 20/ago/1949.p.1 30 SILVA, Paulo Santos. Âncoras de Tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na Bahia (1930-1949). Salvador: EDUFBA, 2011. 31 BENEVIDES, op.cit.p. 245. 28 27 Isso possibilitou ao partido moldar a ideia de que liberalismo e democracia eram indissociáveis. A UDN se apresentava como restauradora “do passado demolido” e como defensora de tradições democráticas. 32 Foi dessa noção passadista que se fundamentou o discurso do udenismo feirense. Tratava-se de uma tática de conservação do passado com a garantia da propriedade privada e sem proposições de alterações da participação do povo no jogo político. O “futuro da democracia” deveria ser concedido pelo “Estado Harmonioso”, ordeiro. Isto é, o povo, principalmente os movimentos populares não fazia parte do horizonte de participação democrática. O apelo à intervenção militar fazia parte do repertório de “ambiguidades” e das práticas do udenismo.33 A análise da conjuntura nacional divulgada pelo Folha do Norte apontava para uma solução autoritária no início de agosto e o papel das Forças Armadas na condução da abertura democrática.34 Coube aos militares, auxiliados pelas forças civis de oposição, em que teve papel de relevo a UDN, o ato final contra o governo e o golpe em Getúlio Vargas em 29 de outubro de 1945.35 A saída para uma nova reorganização política foi o golpismo, com o intuito, conforme alegavam, de impedir a continuidade do regime vigente. Mas a reorganização do sistema político não veio seguida de alterações na esfera da participação de setores populares, como trabalhadores e feirantes.36 Àqueles que, em Feira de Santana, viriam a compor o PSD e o PTB, partidos gestados por Vargas, já eram de antigos beneficiados políticos e a mudança do regime político não implicou em transformações para as camadas populares do município. O que a UDN demonstrou entre os anos de 1940 e 1960 foi o distanciamento entre retórica e prática. Embora o seu programa falasse de liberdade de organização, autonomia sindical e direito de greve, suas ações 32 ALMINO, João. Os democratas autoritários: liberdade individuais, de associação política e sindical na Constituinte de 1946.São Paulo: Brasiliense, 1980. p.301. 33 BENEVIDES. Op.cit. A tese de que a UDN tinha uma prática política baseada na readaptação de ideais liberais, ou como ela prefere, ambiguidades, é a ideia defendida pela autora. 34 PARA AS URNAS, brasileiros!. Folha do Norte, 11/ ago./1945, p.1 35 CARONE, Edgar. A república Liberal II Evolução política(1945-1964). São Paulo: Difel, 1985. p.10. 36 PACHECO, Larissa Penelu. Trabalho e costume de Feirantes de Alimentos: pequenos comerciantes e regulamentações do mercado em Feira de Santana. Feira de Santana, 2009. Dissertação (Mestrado). Universidade Estadual de Feira de Santana, Bahia. Departamento de Ciências Humanas e Filosofia. 28 foram contrarias à teoria.37 O teor liberalizante do programa do partido apresentava inconsistências pragmáticas. Os integrantes da UDN em Feira de Santana opuseram-se aos setores populares taxando-os de anárquicos e subversivos.38 Ameaças à ordem foram duramente repremidas. Ao povo cabia, simplesmente, a participação através do voto. A UDN feirense que anunciava a “democracia” ao final de 1945 agregou o mesmo grupo conservador com traços autoritários que passaram a agir entre os anos 1950 e 1960. As classes dominantes feirenses apelavam às forças armadas por meio da amizade com o oficial do exército Juraci Magalhães. Por seu intermédio foi possível que “democratas” solicitassem a deposição em abril 1964 do prefeito Francisco Pinto “manu militari” na defesa dos “princípios democráticos”.39 A confiança nas Forças Armadas para a transição pôde ser ratificada com o nome de um militar, o Brigadeiro Eduardo Gomes, como candidato da UDN. Retratado como herói do Forte de Copacabana, participante da revolução de 1930 e opositor intransigente da ditadura do Estado Novo, o oficial parecia reunir as qualidades morais e emblemáticas para a democracia.40 O udenismo em Feira de Santana o apoiaria nas eleições de 1945. 2. “O brigadeiro vem aí”: a UDN feirense e as eleições nacionais As eleições para presidente, desde fevereiro 1945, estavam confirmadas para dezembro daquele ano. Foi necessário que comitês em todo o país fossem formados com o intuito de arregimentar eleitores, organizar comícios e trabalhar em frentes diversas para conseguirem o maior número de votos em um curto espaço de tempo. Foram nove meses para por em ordem a campanha eleitoral cuja votação se realizou em dezembro. 37 Ibid.,p.39. Ver.; SANTOS, Ana Maria Fontes dos. O ginásio municipal no centro das lutas populares em Feira de Santana (1963-1964). Sitientibus: Revista da Universidade Estadual de Feira de Santana, n. 24, jan./jun. 2001. Esse episódio é emblemático para entender movimentos populares e as reivindicações das populações em Feira de Santana além da tensa relação que se processou com a classe dirigente ferense. 39 Moção de aplausos a Revolução. n. 01. 08/04/1964. Acervo do Autor. 40 CARONE.op.cit.,p.15 38 29 O General Eurico Gaspar Dutra, candidato pelo Partido Social Democrático, tinha sido ministro da guerra durante o Estado Novo e teve o apoio de Vargas; o segundo, o Brigadeiro Eduardo Gomes (União Democrática Nacional) sobrevivente da Revolta dos 18 do Forte de Copacabana e participante do movimento tenentista na década de 1920, disputou o pleito com a sustentação de uma organização que teve sua história política marcada na luta contra a ditadura varguista. Em Feira de Santana, a campanha eleitoral realizada pelo Folha do Norte veiculou a propaganda do Brigadeiro Eduardo Gomes. A sede do jornal serviu como local de venda de cédulas eleitorais para aqueles que quisessem contribuir “para a vitória” do candidato da UDN.41 Os partidos eram os responsáveis pela confecção das cédulas eleitorais e sua distribuição ao eleitorado. Esse mecanismo vigorou até 1955 quando a nova Reforma Eleitoral instituiu a cédula única com o objetivo de evitar fraudes. Os esforços para o lançamento da candidatura de Eduardo Gomes pela UDN significavam um ato cívico, segundo o Folha do Norte. Tratava-se de uma luta que todos os cidadãos deveriam encampar com o objetivo de consolidar a abertura democrática. Uma segunda batalha política, pois a primeira, contra o Estado Novo, tinha sido vitoriosa, seria o triunfo no pleito de 1945, a favor dos udenistas. Por isso, na noite domingo dia 18 de novembro, concentraram-se uma grande multidão e a presença de importantes lideranças baianas conforme noticiou o Folha do Norte. Na praça de Santana, a principal da cidade, e ao som da filarmônica Vitória e da banda de música da Sociedade 25 Março estiveram presentes no comício Arnold Silva, Barros Barreto, João Mendes Filho, Clovis Amorim, Rogério de Farias, Alberico Fraga, Jayme Ayres, Nestor Duarte, Juca Pedreira, Áureo Filho, Aloísio Carvalho, Durval Fraga, Juraci Magalhães e o estudante Raimundo Reis de Oliveira. 42 Políticos presentes no comício faziam parte da Concentração Autonomista da Bahia. Surgida em 1933, como reação ao desprestígio que a Bahia e seus líderes políticos tiveram depois do movimento de 1930, ela foi uma corrente política aglutinadora de facções políticas que se reuniram com o objetivo de conferir à Bahia autonomia frente ao poder central. Tinham o lema 41 42 CONTRIBUA para a vitória da Eduardo Gomes. Folha do Norte.03/Nov/1945 A GRANDE concentração do domingo.Folha do Norte, 24/nov/1945, p.1. 30 “reintegrar a Bahia na posse de si mesma”. Essa organização lançou as bases políticas e ideológicas para a formação da UDN no estado.43 Conforme sugere Maria Vitória Benevides, existiam “várias UDNs”. A UDN organizou-se na Bahia mesmo repartida entre as facções juracisistas e mangabeiristas. Os primeiros seguiam orientações políticas do ex-interventor Juraci Magalhães e os segundos as de Otávio Mangabeira.44 O que as conciliava e dava unidade era o discurso autonomista carregado de crítica à estrutura centralizada do Estado Novo. Além de objetivarem o retorno aos antigos postos de comando na esfera estadual. A equipe de políticos presentes no comício confirma o caráter de “frente oposicionista” no estado. Ao instalarem o diretório estadual da União Democrática Nacional, a direção foi divida entre mangabeiristas e juracisistas para permitir uma melhor coordenação partidária, segundo eles. A cada um dos dois grupos coube a escolha de quatro elementos para compor a comissão diretora. Os mangabeiristas foram compostos por Aloísio de Carvalho Filho, Nestor Duarte, Luiz Viana Filho e Gilberto Valente. Os juracisistas Manuel Novais, Albérico Fraga, Aliomar Baleeiro e Rafael Cincorá.45 Comparando-se os membros do diretório com os políticos presentes no comício percebe-se que ambas as correntes estavam igualmente representadas. Em Feira de Santana, a coesão interna certamente tinha o objetivo de evitar a dispersão de votos. Além disso, a concentração da maioria do eleitorado no campo obrigava os partidos a se deslocarem em caravanas em direção ao interior para disputarem o eleitorado rural e semirrural baiano. Os comícios para o lançamento da candidatura do Brigadeiro Eduardo Gomes se realizaram na principal praça da cidade, a de Santana também conhecida como Matriz. Uma “multidão” se avolumou para ver do coreto falarem políticos influentes na Bahia como Jayme Ayres e Nestor Duarte. As praças feirenses construídas entre o Império e a República tinham coreto, espécie de púlpito, coberto em estilo neoclássico ao ar livre, normalmente destinado a apresentação de bandas ou filarmônicas; em ocasiões de campanhas eleitorais músicos e políticos se revezavam na tarefa de animar e passar a mensagem ao público. 43 SILVA, Paulo Santos. Âncoras de Tradição: luta política, intelectuais e construção do discurso histórico na Bahia (1930-1949). Salvador: EDUFBA, 2011. 44 BENEVIDES, op.cit. 45 SILVA. Op.cit., p.97 31 Certamente os políticos presentes não eram a única atração da festa. A filarmônica Vitória e a banda de música da Sociedade 25 de Março motivavam pessoas a irem à praça. Normalmente, só faziam apresentações em ambientes particulares com entrada restrita. Escutar os principais grupos musicais da cidade gratuitamente era uma propaganda que tinha o objetivo de atrair possíveis eleitores e levar a mensagem política ao maior número de pessoas. O jornal não divulgou os pronunciamentos feitos pelos políticos no comício, mesmo que tenha sido em apoio à candidatura do Brigadeiro Eduardo Gomes no que seria um dos primeiros comícios realizados no pós-Estado Novo. Nelson de Souza Sampaio em um estudo sobre a experiência republicana no pós-1945, intitulado Diálogo Democrático, ressalta que em sua a maioria, os discursos improvisados agradavam mais o público e poderiam ter maior poder de persuasão, o que dificulta o acesso ao conteúdo dos comícios.46 O público que escutava comícios improvisados e as apresentações musicais ao ar livre era composto por populares. Homens e mulheres participavam desses comícios; mas elas tinham um motivo político a mais: a constituição que assegurou à mulher o direito de voto. Durante as campanhas presidências elas formaram comitês femininos apoiando o Brigadeiro Eduardo Gomes junto com jovens feirenses: Instala-se [...] o comitê feirense pró-Eduardo Gomes, que terá uma brilhante e eficiente ala feminina. Movimento espontâneo de um grupo de moços idealistas [...] o comitê estenderá sua ação a todos os distritos do município através de intensa e bem orientada 47 propaganda. Não foi possível identificar as jovens feirenses que fizeram parte do “comitê pró-Eduardo Gomes”. No entanto, a notícia de sua formação atenta para a importância da “ala feminina”, certamente, intencionando converter mulheres alfabetizadas em eleitoras e convidando-as a participarem da vida política. A princípio, o agrupamento não teve ligações partidárias diretas com a UDN, isto é, associando a legenda ao movimento, embora, indiretamente, esse partido financiasse ações e ajudasse na divulgação dos seus objetivos. Em discurso, Otávio Mangabeira dizia que a ideia era realizar uma campanha cívica, um movimento de opinião que reunisse os vários setores sociais como a 46 SAMPAIO, Nelson de Souza. O Diálogo democrático na Bahia. Revista Brasileiro de Estudos Políticos: Livraria da Revista Forense, Rio de Janeiro,1960. 47 COMITÊ feirense pró-Eduado Gomes. Folha do Norte, 29/set/1945, p.1 32 imprensa, intelectuais, mocidade, proletários e elementos femininos, consolidado na formação desse comitê. 48 O comitê sistematizou suas propostas políticas na forma de um manifesto. O documento posicionava-se contra a ditadura varguista ao dizer que a UDN era a portadora da “luz” que norteou o Brasil para os rumos da democracia, expondo as razões para o apoio “à candidatura presidencial do BRIGADEIRO EDUARDO GOMES bravo e impoluto militar, protótipo de virtudes cívicas e morais”. Conclamou de amigos a operários para com a cédula eleitoral apoiarem a candidatura udenista. 49 Qual seria o perfil da mocidade feirense que compunha os comitês a favor de Eduardo Gomes? Supõe-se que ela foi formada por estudantes do Colégio Santanópolis. Acima foi mencionado um comício feito em apoio à candidatura presidencial da UDN e um de seus participantes foi o estudante Raimundo Reis de Oliveira (1930-2002). Este jovem tinha 15 anos em 1945 e destacou-se como orador nessa escola de formação secundária, motivo que levou políticos feirenses a levarem-no ao coreto para participar do ato público.50 Talvez sua presença dotasse a campanha do Brigadeiro Eduardo Gomes de teor cívico, sugerindo que todas as pessoas deveriam apoiar aqueles que lutaram para a abertura democrática e o fim da ditadura. Em suas ações políticas, o comitê voltou-se para o meio rural. Os distritos eram locais mais habitados do que os centros urbanos e a quantidade de eleitores era maior; constituíam em divisões territoriais administradas por uma sede e seu contingente populacional superava a população urbana que residia em Feira de Santana. A propaganda deveria ser intensificada nessas localidades para levar as propostas políticas às populações mais distantes e convencê-la a votar em Eduardo Gomes. Apesar da campanha, o Brigadeiro Eduardo Gomes perdeu as eleições para Eurico Gaspar Dutra, candidato do PSD. Em Feira de Santana a diferença foi de mais de três mil votos.51 No plano nacional, Dutra foi eleito com 55% dos votos. A concepção de frente única, entretanto, defendida pela UDN, teve mais força no candidato a governador da Bahia em 1946. Ela incluiu outros partidos 48 ENTRA EM ATIVIDADE a União Democrática Nacional. Folha do Norte, 02/jun/1945, p.1 MANIFESTO do comitê feirense pró-Eduado Gomes. Folha do Norte,13/out/1945,p.1 50 Disponivel em: <http://ginasiosantanopolis.blogspot.com/2010/12/raimundo-reis-oliveira.html>. Acesso em 17 nov. 2011 às 23:26. 51 DEPARTAMENTO ESTADUAL DE ESTATISTICAS. Representação política. IBGE,1949. 49 33 na defesa de Otávio Mangabeira para o governo do estado, como veremos a seguir. 3. Otávio Mangabeira unanimidade?52 governador em 1946: candidato da A corrida para o pleito presidencial, apesar do curto espaço de tempo, serviu para tecer alianças nos municípios baianos e ratificar antigos laços. A derrota da UDN deixou um legado político considerável para as próximas disputas: comitês políticos, forte propaganda nos municípios e a imagem de que a UDN lutou para a abertura democrática. As próximas eleições seriam para governador do estado e o candidato de “conciliação” foi Otávio Mangabeira: Estamos informados de que durante sua permanência entre nós, o parlamentar e dirigente pessedista [Eduardo Fróes da Motta] procurará orientar seus correligionários no sentido de uma política de conciliação adotada pelas maiores forças democráticas do estado em torno da candidatura, ao governo da Bahia, do Sr. Otavio Mangabeira 53 presidente da UDN. O PSD e a UDN formaram uma coalizão que, apesar das diferenças, acentuadas pelo antigetulismo e antipopulismo, visou criar um clima de paz social e assegurar a normalidade democrática.54 Otávio Mangabeira era um político cuja trajetória foi marcada pelo combate ao Estado Novo e, mesmo exilado, fez críticas à ditadura Vargas enviando cartas ao Brasil cujo conteúdo ideológico ajudou a construir uma alternativa política que viria a se tornar a União Democrática Nacional.55 Uma das lideranças feirenses que apoiou a candidatura de Otávio Mangabeira foi Eduardo Fróes da Motta. Filho do ex-intendente de Feira de Santana, Agostinho Fróes da Motta. O médico Motta se graduou em medicina na Universidade da Bahia e ao longo do século XX construiu uma trajetória de 52 Lucia Hipólito aponta para a intencionalidade de Otávio Mangabeira se tornar o candidato a presidência. O acordo interpartidário de 1948 visava à sucessão presidencial de 1950. Dutra tentava coordenar uma candidatura de união nacional para manter o controle da própria sucessão. O acordo mantinham vivas as aspirações de Otávio Mangebeira de vir a ser escolhido por Dutra como candidato de união nacional. Ver PSD de raposas e reformistas. p.70. 53 DEPUTADO Fróes da Motta. Folha do Norte, 09/Nov/1946, p.1 54 DULCI, Otávio Soares. A UDN e o antipopulismo no Brasil. Belo Horizonte: UFMG, 1986. 55 Ver: SILVA. op. cit. 34 destaque dentro da política nacional. Durante a ditadura de Vargas, conseguiu se aliar ao governo alcançando benefícios políticos, como o cargo de prefeito, que, durante o Estado Novo, era ocupado por indicação dos interventores que eram nomeados por Getúlio Vargas. Eduardo Fróes da Motta durante as primeiras décadas do século XX coligou-se com outras lideranças políticas feirenses, como Edelvito Campello Araújo, Servilio Alves Carneiro, Colbert Martins da Silva (1928-1994), Francisco Caribé,56 entre outros, agrupando herdeiros políticos da Era Vargas. Parte dos ex-prefeitos formaram quadros do Partido Social Democrático em Feira de Santana ao lado de outros políticos que se tornaram entre 1948 e 1965 vereadores e prefeitos. Abaixo, temos o documento, onde se encontra registrado a lista de fundadores do PSD feirense. Nominantes dos membros do partido; PRESIDENTE – Eduardo Fróes da Motta. 1º vice-presidente Servilio Alves Carneiro. 2º vicepresidente – Teódulo Bastos de Carvalho. 1º secretário Antonio Manuel Araújo. 2º secretário – Antonio Salustio Azevedo. – tesoureiro Alvaro dos Santos Rubem – Membros: Américo de Almeida Pedra – Augusto Fróes da Motta – Agostinho Fróes da Motta – Anacleto Figueiro Mascarenhas – Antonio Faustino de Oliveira – Colbert Martins da Silva – Carlos Marques – Francisco Martins da Silva – Genésio Moreira de Azevedo – Hermogenes Santana – João Pereira de Aguiar – Manuel dos Anjos Almeida – Mario Portugal Caribé – Nourival de Oliveira Freitas – Manuel Justo de Brito – Osvaldo Abreu Boaventura – Osvaldo Monteiro Pirajá – Olegário Bispo de Almeida – Oscar Marques – Tito Barreiros Machado – Francisco José Pinto dos 57 Santos – Manuel de Castro Barbosa – Dorival Costa Oliveira. Dos 27 nominantes que assinaram o registro de fundação do PSD em Feira de Santana e que atuaram nos partidos doze conseguiram ser eleitos para vereador pela legenda e um se tornou prefeito: Francisco José Pinto dos Santos, mais conhecido como Chico Pinto. Este conjunto de políticos foi liderado pelo presidente do partido Eduardo Motta e o direcionamento dado aos seus correligionários para apoiarem a candidatura de Otávio Mangabeira caracteriza o agrupamento como frente suprapartidária, o que contribuiu para a vitória de Mangabeira ao governo do estado apoiado pela aliança PSD-UDN em 1946.58 No entanto, no plano municipal esta união não se configurou e longe de estarem mais uma vez coligados em torno de um nome para as eleições 56 Sumário – difamação.Processos-Crimes. Feira de Santana, CEDOC/UEFS. Cx-86 Ex-03 Doc- 1686. Fls 48. 57 Sumário – difamação.Processos-Crimes. Feira de Santana, CEDOC/UEFS. Cx-86 Ex-03 Doc- 1686. Fls 48. 58 DEPUTADO Fróes da Motta. Folha do Norte, 09/Nov/1946, p.1 35 municipais de 1948, o cargo de prefeito passou a ser objeto de disputa entre esses dois partidos. 4. Corrida para as eleições municipais, 1947: da conciliação ao embate A coligação UDN-PSD que elegeu para governador do estado da Bahia Otávio Mangabeira em 1946 não se repetiu nas eleições municipais que elegeram um novo prefeito para Feira de Santana para o período entre 1948 e 1952. Ao contrário da “tranquilidade” que se vivenciou durante a campanha estadual, o pleito de 1947, para o executivo municipal, foi marcado por um clima de tensão e disputa. A UDN feirense foi formada por políticos que perderam espaço durante o Estado Novo e que comungavam de ideias liberais. Muitos deles entraram em contato com essas ideias quando se graduaram entre 1930 e 1940, na Faculdade Livre de Direito da Bahia, lugar de destino de estudantes do interior que almejavam uma formação de nível superior. Esta instituição, conforme demostrava Paulo Santos Silva, foi um dos locais de resistência contra a ditadura de Vargas. Através de entidades estudantis como o Centro Acadêmico Ruy Barbosa, e por meio de publicações no jornal A tarde, onde destacavam a necessidade do restabelecimento das liberdades políticas e civis, os bachalerandos em direito protagonizaram a campanha pela volta da democracia.59 A possibilidade de reocuparem espaços no controle do município, com as eleições em 1947, redirecionou a campanha política udenista. Durante a corrida presidencial, a UDN baiana através de jornais e comitês montou uma estrutura propagandística que serviu à campanha eleitoral do udenista Carlos Rubiños Bahia ao cargo de prefeito de Feira de Santana. Os comitês formados durante a campanha do Brigadeiro foram reutilizados e a corrida por eleitores se voltava não para o centro urbano feirense, mas para o seu entorno, os distritos, locais onde os contingentes populacionais eram maiores, apesar da existência de um grande número de analfabetos. 59 SILVA.op.cit. 36 Foi então constituída a Coligação Democrática Feirense, formada por quatro partidos: a União Democrática Nacional, o Partido Social Trabalhista, o Partido Socialista Brasileiro e o Partido Republicano.60 O número de legendas que apoiavam a candidatura de Carlos Bahia poderia sugerir uma ampla adesão ao seu nome e a conclusão de que ele seria um candidato da unanimidade, como havia sido Otávio Mangabeira. Supondo-se que ele faria a “pacificação na política local”.61 Com essa ideia o jornal Folha do Norte anunciou o lançamento de sua campanha eleitoral. Foram marcados dois comícios para 1º de novembro de 1947, em Pacatú, da “Coligação Democrática Feirense”, que contou com a presença de “oradoras”, isto é, mulheres que formavam o comitê feminino pró-Carlos Bahia, encarregadas de discursar publicamente ao lado de importantes líderes políticos feirenses.62 Junto estavam rapazes que ajudavam na organização dos comícios e da campanha partidária. Nelson de Souza Sampaio salientou que a utilização de outros meios de propaganda política como rabiscos nas paredes, cartazes, manifestos, rádio, anúncios em jornais era comum. Dessas tarefas se incumbiam os comitês. A escolha de Bahia para a prefeitura teve, conforme seus correligionários, o objetivo de congregar todos os partidos políticos feirenses. No comício da Coligação Democrática, realizado em 23 novembro de 1947, foi ressaltado que essa era uma “candidatura dos interesses superiores, do espírito da ordem e das tradições cristãs, políticas e sociais do povo feirense”.63 O discurso se utilizou de palavras que pregavam a defesa de valores cristãos católicos, como se o candidato fosse detentor de princípios morais indispensáveis para se tornar prefeito: A candidatura do Sr. Carlos Rubiños Bahia justifica-se pelo entusiasmo de todos os correligionários, porque o nome do candidato à prefeitura municipal é um escudo inquebrantável da ordem, do 64 civismo, da fé, da honestidade, do trabalho e do amor à família. 60 POSSÍVEL a pacificação em torno da candidatura de Carlos Bahia. Folha do Norte, 01/Nov./1947, p.1 61 POSSÍVEL a pacificação em torno da candidatura de Carlos Bahia. Folha do Norte, 01/Nov./1947, p.1 62 POSSÍVEL a pacificação em torno da candidatura de Carlos Bahia. Folha do Norte, 01/Nov./1947, p.1 63 RUMO as urnas. Folha do Norte, 22/Nov/1947, p.1 64 RUMO as urnas. Folha do Norte, 22/Nov/1947, p.1 37 O direcionamento da campanha da Coligação Democrática Feirense centrou-se na figura de Carlos Bahia como um homem de caráter, detentor de um “escudo inquebrantável”, não de sua trajetória como político. A escolha de Bahia cumpria estratégias da UDN feirense, que era levar ao pleito de 1947 um candidato sem muita experiência política, cuja carreira como pecuarista e homem de bens, baseada na “honestidade” e no “trabalho” era mais importante naquele momento. Para os udenistas de Feira de Santana a “redemocratização” iniciada em 1945 deveria significar uma nova fase política livre dos resquícios e do atraso político representados pelo Estado Novo. Embora não fosse bacharel, Carlos Bahia incorporava características do “estilo” udenista. A “mística da ordem” e o “moralismo” foram traços característicos de sua campanha e do “perfil ideológico” do partido. A ordem que aparece como “escudo inquebrantável” foi um dos lemas da UDN convertidos em práticas políticas. A defesa da ordem era mais importante do que a defesa da democracia.65 A imagem que transparecia de Carlos Bahia acentuava valores morais inspirados na “honestidade, na fé, no civismo e no amor à família”. Os valores morais desse homem público serviam para explicar seu comportamento político com ênfase na probidade pessoal, conforme assegurava o Folha do Norte. Carlos Bahia também era ligado a uma rede de parentesco que se não o impulsionava, certamente servia como referencial simbólico para a indicação do seu nome para o pleito. Ele era filho de Bernardino Bahia, ex-intendente de Feira de Santana durante a Primeira República, cunhado de Arnold Silva que era líder político da UDN e sócio-proprietário do jornal Folha do Norte. Esse laço familiar o colocava na mais “elevada linha social da cidade” ligado à uma família abastada e tradicional. Apesar de não ter ocupado cargos públicos, antes de sua candidatura, existiam chefes políticos que o apoiavam. De alguma forma, esses referenciais serviam para recuperar a imagem desses antigos líderes e associá-los ao pretendente udenista numa tentativa de fortalecer a candidatura. 66 A sua figura também se revestia de um “sentido de excelência”, de um elitismo ligado à aristocracia feirense. A ênfase nas qualidades pessoais e na tradição familiar foi o eixo de sustentação da campanha, além da crença de 65 66 BENEVIDES.op.cit.,p.263. PELA ORDEM moral e social. Folha do Norte, 19/dez./1947, p.1 38 que Bahia era o melhor nome para representar parcelas da classe dirigente feirense.67 Durante a campanha da Coligação Democrática Feirense, o Folha do Norte reservou as primeiras páginas para promover a candidatura de Carlos Bahia. Discursos, comícios e comentários dos eventos da agenda política do candidato da UDN eram a prioridade. Frases de efeito ou trechos do programa partidário ditas em pronunciamentos foram reproduzidas em destaque sob a forma de epígrafe, abaixo do nome do jornal. Enquanto não se definia uma candidatura pessedista, para o leitor, ficava claro que apenas Bahia disputava o pleito alimentando a ideia de repetir em Feira de Santana o resultado que elegeu Otávio Mangabeira nas eleições de 1946.68 O impresso, durante as eleições pendeu abertamente para promoção do candidato udenista, redirecionando o trabalho de seus jornalistas para a elaboração de artigos com fins partidários. 69 Embora, naquele momento, o PSD não tivesse um jornal que divulgasse suas propostas, como o Folha do Norte, que divulgava as da UDN, ele detinha forte influência nos meios políticos. No pós-Estado Novo os pessedistas saíram fortalecidos, do ponto de vista político, principalmente porque aqueles que foram beneficiados durante a ditadura Vargas fizeram parte do PSD. Isso permitiu a esses políticos a criação de uma rede de indivíduos, principalmente nos meios rurais, que seriam responsáveis por levar até os locais mais distantes do centro urbano de Feira de Santana as políticas públicas. Essa era a função dos administradores de distritos. Eles eram o vínculo entre o prefeito e comunidades rurais e ao mesmo tempo gozavam de prestígio social e político. Supõe-se que durante a ruptura do Estado Novo aqueles que comporiam o PSD feirense nomearam a maioria dos administradores de distritos, permitindo o controle político sobre áreas rurais onde se concentrava a maioria do eleitorado. As localidades que formavam a circunscrição territorial eram: Tiquarussu, Ipuaçu, Jaguara, Tanquinho de Feira, Maria Quitéria, locais administrados por Feira de Santana. Mesmo com influência política no interior de Feira de Santana os pessedistas não concorreram ao pleito majoritário. Cogitou-se o nome do então Deputado Federal Eduardo Fróes da Motta para concorrer pela legenda do 67 BENEVIDES.p.253 PELA ORDEM moral e social. Folha do Norte, 19/dez./1947, p.1 69 Honorato Manuel Bonfim que também era filiado à UDN e um dos jornalistas que publicavam artigos a favor da campanha de Carlos Bahia. 68 39 partido o que não se efetivou, conforme foi anunciado em entrevista do político ao jornal O Globo e reproduzido pelo Folha do Norte. O periódico feirense ao reproduzir parte da entrevista transcreveu uma das afirmações feitas no O Globo. Com espanto esse jornal anunciou: “um deputado federal vai trocar sua cadeira de deputado por uma prefeitura do interior”.70 Tentando contornar a situação, Motta disse que o cargo de prefeito de Feira de Santana era tão importante quanto o de deputado ou secretário de estado e que sua candidatura seria um gesto de “gratidão, evitando que o município seja entregue a pessoas pouco ou quase nada interessadas em servi-lo”.71 E principalmente porque existiam “pessoas interessadas em apoderar-se da prefeitura para beneficiar amigos, explorar o povo e exercer vinganças pessoais”, certamente essa era uma alusão ao grupo composto por membros da UDN que disputava com o PSD feirense. 72 O controle de redutos eleitorais permitiu a Eduardo Fróes da Motta se articular com o PTB e formar a Aliança Feirense. A “atuação moderadora” baseada na “esperteza” e na “acomodação” refletia o comportamento típico dos pessedistas. Era uma“raposa” formada na prática política e nas lutas eleitorais. Liderança tradicional e atenta às reivindicações das bases do interior, de onde viam sua força eleitoral.73 Agnaldo Soares Boaventura foi o indicado pela Aliança Feirense. As reuniões entre lideranças do Partido Trabalhista Brasileiro e do Partido Social Democrático para formalizarem a junção das legendas e a escolha do candidato foram realizadas no “reduto trabalhista”, a Fazenda Paus Altos.74 O jornal Folha do Norte qualificou a união interpartidária como uma “tragédia”.75 A Aliança Feirense elegeu o candidato petebista Agnaldo Soares Boaventura. A conciliação entre os partidos criados por Getúlio Vargas obteve êxito. 76 A perda provocou rápida reação da UDN alegando, através do Folha do Norte, que nas eleições houve fraudes. Iniciava-se uma conspiração contra 70 ASSIM FALOU vsa. excelência. Folha do Norte. 01 /Nov./1947, p.4. ASSIM FALOU vsa. excelência. Folha do Norte,01 /Nov./1947, p.4. 72 ASSIM FALOU vsa. excelência. Folha do Norte,01 /Nov./1947, p.4. 73 HIPPOLITO, Lúcia. De Raposas e Reformistas: o PSD e a experiência democrática brasileira (1945-64). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. pp.44-49. 74 DO CONCLAVE de finados à tempestade da quarta Feira. Folha do Norte, 15/Nov./1947, p.4. Na Folha do Norte de 14 fevereiro de 1948 consta que essa fazenda pertence a Carlos Bahia. 75 DO CONCLAVE de finados à tempestade da quarta Feira. Folha do Norte, 15/Nov./1947, p.4. 76 As fraudes e irregularidades do pleito de 21 de dezembro, preocupam a justiça. jornal folha do Norte. 10/jan/1948. 71 40 a posse do prefeito, ligado ao “temido getulismo”, que visava deslegitimar o pleito como veremos a seguir.77 5. Janeiro frustrado da UDN: a dupla derrota udenista e as fraudes eleitorais nas eleições de 1948 No domingo dia 21 de dezembro de 1947, eleitores feirenses compareceram às urnas para escolherem o prefeito e os membros da câmara de vereadores. As semanas que se seguiram às eleições foram de espera pelo resultado.78 A apuração adentrou as festas de final ano, mas não saiu a decisão definitiva na primeira semana de janeiro, como era de se esperar, pois haviam sido feitas denúncias de fraudes nas eleições divulgadas pelo Folha do Norte. A Junta Apuradora composta por membros da Coligação Democrática esteve à frente das investigações. Desde sexta-feira, dia 2 de janeiro de 1948, com a abertura das últimas urnas localizadas no distrito de Tanquinho, já circulavam pela cidade rumores da vitória de Agnaldo Soares Boaventura. No sábado, o Folha do Norte noticiou a vitória da Aliança Feirense no texto intitulado: “Gravíssimas irregularidades nas eleições de dezembro”, sugerindo que a vitória “pessedista” foi conseguida através de fraudes: Examinadas com atenção e cuidado as listas eleitorais, membros da “Coligação Democrática Feirense” em trabalho penoso e demorado, conseguiram descobrir algumas das tremendas fraudes e anormalidades verificadas nas eleições municipais, onde eleitores votaram duas ou três vezes [...] Ai está à vitória pessedista [...] O total de votos impugnados pela “Coligação Democrática Feirense” monta a mais de 2.300 votos e o Sr. Dr. juiz acha-se na impossibilidade de expedir o diploma de prefeito porque as urnas 79 impugnadas podem fazer mudar a situação do pleito Membros dos partidos ou das coligações faziam parte da Junta Apuradora que contabilizava os resultados e os comparavam as listas eleitorais. Essas listas eram publicadas em jornais de grande circulação, como o Folha do Norte, e divulgavam nominalmente os votantes da Zona Eleitoral.80 77 BENEVIDES.op.cit.,p.249. O PLEITO de 21. Folha do Norte 27/dez/1947.p.1 79 GRAVÍSSIMAS irregularidades nas eleições de dezembro. Folha do Norte. 03/jan/1948.p.1 80 Ver: Folha do Norte. 24/Nov/1945.p.1 78 41 As juntas após constatarem irregularidades, como essa que foi registrada, poderiam solicitar ao juiz a impugnação das eleições no Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Essas informações que foram publicadas pelo Folha do Norte tentavam cancelar o pleito devido às irregularidades encontradas no processo eleitoral. Todas as edições do mês de janeiro foram destinadas a divulgar, semanalmente, os “achados” feitos pela laboriosa equipe, composta por membros da Coligação Democrática e responsável pelas investigações. Quem apresentou as denúncias, formalmente, foi o advogado e então Deputado Estadual pelo PR, Humberto Alencar, à justiça eleitoral. Coube ao “vanguardeiro da Democracia que é o Deputado Humberto Alencar”, como adjetivou o Folha do Norte, que não poupava elogios aos membros da Coligação Democrática, a liderança na condução dos trabalhos para anular as eleições.81 O Juiz de Direito da Vara Crime, Colombo Cerqueira, ao atender solicitações da Junta Apuradora, foi quem enviou um telegrama para o presidente do Tribunal Regional Eleitoral, Andrade Teixeira, expondo motivos do impedimento da diplomação do prefeito de Feira de Santana. A mensagem relatava irregularidades eleitorais, como votos de eleitores falecidos e em duplicidade, falsidade de títulos e falsidade de registros que não foram publicados antes das eleições. Essas alegações poderiam mudar os resultados das eleições 82 Em resposta ao telegrama enviado pelo juiz feirense, o presidente do TRE respondeu que diante da possibilidade de “alteração na colocação dos candidatos, proclamação e posse resultantes tão somente votos apurados e recorridos não poderão ser realizadas até que o tribunal comunique resultado de suas decisões”. 83 Com isso, a Coligação Democrática Feirense comemorou a possibilidade da confirmação das irregularidades e consequentemente a nulidade do pleito. Almejava a possibilidade de, pela via jurídica, mudar o rumo das eleições. As cinco edições do Folha do Norte do mês de janeiro trouxeram o resultado das investigações feitas pela Junta Apuradora. O esquema de 81 FRAUDES e irregularidades no pleito de 21. Folha do Norte.10/jan/1948. FRAUDES e irregularidades no pleito de 21. Folha do Norte.10/jan/1948. 83 FRAUDES e irregularidades no pleito de 21. Folha do Norte.10/jan/1948. 82 42 fraudes baseou-se, segundo o jornal, na manipulação eleitoral do “partido dominante” de Feira de Santana, o PSD, através de: 1) Inscrição de eleitores fora do prazo legal estabelecido pelo TRE; 2) duplicação de votos, isto é, eleitores votavam várias vezes em seções diferentes, portando títulos diferentes ou com o mesmo; 3) acesso a documentos de eleitores em branco, por indivíduos ligados à política pessedista, o que possibilitava uma pessoa votar com mais de um título; 4) Votos de pessoas falecidas antes da execução do pleito; e 5) votações de eleitores de outras zonas eleitorais. 84 Inscrições de eleitores fora do prazo legal constituíram táticas pessedistas de fabricação de votos, segundo as informações do Folha do Norte. Relações de amizade entre Demócrito Soares (1908-1963), exserventuário da justiça e tesoureiro do PSD, e o Juiz Alibert do Amaral abriram brechas nos prazos para entrega das inscrições de eleitores, assim publicou o periódico. Ao invés de entrega-las na segunda-feira dia 21 de outubro de 1947, último dia para entrega, Soares entregou no outro dia. Mesmo com o aviso do escrivão do cartório, Epaminondas Vicente dos Reis, do vencimento do prazo para entrega da documentação eleitoral, o ex-tesoureiro, conseguiu um bilhete do Juiz que dizia: “Epaminondas – receba as petições sob minha responsabilidade[...]”.85 A ligação pessoal entre ambos garantiu o tratamento diferenciado dado pelo Juiz ao membro do PSD. Naquele dia, foram aceitas 77 inscrições que, posteriormente, seriam convertidas em títulos eleitorais. A multiplicação de votos consistia na repetição da votação pelos eleitores. O título ao portador possibilitava àquele que estivesse com o documento em mãos votar sem nenhum tipo de comprovação de identidade.86 O Folha do Norte registrou que um mesmo eleitor votou 9 vezes com títulos diferentes. Em outra denúncia o título “6.045 pertenceu a 6 pessoas”.87 Em determinadas seções o número de votos foram superiores aos previstos.88 Segundo o deputado estadual Humberto Alencar, Demócrito Soares não se beneficiou da amizade com o juiz apenas para aumentar o prazo para entrega de inscrições eleitorais. O “ex-serventuário da justiça” obteve acesso a fichas de eleitores em branco. Alencar exibiu um documento do cartório que 84 GRANDE escândalo eleitoral. Folha do Norte.17/jan/1948.p.1. GRANDE escândalo eleitoral. Folha do Norte.17/jan/1948.p.1. 86 SOARES NETO, Cícero José Alves. Coronelismo e fraudes eleitorais: análise processual (1950). Revista do Curso de Direito da Universidade Federal de Uberlândia, v. 33, 2005. 87 UM SÒ ELEITOR deu nove votos – Assinatura nos títulos – como funcionava a máquina dominante – a dignidade política de Feira exige desagravo. Folha do Norte 24/jan/1948.p1. 88 GRANDE escândalo eleitoral. Folha do Norte.17/jan/1948.p.4. 85 43 confirmava a entrega de “489 processados eleitorais e igual número de fichas em branco” ao Sr. Soares. Fato que comprovava a utilização de “papeis privativos do Juizo Eleitoral” pelos “dirigentes pessedistas” para a fabricação de títulos eleitorais.89 As apurações feitas pelos membros da coligação encontrou votação feita com o título de José Joaquim Cerqueira falecido em Humildes no dia 21 de fevereiro de 1947, exatamente 11 meses antes das eleições. Em resposta, Agnaldo Soares Boaventura e membros do PSD requereram ao juiz de paz do distrito, um exame nos livros de Registro Civil daquela localidade. Segundo as informações compiladas pelo Folha do Norte não havia, no livro 7, óbito em nome de José Joaquim Cerqueira. O documento e a suposta intenção em ajudar com as investigações por parte do PSD não convenceram a “coligação”. A “caravana jurídica” dirigiu-se ao distrito compondo-a o Juiz da 2º Vara Crime, Candido Colombo, responsável pelas investigações, na busca pela certidão de óbito de José Joaquim Cerqueira.90 O Juiz achou no livro 7, folha 47, que estava solta, o registro de óbito de Cerqueira que morreu em 11 de fevereiro de 1948. Isso confirmava fraudes e ratificava a imagem construída pelo Folha do Norte de que havia crimes eleitorais acontecendo e seus autores eram “os pessedistas”.91 O Tenente e Bacharel Durval Tavares Carneiro foi um dos que votaram fora da zona eleitoral. Desde 1946, mudou-se da capital do estado para Feira de Santana sem, contudo, transferir seu título de eleitor. Segundo denúncias divulgadas no Folha do Norte, ele participou das eleições feirenses mesmo sem autorização legal para votar com um documento, cuja numeração pertencia a Teresinha Fernandes Cavalcanti, conforme certifica o escrivão Epaminondas Vicente dos Reis. Um oficial da Polícia Militar, responsável pela ordem citadina, estava ligado umbilicalmente aos partidos políticos feirenses e votou “como disciplinado pessedista que é”.92 As denúncias divulgadas pelo Folha do Norte do processo eleitoral feirense nos apresentam um emaranhado de conexões entre política partidária, 89 GRANDE escândalo eleitoral. Folha do Norte.17/jan/1948.p.4. 91 O “DEFUNTO” de Humildes morreu, mesmo... Folha do Norte.24/jan.1948.p.4 GRANDE escândalo eleitoral. Folha do Norte.17/jan/1948.p.4. 92 44 abusos de poder e relações pessoais. Desses fios entrelaçados é possível extrair informações valiosas sobre práticas políticas realizadas em Feira de Santana. Cícero José Alves Soares Neto analisando as relações entre fraudes eleitorais e coronelismo caracteriza, historicamente, onde se instalaram, entre 1940 e 1960, falcatruas nas fases do processo eleitoral e identifica três: 1) Alistamento onde se processa a qualificação do eleitorado para habilita-lo a participar ou não do direito de votar; 2) votação, fase na qual o eleitor é recebido pela mesa receptora e o auxilia no ato de votar; e 3) a apuração, que, como o próprio nome sugere apura e coleta o resultado que foi depositado nas urnas; é o momento de consolidação do processo. O autor argumenta que a falta de controle dos coronéis sobre a “massa votante cativa do curral eleitoral”, em meados da década de 1940, fez com que eles recorressem às fraudes eleitorais, principalmente nessas “dimensões” supracitadas. Apesar da dissertação não sustentar a tese central defendida por Soares Neto, seu trabalho sociológico nos mostra a dinâmica interna das eleições. Subsidiado por dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) ele constata três tipos de fraudes, o eleitorado fantasma, a votação múltipla e o mapismo. No primeiro ocorre uma produção desenfreada de uma massa votante superior a população alistável. No segundo, em que o eleitor, por meio do título eleitoral ao portador, pode votar com vários títulos diferentes ou em seções diferentes. No último caso, existe adulteração das atas, mapas e boletins eleitorais, visando reaproveitamento dos votos em branco e a transferência de um candidato para o outro. Em muitos casos existia a conivência de setores do judiciário com a Junta Apuradora para “redirecionarem os votos”.93 Essas fraudes eram facilitadas pela existência do título ao portador e das cédulas individuais dos candidatos e partidos. Quando o eleitor se dirigia às urnas, antes de 1955, ele tinha que ter em mãos, além do título, as cédulas individuais dos partidos. Nelas constavam informações eleitorais do partido que forneceu esse documento. No caso das eleições em Feira de Santana, o votante quando comparecia às urnas tinha em mãos uma cédula onde não constavam informações dos dois candidatos, Agnaldo Soares Boaventura (PTB/PSD) e Carlos Rubiños Bahia (UDN). Havia registro de um dos candidatos e a distribuição era feita pelos partidos, que arcavam com os custos 93 CÍCERO.op.cit., 45 de confecção e entrega aos eleitores. Apenas com a Reforma Eleitoral, em 1955, são adotadas a cédula única com informações de todos os candidatos ao pleito e a identidade eleitoral com retrato no título. Alterações que objetivavam “evitar o controle político dos eleitores”.94 O cartório, conforme boletim do TSE, era um dos locais de onde se originavam as fraudes eleitorais.95 A partir dele era possível produzir títulos de eleitores falsificados ou autênticos, mas sem o preenchimento da assinatura, cabendo àquele que receber o documento assiná-lo. Dessa forma um “eleitor partidário”, isto é, aquele que tem partido definido e caso se envolva na luta política, poderia com a conivência de membros do poder judiciário ter vários documentos eleitorais que não foram entregues aos donos. Isso permitiria realizar votações múltiplas, facilitadas pela imprecisão da identidade eleitoral. O setor cartorial de Feira de Santana no final dos anos 1940 e início dos 1950 tinha funcionários ligados às hostes do PSD. Uma análise em perspectiva dará uma visão mais ampla de práticas políticas que utilizam órgãos públicos para interesses partidários. Como vimos e conforme foi publicado pelo Folha do Norte, Demócrito Soares era amigo do juiz Alibert Batista do Amaral. A amizade foi constituída dentro do cartório onde eram funcionários. Soares, provavelmente, se afastou do cargo para concorrer às eleições para vereador, cujo pleito obteve êxito em 1948.96 Concorrendo anos mais tarde, outro funcionário de cartório, o tabelião e professor Almáchio Alves Boaventura, pelo PSD, foi eleito prefeito de Feira de Santana, entre 1951 e 1955. No entanto, o jornal não divulgou denúncias de fraudes ou irregularidades, sendo otimista em relação à futura administração pessedista na reportagem em que divulgou a posse de Boaventura. 97 Nessa edição reproduz notícias dos seus correspondentes, em que divulga a posse do governador da Bahia, Régis Pacheco, e do presidente, o petebista Getúlio Vargas. De algum modo, parecia operar uma espécie de “economia eleitoral” em que as moedas seriam amizades. Essa economia era movida pela troca de favores. O beneficio era dado aos amigos, muitas vezes companheiros de partido, e negado aos inimigos, aqueles que não faziam parte dos círculos 94 Ibid. Idem. 96 Para mais informações ver Apêndice C. 97 EMPOSSADO novo prefeito. Folha do Norte. 03/fev/1951.p.1 95 46 políticos e afetivos. A instância do político, longe de ser baseada em relações frias de interesses econômicos e partidários, era entremeada por laços de afetividade, respeito, honra e consideração. Esses sentimentos definiam práticas políticas, ações e ao mesmo tempo hábitos como a fidelidade ao partido ou a uma personalidade. O oficial da polícia militar Durval Carneiro, que respondia pela delegacia, votou com um título que não lhe pertencia. De fato, era um partidário da política do PSD feirense não apenas como eleitor, mas como propagador da política pessedista através de pequenos jornais que eram datilografados na delegacia em 1948, como veremos no segundo capítulo. Órgãos da justiça eleitoral e da delegacia de policia eram controlados por partidários do PSD de Feira de Santana. Os tentáculos pessedistas faziam esforços para controlar setores chaves na administração e ordem pública. Repetidas vezes, o Folha do Norte adjetivou de “máquina” esse complexo de controle político que abrangia diversas esferas da sociedade feirense como a polícia e o poder judiciário. Essa estrutura permitia ao grupo ordenar a cidade conforme suas concepções de progresso que excluía a grande maioria da população e ratificava Feira de Santana como centro comercial, dinâmico e ordenado. Nesse aspecto, PSD e UDN não se distinguiam, pois adotavam práticas que visavam a minimização da participação popular e do seu poder de decisão no jogo político. No entanto, a eleição de Francisco Pinto, o crescimento dos movimentos populares durante os anos de 1950, além do surgimento de novas correntes políticas dentro do PSD, sobretudo a “ala moça”, operaram mudanças na maneira como segmentos das classes dominantes feirenses viam parcelas marginalizadas socialmente. Retomemos as fraudes eleitorais. A narrativa feita pelo Folha do Norte pode incorrer na falsa conclusão de que a UDN feirense manteve-se longe de falcatruas. Como veremos no segundo capítulo, esse jornal e a União Democrática Nacional mantinham vínculos e ajudaram organicamente na construção e fortalecimento da corrente juracisista em Feira de Santana. Foi João da Costa Falcão quem nos forneceu informações do envolvimento da UDN com fraudes eleitorais. Ao narrar em seu livro O partido comunista que eu conheci sua trajetória nas campanhas para deputado da 47 constituinte em 1946 afirma que “a maior decepção” que teve na vida foi a quantidade de votos obtidos em Feira de Santana: “Não podia compreender como meus conterrâneos me haviam abandonado, dando-me pouco mais de 200 votos”.E acrescentava: ”Eu esperava, naturalmente, uma queda na minha votação,[...] mas não tanto”.98 Anos mais tarde ele encontrou a explicação para a baixa votação em Feira de Santana, numa campanha em que visitou vários municípios do sertão e do recôncavo baiano, além da capital e da “princesa do sertão”, e que lhe rendeu a 5º suplência com apenas 870 votos: [...] após a apuração e antes de fechar o mapa final da votação que seria remetido ao Tribunal Regional Eleitoral, um dos experts no habitual mapismo, que sempre existiu no Brasil, isto é, ganhar as eleições no mapa, sugeriu que, para o bem dos feirenses, uma vez que eu não seria eleito, deviam repartir parte dos meus votos com os dois candidatos da terra que tinham chances: Arnold Ferreira da Silva, pela UDN, e Eduardo Fróes da Motta, pelo PSD. Contando com a conivência do Juiz da Comarca surrupiaram a mim e ao Partido algumas centenas de votos Nessa passagem o autor afirma que fraudar eleições eram práticas corriqueiras na década de 1940. O Juiz Eleitoral da época, em Feira de Santana, era Alibert Batista do Amaral que, para beneficiar “candidatos da terra”, legitimou a fraude e redistribuiu votos “arduamente” conquistados por João Falcão. Conivência não apenas do Juiz Eleitoral, mas dos dois principais políticos da cidade, entre os anos de 1940 e 1960, Arnold Silva e Eduardo Motta. Silva, e com ele a UDN feirense, manipularam votos entre os que melhor representavam anseios para “a população feirense”. Representavam indivíduos que organizaram frações da classe dirigente feirense durante o período estudado e se consolidaram como suas principais lideranças. A conciliação de interesses uniu adversários que mancomunavam juntos a ida à assembleia que elaborou a constituição de 1946. Mas a segunda tentativa de Arnold Silva para a constituinte, mesmo com a utilização do “habitual mapismo” não surtiu efeito. Apenas Motta se beneficiou da manobra eleitoral e conseguiu uma cadeira na câmara dos deputados. Os udenistas feirenses que lideraram a “Coligação Democrática” souberam como investigar as fraudes nas eleições em 1948 por que já as conheciam e desses mecanismos tentou se beneficiar. A classe dirigente 98 FALCÃO, João. O partido comunista que eu conheci. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 1988. p.308. 48 feirense se uniu quando era possível beneficiar ambas as frações distribuídas na UDN e no PSD, o que implicava passar por cima da vontade do eleitor. As investigações realizadas pelo Folha do Norte visavam impedir a diplomação do candidato apoiado pelo PSD. Mesmo com provas de fraudes, a justiça eleitoral empossou em 14 de maio de 1948 vereadores, inclusive Demócrito Soares, e o prefeito Agnaldo Soares Boaventura. Com a diplomação de Boaventura, a UDN foi derrotada duplamente; uma vez nas urnas, pela via eleitoral, e outra, pelo insucesso na tentativa de recorrer ao TRE para impedir a posse. Seria uma tentativa golpista em favor da democracia, versão municipal de práticas corriqueiras entre as décadas de 1950 e 1960 no Brasil? Soluções que empregavam meios autoritários foram utilizados pela UDN feirense quando da deposição de Francisco Pinto. Em Feira de Santana o udenismo se moldava na concepção da “eterna vigilância”, estandarte do golpismo. Além de fraudes o enfrentamento político e as articulações partidárias são os pontos altos das ações desenvolvidas em diversas esferas. Outras estratégias foram forjadas ao longo do período. O uso da imprensa foi uma delas. Ela assume papel relevante no diálogo interpartidário como meio de interlocução entre políticos, comunidade e no conjunto das iniciativas de interesse partidário. Assunto que será discutido no segundo capítulo. 49 SEÇÃO III – CAPÍTULO II A IMPRENSA COMO ESTRATÉGIA Este capítulo analisa estratégias e práticas utilizadas por políticos feirenses durante o período de 1948 a 1965. Suas ações visavam à representatividade política e à conquista de cargos públicos. Pode-se notar, a partir de processos crimes, que os espaços institucionais, como partidos e câmara de vereadores, não eram os únicos locais de embate, cabendo a imprensa um papel central nas disputas políticas. 1. A escassez de votos e o jornal como meio de propaganda A partir de 1945, com o fim do governo Vargas, tornou-se cada vez mais livre a manifestação de pensamento e opinião expressos através de jornais, revistas e outros meios de comunicação que começavam a se multiplicar pelo país. Em Feira de Santana, temos evidencias do surgimento, entre 1946 e 1964, de cinco jornais: O Coruja, Santanópolis, Gazeta do Povo, O Combate e O Trovão, todos eles com vida curta, não circulando por mais de seis anos. Além de garantir liberdade de expressão, a constituição de 1946 também estabelecia novos critérios eleitorais. Alfabetizados e maiores de 21 anos poderiam votar incluindo as mulheres, o que possibilitou a ampliação do contingente eleitoral. Além disso, criaram-se mecanismos que presumivelmente assegurariam lisura nas eleições, como o Supremo Tribunal Eleitoral e o voto secreto. Para conquistar o poder no executivo ou no legislativo, qualquer um que pudesse votar poderia ser votado, independente de raça, religião ou poder aquisitivo desde que fosse alfabetizado e maior de idade. Os meios de comunicação, sobretudo o jornal, ao longo desse período tiveram papel relevante, por veicularem a propaganda político-partidária. O desafio para muitos candidatos era levar propostas ao seu eleitorado, para que ele decidisse em quem votar. A imprensa teve um papel de destaque na divulgação das ideias e proposições de partidos políticos, quando não era a ela 50 vinculado. Através dela o eleitor lia as notícias da agenda eleitoral do seu candidato, das filiações partidárias, dos objetivos da campanha e das disputas interpartidárias. Nelson de Souza Sampaio, um observador da época, nos fornece algumas informações: “A propaganda sob suas diversas formas se tornou indispensável na batalha das urnas [...] um processo de catequese coletiva do eleitorado generaliza-se logo, como sucede com uma nova arma de guerra. Tem a força de uma coerção social irresistível”.99 O autor ressalta a força da propaganda como a principal “arma do arsenal político”, mesmo não representando uma parcela considerável das despesas com a campanha eleitoral. As propagandas variavam em suas formas indo desde pichações com carvão e tintas, manifestos, cartazes até distribuição de brindes.100 A impressa tinha uma funcionalidade estratégica na promoção do candidato, por tornar públicas ideias, objetivos e a figura do candidato. O controle de veículos de comunicação em massa poderia resultar em um maior poder de “catequização” do eleitorado, isto é, de transformar ou formar opiniões das pessoas. A população feirense em 1948 era composta por 93.253 pessoas distribuídas em dez distritos (Anguera, Bonfim de Feira, Humildes, Ipuaçu, Jaguara, Maria Quitéria, Pacatu, Santa Bárbara, Tanquinho e Tiquaruçu) e a sede Feira Santana. A cidade tinha cerca de 20% do total dos habitantes e os 80% restantes residiam nessas localidades, em média cada distrito tinha cerca de 7 mil feirenses, o que nos leva à constatação de que a população estava pulverizada nessas microrregiões administrativas. O interesse político não era no contigente populacional absoluto; mas na quantidade de indivíduos cujo perfil se enquadrasse nos termos do Código Eleitoral de 1946. Um censo feito pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas traz os seguintes dados: 99 SAMPAIO, Nelson de Souza. O Diálogo democrático na Bahia. Revista Brasileiro de Estudos Políticos: Livraria da Revista Forense, Rio de Janeiro,1960.p.19-20. 100 Idem.p.21 51 Quadro I – Perfil dos eleitores feirenses em 1948 INFORMAÇÕES DA LOCALIZAÇÃO, IDADE E ALFABETIZAÇÃO DA POPULAÇÃO DE FEIRA DE SANTANA LOCALIZAÇÃO POPULAÇÃO DO MUNICÍPIO DE FEIRA DE SANTANA Urbana e suburbana 19.750 Rural 63.518 IDADE De 20 a 59 anos 34.829 INSTRUÇÃO Sabem ler e escrever 15.318 Não Sabem ler nem escrever 55.579 Instrução não declarada 339 Fonte: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Sinopse Estatístico do Município de Feira de Santana. Rio de Janeiro, 1948. (Adptado) Cruzando-se os dados do IBGE e os comparando com os critérios para ser um votante, chegaremos à conclusão de que 15. 318 pessoas estavam aptas a votar. A maioria da população estava excluída da participação política através do voto. Os dados não forneceram detalhes sobre a caracterização da população de cada distrito, apenas concentrou as informações na coluna “município”. Assim aconteceu com o campo “instrução” em que não foi informado o nível de escolaridade dos feirenses, apenas distinguiu-se alfabetizados de não alfabetizados. Numa cidade com cerca de 90 mil habitantes entre final de 1940 e inicio de 1950, em média 16% da população poderia votar, quando compareciam às urnas.101 Segundo Sampaio, existiam três categorias de eleitores: o indiferente que não possui motivo para votar, o tutelado, que adota passivamente a decisão de outra pessoa e o independente, que resolve sem nenhuma influência em quem votar. O autor salienta que para o desenvolvimento político é necessário aumentar a quantidade desse último tipo de eleitor para consolidação do direito ao voto e o pleno exercício da cidadania, livre de influencias externas. De fato, ele ressalta que o desafio era tornar efetiva a autonomia do cidadão na escolha do candidato, uma vez que o eleitor tutelado 101 POPINO, Rolie E. Feira de Santana. Salvador: Ed. Itapuã, 1968. Diz: “Conquanto o voto se tenha universalizado, recentemente, o direito de votar está ainda restrito a uma pequena porcentagem dos habitantes de Feira de Santana. Em 1950, pouco mais do que 10% dos habitantes votaram nas eleições municipais. Esta situação é, em parte, o reflexo da apatia geral, em relação à política, entre a população adulta de Feira de Santana. Uma explicação bem significativa é a que decorre do fato das leis brasileiras excluírem os analfabetos das urnas”.p.14. 52 compreendia a maioria dos votantes, enquanto que os politizados compunham uma reduzida minoria.102 O voto era um objeto escasso e o meio essencial para o acesso aos cargos do executivo e do legislativo através dos pleitos majoritários e proporcionais. Apesar da propaganda política realizada pelos jornais como meio de ligação entre eleitor e o candidato, a compra de votos e a coerção vigoravam como práticas políticas. Fundar um jornal significava não apenas obter uma empresa de comunicação, mas a possibilidade de propagandear ideias e aspirações de um grupo de pessoas, assim como obter um elemento na defesa de proposições e na crítica aos adversários. Os jornais como empreendimentos particulares se reservam a realizarem publicações que os interessassem, principalmente no campo político. Com a inexistência da televisão e o precário acesso ao rádio, devido ao alto custo, a maioria da população ficava sabendo das informações através do jornal. Ele era utilizado para realizar propagandas ou anúncios e servia com um instrumento poderoso nas batalhas políticas. 2. O Folha do Norte na defesa do juracisismo. Informações divulgadas pelo o jornal indicam que com o falecimento de Tito Ruy Bacelar, em 1930, sem deixar herdeiros, os funcionários e irmãos Silva, arremataram em leilão público o periódico que desde então passou a pertencer aos membros dessa família.103 A produção jornalística e as disputas por espaços na política, no entanto, permaneceram apesar da troca de donos. Entre os membros dessa irmandade, será Arnold, quem terá uma ascensão substancial. Arnold Ferreira da Silva nasceu em 1894 e conseguiu construir uma trajetória de ascensão baseada na aliança com os membros de setores dominantes. O enlace de Arnold Silva com uma das famílias mais abastadas da cidade contribuiu para a sua ascensão política. Casou-se primeiramente com Amanda de Barros Bahia e, após falecimento desta, com Bereniza Barros 102 103 SAMPAIO.op.cit,.35-41 EDIÇÃO comemorativa 100 anos do Folha do Norte. Folha do Norte, 18/set/2009, p.1 53 Bahia, com quem teve uma filha, Maria Luisa da Silva. Ambas eram filhas do Coronel e político da Primeira República Bernardino Bahia.104 Quadro II – Intendentes e prefeitos de Feira de Santana (1890-1931) INTENDENTE OU PREFEITO ENTRADA SAÍDA Joaquim de Melo Sampaio 16 Jan. 1890 30 Jul. 1890 José Freira de Lima 30 jun. 1890 25 jul 1903 Agostinho Fróes da Motta 25 jul. 1903 1 jan. 1904 Tito Ruy Bacelar 1º jan. 1904 22 mai. 1907 José Antunes Guimarães(interino) 22 mai. 1907 1º jan. 1908 Abdon Alves de Abreu 1 jan. 1908 15 out. 1912 Bernardino da Silva Bahia 15 out. 1912 1º jan 1916 Agostinho Fróes da Motta 1 º jan.1916 1º jan. 1920 Bernardino da Silva Bahia 11 jan. 1920 1º jan. 1924 Arnold Ferreira da Silva 1º jan 1924 1º jan. 1928 Elpídio Raimundo Nova 1º jan. 1928 3 jan. 1931 Fonte: POPINO, Rolie. Feira de Santana. Salvador: Ed. Itapuã, 1968.p.149.(Adaptado) Não é nosso objetivo traçar uma biografia de Arnold Silva, mas conectálo uma rede de relações sociais que se construiu nos bastidores das redações dos jornais e que marcaram definições políticas de um conjunto de personalidades. Eles constituíram um grupo político, não apenas por se afinarem como as mesmas ideias, mas por compartilharem de um mesmo ramo familiar. Membros da família Silva compuseram as fileiras da UDN feirense intimamente ligadas à liderança de Juraci Magalhães. Quando visitava Feira de Santana e região, para cumprir funções político-partidárias, se hospedava na residência do ex-prefeito de Feira de Santana.105 Não apenas esse grupo ligava-se a essa personalidade política; outros políticos feirenses também o seguiam como o industrial Clovis Amorim, o advogado e médico Manuel Bonfim, ambos articulistas e frequentes colaboradores do jornal Folha do Norte. Eram comuns reuniões partidárias na casa de Arnold Silva, que servia como local de encontros. Isso acentuava a cisão udenista entre juracisistas e 104 PANG, Eul-Soo. Coronelismo e oligarquias 1889-1943. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. 105 CORONEL Juraci Magalhães: instalado festivamente diretório em Serrinha. Folha do Norte. 08/set/1945, p.1 54 mangabeiristas, o que acirrava a disputa interna em torno das lideranças de Juraci Magalhães e Otávio Mangabeira. Certamente, a cisão da UDN feirense resultou no seu enfraquecimento nas primeiras eleições para o legislativo, para o período de 1948-1951, no qual o partido elegeu apenas dois candidatos. Otávio Dulci, ao se referir à UDN nacional, salienta que o fracionamento começou por conta da sucessão estadual de 1950, na qual os mangabeiristas não endossaram a candidatura de Juraci Magalhães. 106 No entanto, Sonia Serra escrevendo sobre o Momento, jornal militante vinculado ao PCB baiano, identifica que o racha já se verificava nas eleições municipais de 1948.107 Mais do que um órgão vinculado à UDN feirense, evidências mostram que o Folha do Norte ligava-se à corrente juracisista. Posição que foi se acentuando ao longo dos anos de 1940 a 1960, com a inclusão de barganhas políticas, como o pedido de deposição de Francisco Pinto, prefeito entre 1963 e 1964, intermediada por Juraci Magalhães com o advento do golpe civil-militar de 1964. O corpo de colunistas era declaradamente a favor de Magalhães e os sócios-proprietários como Arnold Silva coadunavam com os juracisistas, mesclando relações de amizade com interesses políticos. Silva e seu sobrinho Hugo eram responsáveis por colunas do jornal para o qual contribuíam na produção jornalística e gerência, além de serem filiados a essa agremiação partidária. Por isso o jornal mais do que um reduto udenista em Feira de Santana, era o local de articulação política do juracisismo feirense. Eles compunham junto com Áureo Filho, José Joaquim Saback, Heráclito Dias de Carvalho e João Mendes da Costa Filho uma agremiação que defendia perspectivas antigetulistas e antipopulistas. Através de artigos dos Diários Associados, escritos por Assis Chateabriand e republicados no Folha do Norte, eles criticavam as iniciativas nacionalistas durante o segundo governo de Getúlio Vargas que, segundo eles, ajudavam a distanciar o Brasil dos Estados Unidos e deixava a relação entre os dois países num estado letárgico.108 O suicídio do ex-presidente evidenciou a maneira como o jornal se posicionava diante do getulismo e da figura de Vargas. O caso parece não ter 106 DULCI, Otavio. A UDN e o anti-populismo no Brasil. Belo Horizonte: PROED, 1986. p.128. 107 SERRA, Sônia . O Momento: História de um jornal militante. Dissertação de Mestrado. UFBA, 1987.p.60. 108 A INQUIETAÇÃO Norte Americana. Folha do Norte, 28/out/1950, p.1. 55 causado comoção para o corpo de redatores do jornal, que resumiu a noticia na metade da primeira página, reproduzindo um discurso do líder da câmara federal na época, Gustavo Capanema, no qual salientou a honra como sentimento motivador para o crime. Além disso, expôs dados biográficos, mas sem comentários a respeito. Para o Folha do Norte o que provocou enternecimento em Feira de Santana foi a morte do médico feirense Gastão Guimarães, na manhã da terçafeira. O dia 24 de agosto teve comoções divididas em face das duas mortes. O periódico salientou sua atuação na área da saúde na Bahia e como professor da Escola Normal e do Ginásio Santanópolis. Dedicou ao fato a maior parte da primeira página. O “companheiro de redação” professorando Antonio Navarro da Silva, à beira do túmulo, sublinhou o sofrimento dos seus “discípulos” e a perda de um “mestre” que era um “manancial, no qual matávamos a nossa imensa e torturante sede de conhecimentos”.109 Embora quase nunca houvesse editorais no Folha do Norte para explicitar suas posições políticas, seu corpo de redatores era vinculado ao juracisisismo e defendia o antigetulismo. Como pontua Maria Benevides é “o corte do getulismo” que acentua diferenças políticas e ideológicas objetivas entre PSD e UDN. O subnoticiamento do suicídio de Getúlio Vargas destaca “a tradicional aversão ao getulismo” que transformava “no horror ao populismo” e a qualquer manifestação de simpatia ou culto ao líder populista.110 Outros jornais que surgiram definiram posições políticas e ajudaram a compreender a função do jornal nos debates e caracterizá-lo como meio propagandístico durante o período. 3. O Trovão: PTB, impresa e disputas internas. O Partido Trabalhista Brasileiro em Feira de Santana durante o período de 1948-1964 conseguiu eleger dois prefeitos. Em 1948, o comerciante Aguinaldo Soares Boaventura e, em 1952, o prof. Almáchio Alves Boaventura (19151975), ambos apoiados pelo PSD. A governabilidade durante o período se deu principalmente pelas alianças feitas ao longo das gestões que subsidiavam as 109 SACIFICOU-SE pela honra e Dr. Gastão Clovis Souza Guimarães. Folha do Norte, 28/ago/1954, p.1. 110 BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A UDN e o udenismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981. p.212. 56 ações da prefeitura. Essa agremiação, durante o período, disputou postos do executivo principalmente pela inserção em direções de sindicatos feirenses. Quadro III - Prefeitos e coligações vitoriosas (1948-1964) PREFEITO GESTÃO PARTIDO COLIGAÇÃO VITORIOSA Aguinaldo Soares Boaventura 1948-1951 PTB PTB – PSD “Aliança feirense” Almáchio Soares Boaventura 1951-1955 PSD João Marinho Falcão 1955-1959 UDN Arnold Ferreira da Silva 1959 -1962 UDN José Sisnando Lima 1962-1963 UDN PTB-PSD “Aliança Democrática Feirense” UDN - PR “Frente Democrática Feirense” Sem coligações entre os principais partidos. Cada um lançou a sua própria. Substituiu por motivo de doença Arnold Silva Francisco José Pinto dos Santos 1963 -1964 PSD [Não Identificada] Fonte: pesquisa do autor. Das cinco legislaturas do período – José Sisnando Lima era vereador e presidente da Câmara e substituiu Arnold Silva que teve problemas de saúde – duas foram resultadas da aliança PTB – PSD. Se no executivo o PTB tinha força, o mesmo não se pode dizer do legislativo. Das cinco legislaturas, entre 1948 e 1966, a legenda do partido não conseguiu eleger mais do que 3 cadeiras na câmara de vereadores, embora estivesse ligado ao PSD. Benevides diz que o PTB foi a agremiação política que mais cresceu tanto em nível de representatividade federal, como na formação de diretórios municipais e locais.111 No entanto, em Feira de Santana, no plano municipal, os petebistas tiveram um pico de ascensão em 1955, quando elegeram 24% dos vereadores, mas nos mandatos posteriores não conseguiram repetir nem ultrapassar esse número. Além de ter se constituído num dos primeiros partidos organizados, o PTB conseguiu inserção nas organizações de classe através da atuação de seus militantes nas diretorias de sindicatos. Segundo Maria Vitória Benevides, “a legenda destinada ao operariado, tinha de transformar as entidades e órgãos 111 BENEVIDES, Maria Victoria. O PTB e o Trabalhismo: partido e sindicato em São Paulo (1945-1964). São Paulo: Brasiliense, 1989. 57 trabalhistas em sustentáculos de sua estrutura e ação”.112 O cruzamento de dados permite rastrear em quais locais os petebistas feirenses estavam alocados e quais funções desempenhavam. Manuel Narciso da Natividade, era tesoureiro na Associação dos Profissionais da Indústria da Construção Civil, mesma função que exercia no partido; Waldomiro Alves dos Santos tinha essa mesma atividade no Sindicato dos Fumageiros; e Hamilton Cohim, ex-deputado estadual e vereador era vice-presidente da Associação Comercial. Todas essas organizações ficavam em Feira de Santana. Os postos por eles ocupados tinham funções estratégicas ligadas à direção das referidas organizações. Era comum encontrar anúncios de candidatos do PTB na defesa dos trabalhadores. Claudemiro Campos Suzart, nas eleições de 1954, se proclamou “o candidato dos Trabalhadores”.113 Mas a candidatura não obteve êxito. No Folha do Norte apareciam poucos candidatos realizando propaganda e dava-se maior notoriedade às figuras que concorriam para o executivo. Candidatos a vereadores que não pertenciam à coligação liderada pela UDN tinham parcos espaços nesse veículo de informação e reservadas as últimas páginas.114 Tudo indica que no conjunto das ações políticas do PTB feirense a elaboração de um jornal de cunho getulista-trabalhista fizesse parte das estratégias políticas de divulgação de ideias e propaganda partidária. O Trovão foi o órgão do petebismo feirense, apesar da curta existência. Circulou apenas três meses em 1952. Não possuímos coleções completas desse jornal. As informações que tivemos foram provenientes de um inquérito policial envolvendo membros da direção do periódico. A maioria dos anexos traz trechos do impresso como meio de comprovação de afirmações/acusações realizadas entre as partes. No entanto, os fragmentos que foram juntados aos autos nos mostram os objetivos do jornal, sua linha política e as pessoas que o gerenciavam. Como órgão do partido, O Trovão, tinha por “lema” servir o “povo na defesa de sua economia”, visando não fazer retaliações nem ataques. Como chefe de honra, tinha Getúlio Vargas e de orientação, Joel Presídio. O jornal “defenderá a política trabalhista 112 NEGRO, Antonio Luigi. & SILVA, Fernando Teixeira da. Trabalhadores, Sindicatos e política (1945-1964).In.: Brasil Republicano. Livro 3. FERREIRA, Jorge & DELGADO, Lucilia de Almeirda Neves (orgs). Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2010.p.53. 113 Uma das alcunhas que Claudemiro Campos Suzart possuía era “Getulinho de Feira”.Ver.: OLIVEIRA, Leila Vitor Fernandes. Inquilinos da Casa da Cidadania. CD-ROM. 114 Folha do Norte, 04/ago/1954, p.4. 58 do eminente estadista Sr. Getúlio Vargas, porque foi criado por sua inspiração e em defesa do bem estar da família baiana, sendo a Feira de Santana, uma das suas mais vivas partículas”, proclamava o periódico.115 No entanto, ele não foi o único jornal vinculado organicamente ao PTB na Bahia. Sônia Serra destaca que em 1946, junto com O Momento, A Tarde e O Imparcial, circulou em Salvador o semanário Correio Trabalhista vinculado ao partido, mas de circulação efêmera.116 A pesquisadora conseguiu informações ao ler atas da Associação Brasileira de Imprensa sem consultar coleções completas do periódico. Isso provavelmente aconteceu porque esses jornais não foram incorporados aos acervos públicos e privados e não preocuparam membros do partido que visassem à preservação de sua memória. Apesar disso as notícias que dispomos sobre o PTB feirense, fornecem-nos dados valiosos sobre suas estratégias, objetivos e conflitos internos. Da mesma forma o acesso às notícias do jornal petebista deu-se através de outros meios. No nosso caso por meio de processos crimes que relatavam disputas entre indivíduos ligados ao PTB feirense. O inquérito policial foi movido pelo ex-jornalista petebista Gonçalves de Souza que declarou ter sido vítima de uma tentativa de homicídio na madrugada de 28 de abril de 1952. Na ocasião, foram deflagrados em sua residência dois tiros e, logo após, apareceu embaixo de sua porta um envelope contendo um recorte do jornal “O Combate”. Segundo seu depoimento, a acusação pelo atentado recaiu sobre Antonio Leopoldo Cabral, com quem tinha discutido por ter deixado de colaborar com outro periódico, O Trovão.117 O jornal O Combate surgiu da dissolução da diretoria de O Trovão, formada por Gonçalves Souza e Antonio Leopoldo Cabral. O racha aconteceu porque conforme o depoimento de Cabral, Souza estava usando o periódico para fazer chantagem, ameaçando divulgar noticias que pudessem comprometer prefeituras municipais, caso não fosse pago a quantia exigida. 115 O Trovão. 03/jan./1952. Fragmento anexado ao processo crime E – 03; CX – 85; DOC – 1668. 116 SERRA, Sonia. O Momento: História de um jornal militante. Dissertação de Mestrado. UFBA, 1987. 117 O Trovão. 03/jan./1952. Fragmento anexado ao processo crime E – 03; CX – 85; DOC – 1668. 59 Ele juntou recibos ao processo que mostram pagamentos realizados ao periódico O Trovão pelas prefeituras de Alagoinhas e de Santo Amaro.118 Segundo o depoimento de Antonio Leopoldo Cabral, quando Gonçalves Souza rompeu com o jornal, ele saiu da redação de O Trovão levando dinheiro e “materiais da redação”. Em sua delação, Cabral não especificou quais equipamentos foram subtraídos, sem a devida permissão, das instalações do jornal. Com capital e os recursos técnicos Souza conseguiu montar uma oficina em um de seus pontos comerciais em Feira de Santana, à Praça Bernadino Bahia. Quando o ex-vereador foi realizar a cobrança do dinheiro e dos materiais aconteceu um desentendimento entre ambos e pôs Cabral como o acusado pelo atentado à residência de Souza. Não foi encontrado o responsável pelo atentado. No decorrer das investigações Antonio Leopoldo Cabral juntou provas que confirmavam suas acusações e que colocavam Gonçalves Souza como um jornalista que estava utilizando jornais, O Trovão e, posteriormente, O Combate para fazer chantagem e extorsão. Essa desarticulação contribuiu para desviar o foco do jornal de “defender a política trabalhista” e de se consolidar como órgão de comunicação vinculado ao Partido Trabalhista Brasileira.119 Essas divergências ajudam a pensar articulações internas e desgastes nas relações entre os elaboradores do jornal petebista. Do depoimento de Gonçalves Souza foi possível extrair indícios de um clima de animosidade que existia dentro o partido. Ele relatou que o ambiente político no partido era tão tenso que duas das principais lideranças, Hamilton Cohim e Antonio Leopoldo Cabral no inicio dos anos 1950, chegaram a trocar ameaças. Segundo suas declarações, numa das discussões entre os líderes, Cabral ameaçou atirar em Cohim, porque este discordava da orientação “nazista” dada à organização política. Os depoimentos apontam que a dissolução da diretoria dos periódicos pessedistas são reflexos de disputas existentes dentro do PTB feirense. Além disso, fornecem evidencias da necessidade política de setores envolvidos com política-partidária em obter um meio de expressão de suas ideias. Jovens feirenses passam a perceber a centralidade da sua participação no debate 118 Sumário. Processos-Crimes. Feira de Santana, CEDOC/UEFS. E – 03; CX – 85; DOC – 1668. 119 O Trovão. 03/jan./1952. Fragmento anexado ao processo crime E – 03; CX – 85; DOC – 1668. 60 político e, da mesma forma, procuram um canal impresso de divulgação de propostas. 4. Os “jornaizinhos” Santanopolis e o Coruja: jornais estudantis e militantâcia política Merecem destaque os jornais o Santanópolis e O Coruja, produzidos pelos alunos do Colégio Santanópolis, este último fundado em 1933 e extinto em 1984. Os periódicos não se limitaram a registrar o cotidiano escolar. Preocuparam-se em dialogar com a sociedade feirense interferindo em questões políticas, econômicas, culturais e sociais. Trata-se de 7 números do jornal O Santanópolis e 67 edições de O Coruja, editados com interrupções em função das dificuldades de mantê-los. Em 1954, os periódicos amadureceram de “gazetas” de circulação interna nos espaços escolares para “hebdomadário”, isto é, semanários de ampla circulação divulgados em toda a cidade de Feira de Santana.120 O “Centro Cultural Áureo Filho, órgão de classe dos estudantes” começou com publicações semanais do “jornalzinho”, dirigido e escrito pela comunidade estudantil ligado a essa organização, intitulado Santanópolis. Naquela época muitos já haviam ingressado na Escola Normal de Feira de Santana e conciliavam estudos com a atividade jornalística. Criaram o jornal com a “função mais relevante de expressar o pensamento, pela imprensa livre”.121 Apesar de ter o mesmo nome do Ginásio Santanópolis, e os seus diretores terem ligações familiares com essa instituição de ensino, o jornal afirmou que não possuía ligações com a diretoria do colégio.122 A escola dirigida por Áureo Filho era um dos poucos ginásios da Bahia onde jovens saiam com uma formação de nível médio. Os que tinham interesse e condições econômicas poderiam continuar os estudos de nível superior em Salvador e se graduarem em Direito, Medicina e Engenharia, ou ingressarem na Escola Normal de Feira de Santana, no magistério. O Santanópolis era um local de 120 RESSURGE o Santanópolis. O Santanópolis, 09/set/1954, p.1. Também existiam outros jornais segundo Evandro Oliveira, filho do dono do Ginásio Santanópolis. A AVEICA e o JORNAL CULTURA. Eram jornais estudantis mimiografados. Ver: MELLO, Carlos Alberto Almeida. Memórias Periódicos Feirenses: Santanópolis (1954-1955) O Coruja (1955-1957). Feira de Santana: Fundação Senhor dos Passos; Núcleo de Preservação da Memória Feirense, 2010. 121 RESSURGE o Santanópolis. O Santanópolis, 09/set/1954, p.1 122 ATENÇÃO. O Santanópolis, 09/set/1954, p.2 61 referência na formação dos feirenses, tendo em vista que, até meados da década de 1960, se constituiu no único lugar para a formação secundarista e na preparação de estudantes para o ingresso no nível superior. Alguns jovens que estudaram no Ginásio Santanópolis uniram-se em torno do Centro Cultural Áureo Filho e quando iniciaram o jornal Santanópolis já haviam sido aprovados em exames vestibulares. Trata-se de um periódico formado por estudantes, que mesmo após iniciar os estudos superiores mantiveram um vínculo organizacional formado no ensino médio. O semanário direcionava-se ao “moço feirense” e ao “desejo incessante, de elevar o nível cultural de nossa terra” e se intitulava “órgão independente, literário e noticioso” que trazia noticias da política nacional, municipal e estadual, além de crônicas, poesias, curiosidades, divulgação de eventos sociais e propagandas. 123 O Santanópolis circulou por um ano exatamente de 1954 a 1955 e ao todo somam sete edições. Seu diretor foi José Luiz Navarro da Silva, tendo como redator chefe Antonio Wanderley, até outubro de 1955, quando assumiu Oyama Pinto.124 Ele era impresso na tipografia do jornal Folha do Norte, que pertencia ao pai de Silva que ajuda a explicar a disponibilidade das instalações da empresa gráfica aos estudantes. Certamente a infraestrutura desse periódico permitiu ao Santanópolis a formação de um impresso para um publico maior do que aquele restrito à escola, pela qualidade técnica e o aumento na quantidade de jornais. O Santanópolis não objetivava competir com um jornal tradicional, mas ser uma publicação paralela, com a finalidade de atrair a comunidade estudantil. Os jovens que deram corpo ao Santanópolis compuseram também o Centro Cultural Áureo Filho. Eram formados por Oyama Pinto, Evandro Oliveira, Antonio Wanderley, Jair Santos Silva, Maridélia Jales, Olney São Paulo. 125 Em 1954, ano de corrida eleitoral para deputados estaduais, federais, vereadores e prefeitos, o jornal trouxe propagandas e publicava artigos apologéticos de candidatos a Deputado Estadual como Áureo Filho e também anúncios da candidatura de João Marinho Falcão a prefeito. Ambos foram candidatos pela legenda da UDN. A identificação partidária e os elos familiares 123 RESSURGE, o Santanópolis. O Santanópolis, 09/set/1954, p.1 Oyama Pinto 13 anos depois de ter sido diretor do Santanópolis foi diretor do jornal Folha do Norte durante a Ditadura Militar entre 1968-1971.Ver.: Folha do Norte. 28/jul/2012. 125 MELLO, Carlos Alberto Almeida. Memórias Periódicos Feirenses: Santanópolis (1954-1955) O Coruja (1955-1957). Feira de Santana: Fundação Senhor dos Passos; Núcleo de Preservação da Memória Feirense, 2010.. 124 62 entre estudantes e membros do corpo editorial do Folha do Norte fizeram dos “jornais estudantis” um veículo de militância política pró-udenista. Jair Santos Silva, em 9 de setembro de 1954, a pouco mais de um mês das eleições, divulgou um texto que fazia apologia da candidatura de Áureo Oliveira Filho: “Candidato à legislatura estadual, satisfaz no terreno do poder temporal as aspirações do povo; é um candidato esclarecido com dotes intelectuais capaz de reagir a qualquer ataque aos nossos direitos constitucionais”.126 O artigo defendeu o prestígio do nome, sua eficiência profissional e a qualidade superior de dirigente, como era o caso de Oliveira Filho, muito da próxima a imagem que a UDN possuía de ser um “partido dos notáveis”, em oposição ao “partido das massas” prezando mais pela qualidade do que pela quantidade dos seus membros notáveis”.127 Oliveira Filho venceu com uma margem considerável de votos as eleições daquele ano. Um dos membros do Centro Cultural Áureo Filho tinha vínculo familiar com o candidato. Evandro de Oliveira que foi estudante do Santanópolis era filho do ex- Deputado Estadual Áureo de Oliveira Filho. Este era uma das figuras mais proeminentes da UDN feirense, tendo sido presidente desse partido em 1954. No entanto, a definição política dos membros do jornal serviu para a decisão nos rumos das perspectivas políticas dos seus jornalistas e redatores. Quando muitos desses membros começaram a “se envolver com as coisas da cidade” e começaram “a fazer campanhas que envolviam posições políticas” isso deu outros objetivos ao jornal. Motivo que deve ter levado a uma crise no jornal sinalizada com um intervalo de 11 meses, em que não foram publicadas novas edições entre outubro de 1954 e setembro de 1955. Assim que retornaram as publicações Antonio Wanderley foi substituído por Oyama Pinto, que ficou como diretor do jornal Santanópolis até sua última edição publicada em 10 de setembro de 1955. Na semana seguinte a última publicação do Santanópolis, o jornal mudou de nome passando a se chamar O Coruja, mas preservou a contagem do outro periódico, saindo com o “número 8”.128 Isto evidencia que o jornal preservou o corpo editorial do Santanópolis. Ao mesmo tempo sugere o comprometimento político não apenas dos diretores do jornal, mas dos 126 À CANDIDATURA Aúreo Filho. O Santanópolis. 09/set/1954.p.1. BENEVIDES. op.cit. p.225. 128 O Coruja. 17/set/1955, p.1. 127 63 jornalistas, que mesmo com a redefinição dos objetivos do semanário, mantiveram a mesma equipe de jornalistas com Olney São Paulo, Juvenaldo Lopes, Andrade Geraldo Leite e José Navarro da Silva. Antonio Wanderley foi o único que parece ter se afastado do grupo, com a mudança de nomenclatura, uma vez que não teve mais artigos por ele assinados. O Coruja, que se dizia “independente, noticioso e literário” passou a seguinte composição: diretor Oyama Pinto da Silva, redator-chefe José Luiz Navarro da Silva e os secretários Juvenaldo Correia Lopes e diretores de publicidade Joel Magno e José Amaral. A redefinição política do jornal se deu por meio de publicações que faziam apologia a políticos ligados à UDN. Não temos informações sobre vinculações orgânicas entre a UDN e membros de O Coruja, isto é, se estiveram coligados ao partido durante a circulação do jornal. O teor das notícias aponta que o partido e o impresso concordavam muitos aspectos. Reportagens trazem informações elogiosas de políticos udenistas, como o Wilson Falcão e Joselito Amorim, principalmente quando eles apoiavam atos do prefeito João Marinho Falcão. Numa das reportagens os articulistas escreveram que com exceção desses dois, a “câmara de vereadores” estava com “descaso” “para com os problemas do município”, porque segundo o periódico, os edis deveriam ter a mesma ação desses udenistas: “desistir dos vencimentos, em beneficio do município, até que a situação financeira do mesmo fosse equilibrada”. E censuram a atitude: “os representantes do povo rejeitaram a proposta do Sr. Prefeito, maculando de maneira vergonhosa aquela tradicional casa, escrevendo assim uma das páginas mais negras da história de Feira”. 129 Saliente-se que Wilson Falcão e Joselito Amorim eram mais do que camaradas de partido de João Marinho Falcão; o primeiro era filho e o segundo primo, laços de parentesco que não foram destacados pela reportagem, mas devem ter influído nos rumos da decisão desses políticos. Sem dados estatísticos sobre a situação econômica da cidade não sabemos se houve exageros nas informações transmitidas. Diziam que a administração anterior era “corrupta” e que a vitória de João Marinho Falcão significaria o fim do jogo do bicho, tema que foi debatido frequentemente no jornal O Coruja. Por essas ações Falcão não era apenas mais um político, era 129 O DESCASO da câmara de vereadores para com os problemas do município. O Coruja, 06/Nov/1955. p.1. 64 um exemplo, que incorporava virtudes altruístas, chegando a escrever um artigo apontando razões que levaram a “ser [ele] benemérito”.130 O comércio, a indústria e a prestação de serviços que comprava espaço no periódico para fazer divulgação dos seus produtos mantinham O Coruja em circulação. Destinavam-se páginas quase completas as propagandas; mas o que chama a atenção são os anunciantes que divulgavam seus préstimos. Entre os mais assíduos estão o médico Waldir Pitombo, o advogado Hugo Navarro da Silva, o dentista João Durval Carneiro, todos eles foram vereadores pela UDN feirense, como Pitombo (1959-1962), Silva (1963-1966) e Carneiro (1955-1958;1959-1962). Se não identificamos ligações orgânicas com esse partido, as informações sobre quem financiou e quem apoiou indica ligação com o udenismo feirense. Os membros do jornal O Coruja, com seu “jornalzinho” estudantil, formado por universitários, posicionaram-se politicamente defendendo a bandeira partidária da UDN, embora tentassem colocar em prática a proposição de ser um periódico independente. Nessa redação se formaram jovens que experimentariam não apenas o “exercício do jornalismo”, mas a participação política permeada pela imprensa, “a voz do mundo”.131 5. De pasquim a jornal: o Gazeta do Povo e a imprensa do PSD. O Gazeta do Povo, jornal fundado em 1959, como órgão vinculado ao PSD feirense, fez parte das táticas políticas iniciadas no final da década de 1940. Examinaremos como o PSD feirense construiu um veículo de informação de massa para o embate político iniciado com publicações caseiras e amadurecido através no Gazeta do Povo. Como não existe uma série definida dos “pasquins pessedistas” trabalhamos com informações transmitidas pelo Folha do Norte. A denominação pasquim foi dada pelos jornalistas do Folha do Norte visando desprestigiar publicações dos adversários. Nos vários artigos em que examinamos prevalecia um tom de desprezo, deboche e a crítica aos “pasquins” seguida da indicação de Carlos Bahia, da UDN para prefeito de Feira de Santana em 1947. Havia esforço em minimizar o impacto das 130 NOVE MESES de serviços honestos, superaram quatro anos de desequilibro. O Coruja, 07/jan/1955, p.1. 131 A IMPRENSA é a voz do mundo, é o terror do traidor e do covarde. O Coruja, 14/jan/1955. p.1. 65 informações veiculadas pelos “pasquins pessedistas” porque elas atingiam pessoas que detinham prestígio na cidade. Quase nunca o Folha do Norte reproduzia o que era escrito pelas publicações do PSD. Limitava-se a criticar o teor das informações veiculadas pelos pasquins, que contrariavam a “moralidade política”, desacatava “os lares”, ofendia “os brios”, “divulgava infâmias” “atingindo pessoas de conceito firmado”. A divulgação dessas publicações representava para o médico, professor e jornalista Honorato Bonfim Filho, uma “hora triste, em que se entrechocam os interesses partidários, e se retalha o conceito moral de pessoas acatadas na sociedade, com a distribuição criminosa de pasquins por pessoas desqualificadas”. Ao longo deste artigo, intitulado “Pela Moralidade política”, ao passo que faz observações ao teor político dos pasquins, ele realiza propaganda política do “probo e benquisto Carlos Arthur Rubiños Bahia”. 132 No entanto, informações divulgadas pelo Folha do Norte sobre os “pasquins pessedistas” nos permitiram analisar aspectos da impressa do PSD em Feira de Santana. As primeiras notícias apareceram em seis de agosto e as últimas no inicio de novembro de 1947, o que sugere que articulistas do PSD publicaram matérias com fins de propaganda político-partidária, durante cerca de quatro meses.133 Foi difícil precisar a frequência das publicações, mas elas tinham local e equipe de pessoas responsáveis pela distribuição e elaboração. Armando distribuía e seu filho, Valter Lacerda, escrivão e datilógrafo da polícia, escrevia no jornal. A Delegacia de Policia era o lugar de impressão do jornal, com a autorização do chefe, o Tenente Durval Carneiro. A precariedade pessoal e instalações evidencia o comprometimento de poderes públicos com a política partidária. Foi o Folha do Norte quem expôs os fatos: Valter foi designado, há meses pela prefeitura local, para servir na delegacia de policia local para servir como auxiliar de escrivão. Com o aceso da campanha política municipal surgiram, na cidade, pasquins datilografados, contendo infâmias contra elementos da “coligação democrática feirense” pasquins esses de origem pessedista. Implicando Valter no inquérito que se instaurou a respeito, sem rebouços dirigiu uma carta ao advogado impetrante, demonstrando 132 PELA MORALIDADE política. Folha do Norte, 20/set/1947,p.1. Por terem circulado clandestinamente não há evidencias materiais da existência desses pasquins. No entanto, a Folha do Norte do ano de 1947, particularmente entre agosto e setembro travou intenso diálogo com essas publicações. 133 66 sua irresponsabilidade no assunto, historiando como nasceram, no 134 recinto da delegacia de polícia local, os pasquins em causa. Nesse e em outros artigos há um direcionamento político para essas publicações do PSD. Eles direcionavam suas “infâmias” aos membros da Coligação Democrática Feirense e as edições pessedistas, devido à disputa pelo pleito em Feira de Santana, aparecem como elementos catalisadores das disputas políticas iniciadas com o fim do Estado Novo, especificamente durante a corrida presidencial de 1945. As publicações do PSD tiveram tanta repercussão nos meios políticos feirenses que rendeu a Valter Lacerda um inquérito policial, pelo crime de injúria, devido às agressões verbais direcionadas aos membros da Coligação Democrática. O que o levou a se envolver na elaboração dos pasquins pessedistas foi explanado na carta que dirigiu ao advogado que moveu a ação criminal contra ele. Mas podemos especular um dos motivos com base nas informações do jornal Folha do Norte. O seu cargo de auxiliar de escrivão de de polícia não foi obtido por meio de concurso de público. Resultou de uma designação da prefeitura que pagava seu salário, cujo prefeito, em 1947, compôs aliança com o PSD de Feira de Santana.135 Além disso, o Delegado, o Tenente Durval Carneiro, era um “político a serviço do PSD” junto com membros da delegacia.136 Mas Valter Lacerda não foi o único envolvido. Além do comprometimento com o PSD feirense do delegado de polícia, o primeiro suplente João Aguiar junto com Armando Lacerda, responsável pela distribuição, montaram a equipe chefiada por Durval Carneiro. A delegacia era a oficina e o centro de distribuição, contando com o espaço e o pessoal do serviço público na realização de publicações orientadas pelo PSD. O que levou o PSD a elaborar publicações com características clandestinas? Objetivava uma agitação política? Supõe-se que o objetivo dos pasquins fosse criar um canal de diálogo com membros da sociedade feirense através de um instrumento impresso, tendo em vista que o Folha do Norte abrigava as principais lideranças udenistas que disputavam partidária e politicamente postos no legislativo e executivo contra o PSD. Razão pela qual o 134 REVIVE o caso dos pasquins pessedistas.. Folha do Norte. 15/Nov/1947, p.1. Folha do Norte. 03/jul/1948. 136 REVIVE o caso dos pasquins pessedistas.. Folha do Norte. 15/Nov/1947, p.1. 135 67 partido se utilizou de mecanismos de controle de órgãos públicos para bancar um meio impresso de divulgação de ideias. A ideia de criar um veículo de comunicação com vínculos com o PSD foi desenvolvida durante a década de 1950. Nesse período o partido, apesar de sempre ter conquistado a maioria na Câmara de Vereadores, perdeu duas eleições consecutivas para prefeito, em 1954 e 1959, ambas disputadas pela principal liderança do pessedismo feirense, o médico e pecuarista Eduardo Fróes da Motta. Em 03 de maio de 1959, Osvaldo Galeão, o Capitão José Máximo Jandiroba e Eduardo Fróes da Motta fundaram o Gazeta do Povo “jornal político sob orientação do PSD”.137 Diz em suas “diretrizes”: Trazendo à lume o primeiro número desse semanário, não fugimos de confessar que o fazemos sob o impacto da mais sadia emoção e da maior alegria. Uma e outra são, inegavelmente, o prêmio da fé com que encaramos sempre a efetivação de tão acalentado sonho que vencendo óbices, superando dificuldades, hoje se corporifica, nestes homens que labutam, nesta impressora que roda, nesta folha 138 que circula[...]. A partir daí o partido corporificou um sonho e trouxe à luz um hebdomadário para competir politicamente com o udenista Folha do Norte. Ressalte-se que a ideia de fundar um jornal não era disputar espaços no comercio jornalístico; buscava-se abrir espaços num esquema onde o Folha do Norte e sua agremiação política eram hegemônicos. A criação dos jornais era a manifestação escrita do embate na política cotidiana e tinha um objetivo bem definido: expor suas ideias diante da opinião pública feirense, desestabilizar o adversário, ao realizar críticas, e propagandear as ações dos políticos do partido. O financiamento do jornal era dependente da contribuição financeira de membros do PSD. Não eram feitas campanhas de arrecadação pelo próprio periódico para a sua manutenção. Eram destinados poucos espaços para propagandas, reservando-se a maioria das colunas do jornal para reportagens de cunho nacional e local. Os anúncios eram realizados por integrantes do partido que possuíam empresas ou prestavam serviços. Oscar Marques, vereador pelo partido entre 1958 e 1962, por exemplo, foi um dos que mais utilizaram páginas do jornal para realizar propagandas de sua revenda 137 138 DIRETRIZES. Gazeta do Povo, 03/05/1959, p.1. DIRETRIZES. Gazeta do Povo.. 03/05/1959. p.1. 68 autorizada das cervejas Brahma. Olegário Bispo Almeida era também um dos acionistas do jornal, de quem não conseguimos identificar maiores informações.139 Ao que tudo indica, o dono do jornal Eduardo Fróes da Motta era o responsável pela maior parte dos recursos. Durante os primeiros meses de circulação, o Gazeta do Povo fez críticas ao governo do udenista Arnold Silva (1958-1962). As noticias veiculadas pelo periódico abordavam deficiências do governo de Silva, a exemplo do descaso com que o governo municipal tratava os distritos feirenses e as más destinações de recursos públicos. Para isso, o jornal dedicou dois trechos: um intitulado “A Voz dos Distritos” para que os distritos expressassem suas demandas e outra coluna “O povo reclama” onde eram expostas demandas, abrindo um canal de diálogo com o leitor e moradores da sede do Município que não tinham espaço no Folha do Norte. Eram comum solicitações de serviços públicos em “A voz dos distritos” como instalação de escolas e postos de saúde. No entanto, o Gazeta do Povo reutilizou a coluna, que além de possibilitar reclamações da população ao poder público, serviu como espaço para propagandear ações de vereadores vinculados à legenda do PSD: Tiquaruçu Estamos sem luz. A sede de nosso distrito, continua às escuras, não obstante os apelos do nosso representante na Câmara Municipal, Antonio Araujo. Acreditamos que na atual legislatura, os pedidos do nosso querido vereador encontrem eco. Humildes Em 1960 teremos um prédio escolar para nosso Distrito. O projeto de lei de autoria do vereador Antonio Pinto, trará muitos benefícios aos escolares de Humildes. Os moradores da Vila estão regorjizando com a notícia, pois a grande obra terá o nome do nosso saudoso vigário Cngo. Henrique Borges. Bonfim de Feira Reina muito entusiasmo, entre os habitantes desta vila, com a atuação do vereador Teódulo Carvalho Junior. Em suas atividades, na atual legislatura, já vem demonstrando interesse por sua terra. Requereu ao Sr. Prefeito reparos para a estrada municipal, que liga nosso distrito à Anguera. Sua maior preocupação é estender a rede de iluminação elétrica até Bonfim, através de movimento conjunto 140 com os prefeitos de Serra Preta e Ipirá. [GRIFOS NOSSOS] Os nomes em destaque foram de vereadores pelo PSD entre 1958 e 1962. Ao mesmo tempo em que o Gazeta do Povo frisava demandas dos distritos, dava ênfase à atuação dos legisladores e seus esforços para beneficiar a população. Nas colunas, a impressão que se tinha era a de que as 139 140 Gazeta do Povo. 06/dez/1959, p.1 A VOZ dos distritos. Gazeta do Povo. 03.05.1959, p.4. 69 ações da prefeitura não eram efetivadas nos locais fora da sede de Feira de Santana, ficando a população do entorno sedenta por serviços públicos, dando margem à ação dos vereadores pessedistas para cumprirem suas solicitações. Em “O Povo reclama” o jornal expunha críticas diversas à administração pública. Desde aquelas relacionadas à carestia da carne até a forma como casais de namorados se comportavam nas praças públicas. A destinação de recursos para a construção de uma biblioteca pública foi motivo de reclamações: O Povo Reclama! Contra um projeto do executivo Municipal que tramita na câmara, pelo qual o prefeito solicita verba inicial de três milhões para a construção de uma Biblioteca Pública, e, anexo um teatro. Como se sabe tais obras custarão aos cofres municipais cerca de uns trinta milhões de cruzeiros. Enquanto as populações dos bairros vivem completamente 141 abandonada sem água, luz calçamento e etc. Esse era um “projeto de fachada”, que naquele momento não havia necessidade, segundo o jornal, tendo a prefeitura outras prioridades. Mesmo com as reclamações do “Povo” – ressalte-se que essa coluna não tinha quaisquer assinatura o que pode evidenciar que isso era em parte opinião dos jornalistas do Gazeta do Povo – foi aprovada na câmara de vereadores a solicitação do prefeito, mesmo com Raimundo Aguiar (PSD), Colbert Martins (PSD) e Antonio Manuel Araújo (PSD) “torpedeando” e votando contra o projeto. A obra foi concluída em 1962 e recebeu o nome Biblioteca Municipal Arnold Ferreira da Silva, no final da gestão desse prefeito. As críticas realizadas contra a administração do prefeito Arnold Silva junto com problemas de saúde o afastaram da prefeitura algumas vezes, geraram um clima de tensão, em que limites entre problemas pessoais e políticos eram cada vez mais indefinidos. A maioria delas incluía denuncias de corrupção como o emprego de funcionários fantasmas e desvio de dinheiro. Questionavam a honestidade do chefe do executivo. Por esta razão, Itamar Silva, que não possuía ligações orgânicas com a UDN, mas era sobrinho do prefeito, invadiu as instalações do Gazeta do Povo depredou as oficinas do jornal e bagunçou os tipos, mas nada que atrapalhasse a circulação do periódico na semana seguinte. O fato foi amplamente divulgado, devido aos telegramas enviados por Eduardo Fróes da Motta para redações de jornais 141 O POVO reclama. Gazeta do Povo. 20/Dez./1959, p.4. 70 onde possuía conexão. O que possibilitou uma repercussão nacional do ocorrido.142 Isso rendeu a Itamar Silva um inquérito policial. No interrogatório, foi-lhe perguntado diversas vezes se sua ação criminosa nas instalações do Gazeta do Povo teve motivações políticas. Em todas as ocasiões ele ou fugiu do assunto ou não respondeu diretamente às perguntas. Isso pode ser uma evidencia de que Silva estava contrariado com as posições sustentadas pelo semanário, vendo seu tio enfermo receber cobranças e críticas do jornal. O Gazeta do Povo conseguiu dar notoriedade às políticas pessedistas. Os canais de diálogo abertos no jornal também foram estabelecidos junto às camadas populares, tendo à frente Francisco José Pinto dos Santos, mais conhecido como Chico Pinto, que, além de advogado, foi vereador entre 1951 e 1954. O foco da política, tanto do jornal quanto do partido, foi descentralizar o apelo e as revindicações. Ao invés de procurar o eleitorado nos lugares centrais, eles buscaram nas periferias da cidade e nos distritos, aproximandose dos sindicatos e de setores populares.143 A aproximação com os setores populares, a ação do jornal e a indicação de Francisco Pinto, em lugar de Eduardo Fróes da Motta, revigorou o PSD feirense, que em 1962, elegeu pela segunda vez um prefeito.144 No entanto, o golpe de 1964, além de fechar o jornal Gazeta do Povo, substituiu Pinto por Joselito Amorim, encerrando o pluripartidarismo e o modelo político iniciado em 1945. Além da análise do papel da imprensa no embate entre as facções, resta-nos examinar detidamente atos de violência praticados por políticos feirenses. Esse será o tema do próximo capítulo. 142 O EMPASTELAMENTO do jornal Gazeta do Povo. Gazeta do Povo, 10/jul/1960, p.1. Depoimento de Sinval Galeão. O movimento comunista. Doc. n. 42. Acervo de História Oral. CEDOC/UEFS. 144 Para mais informações ver o apêndice D. 143 71 SEÇÃO IV – CAPÍTULO III VIOLÊNCIA COMO PRÁTICA Este capítulo analisa o uso da violência física e moral como estratégia política durante o período de 1948 a 1965. O uso dela revelou a indissociabilidade do universo político e social na dinâmica dos conflitos feirenses. A competição pelo estado entre frações da classe dirigente de Feira de Santana interessava pela possibilidade de implementar projetos que beneficiassem seus pares e também pela utilização do poder como forma de legitimar ações no conjunto da vida social. Examina-se a relação entre o público e o privado, o social e o político. Fazer parte da administração do município significava apropriar-se de um instrumento de controle que favorecia os interesses pessoais e políticos. Não raro aconteceram casos de conflito direto entre frações sobre os rumos do executivo feirense. Eles ocuparão papel central neste capítulo, pelo fato de não se limitaram à vida institucional. 1. O “self-made-man” contra o “torrador de café” De que maneira o aparelho governamental serviu para atender os interesses privados e para a reprodução de frações da classe dirigente local? De qual forma eram tratados setores da população feirense que reivindicavam direitos? Ao buscar informações sobre disputas entre políticos feirenses encontramos processos crimes que denunciam irregularidades e atos de truculência envolvendo Aguinaldo Soares Boaventura. Trazem notícias sobre como setores da classe dirigente operacionalizavam o aparelho do Estado e também como lidavam com outras classes sociais como trabalhadores feirenses. O primeiro documento analisado é o processo crime de lesões corporais no qual, supostamente, o ex-prefeito de Feira de Santana Aguinaldo Soares Boaventura foi o mentor intelectual da agressão sofrida por João Hermelino da Silva. Ele revela para além da utilização da coerção como prática de repressão, algumas questões relacionadas a tensões entre trabalhadores 72 urbanos de Feira de Santana e as classes dominantes. Nesse sentido, cabe pensar como a classe que briga entre si pode se aliar tacitamente quando enfrentam um mesmo “inimigo”. João Hermelino da Silva era pai de nove filhos e funcionário há 16 anos do comerciante e ex-prefeito de Feira de Santana Aguinaldo Soares Boaventura. Morava na Rua Senador Quintino no número 116, local relativamente distante do centro na década de 1950. Durante todo o período em que trabalhou como empacotador de café nunca gozou de férias ou benefícios trabalhistas. Segundo ele, o que ganhava mal dava para seu sustento.145 Em setembro de 1952, resolveu solicitar ao patrão aumento salarial. No dia estavam presentes dois outros funcionários de Aguinaldo Soares Boaventura. Uma “moça” que trabalhava no caixa e Domingos. Discutiram e Boaventura chegou a chamar João Hermelino, que na época tinha 66 anos, de “safado velho”, porque o chamara de “mentiroso e garganteiro”. O patrão demitiu Hermelino e, semanas depois, o contratou novamente aumentando-lhe o salário de 120 para 150 cruzeiros semanais. O funcionário saia desse primeiro embate com aumento salarial, mas com mudanças pouco significativas para melhoria dos padrões de vida. No entanto, Aguinaldo Soares Boaventura parece ter ficado ressentido com a situação, o que o levou a tratar “o velho João” no ambiente de trabalho com “aspereza”. De alguma maneira o longo período em que trabalhará na empresa lhe dera alguma margem de negociação entre ele e o patrão. A tensão que se desenvolveu entre ambos culminou numa tentativa de homicídio. No dia 28 de outubro de 1952, por volta das 18:30 horas, quando retornava do trabalho, pela avenida Senhor dos Passos, João Hermelino recebeu uma paulada na nuca seguido de pancadas violentas no abdômen desferidas por um homem que não foi identificado. Por sorte a esposa de Clóvis Amorim estava na porta de sua residência e, ao ver a cena gritou, espantando o indivíduo que escapou do local. A senhora ao prestar-lhe socorro solicitou a um dos transeuntes que acionassem a policia. Ao chegar, o delegado conduziu Hermelino ao hospital que ficou internado por alguns dias. As pancadas foram tão violentas que só depois de 8 dias ele teve condições de prestar depoimentos, ainda assim colhidos em sua residência. 145 Inquérito policial – lesões corporais. Processos crimes. Feira de Santana, CEDOC/UEFS. E – 01; CX – 20; DOC – 369. 73 Segundo o laudo da perícia, as agressões que atingiram a cabeça, braço e abdômen provocaram sequelas no seu ouvido direito com a redução da capacidade auditiva.146 As acusações recaíram sobre Aguinaldo Soares Boaventura. Nenhum dos envolvidos foram presos e o processo foi arquivado em 1964. O que esse caso ajuda a pensar sobre as classes dominantes de Feira de Santana e suas disputas? Tivemos acesso às informações do espancamento sofrido por João Hermelino através do processo crime. Nenhuma informação foi veiculada pelo jornal Folha do Norte acerca do ocorrido. Em 1º de novembro de 1952, semana seguinte ao ocorrido, os articulistas se preocuparam em denunciar o “jogo do bicho” e com as emancipações políticas de Tanquinho e Serra Preta de Ipirá, que se separaram de Feira de Santana provocando desagregações no território feirense. Nesse artigo denunciaram a depredação da Praça Bernadino Bahia que estava em péssimas condições porque aquele que dá nome era uma das referências políticas do udenismo feirense. As zonas centrais e “as pútridas cozinha do Mercado Municipal” eram despejadas na rua “e ali toda a sarjeta é o mesmo ferver de panelas sujas, o mesmo fumaçar de fogões improvisados a mesma sordidez africana de cubata”. Segundo as informações do jornal existia irregularidades acontecendo na cidade na gestão do pessedista Almáchio Alves Boaventura, que governou entre 1951e 1955, segundo o periódico. A imagem divulgada era de uma cidade atrasada e não modernizada. 147 Nas outras edições nada se comentou a respeito do ocorrido. Poderia ter sido explorado politicamente, principalmente porque envolvia o ex-prefeito da cidade, apoiado pelo PSD, e vereador em 1952, ligado ao “trabalhismo” da cidade. Mas assim não fez o Folha do Norte. O jornal silenciou acerca do sofrimento do trabalhador urbano como várias vezes fariam as classes dominantes feirenses. 146 Inquérito policial – lesões corporais. Processos crimes. Feira de Santana, CEDOC/UEFS. E – 01; CX – 20; DOC – 369. Anexo ao processo existe um laudo de lesões corporais. 147 Para discussão mais adensada sobre modernização em Feira de Santana. Ver: OLIVEIRA,Clovis Frederico Ramaiana Moraes. “Canções da cidade amanhecente”: urbanização, memórias urbanas e silennciamentos em Feira de Santana, 1920-1960. Tese (doutorado). Programa de pós-graduação. Universidade de Brasilia: Brasília, 2011 e OLIVEIRA, Ana Maria Carvalho dos Santos. Feira de Santana em tempos de modernidade: olhares, imagens e práticas do cotidiano. Recife: 2008. Tese(Doutorado em História) – Universidade Federal de Pernambuco. 74 Uma das possibilidades para o silenciamento do jornal sobre o caso de João Hermelino tavez se deva ao realinhamento político de Agnaldo Soares Boaventura depois das eleições de 1948. Como vimos no primeiro capítulo, ele foi candidato pelo PTB apoiado pelo PSD feirense de Eduardo Motta e venceu as eleições com auxílio da “máquina pessedista”. Em meados de 1948 ele alinhou-se à UDN feirense. Posição política não muito estratégica, já que a maioria dos vereadores fazia parte da chapa PSD-PTB.148 O seu alinhamento deu-se após a crise na coligação devido à demissão do pessedista Edelvito Campelo Araujo do estratégico cargo de secretário da prefeitura. Tal atitude foi justificada na rádio sociedade, três meses depois das eleições, em que o prefeito fez um discurso “livre de maquievelismos” políticos e baseado no “moralismo”. Agnaldo Boaventura disse que foi necessário estruturar as contas da prefeitura antes de iniciar obras como as de calçamentos na cidade. Por isso exonerou Araújo de uma função que onerava os cofres da prefeitura.149 No entanto, a demissão de Edelvito Araujo da secretária representou um conflito direto com o Eduardo Froes da Motta que o indicou para o cargo. Segundo informações do Folha do Norte existia um plano que consistia num “golpe branco da insidia e da traição”, que visava destituir Agnaldo Soares Boaventura, com auxilio da Câmara Municipal de maioria pessedista, e eleger Araujo como prefeito. Intento que não se efetivou e nem há outras fontes que possam comprovar o que escreveu o periódico.150 Isso marcou um embate direito entre o principal chefe político do PSD em Feira de Santana e o “torrador de café”.151 Talvez a iminência de se tornar uma marionete pessedista com a maioria do PSD na Câmara dos Vereadores e a presença de um secretário que tinha o peso de vice-prefeito o colocava numa posição que não desejava. Determinados instrumentos jurídicos forneceram a Agnaldo Soares Boaventura o aparato legal para se contrapor à vontade política de Motta. Com a extinção do cargo de secretário da prefeitura pelo decreto lei 160 de 1945, o 148 Para mais informações ver apêndice E Folha do Norte. 11/set/1948.p.4.. 150 Folha do Norte. 21/ago/1948. p.1. Na edição do mês de 23 de outubro de 1948 têm-se o seguinte: “De uma forma ou de outra ou pela convenção criminal ou pela intervenção estadual é necessário e urgente que seja dada uma solução ao escabroso caso do prefeito de Feira de Santana”.p.01 151 As atividades comerciais de Agnaldo Boaventura era o comércio de café em que Hermelino Trabalhava. 149 75 prefeito possuía recurso necessário para exoneração de Edelvito Campello d’Araújo.152 Dessa forma, rompeu politicamente com parcelas do PSD e PTB articulando-se, pela primeira vez, com a UDN feirense. Diante do novo quadro político, Agnaldo Soares Boaventura estava isolado dentro da Aliança Feirense que o sustentara. “Ordem, paz e moralidade política” eram agora os atributos que Boaventura possuía e que conseguiu conquistar apoio de “outras forças partidárias”.153 No entanto, ele assumiu uma posição tática. Ao se “coligar” com a UDN, aproximou-se também das principais lideranças udenistas o governador Otávio Mangabeira e Juraci Magalhães ao apoiar em 1950 à candidatura a governo do estado.154 As alianças políticas tecidas entre UDN e Agnaldo Soares Boaventura fortaleceram-se durante seu mandato e o jornal Folha do Norte, órgão que reproduzia ideias da ala juracisista/udenista em Feira de Santana, demonstrava apoio à política de Boaventura. Era improvável que aliados políticos que compunham o editorial do impresso publicassem matérias que pudessem macular a imagem do “operoso e honesto prefeito” com a acusação de ter mandado espancar um de seus funcionários que trabalhavam no seu comércio de café. Para além de mostrar como a política local se configurou em fins dos anos 1950 o processo crime também é revelador da situação da classe trabalhadora brasileira nessa década. Sabemos que desde o governo Dutra as lutas contra a carestia estouravam em todo o país e que se efetivavam com a alta de gêneros alimentícios, alugueis, pão e transportes somando-se a isso o baixo poder de compra dos salários dos trabalhadores.155 Retomemos o caso do “velho João”. O pedreiro João Hermelino da Silva Filho, de 26 anos, que morava na casa com os pais, prestou depoimentos sobre o ocorrido, porque João Hermelino da Silva estava hospitalizado. Afirmou que seu pai trabalhava, naquela ocasião, há 16 anos sem receber férias, gratificações ou quaisquer direito trabalhistas. E quando foi solicitar aumento salarial, ao seu patrão, Agnaldo Soares Boaventura este começou a trata-lo com descortesia, objetivando pressionar seu genitor a sair da empresa sem o 152 EXONERADO das funções de diretor da secretaria da prefeitura.Folha do Norte.7/ago/1948. Folha do Norte. 21/ago/1948.p.1. 154 JURACY Agnaldo a. Folha do Norte. 7/jan./1950.p.1. 155 CARONE, Edgar. A república Liberal II Evolução política(1945-1964). São Paulo: Difel, 1985.p.21. 153 76 recebimento das indenizações trabalhistas. Declarou ainda que os salários dos dois não eram suficientes para o sustento da família.156 Seu depoimento é ilustrativo para analisarmos a situação de trabalhadores feirenses na década de 1940 e 1950, no que diz respeito ao custo de vida. Principalmente quando o comparamos com os de outras cidades do país. O trabalho de Mirian Freitas intitulado Populismo e Carestia, apesar de analisar a capital do Estado, leva-nos a um quadro econômico de carestia que assolava a classe trabalhadora brasileira e, especificamente, a baiana. A autora chegou à conclusão, em estudo comparativo das famílias operárias das principais capitais do país em 1952, que Salvador se apresentava como a cidade com maior custo de vida. Do orçamento familiar da classe operário industrial, 75% (setenta e cinco por cento) era destinado a despesas básicas de alimentação e habitação, e em Porto Alegre, cidade com melhores índices, essa estatística caia para 52%. Some-se a isso a flutuação nos preços que poderiam resultar na perda do poder aquisitivo do salário. Esses dados eram para aqueles que ganhavam um salário mínimo em 1952 que havia subido em janeiro para Cr$ 700,00 (setecentos cruzeiros).157 Enquanto isso João Hermelino Silva só recebeu aumento salarial a partir de setembro, quando sua contribuição pecuniária subiu de Cr$ 480,00 (quatrocentos e oitenta cruzeiros) para Cr$ 600,00 (seiscentos cruzeiros) mensais. Mesmo com a elevação, Silva não recebia a remuneração mínima prevista na legislação trabalhista. Sua apelação de aumento salarial correspondia ao primeiro concedido pelo governo Vargas que se seguiu às políticas de combate à carestia como as de congelamento de preços. 158 O aumento salarial aconteceu depois de ter enfrentado o patrão Agnaldo Boaventura dentro do estabelecimento, ponto de discórdia e um dos motivos apontados pela vítima para Boaventura mandar um indivíduo “eliminalo”.159 Conforme as declarações, o intuito era fazer com que “o velho João” não recebesse os direitos trabalhistas, seja pedindo demissão voluntariamente ou através de um assassinato. 156 Inquérito policial – lesões corporais. Processos crimes. Feira de Santana, CEDOC/UEFS. E – 01; CX – 20; DOC – 369.. p.8 157 FREITAS, Mirian Tereza de. Populismo e Carestia. Salvador, 1985. Dissertação (Mestrado). Mestrado em ciências sociais. Universidade Federal da Bahia. p.59 158 FREITAS.op.cit. 159 Inquérito policial – lesões corporais. Processos crimes. Feira de Santana, CEDOC/UEFS. E – 01; CX – 20; DOC – 369. 77 Tratava-se da luta do trabalhador feirense contra a espoliação e carestia de vida. Sua luta individual fazia parte de um conjunto de enfrentamentos populares que se espalhavam por toda a Bahia. Em Ilhéus manifestações contra açougues; em Juazeiro protestos, contra a carestia; em Murituba, São Felix e Afonso Pena revolta popular contra o aumento da farinha; protestos contra a carestia em São Antonio de Jesus e Cachoeira; no Distrito Federal, apedrejamento de açougues.160 Em nenhuma dessas manifestações o Folha do Norte fez qualquer alusão às reivindicações populares. Além disso, tratava-se de denuncias de não cumprimento de obrigações trabalhistas. No entanto, para Agnaldo Soares Boaventura recaia uma maior atenção por ser um dos representantes do trabalhismo na cidade. Apesar de migrar em 1951 para o PTN (Partido Trabalhista Nacional), quando se elegeu vereador, continuou a manter relações com o trabalhismo quando recepcionou Getúlio Vargas em campanha para presidente da república pelo PTB em 1950. Os elos com o trabalhismo limitavam-se aos meios políticos. Por dezesseis anos o “torrador de café” João Hemelino trabalhou sem ter recebido os direitos “concedidos” por Getúlio Vargas.161 Era a luta de um trabalhador urbano para diminuir o abismo entre as leis escritas na Consolidação das Leis Trabalhistas e sua realidade laboral.162 Apesar da tentativa de homicídio acontecer no centro de Feira de Santana o Folha do Norte nada informou sobre o caso. O silenciamento do jornal articular-se com vários fatores. Um deles o esforço em apaziguar os conflitos de classe que estouravam em todo o país ao escamotear a situação de trabalhadores urbanos feirenses; a crença histórica que o periódico possuía de que aos setores populares não cabia qualquer forma de enfrentamento; e as ligações políticas entre Agnaldo Boaventura e membros do impresso. O jornal esforçava-se para conter movimentos urbanos feirenses, e qualquer desvio de conduta fora da “ordem” e da “harmonia” padronizada pela classe dirigente, como o enfrentamento de Hermelino contra o seu patrão, deveria ser tratado com rigidez, sob pena de perderem os rumos da 160 FREITAS.op.cit.p. 124. Ela mostra esse panorama com base em informações do jornal O Momento. 161 GOMES, Ângela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005. 162 FRENCH. John. Afogados em leis: A CLT e a cultura política dos trabalhadores brasileiros.São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2001. Nisso consiste a argumentação central desse autor tomando como base a cidade de São Paulo entre 1945-1964. 78 administração pública. As frações se uniam tacitamente para preservar o controle do poder político na esfera da “sociedade politica”.163 O poder político também servia para atender aos interesses de seus familiares com o intuito de beneficiar parentes, como veremos a seguir. 2. A prefeitura para o comércio: o público serve ao privado Argumentamos nos dois capítulos anteriores de que modo se operavam a competição pelo poder político de Feira de Santana. Essas disputas visavam o aparelho governamental e o controle político da cidade. Assim, dar-se-ia se a reprodução da fração da classe dirigente no poder tanto na ocupação de cargos públicos quanto no atendimento aos interesses privados utilizando-se instâncias do poder público. Conseguimos encontrar um processo em que o comerciante Mario Figueiredo Mascarenhas acusa Agnaldo Soares Boaventura, ex-prefeito de Feira de Santana, de crime de prevaricação em 1951. Essa queixa caracterizou-se como ato praticado por funcionário público contra a Administração Pública. Consistiu em retardar ou deixar de praticar devidamente ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei para satisfazer interesse ou sentimento pessoal. As razões que levaram Soares a cometer essa atitude ilegal permitem analisar usos do aparelho governamental para obtenção de vantagens para entes da família Boaventura. A queixa-crime prestada por Mario Figueiredo Mascarenhas foi contra o aforamento de terras feito por Agnaldo Soares Boaventura quando ainda era prefeito de Feira de Santana. Em dezembro de 1950, a prefeitura, através do jornal Folha do Norte, publicou o edital 248 concedendo o lote 84, próximo à estrada de rodagem que ligava Feira de Santana a Ipirá, no Bairro do Sobradinho nas imediações dos antigos currais modelo, a Aristocles Soares Boaventura.164 Ao tomar conhecimento do edital, publicado pelo Folha do Norte em 2 de dezembro de 1950, Mario Mascarenhas deve ter se surpreendido. Meses antes, em 17 de agosto, ele havia solicitado à prefeitura o lote 84 (o mesmo que o de Aristocles Boaventura) para a construção de um abrigo. Para tanto 163 BIANCHI, Álvaro. O laboratório de Gramsci: filosofia, historia e política. São Paulo: Alameda, 2008. 164 Queixa-crime Prevaricação. Processo-crime. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-1;CX- 2; DOC 41. 79 apresentou plantas e o projeto de construção; documentação necessária para obtenção do direito de usar a terra pública. Esses terrenos pertenciam ao poder público municipal e de acordo com os interesses de crescimento urbano do executivo, poderiam ser cedidos a indivíduos que primeiro apresentasse objetivos para a construção de edificações. A prefeitura não garantia a posse efetiva o que impedia a venda da terra e estipulava o prazo de dois anos para execução do projeto.165 No entanto, Mascarenhas alegava que havia apresentado toda a documentação necessária para a construção de um abrigo antes que Aristocles Soares Boaventura. Como foi o primeiro a se pronunciar como interessado pelo imóvel e estabelecer intenções legais para a obtenção do contrato de aforamento, deveria ter sido ele o contemplado com o lote 84. Por essa razão ele entrou com uma ação criminal contra o ato administrativo de Agnaldo Soares Boaventura. O depoimento de um dos funcionários do paço municipal fornece detalhes sobre o ocorrido. Ao ser intimado, Oscar Ribeiro, porteiro da Prefeitura e responsável pelo livro de protocolos onde são registrados os documentos entregues no paço municipal, disse que foi procurado por Mario Figueiredo Mascarenhas que lhe apresentou uma petição acompanhada de plantas para a construção. Estas, segundo ele, foram encaminhadas ao prefeito. Ele, como de costume, as protocolou e extraiu o conhecimento para pagamento da taxa de entrada e forneceu recibo. Dias depois foi procurado por seu colega de repartição, cuja pessoa e nome não se recordava, que vinha em nome e por ordem de Agnaldo Soares Boaventura, trazer-lhe uma documentação de Aristocles Soares Boventura sobre o mesmo assunto que dizia respeito a Mario Mascarenhas afim de que ele a substituísse. 166 Para cumprir a ordem do prefeito, raspou do livro o nome de Mario Figueiredo Mascarenhas e substituiu pelo de Aristocles Soares Boaventura, ficando o nome deste em lugar daquele e a petição do segundo com a entrada e petição idêntica a do primeiro. 167 165 Queixa-crime Prevaricação. Processo-crime. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-1;CX- 2; DOC 41. 166 Queixa-crime Prevaricação. Processo-crime. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-1;CX- 2; DOC 41.p.13. 167 Queixa-crime Prevaricação. Processo-crime. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-1;CX- 2; DOC 41.p.13. 80 Agnaldo Soares Boaventura contestando as afirmações de Oscar Ribeiro disse que não recebeu nenhum pedido de Mario Figueiredo. Afirmou, em depoimento, que tomou conhecimento do protesto através da imprensa, por meio do jornal Vanguarda.168 O comerciante Mário Mascarenhas, segundo as informações de Oscar Ribeiro teve o nome do livro de protocolos “raspado”. Os documentos protocolados não foram encontrados nos arquivos da prefeitura. No processo não foi informado à destinação dos documentos. Informações que poderiam servir como provas para Mascarenhas desapareceram. Em 14 de outubro de 1952, por solicitação do Juiz, dois contadores serviram como peritos para avaliar o livro de protocolos da prefeitura que foi raspado. No parecer, concluíram que o nome de Mário Figueiredo Mascarenhas foi substituído pelo de Aristocles Soares Boaventura. Um dos indícios para tal conclusão foi a constatação da letra “s” ao final da palavra Boaventura que poderia ter sido do sobrenome Mascarenhas.169 Ficou provado que houve adulteração no livro de protocolos da prefeitura e a responsabilidade do ato recaiu sobre o Prefeito que ordenou a prática delituosa. Com isso, Mario Mascarenhas entrou com processo de nulidade do ato do prefeito. Agnaldo Soares saiu sem sofrer nenhuma sanção haja vista que o crime prescreveu.170 A esta altura, é possível relacionar os laços de parentescos a partir dos sobrenomes. Aristocles Soares Boaventura era filho de Aguinaldo.171 Trabalhava com o pai no comércio de café, era solteiro e morava com sua família. Em 9 de dezembro de 1950 o Folha do Norte não publicou apenas o edital 248. Foram ao todo 15 editais comunicando publicamente aforamentos de áreas que pertenciam à municipalidade localizados nas imediações dos Currais Modelos próximos a Rua Santos Dumont. Essa era uma zona de passagem obrigatória para quem se dirigia de ônibus para Ipirá e transeuntes vindos de outros estados poderiam ter acesso a Feira de Santana, por essa 168 Queixa-crime DOC 41.p.11. 169 Queixa-crime DOC 41.p.74. 170 Queixa-crime DOC 41. 171 Queixa-crime DOC 41.p. 78. Prevaricação. Processo-crime. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-1;CX- 2; Prevaricação. Processo-crime. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-1;CX- 2; Prevaricação. Processo-crime. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-1;CX- 2; Prevaricação. Processo-crime. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-1;CX- 2; 81 via. Por ser um local de intenso trânsito de pessoas, poderia ser utilizado para atividades comerciais ou mesmo para a construção de abrigo, onde pessoas poderiam se hospedar, especificamente aquelas que vinham às segundasfeiras negociar no diversificado comércio feirense.172 Enquanto zona de passagem, lugar de feira, a cidade possuía uma grande população flutuante. Nas segundas-feiras, o comércio era feito a céu aberto e ocorria no centro, na interseção das principais avenidas da cidade, a Senhor dos Passos e a Getúlio Vargas. Além disso, o desenvolvimento comercial atraia pessoas vindas de outros estados, geralmente fugindo da seca, que procuravam melhores oportunidades. A zona que estava em litígio entre Agnaldo Boaventura e Mario Mascarenhas era um local estratégico, principalmente para comércio ou a construção de abrigo. Tanto Mascarenhas como Aristocles Soares Boaventura tinham interesses econômicos. Mesmo o juiz pedindo que fossem juntadas plantas do abrigo que seria construído por Mário Mascarenhas essa documentação não foi encontrada nos arquivos da prefeitura, segundo as informações do processo. No entanto, o que consta nos autos é um projeto para construção de um abrigo que foi apresentando por Aristocles Boaventura. O trânsito de pessoas cada vez mais intenso, em razão da construção de estradas em 1949 que ligavam Feira de Santana a então capital do pais e do estado era um fator positivo para essa atividade econômica.173 Eles perceberam a falta de locais para estadia de comerciantes vindo de outras regiões para comercializar em Feira de Santana. Mas outro fato desperta curiosidade nessa edição de dezembro do Folha do Norte. De 15 lotes aflorados quatro beneficiaram filhos de Aguinaldo Soares Boaventura. Aristocles pleiteou o lote 84 e 87; Anibal o 85 e a Aristófanes o 86. Todos situados na Rua Santos Dumont próximo ao Currais Modelos. Trata-se de terras contíguas e que talvez formassem um quarteirão a julgar pelo tamanha dos terrenos. É provável que esses imóveis servissem para especulação imobiliária. Entre as décadas de 1940 e 1950 a população por pouco não dobrou. Ela aumentou de 14.131 para 26.559. Mesmo sendo, nesse período, a cidade mais populosa do interior baiano, nenhum projeto de habitação popular foi 172 POPINO, Rolie E. Feira de Santana. Salvador: Ed. Itapuã, 1968. Ver capítulo X O papel do comércio na economia da Feira de Santana de 1860 a 1950. 173 Ibid.p.13. 82 executado.174 Então à prefeitura não interessava solucionar problemas sociais. Doava terrenos para comerciantes em áreas estratégicas, em detrimento de qualquer política habitacional efetivamente popular. O então prefeito Agnaldo Soares Boaventura poderia manobrar recursos municipais através da concessão do usufruto de terras da “municipalidade” para seus filhos. Disso podemos inferir que a disputa pelo poder político em Feira de Santana envolvia interesses econômicos e tentativas, mesmo ilícitas, de favorecimento de indivíduos de um mesmo círculo familiar. Também nesse processo crime encontramos conexões das ligações políticas entre o Folha do Norte e Agnaldo Soares Boaventura. São nos silenciamentos do periódico que se escuta vozes desse imbricamento entre a política e a imprensa feirense. No seu depoimento ele disse que tomou conhecimento do “protesto” contra o aforamento de terras através do jornal Vanguarda. Este era o outro impresso do município que concorria com o Folha do Norte, que em 1950 era “o jornal mais lido de todo o interior da Bahia”.175 Daí tem-se notícias de outro periódico que circulou entre 1948 e 1955, em Feira de Santana, antes da sua migração para Jacobina.176 Mário Figueiredo Mascarenhas denunciou atos ilícitos do poder executivo por esse canal de comunicação. Sua atitude se explica, certamente, porque Mascarenhas sabia das ligações políticas entre Agnaldo Soares Boaventura e o Folha do Norte. Sobretudo porque desde maio de 1950, ano eleitoral, o então prefeito manifestou apoiou ao candidato feirense Carlos Bahia da UDN e também ao candidato Juraci Magalhães.177 Mesmo partilhando de uma legenda diferente, “o operoso prefeito” era um correligionário da Coligação Democrática Feirense. Desde o conflito com Eduardo Motta no início do mandato ele se coligou com essa agremiação política e dela soube extrair vantagens estratégicas, como veremos detidamente mais adiante. 174 POPINO.op.cit. Ver especificamente o capítulo XI. Neste capítulo Popino preocupa-se mais com características arquitetônicas de casas populares feirenses do que com problemas relacionados a habitação popular em Feira de Santana. 175 Ibid. p.220. Ver capítulo transportes e comunicações em Feira de Santana entre 1860 a 1950. 176 http://memoriadeouro.com/?page_id=32. Este site possui registros do periódico Vanguarda que circulou em Feira de Santana e depois migrou para Jacobina. Segundo as informações da home page, o jornal foi fundado em Setembro de 1948 e teve contribuições do feirense Demócrito Soares (1908-1963). 177 PREFEITO Agnaldo Boaventura levantou a candidatura do Sr. Carlos Bahia. Folha do Norte.6/mai/1950. 83 Como vimos no segundo capítulo, o Folha do Norte era composto por membros da UDN que defendiam a corrente juracisista. O apoio dado pela imprensa a Agnaldo Boaventura estabeleceria laços de reciprocidade baseados no apoio político da agremiação. Ao final, Mario Mascarenhas deveria recorrer a outro periódico para denunciar o prefeito, uma vez que aquele órgão de comunicação mantinha vinculações com Boaventura. A omissão do jornal visava à manutenção de um governante e aliado político que enfrentou o PSD liderado por Eduardo Motta. 3. “Transfigurou-se o panorama político do município”: PSD-PTB, de aliados a inimigos políticos São múltiplas as determinações históricas imbricadas nas decisões políticas. Não se trata isoladamente de questões econômicas, sociais ou de projetos políticos. A política em Feira de Santana de meados do século XX ajuda entender o poder político como resultado de múltiplas determinações. O primeiro capítulo teve como objetivo específico analisar o processo eleitoral no final dos anos 1940. Uma questão, no entanto, que merece melhor tratamento é como se operou a dinâmica interna da aliança PSD-PTB. A competição pelo controle do aparelho estatal definiu dissidências entre frações da classe dirigente feirense. Em 1948, o líder Eduardo Fróes da Motta, objetiva manter o cargo de deputado federal e manipular o prefeito Agnaldo Soares Boaventura. Ele conseguiria controlar o executivo municipal através da indicação do então presidente da câmara de vereadores Edelvito Campello d’Araujo para assumir a função de diretor da secretaria da prefeitura. No entanto, a estratégia de Motta, segundo o Folha do Norte, surtiu efeitos apenas nos primeiros meses da gestão de Boaventura, entre janeiro e agosto de 1948. Esse cargo era estratégico porque ao dirigir a secretaria geral da prefeitura ele substituía o prefeito em sua ausência e não impedia que o indivíduo acumulasse outra função política como a de vereador, por exemplo. Ele poderia realizar simultaneamente os dois trabalhos. Ao prefeito cabia a indicação para o cargo. 84 A função de diretor de secretaria da prefeitura, provavelmente, foi a moeda de troca para a aliança PSD-PTB.178 Ao receber apoio de Eduardo Fróes da Motta, Agnaldo Soares Boaventura indicou Edelvito Campello d’Araújo para a função. Isso ajuda a explicar o esforço do PSD tanto na campanha eleitoral quanto no reconhecimento da legalidade das eleições, como mostramos no primeiro capítulo. No entanto, Boaventura nos primeiros meses de administração percebeu o peso político de Edelvito Campello d’Araújo e o cargo a ele atribuído. Araújo ao acumular a função de diretor de secretaria e a presidência da câmara atuou nas esferas legislativa e executiva; suas estreitas ligações com o então deputado federal Motta garantia ser ele o porta-voz da liderança do PSD em Feira de Santana. Segundo as informações do Folha do Norte, a presença de um membro do PSD nesse importante cargo resultaria na tentativa de um “golpe branco” para depor Boaventura orquestrado pelo partido. Mal concluído o acordo PTB-PSD [...]conceberam os pessedistas o plano de tornar ainda mais asfixiante para o senhor Agnaldo Soares Boaventura, esse instrumento de suplicio, violando o contrato [....]. O plano era, evidentemente, o de forçar a renuncia do digno conterrâneo para que, então a maioria da câmara, com que o pessedismo supunha contar, elegesse um novo prefeito, todo seu, e 179 que seria, precisamente o dr. Edelvito Campello d’Araujo O jornal não apresentou provas do “golpe” que estava em curso. Quantitativamente o PSD era maioria na câmara contando com dez dos treze vereadores eleitos. Não houve projetos na câmara que cogitassem a hipótese sustentada pelo Folha do Norte. Além disso, vereadores do PSD e do PTB defenderam o prefeito apresentando moções de apoio ao governo e aos atos do executivo. “Ainda mais asfixiante” era a supressão dos poderes executivos devido à presença de elementos políticos que limitavam as ações do prefeito. A indicação para o cargo de diretor de secretaria junto com a presidência da câmara, concedida ao advogado e vereador “dr. Edelvito Campello d’Araújo” prendia Agnaldo Soares às deliberações partidárias do PSD. Provavelmente não havia intenções de “forçar a renuncia”, conforme foi noticiado pelo Folha do 178 Câmara de Vereadores de Feira de Santana. Arquivo da Câmara Municipal. Ata da Sessão. 19/08/1948.fls.28 179 TRANSFIGUROU-SE o panorama político do município. Folha do Norte. 21/ago./1948. 85 Norte. O intuito do pessedismo [leia-se Eduardo Motta] era acumular margem de participação política no plano federal sem perder os rumos da administração municipal. Agnaldo Soares Boaventura em pronunciamento à população através da Rádio Sociedade de Feira de Santana, em 11 de setembro de 1948, caracterizou a política local e definiu seu realinhamento como aliado da UDN. Não exercito a política de cacequismo, adotando o filhotismo como condição básica para a conquista de prestígio eleitoral [...] Bani um pseudo funcionário que vinha sendo pago e bem pago pelos cofres municipais agarrado que era desde 1945 a uma comissão extinta. Tratava-se dum afilhado que trazia como marca de batismo, a representação em segundo corpo do padrinho todo-poderoso. Demiti [...], obedecendo tão somente a dispositivos da Constituição Federal e estadual. Vê o povo quê, quando demiti um funcionário que exercia 180 cargo extinto agi por um princípio altamente moralizador Apesar de não citar nomes o “pseudo funcionário” era o advogado Edelvito Campello d’Araújo. Ele só esteve diretor da secretaria da prefeitura nos três primeiros meses da gestão Boaventura. Um dispositivo constitucional o decreto-lei n. 160 de 29 de agosto de 1945 havia tornado extinto esse cargo, mas, até 1948 essa função era exercida e remunerada pelos cofres municipais. “Por decreto, [o] prefeito municipal, exonerou o bacharel [...] das funções da secretaria da prefeitura”.181 As palavras do pronunciamento remetem à dinâmica da política local: “caciquismo” e “filhotismo”, “afilhado” e “padrinho”. Para ser mais preciso, Boaventura estava caracterizando as relações entre Eduardo Fróes da Motta e Edelvito Campello d’Araújo. O primeiro como um cacique e líder político local, e o segundo como seu filhote. Motta como padrinho, d’Araújo como afilhado e, portanto, alguém que deve ser tutelado. Edelvito Campello d’Araújo era a “representação em segundo corpo do padrinho todo-poderoso” Eduardo Fróes da Motta. A atuação de Motta como deputado federal, no distrito federal, impedia sua presença física na administração municipal, sendo seu partido uma das bases do executivo. Era necessário fazer-se presente, mesmo estando ausente, nomeando pessoas de sua confiança para exercer cargos estratégicos. No entanto, o que Motta não cogitava era que Agnaldo Boaventura fosse se utilizar de dispositivos constitucionais para retirar o cargo de Edelvito d”Araújo. 180 181 MENSAGEM do prefeito aos munícipes. Folha do Norte. 11/set./1948. GOVERNO do município. Folha do Norte. 11/ago./1948 86 Boaventura afirmou que sua atitude foi guiada por um “principio altamente moralizador”, porque foi embasada legalmente pelos princípios constitucionais. Talvez ai resida os fios que o uniu à UDN. A desarticulação dessa aliança não abalou apenas estruturas políticas, mas também sociais. Laços de amizade foram desatados, resultando em cenas de luta corporal em defesa dos seus líderes e valores morais. As ruas e o paço municipal foram territórios desses conflitos onde apareceram a “eloquência das armas de fogo”.182 Na terceira semana de setembro de 1948, processou-se a crescente turbulência que resultaria na cisão PSD-PTB. Depois disso, o pessedismo feirense afastar-se-ia de candidaturas que os aliassem nos três pleitos para o executivo municipal que se seguiram.183 Configurou-se então um momento importante do debate político feirense, pois uniões partidárias se remodelaram. Assim que anunciou a exoneração de Edelvito Campello d’Araújo, em 3 de agosto, vereadores da câmara municipal lançaram críticas e moções contra a atitude do prefeito. Entre agosto e setembro não houve votações de projetos. Na 19º sessão ordinária o vereador José Joaquim Saback (UDN) propôs uma “moção de apoio ao prefeito pelo transcurso do terceiro mês de sua administração”.184 A partir daí as discussões que se seguiram foram acerca do significado político de posicionar-se a favor ou contra o prefeito. A luta de parcela do PSD visava à rejeição dessa moção. No mesmo dia Almáchio Soares Boaventura apelou ao proponente “para que o mesmo retirasse a moção para melhor harmonia dos trabalhos da câmara”.185 Parece que o edil sabia que isso resultaria num enfrentamento direto por vias de fato entre legisladores. Em resposta, na 22º sessão, Antonio Matos propôs “moção de desconfiança e desaprovação as atitudes do prefeito” aprovada por unanimidade, principalmente porque vereadores que apoiavam o prefeito não estavam presentes ou saíram do plenário durante a votação.186 O documento, 182 CLIMA de insegurança. Folha do Norte. 18/set/1948. Ver quadro de candidatos e eleitos para prefeitura de Feira de Santana entre 1948-1964 em anexo. 184 Câmara de Vereadores de Feira de Santana. Arquivo da Câmara Municipal. Ata da 19º Sessão Ordinária. 16/ago/1948. 185 Câmara de Vereadores de Feira de Santana. Arquivo da Câmara Municipal. Ata da 19º Sessão Ordinária. 16/ago/1948. 186 Câmara de Vereadores de Feira de Santana. Arquivo da Câmara Municipal. Ata da 22º Sessão Ordinária. 6/set/1948. A moção foi assinada por Antonio Matos, Edelvito Campello, Abílio Santa Fé, Servilo Carneiro, Democrito Soares e Almáchio Boaventura. 183 87 segundo Matos, se justificava “pela maneira arbitrária e sobretudo ilegal que [o prefeito] vem gerindo os destinos do município”187 A 23º sessão marcaria a divisão da câmara entre os que apoiavam ou não atos do prefeito, motivados pela discussão quanto à aprovação da ata reunião passada, que aprovou moção de desconfiança ao prefeito. Nessa plenária o presidente por três vezes fez intervalos de cinco minutos para acalmar os ânimos. Nas atas não foram registradas cenas de agressão, embora haja inscrições de vereadores falando em “altas vozes” e com comportamento “descortês”. Um deles foi protagonizado por Renato Santos Silva que “gritando palavras ofensivas ao Sr. Presidente, verificando-se ligeira discussão entre os srs. Vereadores Renato Santos Silva e Antonio Matos, estabelecendo tumulto”. Como atas da câmara de vereadores são documentos produzidos pelo legislativo, passam por filtragens.188 A imprensa feirense noticiou o enfrentamento entre esses edis de forma diferente: AGRESSÃO EM PLENA CÂMARA Durante o debate quando falava o vereador [Renato] Santos Silva verberando a atitude da mesa, que não queria respeitar a decisão da maioria, o representante integralista marchou para o orador tentando agredi-lo. Com a intervenção de outros representantes, o “valentão” populista tentou sacar de um revólver para atingir o vereador pessedista, no qual foi impedido. A esta altura dois ou três pessedistas sacaram das armas, sendo contidos pelo povo que a essa hora clamava contra aos vereadores pessedistas e impunha a 189 ordem, mesmo contra a polícia. Essa noticia foi reproduzida dos Diários Associados que através de um “correspondente especial” noticiou fatos que aconteceram em Feira de Santana.190 Cruzando informações das atas e dos jornais foi possível perceber que tensões se acentuavam e tomavam cores políticas. O “representante integralista” e “populista” foi Antonio Matos, membro do PSD feirense e quem, certamente, tinha posturas que, na análise do articulista, estava associada ao 187 Câmara de Vereadores de Feira de Santana. Arquivo da Câmara Municipal. Ata da 22º Sessão Ordinária. 6/set/1948. 188 BACELLAR, Carlos. Uso e mal uso dos arquivos.In.: PINSKY, Carla Bassanezi (org). Fontes históricas. São Paulo: Contexto, 2005. 189 CLIMA de insegurança. Folha do Norte. 18/set/1948. 190 Os Diários Associados constituíam uma cadeia de imprensa que no auge, entre 1946 e 1960, congregou 90 empresas todas pertencentes à Assis Chateaubriand, integrando-a jornais, radio e televisão. Ver LAURENZA, Ana Maria de Abreu. Batalhas em letra de forma: Chatô, Wainer e Lacerda.In.: História da Imprensa no Brasil. MARTINS, Ana Luiza & LUCA, Tânia Regina (orgs). São Paulo: Contexto, 2008.p.179. 88 populismo/integralismo. Tratava-se de um conflito político-ideológico. Apesar disso não houve cenas de vias de fato entre os edis mesmo estando, quase todos, armados segundo as informações da Folha do Norte. A partir daí os edis se dividiram entre os que apoiavam o prefeito e os que desaprovaram o governo. A própria bancada do PSD, que era maioria, foi “desmanchada”.191 Renato Santos Silva (PSD), José Joaquim Saback (UDN) Áureo Filho (UDN), Augusto Matias Carneiro(UDN), Antonio Cabral (PTB) apoiava o prefeito. Enquanto que Abílio Santa Fé (PSD), Servilio Carneiro (PSD), Antonio Matos (PSD), Demócrito Soares (PSD), Almáchio Boaventura (PSD), Edelvito d’Araujo (PSD) fizeram pronunciamentos e elaboraram moções que discordavam de atos do prefeito. Na 19º sessão Antonio Matos ao justificar a rejeição a moção de apoio ao executivo, relacionou o apoio de membros da bancada da UDN com a concessão de cargos públicos aos parentes do vereador Renato Santos Silva. Segundo ele, Silva foi beneficiado pelo prefeito por conseguir “nomeação de uma parente para o quadro de funcionalismo municipal”.192 Evidencia-se que uma das formas adotadas por Agnaldo Soares Boaventura para conseguir apoio político foi barganhando cargos públicos. Além disso, o fato de enfrentar Eduardo Motta ao descumprir o acordo interpartidário e realizar denuncias de corrupção assegurou que a bancada udenista o apoiasse. Além dos conflitos verificados na câmara, houve luta corporal entre o vereador Demócrito Soares e o secretário da prefeitura Gabriel Castilho nas ruas da cidade. O incidente foi registrado na delegacia de policia na forma de um processo crime de injúria. Discutiram por causa de afirmações feitas no “Panorama Político” da Rádio Sociedade apresentado por Castilhos em que ele divulgava crônicas da política local e estadual. No depoimento prestado por Demócrito Soares e em pronunciamentos na câmara de vereadores, Gabriel Castilho estava insultando “beneméritos feirenses” através da “imprensa local” com “notas infundadas”.193 Ele vinha diariamente, segundo depoimentos, tecendo comentários de caráter político, visando elementos destacados do PSD, como Eduardo Fróes da Motta, Carlos 191 POLÍTICA local. Folha do Norte.11/set/1948. Câmara de Vereadores de Feira de Santana. Arquivo da Câmara Municipal. Ata da 19º Sessão Ordinária. 193 Câmara de Vereadores de Feira de Santana. Arquivo da Câmara Municipal. Ata da 25º Sessão Ordinária. 192 89 Valadares e Edelvito Campelo Araújo sem assumir a autoria dos pronunciamentos. 194 Ao se encontrarem no edifício do Correio e Telégrafos, no sábado dia 18 de setembro, Demócrito Soares pediu permissão a Gabriel Castilho para perguntar-lhe acerca das crônicas que divulgava na imprensa local onde destratava a ele e a “amigos seus” membros do PSD. Motivo que os levaram às vias de fato. Soares desferiu um soco do qual Castilho se esquivou com a ajuda do guarda chuva que carregava na mão. Ato contínuo, o primeiro puxou uma arma de fogo e atirou, ferindo Castilho na testa e no dedo mínimo, conforme relatou Gabril Castilho.195 O laudo de exame de lesões corporais comprovou a agressão. No seu depoimento, afirmou que Demócrito Soares estava com uma arma, fato negado por Soares. No entanto, a luta corporal se seguiu e nas cenas descritas apareciam, por exemplo, Castilho “negaceando como um capoeira, gingando como um malandro” ao brigar com Soares.196 Tratava-se de antigos amigos e correligionários do PSD, que naquele momento reposicionavam-se no meio político. Durante a campanha que elegeu Agnaldo Boaventura, o Promotor Público de Barreiras, Gabriel Castilho ajudou na campanha como tesoureiro do partido e foi um dos responsáveis pela festa de posse. Em depoimento, Demócrito Soares afirmou que mantinha “relações amistosas” com Castilho.197 Além da conjuntura política marcada pela divisão entre PSD e PTB, depois da exoneração de Edelvito d’Araujo, aquela semana de 12 a 19 de setembro selaria o fim de amizades. Enquanto o segundo se manteve fiel aos seus amigos e “beneméritos feirenses” Eduardo Motta e Carlos Valadares as ofensas feitas por Gabriel Castilho posicionara-o próximo a Agnaldo Soares Boaventura, de quem gozava de confiança política a ponto de ser nomeado secretário da prefeitura. A esses arranjos políticos incluem-se novos atores ao longo da década de 1950. No entanto, os embates permaneceram. É o que veremos a seguir. 194 Sumário – injúria. Processos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS.p.11. Sumário – injúria. Processos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS.p.16. 196 Sumário – injúria. Processos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. 197 Sumário – injúria. Processos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. No processo crime Carlos Valadares advogado de Demócrito Soares disse que Castilho e Soares “mantinham relações amistosas”.p.17. 195 90 4. “Ofensas pessoais” e “divergência político-partidárias”: novos atores, conflitos históricos. Em 1958, a UDN baiana obteve vitórias expressivas. Para governador Juraci Magalhães (1959-1963) e uma das cadeiras do senado ficou com Otávio Mangabeira (1886-1960). Os feirenses João Mendes da Costa Filho, falecido em 1971, e Wilson Falcão (1918-2007) conquistaram vagas, o primeiro, na câmara dos deputados e o segundo, na Assembleia Legislativa. O número de assentos destinados aos udenistas na Câmara Municipal também cresceu em relação à legislatura anterior. Subiu de quatro para seis, o número de vereadores eleitos pela legenda, o que representava quase metade dos edis. Representatividade nunca vista até então.198 Em Feira de Santana, era a primeira vez que as duas principais lideranças feirenses se enfrentavam para um cargo do executivo. A vitória coube a Arnold Silva (UDN) que venceu Eduardo Motta (PSD). O primeiro com 8.025 e o segundo 7.612. 199 Diferença de votos significativa. O PTB participou das eleições ao lançar candidatura de Claudemiro Campos Suzart que conseguiu com 497 votos.200 Era a segunda vez consecutiva que Eduardo Fróes da Motta disputava a prefeitura. A primeira foi em 1954 na qual João Marinho Falcão (UDN) venceu com 5.477, ficando Motta com 3.671 e Hamilton Cohim (PTB) 3.058 votos. 201 Em 1958, o líder pessedista sentia a força que o Partido Trabalhista Brasileiro possuía nas urnas. Nas eleições de 1954 e 1958, caso as legendas do PTB e do PSD tivessem indicado um único candidato como aconteceu em 1948 a soma dos votos presumivelmente seria suficiente para a vitória dos partidos nesses pleitos. No entanto, realinhamentos políticos no final da década de 1940 cortariam laços dessa união partidária. Em 1954, segundo o Folha do Norte, a vitória expressiva de João Marinho Falcão representou a reação do município contra o “jogo do bicho”, a “corrupção” e a “dilapidação da fortuna pública”.202 As críticas ao governo 198 Ver tabelas de legislaturas de vereadores em anexo. A EXTRAORDINÁRIA passeata do triunfo. Folha do Norte.18/out/1958.p.1 200 Nas eleições de 1958 quando concorreu para prefeito, o lema da campanha de Claudemiro Suzart era: “A pititinga contra os tubarões”. Ver.: OLIVEIRA, Leila Vitor Fernandes. Inquilinos da Casa da Cidadania. CD-ROM. 201 POLÍTICA Local. Santanópolis.13/set/1954.p.1 202 TODO o município reagiu. Folha do Norte. 16/out/1954. 199 91 pessedista de Almáchio Alves Boaventura giraram sempre em torno dessas questões. Em 1958, pela primeira vez, a UDN experimentou em Feira de Santana a alternância no poder executivo. Substituiu o udenista João Marinho Falcão por um dos principais chefes políticos feirenses, Arnold Silva. Nessas eleições Wilson Falcão, filho do então prefeito, foi eleito Deputado Estadual. Em razão da expressiva votação, as festividades da vitória de Arnold Silva para prefeito de Feira de Santana iniciaram-se às 17 horas do domingo, 3 de outubro, dia das eleições. Estavam presentes Juraci Magalhães, Wilson Falcão, João Marinho Falcão, entre outros.203 Todos eles estavam no Paço Municipal, que naquela época, abrigava o poder executivo, legislativo e judiciário, isto é, a Câmara de Vereadores, o gabinete do prefeito e a Comarca. O Folha do Norte Assis descreveu o cenário: Cortejo, [...] de pessoas possuídas de incontido entusiasmo para a residência de Arnold Silva que vinha acompanhado de Juraci Magalhães e Wilson Falcão, em carro aberto precedido de vibrante falange feminina que fazia tremular, nos céus da Feira [...] dezenas de bandeiras da Bahia.[...] Enquanto a banda da “25 de Março” tocava a marcha de Juraci”, o povo cantava e dançava, e o cortejo avançava em meio as miríades de papelotes que se despejavam do alto dos edifícios.[...] Educado politicamente, o povo sabe o que quer 204 [...]. Como vimos no segundo capítulo, as conexões políticas e pessoais entre Juraci Magalhães e Arnold Silva eram estreitas. Motivo pelo qual o governador eleito participou das festividades de posse do prefeito eleito. O artigo, obviamente, veio repleto de adjetivos pelo “triunfo” de Silva. Mais uma vez as mulheres mereceriam destaque entre os participantes do “cortejo”. Desde as formações dos comitês políticos, no final da década de 1940, a participação política da mulher feirense ganhou visibilidade. Em 1950, a professora Helena de Sena Assis (1912-1997) apareceu como um dos nomes da UDN para ocupar o cargo no legislativo com relevante carreira docente no interior baiano.205 Sua candidatura significava uma “expressiva homenagem à inteligência, à cultura e ao civismo da Mulher Feirense”.206 Provavelmente uma das estratégias udenistas para angariar votos do público feminino. 203 A EXTRAORDINÁRIA passeata do triunfo.Folha do Norte. 18/out/1958.p.1 A EXTRAORDINÁRIA passeata do triunfo. Folha do Norte. 18/out/1958.p.1 205 ALMEIDA, Oscar Damião de. Dicionário da Feira de Santana. Feira de Santana: Santa Rita, 2006.p.69. 206 Folha do Norte. 9/set/1950.p.1. 204 92 Acompanhados pela “marcha de Juraci” tocada pela “banda da 25 de Março” o povo seguiu o cortejo. Fundada no final do século XIX, a Sociedade Filarmônica 25 de Março contava com a colaboração financeira, na década de 1950, de sujeitos como João Marinho Falcão (1893-1971), os irmãos Silva, Arnold, Dálvaro e Raul, Carlos Rubiños Bahia, Heráclito Dias de Carvalho, todos ligados à UDN.207 Esse dado acentua o caráter multifacetado das classes dirigentes que concentravam, em poucos indivíduos, uma diversidade de atividades na sociedade feirense.208 Arnold Silva solicitou a presença musical de uma banda que mantinha ligações com ele e seus correligionários para festejar sua vitória. Acompanhar o cortejo e as lideranças udenistas em meio à chuva de papéis, ou como escreveu o Folha do Norte, uma “miríade de papelotes”, era evidencia de que o “povo” estava “educado politicamente”. Não era mais “marionete” no jogo político.209 Logicamente essa afirmação respondia as iniciativas da UDN para o período. Mudanças com permanências. Indicar um chefe político que acumulava a experiência política nos anos 1920 e era sócioproprietário do jornal mais lido do interior da Bahia, como Arnold Silva, com uma trajetória amarrada ao juracisismo, foi uma estratégia de conservação de poder vitoriosa. O udenismo feirense por sua vez se aproximou de grupos de estudantes e também de mulheres para deles obter vantagens políticas como bases eleitorais e formação de quadros. Um dos jovens estudantes cooptados pela UDN foi Hugo Navarro da Silva. Sobrinho de Arnold Silva, o jovem advogado, professor, jornalista e político no início dos anos 1950 seria um dos novos atores dos conflitos entre pessedistas e udenistas feirenses. Sua participação política ganha relevo após o afastamento de seu tio, Arnold Silva, por motivos de saúde das atividades de prefeito em 1958, cargo que foi ocupado por Sisnando Lima. Ele foi uma das principais vozes udenistas nos anos 1960 utilizando-se, principalmente, do Folha do Norte como espaço de divulgação de ideias. Assim como a UDN, o PSD feirense redirecionou suas estratégias políticas no final dos 1950. A aproximação do PSD com movimentos populares e de trabalhadores conferiu a base necessária para a sua vitória em 1962. Eduardo Fróes da Motta foi responsável pela renovação do partido convocando 207 ALMEIDA.op.cit.p.217. Ver quadro em anexo atividades profissionais vereadores PSD entre 1948-1962. 209 A EXTRAORDINÁRIA passeata do triunfo.Folha do Norte. 18/out/1958.p.1 208 93 novos membros. Entre eles destacaram-se Francisco José Pinto dos Santos (1930-2008), ou Chico Pinto, como era mais conhecido. É o ex-prefeito de Feira de Santana quem narra no livro “Autênticos do MDB” o convite feito por Motta: “Fui procurado [...] pelo deputado federal constituinte de 1946 e exprefeito do município, dr. Eduardo Froes da Motta, uma das maiores figuras que conheci na vida pública, que convidou-me para ser candidato pelo PSD.[....] Afirmou conhecer meu trabalho e que também me beneficiaria com o apoio de alguns correligionários do meu pai, sobretudo do distrito de Humildes [...] Acrescentou, ainda, 210 que queria renovar o PSD no município. O trabalho desenvolvido por ele e outros jovens feirenses visava articular um novo partido na cidade. Intento que foi desaconselhado por Eduardo Motta pois a nova agremiação não conseguiria o coeficiente eleitoral necessário. Seu trabalho, inicialmente, foi “fazer” eleitores trabalhando no alistamento eleitoral. Ao realizar inscrições de pessoas que votariam pela primeira vez, divulgava seu nome como candidato. O convite de “dr. Eduardo” e o apoio de correligionários de seu pai que tinham influência política em Humildes, um dos distritos mais populosos do município, o beneficiaram nas urnas, garantindo expressiva votação para vereador em 1950. Somava-se a isso o fato de Francisco Pinto ser filho de membros da oligarquia baiana. Seu pai, o “coronel” José Pinto dos Santos (1889-1946), fazendeiro, agricultor e industrial foi ligado à política. Atuou como Conselheiro Municipal, sendo por isso influente nos meios políticos feirenses.211 A renovação do PSD proposta por Motta inseria jovens ligados às tradicionais classes dirigentes feirenses. Renovações nos quadros partidários ocasionaram atritos entre políticos mais experientes e iniciantes. Um exemplo desses conflitos foi entre o líder pessedista Eduardo Froes da Motta e o jovem udenista Hugo Navarro da Silva, logo após as eleições para prefeito em 1962. A arena da luta foi a imprensa. Através dos jornais Gazeta do Povo e Folha do Norte esses dois políticos trocaram ofensas pessoais motivados pelas divergências partidárias. Nem mesmo a intervenção do Lions Club de Feira de Santana, através de sua comissão de interesses da comunidade, resolveu definitivamente a situação. 210 NADER, Ana Beatriz. Autênticos do MDB: semeadores da democracia: historia oral de vida política. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998. p.143. 211 DAMIÃO.op.cit p.91. 94 Em 21 de março de 1963, Eduardo Fróes da Motta apresentou uma queixa de calúnia contra Hugo Silva. Esse processo crime foi impetrado porque no mês de fevereiro de 1963 ainda continuava reminiscências das acirradas disputas eleitorais travadas entre o PSD e a UDN. Partia-se para outras esferas de disputa. Ataques à moralidade, à honra e às memórias de parentes eram alvos de divergências políticas. Motta, denunciou Silva, fundamentado-se na Lei de Imprensa de 1953, passando procuração para representar seus interesses e os do seu falecido pai Agostinho Motta aos advogados José Sá Moraes e Francisco Pinto dos Santos.212 A edição do Folha do Norte trouxe em letras maiúsculas um artigo intitulado “Os filhos de alguém”. Nele, o articulista, desqualificavam Eduardo Hugo Motta. Silva, não Esforçou-se poupou em adjetivos que desmoralizá-lo, correlacionando suas atividades econômicas com o “jogo do bicho” e denunciando seu envolvimento com o candomblé, através de substantivações como “Dudu de Ogum” ou “chefe nagô”.213 Com o objetivo de associá-lo a um universo de falcatruas, acusava-o de ser “o dono do “bicho”, que corria, nesta cidade [...] o banqueiro do “bicho” [que] engolia o dinheiro do jogo [e] embolsava”.214 Este artigo ocupou quase toda a primeira página do jornal. As ofensas se estenderam ao patriarca da família Motta, Agostinho, e às origens de sua fortuna. Vê o chefe pessedista, nas origens alheias, cocheiros, lacaios, barregãs, esquecido de que o preto Agostinho, carroceiro que foi da convivência com as éguas adquiriu o hábito de dar coices, que não abandonou mesmo depois de receber o dinheiro pelo qual vendeu a 215 alma ao Diabo. São nessas passagens que se baseiam as calúnias denunciadas por Eduardo Motta. Ataques à sua imagem de homem que desfruta de “dignidade” e “conceito social” e a de seu genitor Agostinho Fróes da Motta ao associa-los a indivíduos marginalizados socialmente, sem valores morais e materiais, requesitos indispensáveis à construção de um caráter imaculado, de pessoa pública, conforme o Folha do Norte. O periódico associou o traço étnico, “o 212 Queixa crime Injúria calúnia/calúnia. 5; CX – 128; 2504. 213 Queixa crime Injúria calúnia/calúnia. 5; CX – 128; 2504. p.1. 214 Queixa crime Injúria calúnia/calúnia. 5; CX – 128; 2504.p.4. 215 Queixa crime Injúria calúnia/calúnia. 5; CX – 128; 2504.p.1 Processos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS EProcessos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS EProcessos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS EProcessos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS E- 95 preto Agostinho”, e a religiosidade afrodescendente como fatores negativos das origens familiares de Motta.216 No artigo, a desqualificação a Agostinho Motta aparece uma segunda vez: Nunca o bronze, esse nobre metal em que se fundem os sinos da casa de Deus e se eterniza a imagem dos justos e dos heróis teve aplicação menos digna do que lhe deram um busto que há nesta praça desta cidade A praça, que o articulista Hugo Silva fez alusão, é a que possui um busto de bronze em frente à mansão que pertencia à família Motta intitulada Agostinho Fróes da Motta. O bronze foi mal aplicado por compor ao mesmo tempo objetos simbólicos do mundo cristão católico e representar figuras ligadas ao candomblé ou que possuíam ligações com espíritos demoníacos. Criticas a homenagens feitas à memória do pai de Eduardo Motta foi parte de um conjunto de ofensas pessoais de tom discriminatório e fundamentadas nos valores católicos motivadas pela acirrada disputa política entre udenistas e pessedistas. A última das afrontas foi a que justificou o título da reportagem “Os filhos de alguém”. Hugo Silva reproduziu um documento que dizia que Eduardo Motta não era filho de Agostinho. quanto ao mais bastar-nos-ia transcrever um pequeno trecho de uns velhos e empoeirados autos: ‘o coronel Agostinho tinha o propósito de dar a cada qual dos seus filhos um nome cuja inicial fosse – A- daí ( o documento cita todos os pré-nomes, todos começados por A em número de sete [...]) A inicial do nome é – E – e não –A-, logo não é filho do Cel. Agostinho.’ De quem será filho então Eduardo Motta? 217 De alguém, por certo ... de alguém ... No documento citado não foi feita referência ao local de onde essas informações foram retiradas. O que talvez demonstre que o articulista se utilizou de dados imprecisos para atacar o inimigo político. Ainda mais porque os irmãos Motta tinham nomes iniciado com a letra “A”: Artur Fróes da Motta, Augusto Fróes da Motta, Albertina de Almeida Motta, Amália de Almeida Motta 216 Para mais informações sobre Agostinho Motta ver: REIS, Wagner Alves. Agostinho Fróes da Motta: comércio, política e questões raciais na Princesa do Sertão (1900-1922). Monografia de Especialização. Feira de Santana, UEFS: 2008. 217 Queixa crime Injúria calúnia/calúnia. Processos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS E5; CX – 128; 2504.p.4 96 e Adalgisa de Almeida Motta.218 Ele era exceção. Detalhe que não passou desapercebido a Hugo Silva. Em resposta, Hugo Silva, advogando em causa própria, apresentou queixa crime em 21 de maio de 1963, contra Eduardo Motta. Fundamentandose, também, na Lei de Imprensa de 1953, ele impetrou processo de difamação. Queixou-se de noticiais veiculadas pelo jornal Gazeta do Povo, de propriedade de Motta, que desmoralizava a ele e seus parentes. Afirmou que a luta entre os dois era de cunho político. E que a criação do jornal Gazeta do Povo tinha intenções de fazer criticas acerbas e injustas aos adversários políticos. Incluía-se entre elas o atual prefeito Arnold Silva que foi atacado, em seu decoro e dignidade, e cujos comentários violentos levaram o membro do executivo, adoentado, a deixar o paço municipal para tratamento de saúde. 219 Em anexo ao processo crime seguem fotografias do jornal Gazeta do Povo comprovando a argumentação do advogado. Nas primeiras linhas, Hugo Silva salientou o caráter político das disputas históricas entre os semanários, que, como viu-se no segundo capítulo, representavam de um lado o udenismo “juracisista” em Feira de Santana e de outro o PSD, com seus respectivos chefes, Arnold Silva e Eduardo Motta, como proprietários. Este processo crime apresentou mais detidamente embates entre essas facções no final da década de 1950. Segundo suas informações, Hugo Silva e seus “parentes” foram difamados pela “malsinado Gazeta do Povo”.220 O advogado listou que entre aqueles que foram difamados estão seus irmãos: o bacharel Antonio Navarro da Silva (1933), na época delegado de policia, e o professor do ensino médio José Luiz Navarro da Silva desmoralizados com notícias “aviltantes” e perversas publicadas pelo jornal. Hugo Silva juntou aos autos do processo “calúnias e difamações” contra seu primo, Itamar Silva, divulgadas no Gazeta do Povo. Segundo ele, depois que o jornal chamou o rapaz de “bandido”, “desordeiro”, “maconheiro”, “marginal” o jovem teve que deixar o “lar honrado e exemplar dos pais para 218 Ver http://oliveiradimas.blogspot.com.br/2011/10/no-final-do-seculo-19.html visitado em 20 de agosto de 2012. 219 Sumário – difamação. Processos crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-3; CX-86; DOC - 1686. 220 Sumário – difamação. Processos crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-3; CX-86; DOC - 1686.p.5 97 buscar meios de vida no sul do país”.221 No entanto, o que Silva não destacou foi que seu parente apareceu nas colunas do periódico porque depredou as instalações do Gazeta em junho de 1959.222 Ele juntou ao processo artigos do Gazeta do Povo que se posicionava contra o seu tio Arnold Silva. Várias críticas foram feitas ao seu tio, na época prefeito. Num deles intitulado “No mundo das piranhas” o periódico fez uma avaliação criteriosa da política udenista qualificando-a de “ditatorial”. E que depois que o “Sr. Juraci Magalhães assumiu o governo os seus partidários em Feira de Santana puseram as manguinhas de fora” vendo-se jornais empastelados como a G.P., assassinatos, jogo do bicho, funcionários fantasmas e desvios de recursos em obras de pavimentação públicas. Foi necessário que Sisnando Lima (1914-1984), conforme a ironia apresentada no periódico “com três galhos de salsa, arruda e guiné” tangesse um “grupo de fantasmas em forma de funcionários que dilapida o erário público”.223 A Hugo Silva também foi imputado fatos ofensivos, conforme anexo do processo crime. Na edição de 27 de janeiro de 1963, o Gazeta do Povo, em editorial, teceu comentários sobre a conduta funcional de Hugo Silva, que além de ser advogado, exercia docência como professor de português do “Ginásio Estadual”. Publicou o periódico que “metido a professor de português, desmoraliza o título a que se arroga, deixando de dar aulas e, quando o faz, é em tal estado de embriaguês, que deixa a mostra a sua falta de compostura” comprometendo “várias gerações de jovens”.224 Para amenizar os conflitos, setores da comunidade feirense intervieram. Essas ofensas, que abrangiam a vida particular, obrigou o Lions Club de Feira de Santana a publicar uma carta pública, chamada “mensagem ao cidadão feirense” onde ressaltou a preocupação dessas “disputas estéreis”. Criticou o comportamento de “homens públicos” que não pouparam nem a sagrada figura dos antepassados.225 Tratava-se de disputas dentro da classe dirigente de Feira de Santana. Antepassados ou parentes ligados ao poder público eram alvos. Funcionários públicos, como o Delegado de Polícia da 4º região Antonio Navarro da Silva e o 221 Sumário – difamação. Processos crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-3; CX-86; DOC - 1686..p.5 222 Inquérito. Processos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-2; CX-46; DOC-786. 223 O MUNDO das piranhas. Gazeta do Povo.27/jan/1963.p.6 224 Sumário – difamação. Processos crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. E-3; CX-86; DOC – 1686.p.2. 225 MENSAGEM ao cidadão feirense. Folha do Norte. 2/fev/1963.p.1. 98 professor do ensino médio José Luiz Navarro e figuras de destaque durante a Primeira República como o cel. Agostinho Fróes da Motta e Arnold Silva. Os métodos de agressão praticados por Eduardo Fróes da Motta e Hugo Navarro da Silva foram semelhantes. Atingir o adversário político através de ataques diretos a pessoa ou por meio da dilapidação de sujeitos ligados por laços familiares, mas conectados com a trajetória política e social de cada um deles. Mais frutíferas, do ponto de vista social, foram as atividades de movimentos populares durante a curta gestão do prefeito eleito pelo PSD, Francisco Pinto. 5. Nas escolas, nas ruas, nos currais: o governo do prefeito Francisco Pinto (1962-1964) Em 1962, ocorreu uma competição árdua pelo pleito municipal. Pouco mais que 40 votos garantiram a vitória do PSD.226 Desde o reinício do jogo “democrático” o resultado das eleições para prefeito municipal em Feira de Santana nunca foi tão estreito. Disputaram as eleições em 1962 os ex-vereadores Francisco José Pinto dos Santos (1930-2008) e João Durval Carneiro (UDN). Pinto venceu as eleições. Os slogans de campanha são emblemáticos para a análise dar perspectivas políticas em disputa e do contexto das lutas populares do Brasil no inicio dos anos de 1960. O primeiro tinha como lema: “Chico Pinto no poder é o povo governando” e o segundo, pouco mais conservador, “João Durval no poder é João Durval governando”.227 A diferença pouco significativa da vitória de Francisco Pinto se deveu, certamente, às suas aproximações com setores populares urbanos de Feira de Santana. Assim que terminou a faculdade de Direito em Salvador, começou a advogar em 1955: “Tornei-me advogado dos sindicatos de Construção Civil, Fumageira, Feirantes, Metalúrgicos e Comerciários e cheguei a ter a maior banca de advocacia da região, embora não a mais rendosa”.228 Assistência jurídica que lhe rendeu apoio político. 226 PINTO, Raymundo Antonio Carneiro. Pequena historia de Feira de Santana. Feira de Santana, Ba: Sicla, 1971. 227 NADER. Op.cit.145. 228 Ibid.p.144. 99 Em campanha, chegou a afirmar que não queria “votos da burguesia”. Ao direcionar sua campanha para bases populares visava, sobretudo, retirar os votos do Partido Trabalhista Brasileiro conforme afirmava: “comecei a esvaziar o PTB, que conduzia parte do eleitorado da periferia”.229 Além disso membros dessa agremiação estavam inseridos na cúpula das organizações sindicais de trabalhadores em Feira de Santana. Trabalhadores urbanos e populações periféricas eram a direção tomada pela campanha eleitoral de Pinto. Dois fatores podem explicar os motivos que levaram Francisco Pinto a direcionar suas políticas a setores “marginalizados” da sociedade feirense. Um, certamente, foi os “ideais socialistas absorvidos na universidade”. 230 O outro foi o contexto do crescimento das lutas sociais no Brasil. As estratégias de renovação dos quadros do PSD tentadas por Eduardo Motta redirecionaram os rumos das políticas pessedistas em Feira de Santana. A agremiação buscou o apoio dos trabalhadores urbanos, por conta da mudança da composição do eleitorado, consequência do avanço da urbanização possibilitada pelo Programa de Aceleração do Crescimento dos anos Jucelino Kubitschek.231 Principalmente porque a proporção das pessoas que viviam na cidade havia crescido substancialmente. Entre as décadas de 1950 e 1960, Wilson Falcão Deputado Federal entre 1963 e 1967 registrou que “o aumento populacional foi de 135% estando a média atual de crescimento muito acima da média estimada para o nosso estado”.232 Francisco Pinto parecia entender a emergência de novos atores, como os trabalhadores, no jogo político dos anos 1950 e 1960. Apesar da imprensa feirense não noticiar as greves nas regiões de São Paulo e do ABC paulista os enfrentamentos resultaram na conquista de direitos como o décimo terceiro salário em 1962.233 Elas aumentaram substancialmente no poder de mobilização. De 300 Mil em 1953 para 700 Mil em 1963. Governar com o povo, tendo-o como base eleitoral. Esse era o slogan de campanha. As urnas demonstraram que de alguma forma “os trabalhadores e o 229 Idem.p. 145. Idem Ibid. p.142. Os livros da sua biblioteca foram doados à Universidade Estadual de Feira de Santana que estão sob a responsabilidade do Laboratório de História e Memória da Esquerda e das Lutas Sociais apresentam títulos de escritores ligados ao socialismo e ao pensamento marxista. 231 HIPPOLITO, Lúcia. De Raposas e Reformistas: o PSD e a experiência democrática brasileira (1945-64). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.p.140 232 Folha do Norte. 16/mai/1964 233 NEGRO, Antonio Luigi. & SILVA, Fernando Teixeira da. Trabalhadores, Sindicatos e política (1945-1964).In.: Brasil Republicano. Livro 3. FERREIRA, Jorge & DELGADO, Lucilia de Almeirda Neves (orgs). Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2010. 230 100 povo querem é participar da vida econômica, política e administrativa da nação”.234 Essa abertura às demandas populares e propostas de modernização administrativa para uma gestão mais à “esquerda” encontrou eco no PSD através de uma corrente política chamada “Ala Moça”. Os moços que compunham a “Ala Moça” visavam adquar o partido aos novos tempos. Segundo a argumentação de Lúcia Hippólito, a modernização partidária empreendida por esse grupo objetivava ocupar um novo centro político-ideológico que estava deslocado mais para a esquerda. Ligando-se a propostas nacionalistas como a intocabilidade da PETROBRÁS, o reordenamento das remessas de lucros, o disciplinamento da entrada de capitais estrangeiros e a formulação de uma política nacional de energia nuclear. Posições pelas quais foram acusados de serem comunistas ou comunizantes. Esse grupo teve colaboração decisiva na aprovação dos mais importantes projetos e no apoio ao governo Kubitschek.235 Participavam da “Ala Moça” cerca de nove deputados, entre os quais os baianos Viera de Melo e Oliveira Brito, que compunham comissões permanentes de Constituição e Justiça, Economia, Cultura, Legislação Social e Finanças constituindo o principal suporte legislativo do governo JK. Apesar da tentativa de renovação, o grupo não conseguiu tomar o lugar da ala velha do PSD. A falta de apoio do governo entre 1958 e 1960, a oposição das “raposas” e sem representatividade nos governos estaduais, o final da gestão de Juscelino Kubitschek selaria o fim das atividades dos “moços”.236 Embora não fosse membro da “Ala Moça”, Francisco Pinto, certamente reconhecia a vitalidade das ideias defendidas por esses jovens. Nacionalismo, renovação de práticas políticas, modernização administrativa foram características da gestão de Pinto. Os meses da administração de Francisco Pinto contribuem para a análise da competição e dinâmica política na medida em que ela nos revela demandas de setores dominados e seus meios de reivindicações. Assim como a continuidade dos embates entre UDN e PSD e de que forma conexões 234 BENEVIDES, Maria Victoria. O PTB e o Trabalhismo: partido e sindicato em São Paulo (1945-1964). São Paulo: Brasiliense, 1989. p.137. 235 HIPÓLITO. Op.cit. p.139 – 184. 236 Ibid.p.182 101 estaduais e nacionais de políticos feirenses definiram os rumos do poder local no pós-1964. Entre as articulações de esquerda de Francisco Pinto estavam as estabelecidas com Miguel Arraes. Então governador do estado de Pernambuco pelo PSB em 1962, Arraes foi uma das figuras com quem Pinto se articulou na política nacional, junto com Waldir Pires, na época, Consultor Geral da República. 237. Paralelamente à reunião do diretório do PSD, que juntou prefeitos baianos pessedistas em sua casa, Francisco Pinto, convidou Miguel Arraes para participar do encontro. No entanto, mesmo sendo o prefeito, Francisco Pinto “o dono da festa, é quem vai gastar o dinheiro”238, os altos dirigentes do PSD desaprovam a vinda do governador de Pernambuco. Numa análise da situação o Folha do Norte registrou: [...] que a direção partidária desaprovou unanimemente a conduta do senhor Francisco Pinto considerando-a impertinente, (o senhor Miguel Arraes é comunista filiado ao PSB e não pessedista), inoportuna e contraditória em face dos princípios acolhidos pelo partido [PSD] em sua linha pragmática para servirem de balisamento 239 à sua ação no plano estreitamento político A presença de Miguel Arraes em Feira de Santana significava um desvio dos princípios do PSD “que se notabilizava nacionalmente pela moderação de suas propostas e um posicionamento de centro”.240 Os princípios do partido, a que se refere à reportagem, parecem sugerir que um deles consistia em se distanciar de propostas tidas como socialistas. O convite era contraditório por que não sendo pessedista, Arraes venceu as oligarquias tradicionais pernambucanas baseado no compromisso de reformas econômicosociais e abertura às demandas populares. A vinda do governador de Pernambuco serviria, supostamente, para falar das experiências de luta da Frente do Recife, ao lado das associações de bairro e sindicatos em Pernambuco. A Frente tinha como plataforma política as 237 AS LIÇÕES do encontro. Folha do Norte. 05/out/1963.p.1. DIREÇÃO do PSD desaprova Pinto: Convite a Miguel Arraes Folha do Norte 28/09/1963. p.1 239 DIREÇÃO do PSD desaprova Pinto: Convite a Miguel Arraes. Folha do Norte. 28/09/1963. p.1. 240 FERREIRA, Muniz Gonçalves. O golpe de estado de 1964 na Bahia. Disponível em: <http://www.fundaj.gov.br/licitacao/observa_bahia_02.pdf>. Acesso em: 01/ Set/2008. 238 102 resoluções da Carta de Salvação do Nordeste. 241 Entre as suas proposições estavam a “proteção à industria nacional, reforma agrária, reconhecimento de comissões intersindicais e do direito de greve e pleno funcionamento da Confederação dos Trabalhadores do Brasil”.242 Esse documento propunha as reformas estruturais que Chico Pinto apoiava tanto que, aproveitando a presença de Arraes em Salvador para um evento da PETROBRÁS (que coincidiu com a reunião do diretório e dos prefeitos baianos), o convidou, para discutir essas questões em Feira de Santana.243 O convite feito a Miguel Arraes, apesar da insistência de Pinto, foi desaprovada pelo PSD e o governador de Pernambuco, assim como Waldir Pires, não apareceram em Feira de Santana. Foi num período em que “a luta de classe no Brasil alcançou um de seus momentos mais intensos” que Chico Pinto governou. 244 Em Feira de Santana contradições sociais e tendências crescentes de participação popular eram características da abertura política da população feirense. Assembleias em praças públicas, onde a população tinha direito a voz e voto, faziam parte das medidas que visavam à participação popular. Nas palavras de Pinto:245 Inicialmente organizamos a população em associações de bairro, ainda inexistentes no município e criamos uma Federação das Associações nascentes; nenhuma obra era realizada na cidade sem 246 uma discussão em cada bairro e em praça pública. Essa forma de governar em que a participação da população era estimulada, marcou a gestão de Chico Pinto. Isso, no entanto, não agradou a grupos feirenses que, derrotados na eleição anterior, fizeram campanhas de desestabilização e perseguição ao governo. Frequentemente era taxado de 241 A carta de Salvação do Nordeste surgiu como resultado do congresso de Salvação do nordeste, realizado em 1955, que inaugurou o novo tratamento da questão regional do nordeste. De congressos, encontros e documentos como esse, sobre possibilidades de desenvolvimento do nordeste, surgiu a SUDENE. Ver: VIEIRA.op.cit. 242 VIEIRA. op.cit.p.63. 243 NADER [...] op.cit. p.145 Chico Pinto afirmou que junto com alguns de seus secretários, em praça pública, defendia as reformas de base. 244 TOLEDO, Caio Navarro de. 1964: o golpe contra as reformas e a democracia. Revista Brasileira de História, São Paulo,v. 24, n. 47,2004. p.2. 245 Chico Pinto foi um dos primeiros prefeitos do país a fazer uma reforma administrativa subdividindo a secretária da prefeitura em secretarias, como de educação, transportes e obras públicas, etc. Cada secretário ficava responsável por gerir algum setor dentro da administração municipal. 246 NADER. op.cit.p.145 103 anarquista ou comunista, posições políticas que, segundo ele, não se sustentavam.247 Essas hostilidades à política de Pinto geraram problemas com a administração estadual. A aliança política PTB-UDN que elegeu Lomanto Júnior em 1962 fez com que udenistas feirenses tivessem influência no governo do estado. O resultado dessa ligação foi a retirada do secretário de finanças do município, cargo de indicação do Governo do Estado. Como forma de enfrentamento da deliberação de Lomanto Junior, Pinto recrutou, às pressas, “voluntários dos subúrbios” 248 e com o auxilio de 140 homens da Guarda Municipal, conseguiu reunir nos currais-modelos de Feira de Santana uma frente armada para barrar a cobrança de impostos, feita pelo governo estadual. 249 Os currais do município eram onde acontecia a feira de gado tradicional da cidade.250 Nesse local existia uma infraestrutura, com balança de pesagem do gado e uma área cercada, destinada ao comércio e à cobrança das taxas pelo estado e município.251 O comercio de gado era uma das principais atividades econômicas do município e os currais, o palco necessário para essa relação comercial. Para o prefeito municipal seria esse um lugar estratégico para fazer retaliação ao governo do estado, por ter tirado o secretário de finanças do município e impedido que o município contratasse pessoas para realizar ações de cobrança na Recebedoria de Rendas. Nesse período, as prefeituras baianas não tinham um aparato para cobrarem impostos e o estado colocava à disposição dos municípios, secretários de finanças. João Torres assumiu o cargo em Feira: O Torres fazia um bom trabalho na prefeitura, mas as forças da UDN feirense começaram a pressionar o Lomanto para que o retirassem da prefeitura. Conseguiram isso e foram mais além, pois proibiram 247 NADER. op.cit.145. GUERRA dos currais. Folha do Norte. 22/jun/1963 249 NADER. op.cit.p 147. 250 A medida que Feira de Santana crescia o campo do gado mudava de localização. Damião salienta que o campo do gado foi mudado 5 vezes ao longo dos séculos XIX e XX. O 1º foi nos Olhos D’Agua, ao ar livre, o 2º próximo ao abrigo do nordestino, o 3º situou na zona que compreende hoje o Ginásio Municipal Joselito Amorim e o Museu e Arte Comtemporânea, e foi feito de maneira planejada, sendo denominado currais-modelo, o 4º esteve localizado próximo do bairro da Queimadinha, constituído currais-modelo como o construído anteriormente, certamente foi nele que ocorreu a “guerra dos currais”, o 5º, é o atual, situa-se no bairro do Campo do Gado. Ver: Damião, Oscar. Dicionário, histórico personativo de Feira de Santana. p.174 e 175. 251 POPINO.op.cit. p.167. 248 104 que nós colocássemos funcionários para cobrar impostos na 252 Recebedoria da Rendas Não sabemos quais motivos fizeram com que João Torres fosse retirado do cargo de secretário de finanças. Ao que tudo indica, no entanto, a aliança local entre UDN e o PTB, nas eleições para prefeito e governador em 1962, apesar de não obterem êxito em Feira de Santana, colocou aquela coalizão no governo do estado e elegeu Lomanto Júnior, para a gestão de 1962 a 1966 253. Com a máquina estatal ligada à UDN, os udenistas feirenses utilizaram-na para tencionar e enfraquecer o governo pessedista em Feira. A tentativa de impedir que o município arrecadasse imposto, certamente, comprometeria o orçamento para o ano seguinte, inviabilizando a execução de projetos para a cidade. A força política dos udenistas feirenses obteve êxito provisório, pois Lomanto Júnior criou instrumentos para barrar a cobrança de imposto na cidade. Em reação às medidas do governo estadual, Pinto resolveu ocupar o campo do gado e impediu que o estado fizesse cobranças naquele estabelecimento. Ele e funcionários da prefeitura disponíveis no momento estavam entrincheirados, nos Currais do Município fortemente armados e dispostos a repelir, à bala, os prepostos da fiscalização estadual caso pretendessem arrecadar os impostos. 254 Sobre os gritos de “hoje nóis come esses burgueses na faca, prefeito”255 e com a proteção judicial de um Hábeas Corpus preventivo,256 os populares e o prefeito impediram que os fiscais do estado, junto com a Polícia Militar, adentrassem os currais. A população e a Guarda Municipal não entraram em conflito armado com a Polícia. A solução encontrada parece ter 252 BATISTA, Jailton. Chico Pinto, a voz do contra. Revista PANORAMA. Feira de Santana: ano 2, n. 44., p.13, ago./set., 1985.p.85. 253 “O governo de Antônio Lomanto Júnior se constituiu como resultado do triunfo da coalizão UDN-PTB sobre o candidato do PSD, Waldir Pires, nas eleições estaduais de 1962. Sustentada pelos círculos conservadores da política e da sociedade civil baiana de então e tendo como “padrinho” eleitoral Juraci Magalhães — na época governador, figura de proa da UDN e adversário declarado do presidente João Goulart —, a candidatura de Lomanto engendrava desde o início o paradoxo de incluir em sua chapa o PTB baiano, partido que, conquanto fosse hegemonizado na Bahia por sua ala menos “progressista”, era também o partido do primeiro mandatário da República”. Ver. MUNIZ. Op.Cit. 254 GUERRA dos currais. Folha do Norte. 22/jun/1963.p.1. 255 NADER. op.cit.p.147 256 Habeas Corpus Preventivo. Processos Crimes. Feira de Santana. CEDOC/UEFS. Esse documento, tendo Pinto como advogado, garantiria a libertada dos envolvidos na manifestação dos currais-modelo de Feira. 105 sido a permanência de João Torres e a volta à normalidade das funções da Recebedoria de Rendas. “A guerra dos currais”, como ficou conhecida mostrou o apoio da população a Chico Pinto. 257 A aliança entre o PTB e a UDN a nível estadual subsidiou ações de udenistas feirenses ao render de favores políticos que visavam minar a administração de Francisco Pinto. Esse tipo de prática tinha o objetivo de aniquilar o adversário para que fosse desprestigiado e visto pela população como alguém ineficiente e incapaz de resolver os problemas da população. Outro episódio, conhecido como “Quebra-Quebra da Câmara Municipal” marcou as lutas da população feirense em prol de uma educação pública e gratuita na cidade. O monopólio da educação secundaria foi conseguido desde a década de 1930 pelo Ginásio Santanópolis, de propriedade do professor Áureo de Oliveira Filho, um dos principais expoentes da UDN local. Como era uma instituição particular, o internato, não estava acessível à boa parte dos estudantes feirenses, salvo nos casos em que a Câmara Municipal concedia bolsas a alguns jovens que queriam dar continuidade aos estudos. O problema da educação secundária não era apenas local. No país até os anos 60, o ensino médio era restrito a um grupo pequeno de indivíduos, provenientes, em maioria, das camadas medias e altas da sociedade, a partir de quando outros grupos sociais passam a reivindicar e pressionar por mais vagas nesse nível 258 de ensino. A carência de vagas no ensino médio público começava a ser um problema de âmbito nacional. Além disso, os níveis mais altos de educação continuavam pertencendo às camadas médias e altas da sociedade brasileira, principalmente, quando o acesso à educação secundária, em lugares como Feira de Santana, estavam sob responsabilidade da iniciativa privada. As bolsas de estudos municipais concedidas a esses estudantes tinham que ser aprovadas pela Câmara de Vereadores. O aluno tinha que ter bom rendimento para não perder o financiamento municipal. Elas também 257 GUERRA dos currais. Folha do Norte. 22/jun/1963.p.1. SANTOS, Ana Maria Fontes dos. O ginásio municipal no centro das lutas populares em Feira de Santana (1963-1964). Sitientibus : Revista da Universidade Estadual de Feira de Santana, n. 24, jan./jun. 2001.p.34 258 106 serviam “para estimular a iniciativa privada a suprir a escassa oferta pública dessa modalidade de ensino”.259 Além disso, o crescimento populacional durante a década de sessenta contrastou com a estabilização na oferta desse tipo de ensino. Feira de Santana experimentava um impressionante crescimento urbano, superior a 90%, entre as décadas de 1950 e 1960, enquanto a taxa de oferta educacional manteve-se praticamente estabilizada.260 Era urgente a instalação de uma escola de nível médio em Feira de Santana, ao longo da década de 1960. Tanto que em 1961 a Câmara de Vereadores aprovou a Lei Municipal 352/61 que instituiu o Ginásio Municipal de Feira de Santana e, curiosamente, num de seus dispositivos, previu a suspensão imediata das bolsas de estudos.261 A lei antecedeu à gestão de Chico Pinto; no entanto, exigências da população e do Prefeito Municipal para sua aplicação geraram conflitos. Por ter sido protelada por diversas vezes a discussão na Câmara, que previa o orçamento municipal para o ano de 1964 e a aplicação da lei 352/61 os estudantes e movimentos sociais compareceram ao Paço Municipal, para acompanhar a última sessão do ano. Encheram as galerias da Câmara e quando o presidente da casa, Joselito Amorim, abriu a sessão foi recebido por vaias, que aumentaram, quando disse que ia suspender a sessão caso permaneça a algazarra. Suspensa a sessão; os agitadores, entre os quais pessoas ligadas ao executivo, lançaram-se a depredação. Estabeleceu-se o caos. Todas as galerias da câmara foram completamente destruídas. Os vândalos aos gritos de “quebra”, “quebra”, arrancaram janelas, estilhaçaram vidros e puseram cerco ao prédio da prefeitura na tentativa de coagir os vereadores a votarem o orçamento segundo a 262 vontade do todo poderoso prefeito. A intenção dos estudantes feirenses, principalmente da AFES – Associação dos Estudantes Secundaristas de Feira de Santana – talvez não fosse depredar o patrimônio público, mas certamente pressionar os vereadores. Ao longo do ano, a matéria era desqualificada e retardava-se a criação do Ginásio Municipal. Pressões de camadas médias, dos movimentos 259 Ibid.p.38 Ibid.p.38 261 Idem. p.34 262 Folha do Norte. 30/nov/1963. 260 107 populares feirenses e dos estudantes foram imprescindíveis para se constituir na cidade instituições de educação pública e gratuita.263 Se a vitória de Chico Pinto, no pleito de 1962, não foi marcada por um sucesso grande no número de votos, sua administração fora de participação popular e a abertura política à população feirense, traduzida, como em boa parte do país, em conflitos sociais que visavam as demandas da população. Educação, certamente era uma das pautas prioritárias. Participação popular, atendimento as demandas da população, práticas de assembléias públicas, no entanto, não eram bem recebidas pela oposição que viam essa prática política como “desordem”.264 Para esses setores não competiria à população tomar posições políticas, porque: o povo ama a paz e a família, a segurança e liberdade, a inteligência e a justiça. O povo vive de persuasão e esperança, benignidade e trabalho. Não é do seu seio que sai a Mão Negra das destorras 265 anônimas Essas atitudes – tanto as manifestações na Câmara Municipal quanto a represália feito pelo prefeito ao governo do estado – significavam para a oposição parte de um plano comunista para o país.266 Não partiria do pacato povo feirense atitudes como essa, imaginavam os setores conservadores, marcadamente alinhados com a UDN. E o possível plano comunista incluiria a ação de Chico Pinto e os seus “agentes”, como advertiu o Folha do Norte: Pode ficar ciente [...] que os democratas não se entregarão sem luta e que estão dispostos a revidar golpe por golpe parta de onde partir a agressão e, para isso, contam com o apoio de todos os que ainda 267 não perderam a fibra e a coragem Pode-se supor que um golpe estava realmente a caminho, e suas vítimas foram mapeadas ao longo da década de 1960. A ligação de políticos 263 O prédio do Ginásio Municipal tinha abrigado os currais da cidade na década de 20. Depois da sua transferência para novas instalações no Bairro da Queimadinha, sediou as Escolas Reunidas Agostinho Fróes da Motta. Com a aplicação da lei 352/61, esta escola, após o ano de 1963, cedeu lugar ao Ginásio Municipal de Feira de Santana. Para mais informações consultar ALMEIDA.op.cit. 264 PINTO Comanda a desordem: a câmara foi invadida e depredada. Folha do Norte 30/nov/1963. 265 PINTO Comanda a desordem: a câmara foi invadida e depredada. Folha do Norte 30/nov/1963 266 PINTO Comanda a desordem: a câmara foi invadida e depredada. Folha do Norte 30/nov/1963 267 PINTO Comanda a desordem: a câmara foi invadida e depredada. Folha do Norte 30/nov/1963 108 feirenses com os de projeção nacional, a abertura política aos setores da população e, principalmente, os conflitos entre udenistas e pessedistas foram os motivos da deposição de Chico Pinto, em 1964. A UDN feirense com seu moralismo, “o partido da eterna vigilância”, vigiava os passos de Francisco Pinto, seu adversário e entrave nos planos udenistas. 268 Na avaliação deles, a administração de Pinto mesclava anarquia, comunismo, falência e desmoralização.269 Ela, por via da força, conseguiu retornar ao poder em 1964. 270 A deposição de Francisco Pinto foi cobrada por Juraci Magalhães a Castelo Branco.271 A solicitação partiu da UDN feirense, maior beneficiada com a vacância do cargo, que indicou o nome de Joselito Amorim. Ele governou até o fim do mandato que deveria ser exercido por Pinto. Eles ajudaram o governo militar a efetuar as punições, na troca do restabelecimento do poder aos udenistas feirenses. O golpe político possibilitou a restauração da UDN no executivo. Isso foi crucial para a continuidade dos projetos políticos udenistas iniciados nas gestões anteriores dos João Marinho Falcão (1954-1958) e Arnold Silva (19581962). Eles, no decorrer dos 1960/70, basearam-se na tentativa de inserção da cidade nos rumos da industrialização, do desenvolvimento urbano, no esfacelamento dos movimentos populares, assim como na abertura ao capital estrangeiro, com a implantação de um parque industrial.272 Por isso “a revolução” foi saudada, como um marco para história do Brasil, segundo o Folha do Norte. Uma reportagem publicada na edição de dezembro de 1964 fez uma retrospectiva dos principais acontecimentos no mundo. Nela, o golpe de 1964 figurou como o acontecimento que salvou a pátria da ameaça comunista e devolveu a ordem e o progresso a Feira de Santana e ao Brasil. 268 BENEVIDES.op.cit.p.11 Folha do Norte. 16/mai/1964.p.1 270 Maria Benevides faz uma análise do paradoxo da UDN: “Um partido que nasceu da luta conta uma ditadura, cresceu apesar de sofridas derrotas [..] para finalmente, quase vinte anos depois, surgir vitorioso num esquema de poder que instalaria um regime militar de arbítrio, repressivo e autoritário”. Ver.: BENEVIDES.op.cit.p.11. 271 A Tarde.31/mar/2004.p.9. 272 Um das iniciativas foi a criação do CIS/Tomba. Centro Industrial do Subáe situado no bairro do Tomba e foi fundado na década de 1970. Para mais informações sobre industrialização em Feira de Santana ver.: MONTEIRO, Jhonatas Lima. Interesses hegemônicos na margem da periferia: ação política de dirigentes industriais em Feira de Santana (1963–1983). Dissertação (Mestrado). Feira de Santana, UEFS: 2009. 269 109 Veio entretanto para a felicidade da Feira, a Revolução Democrática, que baniu do poder do nosso município, comunistas e simpatizantes, entregando ao homem honesto e trabalhador os destinos da comuna. Coube ao Prof. Joselito Falcão Amorim restaurar a prefeitura, colocar a “casa em ordem” e iniciar uma administração, justa, séria e profícua, que muito vem fazendo e muito fará ainda 273 pela terra feirense. Antes de congratular as forças armadas, essa reportagem fala da “intranquilidade e agitação” que nos primeiros meses de 1964 havia pairado sobre a cidade, com o exemplo da “depredação da Câmara de Vereadores”, no governo do “prefeito deposto”. Era necessário estabelecer um clima de paz e tranquilidade, uma gestão, diferente da anterior, que restaurasse e organizasse a cidade e a população feirense. Colocar “a casa em ordem”, mesmo sendo um ditado popular, deveria ter aparecido sem aspas na reportagem, pois foi com rigor que o governo de Joselito Amorim e os militares atuaram na cidade nos primeiros anos do pósgolpe. As primeiras atitudes tomadas pela gestão Amorim atingiram o funcionalismo público municipal. Exonerações de servidores e administradores de distritos ocorreram nos primeiros dias de mandato, e antes de julho de 1964, a nova estrutura de funcionários da prefeitura estava montada. Alguns vereadores e secretários como Oscar Marques, secretário de Agricultura e Obras Públicas, e Colbert Martins, secretário de agricultura e indústria, que votaram contra o impeachment de Pinto, foram os primeiros a perderem seus cargos. Outras pessoas que tinham cargos de confiança, em suas maiorias políticos, também foram exoneradas. 274 O “expurgo” deu-se também nos administradores de distritos de Feira de Santana. Em locais distantes da sede do município havia um representante da prefeitura, nomeado pelo prefeito, que era o administrador de distrito que fazia parte dos cargos de confiança do funcionalismo municipal. Os administradores de Tiquarussu (José Gregório Araújo), Jaguara (José Batista Carneiro), Maria Quitéira (Raul de Oliveira) e Ipuaçu (Agrário de Oliveira) foram exonerados dos seus cargos, quando Joselito Amorim assumiu a prefeitura.275 Com o golpe de 1964, uma dupla ação seguia-se em Feira de Santana. Uma de cunho político-administrativo e outra de repressão efetiva. Ou seja, essas ações visavam coibir focos de levante contra o governo municipal 273 Folha do Norte. 26/dez/1964.p.1 Folha do Norte. 09/mai/1964 275 Essas exonerações foram encontradas em nota na Folha do Norte entre os meses de maio e julho de 1964. 274 110 instituído na figura de Joselito Amorim e também refrear a participação da população feirense, prendendo participantes e lideranças progressistas dos movimentos populares e estudantil e associações de bairro. Colocar “ordem na casa”, como aparece na reportagem acima, visou esfacelar a participação popular no poder político institucional. 111 CONSIDERAÇÕES FINAIS A análise sobre a competição e dinâmica política em Feira de Santana, entre 1948 e 1965 revelou que disputas em torno da conquista do poder político, protagonizadas pela União Democrática Nacional (UDN) e pelo Partido Nacional Democrático (PSD), envolveram diversos mecanismos. Os embates mais enérgicos foram localizados fora do campo político institucional. A dimensão social dos enfrentamentos deu cores mais vivas à luta pelo o poder e mostrou-se fundamental para compreensão do tema em estudo. A imprensa foi um dos campos de disputa. Ela foi a arena onde vários segmentos tentaram expressar suas ideias. A UDN, através do jornal Folha do Norte, que divulgava suas concepções, não foi a única experiência jornalística e partidária. O Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) forjou iniciativas, nessa perspectiva, mas os conflitos internos culminaram no enfraquecimento e, posteriormente, no fim do periódico. Da mesma forma, o PSD incorporou às suas estratégias, sobretudo ao longo dos anos 1950, a construção de um semanário, o Gazeta do Povo, que circulou seis anos. Os pessedistas criaram um canal de interlocução com a população feirense e, ao mesmo tempo, estabeleceram um espaço de conflito político no jornalismo, baseado na crítica, na divulgação de ideias e de denúncias. A violência foi reveladora de uma rede de relações sociais e políticas que caracterizava as práticas políticas do período. Os processos crimes foram importantes para mostrar dissidências internas da UDN e do PSD e a influência exercida pelas duas principais lideranças: Eduardo Fróes da Motta e Arnold Silva. A utilização de métodos violentos foi um mecanismo para causar intimidação e calar vozes destoantes dos agrupamentos dominantes. A liderança de dois políticos Arnold Silva e Eduardo Fróes Motta evidenciou o personalismo como uma das características do período. A análise dos perfis das lideranças locais mostrou que ambos os líderes pertenciam às classes dominantes e ocupavam papel de destaque na sociedade. A trajetória social e política revelou que eram herdeiros políticos de dois dos principais “coronéis” da Bahia. Esses laços de parentesco ajudaram a impulsionar suas 112 carreiras políticas. Apesar do caráter personalista de ambas as lideranças, manteve-se o caráter ideológico das disputas locais. Aspectos como o antigetulismo, liberalismo, anticomunismo, trabalhismo e populismo foram temas de discussões e afinidades entre políticos feirenses. Apesar do esforço de membros da classe dominante feirense, visando silenciar setores populares estes tiveram papel ativo na política feirense. Seja através das luta pró-educação pública e gratuita ou através de enfrentamento patrões, a população feirense teve papel central em todo o período. Os rumos políticos tomados por Feira de Santana no pós-1964 foi resultado das divergências históricas entre pessedistas e udenistas. Conexões com políticos, como Juraci Magalhães, ligados aos militares, contribuíram decisivamente no golpe contra Francisco Pinto (PSD), que colocou Joselito Amorim (UDN) no poder. Ao fim, a participação dos movimentos populares ou perspectivas de participação da população no governo foram suprimidas por setores da classe dirigente da cidade que apoiaram a Ditadura Militar. 113 LISTAGEM DE FONTES: a) Biográficas, memórialisticas ALMEIDA, Oscar Damião de. Dicionário da Feira de Santana. Feira de Santana: Santa Rita, 2000. OLIVEIRA, Leila Vitor Fernandes. Inquilinos da Casa da Cidadania. CD-ROM. b) CEDOC/UEFS Autos criminais Tipo Período Inicio Partes envolvidas Parte I(autuado) fim Localização Parte II(autor da ação) Est Cx Doc Sumário de difamação 1963 1964 Eduardo Fróes da Motta Hugo Navarro da Silva 03 86 1686 Queixa crime 1963 1964 Hugo Navarro da Silva Eduardo Fróes da Motta 05 128 2504 Inquérito 1960 1960 Itamar Silva jornal Gazeta do Povo 02 46 781 Lesões corporais 1952 1964 Agnaldo Soares Boaventura João Hermelino da Silva 01 20 369 Injúria 1949 1956 Demócrito de Lima Soares Bel. José Castilho Gabriel 05 35 591 Prevaricação 1951 1952 Mario Mascarenhas Soares 01 02 41 Injuria 1963 1964 Rossine Souza 95 1980 Figueiredo Agnaldo Boaventura Antonio Leopoldo Cabral 04 Acervo de História Oral Entrevistados Tema Sinval Galeão Movimento comunista Título do projeto Movimento comunista: envolvimento dos comunistas na 42 frente de mobilização popular c) Arquivo da Câmara de Vereadores de Feira de Santana Atas das sessões Ordinárias e Extraordinárias (1945 a 1964) d) Jornais Arquivo Particular do jornal Folha do Norte jornal Folha do Norte (1945 a 1964) nº.doc. Coleção de Jornais da Família Galeão jornal Gazeta do Povo (05/1959 a 03/1964) 114 Jornais Santanópolis (1954-155) e O Coruja (1955-1957) MELLO, Carlos Alberto Almeida. Memórias Periódicos Feirenses: Santanópolis (1954-1955) O Coruja (1955-1957). Feira de Santana: Fundação Senhor dos Passos; Núcleo de Preservação da Memória Feirense, 2010. Este livro contém publicações fac-símile de todas as edições dos jornais O Coruja e Santanópolis. 115 REFERÊNCIAS ALMINO, João. Os democratas autoritários: liberdades individuais, de associação políticas e sindical na constituinte de 1946. São Paulo: Brasiliense, 1980. ARINOS, Afonso de Melo Franco. História e teoria dos partidos políticos no Brasil. São Paulo: Alfa-ômega, 1974. BATISTA, Jailton. Chico Pinto, a voz do contra. Revista PANORAMA. Feira de Santana: ano 2, n. 44., p.13, ago./set., 1985.p.85. BATTIBUGLI, Thaís. Polícia, democracia e política em São Paulo (1946-1964). São Paulo: Humanitas, 2010. BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. A UDN e o udenismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981. BENEVIDES, Maria Victoria. O PTB e o Trabalhismo: partido e sindicato em São Paulo (1945-1964). São Paulo: Brasiliense, 1989. BIANCHI, Álvaro. O laboratório de Gramsci: filosofia, historia e política. São Paulo: Alameda, 2008. BLOCH, Marc. Apologia da História ou oficio do Historiador. 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APENDICE A – ATIVIDADES PROFISSIONAIS DOS VEREADORES PELA UDN (1948-1962) VEREADOR ALBERTO SAMPAIO DE OLIVEIRA ARTUR VIEIRA DE OLIVEIRA AUGUSTO MATIAS DA SILVA ÁUREO DE OLIVEIRA FILHO GODOFREDO LEITE FILHO HERÁCLITO DIAS DE CARVALHO HUGO NAVARRO DA SILVA JOÃO BATISTA CARNEIRO JOÃO DURVAL CARNEIRO JOÃO JOAQUIM SABAK JOSÉ SISNANDO LIMA JOSELITO FALCÃO DE AMORIM NEWTON TAVARES CARNEIRO PAULO ALMEIDA CORDEIRO WALDIR DA SILVA PITOMBO WALTER NINCK MENDONÇA WILSON DA COSTA FALCÃO QUANTAS VEZES FOI ELEITO PROFISSÃO PREDOMINANTE FUNCIONÁRIO PÚBLICO Sim Não Sem dados ATIVIDADE JORNALISTICA Sim Não PROFESSOR Sem Dados Sim Não PRO Sem dados Sim X X 1 3 3 1 1 1 1 1 2 1 1 2 1 1 1 2 2 médico Professor Professor Agricultor Advogado Pecuarista Dentista Tenente Sem dados Professor Sem dados Comerciante Médico Sem dados Médico X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X 120 APENDICE B – ATIVIDADES PROFISSIONAIS VEREADORES PSD (1948-1962) VEREADOR ABILIO SANTA FÉ AQUINO ALMÁCHIO ALVES BOAVENTURA ANTONIO DE OLIVEIRA MATOS ANTONIO LOURENÇO NERY ANTONIO MANOEL DE ARAUJO ANTONIO PINTO DOS SANTOS ANTONIO RIBEIRO DA CUNHA COLBERT MARTINS DA SILVA DEMÓCRITO DE LIMA SOARES DORIVAL COSTA DE OLIVEIRA (ter certeza. Parece que era udenista) EDELVITO CAMPELLO DE ARAUJO FRANCISCO BARBOSA CARIBÉ FRANCISCO JOSÉ PINTO DOS SANTOS HUMBERTO CERQUEIRA MASCARENHAS JACKSON DO AMAURY JOÃO DE OLIVEIRA CAMPOS JORGE CERQUEIRA MASCARENHAS OSCAR MARQUES OSVALDO MONTEIRO PIRAJÁ RENATO SANTOS SILVA SERVILHO ALVES CARNEIRO THÉODULO BASTOS DE CARVALHO JUNIOR TITO BARREIRO MACHADO QUANTAS VEZES FOI ELEITO 1 1 1 1 2 2 2 3 2 1 PROFISSÃO PREDOMINANTE 1 1 1 Comerciante Tabelião Sem dados Sem dados Tabelião Advogado Sem dados Dentista Pecuarista Fun. Secretária da Fazenda Advogado Sem dados Advogado 1 Contador 1 1 1 Médico (suponho) Médico Sem dados 1 1 1 1 1 comerciante Médico Médico 1 Sem dados Médico FUNCIONÁRIO PÚBLICO Sim Não Sem dados X X X X X X X X X X ATIVIDADE JORNALISTICA Sim Não PROFESSOR Sem Dados X Sim Não X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X Sim X X X X Sem dados X X X PROP X X X X X X X X X X X X X X X X X 121 APENDICE C - RELAÇÃO DE VEREADORES ELEITOS (1948-1962) 1ª LEGISLATURA (1948-1950) NOME PARTIDO ABILIO SANTA FÉ AQUINO PSD ALMÁCHIO ALVES BOAVENTURA PSD ANTONIO DE OLIVEIRA MATOS PSD ANTONIO LEOPOLDO CABRAL PTB ANTONIO RIBEIRO DA CUNHA PSD ANTONIO DE MOURA CARNEIRO PSD(SUPLENTE) AUGUSTO MATIAS DA SILVA UDN ÁUREO DE OLIVEIRA FILHO UDN CLOVIS GONÇALVES AMORIM PSD/ PTB (Suplente) DEMÓCRITO DE LIMA SOARES PSD EDELVITO CAMPELLO DE ARAUJO PSD FRANCISCO BARBOSA CARIBÉ PSD/PTB (Suplente) GENESIO MOREIRA DE AZEVEDO PSD (Suplente) JOÃO BATISTA CARNEIRO UDN JOSÉ JOAQUIM SABAK UDN RENATO SANTOS SILVA PSD MANOEL NARCISO DA NATALIDADE PSD (Suplente) SERVILHO ALVES CARNEIRO PSD SUPLENTES:5 TOTAL DE VEREADORES:13 Mesa Diretiva (01 de Janeiro de 1948 a 31 de Dezembro de 1950): Presidente: Edelvito Campello de Araujo Vice-Presidente: Servilho Alves Carneiro 1º Secretário: Abilio Santa Fé Aquino 2º Secretário: Antonio Ribeiro da Cunha 122 2ª LEGISLATURA (1951-1954) NOME AUGUSTO MATIAS DA SILVA ARTUR VIEIRA DE OLIVEIRA ANTONIO MANOEL DE ARAUJO ANTONIO RIBEIRO DA CUNHA AGUINALDO SOARES BOAVENTURA ÁLVARO DOS SANTOS RUBEM CLAUDEMIRO CAMPOS SUZART DEMÓCRITO DE LIMA SOARES ESTEVAM MOREIRA FRANCISCO BARBOSA CARIBÉ FRANCISCO JOSÉ PINTO DOS SANTOS HAMILTON SABAK COHIN HERÁCLITO DIAS DE CARVALHO JOÃO CATAPANO JOÃO DE OLIVEIRA CAMPOS PARTIDO UDN UDN PSD( Suplente) PSD PTB PTB (Suplente) PTB (Suplente) PSD PTB (Suplente) PSD PSD PTB UDN PR (Suplente) PSD JOÃO MARTINS MAMONA PSD (Suplente) JORGE TUPHIQ ISMERA PR (Suplente) JOSELITO FALCÃO DE AMORIM UDN (Suplente) MANOEL NARCISO DA NATALIDADE PSD (Suplente) MARIO BORGES DE SOUZA PR (Suplente) RAIMUNDO SIMÕES AGUIAR PSD (Suplente) RENATO SANTOS SILVA PR (Suplente) TITO BARREIRO MACHADO PSD WILSON DA COSTA FALCÃO UDN WALTER NINCK MENDONÇA Total de vereadores: 13 Suplentes: 12 UND Mesa Diretiva (01 de Janeiro de 1951 a 31 de Dezembro de 1952): Presidente: Hamilton Sabach Cohim Vice-Presidente: Francisco Barbosa Caribé 1º Secretário: Francisco José Pinto dos Santos 2º Secretário: Tito Barreiro Machado 123 Mesa Diretiva (01 de Janeiro de 1953 a 31 de Dezembro de 1954): Presidente: Francisco Barbosa Caribé Vice-Presidente:Demócrito de Lima Soares 1º Secretário: Walter Ninck Mendonça 2º Secretário: Wilson da Costa Falcão 3ª LEGISLATURA (1955-1958) NOME AUGUSTO MATIAS DA SILVA ARTUR VIEIRA DE OLIVEIRA ANTONIO LOURENÇO NERY ANTONIO MANOEL DE ARAUJO ANTONIO RIBEIRO DA CUNHA COLBERT MARTINS DA SILVA DORIVAL COSTA DE OLIVEIRA JOÃO DE CASTRO BARBOSA JOÃO DURVAL CARNEIRO JOSELITO FALCÃO DE AMORIM JORGE WATT DA SILVA MÁRIO BORGES DE SOUZA MÁRIO PORTO OSVALDO MONTEIRO PIRAJÁ WALTER NINCK MENDONÇA WILSON DA COSTA FALCÃO PARTIDO UDN UDN PSD PTB PSD (Suplente) PSD PSD UDN (Suplente) UDN UDN PTB PTB (Suplente) PTB PSD UDN UDN Total de vereadores: 13 Suplentes:3 Mesa Diretiva (01 de Janeiro de 1955 a 31 de Dezembro de 1956): Presidente: Augusto Matias da Silva Vice-Presidente: Jorge Watt da Silva 1º Secretário: Antonio Manuel de Araujo 2º Secretário: Walter Ninck Mendonça Mesa Diretiva (01 de Janeiro de 1957 a 31 de Dezembro de 1958): Presidente: Jorge Watt da Silva Vice-Presidente:Osvaldo Monteiro Pirajá 1º Secretário: Dourival Costa de Oliveira 2º Secretário: Mário Porto 124 4ª LEGISLATURA (1959-1962) NOME ALBERTO SAMPAIO DE OLIVEIRA ALTAMIR ALVES LOPES ANTONIO MANOEL DE ARAUJO ANTONIO PINTO DOS SANTOS ANTONIO RIBEIRO DA CUNHA PARTIDO UDN PTB PSD PSD PSD (Suplente) ARTUR VIEIRA DE OLIVEIRA UDN COLBERT MARTINS DA SILVA PSD DEMÓCRITO DE LIMA SOARES UDN (Suplente) GILBERTO MOREIRA FERREIRA PR (Suplente) HUMBERTO CERQUEIRA MASCARENHAS PSD JOÃO CATAPANO PR JOÃO DURVAL CARNEIRO UDN JONATHAS TELES DE CARVALHO UDN (Suplente) JOSÉ MARQUES FIGUEIREDO UDN (Suplente) JOSÉ SISNANDO LIMA UDN JOSELITO FALCÃO DE AMORIM UDN (Suplente) OSCAR MARQUES PSD RAIMUNDO SIMÕES AGUIAR PR SEVERINO ALVES CARNEIRO PSD (Suplente) THÉODULO BASTOS DE CARVALHO JUNIOR PSD WALDIR DA SILVA PITOMBO Total de vereadores: 14 Suplentes: 7 UDN Mesa Diretiva (01 de Janeiro de 1959 a 31 de Dezembro de 1960): Presidente:João Durval Carneiro Vice-Presidente: Antonio Manoel Araujo 1º Secretário: João Catapano 2º Secretário: Humberto Cerqueira Mascarenhas ___________________________________________________ Mesa Diretiva (01 de Janeiro de 1961 a 31 de Dezembro de 1962): Presidente: João Durval Carneiro Vice-Presidente: Antonio Manuel de Araújo 1º Secretário: Altamir Alves Lopes 125 2º Secretário: Colbert Martins da Silva 5ª LEGISLATURA (1963-1966) NOME ANTONIO MANOEL DE ARAUJO ALTAMIR ALVES LOPES ANTONIO ANTUNES DOS SANTOS ANTONIO PINTO DOS SANTOS COLBERT MARTINS DA SILVA GODOFREDO LEITE FILHO HUGO NAVARRO DA SILVA HUMBERTO CERQUEIRA MASCARENHAS JACKSON DO AMAURY JORGE CERQUEIRA MASCARENHAS JOSÉ MANOEL DE ARAUJO FREITAS JOSÉ MOREIRA NEWTON TAVARES CARNEIRO PAULO ALMEIDA CORDEIRO RAIMUNDO SIMÕES AGUIAR THÉODULO BASTOS DE CARVALHO JUNIOR JOSELITO FALCÃO DE AMORIM PARTIDO PSD PTB PTB PSD PSD UDN UDN PSD (Suplente) PSD PSD UDN (Suplente) PSD (Suplente) UDN UDN PSD (Suplente) MDB UDN TOTAL DE VEREADORES:13 SUPLENTES: 4 Mesa Diretiva (01 de Janeiro de 1963 a 31 de Dezembro de 1964): Presidente:Joselito Falcão de Amorim Vice-Presidente: Paulo Almeida Cordeiro 1º Secretário: Altamir Alves Lopes 2º Secretário: Theódulo Bastos de Carvalho Junior ___________________________________________________ Mesa Diretiva (01 de Janeiro de 1965 a 31 de Dezembro de 1966): Presidente:Paulo Almeida Cordeiro Vice-Presidente: Godofredo Leite Filho 1º Secretário: Altamir Alves Lopes 2º Secretário: Newton Tavares Carneiro 126 APENDICE D - PREFEITOS (1943-1963) NOME PERÍODO PARTIDO Heráclito Dias de Carvalho (UDN) 6 de julho de 1938 a 11 de março de 1943 Dr. José Berbert Tavares(NI) 11 de março de 1943 a 5 de abril de 1944 Dr. Eduardo Fróes da Motta(PSD) 5 de abril de 1944 a 9 de novembro de 1945 Dr. Augusto Vital Graça (NI) 9 a 16 de novembro de 1945 Dr. Alibert do Amaral Batista(NI) 16 de novembro a 10 de dezembro de 1945 Engº Civil Acioly Vieira de Andrade 10 de dezembro de 1945 a 1° de março de 1946 Dr. Augusto Vital Graça 1° de março a 25 de abril de 1946 Dr. Carlos Valadares (PSD) 25 de abril de 1946 a 3 de janeiro de 1947 Farmac.ºJoão Barbosa de Carvalho – (PSD) 3 de janeiro a 20 de maio de 1947 Dr. Edelvito Campelo de Araújo(PSD) 21 de maio a 6 de junho de 1947 Francisco Barbosa Caribé 6 de junho de 1947 a 16 de maio de 1948 Aguinaldo Soares Boaventura - 16 de maio de 1948 a 31 de janeiro de 1951 PTB Prof. Almáchio Alves Boaventura - 31 de janeiro de 1951 a 7 de abril de 1955 PSD João Marinho Falcão 10 de abril de 1955 a 7 de abril de 1959 UDN Arnold Ferreira da Silva 7 de abril de 1959 a 24 de novembro de 1962 UDN Dr. José Sisnando Lima 24 de novembro de 1962 a 7 de abril de 1963 UDN Dr. Francisco José Pinto dos Santos 7 de abril de 1963 a 6 de maio de 1964 PSD Prof. Joselito Falcão de Amorim 8 de maio de 1964 a 7 de abril de 1967 UDN 127 APENDICE E - QUADRO DE CANDIDATOS E ELEITOS PARA PREFEITURA DE FEIRA DE SANTANA (1948-1964) Ano das Eleições Candidatos Partidos/coligação Vitorioso Período 1947 Carlos Bahia(UDN) Coligação Democratica Feirense (PR, UDN, PTN,PDC) Agnaldo Soares Boaventura (1948-1951) Agnaldo Soares Boaventura(PTB) Aliança Feirense (PSD,PTB) Almáchio Soares Boaventura(PSD) Coligação (PSD,PTB) Almáchio Soares Boaventura(PSD) (1951-1955) Carlos Bahia(UDN) Aliança (PR, UDN, PTN,PDC) João Marinho Falcão (UDN) (1955-1959) Arnold Silva (UDN) (1959-1963) Francisco Pinto(PSD) (1963-1964) 1950 1954 Hamilton Cohim (PTB) Eduardo Motta (PSD) João Marinho Falcão (UDN) 1958 Eduardo Motta(PSD) Frente Democrática Feirense Claudemiro Campos Suzart (PTB) Arnold Silva (UDN) 1962 Francisco Pinto(PSD) João Durval Carneiro (UDN) Hamilton Cohim (PTB)