Discurso de Kofi Annan, 19 de junho de 2013
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Discurso de Kofi Annan, 19 de junho de 2013
Conselho de Segurança das Nações Unidas debate o conflito e os recursos naturais: Discurso de Kofi Annan, 19 de junho de 2013 Senhor Presidente, Membros do Conselho, Obrigado por esta oportunidade de vos dirigir hoje a palavra. O tópico em discussão é extremamente importante e é-me também particularmente caro. Irei limitar as minhas observações de hoje ao que se passa em África, embora eu acredite que os desafios que o continente enfrenta são também relevantes para muitas outras regiões do mundo. Durante anos, vimos que os recursos naturais têm sido uma presença em conflitos internos ou regionais em África e, por vezes, catalisadores dos mesmos. Só nos últimos 15 anos, a rivalidade pelo acesso aos recursos naturais tem alimentado guerras e rebeliões na Serra Leoa, na Libéria, na República Democrática do Congo, no Sudão e no Sudão do Sul, entre outros países. O petróleo tem também desempenhado um papel importante na violência recorrente no delta do Níger. Esta estreita e recorrente associação entre recursos naturais e guerra levou algumas pessoas a descreverem a descoberta e a exploração de recursos naturais em África como uma praga. Esta visão é demasiado simplista. Para cada conflito, é possível encontrar vários exemplos positivos de países africanos onde os recursos naturais estão agora a alimentar um crescimento elevado e sustentado e a melhorar as vidas quotidianas dos seus cidadãos. Os recursos naturais não são uma praga nem uma bênção. São simplesmente uma fonte de oportunidade. Podem ser utilizados para um bem enorme ou podem ser desperdiçados. Ao longo da última década, as economias africanas têm cavalgado a crista de uma onda global de mercadorias básicas. O aumento da procura por recursos naturais na China e noutros mercados emergentes catapultou os preços de exportação para novos recordes. O petróleo, o gás e os recursos naturais de África tornaram-se um poderoso íman para o investimento estrangeiro. Com novas explorações a revelarem reservas muito maiores do que as anteriormente conhecidas, África está destinada a obter ganhos inesperados com os recursos naturais. O desafio que os governos da região enfrentam reside em converter os ganhos inesperados temporários numa conquista permanente do desenvolvimento humano. Recordemos: os recursos naturais não causam guerras. Os conflitos violentos acontecem quando as instituições nacionais são demasiado fracas para conter as tensões políticas, étnicas ou religiosas no âmbito de um diálogo nacional pacífico. Mas a concorrência por recursos naturais pode muitas vezes ampliar e acelerar o conflito, destruindo a malha já de si debilitada de Estados bastante frágeis ou elevar a fasquia em conflitos latentes entre países vizinhos. Por conseguinte, o debate deve centrar-se na forma como os recursos naturais podem contribuir para resultados superiores no domínio do desenvolvimento humano e reduzir as desigualdades, nos atores envolvidos na sua extração e nas regras que regem o comércio internacional e que podem ajudar a prevenir a ocorrência de tais forças centrífugas. A gestão eficaz e transparente dos recursos naturais de um país é uma prioridade para a prevenção dos conflitos, o combate à corrupção e a promoção do desenvolvimento sustentável. Para que as sociedades funcionem e prosperem, são necessárias três condições interrelacionadas: desenvolvimento económico e social; paz e segurança; e Estado de direito e respeito dos direitos humanos. Se forem bem explorados, os recursos naturais podem contribuir para reforçar as três. A responsabilidade por assegurar a existência destas condições pertence principalmente aos governos africanos. O ponto de partida consiste em que todos os países desenvolvam estratégias nacionais que estabeleçam os termos mediante os quais os seus recursos naturais irão ser desenvolvidos, incluindo políticas fiscais, disposições contratuais e regimes fiscais. Estas estratégias devem substituir os cálculos de curto prazo pela necessária reflexão de longo prazo. Fundamentalmente, estas estratégias nacionais devem identificar projetos extrativos que possam gerar mais empregos através de ligações eficazes à economia local e existente. África não pode criar um crescimento dinâmico e uma prosperidade partilhada enquanto os projetos extrativos funcionarem dentro de enclaves ou os países exportarem recursos naturais sem valor acrescentado. Acima de tudo, as estratégias nacionais devem descrever de que forma a indústria extrativa se alinha com os planos de redução da pobreza, crescimento inclusivo e transformação social. Para alcançar o sucesso será necessário que haja liderança, transparência e responsabilização. A transparência é uma ferramenta poderosa e não existe qualquer substituto para o escrutínio público no desenvolvimento de políticas eficazes e equitativas. No entanto, os governos africanos não podem abordar todos estes desafios da governação sozinhos. A comunidade internacional deve também assumir responsabilidades. Quando os investidores estrangeiros efetuam uma utilização excessiva de empresas offshore, empresas fictícias e paraísos fiscais, estão a debilitar as normas de divulgação e a prejudicar os esforços dos reformistas em África para promover a transparência. Estas práticas também facilitam a evasão fiscal e, em alguns países, a corrupção, negando a África receitas que deveriam ser utilizadas para combater a pobreza e a vulnerabilidade. O Relatório do Progresso em África deste ano revelou que foram utilizadas empresas fictícias anónimas em cinco acordos que custaram à República Democrática do Congo quase 1,4 mil milhões de dólares entre 2010 e 2012. Esta soma é o equivalente a quase o dobro do orçamento conjunto do país para a saúde e a educação em 2012. De facto, África perde mais dinheiro todos os anos através de uma técnica de fraude fiscal, conhecida como fixação errónea dos preços, do que recebe por via da ajuda ao desenvolvimento internacional. Os conflitos causados pelos recursos naturais podem e devem ser prevenidos muito antes de ocorrerem. Assim que começam a ser utilizadas armas já é demasiado tarde. Ao introduzir regras internacionais para acabar com as oportunidades de fraude fiscal, regras que limitam a utilização de empresas fictícias e outras ferramentas que contribuem para acordos secretos, suspeitos e abusivos, a comunidade internacional pode ajudar a prevenir as condições que conduzem à competição armada pelos proveitos da riqueza natural. Uma vez iniciado um conflito armado, a riqueza natural tanto o impulsiona ao aumentar a recompensa pela vitória, como o alimenta ao fornecer fundos para adquirir armas e munições. O Conselho pode desempenhar um papel importante para acabar com o saque aos recursos minerais e a outros recursos naturais que perpetuam o conflito violento. Na África Ocidental, por exemplo, o Conselho tomou medidas firmes para banir o tráfico de diamantes e de madeira, cujos lucros estavam a financiar grupos armados. Sem estas medidas, os esforços da ONU para acabar com as guerras naquela região teriam sido mais difíceis. O Processo de Kimberley criado para combater os “diamantes de sangue” não era o ideal, mas demonstrou que a comunidade internacional consegue trabalhar em conjunto para suspender os fluxos de receitas ilegais que alimentam as guerras. Aquilo de que precisamos hoje é de um quadro muito mais ambicioso e abrangente para a transparência, práticas fiscais justas e fixação de preços de ativos para que as condições que contribuem para os conflitos causados pelos recursos naturais possam ser eliminadas. O Africa Progress Panel, a que eu presido, analisou detalhadamente a forma como a riqueza de recursos naturais pode contribuir melhor para um maior bem-estar e um crescimento equitativo para as nações africanas. As nossas perspetivas são otimistas. Pela primeira vez ao longo de uma geração, o número de pessoas que vivem em situação de pobreza em África baixou. As taxas de mortalidade infantil estão a diminuir. Verificaramse progressos no combate às principais doenças infeciosas. É agora maior o número de crianças africanas que frequentam a escola. Todos estes factos constituem prova de que a combinação de um crescimento económico mais forte e de políticas reforçadas pode produzir resultados. Tirando partido de uma década de forte crescimento, a governação económica continua a melhorar em muitos países, oferecendo proteção contra o ciclo de expansão/contração alimentado por anteriores booms no setor das mercadorias básicas. Em toda a região a democracia está criar raízes mais fortes – e a responsabilização que acompanha a democracia fortalece a gestão de recursos naturais. Alguns investidores estrangeiros demonstram que conseguem obter bons retornos dos investimentos em África não deixando de cumprir as normas internacionais mais rigorosas no âmbito da proteção social e ambiental. A colaboração económica entre fronteiras revelou-se um forte pilar de construção da paz e esse tipo de colaboração transfronteiriça deve ser fortemente encorajado pelos governos em conjunto com parceiros do setor privado no que toca à exploração e transformação de recursos naturais, quer se trate de oleodutos plurinacionais, de fundições de minério de ferro, de refinarias ou de outras indústrias a jusante na área da extração. É animador o facto de hoje estar a surgir uma agenda partilhada. O que é surpreendente é que a mudança está a acontecer, e com grande rapidez, à medida que a procura por uma maior transparência e equidade se estende e acelera a nível global. Por exemplo, para os cidadãos de África, dos países do G8 e de todo o mundo, as atuais práticas fiscais levantam dúvidas em matéria de equidade, justiça social e cidadania. No ano passado, os EUA e a União Europeia lançaram novos requisitos relativos à transparência, assistimos à adesão, por parte do Reino Unido e de França, à Iniciativa para a Transparência nas Indústrias Extrativas, o Canadá acaba de anunciar a sua intenção de lançar requisitos obrigatórios na área da transparência para o seu setor das indústrias extrativas e a Suíça acaba de votar uma proposta provisória de divulgação de pagamentos semelhante às que estão em vigor nos EUA e na UE. A comunidade internacional tem uma forte responsabilidade na criação deste tipo de ambiente. A Cimeira do G8 em Lough Erne no início desta semana foi uma (forte) medida em direção à criação deste tipo de ambiente. Espero que as Nações Unidas possam continuar a desempenhar o seu papel para ajudar a alcançar esta realidade. Obrigado. * * * * * Presidido por Kofi Annan, ex-Secretário-Geral das Nações Unidas, o Africa Progress Panel (o Painel) inclui individualidades eminentes dos setores privado e público que promovem a defesa de questões globais importantes para África e para o mundo. Para mais informações, contactar Edward Harris – HYPERLINK "mailto:[email protected]" [email protected] (telemóvel) +41 79 87 38 322 e (trabalho) +41 22 919 7536 HYPERLINK "http://www.africaprogresspanel.org" www.africaprogresspanel.org e HYPERLINK "http://www.facebook.com/africaprogresspanel" www.facebook.com/africaprogresspanel @africaprogress e #APR2013
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