Uma exploração acerca do comportamento dos avatares no

Transcrição

Uma exploração acerca do comportamento dos avatares no
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
INSTITUTO COPPEAD DE ADMINISTRAÇÃO
PEDRO IVO ROGEDO COSTA DIAS
Uma exploração acerca do comportamento dos
avatares no metaverso
Rio de Janeiro, 2009
Dias, Pedro Ivo Rogedo Costa
Uma exploração acerca do comportamento dos avatares no metaverso / Pedro Ivo
Rogedo Costa Dias - Rio de Janeiro: UFRJ/Coppead, 2009.
170 f.:il
Dissertação (Mestrado em Administração) -Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Instituto Coppead de Administração, Rio de Janeiro, 2009.
Referências bibliográficas: f. 157-170.
Orientador: Antônio Roberto Ramos Nogueira
1. Cultura digital. 2. Estratégia. 3. Administração - Teses. I. Nogueira, Antônio
Roberto Ramos (Orient.). II. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto
de COPPEAD de Administração. III. Título.
PEDRO IVO ROGEDO COSTA DIAS
Uma exploração acerca do comportamento dos avatares no metaverso
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Administração do Instituto
Coppead de Administração, da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Mestre em
Administração.
Orientador: Professor Antônio Roberto Ramos
Nogueira, D.Sc.
Rio de Janeiro, 2009
PEDRO IVO ROGEDO COSTA DIAS
Uma exploração acerca do comportamento dos avatares no metaverso
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Administração do Instituto
Coppead de Administração, da Universidade Federal
do Rio de Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de Mestre em
Administração.
Orientador: Professor Antonio Roberto Ramos
Nogueira, D.Sc.
Aprovada em __________________
______________________________________________________________________ - Orientador
Professor Antonio Roberto Ramos Nogueira, D.Sc. - COPPEAD/UFRJ
______________________________________________________________________
Professor Nicolau Reinhard, Pós-Doutor e Livre Docente – FEA/USP
______________________________________________________________________
Professor José Afonso Mazzon, D.Sc. - FEA/USP
DEDICATÖRIA
Dedico, em primeiro lugar, a Deus. Imagino que ele exista e, se eu consegui terminar essa
dissertação, provavelmente ele deu uma força bastante considerável.
Aos meus patrocinadores financeiros: meus pais, que forneceram casa, comida e roupa
lavada, além do amor e dedicação; Andrea Gouvêa Vieira, que contribuiu de forma graciosa no início
deste trabalho e à CAPES, que financiou metade do meu mestrado.
Professor Roberto Nogueira, meu orientador, sempre disponível para ouvir idéias
completamente heterodoxas e patrocinar intelectualmente essa dissertação. Professora Heloíza
Matos, que considero uma co-orientadora, por ter me ajudado a compreender melhor os assuntos
ligados à Comunicação.
Aos professores Nicolau Reinhard e José Afonso Mazzon, da FEA/USP, que vieram de São
Paulo especialmente para participar da minha banca; obrigado pelo tempo e dedicação.
Aos meus amigos; eles sabem quem são, desnecessário citar nominalmente.
Àqueles que, por ventura, vierem a ler este trabalho. Agradeço antecipadamente pelo tempo
gasto e peço desculpa pelos eventuais erros conceituais que possam existir. Provavelmente eles
existem. Certamente eles existem. Fui por mares nunca d'antes navegados por mim; mesmo após
muita leitura, passando por campos como Filosofia, Comunicação, Sociologia, Psicologia, é certo que
existe alguma incorreção conceitual. Espero que isso não atrapalhe o conjunto da obra e as
consertarei assim que detectar. Peço desculpas antecipadamente.
Aos pesquisadores de todo o Brasil, por continuarem insistindo na idéia que vale a pena,
contra tudo e todos, dedicar-se à pesquisa acadêmica. Reconheço que é difícil, especialmente
quando muitas pessoas que constituem os meios formadores de opinião têm o objetivo de
desqualificar o que é produzido em terras tupiniquins, criando um suposto trade off entre
conhecimento e desenvolvimento.
Tomo uma licença poética para dedicar a uma pessoa que marcou bastante a minha
formação acadêmica, professor Celso Duvivier de Albuquerque Mello – que, como infelizmente
acontece com muitas pessoas boas, é prematuramente falecido.
Guardo com carinho o livro autografado por ele e transcrevo parte do seu prefácio à décima
edição do Curso de Direito Internacional Público:
“Mais uma vez as nossas elites educacionais optam pela ignorância da
população a fim de evitar que ela tenha uma visão crítica. São as mesmas
Autoridades que preferem ensinar álgebra, soma de frações, m.d.c., m.m.c., etc.,
nas escolas das favelas, mas não dão aulas sobre os direitos dos trabalhadores, ou,
ainda, de cidadania. Se no Brasil nada muda, mas apenas os nomes dos que nos
governam, permito-me também participar deste conluio. Quanto menor número
de especialistas em DIP, melhor para mim. Por favor, requeiro às nossas
Autoridades da área da Educação que comuniquem aos demais governantes que
não falem em processo de internacionalização da economia ou do Estado, porque
não consigo explicar essa aparente “contradição” aos estudantes. Creio que deve
haver uma lógica, mas só os iniciados e sábios a conhecem, o que não ocorre com
um modesto mestre-escola de província, que é marcada pela “síndrome de
Beirute” e que infelizmente não mora na nossa Disneylândia (Brasília).
Costumo dizer aos alunos que isso decorre do fato de que eles devem ter
mais tempo livre para fazer cursos de ginástica e defesa pessoal para poder chegar
vivos em casa após as aulas na Faculdade.”
Ao mestre, com muito carinho.
Agradecimentos
Em primeiro lugar agradeço a Deus, qualquer que seja a religião, por me dar motivação e
coragem para seguir nesta pesquisa. Aos meus pais que foram os principais incentivadores da
pesquisa e da dedicação integral nestes dois anos de Coppead.
Ao meu orientador, professor Roberto Nogueira, que aceitou uma proposta razoavelmente
diferente do padrão e teve o trabalho árduo de seguir nessa “viagem tecnológica” junto comigo. Os
meus mais sinceros agradecimentos.
Aos professores do Coppead, em especial aos professores Vítor Almeida, Úrsula Wetzel,
Denise Fleck, Agrícola Bethlem, Everardo Rocha e Adriana Hilal. Agradeço também à psicóloga e
coach Eva Hirsch Pontes que, de uma forma muito humana, abriu bastante as minhas perspectivas
pessoais e profissionais. A todos da Secretaria Acadêmica – Lucianita, Simone e Cida, que sempre
foram um refúgio na hora do stress, gerando excelentes papos e dicas.
Aos colegas – e muitos deles, agora amigos – da minha turma de Mestrado e de outras turmas
também, inclusive do Doutorado, que agüentaram explicações incompreensíveis e animadas sobre o
tema da minha dissertação; além disso, possibilitaram alguns dos momentos mais interessantes da
minha vida.
Agradeço especialmente à professora Heloíza Matos, da Faculdade Cásper Líbero, de São
Paulo, pelas valiosas opiniões e deliciosos encontros regados a café e semiótica. Ao pesquisador e
curador Guilherme Kujawski, do Itaú Cultural, de São Paulo, por separar um precioso tempo para
bater um papo sobre arte e cultura digital e oferecer ótimas sugestões de caminhos a seguir.
Ao professor Charlie Gere, da Universidade de Lancaster, por tirar algumas dúvidas via email, principalmente por responder a uma inquietação minha e dizer que a minha pesquisa fazia
sentido.
“O fundamento da beleza é acima de tudo a liberdade no fenômeno.
O fundamento da nossa representação da beleza é a técnica na liberdade.”
Friedrich Schiller, poeta alemão (1759-1805)
Carta a Christian Gottfried Körner, 23 de fevereiro de 1793
“Em favor da crítica
Agora lhe parece um erro o que outrora você amou como sendo uma
verdade ou probabilidade: você o afasta de si e imagina que sua razão teve aí uma
vitória. Mas talvez esse erro, quando você era outro – você é sempre outro, aliás -,
lhe fosse tão necessário quanto as suas 'verdades' de agora, semelhante a uma
pele que lhe escondia e cobria muitas coisas que você ainda não podia ver.
Foi sua nova vida que matou para você aquela opinião, não sua razão: você
não precisa mais dela, e agora ela se despedaça e a irracionalidade surge de
dentro dela como um verme que vem à luz.
Quando exercemos a crítica, isso não é algo deliberado e impessoal – é, no
mínimo com muita freqüência, uma prova de que em nós há energias vitais que
estão crescendo e quebrando uma casca. Nós negamos e temos de negar, pois
algo em nós está querendo viver e se afirmar, algo que talvez ainda não
conheçamos, ainda não vejamos! - Estou dizendo isso em favor da crítica.”
Friedrich Wilhelm Nietzsche, filósofo alemão (1844-1900)
A Gaia Ciência, Livro IV, Aforismo 307
“Temos, portanto, desde o século XVIII (ou em todo caso desde o fim do
século XVIII) duas tecnologias de poder que são introduzidas com uma certa
defasagem cronológica e que são sobrepostas. Uma técnica que é, pois, disciplinar:
é centrada no corpo, produz efeitos individualizantes, manipula o corpo como foco
de forças que é preciso tornar úteis e dóceis ao mesmo tempo.
E, de outro lado, temos uma tecnologia que, por sua vez, é centrada não no
corpo, mas na vida; uma tecnologia que agrupa os efeitos de massas próprios de
uma população, que procura controlar a série de eventos fortuitos que podem
ocorrer numa massa viva; uma tecnologia que procura controlar (eventualmente
modificar) a probabilidade desses eventos, em todo caso em compensar seus
efeitos.”
Michel Foucault, filósofo francês (1926-1984)
Aula de 17 de março de 1976 no Collège de France
RESUMO
DIAS, Pedro Ivo Rogedo Costa. Uma exploração acerca do comportamento dos avatares no
metaverso. Orientador: Antônio Roberto Ramos Nogueira. Rio de Janeiro: COPPEAD/UFRJ; 2009.
Dissertação (Mestrado em Administração).
O desenvolvimento e crescimento de sistemas de simulação de realidade, primeiro com os
jogos multi-usuários, posteriormente com os metaversos, tem chamado a atenção da imprensa, dos
acadêmicos e, principalmente, dos gestores de Marketing, interessados em compreender o potencial
dessas novas mídias.
Contudo, a compreensão do fenômeno dos mundos virtuais ainda está em estágio inicial de
pesquisa, havendo mais dúvidas que propriamente certezas quanto ao verdadeiro potencial dos
mesmos.
Partindo de um background relacionado à arte, ciência e tecnologia, a pesquisa busca
elencar fatores constitutivos do ethos desta mídia, possibilitando traçar preliminarmente os
antecedentes históricos dos metaversos, relacionando-os com o gênero cyberpunk, literatura
distópica, a idéia da cibernética (primeira e segunda ordem) e o desejo humano de imersão.
Desenvolvem-se cinco agrupamentos teóricos iniciais, de forma a possibilitar a realização de
entrevistas com avatares dentro do metaverso Second Life, investigando principalmente fatores
ligados à motivação para o uso e percepção dos sistemas de realidade simulada.
Os resultados preliminares desta análise exploratória indicam um fértil caminho de pesquisa
adiante, levantando questões como a própria percepção do real e do virtual, o conceito de presença,
a idéia de relacionamento social mediado por computador e as projeções realizadas pelos indivíduos
em seus avatares, que parecem ter bastante importância na compreensão do comportamento nestes
ambientes.
Palavras-chave: metaverso, realidade virtual, imersão, simulação, cyberpunk, Second Life, identidade
virtual.
ABSTRACT
DIAS, Pedro Ivo Rogedo Costa. Uma exploração acerca do comportamento dos avatares no
metaverso. Orientador: Antônio Roberto Ramos Nogueira. Rio de Janeiro: COPPEAD/UFRJ; 2009.
Dissertação (Mestrado em Administração).
The rise of reality simulation systems – first, multiplayer online games and then metaverses –
receives an ever growing press coverage, as well as the interest of scholars and Marketing
professionals, trying to comprehend and unleash those new media's full potential.
However, the study of the virtual worlds phenomenon is, yet, at an embryonary stage;
researchers have more questions than certainties about their de facto potential.
From an Art, Science and Technology (AST) background the research aims to help the
understanding of this new media ethos, then allowing the description of the historical determinants
of the metaverses, relating them to the cyberpunk genre, dystopian literature, the idea of
cybernetics itself (first and second order) and the human desire of immersion.
Five theoretical constructs are initialy proposed in order to create room for the realization of
interviews with avatars, inside the metaverse called Second Life, specially inquiring about factors
related to those systems' usage and the perception of simulated realities.
Results of this exploratory research show, primarily, that there's a long and interesting way
ahead, taking notes on issues like the perception of the real and virtual, the concept of presence, the
idea of a computer-mediated social relationship and the individual projections over their avatars,
which seems to be somehow important in order to understand the purchasing behaviour at
metaverses; those processes appear to be kind of different from the traditional theoretical models
used with e-commerce.
Keywords: metaverse, virtual reality, immersion, simulation, cyberpunk, Second Life, virtual identity.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Nota legal: Muitas figuras utilizadas nesta dissertação podem estar protegidas pela legislação de
direitos autorais, tanto no Brasil quanto em caráter internacional. Contudo, acredita-se que o uso
realizado neste trabalho enquadra-se na categoria “fair use”, por se tratar de imagens com
relevância histórica, importantes para a compreensão do tema, enquadradas no contexto de uma
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violation.
Máquina de Herman Hollerith, c.1890
Disponível em: http://ed-thelen.org/comp-hist/hollerith.jpg
ASCC, Universidade de Harvard, 1944
Disponível em:
http://www03.ibm.com/ibm/history/exhibits/markI/images/241304.jpg
Sketchpad, de Ivan Sutherland, c.1961
Disponível em:
http://www-tc.pbs.org/wgbh/nova/specialfx2/images/sketchpad.jpeg
HMD, de Ivan Sutherland, s.d.
Disponível em:
http://www.inition.co.uk/inition/images/guide_hmd_oldhmd.jpg
Movimento animal – homem, Eadweard Muybridge, c.1885
Disponível em:
http://www.artlex.com/ArtLex/t/images/time_muybridge.runningman.th.jpg
Seqüência de fabricação, Frank Gilbreth, c.1914
Disponível em: http://photography.si.edu/upload/Images/sm_737_Image_167.jpg
Dinamismo de um ciclista, Umberto Boccioni, 1913
Disponível em: http://www.artchive.com/artchive/f/futurist/boccioni_cyclist.jpg
Dinamismo de um cão em uma coleira, Giacomo Balla, 1912
Disponível em: http://www.soniavandijck.com/balla_dog.jpg
Vive la France, Filippo Marinetti, 1914/1915
Disponível em: http://www.moma.org/images/collection/FullSizes/00283080.jpg
Composizione, Enrico Prampolini, s/d (191?)
Disponível em:
http://www.bancaintesaarteecultura.net/singola_opera_anonimo_new.asp?
q_idopr=101&q_imgtipo=0
Bicicleta, Marcel Duchamp, 1913
Disponível em:
http://www.askart.com/AskART/images/glossary/Dada_Marcel_Duchamp.jpg
Fonte, Marcel Duchamp, 1917
Disponível em:
http://everydaytrash.files.wordpress.com/2008/04/marcel-duchamp-fountain.jpg
Cena de Metropolis, Fritz Lang (diretor), 1927
Disponível em: http://boxoffice.com/blogs/steve/metropolis.jpg
The rooftop studio, Rudolf Schlichter, 1927
Disponível em:
http://www.lokalseiten.de/wuppertal/1997/11/images/Schlichtergross.jpg
Capa da edição de Admirável Mundo Novo, Aldous Huxley (autor), 1932
Disponível em:
http://lindenbergh.net/peter/assets/images/Aldous_Huxley_Brave_New_World02.jpg
Cena de Tempos Modernos, Charles Chaplin (diretor/ator), 1936
Disponível em:
http://www.mc.cc.md.us/Departments/hpolscrv/Pics/ModernTimesCog.jpg
Capa de 1984, George Orwell (autor), 1948
Disponível em: http://www.duplipensar.net/lit/images/1984.jpg
Cena de Viagem à Lua, George Méliès (diretor), 1902
Disponível em: http://www.fotyart.org/travel/imagenes5-6/viaje/melies.gif
Theremin, Léon Theremin, s/d
Disponível em: http://www.137.com/theremin/leon_theremin300c.jpg
Composition with lines, Piet Mondrian, 1917
Disponível em: http://www.fiu.edu/~andiaa/cg2/mon_09.jpg
Computer composition with lines, Michael Noll, 1964
Disponível em:
http://www.citi.columbia.edu/amnoll/CompArtExamples_files/image006.jpg
Hummingbird, Charles Csuri, 1968
Disponível em:
http://www.siggraph.org/artdesign/profile/csuri/artworks/plot/scribble-birdtwo.jpg
Sensorama, Morton Heilig, 1961
Disponível em:
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/a/ae/Sensorama_patent_fig5.png
Orientation Island, Second Life, 2006
Disponível em: http://www.gamesetwatch.com/2006_07_04_firstthing.jpg
Lucro mensal de usuários do Second Life, tabulação do autor, 2008
Composição etária dos usuários do Second Life, tabulação do autor, 2008
Os diferentes tipos de interatividade segundo Lévy, tabulação do autor, 2008
Matriz de amarração, tabulação do autor, 2008
Representação do modelo TAM, reconstituição do autor com base em Legris et. al., (2003),
2008.
Grupo identidade, tabulação do autor, 2008
Grupo imersão, presença e migração, tabulação do autor, 2008
Grupo tecnologia e interface, tabulação do autor, 2008
Grupo social, tabulação do autor, 2008
Imagem em 2D do exterior da estrutura de pesquisa, construção do autor, 2008
Imagem em 2D do interior da estrutura de pesquisa, construção do autor, 2008
Quadro de Referência Cruzada, tabulação do autor, 2008
Modelo preliminar proposto para futuras pesquisas, construção do autor, 2009
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
2D
Duas dimensões
3D
Três dimensões
COPPE
Coordenação de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia/UFRJ
COPPEAD
Coordenação de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração/UFRJ
L$
Linden Dollar
LL
Linden Lab, Inc.
MMORPG
Massive Multiplayer Online Role Playing Game
MUD
Multi-user Dungeon
NMC
New Media Consortium
RPG
Role Playing Game
SL
Second Life
TAM
Technology Acceptance Model
TIC
Tecnologias da Informação e Comunicação
SUMÁRIO
1 APRESENTAÇÃO
1.1 Consideração inicial
19
1.2 A pesquisa sobre realidade virtual no Brasil e a localização do Coppead
20
1.3 A pesquisa sobre novas mídias no Brasil e no mundo
21
1.4 Objetivos da pesquisa
1.4.1 Realizar o levantamento dos antecedentes históricos do metaverso
22
1.4.2 Identificar o metaverso no contexto do cyberpunk
23
1.4.3 Subsidiar a compreensão do comportamento dos usuários do metaverso
23
1.4.4 Identificar fatores que possam explicar o uso do metaverso
23
1.4.5 Propor um modelo de pesquisa futuro
24
1.5 Relevância do estudo
24
2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 Evolução e desenvolvimento das comunicações
26
2.2 Evolução e desenvolvimento da computação
30
2.2.1 As máquinas de cálculo e suas linguagens
30
2.2.2 Cibernética: uma visão preliminar
34
2.2.3 O pós-Segunda Guerra Mundial
39
2.3 A arte e a percepção acerca da tecnologia
42
2.3.1 Tempo, espaço e sua manipulação
43
2.3.2 Da fotografia ao dinamismo nas artes visuais
45
2.3.3 Percepção acerca da tecnologia no período entre guerras
49
2.3.4 Metropolis, de Fritz Lang (1927)
50
2.3.5 Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley (1932)
54
2.3.6 Tempos Modernos, de Charles Chaplin (1936)
55
2.3.7 Mil novecentos e oitenta e quatro – 1984, de George Orwell (1949)
56
2.3.8 Anotações complementares sobre o cinema
58
2.3.9 Cibernética: entre tecnologia e arte
59
2.4 Novas mídias e tecnologias na arte
64
2.5 O Metaverso
68
2.5.1 A estética cyberpunk
68
2.5.2 Desenvolvimento de sistemas de realidade virtual
71
2.5.3 Arte e sistemas de realidade virtual
75
2.5.3.1 Charlotte Davies
75
2.5.3.2 Maurice Benayoun
76
2.5.3.3 Monika Fleischmann e Wolfgang Strauss
77
2.5.4 Conclusão do metaverso
78
2.6 O Second Life enquanto metaverso
79
2.6.1 Uma introdução ao “sistema Second Life”
79
2.6.2 A economia do Second Life
83
2.6.3 Os residentes
85
2.6.4 Negócios dentro do Second Life
87
2.6.5 Sucesso e fracasso das iniciativas dentro do Second Life
89
2.7 Pesquisas sobre o “virtual”
90
2.7.1 Simbiose e interface
90
2.7.2 As análises filosóficas
91
2.7.3 Imersão e presença
95
2.7.4 Personalidade em ambientes virtuais
96
2.7.5 Migração e percepção de espaço
99
2.8 Conclusão
100
2.8.1 Arte e mídia: rastreando as origens do metaverso
101
2.8.2 Retorno à pergunta inicial
105
2.8.3 Matriz de amarração
105
2.8.3.1 Uso e motivação para o uso
107
2.8.3.2 O grupo identidade
109
2.8.3.3 O agrupamento imersão, presença e migração
110
2.8.3.4 O agrupamento tecnologia e interface
112
2.8.3.5 O agrupamento social
113
3 MÉTODO DE PESQUISA
3.1 Razões de escolha do método de pesquisa
115
3.2 A experiência do pesquisador no campo
117
3.3 Etnografia no ciberespaço (ciberetnografia)
118
3.4 Análise histórica
119
3.5 Especificidades de entrevistas em ambientes virtuais
119
3.6 As entrevistas
121
3.6.1 Delimitação do universo de sujeitos a serem entrevistados
122
3.6.2 Situação de contato
123
3.6.3 Realização da entrevista
123
3.7 Roteiro utilizado
124
3.8 Questões e justificativas na literatura (Quadro de Referência Cruzada)
126
3.8.1 Grupo “Dados Pessoais ( I )”
127
3.8.2 Grupo “Dados sobre a migração (II)”
127
3.8.3 Grupo “Percepção primária do metaverso (III)”
130
3.8.4 Grupo “Hábitos no metaverso (IV)”
131
3.9 Aspectos epistemológicos importantes (limitações do método)
133
4 RESULTADO DAS ENTREVISTAS
4.1 A percepção do Second Life: um jogo?
135
4.2 A questão do real e do virtual
136
4.2.1 O que é a vida no Second Life?
136
4.2.2 Residências virtuais
137
4.2.3 Bens virtuais: freebies, objetos pagos ou design exclusivo?
139
4.4 Interconexão com outras mídias
140
4.5 A migração
141
4.5.1 Interessante, ou simplesmente divertido
141
4.5.2 Existo, logo socializo
142
4.6 Percepção de negócios dentro do Second Life
142
4.6.1 Ilhas que nada vendem, mas são “bonitinhas”
142
4.6.2 Benefícios para as organizações
143
4.6.3 Trabalho e renda dentro do metaverso
143
4.7 Tecnologia e interface
144
4.8 Hábitos de uso
144
5 CONCLUSÃO
5.1 Rotwang, Maschinenmensch e o avatar
145
5.2 Uma visão conjunta
147
5.3 Privacidade e representação
148
5.4 Correlação entre heavy users e uso do metaverso?
148
5.5 Proposta de modelo para futuros testes
149
5.6 Propostas de futuras linhas de pesquisa
151
5.6.1 Influência da estética 3D na atitude em relação à plataforma
151
5.6.2 Correlação entre redes sociais e o metaverso
152
5.6.3 O processo de socialização
153
5.6.4 Motivadores da conversão do uso eventual ao habitual
153
5.6.5 Hábitos de compra no metaverso
154
5.7 Implicações para os pesquisadores em tecnologia
154
5.8 Implicações para o mercado
155
5.9 Algumas últimas palavras
155
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
157
1 APRESENTAÇÃO
1.1 Consideração inicial
Esta pesquisa surgiu como um processo pós-moderno de construção; quase um
hipertexto construído através de repetidas iterações (muitas destas indo para “mares nunca
dantes navegados”), com desdobramentos que foram se tornando tão ou mais interessantes
que a própria idéia inicial.
Na época em que ainda estava no mercado de trabalho, o pesquisador começou a atuar
num ambiente virtual chamado Second Life, tendo desenvolvido uma relação comercial
razoavelmente lucrativa e absurdamente interessante dentro daquele espaço.
Como todas as novidades em tecnologia, não demoraram a aparecer as “consultorias”
em metaverso e as empresas que tinham bastante interesse em participar desta plataforma,
sem que estas consultorias demonstrassem adequadamente conhecer todas as limitações e
potenciais do Second Life.
No mesmo momento em que se proliferavam as mais variadas técnicas de monetização
dentro do metaverso, algo ainda era esquecido: como descobrir as técnicas de monetização
sem sequer conhecer esse usuário do sistema?
Essa pesquisa nasce como um esforço para tentar compreender o comportamento
desse indivíduo dentro de um sistema de simulação em realidade virtual, como o Second Life.
Para tanto, a pesquisa irá investigar as origens históricas e culturais dos sistemas de realidade
virtual para subsidiar a construção da base teórica respectiva.
Como sugestão da banca, farei umas pequenas definições iniciais, principalmente para
se compreender o título deste trabalho – sem se ter que chegar à página 30 para tanto.
Avatar, palavra de origem sânscrita, tem um significado original como uma “emanação
da alma”, ou seja, intrinsecamente metafísico. No caso da presente dissertação (e do tema de
pesquisa), avatar, grosso modo, é uma representação do indivíduo em um ambiente virtual. É,
de certa maneira, uma projeção deste indivíduo nas plataformas digitais, sendo aí
compreendida também o translado de sua personalidade – ou daquela que ele deseja projetar
naquele meio social.
Metaverso representa o gênero dos ambientes virtuais imersivos, ou seja, plataformas
nas quais os usuários (no caso, os avatares) estão representados e desenvolvem as mais variadas
atividades. É, eminentemente, uma rede social de forte apelo gráfico, sendo em algum tipo de
19
simulação de um ambiente de 3-D – embora sem os aparelhos, como óculos de realidade
virtual, que façam isso acaba se reduzindo em uma simulação 2-D.
1.2 A pesquisa sobre realidade virtual no Brasil e a localização do Coppead
A pesquisa em realidade virtual no Brasil conta com alguns pólos específicos,
geralmente dentro de Universidades, com financiamento público. Alguns dos principais grupos
brasileiros em atuação.
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar/SP)
Grupo de Realidade Virtual
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
GRVM – Grupo de Pesquisa em Realidade Virtual e Mídia
Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC)
LARVA – Laboratório de Realidade Virtual Aplicada
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
GRVa / LAMCE – Grupo de Realidade Virtual Aplicada
Universidade de São Paulo (USP)
NRV / MEI / Poli – Núcleo de Realidade Virtual
Interlab / Poli – Interactive Technologies Laboratory
Universidade Federal de Uberlândia (UFU)
Grupo de Realidade Virtual
No Coppead, contudo, inexistem pesquisas voltadas para a aplicação de mecanismos
de realidade virtual, bem como possíveis modelos de negócios ou mesmo pesquisas voltadas
para a compreensão do comportamento deste novo tipo de consumidor.
Algumas iniciativas existem na UFRJ, mas praticamente todas concentradas na COPPE e
em outros institutos de pesquisas voltados para as ciências da natureza.
A maior parte das pesquisas no Brasil sobre realidade virtual tem o foco nos aspectos
tecnológicos e na possibilidade de melhoria de sistemas de apoio à decisão. Tomando como
exemplo a COPPE/UFRJ, muitas pesquisas são voltadas para a utilização da realidade virtual
em simulações, enquanto existe um número crescente que estuda a aplicabilidade em sistemas
de ensino.
20
O estudo exploratório de Campos (2004), realizado com grupos de alunos de cadeiras
introdutórias ao estudo de Astronomia na UFRJ, buscava estabelecer algum tipo de correlação
entre a utilização de tecnologia de realidade virtual – no caso, não imersiva – e alguma
melhoria percebida no aprendizado de conceitos espaciais. Os resultados sugerem que houve,
na turma pesquisada, um aumento na cooperação e motivação dos estudantes, além de outros
benefícios observados.
Guimarães (2006) observa o potencial da utilização de sistemas de realidade virtual
para o ensino de matemática em sua pesquisa, realizada com crianças possuidoras de
Transtorno de Déficit de Atenção, chegando a conclusões muito positivas acerca da aceitação
da tecnologia e melhoria no aprendizado.
Amim (2007) pesquisou a aplicação de realidade aumentada em arquitetura e
urbanismo, atentando para o amplo potencial das tecnologias envolvidas em mudar a forma
padrão de concepção e realização de um projeto na área. Os vários casos estudados parecem
corroborar a pesquisa. Para Amim (op.cit., 110): “a realidade aumentada aplicada à Arquitetura
e Urbanismo muda não só a relação homem-computador mas também o comportamento
humano nas cidades, nos locais de trabalho, nas próprias casas”.
No campo da modelagem, podem ser notadas as pesquisas de Reis (2008), em que
realiza uma simulação do comportamento de crianças de rua para subsidiar as políticas
públicas no setor.
Embora haja um aumento no número de pesquisas desenvolvidas sobre realidade
virtual, ainda é muito pequena a participação de estudos voltados para o desenvolvimento de
um modelo de negócios que, em última análise, poderá ser a chave para viabilizar a aplicação
comercial de várias das novas tecnologias que são pesquisadas atualmente nas Universidades.
1.3 A pesquisa sobre novas mídias no Brasil e no mundo
A elite da pesquisa global em novas mídias pode ser identificada através da filiação ao
New Media Consortium (NMC), uma reunião de mais de trezentas universidades, órgãos de
pesquisa corporativos, museus e think tanks ao redor do mundo para compartilhar e construir
conhecimentos sobre as novas formas de mídia.
Não há, contudo, nenhuma instituição brasileira filiada ao consórcio até este momento.
Existem alguns centros de pesquisa mais destacados, como o Massachusetts Institute of
Technology (MIT), que possui o Comparative Media Studies, comandado pelo professor Henry
21
Jenkins. O CMS tem várias linhas de pesquisa referentes aos impactos das novas mídias e
tecnologias da informação e comunicação.
O professor Charlie Gere dirige o Institute for Cultural Research (ICR), da Universidade
de Lancaster, na Inglaterra, contendo linhas de pesquisa voltadas principalmente para a
relação entre o homem e a tecnologia, além das novas formas de mídia e consumo.
Na Universidade de Indiana existe o Synthetic Worlds Initiative, coordenado pelo
professor Edward Castronova, com interesses voltados para os aspectos econômicos dos
mundos virtuais, bem como comportamentos em ambientes de jogo, além de outras linhas
correlatas.
E a lista é bem mais extensa.
No Brasil, entretanto, a pesquisa é bastante isolada e desenvolvida em apenas alguns
centros, a maior parte ligado às escolas de comunicação e artes. A Administração e o
marketing têm passado ao largo das discussões sérias sobre os aspectos culturais relacionados
à convergência de mídias.
A Cidade do Conhecimento, na USP, é um projeto que explora as possibilidades novas
de comunicação através das mídias relacionadas à emancipação digital1. As pesquisas do
professor Gilson Schwartz representam um ponto fundamental no Brasil, tentando fazer a
ponte entre a tecnologia, a sociedade e os princípios democratizantes.
Outro pesquisador brasileiro, com várias publicações tanto no Brasil quanto no exterior,
é o professor Marcelo Zuffo.
Após uma reestruturação curricular, a tradicional Faculdade Cásper Líbero, de
Comunicação Social, está com uma linha de pesquisa específica na área de novas mídias e
interatividade.
Fora estes e outros exemplos, o tema ainda é relativamente negligenciado aqui no
Brasil.
1.4 Objetivos da pesquisa
1.4.1 Realizar o levantamento dos antecedentes históricos do metaverso
Seria ao menos temerário começar a falar de um fenômeno relativamente recente
como os metaversos (ou ambientes virtuais imersivos de realidade simulada) sem ao menos
1 Emancipação digital pode ser entendida, grosso modo, como a série de métodos e iniciativas que visam dar
poder ao indivíduo através das TIC, ampliando bastante o conceito de “inclusão digital” (Schwartz, 2006).
22
tentar introduzir o leitor ao histórico do mesmo.
Entender as idéias e conceitos que nortearam o desenvolvimento das tecnologias, até
chegar ao objeto de estudo, pode fornecer uma dimensão histórica relevante para sua
compreensão enquanto fenômeno social.
Desta forma, o primeiro objetivo será o levantamento dos antecedentes históricos do
metaverso, usando para tanto as ferramentas do campo de estudo conhecido como AST (Art,
Science and Technology), para depois ir efetivamente para o aprofundamento respectivo.
1.4.2 Identificar o metaverso no contexto do cyberpunk
Após a parte inicial, do histórico, serão obtidos subsídios para a inserção do fenômeno
no âmbito do gênero literário conhecido como cyberpunk. Um dos objetivos da pesquisa é
compreender por que o metaverso (em seu conceito) é descendente direto deste tipo de
literatura, além de analisar quais características influenciaram o seu desenvolvimento.
A identificação de tais aspectos contribuirá para o atingimento dos objetivos
subseqüentes.
1.4.3 Subsidiar a compreensão do comportamento dos usuários do metaverso
Após entender a origem histórica do metaverso, a pesquisa terá se municiado de
informações e dados relevantes para poder traçar parâmetros que possivelmente podem ser
relevantes para a análise adequada do comportamento dos usuários neste ambiente.
Por se tratar de uma espaço virtual, com a estética ligada ao paradigma imersivo em
três dimensões, acredita-se que possam existir fatores diferentes dos tradicionais aspectos
estudados em ramos como Sistemas de Informação. A compreensão do comportamento deste
usuário, com base na literatura acadêmica das mais diversas áreas, é ponto crítico para
qualquer modelagem posterior, e embasará a criação do roteiro de entrevistas.
1.4.4 Identificar fatores que possam explicar o uso do metaverso
Este objetivo é intimamente ligado ao anterior, sendo um desdobramento natural da
pesquisa. Quais fatores, dentre os vários identificados na literatura, podem contribuir para a
compreensão do uso do metaverso?
23
Acredita-se que, após a revisão de literatura, será obtido um “arsenal” de possíveis
candidatos a figurar no rol de fatores explicativos do uso.
A realização das entrevistas se dará nesta etapa, admitindo-se espaço para uma certa
adaptação dos conceitos observados, dando-se prioridade às informações fornecidas pelos
entrevistados.
1.4.5 Propor um modelo de pesquisa futuro
Após a realização das entrevistas será realizada uma análise, considerando quais
aspectos puderam ser observados na amostra que, embora não extrapolável, é capaz de
fornecer fortes indícios de conceitos, modelos e perguntas adequados para a compreensão do
fenômeno do metaverso.
A utilização do Second Life como exemplo prático – e local de realização das
entrevistas – cumpre um papel de suporte para a identificação de quais fatores, presentes na
literatura, foram observados em algum grau nas respostas das entrevistas, possibilitando o
desenho de um modelo preliminar objetivado para pesquisas futuras.
Neste mesmo objetivo, serão apresentadas linhas de pesquisa correlatas, que irão
explorar determinados aspectos observados nas entrevistas que, de alguma forma, pareceram
ser relevantes para a compreensão do comportamento nestes ambientes, objetivando
posterior desenvolvimento e teste empírico.
1.5 Relevância do estudo
A pesquisa é relevante porque existe uma carência2 de investigações acadêmicas sobre
o comportamento de indivíduos em ambientes de realidade virtual imersiva simulada, como a
plataforma Second Life e congêneres, embora a importância de tal mídia esteja crescendo,
tanto sob o aspecto econômico quanto social.
Já existem acadêmicos que defendem a Internet em 3D como parte crucial do futuro
(como exemplo, Castronova, 2007) da rede, em cenários que variam de 5 a 15 anos.
A maior parte da literatura sobre comportamento “digital” é relacionada a outras
mídias, como e-mail, grupos de discussão, chats, softwares proprietários e até blogs. Há uma
quantidade grande de material sobre jogos online (como MUDs e MMORPGs), mas ainda se
2 Todas estas alegações são mais bem explicitadas e exemplificadas na revisão de literatura.
24
tem pouca coisa escrita (academicamente) sobre estas novas redes sociais.
Para os gestores, principalmente os que lidam na área de Marketing (branding, canais
de distribuição, publicidade e tendências de comportamento do consumidor), Estratégia e
relações humanas, tal tema pode se revelar de grande interesse e relevância no médio e longo
prazo.
25
2. REVISÃO DE LITERATURA
2.1 Evolução e desenvolvimento das comunicações
Muito se aponta, em diversas retrospectivas históricas sobre tecnologia, o
desenvolvimento da máquina de tabulação de Hollerith como um marco dos mecanismos
industriais, precursores dos atuais computadores.
Embora tal ponto de vista possa ser considerado adequado é, no mínimo, um desleixo
histórico deixar de apontar algumas invenções e tecnologias que influenciaram o atual
cenário.
A revolução da prensa na Europa, com Johannes Gutenberg, alterou no médio e longo
prazo a forma como o conhecimento era difundido. Em uma época na qual todos os livros eram
escritos e copiados à mão, valiosos e, em geral, disponíveis apenas em monastérios e nas cortes
reais, o conhecimento era restrito a uma pequena elite intelectual. Ademais, como não havia o
que ler, a maior parte da população era analfabeta.
Briggs e Burke (2002) observam que o ensino da linguagem fora dos citados círculos, já
nos séculos XIV, era algo que tinha um caráter mais instrumental e funcional. Em Florença –
assim como em algumas outras cidades de característica mercantil – existiam escolas que
ensinavam escrita e aritmética para garotos que iriam se tornar contadores ou comerciantes
(op.cit., 39), além da presença de textos laicos ao lado de oficiais, como registros de
transferência de propriedades e de transações comerciais em geral.
Existe uma tentação no sentido de classificar a descoberta da prensa na Europa como
um marco cultural definitivo, como se antes desse feito as pessoas praticamente não se
comunicassem.
Tal posicionamento, contudo, não é correto.
Além da existência de um tecido social que privilegiava a comunicação oral (pois a
maior parte não conhecia a escrita) em locais como tavernas, banhos e praças públicas, as
representações por imagens também eram bastante comuns e enraizadas na cultura européia
(idem, ibidem).
Por outro lado, a própria invenção da prensa tipográfica não foi inédita para mundo; os
chineses (além de japoneses e coreanos) já conheciam tal técnica há mais de um milênio. Um
escrito budista, a Sutra Dharani, na Coréia, é considerado o primeiro texto impresso – ou ao
menos o mais antigo que ainda existe hoje – sendo datado como de aproximadamente 751 AD
26
(Amaral,A.E.M., 2002).
A importância da imprensa na Europa, contudo, é muito ligada à expansão do
protestantismo. Lutero, assim como Calvino e outros reformadores, viram na impressão uma
poderosa ferramenta de divulgação das novas idéias religiosas, utilizando-se fortemente de
impressos para contraporem-se à doutrina da Igreja Católica que, por sua vez, editou o Index,
relação de livros proibidos (Briggs & Burke, op.cit.; Burke, 2002).
O impacto da imprensa nas relações de poder na Europa foram imensos. Conforme
Bacelar (1999, 4):
“Estas inovações no acesso ao conhecimento científico e às estruturas do
pensamento humano que acompanharam o estabelecimento da imprensa na
Europa influenciaram igualmente as artes, a literatura, a filosofia e a política.
A inovação explosiva que caracterizou o Renascimento foi amplificada, e em
parte gerada, pela imprensa de caracteres móveis. A rígida estrutura social
que determinava o estatuto de cada um em função de seu nascimento e do
patrimônio familiar começou a diluir-se, com o surgimento e ascensão de
uma classe média intelectual.”
Os primeiros jornais que podem ser relacionados com o formato moderno de leitura
datam ainda do período romano (Rizzini apud Venancio, 2007), com as Acta Populi, órgão
informativo servindo ao Imperador Júlio César, em 69 a.C., já com as características de
periodicidade, atualidade e variedade, publicando desde notícias oficiais até intrigas do
Senado romano.
Com a prensa, contudo, os jornais passaram a ter um impulso, pois as técnicas de
impressão possibilitavam não só a manutenção da periodicidade quanto também um preço
relativamente acessível através do ganho de escala. Vários periódicos foram publicados,
incluindo o Notizie Scritte, considerado um dos primeiros, ainda em 1556, em Veneza.
A cultura é fortemente impactada com a difusão da informação escrita. Na esteira
histórica, o Iluminismo Francês é de grande importância.
Com a publicação do Discurso do Método, de Descartes, além de diversas outras obras
filosóficas do período, o pensamento ocidental passa por uma transformação crítica. Ao se
criar um conjunto de técnicas destinadas à replicação do conhecimento – que passam a ser
conhecidas como 'científicas' – a sociedade ocidental passa a utilizar métodos de provas e
27
contraprovas para analisar a 'veracidade' ou 'falsidade' de um argumento.
Através dessa mudança estrutural no pensamento ocidental, a técnica passa a ocupar
um papel crítico no desenvolvimento social, influenciando fortemente os acontecimentos
posteriores.
Em 1714, o primeiro modelo do que viria a ser a máquina de escrever é inventado pelo
inglês Henry Mill, enquanto um século após, em 1814, Joséph Niépce realiza a primeira
imagem fotográfica – no sentido moderno, pois a partir de 1560 já existem exemplares de
fotografias mais primitivas, tiradas com a Camera Obscura.
Briggs & Burke (op.cit.) identificam algumas novas tecnologias de comunicação que
abriram caminho para o transístor no século XX: ferrovias, navios, correio, telégrafo,
radiotelegrafia, cinema e televisão e o gramofone. Nesta parte inicial serão abordados, em
razão do corte histórico, alguns desses inventos, sendo os outros explicados adiante.
As ferrovias tiveram o papel de diminuir o tempo necessário para que uma informação
fosse transmitida. Além do papel de levar passageiros e cargas de modo mais eficiente entre
cidades e países, a redução no tempo de comunicação foi uma característica essencial das
mudanças trazidas pelas estradas de ferro.
Nos EUA, as ferrovias facilitaram a expansão para o Oeste, além de reduzir
drasticamente o custo de transporte das cargas. No imaginário popular, as ferrovias
representaram para os EUA a unificação de um país, ao abrir o caminho para a ocupação do
atual território daquele país. Em outros países a revolução trazida pelas ferrovias também foi
sentida, como na Índia e em várias nações da Europa.
A navegação já era um efetivo meio de transporte há séculos, servindo como um
importante fator geopolítico na História mundial. Muitos portos viraram cidades com uma
economia dinâmica e estes entrepostos comerciais eram ponto de confluência de diversas
culturas. Cidades como Alexandria e Cartago haviam feito riqueza com a navegação, enquanto
os portos italianos eram os pontos de entrada de produtos do Oriente na Europa.
James Watt consegue a patente do motor a vapor em 1769. A inclusão do motor a
vapor na navegação diminui o tempo necessário entre as travessias marítimas de maneira
drástica. Já no início do século XVIII, as travessias oceânicas eram realizadas em questão de
dias: em 1839, o navio britânico Sirius completou a travessia atlântica em 18 dias e 10 horas,
enquanto em 1843 o navio Great Britain fazia a mesma viagem em 14 dias e 21 horas (Briggs &
Burke, op.cit.).
O sistema de correios na Europa era dominado, até o século XVIII, por uma família, a
28
Tassis (de onde vem o nome táxi), que concentrava quase toda a comunicação por escrito entre
governos e instituições (Pérez, 2008). Com a introdução do selo e de sistemas mais rápidos de
comunicação, passaram a ter um volume cada vez maior de cartas particulares e cartõespostais.
Conforme Briggs & Burke (op.cit.) notam, o desenvolvimento dos novos meios de
transporte mais rápidos foi acompanhado pela necessidade de criação de mecanismos para a
segurança, tanto das ferrovias quanto da navegação, o que é o caso do telégrafo; não se trata,
portanto, de melhorias tecnológicas independentes, mas sim interdependentes.
Neste sentido, Stephens (1989) nota as alterações trazidas à cultura pelo avanço das
ferrovias e dos telégrafos, como a mudança na percepção da temporalidade. Confrontadas as
opções, alguns tipos de informação tinham uma necessidade de entrega mais imediata, pois o
seu próprio valor dependia dessa rapidez, como informações sobre os preços das mercadorias
nas bolsas (Field, 1992).
A radiotelegrafia é outro grande avanço, criando uma nova demanda não só de serviços
mas também de regulamentação governamental. Devido às limitações tecnológicas, não era
possível ter uma precisão nos comprimentos de onda utilizados pelas transmissões, o que levou
o governo a tratar os espectros como recursos escassos (o que virá a ter fundamental
importância, até hoje, na discussão sobre padrões livres de comunicação).
Conforme aponta Werbach (2007):
“Durante quase um século, o espectro de radiofreqüência foi tratado como
um recurso que o governo tem de distribuir por meio de concessões
exclusivas. A concessão do espectro nos trouxe o rádio, a televisão, os
telefones celulares e os serviços vitais de segurança pública. Durante esse
período, o modelo de concessão tornou-se um paradigma incontestável que
permeia a nossa forma de ver. Não se consegue nem imaginar algo
diferente.”
De qualquer forma, é com a necessidade de dimensionar a utilização das freqüências
no espectro aéreo que começa a atuação mais forte do governo, regulamentando o seu uso e
aplicação.
A radiofreqüência, utilizada a princípio para a transmissão de sinais telegráficos e,
posteriormente, para o envio e recepção de sons (rádio) e imagens (televisão), é responsável
29
pelo aumento do alcance das comunicações no final do século XIX e século XX, ao lado dos
cabos submarinos, ainda amplamente utilizados.
2.2 – Evolução e desenvolvimento da computação
2.2.1 – As máquinas de cálculo e suas linguagens
A idéia de uma máquina capaz de realizar grandes quantidades de cálculos não é do
início do século XX, mas propriamente do início do século XIX, sem contar outros
desenvolvimentos teóricos anteriores a este período.
Gere (2002) aponta a máquina projetada por Joseph-Marie Jacquard como um
exemplo primeiro da automação em uma fábrica, funcionando através de um sistema de
cartões de madeira perfurados, em um exemplo inicial de programação. Charles Babbage, que
viveu entre 1791 e 1871, planejou e tentou construir durante sua carreira máquinas para
facilitar a criação de tabelas matemáticas utilizadas em muitas fábricas.
Ada Lovelace, filha de Lord Byron, foi responsável por algumas das idéias mais
avançadas no que se relaciona à programação, principalmente ao defender que as tais
máquinas projetadas por Babbage poderiam ser úteis não só para o cálculo utilizando números
mas também símbolos ou mesmo letras alfabéticas.
As idéias de Ada Lovelace são de grande importância até hoje, pois anteciparam
determinadas características da tecnologia que somente foram desenvolvidas mais de um
século após sua morte. A colaboração estreita com Charles Babbage foi altamente profícua no
que se relaciona ao desenvolvimento dos precursores dos atuais computadores.
Toole (1996,4) afirma que Ada Lovelace possuía uma combinação de sensibilidade com
racionalidade matemática. Conforme sugere a autora:
“Parece que foi essa combinação que permitiu a Ada não somente ver o valor
dos projetos de Babbage mas também prever acertadamente alguns dos
potenciais e ramificações dessas idéias. Ada, como o seu pai, tinha a
habilidade de usar a imaginação e a metáfora para avaliar adequadamente
um conceito ou uma idéia. No caso, ela aplicou esse talento na descrição de
uma inovação tecnológica que ainda tem sentido nos dias de hoje.”
Gere (op.cit.) aponta o trabalho dos físicos Ludwig von Clausius e Ludwig Boltzmann
30
como relevantes para esta análise.
O primeiro desenvolveu o conceito de entropia, para descrever o que percebia como
uma tendência universal ao equilíbrio. Boltzmann, por sua vez, em uma palestra proferida em
1894, relacionou o conceito de entropia com a “falta de informação”, conceito que será
revisitado com o nascimento da cibernética e da teoria dos Sistemas de Informação.
Outro marco histórico foi a aplicação de métodos algébricos para a lógica, tarefa
empreendida por George Boole (com o que mais adiante viria a ser conhecido como Lógica
Booleana).
As seis proposições feitas pelo matemático em seu artigo (Boole, 1848), para ilustrar o
seu sistema, são as seguintes:
1 – A lógica gira em torno de relacionamento de classes e a forma com que a mente
percebe esses relacionamentos;
2 – Antes do nosso reconhecimento da existência de proposições, existem leis segundo
as quais a concepção de uma classe é sujeita; leis que são dependentes da constituição do
intelecto e que determinam a característica e a forma do processo de racionalização;
3 – Essas leis são passíveis de expressão matemática, constituindo portanto a base de
um cálculo interpretável;
4 – Essas leis são de tal forma que todas as equações são formadas sujeitas a elas,
mesmo quando expressas sob símbolos funcionais, admitindo solução perfeita, de modo que
todo problema na Lógica pode ser resolvido em referência a um teorema geral;
5 – As formas que as proposições são exibidas, de acordo com os princípios do cálculo,
são análogas às formas da linguagem filosófica;
6 – Ainda que os símbolos do cálculo não dependam da idéia de quantidade para sua
interpretação eles, contudo, na sua particular aplicação ao silogismo, nos conduzem a
condições quantitativas de inferência.
Boole, com isso, aproximando a linguagem da lógica filosófica à do cálculo, permitia
que, independentemente de valores ou significados, a linguagem em si fosse expressa da
forma matemática, quantificável e calculável.
Por volta de 1890 Herman Hollerith desenvolveu uma máquina capaz de processar
grandes quantidades de dados, na forma proposta por Charles Babbage: os dados de cada
indivíduo eram representados por um cartão perfurado, que depois eram passados pela
máquina de Hollerith. Os dados eram, então, processados e poderiam ser contados
31
mecanicamente (Gere, 2002: 37).
Ilustração 1: Máquina de tabulação - Herman Hollerith (1890)
Copyright – Universidade de Columbia
A máquina foi inventada, em suas finalidade original, para atender a demanda do
Censo dos EUA de processamento de grandes quantidades de dados em pouco tempo. Apenas
a título de comparação, o último censo (1880) havia requerido quase oito anos para o
tratamento e compilação dos dados.
Hollerith era funcionário do Censo. Após o sucesso de sua invenção ele criou a sua
própria firma, chamada Tabulating Machine Company, em 1896 (IBM, 2001), prestando
serviços para censos de outros países e também para companhias de seguros.
A Tabulating Machine Company, em 1911, funde-se com a International Time
Recording Company e a Computing Scale Company (IBM, op.cit.), para se tornar a ComputingTabulating-Recording Company (C-T-R). Essa companhia, mais tarde, virá a se chamar IBM.
O diferencial da máquina de Hollerith é o uso da eletricidade. O mecanismo de
contagem é baseado em um circuito que, a cada contato do pino energizado com o mercúrio
(somente possível nas marcações perfuradas) envia um sinal elétrico que aciona um contador
analógico.
Segundo as palavras de Hollerith (1889), tal método propiciaria uma melhoria
32
significativa em três fatores: custo, tempo e precisão.
De fato, o censo dos EUA de 1890 foi contabilizado em apenas dois anos e meio,
representando uma fração bem menor que o tempo gasto na contabilização anterior.
A máquina de tabulações representa um marco em sistemas por tecnologia da
informação, pois pela primeira vez se conseguia reunir e processar uma quantidade muito
grande de dados, algo que, embora fosse possível, demandava anteriormente um esforço de
trabalho e capital exageradamente grande.
A máquina de Hollerith adquire um caráter importante na retrospectiva histórica por
permitir, de forma sem precedentes, o tratamento de uma quantidade grande de dados com
alta rapidez e exatidão.
Essa “explosão” da capacidade de manipulação dos dados, gerando mais fácil e
rapidamente informações variadas de apoio à decisão foi basal para os inventos seguintes, que
buscaram explorar ao máximo esse caminho.
Gere (2002) aponta como inovações de alguma forma derivadas do Hollerith o
analisador diferencial de Vannevar Bush, construído no MIT em 1930, a máquina de cálculos
construída por Konrad Zuse, na Alemanha em 1938 – chamada Z1 – e o ABC, por John
Atanasoff e Claude Berry, nos EUA em 1939.
Duas obras são apontadas como importantes para a caracterização deste período: o
texto “A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica”, de Walter Benjamin
(1992[1936]), e um verbete na Encyclopédie Française escrito por H.G. Wells, chamada “a
idéia de uma enciclopédia global permanente”. O texto de Walter Benjamin será revisitado no
próximo capítulo, juntamente com a obra de Martin Heidegger acerca da tecnologia.
A Segunda Guerra Mundial vai ter um impacto muito forte no desenvolvimento de
novas tecnologias ligadas à nascente informática.
A criação de máquinas destinadas à inteligência de guerra (e, de igual modo, à contrainteligência) é uma característica marcante deste período. Os alemães possuíam o Enigma,
potente máquina de criptografia destinada ao envio de mensagens do comando alemão aos
diversos cantos da Europa ocupada pelo regime nazista. Para conter essa ameaça, vários
cientistas foram comissionados pelos governos para desenvolver, normalmente em locais
secretos, máquinas que pudessem ajudar no esforço de contra-inteligência.
Neste caminho surgem desenvolvimentos como o Colossus, localizado no agora famoso
Bletchley Park, criado com a ajuda do matemático Alan Turing, enquanto nos EUA o Harvard
Mark I era utilizado para cálculo balístico (Gere, op.cit.); neste mesmo período era criado o
33
ENIAC (Electronic Numerical Integrator and Computer), com a ajuda do matemático John von
Neumann – o mesmo que, posteriormente, publicará os fundamentos da Teoria dos Jogos
juntamente com Oskar Morgenstern.
Os avanços tecnológicos desta época deram propulsão para o posterior aprimoramento
dessas máquinas, que passaram a ser utilizados para tarefas comerciais.
2.2.2 Cibernética: uma visão preliminar
A cibernética, junto com a teoria dos sistemas, é a inspiração fundamental dos estudos
acerca da aceitação da tecnologia, conforme visto acima.
Segundo Galison (1994), o termo cibernética foi cunhado pelo pesquisador Norbert
Wiener em 1947, como uma nova ciência de mecanismos de controle, na qual a troca de
informações teria um papel fundamental.
A idéia subjacente ao conceito era a da possibilidade de que todos os sistemas de
controle e informação, fossem de animais ou de máquinas, biológicos ou tecnológicos,
pudessem ser descritos e compreendidos através da utilização dos mesmos conceitos e
linguagem (Apter, 1969). Conforme aponta Wisdom (1951, 5), a “hipótese básica da
cibernética é que o principal mecanismo de um sistema nervoso central é caracterizado por ser
de feedback negativo”. Mais ou menos parecido com um termostato, ou então o método da
tentativa e erro. De qualquer forma, a adaptabilidade é uma forma de resposta aos estímulos
do ambiente.
Percebe-se, de modo claro, o objetivo de vários pesquisadores da área da Cibernética
em equiparar processos mentais e sociais aos processos “engenheiros”. Conforme descrevem
Thomson e Sluckin (1953, p.134), “da mesma forma que na resolução de problemas, no
pensamento também há um feedback contínuo de informações relacionadas à sucessivas
tentativas e erros”.
Além dos processos, a essência do próprio significado de “indivíduo” poderiam ser
comparados, grosso modo, com outras classes, como máquinas e amebas, conforme propõem
Churchman e Ackoff (1951, 37):
“Voltemos nossa atenção agora para os indivíduos e seu comportamento.
Como nós queremos manter o esquema de modo geral, compreendemos
como 'indivíduo' qualquer coisa que o cientista considere como uma unidade
34
idêntica em um determinado período de tempo, seja uma máquina, uma
substância em um béquer, uma ameba, uma pessoa ou um grupo social.”
Obviamente algumas críticas surgiram aos métodos de estudo propostos pela
Cibernética. Negley (1951, 577) chama alguns posicionamentos de Wiener de ingênuos, ao
realizarem determinadas afirmações envoltas em ambigüidades: nesse ponto a “cibernética se
comporta não como uma mera teoria comportamental propositiva, mas sim como uma filosofia
transcendental”.
O conceito proposto por Galison (op.cit.) serve como uma primeira visão da cibernética
de primeira ordem, guardadas as diversas ressalvas quanto à sua aplicabilidade e capacidade
de generalização, conforme aponta Macrae (1951,p.149):
“Ainda que o programa comportamental possa ou não ser realizado, isso não
é importante para nós nessa análise mas, caso o possa ser, provavelmente
permanecerá verdade que formas alternativas de descrição e análise na
esfera da psicologia e sociologia continuarão a ser cientificamente
adequadas e heuristicamente mais convenientes.”
A própria idéia da cibernética vai ser, ao mesmo tempo, um reflexo das características
modernistas da cultura à época quanto uma influência bastante relevante para a definição de
novas idéias dentro da Administração.
A Administração Científica, já propugnada por Frederick Taylor, pode ser diretamente
relacionada com o aspecto moderno das propostas ligadas à teoria dos sistemas e cibernética.
Segundo Karsten (1994,47):
“o objetivo de Taylor era a maximização da produtividade, a despeito do
custo psicológico para o trabalhador. Como um engenheiro, ele considerava
o corpo uma máquina, que poderia ou não operar de modo eficiente. Taylor
objetivava eliminar o conflito entre o capital e o trabalho através do
pagamento com base estrita no trabalho feito – ou seja, por peças. De forma
a estimar as taxas de forma científica e, conseqüentemente, afastá-las de
qualquer conflito, ele e seus colegas foram pioneiros no uso de estudos de
tempo e movimento para determinar o ritmo das tarefas individuais nas
35
fábricas”.
A visão do corpo como uma máquina é bastante peculiar à Administração, não só
devido ao momento em que muitos estudiosos colocam como se fosse a “independência
científica” da Administração, mas por guiar praticamente todas as teorias e práticas ao longo
do século XX.
Segundo Maier (1970, 32):
“O que o Taylorismo oferecia – certamente dentro da fábrica e, em
caráter final, de acordo com o seu autor, em todas as esferas de governo e
vida social – era a eliminação da escassez e das restrições. Era implícita uma
revolução na natureza da autoridade: a utópica mudança do poder dos
homens para a administração das coisas”.
Esse novo ethos social se encarregava de espalhar, ainda que não propriamente de
modo perceptível, os princípios “engenheiros” na administração das empresas, em sua
burocracia e no seu modus operandi. As soluções buscadas pela Administração Científica eram,
segundo Martin (1995, 43), “técnicas e precisas”.
Para corroborar a tese que essa cultura era, de fato, pertencente ao conjunto de idéias
que a Academia associa ao chamado “modernismo”, Cooper e Burrell (1988) afirmam que,
independentemente da forma do modernismo (sistêmico ou crítico) adotada, algumas
características são comuns: a crença em um mundo lógico e que faça sentido, constituído pela
razão ou por alguma fundamentação universal. Conforme mostram os autores:
“A significância da corporação moderna está precisamente na invenção da
idéia de performance, especialmente quando voltada para a redução de
custos, e então na criação de uma realidade de acordo com esta idéia,
através do ordenamento das relações sociais de acordo com os modelos de
racionalidade funcional (Cooper e Burrell, 1988, 96).”
As regras que determinam as condutas em uma sociedade (e em um sistema) são
produto das condições objetivas que são retraduzidas na ordem cultural (Boltanski, 1971).
Seguindo esse ponto de vista, as condições colocadas na Administração Científica, de acordo
36
com os novos padrões modernos, vão ser replicadas, ainda que com outras roupagens, na
ordem social, na burocracia das empresas, atingindo toda uma forma de se pensar a
administração – além de seus mecanismos de replicação.
Tal cenário de aceitação das idéias científicas de gestão abriu caminho, ainda que
indiretamente, para o florescimento dos conceitos relacionados à teoria dos sistemas e
cibernética, já na década de 1950.
As duas grandes guerras e a crise da bolsa em 1929 representaram momentos de
choque para a História. Em um curto espaço de tempo, os arranjos locais de produção, ainda
muito ligados à artesania e manufatura, tiveram que se adaptar a tempos de escassez de
insumos básicos de produção, ou pela falta de acesso aos locais de extração ou pelo
direcionamento destes para os esforços de guerra.
Não é de se estranhar a rápida ascensão da administração científica, ainda que sob
diversas roupagens, nos EUA e, conseqüentemente, na Europa. A necessidade de se obter mais
produtos com menos insumos – ou seja, aumentar a produtividade de uma fábrica, por
exemplo – fez com que não só as técnicas tayloristas fossem tidas como revolucionárias mas
também possibilitaram a rápida difusão da linha de produção, com o que hoje se denomina o
fordismo.
O feedback, tão efusivamente utilizado no vocabulário de gestão nos dias de hoje, tem
sua origem na idéia de um sistema fechado, em que inputs e outputs seriam controláveis e
quantificáveis.
A compreensão dos fenômenos físicos – da natureza – foi o algo da busca dos
pesquisadores durante os últimos duzentos anos, de tal modo a que fosse possível a
identificação de padrões; conseqüentemente, tornar viável o estabelecimento de previsões
acerca de fenômenos previamente conhecidos. Conforme observa Horkheimer (1990, 90):
“ainda hoje a finalidade da ciência é o conhecimento de processos nos quais participa
necessariamente a dimensão do futuro”.
Após a máquina de Hollerith, Vannevar Bush desenvolveu uma máquina para cálculo de
equações diferenciais, ainda trabalhando no sistema decimal inteiro. Foi seu aluno de
doutorado, Claude Shannon, que trabalhou na sua máquina de equações diferenciais.
Shannon inseriu circuitos elétricos no analisador, trabalhando desta vez com a lógica
booleana. O avanço proporcionado pela junção dos sistemas elétricos com a lógica booleana
foi a possibilidade de representação de qualquer tipo de dado por zeros e uns – o modo lógico
binário.
37
A correspondência entre o sistema lógico formal aristotélico e a possibilidade de
aplicação em circuitos elétricos (Shannon, 1940, 11) foi mostrada em sua dissertação de
Mestrado apresentada no MIT.
Gere (op.cit.) ainda nota a importância dos trabalhos de John Atanasoff e Claude Berry,
que construíram um computador já trabalhando de forma digital e eletrônica. Howard Aiken
construiu em 1939 uma máquina de calcular, conhecida como Harvard-IBM Automatic
Sequence Controlled Calculator, que fica conhecida como Mark I ou ASCC.
Ilustração 2: ASCC
Imagem em domínio público (GNU)
A utilização da mesma tecnologia que, alguns anos depois, Shannon usara para
automatizar o analisador diferencial de Vannevar Bush, era proposta por Prampolini, no
contexto do futurismo italiano.
As idéias de modernidade, associadas ao aumento de produtividade e a uma
abordagem “engenheira” da sociedade, ganharam mais terreno na Europa. A sua inserção nas
artes se deu de modo abrupto, caracterizando-se numa ruptura com os padrões tradicionais de
pintura, cenografia, teatro, etc.
O moderno era associado ao viril, saudável, àquele que estava acima dos debates
meramente ideológicos e mais preocupado com o aumento da eficiência, ainda na utopia
industrialista do aumento das horas livres e melhoria da qualidade de vida através dos avanços
tecnológicos.
38
Por outro lado, o desenvolvimento da tecnologia de processamento neste início tem
foco, principalmente, na potencialidade de aumento da velocidade de cumprimento de uma
tarefa (ou mesmo da possibilidade prática). A máquina de Hollerith permitiu ao censo compilar
resultados com menor taxa de erro, em menos tempo com custo menor que o método habitual.
O analisador diferencial de Vannevar Bush permitiu um avanço nos cálculos, antes muito
complexos para seu desenvolvimento.
O objetivo era otimizar as atividades humanas, com a primazia da técnica. Nesse
caminho, o movimento futurista na Itália e a concepção de arquitetura de Le Corbusier, na
França, estão consonantes com esse novo imperativo.
2.2.3 O pós-Segunda Guerra Mundial
O período posterior à Segunda Guerra Mundial assiste a um desenvolvimento em
rápida escala dos meios de comunicação à distância – ou, como são hoje freqüentemente
chamados, telecomunicações.
Há uma grande influência do fator político, vez que a nova ordem global era
caracterizada pela dicotomia entre o poderio (tanto militar quanto ideológico) dos EUA e o da
antiga URSS.
A Guerra Fria, que vai desde a sustentação ideológica do Senador Joseph McCarthy da
existência de 'atividades comunistas' que eram 'anti-americanas' até a queda do Muro de
Berlim, em 1989, marca um período paradoxal. Por uma perspectiva, cada um dos lados
envolvidos na questão desejava mostrar ao mundo sua superioridade tecnológica, enquanto
tentava-se uma divisão física e comunicacional entre os dois blocos: a censura nas publicações,
o controle dos meios de comunicação, dentre outras características marcantes do período.
Se, por um lado, a disputa pela supremacia militar e tecnológica leva a um período de
quase histeria social, por outro se mostra altamente profícua em termos de desenvolvimentos,
tanto no campo bélico quanto nas telecomunicações. É interessante notar que muitos dos
avanços hoje utilizados vieram, originalmente, do campo militar.
A ARPA (Advanced Research Projects Agency) foi um dos órgãos criados pelo governo
dos EUA (na gestão de Eisenhower) como uma maneira de se fomentar a pesquisa, tendo como
causa imediata o lançamento e retorno bem sucedidos do satélite russo Sputnik, em 1958.
Essa agência (que posteriormente se chamará DARPA) é a responsável pelos primeiros
momentos da Internet.
39
O artigo de Vannevar Bush (1945), “As we may think”, é ponto de referência e
influência para vários dos cientistas que atuaram nos primeiros estágios da informática, como
Douglas Engelbart, Theodor Nelson e Alan Kay. O primeiro – Engelbart – desenvolveu
enquanto estava no Augumentation Research Center, em Stanford, o primeiro dispositivo de
localização gráfica em tela, que veio a ser o atual mouse.
A RAND Corporation3, empresa privada de pesquisa voltada para a defesa, foi o local
de primeira gestação da Teoria dos Jogos (em von Neumann e Morgenstern) e, juntamente
com o MIT e a UCLA, desenvolveram as idéias que possibilitaram a comunicação à distância
através de pacotes de informação.
Em 1962, na RAND, um cientista chamado Paul Baran publicou um artigo no qual
defendia uma rede de comunicação que fosse criada sem possuir uma estação central de
processamento, mas sim um perfil distributivo, que pudesse ser resistente até ao evento de
uma guerra nuclear.
Conforme nota Gere (op.cit.), a Internet não deriva diretamente da proposta de Baran
nem é reflexo necessário de uma preocupação com queda de comunicação devido a uma
guerra nuclear; contudo, tal idéia influencia os cientistas da ARPA, que desenvolvem, em 1969,
a primeira rede de computadores construída de forma distribuída – a ARPANet, que ligava a
UCLA, Stanford, a Universidade da Califórnia em Santa Bárbara e a Universidade de Utah.
A ARPANet, mesmo quando ampliada, ainda era uma conjunção de computadores em
universidades e centros de pesquisa, não existindo o computador pessoal. Alguns avanços
foram determinantes para a criação da base que permitiu o surgimento de novas tecnologias
de comunicação pessoal.
Conforme observa Land (1969), o desenvolvimento inicial das tecnologias de interface
gráfica teve como ponto de partida o sketchpad, resultado da tese de doutorado de Ivan
Sutherland.
Esse dispositivo era voltado para a manipulação de desenhos e formas geométricas
diretamente na tela do computador, sem a necessidade de introdução através de linguagem
de programação de códigos ou fontes complexas.
3 A RAND é muitas vezes tida como um dos principais “think tanks” da defesa dos EUA.
40
Ilustração 3: Sketchpad, de Ivan Sutherland
A interação com o usuário dava-se no nível da interface visual, o que era bastante
diferente do que vinha sendo praticado experimentalmente.
É o mesmo Sutherland que, a partir de 1966, juntamente com Bob Sproull, começa a
trabalhar no desenvolvimento de um HMD – Head Mounted Display, o que representava o
primeiro passo “em direção à utopia da mídia: um capacete com displays binoculares em que
as imagens em dois monitores, posicionados diretamente em frente aos olhos, forneceriam
uma perspectiva tridimensional” (Grau, 2007, 194).
Ilustração 4: Um dos
primeiros HMD, por Ivan
Sutherland (aprox. 1968)
Já em 1968 (idem, ibidem) Sutherland consegue desenvolver o primeiro HMD auxiliado
por computador, utilizando-se dos fundos financeiros providos pela ARPA.
Com a introdução do microprocessador, o custo de um computador (além do espaço
necessário para realizar sua instalação) teve uma queda considerável, sendo considerado um
momento crítico para o desenvolvimento inicial dos computadores pessoais.
41
Muitos kits eram vendidos, que consistiam principalmente de peças para que o próprio
usuário montasse sua máquina, voltados para entusiastas4. Um dos exemplos era o Mark-8, em
1974.
Um dos exemplos iniciais era o Xerox Alto, desenvolvido pelo PARC (Palo Alto Research
Center), que já utilizava uma espécie de mouse e interface gráfica (GUI: graphical user
interface). Em 1975, o MITS Altair consistia em um kit com microprocessador, e que é
considerado um dos primeiros sucessos comerciais em microcomputadores. Usando um
processador Intel 8080 (Mazor, 1995), foi uma das máquinas que inspirou Paul Allen e Bill
Gates a colocar o BASIC neste este equipamento. Na década de 1970, contudo, a maior
utilização destes computadores era em clubes de entusiastas, com aplicações voltadas para o
aprendizado de programação e para diversão.
O final desta década teve três computadores principais disputando a preferência do
consumidor: Apple II (da recém-fundada Apple, de Steve Jobs e Steve Wozniac), PET 2001 (da
Commodore International) e o TRS-80 (da Tandy).
O Apple II vinha com gráficos coloridos, um design diferenciado e possuía uma
arquitetura aberta. O Commodore PET 2001 tinha um monitor monocromático. O TRS-80
dispunha de um design mais tradicional. Estes três computadores foram os primeiros que
movimentaram o mercado de computadores pessoais, já em 1977.
Em 1979 surge o VisiCalc, precursor dos atuais pacotes de escritório, um dos
responsáveis pela popularização dos computadores pessoais; de fato, agora havia uma
utilidade prática para a máquina em uma rotina de trabalho, com um preço acessível e
interface mais amigácel. Em 1980, a IBM entra com força no mercado de computadores
pessoais com o IBM PC, lançado em 1981.
Em 1984 a Apple irá introduzir no mercado o Macintosh, enquanto em 1990 a
Microsoft lançara o sistema operacional Windows 3.0, incorporando várias características
introduzidas pela Apple, como a interface amigável com o usuário (Turkle, 1995).
2.3 A arte e a percepção acerca da tecnologia
Nesta seção será feita uma outra retrospectiva, coincidente com a vista anteriormente,
mas tratando da arte.
Objetiva-se apresentar um paralelo ao desenvolvimento tecnológico, mostrando como
4 Neste sentido, observar a descrição histórica de Turkle (1995).
42
a arte, reflexo da cultura humana (Gere, 2002), percebe os avanços ao longo dos anos,
oscilando entre visões pessimistas e otimistas sobre a tecnologia, “revoltas” contra os padrões
artísticos clássicos e um direcionamento progressivo para o aumento da participação do
indivíduo na própria obra de arte, conceito muito falado atualmente sob o manto da “web 2.0”,
ou a Web participativa.
Oliver Grau (2007), pesquisador da área de História da Arte e Mídias Digitais, realizou
extenso estudo sobre a evolução da arte virtual, tomando como ponto de partida os afrescos
romanos de 60 a.C.
O ponto central argumentativo de sua pesquisa é que a arte virtual, tal como é
conhecida atualmente, encontra suas raízes na vontade humana de atingir graus cada vez
maiores de imersão. Conforme sintetiza Saboia (2004):
“(...)
as
criações
artísticas
envolvendo
processos
imersivos
estão
profundamente relacionadas aos ambientes ilusionistas, que remontam a
tempos antigos e têm se modificado na medida em que há transformações na
criação de imagens, derivadas, dentre outras causas, das inovações das
mídias. Esta evolução passa pelas impressões e pinturas no interior das
cavernas, pelos diversos tipos de afrescos, espaços arquiteturais, pinturas de
rotundas, panoramas, fotografia, cinema, vídeo, computação gráfica,
animações, arte na Web, arte interativa, criações em telepresença e,
finalmente, arte genética.”
2.3.1 Tempo, espaço e sua manipulação
Rush (2006) identifica a importância da fotografia (bem como de desenvolvimentos
posteriores, como o cinema) para as artes no século XX. Há a centralização da temporalidade
da forma artística – tempo e memória; os seres humanos conseguem, segundo Rush (ibidem: 6):
“participar da manipulação do tempo em si: capturando-o, reconfigurando-o e
criando variações com intervalos de tempo, avanço rápido, câmera lenta, e todas
aquelas outras frases relacionadas ao tempo, próprias da arte e da ciência da
fotografia”.
43
As fotos de Eadweard Muybridge permitiram, de modo conceitual, que se efetivasse
essa quebra e manipulação do tempo e do espaço.
Em um de seus estudos do movimento animal ele utiliza uma série de câmeras
posicionadas em linha, ativadas com pouca diferença de tempo, de modo a dividir uma
seqüência de movimento como se fossem os atuais slides de um Power Point.
Nas palavras do próprio Muybridge, em um anúncio de seu zoopraxiscópio, uma das
finalidades desta técnica era “a demonstração sintética de movimentos analiticamente
fotografados da vida”.
A fragmentação do ato de se movimentar (Muybridge também fotografou atividades
como carregar uma sacola, fazer exercícios, dentre outras), quebrando-se a sua temporalidade
em diversas fases analisáveis, possibilita abordagens como as constantes no Taylorismo e no
Fordismo. Basicamente, um dos requisitos da pesquisa científica é a possibilidade de análise do
fato, o que a fotografia permite.
De fato, a análise dos movimentos humanos fotografados com a finalidade de obter
maior eficiência em processos é de responsabilidade inicial do casal Gilbreth. Frederick Taylor
utilizou os exemplos de Frank Gilbreth em seu mais famoso livro, datado de 1911 – Princípios
da Administração Científica.
A idéia de buscar a maior eficiência possível em processos foi desenvolvida pelo casal
Gilbreth, dentre outras maneiras, pela filmagem de determinada tarefa de um trabalhador sob
um fundo com linhas brancas e, posteriormente, analisando o tempo gasto em cada etapa.
Dessa forma eles poderiam comparar métodos e avaliar se eram mais ou menos eficientes,
determinando as melhores práticas (Price, 1992).
44
Ilustração 5: Eadweard Muybridge Movimento Animal - Homem [c.1885]
Ilustração 6: Frank Gilbreth - Seqüência
de fabricação [c.1914]
A semelhança metodológica não é coincidência. Em 1910 Frank Gilbreth conheceu
pessoalmente Eadweard Muybridge e ficou fascinado pela técnica, antevendo o potencial que
detinha para a análise dos movimentos dos operários, de modo mais seguro que a simples
observação humana, sujeita a muitos erros (Karsten, 1996, 51).
2.3.2 Da fotografia ao dinamismo nas artes visuais
O conceito embutido na técnica fotográfica de Muybridge foi utilizado por diversos
45
artistas, que aplicavam em seus estudos sobre o movimento humano e animal (Rush, 2006, 9).
Giacomo Balla pintou, em 1912, o quadro “Dinamismo de um cão em uma coleira”, que
se utiliza de linhas diagonais para criar a impressão de movimento, enquanto “Dinamismo de
um ciclista”, pintado por Umberto Boccioni em 1913, oferece uma impressão de movimento
mais dramática.
Ilustração 7: Umberto Boccioni - Dinamismo de um
ciclista (1913)
Ilustração 8: Giacomo Balla - Dinamismo de um cão em
uma coleira (1912)
A idéia presente em ambas as obras, em semelhança às fotografias de Muybridge, é a
de mostrar, em uma tela, meio tradicionalmente estático, a idéia de movimento.
A idéia de movimento, de dinamismo, está presente no Manifesto do Cinema Futurista,
46
de Tomaso Marinetti: “cinema como o mais dinâmico de todos os meios de expressão humana,
por sua capacidade de compor formas tradicionais de arte e mídia” (Grau, op.cit.: 169).
Ilustração 9: Marinetti - Vive la France (1914/1915)
Copyright - ARS
Idéias como a valorização do movimento, a crítica à arte estática e aos trabalhos
artísticos identificados com o passado, aos museus, dentre outras, estão contidas em seu
Manifesto:
“Você, então, desejará gastar todas as suas energias nesta adoração eterna
e inútil do passado, da qual você emerge cansado, destruído, exausto?” (Marinetti,
1909)
Há a identificação na literatura atual sobre as características de gênero contidas no
Manifesto de Marinetti. Conforme Blum (1990:198):
“O Manifesto sustenta-se na estratégia retórica que traz o gênero em suas
correlações com fatores políticos e estéticos, uma estratégia em que a
feminilidade é vista como uma marca de impotência, doença e fragmentação,
características que estão em contradição aos princípios futuristas.”
47
Maier (1970), em artigo que relaciona as visões sobre a produtividade industrial na
Europa da década de 1920, expõe que os conceitos tayloristas não apenas propõem uma
melhora na produtividade das fábricas mas também uma alteração na função do engenheiro,
que era visto como “o manipulador de todos os relacionamentos industriais” ( op.cit.,28). A sua
posição de conhecedor técnico o colocava, segundo se pensava, acima dos interesses
ideológicos ou partidários:
“A engenharia sugeria uma auto-imagem de arbitragem técnica imparcial,
dedicação aos padrões científicos e objetividade, acima de quaisquer interesses
[pessoais] dentro da fábrica”. (Maier, op.cit.:30)
A melhor organização das fábricas poderia levar a uma melhor organização social, com
o governo atuando agora não mais sob bases ideológicas, mas científicas. Dentro desse
ambiente, o Manifesto Futurista representa a união radical da tecnologia com a
irracionalidade. A máquina, para os futuristas, é fonte de “erotismo, violência e morte”5.
Ilustração 10: Prampolini Composizione (sem data)
Nesse contexto futurista, Enrico Prampolini defendia no campo da cenografia, segundo
Grau (op.cit., 169), a “remoção imediata e radical de todas as cenas estáticas pintadas e suas
substituição por uma arquitetura cênica eletromecânica e dinâmica de elementos plásticos
luminosos em movimento”. Trata-se de uma tentativa de reduzir (ou mesmo remover) a
fronteira entre o observador e o espaço imagético.
5 Maier (1970:36) também indica que o arquiteto francês Le Corbusier citava as obras de Taylor e Ford em
seus tratados, em defesa da idéia de elevar o nível dos “decadentes arquitetos franceses” aos “saudáveis e
viris, ativos, úteis e felizes engenheiros”.
48
2.3.3 Percepção acerca da tecnologia no período entre guerras
O movimento surrealista, que surge em meados da década de 1920, preconizava a
liberação das exigências estritas da lógica e da razão, incentivando a expressão através dos
sonhos, possibilitando uma rejeição da razão e de valores burgueses como a religião, a pátria,
dentre outros, o que pode ser percebido através de obras como o Manifesto Surrealista de
Breton.
As perguntas introduzidas na arte através de Marcel Duchamp levaram a uma
reconceituação, uma mudança da ênfase do objeto para o conceito (Rush, 2006).
49
Alguns artistas também têm obras notáveis neste período, como Salvador Dali, com
obras como “El gran masturbador”, de 1929. Em 1921, o escritor russo Zamyatin escreve a obra
“Nós”, de inclinação distópica, em que a população é confinada da natureza e todas as
atividades humanas são coordenadas por equações matemáticas. O tema da eficiência é
central ao planejamento do “Estado”, e as atividades são controladas por este paradigma; as
pessoas são conhecidas não por nomes, mas por números.
2.3.4 Metropolis, de Fritz Lang (1927, Alemanha)
Ilustração 11: Metropolis (1927) - Cena Maschinenmensch e Rotwang
O filme “Metropolis”, do diretor alemão Fritz Lang, é considerado por muitos
pesquisadores de cinema como o primeiro grande filme de ficção científica (Viagem à Lua, de
50
Méliès, é considerado o primeiro cronologicamente).
A narrativa se passa em uma cidade dividida em dois grandes espaços: a superfície,
onde mora a classe dominante, e o subterrâneo, no qual residem os operários, que são
responsáveis pelo funcionamento de Metropolis, uma cidade-estado dominada por uma
corporação e administrada por Joh Frederson, no ano de 2026.
Maria é uma mulher que conforta os operários, evitando uma revolução, clamando que
um dia chegará o “Mediador”, que será o “coração entre a cabeça e as mãos”, em uma alusão a
Frederson e os operários, respectivamente.
Seguindo Maria, Freder – o filho de Joh Frederson – desce ao subterrâneo,
experimentando a vida como operário, situação na qual fica chocado com as condições de vida
dos operários, eventualmente simpatizando-se com eles.
Rotwang, cientista de Metropolis, construíra um robô de forma feminina
(Maschinenmensch). Frederson tem a idéia de utilizar o robô para tomar a forma de Maria e
incitar a discórdia entre os operários.
O cientista, então, captura Maria e dá ao robô a sua forma. Após uma apresentação na
boate de Yoshiwara para os aristocratas de Metropolis, o robô incita uma rebelião dos
operários, que invadem e destroem a estação de força da cidade, inundando o subterrâneo.
Há um desenvolvimento posterior da narrativa, que não será dito aqui para que o
suspense do filme não seja atrapalhado.
Huyssen (1982) identifica em Metropolis duas visões acerca da tecnologia moderna,
que se encontram misturadas no enredo. A primeira percebe a tecnologia em seu potencial
destrutivo e opressor (visão expressionista), enquanto a segunda apresenta um cenário de
confiança no progresso tecnológico da engenharia social (culto à tecnologia).
A Primeira Guerra Mundial exerceu um impacto forte sobre a percepção cultural e
artística sobre a tecnologia e seus potenciais, caracterizando-se como o “o primeiro conflito
totalmente mecanizado na História da Europa” (Biro, 1994, 71).
Kaempffert (1941), em sua análise da relação entre as guerras e o desenvolvimento
tecnológico, nota que embora os conflitos armados tenham a capacidade de destruir
civilizações, os maiores avanços tecnológicos ocorreram em momentos de grande instabilidade
e guerras.
O pesadelo de Freder, que aparece logo no início de Metropolis, representa a máquina
como a divindade Moloch6, que demanda o sacrifício de vidas humanas. Tal metáfora é
6 Outra utilização do termo Moloch pode ser encontrada em obras alemãs datadas de alguns anos após a
Primeira Guerra Mundial, como na peça Masse-Mensch, de Ernest Toller: 'Ist Moloch:/Gott war
51
extremamente representativa na visão expressionista contida no filme, pois ressalta o potencial
destrutivo da tecnologia – na mesma cena, em que há um acidente na usina, os trabalhadores
são substituídos antes mesmo de ser prestado o socorro aos que se machucaram.
Por outro lado, Huyssen (op.cit.) também identifica traços do movimento artístico
conhecido como Neue Sachlichkeit7 (ou Nova Objetividade) na estética do filme. Embora
existam críticas em relação à aplicação do termo “objetividade” como tradução para o
movimento (por exemplo, Schmalenbach, 1940, 163-164), o movimento reflete não
necessariamente uma oposição ao expressionismo, mas sim uma forma diferente de concepção
da arte.
Ilustração 12: Rudolf Schlichter - The rooftop studio (1922)
Metropolis apresenta, portanto, traços fortes de ambos os movimentos.
Matthew Biro (1994, 85) diz que Metropolis é fascinante “devido à maneira que as
representações do trabalho tecnológico, da visão mecanizada e da cyborg mulher também
servem para enfraquecer as suas tendências autoritárias”.
O ponto alto do filme para a presente análise é a forma que a relação homem-máquina
é retratada: conforme visto anteriormente, é um modo ambíguo que, contudo, não se mostra
paradoxal, quando se contextualiza o filme historicamente.
Moloch,/Staat war Moloch,/Masse war Moloch' (é Moloch: Deus era Moloch, o Estado era Moloch, as
Massas eram Moloch). A temática é relacionada à resistência da classe trabalhadora em relação às condições
de trabalho. Em sentido semelhante segue a peça Gas, de Georg Kaiser (Whitney, 1923).
7 Fritz Schmalenbach (1940) aponta a origem do termo Neue Sachlichkeit para o ano de 1923, pelo curador G.
Hartlaub, como título para uma exibição de pinturas e outras manifestações das artes plásticas de
características objetivas e pós-expressionistas, na galeria de arte de Mannheim, na Alemanha.
52
É interessante notar que não só as máquinas, mas também o tempo que é designado em
Metropolis como o opressor dos trabalhadores; o conceito de tempo, inclusive, faz parte da
significação de “mecânico” (Williams, 1974).
O tempo também é elemento constituinte dos estudos de movimento efetuados por
Gilbreth, servindo como um parâmetro referencial para a análise da eficiência dos
trabalhadores.
A crítica realizada pelo filme é perceptível no início, em que os turnos dos funcionários
são medidos por um relógio diferente, com dez horas no lugar de doze. O controle é realizado
por Frederson de seu escritório, em um mecanismo parecido com televisões e câmeras com
foco nas plantas de produção.
O dispositivo panóptico8 é, contudo, retratado como ineficaz em duas situações: na
primeira, quando Frederson é levado por Rotwang às catacumbas, lugar que não é atingido
pelas câmeras e, conseqüentemente, pelo controle mecânico – lugar, inclusive, desconhecido
de Frederson.
A segunda situação é retratada ao final, quando os mecanismos de controle são
mostrados como inúteis para conter a força das massas (Biro, 1994, 95).
Metropolis é importante enquanto uma das primeiras manifestações cinematográficas
acerca dos dilemas tecnológicos, embebida nos ideais do expressionismo alemão. A visão de
uma tecnologia que, ao mesmo tempo, permite que algumas pessoas vivam em um ambiente
idílico, enquanto obriga outras a participar de sua infra-estrutura de manutenção – explícito
através da relação homem-máquina na usina de energia.
É um paradoxo: uma cidade dividida entre classes, uma na superfície e outra no
subterrâneo, tudo isso permeado pela tecnologia. Como obra cinematográfica, o filme
Metropolis é uma obra-prima, sendo considerado “a primeira proposta profética da sétima
arte”(Macedo, 2005).
8 O “panopticon” foi descrito por Jeremy Bentham como uma forma de arquitetura que permitia a vigilância de
todos os presos por apenas uma torre central. A idéia é melhorar a eficiência da operação, bem como atestar
uma relação de poder, na qual o vigilante tem total controle sobre as rotinas e atos do vigiado. Nesse sentido,
a obra de Michel Foucault é extremamente elucidativa. O tema do panopticon será revisitado na análise do
livro “1984”, de George Orwell.
53
2.3.5 Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley (1932)
Aldous Huxley, que é pertencente a uma família com muitos outros talentos, escreveu
esta obra ainda em 1932, e até hoje é tida como uma das referências da literatura mundial.
A história se passa num futuro em que os anos não são mais contados como depois de
Cristo, mas sim depois de Ford. Há um governo mundial, um Estado totalitário chamado
“World State”, organizado através dos princípios da “comunidade, identidade e estabilidade”.
O modelo ideal de organização humana baseava-se na reprodução humana em
laboratórios, classificação dos indivíduos em castas, inexistência de liberdade, felicidade
através de sedativos (drogas) e o consumo sem limite.
A organização da sociedade era voltada para a estabilidade; todos os fatores
emocionais potencialmente subversivos foram eliminados (Lopes, 2008), como a História, a
Literatura, a Arte.
O romance conta a história de um grupo social que pregava a primazia da técnica,
como mecanismo de organização da sociedade. A tecnologia era vista como um triunfo, mas
ao mesmo tempo o seu domínio era restrito, já que possuía os mesmos risco de subversão que
outros campos, como a arte.
O principal atributo desta obra de Huxley que interessa a esta análise é o fato de ter
sido uma das primeiras obras a traçar um futuro no qual a tecnologia tem um papel de
repressão das pessoas, supressão da individualidade e manutenção do status quo.
54
2.3.6 Tempos Modernos, de Charles Chaplin (1936 – Estados Unidos)
Tempos modernos é considerada uma das obras-primas do ator e diretor Charles
Chaplin, de origem britânica e radicado nos EUA.
A narrativa é razoavelmente simples, tratando-se de uma pessoa, afetada pela
Depressão de 1929, que procura emprego. Acaba encontrando uma posição quase-escrava em
uma fábrica.
Envolvendo uma trama amorosa, o filme se revela altamente crítico da sociedade da
época, notadamente dos meios de produção e da procura pela eficiência a qualquer custo.
Logo no início do filme, Chaplin sobrepõe a chegada de trabalhadores pelo Metrô à
cena de uma manada de ovelhas sendo conduzida. Tem-se a primeira imagem de um relógio,
na mesma idéia emblemática de controle que também possuía em Metropolis.
A repetição do trabalho é tema central na crítica de Chaplin. As tarefas são mostradas
como enfadonhas e extremamente repetitivas, sempre sob o olhar de controle de algum
capataz.
Pelo lado do controle, há o modelo de uma televisão com dispositivo de captura de
imagem (de modo muito semelhante às webcams instaladas em computadores), aparato que à
época ainda era meramente uma idéia, um conceito. A própria televisão vai encontrar
desenvolvimento inicial no meio da década de 1930.
O conceito panopticista também encontra referência em Metropolis, em que Frederson
controla os movimentos de seus empregados através de telas e câmeras espalhadas pelas
fábricas.
Há uma passagem emblemática, quando uma empresa tenta vender para a Companhia
55
em que Chaplin trabalhava uma máquina de alimentação automática. As expressões utilizadas
pelos vendedores mostram a idéia industrial de prevalência da máquina sobre o indivíduo: o
trabalhador “não irá parar para o almoço”, “a produção irá aumentar” e “esteja à frente de seus
competidores”, sem referências à saúde ou mesmo bem-estar do funcionário.
O filme de Chaplin mostra, portanto, uma visão profundamente crítica, ainda que bem
humorada, da tecnologia e da sua aplicação para o controle, tema que será explorado por
outros como, por exemplo, Michel Foucault.
2.3.7 Mil novecentos e oitenta e quatro – 1984, de George Orwell (Inglaterra, 1949)
Outra obra bastante citada, teve uma versão cinematográfica rodada no ano de 1984,
em Londres, cenário prospectivo de George Orwell para a trama, com perspectivas de outra
versão para o cinema ainda em 2010.
A obra retrata a visão de Orwell (ou Sir Arthur Blair) sobre o desenrolar dos governos
autoritários que, fatalmente, cairiam em um círculo de dominância absoluta sobre o cidadão e
a sociedade como um todo, transformando-se em institutos totalitários.
A importância do livro é seminal. Ahituv (2001, 48) observa:
“Tente imaginar nossa vida sem segredos. George Orwell previu algo
semelhante em seu clássico de ficção científica, 1984, mas o século XXI
oferece algumas poderosas ferramentas as quais Orwell sequer poderia
imaginar: o computador moderno e a conectividade via Internet.”
56
Em ensaio precedente ao 1984, Orwell (1945, 3) já apresentava sua opinião acerca do
tratamento dispensado pelos governos aos seus cidadãos:
“Por 'nacionalismo' eu entendo, em primeiro lugar, o hábito de assumir que
os seres humanos podem ser classificados como insetos e que blocos de
milhões ou dezenas de milhões de pessoas podem ser marcadas como 'boas'
ou 'más'. Mas, em segundo lugar e muito mais importante, eu entendo o
nacionalismo como o hábito de identificar alguém com uma nação ou outra
unidade, colocando-a além do bem e do mal e reconhecendo nenhum outro
interesse que não o dessa nação.”
Conforme nota Posner (1999,18):
“1984 está correto em sugerir que as condições de uma sociedade totalitária,
em particular a supressão da liberdade de pensamento, questionamento e
comunicação, são inímicas ao progresso científico e tecnológico.”
Orwell previu a criação de tecnologias, as quais se caracterizam por serem altamente
intrusivas, embora não tivesse previsto que tais avanços poderiam ser criados fora do jugo de
um sistema totalitário (Clarke, 1988, 508).
A figura do Grande Irmão (Big Brother), sempre presente na vida de cada indivíduo,
representa o máximo da participação do Estado. Através de um aparelho conhecido como
teletela, os indivíduos são constantemente bombardeados com a informação oficial, onde quer
que se localizem; ademais, o aparelho não pode ser desligado, apenas ter o seu volume
reduzido.
Estes dispositivos consistem em uma forma de comunicação bidirecional. Localizados
em todas as casas, bares, fábricas, florestas, ruas – enfim, em todos os lugares, as teletelas
poderiam ser usadas para a transmissão de uma mensagem oficial (modo broadcast) ou para a
vigilância individual, conforme acontece no filme, servindo como um modo de o governo
manter um constante vigilância tudo e todos; ou melhor, com o potencial de vigilância (Green
Jr., 1984).
A mídia também era completamente controlada pelo Estado. Uma das funções da
57
personagem principal era exatamente “corrigir” os jornais antigos, para que todas as notícias
fossem exatamente como o partido desejasse.
O livro é tido como uma das principais obras do gênero distópico, ou seja, ao contrário
de uma utopia, a realidade projetada pela obra é ruim, aprisionadora, degradante, muito ao
inverso de previsões otimistas acerca da evolução da tecnologia. Em 1984, a tecnologia existe
enquanto mecanismo de auxílio ao controle exercido pelo Estado totalitário sobre os seus
cidadãos.
2.3.8 Anotações complementares sobre o cinema
Há, no período anterior à Segunda Guerra Mundial, um cenário bastante diverso de
experimentações com novas mídias que eram ainda recentes. O cinema, por exemplo, reflete
bastante a efervescência cultural que agitava a Europa.
Desenvolvido já no final do século XIX, representando uma continuação conceitual da
quebra da temporalidade (em sentido semelhante ao da fotografia), o cinema afirmou-se não
somente como uma nova mídia mas também como o palco de manifestações artísticas.
Segundo Grau (op.cit., 180), o “filme afetou um público cuja percepção estava
despreparada para processar movimento e imagens simuladas”. Para uma audiência
acostumada a não ver movimento em representações imagéticas, a introdução do mecanismo
dinâmico na experiência perceptual representou algo muito diferente e inovador.
O cinema, cuja tecnologia é criada inicialmente nos laboratórios de Edison, tem seu
primeiro expoente artístico em George Méliès, que utiliza várias técnicas de fotografia em seus
filmes (Rush, 2006). Destaca-se a obra “Viagem à Lua”, de 1902, considerado o primeiro filme
de ficção científica produzido, com a cena emblemática do pouso da nave na Lua. A obra foi
inspirada nos trabalhos de Jules Verne e H.G. Wells.
58
Ilustração 13: George Méliès
- Viagem à Lua (1902)
Enquanto isso, Thomas Edison produz filmes nos EUA, como o “The Great Train
Robbery”, de 1903. Griffith produz, em 1915, o polêmico “The Birth of a Nation”. Na Rússia,
Sergei Eisenstein dirige o clássico “Encouraçado Potemkin” em 1925.
A Europa, principalmente no período anterior à Primeira Guerra Mundial, observa um
desenvolvimento grande do cinema (Bottomore, 1999), cedendo lugar para Hollywood
posteriormente, que vai ser firmar como o principal pólo produtor de entretenimento
cinematográfico do mundo, gerando uma verdadeira indústria em torno do filme.
2.3.9 Cibernética: entre tecnologia e a arte
A cibernética se afirma com força após o fim da Segunda Guerra Mundial, conforme
relaciona Gere (op.cit.). A partir de uma lógica de militarização constante, com crescente
armamento que pudesse intimidar as superpotências (EUA e URSS), a situação era de
equilíbrio; porém, tal equilíbrio se afigurava delicado e sujeito a situações de desbalanço,
como na crise dos mísseis cubanos.
A Guerra Fria fez aumentar desproporcionalmente o valor dos gastos militares, não
somente na compra do armamento como também em pesquisa e desenvolvimento.
A cibernética, como ficou conhecido este campo de estudos, tem a sua idéia central no
desenvolvimento de sistemas formais e abstratos, do mesmo modo que a Teoria da Informação,
Teoria Geral dos Sistemas, Inteligência Artificial e Estruturalismo, como nota Gere (op.cit.).
Claude Shannon teve o mérito de separar o processo de entrega da mensagem do seu
conteúdo propriamente dito. A partir de sua dissertação de Mestrado no MIT (Shannon, 1940)
ele passa a desenvolver um outro conceito de comunicação, formalizado através de um
59
esquema linear: a fonte da mensagem, o mecanismo de codificação, o canal de transmissão, o
mecanismo de decodificação e o destino final.
Neste aspecto, a separação entre o conteúdo e a mensagem em si torna possível, ao
menos em teoria, o desenvolvimento de mecanismos mais eficientes (com menor nível de
ruído) para a transmissão da mesma, independentemente de seu significado.
Conforme nota Castro (2005, 13):
“através da cibernética e da teoria da informação pensou-se
encontrar a fórmula de materialização de algo denominado “conhecimento”
que pode enfim ser transmitido como informação entre pessoas e máquinas,
indiscriminadamente.”
O termo “cibernética” foi cunhado, em seu sentido moderno, por Norbert Wiener. A
origem é do grego, e tem o significado de “controle de governo”.
Vannevar Bush (1945), no mesmo sentido, populariza esta idéia em um artigo – hoje
clássico – publicado nos EUA. Sua visão antecede muitos dos avanços que atualmente
percebemos, como o próprio conceito da World Wide Web9.
A idéia cibernética segue, em muitas matizes, o que já fora preconizado pela cultura e
pela arte do período anterior à Segunda Guerra Mundial. Em filmes como Metropolis 10 e
Tempos Modernos, a temática perpassa um cenário de relacionamento estreito entre as
máquinas e os seres humanos.
Nesta cultura emergente, em que a idéia de um sistema de informação surge como
uma nova forma de se otimizar os processos humanos, há embutida nela um sentimento de
pertencimento do ser humano a uma rede mais complexa, que pode ser, na forma que
Shannon e Wiener, ainda que indiretamente, propuseram, uma intrincada relação homemmáquina, em que os processos podem ser formalizados e colocados em um plano mais
abstrato.
Tais características não são divergentes da ciência cartesiana, embora neste estágio a
aplicação tenha perpassado o campo das ciências da “natureza” (como física, química, etc.) e
penetrado na esfera dos estudos sociais. Conforme nota Horkheimer (1990, 91):
9 Uma destas visões, pouco relembrada atualmente, é o MeMex.
10 Em Metropolis a discussão é bem mais profunda e controversa, mas é possível delimitar esse relacionamento
não só como estreito como paradoxal.
60
“(...) as leis não são a meta da atividade científica, são meros meios
auxiliares; o importante no final é passar das fórmulas legais abstratas para os
julgamentos existenciais concretos, e estes, em todo o domínio das ciências
naturais, não incluem apenas passado ou presente, mas sempre também o
futuro.”
E este fenômeno de mistura entre o humano e a máquina é intensificado
principalmente a partir deste período.
Oliver Grau (2007, 193) aponta como decisiva para a interface homem-máquina a tese
de doutorado de Ivan Sutherland, orientada por Claude Shannon, sobre o Sketchpad,
programa de desenho (precursor dos atuais sistemas CAD) em que o usuário utilizava um
dispositivo parecido com uma caneta para 'desenhar' diretamente sobre a tela.
Através de alguns comandos era possível trabalhar atributos como o tamanho,
proporções, pontilhados, retas, curvas, dentre vários outros.
O Sketchpad foi um marco na área de computação gráfica, principalmente porque,
embora já existissem programas que realizassem gráficos via computadores, o acesso a estes
era geralmente mais restrito. Vale lembrar que nessa época os computadores eram muito caros
e disponíveis apenas em Universidades ou centros de pesquisa de grandes empresas, como
IBM.
Além disso, o programa de Sutherland permitia ao usuário desenhar diretamente na
tela, usando para isso a memória do computador, sem precisar de codificar fórmulas em
cartões perfurados ou outros mecanismos similares. Conforme nota Dietrich (1986), as
primeiras exposições de “arte de computador” foram realizadas não por artistas, mas por
cientistas. A junção entre esses dois “mundos” vem apenas no final da década de 60, com três
exposições: Cybernetic Serendipity (Londres, 1968), Some more beginnings (Nova Iorque,
1968) e Software (Nova Iorque, 1970).
Em um artigo bastante incisivo11, o compositor alemão Karlheinz Stockhausen (1971)
aponta as origens da música eletrônica exatamente para a década de 1950, em sua obra
Estudo Eletrônico I, de 1953, que foi a primeira a utilizar sons inteiramente sintéticos derivados
de tons senóides.
Há uma ligação clara com o movimento cibernético.
11 O artigo em si é uma resposta a carta de um leitor americano. Stockhausen acusa, dentre outros assuntos, os
americanos de serem muito limitados musicalmente e de desconhecerem a origem dos novos movimentos
artísticos na música (nesse caso, da própria música concreta, de Varèse, e da música eletrônica).
61
Stockhausen (idem, ibidem) aponta como influência direta as leituras e seminários de
Meyer-Eppler, que eram pesquisas na área de comunicação, já englobando estatística,
operações aleatórias e teoria da informação).
Na mesma forma que os artistas pioneiros do computador, há o interesse em explorar
novas possibilidades estéticas. Stockhausen fora muito próximo a Edgard Varèse, expoente da
musique concrète, além do compositor Olivier Messiaen. Um de seus objetivos nessa
experimentação sonora era a procura de sons absolutamente puros, controláveis, sem a
influência subjetiva e emocional dos intérpretes.
Respondendo se concordava com Webern12, que dizia que as diferenças entre as artes e
a ciência seriam eventualmente dispersas pela evolução dos processos de pensamento,
Stockhausen afirmou:
“[de maneira constante] eu aprendi coisas através da tecnologia, da ciência,
do meu trabalho no estúdio de música eletrônica, desenhando eu mesmo os
circuitos para os equipamentos e trabalhando com cientistas e técnicos no
campo da acústica e da eletrônica.”
(Felder e Stockhausen, 1977, 94)
A experimentação da música eletrônica, muito antes da década de 1950, quando entra
a cibernética, já era realizada em outras partes por várias pessoas.
Thaddeus Cahill criara uma máquina chamada Telharmonium, que fora demonstrada
em 1906. Funcionava utilizando dínamos e corrente alternada e a música produzida era
transmitida através das linhas telefônicas.
Da mesma forma, Léon Theremin criara um instrumento eletrônico que funcionava com
osciladores e antenas, gerando sons de diferentes tons e intensidades de acordo com a
proximidade das mãos do músico.
12 Anton Webern (1883-1945), compositor austríaco, estudou com Arnold Schoenberg, e compôs músicas de
características conhecidas como “seriais”.
62
Ilustração 14: Leon Theremin
Portanto, a utilização de mecanismos eletrônicos na música, embora fosse algo
potencializado após a década de 1950 com o avanço nos computadores, já era conhecida,
ainda que em caráter experimental.
As músicas escritas pelo compositor Edgard Varèse, por exemplo, são formas já de
experimentação musical, em formas diversas das tradicionais. Aurelio de la Vega (1965)
enumera seis etapas de evolução:
1. musique concrète pura, caracterizada por sons oriundos de fontes puramente acústicas;
2. música eletrônica pura, originada em estúdios ou centros de pesquisa universitários;
3. combinações da musique concrète com música eletrônica, muitas vezes com elementos
vocais humanos transformados eletronicamente;
4. música utilizando procedimentos elaborados de programação computacional;
5. música para concertos, utilizando gravações e efeitos especiais;
6. uso misturado de elementos eletrônicos, instrumentos ou mesmo a voz humana.
Não é o objetivo desta pesquisa entrar de modo mais profundo na caracterização de
cada estilo, mas é importante notar que há uma penetração dos sons eletrônicos nas
experimentações musicais, já antes dos computadores das décadas de 1950 e 1960.
63
2.4 Novas mídias e tecnologias na arte
A introdução de novas tecnologias, como a fotografia, o cinema e a televisão – apenas
para citar algumas mais antigas – teve um alto impacto na percepção das pessoas acerca dos
meios de comunicação, gerando reflexos nos movimentos artísticos contemporâneos.
Houve uma mudança gradual da tradicional posição do admirador da arte enquanto
sujeito passivo da obra, a ele sendo imputadas significações e interpretações de outros acerca
do que estava vendo; passa-se a procurar a inserção do sujeito e, em algumas formas, a criação
coletiva da obra, conceito que atualmente retorna à mesa de discussões na prática gerencial.
Um dos primeiros nomes deste movimento é o de Robert Rauschenberg. Juntamente
com o engenheiro eletrônico Billy Klüver, ambos conceberam e criaram diversas instalações
artísticas voltadas para a nova estética multimídia (Rush, 2006). Um exemplo dessas obras é
Variations V, de 1965, criada com a colaboração de John Cage (músico experimental, um dos
pais do gênero eletrônico) e Merce Cunningham (dançarino e coreógrafo dos EUA).
Em 1967, depois de várias apresentações com sucesso, foi criada a EAT (Experimentos e
Arte e Tecnologia), marcando o início de uma colaboração entre artistas e engenheiros.
Robert Whitman apresentou, em 1965, a instalação Prune Flat, na qual os artistas
interagiam ao vivo com imagens filmadas e projetadas sobre eles e em telas atrás deles; no
mesmo ano, Michael Snow realizou a performance Right Reader, em que interagia com o
público através de uma tela de acrílico simulando um vídeo gravado.
A obra de Whitman abre a possibilidade estética de interação em diferentes aspectos
de temporalidade: a performance, em sua totalidade, era a soma da atuação ao vivo com a
gravação previamente realizada, perfazendo uma imagem superposta através de múltiplas
possibilidades de interação atemporais.
Tal processo, ao menos em linhas gerais, guarda semelhança com os Motion Studies dos
Gilbreth, só que em direção bastante diversa. Enquanto Whitman pretendia explorar novas
formas de interação entre diferentes temporalidades, os Gilbreth tinham como objetivo
'congelar' no tempo alguma ação para poder realizar seu estudo. De certa forma, consiste na
diferença entre a síntese, de Whitman, e a análise, dos Gilbreth.
Right Reader de Michael Snow, explora o aspecto de dissimulação que a tecnologia
pode promover: enquanto parece que se trata de uma performance com áudio real, percebese após que se trata de uma gravação e que o artista apenas está simulando sons saindo de sua
64
boca.
A arte dos Happenings também se desenvolve neste período. Higgins (1976, 268)
explica a origem do termo:
“No final da década de 1950, as manifestações artísticas de vanguarda cada
vez mais se fundiram, com os artistas explorando as novas mídias. Artistas
visuais como Allan Kaprow fizeram colagens extensivas, usando máquinas,
espelhos refletindo os expectadores e, ultimamente, performances ao vivo.
Kaprow percebeu que necessitava de um termo para descrever esta nova
forma de arte que estava se desenvolvendo, e chamou de Happening,
porque, como ele me disse posteriormente quando o perguntei, 'Eu não sabia
como chamar isso, e a minha performance era algo que simplesmente estava
imaginada para acontecer [Happen] naturalmente'.”
Os Happenings13 de Allan Kuprow representavam uma tentativa de afastamento da arte
acadêmica para uma posição de maior proximidade com o público, buscando incorporar o
observador à obra de arte (Rush, 2006, 30).
Johanna Drucker (1993, 51-52) nota:
“Em grande parte, é o processo colaborativo dos Happenings que lhes
garante a característica de obras de arte que interrogam os elementos
constitutivos da tradição modernista. O impacto crítico dos Happenings
pode ser mais bem analisado em termos da recusa do materialismo orientado
ao produto, a rejeição da assinatura enquanto significante de autoria,
originalidade e propriedade e uma subversão geral à estrutura da arte
visual.”
Nas chamadas performances de estúdio, os artistas utilizavam principalmente
equipamentos de vídeo de televisão, em que se enfatizava o próprio processo de criação física
da arte.
London (1995) faz uma análise de algumas14 obras de artistas que utilizaram-se do
13 Para uma descrição do processo dos Happenings no continente europeu, cuja arte foi fortemente influenciada
pela Segunda Guerra Mundial, ver Berghaus (1993).
14 São cinco as obras analisadas mas, por uma questão de corte temporal, somente serão apresentadas quatro,
excluindo-se da lista a obra “Suspension of Disbelief (for Marinne)”, de Gary Hill, realizada em 1992.
65
vídeo para tratar da idéia de temporalidade.
Corridor Instalation (Bruce Nauman, 1970) tem como efeito deixar o participante da
instalação com a sensação de estar preso em uma série de pequenos corredores, com vários
jogos de imagens, alguns conectados ao tempo real e outros previamente gravados, sem
indicação para o participante de qual se refere a que tipo de temporalidade.
TV Buddha (Nam June Paik, 1974) é a gravação de uma imagem de Buda, sendo
reproduzida em frente a ele. A questão que se levanta aqui é acerca da diferença entre uma
imagem gravada e outra ao vivo, sob a percepção daquele que observa a televisão. Conforme
pergunta London (idem,ibidem), “qual a diferença entre o Buda olhando fixamente para uma
imagem ao vivo (tempo presente) dele mesmo e o Buda confrontado com um replay de uma
imagem anterior (tempo passado)?”
Present Continuous Past(s) (Dan Graham, 1974) traz à tona um conceito desenvolvido
por Albert Einstein, relacionado aos múltiplos espaços. Tal como uma casa dos espelhos de um
parque de diversões, Graham utiliza câmeras e truques de espelhos para chamar a atenção do
participante em relação ao espaço, não a ele mesmo. Existe um atraso de alguns segundos
entre as imagens. A instalação questiona o relacionamento entre o presente e o passado na
percepção do participante.
Decay Time (Bill Viola, 1974), passando por Husserl e James, explora o conceito do
tempo enquanto fenômeno da experiência humana. Em uma sala escura, iluminada
intermitentemente por uma luz estroboscópica, uma câmera tem alguns momentos apenas de
luz para ter uma imagem do participante. Esta é projetada em uma parede e, momentos
depois, desaparece.
Um dos principais movimentos a explorar as novas formas de comunicação e mídia é o
Fluxus, criado em torno do artista Georges Maciunas. Com participantes como Yoko Ono, Nam
June Paik e Allan Kuprow, o grupo explorava vídeo, produções minimalistas e eventos (como os
“Happenings”).
Conforme aponta a Enciclopédia Britânica (2008):
“ Em seus primeiros anos, de 1962 até 1966, o Fluxus misturou a arte
conceitual, o minimalismo, a nova música, poesia e um trabalho baseado no
aleatório em um fenômeno de intermídia, identificável mais através de sua
atitude irreverente que propriamente através do uso de algum estilo
específico. Utilizando o humor – no espírito do Dadaísmo – e os materiais e
66
experiências cotidianas, o Fluxus criou objetos e eventos surpreendentes e
originais.”
Com o avanço da informática, aos poucos os artistas também foram utilizando desse
novo meio para a construção e expressão de sua arte.
“Computer composition with lines”, de Michael Noll, é uma releitura da obra de
Mondrian (“Composition with lines”, de 1917), utilizando um computador IBM 7094 (Gere,
2002). “Hummingbird”, de Charles Csuri, trata do processo de criação da imagem
computadorizada dos traços de um pássaro.
Ilustração 16: Piet Mondrian:
Composition with lines, 1917
Ilustração 15: Michael Noll:
Computer composition with
lines, 1964
Ilustração 17: Charles Csuri: Hummingbird, 1968
67
2.5 O metaverso
O capítulo anterior apresentou, de modo introdutório, uma linha do tempo sobre o
mesmo período histórico, só que através de dois pontos de vista razoavelmente diferentes: um
tem como foco a tecnologia, enquanto o outro pinça algumas percepções acerca da
tecnologia.
Tal aproximação é interessante, ao ponto que perpassa algumas obras-chave na cultura
ocidental e que, como veremos mais adiante, são importantes (Gere, 2002) para a
compreensão do fenômeno histórico contemporâneo.
Embora tecnologia seja o tema central de ambos, esta divisão foi necessária para
reforçar o assunto que agora será tratado neste capítulo, e que é o tema principal desta
dissertação: o metaverso.
Não há, na literatura acadêmica, uma definição precisa do termo; de igual forma na
prática do mercado. A origem da palavra explicita essa questão, pois metaverso aparece no
romance cyberpunk de Neal Stephenson, “Snow Crash”.
2.5.1 A estética cyberpunk
No final da década de 1970 e início de 1980, os computadores foram, cada vez mais,
diminuindo de tamanho (através de microprocessadores mais potentes, CPUs compactos, etc.),
substituindo gradualmente as antigas máquinas que preenchiam salas e criando, pela primeira
vez, a idéia de um computador pessoal.
Se antes os computadores estavam apenas em Universidades, Centros de Pesquisa
corporativos ou governamentais e outras instituições que tivessem dinheiro para manter um
em funcionamento, aos poucos eles foram ficando mais acessíveis financeiramente para os
primeiros usuários que, muitas vezes, eram estudantes que já trabalhavam ou pesquisavam essa
área durante o dia e utilizavam os computadores como um hobby.
Conforme aponta Turkle (1995), essa cultura inicial dos computadores incluía dois
subgrupos – os hackers e os hobbyists, que se diferenciavam não pelo quanto sabiam de
programação, mas sim pelo valor que davam às máquinas.
Os hackers eram os virtuoses em programação que estavam interessados em pegar
sistemas complexos de computador e explorar todos os seus limites. Os hobbyists, por sua vez,
tinham como objetivo a reduzir a máquina aos elementos mais simples, com a finalidade de
68
compreendê-la em detalhes.
Todo esse avanço inicial da computação doméstica teve influência na cultura.
McCallum (2000, 349-350) observa:
“A ficção cyberpunk trabalha com as inovações tecnológicas que provocam
mudanças significativas na forma como os humanos se orientam em relação
ao mundo – ou mesmo no mundo em que habitam, seja virtual ou real.
Embora a ficção científica seja popularmente compreendida como sendo
sobre exploração do espaço e de outros planetas, o cyberpunk altera esse
tema em favor da imaginação de um espaço “faux” de banco de dados e
redes – sistemas de informação, comunicação e mídia – em nosso mundo.”
Amaral (2003a, 2003b, 2008) identifica duas facetas que constituem o “DNA” da subcultura cyberpunk: os hackers e o industrial.
No que se refere aos hackers, essa categoria é diretamente relacionada – em sentido
parecido ao colocado acima por Sherry Turkle – ao desenvolvimento tecnológico da
informática, sendo percebidos, geralmente, como 'desajustados sociais', altamente curiosos em
resolver complexos problemas técnicos através de novos processos criativos.
Conforme destaca Steven Levy (apud Amaral, 2008), os hackers sempre foram muito
ligados à questão da tecnologia enquanto entretenimento, tanto que os primeiros hackers
criavam jogos inicialmente, antes de qualquer outro tipo de programação posterior, sendo um
grupo bastante apreciador dos RPGs (Role Playing Games), além de uma predileção por
literatura de ficção científica.
No outro lado, a subcultura industrial (por sua vez herdeira da subcultura gótica) e que,
por vezes, cruza com o cyberpunk em algumas de suas características paradoxais: o analógico e
o digital, o medo e o desejo, a tecnofobia e a tecnocracia, o rock e a música eletrônica ( idem,
ibidem).
A fusão destas duas subculturas gera o que se conhece como cyberpunk. O primeiro uso
do termo, inclusive, é como o título de uma estória do autor estadunidense Bruce Bethke, em
1984 (Amaral, 2003b).
Uma das primeiras novelas a influenciar bastante os livros posteriores é “Do Androids
dream of electric sheep?”, de Philip Dick (1968), mais conhecida pelo filme que a retratou:
“Blade Runner”.
No enredo, que se passa em 2021, após uma guerra e extinção de várias espécies de
69
animais, a humanidade passa a desenvolver máquinas que simulam os animais raros e também
seres humanos. A trama consiste no trabalho de detetive que a personagem principal
desenvolve, achando os “replicantes” (humanos falsos, sintéticos) e os destruindo.
William Gibson publica Neuromancer em 1984, romance cyberpunk bastante famoso,
introduzindo na literatura idéias como inteligências artificiais altamente evoluídas e um
espaço virtual bastante aproximado das características físicas do espaço “real”.
O próprio conceito de cyberspace também aparece nessa obra, definido por Gibson
(1984) como uma “alucinação consensual experimentada cotidianamente por bilhões”.
Junto com outros autores, o gênero foi se desenvolvendo, em estreita conexão com o
crescimento da computação pessoal e de sua subjacente cultura, além de obter uma
penetração cada vez maior em um contingente jovem.
Nesse contexto Neal Stephenson escreve o romance Snow Crash, em 1992,
descrevendo o que seria o metaverso:
“(...) Como qualquer outro lugar na realidade, a Rua está sujeita a
otimizações. Desenvolvedores podem construir suas próprias ruazinhas que
desemboquem na principal. Eles podem construir prédios, parques, placas e
tudo o mais que não existe na Realidade, assim como veículos com show de
luzes e comunidades especiais onde as regras do espaço-tempo
tridimensional são ignoradas. Coloque uma placa ou um prédio na Rua e cem
milhões de pessoas, as mais ricas, importantes e conectadas da Terra irão ver
isso todos os dias de suas vidas. A Rua não existe verdadeiramente. Mas neste
momento, milhões de pessoas estão caminhando para cima e para baixo lá.”
(Stephenson, 1992, 22-23)
O metaverso seria, portanto, uma espécie de “não-lugar”, sob uma ótica da existência
física. Da mesma forma que o ciberespaço – e o metaverso faz parte dele, é uma presença que
existe em um contexto de simulação de uma convivência social.
Matrix, trilogia blockbuster lançada em 1999 pelos irmãos Wachowski, é responsável
pela impressão de uma narrativa transmidiática. Ao empregar diversas mídias na construção da
estória, cada uma contendo diferentes momentos e características da trama, os Wachowski
conseguiram criar uma espécie de teia narrativa, em que o domínio total dos elementos da
estória dificilmente são conseguidos por uma só pessoa; ao contrário, tal atividade se
70
caracteriza por ser eminentemente coletiva – a construção coletiva do significado de Matrix
(Jenkins, 2006, 93-130).
Matrix explora bastante a idéia da simulação, sendo fortemente influenciada por Jean
Baudrillard (1991) e por diversas outras áreas temáticas, desde artes marciais até religião. Em
um futuro apocalíptico, os homens foram reduzidos a meras baterias para fornecer energia
elétrica para as máquinas, que agora dominam o mundo. Nesse sentido, para manter as
“plantações” sob domínio e assim possibilitar o fornecimento de energia, cria-se uma
simulação do mundo, colocando os humanos para viver nessa espécie de alucinação coletiva.
O cyberpunk é, finalmente, tudo isso. É ao mesmo tempo ficção científica que põe
sérios questionamentos sobre o significado de ciência e de outros conceitos, como o
significado de “ser” humano.
2.5.2 Desenvolvimento de sistemas de realidade virtual
Seguindo a proposta de Howard Rheingold (1992), podem ser traçadas as origens
tecnológicas e ideológicas de sistemas de realidade virtual (ou ainda de realidade aumentada)
em dois de seus principais predecessores: Douglas Engelbart e Joseph Carl R. Licklider.
Engelbart foi um dos primeiros cientistas a considerar, ainda na década de 1950, a
possibilidade de que o computador pudesse ser utilizado para algo além de folhas de
pagamento e complexos cálculos científicos, embora uma década tivesse que se passar antes
que fosse ouvido seriamente (idem, ibidem).
Essas idéias de Engelbart foram seriamente influenciadas pelo artigo de Vannevar Bush
(1945), “As we may think”, ao qual ele teve acesso quando ainda estava fora dos EUA. A
proposta de estudo inicial do cientista era analisar “como nossos meios de manipulação
exterior dos símbolos influenciam tanto a linguagem quanto a maneira de pensar” (Barnes,
2000, 359).
Se, em grande parte, era um desenvolvimento dos conceitos já propostos anteriomente
por Vannevar Bush, por outro lado representava um avanço tecnológico considerável, vez que
Engelbart tinha como objetivo entender e aumentar esse relacionamento entre o homem e a
máquina.
O pesquisador foi responsável por alguns dos avanços mais significativos neste estágio
inicial da informática15, como o mouse, e também a idéia do hipertexto e das redes de
15 Neste sentido, para maior detalhamento acerca da importante contribuição de Douglas Engelbart, recomendase a leitura de Bardini & Friedewald, 2002.
71
computadores (Giloth e Pocock-Williams, 1990).
No mesmo caminho, Joseph Licklider inova, ao introduzir a idéia da “simbiose homemmáquina”, que, em linhas gerais, apontava para a necessidade de uma interface mais simples,
amigável entre o computador e o ser humano, propiciando experiências de uma maneira
bastante similar à simbiose na Biologia.
De modo a antecipar bastante alguns desenvolvimentos da informática, Licklider
(1960) identifica algumas pré-requisitos para esta simbiose:
1. utilização de computadores em rede, para melhor divisão da capacidade de
processamento de dados;
2. utilização de mecanismos de memórias para leitura e de escrita;
3. modificação das ferramentas de catalogação e busca dos dados guardados na
memória;
4. enquanto os homens pensam mais por objetivos, os computadores trabalham com
processos. Para que as linguagens sejam mais próximas umas das outras, seria
interessante que as ordens fossem dadas ao computador em termos de objetivos, não
caminhos, os quais poderiam já estar pré-programados;
5. alteração nos equipamentos de entrada e saída de dados, com a utilização de displays
em forma de superfície, possível utilização de telas grandes que apresentassem
informações a todo um grupo, reconhecimento e produção de voz;
A semelhança das idéias de Licklider com vários inventos realizados ao longo do tempo
é inegável: desde a interface de “desktop” do Mac, passando pelos atuais programas de
reconhecimento de voz e comandos através de “touch screen”, somente para citar alguns.
Em 1962, conforme já citado, Ivan Sutherland inventa o “Sketchpad”, que utiliza o
comando direto na tela do usuário. Neste mesmo ano, Morton Heilig, um obscuro inventor da
Califórnia, recebe a patente pela máquina que virá a ser conhecida como Sensorama.
72
Ilustração 18: Sensorama, de Morton Heilig
Patente n. 3050870 EUA
O Sensorama é, de facto, a primeira máquina voltada para a simulação de uma
realidade, com foco na total imersão dos sentidos em uma determinada situação. Além deste
aparelho, Heilig também teve outras idéias, algumas patenteadas, como a criação de um
“cinema de experiência” e também um modelo rudimentar do HMD (Head Mounted Display)
que, em 1966, é desenvolvido por Sproull e Sutherland (Grau, 2007).
O “cinema de experiência” é um conceito bastante similar ao exposto por Huxley
(2003), o “cinema sensível”, que possui mecanismos de simulação de odores, sensações físicas,
emoções, dentre outras16.
O Sensorama não foge deste objetivo. Desenhado para ser uma espécie de cinema
particular, ele propicia algumas simulações no campo visual, mas também acrescente
percepções físicas (de movimentos) e de odores, diretamente relacionados ao que o
expectador está vendo no momento.
16 Conlon (2000) oferece subsídios para a compreensão deste mecanismo enquanto experiência no contexto
social, tanto em Huxley quanto em Orwell. Clarke (1988) também segue em linha semelhante.
73
Rheingold atenta para a importância do Sensorama em seu contexto histórico.
Conforme nota:
“A visão de Heilig de um meio para possibilitar experiências artificiais multi
sensoriais está se tornando realidade [em 1990], mas o caminho para o
desenvolvimento atual das tecnologias de realidade virtual não é oriundo do
cinema. Em vez disso, o desenvolvimento de máquinas para 'pensar com', a
extensão das ferramentas baseadas em computadores para a amplificação da
percepção humana e cognição levaram à emergência de uma forma do
teatro de experiência do campo menos ligado ao cinema: a ciência da
computação”. (Rheingold, 1992, 60)
As tentativas de Heilig para desenvolver este tipo de tecnologia não encontraram
muitos entusiastas dentre aqueles que possuíam o poder de decisão para financiá-lo e, mesmo
quando os encontrou, alguns percalços existiram em seu caminho (como a morte acidental de
um ministro mexicano que havia decidido patrocinar seu projeto).
A patente de Heilig da sua televisão estereoscópica era uma proposta, dois anos antes
do Sensorama (portanto, 1960), do que seria necessário para se atingir a imersão: um aparelho
com lentes estéreas, duas telas de TV em miniatura produzindo imagens em três dimensões e
que combinariam os princípios do estereoscópio com a televisão (Grau, 2007).
A visão, contudo, já estava também presente através de um famoso cineasta russo,
Sergei Eisenstein, autor de importantes obras como o Encouraçado Potemkin, de 1925, tendo
acreditado que o Stereokino (cinema estereoscópico) seria a síntese definitiva de todos os
gêneros artísticos. Para ele, a humanidade desejava vivenciar a imagem como 'verdadeira
tridimensionalidade', a qual 'jorraria' da tela para o espectador, tudo isso com som estéreo
(idem, ibidem, 184).
Outras tecnologias vieram com o tempo, principalmente voltadas para a defesa,
considerando que era o período da Guerra Fria e a principal agência financiadora
governamental era a ARPA.
Tom Furness desenvolveu aparelhos óticos para a Força Aérea dos EUA, enquanto Scott
Fisher, outro pioneiro da realidade virtual, começa a pesquisar aparelhos óticos estéreos, no
MIT, posteriormente mudando para a recém-criada Atari, onde conhece o cientista Thomas
Zimmermann (Grau, op.cit.), que havia inventado um protótipo de luva digital.
74
Posteriormente, Zimmermann irá se juntar a Jaron Lanier para fundar a VPL Research,
que aperfeiçoa – em parceria com a NASA – a luva, permitindo a navegação e o toque de
objetos gerados por computador.
Até o final da década de 1980, empresas como a VPL e outras do gênero serão
responsáveis pelo desenvolvimento dessas tecnologias que permitiam, em escala inicial, a
navegabilidade em ambientes virtuais através desta interface simbiótica.
2.5.3 Arte e sistemas de realidade virtual
Paralelo ao desenvolvimento de novos sistemas e interfaces de realidade virtual pelos
cientistas, vários artistas começam a explorar as potencialidades destas novas tecnologias.
O Architecture Machine Group, coordenado por Nicholas Negroponte no MIT, criou
em 1978 um dispositivo chamado “Aspen Movie Map”, que simulava um passeio de carro pela
cidade de Aspen, nos EUA, tendo inclusive a opção de se escolher em qual estação do ano. A
interface era através de um monitor de computador (Gere, 2002, 128-129).
Dentre vários outros experimentos, alguns artistas contemporâneos merecem destaque
pelo grau de inovação de suas obras.
2.5.3.1 Charlotte Davies
A obra “Osmose”, de 1995, é considerada como um marco nas instalações de realidade
virtual imersiva (Grau, 1999 e 2007). Inspirada pela obra de Heidegger e Bachelard, Charlotte
Davies, na época diretora da SoftImage, visava criar um espaço de simulação computadorizada
que conseguisse mexer profundamente nas concepções do indivíduo, não só acerca do espaço,
mas também de sua própria natureza (Davies e Harrison, 1996).
Através de um HMD e também da utilização de sensores pelo corpo, o “imersant”
(como Char Davies chamou o participante ativo da instalação) navega por meio de diferentes
paisagens virtuais, tendo como principal interface o movimento de seu corpo – inclinações e
respirações, de modo bastante semelhante ao de um mergulhador.
A experimentação do conceito heideggeriano17 de “estar-no-mundo” é o objetivo
primário de Osmose (Davies, 1998). A obra explora a sensibilidade do “imersant”, que tem
disponível uma interface natural, que cobre todo o corpo, navegando através dos constructos
17 Neste sentido, ver Zahorik e Jenison, 1998.
75
em realidade virtual desenhados pela equipe de Char Davies).
Osmose também possui um sentido duplo no que tange à vivência da obra: ao mesmo
tempo que existe alguém “comandando” a experiência, na sala contígua há a projeção do
espaço virtual pelo qual se está navegando, permitindo uma certa percepção coletiva na
instalação (deLahunta, 2002, 107).
Em relação à interface de Osmose, Grau (2007, 225-226) observa:
“O objetivo de Char Davies, desenvolver uma interface natural, é
inovador. A interface de usuário, ponto de contato para o intercâmbio entre
humanos e máquinas, pode assumir muitas formas. É na interface, a ser usada
pelo observador ativo de acordo com as regras do mundo particular de
ilusão, que as estruturas de simulação projetadas para a comunicação
encontram-se com os sentidos humanos. Dessa forma, a interface na
realidade virtual funciona universalmente como uma chave para a obra de
arte digital, moldando tanto a percepção como as dimensões da interação.”
Osmose, portanto, é uma guinada na interface tradicionalmente composta apenas pelo
HMD em instalações de realidade virtual, aproximando-se mais da interface natural – os
movimentos similares a um mergulho. Grau (op.cit., 234) ainda afirma: “(...) Osmose representa
um marco na história da mídia, como os filmes dos irmãos Lumière ou os primeiros panoramas,
ao menos pela sua utilização estética das novas tecnologias de imersão e ilusão”.
2.5.3.2 Maurice Benayoun
Um panorama de fotos de noticiários, retratando cenários de guerra, com soldados,
tanques e escombros; esse é o cenário da instalação de Maurice Benayoun, “World Skin”,
realizada em 1997.
A obra é realizada na CAVE – “Cave Automatic Virtual Environment”, que é “um cubo
em que todas as seis superfícies podem ser usadas como telas de projeção, circundando o
visitante com um ambiente de imagens” (Cruz-Neira et.al., apud Grau, op.cit., 16).
Nesta instalação, o visitante se encontra efetivamente circundado por este ambiente
imagético de guerra, munido de uma máquina fotográfica. A cada fotografia tirada, o espaço
correspondente deixa de existir na percepção de todos os que estão na CAVE.
76
Acerca desse efeito da fotografia, Benayoun (2008) diz:
“Nós tiramos fotos. Primeiro pela nossa agressão, depois pelo prazer de
mostrar aos outros, nós arrancamos a pele do mundo. Essa pele se torna um
troféu, e nossa fama cresce junto com o desaparecimento do mundo. (...)
Tirar fotos expropria a intimidade da dor enquanto, no mesmo momento,
serve de testemunha para ela.”
Ao mesmo tempo, a imersão desejada por Benayoun é atingida tanto no aspecto da
vivência coletiva da experiência do panorama da guerra quanto pelo gesto individual de
carregar um 'pedaço' daquela estética junto a si.
2.5.3.3 Monika Fleischmann e Wolfgang Strauss
Home of the Brain (1991) é uma das obras mais importantes dessa dupla alemã que, em
1988, ajudou a montar o instituto ART+COM, destinado ao projeto de pesquisa interdisciplinar
e ao desenvolvimento de novas técnicas informatizadas de comunicação e design (Grau, 2007,
251).
Através de uma luva digital e um HMD equipado com sensores, o participante navega
através de quatro casas virtuais, que são 'habitadas' por quatro cientistas da informática e
filósofos da mídia: Joseph Weizenbaum, Marvin Minsky, Paul Virilio e Vilém Flusser. Essa
viagem virtual desperta alguns questionamentos acerca de temas como as implicações sociais
e políticas da Internet ou mesmo a criação de uma inteligência artifical.
Como nota Vargas (2005, 13), “os artistas berlinenses apresentam suas inquietudes não
só pelo desenvolvimento do potencial tecnológico como também pelo traslado dos
espectadores a um 'mundo imaginário em um espaço sem tempo'.”
Além de “Home of the brain”, os dois artistas desenvolveram, em 1994, a “Responsive
Workbench”. Trata-se de uma mesa na qual várias pessoas podem trabalhar ao mesmo tempo,
através de uma interface de simulação de realidade virtual. Conforme dizem os autores:
“O homem é um ser que se move. Caso contrário, está morto. Nós
aprendemos apenas a mover nossa cabeça. O resto permanece parado. Nossa
sociedade tem, há tempos, ido de encontro a uma parede de tijolos, pois
77
tudo em nossa cabeça também está virando. Sendo assim, nós não queremos
permanecer parados em velhos sistemas. Nós realmente temos que sentar
enquanto trabalhamos? Queremos usar nossas mãos. Queremos desenhar,
construir modelos e não apenas sermos operadores de um teclado.
Queremos ver esses modelos através de uma câmera virtual. Queremos
deixar nossos olhos voarem através da parede da realidade. No lugar de
desenhar esquemas, nós queremos produzir 25 quadros por segundo”.
(Fleischmann e Strauss, 1998, 5)
2.5.4 Conclusão do metaverso
O metaverso surge, portanto, não apenas da convergência de diferentes tecnologias,
mas também tem um forte componente conceitual e de ficção em sua concepção.
As literatura cyberpunk relata uma visão paradoxal acerca da tecnologia, muitas vezes
distópica, relacionando-se freqüentemente com temas anteriormente abordados em obras
como 1984 e Admirável Mundo Novo.
A origem do metaverso é, inegavelmente, relacionada a esta estética, dominante
inicialmente nos círculos de computação, em uma época que apenas ainda havia a visão
conceitual, com sérias restrições tecnológicas para a experiência imersiva, na forma como
relatada por Stephenson em seu Snow Crash (1992) ou mesmo na série de livros de ficção de
Gibson.
O ciberespaço começa a se formar, de modo mais efetivo, na década de 1980, ainda
que em escala reduzida, em grande parte devido aos ainda poucos computadores e também às
redes, que eram geralmente independentes (a World Wide Web só surgirá no início da década
de 1990).
Ao mesmo tempo em que eram influenciados pelos ideólogos da tecnologia, como
Sutherland, Heilig ou mesmo Vannevar Bush, essa nova classe social, ligada intimamente à
cultura dos computadores, imagina novas possibilidades de interação em um ambiente novo, o
não-lugar do ciberespaço.
As tecnologias que foram se desenvolvendo, desde as idéias iniciais de Eisenstein, eram
eminentemente voltadas para uma simulação sensorial, uma experiência completa, de modo a
envolver todos os sentidos do usuário em um determinado contexto. Ainda que primitivos, a
78
presença de HMDs, luvas, a própria concepção do Sensorama, se revelam cruciais para a
compreensão do fenômeno do metaverso.
Os trabalhos recentes dos artistas de realidade virtual apontam para um caminho que
privilegia dois aspectos, principalmente: a interface e a construção (ou destruição) coletiva.
Na maior parte das obras estudadas (além das que foram apresentadas aqui), há a
utilização de HMDs ou dispositivos similares para preencher o campo visual do indivíduo. À
experiência visual soma-se os níveis sonoros e as simulações com utilização de mecanismos de
toque.
A interface se caracteriza pela imersão, pela busca cada vez mais profunda do
envolvimento do participante com a obra, não só através da utilização de ferramentas
tecnológicas como também pelo visual, sensorial e semiótico.
O caráter coletivo é realçado através das obras, em que o participante pode ter tanto
uma experiência compartilhada com outros e, de algum modo, participar da obra de arte.
Todos são fatores que estão na base da criação dos metaversos, ao menos na ideológica.
O próximo capítulo abordará mais especificamente a criação do metaverso atualmente
mais conhecido, que é o Second Life, dentro do contexto preconizado por Stephenson.
2.6 O Second Life enquanto metaverso
2.6.1 Uma introdução ao “sistema Second Life”
Segundo Au (2008), o principal objetivo quando da criação do Linden Labs, empresa
que mais tarde viria a desenvolver o Second Life, não era a criação de um metaverso, ao menos
no início, em 1999.
Seu fundador, assim como muitos outros novos empreendedores da Califórnia, nos
EUA, era um jovem chamado Philip Rosedale que havia trabalhado em alguns lugares
anteriormente, chegando a ocupar cargos executivos na Real Networks.
Surgida inicialmente em um galpão em São Francisco, na Califórnia, Rosedale criou a
Linden Labs com o apoio do investidor e ex-chefe Mitch Kapor, que o ajudou a levantar capital
de risco para a empresa, em 2001, quando se incorporou.
Au conta que no início, Rosedale não tinha como principal inspiração o metaverso
conforme descrito em Snow Crash, mas sim “imagens geradas por computador que ele vira em
uma exposição de figuras 3D, as quais reproduziam deslumbrantes cenários naturais com tanto
79
realismo que os pixels pareciam ter vida” (Op.cit., 46).
Surge, então, o Linden World, inspirado tanto pelo metaverso de Snow Crash quanto
por outras influências como os M.U.Ds18 da década de 1980 e 1990 e tecnologias gráficas em
3D.
Os “mundos sintéticos” têm início já na década de 1970.
Os primeiros espaços multi-usuários surgiram neste época, em formato de texto,
enquanto na década de 1980 surge o primeiro espaço com personagens gráficas, desenvolvido
pela LucasArts (Castronova, 2005). A idéia de um jogo com o gráfico centrado na perspectiva
de primeira pessoa veio com Meridian 59, em 1996. Logo depois, em 1997, Ultima Online, da
Electronic Arts, ganhava expressão comercial com aproximadamente 200.000 usuários
inscritos.
Em 1998, Lineage, da NCSoft, já dispunha de mais de um milhão de associados, e em
1999, EverQuest, da Sony Online Entertainment, alcança 450.000 usuários registrados.
Nessa mesma linha, o Second Life agora debutava como um metaverso, aberto aos
primeiros “desbravadores” desse novo mundo – utilizando aqui uma expressão bastante batida,
Brave New World.
O Second Life, do ponto de vista do usuário, consiste em um software, o qual deve ser
instalado no computador do participante. Há versões para os sistemas operacionais Windows,
Linux e Mac, demandando uma placa de vídeo com suporte para gráficos tridimensionais, além
de uma capacidade de processamento que, em muitos casos, requer uma máquina com um
bom hardware para que a navegabilidade seja satisfatória.
Os servidores da Linden Labs são responsáveis pela hospedagem e comunicação entre
as diversas áreas do Second Life.
Assim como em alguns jogos multi-usuários, que são divididos em zonas denominadas
shards, o Second Life também é dividido em regiões, que são compostas por um conjunto de
ilhas (ou simuladores, sims).
Cada região correspondia a um servidor, embora atualmente existam conjuntos de
regiões que são hospedadas em apenas um servidor dedicado.
Uma região, é uma área gráfica correspondente a um quadrado de 256 metros de lado,
perfazendo 65.536 m², sendo que há a continuidade do ambiente virtual quando se navega
entre as áreas, de modo contíguo.
18 Multiuser Dungeons, eram os primeiros jogos ainda na época pré-Web, que utilizavam a interface de texto e,
posteriormente, o 2D gráfico, para criar histórias a serem jogadas por vários usuários, no estilo dos Role
Playing Games.
80
A maneira mais usual de navegação dentro do ambiente virtual é através de um
dispositivo chamado teleport ou, em Português, teleporte, nome oriundo da ficção científica e
que significa, literalmente, transferir-se de um ponto a outro do mapa instantaneamente. No
início a Linden Labs disponibilizou áreas para teleporte, denominadas hubs, de modo bastante
similar ao descrito em Snow Crash, mas optou por deixar livres as movimentações, que podem
ser realizadas também por caminhadas ou vôos, após sugestões e reclamações de usuários.
Há uma economia dentro da plataforma, que opera de modo muito semelhante a um
sistema macroeconômico de um país. A moeda local é o Linden Dollar (L$), que tem cotação
flutuante em relação ao dólar americano (USD). A Linden Labs coordena a flutuação da moeda,
intervindo diretamente no mercado, alterando preços de terrenos e custos de transação, de
forma a injetar ou retirar recursos do sistema, tendendo a mantê-lo estável.
Cada usuário do Second Life tem a opção de comprar moeda para utilização dentro da
plataforma, o que pode ser realizado via Linden Labs, através do Lindex – sistema de câmbio de
moedas para o Linden Dollar – ou de corretores independentes.
O Linden Dollar é utilizado para compra dos mais diversos bens e serviços. O mais
importante deles é a corretagem de terrenos virtuais. Conforme foi dito acima, cada simulador
tem aproximadamente o correspondente a 65.000 metros quadrados de área, a qual pode ser
utilizada para construção de modelos virtuais de casas, empreendimentos comerciais, zonas de
jogos, etc.
Os terrenos podem ser comprados diretamente do Linden Labs, quando a empresa
disponibiliza mais um servidor dentro da chamada “grade”, ou seja, o conjunto de ilhas e
simuladores oferecidos aos usuários. Há a opção de compra diretamente de outros
proprietários, sendo o preço determinado pelo vendedor, variando conforme localização,
vizinhança, tipo de terreno, dentre vários outros fatores.
Existem alguns leilões de terrenos oferecidos pelo Linden Labs, cujos lances podem ser
dados em dólar americano ou Linden Dollar. Esse mecanismo de propriedade de terrenos
virtuais funciona na chamada mainland, o que poderia ser traduzido como “terra firme”, que
designa as terras que são administradas pelo Linden Labs. A utilização das mesmas, bem como
regras de construção e zoneamento, são livres, apenas sendo restringidas pelos termos de
serviços da empresa (que envolve questões como pedofilia, jogo ilegal, dentre alguns outros
temas). Os proprietários pagam um valor mensal à empresa, relacionado aos custos de
manutenção de servidor, diretamente proporcional à quantidade de terras que possui.
Há a disponibilização de terrenos localizados em ilhas particulares, os chamados
81
“estates”. Essas regiões são simuladores comprados por usuários que têm a liberdade de alugar
ou revender essas terras para terceiros, não havendo interferência do Linden Labs. Poderiam
ser comparados, grosso modo, a condomínios fechados com regras de conduta determinadas
pelos administradores, que são também usuários do Second Life. No caso destas regiões, o
valor pago pela sua utilização é devido aos administradores, que têm o poder de aceitar ou
recusar quem quer que seja na área.
A representação do usuário no ambiente do metaverso é realizada através de um
avatar, palavra derivada diretamente do sânscrito, significando “encarnação” (Castronova,
2007). A personagem é responsável pelo aspecto físico do usuário dentro do metaverso. O uso
da palavra “avatar” neste sentido foi realizado em Snow Crash, de Neal Stephenson (1992).
O usuário tem a possibilidade de customizar seu avatar, escolhendo não apenas
atributos humanos, como cor da pele, olhos, altura, constituição física, mas também a opção de
utilizar formas não humanas, tais como elfos, máquinas, anjos, ursos, dentre muitas outras. De
fato, a gama de representações não possui muitas limitações.
Ilustração 19: Panorama da Orientation Island – Imagem de
http://www.gamesetwatch.com/column_letters_from_the_metaverse/
82
2.6.2 A Economia do Second Life
Conforme já mencionado anteriormente, há uma economia dentro da plataforma, que
possui uma moeda própria de cotação flutuante, a qual tem se mantido na faixa dos L$ 265 a
L$ 270 frente a um dólar americano.
De modo já observado anteriormente em outros mundos virtuais (Castronova, 2005c,
7), há uma desigualdade social dentro do Second Life, com alguns usuários possuindo milhares
e até milhões de Linden Dollars em moeda e bens, enquanto muitos têm apenas o equivalente
a alguns poucos dólares americanos (no máximo L$1000).
Há um processo de apreciação dos bens virtuais.
Os usuários constroem casas (que são modelos em 3D), roupas para avatares, objetos
como móveis, armas, obras de arte, dentre muitos outros, aos quais dão um valor, que pode
variar desde zero (chamados freebies) até milhões de Linden Dollars. Os serviços, de igual
modo, têm preço, como promoter de festas virtuais, corretor de imóveis, arquiteto,
desenvolvedor de projetos comerciais, modelo, DJ, dentre uma infinidade, os quais podem ser
pagos tanto em Linden Dollar (mais comum) ou em dólares americanos.
No diretório de buscas dentro do software do Second Life existe a possibilidade de se
encontrar esses bens, embora sejam muito populares sites externos, que funcionam de modo
semelhante a um E-Bay, tais como XstreetSL (antigo SLExchange) e Apez.biz. São oferecidos,
inclusive, mecanismos de administração voltados para o Business to Business (B2B), como
scripts para pagamento de aluguéis e de pessoal, bem como contadores de público.
Nestes sites, que muitas vezes também oferecem sistemas de corretagem de moedas, o
usuário cadastra seu avatar, permitindo que o script do site realize transações financeiras em
seu nome. Dessa forma, há um intercâmbio entre o Second Life e o sítio na Internet: uma
compra realizada na Internet será entregue no Second Life e o depósito de dinheiro dentro da
plataforma será disponibilizado para gastos no sítio.
As transações realizadas entre usuários respondem por um valor mensal aproximado
(em dados de novembro de 2008) de L$ 8,8 bilhões, equivalente a USD 33 milhões. Segundo os
cálculos da Linden Labs, existem atualmente quase 60.000 iniciativas empreendedoras que têm
algum tipo de retorno positivo – ou seja, apresentam alguma forma de lucro mensal. Destas,
606 têm ganhos entre USD 1.000 e 2.000, 377 apresentam lucros entre USD 2.000 e USD
5.000 e 181 têm lucros acima de USD 5.000, em base mensal.
83
35000
30000
25000
20000
15000
10000
5000
$10 - $50 USD
$100 – 200 USD
$500 - $1,000 USD
$2,000 - $5,000 USD
< $10 USD
$50 - $100 USD
$200 - $500 USD
$1,000 - $2,000 USD
> $5,000 USD
Lucro mensal
Ilustração 20: Usuários com lucros mensais
A maior parte dos negócios, contudo, é realizada dentro da plataforma. Através do
próprio software, no canto superior direito da tela, é possível comprar mais Linden Dollars
diretamente da Linden Labs, com depósito direto no avatar – uma espécie de conta-corrente.
Existiam no Second Life um conjunto de empreendimentos dedicados ao investimento
do dinheiro do usuário, tal como bancos e fundos de investimento. Esses bancos recebiam
depósitos, em troca de rendimentos, auferidos através de aplicações em terrenos, projetos e
empreendimentos comerciais como cassinos e shoppings.
Em janeiro de 2008, a Linden Labs decidiu banir definitivamente os bancos e atividades
conexas dentro da plataforma, a não ser que fossem correspondentes diretas a alguma
instituição financeira em operação com aval de algum governo (Talbot, 2008; Riley, 2008). Tal
atitude foi tomada logo após o colapso do Ginko Financial, principal banco dentro do Second
Life, deixando um default de aproximadamente USD 750.000, além de gerar um efeito
cascata, ocasionando falta de liquidez no mercado.
Uma das causas do colapso dos bancos é a proibição, alguns meses antes, dos cassinos
dentro da plataforma, o que gerou um sério déficit nas receitas do mercado financeiro. De
qualquer modo, muitos economistas já observavam que a série de rendimentos prometida
pelas instituições mais se assemelhava a um esquema piramidal (Naone, 2007).
Atualmente, as opções para investimento se resumem basicamente a terrenos, que
sofrem variações dependendo da quantidade de novas terras que a Linden Labs disponibiliza
ao público. Por se tratar de um recurso teoricamente infinito, o aumento no número de
terrenos diminui o valor individual dos mesmos, de acordo com a clássica teoria econômica
(Castronova, 2006).
84
2.6.3 Os residentes
São chamados residentes os usuários registrados no Second Life, que podem ter três
tipos de conta: a básica, responsável pela esmagadora maioria dos registros, que é gratuita e
não dá direito à compra de terrenos na mainland, a premium, que permite ao usuário comprar
terrenos, além de garantir um pequeno salário semanal, sendo esta paga em base mensal ou
anual, e a conta de funcionários da Linden Labs.
Após o registro19 no site do Second Life, o novo usuário deve realizar o download do
cliente, entrar com seu login e senha e, em seguida, começa a navegar no metaverso.
Os primeiros passos no metaverso podem ser bastante confusos, pois se trata de uma
navegação em três dimensões através de uma interface de duas dimensões (a tela do
computador, através de devices igualmente bidimensionais, como o mouse e o teclado).
De fato, a curva de aprendizado da plataforma é um fator relevante para a análise.
Cheal (2007) nota que, do ponto de vista da adaptação de professores às novas tecnologias em
mundos virtuais, estes apresentam uma maior curva de aprendizado que outros mecanismos de
e-learning.
Delwiche (2006) conclui preliminarmente que existe uma diferença substancial entre os
MMORPGs, como Everquest e World of Warcraft e mundos como The Sims e Second Life no
que tange à curva de aprendizado, pois nos primeiros há a necessidade não só de compreender
os comandos básicos e a dinâmica de movimentação, mas também o enredo e as personagens
da história, com a finalidade de obter um nível razoável de prazer no ato de jogar.
Os residentes recém-chegados geralmente são transportados automaticamente para
ilhas de orientação, que são espaços desenhados pela Linden Labs (ou por parceiros regionais,
dependendo do país de acesso), que têm a finalidade de adaptar o novato aos movimentos
básicos da plataforma, além de apresentar conceitos como o vôo e o teleporte, que serão
essenciais para o aproveitamento da experiência.
Castronova (2007) faz, inclusive, um relato ficcional sobre um senador americano que,
ansioso por “explorar” as novas possibilidades dos mundos virtuais, fica completamente
perdido e sem compreender exatamente o novo mundo dos ambientes virtuais e metaversos
aos quais era exposto.
Segundo os últimos dados disponibilizados pela Linden Labs, em novembro de 2008, a
19 A presença de um registro obrigatório pode ser uma característica que reduz a taxa de conversão do Second
Life, por analogia à pesquisa realizada por Burns (2008) com sites de venda online.
85
composição etária dos residentes concentrava-se nas faixas de jovens adultos e adultos, que
perfazem quase metade de todos os usuários.
Divisão etária
Novembro de 2008
13-17 (Teen
Grid)
18-24
25-34
35-44
>45
Unknow n
Ilustração 21: Composição etária - Residentes
do Second Life
Quanto à procedência nacional, os principais países por número de horas de uso são:
Estados Unidos (39,38%), Alemanha (9,55%), Reino Unido (6,61%), Japão (5,49%), França
(5,38%), Holanda (3,83%), Itália (3,81%) e Brasil (3,71%).
É interessante notar que há uma correspondência entre esses dados e os números
relativos à penetração da Internet, com exceção do Brasil (INTERNET WORLD STATS, 2008;
LINDEN LAB, 2008).
Entretanto, não é possível, com os dados disponibilizados pela Linden Labs, efetuar
algum tipo de conclusão mais substancial, considerando que as medições são feitas com base
em horas de uso por país, não existindo os números absolutos de usuários. De qualquer modo,
é ao menos notável que, em um país com baixo índice de penetração da Internet como o Brasil,
o Second Life tenha um forte nível de uso.
Após o primeiro contato, os usuários são livres para irem a qualquer lugar. Muitas vezes
dirigem-se a clubes e boates com a finalidade de conhecer outros avatares e dançar ao som de
algum DJ. Em geral, esses clubes são abertos ao público e gratuitos, sendo sua monetização
realizada através de publicidade ou doações dos membros.
Outro caminho comum é a busca de um pedaço de terra para alugar e construir uma
casa – ou ao menos tentar se aventurar na construção.
O modelo básico de criação de estruturas dentro do Second Life é o de desenho em 3D,
86
para o qual existe uma funcionalidade dentro da plataforma, com possibilidade de
texturização, renderização e outras, permitindo que o usuário construa qualquer coisa que vier
à imaginação.
2.6.4 Negócios dentro do Second Life
A maior parte dos negócios existente dentro do Second Life é composta por pequenos
empreendimentos, de iniciativa dos próprios empreendedores, que oferecem produtos e
serviços variados. Desde um usuário que realiza projetos arquitetônicos, passando por
designers que oferecem roupas e acessórios para os avatares e promoters que são responsáveis
pela organização das muitas festas dentro do metaverso.
Existem algumas iniciativas de dentro do Second Life que conseguem sair do
metaverso, virando verdadeiros modelos de negócio. Um desses exemplos é o Tringo, um jogo
desenvolvido pelo residente Kermit Quirk20, que assinou um contrato cedendo os direitos de
sua criação por um valor acima de USD 20.000 (Malaby, 2006).
Terdiman (2007) aponta algumas áreas em que os residentes conseguem auferir lucros:
moda, corretagem e desenvolvimento de terrenos, arquitetura e construção e sexo.
Em moda, várias boutiques oferecem roupas para uso dos avatares, incluindo novas
peles, sapatos, acessórios (tais como jóias e braceletes), além de outros complementares. Os
bens podem estar dispostos de modo visualmente acessível ou então através de uma tela, em
que o usuário aperta alguns botões para ver as fotos dos produtos, como em um slide show –
tal mecanismo é usado para aumentar o número de bens oferecidos na loja.
O usuário interessado em algum item clica em cima dele e seleciona a opção de
compra. Automaticamente o item passa para o seu inventário e a quantia correspondente é
debitada de forma automática na sua conta e transferida para o vendedor.
Tal mecanismo permite que os produtos estejam disponíveis 24 horas por dia, mesmo
com a ausência do proprietário; o processo é completamente automatizado. Contudo, existem
lojas que contratam vendedores para oferecer produtos aos clientes e sanar dúvidas, tal como
em uma loja física.
Em relação à corretagem e desenvolvimento de terrenos, existem diversos usuários que
oferecem este tipo de serviços.
O proprietário pode colocar seu terreno diretamente à venda, para um terceiro, mas
20 Nome do avatar.
87
para determinados tipos de terrenos mais caros existem corretores que indicam as melhores
opções para os clientes.
Existe uma variedade de terrenos nas mais diversas localizações dentro da grade do
Second Life. A localização e vizinhança são fatores importantes, sendo as regiões particulares
bastante procuradas por aqueles que desejam estabelecer uma residência em lugares
tranqüilos e livres de visitantes indesejados.
Nestas ilhas muitas vezes são desenvolvidos condomínios. O proprietário pode
contratar um terceiro para realizar o trabalho paisagístico e de construção das residências,
sendo que o modelo de negócios geralmente gira em torno do aluguel em base semanal. De
fato, a economia do Second Life tem um ciclo semanal, não mensal.
Em outros terrenos, os proprietários podem desenvolver empreendimentos comerciais,
como shopping centers e clubes, neste caso alugando para comerciantes as áreas respectivas.
Cada aluguel tem uma espécie de mini-contrato, no qual são especificadas as restrições da
área bem como a quantidade máxima de prims, unidade básica de construção, que podem ser
utilizadas naquele espaço.
No campo da arquitetura, existe uma gama de residentes que são exímios construtores
de modelos em 3D, perfazendo casas, prédios e estruturas muito admiradas. Em muitas
situações, contrata-se uma equipe de construção, constituída por um builder (alguém
responsável pelo desenho e concepção arquitetônica), um scripter (que irá acrescentar
programas ao modelo), um decorador (que irá procurar móveis e acessórios para o projeto) e
um paisagista (responsável pelo conceito de jardins, árvores e água ao redor da construção).
Os valores, dependendo do projeto, são acertados diretamente em dólares americanos,
podendo ser pagos via PayPal21 ou outro mecanismo de compensação monetária.
No que se refere ao sexo, assim como no mundo físico, existe uma forte indústria
dentro do Second Life, que compreende desde garotas de programa para sexo virtual, clubes
para swing e, por que não, locais para relacionamento sexual entre avatares.
Por mais estranho que pareça, existem muitas pessoas que pagam valores até acima de
L$1000 por hora com uma garota de programa, que os acompanha a eventos sociais dentro do
metaverso.
Há uma rede complementar de lojas que vendem acessórios para o sexo, como camas
programadas com scripts específicos de posições do Kama Sutra, instrumentos de fetiche
dentre outros objetos análogos.
21 O PayPal é um popular meio de pagamento online, que serve como uma espécie de identidade financeira na
Internet.
88
Alguns casais que casaram no Second Life, por exemplo, acabaram casando no civil
enquanto outros casais “reais” acabaram se separando por supostas traições ocorridas dentro
da plataforma (Alter, 2007).
Criou-se também, além destas empresas dentro do Second Life, uma gama de
consultorias físicas destinadas a realizar estratégias de entrada e monetização em mundos
virtuais, notadamente voltadas para grandes empresas.
A Millions of Us, agência de mídia social criada por Reuben Steiger, presta serviços de
consultoria para empresas que desejam ter algum tipo de campanha voltada para redes sociais,
já tendo realizado projetos para corporações como Coca-Cola, Sony, Microsoft e Nike.
A Electric Sheep Company tem o mesmo escopo, tendo em seu portfólio empresas
como MTV, Intel, Yahoo (Terdiman, 2006).
2.6.5 Sucesso e fracasso das iniciativas dentro do Second Life
Aproximadamente 90% das iniciativas de empresas “reais” dentro do Second Life
falharam em um período de 18 meses, de acordo com um estudo da Gartner (Gonsalves, 2008).
Alguns comentadores identificam as prováveis causas deste fracasso:
“No Second Life, os mesmos princípios se aplicam: as companhias devem
descobrir produtos que são úteis para as atividades do Second Life. E esses
produtos não são, necessariamente, os mesmo que os da vida real.” (Saiman,
2008)
De acordo ainda com o estudo da Gartner (Gonsalves, op.cit.):
“Muitos projetos são abandonados devido à falta de objetivos claros e uma
compreensão limitada da demografia, comportamento e expectativas das
comunidades dos mundos virtuais”.
E continua:
“Elas [as empresas] precisam perceber que os mundos virtuais marcam a
transição das páginas Web para os lugares Web e que uma presença virtual
bem-sucedida começa com pessoas. Gráficos e comportamentos realistas
89
contam muito pouco exceto se esta presença é valorizada através da
participação de um grande conjunto de pessoas”.
Um dos objetivos da pesquisa desta dissertação é investigar, do ponto de vista do
usuário, aquilo que ele percebe como importante em um ambiente como o Second Life.
2.7 Pesquisas sobre o “virtual”
Algumas pesquisas abordaram diversos aspectos relacionados ao usuário de ambientes
virtuais, mais especificamente o metaverso, em seus mais variados matizes. Opta-se, nesta
pesquisa, pela utilização de uma linha lógico-narrativa baseada na proposta de Steve Dietz
(2002), dos dez sonhos de tecnologia.
2.7.1 Simbiose e a interface
Nomenclatura proposta por Joseph Licklider(1960, além de Licklider & Taylor, 1968), a
simbiose reflete um estágio de vivência com as máquinas, no qual o indivíduo está de tal forma
conectado a estas mídias que é impossível dissociá-lo desta infra-estrutura.
Anderson (2003, 537) explora do seguinte modo o tema:
“Simbiose significa interação entre dois organismos para o benefício mútuo
de ambos. A interação entre uma bactéria intestinal que ajuda o organismo
na digestão de sua comida, e o organismo que fornece uma fonte contínua
de alimento para a bactéria, é um exemplo bastante citado. Muito do debate
atual relaciona-se com a simbiose presente ou potencial das pessoas e
máquinas inteligentes, talvez levando à emergência de novos seres com um
novo sentido do 'eu', identidade e limites pessoais”
Neste campo, são estudadas as novas formas de trabalho que surgem através do
relacionamento humano com as máquinas (e, muitas vezes, mediado pelas máquinas).
Conforme visto nos primeiros capítulos, a história registra um desenvolvimento das
tecnologias de comunicação voltadas para a redução da distância entre os indivíduos, como o
caso do telefone, que possibilitava uma comunicação bidirecional. Contudo, as novas
90
tecnologias tiveram conseqüências no comportamento social, alterando muitas vezes a forma
como os indivíduos se percebiam.
Desde exemplos mais simples, como a alteração nos preços dos imóveis comerciais com
a invenção dos elevadores modernos (os mais acima passaram a valer mais que os térreos), a
tecnologia serve como um fator determinante de mudanças sociais.
A simbiose pode ser estudada através das alterações nas interfaces de relacionamento
entre as máquinas e as pessoas.
2.7.2 As análises filosóficas
Em “The question concerning technology”, Martin Heidegger (1966) oferece um
estudo filosófico da matéria, identificando o relacionamento entre a essência da tecnologia e
idéia de revelação. A tecnologia seria, então, uma forma de revelação. Neste sentido, o
filósofo observa as raízes etimológicas do termo, expondo que a techné não só se relaciona às
atividades do artesão como também às artes, sendo, portanto, também parte da poiesis.
Para Heidegger, nem a perspectiva antropológica (a tecnologia como uma atividade
humana dentre várias) ou a instrumentalista (como um meio para um fim que pode ser
calculado e controlado pela consciência humana) são representativas da essência da
tecnologia moderna (Smith, 1991). Esta seria, em última análise, o ponto alto da metafísica.
A análise de Castro complementa (2005, 45):
“(...) as novas tecnologias da informação e da comunicação devem ser
repensadas como objetos de arte. Sua natureza de engenho de
representação deve ser reavaliada segundo princípios de arte há muito
tempo denegrida, a retórica. Um engenho de representação informacionalcomunicacional, desenhado segundo esta arte da expressão efetiva de teses,
não deveria se preocupar tanto com a produção de efeitos, ou com a simples
reprodução de verossimilhanças imaginárias. Sua possibilidade de re-velar a
verdade, reconhecida sua identidade enquanto plena expressão da essência
da técnica moderna, a com-posição, vai depender de que modo esta arte do
passado, a retórica, será apropriada no dar-se e propor-se da informática.”
Ser-no-mundo é outro conceito Heideggeriano que tem sua relevância para a presente
91
análise. Ser, no sentido de Heidegger, é um infinito de possibilidades, com forte base na idéia
niilista; ser-no-mundo representa essa miríade de possibilidades, num desdobramento das
idéias contidas tanto em Kierkegaard quanto em seu mestre, Husserl.
Na mesma linha de pesquisa, Michael Heim (1993) oferece uma justaposição entre
Martin Heidegger e Marshall McLuhan, no que chama de “o computador como um
componente”.
Em 1972, Robert Dreyfus observa que a partir da metade do século XX, houve a
tendência cultural de se interpretar o ser humano como um sistema de processamento de
informações. De modo diferente, Heidegger percebia os computadores como um componente
da cultura humana: a “tecnologia é, em essência, um modo da existência humana, e nós não
pudemos apreciar essa infiltração mental até que o computador se tornasse um fenômeno
cultural” (op.cit., 61).
McLuhan também possuía idéias semelhantes a Heidegger, notando que “a tecnologia
não leva as coisas antigas embora, mas as transforma” (op.cit., 65).
Jean Baudrillard (1991) traz a idéia de simulacro. Partindo da tradição clássica grega da
Filosofia, o autor traz para a contemporaneidade este conceito. O simulacro toma o lugar
daquele objeto que representa; a verdade, portanto, estaria sendo substituída pelos simulacros
, a ponto de haver um rompimento entre o verdadeiro e o falso.
Pierre Lévy (1996) identifica a oposição entre o real e o virtual como algo falacioso, que
leva a crer que o virtual referir-se-ia a uma ausência de realidade. De fato, para Lévy, a origem
etimológica da palavra virtual remete a “virtualis”, a “virtus”; virtual seria, portanto, aquilo que
existe em potência, não em ato.
Sendo assim, a virtualização opõe-se, teoricamente, à atualização, processo de
“criação, invenção de uma forma a partir de uma configuração dinâmica de forças e de
finalidades” (op.cit., 16). Virtualização poderia, então, ser definida como “o movimento inverso
da atualização”, uma passagem do “atual ao virtual, uma 'elevação à potência' da entidade
considerada” (op.cit., 17).
Passando pelas técnicas utilizadas na comunicação humana, Lévy (1993) faz uma
analogia entre a massificação dos livros e a dos computadores; os primeiros tiveram que
reduzir de tamanho e custo para que atingissem o grande público, de modo conexo aos
computadores.
O autor também identifica algumas características que tornariam uma navegação mais
92
amigável22, como a representação icônica das informações e comandos, uso de um mouse,
menus e telas de alta resolução.
Navegar, por si só, é o efeito de uma abordagem hipertextual, algo não-linear (idem,
ibidem). Da mesma forma que algumas décadas antes Vannevar Bush (1945) já antecipara a
navegação hipertextual, Lévy também observa: “a memória humana é estruturada de tal forma
que nós compreendemos e retemos bem melhor aquilo que esteja organizado de acordo com
relações espaciais” (Lévy, 1993, 40).
Na sua análise sobre a interatividade, Lévy (1999) apresenta um quadro-resumo das
várias possibilidades de comunicação interativa no ciberespaço.
Os estudos atuais sobre o metaverso se localizam na coluna de “implicação do
participante na mensagem”, podendo passar pelos vários tipos de dispositivos de
comunicação.
22 Notar que o autor escreve tais observações em 1990 (na edição francesa original), época em que ainda
existiam muitos comandos de texto para o controle do computador.
93
Os diferentes tipos de interatividade (Lévy, 1999)
Relação com a mensagem
Dispositivo de comunicação
Interrupção e
Mensagem linear
reorientação do fluxo
não-alterável em tempo
informacional em tempo
real
real
Difusão unilateral
Imprensa
Rádio
Televisão
Cinema
Diálogo,
reciprocidade
Correspondência postal
entre duas pessoas
Diálogo entre
vários participantes
Implicação do
participante na
mensagem
- Bancos de dados
- Videogames com um
multimodais
só participante
- Hiperdocumentos fixos - Simulações com imersão
- Simulações sem
(simulador de vôo) sem
imersão nem possibilidade
modificação possível
de modificar o modelo
do modelo
Telefone
Videofone
Diálogos através de
mundos virtuais,
cibersexo
- Teleconferência ou
videoconferência com
- RPG multiusuário
vários participantes
no ciberespaço
Hiperdocumentos
- Videogame em
- Rede de
abertos acessíveis
“realidade virtual”
correspondência
online, frutos da
com vários participantes
- Sistema das publicações
escrita/leitura de uma
- Comunicação em
em uma comunidade de
comunidade.
mundos virtuais,
pesquisa
- Simulações (com
negociação contínua
- Correio eletrônico
possibilidade de atuar
dos participantes sobre
- Conferências eletrônicas
sobre o modelo) como de
suas imagens e a
suporte de debates em imagem de uma situação
uma comunidade
comum
2.7.3 Imersão e presença
Klainbaum (2006, 4) define imersão como “ a extensão na qual os atributos físicos de
um meio envolvem os sentidos de um indivíduo”, enquanto a pesquisa de Brown e Cairns
(2004) indica que, para os usuários de jogos, o conceito é relacionado com o grau de
envolvimento do indivíduo no ambiente virtual.
Zahorik e Jenison (1998) chegam a uma proposta baseada tanto nos trabalhos de
Heidegger quanto de Gibson acerca do conceito de presença, considerando que equivaleria à
ação corretamente suportada no ambiente, enquanto Lee (2004, 37) propõe a definição como
“um estado psicológico no qual os objetos virtuais (para-autênticos ou artificiais) são
experimentados como objetos atuais de modos tanto sensoriais como não-sensoriais”.
Dede (1995, 50) nota:
“Induzir a imersão envolve dar poder ao participante em um ambiente virtual
para iniciar ações que terão conseqüências novas, diferentes. Por exemplo,
quando um bebê está aprendendo a andar, o grau de concentração que esta
atividade cria na criança é extraordinário. Descobrir novas capacidades que
definem o ambiente de uma pessoa é altamente motivante e tem como
condão focar as atenções.”
No meio artístico, a imersão é um objetivo relativamente antigo (Grau, 2007), tanto
que sempre foi utilizada da mais alta tecnologia disponível à época para simular ambientes e
“jogar” o indivíduo em uma sensação de estar naquela pintura ou paisagem. Os panoramas
seriam um exemplo desta obstinação artística, assim como a construção de numerosas salas
com pinturas refletindo outros ambientes (como a Chambre du Cerf, no palácio papal de
Avignon).
Dietz (2002) nota os trabalhos de Charlote Davies, notadamente Osmose, em que o
indivíduo “navega” por um ambiente completamente gerado por computador, como exemplos
de tentativas artísticas de imergir o indivíduo em ambientes virtuais. Vários desenvolvimentos
tecnológicos, como os HMDs e a navegação através de interfaces “naturais” com o corpo são
significativos desta vontade de imersão (Grau, 1999).
Através da retrospectiva das artes, tem-se a presença de vários movimentos que
95
tentaram subverter a ordem clássica, unilateral de emissão de uma mensagem, com o objetivo
de incluir o participante na experiência.
As primeiras manifestações do Fluxus, por exemplo, denotam esta característica. Os
Happenings mudam a tradicional localização do indivíduo, que era meramente um espectador,
para uma tentativa de participação mais ativa, às vezes até necessária para consecução da obra
de arte.
A imersão, nesse caso, manifesta-se em sua vertente psicológica, social, fazendo com
que o espectador participe de um evento que, em outras situações, não estaria apto ou mesmo
a ele não seria permitido.
É inegável que os movimentos artísticos ao longo das últimas décadas alteraram
profundamente não só o conceito de arte mas também o papel do indivíduo frente ao
fenômeno estético considerado.
A emergência de novas mídias digitais levou a outro nível o sonho da imersão (Dietz,
2002). Com os trabalhos dos novos artistas digitais, conceitos como distância e tempo foram
trabalhados de modos até então diferentes do habitual.
A participação do indivíduo é agora possibilitada através dos meios digitais que, de
modos diversos, permitem inclusive uma participação (e, de igual modo, uma construção)
coletiva da obra de arte e do ambiente virtual, conforme percebe-se em Osmose, de Charlotte
Davies.
Os conceitos relacionados à imersão e à presença são bastante diversos e controversos.
Para a finalidade desta pesquisa, o conceito de Kleinbaum (2006) sobre imersão, embora
simples, será utilizado com base teórica. Da mesma forma, a proposta de Lee (2004) sobre
presença será adotada.
2.7.4 Personalidade em ambientes virtuais
Neste campo destacam-se as pesquisas de Sherry Turkle, do MIT. Há mais de duas
décadas pesquisando sobre o comportamento dos indivíduos em ambientes virtuais, a
professora Turkle realizou algumas investigações que servirão de base para essa pesquisa.
Segundo Turkle (1995), nos ambientes virtuais co-existem vários níveis de
personalidade, ou melhor, várias personalidades em si, dentro de um mesmo indivíduo,
transformando-se num “eu-distribuído”.
Tal característica é potencializada pela possibilidade de manutenção de múltiplas
96
janelas de abertas na área de trabalho, significando diversos caminhos para que o indivíduo
realize sua jornada através dos mundos virtuais.
Nos chamados MUDs (Multi-User Dungeons), versões antigas dos atuais MMORPGs, a
pesquisadora encontrou uma diversidade de personalidades à disposição dos jogadores; ao
mesmo tempo poderiam ser bruxos maldosos em um jogo enquanto noutra janela eram
empregados de alguma firma de contabilidade realizando as tarefas cotidianas do trabalho.
No lugar de conflitos psicológicos, essas “múltiplas personalidades” convivem em um
regime de locais distintos para seu exercício. Tal dinâmica será relevante também para a
escolha do meio apropriado para a expressão, como um blog23, um e-mail, um sítio, um mundo
virtual, dentre vários possíveis.
Mas, ao mesmo tempo que os indivíduos aprendem a trabalhar com os computadores,
estes também estabelecem uma mudança na forma de pensar (Turkle, 2004; Lévy, 1993, 2842), que passa a incorporar elementos de uma lógica tradicionalmente binária, refletidos na
utilização de verbos como “deletar” e “inicializar”.
De certo modo, tal fenômeno já havia se incorporado na cultura através da cibernética
de primeira ordem24, até hoje sendo sentidos os efeitos na Administração com a Teoria dos
Sistemas de Informação e o uso de expressões como “feedback”, que pressupõem uma relação
de semelhança entre humanos e computadores.
Riva e Galimberti (2001) apontam que a única forma de entender a experiência virtual
seria analisando os sujeitos envolvidos na mesma, no ambiente em que se encontram, o que
denota o papel importante do contexto social da experiência.
Talamo e Ligorio (2001, 112) também seguem ponto de vista semelhante, em sua
pesquisa sobre a rede social “Euroland”:
“Em ambientes virtuais, cada participante tem um rico 'repertório' de
identidades possíveis, mas cada pessoa também carrega a sua própria história
e os múltiplos 'eus' na interação. (...) As pessoas escolhem quais aspectos das
suas identidades e da dos outros dirigirão seu foco.”
23 Neste sentido, Slade (2007).
24 A cibernética de primeira ordem, conforme observada em Wiener (Gere, 2002; Grau, 2007), caracteriza-se
pela idéia da auto-regulação, em decorrência da qual a previsibilidade seria conseqüência natural, mantendose um equilíbrio nos sistemas observados. A cibernética de segunda ordem, de acordo com Kujawski (2008),
relaciona-se mais com a idéia de auto-organização, imprevisibilidade decorrente e uma posição mais ativa do
participante, perfazendo sistemas em um estado diferente do equilíbrio. Nas palavras de Kujawski (op.cit.),
“na cibernética de segunda ordem, a relação causal não é linear, podendo o efeito dar origem a uma causa, e
assim sucessivamente, numa série de eventos recursivos aninhados”.
97
Na pesquisa de Bailenson et. al. (2003) foi percebido que indivíduos replicam
determinados padrões físicos de distância interpessoal em ambientes virtuais, o que pode ser
um indicativo da transliteração de comportamentos entre os ambientes reais e virtuais,
principalmente quando se envolve uma representação gráfica do indivíduo, como no
metaverso. Tal comportamento pode, de igual modo, ser significativo de diversas práticas
sociais e de criação hierárquica e de espaços, o que abriria a possibilidade da inclusão da
variável cultural para o estudo destes comportamentos no metaverso.
Slater e Usoh (1993) propõem que a representação virtual do corpo (o que, no caso
presente, poderia ser relacionado com o avatar), tem algumas funcionalidade na percepção do
indivíduo:
➢
é a representação do “eu”;
➢
é provavelmente um fator que aumenta a sensação de presença;
➢
é o fundamento de um modelo para interação centrada no corpo;
➢
é um meio de comunicação com outros em ambientes compartilhados (multi-usuários);
Messinger et al. (2008) apresentam uma hipótese de pesquisa na qual propõem que os
padrões utilizados pelos indivíduos na construção dos avatares (na criação 'física', da imagem
percebida pelo grupo social) seguem, geralmente, as características físicas do “mundo real”,
com pequenas alterações. Tal hipótese, contudo, ainda não foi testada.
No estudo das alterações comportamentais, notadamente em crianças e adolescentes,
causadas por jogos, a literatura é geralmente inconclusiva, devido à grandes diferenças no que
se refere às várias categorias possíveis para definir violência, embora haja alguma evidência da
existência de algum tipo de alteração, ao menos no curto prazo (Griffiths, 1999).
Chee et al. (2006) identificam que as representações em jogos seriam mais relacionadas
à vontade de comunicar-se que propriamente a uma sensação de “escapar25”, havendo uma
forte relação entre os mundos online e offline.
Suler (2002) propõe cinco fatores que interferem na forma como as pessoas navegam
no ciberespaço:
a) nível de dissociação e integração: a forma com que as múltiplas facetas da personalidade do
25 Ou seja, um indivíduo usaria o mundo virtual como uma espécie de fuga deliberada da realidade.
98
indivíduo se manifestam nos diferentes ambientes (tanto online quanto offline) e o modo como
essas percepções se integram;
b) valência do positivo e do negativo: a questão dos valores, da divisão entre o bom e o ruim,
no ciberespaço, é algo muitas vezes ambivalente;
c) nível de fantasia e realidade: em muitos casos, os próprios ambientes virtuais “encorajam” a
utilização de características fantásticas, como no caso dos MUDs (e MMORPGs), ou então algo
mais ligado à percepção “real” do indivíduo, como um grupo acadêmico de e-mails;
d) grau de controle e consciência no ciberespaço: muitas pessoas incorporam suas
representações no ciberespaço, fenômeno observado principalmente com jogadores de
MMORPGs;
e) mídia utilizada: dependendo desta escolha, algumas características podem aumentar a
sensação de fantasia ou realidade, além de influenciar diretamente na experiência de imersão;
A combinação dos elementos presentes nesses cinco fatores seria responsável pela
percepção da personalidade no ciberespaço. Suler (op.cit.) inclusive acrescenta questões sobre
a utilização de alguns tipos específicos de suportes à mídia, como áudio e vídeo, e a influência
destes no aspecto da identidade enquanto representação fantástica em um ambiente virtual.
Por fim, são muitas as possibilidades de compreensão do fenômeno das identidades
dentro de ambientes virtuais, mas parece haver certa congruência na Literatura pesquisada no
sentido de considerar que não existe uma divisão rígida entre o mundo “real” e o “virtual” e
que, mesmo quando existindo tal diferença no nível do discurso, é inegável a interconexão
entre as mais diversas facetas da personalidade de um indivíduo.
2.7.5 Migração e percepção de espaço
Migração é o nome dado em sistemas quando alguém muda de um determinado
ambiente operacional para outro: 'fulano' migrou do Linux para o Windows, ou então 'ciclano'
migrou para um novo software de gestão.
Do ponto de vista do comportamento do indivíduo nos ambientes virtuais, a migração
tem uma importância em um grau diferente. Castronova (2005a) argumenta que a migração
para os mundos virtuais se dá, principalmente, porque as pessoas acham um lugar interessante
e divertido.
Embora possa parecer relativamente simplista esta definição, a idéia por trás da mesma
99
é simples: os ambientes virtuais se tornam meras opções de convivência que um indivíduo pode
escolher, tendo como uma das alternativas a própria vida física (embora não sejam exatamente
experiências mutuamente excludentes ou mesmo sem qualquer tipo de inter-relação).
O processo de entrada em um ambiente virtual como o metaverso pode se revelar
razoavelmente complicado (conforme explicitado anteriormente neste trabalho), exigindo um
período de aprendizado que pode, muitas vezes desanimar o indivíduo.
Na literatura sobre jogos, Taylor (2006) nota que uma vez passada esta fase inicial de
adaptação, o jogo se mostra como uma narrativa em construção, na qual a participação do
jogador tem efeitos no mundo ao seu redor.
Há uma espécie de incentivo para a manutenção nesse espaço virtual, incentivo o qual
provém fundamentalmente de dois fatores: a aquisição do conhecimento necessário para a
navegação no espaço e a criação de laços sociais.
Neste caso, a criação de redes sociais , que ligam os participantes a essa nova narrativa
é um dos fatores de incentivo, criando uma espécie de “capital social” (Blanchard e Horan,
1998).
Neste processo de migração e percepção do espaço imagético virtual, muitas vezes
existem correlações entre a vida “real” e a vida “virtual”; alguns usuários têm costume de
apresentar justificativas para ausências prolongadas tais como “ocupado na RL” (real life).
A pesquisa tentará investigar o processo de migração para a plataforma do Second Life,
identificando as principais razões que motivaram os usuários.
Vale ressaltar que, para a literatura referente ao metaverso, a idéia de migração adota
sentido diferente da mera adoção de um sistema.
Conforme Castronova (2005a), o processo de migração para um mundo virtual26
envolve não apenas adotar uma nova tecnologia, mas todo um processo de adaptação social,
psicológica, política e econômica. O sentido da migração é mais parecido com o da mudança
para um outro país que propriamente a mera adoção de uma plataforma.
2.8 Conclusão
Após todas as cronologias, relatos históricos, pesquisas acadêmicas e outras fontes
apresentadas, resta a pergunta: como relacionar todos esses conceitos e trabalhar em prol de
uma modelagem que seja útil para a pesquisa do fenômeno estudado?
26 O autor usa a nomenclatura “mundos sintéticos”.
100
Há uma razão para a extensão desta revisão de literatura, passando por temas
aparentemente tão díspares quanto mídia, tecnologia e arte. A tese – que já deve ter sido
percebida – é que o metaverso (e aí se inclui o Second Life como espécie) tem esses três
componentes em sua gênese.
Mídia, tecnologia e arte. A plataforma é uma mídia, possibilitada através de uma
tecnologia de comunicação que é a Internet27, cuja ideologia principal é oriunda da ficção
científica, descendente diretamente do gênero cyberpunk.
Quando, em 1992, Neal Stephenson escreveu pela primeira vez sobre o metaverso, ele
estava antecipando um desenvolvimento que viria a acontecer anos após. É recorrente que
muitos teóricos e visionários da tecnologia tenham idéias muito tempo antes que estas sejam
tecnologicamente possíveis.
Desde as primeiras observações de Ada Lovelace, passando por Aldous Huxley e
George Orwell; Vannevar Bush coloca a semente do atual sistema hipertextual ainda em 1945.
Joseph Licklider explora o tema da conectividade alguns anos após. Ivan Sutherland cria
interfaces de manipulação em computadores que somente décadas após foram desenvolvidas
e utilizadas em larga escala (como o Sketchpad, com seus controles diretamente no gráfico em
tela).
Em Metropolis, Tempos Modernos e 1984 (respectivamente, 1927, 1936 e 1948) já
aparecem máquinas de comunicação muito semelhantes às atuais videoconferências – sendo a
sua versão mais sinistra a teletela, de Orwell, desenhada especificamente como aparato de
vigilância constante do Big Brother.
A arte pode, conforme sugeriu McLuhan (2007[1964], também Gere, 2002), servir
como um early warning para a sociedade sobre aquilo que está mudando.
Nesta seção será realizado o fechamento da revisão de literatura, apresentando a
pergunta da pesquisa e ligando o que foi apresentado em dimensões para propiciar a pesquisa
de campo.
2.8.1 – Arte e mídia: rastreando as origens do metaverso
Vários aspectos foram analisados na revisão de literatura empreendida até aqui,
principalmente no que se refere às origens culturais do metaverso; é a primeira pergunta e faz
parte dos dois primeiros objetivos desta pesquisa.
27 Além, claro, dos “periféricos” como hardware, software, linhas de transmissão de dados, etc.
101
Elencaram-se as principais características observadas através da revisão de literatura
sobre os caminhos tomados pela atividade artística, notadamente no último século (XX).
Percebe-se que há uma tendência, que fica evidenciada principalmente com as obras
participativas do Fluxus, em deslocar a participação do usuário de um pólo passivo, conforme
tradicional nas artes clássicas, para uma posição mais ativa, não só na compreensão da obra
como também na sua construção.
Certas obras de Duchamp, por exemplo, ao causarem um choque inicial, mostrando
objetos cotidianos como arte, levam o indivíduo a pensar sobre o papel da arte em si, criando
questionamentos estéticos e de cunho valorativo. É necessária, para aquele que analisa a arte
moderna e contemporânea, uma certa dose de crítica e abstração, exatamente um dos efeitos
pretendidos por muitos artistas.
Conforme observa Arantes (2005, 34):
“Não se trata mais de erguer um espaço metafórico, ilusionista, no qual uma
janela parece abrir-se recortando um 'pedacinho do mundo', e sim de
incorporar a obra no espaço real e de emprestar a esse espaço, pela aparição
da obra, atenção especial. A obra sai da tela para adentrar o espaço real,
vivenciado principalmente pelo espectador.”
Ou, conforme o próprio Walter Benjamin (1992, 97) já havia notado, “a diferença entre
autor e público está prestes a perder o seu caráter fundamental”.
Outra característica interessante é o uso da arte (no caso, através das novas mídias
disponíveis à época) como instrumento de ilusão, voltada à manipulação sensorial do tempo e
do espaço.
Enquanto Muybridge, ao criar a fotografia seriada, consegue separar o tempo em
partes individualmente analisáveis através de um sentido no todo, outros artistas vão em
direções diversas, como as obras que trabalham com o conceito de retardo de tempo e mesmo
de presença, como as de Nauman e Nam June Paik.
Se em Metropolis o ser andróide (no caso, a mulher) foi utilizado eminentemente para
enganar as massas, Tempos Modernos apresenta uma crítica mais ligada à crescente
incorporação na sociedade humana de uma cultura industrial, em que as máquinas controlam
os movimentos dos homens.
A tecnologia tem um papel bastante crítico em 1984, de Orwell, sendo utilizada num
102
sentido de suporte ao domínio político de uma corrente sobre uma população. Tal temática
encontra ressonância principalmente na obra dos pós-estruturalistas, notadamente Michel
Foucault e Gilles Deleuze.
Ao analisar as instituições disciplinares, como as prisões, fábricas, hospitais, colégios,
dentre outras, Foucault (1987, 173) nota:
“Duas imagens, portanto, da disciplina. Num extremo, a disciplina-bloco, a
instituição fechada, estabelecida à margem, e toda voltada para funções
negativas: fazer parar o mal, romper as comunicações, suspender o tempo.
No outro extremo, com o panoptismo, temos a disciplina-mecanismo: um
dispositivo funcional deve melhorar o exercício do poder tornando-o mais
rápido, mais leve, mais eficaz, um desenho das coerções sutis para uma
sociedade que está por vir.”
A importância de Foucault para os estudos em Administração é demonstrada pela
análise empreendida por Burrell (1988), que chama atenção para o avanço das tecnologias da
informação e comunicação. O panóptico idealizado por Bentham, para o autor, pode ser
encontrado atualmente nas complexas redes sociais viabilizadas pela informática.
Nesse ponto, a tecnologia pode ser, efetivamente, um conglomerado de técnicas e
ideologias desenhadas para o domínio do ser humano, conforme proposto nas obras de Orwell
e Huxley.
Por outro lado, retorna-se à pergunta: o que é ser um humano?
Se a tecnologia está, através das novas mídias e formas de comunicação, possibilitando
o aparecimento de redes sociais cada vez mais complexas, que misturam o indivíduo e uma
rede “virtual”, ela levanta questionamentos acerca do significado da existência humana.
Parece, nesse caso, que se volta à dúvida inicial de Descartes, que deu origem ao
célebre conceito do “penso, logo existo”:
“(...) examinando com muita atenção o que eu era e concluindo que
podia ou não fingir não ter corpo e não havia mundo ou lugar em que me
encontrasse, mas, ao mesmo tempo, não podendo fingir não existir, sendo
bastante o fato de duvidar da verdade das outras coisas para ficar
demonstrado, de modo muito certo e evidente, que eu existia, enquanto que
103
bastaria deixar de pensar, ainda que admitindo como verdadeiro tudo que
imaginasse, para não haver razão alguma que me induzisse a acreditar na
minha existência, concluí de tudo isto que eu era uma substância cuja
essência ou natureza reside unicamente em pensar e que, para que existe,
não necessita de lugar algum nem depende de nada material, de modo que
eu, isto é, a alma, pela qual sou o que sou, é totalmente diversa do corpo e
mesmo mais fácil de ser reconhecida do que este e, ainda que o corpo não
existisse, ela não deixaria de ser tudo o que é”. (Descartes, 2000[1637], 67)
O título oficial de Blade Runner, contudo, já oferece uma contestação sutil ao cogito
cartesiano: Do androids dream of electric sheep?.
Em um ambiente no qual o virtual acaba se tornando mais um espaço de atuação
possível (Turkle, 1995) e que os mundos virtuais28, na visão de Castronova (2005a), se
assemelham à “realidade” em vários aspectos para que sejam uma alternativa possível ao
“mundo real”, a pergunta quase retórica acerca do que seria o humano volta à tona.
A arte contemporânea, principalmente nas manifestações com suporte em mídias
eletrônicas, retoma essa pergunta.
Matrix explora essa temática, ao inserir o questionamento em um contexto pósapocalíptico, em que seres humanos seriam meramente “pilhas”, servindo às máquinas
enquanto vivem uma alucinação coletiva produzida para mantê-los dóceis e submissos,
ignorantes do real estado de escravos que são.
Ao contrário de Matrix, contudo, Neal Stephenson (1992) apresenta o metaverso como
um mundo alternativo, embora também use explicitamente a idéia de “alucinação coletiva”, na
qual pode-se entrar e sair, adotando diversas identidades entre o “real” e o “virtual”.
Assim, percebe-se que ao longo dos anos a arte vem oferecendo à humanidade vários
insights sobre eventuais caminhos que a tecnologia pode tomar, muitos deles transformados
em realidade.
A origem do metaverso, portanto, pode ser traçada neste contexto, sendo mais
relacionada a um produto cultural possibilitado através de tecnologia.
28 Castronova (2005) prefere a nomenclatura “mundos sintéticos”.
104
2.8.2 Retorno à pergunta inicial
A pergunta principal da pesquisa é “o que levaria alguém a usar algo como o
metaverso”?
A questão não é simples.
Ao longo das últimas décadas, diversas tecnologias foram implementadas, muitas sem
sucesso comercial, ainda que tecnicamente superiores, como o caso emblemático do Betamax,
citado à exaustão em cursos de MBA. Ou então o Apple Newton, em 1993. Questão
semelhante é atualmente discutida em áreas como a TV Digital.
O uso do metaverso, assim como o dos MMORPGs, é um ato ativo do indivíduo,
considerando que não existem computadores no mercado que sejam pré-instalados com
plataformas do estilo Warcraft, The Sims Online ou mesmo Second Life.
Sendo um ato que depende da sua exclusiva motivação para comprar o software (ou
realizar seu download), quais são os fatores que influenciam nesse processo e qual o seu grau
de participação na decisão final, tanto do uso quanto do não uso?
Será montada uma matriz de amarração para subsidiar a ida a campo para tentar obter
informações que possam levar a uma resposta.
2.8.3 Matriz de amarração
De acordo com a proposta metodológica de Mazzon (1981, apud Telles, 2001), tentouse montar uma matriz de amarração conceitual, para explicitar o caminho da pesquisa e sua
relação com as perguntas e métodos relativos.
Após a matriz de amarração serão detalhados os agrupamentos teóricos criados para a
presente pesquisa, iniciando-se com o quadro referencial da arte, mídia e tecnologia,
referente à primeira parte desta dissertação.
105
Objetivos da pesquisa
Questões da pesquisa
Modelo de pesquisa
Levantamento/Análise de dados
História
da mídia (c.1500-c.1950)
Realizar o levantamento dos
antecedentes históricos
do metaverso, incluindo as
áreas de arte, ciência e
tecnologia (AST, no Inglês)
História
da tecnologia (1800-)
Qual a origem cultural
do metaverso?
Identificar as origens do
metaverso no contexto
cultural e histórico
que culmina com o
cyberpunk
Compreender o comportamento
dos usuários deste sistema,
enquanto online, fornecendo
subsídios para o desenho
primário de um modelo
Identificar fatores recorrentes
de incentivo ao uso de
um metaverso
Desenvolver um esboço
de um possível modelo para
a compreensão do fenômeno
Dados secundários
- Análise histórica
Percepção artística acerca
da tecnologia
Características
do cyberpunk
Características
do metaverso
Dados secundários
- Análise histórica
- Análise da arte
(perspectiva pós-estruturalista)
Levantamento
de dados sobre
o Second Life
O que é a identidade
dentro do metaverso?
Por que alguém
participaria
um sistema de
realidade virtual
simulada?
Conceitos de
Identidade
virtual
Motivação de uso de plataformas
de realidade virtual simulada
Variáveis possíveis de uso posterior
em pesquisa sobre uso e adoção
de metaversos
Dados primários
- Pesquisa qualitativa (entrevista)
- Pesquisa qualitativa
(ciberetnografia)
2.8.2.1 – Uso e motivação para o uso
A utilização de sistemas de informação é tema bastante estudado, principalmente nas
últimas décadas, havendo vasta literatura sobre a adoção de novas tecnologias. Legris et al.
(2003) oferecem uma consistente revisão dos trabalhos no tema, tendo como foco a aplicação
do “Technology Acceptance Model”, de Fred Davis (1989).
No caso desta pesquisa, devido à natureza exploratória, serão considerados alguns
insights extraídos das várias pesquisas realizadas neste campo, principalmente no que se refere
às razões de uso de um sistema de informação. Tais entradas poderão ser úteis na confecção de
perguntas no questionário e também na formulação da proposta de um modelo, ao final das
entrevistas.
A maior parte da pesquisa realizada sobre o TAM apresenta um cunho eminentemente
de aplicação de sistemas de informação em ambientes empresariais. As referências aos dois
constructos (facilidade de uso percebida e utilidade percebida) é mais relacionada a uma
postura passiva, do indivíduo na condição de usuário (Turkle, 1995) e em um ambiente de
trabalho.
Utilidade
percebida
Variáveis
externas
Atitude
Intenção de
uso
Uso efetivo
Facilidade de
uso percebida
Ilustração 22: Modelo TAM, conforme Legris et al. (2003)
Os principais inputs do modelo TAM para esta pesquisa foram identificados nas
relações entre atitude e intenção de uso – além da facilidade de uso e intenção respectiva utilizando tais dados de modo reverso: o entrevistado já é usuário do sistema; sendo assim,
busca-se realizar uma retrospectiva dos porquês dessa utilização, de modo a montar um mapa
inicial das percepções e motivações que levaram ao uso da plataforma.
Para tanto, foram utilizados os artigos revisados por Legris et al. (op.cit.) que estudam
as relações entre: (a) facilidade de uso percebida/intenção de uso; (b) atitude/intenção de uso.
Apenas duas pesquisas exploraram ambas as relações.
Em Davis et al. (1989), foram analisadas reações de estudantes de MBA em relação a
um software de edição de textos, tendo dois momentos de aplicação dos questionários: o
107
primeiro, logo após uma introdução sumária (durando uma hora) ao software e outra ao final
do período de aulas do semestre.
Uma das conclusões que os autores chegam ao final é que, num contexto gerencial, a
facilidade de uso pode ser um determinante secundário das intenções para o uso dos sistemas.
Acredita-se que tal insight possa ser adaptado para ser usado no design do roteiro das
entrevistas.
Em Jackson et al. (1997), propõe-se que a atitude tem um papel de mediação, além do
efeito direto entre envolvimento com o sistema e intenção de uso. A pesquisa foi realizada, da
mesma forma que a anterior, com estudantes, referindo-se a softwares de edição de textos,
planilhas e banco de dados.
Contudo, é na literatura sobre jogos que se encontram referências mais próximas sobre
as motivações de uso de sistemas de certo modo análogos aos Second Life.
Csikszentmihalyi e Bennett (1971, 56) apontam:
“O que é importante aqui [no estudo] para a teoria social é que uma
realidade negociável que é sujeita a várias interpretações e requer um “eu”
(vida cotidiana) coexiste com uma realidade voluntariamente estruturada
sem requisitos referenciais (jogo). Em outras palavras, o tradicional conflito
teórico entre indivíduo e sociedade (ou monismo e dualismo) é irrelevante
para um indivíduo num jogo.”
Os jogos, enquanto atividades eminentemente voluntárias e destinadas a propiciar
algum tipo de satisfação ao indivíduo, apresentam motivações diferentes para a prática que
propriamente os softwares de produtividade analisados pelo modelo TAM, em ambientes
empresariais nos quais, em muitos, não havia a possibilidade de rejeitar seu uso.
A variável a ser utilizada neste estudo será relacionada aos hábitos de uso da Internet
(suporte da conexão com o metaverso) e de outros programas correlatos, notadamente redes
sociais.
Conforme apontam DiMaggio et al. (2001), o impacto da Internet na sociedade, assim
como de outras tecnologias de comunicação e informação, não é unidirecional, sendo seu
fluxo de influência uma construção constantemente em alteração, de acordo com parâmetros
culturais e políticos.
A utilização da Internet pode ser um fator que apresenta alguma relação preditiva com
108
o uso (ou seu potencial) de metaversos.
O uso da Internet é fenômeno já estudado pela Literatura, em campos distintos como
Marketing e Psicologia. Muitas referências são relacionadas a estudos sobre o padrão
compulsivo, patológico de uso da rede, considerando alguns heavy users como portadores de
uma doença psicológica.
Straub et al. (1995) apresentam uma compreensiva revisão de literatura sobre o tema.
Ponderam acerca da propriedade das medidas de uso baseadas em características objetivas
(horas de uso de um sistema medidas através de conexão, por exemplo) e subjetivas (descrição
ou identificação do usuário com determinada sentença ou idéia em uma escala Likert).
Para os pesquisadores, a medida de uso que é obtida através de critérios subjetivos
pode apresentar sérias distorções em relação à realidade. Alguns usuários que se enquadram
na categoria de “heavy” podem não ter essa percepção sobre si mesmos, e vice-versa. De todo
modo, tal classificação, mesmo com todas as ressalvas relacionadas à forma de coleta dos
dados (auto-declaração) pode ser útil para uma pesquisa exploratória.
Na mais recente edição da Campus Party, em São Paulo, o IBOPE realizou uma pesquisa
com os participantes para tentar traçar o seu perfil de uso da Internet, bem como das
ferramentas colaborativas (IBOPE, 2009).
87% dos entrevistados apresentavam algum tipo de perfil em site de relacionamento,
tendo o mesmo percentual dito que utilizam páginas wiki como fonte de informações sobre os
mais variados assuntos. As três vantagens mais citadas de tecnologias colaborativas são:
diversão (29%), desenvolvimento profissional (25%) e edução/ensino (24%).
Neste quadro, que pode indicar uma relação entre os chamados usuários pesados, mais
ativos da Internet e tecnologias (ou heavy users) e um potencial uso do metaverso, há o
interesse em saber como o usuário se percebe em relação ao uso da tecnologia para traçar
possíveis pesquisas futuras.
As dimensões para análise, no caso desta pesquisa exploratória, são as duas seguintes:
(1) percepção do uso de tecnologia em geral; (2) percepção do uso da Internet, Second Life e
redes sociais em geral.
2.8.2.2 O grupo identidade
Esta agrupamento representa as tentativas de se explicar a questão da identidade em
ambientes virtuais.
109
Constructo identidade
Autor
Idéia principal utilizada
#
Turkle (1995)
Coexistência de “várias personalidades”, “eu distribuído”.
1
Lévy (1993)
Alteração do modo de pensar com a informática.
2
Bailenson et al. (2003)
Replicação de distâncias físicas em ambientes virtuais.
3
Slater & Usoh (1993)
Papel do avatar na percepção do indivíduo.
4
Messinger et al. (2008)
O avatar teria características muito similares às físicas,
com apenas pequenas alterações (hipótese).
5
Griffiths (1999)
Relação dos jogos com a violência.
6
Suler (2002)
Cinco fatores de influência: dissociação, valência, fantasia,
controle e consciência, mídia.
7
Chee et al. (2006)
Uso mais relacionado à vontade de se comunicar que a
uma intenção de escape da realidade.
8
Riva & Galimberti (2001)
Análise da personalidade em ambientes virtuais é
fortemente relacionada a este contexto social.
9
Talamo & Ligorio (2001)
Multiplicidade de “eus”.
10
2.8.3.3 O agrupamento imersão, presença e migração
Este agrupamento combina todas as contribuições conceituais dadas pelos mais
diversos autores no que se refere à imersão em ambientes virtuais, além do significado de
presença e dos fatores de migração para o ambiente online.
110
Imersão e presença
Autor
Idéia principal utilizada
#
Klainbaum (2006)
Imersão é a extensão na qual os atributos físicos
de um meio envolvem os sentidos de um indivíduo
1
Brown & Cairns (2004)
Imersão é relacionada com o grau de envolvimento
do indivíduo no ambiente virtual.
2
Zahorik & Jenison (1998)
Concepção heideggeriana de presença-no-mundo.
3
Lee (2004)
Objetos virtuais experimentados como atuais.
4
Dede (1995)
Relação entre a imersão e o “enpowerment”
do indivíduo no ambiente virtual.
5
Grau (1999)
Papel da interface tecnológica (como os HMDs) para
a sensação de imersão.
6
Castronova (2005)
A migração se dá porque as pessoas acham “interessante”
ou mesmo “divertido”.
7
Taylor (2006)
O jogo enquanto narrativa em construção.
8
Blanchard & Horan (1998)
Criação de capital social nos jogos.
9
Migração
2.8.3.4 O agrupamento tecnologia e interface
Tecnologia e interface são colocadas lado a lado neste agrupamento teórico devido à
proximidade conceitual, e até certa dependência; a interface de comunicação entre o ser
humano e a máquina é produto da técnica (Lévy29, 1993, 1996 e 1998a; Gere, 2002; Grau,
2006; Rush, 2006).
A interface possui papel determinante na alteração nos modos de pensar e experienciar
o corpo e subjetividade (Ferraz, 2008). Na visão de Licklider (1960), a interface homemcomputador se caracterizará por uma parceria; parece que a arte também segue tal caminho,
abrindo esta tendência com obras imersivas e participativas, as chamadas interfaces naturais,
como em Osmose, de Charlotte Davies.
Em estudo sobre o tema, Priscila Arantes (2005, 68) observa:
“Uma série de artistas utiliza, cada qual à sua maneira, interfaces que vão
além do mouse e do teclado, explorando as ações do corpo humano, como o
gesto, o toque, a voz e a respiração. Na maioria dos casos, esses trabalhos
procuram colocar em evidência novas relações do corpo humano com a obra
de arte, em espécie de 'nostalgia do corpóreo', como diria Lygia Clark.”
Assim, é crítica a compreensão de como as interfaces agem no indivíduo e qual o papel
percebido por ele; a interface enquanto facilitadora da comunicação.
A estética da informática é afetada diretamente por essa percepção. Conforme nota
Turkle (1995, 44), essa nova estética de simulação, da superfície que prevalece sobre a
profundeza30, tem características eminentemente pós-modernas31.
A interface, agora muito permeada por outro conceito, o da ubiqüidade, é a questão
crítica mas que ao mesmo tempo carece de grandes questionamentos por parte dos usuários.
Não chama atenção ao usuário de hoje o papel revolucionário que o mouse teve na
computação ou mesmo a introdução dos navegadores (browsers) para o acesso à informação
contida na Internet.
Sendo assim, o agrupamento tecnologia e interface concentra-se, para fins dessa
pesquisa, nas seguintes acepções:
29 O conceito de Pierre Lévy é mais complexo; contudo, tal simplificação foi utilizada para fins de pesquisa.
30 Ver a dualidade, explicada anteriormente, entre a cultura hacker e a hobbyist.
31 O teórico da pós-modernidade que é referido explicitamente por Turkle é Fredric Jameson.
112
- Fatores de atração estética: ligado ao fato de o metaverso ser um ambiente de
realidade virtual simulada; foco no papel dos gráficos e da riqueza de detalhes que o
assemelham ao mundo “real” (Castronova, 2005a; Wetsch, 2008) e como isso é percebido
como agradável ou não pelos indivíduos;
- Atributos de hardware e software: a capacidade de processamento da máquina é um
fator que provavelmente influencia na experiência de “renderização” em 3D na tela do
usuário. Wetsch (2008) identifica a falha nesse quesito como um potencial gerador de
frustrações;
Certamente existem inúmeros outros fatores que poderiam ser discriminados neste
tópico; contudo, pelo escopo da pesquisa, neste momento serão utilizados os dois supracitados
para subsidiar a construção do roteiro.
Constructo tecnologia e interface
Autor
Idéia principal utilizada
#
Ferraz (2008)
Percepção da interface enquanto mecanismo
de contato com o virtual
1
Jameson
(apud Turkle, 1995)
Características pós-modernas
(interface de superfície)
2
Castronova (2005a)
Wetsch (2008)
Importância de gráficos e estéticas
de simulação em 3D
3
Wetsch (2008)
Influência da capacidade de processamento
na percepção de imersão
4
2.8.3.5 O agrupamento social
Se o metaverso é uma rede social (Castronova, 2001, 2005a, 2005b, 2007; Pereira,
2008), é necessário que seja incluído em um modelo de análise o fator social para a
compreensão da percepção do metaverso enquanto experiência coletiva.
Boostrom (2008) observa que a construção social do Second Life pode ser caracterizada
como secundária, considerando que o processo primário de socialização seria a “vida real”.
Neste caso, para o Second Life, o usuário é apresentado a uma “outra” possibilidade de
socialização, neste caso no ambiente virtual.
As redes sociais podem ser utilizadas em um contexto de permitir e incentivar a
113
comunicação entre as pessoas, com a conseqüente formação de laços sociais (Recuero, 2005),
da mesma maneira que a repetição deste processo cria o capital social (Blanchard e Horan,
1998; Recuero, 2008).
A proposta de análise empreendida por Riva e Galimberti (2001) também faz parte
deste conglomerado teórico, sendo dividida nesta pesquisa com o agrupamento identidade,
considerando que em ambos os grupos há a relevância conceitual que justifica sua inclusão na
pesquisa.
Constructo social
Autor
Idéia principal utilizada
#
Castronova (2007)
Pereira (2008)
Percepção do metaverso enquanto
rede social
1
Boostrom (2008)
Relações sociais primárias (“reais”) e
relações sociais secundárias (metaverso)
2
Recuero (2005; 2008)
Blanchard e Horan (1998)
Criação de laços sociais e subseqüente
capital social
3
Riva e Galimberti
(2001)
Personalidade em ambientes virtuais influenciada
por características específicas desta mídia
4
114
3 MÉTODO DE PESQUISA
De acordo com Bento e Ferreira (1982), uma das tarefas mais importantes para o
pesquisador é a correta identificação da posição de seu tema de pesquisa dentro da Literatura
relacionada. Na classificação adotada pelos autores, identifica-se o objetivo desta pesquisa, no
campo metodológico, como obter informações sugestivas.
Para ambos (idem, 9) as informações sugestivas sobre o fenômeno darão ao
pesquisador maior “familiaridade, uma nova compreensão do problema: não pretendem
retratar o típico, descrever a realidade ou verificar hipótese, mas sim possibilitar insights,
intuições”.
Seguindo as categorias propostas por Marshall e Rossman (1999, 33), esta pesquisa tem
dois propósitos, a saber: exploratória e descritiva.
Exploratória porque: a) investiga um fenômeno pouco compreendido; b) tenta
identificar importantes categorias de significado; c) gerará hipóteses para pesquisas futuras.
Descritiva porque documenta e descreve o fenômeno de interesse.
Abaixo são enumeradas algumas razões e considerações sobre a escolha dos métodos
de pesquisa específicos.
3.1 Razões da escolha do método de pesquisa
A pesquisa qualitativa oferece algumas vantagens e adequações para o fenômeno
estudado aqui nesta pesquisa.
De acordo com Johnson e Harris (2002,109):
“A pesquisa qualitativa é associada com questões de pesquisa e fenômenos
de interesse que requerem exploração de dados em profundidade, com foco
na descrição, comparação ou prescrição.”
No caso em estudo, deseja-se encontram algum caminho para se chegar à resposta da
pergunta “por que alguém usaria um mundo virtual?”, que terá reflexos em outras áreas de
interesse direto da Administração, como planejamento, Marketing, estratégia e tecnologia da
115
informação.
Contudo, uma parcela considerável da literatura em Administração disponível à época
desta pesquisa é da tendência prescritiva, indicando um mix de casos de sucesso e sugerindo
técnicas para monetização e sucesso nos ambientes virtuais. Exemplos de pesquisas
relativamente amplas e calcadas na experiência do autor: Terdiman (2007), Gillin (2007),
Weber (2007).
A alternativa encontrada foi sair do campo tradicional de Tecnologia da Informação e,
de certo modo, da Administração, e buscar a compreensão do fenômeno dos metaversos
através de sua acepção histórica.
Marshall McLuhan certa vez sugeriu que “a arte era um early warning que sempre
poderia indicar à cultura antiga o que estaria começando a acontecer com ela” (Gere, 2002,
112).
Considerando esta idéia, a pesquisa apresenta o desenvolvimento histórico das
tecnologias, sob duas óticas superpostas no mesmo período cronológico: as tecnologias de
mídia e o nascimento da informática e da cibernética. Ambas, conjugadas, são centrais para a
compreensão do estado atual da cultura digital.
O item seguinte associou a história e os movimentos cyberpunk, indicando a gênese da
idéia de um metaverso que, conforme foi notada, não é algo recente. Os trabalhos de artistas
como Christa Sommerer e Maurice Benayoun já denotam uma percepção diferente acerca da
tecnologia, em um aspecto mais humano e social.
Tendo optado por este caminho não usual, a pergunta da pesquisa desdobra-se em
uma miríade de possibilidades de investigação, voltadas primordialmente para a compreensão
do metaverso sob o ponto de vista de seu usuário, passando obrigatoriamente pelo senso
estético, artístico e de simulação. A redução das distâncias, o desejo social buscado através das
mais diversas tecnologias. Qual o impacto destas considerações sobre os usuários dos
ambientes virtuais?
Sherry Turkle (1995), psicóloga do MIT, em sua linha pioneira de pesquisa, entrevistou
diversos usuários de sistemas computadorizados, tentando obter informações acerca do
comportamento destes indivíduos em ambientes virtuais, em uma época que a maioria dos
estudos no mesmo tema ainda estava fortemente dependente das teorias de sistemas de
informação. A autora nota:
“O poder de um computador é um fenômeno frequentemente referido
116
através dos termos associados com o consumo de drogas. É assustador notar
que a palavra 'usuário' é associada principalmente com computadores e
drogas. O problema com essa analogia, contudo, é que coloca o foco naquilo
que é externo (a droga).” (op.cit., 30)
O método qualitativo escolhido para esta pesquisa visa seguir os trabalhos de Sherry
Turkle, explorando aspectos relacionados à percepção do indivíduo acerca de uma suposta
dualidade entre o real e o virtual, além de seus efeitos no comportamento em um ambiente
virtual.
Conforme notam Ayrosa e Sauerbronn (2006, 189):
“(...) um investigador pode usar métodos qualitativos, como análise de
discurso ou conversação, para confirmar expectativas estabelecidas por
análise de teoria. O pesquisador não formula hipóteses porque sabe que
testes de significância estatística não fazem sentido algum em métodos
qualitativos. No entanto, as conclusões são fundamentalmente, em uma
leitura do corpo de dados coletados vis-à-vis, as expectativas levantadas por
análise de literatura na área.”
Como se trata de um fenômeno ainda pouco estudado, especialmente em relação ao
metaverso, buscou-se municiar de informações relativas à formação da cultura digital, para
posterior exploração em profundidade através das entrevistas, realizadas no próprio ambiente
virtual.
3.2 A experiência do pesquisador no campo
Segundo James Clifford (2002, 34), a “experiência do pesquisador pode servir como
uma fonte unificadora da autoridade no campo”.
O pesquisador tem conhecimento profundo do Second Life, havendo inclusive
desenvolvido um negócio dentro da plataforma, sendo usuário ativo há pelo menos dois anos.
Esta experiência serve tanto para a formulação das perguntas das entrevistas quanto para a
observação comportamental dentro do metaverso. Guardou-se o alerta de James e
Vinnicombe (2002, 89):
117
“(...) na pesquisa social, o reconhecimento do envolvimento pessoal nos
dados não deve ser considerado como uma prática ruim ou enviesada, mas
como uma fonte de dados em si mesma, particularmente quando métodos de
coletas de dados ricos em informação são utilizados. Os pesquisadores que
desejam evitar o viés na coleta de dados mas, ao mesmo tempo, querem usar
sua experiência devem rever constantemente suas motivações e
envolvimento”.
Conforme já explicitado anteriormente, a experiência do pesquisador foi utilizada
principalmente para a construção do roteiro e para o processo de realização das entrevistas,
poupando um tempo de aprendizado (curva de experiência) acerca do funcionamento da
plataforma.
3.3 Etnografia no ciberespaço (ciberetnografia)
Conforme notado por Amine e Sitz (2004), existem duas nomenclaturas para este tipo
de pesquisa, esta etnografia no ciberespaço.
A primeira é a netnografia, apresentada por Kozinets (2002, 62), que a caracteriza
como uma metodologia que adapta “técnicas de pesquisa etnográficas ao estudo das culturas
e comunidades que emergem através da comunicação mediada por computador”. A segunda é
a aplicação do prefixo ciber, gerando a ciberetnografia (Ward, apud Amine e Sitz, op.cit.), que
possui as mesmas características da netnografia.
Trata-se de um campo novo de pesquisa e, como toda novidade, ainda é local de
muitos debates dentro da Academia. Considerando todas as observações realizadas neste item,
pode-se dizer que o método ciberetnográfico foi aplicado na pesquisa principalmente na
etapa de construção do roteiro e da realização das entrevistas.
O pesquisador, como conhecedor do ambiente a ser analisado, aproveitou-se da
experiência prévia para apresentar hipóteses para perguntas, que após a revisão de Literatura
se mostraram adequadas (as perguntas que não obtiveram sucesso nessa primeira etapa foram
descartadas do roteiro ou revisadas).
118
3.4 Análise histórica
Foi empreendida na primeira parte deste trabalho o levantamento histórico dos
antecedentes do fenômeno do metaverso, principalmente sob a ótica da Arte, Ciência e
Tecnologia (AST).
O método de análise utilizado para responder à primeira pergunta (“qual a origem
cultural do metaverso?”) teve como base a interpretação de dados históricos, nisto
conglobando obras artísticas.
No lugar de uma análise puramente ligada à semiótica, optou-se por aproximar-se mais
da proposta pós-estruturalista, acreditando-se na pertinência e adequação desta ao trabalho.
Nas palavras de Manning e Cullum-Swam (1994, 468): “um texto, em termos pósestruturalistas, não é um objeto ou coisa, mas uma ocasião para a interconexão de múltiplos
códigos e perspectivas”.
Conforme observam Blanchot e Hanson (1987), os eventos são temporários e a
memória dos mesmos é transitória, existindo em um contexto de significação específico dentro
do cotidiano. Neste sentido, em relação à análise semiótica das obras cinematográficas (como
Metropolis ou Tempos Modernos, analisadas aqui), Barthes (2005, 43) elucida:
“De maneira geral, o significado tem um caráter conceitual, é uma idéia;
existe na memória do espectador, e o significante apenas o atualiza, tem
sobre o significado um poder de apelo, não de definição; aliás, é por isso que,
em semiologia, não é totalmente correto postular uma relação de
equivalência entre o significante e o significado; não se trata de uma
igualdade de tipo matemático, mas sim de um processo de tipo dinâmico.”
Para o escopo deste trabalho, que não é uma antologia sobre estética, a análise terá um
papel secundário, de suporte à construção do roteiro de entrevista e para a análise dos
resultados, bem como na sugestão de futuras pesquisas.
3.5 Especificidades de entrevistas em ambientes virtuais
No caso, parte da pesquisa é realizada em ambiente virtual. Estalella e Ardèvol (2007)
notam que:
119
“O adjetivo 'virtual' não está eximido de polêmica, já que por uma parte,
marca uma polaridade frente ao 'real', dando a entender que as relações que
se estudam são menos 'reais' que as que mantemos fisicamente, cara a cara
ou mesmo pelo telefone; ou então que as interações e as relações mediadas
pelo computador são, a priori, diferentes das que se estabelecem 'cara a
cara'.”
Seguindo na mesma linha, o Wolfgang Hofkirchner (2007), em sua análise sobre a
natureza da Internet, identifica esta como um sistema social, sendo ao mesmo tempo um
subsistema de um grande sistema que rege a sociedade como um todo.
Quanto aos indivíduos entrevistados, há a questão acerca da subjetividade; ou seja:
qual é, efetivamente o entrevistado – o indivíduo de carne e osso ou o seu avatar? Qual a
personalidade que estaria respondendo às perguntas?
A linha de pensamento adotada, ao menos preliminarmente, pela pesquisa é a da
multiplicidade de personalidades. Sherry Turkle (1999, 646) oferece um caminho:
“A noção de uma identidade descentralizada foi concretizada pelas
experiências com a tela de um computador. Neste caminho, o ciberespaço se
torna um objeto 'para se pensar com', de forma a entender sobre a
identidade – um elemento de bricolagem cultural.”
Considerando, então, a identidade como um elemento de bricolagem cultural, a
pesquisa realizada no metaverso irá buscar as personalidades aparentes dos avatares,
independentemente das suas correlações com o “real”. Tal opção é puramente
metodológica32, considerando que provavelmente há uma relação muito forte entre as diversas
facetas da personalidade de um indivíduo.
Contudo, pela impossibilidade prática de se checar a veracidade das informações
prestadas ou mesmo de conduzir uma pesquisa presencial aprofundada (ou mesmo um follow-
up) com os entrevistados dentro do metaverso, optou-se pela busca maximizada de
informações sobre os avatares, tendo um campo pequeno de informações demográficas do
“mundo real”.
32 Essa é uma possibilidade de exploração em pesquisas posteriores.
120
Thomsen, Straubhaar e Bolyard (1998) consideram que a pesquisa no ambiente virtual
tem peculiaridades em relação às contrapartes físicas, como a necessidade de se redefinir os
vínculos sociais, tradicionalmente pensados em termos de presença e interação físicas. Embora
a pesquisa ainda tratasse de ambientes virtuais de texto, o trabalho reconhece a necessidade
de o pesquisador estar imerso no ambiente de pesquisa, conhecendo bastante aquela
realidade específica de modo a poder compreender as relações que ocorrem naquele
contexto.
Tal pensamento guarda consonância com a proposta de Riva e Galimberti (2001), no
sentido de que a análise das personalidades no ambiente virtual é fortemente relacionada a
este contexto próprio. A validade epistemológica, portanto, estaria diretamente ligada à
capacidade do pesquisador em compreender adequadamente o contexto do ambiente virtual
que está pesquisando.
É o caso de Edward Castronova (2005a), em sua pesquisa inicialmente feita sobre o
MMORPG World of Warcraft ou de Recuero (2008) no caso dos fotologs.
Kuntsman (2004) nota que o ciberespaço pode significar, num contexto antropológico
tradicional, estar “em casa” e “fora de casa” ao mesmo tempo; o “campo” da pesquisa
etnográfica muitas vezes era algum lugar longínquo, isolado. Neste contexto, uma das
propostas encontradas na literatura especializada é a consideração do “campo” não como um
lugar no sentido clássico, mas sim uma situação específica de contato, diferenciando-se do
tradicional campo.
Teli, Pisanu e Hakken (2007) apontam para uma pesquisa etnográfica online em que
não existe necessariamente uma contraposição entre o “real33” e o “virtual”. Nesse caso, o foco
estaria em uma ontologia e epistemologia de pesquisa com foco exatamente nesse caráter
híbrido do ambiente online.
3.6 As entrevistas
O desenho do instrumento seguiu a classificação proposta por Patton (2002, 349),
escolhendo-se o método de entrevista através de um guia, na qual os tópicos e assuntos a
serem cobertos são definidos a priori, na forma de um roteiro, havendo a possibilidade de
inversão da ordem de algumas perguntas durante o curso da entrevista.
Tal forma tem a vantagem de aumentar a compreensão sobre os dados gerados, além
33 Originalmente os autores usam a terminologia proposta por Lévy (1993), de “atual” e “virtual”.
121
de dar ao respondente uma maneira sistêmica para fornecer as informações. Os eventuais gaps
lógicos podem ser ajustados no decorrer da entrevista e eventualmente fechados, levando a
conclusões mais profundas (Patton, op.cit.). Como pontos negativos, há a redução no grau de
comparabilidade das respostas, considerando que as ordens podem ser diferentes, bem como
há a possibilidade de omissão de pontos relevantes no curso da entrevista.
Contudo, optou-se por este modelo devido à possibilidade de obter profundidade nas
respostas dos entrevistados, em comparação a modelos fechados de entrevista (Fontana e Frey,
1994).
3.6.1 Delimitação do universo de sujeitos a serem entrevistados
Para a pesquisa foram selecionados avatares com presença na plataforma entre um e
seis meses, independentemente da idade ou sexo, que fossem parte da comunidade brasileira.
Tal molde encontra sustentação no direcionamento deste estudo, de natureza exploratória,
com a escolha da amostra através de critérios pré-definidos, o que pode aumentar a qualidade
das informações recebidas (Patton, 2002, 243).
A razão principal para a delimitação de tempo de uso foi colocar foco nos indivíduos
que haviam vivido mais recentemente a experiência de se adaptar ao metaverso, sendo uma
escolha puramente metodológica. Existia a possibilidade de se realizar a pesquisa com
empreendedores do Second Life, principalmente os avatares já estabelecidos, geralmente com
mais de um ano de uso.
Tal possibilidade, contudo, foi descartada num primeiro momento devido à carência de
informações básicas sobre a motivação inicial destes indivíduos (pouquíssimas pesquisas
realizadas) e também ao fato de a maior parte dos empreendedores que têm alguma renda
significativa (por exemplo, acima de USD 100 por semana) serem estrangeiros, o que
acrescentaria um fator extra à análise, tornando-a muito complexa neste estágio da
investigação.
A idade e o sexo não foram considerados como fator de limitação da amostra.
3.6.2 Situação de contato
Os indivíduos foram contactados através de fóruns de mensagem, dentro do Second
Life, e também utilizando a figura de um recrutador pago.
122
Este indivíduo era equivalente a um assistente de pesquisa, recebendo L$40 para cada
pessoa que indicasse e que satisfizesse as condições iniciais. Cada entrevistado recebia outros
L$40, transferidos diretamente para sua conta dentro do Second Life ao final da entrevista.
As entrevistas foram realizadas em um ambiente virtual – um modelo de uma casa,
criada pelo autor especialmente para este fim. Nesta localização virtual, a casa serve como um
referencial para tornar maior a semelhança com um local físico de pesquisa.
As dimensões do modelo virtual foram especialmente planejadas para propiciar uma
estética simples, porém acolhedora para o avatar. A sala virtual tem capacidade para quatro
avatares, em frente a uma tela com um script que emula um projetor de slides.
Acima da mesa há um objeto com um script de gravação de texto e voz, destinado a
realizar a posterior transcrição. Em caso de falha no software do Second Life, o objeto envia a
transcrição ou a gravação diretamente para o e-mail cadastrado.
A arquitetura do espaço direcionava o participante para usar o modo de visualização
em primeira pessoa. Embora houvesse a possibilidade de realizar as entrevistas com
visualização em terceira pessoa, resolveu-se seguir a proposta de Machado (2002, 12),
inicialmente em uma discussão sobre cinema:
“Nos ambientes em que se visa produzir um efeito de imersão, a câmera
subjetiva costuma ser um dos recursos mais utilizados, pois é a maneira mais
poderosa de fazer com que o espectador se sinta 'dentro' do filme,
incorporando um olhar já presente e previsto na imagem, o olhar de uma
personagem virtual ou potencial que ele próprio, o interator, assume ao
penetrar no sistema. A câmera subjetiva insere imaginariamente o
espectador dentro da cena, permitindo-lhe vivenciá-la como um sujeito
vidente implicado na ação.”
O ambiente ao redor da casa se assemelhava a uma praia, local típico de convivência
para a comunidade brasileira dentro do Second Life.
3.6.3 Realização da entrevista
Cada entrevista teve a duração de aproximadamente trinta minutos. Foram
123
entrevistados, ao todo, 22 avatares, no local de pesquisas desenhado para este fim. Elas foram
realizadas na semana entre 20 e 26 de julho de 2008.
Seguem abaixo fotos da construção virtual desenhada como local de contato e
realização das entrevistas, dentro do Second Life.
3.7 Roteiro utilizado
Foi montado um roteiro inicial, fruto de um brainstorming, com possíveis perguntas a
serem feitas aos entrevistados. Tal técnica foi calcada principalmente nas percepções e
observações realizadas por ocasião da revisão de literatura, além da experiência do
pesquisador no campo específico.
124
Algumas perguntas foram eliminadas do roteiro, principalmente devido ao tempo
esperado de entrevista (em torno de 20 a 30 minutos), enquanto outras foram mescladas.
Após análise do pesquisador acerca da pertinência de tais questionamentos e também
de uma comparação cruzada com a literatura (primeiro tratamento), chegou-se a uma versão
de trabalho, com as perguntas agrupadas em quatro partes:
(I)
Dados pessoais
(II)
Dados sobre a migração
(III)
Percepção primária do metaverso
(IV)
Hábitos no metaverso
Cada uma dessas partes agrupa um conjunto de perguntas relacionadas de acordo com
o tema a ser buscado. Com a finalização da Revisão de Literatura, montou-se um quadro para
indicar a raiz referencial de cada pergunta, que lhe dá suporte enquanto indagação de campo
para uma pesquisa qualitativa de natureza exploratória.
Houve, conforme já esperado, uma coincidência de diversos fatores oriundos da
Revisão de Literatura, o que significa que aquela pergunta abrange várias raízes referenciais,
assim como tem a possibilidade de responder a diversos itens dos agrupamentos teóricos
relacionados como base da pesquisa.
3.8 Questões e justificativas na literatura (Quadro de Referência Cruzada)
125
Questões da entrevista semi-estruturada
I
II
III
IV
1 2 1 2 3 4
1 5
2 6
3 7 8 9 10 1 2 3 4
1 5
2 6
3 7 8 9 1 2 3 1
4 1 2 3 1
4
IPM
ID
Uso
Agrupamentos
TIn
SOC
1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 6 7 1 2 3 4 5 1 2 3 4 5 6 7 8
Abrev.
Agrupamento
Uso
ID
Uso
Identidade
IPM
Imersão, presença
e migração
TIn
SOC
Tecnologia e identidade
Social
Id
Grupo de perguntas
I
Dados pessoais
II
Dados sobre migração
III
Percepção do metaverso
IV
Hábitos no metaverso
3.8.1 Grupo “Dados pessoais ( I )”
1. Idade (caso não queira dizer, passar para faixas)
2. Sexo
3. Ocupação principal
4. Nível de escolaridade (o mais alto, ainda que cursando)
5. Local de residência
Originalmente a idéia para este grupo de perguntas era realizar uma identificação
sumária do entrevistado, principalmente naquilo que era referente à sua vida “real” (ou RL na
linguagem do Second Life).
Idade, sexo e ocupação principal têm como objetivo tentar traçar, na fase de análise
dos resultados, algum tipo de relação entre esses atributos “reais” e a construção da
personalidade do avatar no Second Life. Junto a esses dados, o nível de escolaridade teria
como principal objetivo a identificação de eventuais profissões/atividades que poderiam ser,
num primeiro momento, ligadas a uma tendência de uso desses sistemas (como profissões
ligadas à Internet, por exemplo).
O local de residência foi pensado para desenhar um mapa sumário da localização dos
entrevistados, considerando se eram grandes cidades, qual região do país, etc.
3.8.2 Grupo “Dados sobre a migração (II)”
1. Como você soube do Second Life? Falar sobre as razões que instigaram a testar a
plataforma.
2. Há quanto tempo você entrou? Falar sobre como foi o processo de entrada e
adaptação à plataforma.
3. Você já teve algum contato anterior com 3D antes do Second Life? Exemplos: CAD,
videogames, etc.
4. O que, na sua opinião, mais motivou a utilização do Second Life?
5. Existiram dificuldades nesse processo de entrada? Falar um pouco mais sobre isso.
6. Como você conheceu as primeiras pessoas dentro do Second Life? Clubes, praças
127
públicas, eventos específicos?
7. Como foi o processo de criação do seu avatar?
O foco principal neste grupo de perguntas é fornecer subsídios para a identificação da
percepção do indivíduo sobre a plataforma, envolvendo o desde o primeiro momento,
passando pela motivação e eventuais dificuldades neste processo.
Migração, no caso de metaversos, é o nome dado por Castronova (2005a) para
descrever o processo de entrada em um desses ambientes de realidade virtual simulada –
embora o termo também possa ser usado para MMORPGs.
A primeira pergunta representa esse momento inicial de contato, ou seja, como o
indivíduo passou a saber que existia o Second Life. Como todos os entrevistados são usuários,
uma das vantagens deste item é que todos que irão responder passaram por esta fase e
provavelmente terão diferentes fontes que motivaram a decisão.
A percepção do metaverso enquanto rede social (Castronova, 2007; Pereira, 2008)
depende desse contato inicial, enquanto o “teste” da proposta de Castronova (2005a),
segundo a qual um dos principais motivos de incentivo à adoção é a percepção do sistema
como algo “interessante” provavelmente podem ser revelados pelas respostas a estes itens.
Conexa a esta pergunta está a segunda, que versa sobre o tempo de uso, que está,
segundo a metodologia de aplicação das entrevistas, balizado e direcionado para usuários
mais novos. Mesmo sendo altamente improvável que alguém, nesta fase de uso, esteja usando
um HMD ou dispositivo semelhante para o aumento da experiência sensorial, é interessante
explorar a idéia de Grau (1999) sobre o nível de interação percebido através das interfaces
tecnológicas.
A descoberta de uso prévio de outros sistemas que utilizem 3D (ou então a simulação)
pode ser um indicativo de migração entre diferentes tipos de mídia. Esta pergunta está ligada
a todos os itens pertencentes ao agrupamento tecnologia e interface, pois a percepção da
interface enquanto mecanismo de comunicação com o “mundo virtual” (Ferraz, 2008) pode
estar relacionada com a sensação do “belo”, do esteticamente agradável – o que indicaria no
sentido do proposto na pesquisa de Wetsch (2008) e poderia possibilitar uma exploração
posterior da natureza desta “estética” preferida e sua relação com as artes, fator não explorado
neste item.
Devido à complexidade do conceito da pós-modernidade em Jameson (apud Turkle,
2005), optou-se por incluir tal relação como colateral e possível, porém de difícil interpretação
128
neste estágio da pesquisa.
A pergunta 4, sobre a motivação principal para uso do Second Life, direciona o
entrevistado para a reflexão não só acerca de suas preferências pessoais em uma plataforma
mas também quais dessas características foram encontradas no caso concreto.
É uma pergunta bastante relevante que, além de ter relação com quase todas as
perguntas do agrupamento tecnologia e interface, envolve-se com a possibilidade de
revelação de fatos diretamente relacionados com dois componentes do agrupamento sobre as
artes; a participação do indivíduo na criação, ou seja, o papel ativo enquanto criador do
ambiente virtual no qual vive34, além do provável surgimento dos questionamentos sobre o real
e o virtual.
Bastante provável que os usuários não estejam a par das idéias de Lévy (1993) sobre o
“atual35” e o “virtual”, mas neste caso serão buscados os conceitos comuns, de uso cotidiano na
comunicação.
As dificuldades podem indicar pontos interessantes, principalmente para a análise da
estrutura do sistema tal como é atualmente - software próprio, demandando grande largura de
banda e com pouquíssima orientação a priori de uso, apenas para citar alguns problemas em
potencial.
Assim como identificado em Burns (2008) e Wetsch (2008), tais dificuldades podem
impactar de forma decisiva na experiência do usuário, afetando a percepção de interesse
segundo Castronova (2005a). A estrutura da pergunta é intencionalmente deixada em aberto,
para que o entrevistado possa explorar este ponto.
Segundo a lógica cronológica, a pergunta 7 vem antes da 6; procura-se aqui saber
como foi o processo de criação do avatar. O formato aberto do questionamento é intencional,
para estabelecer uma ligação com o item II.536, porém dissociando no momento da entrevista
tais acontecimentos.
O processo de criação do avatar pode oferecer subsídios no sentido de se analisar a
relação proposta em Slater e Usoh (1993), que identificam o papel do avatar na percepção do
34 Neste ponto apresento divergências quanto a uma possível equiparação desta idéia do conceito de prosumer,
considerando que o papel principal do usuário no Second Life não é, a princípio, movimentar a economia (ao
menos não sob sua ótica) ou receber bens gratuitos, mas simplesmente usufruir do espaço o qual lhe é
permitido construir, independentemente de compras. Observar as idéias expostas em Taylor (2006), Rush
(2006), Grau (2006), Stallabrass (2003), Kac (2004), Tapscott e Williams (2007), dentre muitos outros, para
análise mais detalhada desta discussão teórica.
35 De igual forma, sobre o debate filosófico em torno da “essência” da tecnologia, como em Heidegger (1977) e
a análise de Castro (2005) sobre o pensamento heideggeriano.
36 Item III.5: Você acredita que uma organização (empresa, ONG, governo, etc.) poderia se beneficiar do
Second Life? Por que?
129
indivíduo e tentar captar alguma das dimensões relacionadas em Suler (2002), principalmente
a dissociação e valência. Indiretamente poderá ser tentada a exploração da hipótese da
semelhança do avatar com o indivíduo “real37”, conforme levantado por Messinger et al.
(2008).
A pergunta 6 explora o lado dos primeiros contatos sociais, logo após a entrada
“oficial” no Second Life. Poderão aparecer neste momento referências às relações sociais
primárias e secundárias (Boostrom, 2008) além de traços de sociabilidade em ambientes
virtuais, influenciados por novas variáveis no contexto (como o anonimato), que poderia levar
no sentido proposto por Riva e Galimberti (2001), da influência do ambiente virtual na
personalidade “escolhida38”.
3.8.3 Grupo “Percepção primária do metaverso (III)”
1. Como você vê o Second Life? (Jogo, rede social, comunidade de negócios,
entretenimento puro, etc.)
2. Quantas horas por semana, em média, você costumar estar online? E no Second Life?
3. Você se vê como uma pessoa que gosta de tecnologia? Comentar um pouco sobre isso.
4. Na sua percepção, o que mais atrai em um ambiente 3-D?
5. Você acredita que uma organização (empresa, ONG, governo, etc.) poderia se
beneficiar do Second Life? Por que?
Neste grupo foram incluídas as perguntas voltadas para a percepção do usuário sobre
este novo mundo que adentra, bem como eventuais motivos para gostar (ou não) do Second
Life.
A primeira pergunta guarda referências cruzadas com todos os agrupamentos da
pesquisa.
Saber como o indivíduo percebe questões como tempo e espaço no ambiente virtual,
além do próprio conceito de realidade em si (Turkle, 1995; Castronova, 2005a; Jenkins, 2005)
podem se revelar crítico para a análise da motivação para uso, tanto puramente recreativo
como comercial.
O item também guarda relação com todos os componentes do agrupamento social,
37 Um dos fatores que impede a correta análise deste item é a ausência da entrevista pessoal, física.
38 O uso desta palavra pressupõe, como de fato acontece na pesquisa, a utilização da idéia de várias
personalidades conforme proposta em Turkle (1995).
130
principalmente porque se uma pessoa vê a plataforma como um jogo (no caso, um MMORPG),
muito provavelmente sua reação será diferente do que se fosse percebido como uma
comunidade de negócios (como o LinkedIn39, por exemplo). Direciona-se o respondente para
dizer o que ele acha que o Second Life é efetivamente.
É possível que sejam encontradas referências quanto à construção de capital social
dentro do Second Life, no sentido visto por Blanchard e Horan (1998) e Taylor (2006), ambos
pesquisando jogos e não metaversos.
A pergunta III.2 tem o objetivo de compreender melhor o usuário, tentando traçar uma
proporção de uso tanto da Internet quanto do Second Life. Poderá ser explorada no sentido de
se tentar entender se o indivíduo também é usuário de outras redes sociais além da freqüência
de tal comportamento, o que poderia levar a uma categorização exploratória em usuários
leves ou pesados de tecnologia.
A terceira pergunta, inclusive, é uma continuação deste tema, explorando qual a
percepção do indivíduo sobre o seu nível de uso da tecnologia. Esta é uma possibilidade
tangente de se observar a idéia da alteração do pensamento através da informática, conforme
levantado por Lévy (1993).
A quarta pergunta relaciona-se com o fator estético e de atratividade de mundos
virtuais (Castronova, 2005a; Gere, 2002; Grau, 2007), havendo a forte possibilidade de revelar
informações relativas à possibilidade de adoção de outras “personalidades” (Turkle, 1995),
além de possíveis motivos para a atração com foco na imersão e envolvimento do indivíduo no
ambiente virtual (Klainbaum, 2006; Brown e Cairns, 2004), retomando a pesquisa desenvolvida
por Wetsch (2008).
A percepção do metaverso enquanto rede social é um possível caminho para a resposta,
que é correlata à pergunta III.1 (Castronova, 2007; Pereira, 2008).
A pergunta III.5 pode parecer inicialmente deslocada deste bloco, mas sua localização
é proposital, no sentido de tentar captar quais características percebidas pelo indivíduo como
“agradáveis” ou “interessantes” podem influenciar na sua decisão de ir a um local operado por
uma organização do “mundo real”.
3.8.4 Grupo “Hábitos no metaverso (IV)”
39 O LinkedIn é uma rede social, tipo o Facebook ou Orkut, direcionada para a realização de contatos de cunho
profissional e de carreira.
131
1. Quando você está logado40, quais os locais que você costuma ir?
2. Como se dá a sua socialização? Você costuma usar mais o IM (instant messenger), a
digitação de texto ou o VoIP (voice over IP)?
3. Como você acrescenta alguém como amigo?
4. Como se dá o seu relacionamento com essa pessoa, em geral?
5. O que você costuma comprar no Second Life? Você usa muitos freebies?
6. Você acha que ter um ponto fixo de residência é importante? Você alugaria uma casa,
apartamento ou algo parecido?
7. Você gosta de construir objetos? E construções como casas, barcos, etc?
8. Você costuma ir a ilhas de empresas? Falar um pouco sobre isso.
O último grupo é o mais utilizado como subsídio para a coleta de informações sobre os
agrupamentos, notadamente o social.
A primeira pergunta (IV.1) tem como objetivo tentar identificar os locais que os novos
entrantes no Second Life costumam ir nessa etapa inicial da “nova vida”, além de tentar
mensurar o grau de envolvimento dos usuários na experiência imersiva (Brown e Cairns, 2004)
e uma possível preferência de uso ligada ao aumento da capacidade de comunicação, não à
fuga do real, no mesmo caminho defendido por Chee et al. (2006).
É importante, principalmente sob o ponto de interesse da interface e da identidade,
descobrir indícios e pistas de como se dá o processo de socialização dos avatares dentro do
metaverso. O uso de sistemas de VoIP41 tem uma característica muito peculiar para estes
ambientes virtuais que é a de revelar um detalhe “real”, ou seja, a voz. Apenas com esse
contato inicial já seria mais fácil identificar, por exemplo, o sexo do indivíduo ou então uma
provável nacionalidade (devido ao estilo da língua falada).
Por outro lado, o uso de IM (mensagens instantâneas) permite a geração de um log
(registro) das mensagens recebidas, o que pode se revelar um mecanismo facilitador da
comunicação dentro do Second Life.
As perguntas IV.3 e IV.4 foram desenhadas para captar a forma como alguém inicia e
mantém relacionamentos dentro do ambiente virtual, seguindo a idéia que o capital social
gerado no Second Life poderia ser uma razão do gosto pelo ambiente (Castronova, 2005a),
40 O uso do termo logado se relaciona à necessidade de aproximação da linguagem do pesquisador ao dos
sujeitos entrevistados.
41 Sistemas VoIP são os utilizados para converter a voz do usuário em pacotes, de acordo com o protocolo de
Internet, possibilitando, dentre outras coisas, a realização de uma conexão via voz, como em um telefone,
entre duas ou mais pessoas.
132
permanecer no metaverso (Blanchard e Horan, 1998), enfim, a criação de laços dentro deste
ambiente (Recuero, 2008).
Saber como são percebidas as relações econômicas dentro do Second Life é um passo
interessante. A pergunta 5 é relacionada ao conceito de bens virtuais (Castronova, 2001;
Malaby, 200642, além da pesquisa de Wetsch, 2008) e o relacionamento dos indivíduos com
essa específica categoria econômica. No caso, poderá ser avaliada a idéia de tentativa de
construção, o que é possível dentro da plataforma, como uma alternativa à compra ou então o
uso de bens gratuitos.
No Second Life existem regiões chamadas sandbox que são públicas, especialmente
destinadas àqueles que têm interesse em construir novos objetos virtuais (armas, casas, móveis,
etc.). Avaliar se existe a vontade de construir será averiguado pela pergunta IV.7.
Da mesma forma que em Snow Crash (Stephenson, 1992), há a possibilidade de se ter
um espaço residencial dentro do Second Life, o qual poderá ser usado para as mais diversas
finalidades, inclusive a social. Outra vez será explorada (no item IV.6) a idéia de realidade, de
socialização no ambiente virtual e as formas com que esse processo toma forma.
O modo da pergunta é relacionado ao formato condicional (“você alugaria”), pois é
bastante provável que os usuários ainda não tenham uma residência fixa, apenas a categoria
social relativa para comparação (“casa de amigos”, etc.).
A última pergunta (IV.8) é uma espécie de “curiosidade” acadêmica, relacionada com o
conhecimento dos usuários acerca da própria existência dos espaços comerciais de empresas
brasileiras e estrangeiras dentro da plataforma e a sua visão/relação com as mesmas.
3.9 Aspectos epistemológicos importantes (limitações do método)
Pesquisas sobre comportamento em ambientes virtuais são relativamente recentes,
sendo desenvolvidas principalmente a partir de 1995, com a publicação de “Life on the
screen”, da professora Sherry Turkle, do MIT. Naquele trabalho são analisadas algumas das
situações de contato existentes à época, principalmente no relacionamento com sistemas de
informação que se pensava possíveis de substituição de funções humanas.
O trabalho de Turkle é meritório principalmente devido à profundidade da análise do
comportamento e da cultura em um ambiente cada vez mais “recheado” de computadores. A
delimitação das estéticas moderna e pós-moderna é outra grande contribuição da
42 Outra vez, ambas as referências são relacionadas a pesquisas em MMORPGs, não metaversos, mas podem
fornecer algum insight sobre caminhos possíveis de investigação.
133
pesquisadora.
De igual forma, quando cita a objeção de Ada Lovelace (apud Turkle, 1995, 134) a um
modelo “computadorizado” de pensamento nota que uma das características do ser humano é
que não segue estritamente regras. Muito se passou desde a idéia de Lovelace, datada de
1842, e o desenvolvimento posterior dos computadores, passando pelas críticas ferrenhas já
levantadas por Dreyfus (neste sentido, ver Heim, 1993).
Já foram mostradas anteriormente limitações quanto à pesquisa em ambiente virtual
levantadas pela antropologia, principalmente no que se refere ao sujeito e ao espaço (o
campo) da etnografia.
Muito do que já foi pesquisado é relacionado aos jogos, especialmente aos MMORPGs
(exemplos: Castronova, 2005a; Taylor, 2006). A pesquisa, devido à natureza exploratória, usa os
conceitos contidos nestes trabalhos para investigar uma eventual possibilidade de
transposição, analogia ou adaptação aos metaversos.
Uma das razões que pode indicar que tal caminho seja válido é o fato de, conforme foi
mostrado na revisão de literatura, os metaversos e os MMORPGs possuem raízes culturais
bastante próximas, guardando uma série de semelhanças estruturais - são redes sociais, com a
finalidade de imersão, permanentes43 e cujas ações influenciam as percepções do espaço
vivenciadas por outros (Castronova, 2005a e 2007), apenas para citar algumas comunalidades.
A pequena (embora crescente) e recente quantidade de pesquisas feitas no metaverso
limitam o campo enquanto fonte de informações sistêmicas ou mesmo preditivas (Bento e
Ferreira, 1982), tornando a pesquisa na área praticamente pela busca de informações
sugestivas, as quais são buscadas, geralmente, através de técnicas qualitativas.
Devido às datas de publicação de tais estudos, não foi possível incorporá-los aos
agrupamentos desenhados para as entrevistas, embora se tenha a idéia de utilizá-los, se
possível, como subsídio para a analise dos resultados e proposição de pesquisas posteriores.
43 O caráter de permanência é no sentido de a existência do mundo virtual não depender da presença ou
conexão do usuário. Assim como no Planeta Terra (para usar a terminologia de Castronova, os mundos
virtuais estão lá quando você vai dormir e quando acorda, 24 horas por dia, 7 dias por semana, ainda que o
usuário não fique permanentemente conectado. Ou seja, o aspecto da simulação técnica independe da
presença do usuário.
134
4 RESULTADO DAS ENTREVISTAS
4.1 A percepção do Second Life: um jogo?
Uma das percepções captadas pelo instrumento foi a idéia do Second Life como um
jogo. Dos 22 entrevistados, praticamente todos (18) afirmaram que percebem, em maior ou
menor grau a plataforma como um jogo, ainda que tal idéia não seja sempre explícita (com o
uso de expressões como “quando você joga” ou “...você fala com outros jogadores...”).
Os quatro restantes não mencionaram nada que pudesse ser relacionado a esta
percepção.
Conforme mostrado em capítulos anteriores, a gênese do metaverso é um misto de
ficção científica com os antigos RPGs, que deram origem aos MUDs e ao atuais MMORPGs,
como o Everquest e World of Warcraft.
Tal percepção também existe na mídia, espalhada por agências de notícias e blogs na
Internet.
Faoro (2005) diz que o Second Life “é um jogo em que muita gente participa”,
enquanto a própria implementadora da versão brasileira da plataforma é uma desenvolvedora
de jogos, a Kaizen Games. A revista Fortune, por outro lado, publicou um extenso artigo no
qual defende que não se trata de um mero jogo, pois seria um lugar propício a realizar
negócios, ou uma “mina de ouro” (Kirkpatrick, 2007).
No caso, jogos têm geralmente objetivos bem definidos (uma pontuação a alcançar, um
vilão para exterminar, etc.), um ethos competitivo e uma possibilidade de se vencer
determinados obstáculos para se ganhar acesso a outros níveis. MMORPGs acrescentaram o
caráter das redes sociais virtuais aos antigos MUDs e a rápida difusão de banda larga nos países
mais desenvolvidos permitiu uma qualidade melhor de gráficos e da jogabilidade em si.
Contudo, o Second Life efetivamente não é um jogo. De fato, é uma plataforma de
simulação em 3D sobre a qual podem ser realizados diversos tipos de atividade, incluindo
jogos, como no caso do Tringo ou os Cassinos, banidos atualmente. Mas não há,
especificamente, um objetivo a conquistar. Nada impede que apenas se entre na plataforma
para se visitar ambientes em 3D, sem fim competitivo algum.
É estranho notar que muitos dos entrevistados tenham esse tipo de opinião, mesmo que
jamais tenham visto característica alguma de um jogo padrão dentro da plataforma. Um
135
informante chegou a comentar que “acha o Second Life o jogo mais legal porque não tem
ninguém para matar ou vencer”, o que é evidentemente um paradoxo dentro da definição
padrão de jogos.
4.2 A questão do real e do virtual
RL e SL (significando “real life” e “Second Life”) foram expressões bastante encontradas
nas entrevistas, junto com variações do estilo “real” e “virtual”. Cinco entrevistados
expressamente disseram ter plena consciência (em outras palavras) que o Second Life era
virtual; contudo, podem ser identificados ao menos oito entrevistas nas quais os entrevistados
disseram não se importar com essa distinção: o que importaria seriam as relações de amizade e
contatos sociais, independentemente do ambiente virtual.
Alguns (sendo três claramente identificáveis), quando indagados sobre as amizades
realizadas dentro da plataforma, dizem que tais relacionamentos são, às vezes, mais
interessantes que os “reais”, relacionando com aspectos tradicionalmente utilizados para estas.
Um informante, por exemplo, relata que “tem que haver química”, enquanto outro diz que
somente não conheceu pessoalmente seus amigos do Second Life devido à distância entre as
cidades que moram.
A questão que preocupa Lévy (1993), sobre o uso errôneo de virtual enquanto oposto a
real parece não ser um fator determinante para os entrevistados. Muitos sequer enxergam
nisso alguma espécie de oposição ou dualidade excludente.
Embora exista firmemente a noção de “vida real” e “vida virtual”, os informantes
parecem não se importar com tais categorias. Vêem o Second Life como uma “vida virtual”,
mas que tem nítidas relações com a “vida real”.
4.2.1 O que é a vida no Second Life?
A vida no Second Life pode assumir, para os participantes, o sentido literal da tradução
do Inglês: uma “segunda vida”. Para um entrevistado, um dos fatores que mais o atrai na
plataforma é “poder viver uma vida diferente”, enquanto outro afirma que “é muito legal
poder ser outra pessoa que você não é”.
Dois entrevistados citaram expressamente ter muito mais interesse na convivência
dentro do Second Life, enquanto quatro indicaram achar perfeitamente possível manter
136
relações firmes, tais como no mundo físico, dentro da plataforma.
Um entrevistado discorreu sobre este tema, dizendo:
“[o Second Life] é tipo uma chance pra você realizar seu sonho. O que você é
na vida real tu (sic) pode ser aqui44.” (Entrevista 16)
Outros sete entrevistados ofereceram respostas no sentido de entender a convivência
dentro do Second Life como uma “vida alternativa”.
Parece que, de certa forma, há um encaixe inicial entre a proposta das múltiplas
personalidades online de Turkle (1995) e o relatado nas entrevistas. A configuração do avatar
dos informantes é um fator que pode indicar tal fato, considerando que a maior parte dele tem
um visual que poderia ser considerado como “charmoso” (homens altos e musculosos, mulheres
magras e esbeltas), dentro do padrão tradicional de beleza.
É muito provável que existam entrevistados que não possuam tais características, de
fato, o que iria contrariar a hipótese apresentada por Messinger et. al. (2008). Contudo, devido
ao método aplicado, não foi possível confirmar ou afastar tal possibilidade.
A vida virtual, para os entrevistados, tem praticamente todas as características da “vida
real”: realizam-se festas em boates, encontros nas casas dos amigos, casa-se, separa-se, dentre
vários outros atos cotidianos.
4.2.2 Residências virtuais
A maior parte dos entrevistados (16 dos 22) considera a idéia de ter uma residência
dentro do Second Life como algo que vai de “interessante” até “necessário”. A função destes
espaços, assim como no cotidiano, é oferecer certa privacidade para os usuários (conforme
nota a informante 5).
Três entrevistados revelaram ter uma “casa” dentro da plataforma – na verdade um
apartamento, em regime de aluguel semanal, em ilhas movimentadas. Houve um informante
que disse não possuir uma residência, mas que usava a casa de um amigo quando queria
privacidade.
Nenhum dos usuários entrevistados afirmou ter conhecimentos avançados de design
44 Todas as transcrições mostradas estão com os eventuais erros gramaticais e de pontuação ajustados. Quando
determinada forma de escrita, ainda que incorreta, for necessária para a compreensão da resposta, será aposta
a tradicional expressão latina “sic”.
137
em 3D, embora ao menos onze tenham mencionado já terem tentado construir algum tipo de
estrutura residencial; uma entrevistada disse que tentou mas ficou “uma porcaria, parecia
desenho de criança”.
A fonte de residências pré-fabricadas que três usuários afirmaram ter procurado foram
os freebies, objetos gratuitamente disponíveis no Second Life, embora não tivessem terrenos
para colocá-los.
Além da privacidade, as residências podem oferecer outra gama de vantagens, como a
customização do streaming de áudio e vídeo, além de permitir, geralmente, a elaboração de
uma lista de acesso. Contudo, a possibilidade de uma lista de acesso é praticamente exclusiva
de terrenos, não de aluguel de apartamentos, considerando que as restrições são para todos os
usuários que alugam espaços ali.
É possível ter uma residência dentro do metaverso através de aluguel ou compra, sendo
que geralmente o terreno é uma transação separada da construção da residência. Montar um
ambiente “high end” dentro do Second Life pode custar algo em torno de L$ 2000/semana
mais o custo da construção – a compra de uma casa pré-fabricada pode atingir L$10000,
enquanto um bom arquiteto virtual pode cobrar mais de USD 100 para construir uma.
Não é de se estranhar que a maior parte dos usuários não tenha recursos para ter
tamanho “luxo” virtual.
O número de usuários premium, ou seja, os que pagam ao Second Life pelo direito de
possuir terras na mainland e possuem alguma forma de pagamento registrada (como um
cartão de crédito internacional ou mesmo PayPal) é em torno de 80000, o que representa
menos de 1% dos usuários45 totais.
A conta premium dá acesso ao Lindex, que é a plataforma oficial de transações
financeiras do Second Life.
Nenhum dos entrevistados possuía tal conta, o que os obrigava a começar sua vida
virtual com zero em suas contas virtuais ou então procurar câmbios alternativos para realizar
transações com o Real (pois a maior parte também trabalha com PayPal e cartões
internacionais).
A Kaizen Games, empresa brasileira responsável pelo Second Life, possui tal serviço,
mas não se tem informações acerca do volume financeiro ou do número de transações
realizadas.
Sendo assim, parece que, com uma certa ironia, o “sonho brasileiro da casa própria”
45 Tal estimativa foi realizada com base em projeções da comunidade do Second Life, pois atualmente a Linden
Lab apenas divulga o total de horas de uso, não mais o número de usuários.
138
(conforme relatou uma informante) se replique dentro da plataforma. Os poucos informantes
que têm moradia fixa (apenas 3) geralmente o fazem através de aluguéis pequenos (em torno
de L$150/semana) em prédios residenciais, localizados em ilhas ou terrenos administrados por
brasileiros.
4.2.3 Bens virtuais: freebies, objetos pagos ou design exclusivo46?
Dos 22 entrevistados, em 14 puderam ser identificadas características do processo de
aquisição de bens virtuais dentro do Second Life. Praticamente todos (12) disseram, de alguma
maneira, que gostariam de ter mais Linden Dollars para comprar objetos dentro do Second
Life. Três afirmaram que acham o sistema de câmbio complicado ou mesmo difícil de ser usado
por um brasileiro, pois as transações são feitas via cartão de crédito internacional47.
Dois disseram que já ouviram falar de serviços de câmbio operado por brasileiros, que
realizam a conversão de Real para Linden Dollar, mas que não efetivaram transações nesse
sentido. Um disse que “não confiaria num bonequinho pra trocar dinheiro” e a outra disse não
saber se “o cara lá vai depositar minha grana”.
Os freebies são a fonte mais freqüente de objetos para os usuários entrevistados: sete
disseram que já foram em lugares que distribuem tais bens.
Ao contrário do imaginado inicialmente, não há resistência efetiva quanto à compra de
objetos dentro do Second Life; ao contrário, os informantes entendem como um processo
completamente natural de compra e venda, de forma análoga ao método físico que estamos
acostumados.
Embora haja uma clara preferência pelos bens gratuitos (freebies), o fator que mais
atrapalha a compra é a falta de dinheiro. Devido ao pouco número de contas premium, os
usuários brasileiros raramente procuram fontes externas de dinheiro.
Em outras palavras, os informantes não colocaram dinheiro externo dentro do sistema
econômico do Second Life; ao contrário, preferiram ganhar os Linden Dollars através de
atividades dentro da plataforma. Um entrevistado, por exemplo, trabalha como recepcionista
em um curso virtual e outra entrevistada foi promoter de festas e eventos.
46 Freebies são os bens gratuitos, disponibilizados em vários lugares dentro do metaverso; objetos pagos são
considerados aqueles feitos para serem distribuídos em venda de massa; o design exclusivo responde por
objetos considerados caros, realizados ou sob encomenda ou com preços muito acima do mercado (de forma
análoga a um mercado de luxo).
47 O Lindex, câmbio oficial da Linden Lab, pode ser utilizado por usuários registrados e também realizado o
pagamento através de uma conta PayPal – a qual muitos brasileiros não têm porque dependeria de um cartão
internacional para a efetivação do pagamento.
139
Sendo assim, uma faixa de preços típica deste consumidor é algo entre L$10 e L$200 (o
que é abaixo de USD1,00), valores que podem ser facilmente ganhos através de atividades
como figuração em áreas comerciais (para dar a aparência de tráfego, os chamados
campings48) ou mesmo por pequenos trabalhos temporários.
Não foi mencionada qualquer intenção de compra de objetos de alto luxo ou mesmo a
contratação de um serviço caro pelos informantes.
4.4 Interconexão com outras mídias
O Second Life é percebido como uma mídia, sendo colocado em paralelo com as outras
duas redes sociais citadas: o Orkut (da Google) e o MSN (da Microsoft).
Além de muitos entrevistados (pelo menos onze mencionaram expressamente)
também fazerem uso das redes sociais citadas, há uma interconexão entre esses diversos tipos
de mídia, incluindo outras como e-mail e mesmo o telefone celular. Dos vinte e dois
entrevistados, cinco disseram já ter trocado e-mail ou número de celular com alguém que
tenha conhecido dentro do Second Life, embora não tenha sido explorado devidamente a
profundidade específica destes contatos.
Tal troca mostra que há uma extrapolação do contato realizado primariamente no
Second Life para outras formas de comunicação, principalmente no aspecto relacional. Todos
os entrevistados participam de algum grupo dentro do Second Life (tal como “Brasileiros no
SL”, “Ilha Brasil”, dentre outros). Tais grupos servem para comunicação interna, além de
publicidade de produtos e eventos como festas.
Um entrevistado comentou que achava o Second Life melhor que o MSN porque “você
conversa de divertindo”.
Jenkins (2006) já mencionava que tal fenômeno era bastante comum entre as mídias;
uma análise mais atenta à própria história dos meios de comunicação mostra que um novo
meio não significa a exclusão de outros mais antigos (Briggs e Burke, 2006), como no caso dos
correios e da Internet. Basta lembra que o e-mail, a despeito de todos os outros métodos que
surgiram após, tem mais de três décadas de existência, não mostrando sinais ainda de
abandono.
48 O nome camping denota exatamente a função: os avatares ficam sentados em cadeiras, sem nada fazer, e
ganham valores como L$10 a cada trinta minutos; tal mecanismo serve para aumentar artificialmente o
tráfego de uma região comercial e, conseqüentemente, valorizá-la.
140
4.5 A migração
Parece haver certa congruência em direção aos conceitos de migração apresentados
por Castronova (2005), Taylor (2006) e Blanchard e Horan (1998), o que será exposto a seguir.
4.5.1 Interessante, ou simplesmente divertido
Praticamente todos os entrevistados (em vinte respostas, dezoito foram positivas)
conheceram a plataforma através de indicações de amigos ou então por matérias veiculadas na
mídia. A decisão de realizar o download consiste em uma decisão individual, considerando que
não existem computadores que vêm com o software pré-instalado (como no caso do Internet
Explorer).
Outro dado é que seis entrevistados, deram como motivo principal para continuar
usando o Second Life palavras relacionadas à “diversão”. Um usuário relatou problemas na
instalação do software, dizendo que achava “enrolado” o processo. Contudo, parece que tal
opinião é isolada, considerando que pelo menos cinco entrevistados citaram explicitamente
não ter encontrado problemas na instalação.
É possível que o conceito errôneo acerca de o Second Life ser um jogo esteja
relacionado com a percepção de diversão que muitos entrevistados têm sobre a plataforma.
Da mesma forma que o Mozilla Firefox, cada download do Second Life representa uma
vontade individual, a despeito do fato de ser um programa cujo tamanho é em torno de 40MB
– o que já poderia afastar potenciais usuários, como aconteceu com a antiga versão do Joost.
Sendo assim, a pesquisa procurou investigar qual a motivação principal para o primeiro
contato com a plataforma. Uma quantidade razoável de pessoas respondeu com conceitos
ligados à diversão e ao lado social.
Quase todas relataram não terem passado por dificuldades significativas no que se
refere ao lado tecnológico da adoção, passando pela Orientation Island e montando seu
avatar, ainda que de maneira primária.
A dificuldade relatada repousa principalmente na ausência de indicações claras sobre
“onde seria o lugar das boates” ou então “onde fica a ilha dos brasileiros”. Um informante
chegou a pensar, nesse primeiro momento, que o Second Life consistia apenas naquela
primeira ilha de introdução.
Uma vez passada essa fase, o destino principal dessas pessoas eram as áreas comuns de
141
entretenimento.
4.5.2 Existo, logo socializo
As atividades mais citada nas entrevistas, especialmente quando indagados sobre o que
fazem quando logados, são referentes às atividades sociais.
Outra opção mencionada por alguns entrevistados foi a das sandboxes, que são ilhas
públicas destinadas à construção. Nestas ilhas, que são geralmente públicas (embora existam
algumas particulares abertas ao público, como a da IBM), os usuários podem ter um espaço
para desenhar objetos, residências, dentre várias outras coisas.
O processo de socialização na plataforma tem uma característica muito mais ligada à
exploração de novos lugares (Castronova, 2005a), com uma sensação de vitória quando se tem
a descoberta de um novo clube ou praia brasileira; uma informante relatou que se sentiu
“menos burra” quando conseguiu finalmente encontrar os lugares habitados pelos brasileiros.
A primeira atividade dos recém-chegados avatares consistiu em ir a lugares de
entretenimento e socialização; iam aos shoppings, mesmo sem ter dinheiro para comprar coisa
alguma, mas acabavam travando seus primeiros contatos sociais nestes lugares.
Neste sentido, a proposta levantada por Blanchard e Horan (1998) parece se aplicar
também ao Second Life, mesmo não sendo um jogo. A criação do capital social aparece como
uma das primeiras e mais importantes atividades destes usuários dentro do metaverso.
Não foi possível averiguar a hipótese de ser o Second Life uma narrativa em construção,
conforme Taylor (2006), devido à ausência de respostas (positivas ou negativas) neste sentido.
4.6 Percepção sobre negócios dentro do Second Life
4.6.1 Ilhas que nada vendem, mas são “bonitinhas”
Uma informante disse a frase de está estampada neste subtítulo.
Em geral os entrevistados não demonstraram hostilidades em relação à presença de
empresas (neste caso, das “reais”, que atuam efetivamente no mercado que estamos
acostumados) na plataforma. Têm uma visão até inclinada a achar as iniciativas boas, mas não
conseguem citar nenhum tipo de campanha marcante.
Um informante disse que lembrava “existir algo da Globo” na Ilha Brasil (de fato, é um
142
stand do G1, da Rede Globo) enquanto outra menciona os bens virtuais da Ferrari como
exemplo. O problema é que efetivamente os bens virtuais marcados com o logo da Ferrari não
eram devidamente licenciados pela empresa, sendo o equivalente a uma “pirataria virtual”.
Embora muitas pessoas já tenham ido às ilhas montadas por empresas (ou mesmo aos
prédios em áreas comerciais), não parece haver algum atrativo real nesses lugares, a não ser o
estético.
Alguns entrevistados, quando indagados sobre as ilhas do Itaú ou do Bradesco, por
exemplo, demonstraram não saber que existiam.
Há uma ausência de bens a serem vendidos nas campanhas das empresas, mas parece
que a estratégia de oferecer determinados bens virtuais é extremamente bem-vista por alguns
informantes.
Um entrevistado disse que “acha irado” que as empresas ofereçam freebies em suas
localizações. Outro disse que vai às ilhas corporativas pela “cordialidade dos atendentes”.
Algumas empresas tentam servir como um espaço de inserção do avatar recém-chegado ao
metaverso, muito embora esse fato não tenha sido mencionado por nenhum participante da
pesquisa.
4.6.2 Benefícios para as organizações
Muitos participantes acham que as empresas e organizações em geral podem se
beneficiar do Second Life, mas apenas uma informante sugeriu um modelo básico de negócios
para um banco, atuando em câmbio de reais para Linden Dollars, ou então uma loja de roupas
de alguma grife famosa.
4.6.3 Trabalho e renda dentro do metaverso
Alguns informantes (quatro) relataram desenvolver atividades laborais dentro da
plataforma, como promoter e atendente de curso virtual, além de um outro que produzia
novas “peles” para os avatares (modelos customizados de cor de pele, textura, olhos, etc.).
Considerando que não há quase verba trazida para dentro do sistema econômico pelos
indivíduos no caso estudado, essa fonte de renda se constitui na principal, sendo primária para
financiar os gastos da vida virtual.
Há também os casos em que o avatar tem algum patrocinador, geralmente um amigo
143
que já tem algum tempo de uso da plataforma, que fornece uma quantidade inicial de Linden
Dollars para ele, como no caso de dois entrevistados.
Além dos campings, as boates e áreas de entretenimento geralmente realizam
concursos e sorteios, com prêmios em L$ ou mesmo objetos, geralmente para aumentar a
freqüência, o que acaba se tornando outra fonte de renda.
4.7 Tecnologia e interface
A maioria dos entrevistados relatou usar o mecanismo de mensagens textuais dentro da
plataforma como forma principal de comunicação, mas alguns também usam a funcionalidade
de voz sobre IP (VoIP), igualmente embutida no software do Second Life.
Uma das razões citadas para tanto é que às vezes, em ambientes com muitas pessoas, a
comunicação com voz pode ficar “igual a uma feira”, como disse uma informante,
transformando-se em um local de difícil compreensão do que é dito. No texto há a vantagem
de ser criado na tela do usuário (nos moldes dos MMORPGs e MUDs) uma espécie de log, que
grava tudo o que foi dito e por quem.
4.8 Hábitos de uso
Dez usuários declararam, direta ou indiretamente, serem usuários freqüentes da
Internet, sob formas que poderiam ser relacionadas com o conceito de heavy users: podem
permanecer conectados por mais de dez, doze horas ao dia, apresentando uma espécie de
continuação da conexão do trabalho para a residência, embora com objetivos diferentes (“uso
aqui em casa porque ninguém fica me enchendo o saco”, como disse uma entrevistada).
Embora não os restantes não possam ser classificados como heavy users, apenas dois
disseram que não costumam usar freqüentemente a Internet.
144
5 CONCLUSÃO
5.1 Rotwang, Maschinenmensch e o avatar
Quem é esse avatar? Qual a personalidade verdadeira dessa figura que habita o
metaverso? Como se vive essa dualidade entre o real e o virtual?
Voltando à analise de Huyssen (1982), que identifica no filme Metropolis duas visões
sobre a tecnologia moderna, para qual lado penderia a percepção do indivíduo sobre essa
possibilidade de desenvolver uma “segunda vida”? A ênfase seria no potencial destrutivo e
opressor ou então na confiança em um progresso tecnológico, em uma melhoria da vida em
sociedade através da tecnologia?
Parece, nesta primeira abordagem exploratória, que os fatores “meta”, ou seja, aqueles
relacionados à coisa em si, não são tão relevantes para o indivíduo imerso num sistema de
realidade virtual simulada como o Second Life.
Uma possibilidade é que o indivíduo consiga conviver com dois mundos, inicialmente
diferentes, diametralmente opostos: de um lado, a realidade, de outro a fantasia. E que essa
fronteira faça sentido enquanto experiência de imersão.
Os entrevistados sabem que o Second Life é uma simulação, têm perfeita percepção
que estão em frente a um computador. Ou seja, fisicamente, não passam de indivíduos
rodando um software em uma máquina conectada à Internet, com gráficos 3D sendo
renderizados várias vezes por segundo, projetando as imagens em telas de computador.
Nenhum deles manifestou desgosto pela vida que têm fora da simulação;
aparentemente, não se trata de uma fuga para um outro mundo, mas sim algo mais parecido
com um jogo. Tem-se a entrada e a saída nos horários mais convenientes.
As relações pessoais, contudo, criadas nestes ambientes, parecem extrapolar o campo
da mera simulação. Conforme Turkle (1995) havia proposto, as múltiplas personalidades são
perceptíveis nessa aparente dissociação entre o “real” e o “virtual”, sendo que neste último
ambiente há uma maior liberdade em escolher quais características a personagem terá.
Personagem, por sinal, é um conceito interessante para analisar este fenômeno.
William Shakespeare (2005 [1623]), na peça “As you like it”, traz o seguinte
pensamento:
145
“All the world's a stage,
And all the men and women merely players:
They have their exits and their entrances;
And one man in his time plays many parts,
His acts being seven ages (...)”
A idéia de ser o mundo um palco, no qual as pessoas representam, parece encontrar
eco tanto nos metaversos quanto nos seus antecessores.
Os antigos RPGs49 que, como o próprio nome diz, são jogos de representação, atuam
neste mesmo sentido de usar uma outra persona, configurando um estado consciente de
representação, no qual todos sabem que estão encarnando personagens; a narrativa, portanto,
desenvolve-se neste nível de fantasia, local de onde surge a diversão.
Passando para uma plataforma eletrônica, encontram-se os MMORPGs, que adicionam
a característica de conexão de rede e construção da narrativa de modo online, encontrando o
seu desenvolvimento posterior no metaverso, que pegam as características multi-usuário e
transformam a narrativa em uma construção coletiva consciente e em tempo real.
Acredito que há uma supervalorização do caráter virtual desta construção,
principalmente levada a cabo por seus detratores. Não seria o metaverso, assim como o teatro,
apenas uma forma de lazer, em um espaço imagético diferente, mas através do mesmo
princípio que é a representação?
Trata-se de uma linha de pensamento alternativa. No lugar de privilegiar o virtual e
perceber os MMORPGs e metaversos como novidades absolutas, traçar este paralelo com o
teatro pode levar à percepção que a idéia subjacente não é tão recente.
É o mesmo caminho percorrido por Grau (2007), ao conseguir traçar as origens da idéia
de imersão até 60 A.D., indicando espaços originalmente imaginados para provocar uma
sensação de imersão em determinado local, como os panoramas do século XVI.
Acredito que a idéia do virtual como algo muito estranho ao “real”, essa percepção
altamente crítica de modo negativo, é desenvolvida principalmente com o avanço tecnológico
propiciado pela eletricidade e novas formas de comunicação, como o rádio e a televisão,
culminando com o nascimento e crescimento da informática.
Conforme já prenunciado em 1927, por Metropolis, uma das grandes questões da
49 Do Inglês, “Role Playing Games”.
146
humanidade foi exatamente o que seria a existência, ou seja, em outras palavras, a
humanidade em si.
Autômatos já existem pelo menos há cinco séculos e o domínio da técnica convive
conosco pelo menos desde a idade do Bronze como fator importante para o avanço da
civilização.
A criação de um objeto que representa uma substituição da figura humana pela
sintética já havia sido abordado, de alguma forma, em obras como Frankenstein. Metropolis vai
apresentar esta criatura, mecânica, sob a ainda recente mídia chamada cinema.
O avatar, representação imagética do indivíduo no ambiente virtual, também pertence
a esse raciocínio. Ao abrir a possibilidade de diferenciação entre a imagem “real” de uma
pessoa e a virtual, coloca tal mídia em um patamar comparável ao teatro, com suas roupas,
fantasias, efeitos especiais, atributos físicos diferenciados, maquiagem e, principalmente, um
novo papel nesta representação. Não é por acidente que existe tanta proximidade com os
MMORPGs, exceto no que se refere ao fato de não serem necessariamente jogos.
5.2 Uma visão conjunta
Percebeu-se durante as entrevistas várias manifestações relacionadas a eventuais
discrepâncias entre o “real” e o “virtual”, principalmente quando se referia às profissões e
atividades realizadas no mundo “real”.
Isso pode demonstrar, até certo ponto, que há uma consciência do que é mediado pela
plataforma e do que pertenceria a um mundo “externo” a ela. Configuraria, neste caso, uma
imersão, porém não uma simulação bem sucedida. No dizer de Rodrigues (2007), “uma
simulação bem sucedida seria, desse modo, a inibição mesma do virtual”.
De certa forma, talvez seja que a experiência não tem como objetivo (ou possibilidade
atual) a simulação total, inibidora do virtual. As táticas de imersão utilizadas, com o apoio do
contexto socializante, ainda não propiciam tal fenômeno.
A ausência de dispositivos de interface em 3D, disponíveis massificadamente, como
HMDs ou mesmo as caras CAVEs, tornam a imersão intermediada pelo computador realizada
por mecanismos tradicionais, como o mouse e o teclado. Mesmo o uso de suportes de mídia
ainda não é tão forte, conforme pode-se perceber nas entrevistas.
Um uso mais intenso de tais dispositivos pode ser o catalisador das tecnologias de
imersão em realidades simuladas, como o metaverso, em um futuro próximo.
147
5.3 Privacidade e representação
Na pesquisa de Bakardjieva (2003), alguns dos entrevistados admitiram ter sentido
receio acerca de sua privacidade quando se junta a uma comunidade virtual, pensando,
inclusive, que suas verdadeiras identidades (assim como endereços, características físicas, etc.)
pudessem ser automaticamente descobertos – embora, no caso, não houvesse tal
possibilidade, exceto através de informações liberadas pelos próprios usuários.
5.4 Correlação entre heavy users e uso do metaverso?
Devido à natureza da entrevista, não foi possível traçar algum perfil do usuário do
Second Life que tivesse significância estatística passível de generalização. Em uma análise
exploratória, conforme dito acima, o objetivo principal é fornecer subsídios para pesquisas
posteriores e para a compreensão do fenômeno estudado.
Contudo, algumas características puderam ser notadas, já nesse primeiro contato.
Caso seja colocado em evidência a categoria de heavy users (versus seus respectivos
antagônicos, os light users), podem ser detectadas algumas comunalidades entre os
pertencentes a esse grupo.
Assim como na pesquisa do Ibope realizada na Campus Party (IBOPE, 2009), os que
declaram utilizar de modo mais intenso a Internet têm associados a isso um comportamento de
uso bastante significativo de uso do Second Life, tanto do lado de horas de uso como da
percepção social.
Neste usuários, foram percebidas características interessantes como uma aparente
valorização das relações mediadas por computador (embora tais características possam ser
encontradas em alguns que não são classificados como heavy users). As relações sociais destes
usuários, contudo, parecem ter maior propensão a adotar uma postura transmidiática,
perpassando outras redes sociais, como o Orkut.
Um dos fatores que pode estar indiretamente associado a este achado é relacionado à
interface, principalmente os requisitos de conectividade (tanto da máquina quanto da
Internet, como a velocidade e capacidade da banda). Parece que os usuários que são mais
intensos no uso da Internet e de redes sociais costumar investir mais em suas máquinas, ou
mesmo apenas na capacidade de sua conexão.
148
Tais requisitos são fundamentais para um bom nível de uso do Second Life, conforme já
indicado por Wetsch (2008). Contudo, não há ainda quantidade de pesquisas que possam
apresentar uma correlação significativa neste sentido.
Não foi possível traçar uma relação entre a profissão (ou ocupação profissional) dos
entrevistados que se enquadram no conceito de heavy users. Tal fato deve-se a um erro na
confecção do roteiro de entrevista, no qual as perguntas relacionadas às características
demográficas ocuparam o primeiro lugar. Tal posicionamento pode ter sido responsável por
criar uma espécie de desconfiança para os entrevistados; caso estivessem no final, o
pesquisador poderia ter sido beneficiado com a criação de uma espécie de vínculo com o
entrevistado, gerando uma maior propensão para a resposta.
Seis usuários que foram classificados como heavy users tem idades abaixo de 30 anos,
enquanto cinco (dos dez) exercem funções que poderiam se enquadrar em áreas ligadas à
Tecnologia da Informação e Comunicação.
5.5 Proposta de modelo para futuros testes
Com base nos resultados da pesquisa, é proposta aqui uma versão inicial de um modelo
que poderia ser utilizado futuras pesquisas sobre o tema.
149
Uso intenso
de tecnologia
Uso de outras
redes sociais
Socialização
Sensação de
imersão
Diversão
Estética da
interface
Atitude
em relação
à plataforma
Intenção de
uso
Uso efetivo
Facilidade de
uso percebida
Migração
Ilustração 23: Modelo proposto para futuros testes
As relações percebidas nesta análise exploratória foram sintetizadas neste modelo
apresentado.
A interface parece exercer papel importante na percepção da facilidade do uso. Alguns
usuários chegaram a realçar a facilidade que perceberam no primeiro contato com o Second
Life, principalmente através da Ilha de Orientação (Orientation Island). Além disso, dentro da
construção teórica relacionada à interface, são incluídos os aspectos ligados à percepção
estética, principalmente porque foram mencionados em algumas entrevistas opiniões bastante
positivas relacionadas ao visual do simulador, o que propiciaria maior realismo e poderia gerar
uma atitude positiva em relação à plataforma.
O uso intenso de tecnologias (aqui caracterizado com o heavy user), junto com o uso de
redes sociais, a sensação de imersão e a própria diversão foram incluídos como possíveis
relações causais positivas com a intenção de uso da plataforma. No caso, como a diversão e a
sensação de imersão somente são possíveis após o efetivo uso da plataforma, tais construções
teóricas foram consideradas como possíveis causas da permanência na plataforma, atuando em
uma espécie de loop, um feedback contínuo.
A socialização gerada pela plataforma também pode ter essa mesma característica. Ao
mesmo tempo em que pode servir como conseqüência de outras redes sociais (“eu já uso
outras redes e por isso poderia usar o Second Life”), pode ser a sua causa (“eu já uso o Second
Life e tenho vontade e extrapolar meus contatos daqui para outras plataformas”).
A intenção de uso, antes de passar para o uso efetivo, passa pela migração, que atua
como processo de mediação. Seria interessante aprofundar o estudo dos fatores que poderiam
levar alguém a não usar o Second Life ou mesmo das eventuais desistências.
5.6 Propostas de futuras linhas de pesquisa
Serão feitas, a título de contribuição para o aumento da quantidade e qualidade das
investigações teóricas e empíricas relacionadas ao presente tema, sugestões para pesquisas
posteriores, com base em aspectos ainda com pouca base teórica ou prática, observados ao
longo desta pesquisa e, principalmente, pelas entrevistas.
5.6.1 Influência da estética 3D na atitude em relação à plataforma
151
Parece que a estética 3D pode ser um fator forte de influência na decisão de adoção ou
mesmo na continuidade do uso do metaverso.
Muitos entrevistados mencionaram implícita ou explicitamente tais atributos,
geralmente os associando a idéias relacionadas ao prazer, diversão, felicidade, dentre outras
que podem ser concebidas em um sentido positivo.
No modelo proposto acima, a estética da interface pode influenciar positivamente
tanto a facilidade de uso percebida quanto à atitude em relação à plataforma. Tal potencial
relacionamento é fruto de análise das duas características mais relacionadas, em um nível
causal, aos porquês do uso do Second Life.
Uma das limitações presentes na pesquisa é que, como foram realizadas entrevistas
com pessoas que já usam o sistema, não pôde ser explorada de forma adequada um eventual
estágio de decisão de adoção, sendo tal investigação em caráter retroativo por autodeclaração, o que pode trazer incompletudes à análise.
Seria interessante realizar estudo com foco na eventual influência da estética 3D na
adoção de tais tecnologias, não somente do metaverso, mas de outros sistemas que possam ser
desenvolvidos com o mesma idéia.
Tal pesquisa poderia ser crucial para estabelecer até uma relação de significância
estatística entre tais fatores, denotando uma relação causal. Contudo, mesmo a negativa já
seria objeto de fértil estudo.
5.6.2 Correlação entre redes sociais e o metaverso
Há uma congruência entre os usuários do Second Life entrevistados e os usuários de
redes sociais e programas como Messengers.
No modelo proposto, tal relação foi colocada de forma biunívoca, sendo tanto o efeito
de uma socialização decorrente do uso do Second Life (“continuar as conversas com os amigos
de dentro da plataforma”) quanto como possível incentivo ao uso do Second Life, no ponto em
que pode-se atingir um caráter de complementariedade às redes já existentes.
Seria bastante útil o estudo desta correlação (caso se confirme) entre redes de
relacionamento (tais como Orkut e Facebook), sistemas de publicação (como os blogs e o
recente Twitter, de microblogging).
152
5.6.3 O processo de socialização
Embora tenham sido identificadas várias características de um processo de socialização
secundária dentro do Second Life, tais idéias não foram exploradas de forma a abranger a
completude do fenômeno.
É possível que a socialização dentro da plataforma tenha aspectos semelhantes às
encontradas em outras redes sociais – como as supracitadas, mas tal relacionamento não foi
aprofundado nesta pesquisa. Por outro lado, é bastante provável que o aspecto de socialização
em 3D exerça algum tipo de influência específica, diferenciando-se de outros suportes, como
o 2D e mesmo o modo texto, como de chats na Internet.
Foi percebida a interconexão de diversas mídias dentro da plataforma, aspecto que
pode ser explorado mais detidamente. Como é esse processo de socialização?
Futuras entrevistas, tanto com avatares quanto com seus respectivos alter ego
humanos, podem explicitar determinadas características que não foram devidamente
desveladas por este estudo.
A realização de um estudo comparativo, colocando-se de um lado os tratos de
socialização no “mundo real” e de outro as relações do mundo virtual poderia constituir uma
fonte de insights valiosos sobre o tema.
5.6.4 Motivadores da conversão do uso eventual ao habitual
Não foi estudado o processo de transição do uso eventual para o habitual (ou seja, o
aumento nas horas de utilização e o respectivo aumento de intensidade na percepção da
imersão), ou ainda o fenômeno em sentido inverso: a redução no uso com posterior abandono
da plataforma.
Tal aspecto apenas foi mencionado de forma incidental por poucos entrevistados, que
se detiveram alguns momentos na explicação de como passaram a usar mais o metaverso,
ambos convergindo para idéias próximas ao aumento da socialização como causa da
participação mais constante no Second Life. Ou seja, devido ao aumento dos contatos sociais
naquele ambiente, houve uma tendência a lá permanecerem mais.
Um estudo que possa realizar um levantamento dos principais aspectos que ocasionam
tanto o aumento quanto a redução de uso, analisando a possível relação com a socialização e
mesmo a outros conceitos, como a curva de aprendizado e massa crítica de usuários, poderia se
153
mostrar, além de interessante, bastante útil na compreensão global do fenômeno.
5.6.5 Hábitos de compra no metaverso
Os hábitos de compra no metaverso foram objeto de investigação em uma parte
específica do roteiro de entrevista; alguns comportamentos específicos conseguiram ser
identificados no grupo de estudo, como a preferência pela obtenção de bens a custo
percebido zero e a aparente pouca importância que dão às iniciativas das empresas “reais”
dentro do Second Life.
Contudo, como não foi percebido, a priori, uma rejeição às organizações de fora, seria
bastante interessante pesquisar como essas percepções são construídas, além de se aprofundar
mais o estudo dos hábitos de compra através da influência do marketing dentro da plataforma.
Outro caminho possível de pesquisa seria a investigação das atitudes de empresas que
têm algum tipo de presença dentro do metaverso, como a Reuters ou a Globo, tanto do ponto
de vista corporativo, como estratégia de marketing, quanto do ponto de vista das pessoas,
tentando-se captar suas percepções e reações às atividades empreendidas por aquelas
organizações.
5.7 Implicações para os pesquisadores em tecnologia
A pesquisa em tecnologia, ainda muito pautada pelo modelo TAM e seus derivados
conceituais, concentra-se fortemente nos conceitos de usuário e aceitação de tecnologia.
Contudo, quanto mais a tecnologia vira um fator que permite ao indivíduo sair de uma posição
de mero consumidor de conteúdo e ir para uma perspectiva de criador de conteúdo, o uso
passa a não ser meramente uma postura passiva.
O mesmo acontece com a idéia de aceitação. Aceitar implica na mesma postura
passiva, como se o indivíduo tivesse apenas a opção de aceitar ou não.
Como tais idéias foram desenvolvidas em um contexto empresarial, para a análise da
implementação de sistemas de informação, compreende-se que tal limitação esteja
relacionada a esta gênese.
Contudo, para a análise de um futuro uso de tecnologias como o metaverso, é
necessária uma expansão do modelo tradicional, para contemplar outros aspectos que reflitam
esse caráter volitivo, incorporando em sua parte de atitude fatores como diversão e
154
socialização.
A presente dissertação oferece um dos vários possíveis caminhos para isso. Acredita-se,
contudo, que é fundamental realizar a inclusão destes aspectos para se obter algum modelo
que seja suficientemente preditivo para auxiliar na realização de cenários futuros para o
planejamento estratégico.
5.8 Implicações para o mercado
Conforme já mencionado anteriormente, quase 90% das empresas que tiveram algum
tipo de ação de marketing dentro do Second Life falharam. É um número bastante alto, e que
não pode ser explicado por uma suposta inexperiência executiva das agências de publicidade
contratadas. Todas essas organizações têm um faturamento que passa dos milhões de dólares,
batendo os bilhões no caso de algumas.
Contudo, a falha na entrada nesta nova mídia é muito mais relacionada ao
desconhecimento do ethos, ou seja, dos seus mecanismos intrínsecos, que propriamente falta
de dinheiro.
Aliás, falta de dinheiro não é um problema tão grave. Basta perceber as estratégias de
marketing viral, que podem ter um custo que beira zero para a empresa.
A presente pesquisa, embora não possa ser aplicada diretamente pelas organizações,
pode servir como uma fonte de insights para futuras investigações, como a realização de focus
groups, entrevistas, pesquisas quantitativas, dentre vários outros mecanismos de mensuração
utilizados pelas empresas em relação a mídias tipo o metaverso.
5.9 Algumas últimas palavras
Esta dissertação de Mestrado representa apenas um estágio inicial, praticamente
embrionário de pesquisa, em uma área que carece de conhecimentos sistematizados dentro da
área da Administração.
A realização de um diálogo com outras áreas acadêmicas, principalmente com a Arte,
Psicologia, Sociologia e Comunicação, pode-se revelar bastante frutífero para a própria
Administração, oferecendo-lhe outras visões, muitas vezes exploradas através de caminhos
novos, para a compreensão dos fenômenos sociais.
Adverte-se que não se pode tirar conclusão generalizante alguma desta pesquisa; não é
155
o objetivo de uma análise exploratória. A amostra é pequena em relação à população para
possibilitar qualquer tipo de inferência estatisticamente válida. Contudo, realmente não é esse
o objetivo dessa pesquisa.
Como tema ainda novo e com até bastante literatura, porém altamente espalhada nos
mais diversos campos do conhecimento, tornou-se necessário colocar o foco na junção de tais
idéias e conceitos e exploração livre de possíveis componentes de um modelo, a ser ainda
exaustivamente testado, melhorado, testado, ampliado, testado, reduzido, testado...
Desencoraja-se fortemente qualquer tipo de uso direto desta pesquisa acadêmica para
a confecção direta de métodos e estratégias de marketing, branding ou áreas correlatas; é
impossível inferir, neste estágio, qualquer lista de melhores práticas (pois elas sequer existem
ainda) ou então a proposição de n maneiras para ganhar dinheiro no metaverso.
Encoraja-se o uso desta dissertação como um dos possíveis pontos de partida para a
compreensão, tanto acadêmica quanto mercadológica, deste fenômeno, sugerindo ao
pesquisador que prossiga nas investigações, com o olhar crítico daquele que sempre coloca em
dúvida mesmo a mais flagrante verdade. Conforme escreveu Nietzsche50:
“Agora lhe parece um erro o que outrora você amou como sendo uma
verdade ou probabilidade: você o afasta de si e imagina que sua razão teve aí
uma vitória. Mas talvez esse erro, quando você era outro – você é sempre
outro, aliás -, lhe fosse tão necessário quanto as suas 'verdades' de agora,
semelhante a uma pele que lhe escondia e cobria muitas coisas que você
ainda não podia ver.”
Portanto, sejam bem-vindas as críticas. O pesquisador está disponível para quaisquer
esclarecimentos que se façam necessários.
50 Tal citação encontra-se na epígrafe desta dissertação.
156
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