T - sisne.org

Transcrição

T - sisne.org
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
A Equação de Onda em Uma Dimensão (continuação)
Consequências do Princípio de Superposição
O princípio de superposição nos diz que quando houver mais de uma
onda se propagando em uma corda, a onda resultante é dada pela
combinação linear dessas ondas individuais. Vamos considerar, a
seguir, diferentes casos de duas ondas harmônicas propagando-se
em uma corda e aplicar o princípio de superposição a elas para ver
que tipo de onda resultante ocorre. A análise matemática de cada
caso poderá nos levar a resultados inesperados, que então deverão
ser interpretados fisicamente. Esses resultados novos constituem as
previsões do princípio de superposição e é a partir da verificação
experimental da sua existência ou não que se comprova se o
princípio de superposição é válido ou não.
Vamos considerar três casos aqui, sempre envolvendo duas ondas
harmônicas: (1) as ondas se propagam na mesma direção, mas têm
amplitudes e fases diferentes; (2) as ondas são idênticas, mas se
propagam em direções opostas; e (3) as ondas se propagam na
mesma direção e têm a mesma amplitude e fase, mas têm
frequências ligeiramente diferentes.
1
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
1o caso: Duas ondas harmônicas iguais, mas de amplitudes e fases
diferentes, propagando-se na mesma direção.
Vamos chamar as duas ondas de 1 e 2 e vamos supor que elas têm o
mesmo comprimento de onda λ e a mesma frequência angular ω. As
amplitudes das duas ondas serão indicadas por A1 e A2 e a diferença
de fase entre elas será chamada de φ. Sem perda de generalidade,
podemos supor que a onda 1 tem fase zero e a onda 2 tem fase φ.
Portanto, as duas ondas podem ser descritas pelas funções,
y1 ( x , t ) = A1 cos (kx − ω t )
(1)
e
y 2 ( x , t ) = A2 cos (kx − ω t + φ ) .
(2)
Quando as duas ondas coexistem na mesma região da corda, a onda
resultante é dada pelo princípio de superposição,
y( x, t ) = y1 ( x, t ) + y2 ( x, t ) = A1 cos(kx − ωt ) + A2 cos(kx − ωt + φ ) . (3)
Já vimos como simplificar uma expressão como esta na aula 6, que
tratou de superposição de oscilações (dê uma olhada nas notas da
aula 6 para relembrar). Por causa disso, algumas passagens a seguir
serão feitas mais rapidamente (para maiores detalhes, consulte as
notas da aula 6).
2
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Podemos usar a representação de y1 e y2 em termos de números
complexos e escrever,
z1 ( x , t ) = A1e i ( kx − ω t )
e
z 2 ( x , t ) = A2 e i ( kx − ω t + φ ) ,
(4)
de maneira que
(
)
z1 + z 2 = A1e i ( kx − ω t ) + A2 e i (kx − ω t + φ ) = e i (kx − ω t ) A1 + A2 e iφ . (5)
Esta expressão pode ser escrita como
z1 + z 2 = e i (kx − ω t ) Ae iβ = Ae i (kx − ω t + β ) ,
(6)
onde A e β são dados por
A2 = A12 + A22 + 2 A1 A2 cos φ
(7)
e
senβ =
A2
senφ .
A
(8)
A solução física real é dada pela parte real de (6),
y1 + y2 = Re(z1 + z2 ) = A cos(kx − ωt + β ) .
(9)
Logo, a superposição de duas ondas harmônicas de mesma
frequência e mesmo comprimento de onda, mas com amplitudes e
fases diferentes, que se propagam no mesmo sentido é também uma
onda harmônica com a mesma frequência e o mesmo comprimento
de onda propagando-se no mesmo sentido.
3
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Lembrando da equação (37) da aula 17, que diz que a intensidade de
uma onda harmônica é proporcional ao quadrado da sua amplitude, e
usando a equação (7), que relaciona o quadrado da amplitude da
onda resultante da superposição com as amplitudes das ondas
individuais, podemos escrever,
I = I1 + I 2 + 2 I1I 2 cos φ .
(10)
Este resultado é importante e constitui uma previsão do princípio de
superposição que é comprovada experimentalmente para ondas:
embora a onda resultante da superposição de duas ondas harmônicas
seja, ela mesma, uma onda harmônica dada pela soma das duas
ondas, a intensidade da onda resultante é diferente da soma das
intensidades das duas ondas.
Este fenômeno é típico de ondas e é chamado de interferência.
Note que, segundo a equação (10), a intensidade da onda resultante
depende do cosseno da diferença de fase entre as duas ondas.
Portanto, a intensidade será máxima (interferência construtiva)
quando cos φ = 1, isto é, quando,
φ = 2mπ (m = 0,±1,±2, K) .
(11)
Note que podemos escrever o valor máximo de I como,
4
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
I max =
(
)
2
I1 + I 2 .
(12)
Por outro lado, a intensidade será mínima (interferência destrutiva)
quando cos φ = –1, ou seja, quando,
φ = (2m + 1)π (m = 0,±1,±2, K) ,
(13)
e o valor da intensidade mínima é,
I min =
(
)
2
I1 − I 2 .
(14)
Um caso particular interessante ocorre quando as amplitudes das
duas ondas y1 e y2 são iguais. Neste caso, I1 = I2 e as intensidades
máxima e mínima da onda resultante são, respectivamente,
I max = 4 I1
e
I min = 0 .
(15)
No caso de interferência destrutiva de duas ondas idênticas e de
mesma amplitude, a intensidade da onda resultante é nula.
2o caso: Duas ondas harmônicas iguais, com mesma amplitude,
mesmo comprimento de onda, mesma frequência e mesma fase,
propagando-se em direções opostas.
Como as duas ondas têm a mesma fase, para simplificar vamos
supor que a fase é zero. As duas ondas são então escritas como
y1 = A cos(kx − ωt )
e
y2 = A cos(kx + ωt ) .
(16)
5
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Note que a onda 1 viaja para a direita e a onda 2 viaja para a
esquerda.
A superposição das duas ondas nos dá,
y = y1 + y2 = A[cos(kx − ωt ) + cos(kx + ωt )] .
(17)
Usando as fórmulas para o cosseno da soma e da subtração a
expressão acima pode ser reescrita como (mostre como exercício),
y = 2 A cos (kx )cos (ω t ) .
(18)
O que a equação matemática acima nos diz é que a onda resultante
da superposição das duas ondas iguais que se propagam em sentidos
contrários não se propaga. Note que ela não tem o termo (kx ± ωt)
característico da função de onda de uma onda propagante.
A onda resultante neste caso é dita estacionária. Ondas estacionárias
também são previsões do princípio de superposição cuja existência é
comprovada experimentalmente.
Em uma onda estacionária unidimensional, cada ponto x executa um
movimento harmônico simples com frequência angular ω e
amplitude que depende da posição ao longo da corda, A = A(x).
6
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
No caso da onda estacionária obtida acima, dada pela superposição
de duas ondas harmônicas idênticas propagando-se em sentido
contrário, a sua frequência angular é igual à das duas ondas que a
originam e a sua amplitude é A(x) = 2Acos(kx).
As amplitudes das oscilações dos diferentes pontos da corda
dependem do ponto. A figura abaixo mostra o perfil cossenoidal do
envelope que delimita as oscilações dos pontos da corda.
Observe que há pontos x que não oscilam, permanecendo sempre em
repouso. Esses pontos são chamados de nodos e estão indicados na
figura por setas. Por outro lado, há ponto na metade de dois nodos
para os quais a amplitude de oscilação é a máxima possível. Esses
pontos são chamados de ventres.
As posições x para as quais a amplitude é máxima são dadas por
cos(kx) = ±1, ou seja,
kx = 0, π , 2π , 3π , K , nπ (n inteiro).
7
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Como k = 2π/λ, essas posições são:
Posições dos ventres : x = 0,
λ
2
, λ,
3λ
nλ
, 2λ K ,
(n inteiro).
(19)
2
2
Já as posições da corda que nunca oscilam (nodos) são dadas por,
kx =
π 3π 5π
2
,
2
,
2
,L,
nπ
(n ímpar) ,
2
o que implica que:
Posições dos nodos : x =
λ 3λ 5λ
4
,
4
,
4
,L,
nλ
(n ímpar) .
4
(20)
Uma onda estacionária não se propaga, portanto a velocidade v de
uma onda estacionária é zero. Olhando para a equação (39) da aula
17, que dá a energia média transportada por uma onda, vemos que
ela é proporcional a v. Isto implica que a energia média transportada
por uma onda estacionária é nula.
Podemos entender isso notando que as duas ondas harmônicas que
se combinam para formar a onda estacionária têm fluxos de energia
iguais, mas de sentidos contrários. Esses fluxos se anulam com a
soma das ondas, resultando em um fluxo médio de energia nulo.
8
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
3o caso: Duas ondas harmônicas com mesma amplitude, mesma
fase, mas comprimentos de onda e frequências ligeiramente
diferentes propagando-se na mesma direção.
Este caso também é muito similar ao que já foi visto na aula 6
quando tratamos de batimentos. Portanto, algumas passagens aqui
serão feitas mais rapidamente (para maiores detalhes, consulte as
notas de aula da aula 6).
Como as duas ondas têm a mesma fase, vamos supor, para
simplificar, que essa fase é zero. Também vamos supor que as duas
ondas se propagam para a direita. Podemos, então, escrever as duas
ondas como
y 1 ( x , t ) = A cos (k 1 x − ω 1 t ) ,
(21)
y 2 ( x , t ) = A cos (k 2 x − ω 2 t ) .
(22)
e
Vamos supor, sem perda de generalidade, que k1 > k2 e ω1 > ω2.
Para facilitar as contas, vamos fazer as seguintes definições:
ω =
ω1 + ω 2
2
e
k1 + k 2
,
2
(23)
∆k = k1 − k 2 .
(24)
k =
e
∆ω = ω1 − ω 2
e
9
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Como estamos supondo que as frequências e números de onda são
apenas ligeiramente diferentes, podemos escrever,
∆ω << ω
e
∆k << k .
(25)
Podemos então escrever,

∆k  
∆ω  
y1 = A cos  k +
x − ω +
t
2  
2  



e y 2 = A cos k −

∆k  
∆ω  
 x − ω −
t ,
2  
2  
ou

∆ω 
 ∆k
y1 = A cos(k x − ω t ) + 
x−
t e
2 
 2


∆ω 
 ∆k
y 2 = A cos (k x − ω t ) − 
x−
t ,
2 
 2

de maneira que
 

∆ω 
∆ω  
 ∆k
 ∆k
y = y1 + y 2 = Acos(k x − ω t ) + 
x−
t  + cos(k x − ω t ) − 
x−
t   .
2
2
2
2



 




Usando as fórmulas para o cosseno da soma e da subtração podemos
escrever a expressão acima como (mostre como exercício),
∆ω 
 ∆k
y ( x, t ) = 2 A cos
x−
t  cos(k x − ω t ) .
2 
 2
(26)
A expressão acima contém dois termos que correspondem a ondas
harmônicas propagando-se para a direita:
(
cos k x − ω t
)
e
∆ω 
 ∆k
cos
x−
t.
2 
 2
O termo com frequência ω e número de onda k oscila com uma
frequência (temporal) muito maior que a do outro termo, mas com
um comprimento de onda (espacial) λ = 2π / k muito menor.
10
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
A figura abaixo mostra um instantâneo (uma “foto” para t fixo) da
situação. As duas ondas de cima são as duas ondas harmônicas que
se superpõem e a onda de baixo é a onda resultante.
Temos uma onda de comprimento de onda λ pequeno (e frequência
alta) modulada por outra onda de comprimento de onda λmod grande
(e frequência baixa).
Podemos interpretar este comportamento como sendo o de uma onda
harmônica de alta frequência e baixo comprimento de onda
propagando-se para a direita com amplitude A(x,t) modulada por
outra onda harmônica propagando-se para a direita, mas com
frequência bem menor e comprimento de onda bem maior.
No caso, a amplitude variável A(x,t) é dada por,
11
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
∆ω 
 ∆k
A(x, t ) = 2 A cos
x−
t.
2
2


(27)
Este fenômeno já foi visto por nós antes1 e é conhecido como
batimento. Ele é outra previsão do princípio de superposição que é
observada em vários tipos de ondas.
Como a intensidade de uma onda harmônica (fluxo de energia por
um dado ponto do espaço por unidade de tempo) é proporcional ao
quadrado da amplitude, a expressão acima indica que, quando
houver batimento entre duas ondas, a intensidade da onda resultante
em um dado ponto fixo do espaço oscilará no tempo conforme um
cosseno ao quadrado.
Em particular, afinadores de instrumentos utilizam o fenômeno de
batimento para afinar instrumentos com o uso de um diapasão.
Quando a frequência da nota musical do instrumento se aproxima da
frequência do diapasão, ouve-se um som com intensidade variável:
aaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa ...
... aaaaaaaaaa
Quanto mais próxima for a frequência do instrumento da do
diapasão, mais lenta será a modulação do som ouvido e o
instrumento estará mais bem afinado.
1
Na aula 6, só que lá a modulação ocorria apenas no tempo. Aqui ela ocorre no espaço e no tempo.
12
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Como exercício para casa, faça gráficos da equação (26) no domínio
do espaço e no domínio do tempo, isto é, gráficos de y(x,t) versus x
para t fixo (como o acima) e gráficos de de y(x,t) versus t para x
fixo. Faça gráficos para diferentes valores de t e os superponha para
tentar determinar graficamente a velocidade da onda. Se você ficou
em dúvida sobre o que fazer, veja abaixo.
A equação (26) contém duas ondas harmônicas. Uma de maior
frequência ( ω ) e outra de menor frequência (∆ω). Lembrando da
aula 15, a velocidade de propagação de uma onda é dada pela razão
entre a sua frequência e o seu número de onda (v = ω/k). Logo,
temos duas velocidades de onda aqui.
A onda de maior frequência se propaga com velocidade
v=
ω
k
,
(28)
que é chamada de velocidade de fase.
Ela é chamada de velocidade de fase porque estamos considerando
que a onda de frequência menor (∆ω) é parte do termo que
determina a amplitude da onda de frequência maior ( ω ). Desta
forma, aquilo que estamos chamando de fase da onda neste curso é o
argumento da função cos(k x − ω t ).
13
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
fase : ϕ ( x, t ) = k x − ω t .
(29)
No entanto, a onda de menor frequência (a que define o “envoltório”
da onda de maior frequência) também tem uma velocidade de
propagação, dada por:
vg =
∆ω
.
∆k
(30)
Esta é chamada de velocidade de grupo da onda. Podemos imaginar
a velocidade de grupo como a velocidade com que o “pacote” de
ondas dado pela envoltória da onda se propaga (é por isso que ela
recebe o nome de velocidade de grupo).
Em geral, a velocidade de fase e a velocidade de grupo são iguais.
Por exemplo, quando as freqüências ω1 e ω2 forem muito próximas
uma da outra podemos escrever a velocidade de grupo como
vg =
∆ ω dω
≈
.
dk
∆k
(31)
Quando a velocidade de fase de uma onda não depende da sua
frequência, como no caso de uma onda em uma corda homogênea ou
da luz no vácuo,
v=
ω
k
= constante ,
o que implica que ω = vk e a derivada de ω em relação a k é igual a
v. Portanto, as velocidades de fase e de grupo são iguais.
14
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Porém, existem situações em que a velocidade de propagação da
onda depende da sua frequência (ou do comprimento de onda, ou
ainda do número de onda), como é o caso das ondas
eletromagnéticas se propagando em meios materiais. Nesses casos,
podemos escrever
ω = kv (k ) ,
(32)
o que implica que
vg =
dω
dv(k )
dv (k )
= v(k ) + k
= v fase + k
.
dk
dk
dk
(33)
Ou seja, as velocidades de fase e de grupo são diferentes. Em um
caso como este, diz-se que ocorre dispersão e a equação ω = kv(k ) é
chamada de relação de dispersão da onda.
Este é o caso, por exemplo, da luz branca quando penetra em um
meio material como o vidro, o que faz com que cada uma das suas
componentes (do vermelho ao violeta) tenham velocidades de fase
diferentes e, portanto, sejam difratadas por ângulos diferentes.
Um caso importante onde não ocorre dispersão é o de ondas sonoras
em gases. Sons de diferentes comprimentos de onda viajam pelo ar
com a mesma velocidade. Imagine como seria nossa percepção dos
sons, por exemplo de um conjunto musical, caso houvesse dispersão
de ondas sonoras no ar
15
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Quando ocorre um fenômeno de dispersão as ondas individuais
dentro da envoltória se movimentam em relação a ela, podendo ter
velocidades maiores do que a velocidade de grupo. Em um caso
assim, as ondinhas individuais dentro de um pacote “nascem” na sua
extremidade da esquerda, se propagam dentro do pacote e
“desaparecem” na sua extremidade direita.
Às vezes, a velocidade com que essas ondinhas se movem é maior
do que a velocidade da luz. Porém, os cálculos feitos para os vários
tipos de ondas (acústicas, eletromagnéticas, etc) mostram que a
velocidade de propagação da energia é a velocidade de grupo e esta
sempre tem valor menor ou igual ao da velocidade da luz.
Reflexão de ondas
Quando uma onda propagante se depara com uma barreira, ou uma
interface entre dois meios diferentes, podem ocorrer interessantes
fenômenos conhecidos como efeitos de borda ou de fronteira.
Vamos consider aqui, do ponto de vista qualitativo2, apenas um
desses fenômenos: o de reflexão. Vamos novamente usar o caso da
onda em uma corda como exemplo.
2
Para um tratamento quantitativo geral, veja o apêndice desta aula.
16
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Consideremos um pulso que se propague da esquerda para a direita
em uma corda. Vamos supor que a extremidade direita da corda está
presa a um suporte, de maneira que ela não possa se movimentar
(dizemos que a sua extremidade está fixa, ou presa). O que acontece
quando o pulso chega a essa extremidade fixa da corda?
Antes de mais nada, vamos considerar o que acontece com a corda
quando um pulso se propaga por ela (veja a figura abaixo).
A figura mostra o perfil da corda quando um pulso se propaga por
ela, para a direita, em dois instantes de tempo. A figura mostra
também, de maneira esquemática (sem qualquer pretensão de
escala), as velocidades instantâneas de cada ponto da corda quando
o pulso está com seu pico na origem (setas vermelhas). Note que o
deslocamento se dá para a direita porque a tendência de cada ponto à
esquerda do pico é se deslocar para baixo e a tendência de cada
ponto à direita do pico é se deslocar para cima.
17
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Observe o pedaço da corda logo à direita do fim do pulso centrado
na origem. No instante seguinte ao do desenho, esse pedaço
começará a se movimentar para cima, pois a onda irá “passar” por
ele. Esse pedaço de corda, portanto, sairá do repouso e adquirirá
uma velocidade transversal vy não nula. Isto ocorre porque a parte da
corda à esquerda do pedaço faz uma força sobre ele.
Imagine agora que o pulso chegou à extremidade direita da corda,
que está presa a um suporte como na figura abaixo.
18
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Quando o pulso encontra o suporte ele faz uma força para cima
sobre o suporte, assim como ele fazia com o pedaço de corda à sua
direita. O suporte, porém, não se move. Em contrapartida, pela 3a lei
de Newton o suporte exerce sobre a corda uma força igual e de
sentido contrário, isto é, para baixo. Esta força inverte a forma do
pulso, que começa a se propagar para a esquerda com essa forma
invertida.
A reflexão de uma onda numa extremidade em que ela está presa
produz uma onda refletida defasada de 180o (isto é, invertida) em
relação à onda incidente.
Um caso diferente ocorre quando o pulso está completamente livre
para se movimentar verticalmente na sua extremidade. Por exemplo,
imagine que a corda está presa a um anel sem massa que deslize sem
atrito por uma haste vertical (veja a figura abaixo).
19
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Quando o pulso chega à extremidade direita da corda, o suporte não
faz qualquer força sobre a corda (ela está livre). Por causa disso, a
corda sobe e desce e a sua deformação (o pulso) preserva a mesma
fase do pulso incidente. Neste processo, a corda continua tensionada
o tempo todo, mas a tensão T no ponto de contato com o anel tem
apenas componente horizontal.
A reflexão de uma onda numa extremidade em que ela está livre
produz uma onda refletida com a mesma fase da onda incidente.
20
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Apêndice
Vamos agora estudar quantitativamente o problema de uma onda
chegando a uma interface entre dois meios. Continuaremos usando
ondas transversais em cordas como modelo.
Consideremos o caso da figura abaixo, em que duas cordas de
densidades de massa diferentes (µ1 e µ2), mas sujeitas à mesma
tensão T, se encontram na origem (x = 0). Observe que estamos
chamando a corda da esquerda de 1 e a corda da direita de 2.
Como as densidades lineares de massa são diferentes, as velocidades
de propagação de ondas nas duas cordas são diferentes. Elas são
v1 =
T
µ1
e
v2 =
T
µ2 .
(A1)
Vamos supor que uma onda harmônica incide sobre a junção entre
as duas cordas vindo da esquerda para a direita. O que você acha que
aconteçará com as duas cordas depois que a onda atinge a junção?
21
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
A experiência prévia observando cordas (e também a intuição)
sugere que haverá uma onda refletida na corda da esquerda,
propagando-se em sentido contrário ao da incidente, mas também
haverá uma onda transmitida na corda da direita, propagando-se no
mesmo sentido da onda incidente.
Vamos supor que tanto a onda incidente, como a refletida, como a
transmitida são ondas harmônicas. Sendo assim, vamos escrever
suas expressões gerais como:
Onda incidente : yi = Ai cos(k1 x − ωt )
(A2)
Onda refletida : yr = Ar cos(k1 x − ωt )
(A3)
Onda transmiti da : yt = At cos(k 2 x − ωt )
,
(A4)
Onde o sub-índice i indica onda incidente, o sub-índice r indica onda
refletida e o sub-índice t indica onda transmitida.
Note que as frequências das três ondas são iguais (indicadas por ω
nas equações). Isto porque as vibrações temporais das duas cordas
têm que ser iguais. Já os comprimentos de onda (e os números de
onda) nas duas cordas são diferentes. Temos então:
ω = k1v1 = k 2 v2 .
(A5)
22
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Para os nossos propósitos aqui, é mais conveniente escrever as
equações (A1, A2 e A3) como:
yi = Ai cos[− (ωt − k1 x )] = Ai cos(ωt − k1 x )
(A6)
yr = Ar cos[− (ωt − k1 x )] = Ar cos(ωt − k1 x )
(A7)
yt = At cos[− (ωt − k 2 x )] = At cos(ωt − k 2 x )
.
(A8)
As ondas nas duas cordas, que chamaremos de y1 e y2, são, pelo
princípio de superposição:
y1 = yi + yr = Ai cos(ωt − k1 x ) + Ar cos(ωt + k1 x )
(A9)
e
y2 = yt = At cos(ωt − k 2 x ) .
(A10)
Vamos agora determinar as condições de contorno para o problema.
Estas são as condições que devem ser satisfeitas pelas funções y1 e
y2 na junção entre as duas cordas (x = 0). Elas são:
y1 (0, t ) = y2 (0, t )
(A11)
e
∂y1
∂x
=
x =0
∂y2
∂x
x =0
.
(A12)
A primeira condição (A11) indica que as funções que descrevem as
duas cordas têm que ser contínuas na junção entre elas.
23
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
A segunda condição (A12) indica que as derivadas dessas funções
também têm que ser contínuas na junção. Se a condição (A12) não
fosse satisfeita, poderia haver, por exemplo, um bico na junção
como o mostrado na figura abaixo.
Em tal situação, as tensões atuando sobre o ponto na junção entre as
duas cordas teriam uma resultante apontando para baixo. Como o
ponto (infinitesimal) tem massa muito pequena, a sua aceleração
para baixo seria enorme. É para evitar isso que se impõe a condição
(A12).
Impondo a condição de contorno (A11) às equações (A9) e (A10):
y1 (0, t ) = y2 (0, t ) ⇒ Ai cos(ωt ) + Ar cos(ωt ) = At cos(ωt ) .
Como esta condição deve ser válida para todos os instantes de tempo
t, devemos ter
Ai + Ar = At .
(A13)
Impondo a condição de contorno (A12) às equações (A9) e (A10):
∂y
∂x
=
x =0
∂y2
∂x
⇒ k1 Ai sen (ωt ) − k1 Ar sen (ωt ) = k 2 At sen (ωt ) ⇒
x =0
⇒ k1 ( Ai − Ar )sen (ωt ) = k 2 At sen (ωt ) .
24
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
Como esta condição tem que ser válida para todos os instantes de
tempo, devemos ter
k1 ( Ai − Ar ) = k2 At .
(A14)
Temos duas equações (A13 e A14), mas três incógnitas (Ai, Ar e At).
Não podemos, portanto, obter os valores das três incógnitas.
Podemos, porém, trabalhar com as razões:
Ar
≡R
Ai
e
At
=T ,
Ai
(A15)
que podemos chamar, respectivamente, de coeficiente de reflexão e
de coeficiente de transmissão.
Substituindo (A5) em (A14):
ω
v1
( Ai − Ar ) = ω
v2
At ⇒
⇒ v2 ( Ai − Ar ) = v1 At .
(A16)
Substituindo agora (A13) em (A16):
v2 ( Ai − Ar ) = v1 ( Ai + Ar ) .
Isolando Ai e Ar nesta equação:
Ai (v2 − v1 ) = Ar (v1 + v2 ) ⇒
⇒
Ar
v −v
=R= 2 1.
Ai
v1 + v2
(A17)
Substituindo (A17) de volta em (A13):
25
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18

A 
At = Ai + Ar = Ai 1 + r  ⇒
Ai 

⇒
2v 2
At
A
v −v
= 1+ r = 1+ 2 1 =
⇒
Ai
Ai
v1 + v2 v1 + v2
⇒
At
2 v2
=T =
Ai
v1 + v2 .
(A18)
Vejamos agora alguns exemplos dessas soluções:
a) µ2 infinitamente grande (µ2 = ∞)
Neste caso, a corda da direita não pode ser movida. Isto
corresponde ao caso da corda da esquerda tendo sua
extremidade da direita (em x = 0) fixa.
A velocidade da onda na corda 2 é
v2 =
T
µ2
= 0,
E os coeficientes de reflexão e de transmissão são:
R=
v2 − v1
v
= − 1 = −1 ⇒ Ar = − Ai ,
v1 + v2
v1
(A19)
a onda refletida é invertida em relação à onda incidente, e
T=
2 v2
= 0,
v1 + v2
(A20)
não há onda transmitida.
26
5910170 – Física II – Ondas, Fluidos e Termodinâmica – USP – Prof. Antônio Roque
Aula 18
b) µ2 infinitamente pequena (µ2 → 0 e v2 → ∞).
Isto corresponde ao caso da corda da esquerda tendo sua
extremidade da direita (em x = 0) livre. Os valores de R e T
são:
R=
v2 − v1 v2
=
= 1 ⇒ Ar = Ai
v1 + v2 v2
,
(A21)
a onda refletida preserva o sinal da onda incidente, e
T=
2 v2
2v
= 2 = 2,
v1 + v2
v2
(A22)
a onda transmitida tem a mesma orientação da incidente.
c) µ1 > µ2 → v1 < v2.
Caso intermediário entre os dois anteriores. Neste caso,
R>0
e
T > 0,
(A23)
as ondas refletida e transmitida têm a mesma orientação. A
corda mais pesada força a corda mais leve a oscilar como ela.
d) µ1 = µ2 → v1 = v2.
Neste caso as duas cordas são iguais e temos:
R=0
e
T = 1.
(A24)
27

Documentos relacionados