PROJETO PAIR/MG Programa de Ações Integradas e Referenciais

Transcrição

PROJETO PAIR/MG Programa de Ações Integradas e Referenciais
Proex
Secretaria Especial de Direitos Humanos
e
Universidade Federal de Minas Gerais
Pró-Reitoria de Extensão
Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública
Programa Pólos de Cidadania
PROJETO PAIR/MG
Programa de Ações Integradas
e Referenciais de
Enfrentamento à Violência
Sexual Infanto-Juvenil em
Minas Gerais
DIAGNÓSTICO
Teófilo Otoni
Relatório Técnico Final
FICHA TÉCNICA
Pró-Reitoria de Extensão - UFMG
Ângela Imaculada Loureiro de Freitas Dalben – Pró-Reitora de
Extensão
Paula Cambraia de Mendonça Vianna – Pró-Reitora Adjunta de
Extensão
Coordenação Geral da Expansão do PAIR-MG
Edite da Penha Cunha, MSc – Pró-Reitoria de Extensão
Eduardo Moreira da Silva, MSc – Pró-Reitoria de Extensão
Lucas Schetinni – Pró-Reitoria de Extensão
Coordenação do Diagnóstico
Joana Domingues Vargas, DR – Professora Adjunta do Departamento
de Sociologia e Antropologia da FAFICH/UFMG e Pesquisadora do
Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública
(CRISP/UFMG)
Pesquisadores
Klarissa Almeida Silva, Mestre – CRISP/UFMG
Marisa Lacerda, Doutoranda – Programa Pólos de Cidadania/UFMG
Frederico Couto Marinho, Mestre – CRISP/UFMG
Bráulio Alves Figueiredo Silva, Mestre – CRISP/UFMG
Cristiane Kazuko Torisu, Mestranda – CRISP/UFMG
Keli Rodrigues de Andrade, Mestranda – CRISP/UFMG
Estagiários
Analice Mateus – CRISP/UFMG
Lívia Henriques de Oliveira – CRISP/UFMG
Mateus Reno – CRISP/UFMG
Hanna Fux – Programa Pólos de Cidadania/UFMG
Ana Luiza de Oliveira Cunha – Universidade Federal dos Vales
Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM/Campus Teófilo Otoni
Heverton Oliveira Leite – Faculdades Doctum/Campus Teófilo Otoni
Data de Atualização: 17 de agosto de 2007
1
SUMÁRIO
PARTE I – A Expansão do PAIR-MG e o Diagnóstico...................... 3
PARTE II – Caracterizando o Município de Teófilo Otoni .............. 16
PARTE III – Caracterizando o Fenômeno................................... 40
PARTE IV – Caracterizando a Rede .......................................... 59
PARTE V – Comentários Finais e recomendações ao trabalho em rede
em Teófilo Otoni ................................................................... 85
Referências Bibliográficas ....................................................... 88
2
PARTE I – A Expansão do PAIR-MG e o Diagnóstico
1. Introdução
No segundo semestre de 2006, foi estabelecido um convênio entre
Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Universidade
Federal de Minas Gerais - através da Pró-Reitoria de Extensão, do Centro de Estudos
de Criminalidade e Segurança Pública e do Programa Pólos de Cidadania - e
Universidade Federal do Triângulo Mineiro para a expansão do Programa de Ações
Integradas e Referenciais de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-Juvenil (PAIR)
em Minas Gerais.
Foi definida no convênio a realização de um Diagnóstico das redes de
enfrentamento da violência e exploração sexual contra crianças e adolescentes nos
municípios de Itaobim, Teófilo Otoni e Uberaba. A indicação dos municípios foi
realizada pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República.
Com o diagnóstico propõe-se a identificação das agências governamentais e não
governamentais dos municípios de Uberaba, Teófilo Otoni e Itaobim que atuam no
âmbito do fenômeno e análise dos dispositivos facilitadores e daqueles que entravam
os fluxos de defesa de direitos, de atendimento e de responsabilização das situações
de violência e exploração sexual contra crianças e adolescentes. Esta análise pretende
subsidiar a implementação de um circuito articulado de ações entre as agências
governamentais e não governamentais envolvidas com a problemática em questão nos
municípios selecionados.
O modelo sugerido pelo CRISP, em parceria com a Universidade Federal
do Triangulo Mineiro e o Programa Pólos de Cidadania, é decorrente da perspectiva
segundo a qual os eventos que caracterizam o fenômeno da violência e exploração
sexual contra crianças e adolescentes são gerados por um conjunto de fatores que os
antecedem, ou seja, problemas nas comunidades como desorganização social ou
física, vulnerabilidade sócio-econômica, escassez na oferta de serviços públicos,
baixos níveis de mobilização, baixa efetividade das redes de defesa, responsabilização
e atendimento, dentre outros. Neste sentido, a intervenção deve-se dar sobre os
problemas que antecedem os eventos e não sobre esses últimos, de modo isolado.
Para realização deste diagnóstico, contamos com a contribuição de
diversos promotores de justiça do Ministério Público de Minas Gerais; juizes e
técnicos das Varas Criminais e dos Juizados da Infância e Juventude; conselheiros
3
tutelares e de políticas públicas; polícias; equipes técnicas de diversos programas;
gerentes, coordenadores e secretários da Assistência Social, da Educação, da Saúde,
da Cultura e Esportes; representantes da sociedade civil; dirigentes e funcionários de
organizações não-governamentais, creches, abrigos e instituições de atendimento às
crianças e adolescentes. Todos nos forneceram dados e informações importantes
sobre a violência sexual infanto-juvenil, bem como sobre a estrutura e funcionamento
da rede de garantia e defesa de direitos da criança e do adolescente. A todos os
nossos
colaboradores,
entrevistados,
estagiários
locais,
nossos
sinceros
agradecimentos.
2. Discussão Teórica
O problema social da violência sexual (abuso e exploração comercial)
contra crianças e adolescentes tornou-se questão pública assumindo relevância
política no início da década de 90 com as instalações da Comissão Parlamentar de
Inquérito (CPI) sobre a violência sexual contra crianças e adolescentes realizada pelo
Congresso Nacional em 1993 e da Prostituição Infantil do Norte de Minas Gerais
realizada pela Assembléia Legislativa de Minas Gerais em 1995. Estas CPIs
provocaram a conscientização e mobilização de importantes setores da sociedade
civil, do executivo, legislativo e judiciário, além da mídia e de inúmeros organismos
internacionais, quanto à gravidade do fenômeno no país.
A CPI do Congresso Nacional trouxe inúmeros avanços para a concepção
desta temática. Com base nela, a prostituição infantil passou a ser compreendida
como Exploração Sexual Infanto-Juvenil, em consonância com as diretrizes do
Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei Federal nº 8.089/96).
Como resposta à emergência pública do fenômeno da violência e
exploração sexual de crianças e adolescentes advindos com a CPI, o Governo
Federal formulou o primeiro projeto de âmbito nacional, o Plano Nacional de
Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, definindo
diretrizes, ações prioritárias e estratégias. O plano foi deliberado pelo CONANDA em
Julho de 2000, constituindo-se em diretriz nacional no âmbito das políticas de
enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes.
O plano define cinco princípios estratégicos para prevenção e redução da
violência sexual contra crianças e adolescentes, a saber: (a) realização de
investigação científica, visando compreender, analisar, subsidiar e monitorar o
planejamento e a execução das ações de enfrentamento do fenômeno; (b) garantia do
atendimento especializado às crianças e adolescentes em situação de violência
4
sexual consumada; (c) a promoção de ações de prevenção, articulação e mobilização,
visando o fim da violência; (d) fortalecimento dos sistemas de defesa de direitos e de
responsabilização; (e) desenvolvimento do protagonismo juvenil como meio.
A concepção geral do diagnóstico construído pela equipe do CRISPUFMG e seus parceiros, para a expansão do PAIR em Minas Gerais, partiu dos
princípios do Plano Nacional de Enfrentamento à ESCCA (Exploração Sexual
Comercial de Crianças e Adolescentes). A tradução e operacionalização dos
princípios do Plano Nacional de Enfrentamento à ESCCA em uma metodologia
científica e em instrumentos de coleta partiu do reconhecimento e compreensão de
várias iniciativas pioneiras no país (apesar da escassa produção científica sobre
violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil) que fundaram um marco
teórico e metodológico sobre o tema da violência sexual e revelaram um panorama da
sua incidência e prevalência nas distintas regiões do país.
Destacamos algumas destas iniciativas como fundamentais na construção
dos diagnósticos executados nos municípios de Uberaba, Teófilo Otoni e Itaobim:
O material sobre a disseminação do PAIR produzido e disponibilizado pela
Secretaria Especial de Direitos Humanos e Universidade Federal de Mato Grosso do
Sul, em especial o Diagnóstico Rápido Participativo.
As pesquisas e estudos realizados pelo CECRIA, com destaque para os
relatórios, “Circuitos e Curtos-Circuitos no Atendimento, Defesa e Responsabilização
do Abuso Sexual contra crianças e adolescentes no Distrito Federal” (2002); “A
Exploração Sexual Comercial de Meninos, Meninas e Adolescentes na América Latina
e Caribe”(1999) e “Repensando os conceitos de Violência, Abuso e Exploração
Sexual contra Crianças e Adolescentes” (2000). Os trabalhos do professor Vicente de
Paula Faleiros sobre o tema (Redes de Exploração e Abuso Sexual e Redes de
Proteção entre outros) merecem menção especial (1998).
Outras referências essenciais foram: o relatório “Exploração Sexual
comercial de crianças e adolescentes e tráfico para os mesmos fins” da Organização
Internacional do Trabalho (2005); a “Pesquisa sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e
Adolescentes para fins de exploração sexual comercial – Prestaf” (2002) e a Matriz
Intersetorial de Enfrentamento da Exploração Sexual Comercial de Crianças e
Adolescentes, publicado pela Secretaria Especial de Direitos Humanos, em parceira
com o UNICEF e a UnB (1999).
Foram muitos os avanços produzidos por estas iniciativas, como a
clarificação e definição dos conceitos de abuso e de exploração sexual contra
crianças e adolescentes, possibilitando sua devida separação e distinção do termo
prostituição infantil. Uma terminologia mais precisa para o abuso sexual e exploração
5
sexual possibilitou a identificação das suas diversas formas de manifestação, o
reconhecimento das conseqüências psicossociais e econômicas para a vítima e sua
família. Também foram detectados problemas, como a desinformação do poder
público, a não integração na rede das instituições de saúde e educação que atendem
crianças e adolescentes, a dificuldade de aplicação do ECA. Importante avanço foi
obtido com a criação de um sistema de notificação nacional integrado (SIPIA).
Outra questão fundamental foi a compreensão do abuso e da exploração
sexuais de crianças e adolescentes enquanto violência implicada numa rede familiar
ou de exploração à qual se deve contrapor uma rede de parcerias e políticas públicas
integradas.
Enfim, as práticas de violência sexual interpessoal e comercial contra
crianças e adolescentes passaram a ser categorizadas segundo o marco legal do
ECA como uma violação de seus direitos humanos e sexuais, e dos direitos
particulares de pessoa em desenvolvimento.
A partir destas contribuições foi possível a elaboração de uma base
conceitual/operacional articulada e minimamente consensual para o avanço do
conhecimento sobre o tema e para embasar as intervenções por parte do Estado e da
sociedade.
As variáveis coletadas e utilizadas neste diagnóstico foram selecionadas
com base na revisão destes e de outros estudos teóricos e de pesquisas sobre o
fenômeno da violência sexual contra crianças e adolescentes no Brasil que
detalharemos a seguir. Apesar da heterogeneidade destes estudos e pesquisas
(metodologia, unidade de análise etc), há um consenso quanto à complexidade das
causas do fenômeno, composta por várias dimensões que se articulam, mas têm
dinâmicas próprias.
Para a discussão sobre o ECA, nos valemos de trabalho realizado
anteriormente (Vargas e Marinho, 2006). Mais especificamente, nos detivemos no
desafio que representa a ação coordenada entre antigos e novos atores oriundos de
universos sociais diferentes e portadores de cultura e visões programáticas
específicas, bem como a sua articulação com diferentes parceiros para atender as
demandas e necessidades das crianças e adolescentes, especialmente daquelas
vivendo em situação de risco.
Trabalhos, também realizados anteriormente, sobre a apreensão e o
tratamento dado aos crimes sexuais pelo sistema de justiça e, em particular ao crime
de estupro (Vargas, 2000 e 2004) auxiliaram-nos na investigação e no entendimento
da atuação da rede de responsabilização.
6
A pesquisa “Avaliação do Programa Sentinela” (2005), executada pelo
Departamento de Ciência Política e Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre a Mulher
(NEPEM) da UFMG e financiada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome sob coordenação da professora Marlise Matos, resultou na
elaboração de um Índice de Elegibilidade Municipal para classificar os municípios
brasileiros quanto a sua exposição à ESCCA. Este trabalho orientou nossa
compreensão dos fatores de risco associados a ESCCA.
Os estudos desenvolvidos pelo professor Walter Ude Marques (2001 e
2002) nos alertaram para a complexidade das redes sociais e das intervenções
promovidas pelas políticas públicas (alcance e limites). Análises voltadas para
fenômenos como o do trabalho infantil foram parâmetros na definição do conceito de
rede, em geral, como também das redes de defesa, responsabilização e atendimento
à ESCCA.
Destacamos dois estudos mais recentes referentes a pesquisas realizadas
em São Paulo e São José dos Campos (Nappo et.al., 2004) e em Recife (Pagano,
2006). A principal contribuição do primeiro refere-se à relação entre exploração e
drogas, analisada com base na correlação entre prostituição e uso do crack, que
conflui para uma maior exposição destas mulheres à contaminação por DSTs/HIV em
São Paulo. O segundo estudo, por sua vez, contribuiu para a discussão da visibilidade
da exploração sexual. Foram identificados como os lugares de maior visibilidade da
exploração sexual infanto-juvenil, os hotéis, as praias e o aeroporto, embora a
existência do fenômeno não seja reconhecida pela sociedade em geral. Importante
achado neste estudo refere-se ao número reduzido de registros nas agências de
proteção aos direitos da criança e do adolescente, sendo que as denúncias
geralmente ocorrem quando uma das partes “descumpre o acordo previamente feito”.
Especificamente para Itaobim, merece destaque o estudo do Programa
Pólos de Cidadania, um de nossos parceiros neste trabalho, sob a coordenação da
professora Miracy Barbosa de Souza Gustin. O “Projeto 18 de Maio” teve por objetivo
construir alternativas de geração de renda para criar condições de prevenção à
exploração sexual contra crianças e adolescentes. O projeto contemplou, além de
Itaobim, as cidades de Araçuaí, Comercinho, Medina, Padre Paraíso, Ponto dos
Volantes e Virgem da Lapa. Os resultados obtidos, com base nesta abordagem, nos
levou a destacar como uma de nossas hipóteses referentes ao fenômeno a sua
regionalização. Em Itaobim, o Projeto entrevistou 12 entidades componentes da rede
de enfrentamento à exploração sexual infanto-juvenil. Discutiu, dentre outras coisas,
aspectos que embasaram o nosso estudo como: causas para entrada e permanência
de crianças e adolescentes na situação de exploração sexual; visibilidade do
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problema; procedência e faixa etária das vítimas; localização dos pontos de
exploração; perfil dos exploradores; moeda de troca; sugestões para enfrentar o
problema. Também identificou e promoveu ações de protagonismo juvenil voltadas às
crianças e aos adolescentes nestes municípios. Ações de mobilização local, bem
como dificuldades encontradas na abordagem das crianças e adolescentes em
situação de risco, em particular, nortearam metodologicamente a realização do
presente diagnóstico.
Todas essas discussões contribuíram para um maior entendimento do
fenômeno da violência sexual e comercial de crianças e adolescentes. Explicações
multidimensionais foram utilizadas para fazer face à multiplicidade de causas do
fenômeno. Foram apontados aspectos de natureza estrutural como: pobreza,
desigualdade social, exclusão do mercado de trabalho, falta de acesso a serviços
básicos, violência, uso e tráfico de drogas, bem como aqueles de natureza cultural:
valores, imaginário social, concepção de sexualidade, relações de gênero,
desigualdade de poder entre os gêneros, estigma do sexo. Também foram discutidos
aspectos para o enfrentamento do fenômeno, tais como mobilização da rede,
participação da sociedade civil, responsabilização legal, cidadania (direitos civis,
políticos e sociais) e elaboração das políticas públicas.
2.1. Documentos Referenciais do Diagnóstico
a) Estatuto da Criança e do Adolescente (1990)
b) Comissão Parlamentar de Inquérito (1993)
c) Conanda
d) Sentinela
e) Plano de Enfrentamento do Governo Federal (fortalecendo conselho tutelares,
delegacias de proteção à infância e juventude, defensorias públicas)
f)
Prestraf – Pesquisa Nacional sobre o tráfico de mulheres, crianças e
adolescentes para exploração sexual
g) PAIR – trabalho em rede – referência metodológica (artigo 86)
h) Plano de Enfrentamento ao fenômeno da violência contra criança e
adolescente
i)
Disseminação PAIR: Coleta de Dados para o Diagnóstico Estrutural dos
Conselhos Tutelares - Diagnóstico rápido participativo
j)
Sipia – Sistema de Informação para Infância e Adolescência
k) www.caminhos.ufms.br
8
2.2.
O ECA e a emergência dos novos atores no enfrentamento da
violência e exploração sexual infanto-juvenil
Na década de 1990 os temas e problemas associados à Exploração
Sexual contra Crianças e Adolescentes ganharam projeção no espaço público
brasileiro. As ações e programas desenvolvidos pelo Estado a partir de então, para
prevenir e controlar de forma mais eficaz este tipo de violação dos direitos infantojuvenis partem do Estatuto da Criança e do Adolescente, que estabelece uma série de
medidas protetivas para o atendimento de crianças e adolescentes.
Com a elaboração do ECA, múltiplos projetos e programas foram criados,
dirigidos principalmente aos adolescentes e focando questões como desemprego,
profissionalização, doenças sexualmente transmissíveis, drogas, violência e crime.
Grande parte dos serviços e programas executados tem caráter misto, ou
seja, executam as medidas protetivas definidas no Estatuto da Criança e Adolescente
a partir de parcerias entre setores da sociedade civil e do Estado. Diversos atores
passam debater e atuar de forma conjunta sobre os temas que envolvem a
Exploração Sexual contra Crianças e Adolescentes (ESCA) – Estados, prefeituras,
Ongs, empresas e fundações privadas, conselhos gestores e outros.
2.3.
Conceito de Rede
As redes não são invenções abstratas, mas partem da articulação de
atores/organizações-forças
existentes
no
território
para
uma
ação
conjunta
multidimensional com responsabilidade compartilhada (parcerias) e negociada.
Esta definição de redes pressupõe uma visão relacional dos atores/forças
numa correlação de poder onde a perspectiva da totalidade predomina sobre a da
fragmentação.
Supõe também que as redes são processos dinâmicos e não organismos
burocráticos formais, mas onde se cruzam (como numa rede) organizações do Estado
e da sociedade.
A rede é, pois, uma aliança de atores/forças, num bloco de ação, ao
mesmo tempo, político e operacional. As redes como mecanismos de gestão
democrática compartilham o poder de decisão entre os atores, pela interação
comunicativa,
transparência
das
propostas,
coordenação
legitimada,
ação
compartilhada e avaliação coletiva.
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O foco do trabalho em redes não é um problema imediato, isolado, mas a
articulação de sujeitos/atores/forças para propiciar poder, recursos, dispositivos para a
ação, a auto-organização e a auto-reflexão do coletivo dos atores/instituições
participantes.
Quando se trata de violação dos direitos das crianças e dos adolescentes,
falamos em três níveis ou três tipos de redes, cada um caracterizado pela função
singular a ser exercida. São eles: responsabilização, defesa dos direitos e
atendimento.
A rede de Responsabilização é composta pelas Delegacias de Polícia,
Delegacias Especializadas (de Proteção à Criança e ao Adolescente, e da Mulher),
Instituto Médico Legal, Varas Criminais, Vara da Criança e do Adolescente ou da
Infância e Juventude, Delegacia da Criança e do Adolescente e Ministério Público.
Suas funções são: responsabilizar judicialmente os autores de violações de direitos,
proteger a sociedade, fazer valer a lei. Pode determinar como pena o atendimento ao
réu.
A rede de Defesa de Direitos é composta pelos Conselhos Tutelares,
Varas da Infância e da Juventude, Ministério Público, Defensoria Pública e Centros de
Defesa. Suas funções são: defender e garantir os direitos de todos os implicados na
situação de violência sexual notificada, protegendo-os de violações a seus direitos.
Para tal, tem o poder de, com força da lei, determinar ações de atendimento e de
responsabilização.
A rede de Atendimento é composta pelas instituições executoras de
políticas sociais (de saúde, educação, assistência, trabalho, cultura, lazer,
profissionalização) e de serviços e programas de proteção especial, bem como por
ONGs que atuam nestas áreas. Suas funções são: dar acesso a direitos a políticas
sociais e de proteção, prestar serviços, cuidar e proteger. Deve dar cumprimento a
determinações oriundas do Fluxo de Defesa de Direitos e do Fluxo de
Responsabilização, bem como prestar-lhes informações.
3. Objetivo do Diagnóstico
O diagnóstico visa à adequada descrição do problema e da rede de
proteção nos municípios selecionados para informar e embasar as discussões do
Seminário de sensibilização e adesão e das oficinas de planejamento, próximas
etapas do PAIR-MG.
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3.1. Objetivos Específicos
a) Caracterizar o município de Teófilo Otoni - identificar e caracterizar as
comunidades mais atingidas pelo fenômeno da exploração - quanto à sua
história e desenvolvimento, quanto aos aspectos sócio-demográficos, serviços
de infra-estrutura urbana, padrões de renda, escolaridade, saúde, mercado de
trabalho e índice de desenvolvimento humano, bem como quanto à incidência
de violência.
b) Caracterizar a rede de proteção às crianças e aos jovens quanto a:
•
Percepções em relação à exploração sexual infanto-juvenil - história,
causas, origem das crianças e adolescentes em situação de
exploração, freqüência das ocorrências, visibilidade do problema,
sugestões de enfrentamento, programas adotados e avaliação da
efetividade destes.
•
Organizações de jovens em cada município.
•
Situação estrutural e institucional da rede de atendimento defesa e
responsabilização voltadas para a criança e o adolescente – pessoal e
qualificação, planejamento, atividades, etc.
•
Fluxo de atendimento da rede de proteção social (caminhos da
notificação, atores chaves, etc).
•
Uso e gestão da informação
•
Interação e articulação da rede para o enfrentamento do fenômeno.
Entraves/dificuldades
na
articulação
da
rede.
Sugestões
de
aprimoramento.
c) Constituir base de dados georreferenciados quanto à:
•
Identificação da distribuição espacial do fenômeno da exploração
sexual infantil.
•
Identificação da distribuição de demais crimes violentos.
•
Identificação da distribuição das redes de atendimento.
•
Sobreposição destas informações e das características econômicas e
sociais do município.
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4. Hipótese
O artigo 861 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que define o
trabalho em rede, é a referência metodológica do PAIR. O maior desafio do Plano
Nacional de Enfrentamento à violência e exploração sexual infanto-juvenil é a ação
coordenada entre antigos e novos atores oriundos de universos sociais diferentes e
portadores de cultura institucional e visões programáticas específicas.
4.1. Hipóteses específicas
1) O fenômeno se distribuiu regionalmente
2) O fenômeno da violência sexual e da exploração apresenta características
diferenciadas quanto ao local de ocorrência, tipo de agressor envolvido, tipo de
percepção da agressão, visibilidade.
3) O fluxo legal definido no Estatuto da Criança e do Adolescente não
corresponde ao fluxo real de atendimento e de proteção (baixa articulação
deste)
4) A gestão da informação não é centralizada, os documentos de registros não
contemplam informações fundamentais, há duplicação de registros, a
informação não é utilizada na ação.
5) Os Conselhos Tutelares – principal novo ator da rede, constitui um dos pontos
do gargalo do fluxo.
6) Falta de comunicação e dificuldade de integração da rede voltada para o
atendimento, defesa e responsabilização.
7) Dificuldade de integração da rede geral de proteção – órgãos governamentais
e não governamentais.
8) Não há ainda a integração de fato na rede das instituições que atuam na ponta
da rede: escolas e postos de saúde, polícia rodoviária.
9) Não há, nos municípios estudados, a conscientização de atores chaves na
exploração: (agentes de transporte, de turismo, donos de postos, etc.)
10) Identificação de diferenças significativas entre os três municípios estudados,
quanto à: visibilidade do fenômeno, natureza do fenômeno, estruturação da
rede, estruturação da rede de proteção. Identificação de semelhanças quanto
à disparidade entre o fluxo ideal e real, dificuldade de articulação da rede
voltada para o jovem e adolescente bem como da rede de proteção em geral.
1
“Art. 86 - A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um
conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios”.
12
5. Discussão Metodológica do Diagnóstico
A metodologia da pesquisa é considerada como um processo que busca o
conhecimento implicado no enfrentamento de uma realidade complexa e que não se
desvela à primeira vista, exigindo-se, pois, a combinação de referências teóricas e de
técnicas que dêem conta da questão colocada como objeto de investigação. Para
capturar o objeto – a rede de enfrentamento à violência contra a criança e o
adolescente - e dar conta da questão dos fluxos da notificação foram escolhidos: a
consulta a fontes documentais (sobre fenômeno e a rede), a elaboração de
questionários institucionais e entrevistas com representantes das redes de defesa,
atendimento e responsabilização, além do geoprocessamento dos dados e roteiro de
observação.
Para tentar obter uma compreensão mais aprofundada sobre a dinâmica
da violência sexual e comercial contra crianças e adolescentes no município de
Teófilo Otoni, a metodologia aqui utilizada buscou compreender três principais temas,
a saber:
1. Caracterização do município: procurou-se, a partir de fontes
secundárias, caracterizar o município sob o ponto de vista sócio-econômico e
demográfico, analisando a distribuição da população segundo faixa etária, gênero,
educação, renda, habitação e vulnerabilidade social, uma vez que essas variáveis
estão associadas à incidência do fenômeno da violência e exploração sexual de
crianças e adolescentes no município. Idade e gênero são variáveis fundamentais
para a compreensão do fenômeno, uma vez que crianças e adolescentes do sexo
feminino apresentam índices mais altos de incidência do fenômeno. Procurou-se,
também, traçar um panorama mais amplo da criminalidade local, fazendo uso dos
registros oficiais das polícias Civil e Militar. Nesse sentido, foram analisados registros
de ocorrências (estatísticas de crimes contra a pessoa, costumes e patrimônio) com o
objetivo de caracterizar o município quanto à incidência da criminalidade e da
vitimização de sua população. Uma das informações novas mostradas refere-se ao
chamado Índice Mineiro de Responsabilidade Social (IMRS), em especial sua
dimensão segurança pública, produzido pela Fundação João Pinheiro para avaliar a
situação de Teófilo Otoni. A dimensão de segurança pública do IMRS é composta por
cinco temas: criminalidade, capacidade de aplicação da lei, medidas de prevenção, de
produtividade do sistema de justiça criminal além da gestão municipal do problema.
Através de seus componentes, procura-se caracterizar o município sob o ponto de
vista da segurança pública, uma vez que essas variáveis são consideradas
importantes para a compreensão do fenômeno.
Para a caracterização do município e para análise georeferenciada foi
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utilizado um índice de vulnerabilidade social. Partimos do pressuposto de que a
construção de um indicador de vulnerabilidade social permite ao gestor público e à
sociedade uma visão mais detalhada das condições de vida do seu município, com a
identificação e a localização espacial das áreas que abrigam os segmentos
populacionais mais vulneráveis à pobreza. Este indicador, que será detalhado mais a
frente, também constituiu novidade neste tipo de análise e foi baseado na metodologia
utilizada pela Fundação SEADE do Estado de São Paulo para a construção do Índice
Paulista de Vulnerabilidade Social.
2. Caracterização do Fenômeno: a partir das entrevistas realizadas com
nossa população alvo – atores da rede de defesa, atendimento e responsabilização
da violência sexual contra a criança e o adolescente constituída no município em 2006
- buscamos caracterizar o abuso e a exploração sexuais contra criança e adolescente
através dos instrumentos de pesquisa elaborados especificamente para este fim pela
equipe do diagnóstico, quais sejam:
1. Entrevistas semi-estruturadas com os atores da rede.
Entrevistamos 8 instituições componentes da rede de
defesa/responsabilização e atendimento.
2. Questionários
auto-respondidos
pelas
instituições
componentes da rede. Entregamos 11 questionários e
recolhemos 8 questionários.
3. Coleta de dados para os casos de violência sexual e
drogaditos contra crianças e adolescentes registrados pelo
Conselho Tutelar no ano de 2006. Foram coletadas
informações sobre perfil das vítimas e dos agressores, local
de residência das vítimas e local de ocorrência da violação,
relacionamento
entre
vítimas
e
agressores,
tipo
de
encaminhamento realizado por essas instituições, dentre
outras.
4. Georreferenciamento dos pontos de prostituição e de venda
de drogas visando à: identificação da distribuição espacial do
fenômeno da exploração sexual infantil nos municípios, a
identificação da distribuição de demais crimes violentos, a
identificação da distribuição das redes de atendimento e a
sobreposição destas informações e das características
econômicas e sociais de cada município.
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3. Caracterização da Rede: descrever e compreender a rede de proteção
às crianças e aos jovens quanto a: percepções em relação à exploração sexual
infanto-juvenil - história, causas, origem das crianças e adolescentes em situação de
exploração, freqüência das ocorrências, visibilidade do problema, sugestões de
enfrentamento, programas adotados e avaliação da efetividade destes. Situação
estrutural e institucional da rede de atendimento, defesa e responsabilização voltadas
para a criança e o adolescente – recursos humanos, financeiros, uso e gestão da
informação no planejamento das atividades. A interação e articulação da rede para o
enfrentamento do fenômeno e seus entraves - dificuldades também são contempladas
nesta seção.
Para analisarmos os dados coletados utilizamos softwares adequados a
cada metodologia. Para a análise de conteúdo das entrevistas estruturadas e dos
grupos focais, usamos o NUDIST, versão 6.0. Para a tabulação das respostas dos
questionários, usamos o SPSS, versão 14.0. por último, para georreferenciar os
pontos de prostituição, de drogaditos, as sedes das instituições componentes da rede
e demais informações mapeadas, usamos o MAPINFO, versão 6.5. Desta forma,
garantimos a confiabilidade das análises aqui empreendidas e, consequentemente,
dos resultados aqui encontrados.
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PARTE II – Caracterizando o Município de Teófilo
Otoni
1. Caracterização do território
Teófilo Otoni é um dos 853 municípios que compõem o Estado de Minas
Gerais. Localizado a 485 km da capital, geograficamente é sede da microrregião de
Teófilo Otoni e faz parte da mesorregião do Vale do Mucuri. Como sede da
mesorregião Vale do Mucuri, para ela convergem os interesses de dois outros vales:
São Mateus e Jequitinhonha.
Figura 1 – Localização de Teófilo Otoni no território de Minas Gerais
Fonte: www.ibge.gov.br
O município de Teófilo Otoni, junto com Malacacheta e Nanuque,
destacam-se como os principais pólos econômicos da região do Vale do Mucuri, além
de estar entre os 20 municípios mineiros com população superior a 100.000
habitantes.
Teófilo Otoni situa-se na BR-116 Rio-Bahia, e também na confluência com
outras rodovias estaduais e federais, como mostra a figura anterior. Esta localização é
fator de risco permanente. Entendemos que a localização do município próximo a
essas vias de tráfego intenso, em grande parte de caminhões, atua fortemente para
promover o problema da exploração sexual infanto-juvenil, foco desse estudo.
16
Conforme veremos, muitos dos agressores são caminoneiros que se envolvem
sexualmente com crianças e adolescentes durante o trajeto que leva de um ponto a
outro em suas viagens. Um outro fator de risco permanente são as feiras de negócio
de pedras e os garimpos de pedras nas proximidades do município que concentram
homens e dinheiros.
Riscos temporários também podem ocorrer. Trata-se, principalmente, de
instalação de programas ou obras que trazem para o município um contingente de
trabalhadores masculinos instalados temporariamente, incentivando o incremento de
casas de prostituição nesses novos locais e, ao mesmo tempo, o incremento da
exploração sexual infantil.
Figura 2- Malha Rodoviária de Teófilo Otoni e região
Fonte: www.dner.mg.gov.br
2. Demografia
De acordo com dados do Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil, da
Fundação João Pinheiro, a população de Teófilo Otoni passou de 130.017 em 1991
17
para 129.424 em 2000, o que representa uma estabilidade demográfica, em um
período de nove anos. Já de acordo com dados do IBGE, no período de 2000 a 2006,
houve uma diminuição média de -0,2% ao ano. A densidade demográfica
correspondia, em 2000, a 39,7 hab/ km², e 38,26 hab/km² em 2005. O gráfico a seguir
demonstra a evolução do desenvolvimento demográfico de Teófilo Otoni, no período
de 1997 a 2006.
Gráfico 1 – Comportamento demográfico de Teófilo Otoni – 1997 a 2006
130.000
129.000
População
128.000
127.000
126.000
125.000
124.000
123.000
122.000
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006
Anos
Fonte: IBGE, Censos e Estimativas / Data SUS
Nota-se um comportamento demográfico decrescente entre os anos de
1997 a 1999, seguido de um grande crescimento no ano 2000. Já em 2000, a
população foi calculada através do censo. Após o ano 2000, observa-se estabilidade
do número de habitantes.
A tabela a seguir mostra a diminuição da população de Teófilo Otoni,
assim como sua distribuição entre o meio urbano e o rural, nos anos 1991 e 2000, e
suas respectivas taxas de urbanização nestes períodos. A taxa de urbanização
cresceu 2,15%, passando de 77,77% em 1991 para 79,44% em 2000.
Tabela 1 – Crescimento populacional e taxa de urbanização.
População por Situação de Domicílio
1991
2000
População Total
130.017
129.424
Urbana
101.111
102.812
Rural
28.906
26.612
Taxa de Urbanização
77,77%
79,44%
Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano, Fundação João Pinheiro.
18
O gráfico a seguir mostra a distribuição da população de Teófilo Otoni no
ano de 2006, por faixa etária. Observa-se que na cidade há predominância da
população jovem, já que 36.743 pessoas (28,36%) tem entre 0 e 14 anos, 14.294
pessoas (11,2%) têm entre 15 e 19 anos e 21.772 (17,1%) entre 20 a 29, contra
apenas 14.103 pessoas com 60 anos ou mais (11,05%).
Gráfico 2 – Composição da população por faixa etária em 2006
25.000
População
20.000
15.000
10.000
5.000
0
Menor 1
1a4
5a9
10 a 14
15 a 19
20 a 29
30 a 39
40 a 49
50 a 59
60 a 69
70 a 79
80 e +
Idade
Fonte: IBGE, Censos e Estimativas/ DataSUS.
3. Renda e Infra-Estrutura Econômica
Em 2000, 39,8% da população residente em Teófilo Otoni era considerada
pobre, sendo que a média de renda per capita (por pessoa) correspondia a R$210,30.
O índice de Gini para o município apresentava valor igual a 0,61, mensurando que a
desigualdade social no município é a mesma da média estadual (0,61). Porém, a
população considerada pobre está 10 pontos percentuais acima da média estadual
(29,8%), e também há uma grande diferença quando comparada a renda média per
capita de Teófilo Otoni com a do Estado, que é de R$ 276,60.
O mapa seguinte mostra a variação por quartis, ou seja, o tom mais claro
indica renda per capita mais baixa, enquanto o tom mais escuro indica renda per
capita mais alta. Teófilo Otoni se situa na terceira faixa, indicando que regionalmente
é um dos municípios cuja população possui renda per capita mais alta.
19
Mapa 1- Distribuição da renda per capita de Teófilo Otoni – Minas Gerais, 2000
Noroeste
Noroeste
Jequitinhonha
Jequitinhonha
Teófilo Otoni
Otoni
Teófilo
Rio Doce
Alto São
São Francisco
Francisco
Triângulo/Alto Paranaíba
Metalúrgica/
das Vertente
Campo
Campo das
Zona da Mata
Zona
Mata
Sul de Minas
∗
0
125
250
Renda per capita em 2000
Minas Gerais
acima de 258 reais
de 187 até 258 reais
de 129 até 187 reais
até 129 reais
(115)
(243)
(246)
(249)
Quilômetros
Fonte: IBGE, 2000/ CRISP-UFMG
Observando o gráfico seguinte, com a distribuição salarial da População
Economicamente ativa (PEA), notamos que, em 2001, a grande maioria da população
de Teófilo Otoni recebia até 3 salários mínimos (cerca de 78%), enquanto menos de
5% recebem mais de 10 salários mínimos. Os homens ganhavam R$ 529,79 em
média, por mês, enquanto as mulheres recebiam R$ 342,05 em média, por mês. Ou
seja, a média salarial de Teófilo Otoni era de aproximadamente R$ 446,22 e os
homens ganhavam, em média, R$187,74 a mais que as mulheres.
20
Gráfico 3 – Distribuição salarial da PEA em Teófilo Otoni – 2001
1%
4%
8%
até 1 salário mínimo
9%
mais de 1 a 2 salários mínimos
48%
8%
mais de 2 a 3 salários mínimos
mais de 3 a 5 salários mínimos
mais de 5 a 10 salários mínimos
mais de 10 a 20 salários
mínimos
mais de 20 salários mínimos
22%
Fonte: IBGE, Censos e Estimativas
A desigualdade social em Teófilo Otoni, assim como nos demais
municípios brasileiros, torna-se ainda mais nítida quando observamos dados
referentes à porcentagem de renda apropriada por estratos da população. De acordo
com os indicadores mostrados na tabela a seguir, os 20% mais ricos do município
detinham 65,4% da renda local, enquanto os 20% mais pobres detinham apenas 2,2%
do dinheiro circulante na cidade, em 2000. Se compararmos com 10 anos anteriores,
notaremos que a desigualdade teve uma leve redução neste município, enquanto se
manteve praticamente estável em Minas Gerais.
Tabela 2 – distribuição salarial entre os estratos populacionais
Teófilo Otoni
Minas Gerais
1991
2000
1991
2000
2,8
2,2
2,5
2,2
20% mais pobres
8,2
8
8
8
40% mais pobres
17
17,5
17,4
17,7
60% mais pobres
32,7
34,6
34,1
34,3
80% mais pobres
67,3
65,4
65,8
65,7
20% mais ricos
Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil/ Fundação João Pinheiro, PNUD, IBGE
Faixas populacionais
4. Educação
Em 2006, de acordo com o IBGE, a rede pré-escolar de ensino contava
com 46 escolas, sendo 30 escolas públicas municipais, com 1.864 matrículas e 16 da
rede privada, com 561 matrículas, num total de 2.445 matrículas. As escolas da rede
pública apresentavam um total de 103 professores e da rede privada, 56. Teófilo Otoni
não possui escolas da rede pública estadual ou federal de ensino pré-escolar.
Nesse mesmo ano, havia 26.867 matrículas no Ensino Fundamental em
Teófilo Otoni, sendo que 17.181 crianças estavam matriculadas em escolas públicas
estaduais, que são 46 no total e contam com 965 professores; 7.974 divididas em 36
21
escolas públicas municipais e com 419 professores; e 1.712 matrículas em escolas
privadas, que são 15 no total e têm um quadro de 163 professores. Teófilo Otoni não
tem escolas públicas federais de ensino fundamental.
Já no Ensino Médio, em 2006, havia 7.112 matrículas, sendo que 6.387
jovens estavam matriculados em escolas públicas estaduais e somente 725 em
escolas privadas. A cidade não tem escola pública federal ou municipal de ensino
médio. São 14 escolas da rede pública estadual, que conta com 307 professores, e 6
escolas privadas, com 82 professores no total.
Em 2006, Teófilo Otoni tinha apenas escolas privadas de Ensino Superior,
sendo 6 no total. Foram registradas 3.675 matrículas nestas instituições, que contam
com um corpo docente de 187 professores.
De acordo com informações do site da Assembléia Legislativa de Minas
Gerais, em 2002, Teófilo Otoni contava com cursos profissionalizantes tais como
magistério de 1º grau, técnico em enfermagem, técnico em informática, técnico em
patologia clínica, técnico em radiologia médica e rádio-diagnóstico. Já o ensino
superior contava com as habilitações em administração de empresas, ciências
biológicas, ciências sociais, direito, letras e pedagogia.
A tabela a seguir ilustra o nível educacional da população jovem de Teófilo
Otoni, de acordo com faixa etária e tempo de estudo. É notável a diferença entre os
anos de 1991 a 2000, principalmente a redução da taxa de analfabetismo e o grande
aumento da porcentagem de jovens com freqüência escolar, principalmente entre 15 e
17 anos.
Tabela 3 - Nível educacional da população jovem
Nível Educacional da População Jovem, 1991 e 2000
Faixa etária
Taxa de analfabetismo
% com menos de 4
anos de estudo
% com menos de 8
anos de estudo
% freqüentando a
escola
1991
2000
1991
2000
1991
2000
1991
2000
7 a 14 anos
26,3
9,2
-
-
-
-
78,3
95,4
10 a 14 anos
14,2
4
67,2
43
-
-
79,8
95,1
15 a 17 anos
9,6
2,6
35,1
11,3
89,4
59,3
56,5
80,7
18 a 24 anos
9,8
5
24,2
16,2
16,2
72,3
-
-
Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil/ Fundação João Pinheiro, PNUD, IBGE
A próxima tabela evidencia dados referentes à população adulta e seu
nível educacional. A taxa de analfabetismo que em 1991 era de 31,8%, passou para
22,8% em 2000, uma redução de 9%. A média de anos de estudo também obteve
22
melhora, passando de 4,2 para 5,3 anos, um aumento de 1,1 ano no tempo total de
estudo.
Tabela 4 - Nível educacional da população adulta
Nível Educacional da População Adulta (25 anos ou mais), 1991 e 2000
% com menos de 4 anos de estudo
1991
31,8
50,7
2000
22,8
40,2
% com menos de 8 anos de estudo
77,7
69,3
4,2
5,3
Taxa de analfabetismo
Média de anos de estudo
Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil/ Fundação João Pinheiro, PNUD, IBGE
O gráfico a seguir ilustra o tempo de estudo da população de Teófilo Otoni,
de acordo com a faixa etária. Mais de 36% das pessoa possuem entre 4 a 7 anos de
estudo, o que corresponde ao ensino básico e fundamental, isto é, cursaram até a
oitava série.
Gráfico 4 – Tempo de estudo e faixa etária
40.000
36.174
35.000
População
30.000
25.000
sem instrução e menos de 1 ano de estudo
1 a 3 anos de estudo
4 a 7 anos de estudo
8 a 10 anos de estudo
11 a 14 anos
15 anos ou mais de estudo
20.425
20.000
15.303
14.520
15.000
15.195
10.000
5.000
3.486
0
1
Tempo de Estudo
Fonte: Fundação Instituto de Geografia e Estatística – IBGE
Entendemos que a permanência de uma criança na escola é um fator
protetivo a situações de risco de vitimização como um todo e, principalmente, no
nosso caso, da violência sexual. Numa escala de 1 a 4, onde 1 estão os municípios
com baixo percentual de crianças entre 10 e 14 anos com mais de 1 ano de atraso
escolar e 4, onde estão os municípios com alto percentual de crianças com mais de 1
ano de atraso escolar, Teófilo Otoni encontra-se no nível 3 - ou seja, pouco mais de
1/3 das crianças entre 10 e 14 anos estão com 1 ano ou mais de atraso escolar.
23
Comparando com os municípios mais próximos, Teófilo Otoni encontra-se no mesmo
nível, nem abaixo, nem acima dos vizinhos.
Mapa 2 - Percentual de Crianças entre 10 e 14 anos com mais de um ano de atraso
escolar – Minas Gerais, 2000
Noroeste
Noroeste
Jequitinhonha
Jequitinhonha
Teófilo
Teófilo Otoni
Otoni
Rio Doce
Doce
Rio
Alto São
São Francisco
Francisco
Alto
Triângulo/Alto Paranaíba
Metalúrgica/
Metalúrgica/
Campo
Campo das
das Vertente
Vertente
Zona da
da Mata
Mata
Zona
% de crianças de 10 a 14
com mais de 1 ano de atraso escolar
de Minas
Minas
Sul de
∗
0
125
250
mais de 41.5%
de 31.4% até 41.5%
de 23.6% até 31.4%
até 23.6%
(131)
(218)
(272)
(232)
Quilômetros
Fonte: IBGE, 2000/ CRISP-UFMG
Na comparação das taxas de abandono escolar de Teófilo Otoni com as
taxas de Minas Gerais, da região Sudeste e do Brasil em 2004 observa-se que essas
são mais elevadas do que as taxas nacionais, regionais e estaduais, tanto para o
ensino médio como para o fundamental. Como já afirmado, a permanência de
crianças e adolescentes no sistema de ensino formal é compreendida como fator
protetivo contra o problema de violência sexual e de vitimização de modo geral. Se
fora da escola estes encontram-se expostos ao trabalho infantil ou à exploração
sexual infanto-juvenil. Destacamos, portanto, esta informação para o enfrentamento
da violência e exploração sexual infanto-juvenil no município.
24
Gráfico 5 – Taxa de Abandono Escolar nos Ensinos Fundamental e Médio (2004)
Brasil, Sudeste, Minas Gerais e Teófilo Otoni
Ensino Fundamental
20,0%
16,0%
16,0%
Taxa de Abandono Escolar (%)
18,1%
Ensino Médio
18,0%
15,9%
14,0%
11,8%
12,0%
11,0%
10,0%
8,3%
8,0%
6,4%
6,0%
4,0%
4,0%
2,0%
0,0%
Brasil
Sudeste
Minas Gerais
Teófilo Otoni
Fonte: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira/ MEC
5. Saúde
Valendo-se do baixo índice de desenvolvimento do Vale do Jequitinhonha
e do Vale do Mucuri, a cidade acabou se tornando uma referência no comércio
regional, atraindo moradores das cidades vizinhas. O mesmo se aplica para o caso da
saúde pública, em que os demais municípios transferem boa parte de seus moradores
doentes para Teófilo Otoni.
Para a caracterização do município em relação à saúde, alguns dados são
interessantes a serem destacados. As tabelas abaixo mostram o abastecimento de
água da cidade, o tipo de instalação sanitária e as formas de coleta de lixo, em uma
comparação entre os anos 1991 e 2000.
Teófilo Otoni contava, em 2005, com 65 estabelecimentos de saúde no
total, sendo que 29 deles são públicos. Destes, 26 são públicos municipais e 3
públicos estaduais. Os outros 36 estabelecimentos de saúde são do tipo privado,
sendo que 33 estabelecimentos têm fins lucrativos e 3 deles são do tipo sem fins
lucrativos. Com atendimento pelo SUS, são 46 no total, sendo que 5 deles possuem
internação.
São 26 estabelecimentos com internação, sendo que um é do tipo público
e 25 privados. Estabelecimentos sem internação são 26 públicos e 10 privados. Em
2005, Teófilo Otoni possuía 417 leitos em estabelecimentos de saúde no total, sendo
que 66 deles estavam em estabelecimentos de saúde pública e 351 na rede privada,
mas com atendimento pelo SUS. Em relação a emergências, a cidade possuía 2
unidades de atendimento, uma com atendimento emergencial em pediatria e uma com
25
obstetrícia. Também atendem emergências clínicas, traumatológicas e ortopédicas,
cirúrgicas e neurocirúrgicas. Possui ainda 1 estabelecimento que presta atendimento
ao SUS para CTI e 3 para diálises.
No ano 2000, o Programa Saúde da Família (PSF) atendia a 11.114
pessoas em Teófilo Otoni, o que correspondia a 8,6% da população. Neste mesmo
ano, o Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS) atendia a 629 pessoas,
0,5% da população. Em 2005, o número de pessoas atendidas pelo PSF passou para
47.560, o que correspondia a 37,2% da população e o PACS passou a atender 8.988
pessoas, isto é, 7% da população de Teófilo Otoni.
Foram registrados 23 óbitos hospitalares de crianças até 1 ano de idade
em 2005, sendo 15 do sexo masculino e 8 do sexo feminino. As principais causas de
mortalidade infantil registradas foram algumas doenças originadas no período
perinatal (77,8%), doenças do aparelho respiratório (4,8%) e doenças infecciosas e
parasitárias (4,8%). Entre crianças de 1 a 14 anos de idade, foram registradas 14
mortes hospitalares, sendo 5 do sexo feminino e 9 do sexo masculino. Neste grupo,
as principais causas de mortalidade foram causas externas de morbidade e
mortalidade, doenças do aparelho respiratório, doenças infecciosas e parasitárias.
A despesa total com saúde por habitante era de R$ 138,21 em 2001,
subindo para R$ 214,70 em 2004. A despesa com recursos próprios, que em 2001 era
de R$ 42,04 em média por habitante, subiu para R$ 60,22. Já a transferência do SUS
passou de R$ 96,17 em 2001 para R$ 147,94 em 2004, por habitante.
A tabela abaixo mostra os indicadores para causas de internações
registradas em Teófilo Otoni, em 2005, por faixa etária. Chamamos a atenção para o
percentual de 73,1% das causas de internações entre adolescentes de 15 a 19 anos
referir-se à “gravidez, parto e puerpério”, indicando o alto índice de adolescentes
grávidas no município. Entendemos que esta informação está diretamente ligada à
temática da violência sexual juvenil e, por isso, deve ser destacada:
26
Tabela 5 – Distribuição Percentual das Internações por Grupo de Causas e Faixa
Etária
CID-10/ local de residência da vítima/ 2005
Capítulo CID
I. Algumas doenças infecciosas e parasitárias
II. Neoplasias (tumores)
III. Doenças sangue órgãos hemat e transt imunitár
IV. Doenças endócrinas nutricionais e metabólicas
V. Transtornos mentais e comportamentais
VI. Doenças do sistema nervoso
VII. Doenças do olho e anexos
VIII.Doenças do ouvido e da apófise mastóide
IX. Doenças do aparelho circulatório
X. Doenças do aparelho respiratório
XI. Doenças do aparelho digestivo
XII. Doenças da pele e do tecido subcutâneo
XIII.Doenças sist osteomuscular e tec conjuntivo
XIV. Doenças do aparelho geniturinário
XV. Gravidez parto e puerpério
XVI. Algumas afec originadas no período perinatal
XVII.Malf cong deformid e anomalias cromossômicas
XVIII.Sint sinais e achad anorm ex clín e laborat
XIX. Lesões enven e alg out conseq causas externas
XX. Causas externas de morbidade e mortalidade
XXI. Contatos com serviços de saúde
CID 10ª Revisão não disponível ou não preenchido
Total
Fonte: SIH/SUS
Menor 1
17,0
0,2
0,2
1,1
1,6
0,7
22,0
3,0
0,5
1,4
43,8
3,7
3,2
1,4
0,2
100,0
1a4
25,9
2,2
1,2
5,0
3,4
0,2
0,2
0,7
33,8
7,9
1,7
1,2
3,1
0,5
2,6
3,4
6,5
0,2
0,2
100,0
5a9
14,2
3,1
1,2
5,1
2,8
0,4
2,4
15,7
19,7
2,8
4,3
5,5
2,0
2,0
18,9
100,0
10 a 14
5,9
4,0
3,0
7,9
5,0
5,4
7,4
16,8
2,0
1,5
5,9
7,9
0,5
4,0
0,5
22,3
100,0
15 a 19
1,2
1,7
0,5
0,9
0,1
1,3
1,5
2,2
3,4
0,8
1,6
2,9
73,1
0,4
0,8
7,4
100,0
20 a 49
2,7
3,9
0,7
3,3
0,8
2,5
0,1
0,0
15,0
5,3
12,9
1,1
1,6
7,1
34,3
0,2
1,4
6,9
0,2
100,0
50 a 64
4,0
6,0
0,8
8,8
0,1
1,4
0,2
32,0
11,6
16,0
2,8
2,1
7,8
0,1
0,1
1,4
4,6
0,1
100,0
65 e mais
5,3
3,8
1,5
9,8
0,1
1,2
32,2
18,6
10,9
2,3
2,1
6,7
1,4
3,9
0,2
100,0
6. Assistência Social
As principais instituições que atendem crianças e adolescentes em Teófilo
Otoni, de acordo com questionários aplicados na reunião do PAIR-MG são o
Ministério Público, Conselho Tutelar, órgãos da Prefeitura Municipal, Secretaria
Municipal de Educação, Programa Sentinela, Conselho Regional de Assistência
Social (CRAS), Secretaria Desenvolvimento Sócio Econômico (SEDESE), HSUP,
Associação dos Municípios da Microrregião do Vale do Mucuri (AMUC), Secretaria
Municipal de Saúde (SMS) e Casa Ninho.
De acordo com dados do IBGE, em 2005, não havia uma definição legal
de percentual do orçamento do município para assistência social. Porém, o valor total
previsto para o município para assistência social foi de R$ 80.000.000,00, sendo que
R$ 2.168.00,00 era o valor previsto de recursos próprios do município destinados à
Função de Assistência Social. O valor previsto dos recursos próprios do município
destinado ao Fundo Municipal de Assistência Social era de R$ 10.000,00, sendo que
este recurso em alguns municípios pode ser obtido em conjunto com outra política.
Em 2004, de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento Social e
Combate à Fome, a estimativa de famílias pobres, isto é, com renda per capita
familiar de até R$ 120,00 era de 9.898 famílias, que se encaixam no Perfil Bolsa
Família. As que se enquadravam no perfil Cadastro Único, isto é, aquelas famílias
com renda per capita familiar de até R$ 175,00 eram 15.441 famílias. Porém, o total
27
60 e mais
5,0
4,2
1,4
9,7
0,0
1,2
32,6
17,5
11,7
2,4
2,0
6,9
1,3
3,9
0,1
100,0
Total
5,1
3,8
0,9
5,2
0,4
2,1
0,1
0,0
17,8
10,5
11,9
1,6
1,7
6,4
22,0
1,9
0,5
1,5
6,4
0,0
0,2
100,0
de famílias cadastradas foi 18.773 no perfil Cadastro Único, e 17.706 no Perfil Bolsa
Família.
Os benefícios liberados para o Perfil Bolsa Família correspondem a um
total de 11.710. O número de benefícios liberados para famílias beneficiárias da Bolsa
Escola foi de 227 e 1.750 famílias foram beneficiadas com o Auxílio Gás.
7. Desenvolvimento Humano
O Índice de Desenvolvimento Humano Municipal é calculado a partir de
outros três índices – o IDH-Educação, o IDH-Renda e o IDH-Longevidade. Em 2000, o
Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M) de Teófilo Otoni era de 0,742
enquanto o IDH de Minas Gerais era de 0,773. Segundo a classificação do Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o município está entre as
regiões consideradas de médio desenvolvimento humano (IDH entre 0,5 e 0,8).
Os
IDHs-Educação,
Renda
e
Longevidade
apresentavam
respectivamente os valores de 0,814, 0,666 e 0,746. Para Minas Gerais, o valor do
IDH-Educação era de 0,850, o IDH-Renda correspondia a 0,711 e o IDH-Longevidade
possuía valor igual a 0,759. Esses indicadores partem do princípio de quanto mais
próximo do valor 1 melhor é a qualidade de vida da população de um determinado
território. Assim sendo, podemos inferir que a qualidade de vida de Teófilo Otoni é um
pouco inferior à qualidade de vida dos mineiros como um todo, principalmente em
relação ao IDH-Renda.
Tabela 6 – Índice de Desenvolvimento Humano Municipal e seus componentes
1991
2000
IDH – Teófilo Otoni
0,651
0,742
Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
0,702
0,814
Educação
0,64
0,746
Longevidade
0,612
0,666
Renda
Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil/ Fundação João Pinheiro, PNUD, IBGE
No período 1991-2000, o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
(IDH-M) de Teófilo Otoni cresceu 13,98%, passando de 0,651 em 1991 para 0,742 em
2000.
A dimensão que mais contribuiu para este crescimento foi a Educação,
com 41,2%, seguida pela Longevidade, com 39,0% e pela Renda, com 19,9%. Neste
período, o hiato de desenvolvimento humano (a distância entre o IDH do município e o
28
limite máximo do IDH, ou seja, 1 - IDH) foi reduzido em 26,1%.
Em relação aos outros municípios do Estado, Teófilo Otoni apresenta uma
situação intermediária: ocupa a 343ª posição, sendo que 342 municípios (40,1%)
estão em situação melhor e 510 municípios (59,9%) estão em situação pior ou igual.
Através do gráfico a seguir, é possível observar a situação do IDHMunicipal, IDH-Educação, IDH-Longevidade e IDH-Renda em 2000. Comparando com
os municípios vizinhos, Teófilo Otoni se destaca, com IDH superior aos demais. O que
é importante chamar atenção aqui é o entorno de Teófilo Otoni especialmente a
noroeste do município que tem IDH muito baixo e, portanto alta vulnerabilidade. Esta
informação é de importância fundamental para permitir reflexão a respeito da
regionalização do fenômeno da violência sexual infanto-juvenil, que será abordado
mais adiante. Por outro lado, Teófilo Otoni se destaca como centro de serviços e
atendimentos para a região.
Mapa 3 – Distribuição do Índice de Desenvolvimento Humano – Municípios de
Minas Gerais (2000)
Noroeste
Noroeste
Jequitinhonha
Jequitinhonha
Teófilo
Teófilo Otoni
Otoni
Rio
Rio Doce
Doce
Alto
Alto São
São Francisco
Triângulo/Alto
Triângulo/Alto Paranaíba
Paranaíba
Metalúrgica/
Metalúrgica/
das Vertente
Campo das
Zona da
da Mata
Mata
Zona
Sul
Sul de
de Minas
Minas
∗
0
125
250
Índice de Desenvolvimento Humano - IDH-M
Minas Gerais - 2000
acima de 0.765
de 0.719 até 0.765
de 0.664 até 0.719
até 0.664
(191)
(276)
(230)
(156)
Quilômetros
Fonte: IBGE, Censo Demográfico, 2000.
29
8. Índice de Vulnerabilidade Social
Foi dito que a construção de um indicador de vulnerabilidade social
permite ao gestor público e à sociedade uma visão mais detalhada das condições de
vida do seu município, com a identificação e a localização espacial das áreas que
abrigam os segmentos populacionais mais vulneráveis à pobreza. Este indicador se
baseou na metodologia utilizada pela Fundação SEADE do Estado de São Paulo para
a construção do Índice Paulista de Vulnerabilidade Social.
De acordo com a metodologia original, este indicador se baseou em dois
pressupostos. “O primeiro foi a compreensão de que as múltiplas dimensões da
pobreza precisam ser consideradas em um estudo sobre vulnerabilidade social.
Nesse sentido, buscou-se a criação de uma tipologia de situações de exposição à
vulnerabilidade que expressasse tais dimensões, agregando aos indicadores de renda
outros referentes à escolaridade e ao ciclo de vida familiar. O segundo pressuposto foi
a consideração de que a segregação espacial é um fenômeno presente nos centros
urbanos
e que contribui decisivamente para a permanência dos padrões de
desigualdade social que os caracteriza. Isso levou à utilização de um método de
identificação de áreas segundo os graus de vulnerabilidade de sua população
residente, gerando um instrumento de definição de áreas prioritárias para o
direcionamento de políticas públicas, em especial as de combate à pobreza. Para
tanto, entendeu-se que os resultados precisavam ser fortemente detalhados do ponto
de vista espacial, de forma a permitir o desenho de ações locais focalizadas,
especialmente
por
parte
do
poder
público
municipal”
(http://www.al.sp.gov.br/web/ipvs/index_ipvs.htm, em 07 de Maio de 2007).
As informações utilizadas para a construção do Índice de Vulnerabilidade
Social no município mineiro de Teófilo Otoni são provenientes do Censo Demográfico
2000, detalhadas por setor censitário, sendo essa a única fonte de dados existente
em escala intra-urbana para todos os municípios brasileiros com população superior a
25 mil habitantes naquele ano de realização do Censo. Adotou-se um Sistema de
Informação Geográfica (SIG), para que os setores censitários urbanos fossem
tratados e representados em cartografias temáticas.
Como se pode observar, o bairro Novo Horizonte, em Teófilo Otoni, é a
região com maior vulnerabilidade social de acordo com a metodologia proposta para a
construção do indicador. O mapa da área urbana desta cidade é representado pelos
distintos graus de vulnerabilidade social. Isso nos permite identificar que ao longo das
rodovias MG-217 e BR-418 (que cortam a cidade de Teófilo Otoni) se situa a região
30
mais carente sob o ponte de vista deste indicador.
Mapa 4 – Índice de Vulnerabilidade Social – Teófilo Otoni
Joaquim
Joaquim
Pedrosa
Pedrosa
Centro
Centro
Jardim
Jardim Serra
Serra Verde
Verde
Novo
Novo
Horizonte
Horizonte
Ipiranga
Ipiranga
Filadélfia
Filadélfia
Índice de Vulnerabilidade Social
Teófilo Otoni - 2000
0
1.5
3
Taquara
Taquara
Quilômetros
Nenhuma vulnerabilidade
Vulnerabilidade muito baixa
Baixa Vulnerabilidade
Vulnerabilidade média
Vulnerabilidade alta
Vulnerabilidade muito alta
(24)
(21)
(25)
(2)
(21)
(3)
Fonte: IBGE, 2000/ CRISP-UFMG Fonte: IBGE, 2000/ CRISP-UFMG
9. Diagnóstico da Segurança Pública e Criminalidade
No tocante à segurança pública serão analisados os dados de ocorrência
de crimes no município, a estrutura organizacional das polícias e seus respectivos
efetivos, além dos programas desenvolvidos para promover melhorias nos serviços
prestados à população, bem como focalizar o combate aos principais problemas
relacionados à segurança pública local. As informações foram obtidas junto às
Polícias Militar e Civil de Teófilo Otoni através do Centro de Estudos de Criminalidade
e Segurança Pública (CRISP) da UFMG.
A análise das ocorrências dos crimes se justifica na medida em que
supomos que muitos deles relacionam entre si como é o caso, por exemplo, do tráfico
e daqueles de natureza violenta, especialmente
o homicídio. Ou o tráfico e o
lenocínio e a exploração sexual etc.
31
9.1. Criminalidade violenta em Teófilo Otoni
São classificados como crimes violentos aqueles contra a pessoa (soma
de homicídios, tentativas de homicídio e estupros) e contra o patrimônio (que inclui
roubos e roubos a mão armada). Nos gráficos a seguir podemos visualizar as taxas
de crimes violentos, homicídios, roubo, roubo a mão armada, crimes contra o
patrimônio e crimes contra a pessoa. O cálculo de taxas é realizado a partir da razão
do número de ocorrências em cada ano, para cada 100.000 habitantes, no município.
Gráfico 6 – Taxa de Crimes Violentos em Teófilo Otoni por 100 mil habitantes -1986 a
2005
700,00
Taxa bruta por 100 mil habitantes
600,00
500,00
400,00
300,00
200,00
100,00
0,00
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
Anos
Fonte: Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública/ Polícia Militar de Minas Gerais
Através do gráfico acima, que mostra a evolução das taxas de crime
violento em Teófilo Otoni no período de 1986 a 2005, é possível perceber a gradativa
evolução desse tipo de crime, que começa a subir a partir dos anos 1990, com um
grande crescimento no período entre 1997 e 1999, queda em 2000 e volta a crescer
nos anos subseqüentes. Essa taxa que em 1986 correspondia a 139,69 passou para
599,96 em 2005.
32
Gráfico 7 – Taxa de Homicídios em Teófilo Otoni por 100 mil habitantes - 1986 a 2005
Txa bruta por 100 mil habitantes
60,00
50,00
40,00
30,00
20,00
10,00
0,00
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
Anos
Fonte: Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública/ Polícia Militar de Minas Gerais
O gráfico acima ilustra a evolução das taxas de homicídios para cada 100
mil habitantes em Teófilo Otoni no período de 1986 a 2005. É possível perceber uma
irregularidade nas taxas de homicídios registrados na cidade até 2000, com picos e
quedas das taxas. A partir de 2001, a taxa de homicídios cresce gradativamente, com
uma queda no ano de 2004 e volta a crescer em 2005. Em 1986, essa taxa
correspondia a 13,7 e passou para 51,92 em nove anos.
Gráfico 8 – Taxa de Roubos em Teófilo Otoni por 100 mil habitantes - 1986 a 2005
taxa bruta por 100 mil habitantes
300,00
250,00
200,00
150,00
100,00
50,00
0,00
1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
Anos
Fonte: Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública/ Polícia Militar de Minas Gerais
33
Em 1986, Teófilo Otoni registrava uma taxa de roubo de 52,4 para cada
100 mil habitantes, passando para 212,73 em 2005. Através do gráfico é possível
visualizar o crescimento destas taxas, que do ano 2000 a 2004 apresenta um grande
crescimento, seguido de um declínio no ano 2005.
Gráfico 9 – Taxa de Roubos a Mão Armada em Teófilo Otoni por 100 mil habitantes 1987 a 2005
Taxa bruta por 100 mil habitantes
250,00
200,00
150,00
100,00
50,00
0,00
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
Anos
Fonte: Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública/ Polícia Militar de Minas Gerais
O roubo a mão armada em Teófilo Otoni apresenta um grande
crescimento, a partir de 1997, com queda no ano 2000, voltando a crescer nos anos
seguintes. A taxa para cada 100 mil habitantes que em 1986 correspondia a 30,34
passou para 237,97 em 2005.
Gráfico 10 – Taxa de Crimes Contra o Patrimônio em Teófilo Otoni por 100 mil
habitantes - 1986 a 2005
500,00
Taxa bruta por 100 mil habitantes
450,00
400,00
350,00
300,00
250,00
200,00
150,00
100,00
50,00
0,00
1986 1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993 1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000 2001
2002
2003
2004
2005
Anos
Fonte: Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública/ Polícia Militar de Minas Gerais
34
A taxa de crimes contra o patrimônio correspondia a 52,04 para cada 100
mil habitantes em 1986, passando para 450,69 em 2005. Grande aumento a partir do
ano de 1997, declínio em 2000 e crescimento gradativo de 2000 em diante.
Gráfico 11 – Taxa de Crimes Contra a Pessoa em Teófilo Otoni por 100 mil habitantes
- 1986 a 2005
180,00
Taxa bruta por 100 mil habitantes
160,00
140,00
120,00
100,00
80,00
60,00
40,00
20,00
0,00
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
Anos
Fonte: Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública/ Polícia Militar de Minas Gerais
Os crimes contra a pessoa apresentam um comportamento bastante
irregular das taxas, passando de 87,65 em 1986 para 149,27 em 2005, com
crescimento do ano de 1987até 1985, quando tem uma queda, novo pico em 1998,
queda no ano 2000 e crescimento gradativo deste ano em seguida. A partir de 2005, é
possível visualizar uma ligeira queda. Através da tabela a seguir, é possível verificar
os tipos de crime contra o patrimônio ocorridos nos anos 2002 e 2005, assim como o
valor absoluto de cada um deles.
Tabela 7 - Crimes Contra o Patrimônio em Teófilo Otoni – 2002 e 2005
Crime contra o Patrimônio
Tipo de delito
2002
2005
Apropriação Indébita
13
20
Dano
336
396
Estelionato
89
93
Extorsão Mediante Seqüestro
0
0
Furto
1886
1885
Furto a Transeunte
134
116
Furto de Carga
1
0
Furto de Veículo
503
69
Outro Crime Contra o Patrimônio
253
84
Receptação
4
2
Roubo
134
57
Roubo a Transeunte
389
54
Roubo a Veículo Táxi/Coletivo
2
0
Roubo Circunstanciado (Seqüestro Relâmpago)
0
0
Roubo de Carga
0
0
Roubo de Veículo
15
13
Roubo Seguido de Morte (Latrocínio)
1
1
TOTAL
3.547
2.790
FONTE: DIRETORIA DE ESTATÍSTICA/COSEG/PCMG/ARMAZÉM SEAB/ Polícia Civil Teófilo
Otoni
35
A maior incidência deste tipo de crime é do tipo furto, com 1.886
ocorrências em 2002, caindo apenas uma ocorrência em 2005. O tipo de crime contra
o patrimônio “roubo a transeunte” obteve uma grande queda, passando de 389
ocorrências em 2002 para 54 em 2005, de acordo com dados da polícia civil de
Teófilo Otoni.
Através da tabela a seguir, podemos saber quais crimes entram na
categoria Crimes contra a Pessoa, e suas determinadas ocorrências nos anos 2002 e
2005.
Tabela 8 – Crimes contra a Pessoa em Teófilo Otoni – 2002 e 2005
Crimes contra a Pessoa
Tipo de delito
2002
2005
Ameaça
1560
1.121
Calúnia, Difamação, Injúria.
180
87
Homicídio
36
66
Lesão Corporal
1274
862
Outro Crime Contra a Pessoa
170
144
Tentativa de Homicídio
88
54
Violação de Domicílio
3
8
Total
3200
2.342
FONTE: DIRETORIA DE ESTATÍSTICA/COSEG/PCMG/ARMAZÉM SEAB/ Polícia Civil Teófilo
Otoni
Os tipos de crime contra a pessoa que mais registraram ocorrências foram
as categorias “ameaça” e “lesão corporal”, ambas apresentando queda de 2002 para
2005, de 1560 ocorrências para 1.121 e 1.274 para 862, respectivamente. Porém, o
número de homicídios neste período subiu, passando de 36 ocorrências em 2002
para 66 em 2005.
Ainda na categoria de crimes contra a pessoa, entram os crimes contra os
costumes, visualizados na tabela a seguir.
Tabela 9 – Crimes contra os Costumes em Teófilo Otoni – 2002 e 2005
Crimes contra os Costumes
Tipo de delito
2002
2005
Assédio sexual
0
0
Atentado violento ao Pudor
3
4
Corrupção de Menores
1
0
Estupro
6
0
Outro Crime Contra os Costumes
37
27
Sedução
0
0
Total
47
34
FONTE: DIRETORIA DE ESTATÍSTICA/COSEG/PCMG/ARMAZÉM SEAB/ Polícia Civil Teófilo
Otoni
Em 2002, foram registrados 6 estupros de acordo com dados da Polícia
Civil, e nenhum em 2005. O tipo “outro crime contra os costumes” passou de 37
36
ocorrências em 2002 para 27 em 2005. Em 2005, não foi registrada nenhuma
ocorrência de sedução de menores. Através da tabela abaixo é possível visualizar os
delitos relacionados a Tóxicos e Entorpecentes em Teófilo Otoni, nos anos de 2002 e
2005.
Tabela 10 – Tóxicos e Entorpecentes em Teófilo Otoni – 2002 e 2005.
Tóxicos e Entorpecentes
Tipo de Delito
2002
2005
Tráfico de Cocaína
0
2
Tráfico de Crack
2
6
Tráfico de Haxixe
3
0
Tráfico de Lança Perfume
0
0
Tráfico de Maconha
13
18
Tráfico de outras drogas/entorpecentes
3
3
Uso indevido de cocaína
3
15
Uso indevido de Crack
13
22
Uso indevido de lança perfume
0
0
Uso indevido de maconha
134
128
Uso indevido de outras drogas/entorpecentes
32
3
Total
206
197
FONTE: DIRETORIA DE ESTATÍSTICA/COSEG/PCMG/ARMAZÉM SEAB/ Polícia Civil Teófilo
Otoni
Tanto em relação ao tráfico como ao uso indevido de droga, a maior
ocorrência é em relação à maconha. A ocorrência de tráfico passou de 13 em 2002
para 18 em 2005, mas seu uso indevido diminui, passando de 134 ocorrências em
2002 para 128 em 2005. O tráfico e consumo de crack na cidade aumentaram. Em
2002, foram registradas 2 ocorrências de tráfico de crack, passando para 6 em 2005,
e seu uso indevido saltou de 13 em 2002 para 22 em 2005. Deve-se levar em conta,
que estes dados não representam apenas a incidência do fenômeno, mas também o
trabalho policial de repressão.
9.2. Índice Mineiro de Responsabilidade Social – Segurança
Pública
O IMRS, índice desenvolvido pela Fundação João Pinheiro para todos os
municípios do Estado de Minas Gerais, deve avaliar a situação dos municípios,
contemplando as dimensões renda, saúde, educação, segurança pública, gestão,
habitação e meio ambiente, cultura, desporto e lazer. Os esforços para alterar a
situação são captados por meio da variação dos indicadores ao longo do tempo.
Para cada dimensão, foram selecionados temas relevantes que pudessem
retratar: a situação existente, a atuação da gestão pública e as iniciativas vinculadas à
participação nas decisões. As ações avaliadas foram definidas como aquelas que são
37
(ou deveriam ser) prioridade de programas e de políticas públicas das esferas de
governo municipal, estadual e/ou federal. Sendo assim, os diferentes níveis de
governo são co-responsáveis por avanços nessas áreas, e o índice retrataria seu
sucesso ou sua responsabilidade social conjunta. O índice varia entre 0 e 1 e quanto
mais próximo de 1 é o índice, melhor o desempenho municipal.
O IMRS municipal é construído a partir da média ponderada dos índices de
cada dimensão. Neste estudo será abordada especificamente a dimensão relativa à
Segurança Pública de Teófilo Otoni. Os temas selecionados para essa dimensão
foram: segurança pública, criminalidade, capacidade de aplicação da lei, além de
apresentar o IMRS municipal.
O IMRS Municipal (aquele que inclui todas as variáveis citadas acima) de
Teófilo Otoni sofreu uma sutil piora no período de 2000 a 2004 quando passou de
0,650 a 0,636.
A dimensão de segurança pública do IMRS é composta por basicamente
cinco temas: a criminalidade, a capacidade de aplicação da lei, as medidas de
prevenção e de fluxo e produtividade do sistema de justiça criminal além da gestão
municipal do problema.
O IMRS segurança pública caiu de 0,612 em 2000 para 0,526 em 2004, e
a sua componente Segurança Pública – Criminalidade caiu de 0,586 em 2000 para
0,447 em 2004. Já a componente IMRS segurança Pública – capacidade de aplicação
da lei obteve um leve aumento, passando de 0,664 em 2000 para 0,685 em 2004.
A tabela a seguir mostra os valores do Índice Mineiro de Responsabilidade
Social, assim como as componentes Segurança Pública – Criminalidade e Segurança
Pública – Capacidade de aplicação da Lei, dos anos 2000, 2002 e 2004.
Tabela 11- índice Mineiro de Responsabilidade Social – 2000 a 2004.
Anos
2000
2002
2004
IMRS - Segurança Pública:
capacidade de aplicação da
Lei
0,65
0,612
0,586
0,664
0,607
0,547
0,483
0,677
0,636
0,526
0,447
0,685
Fonte: Fundação João Pinheiro/ Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública
IMRS
IMRS – Segurança
Pública
IMRS - Segurança
Pública: criminalidade
A tabela a seguir mostra algumas componentes do Índice Mineiro de
Responsabilidade Social, nos anos de 2000 a 2004.
38
Tabela 12 – Componentes do IMRS – 2000 a 2004.
Ano
2000
2001
2002
2003
2004
Gasto
Municipal per
capta com
segurança
pública
245,7
10,84
186,68
59,65
257
1.505
40.378
0,42
415,93
18,55
313,88
102
261
1.399
28.433
0,79
513,61
28,62
380,57
133
264
1.386
33.263
0,52
513,9
41,02
364,53
149,4
274
1.398
24.813
0,36
563
34,07
412,76
150,2
278
1.378
28.035
0,26
Fonte: Fundação João Pinheiro/ Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública
Taxa
crime
violento
Número
Taxa
Taxa
Número Número
pessoas por
Taxa
crime
crime
pessoas pessoas
Juiz na
contra
contra
homicídio
por PM por PC
Comarca
patrimônio pessoa
As taxas de crime violento, homicídio, crime contra o patrimônio e crime
contra a pessoa aumentaram de 2000 a 2004, fazendo cair o IMRS. O número de
pessoas por Policial Militar também aumentou, o que significa menos policiais,
proporcionalmente. Em 2000, eram 257 pessoas por PM em Teófilo Otoni, passando
para 278 em 2004. Mas em 2000, eram 1505 pessoas por Policial Civil, caindo para
1378. O número de pessoas por Juiz na Comarca obteve uma melhora, já que caiu de
40.378 em 2000 para 28.035 em 2005.
39
Esforço
orçamentário
com
segurança
pública
0,07
0,15
0,07
0,07
0,04
PARTE III – Caracterizando o Fenômeno
1. Violência Sexual Infanto-Juvenil no Brasil e em Minas
Gerais
A partir de 1997 criou-se um canal nacional de denúncias através do
telefone 0800-99-0500. Por meio deste número, a população faz a denúncia de forma
anônima. O quadro abaixo mostra o número de denúncias feitas pelos cidadãos entre
janeiro de 1997 e janeiro de 2003, por Unidades da Federação. Notamos que, ao final
do intervalo considerado, foram denunciadas 4.076 casos de abuso e exploração
sexual no Brasil, dos quais cerca de 26% são oriundos do Rio de Janeiro, seguido de
São Paulo (14%), Ceará (8%) e Minas Gerais (6,45%). Mas o que chama a atenção
nesta tabela é o aumento do número de denúncias a partir de 2000 para todas as
unidades da federação, sendo que o ano de 2002 concentra cerca de 40% de todas
as denúncias no período considerado. No entanto, acreditamos que este aumento se
deve mais à divulgação desta política do que propriamente ao aumento desta
violência. Neste sentido, vislumbramos uma tendência de um maior reconhecimento e
uma maior visibilidade do fenômeno perante a população brasileira em geral.
Quadro 1 - Número de denúncias registradas pelo 0800-99-0500
Unidades da Federação - jan/1997 a jan/2003
Fonte: Sistema Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infanto-Juvenil 0800-990500/ABRAPIA (Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção á Infância e Adolescência)
40
A tabela abaixo, também retirada do Sistema Nacional de Combate à
Exploração Sexual Infanto-Juvenil, mostra que entre janeiro de 2001 e dezembro
de 2002 houve um aumento de cerca de 50% no número de denúncias
telefônicas de exploração sexual em Minas Gerais e um aumento de 500% para
as denúncias de abuso sexual. Em geral, houve um aumento da ordem de 220%
entre um ano e outro para todas as denúncias relacionadas ao tema e recebidas
pelo sistema. Tais informações reforçam a análise da tabela anterior, mostrando
que o fenômeno vem se tornando mais visível com o passar do tempo, em
virtude de campanhas publicitárias de conscientização e de trabalhos de
divulgação do problema, realizado por algumas instituições componentes da
rede de enfrentamento ao fenômeno.
Tabela 13 – Número de denúncias de exploração e abuso sexual em Minas
Gerais via telefone- janeiro de 2001 a dezembro de 2002
Fonte: Sistema Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual Infanto-Juvenil 0800-990500/ABRAPIA (Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção á Infância e Adolescência)
2. Percepção da rede de Teófilo Otoni sobre o fenômeno
No município de Teófilo Otoni foram realizadas 8 entrevistas, sendo que
seis das instituições podem ser classificadas como componentes da rede de defesa e
responsabilização às vítimas de violência sexual infanto-juvenil, sobretudo, abuso e
exploração sexuais. São elas: Conselho Tutelar Norte, Conselho Tutelar Sul, Policia
Civil, Polícia Rodoviária Federal, Ministério Público e Juizado.
As outras duas
instituições foram classificadas como de atendimento: Casa Ninho e Centro de
Referência de Assistência Social – CRAS.
Em relação ao fenômeno, foram analisadas as seguintes categorias,
sendo que cada uma delas se subdividiu em “abuso sexual” e “exploração sexual” e
as
respostas
foram
comparadas
entre
as
redes
de
atendimento
e
defesa/responsabilização:
1. Definição do fenômeno
2. Causas ou fatores que propiciam a ocorrência do fenômeno
3. Perfil das crianças e adolescentes vítimas de abuso e exploração sexuais
4. Localização dos principais pontos de ocorrência do fenômeno
5. Visibilidade do fenômeno no município
41
6. Perfil dos agressores, sobretudo, relação social existente entre estes e as
vítimas
7. Empecilhos ou dificuldades no oferecimento de denúncias/queixas por parte
da sociedade
8. Empecilhos ou dificuldades em relação ao levantamento de provas e,
principalmente, com o testemunho infantil
2.1.
Definição do fenômeno pela rede em Teófilo Otoni
De acordo com os entrevistados da rede de defesa e responsabilização
em Teófilo Otoni, o que diferencia “abuso sexual” e “exploração sexual” é o fato
de o primeiro acontecer no ambiente doméstico, velado e não se restringir apenas ao
ato sexual, mas envolver “todos os tipos de abuso”. São vítimas “mais indefesas”
fisicamente, por se concentrarem, em geral numa faixa etária mais baixa que as
vítimas de exploração. Em relação à exploração, esta é caracterizada pelos
entrevistados como mais presente no espaço público e cujo processo envolve a troca
material, seja em forma de dinheiro seja por outro tipo de mercadoria. Também para
os entrevistados da rede de atendimento do município, o que diferencia “abuso
sexual” e “exploração sexual” é o fato de o primeiro acontecer no ambiente
doméstico, envolvendo pessoas próximas. Existe a idéia de que no abuso, a vítima é
agredida por um número menor de pessoas, geralmente parentes, em grande parte
dos casos os próprios pais. Por outro lado, a exploração sexual é caracterizada pelos
entrevistados dessa rede como “algo mais exposto”, o “uso” da adolescente por um
número maior de pessoas e à prostituição, uma vez que envolve relação de troca
entre vítima e agressor.
2.2.
Causas ou fatores que propiciam a ocorrência do
fenômeno
A vulnerabilidade econômica e social das famílias das vitimas de abuso e
exploração sexual aliada à desestruturação dessas famílias é apontada como uma
das causas primárias do problema de abuso e exploração sexual infanto-juvenil
no município para os entrevistados da rede de defesa/responsabilização. Muitos
relatos mostram que tanto para abuso sexual quanto na exploração, fatores de cunho
econômico atuam como facilitadores para que os mesmos ocorram. Na questão do
abuso sexual, a permanência de muitas pessoas dentro de uma casa pequena onde
não há muitos cômodos pode levar a situações de abuso sexual da criança por
42
parentes que dividem o mesmo ambiente. Isso pode ocorrer, sobretudo, quando
fatores como alcoolismo ou uso de outras drogas também estão presentes:
“E, é um ambiente que eles vivem, tanta promiscuidade; não
promiscuidade é... um ambiente que você não tem divisão de
cômodos entendeu? Então, no final das contas é pai que troca roupa
na frente de filha, aí a filha vai virando adolescente, entendeu? E é
aquele pai que bebe. Então... acho que no final das contas eu
atribuo isso mais à questão financeira”. (Entrevista, rede de Defesa
a Responsabilização)
A questão cultural também foi mencionada como uma das causas de
abuso sexual na zona rural. Em uma entrevista, foi-nos relatado uma experiência em
que uma mulher afirma considerar normal a iniciação sexual da filha pelo pai no meio
rural:
“...ela virou pra mim e falou: doutora eu acho que isso é uma questão
extremamente cultural”... porque as pessoas vivem no meio da roça,
né? Não tem luz, aquela situação né, e, eles acham normal que o
pai é... faça a iniciação sexual da filha.”(Entrevista, rede de Defesa e
Responsabilização)
Em relação à exploração sexual, o aspecto econômico interfere
diretamente no problema, pois envolve troca material. Muitas crianças e adolescentes
permanecem em situação de exploração em troca de dinheiro para ajudar a família,
comprar coisas para si próprias incentivadas pelo apelo consumista ou até mesmo em
troca de produtos de primeira necessidade como sabonetes:
“...em Pedra Azul nós tivemos apurando um fato lá que a menina se
prostituía em troca de sabonete, sabonete, em troca de pequenas
coisas, isso aí a gente sabe, chegamos a apurar o caso
assim.”(entrevista, rede de defesa e responsabilização)
No caso da exploração, outro fator apontado para sua ocorrência foi a
“herança” familiar de avós e mães que transferem o oficio para as filhas:
“...vem uma série já, a bisavó era, a avó era, a mãe era (prostituta).”
(entrevista, rede de defesa e responsabilização)
Portanto, há uma tendência a se atribuir o abuso e exploração sexual das
crianças e adolescentes na cidade à situação de pobreza extrema e desestrutura
familiar. De acordo com a percepção dos entrevistados, existe essa raiz comum para
os dois problemas:
43
“...alguns casos a gente vê que é uma convivência familiar
superlotada, uma família de 10 pessoas que convive em um cômodo
de uma casa, e também tem o outro lado, a mãe que é prostituta e
que ensinou a filha a se prostituir. O fator mais assim que a gente
pode falar é a pobreza, é a extrema pobreza. Tanto pra um quanto
pra outro” (Entrevista, rede de Defesa a Responsabilização),
“...ta havendo, a pobreza ta, porque as meninas são muito pobres
então eles estão tendo relação sexual na beira da rodovia por causa
de dinheiro... é um, é um enfoque né, mas às vezes o enfoque tem
que ser em outro lado, que a falta de informação né, a falta de
gerenciamento familiar gera esse negócio aí” (Entrevista, Rede de
Defesa e Responsabilização).
Em Teófilo Otoni, as causas e fatores que levam ao abuso e à
exploração sexual não foram abordadas pelos entrevistados da rede de
atendimento, exceto uma menção feita às “famílias desestruturadas” como
causadoras desse fenômeno:
“Isso é característica de famílias desestruturadas.” (Entrevista, Rede
de Atendimento)
Fazendo uma comparação entre as duas redes de enfrentamento,
percebe-se que, em relação aos fatores que levam à exploração e ao abuso sexuais,
a rede de defesa e responsabilização demonstrou uma clareza maior quanto a esse
aspecto, atribuindo como fator primário para esse problema a vulnerabilidade social e
econômica em que as famílias das vítimas se encontram. De acordo com sua
percepção, as condições muitas vezes precárias de moradia em que as famílias
vivem, com poucos cômodos que acomodam muitas pessoas, pode propiciar um
ambiente fértil ao abuso sexual e pode ser agravado devido ao uso de álcool ou
drogas por parte do agressor. Quanto à exploração, a necessidade de subsistência
leva crianças e adolescentes para esse caminho, sendo que muitas vezes essas
meninas já vêm de uma história familiar em que mães e avós se prostituíam. Há
também o problema de desestruturação familiar onde as vítimas estão expostas e que
foi
apontado
tanto
pela
rede
de
atendimento
como
pela
de
defesa
e
responsabilização.
44
2.3.
Perfil das crianças e adolescentes vítimas de abuso
e exploração sexuais
Podemos perceber através das entrevistas da rede de atendimento que
grande parte das vítimas de abuso e exploração sexual é de meninas provenientes
de famílias pouco estruturadas e de condições sócio-econômicas mais desfavoráveis
em cujas casas comumente convivem mais de duas gerações, primos, avós, tios,
padrastos:
“Um suposto avô morava com a avó dela. E, ele abusou dela,
entendeu?... E, aí, ela já tava dormindo com um primo dela, e, tava
tendo relações com esse primo também.” (Entrevista, Rede de
Atendimento).
O perfil das vítimas de abuso e exploração sexual delineado nas
entrevistas da rede de defesa e responsabilização nos revela que a maior parte é
de meninas que pertencem a famílias desestruturadas, de alta vulnerabilidade social e
econômica. Nos casos de abuso, as regiões rurais também foram apontadas como
focos de ocorrência desse tipo de crime e a idade das vitimas geralmente varia entre
6 e 12 anos. As adolescentes que passam dessa faixa etária possuem mais
condições de defesa que as menores, segundo as entrevistas. No caso da
exploração, a faixa etária é mais flexível, sendo que muitos relatos confirmam a
existência de crianças entre 6 e 7 anos até adolescentes de 16 a 17 anos. Muitas
meninas dizem ir à escola quando na verdade se dirigem aos pontos de exploração
sexual. Algumas garotas são aliciadas pelos próprios pais:
“ele apreendeu uma menor aí, com o pai, que aliciava a menina, aí
que o pai virou pra ele e falou assim "que isso, essa menina tem
uma mina de ouro no meio das pernas!"” (Entrevista, rede de defesa
e responsabilização)
Muitas meninas, por serem usuárias de drogas, colocam-se em situação
de exploração para sustentar o vício e muitas acabam se envolvendo com o tráfico,
atuando como “aviõezinhos” e terminam como “mulheres de todos”, ou seja,
mantendo relações com os componentes do grupo de tráfico em troca da droga.
Como salientado na parte metodológica deste relatório, além das
entrevistas com os atores das redes de atendimento, defesa e responsabilização,
coletamos informações contidas nos registros de casos de violação dos direitos da
criança e do adolescente, sobretudo nos casos de violência sexual e drogaditos,
registrados pelo Conselho Tutelar (foram registrados 3 casos de exploração e 9 casos
45
de abuso sexual em 2006, no município). As variáveis coletadas diziam respeito a
informações sobre o perfil das vítimas e dos agressores, sobretudo no que se refere à
relação social existente entre eles, além de informações sobre encaminhamentos
realizados pelas instituições, sobre forma de denúncia, dentre outras.
O gráfico a seguir mostra o perfil das vítimas de abuso sexual, quanto à
idade, cujos casos chegaram ao conhecimento do Conselho Tutelar. Vê-se que a
maioria é do sexo feminino, 67% possuíam até 11 anos de idade e o restante entre 12
e 18 anos.
Gráfico 12 - Perfil das Vítimas de Abuso Sexual - Idade
70%
60%
50%
40%
30%
20%
10%
0%
0 a 11 anos
12 anos ou mais
Fonte: Conselhos Tutelares de Teófilo Otoni - CRISP-UFMG
A partir das informações dos Conselhos Tutelares de Teófilo Otoni,
constatamos que quatro das vítimas de abuso sexual registradas tiveram
encaminhamento para a rede de responsabilização. A maior parte não fez uso de
drogas (5 casos), tinha entre 0 e 12 anos de idade (6 casos) e era do sexo feminino (7
casos). Em cinco das ocorrências registradas, o primeiro depoente era pessoa da
família e em um terço delas, a pessoa que fez a denúncia também é da família. Em
uma das ocorrências de abuso sexual registrada houve mais de uma vítima.
Em relação à exploração sexual, foram registrados três casos nos
Conselhos Tutelares em 2006 cujas vítimas tinham treze, quinze anos e uma de idade
não informada, todas do sexo feminino. Sobre informação relacionada ao primeiro
denunciante e efetuação de denúncia, em dois dos casos as queixas foram realizadas
por familiares. Não se registraram informações em relação ao uso de drogas por parte
das vítimas ou internação das mesmas, de forma que não é possível através desses
dados confirmar ou não os depoimentos dos entrevistados sobre a relação entre
drogas e exploração sexual. Em uma das ocorrências houve mais de uma vítima.
46
Para os casos de drogaditos registraram-se sete ocorrências no município,
em 2006, nos Conselhos Tutelares. Todos tinham por vítimas crianças e adolescentes
do sexo masculino. Quatro deles estavam entre 13 e 17 anos. Em seis dos casos, o
denunciante das ocorrências era pessoa da família e essa mesma relação se deu nos
casos de primeiro depoimento.
Em relação à referência ao bairro de moradia das vítimas, esta não tem
por objetivo estigmatizar o mesmo, mas chamar a atenção das autoridades e da rede
para prevenção ou ações no local. Nos dois mapas abaixo, temos a representação
dos locais de origem das vítimas de abuso e exploração sexual. Como constatamos
nos depoimentos colhidos entre representantes das duas redes de enfrentamento de
violência sexual infanto-juvenil, uma das grandes causas a que foram atribuídas as
ocorrências do fenômeno foi a alta vulnerabilidade sócio-econômica das vítimas e
suas famílias.
Mapa 5 - Local de residência das vítimas de abuso
sexual – 2006
Mapa 6 - Local de residência das vítimas de
exploração sexual – 2006
9
São
São Cristóvão
Cristóvão
9
BR11
6
BR11
6
São
São Jacinto
Jacinto
9
Centro
Centro
Manoel Pimenta
Pimenta
Manoel
99
Teófilo
Teófilo Rocha
Rocha
Abuso sexual - Cons. Tutelar
Exploração Sexual - Cons. Tutelar
Bairro de Origem
0
1.5
3
Quilômetros
9
9
Bairro de Origem
2 denúncias
1 denúncia
0
1.5
3
9
Casos denunciados
Quilômetros
Fonte: Conselhos Tutelares de Teófilo Otoni/CRISP-UFMG
2.4. Locais de Ocorrência do Fenômeno
De maneira geral, os entrevistados citaram a região do Vale do Mucuri
como um foco de exploração sexual. A rede de Defesa e Responsabilização se
referiu várias vezes à exploração ocorrida nas rodovias, em particular na BR 116,
postos de gasolina e restaurantes ao longo destas. Foram mencionadas localidades
como Cruzeiro, Campanário, Águas Formosas, Novo Oriente, Mucuri e Mucurizinho.
Entretanto, a exploração não acontece ao longo de toda BR, mas nos perímetros
urbanos onde há iluminação e o tráfego circula em menor velocidade. Fora desses
47
trechos, os veículos passam rápido, dificultando a visibilidade do motorista em relação
a quem está na pista:
“Você não vai ver uma prostituta aqui de madrugada, mesmo
porque o motorista nem vai vê-la... e ele não vai nem tentar parar a
carreta. Se ele for tentar parar, vai ser bem longe, a menina não vai
nem ver” (Entrevista, rede de defesa e responsabilização).
Por outro lado, a rede de atendimento e uma das instituições da rede
de defesa fizeram menção aos bairros e regiões de Teófilo Otoni onde, de acordo
com elas, ocorre exploração sexual. Foram citadas as regiões das favelas
(Pindorama, Boiadeiros), bairro São Jacinto, Palmeiras e Eucaliptos. Neste último, de
acordo com os entrevistados, ocorre por causa do tráfico de drogas. As regiões onde
se concentra a população mais carente da cidade foram citadas também como local
de concentração de casos de exploração sexual. Os bairros Pindorama e Boiadeiros
foram
mencionados
como
bairros
de
procedência
de
meninas
exploradas
sexualmente.
Em relação ao abuso sexual, houve poucas identificações dos locais de
ocorrência. Alguns afirmaram que esse fenômeno ocorre em todos os bairros da
cidade e, por ser um fenômeno concentrado no “contexto doméstico”, muitas vezes
não é denunciado por medo de novas agressões. Entretanto, outros citaram a zona
rural e bairros carentes da cidade como regiões de maior número de ocorrências do
abuso sexual.
O trabalho de campo na cidade de Teófilo Otoni permitiu que se
mapeassem os locais onde havia, de acordo com informantes locais (da rede), a
incidência de exploração infantil na cidade. Com a utilização do aparelho GPS, foi
possível captar as coordenadas espaciais destes pontos o que permitiu, em seguida,
georeferenciá-los.
Como se pode observar a partir do mapa a seguir, em Teófilo Otoni
existem, basicamente, duas regiões onde a exploração sexual se concentra, uma na
região Central da cidade e outra nas proximidades do cruzamento da BR-116 com a
MG-217.
48
Mapa 7 - Locais dos pontos de Exploração Sexual
Joaquim
Joaquim
Pedrosa
Pedrosa
Centro
Centro
Jardim Serra
Jardim
Serra Verde
Verde
Novo
Novo
Horizonte
Horizonte
Ipiranga
Ipiranga
Filadélfia
Filadélfia
Índice de Vulnerabilidade Social
Teófilo Otoni - 2000
0
1.5
3
Quilômetros
Taquara
Taquara
Nenhuma vulnerabilidade
Vulnerabilidade muito baixa
Baixa Vulnerabilidade
Vulnerabilidade média
Vulnerabilidade alta
Vulnerabilidade muito alta
(24)
(21)
(25)
(2)
(21)
(3)
Fonte: IBGE / Crisp – Tabulação própria
A região Central da cidade foi apontada como local de concentração de
exploração sexual. Identificou-se particularmente, de acordo com informações, uma
grande concentração de exploração sexual ao longo da rua Francisco Sá, avenida
Alfredo Sá, Praça da CEMIG (região conhecida historicamente como ponto boêmio e
de prostituição da cidade), Praça Tiradentes (e imediações), em alguns bares,
lanchonetes (algumas com casas ao fundo cujos quartos são alugados para fins de
prostituição). Além desses locais, também foram apontados becos próximos ou que
tangenciam a rua Francisco Sá.
Outro local onde se identificou a concentração da ocorrência de exploração
sexual foi no cruzamento das rodovias BR-116 e MG-217. Este também é um local
relativamente de baixa vulnerabilidade social, mas que tem como fator de risco para a
ocorrência do fenômeno o entroncamento das rodovias estadual e federal. Além
desses, foram apontadas feiras ao longo da BR-418. Nos arredores da mesma, há
muitos pontos comerciais, em especial supermercados e postos de gasolina, nenhum
de pernoite de caminhoneiros.
A praça próxima ao Batalhão da PMMG e da BR-418 também foi indicada
como local onde as “meninas fazem ponto”. Nos arredores, alguns poucos comércios
49
e, sobretudo residências. A ponte Nanuque, situada nesta BR, é também um local em
evidência.
Os mapas a seguir mostram, em detalhes, os pontos geocodificados de
exploração sexual na região central de Teófilo Otoni e ao longo da BR-418.
Importante destacarmos que, durante o campo, pudemos observar quatro meninas
“subindo na boléia de um caminhão” nesta rodovia. Neste dia, também, um pouco
mais tarde, por volta da 1 hora da madrugada, uma adolescente de 15 anos, grávida,
foi apreendida pela Polícia Militar em um bar da região central portando crack e
“fazendo ponto”. Notamos, ao sobrepor os pontos ao índice de vulnerabilidade social,
que os mesmos se concentram nas regiões de baixa vulnerabilidade. Entretanto,
como informado pelos entrevistados, os adolescentes vitimados são oriundos das
áreas de alta vulnerabilidade social.
BR 116
AL
ALF
ALF
ALFRE
RE
REDO
FRE
DO SA
SA
Mapa 8 - Exploração sexual na região central de Teófilo Otoni
SA
CO
CO
O
O SA
NCIS
NCIS
CISC
CISC
FRA
FRA
FRAN
FRAN
A
AIUVA
BOCAIUV
TINO BOC
QUIN
QUINTINO
Índice de Vulnerabilidade Social
Teófilo Otoni - 2000
Nenhuma vulnerabilidade
Vulnerabilidade muito baixa
Baixa Vulnerabilidade
Vulnerabilidade média
Vulnerabilidade alta
Vulnerabilidade muito alta
(24)
(21)
(25)
(2)
(21)
(3)
Fonte: IBGE / Crisp – Tabulação própria
50
Mapa 9 - Exploração sexual ao longo da BR 418
NII
ON
OTTO
IO O
NIO
ON
IDO
SSID
18
BR
BR 4418
3342
MGT
M
Índic e de Vulnerabilidade Social
Teófilo O toni - 2000
Nenhum a vulnerabilidade
V ulnerabilidade m uito baix a
B aix a V ulnerabilidade
V ulnerabilidade m édia
V ulnerabilidade alta
V ulnerabilidade m uito alta
(24)
(21)
(25)
(2)
(21)
(3)
Fonte: IBGE / Crisp – Tabulação própria
Uma das atividades de campo consistiu em uma viagem ao longo da BR116 junto com a Polícia Rodoviária Federal, saindo do posto em Teófilo Otoni e
chegando a Itaobim. Os inspetores nos indicaram muitos postos de gasolina, hotéis e
restaurantes que funcionam como “ponto de encontro” entre as prostitutas e os
viajantes, em sua maioria, caminhoneiros. Segundo os inspetores, várias blitz foram
realizadas no intuito de apreender adolescentes em situação de exploração sexual.
Entretanto, são raras as oportunidades em que conseguem efetuar a apreensão, ou
porque “elas fogem” ou porque “apresentam identidade falsa”. Outro empecilho referese ao fato de as cabines dos caminhões serem consideradas domicílios implicando a
exigência de mandado de busca e apreensão para se averiguar a suspeita. Segundo
os agentes, ainda, a exploração é maior durante as quartas e quintas-feiras quando
os caminhoneiros passam por aí, após fazer o carregamento, principalmente em Belo
Horizonte e Salvador, nas segundas e terças-feiras.
51
Mapa 10 – Regionalização da exploração sexual no trecho da BR-166 entre Teófilo
Otoni e Itaobim
M
M
GG
TT
3344
22
C
C a ra
raí
C aatu
tu ji
ji
G 21
MG
M
2 1 11
6
BR 111
T
T eeó filo
filo O
O to
ton
n ii
Fonte: IBGE / Crisp – Tabulação própria
2.5. Visibilidade do fenômeno no município
Quanto à visibilidade do problema, de acordo com os entrevistados da
rede de atendimento, podemos observar que o fenômeno é “conhecido”, mas não é
“visto”. Muitos afirmaram saber da alta incidência de violência sexual de crianças e
adolescentes na região. Entretanto, percebem que os casos não são denunciados:
“...eu tenho acompanhado o trabalho do Sentinela, e o Sentinela ele
ainda tem que se investir muito nesse programa para que ele
realmente cumpra com essa função, engraçado eles não tem
recebido muitas denúncias, isso é uma coisa que, que causa uma
dúvida, um impacto muito grande, como assim que Teófilo Otoni é
um dos maiores índices (de violência sexual) do estado e os casos
não tão chegando!”(entrevista, rede de atendimento).
Foi chamada a atenção para a necessidade de se divulgar, dar visibilidade
à questão para que mais recursos possam ser empregados no enfrentamento da
violência sexual de crianças e adolescentes. De acordo com os relatos, a menor verba
do município é destinada a essa causa.
Entre aqueles da rede de defesa/ responsabilização, observa-se que
nos conselhos tutelares, o fenômeno é menos visível que nas outras instituições
52
ligadas a essa rede, apesar dos entrevistados saberem que existe. Acredita-se que o
número de denúncias para o conselho é sub-registrado, talvez pelo fato das
denúncias chegarem diretamente no Ministério Público e nas delegacias. Nesses
órgãos, o fenômeno da violência sexual é muito mais percebido, de acordo com os
relatos. Muitos entrevistados atribuem às campanhas de sensibilização da população
realizadas recentemente o aumento dos números de denúncias de abuso e
exploração sexual. Foi ressaltada a importância de se chamar atenção da
comunidade para o problema bem como o dever de denunciá-lo caso seja detectado.
Houve consenso quanto ao aumento da visibilidade do problema dentro da
comunidade e isso pode ser atribuído também às reportagens realizadas na região
abordando a questão da violência sexual contra menores e veiculadas por televisão e
rádio.
2.6. Perfil dos agressores: relação social existente entre
estes e as vítimas
Os agressores de abuso sexual foram mais mencionados pela rede de
atendimento que aqueles de exploração. Foi unânime a referência a abusadores
entre os familiares tais como os pais, padrastos, tios, avós, primos e pessoas
próximas como vizinhos. Alguns relatos mostraram que existem meninas que são
abusadas por mais de um membro da família. Dentro de tal estrutura pouco
convencional, a criança acaba considerando o abuso como algo normal, de acordo
com entrevistas:
“Um suposto avô morava com a avó dela. E, ele abusou dela,
entendeu? No entanto, no futuro, ela achou que aquilo era normal. E,
aí, ela já tava dormindo com um primo dela, e, tava tendo relações
com esse primo também. Porque na cabecinha dela, ela hoje tá com
11anos, a cabeça dela, era certo aquilo ali”. (Entrevista, rede de
atendimento).
Em relação aos casos de exploração, os agressores foram identificados
como pessoas de fora da cidade. Entre a rede de defesa/ responsabilização, os
entrevistados destacaram enfaticamente que os agressores de abuso sexual são
pessoas, em geral, próximas à vitima, familiares como pais, padrastos, irmãos, tios,
primos e vizinhos e, em geral, são pessoas acima de 25 anos de idade. O perfil do
explorador é menos definido. Alguns apontaram pessoas ligadas ao tráfico de drogas
como os principais exploradores, mas essa opinião não foi consenso nos relatos.
53
Nos casos de abuso sexual, registrados em 2006 nos Conselhos Tutelares
(nove casos), dos agressores identificados (seis), todos são do sexo masculino,
quatro deles eram parentes da vítima (três padrastos e um tio) e dois eram vizinhos.
Ou seja, todos os que foram identificados tinham parentesco ou eram conhecidos da
vítima. Em uma das ocorrências o agressor foi preso e em duas delas foi constatada a
utilização de substância entorpecente. Em oito dos casos houve apenas um agressor.
Em todos os casos de exploração sexual registrados em Teófilo Otoni (3
registros), no mesmo ano, o agressor era adulto e do sexo masculino. Nos três casos
havia mais de um agressor. Não há informações sobre idade e profissão dos mesmos.
Também não há registros sobre se esses fizeram uso de substância entorpecente e
em dois dos casos não se sabe se o agressor foi preso ou não.
2.7. Empecilhos ou dificuldades do oferecimento
denúncias/queixas por parte da sociedade
de
Sobre as denúncias de abuso e exploração sexual de crianças e
adolescentes, um dos grandes empecilhos apontados pelos entrevistados da rede
de atendimento foi o fator econômico, principalmente nos casos de abuso. Muitos
entrevistados consideram que familiares, principalmente as mães, não denunciam o
agressor por não ter condições financeiras de manter sozinhas a família
permanecendo assim, coniventes com a situação. Outros fatores também foram
apontados como empecilhos para as denúncias como medo de perder o amásio ou de
represálias e ameaças de morte. A exposição da criança diante da sociedade
relacionando-a a um problema tão grave também foi apontada como um fator que
reprime as denúncias de abuso e exploração sexual
Para os entrevistados da rede de defesa/responsabilização, as
dificuldades nas denúncias de abuso sexual estão relacionadas a fatores como
medo de represálias por parte do agressor, vergonha da opinião da comunidade por
vincular a imagem da família ao problema da exploração e abuso sexual e também à
questão financeira. De acordo com os relatos da rede de defesa e responsabilização,
muitas pessoas da família da vitima permanecem omissas, muito comumente as
mães, pelo fato de o agressor ser, em grade parte dos casos, o próprio pai ou
padrasto e responsável pela manutenção da casa. O fato de ser um problema
circunscrito ao âmbito doméstico também dificulta a visibilidade e, conseqüentemente,
as denúncias dos casos de abuso sexual. Segundo os entrevistados, em muitos casos
as denúncias ocorrem por parte de vizinhos que detectam o problema e resolvem
54
denunciar. Muitos, entretanto, são reprimidos pelo medo de sofrer algum tipo da
ameaça por parte do agressor:
“A princípio chega a informação, mas aí você vai lá apurar, pede por
exemplo.... vamos pedir uma instauração de uma sindicância, um
comissário vai visitar aquele lugar, vai conversar com as pessoas ali
em volta, vai tentar apurar o que ta acontecendo, mas as pessoas são
muito boas pra denúncias anônimas né? Na hora que tem falar
mesmo né, na frente de alguém que tem que assinar, não assina
entendeu? Tem medo sabe? Então, acaba que é difícil...” (entrevista,
rede de defesa e responsabilização).
Instituições como escolas foram identificadas como muito importantes no
processo de denúncia, pois muitas vítimas recorrem às professoras e diretoras da
escola em que estudam e estas as encaminham para o Conselho Tutelar. Sendo
assim, essa mediação realizada entre a escola foi apontada como fundamental para a
efetivação da denúncia. Na exploração sexual, o motivo que foi mais apontado como
empecilho para as denúncias foi o fator econômico. A maior parte dos entrevistados
afirmou que as próprias vítimas mostram-se relutantes em delatar os exploradores
devido aos ganhos financeiros da atividade em que estão envolvidas.
O medo de represálias por parte dos agressores foi apontado pelas duas
redes como um dos maiores empecilhos às denuncias de abuso e exploração
sexuais. Em relação ao abuso, foi falado também que, por se tratar de um fenômeno
na maior parte das vezes, restrito ao ambiente familiar, a pouca visibilidade da
violência impede que haja denúncia. Esta acontece, na maioria das vezes, quando
algum vizinho ou outra pessoa de fora percebe e faz a denúncia. Nas duas redes,
houve consenso quanto à conivência de familiares com o abuso por ser o agressor,
muitas vezes, quem sustenta a casa. Nos casos de exploração, a rede de defesa e
responsabilização afirmou que muitas vezes a vítima se torna um empecilho para as
denúncias, pois teme perder os ganhos de sua atividade. A rede de atendimento
mencionou a vergonha como um dos fatores que também prejudicam denúncias em
casos de abuso sexual.
Dentre os denunciantes registrados nos Conselhos Tutelares estão os
familiares, Polícia Militar, Polícia Rodoviária Federal, Delegacias, Emater, escolas,
Sentinela.
55
2.8. Empecilhos
ou
dificuldades
em
relação
ao
levantamento de provas e, principalmente, com o
testemunho infantil
A maior dificuldade apontada pela rede de atendimento em relação ao
testemunho infantil é o medo que algumas vítimas sofrem devido a ameaças por
parte dos agressores:
“...tem umas (crianças) que por ser ameaçadas elas não contam...tá?”
(Entrevista, rede de atendimento)
Em outros casos, as vítimas não têm condições de falar devido ao trauma
e à relação estabelecida com o agressor. O fenômeno do abuso sexual envolve
questões muito complexas e alguns relatos mostraram que possíveis laços afetivos
estabelecidos entre vítima e agressor podem impedir que a mesma testemunhe:
“Porque o que mais me chamou a atenção, a menina de
Campanário, ela veio pra cá com 14 anos. 14... 13 anos. Ela tinha
13. Veio grávida. Aí, a gente perguntava pra ela né, quem era o pai
da criança. Ela falava que era o namorado. No fim, quando a
gente... quando eu fui descobrir, que eu olhei, né, porque até então
não tinha olhado o relatório, era do pai dela. A mãe foi embora pro
Rio. O pai tomava conta dela. Só que ela amava esse pai. Só que
ela não amava ele como pai, ela gostava dele como homem. E, aí,
ela foi, ela chorava por causa dele. E, aí, essa criança nasceu. No
dia que essa criança nasceu, ela colocou o mesmo nome do pai,
porém em letras diferentes. Mas, era o mesmo nome. Aí, ela falava:
“o meu pai tem que conhecer o neto”. Mas ela não pensava... na
mente dela não era... não pensava em neto, ela pensava no filho. E,
ela amava esse pai de paixão. Pai não, homem, né”. (Entrevista,
rede de atendimento)
Segundo a rede de defesa e responsabilização, o testemunho infantil
nos casos de abuso e exploração sexuais deve ser tomado criteriosamente e possui
características diferentes. No caso do abuso, os entrevistados ressaltaram o
estabelecimento da confiança entre a justiça e a criança pra que a mesma relate o
fato ocorrido. O testemunho da criança, entretanto, não é tomado isoladamente.
Outros fatores são avaliados na tentativa de contextualizar a situação de abuso tais
como o depoimento do agressor, seu estilo de vida e o depoimento de outras
testemunhas também. A avaliação psicológica da criança nesses casos fornece
subsídio ao juiz para que o mesmo possa se posicionar diante do testemunho infantil:
56
“Não existe uma técnica né, não existe uma técnica, não existe
aquela maquininha da verdade né, se ela falou verdade ou falou
mentira, não existe. Mas é... vai depender muito do contexto, o juiz
não analisa só também a palavra da vítima (ênfase na palavra “da"),
ela tem valor probatório? Tem, mas ela tem que ser contextualizada,
tem que ser avaliada em conjunto com os demais elementos, né,
com o comportamento do próprio acusado, a forma de vida que
levava. E não, às vezes também é possível encaminhar essa
criança ao serviço de auxílio de psicologia pra que receba um
tratamento adequado, pra que se entreviste, e o psicólogo é um
profissional né, especializado, e ele tem condição de fornecer
subsídios ao juiz no julgamento.” (Entrevista, Rede de Defesa e
Responsabilização).
A constatação material do crime é fundamental para que possa ser
comprovada a violência. Esse processo pode ser prejudicado por causa da demora na
denúncia e no encaminhamento da vítima à rede de atendimento na qual serão
realizados os exames cabíveis:
“A dificuldade é exatamente essa, quando a denúncia não chega pra
gente a tempo, demora, a demora da denúncia né, as vezes os
vestígios já desapareceram né, a vítima que estaria machucada no
dia não ta mais, é, as vezes quando o crime acontece dentro de
casa como eu disse aí, há uma, há um temor de denunciar.”
(Entrevista, Rede de Defesa e Responsabilização).
“As dificuldades maiores é quando, é quando a denuncia não vem, o
tempo demora muito né, aí denuncia aí chega uma denúncia aqui
pra gente de que a quinze dias atrás foi visto uma menor de idade
dentro de um caminhão, a gente não tem como comprovar isso
mais, o caminhoneiro já foi embora, não tem como, então a demora
na denúncia eu acho que é uma das dificuldades.” (Entrevista, Rede
de Defesa e Responsabilização).
Nos casos de exploração, o depoimento das vítimas é ainda mais difícil,
pois muitas vezes existe uma conivência destas com o explorador. Alguns
entrevistados apontam contradições criadas pelo ECA, e relatam casos de
adolescentes que se apresentam e, cientes dos direitos a eles assegurados pelo
Estatuto, utilizam para prejudicar outrem ou livrarem-se de alguma situação em que
apresentem culpa. Afirmam que esse processo deve ser realizado com extremo
cuidado para que não se propiciem situações opostas nas quais crianças possam
manipular seus direitos para prejudicar outras pessoas.
57
Em suma, os entrevistados foram questionados sobre a questão das
dificuldades com o testemunho infantil sendo que a rede de atendimento atribui
essas dificuldades ao medo da vítima em relação a possíveis ameaças feitas pelo
agressor, trauma e em alguns casos, laços afetivos que podem ser estabelecidos
entre essas partes. A rede de defesa e responsabilização afirma que esse processo
deve ser feito com muito critério e uma das dificuldades apontadas é ter dimensão da
veracidade do que está sendo dito pela criança durante o testemunho. Para permitir
uma avaliação mais acurada são levadas em consideração outras dimensões como o
modo de vida do agressor, outros depoimentos além da avaliação psicológica da
criança feita por profissional capacitado.
58
PARTE IV – Caracterizando a Rede
“A exploração sexual comercial e os abusos sexuais respondem a múltiplos
fatores e se inscrevem num estilo de relações que, de alguma maneira,
todos participam. Nesse aspecto, a proposta de intervenção em rede implica
muito mais que a coordenação ou a articulação de diferentes recursos
familiares, comunitários e institucionais. Por um lado, implica a aceitação de
diferentes modalidades de atenção, distintas formas operativas de
abordagem e reconhecimento da diversidade de visões. Por outro lado,
requer a construção coletiva de modelos para entender a problemática,
altamente determinada por fatores ideológicos e culturais. Implica também
abrir espaços para a divisão de papéis, a negociação, partilha de recursos e
responsabilidades. As redes sociais de proteção e atenção à infância e à
adolescência e de combate à exploração sexual comercial, com a
participação de
organizações
públicas
e
privadas,
de
associações
comunitárias, de empresas, de sindicatos e outros movimentos sociais, é a
via mais eficaz para lograr uma resposta efetiva ao problema.” (Fonte:
Glossário OIT/IPEC -Programa de Prevenção e Eliminação da Exploração
Sexual Comercial de Crianças e Adolescentes na Tríplice Fronteira
Argentina/Brasil/Paraguai).
Atualmente, percebemos a importância dos “trabalhos em rede”, cujas
noções giram em torno da articulação de atores e organizações para ação conjunta
com responsabilidade compartilhada, de contatos dinâmicos e não burocráticos entre
organizações do Estado e da Sociedade. (Faleiros,1998). O conceito de redes
transformou-se nas últimas duas décadas em alternativa prática de organização,
possibilitando atuação e articulação social.
1. Rede em Teófilo Otoni
O contexto observado neste município nos permite dizer que a visibilidade
da violência sexual e também a forma como ela ocorre parecem ser distintas. Uma
das poucas instituições de atendimento que lida com crianças e adolescentes que
tiveram seus direitos violados é a Casa Ninho, que é o abrigo para onde elas são
encaminhadas quando retiradas dos lares.
Embora não haja unanimidade acerca do fato de existir ou não uma rede
constituída no município, as entrevistas, visitas e conversas informais realizadas ao
59
longo do processo de pesquisa sugerem que de fato não existe, no município, uma
rede de enfrentamento à violência sexual infanto-juvenil nos moldes da definição
adotada. Pelo contrário, o que existe é um conjunto de instituições que recebem, de
alguma forma, e em diferentes momentos, crianças e adolescentes vítimas e que dão,
de forma geralmente isolada, os encaminhamentos que lhe cabem, sem que haja
articulação e troca de informações, sobretudo seguindo um fluxo ou rotina
estabelecidos.
1.1. Percepção da rede sobre o conceito de rede
Em linhas gerais, é possível elencar alguns termos que sintetizam os
conceitos de rede apontados pelos entrevistados: integração, cooperação, atuação
conjunta voltada para um objetivo em comum; identificação conjunta de problemas e
de soluções; envolvimento de todos; escuta; diálogo; fluxo efetivo da comunicação e
de informação entre todos envolvidos.
A idéia de um conjunto de instituições conectadas pelos objetivos e
trabalhando em prol de algo comum perpassou todas as entrevistas. Também a idéia
de que cada instituição tenha seu papel, e que a rede é composta por atores de
diferentes naturezas – governamental e não governamental - fez parte das definições
apresentadas.
A comunicação entre as instituições é um outro ponto de destaque nas
definições
apresentadas.
O
trabalho
em
rede
envolve
o
atendimento,
o
encaminhamento e também o retorno com relação aos casos encaminhados – ou
seja, comunicação efetiva. Este trabalho requer que as informações sobre os casos
atendidos circulem entre as diferentes instituições envolvidas, para que os registros
possuam todo o histórico dos casos.
A comunicação prevaleceu como aspecto essencial da rede. A discussão
sobre responsabilidade compartilhada e sobre a ação ser horizontalizada foi apenas
mencionada, mas não aprofundada pelo atores.
A delimitação de qual o grupo no qual intervir surgiu em algumas
definições, embora a delimitação do grupo da intervenção não tenha sido o foco das
falas dos entrevistados. Alguns trechos de entrevistas, mencionados abaixo, ilustram
bem as definições apresentadas.
“Como se fosse um teatro, uma peça teatral, e cada qual tem sua
função. Para que funcione, para que a peça seja bem feita e tenha
60
sucesso, é necessário que haja envolvimento de todos naquilo”
(Entrevista, rede de defesa/responsabilização).
“O trabalho em rede, ele implica numa comunicação, né, uma
comunicação efetiva entre todos os serviços oferecidos na cidade.
Isso implica um trabalho de referência contra. Implica que essas
entidades tenham como se comunicar” (Entrevista, rede de
atendimento).
“Rede, se for o que eu estou entendendo, seria uma forma de
integração entre os órgãos envolvidos para que possam agir
exatamente em regime de integração, evita exatamente aquela
separação rígida, aquela coisa compartimentada, comunica pra um
que comunica pro outro que comunica pro outro, aí se deveria ser a
ação simultânea de todos os órgãos envolvidos” (Entrevista, rede de
defesa/responsabilização).
1.2. Fluxo de Funcionamento da Rede
Um dos objetivos desta pesquisa é identificar o fluxo de funcionamento da
rede de enfrentamento dos crimes de abuso e exploração sexual infanto-juvenil. Este
fluxo pode ser assim representado:
Figura 3 – Fluxo de Encaminhamento
Família/População
Instituições/ ON Gs
Denúncia
N otificação
Encaminhamen
to
Criminal
Delegacias
M inistério
Público
Vara Criminal
Conselho
Tutelar
MP
SOS–Criança
Encaminhamen
Vara da
to
Infância e
Civil
Juventude
− Abrigos provisórios
− Programas
e
Projetos
Sócio-Cultural
− Profissionalização/Esporte
e Lazer/Saúde e Educação
O utras alternatives
Fonte: CECRIA, “A Exploração Sexual Comercial de Meninos, Meninas e Adolescentes na América
Latina e Caribe- 2ª Edição Elaboração do Relatório: Maria Lúcia Pinto Leal, Brasília, Julho/1999
61
A denúncia destes casos é feita pela família, ou pela população
(ex.vizinho, denúncia anônima) ou por instituições públicas tais como escola, creche,
hospital ou postos de saúde, pela Polícia Militar, Polícia Rodoviária Federal, pelo
Centro de Referência de Assistência Social (Cras), ou não governamentais como a
Casa Ninho e a APJ – Aprendendo a Produzir Juntos – sendo a primeira totalmente
voltada para crianças e adolescentes. A notificação pode ser feita pelo Conselho
Tutelar, pelo Ministério Público ou ainda pelo Juizado da Infância e Juventude. Há
duas possibilidades de encaminhamento. Em casos de abuso e exploração sexual,
são feitos os dois tipos de encaminhamento: civil e criminal. O encaminhamento civil
(atendimento e proteção da criança e do adolescente) pode ser feito pelos Conselhos
Tutelares requisitando serviços públicos na área de assistência social (Cras –
diagnóstico da família do abusado) e na área de saúde, educação, esporte. Ou pelo
Ministério Público que atua na área civil, por exemplo, para pedir a guarda de uma
criança que precisa ser retirada da família ou ainda pelo Juizado com a atuação do
comissariado fiscalizando locais suspeitos de aliciar adolescentes, encaminhando as
crianças para lares substitutos e abrindo processo de adoção para estas. Em Teófilo
Otoni, existe a Vara da Infância e da Juventude. Isto é, com Juiz e Promotor
especializados, técnicos tais como psicológos, assistente social, dentre outros. Foi
enfatizado nas entrevistas que o encaminhamento é feito por estas instituições, no
caso de abuso e exploração sexual, ao Sentinela. A instituição, embora recente no
município, é reconhecidamente apontada por tratar destes casos. Sua atividade
principal é o monitoramento destes casos. Estes também são encaminhados a
entidades tais como a Casa Ninho ou outras que desenvolvem oficinas ocupacionais e
programas de profissionalização, tal como a APJ.
O outro encaminhamento é o criminal (identificação e incriminação do
autor) que pode seguir no fluxo com a realização de investigação na Polícia Civil,
solicitada pelo Conselho Tutelar depois de realizado o exame de conjunção carnal.
Mas não é incomum que a investigação se inicie sem ter passado pelo Conselho
Tutelar e que o caso, da Delegacia seja encaminhado para o Sentinela. Também não
é incomum que o Ministério Público Criminal inicie a ação e a denúncia dos
envolvidos no aliciamento ou no abuso a ser apreciada e julgada pelo Juiz da Vara
Criminal. Na Vara Criminal os processo de abuso e exploração (que são poucos) não
são distintos dos outros quanto ao tramitamento. Foi reconhecida a lentidão no fluxo
de responsabilização. Uma novidade que pretende ser instaurada na Vara é marcar
com tarjas estes processos para diferenciá-los de outro e, desta maneira,
proporcionar um tratamento mais ágil para estes casos. Ainda neste sentido, foi
62
sugerida uma melhor articulação entre as Promotorias Civil e Criminal com a Vara
Criminal objetivando um andamento mais rápido dos processos que envolvem
crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, principalmente.
Em relação ao atendimento em casos de abuso e exploração sexual de
crianças e adolescentes, os casos são ouvidos e mantidos em sigilo absoluto. O
procedimento de encaminhamento passa pela Delegacia, IML para ser realizado o
exame de conjuncão carnal e logo em seguida o caso é direcionado ao programa
Sentinela onde se realiza o acompanhamento.
Dentre as dificuldades no fluxo de funcionamento, no caso do
Delegacia Regional, foi apontada a dificuldade de abordar os caminhões nas
operações uma vez que a cabine é considerada domicílio e, portanto, é necessária a
presença de um juiz para dispensar a burocracia de expedição dos mandatos que
entravam as operações. Além disso, a demora e falta de denúncia são empecilhos
para apuração dos casos que se tornam assim invisíveis, fato também apontado pela
Promotoria. Outro problema: a ação penal depende necessariamente da autorização
da vítima ou seu representante legal (exceto quando o agressor é tutor ou
responsável legal por esta, ou que o fato tenha resultado em morte ou lesão grave).
Outra dificuldade apontada: como a denúncia não chega com rapidez aos
órgãos competentes, todo o processo de identificação – que inclui o exame de
conjunção carnal que deve ser imediato – apuração, encaminhamento e desfecho
ficam comprometidos.
Deve-se levar em conta, com respeito ao fluxo, que a realidade é muito
mais complexa do que a representação que conseguimos fazer dela. Tal
representação teria que ser multidimensional demonstrando, por exemplo, conforme
apareceu nas entrevistas, que não poucas vezes são efetuadas ações conjuntas entre
dois ou mais atores ou instituições, por exemplo: Conselho Tutelar e Delegacia;
Conselho Tutelar e Promotoria (acompanhando juntos procedimentos, por exemplo).
Contudo, estas ações conjuntas não se tornaram procedimento de rotina para todos
os atores da rede e aplicáveis a todos os casos. Se parte disto se deve ao fato de que
as decisões no fluxo de funcionamento são tomadas de acordo com cada caso, ainda
assim nos parece, que não prevalecem estratégias mais dinâmicas e sim um
prosseguimento mais burocrático e formal.
O não acompanhamento do caso depois de finalizada a ação da
instituição pareceu ser a regra. Também prevaleceu a comunicação via papel (a que
mais nos chama atenção é a do Conselho Tutelar com o Programa Sentinela). O
63
contato do Conselho Tutelar com o Juizado e, especialmente, com a Vara Criminal
pareceu ser extremamente insuficiente, uma indicação disto é que estes sequer foram
representados no diagrama apresentados adiante. Nestes casos, conforme apareceu
nas entrevistas, o contato com o Juiz Criminal é feito via Promotoria. A ausência desta
relação também foi apontada pelo Juiz.
2. As instituições da rede
Em linhas gerais, vamos analisar a rede de enfrentamento ao fenômeno
da violência sexual infanto-juvenil em Teófilo Otoni segundo os aspectos da
organização, da atuação e do trabalho realizado, do planejamento e metas e do
registro das informações de cada instituição. Algumas serão analisadas de forma
pormenorizada
a
fim
de
exemplificarmos
o
funcionamento
do
fluxo
de
encaminhamento e troca de informações entre as mesmas.
A. O Conselho Tutelar
A constituição de 1988 entendeu que a sociedade devia participar lado a
lado com o Estado para o atendimento e negociação de seu interesse. Esta
participação também foi enfatizada na Legislação referente à infância - o Estatuto da
Criança e do Adolescente - Eca, promulgado em 1990 que criou o Conselho Tutelar,
órgão encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança
e do adolescente (art 131). Os Conselhos Tutelares constituem, portanto, uma
inovação. Uma das maiores dificuldades enfrentadas pelos Conselhos Tutelares, em
geral, é a deficiente estrutura oferecida pelos poderes locais.
Em Teófilo Otoni, existem dois Conselhos Tutelares e são divididos em
Norte e Sul.
CONSELHO TUTELAR NORTE
A equipe técnica do Conselho Tutelar Norte conta com um assistente
social, um motorista, cinco estagiários além de uma pessoa responsável pelos
serviços gerais. Entretanto, segundo os conselheiros, há a necessidade de
profissionais de outras áreas para compor o quadro técnico da instituição tais como
psicólogos, advogados, pedagogos e apoio administrativo.
O planejamento das atividades é realizado anualmente e no decorrer
desse período são executadas de acordo com a demanda e discutidas entre os
64
conselheiros. Esse Conselho possui um automóvel de uso alternado com o Conselho
Sul em bom estado de conservação para realizar suas diligências.
O programa SIPIA foi instalado nessa agência, mas não vem sendo
utilizado regularmente. De acordo com entrevista, apenas alguns casos são
registrados nesse sistema. O motivo se deve ao fato do programa exigir informações
que muitas vezes os conselheiros não dispõem, impedindo-os de avançar no registro
dos dados, além de pouca capacitação para operá-lo. Os casos são registrados em
um caderno, com informações objetivas e sucintas, incluindo descrição da demanda
atendida e encaminhamentos realizados. Essas informações norteiam as ações do
conselho e servem para elaborar estatísticas, de acordo com entrevista.
São muitas as atribuições do Conselho Tutelar, e as que são realizadas
com maior eficiência de acordo com uma auto-avaliação são as de encaminhamento
das informações em casos que envolvam crianças e adolescentes ao Ministério
Público ou outras agências competentes. As áreas que mais apóiam o Conselho
Tutelar Norte, em casos de solicitação, são as áreas de assistência social, psicológica
e jurídica e às vezes obtém apoio médico e administrativo.
O Conselho Tutelar mantém contato com a maior parte das agências que
compõe a rede trocando informações via papel e realiza ações conjuntas com outras
entidades da rede de defesa e responsabilização, exceto a Polícia Rodoviária
Estadual.
Existem algumas dificuldades no trabalho dessa instituição, apontada
pelos entrevistados. Falta infra-estrutura adequada aos atendimentos e o excesso de
demanda faz com que o Conselho restrinja seu trabalho ao atendimento das vítimas,
não tendo disponibilidade para se dedicar a outras tarefas.
Em relação aos fatores que podem servir para o aprimoramento do
Conselho Tutelar Norte foi apontado como muito necessário um programa de
capacitação dos conselheiros para lidar com o problema de abuso e exploração
sexual de crianças e adolescentes de acordo com o Eca, além de estreitamento de
relações entre o Conselho, o CMDCA e órgãos do executivo em áreas como
educação, saúde, habitação, etc.
65
Figura 4- Fluxograma Do Conselho Tutelar Norte
APE
B/RT
M inistério
Público
Instituição A PJ
M/RQ
M A/RD
Secretaria de Ação
Social
Programa
Sentinela
A/RD
M /RQ
C onselho
Tutelar N orte
Instituição
Doctum.
Abrigo O Ninho
M A/RD
M/RD
C.I.A.
Programa Peti
B/SP
A/SP
Polícia Civil
Polícia M ilitar
A/RM
A/RM
Legenda
Rotina Operacional
RD
RS
RQ
RM
RT
RST
SP
Rotina Diária
Rotina Semanal
Rotina Quinzenal
Rotina mensal
Rotina Trimestral
Rotina Semestral
Sem Periodicidade
Nível de Interação
MB
B
M
A
MA
Muito Baixa
Baixa
Média
Alta
Muito Alta
CONSELHO TUTELAR SUL
A equipe técnica do Conselho Tutelar Sul é bastante insuficiente contando
apenas com um assistente social e um motorista. De acordo com o próprio Conselho,
seria necessário um quadro técnico muito superior a esse, contando com profissionais
como advogados, psicólogos, pedagogos, secretárias e pelo menos dois estagiários
para suprir a demanda da instituição. As atividades realizadas são planejadas
semanalmente e discutidas entre os conselheiros e com o promotor de justiça.
Este Conselho avalia como alta ou medianamente eficientes atividades
como atendimento a crianças e adolescentes que tiveram seus direitos violados bem
como o atendimento a suas famílias. São também eficientes os encaminhamentos de
casos de infração dos direitos infanto-juvenis ao Ministério Público, às autoridades
judiciárias em casos de sua competência, promoção e execução de decisões
requisitando serviços públicos em áreas de educação, saúde, serviço social,
previdência, trabalho e segurança. O Conselho fiscaliza ainda as entidades de
atendimento governamental e não-governamental aplicando medidas de advertência
quando cabíveis.
66
O Conselho Sul também conta com o programa SIPIA, mas este não é
utilizado, pois falta cadastramento de algumas entidades e internet para realização de
pesquisas e envio de dados. Assim, as informações são registradas manualmente, tal
como o procedimento adotado no Conselho Norte.
Ao Conselho Sul sempre são encaminhadas denúncias de violação de
direitos de crianças e adolescentes e algumas vezes casos de abuso e exploração
sexual bem como solicitações de atendimento. O Ministério Público foi apontado como
a entidade que mais atende as solicitações feitas pelo Conselho Sul e algumas vezes
são atendidos pelo serviço de saúde, psicológico e de assistência social.
A entidade mantém troca de informações via papel com a maior parte das
outras agências ligadas à rede de enfrentamento de violência sexual infanto-juvenil.
Os casos são encaminhados para serviços da rede de atendimento e outros órgãos
da rede de defesa e responsabilização e a elaboração de ações se faz em conjunto
com as outras instituições dessa rede, escolas e outras entidades da sociedade civil.
Este Conselho fiscaliza entidades e programas voltados para o
enfretamento da violência sexual infanto-juvenil e compartilha suas informações com
o Ministério Público e Poder Judiciário.
Tal como o Conselho Tutelar Norte, o Sul acredita que existem programas
direcionados à questão da violência sexual de crianças e adolescentes em quantidade
e qualidade adequados no município. As maiores dificuldades enfrentadas estão
relacionadas à falta de entidades que possam acolher crianças vitimas de violência
sexual, bem como atender suas famílias. O excesso de demanda diante de uma
equipe técnica tão pequena também tem dificultado as ações do Conselho Tutelar
Sul. Outra dificuldade apontada é o difícil relacionamento entre a instituição e
Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA).
Figura 5 – Fluxograma do Conselho Tutelar Sul
67
Programa
Sentinela
Conselho
Municipal
Creche
M/SP
A/SP
SP/M
Secretaria de Ação
Social
Promotoria
MA/RD
MA/SP
Conselho Tutelar
Sul
APJ
Escola
SP/M
MA/SP
Polícia Militar
Cras
M/SP
MB/SP
Polícia Civil
M/SP
Legenda
Rotina Operacional
RD
RS
RQ
RM
RT
RST
SP
Rotina Diária
Rotina Semanal
Rotina Quinzenal
Rotina mensal
Rotina Trimestral
Rotina Semestral
Sem Periodicidade
Nível de Interação
MB
B
M
A
MA
Muito Baixa
Baixa
Média
Alta
Muito Alta
De acordo com entrevistas, o Conselho não realiza um trabalho específico
voltado para crianças vítimas de violência sexual, apesar de realizarem atividades
como teatros e palestras em escolas para esclarecer para a população seu papel.
Grande parte das denúncias desse tipo de crime chega por telefone ou
mesmo por parte dos responsáveis. Nesses casos, a denúncia chega e a criança é
encaminhada para o programa Sentinela. O registro dos casos é feito numa
ficha/prontuário, com a queixa principal padronizada que contém denúncia, queixa
principal, denunciante e histórico (onde há o relato do fato ocorrido). Alguns casos são
encaminhados à Delegacia onde as vítimas são encaminhadas para exame de
conjunção carnal.
As instituições que encaminham casos para o Conselho Tutelar, em
Teófilo Otoni, são a APJ, escolas estaduais e municipais, creches e a Polícia Militar.
A medida tomada pelo Conselho Tutelar ao agressor de violência sexual
pode ser uma advertência verbal ou oficial seguida de um termo de responsabilidade.
Em casos mais sérios, existe um termo de declaração, como nos casos de violência
sexual.
68
O acompanhamento dos casos vai depender de sua gravidade e evolução.
Quando as vítimas são muito novas, estas costumam ser acompanhadas até a
adolescência.
Os conselheiros atendem regiões onde não moram por medida de
segurança e privacidade. Ao receberem as denúncias, realizam visitas domiciliares
durante as quais são ouvidas as crianças e as famílias. Em alguns casos, existe a
necessidade de encaminhamento das mesmas a instituições como a “Casa Ninho”,
“Agente Jovem” ou mesmo para acompanhamento psicológico ou assistencial. Outros
casos são encaminhados para a Promotoria.
Dentre as funções do Conselho Tutelar está ajudar os pais nas atribuições
de seu papel como, por exemplo, a importância da atenção na criação dos filhos.
Após o atendimento e encaminhamento, a criança e a família são
acompanhadas através de monitoramento do progresso do caso e se o problema que
deu origem à queixa não está acontecendo de novo. Alguns casos são encaminhados
para o CRAS/ Casa das Famílias. O tempo e freqüência de acompanhamento variam
de caso a caso. Os casos que são encaminhados para a Promotoria não são
acompanhados.
As ações do Conselho são norteadas pela demanda e urgência dos casos
que aparecem. Quando não há medidas de urgência para serem tomadas, os
conselheiros realizam, então, visitas em dias alternados, uma vez que existe um carro
que é dividido para os Conselhos Norte e Sul.
O ECA é visto como “uma certa estrutura para a criança, a vítima” que tem
seus direitos violados ou é agredida de alguma maneira. Entretanto, a estrutura para
encaminhamento dessas crianças não é suficiente para atender os casos e que
somente existirem leis não é o suficiente.
O trabalho do Conselho Tutelar ficou parado durante um tempo devido à
falta de recursos (falta de gasolina, telefone). Tempos depois, esses recursos foram
supridos pela prefeitura.
B. Centro de Referência de Assistência Social (CRAS)/
CASA DAS FAMÍLIAS
O CRAS/ Casa das famílias é uma entidade cujo atendimento envolve
toda a família, trabalhando com o público de forma sistêmica. Os casos de violência
sexual em geral chegam ao CRAS encaminhados por escolas, creches, postos de
saúde, Conselho Tutelar, Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE),
69
Aprendendo a Produzir Juntos (APJ) ou através de buscas ativas nas quais o pessoal
do CRAS realiza visitas às famílias. Uma vez identificados os casos, fazem visitas
domiciliares, elaboram um relatório psicossocial da família (relatório padronizado que
aborda questões sobre habitação, escolaridade, etc) que também fornece subsídio
aos técnicos no desenvolvimento para ações intervenientes. Tanto os familiares
quanto a vítima são chamados para entrevista com os técnicos do CRAS, a partir da
qual é desenvolvido um “Programa de Desenvolvimento Familiar” (PDF) quando são
elaboradas pelos psicólogos e assistentes sociais estratégias de intervenção junto à
família (econômicas, sociais e psicológicas). Os técnicos encaminham o caso para o
“Sentinela”, juntamente com um relatório. Os casos são avaliados um a um para
definir estratégias de ação tanto do CRAS quanto do “Sentinela”. Essa primeira
agência trabalha mais no âmbito familiar. O desligamento da instituição é realizado
somente após melhoria das condições de convivência da família.
No CRAS, são desenvolvidos projetos direcionados a pessoas de todas as
faixas etárias. Para o público infantil, especificamente, foram criados dois projetos
com abordagem lúdica, brincadeiras, resgatando a questão do afeto familiar e uma
brinquedoteca. Muitos dos projetos do CRAS são desenvolvidos de acordo com a
demanda regional. No caso da região de Teófilo Otoni, uma das maiores demandas é
acerca do problema das drogas. Neste sentido, a instituição buscou desenvolver
projeto de resgate da identidade dos jovens mostrando outros objetivos diferentes do
uso de drogas. No território sul, a grande demanda é em relação à gravidez na
adolescência e para o enfrentamento do problema foram desenvolvidos projetos em
parceria com os Postos de Saúde Familiar (PSF).
Por esse motivo, foram
apresentadas anteriormente informações sobre registros de gravidez na adolescência
e drogaditos no município. Assim como a exploração sexual infanto-juvenil, esses são
problemas que demandam soluções em Teófilo Otoni e, de acordo com as
entrevistas, estão contando com maior visibilidade. Tomando como exemplo o CRAS,
que desenvolve suas ações de acordo com as demandas de cada região, podemos
pensar que a pouca visibilidade da exploração e abuso sexual infanto-juvenil em
Teófilo Otoni prejudica diretamente suas vítimas, que já são carentes de instituições
de acolhimento e políticas voltadas a seu atendimento, dificultando o desenvolvimento
de iniciativas para seu enfrentamento.
De acordo com as entrevistas do CRAS, a instituição chave para o
enfrentamento do problema da violência sexual infanto-juvenil é o Conselho Tutelar e
esta é a instituição que mais encaminha casos para a Casa das Famílias. Esse
70
encaminhamento se faz ora por telefone, ora pessoalmente. Outra estratégia utilizada
pelo CRAS é a realização de visitas nas escolas para falar sobre o ECA.
O CRAS também recebe denúncias de casos de violência sexual infantojuvenil e encaminha para os órgãos de direito podendo acompanhá-lo paralelamente,
caso seja necessário. Em casos de menores infratores, os casos são encaminhados
para a Promotoria. O planejamento de suas ações é realizado em conjunto por toda a
equipe técnica.
C. CASA NINHO
A Casa Ninho integra a rede de atendimento de crianças vítimas de
violência sexual e outras negligências, sendo a mais importante instituição de
atendimento ao problema no município. Em Teófilo Otoni, conta com um quadro de 42
funcionários e três voluntários e recebem crianças do município e região. Os
candidatos a voluntários passam por uma avaliação dos coordenadores do programa
no intuito de identificar se aqueles satisfazem ao perfil para trabalhar na instituição. A
“Casa Ninho” possui convênio com a educação e ação social. Recebe alimentos, além
de doações de pessoas físicas e jurídicas. De acordo com os entrevistados, a ajuda
não supre todas as necessidades, mas ajuda a manter a instituição. Essa “casa” é
dividida em “casa dos meninos” (que atende 30 crianças) e “casa das meninas” (com
um total de 47 crianças).
Os casos que chegam à instituição são registrados (separados por ano e
nome da vítima) em um livro específico, o “livro de registros”, e a freqüência das
crianças na casa é controlada. Depois é elaborado um relatório que é encaminhado
para o Fórum onde será aberto processo. As informações são armazenadas em
arquivo e computador.
O maior público da “Casa Ninho” é de crianças em situação de risco.
Aquelas vítimas de violência sexual não são muito numerosas. A instituição acolhe as
crianças, que continuam sendo acompanhadas ao sair da mesma, mas não existe
acompanhamento familiar. Da mesma forma, não realizam trabalho com o agressor. A
“Casa” trabalha de acordo com o ECA, um desafio, portanto.
Um dos maiores desafios para a “Casa Ninho” atualmente tem sido a
insuficiente dotação orçamentária da instituição. Os recursos que existem são
aplicados na manutenção da entidade (pagamento de funcionários, encargos, etc),
mas ainda não contempla todas as despesas. Além disso, a instituição não tem
divulgação do seu trabalho.
71
Figura 6 – Fluxograma da Casa Ninho
Conselho
Tutelar
M
Prefeitura
Faculdades
M
Casa
Ninho
Promotoria da
Infância e Juventude
APJ
M
MA
Vara Criminal
Legenda
Rotina Operacional
RD
RS
RQ
RM
RT
RST
SP
Rotina Diária
Rotina Semanal
Rotina Quinzenal
Rotina mensal
Rotina Trimestral
Rotina Semestral
Sem Periodicidade
Nível de Interação
MB
B
M
A
MA
Muito Baixa
Baixa
Média
Alta
Muito Alta
D. POLÍCIA CIVIL
A delegacia de Teófilo Otoni atende em regime de plantão onde fica um
policial, estrutura de plantão, um delegado, um escrivão, perito e uma equipe de
agentes 24 horas na delegacia. No total, a delegacia conta com o efetivo de 9
delegados, 8 escrivães, 5 peritos criminais, 1 auxiliar de necropsia, 1 médico legista e
30 agentes. Especificamente na área da infância e da juventude são 3 agentes, 1
delegado e 1 escrivão.
O atendimento se processa da seguinte maneira: ao receber o boletim de
ocorrência é dada seqüência na apuração de casos em territórios comuns e apuram
ocorrências praticadas por menores ou contra menores, que são apurados pelo
delegado de menores. Em caso de violência sexual cuja vítima é do sexo feminino, os
mesmos são encaminhados para a delegacia da mulher por determinação do
secretário de segurança. De acordo com essa determinação, todos os crimes
cometidos contra mulheres, contra os costumes são encaminhados a essa delegacia.
Em casos de violência nos quais a vítima é do sexo masculino, esses são apurados
72
pelo delegado da comarca. Para todos os casos de violência sexual infanto-juvenil é
solicitado ao Conselho Tutelar encaminhamento das vítimas para instituições de
atendimento.
Quando existem denúncias vagas de crimes, é designada uma equipe de
agentes para comparecer ao local e apurar/recolher informações, nome das pessoas
envolvidas para dar início à investigação. Havendo abordagem de uma vítima, ela é
ouvida, encaminhada a exame para dar base à instauração de inquérito quando for o
caso e, a partir de então o inquérito é concluído.
Os casos chegam através de boletim de ocorrência ou telefone. O boletim
passa a compor parte do inquérito e encaminhado para a justiça e cadastrado no
sistema. A delegacia envia os dados para a superintendência geral na capital, que
alimenta o INFOSEG (trata-se de um sistema de informação de segurança atualizado
pelo Ministério da Justiça), através de relatórios mensais. As ações não são
planejadas com base nesses relatórios.
E. VARA CRIMINAL
Em Teófilo Otoni são 3 varas no total e uma delas é direcionada à
execução de penas. De acordo com entrevistado, a vara possui uma estrutura de
atendimento razoável no que diz respeito a equipamentos. Entretanto, uma das
reclamações foi a falta de espaço para a realização de entrevistas com os acusados
quando do interrogatório com acompanhamento do advogado. Sobretudo em casos
de réu preso.
A Vara funciona em regime de plantão da comarca onde é estabelecida
uma micro-região por resolução do tribunal de justiça e a cada fim de semana ou
feriado, um juiz permanece de plantão de medidas urgentes e hábeas corpus, além
também de um promotor, um escrivão e um oficial de justiça. De acordo com
entrevistado, esse procedimento é amplamente divulgado.
No caso do cartório criminal, este funciona com um escrivão e quatro
servidores, todos efetivos. No entanto esse número não é suficiente sendo
necessários, no mínimo, mais três servidores para atender a demanda de 3500
processos. O espaço do cartório também é insuficiente para o funcionamento da
instituição. Fica a cargo da vara criminal a guarda de armas de fogo e objetos
apreendidos e não existe uma estrutura adequada para isso.
73
De acordo com o juiz criminal de Teófilo Otoni as condenações chegam à
cerca de 90% dos casos, esse percentual também para os casos de violência sexual
infanto-juvenil.
O registro das informações na vara é informatizado. Essas são inseridas
de acordo com a fase em que o processo se encontra. O sistema de armazenamento
de informações é interligado e disponível em internet. A pesquisa pode ser feita pelo
nome da parte do processo ou número. Além disso, as pautas referentes à audiência
são publicadas no átrio do fórum. São produzidos relatórios mensais que servem para
o acompanhamento do juiz e da secretaria e norteiam as ações futuras da vara
criminal. Os relatórios não são encaminhados à corregedoria porque esta já possui
acesso ao sistema de informação da vara. Nos cerca de 22 dias úteis do mês, a Vara
deve realizar 52 sentenças, que é a meta estabelecida, além de despachos e
audiências.
F. POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL
A polícia rodoviária federal é dividida por funções comissionadas dentro do
cargo de policial rodoviário federal. As funções podem se dividir em agentes, agentes
especiais e inspetor. Existe a direção geral, seguida pela superintendência de cada
estado e então, cada estado é dividido em delegacias, que abrangem várias cidades.
O superintendente é escolhido pelo diretor da policia rodoviária e o diretor pelo
ministro. O superintendente escolhe quem vai chefiar cada delegacia e o núcleo de
policiamento.
Em geral, a polícia Rodoviária Federal não colhe depoimentos em casos
de violência sexual. Essa tarefa fica a cargo da polícia civil. O procedimento dos
policiais rodoviários, em geral é colher algumas informações tais como local de
moradia, motivo pelo qual a pessoa se encontra naquele local, se conhece o agressor
ou não (em casos de exploração sexual) etc. Em seguida, vítima e agressor são
encaminhados para a delegacia de polícia civil e lá prestam depoimento. A
confirmação de prática de manutenção de casa de prostituição é difícil de ser
confirmada, de acordo com o policial rodoviário. Em casos de abordagem de menores
em carros e caminhões em situação de exploração, os policiais podem convidar a
menor a descer do veículo, mas não podem obrigá-la a fazê-lo. Mesmo assim, a praxe
é de que a ocorrência seja encaminhada para a polícia e aberto um inquérito que é
encaminhado para o promotor de justiça.
74
G. MINISTÉRIO PÚBLICO
O Tribunal de Justiça de Teófilo Otoni cede algumas salas para o
Ministério Público. Entretanto a construção de sede própria está em andamento onde
haverá uma promotoria especializada em casos da infância. Essa nova sede
contemplará todo o Vale do Mucuri e Vale do Jequitinhonha. As promotorias são
divididas em 5. A da infância e juventude conta com uma pequena sala que acomoda
a promotora, dois estagiários, um técnico e mais um oficial. Esse espaço é insuficiente
para acomodar a promotoria e atender ao seu público. O trabalho em dias de plantão
pode ser realizado via fax e atende a demandas urgentes.
Em casos de violência sexual infanto-juvenil o Conselho Tutelar recebe a
denúncia, verifica em loco a situação e envia relatório ao Ministério Público onde será
iniciado o pedido de providência. As investigações em loco podem ser realizadas
também pela polícia militar e comissariado de menores. A promotoria compartilha
informações com diversas outras agências como o Conselho Tutelar, Conselho
Municipal e com o poder judiciário. O Ministério Público não alimenta o Sistema
Integrado de Comarcas Informatizadas (SISCOM), pois essa tarefa é realizada pela
vara da infância e da adolescência. Então, essa agência não possui informações
registradas para nortear suas ações futuras. A atuação do MP começa, em geral, com
uma fiscalização inicial depois é solicitado um estudo social, através de visita de uma
assistente social que, além de observar, procura identificar fatores que podem ser
melhorados na estrutura familiar. Os menores são encaminhados para a psicóloga,
feita avaliação e identificada a necessidade de encaminhamento. Em casos graves de
violência sexual, as crianças são encaminhadas a abrigos até que um parente tenha
condições de abrigá-la ou até que o agressor seja preso. A entrevistada reconhece
que os casos que passam pela promotoria não são acompanhados como deveriam
(por exemplo, não sabem se houve realmente instauração de inquérito) e afirma que
fazer esse acompanhamento é uma das metas que buscará atingir em seu trabalho.
2.1. Percepção Sobre o Trabalho Realizado das Instituições
Componentes da Rede em Teófilo Otoni
A maioria das entrevistas apresentou uma visão muito positiva do trabalho
realizado pela rede em Teófilo Otoni, uma vez que os entrevistados acreditam que a
existência de suas instituições surte um efeito benéfico para a sociedade como um
todo, cada uma com seu papel.
Assim, enquanto uma ajuda os pais a melhor educar seus filhos
aprendendo especialmente a impor limites, outra abriga crianças em situações de
75
vulnerabilidade familiar dando a elas melhores oportunidades do que se elas
continuassem em casa, pois a instituição dispõe mais recursos. Assim também, há
algumas que acreditam estar contribuindo para melhoria do planejamento familiar,
enquanto outra afirma que a capacidade de percepção do fenômeno da violência
sexual aumentou muito de cinco anos pra cá, sendo que hoje o trabalho da instituição
é coibir a inserção de menores na prostituição. Isso nos permite falar em
complementação das ações desenvolvidas em um sistema interdependente, apesar
de ainda não muito articulado quando se considera o conceito de “trabalho em rede”.
“Porque se não existisse essa casa aqui, onde estariam as crianças
hoje? Como que estariam com as famílias?” (Entrevista, rede de
atendimento).
“A própria instituição começou a disseminar essa cultura de procurar
essas menores e encaminhá-las” (Entrevista, rede de defesa/
responsabilização)
Boa parte daqueles que opinaram com relação à qualidade e quantidade
de políticas de combate ao abuso e exploração sexual infanto-juvenil afirmam que
elas são insuficientes. Alguns representantes da rede de defesa/ responsabilização
reclamaram da falta de contingente: um deles afirma que apesar da frota de carros ter
mais do que dobrado e a malha rodoviária não parar de crescer, o número de agentes
é hoje menor do que era em 1996, impedindo ações mais ambiciosas e amplas. Já
em outra entrevista, deparamo-nos com um número insuficiente de funcionários.
Outro representante da rede de defesa/ responsabilização afirma que enquanto a
quantidade de programas é adequada, a qualidade já deixa a desejar, pois não
resolve o problema. O exemplo dado foi do programa Sentinela que tem espaço para
atender, mas não consegue atuar de forma efetiva por não ser conhecido.
Outra afirmação importante da rede de defesa/ responsabilização é a de
que quando as operações são realizadas na presença de juízes e promotores que
estão realmente dando apoio, querendo participar, elas tendem a ser bem mais
eficientes.
“Você estar com ele in loco, sabe, com o juiz, o promotor, e ele ver a
situação, se sensibiliza com aquilo, manda fechar na hora” (Entrevista,
rede de defesa/responsabilização).
Das instituições de defesa e responsabilização, apenas uma apresentou
uma visão realmente positiva de seu contexto. De acordo com seu representante, a
76
situação da instituição é privilegiada se comparada a outras, pois ela dispõe de
profissionais qualificados (incluindo um técnico concentrado só na infância) e tem um
espaço relativamente tranqüilo para trabalhar.
“... nem todas as instituições dispõem de um técnico, eu disponho
de um técnico... que fica só é, concentrado na infância. Né, tem
também um oficial. Que são dois auxiliares né: o técnico que é
formado em direito... então, um deles é especializado né, e tem o
outro que é o oficial, é é ele tem um, um segundo grau, mas que
realiza essas tarefas burocráticas, assim funções burocráticas...
mas, então é o que eu falo assim, aqui... é é é, aqui eu to
privilegiada, diante de muitas instituições por aí sabe” (Entrevista,
rede de defesa/ responsabilização)
2.2.
Percepção
funcionamento
da
rede
sobre
dificuldades
no
Um primeiro ponto que merece destaque entre as dificuldades no
funcionamento da rede, diz respeito à falta de definição de qual seria o papel dentro
de cada instituição ou ator dentro da rede de enfrentamento à violência sexual infantojuvenil, fator esse que está muito relacionado com incipiência da proposta de trabalho
integrado entre as instituições, incipiência mais visível ainda no caso de nosso foco de
diagnóstico.
Diagnosticamos uma certa falta de clareza para a população em geral e
para as instituições componentes da rede de enfrentamento, de qual seja o real papel
de cada uma delas. Se por um lado isto faz com que muitas vezes a população não
chegue até elas para demandar serviços e, o que nos interessa, para fazer denúncias,
por outro sugere a falta de comunicação entre as instituições e falhas na divulgação
das atividades realizadas. Ademais, o fato de cada instituição possuir objetivos,
públicos-alvo e metodologias distintas, acaba dificultando a identificação de algo que
as una e motive a troca de informações bem como o trabalho articulado, num contexto
onde “a” rede, nos moldes definidos dentro desta análise, encontra-se em estágio
primário.
“Porque o que gente nota, é que essas entidades elas querem, é,
cada uma fazer né, por si. Eu quero colher informações que sejam
pertinentes ao meu trabalho. Ao passo que se tivesse um pensamento
integrado, a minha escuta, a minha coleta de informações, ela poderia
servir pro seu serviço, pro seu atendimento. O que se percebe muito,
77
é que essas entidades elas querem auto-investir no próprio
atendimento e não estão nem ligando pra, pros outros serviços que
existem né, querem acumular tudo dentro delas, e não compartilhar”
(Entrevista, rede de atendimento)
As instituições que potencialmente comporiam a rede de enfrentamento à
violência sexual infanto-juvenil não conseguem abranger todo o município. As áreas
mais afastadas, como é o caso da zona rural e dos distritos, acabam ficando à
margem de todo o processo, inclusive Mucurizinho, distrito bastante citado como de
procedência das vítimas de abuso e exploração sexuais. Os encaminhamentos só são
feitos de fato nos casos em que haja denúncia, além do que nem todos os casos
identificados são denunciados, em face da distância – inclusive física – entre estas
localidades e a “rede” de defesa e responsabilização.
“Esse trabalho em rede, eu acho que é quase utópico. Porque existem
serviços, serviços efetivos que ocorrem, mas não existe essa
comunicação.
Não,
de
forma
alguma!”
(Entrevista,
rede
de
atendimento).
Embora uma das entrevistas tenha aparecido que necessariamente todas
as denúncias chegam à instituição, o que se observou, com base em todas as
entrevistas e visitas realizadas, é que o fluxo da informação, assim como dos
encaminhamentos, depende do caso – “cada caso é um caso” - e de sua “porta de
entrada”. Ou seja, não é possível traçar o fluxo ‘padrão’ dos casos, nem dos
encaminhamentos, uma vez que não se reconhece a existência de um fluxo como
sugerido na teoria – ou seja, de denúncia, de informação, ou de encaminhamento –
que deva ser tomado como obrigatório.
Tal fato impossibilita a existência de uma instituição que congregue
informações sobre todos os casos, que seja capaz de fornecer informação sobre
todos os encaminhamentos que foram dados. De fato, durante as visitas e entrevistas,
não foi possível identificar uma instituição que possuísse registro de todos os casos
denunciados no município, ou seja, qualquer que seja a fonte de informação, existe
uma sub-enumeração das ocorrências. Além disso, faz com que nem sempre a
instituição que fez o encaminhamento tenha retorno dos procedimentos feitos após
sua atuação – ou seja, nem todos os casos têm um acompanhamento ao longo do
tempo, como forma de avaliar se a situação de violência cessou, se os culpados
foram punidos e se a criança/adolescente vitimizado, bem como sua família,
receberam os atendimentos necessários.
78
Outra dificuldade apontada por alguns entrevistados refere-se à falta de
entidades – na rede de atendimento, em especial - para onde se possam fazer
determinados encaminhamentos ou, em outras situações, a falta de estrutura das
entidades para atender à demanda do município. Nas falas dos entrevistados, embora
a denúncia seja feita e os encaminhamentos necessários sejam realizados, muitas
vezes estes não têm efetividade. Isto acaba por impossibilitar a retirada da criança ou
adolescente vítima do contexto de violação em que ele se encontra, ou seja, a falta de
estrutura acaba por revitimizar as crianças e adolescentes que, por falta de estrutura e
de recursos, se vê forçada a permanecer no contexto dentro do qual ocorreram as
violações.
“No caso de Teófilo Otoni, às vezes acontece de ter o abuso e você
pega a vítima, encaminha a vítima e você deixa a vítima no mesmo
lugar que ela ta, porque você não tem a estrutura necessária para
colocar essa vítima” (Entrevista, rede de defesa/ responsabilização).
A este respeito, uma das entrevistadas chamou atenção para o fato de
que não basta existirem as leis, o ECA, e as pessoas envolvidas na rede terem
conhecimento do que está estabelecido, se não há uma estrutura capaz de dar conta
das demandas que surgem em virtude da aplicação/observação destas leis. Embora
esta tenha sido uma fala isolada, ela reflete um sentimento latente em várias
entrevistas, e que vai ao encontro das observações feitas durante as viagens a este
município, que é o da falta de uma estrutura capaz de fazer frente à violência sexual
infanto-juvenil, tanto no que concerne à prevenção quanto ao atendimento às vítimas.
Há de se considerar, no entanto, que esta insuficiência passa, em certa medida, pela
falta de planejamento das ações, dentro das instituições, pela falta ou dificuldade de
comunicação e troca de informações entre as instituições existentes, e pelo fato de
que o município caracteriza-se por ser um pólo regional de atendimento em diversos
âmbitos, fazendo com que a demanda por serviços em algumas áreas seja bastante
elevada. A este respeito, é importante refletir sobre quais as contribuições que a
constituição de uma rede de instituições voltadas para o enfrentamento à violência
sexual infanto-juvenil poderia trazer, no sentido de minimizar os efeitos perversos da
falta de estrutura municipal para fazer frente à demanda, fato que passa, em certa
medida, tanto pela invisibilidade do fenômeno no município, quanto pela falta de
recursos para investimento na ampliação de serviços oferecidos.
Outro ponto deve ser colocado como dificultador do trabalho em rede no
município, é o fato de que uma vez recebida a denúncia e feitos os encaminhamentos,
muitas vezes não há um acompanhamento dos processos ocorridos com a vítima,
79
com o agressor e com sua família. Tal fato guarda estreita relação tanto com a falta
de estrutura das entidades existentes, comentada anteriormente, quanto com o fato,
apontado – ou sugerido – por todos os entrevistados, de que cada caso possui suas
particularidades, que determinam em grande medida o fluxo de encaminhamentos a
serem dados.
O próximo gráfico representa a opinião das instituições que responderam
ao questionário acerca do número de programas relacionados à temática existentes
na cidade. Todas elas responderam que programas de apoio e orientação sóciofamiliar existem em quantidade inadequada na cidade. Em geral, o que devemos
ressaltar nesses dados é que cerca de 80% destas mesmas instituições reconhecem
a existência desses programas na cidade, apesar de estes serem em quantidade
insuficiente para atender a demanda. O único programa que foge a esta regra é o
relacionado “ao combate ao abuso e exploração sexual”. E este último ponto pode ser
considerado como um ponto positivo.
O gráfico abaixo quantifica esta percepção.
Gráfico 13 – Percepção da rede sobre os programas existentes no município:
quantidade não adequada
100%
100
83%
90
83%
80%
75%
80
70
60
50
33%
40
30
20
10
0
Apoio e orientação
sócio-familiar
Apoio a dependetes
de álcool/drogas
Programa
profissionalizante
Programa de
colocação familiar
Protagonismo
Juvenil
Combate ao abuso e
exploração sexual
Fonte: Questionário Institucional - Diagnóstico/CRISP-UFMG
Certamente um ponto importante a ser investigado refere-se ao
relacionamento das instituições componentes da rede com o Poder Executivo local.
Chama a atenção o fato de todas as entidades de defesa terem reconhecido haver
alguma dificuldade com o Poder Executivo. Da mesma forma, a maioria das
instituições da rede de atendimento (67%) também apontaram alguma dificuldade
80
neste relacionamento. Fogem a este padrão, as instituições de responsabilização,
uma vez que a minoria, ou seja, 1/3 (ou 34%) reconheceram esta dificuldade.
As respostas ao questionário enviado também mostraram que todas as
instituições da rede de responsabilização e 67% daquelas componentes da rede de
defesa consideram que a participação da comunidade no enfrentamento do problema
da violência sexual infanto-juvenil é baixa.
2.3. Percepção da rede sobre falta de entidades de
atendimento a crianças e adolescentes e às famílias
A maior parte das instituições representantes das redes considera que
faltam entidades de atendimento a crianças e adolescentes vítimas de violência
sexual em Teófilo Otoni, como nos mostra o gráfico seguinte.
Gráfico 14 – Percepção da rede em relação à falta de entidades, em alto grau, de
atendimento de crianças e adolescentes
100%
100%
100
90
67%
80
70
60
50
40
30
20
10
0
Rede Defesa
Rede Atendim ento
Rede Responsabilização
Fonte: Questionário Institucional - Diagnóstico/CRISP-UFMG
Alta também é a percepção de que existem poucas entidades de
atendimento aos familiares das vítimas de violência sexual, em Teófilo Otoni. (100%
da rede de responsabilização, 67% da rede de atendimento e 50% da rede de
defesa).
81
Gráfico 15 – Percepção da rede em relação à falta de entidades, em alto grau, para
atendimento a famílias
100%
100
90
67%
80
70
50%
60
50
40
30
20
10
0
Rede Responsabilização
Rede Atendimento
Rede Defesa
Fonte: Questionário Institucional - Diagnóstico/CRISP-UFMG
2.4. Aspectos positivos da rede
Papel preponderante foi atribuído pelos atores da rede ao Ministério
Público, mais precisamente à 5ª. Promotoria da Infância e Juventude, que tem se
esforçado na articulação da rede e no contato rotineiro com toda ela, estabelecendo
contato pessoal com os integrantes do Sentinela e da Casa Ninho. Isso demonstra
que a rede em Teófilo Otoni não é totalmente fragmentada, isto é, formada apenas de
atores que agem sós. Apesar disso, ainda na percepção dos atores da rede
entrevistados, essas ações conjuntas ainda estão longe de serem realizadas
articuladamente por todos aqueles que nela estão inseridos.
A instalação do Sentinela é recente no município, entretanto, conforme
entrevistas, os encaminhamentos de exploração e abuso estão sendo enviados ao
mesmo e ele vem sendo integrado à rede. Mas, é importante estar atento para que
este encaminhamento não se torne apenas transferência de responsabilidade.
2.5. Aspectos problemáticos do funcionamento da rede
Escolas e Postos de saúde são instituições fundamentais de denúncias.
Estas instituições apontaram dificuldades para realizar denúncias especialmente as
escolas situadas fora do perímetro urbano.
Ações pró-ativas só foram citadas pelo CRAS, que faz busca ativa em
domicílios. Dentre as ações pró-ativas atualmente estão sendo enfatizadas aquelas
82
que envolvem o protagonismo juvenil, principalmente relacionado aos jovens que
sofreram violência sexual.
Ações conjuntas não se tornaram procedimento de rotina para todos os
atores da rede e aplicáveis a todos os casos. Se parte disto se deve ao fato de que as
decisões no fluxo de funcionamento são tomadas de acordo com cada caso, ainda
assim prevalece um prosseguimento mais burocrático e formal.
O registro de informações é precário, sobretudo nos Conselhos Tutelares,
uma vez que o mesmo é feito de forma manual, não havendo a utilização do SIPIA.
Recomenda-se,
portanto,
o
fortalecimento
dos
Conselhos
Tutelares,
a
conscientização da rede quanto ao seu papel, dentre outros, de centralizador destas
informações de maneira a embasar a elaboração de políticas públicas municipais,
estaduais e nacionais, já que uma das funções desta instituição é dar visibilidade
nacional e governamental ao fenômeno quando do envio dos dados à Secretaria
Especial de Direitos Humanos, através do SIPIA.
2.6. Percepção da rede sobre os desafios para seu sucesso
A idéia de que o trabalho é realizado de forma fragmentada, isolada, faz
com que as potencialidades de cada instituição sejam menos aproveitadas, e que o
trabalho conjunto contribuiria para tornar as instituições mais fortes e para ampliar seu
raio de alcance.
Foi ressaltado que a definição clara acerca de qual seja o real papel de
cada instituição dentro da rede de enfrentamento é um desafio a ser enfrentado. Este
ponto já havia sido levantado quando da identificação das dificuldades enfrentadas no
funcionamento da rede, demonstrando ser esse um objetivo essencial a ser buscado
pelas instituições.
O fato de que cada instituição tem sua especificidade, sua metodologia de
atuação, seus objetivos e seu público-alvo, que são, na maioria dos casos, bastante
distintos, aliado ao fato de que instituições governamentais e não governamentais
operam segundo lógicas muito distintas, fazem com que o desafio do trabalho
integrado fique ainda maior.
Alguns entrevistados apontaram que o sucesso do trabalho em rede, que
envolve a articulação entre instituições governamentais e não governamentais,
dependerá de muita persistência e empenho, para que se mantenha o grupo
mobilizado e para que este não fique estático diante dos desafios e dificuldades que
83
apareçam no caminho. Ou seja, manter a rede operante exigirá um esforço
permanente da parte de todos.
2.7. Visão da rede sobre o Pair
Em linhas gerais, foi unânime a opinião de que a vinda do PAIR é positiva
e irá trazer contribuições importantes para a constituição da rede no município e para
o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes. Existe o
reconhecimento de que o trabalho isolado tende a ser pouco eficiente e mais
dispendioso, em geral e no que tange à violência sexual infanto-juvenil.
Não obstante, tanto para o sucesso das intervenções componentes do
PAIR quanto para a efetividade da articulação entre instituições governamentais e não
governamentais, foi mencionado que será necessária muita persistência para que o
grupo não se desmobilize nem fique estático diante dos desafios e dificuldades que
apareçam no caminho. O fato de que cada instituição tem sua especificidade, aliado
ao fato de que, segundo os próprios entrevistados, a idéia de rede no município seja
ainda incipiente, faz com que o desafio do trabalho integrado e de se efetivar a
proposta do PAIR, fique ainda maior.
84
PARTE V – Comentários Finais e recomendações ao
trabalho em rede em Teófilo Otoni
Em Teófilo Otoni, não foi observada a proeminência de nenhuma
instituição no tocante ao enfrentamento da violência sexual infanto-juvenil, apesar de
alguns entrevistados terem apontado a Casa Ninho como instituição chave no
combate a esse problema. A Casa Ninho é a única instituição no município que lida
diretamente com crianças e adolescentes cujos direitos foram violados e atua também
como abrigo para esse público.
Os depoimentos colhidos no decorrer dessa pesquisa nos mostraram que,
de acordo com os entrevistados das redes de defesa/ responsabilização e
atendimento de Teófilo Otoni, o problema primordial na questão do enfrentamento da
violência sexual infanto-juvenil se refere à falta de apoio do poder público a essa
problemática. Essa carência acaba sendo revertida em falta de apoio infra-estrutural
como instituições especializadas no atendimento às vítimas de violência sexual,
recursos humanos até a falta de legitimidade da questão junto à comunidade, com
pouca visibilidade e dando, por vezes, impressão de que não se trata de um problema
tão preocupante.
Além disso, identificamos uma postura apenas reativa diante dos casos de
violência sexual infanto-juvenil, pois se sabe que o problema existe, mas se os casos
não são denunciados, não existem ações pró-ativas para seu enfrentamento. Esse
parece ser o procedimento padrão nas instituições de enfrentamento do problema no
município, com exceção do CRAS. Essa instituição atua não somente com crianças e
adolescentes em situação de risco, mas com toda a família de maneira sistêmica. De
acordo com depoimentos, são realizadas visitas de averiguação da situação de
famílias suspeitas de estarem violando direitos de crianças e adolescentes.
Os depoimentos demonstraram que não existe um trabalho em rede
estruturado dentro do município. O que se observa na maior parte dos casos são
agências que recebem os casos e procedem de maneira isolada e durante algum
momento do processo, dando os encaminhamentos sem realizar as trocas de
informação e articulação. Muitos relatos mostram que a atuação das instituições se dá
em relação a cada caso, não estabelecendo uma padronização de procedimentos.
Contudo, observa-se o esforço de algumas instituições em procurar estabelecer
parcerias, tais como Conselhos Tutelares e Promotoria ou Conselhos Tutelares e
CRAS, mas essa atuação não é estabelecida como uma prática rotineira para todas
85
as ocorrências, dependendo muito das características de cada um e da “porta de
entrada” da denúncia.
Outra queixa dos atores da rede de enfrentamento em Teófilo Otoni é a
falta de definição do papel de cada um dentro da proposta de trabalho integrado
refletindo insipiência de tal proposta entre as instituições. Essa falta de clareza se faz
refletir também na comunidade que não possui idéia clara sobre o papel de cada
instituição.
O contato com essas instituições permitiu perceber que em nenhuma
delas existe o registro de todos os casos denunciados no município levando a uma
sub-notificação dos mesmos. Além disso, não é comum que os processos sejam
acompanhados após os encaminhamentos.
Houve muitas queixas acerca da pouca oferta de estrutura e instituições
de acolhimento às vítimas infanto-juvenis de violência sexual. Alguns entrevistados
ressaltaram que não basta atender os casos, nem existir um estatuto que as proteja
se não houver uma estrutura compatível com tais direitos. Ademais, as instituições
existentes não são suficientes para atender todo o público do município, muitas vezes
ficando a zona rural desamparada.
Apesar dos problemas apontados, observa-se a iniciativa de algumas
instituições como o Ministério Público, através da Promotoria da Infância e Juventude,
que procuram estabelecer um diálogo com outras no município como os Conselhos
Tutelares, a Casa Ninho e o Sentinela, mesmo que ainda não muito estruturado. Isso
demonstra que a rede no município não está totalmente desarticulada, mas muito
trabalho precisa ser realizado para que exista de fato um trabalho integrado. Sendo
assim, a partir das entrevistas, merece destaque a demanda das instituições por
maior contato umas com as outras e o estabelecimento de maior número de parcerias
para enfrentar o problema da violência sexual infanto-juvenil. Foram apontadas como
necessárias principalmente parcerias com escolas, instituições que lidam diretamente
com o público-alvo da questão. Desta forma, o PAIR é percebido como um programa
que vem a somar aos esforços de enfretamento da violência sexual contra crianças e
adolescentes, posto que o trabalho articulado entre as instituições componentes da
rede é algo valioso, mais eficiente e menos oneroso se comparado a esforços
isolados das instituições.
Entretanto, para que haja um trabalho articulado, é
necessário que se desenvolva, dentro das instituições, conscientização para a prática
desse trabalho e cooperação mútua entre as agências componentes da rede, o poder
público e a comunidade.
86
Através da análise dos depoimentos colhidos junto às redes de
defesa/responsabilização e atendimento em casos de violência sexual infanto-juvenil
e todo o material coletado durante o processo dessa pesquisa, algumas
recomendações da rede podem ser elencadas:
•
Relacionamento mais estreito com as escolas, especialmente aquelas
situadas próximo à BR-116;
•
A maioria dos entrevistados alertou para a falta de atenção das autoridades
quanto ao problema da violência sexual infanto-juvenil. Essa “desatenção”
manifesta-se de várias formas como: a ausência de recursos tanto humanos número reduzido de profissionais e capacitação voltada ao problema - quanto
financeiros, de estrutura física para o atendimento e encaminhamento dos
casos, sobretudo, no que diz respeito aos locais apropriados para acolher as
vítimas (casas-abrigo).
•
A maioria dos entrevistados sugeriu maior troca de informações entre as
instituições através de reuniões periódicas com representantes, além da
ampla divulgação entre elas.
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